Cartografia Pessoal aprendizagem ensino história arte/educação arte formação cartografia rizoma contemporaneidade Cartografia... uma pesquisa que não desenha um mapa fixo ou histórico, mas estuda as relações, os encontros com o mundo, as forças em movimento desprendidas nesses encontros, enquanto eles acontecem. Deleuze sustenta que a arte tem uma função. Ele diz que a função da arte é tornar visível o visível. E que a arte tem o poder de dar a ver e indagar os modos de funcionamento que constituem as formas da nossa experiência estética, ética e política. A arte torna visível as forças com as quais se configuram as formas da nossa percepção e do nosso pensamento. Tem o poder de problematizar esteticamente as formas daquilo que somos, para que possamos, com essa visão, agir politicamente sobre nossas próprias formas. A arte pode agir como criação e resistência nos processos de formação. E essa ação de criação e resistência pode constituir as formas do conhecimento que produzimos...(1) Rizomas são sistemas acentrados, nãohierárquicos, que realizam conexões, ligamentos e junções. Rizoma é aliança, movimento transversal, direção perpendicular. Procede por variação, expansão, conquista, captura. “Um rizoma não começa nem conclui, ele se encontra no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo” (2) Um rizoma... “De qualquer ponto que parta, o discurso se alarga de modo a compreender horizontes sempre mais vastos e, se pudesse se desenvolver em todas as direções, acabaria por abraçar o universo inteiro...” (3) Se arte é produção sensível, se é relação de sensibilidade com a existência e com experiências humanas capaz de gerar um conhecimento de natureza diverso daquele que a ciência propõe, é na valorização dessa sensibilidade, na tentativa de desenvolvê-la no mundo e para o mundo devolvê-la, que poderemos contribuir de forma inegável com um projeto educacional no qual o ensino de arte desempenhe um papel preponderante e não apenas participe como coadjuvante. (4) Ensinar é criar desafios possíveis. Ensinar é desafiar confiando na capacidade de aprender dos alunos. Desafiar é acreditar que gente foi feita para ser feliz. Não apenas feliz no sentido mais comum da palavra, mas feliz na sua origem latina – félix – fértil, abundante, pleno. Ensinar, portanto, é promover a plenitude da vida. Aprender é, antes de tudo, ser capaz de problematizar, ser sensível às variações materiais que têm lugar em nossa cognição presente. [...] O melhor aprendiz não é aquele que aborda o mundo por meio de hábitos cristalizados, mas o que consegue permanecer sempre em processo de aprendizagem. O processo de aprendizagem permanente pode, então, igualmente ser dito de desaprendizagem permanente. Em sentido último aprender é experimentar incessantemente, é fugir ao controle da representação. É também, nesse mesmo sentido, impedir que a aprendizagem forme hábitos cristalizados. (5) Aprender e ensinar Arte – não necessariamente nesta ordem – compõem-se de práticas sensíveis que demandam “[...] relacionar arte e vida, onde o conhecer, o fazer, o expressar, o comunicar e o interagir instauram práticas inventivas a partir das vivências de cada um” (6) , mas também exigem disposição, transformação, atos de relacionar e de contextualizar, intervir, mediar, reinventar para realizar. Só serão possíveis mudanças significativas à medida que o professor de Arte tiver uma compreensão profunda da razão de ser da sua prática, da sua história e uma clara opção política do seu ato pedagógico. É necessário, portanto, que este professor compreenda a raiz epistemológica de suas ações e assuma uma postura ativa na organização do processo de ensino, em especial do processo avaliativo preocupado em efetivar e assegurar aprendizagens e em superar dificuldades encontradas. Com o conhecimento das teorias pedagógicas, os professores de Arte poderão perceber que suas práticas não existem isoladamente, mas adquirem significado e coerência na medida que estão vinculadas à uma teoria sistematizada. Como afirma Paulo Freire (7) ao sustentar que não há ensino sem pesquisa nem pesquisa sem ensino: “[...] esses quefazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino contínuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago. Pesquiso para conhecer o que eu ainda não conheço e comunicar ou anunciar a novidade”. 1964-1978: Educação Artística / Curso Polivalente nas Universidades para formar professores • Regime militar-repressão • LDB 1971/ Educação profissionalizante de cunho tecnicista Vim ao mundo no final da década de 70, em uma cidade privilegiada por Escolinhas de Arte que buscavam o desenvolvimento dos processos mentais envolvidos na criatividade e que, em sua outra face, se valia da polivalência (instituída no ensino formal em 1971) para ensinar arte. 1980-1990: Críticas às práticas anteriores / Criação das associações de professores de Arte/ Encontros nacionais e internacionais / Reformas nos cursos universitários • Pedagogia sociopolítica / Estudos teóricos críticos / Escola Pública competente Desse período me lembro das aulas de arte sempre nos últimos horários, vista como um relaxamento dos conteúdos tidos como mais “sérios”, com foco no desenho com lápis de cor e giz cera, sendo ministrada pela mesma professora... Tinta era algo impossível: sujava as carteiras! 1990: Proposta Triangular/ PCNs – ARTE como disciplina / Arte como conhecimento • Construtivismo • O conhecimento se constrói na relação = Aluno – professor - processos sociais Interessante analisar como as coisas acontecem e com que descompasso elas se edificam nas práticas escolares... Ainda mais nas cidades do interior. Apesar de toda uma movimentação política sobre o Ensino de Arte, o que se observava nas aulas que frequentei era um ensino que mesclava concepções modernistas e concepções tradicionais. Digo isso, pois era frequente o uso de modelos mimeografados e de regras de como colorir e com quais cores o fazer. Lembracinhas para o dias das mães, dos pais, dos avós... Músicas para decorar fórmulas de ciências e hábitos de higiene... Pecinhas teatrais para aprender história... Colorir para pintar mapas... Ensaios de dança? Só se fosse para a festa junina! Canto? Apenas na Festa de Encerramento.... Em contrapartida a concepção anterior, tive professores que nos deixavam livres para criar... Livres no sentido exato da palavra, sem qualquer intervenção de sua parte... Aliás, várias vezes meus pais foram chamados à Diretoria da Escola para conversar sobre esses desenhos... Além desse laissez-faire, lembro também do ensino de técnicas, em especial no curso de Magistério. Dessas técnicas me recordo de pintar com água sanitária em papel crepom, colorir a folha com giz cera e depois passar nanquim para então raspar e “ver o desenho aparecer”, desenhar com limão e passar a vela acesa para descobrir o que havia sido feito... Misturas de tinta a partir de terra, de folha, de flor... Na verdade, até o presente momento, minha visão de Arte era a de distração e de pura expressão da sensibilidade... As coisas só começaram a mudar quando ingressei no Ensino Superior... Foi na Universidade que tomei contato com a Abordagem Triangular e com a concepção de Arte como conhecimento. Embalados pelas conquistas no campo da arte-educação, fundamos no Diretório Acadêmico uma associação de estudantes de licenciatura em Arte, chegando até a promover um encontro para os professores da cidade. Nesse contexto, fui tendo acesso a outros pensares no campo da arte/educação e me senti permeada por eles. No início de carreira, tomei como norte as referências dadas pelos PCNs, reconstruídas cotidianamente. Aliás, penso que os PCNs são um marco na história do ensino de arte (mesmo que coberto de “estrangeirismos” pedagógicos – prática muito utilizada me nosso país), pois configuram a arte como conhecimento, efetivando seu lugar enquanto disciplina no currículo escolar. Instigada pela prática em sala de aula, parti em busca de um curso de pesquisa – mestrado – no qual, me fosse possível dialogar com as diferentes concepções epistemológicas de arte, ainda hoje revisitadas nas salas de aula. Hoje, construindo essa cartografia do da minha formação, em diálogo com o contexto histórico do ensino de arte, percebo o quanto fui influenciada (e talvez ainda o seja) pelos diferentes movimentos da minha área de atuação e de pesquisa: o ensino de arte. Penso que essa ação de reflexão me potencializa para novos rumos e descobertas, para outras práticas e transformações. Créditos 1. FARINA, C. Arte e Formação: uma cartografia da experiência estética. Anped, 2008. 2. DELEUZE, G. et al. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1995. 3. CALVINO, I. A trilha dos ninhos de aranha. São Paulo: Companhia da Letras, 2004. p. 122. 4. BUORO, A. B. Olhos que pintam: a leitura da imagem e o ensino da arte. São Paulo: Cortez, 2002. p. 41 Créditos 5. KASTRUP, V. A invenção de si e do mundo: uma introdução do tempo e do coletivo no estudo da cognição. Campinas: Papirus, 1999. 6. MEIRA, M. Filosofia da criação: reflexões sobre o sentido do sensível. Porto Alegre: Mediação, 2003. 7. FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1997.