Considerações
sobre a indústria
do etanol do
Brasil
Márcia Azanha Ferraz Dias de Moraes1
A experiência brasileira da produção e uso
do álcool combustível: o Proálcool
E
m novembro de 1975, por meio do Decreto nº 76.595, o
Presidente Ernesto Geisel criou o Proálcool, um programa de incentivo à produção do álcool combustível visando
a alternativas para enfrentar a crise do petróleo que ameaçava as economias mundiais importadoras do produto. Esse
Programa alterou significativamente o perfil da produção de
açúcar e álcool do Brasil e estimulou aumento importante da
área plantada de cana-de-açúcar.
Em relação ao processo de implementação do Programa,
devem ser destacadas duas fases: a primeira iniciou-se com a
promulgação do Decreto-Lei nº 76.593, de novembro de 1975,
e estendeu-se até 1978. Essa etapa corresponde ao uso da
mistura álcool-gasolina, à implantação das destilarias anexas
e ao envolvimento da indústria automotiva para a produção
de carros a álcool. A segunda fase, iniciada em 1979, e que
atingiu seu ápice em 1985, é a da produção em larga escala
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
1
Profª Doutora
do Departamento
de Economia,
Administração
e Sociologia da
Escola Superior
de Agricultura
“Luiz de Queiroz”
– Universidade de
São Paulo. E-mail:
mafdmora@esalq.
usp.br
| 137
Divulgação/Unica
do álcool hidratado, para ser usado em carros movidos exclusivamente com esse combustível.
Desde a criação do Proálcool, em 1975, aos dias
Desde a criação do atuais, a produção brasileira de álcool passou de
Proálcool, em 1975, aproximadamente 555 milhões de litros para 17,7
aos dias atuais, a
bilhões de litros, o que significa um crescimento
produção brasileira
médio anual de 11,8%. Contudo, as taxas de crescimento são distintas durante o tempo. Entre as
de álcool obteve um
safras 1975/76 e 1978/79, a produção de álcool crescimento médio
passou de 560 milhões de litros para 2,49 bilhões
anual de 11,8%.
de litros. Nota-se uma aceleração do crescimento
a partir da segunda fase do Proálcool (safra 1979/80) até o
auge do Programa, em 1985/86. Nesse período a produção
passou de 3,39 bilhões de litros para 11,8 bilhões de litros,
o que representa uma taxa geométrica média anual de cres-
138 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
cimento de 23%. Destaca-se que o crescimento maior foi na
Região Centro-Sul.
A evolução da produção de álcool no Brasil a partir do
lançamento do Proálcool pode ser vista na Figura 1.
Figura 1. Evolução da produção brasileira de álcool
- 1975/76 a 2006/07
20.000
18.000
16.000
14.000
12.000
10.000
8.000
6.000
4.000
2.000
1975/76
1976/77
1977/78
1978/79
1979/80
1980/81
1981/82
1982/83
1983/84
1984/85
1985/86
1986/87
1987/88
1988/89
1989/90
1990/91
1991/92
1992/93
1993/94
1994/95
1995/96
1996/97
1997/98
1998/99
1999/00
2000/01
2001/02
2002/03
2003/04
2004/05
2005/06
2006/07
0
Norte-Nordeste
Centro-Sul
Fonte: elaborada
a partir de Moraes
A partir do auge do Programa, em 1985, surge um período
de estabilidade da produção ao redor de 12 bilhões de litros,
que se estende até meados da década de 1990. Em 1986,
diversos fatores contribuíram para que se iniciasse uma fase
de avaliação do Programa pelo Governo. Conforme Santos
(1993), desde janeiro daquele ano os preços internacionais do
(2000) e UNICA.
Existem duas regiões produtoras no Brasil, diferenciadas pelo período da
safra. Os seguintes estados fazem parte da Região Norte-Nordeste: Alagoas,
Bahia, Ceará, Maranhão, Pará, Paraíba, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do
Norte, Sergipe e Tocantins. Da região Centro-Sul: São Paulo, Paraná, Minas
Gerais, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio de Janeiro, Espírito Santo
e Rio Grande do Sul e Santa Catarina.
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 139
petróleo começaram a declinar; a produção interna crescente
desse produto diminuía a dependência do País em relação
ao petróleo importado; e os planos econômicos do Governo
priorizavam o controle da inflação e do déficit público, evidenciando que a expansão do Programa deveria ser feita por
meio do aumento da produtividade das atividades agrícolas
e industrial, já que os financiamentos governamentais para a
ampliação da capacidade instalada estavam suspensos.
Do lado da demanda, em 1989 e 1990, houve duas crises
de abastecimento de álcool, que marcaram profundamente
os consumidores de carros movidos com esse combustível,
levando à queda nas vendas e à rejeição a esse produto,
tendência que só se inverte com o lançamento dos carros
bicombustíveis ou flex-fuel, em 2003.
A partir da safra 1998/99, observa-se uma queda na produção de álcool, que pode ser explicada pela desregulamentação do setor, com conseqüente finalização dos incentivos
à produção, e pela queda acentuada na demanda dos carros
a álcool, que por sua vez reduziu o consumo do próprio álcool hidratado. A redução da intervenção estatal no setor,
em 1999, coincidiu com uma grave crise de super oferta do
produto, quando os níveis de preço do álcool atingiram patamares mais baixos inclusive que os custos de produção,
instalando-se grave crise no setor. Nesse período ocorreu o
O carro bicombustível é um veículo cujo motor admite a utilização de álcool
hidratado ou de gasolina, em qualquer proporção: desde 100% álcool até
100% gasolina, sendo que o consumidor pode fazer a escolha em função dos
preços relativos entre os dois produtos, ou conforme a disponibilidade dos
mesmos. A primeira montadora a lançar o carro bicombustível foi a Volkswagen, com o Gol.
Ver Moraes, M.A.F.D. (2000). A desregulamentração do setor sucroalcooleiro
do Brasil.
140 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
Divulgação/Unica
fechamento de várias usinas e a adequação da oferta à demanda do mercado. Contudo, a partir de 2002, observa-se o início da retomada
da produção e venda de álcool. Nesse período, a questão ambiental começava a preocupar diversos países, fortalecendo a
produção de álcool combustível, considerado um “combustível limpo”. O uso de combustíveis oxigenados - com o objetivo de reduzir a emissão de CO2 - passou a ser uma tendência
nos países desenvolvidos a partir de meados de 1990.
Também em 2003, houve o lançamento dos carros flex-fuel
no Brasil, que não só causou aumento do consumo de álcool
hidratado, mas também foi muito importante para a retomada do crescimento da sua produção. O consumidor aderiu ao
novo produto, que possibilita o uso de qualquer proporção
entre álcool e gasolina.
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 141
Banco de Imagens Petrobras/Rogério Reis
Incentivos de mercado: os carros flex-fuel
e o mercado internacional de álcool
É interessante notar que, desde o início do Proálcool, os
consumidores reagem imediatamente às políticas de incentivo e desincentivo ao Programa e aos preços relativos entre
álcool hidratado e gasolina. Isso faz com que as tendências
nas vendas de carros movidos com os diferentes combustíveis
se revertam em poucos meses. Ressalta-se, portanto, a importância do consumidor no sucesso do Proálcool e, nos anos
recentes, no crescimento do mercado de carros flex-fuel. A
Figura 2 apresenta a evolução das vendas de carros a álcool,
a gasolina, e, a partir de 2003, dos carros bicombustíveis.
142 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
Figura2. Evolução das vendas de carros a álcool e a
gasolina
1.800.000
1.600.000
1.400.000
1.200.000
1.000.000
Gasolina
800.000
Álcool
600.000
Flex-fuel
400.000
200.000
Fonte: elaborado a
2005
2003
2001
1999
1997
1995
1993
1991
1989
1987
1985
1983
1981
1979
0
partir de dados da
Anfavea.
Observam-se mudanças importantes ao longo do tempo.
Desde 1979 até 1986, as vendas de carros a álcool, de forma
geral, apresentam crescimento. Ao término de 1982, o mercado de carros a álcool estava superaquecido, representando
38% das vendas totais de carros de passageiros, sendo que
em dezembro esse percentual chegou a 67%. Entre os anos de
1983 e 1989, as vendas de veículos a álcool representavam,
em média, 90% das vendas totais de automóveis.
A partir de 1989, provavelmente devido à grave crise ocasionada pela falta do álcool ocorrido nessa época, a participação das vendas de carros a álcool começou a diminuir
e, em 1990, a porcentagem de vendas desses veículos em
relação ao total representava apenas 11%. Em 1995, esta
porcentagem passou a somente 2,2% das vendas totais, sendo que, em 2000, chegou a aproximadamente 1%.
Conforme salientado anteriormente, em 2003 ocorreram
duas importantes alterações no agronegócio da cana-de-açúcar, que alteraram significativamente as perspectivas de de-
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 143
manda pelo álcool combustível no médio prazo: a primeira foi
o lançamento do carro bicombustível (flex-fuel), a segunda
foi o desenvolvimento do mercado externo para o álcool.
É importante observar que o veículo flex-fuel dá ao consumidor o direito de escolher o combustível que quer utilizar,
considerando-se questões de eficiência (potência, consumo)
e de preços relativos entre álcool hidratado e gasolina.
O impacto do lançamento desse produto deve ser analisado
sob dois aspectos: o primeiro, já mencionado, é o da autonomia do consumidor, que contribui para afastar a preocupação
com o risco do desabastecimento ocorrido no passado (já que
na falta de álcool hidratado o consumidor pode abastecer com
gasolina). O segundo aspecto é regular o mercado: num cenário desfavorável ao uso do álcool hidratado devido a relação de
preços com a gasolina, os consumidores tendem a migrar para
esse combustível, reduzindo a demanda pelo álcool hidratado, com conseqüente redução de preços, tornando novamente
atrativo seu uso.
Ademais, deve ser considerado o impacto sobre a produção de álcool, decorrente do aumento da demanda adicional
pelo álcool hidratado advinda das vendas dos carQuanto ao mercado ros bicombustíveis, num cenário de preços favoráinternacional
vel para esse combustível. Nessa situação, pode-se
imaginar que todo comprador de carro flex-fuel é
de álcool, é uma
um consumidor potencial do álcool hidratado, e a
oportunidade
demanda por esse produto tende a crescer proporexcelente para o
cionalmente às vendas desses veículos.
País, considerandoQuanto ao mercado internacional de álcool, é
se as vantagens
uma oportunidade excelente para o País, considecomparativas que
rando-se as vantagens comparativas que temos na
temos na produção
produção desse produto, e o fato de o álcool ser
desse produto.
um combustível renovável menos poluente que a
144 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 145
Divulgação/Unica
gasolina. Desde a assinatura do Protocolo de Quioto, diversos
países desenvolvidos estão procurando alternativas ao petróleo, de forma a reduzirem suas emissões de CO2, o que abre
excelentes oportunidades para o álcool combustível.
Contudo, o mercado internacional de álcool, embora concreto, deve ser encarado como de médio a longo prazo, pois
diversas barreiras têm que ser vencidas, desde as protecionistas, impostas por alguns países desenvolvidos, até as culturais. Poucos países atualmente conhecem o uso do álcool
combustível em larga escala, sendo necessário divulgar a experiência brasileira.
Além disso, os países que já demonstraram interesse concreto no uso do álcool anidro para mistura na gasolina, como
o Japão, precisam de uma garantia de abastecimento, e a preços condizentes, já que não querem correr o risco de preços
decorrentes da existência de apenas um fornecedor mundial
do produto, no caso o Brasil. Gargalos de logística também
precisam ser solucionados se aumentarem as exportações.
O crescimento da produção de cana-de-açúcar
Divulgação/Unica
A elevação da produção de álcool fez com que também
se aumentasse muito a demanda de cana-de-açúcar do País,
com conseqüente acréscimo de sua produção e expansão para
regiões não tradicionalmente produtoras. Entre os anos de
1975 a 2006, a produção brasileira de cana-de-açúcar passou
de 88,9 milhões para 456 milhões de toneladas, um crescimento de 413%; ao passo que a área plantada saltou de
1,9 milhões para 6,2 milhões de hectares, representando um
crescimento de 226,3%.
Observa-se que o aumento da área foi menor que o da
produção, o que indica um crescimento importante da produtividade agrícola, decorrentes de investimentos públicos e
privados. Conforme Macedo (2007), entre 1980 e 1990 observou-se a introdução de novas variedades de cana-de-açúcar
146 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
(desenvolvidas no Brasil), uso de vinhaça como fertilizante,
controle biológico da broca da cana, otimização das operações agrícolas, entre outros.
No início do período, a produtividade agrícola era de 46,8
toneladas de cana-de-açúcar por hectare, e, em 2006, atingiu
74,1 toneladas por hectare. A Figura 3 indica o crescimento
da produção, área colhida e produtividade, considerando-se o
início do período como base 100.
Figura 3. Cana-de-Açúcar: produção, área colhida e
produtividade
600
500
400
300
200
Fonte: elaborada
100
a partir dos dados
do Ministério da
2005
2003
2001
1999
1997
1995
1993
1991
1989
1987
1985
1983
1981
1979
1977
1975
0
Agricultura, Pecuária
e Abastecimento,
Área Colhida
Produção
Produtividade
IBGE e UNICA.
Os ganhos de produtividade foram também observados na
área industrial. Conforme Nastari (2005), os ganhos de produtividade agroindustrial cresceram em média 3,77% ao ano durante 1975 e 2005. Em 1975, produzia-se 2024 litros de álcool
hidratado equivalente por hectare. Trinta anos depois, esse
valor atingiu 5931 litros por hectare. Na área industrial, os
investimentos realizados foram principalmente no desenvolvimento de novos sistemas de moagem, fermentações com capacidades maiores e autonomia em energia (Macedo, 2007).
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 147
Competitividade da agroindústria
brasileira
Os ganhos de produtividade agrícola e industrial resultaram em reduções importantes dos custos de produção ao
longo do tempo, sendo atualmente o Brasil o país com os
menores custos de produção mundial. Dado o grande número de produtores que utilizam diferentes sistemas produtivos
(solos, custos da terra, níveis tecnológicos, mecanização,
matéria-prima própria ou comprada, etc), é difícil uma estimativa precisa dos custos de produção. Carvalho (2002) apresenta uma comparação entre os custos de produção do álcool
produzido a partir das principais matérias-primas utilizadas.
Destaca-se que o álcool de cana-de-açúcar produzido no Brasil tem o menor custo, conforme ilustrado na Tabela 1. Tabela 1. Comparação custos médios de produção
álcool anidro
Fonte: Carvalho,
2002
País
Anidro
(US$/l)
Matéria-Prima
BR: Centro-Sul
0,19
Cana-de-açúcar
BR: Norte-Nordeste
0,23
Cana-de-açúcar
EUA
0,33
Milho
UE
0,55
Trigo - Beterraba
Observa-se que, em comparação com a região Centro-Sul
do Brasil, o álcool de milho produzido nos Estados Unidos
apresenta um custo 73% mais elevado; o álcool produzido a
partir de trigo ou beterraba tem custos 189% mais altos.
Outra questão importante refere-se à eficiência energética, que é a quantidade de energia produzida em relação à
148 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
quantidade de energia necessária para produzi-la. Novamente
o álcool de cana-de-açúcar apresenta o melhor desempenho.
A tabela 2 traz o balanço energético das principais matérias-primas atualmente utilizadas para a produção de álcool.
Observa-se que para a cana-de-açúcar, cada quantidade de
energia fóssil utilizada resulta na produção de 8,3 unidades
de energia renovável, ou seja, um balanço energético extremamente favorável para esse produto.
Tabela 2. Balanço energético principais matérias-primas
Matéria-Prima
Energia Renovável Produzida/
Energia Fóssil Consumida
Trigo
1,2
Milho
1,3 – 1,8
Beterraba
1,9
Cana-de-Açucar
8,3
Fonte: Macedo et
alii, F.O. Lichts 2004,
International Energy
Agency
Localização da produção e estrutura de
mercado
O crescimento da produção de álcool, conforme salientado anteriormente, deu-se principalmente na região CentroSul. Na safra 2006/07, a referida região foi responsável por
87,5% da produção nacional de cana-de-açúcar, por 85,5%
da produção de açúcar e 90,5% da produção de álcool. São
Paulo, o maior estado produtor do País, na mesma safra foi
responsável por 63% de toda a cana produzida no Brasil, por
63,3% da produção nacional de álcool e por 65% da produção
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 149
de açúcar. A Figura 4 traz a produção por região, para o Brasil
e para o estado de São Paulo. Figura 4. Produção de cana-de-açúcar, açúcar e álcool
por região produtora
450
400
350
300
250
200
150
100
50
0
18000
16000
14000
12000
10000
8000
6000
4000
2000
0
Cana-de-Açúcar
Milhões t
382
334
241
48
NNE
CS
Brazil
Álcool
Mil litros
15807
14298
10001
1509
NNE
CS
a partir dos dados
do Ministério
da Agricultura,
Pecuária e
Abastecimento.
150 |
Brazil
SP
Açúcar
Mil t
30000
Fonte: elaborado
SP
26213
25000
22406
20000
17188
15000
10000
5000
0
3807
NNE
CS
Brazil
SP
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
Da mesma forma, a maior parte das usinas e destilarias
localiza-se na região Centro-Sul, principalmente no estado
de São Paulo. Observa-se que, em 2006, do total de 363 unidades existentes, 46,5% , ou seja, 169 unidades produtoras
localizavam-se em São Paulo.
Figura 5. Número de usinas/destilarias por Estado
– 2006
180
160
140
120
100
80
60
40
20
0
169
26
30
16
26
29
AL AM BA CE ES GO MA MG MS MT PA PB PE PI PR RJ RN RS SE SP TO
A partir da desregulamentação do setor, em 1999, dado o
ambiente institucional mais propício aos investimentos, observou-se a formação de grupos econômicos produtores de
açúcar e álcool, por meio do processo de fusões e aquisições.
Embora tenha ocorrido a entrada de capital externo de várias
nacionalidades, tais como francês (Coinbra-Louis Dreyfus, Tereos), americano (Cargill, Infinity Bioenergy, Globex, Brenco)
e asiático (Noble), a grande maioria da produção ainda é de
capital nacional, visto que a participação dos grupos estrangeiros foi da ordem de 5% na safra 2006/07. Em 2006, os vinte maiores grupos do Brasil foram responsáveis por 41,3% da produção de cana-de-açúcar, por 39,3%
da produção de álcool e por 46% da produção de açúcar.
Apesar do acelerado movimento de fusões e aquisições, a
indústria nacional de açúcar e álcool não era concentrada: o
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
| 151
CR4, ou seja, a razão de concentração dos 4 maiores grupos
produtores de álcool era de 14,9%.
O maior grupo produtor do Brasil é o Grupo Cosan, que,
em 2006, tinha 17 usinas e destilarias, sendo responsável por
aproximadamente 7% da produção brasileira de álcool, 11,1%
da produção de açúcar e 9% da moagem total de cana-deaçúcar. Ressalta-se que a moagem do grupo Cosan, que foi
de 34 milhões de toneladas de cana-de-açúcar naquele ano,
representou 71% da produção da região Norte-Nordeste.
Geração de empregos
No ano de 2005, trabalhavam no setor de cana-de-açúcar,
açúcar e álcool do Brasil, segundo os dados dos Registros
Administrativos do Ministério do Trabalho e Emprego (RAIS),
982.604 empregados. A Tabela 3 traz a evolução do número
de trabalhadores formais envolvidos na produção de cana-deaçúcar, açúcar e álcool, para as duas regiões produtoras, e o
total do Brasil, para os anos de 2000 a 2005.
Tabela 3. Número de empregados formais por região
produtora – 2000 a 2005
Fonte: Elaborado a
partir de MT-b Rais
(vários anos).
Região
Produtora
2000
2001
2002
2004
2005
NNE
250.224
302.720
289.507
343.026
364.443
CS
392.624
433.170
475.086
557.742
618.161
Total Brasil
642.848
735.890
764.593
900.768
982.604
Nota-se que, para o Brasil como um todo, entre 2000 e
2005, considerando-se os três setores (cana-de-açúcar, açú-
152 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
car e álcool) conjuntamente, houve aumento expressivo de
52,9% do número de empregados formais, que passou de
642.848 empregados em 2000 para 982.604 em 2005. Entre
esses, 63%, ou seja, 618.161 empregados, estavam na região
Centro-Sul do País.
Na Tabela 4 apresenta-se o número de empregados formais por região produtora e por setor: cana-de-açúcar, açúcar
e álcool. Observa-se que, em 2005, existiam 414.668 empregados na atividade da cana-de-açúcar no Brasil, 439.573
empregados na produção de açúcar e um contingente menor,
mas ainda importante, na indústria do álcool: 128.363 empregados.
Tabela 4. Número de empregados formais por região
produtora e por setor – 2000 a 2005
Cana-de-Açúcar
Açúcar
Álcool
Região
2000
2001
2002
2004
2005
NNE
81.191
97.496
86.329
104.820
100.494
CS
275.795
302.830
281.291
283.301
314.174
Total Brasil
356.986
400.326
367.620
388.121
414.668
NNE
143.303
183.517
174.934
211.864
232.120
CS
74.421
84.920
126.939
193.626
207.453
Total Brasil
217.724
268.437
301.873
405.490
439.573
NNE
25.730
21.707
28.244
26.342
31.829
CS
42.408
45.420
66.856
80.815
96.534
Total Brasil
68.138
67.127
95.100
107.157
128.363
642.848
735.890
764.593
900.768
982.604
Total Brasil 3 setores
Percebe-se que, entre 2000 e 2005, o crescimento dos
empregados formais das usinas de açúcar (101,9%) e destilarias de álcool (88,4%) do Brasil foi maior do que o dos
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
Fonte: Elaborado a
partir de MT-b Rais
(vários anos).
| 153
Divulgação/Unica
trabalhadores rurais (16,2%) envolvidos com a produção de
cana-de-açúcar, provavelmente em decorrência do processo
de mecanização da colheita de cana. É importante observar
que nesse período houve crescimento da produção de canade-açúcar: em 2000, a produção nacional foi de 325,33 milhões de toneladas e, em 2005, foi de 419,56 milhões (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, 2005), ou
seja, um crescimento da produção da ordem de 28,9%. Notase também que, em 2000, 55% eram empregados rurais. Já
em 2005 sua participação caiu para 42,2%.
Ressalta-se o grande número de trabalhadores formalmente empregados nos três setores da agroindústria canavieira
– cana-de-açúcar, açúcar e álcool -, que, em 2005, foi de
982.604 trabalhadores. Não se inclui nesse total os empregados de outros setores relacionados com a cadeia produtiva,
por exemplo, adubos e fertilizantes, tratores e equipamentos,
comercialização, transporte, etc. 154 |
Biocombustíveis no brasil: Realidades e perspectivas
Considerações finais
O Brasil é internacionalmente reconhecido pelo pioneirismo em desenvolver a produção e uso em larga escala de um
combustível renovável, produzido a partir da cana-de-açúcar,
com alta eficiência energética e com os menores custos de
produção do mundo.
A motivação principal do Proálcool, na época de seu lançamento, era reduzir a dependência do País em relação ao
petróleo importado, bem como atenuar os impactos sobre os
indicadores macroeconômicos do País. Além disso, possibilitou ao Brasil deter o domínio da tecnologia da produção de
álcool e desenvolver carros com motores alimentados exclusivamente pelo álcool hidratado. Mais recentemente, a indústria automobilística nacional lançou o carro bicombustível,
amplamente aceito pelo consumidor brasileiro.
Grandes foram os crescimentos da produção de cana-deaçúcar, de álcool e de açúcar desde a criação do Proálcool, em
1975, o que foi possível devido às extensões territoriais do
País, aos investimentos em tecnologia industrial e agrícola,
incluindo as novas variedades de cana-de-açúcar mais produtivas. Também o envolvimento da indústria automobilística,
a criação da rede de postos com oferta de álcool hidratado
em todo o território nacional, a criação de tanques coletores,
de dutos para transporte, dentre outras ações, foram essenciais para o sucesso do Programa.
Se na época da criação do Proálcool o principal atrativo
do uso do álcool combustível foi a redução da dependência
em relação ao petróleo importado, atualmente acrescentamse os benefícios ambientais ligados às reduções líquidas das
emissões de CO2. O fato de ser renovável e menos poluente do
que a gasolina tornou o álcool uma alternativa interessante
Considerações sobre a indústria do etanol do Brasil
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para os países que desejam reduzir suas emissões de carbono,
o que pode representar oportunidades importantes ao Brasil,
dada sua competitividade e disponibilidade de terras.
Nesta nova fase, além da viabilidade econômica, fatores
ambientais e sociais ligados à produção são igualmente relevantes. Nesse sentido, é importante ressaltar o potencial de
geração de empregos da agroindústria canavieira: em 2005,
982 mil pessoas foram inseridas formalmente no mercado.
Nesse cenário de crescimento e maior inserção internacionalmente, ressaltam-se os desafios logísticos e a expansão
sustentável da produção, incluindo-se, portanto, os cuidados
com o meio-ambiente e a preocupação com as questões sociais, de forma a estender os benefícios gerados na cadeia
produtiva aos empregados agrícolas e industriais.
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