ANÁLISE ECONÔMICA
Dois Brasis?
Flávio Ataliba
Carlos Eduardo Marino
A desigualdade na distribuição da renda no Brasil continua sendo um dos principais problemas
sócio-econômicos do país. Além da grande diferença existente entre a renda média nacional dos
indivíduos mais ricos quando comparados aos mais pobres, existe também um forte componente
regional desta desigualdade. A Região Nordeste, apesar de representar 28% da população brasileira,
concentra 49% dos pobres e 55% dos indigentes do Brasil. Essas estatísticas apontam que a situação
é ainda de extrema gravidade uma vez que ao distribuição desigual da riqueza em nosso país
contribui para o enfraquecimento da unidade nacional, além de aumentar a polarização de interesses
antagônicos, transformando os brasileiros que moram no Norte e no Centro-Sul em indivíduos de
categorias distintas.
O Gráfico 1, abaixo, apresenta o comportamento do PIB per capita de cada região como proporção
do PIB per capita brasileiro entre 1985 e 2003. Visualmente pode-se perceber que nesse período as
regiões Sudeste, Sul e Centro-Oeste possuem um nível médio de PIB per capita como proporção do
nacional bastante elevado quando comparada às regiões Nordeste e Norte. Conquanto, o mais grave
é que durante todo esse período não há uma tendência de correção desse desequilíbrio, pelo
contrário. Se analisarmos os dois blocos de regiões, separadamente, percebe-se claramente que as
regiões caminham para um processo de aproximação distinto: um Brasil formado pelo Sul, Sudeste
e Centro-Oeste e outro pelo Nordeste e Norte.
Adicionalmente, é interessante observar no gráfico, o declínio proporcional da região Sudeste,
motivado em parte pela imigração para essa região, pelo encarecimento dos seus fatores de
produção e pelos problemas provenientes de superpopulações em aglomerações urbana, como
poluição, crimes, violência etc. Por outro lado percebe-se ainda que Nordeste e Norte encontram-se
praticamente estagnados. Essas evidências motivam-nos a acreditar que as políticas de correções de
desequilíbrios regionais implementadas nos últimos 30 anos não foram ainda suficientes para
solucionar o problema da desigualdade regional. O máximo que elas possam ter conseguido foi
evitar um distanciamento ainda maior entre as regiões ricas e pobres do país, que de outro modo
poderia ter ocorrido.
Naturalmente, tais evidências fazem-nos pensar na necessidade de uma reorientação na forma de
encaminhar as políticas de redução dos desequilíbrios regionais no Brasil. Sabe-se que a partir da
década de 50, tal problema sempre foi pensado pelo governo federal como uma questão vinculada
principalmente a ausência de poupança e de capital físico nas regiões mais pobres. Inspiradas nas
idéias provenientes dos modelos desenvolvimentista do pós-guerra, acreditava-se que o diferencial
de renda per capita entre países ou regiões estava intimamente ligado ao diferencial de capital per
capita. Neste sentido, o problema poderia ser facilmente resolvido, bastando para tanto que fosse
dado subsídio e incentivos ao capital para que ele se desloca-se para as regiões mais pobres. Deste
modo, o diferencial de renda seria corrigido naturalmente ao longo do tempo.
Nessa perspectiva, diversos instrumentos e órgãos foram criados ao longo desses anos para facilitar
a mobilização de poupança para a região. Mais recentemente, no vácuo da inexistência de políticas
nacionais mais consistentes, desenvolveu-se a guerra fiscal como uma alternativa para encorajar
novos investimentos para essas regiões, mas seus resultados parecem ser muito mais prejudiciais do
que animadores.
É evidente que a reversão do processo de desigualdade regional exigiria novas políticas com novas
concepções, uma vez que encarar o problema somente como falta de poupança, é uma visão ainda
muito restrita da questão. A solução é complexa pois depende de vários outros fatores intimamente
ligados as características de cada região, tanto no que se refere a suas condições naturais, o processo
histórico de suas colonizações, sua representatividade política e as condições sócias e institucionais
de suas populações.
No entanto, os principais estudos científicos no Brasil, nos últimos anos, têm apontado que grande
parte do diferencial de renda entre as regiões é explicado pelo diferencial do nível educacional dos
indivíduos que moram nessas regiões. Isso sugere que indivíduos com níveis educacionais
semelhantes em regiões distintas no Brasil não possuem diferenciais significativos de renda, e que
os fluxos de capital dentro do país acaba sendo condicionado, em grande parte, pela presença dessas
características. Assim, o problema do desequilíbrio regional estaria intimamente ligado, em grande
parte, ao diferencial das características dos indivíduos que moram nas regiões. Ou seja, o Nordeste é
pobre, não por ser uma região pobre, mas por possuir muitos indivíduos com características que os
tornam pobres, independentemente em que região do país eles possam viver.
Nesse sentido, há de se entender que o capital se deslocará dentro do país entre seus diversos
estados dependendo da rentabilidade real que lhe seja oferecida e essa rentabilidade é tanto maior
quanto maior a presença de infra-estrutura e mão de obra qualificada. A presença do estado como
indutor do processo de redução dos desequilíbrios regionais seria muito mais eficiente quando for
direcionado mais fortemente recursos na formação desses fatores de produção e na geração de
novas tecnologias nessas regiões. Certamente essas medidas produzirão efeitos permanentes de
longo prazo sobre a produtividade da região e por extensão no seu nível de renda per capita. Insistir
em políticas indiscriminadas de concessão de subsídios e incentivos fiscais, chancelada pela
omissão do governo federal, é tentar antecipar artificialmente um futuro de prosperidade que
certamente não virá.
publicado no jornal "O Povo" de Fortaleza
http://www.noolhar.com/opovo/economian/535470.html
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