A CEBOLA NA MESA DO TURISMO
Elisangela Rinaldi Margheti1
Mateus Lemos da Silva**
RESUMO
Neste trabalho, destaca-se a importância econômica e turística que a cebola Allium
cepa exerce, historicamente, no município de Tavares, segundo maior produtor do Estado do
Rio Grande do Sul. No Brasil, a cebola era cultivada apenas no sul, sendo então,
economicamente valorizada, o que fez crescer a concorrência, expandindo-se a todas as partes
do país. O trabalho apresentado procura mostrar a evolução do transporte, passando de
animais a caminhões, progredindo a comercialização e agilizando o processo. Comenta-se
ainda que, antigamente, produzia-se de forma natural, sem a necessidade de agrotóxicos,
ofensivos à saúde. Contudo, a cebola não deixa de ter seu valor nutricional, sendo ricamente
saudável e medicinal.
A cebola predomina como principal fonte de emprego e renda em Tavares, além de
ser também utilizada, indispensavelmente como atrativo na mesa do turista.
Palavra-chave: Cebolicultura. Turismo. Emprego. Saúde.
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Acadêmicos do Curso de Turismo – ULBRA - Torres/RS.
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INTRODUÇÃO
Cientificamente, conhecida como Allium cepa, a cebola caracteriza-se por ser um
produto agrícola de demanda bastante inelástica, dada a natureza de seu uso. Existem cebolas
de vários tamanhos e cores, e o seu sabor característico varia de forte a adocicado. É
consumida, preferencialmente, “in natura”', na forma de saladas, como condimento ou
tempero, na alimentação humana. Mas, também pode ser usada como princípios químicos
pela indústria farmacêutica e pela medicina caseira.
No município de Tavares-RS, a cebola é historicamente fundamental, constituindo-se
como principal fonte de emprego e renda, desde semeadura, plantio e comercialização.
Este trabalho tem objetivo destacar a importância da produção de cebola no
município de Tavares, identificando como a atividade pode influenciar a expansão do turismo
na região.
1 HISTÓRIA DA CEBOLICULTURA NA REGIÃO
A introdução da cebola no Rio Grande do Sul aconteceu através dos primeiros
colonizadores açorianos e ibéricos que vieram povoar as terras do Estado. Conforme
EMATER-RS, a cultura encontrou condições favoráveis de melhor desenvolvimento na
região litorânea.
Antigamente, Tavares pertencia ao município de São José do Norte, de origem
açoriana, através de casais vindos do Arquipélago dos Açores (Portugal), por volta de 1.752.
Esses primeiros imigrantes dedicavam-se, principalmente, ao cultivo do trigo, centeio, pesca e
pecuária.
AGNELO (2006), pesquisador da cultura açoriana no Litoral, conta que,
antigamente, São José do Norte foi pioneiro na plantação de trigo no Brasil produzindo,
especialmente para a Família Real, no Rio de Janeiro. Outra produção encontrava-se somente
na Europa.
Segundo AGNELO, o produtor rural açoriano Vasco Machado, foi quem trouxe, pelo Porto
de Rio Grande, as primeiras mudas de cebola. A primeira plantação foi desenvolvida em
Capão Comprido, então, distrito de São José do Norte2.
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Capão Comprido pertence hoje ao município de Tavares, que se emancipou em 1982.
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Dessa forma, é substituída a cultura anterior e, começa a desenvolver-se a cultura da
cebola, expandindo a outras regiões sendo, atualmente, cultivada desde o Nordeste até o
extremo Sul do país.
2 PRODUÇÃO
Segundo os plantadores de cebolas, antigamente, o agricultor não tinha custo na
produção, pois, não era necessário o uso de agrotóxicos, nem a compra das sementes.
A terra era suficientemente fértil e rica em matéria orgânica, complementando
apenas com esterco. Porém, como todas as demais culturas, surgiram doenças, pragas e ervas
daninhas, exigindo tratamento químico.
Já no caso da semente, denominada pelos produtores tavarenses como “cebolinho”,
era produzido manualmente. Selecionavam-se as melhores cebolas e as plantava num
canteiro. Dali crescia um canudo, no qual desabrochava uma flor sementeira, ou cachopa.
Colhia-se essa flor, ensacava-se, e deixava no sol para secar. Depois de seca, batia-se na
cachopa com garrafas de vidro, que por sua vez, soltava as referidas sementes. Uma vez
prontas, eram peneiradas, e guardadas para o próximo plantio. E assim sucessivamente.
Além disso, ainda usavam a casca da cebola para tingir o pelo da ovelha, dando um
tom mais amarelado ao cobertor que seria fabricado.
Nos dias de hoje, em Tavares, raramente, se produz dessa maneira. É preferível
comprar a semente pronta e, tornou-se freqüente o uso de agrotóxicos, elevando o custo da
produção.
3 TRANSPORTE DA CEBOLA
A cebola esteve sempre historicamente ligada ao município. Conforme o Histórico
de Tavares, por volta de 1.918, eram feitas viagens de carretas puxadas por bois, carregadas
de cebolas para Porto Alegre, onde eram vendidas no Parque dos Carreteiros, atual Parque da
Redenção. Retornavam trazendo melado, rapadura, farinha de mandioca, cachaça, açúcar,
arroz, farinha de trigo, pão torrado e, tudo que consumissem em casa com a família.
Esta viagem de carreta, com mais ou menos sete juntas de bois, durava na base de 15
e 18 dias, ida e volta, pois paravam no caminho, descansavam e partiam no dia seguinte.
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Em 1.922, houve a Guerra dos Chimangos e Maragatos, sendo os Chimangos
chefiados por Luis Gomes e os Maragatos por Chico Mariano. Passaram por Tavares as
forças, cada uma com seu chefe, compostas de 60 a 80 homens, sendo que passou primeiro de
Chico Mariano e logo depois a de Luis Gomes que, seguiu a viagem tentando encontrar Chico
Mariano.
Logo após a guerra, começou novo estilo de transporte da cebola, pois o acesso por
terra era muito difícil. Em 1.923, começou-se a construir armazéns para depósito e comércio
da cebola, chamados “barracas”, a beira da Lagoa dos Patos. A cebola era levada de carretas
até as barracas, depois seguia de barco para Rio Grande. Quando retornavam, os barcos
traziam mercadorias para serem vendidas nas próprias barracas para os plantadores de cebola.
Após 1.950, começaram os primeiros transportes através de caminhões, prevalecendo
intensivamente. Um meio ágil que facilitou o progresso da cebola e a vida das pessoas.
Segundo MOREIRA (2006), caminhoneiro, no ano de 1.979, época do cruzeiro, com
uma das cargas de cebola que transportou de Tavares a São Paulo, lucrou um caminhão novo,
construiu a própria casa, onde reside até hoje e, ainda sobrou dinheiro.
Cabe ressaltar ainda, que na época não existia asfalto, dificultando qualquer
transporte. Todavia, a cebola estava no auge, sendo economicamente valorizada, o que fez
crescer a concorrência.
A atual acessibilidade, embora em precárias condições, agiliza a eficiência no
transporte. Porém, não possibilita ao produtor tavarense faturar como antigamente, devido ao
elevado custo de produção e ao baixo preço de comercialização.
4 CEBOLICULTURA EM TAVARES
O município de Tavares está localizado na região Sul, distante de Porto Alegre 270
km Possui uma área territorial de 604,3 Km², e sua população, segundo o censo de 2004 é de,
aproximadamente, 5.746 habitantes.
Faz divisa ao Norte com o município de Mostardas, ao Sul com o município de São
José do Norte, ao Leste com o Oceano Atlântico e ao Oeste com a Laguna dos Patos.
Tavares é caracterizado como um município tradicional em produção de cebola no
Rio Grande do Sul e, atualmente, é o segundo maior produtor do Estado, perdendo apenas
para São José do Norte.
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A atividade constitui-se na principal fonte de renda para grande parte dos
agricultores, além de gerar diversos empregos.
Porém, ultimamente, os produtores tavarenses mostram-se bastante insatisfeitos e
preocupados, devido à decadência comercial, conforme mostra a tabela abaixo:
PREÇO PAGO AO PRODUTOR POR Kg
ANO/ SAFRA
2000/ 01
2001/ 02
2002/ 03
2003/ 04
2004/ 05
2005/ 06
2006/ 07
VALOR POR kg DA CEBOLA
R$ 0,28
R$ 0,25
R$ 0,22
R$ 0,25
R$ 0,28
R$ 0,40
R$ 0,10
Tabela 1: Custo Comercial
FONTE: EMATER/ TAVARES-RS, 2006.
Tal queda deve-se à descapitalização do produtor e à entrada de cebola importada no
mercado nacional, concorrendo com a safra gaúcha.
Diante da assustadora realidade, o produtor tavarense não desanima e, recomeça cada
ano esperançoso, na expectativa de uma safra melhor.
5 PROCESSO DE TRABALHO
Embora temporária, a cultura da cebola é grande absorvedora de mão-de-obra,
integrando o produtor e sua família ao meio rural. Resumidamente, o seguinte processo:
*Semeadura:
Existem vários métodos de plantio de cebola, mas no Rio Grande do Sul e,
principalmente em Tavares, utiliza-se o plantio com mudas, sendo realizado através de
sementes, o popular cebolinho.
*Transplante de muda:
A passagem das mudas de cebola dos canteiros de semeação para o lugar definitivo,
denominado pelos tavarenses, como cercado3. A partir dessa fase, a cultura exige mão-de-obra
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Cercado: terreno onde se planta a cebola.
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contratada.
*Colheita:
As plantas são arrancadas manualmente, colocadas sobre o solo, para que seja feita a
“cura ao sol”, ou seja, para que a planta perca o excesso de umidade.
*Ensacação e armazenamento:
Após a cura ao sol no cercado, a cebola é recolhida em sacos e levada aos galpões,
onde é pendurada em varais. Posteriormente, corta-se a rama e aguarda-se a comercialização.
É importante que o depósito seja bem arejado e limpo, para garantir a conservação do
produto.
*Transporte e comercialização
Concluído todo o processo, é chegada a fase final. Caminhões carregados de cebolas,
partem do município de Tavares destinados à varias partes do país. A comercialização da
cebola começa, geralmente, no final de novembro e estende-se até março do ano seguinte.
Percebe-se então, a elevada contratação de mão-de-obra, especialmente nas fases de
transplante, colheita, armazenamento e transporte.
Além de sua importância econômica regional, a cebola ainda exerce papel
fundamental na saúde e medicina. Por exemplo, em Tavares, a cebola branca é bastante
procurada, como excelente remédio para asma e bronquite.
6 BENEFÍCIOS À SAÚDE
A cultura popular está repleta de fatos interessantes sobre a cebola. O livro
Alimentos Saudáveis, Alimentos Perigosos, relata que Alexandre, o Grande, fornecia enormes
quantidades para suas tropas para fortalecê-las para as batalhas. As pinturas das tumbas
egípcias estão repletas de cebolas. Os antigos escritos hebraicos revelam que era um dos
alimentos pelos quais os judeus ansiavam após a saída do Egito. Uma das crenças centenárias
sobre a cebola, através da História, dizem que os curandeiros atribuíam-na poderes quase
mágicos para curar de tudo, da calvície a infecções.
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Atualmente, é a principal hortaliça condimentar utilizada pelos brasileiros e, de modo
geral, indispensável em qualquer cozinha, especialmente pelo sabor que confere a outros
alimentos. Porém, é importante também valorizar seu conteúdo nutricional. Os talos verdes
são boas fontes de vitamina C e beta-caroteno. Uma xícara de cebolas cozidas fornece cerca
de 225mg de potássio.
Recomendada pelos curandeiros como excelente remédio para o coração,
pesquisadores documentaram que a adenosina, substância presente na cebola impede a
formação de coágulos, podendo prevenir ataques cardíacos. Estudos também indicam que a
cebola pode proteger contra os danos do entupimento das artérias pelo colesterol e, se
consumida em quantidade adequada, ajuda a prevenir contra a pressão alta.
Compostos de enxofre presentes na cebola podem causar mau hálito e um
desagradável odor na pele. Entretanto, eles também bloqueiam o potencial cancerígeno de
alguns carcinógenos.
O corte da cebola permite que seus compostos de enxofre combinem-se com enzimas
para formar um tipo de ácido sulfúrico, que faz os olhos lacrimejarem, podendo ajudar a
limpar as vias respiratórias congestionadas durante uma gripe. O xarope feito com cebola e
mel é um antigo remédio para a tosse.
Além disso, a cebola ainda contém substâncias com um leve efeito antibacteriano.
Isso justifica a antiga sabedoria popular, que recomenda colocar uma cebola crua sobre um
corte para prevenir contra infecções, método bastante utilizado ainda nos dias atuais.
6.1 INCONVENIENTES
Apesar de bastante saudável, a cebola apresenta alguns inconvenientes. Se
consumida crua, produz mau hálito e odor na pele. Também pode causar distensão abdominal
e gases.
Referindo-se ao plantio, a necessidade do uso de agrotóxicos é prejudicial, tanto ao
usuário quanto ao consumidor, podendo causar intoxicação. Por isso, no manuseio da
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pulverização, é indispensável à proteção do agricultor, utilizando roupas apropriadas, como:
máscara, macacão, luvas e botas.
Quanto à alimentação, higiene é fundamental.
7 A CEBOLA INFLUENCIA O TURISMO
O município de Tavares é historicamente turístico. Segundo AGNELO (2006), a
cebola foi o carro-chefe do desenvolvimento do Turismo na região. Tavares quando ainda
pertencia a São José do Norte era, periodicamente, visitado por compradores vindos de várias
partes do país, explorando com sucesso a mercadoria do Sul.
Percebendo a importância da atividade, o município resolveu organizar algo a fim de
valorizar seu produto. Criou então, a Festa Nacional da Cebola, realizada em São José do
Norte. Na época, só havia festas religiosas. A novidade despertou curiosidade, atraindo
pessoas de vários lugares, através dos meios acessíveis, como: barcos, carretas de bois,
charretes e inclusive a pé.
Dessa forma, a cebola automaticamente desenvolveu o Turismo, que por sua vez,
complementou a comercialização, despertando a concorrência.
Emancipado em 12 de maio de 1982, Tavares sucessivamente herdou a fama da
cebola, possuindo atualmente, sua própria festa. A EXPOCACE – Exposição do Camarão e
da Cebola é tipicamente realizada de dois em dois anos, no mês de março, divulgando as
atividades econômicas do município.
A decoração da Expocace é feita artesanalmente com cebolas, das mais criativas
maneiras, enchendo de admiração os olhos dos visitantes. Também se comercializa conservas,
réstias de cebolas, entre outras. São saborosas lembranças que o turista leva para casa,
deixando uma importante contribuição para o município.
Percebe-se então que, a cebolicultura é um dos vários atrativos turísticos de Tavares,
unindo o útil ao agradável, ou seja, elegendo a cebola como prato fundamental na mesa do
turista.
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
Após o respectivo trabalho, pode-se afirmar que a cebolicultura é de suma
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importância para o município de Tavares, caracterizando-se como a principal fonte de
emprego e renda. Portanto, os agricultores tavarenses sustentam suas famílias a partir da
comercialização da cebola.
Entretanto, é preciso inovar, diferenciar, buscando novas formas de produção. Uma
ótima alternativa seria a instalação de uma agroindústria no município, para o beneficiamento
e industrialização do excedente da produção, comercializando conservas, temperos, entre
outros. Além de incorporar valor a cebola e gerar empregos para a população, contribuiria
economicamente com o município e, consequentemente, atrairia visitantes interessados,
influenciando o turismo.
Conclui-se então que, por intermédio da cebola, Tavares tem uma histórica ligação
com o turismo e a tendência é aumentar cada vez mais.
Entre o Oceano Atlântico e a Laguna dos Patos, com privilegiada localização,
Tavares produz a melhor cebola da região!
REFERÊNCIAS
AGNELO, Luis Chaves Martins. Entrevista realizada à Rua Izidro Teixeira Machado, n° 217.
Tavares / RS em 10/10/2006.
Alimentos Saudáveis, Alimentos Perigosos, por Reader’s Digest Brasil LTDA. 1998.
BOEING, Guido. Fatores que afetam a qualidade da cebola na agricultura familiar
catarinense. Florianópolis: Instituto Cepa / SC. 2002.
BRANCO, Antônio Vieira. Entrevista realizada na comunidade Olhos D’água. Tavares / RS
em 15/10/2006.
MOREIRA, José Mariano. Entrevista realizada na comunidade Olhos D’água. Tavares / RS
em 26/11/2006.
SILVA, Célia Edi Assis. Agricultura: Produção de cebola no Município de Tavares, no
período de 1993 a 2003. Ijuí, 2004.
TAVARES, Emater / RS. XVIII Seminário Nacional da Cebola. Santa Catarina. 2006.
TAVARES, Prefeitura Municipal. Histórico do Município. Tavares R/S.
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A Cebola na Mesa do Turismo