A To g a CENTRO ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHA Avenida João Pessoa, 80 - térreo (51) 3308.3598 [email protected] Jornal dos estudantes da Faculdade de Direito da UFRGS www.ufrgs.br/caar Porto Alegre, abril de 2011 - Nº 1 - Ano LXIII Distribuição gratuita Tiragem: 1.000 exemplares ENSINO A despedida da Profa. Judith Martins-Costa p. 3 INTERCÂMBIO Os árabes sob os óculos escuros europeus ? p. 4 EXTENSÃO Adolescentes e ato infracional no SAJU p. 5 CULTURA O melhor do Brasil p. 6-7 Um convite: aproveite o que a UFRGS oferece p. 8 A TOGA - Abril de 2011 2 EXPEDIENTE EDITORIAL A Toga Jornal dos estudantes da Faculdade de Direito da UFRGS - Nº 1 - Ano LXIII - Abril de 2011 Comissão Editorial: Bruno Bastos Becker, Kézia Borges, Laura Damo da Cruz, Mariana Medeiros Lenz, Rafael Xavier - “TAGA”. Diagramação: Mariana Medeiros Lenz Tiragem: 1.000 exemplares A Toga é uma publicação promovida pelo Centro Acadêmico André da Rocha (CAAR). Os textos assinados são de responsabilidade de seus autores. Fundado por Nicanor Luz e José J. Dall-agnol, em maio de 1949. Imagem de capa: Maria Lucia Medeiros Lenz DIRETORIA EXECUTIVA DO CENTRO ACADÊMICO ANDRÉ DA ROCHA Gestão Mãos Unidas, Mentes Abertas Presidência: Elis Marina Barbieri Vice-Presidência: Guilherme Jantsch Secretaria-Geral: Nathalia Beduhn Schneider Secretaria Acadêmica: Leonardo Serrat de Oliveira Ramos Tesouraria: Gustavo Saling dos Santos Coordenação da Revista Res Severa Verum Gaudium: Laura Marazita Lotti Secretaria de Ensino, Pesquisa e Extensão: Ailime Pureur Macedo, Felipe da Costa De-Lorenzi, Laura Damo da Cruz. Secretaria de Relações Institucionais: André Silva Gomes, Fernanda Stragliotto Bonotto, Francisco Ponzoni Pretto, Patrícia Vilanova Becker. Secretaria de Eventos Acadêmicos: Bruno Bitencourt Pedroso, Eduardo Kowarick Halperin, Luciano Zordan Piva, Paula Molina Leal, Rafael Xavier - “TAGA”. Secretaria de Cultura: Aline Gabrielle Renner, Augusta Vezzani Diebold, Clarissa Cerveira de Baumont, Lucas do Nascimento, Mariana Kuhn de Oliveira. Secretaria de Comunicação: Arthur Amaral Reis, Mariana Medeiros Lenz. Secretaria de Integração: Daniela Gonsalves da Silveira, Fernando Polidori Rios, Pedro Conzatti Costa. Secretaria de Assuntos Internacionais: Aline Oliveira Vaccari, Gabriela Souza Antunes. Secretaria de Esportes: João Thiago Campos Lopes, Lucas de Mattos Ribeiro, Marcio Furtado. Colaboraram nesta edição: Arthur P. Bedin Arthur Reis Brayner Rogério Tavares Araújo Bruno Bastos Becker Celina Leite Miranda Eduardo Georjão Fernandes Eduardo Kowarick Halperin Emílio F. H. P. Freitas João Vicente Padão Rovani Kézia Borges Laura Damo da Cruz Letícia Zenevich Lucas do Nascimento Marcelo Tosin Marcio Cunha Filho Mariana Medeiros Lenz Rafael Xavier – “TAGA” Rodrigo Führ de Oliveira Samuel Sganzerla O jornal A Toga começa 2011 com um projeto pronto para ser colocado no papel, ou melhor, em vários papéis: consolidar sua periodicidade bimestral, tornando-se uma publicação que chega às mãos dos estudantes de Direito da UFRGS regularmente, uma vez a cada dois meses, sempre com data para retornar com mais reportagens, poemas, resenhas e opiniões. Queremos ainda, com textos produzidos pelos próprios alunos e pela Comissão Editorial, firmar o papel do A Toga como veículo de comunicação que mescla, de um lado, leitura agradável e assuntos que permitam ao leitor identificar-se com o jornal e, de outro, abordagem crítica, relativa especialmente à educação pública e à UFRGS. É com esse espírito que a primeira edição deste ano foi construída. Na reportagem da capa, “O melhor do Brasil – Entre o orgulho e a crítica” (p. 6-7), matéria publicada em janeiro no jornal Zero Hora é o ponto de partida de uma análise dos critérios utilizados pelo Ministério da Educação (MEC) para avaliar os cursos de graduação do Brasil. A exposição tem a finalidade de subsidiar debate entre os estudantes – conhecendo os critérios que levaram o Direito da UFRGS ao posto de “primeiro do País”, fica mais fácil discutir se acreditamos ou não na pertinência da classificação. Nas primeiras páginas, dois temas que também mexeram no cotidiano da Faculdade: a despedida e a homenagem da marcante Profa. Dra. Judith Martins-Costa, e a entrada de uma nova leva de “bixos” e suas primeiras experiências – narradas pelo calouro João Vicente Rovani. Na experiência pessoal também se baseia o texto de Letícia Zenevich (p. 4). Em intercâmbio na França, ela observa de ca- marote a oposição inconciliável que os europeus associam aos árabes e à democracia, tema tão contemporâneo em tempos de luta no Egito pela queda de Hosni Mubarak, após 31 anos no poder. Da França, a página retorna ao Brasil em texto do calouro Brayner Araújo, que critica a inércia dos órgãos do Estado em combater a corrupção e os problemas sociais. Nosso papel como cidadãos e universitários é demonstrado em notícia sobre a criação de um novo grupo do SAJU, destinado ao atendimento de adolescentes acusados de ato infracional (p. 5), e em texto que sugere a prática jurídica como ferramenta de busca de soluções para a garantia do direito à saúde dos usuários de crack. A coluna assinada por Kézia Borges (p. 8) é quase um convite ao mergulho na vida acadêmica cultural, que tem muito a oferecer ao estudante que ousa descobrir a Universidade fora da João Pessoa, número 80. Para auxiliar nessa travessia, divulgamos também parte da programação cultural da UFRGS para o final de abril, envolvendo cinema, teatro e música. A literatura também marca presença no A Toga, por meio de resenha de Lucas do Nascimento da obra Antígona, tragédia grega de autoria do dramaturgo Sófocles. Os assuntos mais próximos do cotidiano do estudante não ficaram de fora. Na página 10, Rodrigo Führ de Oliveira compara as experiências de estagiar em escritório e em órgão público, auxiliando o estudante a escolher de acordo com seu perfil. E, como a vida estudantil não precisa ser só trabalho e estudo, entrevistamos Romano Scapin, destaque do Direitão do ano passado, que fala informalmente sobre a competição e o importante papel do esporte no fortalecimento de amizades entre colegas de aula. A Toga de abril se despede com ar de poesia. Na contracapa, um evento inovador que movimentou a Faculdade de Direito – o I Saarau do CAAR, com o tema Chico Buarque – é acompanhado por poemas escritos por dois alunos, e pela promessa de encontrarmos mais escritores dispostos a compartilhar o que andam rascunhando em cadernos secretos durante a aula... Comissão Editorial, abril/2011 CALOUROS Primeiras impressões “Bixo” narra como foi seu primeiro mês dos próximos 5 anos no Direito • JOÃO VICENTE PADÃO ROVANI Acadêmico do 1º ano noite Minha primeira experiência como aluno de Direito ocorreu logo no dia 21 de janeiro deste ano, quando, após ver meu nome na lista de aprovados do Concurso Vestibular, dar uns pulos de alegria e receber felicitações familiares, abro meu Orkut e vejo que já fui descoberto pelos mais ansiosos dentre os meus veteranos. Para alguém que não tinha assimilado ainda o seu ingresso em tão estimada instituição de ensino – que nos próximos dias seria divulgada como sendo a melhor de Direito do Brasil – foi natural o meu espanto diante de tão rápida recepção. No fórum da comunidade que para nós fora criada nesse mesmo site, fui aos poucos me acostumando com o que depois entendi serem gestos de carinho de meus veteranos, ao mesmo tempo em que conhecia um pouco de meus novos e assustados colegas. Lá também fui informado que devia ir me matricular devidamente trajado com roupas “descartáveis”. Ao chegar à faculdade no dia da matrícula fui recepcionado pelo pessoal do CAAR, que nos fez uma BIXO 2011: João Vicente, do Direito Noturno, participando do trote A TOGA - Abril de 2011 3 ENSINO Uma Professora a quem retribuir Em despedida da Faculdade de Direito da UFRGS, a Profa. Dra. Judith Martins Costa recebe homenagem de alunos • RAFAEL XAVIER - “TAGA” Acadêmico do 3º ano manhã No dia 26 de novembro, despediu-se do nosso corpo docente a Profa. Dra. Judith Martins-Costa. O CAAR, juntamente com a Direção e um grupo de alunos, organizou o grande adeus – na realidade, um até logo, visto que não serão poupados esforços para que a Professora esteja ligada aos Eventos organizados na Egrégia – à eminente Professora que após colaborar significativamente na formação de juristas nos últimos 20 anos na Faculdade, infelizmente, teve de retirar-se do quadro de professores. A homenagem contou com presenças ilustres, tanto na mesa de apresentações do Salão Nobre, quanto na plateia. Palestraram a respeito das “Novas Perspectivas do Direito Obrigacional” o ex-Ministro Eros Grau, ex-presidente do Supremo Tribunal Federal, que tratou da relevância da hermenêutica ligada ao Direito das Obrigações; o Ministro do Superior BIXO 1955: Raul Bastos Miranda, pai da bibliotecária Celina Miranda, da BIBONU, ingressou na Faculdade de Direito da UFRGS há 56 anos e participou da “Passeata dos Bixos” vestindo as roupas de sua mãe, como era tradição na época Tribunal de Justiça, egresso da nossa Faculdade (orientando da Profa. Judith no Doutorado do PPGD) Paulo de Tarso Sanseverino, que fez exposição extraordinária acerca do papel do princípio da Boa-Fé na jurisprudência do STJ, e a Professora da Casa, Doutora Vera Maria Jacob de Fradera, que fez um emocionante relato sobre o Direito Civil na Faculdade, ressaltando a extrema relevância da homenageada no desenvolvimento das mais variadas atividades – de ensino, pesquisa e extensão breve e esclarecedora apresentação, sendo dirigido logo em seguida para a secretaria da faculdade em prol de fazer minha tão esperada matrícula. Mas a verdadeira recepção só foi ocorrer em seguida, na parte externa da faculdade, com bastante tinta, esmalte e um questionário que provavelmente fora criado por um estagiário do famoso Boston Medical Group. E eu não pude deixar de aproveitar a oportunidade para adequar o meu corte de cabelo à situação, sob apavorados protestos de meu irmãozinho. O primeiro dia de aula me impressionou bastante... Primeiramente porque eu esperava receber então algumas delicadezas de meus veteranos. Já a sala de aula me impressionou negativamente, apesar da beleza arquitetônica: goteiras, quadro improvisado, cadeiras quebradas. Mas foi na aula des- – nas últimas duas décadas. encantando a todos, tanto pelo A Profa. Judith tratou notável saber jurídico quanto brilhantemente do tema das pela simplicidade no trato não obrigações antidorais; sendo só com seus discípulos, mas estas as espécies de obrigatambém com o resto do corpo ções nas quais a solução é imdocente. São previstos já para possível; não se pode “pagar a este ano, ao menos, dois eventos dívida”, somente “retribui-la”. que contarão com sua presença: O Salão Nobre contou a II Semana Cultural e a II Jorcom a presença também de nada de Responsabilidade Civil. grandes juristas de destaque A Profa. finalizou – ou nacional, como o ex-Ministro melhor, como não há soludo STF Paulo Brossard, o ção de sua obrigação, retriex-Ministro da Justiça Prof. buiu – ao seu vínculo formal Miguel Reale Júnior, assim com a Faculdade com uma como grandes professores da derradeira e comovente menCasa, como o Diretor Sérgio sagem, se dirigindo aos alunos: Porto, o Prof. Dr. Humberto Ávila e o Prof. Dr. Salo “A minha relação com vocês, alunos de Carvalho, entre outros. desta Faculdade, é uma relação anOs alunos ainda prestatidoral. Eu posso retribuir, não param sua homenagem com um gar. (...) Mas essa relação vale para discurso do acadêmico Ezeos dois lados – para mim, para vocês quiel dos Santos e por meio que devem retribuir, também, tornanda entrega de flores e de uma do-se os futuros professores desta Faplaca, o que causou verdadeira culdade, levando adiante a chama.” comoção entre os presentes. A saída do quadro docente da Profa. Judith foi, certamente, uma perda irreparável à Faculdade de Direito e à Universidade Federal, visto que o diálogo intenso, sempre promovido pela Professora, a respeito não só de assuntos internos ao direito, como também de matérias atinadas a outras áreas da cultura, foi de primoroso destaque na formação de novos acadêmicos. Os alunos, porém, não pouparão esforços para que a Professora siga estimulando e Discurso aos estudantes marca homenagem te dia que eu tive pela primeira vez a sensação que é estar no corpo discente de nossa faculdade: o professor a discursar, o uso do vernáculo jurídico e das expressões latinas, a concentração integral da turma e seu anseio por mais conhecimento, quadro que se repetiria nos dias de aula que se seguiram. Os dias seguintes foram dedicados aos trotes, onde fomos sujos e pintados para sair em busca da compaixão dos transeuntes, que tendem a ser pouco receptivos nas primeiras horas da noite, e dessa forma juntar R$ 150 em trocados. Houve também alguns momentos constrangedores pelos quais tivemos que passar, ocasiões que não esqueceremos tão cedo. O CAAR também teve sua participação com o trote solidário, o mais leve e mais importante da semana. A sede do CAAR, aliás, é um lugar fantástico, com sua mesa de bilhar, seus computadores, violão, jogos e, principalmente, os convivas que lá sempre se encontram, desde o menos assíduo, que vai apenas saudar seus colegas aos intervalos, até aqueles que frequentemente se encontram ali em horário letivo (ouso me perguntar como os professores não se preocupam com esta concorrência). Não só a sede como a instituição em si merece ser parabenizada, pela sua organização, ações comunitárias e por tudo o que proporciona aos estudantes. Pensava eu que este era um órgão pouco eficiente em função de ser muito politizado, mas reconheço que me surpreendi diante de sua atuação e constante preocupação com nós discentes. O clímax de nossa recepção foi a aula que assistimos no salão nobre da faculdade, aula esta que confesso não ter compreendido em sua totalidade, bem como os meus colegas, mas que nos introduziu a disciplina de direito constitucional e já nos deixou ansiosos para as aulas que virão próximo semestre. Expectativas neste início de vida universitária não me falta, e imagino que meus colegas compartilhem deste sentimento, enquanto nos sentimos cada vez mais alunos desta faculdade, que ao mesmo tempo em que começamos a adorar, nos retorna, de certa forma, este sentimento. 7 de abril de 2011 A TOGA - Abril de 2011 4 INTERCÂMBIO • LETÍCIA ZENEVICH Acadêmica do 3º ano noite, atualmente em intercâmbio estudantil em Rennes (França) Sou árabe e derrubei dois ditadores em um mês – afirma Mona Eltahawy (monaeltahawy.com). Pouco importa. Aqui na França, o discurso é análogo não importa onde reproduzido - veículos de comunicação de direita ou de esquerda: PRECAUÇÃO. O fantasma do Irã está adormecido em cada egípcio. Islamismo parece mais audível que o brado de 81 milhões de pessoas no Egito; de 10 milhões na Tunísia, das vozes caladas por Kadhafi. Falo de França, mas o discurso não se altera nas vozes de meus amigos alemães e italianos. Eles derrubaram Ben Ali e Mubarak. Seu sangue e sede rolam na Líbia. Mas NÃO SE ENGANEM. Ainda são eles, os árabes. E ser árabe é ser bárbaro. Ser árabe é se importar mais com o véu opressor que com a democracia da qual meus amigos julgam-se os detentores últimos. O véu não era unanimidade nos protestos do Egito, argumento, e mulheres de véu também estavam protestando, afinal. MAS NUNCA SE SABE. Eles ainda são os outros. Nenhuma prova, nenhuma morte é suficiente para meus amigos europeus: os árabes têm certa predisposição genética para o despotismo e a submissão. b á r b a r o s À espera dos Quando a pátria que temos não a temos Perdida por silêncio e por renúncia Até a voz do mar se torna exílio E a luz que nos rodeia é como grades Sophia de Mello Breyner Andersen Islã significa submissão. Mas catolicismo, tanto com a história de Abraão, como com a história de Jó e, para coroar, com a Idade Média, é a mesma coisa, e voilà, somos democráticos e lindos. Claro que a democracia não é instantânea, como Octávio Paz alertou, uma sopa de três minutos. Evidente que não. E sim, foi preciso laicizar o Estado para isso, como os intelectuais franceses não cansam de lembrar. Contudo, cada Estado democrático teve “graus de laicização” diferentes (no Brasil há, por exemplo, crucifixos nos tribunais, o que é impensável na França), e essa diferença não impediu totalmente o exercício da democracia. Ou melhor, essa diferença, por si, não fomenta regimes ditatoriais em países democráticos onde o processo laicizatório ainda está longe de ter relegado completamente a religião à esfera privada. O que me espanta, no entanto, é a ausência de um único voto de confiança, de algum tipo de otimismo, de uma ideia, de um comentário que possa misturar precaução, sim, necessária, com alguma esperança, mais necessária ainda. Nada disso. Árabes e democracia são valores incompatíveis. Ressalto que escrevo “árabes”, não “muçulmanos”: a eles pouco importa a confissão. Pouco importa a presença católica nos protestos do Egito, pouco importa a proteção católica em torno dos mu- çulmanos para que eles pudessem fazer suas preces: é árabe, é despótico. Quase tão certo como a matemática, invenção de nossos bárbaros atuais. Acaso retruco que após todo o embate, todo o sucesso dos movimentos, devemos emitir esse voto de confiança, de que uma sociedade nova surge, e o que surge sempre pode ser melhor. Ou não. Mas pode ser, e é nisso que cada protestante acredita, e é essa possibilidade que cada um de meus amigos afasta com a cabeça, olhando-me com descrédito: a ingênua latino-americana. Mal sabe ela que os árabes sempre serão árabes. É irreversível. Toda revolução será o Irã. Toda a democracia será a Sharia. Alguns povos são incompatíveis à ideia de processo democrático. Agora, democrática e xenofóbica, essa mesma Europa, reconfigurada, sobrevivente de Auschwitz, refugiada dos Bálcãs, encerra o assunto: a democracia é parte natural e fundadora de sua história. Ela pertence aos europeus, e a eles está destinada. Ah, sim, aos norte-americanos também, mas o norte-americano é apenas um ex-europeu. OPINIÃO Brasil: um país do futuro do pretérito • BRAYNER ROGÉRIO TAVARES ARAÚJO Acadêmico do 1º ano noite O passado está tão longe assim? (será?). Programa do Fantástico, dia 13 de março de 2011. Duas reportagens sobre temas, infelizmente, do cotidiano dos noticiários nos transportam para uma reflexão sobre o nosso país. Somos responsáveis! A primeira apresentou um verdadeiro “show” de corrupção que algumas prefeituras do país (seriam a maioria?) fazem para contratação de empresas especializadas no estudo de necessidade e instalação de lombadas eletrônicas. Numa jogatina criminosa essas prefeituras “negociam” o direcionamento dos editais de prestação de serviço e, em troca, tais empresas (ou seriam quadrilhas...) “ofertam” suas benesses em forma de comissão para esses cânceres municipais. A segunda trouxe um tema não menos “metrópole colonial” – o turismo do sexo. Mulheres adultas e adolescentes que deveriam estar nos bancos escolares não somente majorando números de IDH, mas estudando para tentar mudar suas realidades, perambulam pelas capitais nordestinas tratando seus corpos como mercadoria de baixo valor. Alguma “novidade” nas duas reportagens? Aparentemente não! O problema vai além do óbvio. Um ponto comum, além dos indícios de crimes e desmandos, une estas duas notícias. Ambas muito bem investigadas pela imprensa! Imprensa? Isso mesmo. Cinco séculos se passaram, desde 1500, e queremos crer que o nosso país é “melhor” do que o Brasil das Sesmarias ou o Brasil do plano Bresser (será mesmo?). Temos uma constituição com mais de duas décadas e não há como negar (ou há?) certa “paz” institucional. Ótimo, mas pouco! A imprensa exerce um papel fundamental na sociedade, mas não pode e não deve ser mais competente e investigativa do que o Ministério Público Federal e dos Estados. Muito menos do que os Tribunais de Conta (ou faz de conta?). Não basta haver instituições sólidas, não apenas e tão somente isto. Precisamos de fiscalização constante e eficiente. O Estado não pode ganhar um Oscar apenas quando tributa os contribuintes ou quando os seus Senadores (ou integrantes de quadrilhas?) sobem na tribuna com seus discursos austeros e não menos abstratos. Os Ministérios públicos Federais e Estaduais, bem como os respectivos Tribunais de Conta (não nos esqueçamos das nossas polícias judiciárias) precisam ser mais efetivos na sua tarefa fim e apontarem além de prédios bonitos “regados” a mármore. Precisam investigar; antecipar os fatos e não, apenas, ser espectadores de um programa de televisão. Passamos grande parte das nossas vidas ouvindo que o Brasil é o país do futuro. Enxergamos legados do passado todos os dias! Um país que tem um Coronel, do tempo do voto de cabresto, presidindo o Congresso; um país que, em pleno 2011, ainda insiste no foro por prerrogativa de função e um país dos “Big Brother” precisa urgentemente rever sua direção e ser uma nação não do passado ou do futuro, mas do presente. E o que nós, acadêmicos desta Universidade secular temos com isto? Somos o presente! A TOGA - Abril de 2011 5 DIREITO E SOCIEDADE • ARTHUR REIS Acadêmico do 3º ano manhã • LAURA DAMO DA CRUZ Acadêmica do 2º ano manhã Assistentes e assessores do G10 / SAJU No começo do ano, e após diversos debates internos, o Grupo 9 do SAJU, focado na assistência a crianças e adolescentes, decidiu desmembrar-se em um novo grupo – o G10, voltado apenas para a assistência/assessoria a adolescentes em situação de conflito com a lei. A partir da constatação de que o G9 vinha atendendo um número muito grande de casos e da preocupação com os processos referentes a ato infracional, que demandam um acompanhamento diferente dos de família, concluiu-se que os trabalhos de ambos os grupos seriam beneficiados com a separação. Haveria mais tempo de estudo e reflexão, permitindo também um aprofundamento nas respectivas matérias. Novo grupo do SAJU atua na defesa de adolescentes acusados de ato infracional Herança do G9, o G10 tem como partida a parceria que vinha sido desenvolvida junto ao PEMSE (Programa de Execução de Medidas Sócio-Educativas em Regime Semi-Aberto), ao PIPA (Programa Interdepartamental de Práticas com Adolescentes e Jovens em Conflito com a Lei) e ao PPSC (Programa de Prestação de Serviços à Comunidade) Unidade UFRGS. Dentre os objetivos do grupo destaca-se o apoio jurídico e psicológico aos jovens cumpridores de medidas socioeducativas, realizado através de visitas às unidades de acolhimento e reuniões na sede do SAJU, com os jovens, seus pais, os assistentes/ assessores, advogados e psicólogo. A manutenção do contato com as entidades da rede também está nas prioridades do grupo. O G10, seguindo o Estatuto da Criança e do Adolescente, procura a articulação entre a sua atuação e a de outras organizações de defesa de crianças e adolescentes, objetivando sua proteção jurídica e social. Assim, suas expectativas são várias: além de manter suas parcerias institucionais, pretende aprofundar seus estudos na área do direito infracional, organizando leituras e debates; tem planos de realizar pesquisa sobre direito infracional em Porto Alegre; vai criar seu próprio blog e espera, ainda, com a participação de um estudante como bolsista, que possa trabalhar sempre no melhor aproveitamento do projeto e do grupo como um todo. Ações de manutenção compulsória Prática jurídica e função social: o direito à saúde de usuários de crack • EMÍLIO F. H. P. FREITAS Acadêmico do 4º ano de Direito da FARGS e aluno visitante da UFRGS A única diferença entre um ser humano que luta pela cura de sua saúde, e o esforço descomunal do personagem de Victor Hugo, Guilliat, em seu livro Os trabalhadores do Mar é que a segunda história é um romance, e a primeira, uma tragédia. Um caso bastante corriqueiro nas ações de antecipação de tutela relacionadas à saúde refere-se aos usuários de crack. Situação muito comum: familiares buscarem ajuda nas defensorias públicas, pois, após inúmeras tentativas de internação compulsória, somente é concretizado tal ato através da interferência do Magistrado de 1º grau. Geralmente, a luta das famílias inicia com a constatação da utilização da substância entorpecente. Enquanto o usuário não pratica pequenos ilícitos, os sintomas são somente desconfiáveis. Se o paciente já possui histórico de utilização de drogas, o que era somente uma desconfiança passa a se tornar realidade, principalmente com a ocorrência de pequenos furtos. Outro caso bastante comum são as ações de adoção iniciadas por avós, os quais descrevem endereços incertos de seus filhos, em relação aos netos que ficam para trás. Enfim, um rastro de problemas acompanha todos os relatos, comprovados com documentação, e em algumas vezes, até mesmo reportagens já veiculadas na imprensa. Após a saída do serviço social, é recomendado ao familiar esperar no próprio fórum pela decisão do Magistrado. Depois do aguardar a decisão do juiz, começa outro problema: a análise da real necessidade da internação hospitalar por parte do médico. Então, chegando ao centro clínico, o paciente passa por uma avaliação médica. Alguns são mantidos no local, sendo posteriormente transportados para um centro especializado (Parque Belém, por exemplo). Na pior das situações, o médico avalia não ser caso de internação, então, libera o paciente juntamente com o familiar. Já ocorreram casos de agressão devido a isto. Depois do período de internação (máximo 90 dias), novamente reinicia a luta dos parentes pela continuação do tratamento hospitalar e acompanhamento após alta. Logicamente, este acompanhamento é muitas vezes prejudicado pelas condições sociais dos envolvidos na demanda. Lembro que o direito à vida é garantia constitucional fundamental, elencada expressamente no caput do art. 5º da Constituição Federal. Mais que isto, a proteção à vida é o princípio fundamental que norteia todo o sistema jurídico e dá base ao próprio Estado Democrático de Direito. Uma solução a ser apresentada seria um período maior de prática jurídica. Ou seja, o aluno, estimulado pelo professor, que deverá ir a campo aplicar o ensinado em todo o ano acadêmico. Fruto desta análise teremos o resultado in loco da melhoria a ser futuramente implementada. Logicamente, inúmeros obstáculos seriam utilizados para impedir tal proposta, mas, de que forma o verdadeiro estudante/pesquisador/formador faria para modificar realidade de sua cidade/comunidade? Ou melhor, será que estamos aptos para realmente vê-la? Este é o verdadeiro estratagema: não somente aprender, mas sim, aplicar. Sem críticas aos que preferem permanecer nas torcidas, mas ideias todos temos, basta resolver os quebra-cabeças da vida e colocá-las em prática. 6 A TOGA - Abril de 2011 FACULDADE DE DIREITO Entre o orgulho e a crítica • MARIANA MEDEIROS LENZ Acadêmica do 2º ano manhã Os estudantes da “Casa do Velho André” que folhearam o jornal Zero Hora no dia 26 de janeiro de 2011, uma quarta-feira, se depararam com a foto de um lugar muito familiar, acompanhada de palavras que certamente prenderam sua atenção: “O melhor do Brasil”. Esse foi o título da reportagem publicada no jornal gaúcho a respeito do desempenho da Faculdade de Direito da UFRGS em um ranking construído com base em informações do Ministério da Educação (MEC). De acordo com a matéria, é no prédio histórico da João Pessoa que se encontra a “número 1” entre as 742 graduações em Ciências Jurídicas e Sociais avaliadas em todo o país. Reportagem sobre a Faculdade de Direito foi publicada no caderno Vestibular do jornal Zero Hora, com chamada na capa da edição A repercussão entre os alunos ocorreu instantaneamente e dividiu opiniões. Marcelo Tosin, do 2º ano diurno, fez uma leitura positiva da reportagem: “A primeira reação foi de muita satisfação e orgulho de poder fazer parte da história dessa faculdade. Surgiu também um estímulo ao aprimoramento nos estudos, e a responsabilidade em manter a tradição de excelência”, relata. Como ele, vários estudantes demonstraram contentamento – por exemplo, na rede social Facebook. Entretanto, a ausência de unanimidade foi sentida na própria internet: enquanto muitos “curtiam” e passavam adiante a notícia, não em menor número estavam aqueles que expressavam descrença de que os fatos divulgados correspondessem à realidade. Descrédito com base em estatísticas Nesse último grupo estava Marcio Cunha Filho, graduado em Direito na UFRGS no semestre passado: “O primeiro sentimento ao ler a notícia, sem dúvida alguma, é o de surpresa, seguido do de desconfiança. Me pareceu mais uma daquelas afirmações especulativas, sem muito embasamento empírico, que nós juristas tanto gostamos de fazer. Enfim, o pensamento imediato foi o de que ‘quem escreveu isso não faz ideia do que está falando’. É temerário, equivocado e precipitado sustentar que o curso de Direito da UFRGS é o melhor do país”. Marcio apoia seu descrédito nos resultados de outras avaliações, como o exame da OAB. Nossa Faculdade obteve índice de aprovação de 53,95% na terceira prova aplicada em 2009, ficando atrás, por exemplo, das Universidades Federais de Sergipe (77%), Paraíba (71%), Paraná (70%), Santa Catarina (62%) e Alagoas (54,88%), além de UnB (71%) e USP (69%). Marcio aponta também que a nota Capes da pós-graduação da Faculdade de Direito da UFRGS no triênio de 2007 a 2010 (5, em uma escala de 1 a 7) foi inferior à de universidades como Unisinos, UFPR e UFSC, entre outras, que receberam 6. Deixando os números de lado, o posicionamento também leva em conta sua experiência como aluno: “Teremos certeza de que nosso curso não é o melhor do país se pensarmos no relapso dos professores, na desatualização da biblioteca, na precariedade do espaço físico, no nosso currículo obsoleto”, enumera. Entretanto, a crítica também encontra a própria crítica. Eduardo Kowarick Halperin, do 2º ano diurno, destoa da visão de Marcio: “Até entendo que façamos uma autoavaliação interna. O que não compreendo é por que ficar se colocando para baixo o tempo todo em um momento que deveria ser de alegria. Quando divulgam uma avaliação do MEC que nos coloca em primeiro lugar, é justamente o momento de exaltar a Faculdade, de divulgar para fora o que temos de bom”. Marcelo Tosin, entre os dois extremos, adota uma posição cautelosa, fundada na experiência adquirida até então. Por estar no começo do curso, ele afirma ainda não ter muitos parâmetros de comparação, mas confiar nos critérios do MEC. “Pelo pouco que pude conhecer até agora, percebo que contamos com uma estrutura diferenciada, embora seja cedo para ter uma noção completa. Além disso, é difícil formar uma opinião quando não se conhece pessoalmente outros cursos, porque todos têm problemas”, argumenta. A lógica do podium também é questionada Afastando-se da polêmica do “ser ou não ser” o melhor do Brasil, Samuel Sganzerla, do 5º ano noturno, acredita que se deva repensar o próprio ato de listar os cursos de graduação em um ranking, como times de futebol ou cavalos de corrida. “A primeira sensação que temos ao ler a matéria é de se agradar de ver que estamos em um lugar privilegiado, reconhecido. Mas qual é a necessidade de utilizar esse rankeamento para avaliar a educação pública? O que importa mesmo é se a educação está sendo feita de forma crítica e preocupada com a sociedade”, reflete. Ele ainda levanta a dúvida: “O que será que define se uma faculdade é melhor que a outra?”. Uma pergunta que nos leva a uma seguinte: o que definiu, para o Ministério da Educação (e para Zero Hora), que a nossa Faculdade era melhor que as outras? Afinal, 1º lugar em quê? A TOGA - Abril de 2011 7 FACULDADE DE DIREITO Afinal, 1º lugar em quê? A Toga foi atrás dos quesitos que compuseram a nota dada pelo MEC às faculdades e verificou que o Direito da UFRGS teve desempenho irregular e só despontou como “o primeiro” porque obteve índices altos em variáveis às quais o cálculo dá maior peso, entre elas, número de professores com doutorado Quando rankings são divulgados com alarde em jornais, geralmente presta-se mais atenção à palavra “primeiro lugar” do que a qualquer outra. Dessa vez, não foi diferente. A discussão gerada pela reportagem de Zero Hora caminhou em torno da polêmica de sermos ou não “os melhores”, tangenciando o mais importante: afinal, que critérios nos colocaram no topo? E, indo mais além: no nosso entendimento, esses critérios são úteis para definir, em uma classificação qualitativa, os primeiros e os últimos cursos de Direito do Brasil? O 1º lugar obtido pelo Direito da UFRGS foi no Conceito Preliminar de Curso Contínuo, o CPC Contínuo, referente ao ano de 2009, mas divulgado apenas no início deste ano. O CPC é o indicador criado pelo Inep, instituto de pesquisa do Ministério da Educação, para avaliar anualmente os cursos de graduação brasileiros, em notas que vão de 1 a 5. Ele está relacionado ao Enade porque todas as variáveis utilizadas em seu cálculo são obtidas do exame: não apenas a partir do desempenho dos estudantes, mas também do questionário socioeconômico respondido pelos alunos junto com a prova. Peso de cada critério no cálculo IDD 1,5 Professores doutores 1 ENADE concluintes 0,75 ENADE ingressantes 0,75 Professores mestres 0,25 Dedicação integral/parcial 0,25 Infraestrutura 0,25 Organização didático-pedagógica 0,25 O CPC do Direito em 2009 foi de 4,09. O número, porém, quer dizer pouca coisa se não o relacionarmos com este questionamento: o quê, exatamente, avalia o CPC? As “variáveis” (ou critérios de avaliação) de é o segundo critério mais influente no cálculo do CPC, com peso quatro vezes maior do que o quesito “organização didático-pedagógica”. E isso foi determinante para a classificação que vimos divulgada em Zero Hora. Nossa nota: visão geral Ao todo, oito variáveis, oito medidas de qualidade diferentes, compõem a nota, envolvendo infraestrutura, recursos didático-pedagógicos, titulação e regime de dedicação do corpo docente, notas de ambos estudantes concluintes e ingressantes na prova do Enade, e o IDD, indicador que compara as notas dos concluintes às dos ingressantes. As variáveis têm cálculo com base em proporções e depois são transformadas em notas padronizadas de 1 a 5 (veja as notas do Direito em cada variável na figura abaixo). Uma questão de peso Entretanto, às oito medidas são atribuídos pesos diferentes; algumas contribuem mais e outras menos para a nota final (veja quadro ao lado). O número de professores com doutorado da faculda- O Direito da UFRGS oscilou de ótimos a péssimos desempenhos se considerarmos as medidas de qualidade individualmente. Em conjunto, no entanto, estamos “em 1º”, porque o cálculo do Inep valoriza mais justamente aquelas variáveis em que nosso resultado foi bom: no critério “professores doutores”, tiramos nota máxima, o que compensou o desempenho preocupante em outros aspectos. A oscilação fica evidente quando se analisa a nota relativa à organização didático-pedagógica da Faculdade de Direito. Esse índice é baseado nas respostas dos alunos a uma pergunta sobre plano de ensino no questionário que acompanha a prova do Enade. Dos 249 estudantes do nosso curso que responderam à pergunta, apenas 20% avaliaram positivamente a organização didático-pedagógica das disciplinas. Se somente essa medida fosse levada em consideração, estaríamos não em 1º lugar, mas em 921º. 5 5 4,96 Notas de 0 a 5 4,7 3,63 3,24 3,21 0,83 1º* 1º* 5º 5º 209º 599º 149º 921º Professores doutores Regime de dedicação ENADE ingressantes ENADE concluintes Professores mestres Infraestrutura IDD Didáticopedagógico Proporção de professores do curso com titulação maior ou igual a doutorado. Proporção de professores do curso com regime de dedição integral ou parcial. Nota dos alunos no início da graduação no Enade, (75% da nota na prova específica e 25% da nota na prova de formação geral). Nota dos alunos no final da graduação no Enade (75% da nota na prova específica e 25% da nota na prova de formação geral). É também a nota final do curso no Enade. Proporção de professores do curso com titulação maior ou igual a mestrado. Proporção de alunos que avaliaram positivamente, no questionário do Enade, a infraestrutura disponibilizada pelo curso. Índice que compara o desempenho real dos concluintes e o desempenho que se esperava que eles apresentassem no final da graduação, dadas as informações existentes do perfil dos ingressantes naquele curso. Proporção de alunos que avaliaram positivamente, no questionário do Enade, a organização didático-pedagógica do curso. Classificação * há mais de uma faculdade na mesma posição. Ingressantes foram melhor que concluintes? Outro dado chama atenção na figura: a nota dos ingressan- tes do Direito na UFRGS foi maior que a dos concluintes. O motivo disso fica mais claro quando analisamos individual- mente os resultados da prova que avalia a matéria de Direito e da prova de formação geral: enquanto a nota dos concluin- tes no componente específico (71, 65) ultrapassou em 10 pontos a dos ingressantes (61,46), na formação geral, que con- Os dados apresentados nesta reportagem foram obtidos por meio do sítio do INEP - inep.gov.br. Desempenho oscilante do Direito da UFRGS no CPC tém conteúdos típicos de vestibular, os ingressantes tiveram desempenho melhor: 74,58, contra 68,70 dos concluintes. 8 A TOGA - Abril de 2011 CULTURA O outro lado da rua • KÉZIA BORGES Acadêmica do 2º ano noite Programação cultural da UFRGS em abril Textos adaptados de www.difusaocultural.ufrgs.br Curioso como o Direito tem se mostrado autossuficiente. Desde a declaração de sua autonomia, conferida por Aristóteles, ele teve seu objeto definido e passou a se diferenciar da justiça, da moral e das (outras) artes. Hoje, essa separação é exacerbada (com possível exceção em relação à moral) e representa uma alienação nada incomum no âmbito jurídico; a nossa Faculdade, em diversos aspectos, demonstra bem o fenômeno. Muitos de nós, alunos da “Egrégia”, isolaram-se do restante da Universidade, e, pior, esqueceram que o Direito serve à sociedade, não a si mesmo. Apesar de estarmos fisicamente cercados por outras Faculdades (Economia, Educação e Engenharia, por exemplo), ignoramo-las a ponto de muitos nem saberem que há vida no outro lado da rua (por “vida”, entenda-se Rádio, Teatro, Cinema, Museu...). Felizmente, outros campos (e campi, com o perdão do trocadilho) não se esqueceram do Direito: hoje, dos 170 seriados Programação completa: www.difusaocultural.ufrgs.br www.portocultura.com.br Cinema NOIR: Entre sombras e cinzas Em abril, a Sala Redenção – Cinema Universitário dedica sua programação ao cinema noir. Os filmes “negros”, como eram chamados pelos críticos, geralmente eram relegados pelos grandes estúdios para as séries B, sendo exibidos na segunda parte das sessões duplas de cinema. Caracterizado pelos filmes de crimes, cenas violentas, homicídios e mulheres fatais, durante muito tempo o cinema noir enfrentou o desdém da indústria estadunidense em função do seu valor comercial. E por que a denominação francesa – film noir – se eram de língua inglesa? Na verdade, o film noir começou a aparecer na crítica francesa no período de pós-guerra mundial, com o fim da ocupação nazista, quando os franceses puderam voltar a assistir em suas telas à produção norte-americana dos últimos anos. Com isso, a nova geração de cinéfilos e críticos (muitos deles ligados ao Cahier du cinéma) dedicou-se a examinar a produção até então desconhecida na França. Dessa forma, o termo noir foi inventado pelos franceses, ávidos pelo cinema e pela cultura inglesa do momento. As XX. Na sociedade do Conferências século conhecimento, um paradigse impõe de maneira abUFRGS 2011: ma soluta; é o conhecimento que desempenha O futuro da universidade o papel mais na na sociedade do conhecimento importante configuração Com a curadoria de César Zen Vasconcellos, o ciclo propõe a discussão a respeito da transformação da compreensão sobre o papel do conhecimento na configuração e na dinâmica evolutiva dos distintos sistemas sociais. Vivemos na atualidade em um processo de construção de um novo modo de organização social, a denominada sociedade do conhecimento, ou nova economia, surgida no final do dos sistemas social, econômico e produtivo, criando novos padrões de produção e mercantilização, influindo de maneira decisiva na relação capital-trabalho e ampliando, em tese, as possibilidades para o bem-estar e para a qualidade de vida dos cidadãos. Nesse contexto, deve a universidade participar de modo efetivo da reconfiguração do sistema social e produtivo nacional e na relação influências do noir são várias: no âmbito filosófico, o existencialismo e a psicologia freudiana invadiram não apenas a literatura como também o cinema policial que nela buscava influências; no cinematográfico, claras influências do expressionismo alemão. Sendo um movimento surgido em plena depressão econômica, entre os anos 1930 e 1940, dois de seus grandes temas são o passado sombrio e o pesadelo. Seus personagens geralmente estão em fuga de algum fardo do passado, de um incidente traumático, de algum crime que cometeram em nome de uma paixão ou, simplesmente, de seus próprios demônios. Nesse sentido, a designação noir revela-se muito mais complexa e não só uma simples definição para filmes de crimes e violência como, aliás, compreenderam bem os espectadores mais contemporâneos. Veja os horários das sessões em www.difusaocultural.ufrgs.br. entre o capital e o trabalho? Deve, ainda, a universidade buscar influenciar na estrutura das exportações nacionais, tornando o País menos exportador de commodities e sim em um exportador de bens com maior valor agregado? É este também o papel da universidade? Qual deve ser a relação entre a universidade e as empresas e quais são as consequentes mudanças no comportamento do pesquisador e no modo de produção e de financiamento do conhecimento? E como ficam as áreas humanísticas nesta contextualização? Qual o papel da pesquisa e da formação de pessoas nas áreas humanísticas quando consideramos o País inserido na nova economia? As Conferências são, apesar de sua curta existência, uma tradição na Universidade, e fazem parte do calendário oficial da Reitoria. Sempre na segunda quarta-feira do mês, no início da noite, na Sala Fharion, 2º andar do Prédio da Reitoria, teremos um Professor da Universidade discutindo o futuro da universidade pública e indagando sobre o futuro do país. exibidos na “TV” por assinatura, 39 têm como protagonistas assuntos jurídicos – sem contar os que já não são exibidos, como o saudoso e insubstituível Boston Legal (“Justiça sem Limites”); entre os filmes, o universo é ainda mais amplo, já que as situações “juridicamente relevantes” são inúmeras: Doze Homens e uma Sentença, de Sidey Lumet, O vento será tua herança, de Stanley Kramer e O Processo, de Orson Welles, contêm bons e clássicos exemplos. O último, aliás, demonstra a possibilidade de comunicação com outra área: a Literatura. Essa obra, baseada no romance homônimo de Kafka, aborda expressamente temas jurídicos, assim como os imortais O Mercador de Veneza, de Shakespeare, e Crime e Castigo, de Dostoiévski. O ser humano, mesmo o que estuda ou opera o Direito, é complexo e deve ser visto como um todo – ainda que ele se esqueça disso. Essa pequena coluna é um lembrete de que há muito mais do que esta Faculdade, Tribunais e escritórios de advocacia “lá fora”; para ver, na prática, esse fato, experimente dar um pequeno passo (até o outro lado da rua, por exemplo) e desaliene-se. A sociedade agradece. Projeto OSPA/UFRGS A OSPA realiza dois concertos em abril no Salão de Atos da UFRGS. Nos dias 17 e 26 de abril, a Orquestra Sinfônica de Porto Alegre (OSPA) apresenta respectivamente o 1º Concerto para a Juventude, às 11h, e o 1º Concerto Didático no Salão, às 10h e às 20h30, no Salão de Atos da Reitoria da UFRGS. Os eventos antecedem a abertura oficial da temporada prevista para maio. Teatro Noite de Walpurgis: Todo segredo asfixiado procura ar na escuridão. Toda prisão tem um subterrâneo de liberdade por onde se esgueiram o proibido e o possível, o medo e o desejo, o real e o imaginário, o amor, o ódio, a loucura. Em espelho. Em choque. Em celebração. Em comunhão: cúmplices e adversárias, duas carnes percorridas pelo mesmo sangue constroem as regras de um exercício para a morte. De 06 a 27 de abril, às quartas-feiras (12h30min e 19h30min), Sala Qorpo Santo (Campus Central). Entrada franca. A TOGA - Abril de 2011 9 RESENHA • LUCAS DO NASCIMENTO Acadêmico do 5º ano manhã e Coordenador Geral Discente do Círculo Universitário de Integração e Cultura (CUIC/UFRGS) Antígona, de Sófocles, suscita acirrados debates há séculos. Somente nos últimos dois, produziram-se dezenas, se não centenas de abordagens sobre a tragédia. Representada pela primeira vez em 441 a.C., em Atenas, a obra nasceu sob os auspícios da genialidade sofocleana, recebendo efusivo acolhimento na polis ateniense. Contudo, apenas destacou-se nas discussões jurídicas modernas por meio de Hegel. A abordagem, ainda hoje realizada, que sublinha o conflito entre direito natural e direito positivo em Antígona remonta à mudança de leitura efetuada pelo filósofo alemão, que estabeleceu novos cânones para a interpretação da obra. Não fossem contribuições intelectuais como as de Kathrin Rosenfield e traduções como a de Lawrence Flores Pereira, arriscaríamos, no Brasil, a permanecer limitados a uma compreensão excessivamente alegórica da tragédia, simplificando sua complexidade em um conflito entre poucos e pobres elementos abstratos, isto é, os de direito natural e de direito positivo. Na edição de Antígona da qual por ora se trata, o tradutor e a comentarista norteiam o seu trabalho na leitura realizada pelo poeta Hölderlin, expoente do romantismo alemão. Contudo, servem-se também de outras edições consagradas sobre a tragédia (Jebb, Mazon, Schadewaldt, Reinhardt, Dawe, Bollack e Loraux), colocando-a em debate sob diferentes pontos de vista. Como se não bastasse a qualidade das fontes, acertam na metodologia: com vistas às ambiguidades e nuances do texto grego, os autores preocupam-se com o desbravamento de seu “subtexto”, ou seja, da riqueza e complexidade que afloram “da superfície aparentemente equilibrada e racional da poesia sofocleana” (p. 10). Não é por outro motivo que, atentos ao que há de trágico na tragédia, ao sutil e poético da experiência de vida humana, conseguem retirar do estudo importantes e originais resultados. Vejamos o contexto visualizado pelos autores, a partir do qual se desenvolverão Antígona para além do Direito Natural Edição indispensável aos estudiosos da tragédia sofocleana os grandes e pequenos conflitos nesta edição de Antígona, garantindo sua originalidade. Antígona pertence à linhagem dos Labdácidas, ou seja, à linhagem dos reis de Tebas. Em Édipo Rei, Laio, seu avô e rei de Tebas, é morto por seu pai, Édipo, que casa com sua mãe, Jocasta, tornando-se o novo rei da cidade. Em outras palavras, Édipo mata o próprio pai sem o saber, se une com sua própria mãe, também sem conhecimento do parentesco, e gera filhos dessa união, isto é, Antígona, Polinices, Etéocles e Ismene. Portanto, Antígona nasce de um incesto, sendo ao mesmo tempo irmã e filha de Édipo, assassino de seu avô. Dessa maneira, instaura-se não apenas uma problemática de cunho religioso (poluição de Tebas pelo destino de seus dirigentes), mas também familiar (genealógica) e dinástica (política) mais ampla. Em razão de tais fatores, a desgraça e a morte se abatem sobre Édipo e sobre Jocasta.1 Os dois irmãos de Antígona entram, então, em um acordo sobre se revezarem em períodos de um ano no trono de Tebas. No entanto, Etéocles desrespeita o pacto e não passa ao irmão o trono da cidade no período acordado, o que leva Polinices a aliar-se à polis de Argos, a fim de submeter Etéocles à força. Dessa forma, os irmãos digladiam-se pelo trono de Tebas, a ponto de por pouco não levarem a cidade à ruína. Os dois acabam por matar um ao outro, fratricidas e suicidas, pelo sangue derramado ser o do irmão ao mesmo tempo que o próprio. Cometem, portanto, dupla transgressão, em ameaça redobrada ao solo pátrio.2 Quem salva Tebas é Creonte, descendente de Meneceu e Oclaso e, portanto, pertencente a uma linhagem de conselheiros reais e de regentes. Para isso, sacrifica seu filho Megareu, “coroando gloriosamente seus serviços meritórios” (p. 13-14) à cidade. Contudo, por maiores que tenham sido seus esforços, vê Tebas e suas pretensões à realeza ameaçadas pelos Labdácidas, linhagem em desgraça que permanece viva e em Tebas sob as figuras de Antígona e de Ismene. Uma das maiores virtudes desta edição de Antígona é manter sempre em vista o contexto no qual se desenvolve a obra, ou seja, em que ambiente se insere a interdição de Creonte em relação ao enterro de Polinices e a desobediência de Antígona para com Creonte. Antígona não só é a viva personificação de uma amaldiçoada linhagem de reis, como é mulher e tem direitos em relação ao trono. Lembra Kathrin que na época em que a peça Antígona foi apresentada, existia em Atenas a instituição do epiklerado, “que garantia à filha de um rei morto sem descendência o direito e o dever de parir um descendente para seu pai” (p. 16). Além do mais, Antígona é uma ameaça não passiva, já que rebelde aos intentos de Creonte. Enquanto isso e por outro lado, Creonte é o instrumento de uma ordem que se julga necessária frente ao caos. Procura ele afirmar o seu poder na arruinada cidade que salvara, o que faz entendendo proteger Tebas daqueles que a desgraçaram, a linhagem dos Labdácidas. Como se percebe, a tragédia está longe de limitar-se ao embate dicotômico entre direito natural e direito positivo. É nesse sentido que Kathrin identifica não um, mas três grandes conflitos em Antígona: o enterro de Polinices; o governo de Tebas; e a purificação da cidade. Com grande conhecimento sobre as práticas do mundo antigo, os autores desenvolvem esses pro- ANTÍGONA Sófocles Tradução: Lawrence Flores Pereira Introdução e notas: Kathrin Holzermayr Rosenfield TOPBOOKS 208 p., R$32,00 blemas e outros mais deles decorrentes. Surpreendentemente, conciliam o aparentemente inconciliável, isto é, o espírito científico e o rigor metodológico com a riqueza artística, em uma tradução produzida para a encenação de Antígona no palco.3 É dessa forma que os autores, de maneira ímpar, tornam esta uma edição essencial para aqueles que, em língua portuguesa, adentrarem no complexo universo da mais conhecida tragédia de Sófocles. Notas O destino de Édipo e o de Jocasta encontram-se narrados nas obras Édipo Rei e Édipo em Colono, ambas de Sófocles. 1 Os episódios da guerra entre Etéocles e Polinices estão na tragédia Os sete contra Tebas, de Ésquilo. 2 Inclusive, Luciano Alabarse e seu elenco inspiraram-se nesta edição para, em parceria com Kathrin, Lawrence, além de atores, músicos, bailarinos e cantores, apresentarem Antígona nos palcos de Porto Alegre nos anos de 2004 e 2005. 3 A TOGA - Abril de 2011 10 VIDA ACADÊMICA/OPINIÃO Escritório X Órgão público Onde é melhor estagiar? • RODRIGO FÜHR DE OLIVEIRA Acadêmico do 2º ano manhã Muito se fala e se ouve sobre as diferenças entre o estágio em escritório de advocacia e o estágio em órgão público, e, em geral, a conclusão é taxativa: o público é melhor. Mas será que a etiqueta é verdadeira em todos os casos? Tive a oportunidade de começar um estágio logo no início do primeiro ano de faculdade, no escritório Garrastazu, Gomes Ferreira & Advogados Associados. Muitos colegas advertiram: “te liga, tu vai ser office-boy (e vai ter que servir cafezinho)”. Realmente, pelos relatos de que tinha conhecimento, esse tipo de atividade era basicamente de leva-e-traz de processos do fórum ao escritório. Ocorre que, diferentemente do que imaginava, fui designado à área cível, trabalhando ao lado dos advogados na elaboração de todos os tipos de peças processuais, muito embora ainda não fizesse ideia do que significavam “embargos declaratórios” ou “agravo de instrumento”. A carga diária de trabalho era bastante grande, de modo que o aprendizado teve que ser rápido. Tive a sorte, ainda, de contar com excelentes profissionais, sempre dispostos a esclarecer dúvidas (muitas vezes idiotas, admito), e que me deram verdadeiras aulas, tanto de direito material como de direito processual. Notei que em pouco tempo já conseguia me virar razoavelmente bem na elaboração de peças, e aos poucos me foi sendo dada a chance de participar em casos importantes, como, para citar um exemplo, o de um cliente contra uma grande empresa jornalística, que envolvia a publicação não autorizada, na contracapa, de uma foto e, portanto, direitos autorais, de propriedade material e de propriedade intelectual. Durante boa parte do ano, o estágio foi minha maior fonte de entusiasmo com o Direito, mesmo porque era unicamente ali que eu podia ter contato com a prática, aspecto mal tangenciado nas primeiras cadeiras da faculdade. Passados nove meses, porém, aquele êxtase inicial foi diminuindo, e atribuo esse desânimo a três fatores principais: (1) as ações do escritório eram massificadas, o que tornava o assunto bastante repetitivo; (2) não pensava em estagiar mais de um ano no mesmo local, pois queria conhecer outras áreas; e (3) já era dezembro, e calor e trabalho combinam muito menos do que calor e praia. Saí do escritório no final do ano passado, avaliando ter tido ali uma excelente experiência. Surgiu então a chance de estagiar na Promotoria de Justiça de Defesa do Meio Ambiente. O trabalho só começaria em março – para desespero da minha mãe, que já achava vagabundagem eu não estar trabalhando em janeiro e fevereiro. Agarrei a oportunidade, claro. Se o estágio em escritório já tinha sido bom, imaginei como não seria em órgão público! Não posso omitir que a remuneração, mais recheada, me impediu de maiores hesitações. Não que o dinheiro seja prioridade, pelo contrário, deve-se sempre colocar o aprendizado em primeiro lugar. Mas duvido que alguém negue sua importância. Ingressei, portanto, há pouco mais de um mês, no Ministério Público, com direito a crachá, registro de ponto obrigatório e todas as demais regalias inerentes aos estagiários dali. A quantidade de trabalho é bem menor que no escritório, sem sombra de dúvida. Consequência direta disso é mais tempo para estudar para a faculdade, conversar, tomar chimarrão... A matéria trabalhada, contudo, é bastante diversificada, não sendo exagero afirmar que, nesse pouco tempo, já tive contato com mais assuntos do que nos nove meses de escritório. Me surpreendi ao ver que o Direito Ambiental não cuida tão-somente da natureza – assim compreendida como as florestas, as cachoeiras, as praias –, mas também do ambiente urbano, de trabalho e cultural. Os assuntos se multiplicam e fascinam não só a mim como a todos os estagiários da Promotoria. Se antes eu trabalhava ao lado de advogados, espacialmente falando, agora meu lugar é na sala dos estagiários. Meus colegas são estudantes, assim como eu, e também têm dúvidas frequentes, muitas delas sem possibilidade de sanação nos limites físicos da nossa sala. O que antes era explicado instantaneamente pelos advogados, agora tem que ser eximido com o promotor. O problema é que ele nem sempre está disponível, por conta principalmente de audiências, o que acaba retardando o processo de aprendizagem. Mesmo assim, o que parece um contra, pode se transformar em pró: o trabalho de pesquisa autônoma é obrigado a se desenvolver, sendo, pelo menos para mim, o método que melhor cimenta o conhecimento. Não me arriscaria, ao menos por enquanto, a dar um veredicto e dizer qual dos tipos de estágio é melhor. Ambos têm pontos positivos e negativos. Não descuido, entretanto, que minha avaliação foi feita exclusivamente em cima das minhas próprias e limitadas experiências e que, em relação ao estágio em escritório, tive muita sorte de não ser designado para atividade de office-boy. O que posso dizer é: no escritório é necessário desenvolver uma alta capacidade de produção e aprender rápido, mas, dependendo do tipo de estratégia comercial da sociedade – no caso ações em massa –, não há mais muito para se aprender depois de um tempo. Em órgão público é diferente: como não se escolhe a matéria com a qual se vai trabalhar, os assuntos são diversificados, muitas vezes surpreendentes, o que faz aguçar a curiosidade. Em contraponto, não se tem um contato tão direto com os profissionais que podem dar auxílio na hora da dúvida. Certo é que, independente de público ou privado, cada estágio é diferente. A avaliação de qual é melhor ou pior vai divergir não só pelo tipo de atividade desenvolvida, como pelo tipo do estagiário. Aqui vai muito da afinidade de cada um com a matéria trabalhada e das relações travadas com os demais servidores do local. Só me arriscaria no seguinte (mas não por experiência própria): entre os dois estágios, o pior é aquele em que tu serve cafezinho. A TOGA - Abril de 2011 11 ESPORTES Campeão novamente Enquanto os times começam a se organizar para a Copa do Direito 2011, revivemos grandes momentos do último Direitão • RAFAEL XAVIER - “TAGA” Acadêmico do 3º ano manhã Mais uma vitória do La Barca. Este foi o resultado do Direitão 2010, torneio que contou com um formato inédito com oito times. A superioridade do La Barca deu-se desde o início – além ter se mantido na liderança primeira rodada, venceu com autoridade as partidas da semifinal e impôs derrota de 5x1 ao renovado Estudiantes de Derecho, na grande final. O Estudiantes, vice-campeão, fez belíssima campanha. Bateu o Diretoria nas semifinais em uma partida eletrizante (que vem se consolidando como um dos clássicos jurídicos) e contou com reforços de polêmicos, recém-chegados do exterior para a final – Deco e Feijó. Os dois ousados do Velho Continente não lograram parar, porém, “o homem” do La Barca – Romano – que, com dezesseis gols na fase classificatória e papel decisivo nas finais, foi o grande destaque do campeonato. A Toga teve a honra de conversar em tom informal com Romano: A TOGA: Qual o jogo mais emocionante da competição de 2010? ROMANO SCAPIN: Não consegui assistir a muitos jogos, porque os horários, na maioria das rodadas, ficaram em dias diferentes. Daqueles que presenciei, o jogo mais emocionante foi entre o Estudiantes e o time de bixos da manhã, no fim da fase classificatória, em que o time mais novo ganhava até o finalzinho, mas o Estudiantes, no “abafa”, conseguiu virar e garantir classificação para a fase do mata-mata. Das “peleias” do La Barca no campeonato passado, lembro de uma baita partida que fizemos contra o Diretoria, na fase classificatória, num dia de muita chuva; e da final, quando enfrentamos o Estudiantes e, apesar do placar elástico, não foi tão “chocolate” quanto alguns pensam. Foi um grande jogo, digno de um clássico que vem decidindo os campeonatos do Direito nos últimos anos. A TOGA: Qual o papel do Direitão e das competições esportivas da faculdade? ROMANO: Nossa turma de faculdade (formados em 2009) é muito unida, e os Direitões e Copas do Direito contribuíram muito para isso – principalmente em relação à nossa “gurizada” do La Barca. As atividades esportivas, em especial, para mim, o futebol, são responsáveis por formar grandes amizades e o CAAR cumpre muito bem sua função integradora ao promover esses campeonatos em que jogam alunos e ex-alunos. Aliás, queríamos, por meio de competições esportivas, estimular a integração não só entre os alunos do Direito, mas também com alunos de outras faculdades. Foi o que aconteceu quando organizamos o “Medicina Legal” em 2007, quando equipes formadas por alunos do Direito, enfrentaram equipes das Medicinas da UFRGS, UFCSPA e Ulbra. Houve uma demonstração de identificação dos futuros bacharéis com a faculdade de Direito: não queríamos perder para os “açougueiros de avental” para honrar “nossa facul”! O Direitão e a Copa do Direito vão no mesmo sentido de integração e proporcionam que novas amizades sejam criadas e que as já existentes se fortaleçam mais ainda. Por isso, minha “dica” aos mais novos é que não deixem de ter seu time da turma (ou de sua gurizada) e que joguem os campeonatos do Direito! Isso é único e inesquecível na passagem pela facul... A TOGA: Quais as perspectivas do La Barca para 2011? ROMANO: Nosso objetivo principal, com os jogos da Copa e do Di- reitão, é ter um motivo certo para nos reencontrarmos frequentemente. Depois da faculdade, a vida pessoal de cada um do La Barca não permite que consigamos nos encontrar muito. O futebol semanal é e será a principal e mais fácil causa para nos reunirmos. Além do reencontro entre nós, pretendemos reencontrar (e “encontrar” os que ainda não conhece- Jogadores do La Barca, depois da final contra o Estudiantes de Derecho, exibem o trófeu do Direitão 2010 mos) o pessoal já formado de outras turmas, os formandos e todos aqueles que participam/participarão do Direitão. A perspectiva secundária (mas que também consideramos muito importante) é “defender” os títulos da Copa do Direito e do Direitão, buscando os “tris” das duas competições. A TOGA: O que deve melhorar para as competições de 2011? ROMANO: Acho que mais times deveriam participar das competições. Há pouco tempo, tínhamos 12 times jogando os campeonatos, hoje reunimos 8 ou 9 times (e alguns “capengas”, não sendo raro o W.O.). Portanto, a “vontade” dos alunos (principalmente dos mais novos, já que os times dos bixos não têm firmado dois anos seguidos) deve melhorar. Para melhorarmos, o CAAR tem papel fundamental: se tivermos um campeonato bem organizadinho, com jogos em horários bons, com 4 ou 5 jogos por rodada (porque, assim, é possível assistir aos outros jogos, conversar com a gurizada entre os jogos), com uma premiação “atraente” (e entregue tempestivamente) e, ainda, com o menor custo possível, tenho certeza de que a gurizada se motivará a jogar as “peleias” do Direito. “...minha “dica” aos mais novos é que não deixem de ter seu time da turma (ou de sua gurizada) e que joguem os campeonatos do Direito! Isso é único e inesquecível na passagem pela facul...” A TOGA: Quem é o melhor jogador da Casa do Velho André? ROMANO: É difícil apontar o melhor jogador. Dos que já saíram da Casa do Velho André, eu citaria o Cassius e o Eduardo Melo (Papito) do Chubergs, o Eduardo Rihl, meu companheiro do La Barca, e o Otávio “Juca” (do Diretoria). No gol, o Rodrigo Papaléo (La Barca) ganha a maioria dos prêmios como goleiro menos vazado e isso demonstra, por si só, que ele é o melhor na posição (pelo menos que eu conheço) da Casa do Velho André. Dos que ainda estão na faculdade, acho que, dos que eu conheço, o Castel, o Feijó (ambos do Estudiantes) e o Deda (do Johnnie Lawyer) se destacam. Tem um meio-campo do 2º ano noite que é bom de bola, outro, do 3M, que parece o Rosembrick, que também joga bem e uns zagueiros mais novos que têm sido difíceis de enfrentar. Os olheiros do La Barca, aliás, estão de olho nesses atletas mais novos porque nosso plantel, em pouco tempo, precisará de uma renovação em virtude da aposentadoria de alguns de seus atletas... DIREITÃO 2010: Inscrição por time: R$647,00 32 Jogos 8 Equipes em formato todos contra todos. Os quatro primeiros avançam às semifinais. Placar da Grande Final: Estudiantes 2 x 5 La Barca Copa do Direito 2011: previsão de início em maio Direitão 2011: previsão de início em setembro 12 A TOGA - Abril de 2011 I Saarau do CAAR discute Chico Buarque • MARIANA MEDEIROS LENZ Acadêmica do 2º ano manhã POESIA, uma vez ao dia Soneto da morbidez almática • EDUARDO GEORJÃO FERNANDES Acadêmico do 5º ano manhã No peito sinto a expressão do desamor: Teus olhos mentem, despistam o infinito. Inquieto, dissolvo-me em qualquer labor; Pois sei: em silêncio, sufocas meu grito. Se algum dia sequer fôssemos amantes, Seria eu salvo, prisioneiro liberto. Mas só vejo teus lábios frios, distantes, Rio que já nasce seco, mero deserto. No entanto, gera frutos tão árduo penar. E a ti trago no peito, doce ferida, Sangue que corre e da morte produz vida. Alunos assistiram no Salão Nobre à palestra do Professor de Literatura Fernando Brum, que comentou detalhes sobre a obra de Chico Buarque Música, integração e portas abertas a outros cursos marcam estreia de proposta idealizada pela Secretaria de Cultura Era uma sexta-feira à noite qualquer, mas a Faculdade de Direito vivia um clima diferente. No dia 8 de abril, o Salão Nobre estava cheio em horário de aula, e a sede do Centro Acadêmico se transformou em uma espécie de botequim, atraindo caras novas – estudantes não apenas do Direito, mas de cursos como Moda, Artes Visuais e História. O causador da mudança foi a primeira edição do Saarau do CAAR, que se insere no projeto do Centro Acadêmico de promover o diálogo do Direito com outras ciências humanas, por meio da discussão de temas como literatura, música ou política. Com a temática “Chico Buarque”, o I Saarau trouxe o Professor de Literatura Fernando Brum para uma exposição sobre a obra do músico brasileiro, em que foram abordadas canções como Beatriz, Construção, Jorge Maravilha, Futuros Amantes e Até o fim. Sobre esta última, Brum destacou que a letra é inspirada no Poema de Sete Faces, de Carlos Drummond de Andrade, em que este afirma ter nascido para ser torto, “esquerdo” (gauche) na vida. Em sua versão, Chico Buarque incorporou o sentido das palavras à melodia: durante toda a música, os primeiros versos de uma estrofe são mais compridos, e os segundos, mais curtos, e o som resultante imita alguém que manca, que é torto. Logo após a palestra, os estudantes se reuniram no CAAR para um momento de integração. A cerveja formou um par perfeito com os acordes do Grupo Roda Viva, que há 7 anos toca os sucessos de Chico em pubs de Porto Alegre. João e Maria e A Rosa, entre outras, tiveram o acompanhamento dos alunos, que fecharam a semana – e o Saarau – em rodinhas de conversa no estacionamento da Faculdade. Ora, por que perder-nos em promessas vãs? Se nossas almas nasceram para o encontro, Deixemos que elas morram puras, como irmãs. Correspondência • ARTHUR P. BEDIN Acadêmico do 4º ano manhã Amiga minha, eu rogo, não cantes A intangível angústia dos amantes A imensa solidão dos ausentes As tuas alegrias descontentes Amiga, antes tristeza que falsa alegria Queira-se uma verdadeira melancolia Uma sangria vermelha e desatada Antes que a boca fria da mascarada É a vida, um turbilhão de desencontro E é preciso coragem e estar sempre pronto Para achar qualquer luz na selva escura Abrir no peito o coração, e rasgar a armadura Também é preciso uma infinita paciência Esperar o tempo e suportar a ausência Do amor, que errou de veia e anda perdido E imaginar olhares, e sussurros no ouvido Por ora, te dou meus braços e meu profundo, Indizível e oceânico sentimento de mundo Junto ao meu desassossego permanente Para que na tua busca eu esteja presente E se até a hora fatal, só encontrares dores Eu estendo-te essa mão que é minha Assim como eu ofereço a última linha Aos últimos dos sonhadores Grupo Roda Viva, em participação especial, modificou o ambiente da sede do CAAR Próximo A To g a JUNHO [email protected]