CIÊNCIA POLÍTICA PARA O CURSO DE ADMINISTRAÇÃO Ailton Guimarães 1 1 Mestre em Economia de Empresas pela UCB - Universidade Católica de Brasília; Especialista em Finanças pela UFSC - Universidade Federal de Santa Catarina e Especialista em Controladoria pela Faculdade Tibiriçá/SP. 1 SUMÁRIO 1. PARTE I - CAPÍTULO 1, página 2. Significado e objeto da Política. Evolução Histórica do Pensamento Político. Pensamento Político Contemporâneo. 2. PARTE I - CAPÍTULO 2, página 22. Evolução Histórica do Pensamento Político. Grécia. Roma. Maquiavel. Maquiavel e a Administração. Pensamento Político Contemporâneo. 3. PARTE I - CAPÍTULO 3, página 49. Poder e sociedade. Conceito de poder. Tipos e fontes de poder. Maquiavel e o poder político. Legitimidade e legalidade do poder político. Teoria das elites. As elites e o poder. 4. PARTE I - CAPITULO 4, página 62. Concepção e evolução de Estado. O Estado Moderno. Teorias sobre a origem do Estado. Burocracia. Burocracia e poder. A estrutura burocrática das empresas capitalistas. 5. PARTE II - CAPITULO 5, página 72. Política, poder e Administração. Liderança e poder. Dependência, a chave do poder. Táticas de poder O poder em ação, o comportamento político. 6. PARTE II - CAPITULO 6, página 80. Teorias contratualistas. Economia Política. Poder político e o poder econômico. Intervenção do Estado na economia. 7. PARTE II - CAPITULO 7, página 100. Teoria dos jogos. História. Conceitos. Importância. Teoria da escolha Racional. O poder do eleitor. Teoria das votações. Teorema do eleitor mediano. O jogo do apadrinhamento. 2 CAPITULO I O que veremos neste capítulo: Significado e objeto da Política. Evolução Histórica do Pensamento Político. Pensamento Político Contemporâneo. “O homem é um animal político” Aristóteles 1. Introdução O estudo da ciência política permite-nos conhecer o exercício e organização do poder em uma sociedade. Além disso, através desta ciência social, podemos ver como acontece a distribuição e transferência de poder em processos de tomada de decisão. Estes processos de distribuição e transferência de poder envolvem, normalmente, interesses contraditórios, e a ciência política é o veiculo apropriado para entendermos estes processos. A ciência política faz parte das ciências humanas, pois analisa o Estado, a soberania, a hegemonia, os regimes políticos, os governos, as linhas históricas destas partes da política nos países desde a antiguidade até hoje e a influência que têm sobre a sociedade incluindo as Relações internacionais. É frequentemente um exemplo aplicado na Teoria dos jogos e sob este prisma podemos avaliar os ganhos - como o lucro privado de pessoas ou das empresas ou da sociedade (o desenvolvimento econômico) - e as perdas - como o empobrecimento de pessoas ou da sociedade (Corrupção política) - como resultados de uma luta ou de um jogo em que existem regras não explícitas que a pesquisa deve explicitar. A ciência política tem relação com diversos campos do conhecimento, como os sistemas políticos, ideologia, teoria dos jogos, economia política, geopolítica, análise de políticas públicas, relações internacionais, 3 análise de relações exteriores, estudos de administração pública e governo, processo legislativo e outros. 2. Definição O termo ciência política foi cunhado em 1880 por Herbert Baxter Adams, professor de História da Universidade Johns Hopkins. Significa o estudo da política. Mas o que é política? Segundo Dias (2011), a definição do termo política foi dada pelos gregos. Este povo vivia em cidades ou estados conhecidos como polis. Do termo polis vem os adjetivos "politiké" (política em geral) e "politikós" (dos cidadãos, pertencente aos cidadãos). Ainda segundo Dias, o termo política é usado também para representar uma atividade ou conjunto de atividades que tem como referência a polis ou, em outras palavras, o Estado. Max Weber, citado por Dias (2011), diz que o conceito da palavra política é bastante amplo e abrangente. O termo pode ser usado para indicar a política de desconto de um banco, política de greve de um sindicato, política da diretoria de uma associação e, até, da política de uma esposa para controlar o marido. Para Weber, política é o conjunto de esforços feitos com vistas a participar ou influenciar a divisão do poder. Política também significa a arte ou ciência da organização, direção e administração de nações ou Estados. Nesse sentido temos a política interna - aplicação desta ciência aos negócios internos da nação - e política externa - referente aos negócios externos. 2.1 Outros significados No sentido mais simples, política representa a arte de guiar ou influenciar o modo de governo pela organização de um partido político, pela influência da opinião pública, pela aliciação de eleitores. 4 Para Hobbes, política consiste nos meios adequados à obtenção de qualquer vantagem. Já Rousseau, ensina que política é o conjunto dos meios que permitem alcançar os efeitos desejados. Enquanto que para Maquiavel, política é a arte de conquistar, manter e exercer o poder, o governo. Política pode ser ainda a orientação ou a atitude de um governo em relação a certos assuntos e problemas de interesse público: política financeira, política educacional, política social, política do café com leite. Dos diversos significados podemos inferir que política pode ser entendida como tudo aquilo que acontece nas relações sociais e que envolve poder. Sendo assim, os conceitos mais apropriados para o nosso curso são: 1) Política é a arte ou ciência da organização, direção e administração de nações e Estados; 2) Política é o conjunto de esforços feitos com vistas a participar ou influenciar a divisão do poder. Dessa forma, podemos relacionar a política e suas aplicações nos negócios privados (empresas) e reescrever: Política significa a arte ou ciência da organização, direção e administração de nações ou Estados e empresas. 2.2 Objeto da ciência política Em 1948 a UNESCO – Organização para a Educação, a Ciência, e a Cultura das Nações Unidas – promoveu um encontro entre cientistas políticos com o objetivo de estabelecer o objeto da disciplina Ciência Política. Duas posições se destacaram: 1) a que defendia que a ciência política tem como o objeto do estudo o poder; e. 2) a que defendia que o objeto de estudo da ciência política é o Estado. 5 Não havendo consenso, a UNESCO elaborou um rol de objetos de estudos. Estes objetivos foram divididos em quatro grandes áreas. Vejamos: Área I – Teoria política a) Teoria política b) História das idéias políticas Área II – Instituições políticas a) A constituição b) O governo central c) O governo regional e local d) A administração pública e) As funções econômicas e sociais do governo Área III – Partidos Grupos e Opinião Pública a) Os partidos políticos b) Os grupos e associações c) A participação do cidadão no governo e na administração d) A opinião pública Área IV – As relações internacionais a) A política internacional b) Os organismos internacionais c) O direito internacional Esta sugestão da UNESCO não esgota os objetos de estudo da ciência política, pois muitos autores apontam outros focos de observação. 3. Sistema político Um sistema político é definido por Robert Dahl, citado por Dias (2011), como qualquer padrão permanente de relações humanas que implique de maneira significativa, em poder, governo ou autoridade. Este sistema tem as seguintes características: a) Controle desigual dos recursos políticos Recurso político é meio pelo qual uma pessoa consegue influenciar o comportamento de outras pessoas. Em geral os recursos políticos - 6 representados por dinheiro, informação, alimento, empregos, amizade, posição social, direito de elaborar leis ou votos - são distribuídos de maneira desigual. b) Busca de influência política A busca da influência política acontece quando um membro do sistema procura adquirir controle sobre as diretrizes, regras e decisões determinadas pelo governo. c) Distribuição desigual da influência política A distribuição desigual da influência política, em geral, está relacionada com o controle desigual ou o uso eficiente dos recursos políticos. d) Objetivos conflituosos Conflito e consenso são aspectos presentes e importantes de qualquer sistema político, pois os membros do sistema nem sempre tem os mesmo pensamentos. e) Aquisição de legitimidade A legitimidade é o meio pelo qual os líderes de um sistema político procuram transformar sua influência em autoridade. A legitimidade pode ser conseguida por meio da força, mas também por meio da convicção. f) Desenvolvimento de uma ideologia Ideologia é um conjunto de doutrinas (princípios). Nos sistemas políticos, normalmente os líderes procuram desenvolver ou adotar uma ideologia para legitimar sua liderança. g) Impacto de outros sistemas políticos O comportamento de um sistema político é, em geral, influenciado pela existência de outros sistemas políticos. h) Influência da mudança O comportamento de um sistema político é, em geral, influenciado pela existência de outros sistemas políticos. 4. As origens do pensamento político È consenso entre os estudiosos da ciência política que a Grécia é o berço do pensamento político. A política tinha uma importância muito grande para os gregos e é lá que surgem os primeiros mestres desta ciência. 7 4.1 Os sofistas Os primeiros mestres ou especialmente o primeiro grupo de pensadores políticos foram os sofistas. Sofística era originalmente o termo dado às técnicas ensinadas por um grupo altamente respeitado de professores retóricos na Grécia antiga. Protágoras, Górgias e Prodico foram os principais expoentes deste grupo de pensadores que defendia a ideia de que o homem é a medida de todas as coisas e que cada individuo podia definir, de acordo com suas crenças, o que era direito. Esta ideia expressa o sentido de que o ser humano não deve adequar-se aos padrões estabelecidos sem contestação, mas sim moldar-se segundo a sua liberdade. Os sofistas são considerados os primeiros advogados do mundo, pois cobravam de seus clientes (discípulos) para efetuar suas defesas, dada sua alta capacidade de argumentação. 4.2 Platão Platão é considerado um dos primeiros filósofos políticos. As idéias de Platão sugerem que as pessoas devem se sujeitar a um governo composto dos melhores indivíduos. Platão considerava que a política como a arte de tornar os homens mais justos e virtuosos. Sua obra mais importante é “A república” (Escreveu também “O político e As leis”.) onde defende que a autoridade governamental tem que estar associada à cultura e ao conhecimento mais amplo, e que o filosofo deve ser o homem de Estado. 4.3 Aristóteles Aristóteles foi discípulo de Platão. Entretanto, difere bastante do mestre no que diz respeito ao método e os pontos de vista sobre o sistema político. 8 Aristóteles defendeu a ideia de que a ciência política tem como principal objetivo a busca do bem estar comum. Neste sentido, o Estado é o meio adequado para satisfazer as necessidades intelectuais e morais dos homens. Somente através do Estado o homem poderia alcançar seus fins essenciais. Para ele o homem era um animal político (zoon politikón). Fora da vida social o homem seria considerado uma besta. Para Aristóteles cada individuo teria sua função no Estado segundo suas aptidões. Assim, os homens aptos para governar seriam aqueles dotados de altas condições espirituais. Os que tinham somente vigor físico e pouca cultura não poderiam governar. Desta forma a escravidão seria útil e benéfica para todos. Segundo Aristóteles há uma diferença clara entre Estado e governo. O Estado é representado pelo total dos cidadãos, enquanto o governo é o exercício daqueles que, ocupando os postos públicos e detendo o poder, ordenam e regulam a vida dos outros. 5. Maquiavel Além dos clássicos gregos muitos autores contribuíram para o desenvolvimento da ciência política. No entanto, cabe destacar os ensinamentos Nicolau Maquiavel. A partir de sua obra “O Príncipe” a política passa a ser entendida como um conjunto de técnicas, táticas e estratégias em função do poder. 6. Karl Marx Marx também dá uma importante contribuição à teoria política com sua visão materialista da história. Para Marx, os fatores econômicos determinam as mudanças na vida das pessoas. 7. Os contratualistas 9 Hobbes, Locke e Rousseau também são importantes fontes de estudo de política, principalmente no que se refere a constituição do Estado. 8. A igreja e a concepção do Estado Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino são os pensadores cristãos que mais se destacaram no estudo do poder político, em especial no estudo do poder político. Bibliografia Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011. 10 Textos para discussão Política e Gestão Empresarial Gutemberg B. de Macêdo - 29.10.2010 - http://www.oprincipiodasabedoria.com/?p=312 “Se você deseja uma descrição de nossa era, eis aqui uma: a civilização dos meios sem os fins; opulenta em meios para além de qualquer outra época, e quase para além das necessidades humanas, mas esbanjando-os e utilizandoos mal porque não possui nenhum ideal soberano; um vasto corpo com uma alma esquálida.” R. W. Livingston, 1880-1960 - Escritor inglês O conhecimento e a prática da ciência política nos dias atuais é imprescindível e insubstituível. Nenhum profissional deveria se abster, sob qualquer justificativa, de exercer os seus deveres de cidadãos em todos os instantes de sua vida. E, mais importante ainda, nenhum profissional, por mais preparado que seja, deveria assumir uma posição de liderança se não a conhecesse e a dominasse em profundidade. A ausência desse conhecimento e de sua prática no dia-a-dia de suas atividades é a responsável pelo avanço dos maus políticos e das políticas governamentais comprovadamente equivocadas. Eis alguns dos motivos: 1 - O homem é um ser eminentemente político. Portanto, o profissional que não se ocupa do estudo e da prática da ciência política, já tomou a decisão política de que gostaria de ter-se poupado: serve a classe política dominante e contribui para a proliferação e avanço de pseudos líderes – governantes despreparados, populistas e corruptos. 2 - A intervenção dos governantes em todos os campos das atividades humanas. Nesse caso, quando tremendos poderes se concentram nas mãos de alguns poucos políticos e nenhum profissional é capaz de compreender as conseqüências desastrosas dessa tendência, a sociedade está prestes à mergulhar num sistema ditatorial sem que ao menos percebam. [...] 3 - A maioria absoluta dos brasileiros jamais leu ou estudou a constituição de seu país. São cidadãos cegos e fáceis de serem manipulados. Eles não sabem quais são os seus verdadeiros deveres e direitos constitucionais. E, por não saberem quais são eles, se tornam cidadãos de terceira categoria e sujeitos a serem influenciados e governados por políticos corruptos, despreparados, mentirosos e populistas. 4 - O Brasil está enterrando rápida e sorrateiramente todos os seus valores, se é que eles existiram algum dia ao longo de sua história republicana. A avaliação internacional do povo brasileiro, na questão de ser capaz de perceber a 11 corrupção, e de se insurgir contra ela, chega a ser constrangedora e vergonhosa para homens e mulheres com princípios éticos e morais. [...] 5 - É um erro muito comum entre os cidadãos de acreditar que aqueles que fazem mais barulho ao se lamentar a favor do público sejam os mais preocupados com o seu bem-estar. Na verdade, a maioria deles se vale da causa alheia para defender, proteger e manter os seus interesses pessoais e mesquinhos. R. Hooker, teólogo anglicano, 1554-1600, “Of the Laws of Ecclesiastical Polity”, I, 1, escreveu: “Quem tenta convencer uma multidão de que ela não está sendo tão bem governada como deveria, nunca deixará de ter ouvintes atentos e favoráveis.” 6 - Aqui, vale lembrar as sábias palavras do político alemão e o grande líder da resistência alemã ao nazismo, Konrad Adenauer, 1876-1967, “É muito importante que a tarefa da oposição seja exercida por um grande partido, fixado em bases democráticas”… Considero que uma boa oposição num parlamento seja uma necessidade absoluta; sem uma oposição realmente boa, cria-se acescência e esterilidade. Infelizmente, no Brasil não há oposição e, mais triste ainda, o Congresso Nacional se tornou um grande balcão de negócios e Brasília, um grande shopping center de barganhas políticas fétidas. À luz dessas considerações, qual o caminho proposto às empresas e aos seus profissionais? Primeiro – Colocar os holofotes sobre os reais problemas do país que são bem diferentes dos comumente propalados pelos governantes na televisão. Estamos muito mal colocados no ranking de desenvolvimento humano e qualidade de vida e assistimos passivamente a deterioração, obsolescência e desindustrialização do país, enquanto outros países estão se desenvolvendo rapidamente. Segundo – Promover a valorização da educação e do conhecimento em todos os níveis sociais como únicas fontes de emancipação da mente. Quem leu a entrevista dada pelo reitor da Universidade de São Paulo à revista Veja, 27 de outubro de 2010, deve ter ficado assombrado como algumas de suas afirmações: “Nossas universidades ainda são medievais perto das novas exigências;” “O ensino superior no Brasil está hoje em nível semelhante ao dos Estados Unidos um século atrás,” entre tantas outras. Terceiro – Empresários e executivos deveriam promover em suas empresas cursos sobre a ciência política, a fim de afastar de seu meio a ignorância, a influencia de líderes sindicais corruptos, autoritários, truculentos e sem nenhum compromisso com a democracia. Quarto – Empresários e executivos não deveriam ficar passivos diante dos discursos demagógicos de líderes políticos e sindicais que pregam um 12 socialismo barato e de fachada. E, além disso, atribuem todos os males da sociedade moderna ao capitalismo. É bom frisar, não existe desenvolvimento, progresso, inovação e sustentabilidade sem riqueza. [...] Quinto – Promover a competição entre todos os setores da economia é vital para o desenvolvimento do país. A sociedade não pode continuar pagando impostos para pagar salários e benefícios a uma classe de profissionais que pouco contribui para o aprimoramento das instituições públicas e dos serviços que prestam. Estão aparelhando o estado e inchando a máquina do governo e ela se apresenta cada vez mais ineficiente. Mas poucos falam contra esse desmando. Continuamos como nos dias do jurista Rui Barbosa a procurar os cargos para os homens e não os homens para os cargos. O melhor exemplo que encontrei na história foi dado pelo general Robert Wood Johnson, ex-Chief Executive Officer da Johnson & Johnson, que diante dos problemas que assolavam os Estados Unidos em seus dias, implementou em sua organização, na década de quarenta, um programa de consciência e preparo político para todos os seus colaboradores. A sua premissa era: “No man in business can be successful unless he has some knowledge of practical politics.” (Nenhum homem poder ser bem sucedido no mundo dos negócios a menos que tenha algum conhecimento prático de política) 13 O homem e a máquina Cristiane Mano - São Paulo – Revista Exame – Edição 1.005 – 30.11.2011. pág. 48 Mesmo para os padrões brasileiros, poucas vezes na história os políticos causaram tanta repulsa — mais do que justificada, diga-se — quanto agora. A sequência de escândalos de corrupção já derrubou cinco ministros da presidente Dilma Rousseff, o sexto está cada vez mais enrolado em suas próprias mentiras e, agora, a bolsa de apostas se sofisticou — especula-se não somente quais os próximos da lista mas também a ordem com que seguirão para o cadafalso. Brasília nunca mereceu tanto a alcunha de ilha da fantasia, um lugar onde uma minoria parece conspirar diariamente para sugar o dinheiro de quem trabalha. Tudo, lá, opera a favor do “malfeito”, para usar uma expressão cara à presidente. Temos quase 40 ministérios. Quase 1 milhão de pessoas trabalham para o governo federal, das quais 20 000 são apadrinhadas nos chamados “cargos de confiança”. O orçamento do governo federal é de invejáveis 2 trilhões de reais, o que faz do mandatário brasileiro uma das pessoas que mais movimentam recursos em todo o mundo. Essa montanha de dinheiro circulando num ambiente de pouca transparência, em meio a um sistema político sedento por recursos, só podia dar no que deu. O Brasil é o 69º país mais corrupto da atualidade, segundo um ranking elaborado pela ONG Transparência Internacional. Temos uma das maiores cargas tributárias do mundo — sem que isso se materialize em serviços públicos de padrão digno. No relatório mais recente do Banco Mundial, divulgado em julho, o Brasil aparece na posição 136 entre 142 nações analisadas no quesito de qualidade de gastos do governo. O orçamento trilionário do governo é incapaz de financiar uma infraestrutura compatível com o tamanho de nossa economia. A máquina pública brasileira suga muito e devolve pouco, dando um exemplo de improdutividade e ineficiência que extrapola os limites das repartições, impõe travas ao crescimento e não serve o cidadão. 14 Mais de 15 anos atrás, o Brasil conseguiu vencer a instabilidade econômica, com as consequências que todos nós conhecemos. Agora, parece ser consenso que um novo salto do país só será possível se conseguirmos vencer o enorme desafio da melhoria da gestão pública. “O Brasil que estabilizou a moeda e voltou a crescer se vê obrigado, agora, a se tornar mais eficiente”, diz o cientista político Murillo de Aragão. Hoje, o rosto que melhor personifica essa busca é o do empresário Jorge Gerdau Johannpeter. Durante 56 anos de trabalho na iniciativa privada, Gerdau ajudou a construir o 12º maior grupo empresarial brasileiro, um conjunto de empresas ligadas à área siderúrgica espalhadas hoje por 14 países, com 45 000 funcionários e um faturamento global de 37 bilhões de reais. Sua trajetória e sua estatura como homem de negócios o colocaram na categoria de ministeriável. Recusou todos os convites. No último deles, porém, a conversa tomou um rumo diferente. O diálogo se deu em novembro do ano passado, num encontro a portas fechadas com Dilma, no escritório do governo de transição no Centro Cultural Banco do Brasil, em Brasília. Durante a reunião, Gerdau rabiscou o esboço do modelo que poderia levá-lo à equipe da presidente. De acordo com o modelo, Gerdau seria parte de uma espécie de conselho consultivo para projetos de melhoria da gestão pública. “Anotei algumas ideias e ela pediu para ficar com o papel”, diz. Ali surgiu o embrião do que se tornou, em maio deste ano, a Câmara de Políticas de Gestão, Desempenho e Competitividade. Presidida por Gerdau, a câmara é formada por representantes do governo e do setor privado. De um lado, estão quatro ministros — Gleisi Hoffmann, da Casa Civil, Guido Mantega, da Fazenda, Miriam Belchior, do Planejamento, e Fernando Pimentel, do Desenvolvimento. De outro, o ex-presidente da Petrobras Henri Philippe Reischtul, o presidente da Suzano Papel e Celulose, Antonio Maciel Neto, e o empresário Abilio Diniz, presidente do conselho de administração do Grupo Pão de Açúcar. Nenhum deles recebe remuneração pelo trabalho. 15 Há pouca coisa que une a rotina do Gerdau empresário à do Gerdau que circula por Brasília. À frente dos negócios, suas decisões significavam execução. No governo é diferente. À frente da câmara, Gerdau não tem autoridade para mudar o que bem entender. Não pode demitir quem se recusar a seguir os planos ou premiar os melhores desempenhos nem tem mandato para decidir livremente o escopo de atuação do grupo. O foco do trabalho da câmara foi definido por Dilma ainda em 2010 e se concentrou nos ministérios da Saúde e dos Transportes, na Infraero e nos Correios. Até agora, o grupo realizou sete reuniões oficiais no Palácio do Planalto — mas Jorge Gerdau já participou de quase uma centena de encontros com ministros e secretários de governo para discutir a importância e a necessidade de mudanças. Algumas medidas práticas, que contaram com o apoio de consultorias como McKinsey, Accenture e o INDG, do especialista em gestão Vicente Falconi, já começam a sair do papel. Uma das metas mais ambiciosas está nos Correios — entre aumento de receita e corte de custos, os ganhos previstos são de 1,5 bilhão de reais por ano. Os resultados, segundo os planos da câmara, começarão a aparecer em 18 meses. Outro projeto busca formas de reduzir a burocracia para licitação e execução de obras em rodovias e ferrovias. “É um modelo inédito de cooperação que nos permite perseguir metas objetivas”, diz a ministra Gleisi Hoffmann, uma das principais interlocutoras de Gerdau no governo. “A presidente Dilma tem acompanhado de perto os resultados.” Hoje, a câmara vale mais pelo simbolismo do que pelos resultados. Numa visão otimista, ela seria, antes de mais nada, o reconhecimento de que mudanças precisam ser feitas, o primeiro passo para a ação. Não é pouca coisa, mas também não é garantia de nada. “No Brasil, o governo federal é o reino da rigidez”, diz o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas. “Executar mudanças expressivas 16 nesse contexto é um trabalho heroico.” É evidente que Gerdau sabe disso. A máquina que ele quer ajudar a trabalhar tem, sim, funcionários comprometidos. Mas também está impregnada de gente que, por interesses pes-soais ou políticos, prefere que as coisas continuem exatamente como estão. E elas vão resistir. Gerdau sabe, ainda, que o sucesso de seu grupo depende da entrega de resultados nos próximos meses e anos — e do impacto que eles provocarão na opinião pública e, consequentemente, no meio político. “A burocracia é lenta. Exige paciência, insistência”, diz Gerdau. “Mas os resultados são tão grandes e tão fantásticos que vale a pena insistir. Esse movimento pode mudar o Brasil." Notas aos políticos Prestes a completar 75 anos de idade, Gerdau baseia sua confiança nas experiências que vem colecionando nos últimos anos com governos estaduais e municipais. Seu trabalho pela melhoria da gestão pública começou em mea-dos dos anos 2000 e se intensificou a partir de janeiro de 2007, quando transferiu a presidência executiva do grupo Gerdau a seu filho, André. Foi quando passou a buscar recursos e apoio de outros empresários para sustentar projetos de aumento de eficiência da máquina. O ceticismo, tanto de homens de negócios quanto de políticos, era enorme. “Muita gente não acreditava que pudesse dar certo”, diz Beto Sicupira, sócio da AB Inbev, o primeiro empresário a acompanhar Gerdau nas conversas com governadores. Os dois se conheceram por meio de um amigo em comum, o consultor Vicente Falconi, com quem ambos trabalhavam havia mais de duas décadas. As primeiras visitas a políticos interessados num choque de gestão, como Aécio Neves, então governador de Minas Gerais, e Eduardo Campos, de Pernambuco, sempre eram feitas pelo trio. Para escolher aqueles que mereciam uma segunda visita, Gerdau, Falconi e Sicupira criaram um sistema de notas que iam de zero a 100, de acordo com o interesse do político e as chances de sucesso. “Não voltávamos a conversar com quem recebia nota abaixo de 70”, diz Falconi. 17 Um dos governadores visitados ganhou nota zero após uma experiência que beirava o patético. “Fomos recebidos pela televisão local”, diz Falconi. “O governador pensou que o Gerdau tinha ido até lá para anunciar investimentos e não entendeu nada daquele discurso todo sobre gestão eficiente.” Hoje, Jorge Gerdau e seu grupo têm a seu favor os números. Mais precisamente 14 bilhões de reais em ganhos com aumento de receita e corte de despesas em programas de choque de gestão realizados em 11 governos estaduais e oito municípios. Trata-se de um retorno de quase 200 vezes o valor investido nos projetos de consultoria — boa parte dele financiada por mais de 200 empresários. “Em vez de insistir no embate puro e simples entre empresa e Estado, Gerdau construiu uma parceria em busca de soluções práticas numa proporção inédita”, diz Elcior Santana, responsável pela área de gestão pública do Banco Interamericano de Desenvolvimento, que estuda levar o modelo para outros países da América Latina. A aproximação com diversas esferas do poder, ao contrário do que pode parecer, é quase sempre um trabalho duro e sem glamour. Gerdau já chegou a visitar até quatro governadores num intervalo de dois dias. Recentemente, chegou às 8 da noite e saiu a 1 hora da manhã de um jantar em Londrina, no interior do Paraná, para arrecadar verbas para projetos de melhoria de efi-ciência na prefeitura. Um leiloeiro de gado foi chamado para animar os cerca de 400 convidados que fecharam uma cota de 2,6 milhões de reais, suficiente para cobrir todos os custos com o início do projeto. (Estima-se que, nos últimos cinco anos, o carioca Jorge Gerdau tenha colocado mais de 15 milhões de reais de seu próprio dinheiro em projetos de Porto Alegre, sua cidade por adoção.) Mesmo depois de assumir a dianteira da câmara de políticas de gestão do governo federal, ele faz questão de marcar o primeiro encontro pessoalmente com novos interessados em montar programas de choque de gestão. Em dezembro, tem previsto em sua agenda um encontro com o prefeito de Criciúma, em Santa Catarina. 18 “Em geral, a aproximação entre empresários e o setor público acontece muito mais para prestígio mútuo do que para a obtenção de resultados práticos”, diz Sicupira. “Com o Gerdau é diferente.” Boas ideias na gaveta Encarar o trabalho na administração federal é encarar o risco de frustração. Há anos, Gerdau tenta reproduzir em Brasília pelo menos parte do sucesso obtido em algumas cidades e estados do país. Em 2007, estudos para a reestruturação do sistema de Previdência Social apontaram ganhos de até 50 bilhões de reais em quatro anos — num projeto que incluía um amplo esforço para acabar com as fraudes na área. A proposta esbarrou em alas mais resistentes do governo e nunca foi levada adiante. Um ano depois, outro projeto propôs a redução de 2 bilhões de reais de custos em diversos ministérios, numa ação coordenada pela pasta do Planejamento. A meta também nunca foi atingida. “Temos uma tradição de ministérios encastelados, que funcionam sob a lógica de um jogo de poder extremamente complexo”, diz Aragão. Tradução: para não perder apoio no Congresso, os presidentes costumam simplesmente deixar na gaveta os projetos que confrontem a base aliada, instalada em ministérios loteados. Dilma fugirá dessa armadilha? Uma conjunção de fatores, acredita Gerdau, pode tornar o momento atual mais favorável a mudanças. Um deles, que facilitou o avanço da conversa com a presidente no final do ano passado, é a proximidade entre os dois. Ambos se conheceram nos anos 80, quando Dilma ocupou a Secretaria Municipal da Fazenda de Porto Alegre, no governo de Alceu Collares. Mas foi entre 2003 e 2010, período em que ela presidiu o conselho de administração da Petrobras (do qual Gerdau faz parte desde 2001), que os dois encontraram afinidades. “Tivemos uma relação muito próxima. As reuniões eram mensais e duravam até 7 horas. Percebemos que tínhamos opiniões convergentes sobre temas de gestão”, diz Gerdau. 19 O relacionamento evoluiu para um contato frequente — hoje, eles se falam pelo menos uma vez por semana, pessoalmente ou por telefone. “Ela quer saber o tempo todo como está o andamento dos projetos, quais são as dificuldades e está sempre pronta para resolver”, afirma Gerdau. Um dos exemplos mais recentes diz respeito à burocracia na contratação de consultorias envolvidas nos projetos — que quase sempre esbarram em lentos e ineficientes processos de licitação. Segundo Gerdau, ao perceber o problema, Dilma decidiu fechar os contratos de maneira centralizada na Presidência, num processo que exigiu um trâmite já aprovado na Procuradoria-Geral da União. “Há uma evolução cultural em torno do tema da gestão pública”, diz o empresário. “Noto que as portas estão abertas para avançar.” Para os políticos, as portas se abrem na medida em que os votos se multiplicam. E esse talvez seja o maior dos trunfos de Gerdau e seus companheiros. O choque de gestão promovido em Minas Gerais fez com que Aécio Neves fosse eleito por duas vezes governador do estado e ainda fizesse seu sucessor, Antonio Anastasia. Em Pernambuco, outro estado a perseguir metas de eficiência, Eduardo Campos reelegeu-se com mais de 80% dos votos válidos. É o que Jorge Gerdau chama de “contrato inteligente”. “Com resultados assim, alguns começam a ver esses projetos como oportunidade, não como ameaça”, diz o conselheiro Antonio Maciel Neto, presidente da Suzano. Confiança mútua é fundamental para a lógica de interação desenvolvida por Gerdau. Nos projetos estaduais e municipais, tornou-se praxe o acompanhamento dos resultados das mudanças — conduzido sempre por um grupo de empresários envolvidos em suas metas desde o início. É o que acontece há cerca de cinco anos em Pernambuco. As reuniões no estado ocorrem três vezes por ano e reúnem seis empresários, entre os quais o próprio Gerdau. “Prestamos contas dos resultados e aprendemos a acompanhar de perto o que acontece aqui dentro”, diz o governador Eduardo Campos, que conseguiu 20 dobrar a capacidade de investimento apenas com uma gestão mais eficiente. Na câmara, a função dos conselheiros é reproduzir a mesma cultura de acompanhamento. Os projetos pioneiros escolhidos por Dilma visam obter resultados rápidos, de modo a encorajar novas iniciativas. Além disso, também vão aliviar situações emergenciais. Um deles, conduzido com a ajuda da consultoria Accenture, busca reduzir o tempo de embarque e desembarque de passageiros no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo. As medidas ainda estão sendo estudadas, mas deverão incluir alterações óbvias, como direcionar passageiros barrados pelo detector de metais para uma fila separada, em vez de fazê-los atrasar a passagem dos demais. Os primeiros resultados são esperados para dezembro. Juntamente com a consultoria McKinsey, a câmara vem trabalhando na criação de uma nova metodologia de acompanhamento de projetos do governo. A ideia é impor uma padronização das informações prestadas e uma regularidade de prestação de contas em cerca de dez projetos prioritários, como a execução de obras para a Copa do Mundo de 2014. O modelo é a delivery unit, criada pelo ex-premiê britânico Tony Blair no início dos anos 2000. Até 2002, entre 20% e 25% dos pacientes ingleses passavam mais de 4 horas nos prontos-socorros em hospitais e centros de saúde — um percentual considerado alto demais. Os projetos de definição de prioridades fizeram esse patamar baixar para apenas 4% em 2005. Os ganhos chegaram a 44 milhões de libras por ano. Nas mãos do novo primeiro-ministro, David Cameron, a unidade foi fechada no ano passado, o que evidencia outro desafio da gestão pública — a continuidade. O verdadeiro teste Quais as chances de Gerdau e seu time liderarem uma mudança cultural em Brasília? O lamentável histórico brasileiro no terreno da gestão pública sugere cautela. Gerdau estima que um trabalho abrangente realizado em todos 21 os ministérios possa trazer ganhos de até 80 bilhões de reais nos próximos anos, mas ele próprio admite que, por ora, seu escopo de trabalho é tímido. Para alguns analistas, a Câmara poderá ter bons resultados em projetos isolados, mas o teste definitivo só viria depois de enfrentar áreas mais pantanosas. É o caso do Ministério dos Transportes, em que as metas são diminuir em até 70% o tempo de execução das obras do governo federal e cortar o desperdício de recursos em 30% num prazo de 24 meses. Além da burocracia, a mudança nessa área deverá esbarrar em outros males arraigados. Boa parte da cúpula do ministério foi demitida em julho após denúncias de superfaturamento e recebimento de propina. Quem se dispuser a enfrentar os bandos que dominam feudos inteiros do governo terá de desmontar práticas consolidadas no país desde a redemocratização. Conseguirá Dilma trilhar um caminho diferente de seus antecessores na luta por apoio da classe política? O Brasil está pronto para virar uma página e dar um salto na administração do dinheiro público? Gerdau diz acreditar que sim — e a imensa maioria dos brasileiros espera que ele esteja certo. “Sabemos que vai demorar”, diz Gerdau. “Mas para persistir é preciso manter o idealismo.” Com reportagem de Alexa Salomão e Luiza Dalmazo. 22 CAPITULO II O que veremos neste capítulo: Evolução Histórica do Pensamento Político. Grécia e Roma. Maquiavel e a Administração. Maquiavel em resumo. Pensamento Político Contemporâneo. “Não há nada mais difícil do que planejar, mais duvidoso do que obter sucesso, nem mais perigoso de administrar que a criação de uma nova ordem das coisas... Uma vez que os inimigos tenham a ocasião de atacar o inovador, eles o farão com a paixão de um guerrilheiro, enquanto os outros o defenderão tão preguiçosamente, que o inovador e seus parceiros se tornarão vulneráveis”. Maquiavael 1. Introdução No capítulo 1 iniciamos nosso curso de Ciência política, conhecendo primeiramente a origem e o significado da palavra política. Embora no contexto atual, quando ouvimos esta palavra geralmente fazemos uma associação negativa, ela significa a arte da organização, direção e administração de nações, Estados e também das empresas. Desta forma, a sua ligação com o poder é indiscutivel. A ciência política por sua vez é o estudo da política e, consequentemente sobre o poder. Segundo Bonavides (2010), ciência política, em sentido amplo, é o estudo dos acontecimentos, das instituições e das ideias políticas tanto no passado, quanto no presente e possibilidades futuras. A evolução desta ciência que tem fortes vinculos com a filosofia, direito constitucional, história, psicologia, sociologia e, principalmente com a 23 economia, vem da Grécia Antiga, uma sociedade baseada na escravidão mas também um modelo de democracia. Platão, em sua obra “A República”, já fazia referências à especialização do trabalho e da produção. A ciência política atravessou diversas fases, passando de uma posição mais filosófica a outra mais materialista e naturalista. Esta última, fundamentada pelo positivismo, movimento com raízes historicas na Revolução Industrial. Mas foi na Grécia que surgiram os primeiros pensadores políticos, com destaque para Platão e Aristotóles. Além destes, não podemos esquecer o italiano Maquiavel, que ao rejeitar a tradição idealista de Platão e Aristoteles mostra outro sentido para a política e o poder. Vejamos a seguir um pouco mais sobre estes pensadores e a evolução do pensamento político. 2. A política na Grécia antiga. A vida política na Grécia antiga tinha como uma de suas principais características a realização das assembléias onde todos os membros da polis podiam participar. Entretanto, somente aqueles que estivessem habilitados a disputar o cargo de rei poderiam opinar. Estar habilitado significava possuir alguns recursos políticos tais como terras e o apoio de outros membros importantes da polis. Fato interessante era que, apesar de permitir a expressão das opiniões, a assembléia não decidia nada. Era um lugar de discussão, não de deliberação. Essa cabia unicamente ao rei decidir. Apesar disso, este procedimento mostra que os antigos gregos consideravam a participação dos cidadãos como fator fundamental de sustentação do poder político, e não no uso, ou ameaça do uso, da força estatal em si. Na verdade, a visão política dos gregos acerca da cidadania e da responsabilidade do indivíduo para com o Estado se apoiava, principalmente, 24 mas não exclusivamente, na noção da integração voluntária do cidadão ao processo de tomada de decisões políticas e na sua respectiva execução responsável por parte daqueles cidadãos encarregados da administração política da cidade-estado (a polis). O poder de coerção do Estado, ainda que reconhecido e aceito como algo necessário, ocupava um lugar de menor importância na escala de valores políticos da civilização grega. 2.1 O pensamento platônico As idéias de Platão não se limitavam ao campo da política. Como filosofo ele escreveu sobre o amor, conhecimento, política e sobre o homem e alma. No que se refere ao conhecimento, Platão defendia a ideia de que o filosófico, contido na alma, representava o verdadeiro conhecimento, embora admitisse a existência do conhecimento técnico. Platão certa vez escreveu: “Os males não cessarão para os humanos antes que a raça dos puros e autênticos filósofos chegue ao poder, ou antes, que os chefes das cidades, por uma divina graça, ponham-se a filosofar verdadeiramente.” (Platão, Carta Sétima, 326b). Sobre o poder político, o homem e sua alma, Platão acreditava que as virtudes humanas, em número de três, estavam baseadas na alma. Acreditava também que o homem era dividido em duas partes: I) O corpo – a matéria – que mudava ao longo da vida; e II) A alma – a parte imaterial e divina – que não sofria alteração durante a vida. Para Platão a alma é divida em 3 partes: I – Racional (Que se baseia no raciocínio): cabeça; esta tem que controlar as outras duas partes. Sua virtude é a sabedoria ou prudência. II – Irascível (Que se irrita facilmente): tórax; parte da impetuosidade, dos sentimentos. Sua virtude é a coragem. 25 III – Concupiscente (desejo forte): baixo ventre; apetite, desejo carnal (sexual), ligado à libido. Sua virtude é a moderação ou temperança. A interação entre virtude, corpo e alma determinava a posição que o cidadão ocuparia na hierarquia da pólis, como evidenciado a seguir. A alma e as virtudes segundo Platão Virtude Tipo de alma Orientação Parte do corpo Posição na polis Sabedoria Ouro Razão Cabeça Governante Coragem Prata Vontade Tórax Soldado Moderação Bronze Desejo Baixo ventre Trabalhador Platão acreditava que a alma depois da morte reencarnava em outro corpo, mas a alma que se ocupava com a filosofia e com o Bem, esta era privilegiada com a morte do corpo. A ela era concedida o privilégio de passar o resto de seus tempos em companhia dos deuses. Por meio da relação de sua alma com a Alma do Mundo, o homem tem acesso ao mundo das Idéias e aspira ao conhecimento e às idéias do Bem e da Justiça. A partir da contemplação do mundo das Idéias, o Demiurgo (divindade responsável pela criação do universo), tal como Platão descreveu, organizou o mundo sensível. Não se trata de uma criação ex nihilo, isto é, do nada, como no caso do Deus judaico-cristão, pois o Demiurgo não criou a matéria nem é a fonte da racionalidade das Idéias por ele contempladas. A ação do homem se restringe ao mundo material; no mundo das Idéias o homem não pode transformar nada. Pois, se é perfeito, não pode ser mais perfeito. 2.2 Aristóteles Aristóteles, discipulo de Platão, preocupou-se mais em analisar as diferentes formas de estado (monarquia, aristocracia, governo constitucional, 26 tirania, oligarquia, democracia). Esta posição contrastava com a do seu mestre que defendia, como vimos, a ideia de uma classe dominante de "reis filósofos". Analisadas sob a ótica do pensamento econômico, as posições defendidas pelos dois mostram que, enquanto Platão tinha desenhado um modelo de sociedade com base na Platão imaginava a sociaedade ideal como sendo aquele em que a proriedade fosse comum a todos. De forma diferente, Aristóterles acreditava na sociedade baseada na propriedade privada. propriedade comum de recursos, Aristóteles via este modelo como um anátema (maldição). Para ele um modelo baseado na propriedade privada seria mais apropriado, mas o dinheiro serviria somente como um meio de troca, nada mais do que isto. Aristóteles escreveu certa vez: "É claramente melhor que a propriedade seja privada, mas o uso dela em comum deve ser incentivada pelo legislador". Ele desaprovava a usura e o lucro através do monopólio. 3. O pensamento político em Roma Os romanos assimilaram muitos aspectos da cultura dos povos vencidos, principalmente dos gregos. Dotados de notável senso prático, souberam reelaborar essas influências, nas quais introduziram inovações que levaram à formação de uma cultura original. Com isso, acabaram por legar às gerações futuras várias contribuições nas mais diversas áreas. No que se refere ao pensamento político, Cícero foi o nome de maior destaque. Como escritor, foi ele quem apresentou aos Romanos as escolas da filosofia grega. Além de escritor talentoso foi um ardoroso defensor da república como forma de governo, colocando-se inclusive contra o império. 4. Maquiavel É reconhecido como fundador do pensamento e da ciência política moderna, pelo fato de haver escrito sobre o Estado e o governo como realmente são e não como deveriam ser. 27 Os pensadores que o precederam eram idealistas, orientados por crenças religiosas medievais. Maquiavel inverteu estas lógicas. Para ele, não havia meios que os fins não justificassem nem códigos morais que não pudessem ser transgredidos, nem princípios religiosos que reprimissem o governante. Surge então o termo razão de Estado, que tem o seguinte significado: O governante deve se valer de qualquer meio, independente de tal estratégia ser moralmente aceita ou não para garantir a integridade do Estado. De outra forma, caso o Estado não seja capaz de impor suas ordens de modo irresistível, é impossível garantir a ordem pública e qualquer progresso moral, econômico ou civil. Vem daí as famosas palavras de Maquiavel: “os fins justificam os meios”. Maquiavel entrou para a política aos 29 anos de idade no cargo de Secretário da Segunda Chancelaria. Nesse cargo, ele observou o comportamento de grandes nomes da época e os adicionou aos conceitos da antiguidade clássica que estudou para fundamentar suas ideias. O Príncipe, publicado em 1532, é sua obra mais conhecida. Nela, defendeu a centralização do poder político, mas não propriamente o absolutismo, já que acreditava na república como forma de governo. Suas ideias foram desenvolvidas em uma época em que a Itália estava dividida em diversos pequenos Estados, entre repúblicas, reinos, ducados, além dos Estados da Igreja. Esta divisão levava a constantes disputas de poder entre esses territórios, a ponto de os governantes contratarem os serviços de mercenários com o intuito de obter conquistas territoriais. É neste cenário, que Maquiavel defende a unificação como forma de acabar ou minimizar os conflitos. Entretanto, uma leitura apressada das suas obras pode levarnos a entendê-lo como um defensor da falta de ética na política, em que os fins justificam os meios e não como uma estrategista. É o que nos revela alguns estudos recentes sobre sua obra, que admitem a interpretação errônea do seu 28 pensamento ao vincular o adjetivo maquiavélico, criado a partir do seu nome, aos conceitos de esperteza, astúcia e até maldade. Em o Príncipe, ele apresenta os tipos de principados existentes e expõe as características de cada um deles. A partir daí, defende a necessidade do príncipe formar seus exércitos próprios e após tratar do governo propriamente dito e dos motivos por trás da fraqueza dos Estados italianos, conclui dizendo que um novo príncipe conquiste e liberte a Itália. Suas considerações e recomendações aos governantes sobre a melhor maneira de administrar o governo caracterizam a obra como uma teoria do Estado moderno. É importante repetir que a obra de Maquiavel não deve ser analisada sem se considerar o contexto em que foi produzida. O método utilizado por ele de romper com a tradição vigente (medieval), e fundamentar-se no empirismo e na análise dos fatos recorrendo a experiência passadas - especialmente da Roma antiga – é um marco na forma de análise e estratégia. Além disso, ele foi o primeiro a propor uma ética para a política diferente da ética religiosa, ou seja, a finalidade da política seria a manutenção do Estado. Entre os conceitos mais importantes criados ou defendidos por Maquiavel estão os de virtù e o de fortuna. Estes conceitos são empregados várias vezes por Maquiavel em suas obras. Para ele, a virtù seria a capacidade de adaptação aos acontecimentos políticos que levaria à permanência no poder. A virtù seria como uma barragem que deteria os desígnios do destino. Mas segundo o autor, em geral, os seres humanos tendem a manter a mesma conduta quando esta frutifica e assim acabam perdendo o poder quando a situação muda. 29 Já a fortuna2 representa as coisas inevitáveis que acontecem aos seres humanos (sorte ou falta de sorte). Para Maquiavel, o governante que possuisse a virtú consquistaria também a fortuna. Outro ponto importante das ideias de Maquiavel é a referência a natureza humana. Para ele, a natureza humana seria essencialmente má e os seres humanos desejam sempre obter os máximos ganhos a partir do menor esforço, apenas fazendo o bem quando forçados a isso. A natureza humana também não se alteraria ao longo da história fazendo com que seus contemporâneos agissem da mesma maneira que os antigos romanos e que a história dessa e de outras civilizações servissem de exemplo. Assim, o governante não deveria esperar o melhor dos homens ou que estes fizessem o que se espera deles. 4.1 Maquiavel e a Administração Os autores Luiz Roberto Antonik e Aderbal Nicolas Muller em sua obra “O Príncipe revisitado: Maquiavel e o mundo empresarial”, mostram que os ensinamentos de Maquiavel estão bem atuais e no mundo dos negócios ao contrário do que ensinam certos teóricos da administração - a prática e o conhecimento nos ensinam que um pouco de maldade, estresse e desafio são indispensáveis para o bom resultado, e isso apenas se obtêm com pessoas certas. Embora O Príncipe tenha sido escrito para descrever as maneiras de se conduzir os negócios públicos internos e externos e, fundamentalmente, como conquistar e manter um principado, seus ensinamentos são facilmente aplicáveis também aos negócios privados. 2 A idéia de fortuna em Maquiavel vem da deusa romana da sorte e representa as coisas inevitáveis que acontecem aos seres humanos. Não se pode saber a quem ela vai fazer bens ou males e ela pode tanto levar alguém ao poder como tirá-lo de lá, embora não se manifeste apenas na política. http://pt.wikipedia.org/wiki/Nicolau_Maquiavel 30 Como observador do comportamento humano, Maquiavel foi um renovador de costumes, um agente de mudanças, um estrategista. Suas observações de Maquiavel podem ser comparadas a postura de gestores, sejam eles chamados de líderes, gerentes, coordenadores ou governantes. 4.2 Maquiavel em resumo 4.2.1 Pensamentos sobre a Sociedade - Processo de ascensão do capitalismo: mercantilismo. - Desenvolvimento do Estado Nacional: soberanos locais são absorvidos pelo fortalecimento das monarquias e pela crescente centralização das instituições políticas (cortes de justiça, burocracias e exércitos) . - Estado absoluto: preserva a ordem de privilégios aristocráticos (mantendo sob controle as populações rurais), incorpora a burguesia e subordina o proletariado incipiente. 4.2.2 Pensamentos sobre a natureza humana - Racionalidade instrumental: busca o êxito, sem se importar com valores éticos. - Cálculo de custo/benefício: teme o castigo. - Homem possui capacidades: força, astúcia e coragem. - Homem é vil, mas é capaz de atos de virtude. - Mas não se trata da virtude cristã. - O homem não muda. 4.2.3 Pensamentos sobre a Política - Política: é mostrada como esfera autônoma da vida social. - Não é pensada a partir da ética, nem da religião e nem da filosofia: rompe com os antigos e com os cristãos. passa a ser campo de estudo independente. - A vida política tem regras e dinâmica independentes de considerações privadas, morais, filosóficas ou religiosas. 31 - Política é a esfera do poder por excelência. - Política é a atividade constitutiva da existência coletiva: tem prioridade sobre todas as demais esferas. - Política é a forma de conciliar a natureza humana com a marcha inevitável da história: envolve fortuna e virtu. - Fortuna: contingência própria das coisas políticas: não é manifestação de Deus ou Providência Divina. - Virtu: qualidades como a força de caráter, a coragem militar, a habilidade no cálculo, a astúcia, a inflexibilidade no trato dos adversários. Pode desafiar e mudar a fortuna: papel do homem na história 4.2.4 Pensamentos sobre o Estado - O Estado: está além do bem e do mal: o Estado é. - Estado: regulariza as relações entre os homens, utilizando o que eles têm de bom e evitando o que eles têm de mal. - Tanto na política interna quanto nas relações externas, o Estado é o fim: e os fins justificam os meios. Daí a idéia de “razão de Estado”: existem motivos mais elevados que se sobrepõem a quaisquer outras considerações, inclusive à própria lei. - A tirania é uma resposta prática a um problema prático. 5. Pensamento político contemporâneo Diversos autores contribuiram para formatar o pensamento político contemporâneo. John Locke com sua teoria do contrato social em que defendeu a ideia de que as pessoas contratavam com a sociedade (Estado) e que portanto, seus direitos de propriedade deveriam ser defendidos, foi um deles. Outro autor muito importante foi Karl Marx. A teoria marxista é uma crítica radical das sociedades capitalistas, notadamente as ideis de Adam Smith. 32 O marxismo constitui-se como a concepção materialista da história, significando dizer que os fatos econômicos e que determinam a história. Karl Marx compreende o trabalho como atividade fundamental da humanidade. E o trabalho, sendo a centralidade da atividade humana, se desenvolve socialmente, sendo o homem um ser social. Sendo os homens seres sociais, a história, isto é, suas relações de produção e suas relações sociais fundam todo processo de formação da humanidade. Esta compreensão e concepção do homem são radicalmente revolucionárias em todos os sentidos, pois é a partir dela que Marx irá identificar a alienação do trabalho como a alienação fundante das demais. Bibliografia Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011. Bonavides, Paulo. Ciência política. São Paulo: Editora Malheiros, 17ª. ed. 2010. Weffort, Francisco C. Os clássicos da política. São Paulo. Editora Ática. 2006. http://search.babylon.com/?q=fortuna+e+virt%C3%BA+wikipedia&s=web&as=0&babsrc=home http://pt.wikipedia.org/wiki/Hist%C3%B3ria_do_pensamento_econ%C3%B3mico 33 TEXTOS PARA DISCUSSÃO Fortuna e Virtù na Trajetória de Lula Por Lúcio Flávio Vasconcelos as 20:33 h http://www.wscom.com.br/blog/lucioflavio/post/post/Fortuna+e+Virt%C3%B9+na+Trajet %C3%B3ria+de+Lula-761 As reflexões sobre a política não foram as mesmas depois dos escritos de Nicolau Maquiavel (1469-1527). Nascido em Florença, cidade italiana que vivia a plena efervescência do Humanismo renascentista, Maquiavel foi um homem dedicado ao exercício da administração pública, com o objetivo maior de fortalecimento do papel do Estado na condução da sociedade. Durante toda sua vida, o pensador florentino, acertadamente considerado o fundador da Ciência Política, foi um homem prático, que analisava a política com racionalidade. Nos seus escritos, desnudou as intenções políticas dos homens em sua crueza, com toda sua grandiosidade e mesquinhez. Em 1512, a república que servia com tanto zelo foi derrubada e os Médici retornaram ao poder. O dedicado servidor público Maquiavel foi preso e torturado, acusado de traição pela família Médici. Sem o cargo público que tanto prezava, Maquiavel recolheu-se a uma pequena fazenda de sua propriedade, em San Casciano, e dedicou-se com afinco ao seu segundo maior prazer: escrever. Nos catorze anos seguintes, Maquiavel vai produzir uma significativa obra, que engloba escrito históricos e obras literárias. Mas é com o livro seminal O Príncipe que ele encontrará a imortalidade. Na sua obra O Príncipe, Maquiavel tem a preocupação de aconselhar os governantes não só em obter o poder mas, principalmente, em como mantê-lo. Para tanto, lança mão de dois conceitos principais: Fortuna e Virtù. 34 Para Maquiavel, a Fortuna seria o conjunto dos acontecimentos, os fatos que ocorriam no contexto social em que o governante vivia. Já a Virtù representa a série de qualidades pessoais do príncipe que possibilita o discernimento necessário para conquistar e manter o poder. Após essa rápida análise dos conceitos maquiavelianos, vamos nos debruçar nos últimos acontecimentos que assolam a nossa república. Desde o final dos anos 70 que se processa no Brasil uma mudança significativa na política nacional. Há o surgimento de um novo sindicalismo, que teve como base o ABC paulista. Também houve um profundo envolvimento da Igreja Católica nas questões sociais, culminando na articulação do Movimento dos Sem Terra (MST). A expansão do ensino universitário possibilitou a difusão de um conhecimento científico uniforme em todo o país. Surgiram no Brasil milhares de núcleos urbanos que passaram a abrigar setores de classe média sedentos por mudanças sociais e políticas. Foi dentro desse processo de alteração do cenário nacional que se deu a Fortuna de Lula. Aproveitando as profundas modificações ocorridas nos últimos 25 anos, Lula soube, como nenhum outro líder político brasileiro do século XX, capitalizar as transformações e ser o seu principal representante. Eis a sua Virtù! O líder operário de baixa escolaridade fundou um partido que se distanciou da prática política do Partido Comunista, sensibilizou setores intelectualizados da classe média com seu socialismo moderado, mobilizou segmentos dos trabalhadores com o seu sindicalismo de resultados e galvanizou setores desorganizados da sociedade com sua retórica salvacionista. Na sua trajetória política, Lula percebeu como poucos a oportunidade de chegar ao poder sem provocar a ira dos setores mais conservadores. Ao ganhar as eleições em 2002, apresentou-se como um moderado que iria minimizar o sofrimento dos excluídos sem causar rupturas. Durante o seu mandato, o modelo econômico tão criticado por setores radicais do PT permaneceu no mesmo itinerário traçado pelo antecessor Fernando Henrique Cardoso. 35 A onda de crescimento econômico que atingiu a América Latina, deu margem para que políticas públicas favoráveis aos setores populares fossem implantadas. Salário mínimo de R$ 350,00 é o maior em poder aquisitivo desde 1979. Mesmo após meses de bombardeio de seu governo, com a conseqüente perda de principais auxiliares na construção da sua trajetória, Lula demonstra uma força política inigualável. Os partidos de oposição, principalmente PSDB e PFL, não têm demonstrado Virtù suficiente para desbancar o prestígio que permeia o candidato Lula. Talvez isso se dê porque ainda está muito vivo na memória da maioria da população os oito anos do governo FHC. O desafio para Lula é enorme. Nem Nicolau Maquiavel arriscaria prever se o Governo Lula propiciará, até outubro próximo, a Fortuna tão necessária para que o candidato Lula continue exercendo a sua Virtù. Lúcio Flávio Vasconcelos é Graduado em História pela UFPB, tem Mestrado e Doutorado em História pela Universidade de São Paulo (USP). É professor do Departamento de História da UFPB e também Professor Orientador do Programa de Pós-Graduação em Sociologia (PPGS), do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes da UFPB. Publicou os livros História Política do Sendero Luminoso (1998), Guardiões da Ordem (2001) e América Latina: Entre a Civilização e Barbárie (2005), todos lançados pela UFPB. Atualmente é debatedor no programa Conexão Master. 36 Fortuna e virtù Cláudia Vassallo - Revista Exame | 18/11/2010 Maquiavel e as lições do príncipe: só sorte não basta Em seu magistral o príncipe, o pensador Florentino Nicolau Maquiavel defende que o líder precisa de dois atributos para triunfar: fortuna e virtù - sorte (algo fora do controle dos mortais) e competência. Fortuna é algo que aparentemente não faltará à presidente eleita, Dilma Rousseff, que a partir de 1o de janeiro assume a liderança do país. O Brasil vive hoje um momento que, se não é perfeito como alguns gostam de propagar, traz enormes oportunidades de construção do futuro. O momento histórico nos favorece de diversas maneiras. Mas talvez nada nos abra uma janela tão grande para o crescimento e o desenvolvimento quanto a transformação demográfica pela qual passaremos nos próximos 20 anos - um processo que começa agora e que envolverá o amadurecimento em massa e o ápice da capacidade produtiva da maioria da população brasileira. O chamado "bônus demográfico" chegará a seu pico em 2022, quando se estima que haverá quatro cidadãos inativos - crianças e velhos, sobretudo para cada dez economicamente ativos. Viveremos, então, um período de carga máxima de nossa capacidade de produção e de consumo. As conseqüências e as oportunidades geradas por essa transformação para o país e para quem faz negócios são brutais. E é sobre elas que se debruça a reportagem de capa desta edição, assinada pelo repórter Nicholas Vital. Um estudo assinado pelos professores Cássio Turra e Bemardo Queiroz, da Universidade Federal de Minas Gerais, mostra que apenas o fenômeno demográfico gera um potencial de crescimento do PIB brasileiro de 2,5% anuais até 2030. Trata-se de um cenário, esperamos improvável. Pressupõe que, num espaço de duas décadas, nada seja feito para modernizar o país e tomar sua economia mais dinâmica e mais pujante. O que os professores Queiroz e Turra estão dizendo é que, ainda que tudo dê absolutamente errado, seguiremos em frente. Por pura sorte. Agora é torcer para que a presidente Dilma e seus sucessores emprestem altas doses de sua própria virtù à enorme e efêmera fortuna derramada sobre o Brasil dos próximos 20 anos. 37 Vinte anos para o Brasil ficar rico Nicholas Vital, da EXAME - 17/11/2010 16:16 Está em curso um fenômeno novo para o país: o amadurecimento em massa da população. Mas é preciso correr, pois a janela de oportunidades tem data para fechar Ronaldos e Giseles à parte, a maioria dos mortais segue um roteiro de vida semelhante. Primeiro experimentamos as delícias da infância e da adolescência. Depois, chega a hora de começar a trabalhar, um momento marcado por muito esforço e pouco dinheiro. Com o tempo, as oportunidades vão surgindo e o desafio é conseguir garantir um descanso tranquilo no período final. E assim passamos de geração em geração. Também os países seguem uma trajetória semelhante, com graus diferentes de sucesso. Numa fase inicial, nações jovens têm uma fatia grande da população abaixo da idade de trabalho. Com o tempo, as crianças crescem e começam a trabalhar. É um período ideal para aproveitar o impulso e crescer. Depois vem a fase do envelhecimento, em que o ímpeto econômico se esvaece. Se tudo der certo nesse caminho, haverá, então, riqueza suficiente para financiar o sossego dos idosos. O Brasil já foi uma nação jovem. E seremos, no futuro, um país velho. A boa notícia é que estamos — agora — no auge do período produtivo. Encontrase em curso um fenômeno demográfico e social novo para o país: o amadurecimento em massa da população. O crescimento populacional vertiginoso ficou para trás. Após crescer geometricamente por dois séculos, o número de brasileiros aumenta cada vez menos e não deve ultrapassar a marca de 220 milhões. Ao mesmo tempo, com expectativa de vida de 73 anos, o país tem hoje dois terços da população entre 15 e 64 anos — a faixa etária considerada economicamente mais produtiva. A proporção dos que estão em idade de produzir vai continuar a crescer até 2022, quando atingirá um pico de 71%. A previsão é que nessa data o número de brasileiros em idade ativa passe dos atuais 130 milhões para 147 milhões. As chances de negócios abertas por essa transformação silenciosa são enormes. “Se em dez anos não abrirmos 100 milhões de novas contas, é porque algo deu errado”, diz Luiz Carlos Trabuco 38 Cappi, presidente do Bradesco. Segundo estimativa da Federação Brasileira de Bancos, o número de agências bancárias no país deve crescer 50% na próxima década, o que significa a criação de cerca de 150 000 postos de trabalho. O crescimento no setor bancário é apenas um exemplo do salto esperado em inúmeros mercados na próxima década. “Essa é uma chance única na história de qualquer país”, disse a EXAME Ronald Lee, diretor do departamento de demografia e economia da Universidade de Berkeley e membro da Comissão Americana para Estudos do Envelhecimento. A chance a que Lee se refere é batizada pelos especialistas de bônus demográfico — a fase com o máximo possível de gente trabalhando. Uma projeção realizada pelos professores Cássio Turra e Bernardo Queiroz, da Universidade Federal de Minas Gerais, mostra que o Brasil tem um potencial de crescimento de 2,5% ao ano gerado exclusivamente pelo bônus demográfico. Outra conta, feita por Marcelo Neri, pesquisador do Centro de Políticas Sociais da Fundação Getulio Vargas, sugere um aumento de até 2,7% ao ano na renda média dos brasileiros em função do bônus e do aumento da escolaridade, iniciado nos anos 90. No cenário elaborado por Turra e Queiroz, o Brasil, se crescer apenas à média anual de 2,5% propiciada pelo bônus demográfico, chegará a 2030 com um produto interno bruto de 3,3 trilhões de dólares, 50% maior que o atual. Mas o país tem crescido mais que isso — e os economistas avaliam que será possível manter um ritmo de 4,5%. Isso elevaria, no mesmo prazo, o PIB para 4,8 trilhões de dólares, o suficiente para alcançar um padrão de renda equivalente ao que Portugal tem atualmente. Numa hipótese mais otimista, de o bônus ser aproveitado para impulsionar reformas mais profundas, em duas décadas o Brasil atingiria o nível de renda per capita atual da Espanha e teria um PIB de 7 trilhões de dólares. “Os brasileiros estão diante de uma oportunidade de ouro, mas ela é temporária. Após duas décadas, o envelhecimento da população inverterá a curva e fará a proporção de inativos subir. Por isso, para tirar o máximo proveito até lá, o Brasil deve investir fortemente nas novas gerações, em especial provendo boa educação básica”, diz Lee. O recado é claro: temos mais 20 anos para fazer a lição de casa, 39 modernizando a economia e melhorando a qualidade da educação, e, assim, nos tornar uma nação rica. Caso contrário, estaremos no pior dos mundos. Corremos o risco de envelhecer sem ter conseguido integrar o clube dos desenvolvidos — e aí será muito mais difícil chegar lá. O bônus tem como origem uma guinada no comportamento das famílias brasileiras. Desde meados dos anos 60, tem havido uma queda progressiva no tamanho das famílias. A média de filhos por mulher, que era de seis há meio século, caiu até chegar a menos de dois hoje. A presidente eleita Dilma Rousseff — de quem se espera um conjunto de políticas para aproveitar ao máximo o bônus demográfico — é um exemplo da nova mulher brasileira. Teve apenas uma filha, a qual, por sua vez, recentemente lhe deu o primeiro neto. A idade média da população, antes inferior a 20 anos, atualmente está próxima de 29 — e vai continuar a crescer. A pirâmide demográfica mudou de forma e agora é uma figura cada vez mais arredondada. No ponto atual, a maioria dos que eram jovens nas décadas anteriores ainda não chegou à terceira idade e constitui uma inédita geração de brasileiros mais maduros e que estão no auge de sua carreira profissional. O resultado é que a proporção entre pessoas que não trabalham e as que são ocupadas caiu de mais de sete inativos (seja criança, seja idoso) para cada grupo de dez trabalhadores, há 20 anos, para menos de cinco para dez. No auge do bônus, em 2022, essa proporção será de quatro para dez. Quando há menos gente que precisa ser sustentada, a abundância de população em idade ativa dinamiza a economia e gera recursos adicionais que podem ser revertidos em poupança e investimento. Isso reforça o crescimento econômico e gera oportunidades em inúmeros mercados. A mudança do perfil demográfico da população brasileira deve fazer com que alguns setores da economia experimentem um ritmo de crescimento acelerado na próxima década, o que pode colocar o Brasil entre os líderes globais em vários segmentos. Os cosméticos são um bom exemplo. Hoje, o Brasil é o terceiro maior mercado de produtos de perfumaria e beleza do mundo, atrás de Estados Unidos e Japão. Caso a estimativa de crescimento do setor se confirme — 9,6% ao ano, de acordo com uma estimativa feita pela consultoria 40 Euromonitor a pedido de EXAME —, o mercado brasileiro de cosméticos deverá chegar a 108 bilhões de dólares em 2020, quase o dobro do observado atualmente nos Estados Unidos. “Nossos consumidores, em sua maioria, são maduros”, diz José Vicente Marino, vice-presidente de negócios da Natura, a maior empresa de cosméticos do país. “Boa parte de nosso crescimento nos últimos anos já pode ser atribuída ao bônus.” O envelhecimento da população também deve impulsionar o segmento de serviços médicos, que inclui gastos com consultas, exames e hospitais. Hoje, os brasileiros gastam pouco mais de 56 bilhões de dólares, montante que deve alcançar 112 bilhões em 2020, mais do que o gasto atual da Alemanha, em torno de 90 bilhões de dólares. O gasto com educação, segundo as projeções da Euromonitor, também deve dobrar na próxima década, de 91 bilhões de dólares para 182 bilhões. Para as empresas, um dado central é o perfil do brasileiro médio daqui a uma década, quando o bônus demográfico estiver empurrando o país com força máxima. Muito provavelmente, será próximo ao de Ana Rita Mazza Menani. Aos 33 anos de idade, casada, com dois filhos, formada em comunicação social, ela e o marido, Rogério, têm uma pequena gráfica em Monte Alto, no interior paulista. Juntos eles dispõem de uma renda em torno de 8 000 reais por mês. Moram numa casa confortável e, na garagem, têm dois carros e duas motos. Dentro de casa, não faltam eletrodomésticos, móveis e computador. Os filhos, de 7 e 13 anos, estudam em escola particular, fazem aulas de inglês, artes, música e esportes. “Investimos cerca de 25% da renda familiar na educação deles”, diz Ana Rita. “Se tivéssemos mais filhos, seria difícil manter o padrão. As pessoas da minha geração não têm condições de ter mais que um ou dois filhos.” Embora muito tenha se falado sobre o crescimento na base da pirâmide, o exemplo de Ana Rita ilustra que a ascensão econômica em curso no país legará uma estrutura social com preponderância das classes média e alta. Nessa nova sociedade, algumas tendências comportamentais começam a ser detectadas. A importância crescente dada à educação dos filhos é uma delas. O desenvolvimento esperado para as próximas décadas está atrelado a fortes investimentos em educação e formação de mão de obra qualificada — uma das 41 consequências diretas do bônus. “Saímos da baixíssima escolaridade para um nível menos ruim, e isso já está jogando a favor do desenvolvimento há um tempo”, afirma Neri, da FGV. “Nosso retrato provavelmente seria bem pior se não fosse isso. O que precisamos fazer é avançar com mais ambição no setor de educação, para não desperdiçar o bônus.” Essa necessidade faz com que as escolas constituam um mercado que evidentemente está entre os que mais proliferam atualmente no Brasil. De acordo com a Euromonitor, esse setor deve crescer quase 10% ao ano no Brasil até 2020, quando alcançará 400 bilhões de reais. A expansão tem atraído investidores estrangeiros principalmente para atuar no ensino superior. O grupo americano DeVry chegou ao país há três anos. Instalou-se na Região Nordeste e já conta com 14 000 alunos em suas quatro unidades. “Enxergamos uma grande oportunidade no mercado brasileiro de educação”, diz Carlos Filgueiras, presidente do braço local do DeVry. “O potencial de crescimento é muito grande. Hoje, apenas 30% dos jovens brasileiros entre 18 e 22 anos estão na faculdade. Na Grécia, o índice é de mais de 90%.” De acordo com ele, o efeito do bônus já é perceptível, mas poderá ser mais intenso porque as classes C e D estão começando a ter acesso às universidades. “Isso deve impulsionar o setor nos próximos anos”, diz. Potencial a ser descoberto Curiosamente, muitas empresas ainda não atentaram para o potencial de mercado aberto pela mudança na demografia brasileira. Recentemente, ao promover por seis meses um estudo com seus 100 executivos de nível mais alto para identificar tendências e planejar os próximos dez anos, o grupo de engenharia Promon descobriu o bônus. “O tema da demografia causou frisson nas nossas reuniões”, diz Luiz Fernando Rudge, presidente da Promon. “As pessoas não percebem seu efeito no dia a dia, mas vimos que, ao longo das décadas, o impacto é dramático.” A Promon identifica áreas de negócios que serão particularmente atraentes num cenário de amadurecimento da população, como as de saúde e bem-estar. “Podemos investir na construção e na operação de hospitais e condomínios para pessoas mais idosas”, afirma Rudge. Além 42 disso, com a perspectiva de um crescimento econômico mais consistente, diversos setores de infraestrutura em que a Promon atua, de energia a telecomunicações e tecnologia da informação, também deverão ser positivamente afetados. De acordo com um estudo da consultoria Ernst & Young, a mudança do perfil demográfico da população brasileira deve dar ainda mais fôlego ao setor de construção civil. Estima-se que, todos os anos, cerca de 1,7 milhão de novas famílias sejam formadas no país. Até 2030, serão pelo menos 35 milhões de novas famílias, principalmente da emergente classe C, que precisarão de um lugar para morar. Trata-se de outra tendência que começa a ser detectada: o surgimento de famílias pequenas e em franca ascensão social. As construtoras já perceberam o fenômeno e vêm adequando seus produtos aos novos consumidores. “As famílias estão ficando cada vez menores. Consequentemente, os apartamentos também devem ficar mais compactos”, diz Antonio Carlos Ferreira, diretor de incorporações da Gafisa, uma das maiores construtoras do país. Em 2007, as famílias tinham, em média, 3,1 pessoas. Em 2030, prevê-se que haverá apenas 2,4 pessoas por residência. O operador logístico mineiro Lando Tavares, de 34 anos, comprou seu primeiro apartamento há aproximadamente um mês. Casado há quatro anos e pai de uma menina de 2 anos, ele aproveitou um aumento salarial e a oferta abundante de crédito para financiar em 25 anos um imóvel avaliado em 100 000 reais. Os Tavares representam a nova família brasileira — pequena e mais preocupada com a qualidade de vida. Uma população mais velha traz também mudanças em termos de objetos de desejo. Um segmento crescente é o formado por homens e mulheres maduros e com dinheiro para gastar. O envelhecimento costuma tornar os consumidores mais exigentes. Para as montadoras de automóveis, isso deve produzir uma alteração na demanda. A participação de veículos maiores e mais equipados deverá crescer consideravelmente nos próximos anos, com alta nas vendas de sedãs médios e modelos de luxo. “Eles devem tomar parte do mercado dos populares”, afirma Stephan Keese, sócio da consultoria 43 especializada Roland Berger. “As pessoas mais velhas geralmente têm mais dinheiro e compram produtos melhores.” Atualmente, os veículos compactos respondem por 69% do mercado brasileiro, ante 15% dos sedãs médios. Em 2020, a participação dos populares deve cair para 63%, enquanto a dos médios subirá para 20%. O mercado de carros de luxo também deve dobrar, para mais de 50 000 unidades por ano. “Nos Estados Unidos e na Europa, os carros básicos são mais completos porque são desenvolvidos para uma população mais velha e exigente”, diz Keese. Essa é justamente a aposta que a marca japonesa Nissan fez recentemente para se expandir no Brasil. Instalada no país no final dos anos 90, a Nissan lançou em 2007 o modelo Sentra, aquele que “não tem cara de tiozão”. O sedã, que custa a partir de 55 000 reais, obviamente não tem como público-alvo os jovens. A intenção foi chamar a atenção dos homens maduros, os potenciais consumidores. “Quando chegamos ao Brasil, já sabíamos da tendência de envelhecimento da população. Tínhamos certeza de que o segmento cresceria”, afirma Murilo Moreno, diretor de marketing da Nissan. “O tíquete médio vem subindo. Os carros de luxo estarão cada vez mais presentes nas ruas.” O exemplo vem da Ásia A legião de consumidores maduros deve impulsionar o crescimento de mercados antes pouco expressivos. Uma preocupação é envelhecer bem e de forma saudável. Essa nova realidade faz com que a indústria de lácteos, por exemplo, precise de um novo plano de negócios para os próximos anos. Com um mercado infantil cada vez menor, não faz mais sentido investir milhões de reais em produtos com poucas possibilidades de crescimento. O foco agora são os leites funcionais, ricos em cálcio e outras vitaminas e consumidos por adultos. “Esses produtos devem crescer 300% nos próximos cinco anos”, afirma Fernando Falco, presidente da Leitbom, controladora da marca Parmalat no Brasil. Segundo ele, nos próximos dois anos a Parmalat deve lançar pelo menos sete novos lácteos funcionais e só dois produtos voltados para o público infantil. O crescimento do número de adultos em busca de uma vida mais saudável beneficia uma gama de empresas que vai muito além das fabricantes de 44 alimentos. O Brasil já é o segundo mercado do mundo para as academias de ginástica, só atrás dos Estados Unidos. Todos os países hoje considerados desenvolvidos se beneficiaram de mudanças no perfil populacional para atingir estágios mais elevados de renda e qualidade de vida. Na Europa, no Japão e nos Estados Unidos, a transição demográfica foi mais lenta, tendo se iniciado com a revolução industrial. Lá, as vantagens começaram no século 19, com um aumento da população gerado pelas conquistas científicas e pelo desenvolvimento da infraestrutura urbana de saneamento. Foi uma evolução que se estendeu ao início do século 20, com a redução da mortalidade infantil e a expansão do acesso a serviços médicos e educação. O impulso inicial, de ampliação das populações, depois foi contido com a queda da natalidade. Na Ásia, excetuando o Japão, os avanços na qualidade de vida da população chegaram após a Segunda Grande Guerra. Mas, com as tecnologias e os conhecimentos já disponíveis, a adoção de melhorias foi intensa, o que gerou uma transição rápida. Em países como Coreia do Sul, Singapura, Hong Kong e Taiwan, a mudança demográfica iniciada nos anos 60 gerou uma ampliação da força produtiva que serviu de base para a decolagem das economias. Os governos desses países souberam perceber que uma população com mais expectativa de vida também precisaria ser mais educada e que o ambiente de negócios precisaria ser nutrido. A transformação que se viu em três décadas fez os quatro países merecerem o apelido de Tigres Asiáticos. Um estudo realizado pelos pesquisadores David Bloom e Jeffrey Williamson, da Universidade Harvard, concluiu que o bônus demográfico gerou um terço do crescimento dos quatro tigres entre 1965 e 1990. “A mudança no perfil da população foi determinante para o milagre econômico asiático”, afirma Bloom. “Até então, esses países cresciam lentamente devido ao peso excessivo de uma população muito jovem.” O estudo mostra que, durante a transição, a massa local de trabalhadores cresceu a um ritmo de 2,4% ao ano, enquanto o crescimento total da população era de 1,6%. A Coreia do Sul lançou as bases de seu sucesso antes mesmo de chegar ao bônus. Devastado pela guerra dos anos 50, o país passou a investir em 45 educação e fez uma série de reformas para que sua economia deslanchasse. Mais tarde, em meados dos anos 80, quando chegou ao período de transição demográfica, já estava devidamente preparado. Em três décadas, os sulcoreanos multiplicaram por 8 sua renda per capita, para perto de 20 000 dólares, o dobro da brasileira, e entraram para o clube dos países ricos. Atualmente, quem melhor está aproveitando a transição demográfica é a China. Graças às políticas draconianas de controle de natalidade introduzidas pelo governo na década de 70, o país tem colhido os frutos de uma estrutura etária que, por ora, é favorável — há, desde os anos 90, cada vez menos crianças e cada vez mais adultos aptos a produzir. Todos os anos, milhões de chineses entram para o mercado de trabalho e engrossam o já enorme contingente de mão de obra local. Dar emprego a tanta gente é um desafio, mas o país tem conseguido dar conta. Com custo baixo para produzir quase tudo, a enorme população chinesa é o motor que move a segunda maior economia do mundo. Estima-se que o bônus tenha sido responsável por até 30% do crescimento do PIB da China na última década. Além disso, o fenômeno ajudou a tirar da pobreza cerca de 400 milhões de pessoas nos últimos 30 anos. Assim como o Brasil, a China ainda tem cerca de 20 anos de bônus demográfico pela frente. Mas há uma nítida diferença em como a oportunidade é encarada lá e aqui. “No Brasil, ainda não caiu a ficha de que estamos diante de uma janela temporária”, diz Rogério Rizzi de Oliveira, sócio da empresa de consultoria Monitor Group. “Os chineses correm para manter o crescimento acima de 10% porque sabem que isso só poderá ser feito num prazo curto. Nós, aqui, também precisamos apertar o passo.” Os desafios para que o Brasil aproveite ao máximo sua janela de oportunidades, porém, ainda são muitos. Não temos uma economia com a modernidade e a eficiência necessárias para gerar crescimento econômico de alta qualidade. “O próximo governo precisará trabalhar muito para que possamos dar um salto. Do contrário, corremos o risco de desperdiçar parte do bônus”, afirma Rubens Ricúpero, ex-ministro da Fazenda e diretor da Faculdade de Economia da Fundação Armando Alvares Penteado, em São Paulo. Temos 46 as próximas duas décadas para alcançar um padrão de país rico — depois, a janela de oportunidades irá gradualmente se fechar. Se a transição não for devidamente aproveitada, a sociedade brasileira estará de frente para um novo e dramático quadro por volta de 2040: o de uma nação de idosos que não melhoraram suficientemente seu padrão de vida e, pior, sem recursos para sustentar a velhice. O alerta sobre esse cenário sombrio é dado hoje pelos países europeus, onde os sistemas de seguridade e manutenção do bem-estar social estão em crise. Isso está ocorrendo mesmo em lugares que alcançaram altos níveis de renda per capita, como França, Reino Unido e Itália, e, de forma pior, nos que não enriqueceram tanto, como Grécia, Portugal e Polônia. Uma questão difícil de ser enfrentada é a da saúde. “O custo para tratar um idoso é muito maior que o de um jovem”, afirma o economista Paulo Tafner, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. “Até 2040, o gasto brasileiro com saúde vai se multiplicar por 3.” Caso o país não se prepare adequadamente, o já deficiente sistema público de saúde entrará em colapso. O mesmo impacto se dá nas contas da deficitária Previdência Social. “É preciso reconhecer que o país não está preparado para ter 30 milhões ou 40 milhões de idosos, como deve acontecer nas próximas décadas”, diz Carlos Eduardo Gabas, ministro da Previdência. Para Ronald Lee, de Berkeley, o Brasil terá de reavaliar seu sistema de aposentadoria, que ele considera provavelmente o mais generoso do mundo em relação ao nível de renda per capita. “Não há dúvida de que há muitos idosos pobres que precisam das pensões, mas eu suspeito que haja muita gente recebendo mais do que precisa”, afirma Lee. “O modelo atual não será sustentável no futuro.” O custo da Previdência em relação ao PIB já é duas vezes maior que nos Estados Unidos, e a idade média do brasileiro ainda é inferior à dos americanos. São questões que deveriam estar na ordem do dia. Não estão. Fazendo um paralelo com o que o pensador florentino Nicolau Maquiavel dizia do Príncipe, é preciso ter virtù e fortuna — competência e sorte — para triunfar. Tudo indica que a sorte agora está do lado do Brasil. Falta mostrar virtù para aproveitar ao máximo a janela de oportunidades. São 20 anos — e o relógio está correndo. 47 Maquiavel e o lucro mais magro dos bancos Milton Gamez – Isto é Dinheiro - Edição 773 - 27.7.2012 Nicolau Maquiavel, cinco séculos depois de ter moldado o pensamento e a ciência política moderna, está mais atual do que nunca. Nicolau Maquiavel, cinco séculos depois de ter moldado o pensamento e a ciência política moderna, está mais atual do que nunca. Não apenas devido aos seus ensinamentos sempre úteis aos Príncipes de plantão, mas também ao que tem a dizer aos banqueiros e investidores nestes momentos de crise internacional. Imagine se, por um capricho da história, o pensador florentino fosse vivo e virasse consultor dos maiores bancos privados. Na semana passada, Itaú Unibanco, Bradesco e Santander divulgaram lucros menores que o esperado no primeiro semestre (leia mais aqui). O que o filósofo diria aos bancos diante da queda da atividade econômica e do crescimento da inadimplência nos últimos meses? Que façam muitas provisões contra os calotes – e de uma só vez. Banqueiros, como os demais empresários, buscam o maior lucro para o capital investido, correndo o menor risco possível. Os acionistas das instituições financeiras, como os investidores das outras empresas, também exigem lucros e dividendos polpudos. Em qualquer lugar do mundo, os bancos vivem da confiança do público em sua solidez, pois todos operam alavancados (emprestam bem mais do que o patrimônio contábil) e nenhum abarrota caixasfortes gigantes com dinheiro suficiente para devolver aos clientes de uma só vez, se necessário. Quando a economia vai bem, lucros elevados mostram que o dinheiro dos acionistas e dos investidores está sendo bem utilizado nos financiamentos à produção e na prestação de serviços. Naturalmente, quando os bancos têm retornos financeiros muito superiores aos das empresas dos outros setores, industriais e comerciantes costumam reclamar bastante. 48 Mas e quando a economia vai mal? Bancos com lucros minguados são alvo de desconfiança, perdem clientes e são criticados por emprestar menos e exigir mais garantias. Nessas horas, os banqueiros mais conservadores reforçam a liquidez e aumentam suas provisões contra perdas, mesmo que isso leve a lucros menores. É bom que seja assim, diria Maquiavel. É preciso fazer todo o mal de uma só vez a fim de que, provado em menos tempo, pareça menos amargo. E quando voltarem a fazer o bem, que o façam aos poucos, para que seja melhor saboreado. Só não podem ficar parados e perder o bonde do crescimento no segundo semestre. Se as carteiras de crédito voltarem a crescer de forma responsável, com os juros mais baixos e de acordo com a capacidade de pagamento das empresas e das famílias, todos ganharão mais no longo prazo. Embarcar em farras de crédito, como se viu nos Estados Unidos e na Europa até 2008, não é uma boa estratégia. 49 CAPITULO III O que veremos neste capítulo: Poder e sociedade. Conceito de poder. Tipos de poder e fontes de poder. Maquiavel e o Poder político. Legitimidade e legalidade do poder político. As elites e o poder. 1. Introdução Nas notas de aulas anteriores conhecemos o significado de política (a arte da organização, direção e administração de nações, Estados e também das empresas), os seus o objetos de estudo – sugeridos pela UNESCO - e a evolução Histórica do pensamento político. Aprendemos como Maquiavel e Marx, entre outros pensadores, construíram caminhos alternativos para o entendimento deste conceito tão importante em nossas vidas. Max Weber, citado por Dias (2011), afirma que quem faz política, não importa o motivo, aspira ao poder. Então, vamos conhecer um pouco sobre este que é um dos mais importantes processos sociais das sociedades humanas, segundo Dias (2011). 2. O que é poder? Das diversas definições para a palavra poder, uma tem o apoio da maior parte dos especialistas no estudo das ciências sociais: poder é a capacidade de interferir no comportamento das pessoas. A existência do poder implica uma relação social que pode ocorrer entre duas ou mais pessoas, ou duas ou mais organizações. Segundo Fleiner Gerster, citado por Dias (2011), o poder é derivado, de um lado, da força e a superioridade de uma parte e, do outro lado, da dependência ou fraqueza da 50 outra parte. Neste sentido, o individuo encontra-se sob o poder de outro quando a sua conduta não é decidida por ele mesmo, mas depende de um a decisão tomada pelo outro. Já Friedrich, citado por Dias (2011), ensina que o poder é, de certa forma, a capacidade de obrigar alguém a fazer ou não alguma coisa. Entretanto, argumenta que a origem do poder relacional é consensual e cooperativa, sendo muito importante para um líder a aquisição deste poder originado no consenso. È difícil não acharmos uma relação de poder em nossas vidas. Ela ocorre, em diferentes intensidades, em praticamente todas as relações sociais. Além de variar em intensidade, também existem diversos tipos de poderes. No entanto, apesar desta diversidade, podemos estabelecer uma hierarquia entre os poderes, tendo o poder político o lugar de maior destaque. Esta prevalência do poder político sobre os outros poderes é primordial para estabelecer a necessária convivência social. Baseado nisto, aceitamos ou legitimamos até o uso do poder com o fim da dominação de um grupo sobre outro. Um ponto interessante diz respeito ao exercício do poder, pois apesar dele ser feito por pessoas, não deve ser confundido com elas. É o que chamamos despersonalização do poder. Como processo social, o exercício do poder está fortemente ligado a cultura dos grupos sociais. Significa dizer que se um grupo privilegia o uso da força física, o poder naquela comunidade terá como principal componente a força física. Se os indivíduos valorizarem a divindade, então os sacerdotes terão maiores possibilidades de exercer o poder. Aristóteles em livro Política aponta três tipos de poder: o poder paterno (entre pais e filhos); despótico (entre o senhor e seus escravos) e o político (entre governante e governado). Norberto Bobbio, citado por Dias (2011) também aponta três tipos de poder: o econômico, o ideológico e o político. 51 Segundo aquele autor, o poder econômico é aquele que para ser exercido depende da posse de bens. O poder ideológico é baseado nas ideias. Ele é exercido quando alguém consegue alterar o comportamento de outra pessoa, utilizando somente ideias. O poder político é fundamentado na posse de instrumentos com os quais se exerce a força física ou a coação. Para Max Weber, poder significa toda probabilidade de impor a própria vontade em uma relação social, ainda que exista resistência. Para Dias (2011), o poder é legitimo quando aqueles que não o tem, aceitam e o obedecem. 3. De onde vem o poder? Existem diversas fontes de poder, sendo a força e a autoridade as principais no que se refere a conquista e legitimidade do poder. Em geral, elas não aparecem isoladas, coexistindo em diferentes graus para formar o poder do agente que o exerce. A força, como fonte de poder, surge quando um agente usa ou ameaça de coerção física outro agente. Essa coerção física pode é expressa pelo usa de armas ou até mesmo pelo porte físico. È característica dos Estados o uso da força para promover a coerção física. Para tanto os Estados possuem os meios necessários como polícia e forças armadas (aeronáutica, exercito e marinha) Outra fonte de poder, a autoridade, pode ser definida como um direito de decidir sobre o comportamento de outrem. Max Weber estudou e identificou três tipos de autoridade: a burocrática, também denominada racional; a tradicional e a carismática. A primeira, a autoridade burocrática ou racional, é baseada no cargo ou posição formalmente constituída. Neste caso, a lei ou as regras escritas determinam como será o exercício da autoridade. Exemplos: juiz, delegado, funcionário público. 52 A autoridade tradicional é aquela constituída segundo a crença, as normas e tradições sagradas. As pessoas obedecem devido à tradição. Exemplos: rei, príncipe, padre, marido, pai, etc... A autoridade carismática é baseada nas qualidades pessoais excepcionais do individuo, o líder. As pessoas respeitam a autoridade do líder pelo carisma e isto é importante para a estabilidade da organização ou sociedade. Exemplos: Cristo, Napoleão, Ghandi, Martin Luther King, Peron, Fidel Castro, etc. 3.1 Outras fontes de poder No tocante ao exercício do poder, John Kenneth Galbreith avalia que um líder que deseja motivar as pessoas precisa conhecer os pontos básicos que podem maximizar seu poder. Esses pontos básicos ele classificou como fontes de poder e no seu entender elas são três: I - a personalidade, que é o conjunto de características pessoais de uma pessoa (inteligência, conduta moral, etc.); II - a propriedade ou riqueza, que é o conjunto de bens que uma pessoa possui, e III - a organização ou as organizações (escola, associação, igreja, etc.) da qual participa. 4. O poder político Todo grupo que possui um padrão permanente de relações humanas que envolva de maneira significativa, poder, governo ou autoridade, necessita de um poder que o estruture e o mantenha coeso. È o poder político. Este poder tem algumas peculiaridades, como a possibilidade recorrer a força para que sejam alcançados os fins pretendidos. O poder político é diferentemente exercido pelo líder e pelo governante. O primeiro usa capacidade de convencimento para modificar o comportamento de seus seguidores, enquanto o segundo exerce o poder político 53 de maneira mais formal, em decorrência das leis e normas que legitimam sua autoridade. Importante registrar que os indivíduos se submetem ao poder político, obedecendo-o, por acreditarem na legitimidade. 5. Maquiavel e o poder político Em sua obra O príncipe, Maquiavel procurou compreender a política sob a ótica da conquista ou da manutenção do poder. Baseado no seu entendimento dos fatos e em sua crença de que a natureza dos homens é constante e inalterável ele desenvolveu uma teoria que possibilita a análise objetiva da realidade política. Em O príncipe, Maquiavel aponta os caminhos para governar e manter o poder sem cair nas armadilhas das quais o gênero humano é capaz. Maquiavel pretendia com sua obra ensinar quais eram os mecanismos de governo, como se poderia consolidar e fortalecer o Estado e que erros deveriam ser evitados. Para Maquiavel, a religião e a moral poderiam ser utilizadas para consolidar o poder, mas não para o seu funcionamento. A força, segundo ele, é o único meio de incrementar e manter o poder. Maquiavel argumentava que sempre existiria uma razão de Estado para justificar o emprego da violência e da crueldade, sendo mais importante, para a manutenção do poder, ser temido que amado. 6. Legitimidade e legalidade do poder político A legitimidade vem da crença de que quem exerce o poder político tem autoridade para tal. È a ideia de obrigação política de obediência pela qual as pessoas aceitam e justificam um poder político. Não devemos confundir legitimidade com legalidade, pois enquanto a primeira relaciona o poder com determinado conjunto de valores. A segunda vincula o poder com as leis. 54 7. As elites e o poder Denominamos elite uma categoria de pessoas que se destacam em um setor ou atividade social. No campo político a elite representa quem exerce o poder. Em um sistema político a elite governante é quem detém o poder político, existem outras elites que lhe dão sustentação e apoio tais como igrejas, sindicatos, associações, e outros grupos. 8. Teoria das elites Gaetano Mosca foi quem primeiro formulou a teoria das elites. Para ele há duas classes de pessoas: governantes e governados. A classe governante (a elite) cumpre todas as funções políticas através do monopólio do poder, enquanto a dos governados, mais numerosa, é regida pela elite de modo legal ou violento. Vilfredo Pareto, contemporâneo de Mosca, também formulou sua teoria das elites. Para ele, em toda sociedade há uma classe superior (a elite) que possui os poderes político e econômico. Em sua teoria da circulação das elites ou teorema de Pareto, ele descreve o processo dinâmico de formação e substituição das elites em um movimento permanente que eleva os indivíduos até os postos superiores, deslocando outros para os inferiores. Outro autor, Wright Mills, desenvolveu sua teoria das elites, partindo da ideia de que o homem comum é aquele cujos poderes são limitados pelo mundo cotidiano e sendo assim é movido por forças que não estão no seu controle. Por outro lado, a elite é composta por homens que se encontram em posições tais que lhe permitem ocupar posições estratégicas dentro da sociedade, concentrando poder, riqueza e prestigio. Bibliografia Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011. 55 7 Tipos de Poder no Ambiente de Trabalho http://liderando-lideres.com.br/lideranca/7-tipos-de-poder-no-ambiente-detrabalho/ Há uma frase de Margaret Thatcher, que diz: “O poder é como ser uma dama: Se você tem que dizer às pessoas que você é, você não é”. Pessoalmente, acho que o estudo do poder fascinante. A definição no dicionário de poder é “uma pessoa ou coisa que possua ou exerça autoridade ou influência”. Então, em essência, quando usamos o poder, estamos utilizando a nossa autoridade para conseguir alguma coisa. Todo mundo tem poder. Todos. E, eu não acredito que o poder é uma coisa ruim. A questão é que tipo de poder uma pessoa tem e como alguém usa esse poder. Aqui estão alguns dos tipos mais comuns de poder encontrados no ambiente de trabalho: O poder coercitivo está associado com pessoas que estão em uma posição para punir outros. As pessoas temem as consequências de não fazer o que foi pedido deles; Poder de conexão é baseado em quem você conhece. Esta pessoa conhece, e tem peso na opinião de outras pessoas poderosas dentro da organização; Poder da expertise vem da experiência de uma pessoa (duh!). Isto é normalmente uma pessoa com uma habilidade aclamada ou valorizada; Uma pessoa que tem acesso a informações valiosas ou importantes possui o poder da informação; O poder legítimo vem da posição que uma pessoa detém. Isto está relacionado com o título de uma pessoa e responsabilidades de trabalho. Você também poderá ouvir isso se referir como poder posicional. As pessoas que são bem-queridas e respeitadas podem ter o poder da referência; 56 Poder da recompensa está baseado na capacidade de uma pessoa dar recompensas. Estas recompensas podem vir na forma de missões de trabalho, horários, salários ou benefícios. Agora, pare de ser modesto e pensar sobre si mesmo … Eu não tenho nenhum poder. Como você pode ver, existem muitas maneiras diferentes que o poder pode se manifestar. E por essa razão, é importante perceber que o poder existe em todos nós. É possível também que você tem diferentes tipos de poder com diferentes grupos ou situações. Agora, os dois maiores erros que vejo as pessoas fazerem do uso do poder, são: 1) Tentando usar o poder que elas não têm, e 2) Usando o tipo errado de poder para alcançar resultados. Para ajudar a identificar sua “zona de poder”, tome um momento e pense sobre como você tenta influenciar a ação dos outros. Você pode usar as descrições acima, como uma pseudo autoavaliação. Avalie-se numa escala de 1-5 em cada um dos diferentes tipos de poder. Com 1 sendo nenhuma de suas características e 5 sendo bastante característico. Este pode ser um exercício (desculpe o trocadilho) poderoso. Se você é honesto consigo mesmo, eu espero que você encontre um resultado útil. Não só pela maneira como você tende a usar o poder, mas na maneira como os outros usam o poder com você. 57 O Poder nas Empresas e Demais Organizações - o perigo representado por pessoas que tentam resistir às mudanças. Elias Alves - 28/04/2012 https://sites.google.com/site/espreendedor/o-poder-nas-empresas-e-demais-organizacoes---operigo-representado-por-npessoas-que-tentam-resistir-as-mudancas Um bom líder sempre pensa, planeja e age de maneira que seus funcionários e clientes sintam que necessitam da empresa e dele. Isto lhe garantirá a fidelidade dos funcionários e dos clientes. Existem vários tipos de poderes. O político, o do pensamento (positivo ou negativo), o do chefe de uma tribo, o do líder religioso, o de mercado, etc. Mas o poder que será o tema de uma série de artigos a partir deste é o que deve ser exercido por líderes de organizações sociais - empresas, escolas, associações, igrejas, etc. Todo poder é limitado. Para que uma pessoa ou um grupo exerça poderes, é preciso, no mínimo, existir pessoas sobre as quais os poderes devem ser exercidos. As pessoas que detêm poderes precisam também da existência de um conjunto de estruturas, estratégias e informações confiáveis para conseguir seus objetivos. Portanto, não existe poder ilimitado nem independente. O poder é a capacidade de uma pessoa ou um grupo exercer influências sobre outras pessoas ou grupos, mas isto só é possível depois que o detentor do poder conseguir identificar as motivações das pessoas a serem influenciadas. Para isto ele precisa primeiro identificar as fontes de seu poder. As fontes de poder segundo Galbreith Para descobrir o que pode motivar outras pessoas, o líder de uma organização precisa primeiramente identificar quesitos básicos dos quais seu poder deve provir. Esses quesitos são chamados "fontes de poder". John Kenneth Galbreith - Ph.D. em Economia Agrícola com mestrado e doutorado pela Universidade da Califórnia - identificou três dessas fontes como fundamentais: a personalidade, que é o conjunto de características pessoais de uma pessoa (inteligência, conduta moral, etc.); a propriedade ou riqueza, que é o conjunto de bens que uma pessoa possui, e a organização ou as organizações (escola, associação, igreja, etc.) da qual participa. Galbreith diz que a personalidade é o estágio mais antigo do exercício do poder. É o que mais atrai profissionais como jornalistas, radialistas, profissionais de 58 marketing, mas também advogados e outros que veem nela a possibilidade de participarem em programas de televisão como entrevistados e de se destacarem publicamente através de jornais e outros meios, não necessariamente porque querem "aparecer", mas porque precisam disso profissionalmente. A propriedade e a organização não os conduzem a essa possibilidade. Segundo Galbreith, a propriedade ou a riqueza de uma pessoa ou de um grupo transforma outras pessoas e outros grupos em seus submissos. Entre estes, estão os funcionários em relação aos seus chefes. Mas esses mesmos funcionários se tornam detentores do poder quando diante deles, em casa, se tornam submissos os empregados domésticos, e os demais membros de organizações (associações de moradores de bairros, clubes, etc.) das quais são presidentes. Neste caso, a pessoa ou grupo que detém poderes por interesses específicos pode até "comprar" certos tipos de políticos, de advogados e outras pessoas susceptíveis a subornos e até chantagens. Galbreith destaca a organização como a fonte de poder mais importante porque, segundo ele, são necessárias para que a pessoa garanta seu poder. Isto quer dizer que o declínio do poder proveniente da personalidade e da propriedade pode estar relacionado ao crescimento dos grupos organizados. Por serem instituições formadas por pessoas que se organizam para defender temas específicos, especialmente os de utilidade pública e social, essas instituições conquistam facilmente patamares sociais mais elevados e conquistam um reconhecimento público capaz de transformá-las nos chamados "movimentos sociais". Principais características pessoais associadas às mudanças de poder Entre os elementos pessoais que determinam a capacidade de exercício do poder, costumam-se destacar a personalidade, o 'status' social e as características formal e de competência. Quanto à personalidade, destacam-se o dinamismo, a capacidade de aproveitar oportunidades, a habilidade em negociações e no interrelacionamento pessoal e a motivação para o trabalho. O "status" social se refere à rede de relações que o funcionário é capaz de criar. Na verdade nunca é demais lembrar que isto é extremamente importante para qualquer pessoa obter sucesso na vida. 59 O que se chama de "autoridade formal" é a posição hierárquica como fonte de poder. Neste caso, não se trata do poder exercido pelos líderes, mas do exercido pelos chefes. Lembre-se, "liderança" e "chefia" não são a mesma coisa. A autoridade da competência mede a profundidade do conhecimento que o funcionário tem em relação à empresa para a qual ele trabalha. Como já foi esclarecido em outros artigos neste blog, todo funcionário que queira ser bem sucedido precisa conhecer o máximo possível sobre as potencialidades e as fraquezas da empresa em todos os aspectos; o que a legislação determina quanto à atuação da empresa no mercado e às suas funções sociais, etc. Neste caso, considera-se como líder a pessoa a quem os demais funcionários do departamento costumam, com maior frequência, perguntar o que podem ou não podem fazer ou como devem agir em determinadas situações. O líder é aquele que frequentemente dá a palavra final, a palavra que define uma decisão. Interesses em jogo Em se tratando de poder, o que se verifica claramente no âmbito da política também ocorre nas empresas. Como o poder se move de um departamento para outro e de uma pessoa para outra segundo as exigências das forças de mercado e as características pessoais, obviamente entram em jogo os interesses pessoais. Durante um período pré-eleitoral, os partidos políticos se unem em coalizões para fortalecer as possibilidades de eleição de seus representantes. No entanto, o que mais caracteriza as negociações políticas é o conjunto de interesses comuns dos partidos e pessoais de seus integrantes. Numa empresa, as coalizões para obtenção de poder ocorrem também por interesses pessoais e comuns, e surge outra coalizão a partir do momento em que alguém demonstra outro interesse diferente. O que se verifica ao final de tudo isto é que cada coalizão sempre se configura de forma bem diferente de todas as outras. Jay Galbraith destaca três elementos do poder como os principais Renomado economista norte americano, Jay Galbraith é considerado o precursor dos estudos sobre estruturas organizacionais. Atualmente desenvolve pesquisas para o Centro de Organizações Eficazes da Universidade do Sul da Califórnia. Ele garante a existência de três instrumentos básicos em qualquer organização: o condigno, o compensatório e o condicionado. Imposição sobre preferências pessoais dos funcionários 60 Segundo Galbraith, o poder condigno se destaca pela capacidade de impor ao indivíduo ou a um grupo uma alternativa desagradável e penosa o suficiente para fazê-lo desistir de suas preferências pessoais, usando-se até mesmo punições físicas para tal finalidade (desconforto, dores e até torturas). É um instrumento relacionado à personalidade como fonte de poder. A conquista em vez da obtenção Quando o assunto é o poder numa empresa ou organização, "conquistar" não é o mesmo que "obter". "Conquistar" é conseguir o poder através da opressão ou de interesses escusos; "obter" é alcançar ou conseguir o poder através do merecimento. O poder compensatório se dá pela conquista através de submissão em troca de favorecimentos como aumentos salariais, promoções e outras recompensas nem sempre legais. Tanto neste caso como no poder condigno, o funcionário está consciente de sua submissão. O poder compensatório é um instrumento cuja fonte de poder é a propriedade. Mudança de convicções através da persuasão O poder condicionado é exercido pela mudança de uma convicção. Estão inseridos nele a persuasão, a educação e o compromisso social com o que quer que nos pareça certo. É altamente subjetivo e se manifesta através da família, da escola, dos meios de comunicação, etc. um dos fatos mais interessantes em relação ao poder condicionado é que nem sempre os que o exercem ou os que a ele se submetem percebem sua presença. Isto acontece porque o condicionamento pode ser implícito ou explícito. É implícito quando determinado pela própria cultura à qual pertencemos e explícito ao ser efetuado, por exemplo, pela mídia - principalmente através de publicidade. Os "rituais" e o medo de perder o poder A burocracia costuma definir procedimentos que se transformam em rotinas e, mais do que isto, se tornam "rituais". Entre estas, estão certas circunstâncias e pompas que costumam ser adotadas em recepções a visitantes como autoridades políticas, celebridades de outros países, etc. Há muitos casos em que a burocracia costuma definir procedimentos que acabam se tornando "rituais". São conhecidos fatos em que esses "rituais" são simplesmente desnecessários - como os que ocorrem em certos bancos, nos quais eles são adotados até mesmo como rotina na abertura do atendimento diário por um caixa. 61 Além das rotinas ritualísticas, destaca-se o fato de que há pessoas que ocupam cargos elevados na hierarquia da empresa que simplesmente têm medo de mudanças. Não porque apenas não querem mudar algo que já está estabelecido e achem que uma modificação trará problemas à empresa, mas porque já estão acostumados a uma rotina que lhes garante um poder que não corem correr o risco de perder. Em muitas dessas situações, os chefes chegam a impor obstáculos contra quaisquer sinais de inovações e criatividade demonstrados por seus próprios funcionários, e muitos destes até são demitidos sob a alegação de necessidade de cortes nos gastos da empresa, inaptidão para as funções, etc. Despersonalização As burocracias determinam regras para os cargos, não para os ocupantes dos cargos. Isto faz com que os funcionários sejam conhecidos por seus próprios colegas pelos cargos que ocupam - diretor disto, gerente daquilo, etc. - e não por seus nomes. Existem situações, felizmente raras, em que os funcionários são conhecidos apenas pelos números das matrículas. Dizem que há quem goste dessa impessoalidade. Acredito que haja pessoas acostumadas a ela, mas "acostumar-se a algo" não é o mesmo que "gostar de algo". Creio que as únicas pessoas que poderiam de fato gostar disto seriam aquelas que se beneficiam através de favoritismos e corrupção. O público e os funcionários honestos - que felizmente existem - não querem tratamento impessoal. Querem e têm o direito de serem tratados como pessoas, não querem um tratamento padronizado. Se você perguntar sobre isto a um líder de um departamento de marketing, e se teste for sincero, será isto que ele lhe dirá como resposta. 62 CAPITULO IV O que veremos neste capítulo: Concepção e evolução de Estado. O Estado Moderno. Teorias sobre a origem do Estado. Burocracia. Burocracia e poder. A estrutura burocrática das empresas capitalistas. 1. Introdução Um sistema político, entendido como qualquer padrão permanente de relações humanas que implique de maneira significativa, em poder, governo ou autoridade precisa de um poder que o coordene, necessita de um poder que o estruture e o mantenha coeso. Esse poder é o poder político que na hierarquia dos poderes ocupa o lugar mais alto. Política, sistema político, poder, autoridade, sociedade e Estado são conceitos fortemente entrelaçados e sendo assim, não há como deixar em segundo plano o estudo de nenhum deles. O objetivo deste capítulo é mostrar o significado da palavra Estado, sua concepção e evolução. Também veremos a composição da estrutura necessária para o funcionamento do Estado, a burocracia. Em seguida, estudaremos a burocracia nas empresas, pois ela não é uma exclusividade do Estado. 2. O conceito de Estado Segundo Dias (2011), a palavra Estado surgiu para representar a situação ou condição de poder na sociedade política. No dicionário Houaiss a palavra Estado teve origem no século XIII e designa o conjunto das instituições (governo, forças armadas, funcionalismo público etc.) que controlam e administram uma nação. 63 O jurista italiano Norberto Bobbio, acrescenta que a primeira vez que a palavra foi utilizada, com o seu sentido contemporâneo, foi no livro O Príncipe, de Nicolau Maquiavel. O Estado, fenômeno histórico presente desde a Antiguidade em diversas regiões do planeta, constitui um conjunto de instituições por meio das quais o poder da sociedade se organiza. Essa organização independe de parentesco, não tem personalidade, é vinculada somente à corporação política que forma o povo organizado e serve para justificar o poder político. Neste sentido, podemos entender que o Estado é o aparato necessário para que se possa exercer o poder. Em resumo, no dizer de Dias (2011): “O Estado constitui uma sociedade politicamente organizada em um lugar e tempo determinado, onde vigora determinada ordem de convivência, com um poder soberano, único e exclusivo. [...].” 3. A concepção do Estado O conceito de Estado tal como o utilizado atualmente, e que é utilizado por organizações internacionais para identificar seus membros (como ONU e a OEA), tem sua origem no século XVI, com a formação do Estado moderno, em sua forma absolutista. Ao longo da história, o Estado moderno foi se adaptando a diferentes situações, evoluindo desde as formas absolutistas às democráticas. Hoje, como forma de sociedade, se apresenta como uma corporação de caráter territorial fundamentada pela solidariedade do povo, com autonomia, independência e soberania. Segundo Duverger, citado por Dias (2011), o Estado é uma comunidade humana em que os governantes são mais bem organizados, sendo este fato decorrente de três pontos: 1) o Estado possui a organização política mais complexa, tanto no que se refere à repartição de tarefas como à hierarquia dos órgãos; 64 2) no Estado encontramos um sistema de sanções organizadas que permitem aos governantes reprimir a desobediência e estabelecer a organização da sociedade; 3) o Estado dispõe de maior material para fazer executar suas decisões (exercito, policia, forças armadas, etc..) do que qualquer outra comunidade. 4. A evolução da concepção de Estado Na Grécia antiga encontramos as primeiras referências daquilo que podemos considerar como Estado. Em uma etapa primitiva existiram cidades importantes que eram dominadas por famílias. Tempos depois, surgiram comunidades com relações mais complexas no que diz respeito às formas de organizações. Eram as polis, cidades estados cuja ideia de governo e soberania não estava vinculada ao território que ocupavam. A preocupação maior dos gregos era centrada no comportamento político, econômico, religioso e cultural dos indivíduos, pois esses fundamentavam as leis e costumes, através da pratica da política. Na cultura romana, o Estado era a civitas ou a comunidade dos cidadãos. Tinha em sua constituição a assembleia, o senado e o povo. As formas de organização política romana foram a monarquia, a república e o império. Para Cícero, a civitas não era qualquer aglomeração humana, mas somente a que se baseia no consentimento da lei e na utilidade comum. 5. O Estado moderno Para conseguir o poder absoluto de seus territórios e a centralização do poder os principes empreenderam várias lutas contra o império e a igreja. Este conjunto de lutas foi a condição básica para o surgimento do Estado moderno. Vencidos o império e a Igreja, os princípes conseguiram concentrar o poder em suas mão, sendo que os principais fatores que possibilitaram esta concentração de poder foram: 65 I) a criação de um exército, cujos membros dependiam de pagamento; II) formação de uma estrutura composta de funcionários permanentes com competências bem definidas, economicamente dependente e organizada em hierarquia. A burocracia. III) a criação de um sistema de tributos em contraposição ao sistema de contribuição voluntária da nobreza. IV) Implantação de uma única ordem jurídica em todo território. Além destes fatores citados como importantes para o surgimento do Estado moderno não devemos esquecer: - a adoção do direito romano que trouxe o conceito da propriedade privada; - a reforma protestante que propiciou a ruptura com o poder da igreja, reforçando desta forma o poder do Estado; e - o desenvolvimento do capitalismo fruto da ascensão da burguesia. A primeira forma de Estado moderno que surge é o Estado absolutista, definido como o monopólio da força sobre três planos: a) jurídico – somente o Estado poderia produzir normas jurídicas; b) político – caberia unicamente ao príncipe legislar e administrar; e c) sociológico – o príncipe possui um novo instrumento operacional, uma máquina que atua de maneira racional e eficiente. 6. As teorias contratualistas sobre a origem do Estado Contratualismo é a ideia de que o Estado é o produto da decisão racional dos homens destinada a resolver os conflitos gerados pelo seu instinto antissocial ou para solucionar os problemas advindos da convivência. Os principais autores desta ideia são: Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jaques Rousseau. Suas teorias têm os seguintes pontos em comum: i) Partem da premissa que antes do Estado regido por leis, existiu o Estado em que os indivíduos tinham direitos naturais; 66 ii) Através do contrato social, os indivíduos decidem viver em uma sociedade regida por leis, tendo o Estado como instrumento de solução de conflitos; iii) há diferentes tipos de Estado: o absolutista (Hobbes), liberal (Locke) e democrático (Rousseau). 6.1. O contrato segundo Hobbes (1588-1679) Thomas Hobbes defendeu a ideia de que o ser humano é antissocial e sua conduta é motivada pelo egoísmo. Para ele, os pactos sociais poderiam ser mantidos desde que existisse um governo forte, pois o temor ao castigo induziriam os indivíduos a conviver em sociedade. De acordo com Hobbes, o homem é um ser agressivo e invejoso por natureza devido ao seu desejo de tirar vantagem num contexto inicial de igualdade. Em decorrência disso surgem os conflitos que somente podem ser resolvidos com a intervenção do Estado. Assim, o Estado é mais do que uma decorrência natural da vida em sociedade, é um instrumento necessário para garantir a estabilidade da convivência entre os homens. Hobbes dizia que a natureza humana era composta de duas tendências: A razão e a paixão. A paixão levava os homens a desejarem e a conseguirem os bens e privilégios dos outros, provocando o conflito. Já a razão, lhes mostrava que os bens conseguidos assim não podiam ser desfrutados e dessa forma era melhor pactuar. O pacto consistia na renúncia dos direitos em favor do soberano para que este estabelecesse a justiça e a moral. Desta forma, o soberano se torna o único poder legislativo e o Estado, a única fonte de direito. 6.2. O contrato segundo John Locke (1632-1704) Principal teórico do liberalismo, Locke contribuiu de maneira decisiva para o entendimento dos conceitos de liberdade e propriedade. 67 John Locke acreditava que as pessoas são livres e iguais, embora muito egoístas, buscando o crescimento pessoal sem se importar com a situação dos outros. Como as pessoas são livres e iguais, os poderes do Estado deveriam ser suficientes para garantir o cumprimento das regras de forma a assegurar que as pessoas conseguissem desfrutar seus direitos e as suas liberdades. O Estado deveria providenciar as regras (legislação), difundir o conhecimento (educação), garantir o cumprimento das regras (segurança) e punir o não cumprimento (justiça). 6.3. O contrato segundo Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) Diferentemente de Hobbes e Locke, Rousseau defende que as pessoas são livres, iguais e boas, e as sociedades é que as corrompem. Entretanto, existem inúmeras necessidades que precisam ser satisfeitas e neste sentido, o Estado, constituído segundo a vontade de todos, é o instrumento essencial da vontade geral expressa por meio de lei. 7. O Estado segundo Karl Marx A contribuição de Marx para a Ciência Política é de suma importância. Sua visão materialista, fundamentada no pressuposto de que as relações de produção determinam o modo pelo qual a sociedade se organiza, revoluciona o pensamento político. Para os marxistas, o Estado representa a organização de classe do poder político, que defende e garante a dominação de uma classe (a burguesia) sobre a outra (o proletariado). Esta estrutura dominante utiliza-se da religião e do sentimento nacionalista para perpetuar a relação desigual existente na sociedade capitalista. Para Marx, como o Estado pertencia todos, os meios de produção deveriam pertencer ao Estado e não aos particulares (propriedade privada). 68 8. Estado, burocracia e poder Max Weber foi o estudioso que cuidou de se aprofundar sobre a organização burocrática e teorizar o estudo da burocracia. Ele instituição analisa o burocrática, Estado sendo como sua uma criação necessária para assegurar à classe dominante, uma dominação política. Para garantir a sua dominação, o Estado dispõe de instituições para transmitir a sua ideologia, de instituições de repressão para garantir que as leis que são criadas, sejam cumpridas, e de instituições econômicas para poder intervir na economia. Para se entender melhor a forma de dominação no Estado, é preciso analisar a teoria da dominação de Weber. Segundo ele, existem três tipos de dominação: tradicional, carismática e legal. A dominação tradicional se caracteriza por uma legitimação que se baseia na crença na justiça e qualidade do dominador. O governante tem liberdade para emitir ordens, ficando restrito apenas aos costumes e hábitos da sua sociedade. A dominação carismática consiste na crença em qualidades excepcionais de um indivíduo para governar outros. Quando atinge uma complexidade maior, ele é assessorado pelos seus discípulos mais próximos. Trata-se de uma dominação instável e inconstante. Já a dominação legal se baseia num aparato de regras que legitimam o seu poder. Os assessores administrativos são chamados burocratas e também tem seu poder regulamentado legalmente, não podendo vendê-lo ou transferi-lo. Esses três tipos de dominação, porém, nunca acontecem de forma pura, tendo sempre características misturadas, mas prevalecendo um desses tipos. O Estado moderno sofre a burocratização em toda parte. Mas o fato de que a organização burocrática seja tecnicamente o meio de poder mais altamente desenvolvido nas mãos do homem que o controla, não determina o 69 peso que a burocracia, como tal, é capaz de exercer em uma estrutura social particular. Em condições normais, a posição de poder de uma burocracia plenamente desenvolvida é sempre predominante e toda burocracia busca manter, ou mesmo aumentar, a superioridade dos que são profissionalmente informados, mantendo secretos seus conhecimentos e intenções. A partir do Estado moderno, que fez valer a burocracia, as outras instituições cada vez mais vão adquirindo aspectos burocráticos. Exército, igreja e universidades já tem sua organização burocrática, mas é na grande empresa moderna onde ela é mais perfeitamente aplicada. Max Weber afirma que o moderno sistema de produção burocrático, eminentemente racional e capitalista, se originou da ética protestante: o trabalho árduo e o ascetismo proporcionando a poupança e reaplicação das rendas excedentes, em vez de seu dispêndio para o consumo. 9. A Teoria da burocracia e o pensamento administrativo A Teoria da Burocracia desenvolveu-se dentro da Administração ao redor dos anos 40, em função, principalmente, dos seguintes aspectos: - A fragilidade e parcialidade da Teoria Clássica (Taylor e Fayol) e da Teoria das Relações Humanas (Diversos – grande depressão); - A necessidade um modelo de organização racional aplicável não somente à fábrica, mas a todas as formas de organização, principalmente às empresas; - O tamanho e complexidade crescentes das empresas. O conceito central da Teoria da Burocracia é a autoridade legal, racional ou burocrática. Os subordinados aceitam as ordens dos superiores como justificadas, porque concordam com um conjunto de preceitos ou normas que consideram legítimos e dos quais deriva o comando. A obediência não é devida a alguma pessoa em si, mas a um conjunto de regulamentos legais previamente estabelecidos. O aparato administrativo que corresponde à dominação legal é a burocracia. A posição dos funcionários (burocratas) é definida por regras 70 impessoais e escritas, que delineiam de forma racional a hierarquia os direitos e deveres inerentes a cada posição, os métodos de recrutamento e seleção, etc. A burocracia é a organização típica da sociedade moderna democrática e das grandes empresas. Através do “contrato” ou instrumento representativo da relação de autoridade dentro da empresa capitalista, as relações de hierarquia nela passam a constituir esquemas de autoridade legal. Weber notou a proliferação de organizações de grande porte que adotaram o tipo burocrático de organização, concentrando os meios de administração no topo da hierarquia e utilizando regras racionais e impessoais, visando à máxima eficiência. Fatores principais para o desenvolvimento da moderna burocracia: - O desenvolvimento de uma economia monetária; - O crescimento das tarefas administrativas do Estado Moderno; - A superioridade técnica do tipo burocrático de administração. Características da Burocracia - Caráter legal das normas e regulamento. - Caráter formal das comunicações. - Caráter racional e divisão do trabalho. - Impessoalidade nas relações. - Hierarquia da autoridade. - Rotinas e procedimentos padronizados. - Competência técnica e meritocracia. - Especialização da administração. - Profissionalização dos participantes. Vantagens da Burocracia Para Weber, comparar os mecanismos burocráticos com outras organizações é como comparar a produção da máquina com modos não mecânicos de produção. 71 Assim, as vantagens da burocracia são: - Racionalidade em relação ao alcance dos objetivos da organização; - Precisão na definição do cargo e na operação; - Rapidez nas decisões; - Unicidade de interpretação; - Uniformidade de rotinas e procedimentos; - Continuidade da organização através da substituição do pessoal afastado; - Redução do atrito entre as pessoas; - Subordinação dos mais novos aos mais antigos - Confiabilidade. Nessas condições, o trabalho é profissionalizado, o nepotismo é evitado e as condições de trabalho favorecem a moralidade econômica e dificultam a corrupção. A equidade das normas burocráticas assegura a cooperação entre grande número de pessoas, que cumprem as regras organizacionais, porque os fins alcançados pela estrutura total são altamente valorizados. Bibliografia Dias, Reinaldo. Ciência Política. São Paulo: Editora Atlas, 1ª ed. 2011. 72 CAPITULO V O que veremos neste capítulo: Retrospectiva. Política, poder e Administração. Liderança e poder. Dependência, a chave do poder Táticas de poder O poder em ação, o comportamento político. 1. Retrospectiva Política, sistema político, poder e autoridade são conceitos fortemente entrelaçados e tem importância equivalentes. Relacionar esses conceitos com o mundo empresarial não é difícil visto que em uma empresa temos relações de poder, autoridade e, por que não dizer, de polítca. Nas notas de aulas anteriores estudamos todos esses conceitos, começando pela política e seus primeiros pensadores na Grécia. Da política passamos para o sistema político padrão permanente de relações humanas onde coexistem poder, governo e autoridade. È difícil não acharmos uma relação de poder em nossas vidas. Ela ocorre, em diferentes intensidades, em praticamente todas as relações sociais. Além de variar em intensidade, também existem diversos tipos de poderes. No entanto, apesar desta diversidade, podemos estabelecer uma hierarquia entre os poderes, tendo o poder político o lugar de maior destaque. É um fenômeno intrigante, complexo e oculto. Está presente nos setores públicos e privados com fins lucrativos ou não, em situações de trabalho voluntário e trabalho remunerado. Cada tipo de organização difere em termos de objetivo, quadro de pessoal e outras variáveis, mas os problemas de poder organizacional são muitas vezes da própria sobrevivência individual e estão presentes em cada uma delas. 73 Para Robbins (2002), poder é um processo natural em qualquer grupo ou organização. Ele tem origem na força ou na autoridade. A força, como fonte de poder, surge quando um agente usa ou ameaça de coerção física outro agente. È uma característica dos Estados. A outra fonte de poder, a autoridade, pode ser definida como um direito de decidir sobre o comportamento de outrem. Max Weber identificou três tipos de autoridade: a burocrática; a tradicional e a carismática. O estudo da política, do poder e da autoridade inicialmente acontece naquela instituição que conhecemos como Estado. Entretanto, podemos encontrar estes conceitos também nas organizações privadas. Quando utilizado de maneira equilibrada o poder pode trazer benefícios para a empresa, devendo o gestor decidir a forma mais adequada de exercê-lo, sem ser autoritário e inflexível, mas com firmeza, pois como escreveu Maquiavel, “O homem que tenta ser bom o tempo todo está fadado à ruína entre os inúmeros outros que não são bons”. 2. Política, poder e a Administração Política é, como sabemos, a arte da organização, direção e administração. Com o objetivo de mostrar como a política e o poder se desenvolvem nas empresas, definimos a seguir o que é administração. A administração, também chamada gerenciamento ou gestão de empresas, é uma ciência humana fundamentada em um conjunto de normas e funções elaboradas para disciplinar elementos do processo produtivo. Ela estuda os empreendimentos humanos com o objetivo de alcançar um resultado eficaz de forma sustentável. Neste contexto, o administrador necessita de autoridade para executar suas principais funções que são: Planejar, organizar, liderar e controlar. As instituições administradas são entidades sociais de pessoas e recursos que interagem em ambientes físicos ou não. Essas interações são conhecidas como relações de trabalho. Nelas, o poder e o conflito, estam sempre presentes. 74 Assim, o campo das relações de trabalho surge como espaço propicio de manifestações de poder, produzindo as diversas relações de força existentes entre os grupos de interesse nas próprias organizações. Esses interesses são em geral econômicos, mas os fatores políticos, que podem ser visto na aceitação das regras de maneira consensual quando, eliminando-se o caráter de imposição e garantindo a eficácia do sistema produtivo, como nos ensinam as teorias contratualistas sobre a formação do Estado moderno, são muito importantes. Neste cenário, Morgan (1996) diz que as organizações podem ser vistas como sistemas de atividade política, e esta política organizacional nasce quando as pessoas pensam diferentemente e querem agir diferentemente. Essa diversidade cria tensão que precisa ser resolvida por meios políticos ou, dito de outra forma, por quem detém o poder político. 3. Liderança e poder são sinônimos? Os líderes utilizam o poder como meio de atingir objetivos, seja do grupo ou até mesmo pessoal. Portanto, liderança e poder estão muito próximos, mas não sinônimos. Diferem basicamente de três formas: a) Quanto à vinculação de objetivos; b) Quanto ao foco da influência; c) Quanto a Importância da origem e conquista No primeiro caso, o líder precisa, para ser bem sucedido, fazer seus liderados compartilharem dos seus objetivos, enquanto o exercício do poder requer apenas dependência. Quanto ao foco da influência, a liderança é explicada basicamente pela relação líder - liderado. Já o exercício do poder, para ser 75 entendido corretamente, precisa considerar todos os efeitos, diretos e indiretos, verticais e horizontais. Quanto à importância da origem e conquista, a preocupação sobre a liderança tem foco no estilo do líder. Com relação ao poder, a preocupação é com as táticas de conquistas e da submissão. 4. Dependência, a chave do poder Quanto maior a dependência, maior o poder. Isto nos leva a seguinte constatação: A dependência aumenta quando o recurso detido por um agente é importante, escasso ou não substituível. Um recurso será considerado importante se alguém desejar fortemente aquilo que é possuído por um agente. A escassez, objeto principal de estudo da economia, é um fator determinante para estabelecer o nível de dependência. Quanto menos escasso for um recurso, menos poder ele dará ao seu proprietário. No que se refere à substituição, a conclusão é: quanto menos substitutos viáveis tiver um recurso, maior o poder que seu controle proporcionará. Conclusão: as fontes de poder variam de empresa para empresa. Em uma empresa, os recursos tecnológicos significam fonte de poder; em outra, são os departamentos de marketing os poderosos. 5. Táticas de poder O bom exercício do poder é importante, mas como fazê-lo com eficiência? A maneira como os agentes influenciam os outros, as táticas de poder, são os caminhos para o sucesso, ou não, do exercício do poder. 76 Segundo Robbins (2002), as táticas ou estratégias mais importantes para consquitar e exercer são sete. Vejamos cada uma delas e seu respectivo significado. 1) Razão - argumentação racional e lógica de ideias. 2) Amabilidade - promoção de um clima amigável por meio de uma postura humilde. 3) Coalização - Obtenção de apoio do grupo para suas ideias. 4) Negociação - oferecimento de benefícios ou favores para resolver um conflito. 5) Afirmação - abordagem forte e direta para exigência do cumprimento de obediência. 6) Autoridades superiores - faculdade de conseguir apoio dos superiores para suas ideias. 7) Sanções - utilização de recompensas, punições, promessas e ameaças para motivar. Os administrados utilizam essas táticas ou estratégias de poder em dois planos: I - com relação aos subordinados II - com relação aos seus superiores Em ambos os casos, a razão, segundo Robbins (2002), é o meio mais efetivo para exercer o poder. O uso da estratégia adequada depende, em geral, do objetivo a ser atingido, da expectativa quanto ao resultado pretendido e da cultura organizacional. 6. O poder em ação, o comportamento político Robbins (2002), argumenta que o poder nas organizações é posto em prática quando os agentes se agrupam para exercer influência, seja para conseguir aumentos de salários, promoções ou melhorias das condições de trabalho. Neste caso, estão colocando em prática seus poderes, isto é, estão fazendo política. 77 Essa maneira de agir é vista por Robbins (2002) como comportamento político. De maneira mais formal ele define comportamento político como atividades que não são requeridas como parte do papel formal na empresa, mas influenciam, ou tentam influenciar, a distribuição de vantagens e desvantagens dentro do grupo. O comportamento político, em geral, está fora dos requisitos específicos do trabalho das pessoas. Robbins divide este comportamento em dois tipos: I) O comportamento político legítimo – Aquele relacionado às atividades do dia. Exemplos: reclamar com o chefe, formar coalizões, desenvolvimento de contatos fora da empresa. II) O comportamento político ilegítimo – Aquele que viola as “regras do jogo”. Quem o pratica é chamado de individuo que “joga sujo”. Exemplo: sabotagem, denúncia de colegas e uso de roupas inadequadas. 6.1. A realidade política A política é um fato nas empresas e quem ignorá-lo corre serio risco de ser mal sucedido em sua vida profissional Uma questão importante é: È possível que em uma organização não exista política? Robbins (2002), responde que sim, é possível, mas improvável. Não existirá política se todos na empresa tiverem os mesmos interesses, se compartilharem as mesmas metas, se os recursos organizacionais forem ilimitados e se os resultados dos desempenhos forem totalmente claros e objetivos. Este não parece ser o mundo real, tendo em conta que as organizações são formadas por pessoas com diferentes interesses. È essa diversidade é, normalmente, a grande fonte de conflitos. Esses conflitos podem se materializar pelos seguintes motivos: a) competição pelo uso dos recursos da empresa b) busca de apoio para aprovar interesses 78 6.2. Fatores que contribuem para a existência do comportamento político Pesquisas recentes apontaram alguns fatores que contribuem para o desenvolvimento do comportamento político nas empresas. Aqui estão alguns deles: Fatores individuais: – capacidade de automonitoramento - necessidade de poder - investimento na organização - conformidade - expectativa de sucesso Fatores organizacionais - Alocação de recursos - oportunidades de promoção - sistema de avaliação de desempenho pouco claro - pressão por alto desempenho - abordagem de soma zero Bibliografia Robbins, Stephen P. Comportamento Organizacional. Tradução técnica: Reynaldo Marcondes. São Paulo: Prentice Hall, 9ª ed. 2002. 79 EXERCÍCIO DE FIXAÇÃO O informe oficial quase fez parecer que foi voluntário. Jon S. Corzine, líder do Goldman Sachs, decidiu declinar do cargo de presidente. Na verdade, Corzine foi expulso por um golpe orquestrado pelo comitê executivo da empresa, formado por cinco poderosos executivos. A maneira como Corzine perdeu o emprego é um bom exemplo do papel do poder e da política dentro das organizações. Corzine foi nomeado presidente do Goldman em 1994. A empresa, na época, lutava contra prejuízos no setor de tesouraria e a perda súbita de vários parceiros importantes. Corzine tomou o controle, estabilizou a empresa e ajudou a levantar o moral e a lucratividade. Mas diversos incidentes ocorridos em 1998, solaparam seu poder. Primeiro, os sócios resolveram abrir o capital da empresa. Isto resultaria em um enorme ganho para todos eles. mas os investidores fogem das empresas que se dedicam as operações de tesouraria, por causa da imprevisibilidade desse setor. Os bancos de investimentos, tem ganhos mais estaveis que provem de comissões sobre administração de fundos e subscrições. Como o Goldman tinha ambas as funções, o comitê todo-poderoso dos cinco executivos decidiu apresentar a empresa aos investidores como um banco de investimentos. O problema era que Corzine tinha suas raízes voltadas para as operações de tesouraria. Líder natural, com um estilo dissimulado e desorganizado, ele era visto pela comunidade financeira como ligado a área de comercialização de títulos. Em comparação, o braço direito dele, Henry Paulson, que por sinal era membro do comitê executivo, vinha do lado do banco de investimentos. Reservado, educado e extremamente organizado, Paulson se ajustava perfeitamente à imagem que a empresa pretendia passar para a comunidade financeira. Em segundo lugar, em agosto e setembro de 1998, o Goldman teve um prejuízo de U$$ 500 milhões no setor de tesouraria. O fato aconteceu alguns meses antes da empresa fazer sua oferta pública. Istou reforçou os problemas com o negócio de comercialização de títulos e prejudicou a imagem de Corzine. Terceiro, um dos principais apoiadores de Corzine, o vice-presidente Roy Zuckerberg, deixou o comitê executivo no final de novembro. Por fim, Corzine e Paulson nunca foram muito próximos. Seus históricos e estilos eram muito diferentes, gerando um relacionamento muitas vezes conflitante. Com Corzine perdendo seu apoio e a percepção de que Paulson seria um líder mais adequado para o processo de abertura de capital da empresa, parecia ter chegado o momento de Paulson dar seu golpe. E foi o que ele fez. Em 11 de janeiro de 1999, a empresa divulgou um comunicado oficial dizendo que Corzine estava deixando seu posto e o comitê executivo, dissolvido, fora substituido por um comitê gestor de 15 executivos liderado por Paulson. Adaptado do livro Comportamento organizacional, 9a. edição, 2002, páginas 340 e 341. Editora Prentice Hall. 80 CAPITULO VI O que veremos neste capítulo: Introdução. Teorias contratualistas. Economia Política. Poder político e o poder econômico. Intervenção do Estado na economia. 1. Introdução Depois de conhecermos um pouco mais sobre o poder, estudando como ele se desenvolve nas empresas voltemos nosso foco para a política, em especial a Economia Política ou, dito de outra forma, o estudo da influência política na economia. Para entendermos melhor este tema vamos recordar um pouco das teorias contratualistas. Contratualismo é a ideia de que o Estado é o produto da decisão racional dos homens destinada a resolver os conflitos gerados pelo seu instinto antissocial ou para solucionar os problemas advindos da convivência. Os principais autores desta ideia são: Thomas Hobbes, John Locke e Jean-Jaques Rousseau. Suas teorias têm os seguintes pontos em comum: i) Através do contrato social, os indivíduos decidem viver em uma sociedade regida por leis, tendo o Estado como instrumento de solução de conflitos; ii) há diferentes tipos de Estado: o absolutista (Hobbes), liberal (Locke) e democrático (Rousseau). Thomas Hobbes defendeu a ideia de que o ser humano é antissocial e sua conduta é motivada pelo egoísmo. Para ele, os pactos sociais poderiam ser mantidos desde que existisse um governo forte, pois o temor ao castigo induziriam os indivíduos a conviver em sociedade. John Locke acreditava que as pessoas são livres e iguais e sendo assim, os poderes do Estado deveriam ser suficientes para garantir o 81 cumprimento das regras de forma a assegurar que as pessoas conseguissem desfrutar seus direitos e as suas liberdades. Desta forma, o Estado deveria providenciar: a) as regras (legislação); b) difundir o conhecimento (educação); c) garantir o cumprimento das regras (segurança); e d) punir o não cumprimento (justiça). Rousseau defendeu a ideia de que as pessoas são livres, iguais e boas, e as sociedades é que as corrompem. Entretanto, existem inúmeras necessidades que precisam ser satisfeitas e neste sentido, o Estado, constituído segundo a vontade de todos, seria o instrumento essencial da vontade geral expressa por meio de lei. Além das teorias contratualistas, outros autores contribuíram para tentar explicar a necessidade da existência do Estado. Um dos mais importantes foi Karl Marx. Ele acreditava que o Estado representava a organização de classe do poder político, que defende e garante a dominação de uma classe (a burguesia) sobre a outra (o proletariado). Para Marx, como o Estado pertencia a todos então, os meios de produção deveriam pertencer ao Estado e não aos particulares (propriedade privada). 2. Economia Política Economia política foi um termo criado por Antonie de Montchrétien em 1615, e utilizado para o estudo das relações de produção, especialmente entre as três classes principais da sociedade: capitalistas, proletários e latifundiários. Adam Smith, um dos adeptos da economia política, propôs a teoria do valor-trabalho, segundo a qual o trabalho é a fonte real do valor. No final do século XIX, o termo economia política foi paulatinamente trocado pelo economia, usado por aqueles que buscavam abandonar a visão classista da sociedade, repensando-a pelo enfoque 82 matemático, axiomático e valorizador dos estudos econômicos atuais e que concebiam o valor originado na utilidade que o bem gerava no indivíduo. Atualmente o termo economia política é utilizado comumente para referir-se a estudos interdisciplinares que se apoiam na economia, sociologia, direito e ciências políticas para entender como as instituições e os contornos políticos influenciam a conduta dos mercados. Dentro da ciência política, o termo se refere principalmente às teorias liberais e marxistas, que estudam as relações entre a economia e o poder político. 3. As relações entre o poder político e o poder econômico Muito antes de analisarmos as instituições políticas – governos e partidos políticos –, que na democracia são os instrumentos de exercício do poder, é preciso reconhecer que esses governos e partidos são sustentados por recursos, valores e uma cultura própria da sociedade. Desse conjunto de fatores nascem os poderes que nos governam. Nas sociedades modernas existem como já vimos várias formas de poder, sendo o mais visível e atuante, sem dúvida, o poder político, exercido pelo Estado. Cada cidadão transfere, como nos ensina as teorias contratualistas, para esta instituição, o Estado, uma parte da sua soberania individual, conferindo-lhe mandato para atuar em seu nome na defesa dos interesses comuns da sociedade. Este poder representativo de toda a sociedade dá ao Estado autoridade para exercer sobre o conjunto das pessoas o poder político, nas mais variadas formas: legislativa, administrativa, judicial e coerciva. Outro poder relevante e presente na sociedade é o poder econômico. Apesar de a sua presença não ser notória, pois se apresenta como um conjunto disperso e normalmente não organizado institucionalmente, o poder econômico constitui na verdade um poder final, muito importante e decisivo das sociedades modernas. Este poder tem influência sobre todos os outros poderes, 83 exercendo uma ação dinamizadora sobre o conjunto da sociedade, incluindo sobre os poderes político, mediático e os grupos de pressão. Trata-se de um poder fundamentado na propriedade privada e por isso dizemos que estamos no chamado domínio dos direitos absolutos, pois é inerente ao ser humano, não sendo permissível que sobre o mesmo se sobreponha outro qualquer direito de propriedade. A lei atribui o mais amplo conteúdo ao direito de propriedade privada: o direito de possuir, usufruir e decidir sobre o seu destino. A questão de saber qual a relação entre o poder político e o poder econômico está intimamente ligada à natureza do regime e da política econômica. Buscando extremos na ilustração, diríamos que, num regime de economia baseada na propriedade coletiva dos meios de produção e da direção centralizada da economia, o poder econômico pertence ao povo, que o exerce através da classe política, das cooperativas, dos sindicatos, dos órgãos de gestão das empresas, onde participam diretamente, e de uma série de outros meios e mecanismos populares de gestão da economia, próprios dos sistemas de economia centralmente dirigida. Aqui o poder econômico privado não teria espaço para se afirmar. Diversamente, em um regime cuja economia é baseada na propriedade privada e nas leis do mercado, o poder econômico pertence a quem tem a propriedade desses bens. Os principais atores do poder econômico são, pois, os que detêm a propriedade dos principais e mais importantes bens da economia. Nas economias de mercado, o alcance e a dimensão deste poder são determinados pelo papel econômico do Estado, cuja maior ou menor intervenção na economia depende do regime econômico respectivo. Este pode ser mais ou menos liberal, consoante a tendência ideológica de quem exerce o poder político em cada momento histórico. Modernamente, e independentemente da coloração ideológica de quem exerce o poder político, os Estados não prescindem de uma 84 intervenção reguladora da economia, tendente a suprir as lacunas do poder econômico privado e evitar as crises que o liberalismo econômico nefasto potencia. Exemplo de liberalismo nefasto e das suas consequências (trágicas) foi a recente crise financeira e económica mundial. Pelas razões acima apontadas, faz todo o sentido que, nas economias emergentes, sobretudo as que têm históricos de colonização, o poder econômico privado com influência decisiva sobre o conjunto da sociedade seja nacional, pois ele constitui o poder real - podendo determinar o curso do poder político - e é uma forma de contribuir para a afirmação da soberania nacional e para a independência econômica efetiva. Pelas mesmas razões, no jogo entre o poder político e o poder econômico, o Estado tem a responsabilidade de garantir o equilíbrio entre ambos, dando efetividade aos princípios da liberdade de iniciativa econômica privada e da orientação e regulação públicas da economia. 4. Intervenção do Estado na economia Até 1930 o pensamento econômico predominante era aquele denominado liberal. O pensamento liberal ou liberalismo, que teve como principais expoentes John Locke e Adam Smith, pregava a ideia de que a economia deveria funcionar sem que o Estado tivesse participação direta no processo de produção, como também no consumo, visto que as liberdades individuais deveriam ser respeitadas para que tudo se acomodasse de forma comum e simples. Neste cenário, o sistema econômico era dominado pelas leis de mercado, quer dizer, as forças competitivas da economia se encarregavam ou deveriam se encarregar de fazer os ajustamentos necessários a qualquer desequilíbrio, que por ventura acontecesse. Até então, não havia nenhuma preocupação, quanto à economia como um todo, devido ser mais importante, entender como funcionavam os preços dos produtos e dos fatores de produção no processo de crescimento, das relações exteriores, e do bem-estar interno da população. Isto aconteceu 85 pautado numa suposição mais forte e delicada que seria toda a base do sistema econômico vigente - a concorrência perfeita. Na verdade, os mercados estavam funcionando numa estrutura de grande imperfeição, tendo em conta as acumulações de capital que se processavam, e as concentrações que estimulavam os conglomerados, na formação de oligopólios e monopólios exploradores, invalidando a filosofia da competição perfeita. A crise de 1929 motivou o surgimento de novas ideias em especial as de John Maynard KEYNES (1936). Os estudos de Keynes indicaram que a saída para a crise vivida pelos Estados Unidos passava pelo aumento da participação do Estado na Economia, e foi com isto que surgiu a intervenção do Estado na economia. A intervenção do Estado na economia vem justamente com o aparecimento da macroeconomia, isto é, um estudo econômico que versa sobre a economia como um todo e não localizado, como na teoria dos preços, da famosa competição perfeita. Nestas mesmas condições, o Estado passou de mero coordenador das atividades nacionais gerais, a uma situação de capitalista de Estado, investindo, poupando, decidindo como deve ser a economia, enfim, intervindo na estrutura econômica, de tal maneira que os ajustes econômicos eram coordenados pela intervenção do Estado, através de medidas próprias. E a crise de 1929 teve fim. Alguns países progrediram e se fomentou neste processo de acumulação e concentração, a divisão de países terceiro-mundistas, periféricos, ou, subdesenvolvidos; mas, isto decorrente de uma economia dominadora, imperialista, onde predominam e fortificam-se os poderosos na economia. Para que o Estado agisse com eficiência na estrutura de mercado, KEYNES observou que o sistema econômico não se autorreajusta por si só, ao considerar que, nem sempre a produção global encontra sua procura efetiva e isto faz com que, alguém trace melhor o caminho que a economia deve percorrer. 86 A partir de então os países, desenvolvidos ou em desenvolvimento, adotaram medidas que visavam maior ou menor intervenção do Estado na economia de forma a cumprir com eficiência as funções do Estado. E é neste contexto que a economia está totalmente vinculada aos princípios do Estado como instituição, quer se trate de capitalismo, ou, de socialismo, o Estado já tem bem definido, em seus caminhos a seguir em sua estratégia de planejamento. As funções do Estado seriam de procurar conseguir o máximo bem-estar econômico e social possíveis, para toda a sociedade. Para tanto, ele dispõe de vários instrumentos como a política fiscal e a política monetária, além da importante contribuição que pode prestar ao desenvolvimento econômico mediante a investigação científica e a divulgação dos seus resultados. 5. Exemplos da Intervenção do Estado na economia brasileira O grau de intervenção do Estado na economia está diretamente relacionado ao posicionamento ideológico da elite governante. Para os adeptos do pensamento liberal, o Estado deve intervir o menos possível. Contrariamente, os defensores do socialismo advogam maior intervenção do Estado na Economia. No Brasil, a atuação econômica estatal aparece de forma mais efetiva na década de 40, quando tem início o processo de substituição das importações. Dada à fragilidade da iniciativa privada, o Estado exercia o papel de condutor da economia. Nessa década foram criadas as primeiras grandes empresas estatais, a Companhia Siderúrgica Nacional, a Fábrica Nacional de Motores, a Companhia Vale do Rio Doce e a Companhia Hidrelétrica do São Francisco. Na década seguinte, estabeleceu-se uma importante discussão ideológica acerca do papel do Estado, sobretudo devido ao contexto da guerra fria onde o mundo ficou dividido entre o pensamento capitalista – sob a liderança dos EUA - e as ideias socialistas capitaneadas pela antiga URSS. 87 Neste contexto conturbado surgiram somente duas empresas estatais merecedoras de destaque: o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico – BNDE (depois BNDES) e a Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobrás) – que foi criada simbolicamente, após uma ampla mobilização popular. Mas foi a partir da década de 60, após o movimento militar de 1964, e ao longo de toda a década de 70, quando foram criadas mais de 300 empresas estatais, que o Estado brasileiro cresceu de maneira mais forte. Em setembro de 1981, recenseamento oficial indicou a existência, apenas no plano federal, de 530 pessoas jurídicas públicas, de teor econômico. Na década de 90 com o governo Collor e depois com a implantação do plano Real, o pensamento liberal (neoliberal) ganha força e a tese do Estado mínimo fundamentam as privatizações e a diminuição do Estado empresário. Este viés neoliberal perdeu um pouco de força a partir de 2003 quando o governo eleito no final de 2002 mesmo dando continuidade a algumas medidas conceitualmente liberais investiu na área social com a instituição ou ampliação de programas de assistência. Em entrevista concedida a Associação dos Docentes da Universidade de São Paulo em janeiro de 2011, o professor André Singer, do Departamento de Ciências Políticas da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP (FFLCH), avaliou que o governo Dilma Rousseff tende, ao menos de início, a não afastar-se das linhas mestras do projeto político liderado por Lula, que envolve “transformação dentro da ordem, sem ruptura”. Ou seja, a seu ver, a continuidade, no sentido de ausência de radicalismo, deve prevalecer. Isso porque, dentro da ampla coalizão que elegeu Dilma, as forças políticas ligadas ao capital rejeitam medidas mais contundentes, tais como imposto sobre grandes fortunas ou redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais. Singer não descarta tais mudanças, mas acredita que dependeriam de uma alteração na atual correlação de forças. O professor da FFLCH chama atenção para a complexidade da situação: no interior da composição vencedora, o antagonismo entre de um lado 88 os trabalhadores organizados, e de outro lado “o que restou do capital industrial nacional”, pode ser superado quando se trata de combater a atual política cambial, com a finalidade de preservar empregos e barrar a desindustrialização. “Mexer na política cambial significa um confronto com o setor dominante do capital, que é o capital financeiro. Para enfrentar este bloco é preciso reunir muita força e, portanto, vai haver necessidade de unir esses setores, porque o poder do capital financeiro é muito grande”. Na sua opinião, a vitória de Dilma confirma suas teses sobre o lulismo, fenômeno que expressa um realinhamento do eleitorado e o advento de uma nova e duradoura agenda política para o Brasil: “Existe uma nova maioria, articulada em torno da idéia de combate à pobreza sem ruptura da ordem”. A nova maioria pode incluir interesses muito amplos: desde os setores mais pobres até setores do próprio capital financeiro, “à medida que você mantém, por exemplo, uma taxa de juros relativamente alta”. Contudo, o núcleo dessa vasta composição social, precisa ele, “é formado pelos interessados no processo de distribuição de renda por meio de maior intervenção estatal, que tem um sentido antineoliberal”. O governo Lula, diz, mudou a agenda, que deixou de ser a diminuição do Estado e ampliação do mercado, para ser uma agenda de combate à pobreza: “O que me leva a achar que não está correto o diagnóstico de que o governo Lula aprofunda o neoliberalismo”. Singer pensa que a oposição não tem como fugir da nova pauta fixada pelo realinhamento, o que explica as promessas feitas pelo candidato José Serra no segundo turno, tais como aumento do salário-mínimo e ampliação do Bolsa Família. A entrevista foi concedida a Pedro Estevam da Rocha Pomar e Kamila el Hage. Bibliografia Queiroz, Francisco. As relações entre o poder político e o poder econômico. http://expansao.sapo.ao/home/opiniao/francisco_queiroz/as_relacoes_entre_o_poder_politico_e_o_poder_e conomico. 2010-06-04 11:30:00 Entrevista André Singer: Governo Dilma tende à continuidade e ao equilíbrio, sem ruptura. http://www.adusp.org.br/files/revistas/49/r49a01.pdf 89 Texto para discussão Poder Político e Poder Econômico Paul Singer | 29-11-2011| www.kaosenlared.net/noticia/poder-politico-poder-econmico “Os países que preservaram instituições estatais conseguiram resistir às pressões neoliberais e priorizar desenvolvimento, geração de emprego e combate à pobreza. No Brasil, o Poder Político não está submetido ao Poder Econômico.” 'Banco público impede submissão da política ao poder econômico' A decisão do [então] primeiro ministro da Grécia de submeter o próximo pacote de “ajuda” da Europa ao seu país a uma consulta popular desencadeou uma queda espetacular das cotações nas bolsas de valores no mundo inteiro, colocando em foco a profunda contradição entre o Poder Político e o Poder Econômico nos países capitalistas democráticos, que hoje são a grande maioria das nações. Uma decisão que deveria ser normal em qualquer democracia – a de consultar o povo, do qual o governo, isto é, o Poder Político, é o representante – acaba de provocar pânico entre os donos do capital financeiro, que hoje detém a hegemonia do poder. A mesma contradição é a fonte da motivação essencial do movimento hoje mundial dos Indignados, que desde 15 de outubro promove a ocupação das praças centrais dos distritos financeiros de 951 cidades em 82 países. O que os Indignados demandam, acima de tudo, é que a democracia formal, vigente nestes países, se torne real, ou seja, que o Poder Político eleito pelo povo de fato o represente, em vez de executar políticas que beneficiam exclusivamente a classe que exerce o Poder. O que evidencia a contradição de interesses entre a maioria do povo – os 99% que os ocupantes de Wall Street almejam representar – e o 1% que constitui a elite do Poder. A contradição entre Poder Político e Poder Econômico se explica pela origem de um e outro Poder. Em democracias, o Poder Político é exercido pelos eleitos pela maioria dos cidadãos, que é necessariamente constituída por trabalhadores não proprietários de meios de produção social, boa parte dos quais ganha a vida como assalariados de empresas capitalistas; ao passo que, no capitalismo, o Poder é exercido pelos capitalistas, mas não por todos por igual. Os empresários da economia real, isto é, cujas empresas produzem bens e serviços que atendem necessidades humanas, dependem de crédito tanto para financiar vendas a prazo quanto para investir em matérias primas, maquinário, instalações etc., na medida em que a demanda por sua produção se expande; o crédito é concedido por bancos, fundos de investimento e outros intermediários 90 financeiros. A renda não gasta pelas famílias, empresas e governos é depositada nestes intermediários, que a redistribuem na forma de empréstimos aos governos, empresas e famílias cujos gastos superam sua renda. Os bancos, fundos etc., que são empresas capitalistas, visam maximizar seus próprios lucros, emprestando a juros maiores do que pagam aos depositantes e aplicando parte dos depósitos que lhes são confiados em títulos de propriedade de firmas (ações) ou de débito emitidos por governos e empresas. Commodities, ações de novas empresas e cotas de fundos de investimento são transacionados em leilões diários nas bolsas de valores e suas cotações flutuam ao sabor das oscilações de oferta e demanda pelos mesmos. A maior parte dos participantes nestes leilões são especuladores, que procuram adivinhar em que ativos irão se concentrar as preferências da maioria para adquiri-los antes que se valorizem e quais ativos serão vendidos, para vendê-los antes que se desvalorizem. Obviamente, uma parte dos especuladores faz antecipações erradas e, por isso, perde dinheiro para os seus felizes competidores, cujas apostas anteciparam o futuro corretamente. Trata-se de um jogo de apostas, mas que afeta o andamento da economia real. Se o otimismo prevalecer nas bolsas de valores, os especuladores comprarão ações e títulos de crédito, cujas cotações subirão, o que permitirá aos empresários obter mais facilmente dinheiro para expandir suas atividades; o crescimento da produção da economia real confirmará as expectativas otimistas dos detentores do dinheiro depositado neles pelos poupadores, levando-os a reiterar as compras de títulos e assim por diante. O resultado será a formação de uma típica bolha de valorização de ativos, cujo efeito será acelerar a expansão das atividades econômicas, até que elas esbarrem em pontos de estrangulamento, que impedirão a continuação do crescimento. Os pontos de estrangulamento são constituídos por recursos indispensáveis à produção e à distribuição, que exigem tempo para serem multiplicados, como, por exemplo, a produção e distribuição de energia elétrica, os meios de comunicação e de transporte, a mão de obra com escolaridade acima da fundamental etc.. Os pontos de estrangulamento elevam o custo de produção e distribuição de bens e serviços, suscitando círculos viciosos de elevação de preços e salários, que resultam em inflação cada vez maior, contra a qual o Poder Político é forçado a agir, reduzindo a disponibilidade de crédito e o gasto público. O mero anúncio destas medidas de “austeridade” basta para que as expectativas dos especuladores financeiros se invertam, passando de otimistas a pessimistas, pois eles sabem que elas reduzirão a demanda por títulos nas bolsas, fazendo com que suas cotações desabem. inflação e renda Em suma, o Poder Político é induzido a conter a inflação atendendo ao interesse dos capitais financeiros, que temem a desvalorização da moeda, ocasionada 91 pela subida dos preços. A inflação exige a ampliação da oferta de moeda, que é a “mercadoria” que os intermediários financeiros transacionam. Sua desvalorização prejudica diretamente bancos e fundos, cujos capitais são constituídos, em sua maior parte, por tesouros em forma da moeda corrente do país. Na verdade, a inflação prejudica também todos que dependem de rendas fixas, entre os quais estão também os trabalhadores informais, que estão excluídos de normas contratuais ou legais que reajustam rendas ou depósitos automaticamente por índices periódicos de inflação. Esta circunstância permite aos porta-vozes dos interesses financeiros proclamarem que é necessário paralisar o crescimento econômico tão logo pressões inflacionárias se fazem sentir, porque a inflação é o mais cruel dos impostos, pois pune os mais pobres. Na realidade, pune os mais pobres e os mais ricos, sendo óbvio que os últimos podem suportar perdas muito melhor que os primeiros. A experiência histórica do final do século passado mostra que realmente inflação elevada e persistente pode prejudicar seriamente o funcionamento dos mercados e, quando atinge o limite da hiperinflação, tornar impossível o prosseguimento do desenvolvimento econômico; uma vez atingido este estágio, a estabilização dos preços exige o encolhimento da demanda efetiva total por bens e serviços, com efeitos negativos para a economia real, prejudicada pela dificuldade de vender com lucro suas mercadorias. Como governo algum se arrisca a lançar a economia em hiperinflação, as fases de crescimento rápido são abortadas pelo Poder Político mediante políticas de estabilização que se caracterizam pela elevação das taxas reais de juros, proporcionando grandes lucros aos capitais financeiros. Isso comprova mais uma vez que, no capitalismo contemporâneo, o Poder Político não pode deixar de praticar políticas, que em nome do interesse geral, de fato priorizam o capital financeiro, reforçando a hegemonia deste sobre o Poder Econômico. Convém observar que, se a intermediação financeira fosse atribuição exclusiva de bancos públicos, a estabilização dos preços em vez de concentrar a renda, como acontece hoje, reforçaria a participação do Poder Político na renda nacional, possibilitando-lhe ampliar políticas redistributivas e deste modo tornar a distribuição da renda mais justa. Aqui reside o caráter contraditório do relacionamento entre Poder Político e Poder Econômico. Os governos desejam em geral que haja prosperidade; embora esta possa beneficiar todas as classes, o excedente econômico assim gerado sempre é apropriado pelos capitalistas. Os trabalhadores só se beneficiam pelo aumento do emprego, que viabiliza em alguma medida as campanhas sindicais por melhoras salariais. Só que estas somente são obtidas após muita luta contra a resistência patronal, ao passo que a apropriação do excedente pelos donos e administradores dos capitais é imediata: sendo as mercadorias produzidas pelos trabalhadores propriedade dos capitalistas, o lucro a mais decorrente do maior volume de vendas é deles. O que os trabalhadores podem receber a mais será pelas horas extras eventualmente 92 trabalhadas, o que explica a forte concentração da renda que ocorre sempre quando o crescimento econômico perdura. Para se contrapor à concentração da renda, governos comprometidos com os interesses e aspirações das classes trabalhadoras podem tributar os ganhos extraordinários dos capitalistas e aplicar a receita pública adicional em políticas redistributivas. Políticas como estas, no entanto, provocam a desconfiança dos operadores financeiros, que reduzirão suas aplicações na economia nacional, lançando-a em crise. Sabedores disso, governos de esquerda evitam ferir a confiança do capital financeiro, o que explica sua frequente conversão ao neoliberalismo. No capitalismo contemporâneo, o Poder Econômico, ao contrário do Poder Político, deixou de ser nacional para se tornar global, sendo dominado por um limitado número de gigantescas transnacionais financeiras. Estes capitais tomam em geral a forma de bancos demasiado grandes para que os governos possam correr o risco de deixá-los quebrar. Eles estão interligados por interesses financeiros, o que lhes permite atropelar o Poder Político de países que não se submetem aos seus desejos. O Poder Econômico privado conseguiu monopolizar a distribuição do dinheiro internacionalmente aceito, a moeda “forte”, representada principalmente pelo dólar, graças à influência que exerce sobre instituições multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI), o Banco Mundial (Bird) e a Organização Mundial do Comércio (OMC), o que lhe permite impor sua vontade ao Poder Político de nações que não têm o status de superpotências, como está claro no caso da Grécia e de mais uma série de outros países que simplesmente perderam a confiança do Poder Econômico global, de que sejam capazes de honrar suas dívidas externas. Para reconquistar esta confiança, estão sendo obrigados a aplicar políticas econômicas de austeridade que lançam suas economias nacionais em longas e profundas crises. Bancos públicos A voga do neoliberalismo que assolou o mundo nos últimos 32 anos fez com que muitos países vendessem seus bancos públicos a capitais privados, o que tornou seus governos inteiramente dependentes dos intermediários financeiros privados. Estes governos, para reter a confiança das finanças capitalistas, foram obrigados a equilibrar seus orçamentos, procurando reduzir seus déficits e conter o crescimento da dívida pública. Além disso, tiveram de priorizar o combate à inflação, reduzindo a despesa pública e o ritmo do crescimento econômico. O efeito destas políticas foi reduzir a demanda por mão de obra das empresas, ampliando o desemprego, enfraquecendo os sindicatos e suas lutas por melhores salários e condições de trabalho. A contenção da despesa pública debilitou as políticas redistributivas e os sistemas públicos de saúde, educação e previdência, que estão sendo em parte privatizados. 93 Os países que preservaram seus bancos públicos e os ampliaram de acordo com as necessidades puderam resistir às pressões neoliberais e continuar priorizando o desenvolvimento e o combate à pobreza, ampliando e aperfeiçoando suas políticas sociais e mantendo a expansão do emprego, de modo a evitar o desemprego em massa, sobretudo o de longa duração. Atualmente, os países que optaram por esta alternativa se encontram em sua maior parte na Ásia e na América Latina e constituem as economias emergentes que mais crescem no mundo e menos são afetadas pelas crises produzidas pela especulação financeira desregulamentada. Nestes países, entre os quais se encontra felizmente o nosso, o Poder Político não está submetido ao Poder Econômico. Na América do Norte e na Europa o peso do legado neoliberal subordina o Poder Político à ideologia e aos interesses do Poder Econômico. Daí resulta o marasmo econômico, a persistência do desemprego em massa e da pobreza, com o aumento inegável da desigualdade socioeconômica. Nos países do Primeiro Mundo, os sacrifícios impostos à classe trabalhadora e, em especial, à juventude estão suscitando o surgimento de uma nova esquerda, que diferentemente da velha esquerda não pauta a conquista do poder como ponto de partida para a reversão de uma situação insuportável. A rebelião dos Indignados tem por alvo a restauração da autenticidade democrática por meio da indispensável subordinação dos interesses da minoria privilegiada à vontade da maioria. Para tanto, ela terá de revelar os liames políticos e econômicos que amarram os representantes eleitos ao Poder Econômico, que retira sua força de uma globalização dominada pelo capital financeiro e que impede que o Poder Político, limitado ao âmbito nacional, possa cumprir suas plataformas eleitorais. Obviamente, para restaurar a autenticidade democrática e a supremacia do Poder Político, será necessário desenvolver, ao lado do capitalismo, uma economia em que o capital seja propriedade coletiva dos trabalhadores que o utilizam, como sempre foi em toda longa história da humanidade que precedeu a Revolução Industrial. Esta “outra economia” já está sendo desenvolvida em numerosos países e terá como resultado a diversificação do Poder Econômico, tornando-o em boa parte afinado com as necessidades e desejos dos que hoje são explorados e alienados. *Paul Singer é secretário nacional de Economia Solidária do ministério do Trabalho. 94 Paraguai, paraíso do Estado mínimo. César Felício - Valor Econômico - 21/06/2012 Com uma população de 6,3 milhões de habitantes e um PIB cem vezes menor que o brasileiro, o Paraguai está habituado a viver suas tragédias de forma subterrânea, longe das atenções mundiais. Dificilmente o desastre ocorrido na sexta-feira, em Curuguaty, próximo da fronteira com o Brasil, fugirá dessa regra. O episódio em que morreram 18 pessoas, sendo 11 militantes sem terra e sete policiais, merecia um destino diferente do esquecimento. Serviria como advertência do que pode ocorrer quando se entrecruzam concentração de renda e um Estado débil. Na manhã de sexta-feira, o grupo especial de operações da polícia paraguaia, uma espécie de Bope local, foi deslocado para a fazenda de um ex-senador do Partido Colorado, Blás Riquelme. A propriedade está ocupada há alguns anos por cerca de 500 famílias. Foram recebidos à bala e devolveram o fogo. Entre os mortos, estava o comandante do grupo policial. O confronto gerou uma crise institucional: caiu o ministro do Interior e o chefe da polícia, a oposição tenta articular um pedido de impeachment contra o presidente Fernando Lugo e os ruralistas irão promover um "tratoraço" na segunda-feira. Liderança histórica na área de direitos humanos do país, o advogado Martín Almada lembra que a tragédia de Curuguaty faz parte da herança que o país recebeu da ditadura de Alfredo Stroessner (1954-1989). O ditador, que morreu exilado no Brasil em 2006, estruturou seu poder distribuindo terras fiscais do Estado de maneira discricionária, gerando um caos fundiário. A prática continuou, em menor escala, nos governos seguintes, até 2003. Explosões no país vizinho devem preocupar Brasil Fez parte desta indústria de transações escusas a titularidade de 7,851 milhões de hectares, ou 64% do total adjudicado em 50 anos. Dentro deste universo, foram beneficiados milhares de brasileiros que tornaram-se produtores de soja no Paraguai em circunstâncias pouco transparentes. "É neste contexto que a propriedade de Riquelme se situa", afirma Almada. O que aconteceu no Paraguai foi uma reforma agrária às avessas: em 1991, 1,5% dos proprietários controlavam 81,3% da superfície. Com o advento da soja, a concentração não diminuiu. Segundo dados da coordenadoria nacional de direitos humanos do Paraguai, em 2008 2% das propriedades somavam 78% das terras. A soja e o gado empurraram o Paraguai adiante, e o país chegou a registrar taxas chinesas de crescimento, como os 15,4% de expansão do PIB em 2010. Os dólares entraram no país, mas não nos cofres públicos: o Paraguai é o 95 paraíso do Estado mínimo. Segundo dados do Banco Central local, a carga tributária atual é de 13% sobre o PIB, a mais baixa da América do Sul. O imposto de renda da pessoa jurídica só foi criado em 2004. O de pessoa física, a depender do Congresso, só começará a ser cobrado a partir do próximo ano. No Paraguai, o Estado provedor não existe. As pessoas estão habituadas a cada um cuidar de si. De acordo com um levantamento da Cepal divulgado no ano passado, 69% dos lares paraguaios não contam atualmente com nenhum mecanismo de proteção social, nem mesmo de previdência contributiva. É o mais alto percentual entre os 13 países pesquisados, em uma pesquisa que não inclui o Brasil. Um terço da população está abaixo da linha de pobreza. Foi neste contexto que o então bispo católico Fernando Lugo iniciou a irresistível arrancada que o levaria à Presidência em 2008. Sem estrutura partidária, ganhou ao catalisar as esperanças de desenvolvimento social e reforma agrária, tema de não pouca importância em um país com 40% da população no campo. Em seus quatro anos de governo, o resultado da gestão de Lugo parece apagado. O presidente tornou-se foco de atenções por suas vicissitudes pessoais, como filhos do tempo de celibato reconhecidos tardiamente e a batalha contra um linfoma. Seu maior sucesso administrativo foi conseguir do Brasil a renegociação da venda da energia elétrica de Itaipu. O aumento de 200% na energia gerada pelo Paraguai por si só representou um acréscimo de 1% no PIB local. Do ponto de vista político, disciplinou o Exército, ao reformular a cúpula da instituição. Sem maioria no Congresso, Lugo viu o seu projeto paraguaio de Bolsa Família, o "Tekoporá", ser podado pelo Legislativo. O programa pagava 83 mil benefícios em 2011, muito aquém do que se previa. A estratégia de tocar um programa de reforma agrária com a compra de terras não funcionou. Os conflitos rurais, que caíram entre 2008 e 2010, voltaram a crescer no ano passado. Sem ter o que oferecer aos movimentos organizados, Lugo não os atende e não os reprime. A anemia do Estado no Paraguai faz com que o poder público vá perdendo o seu poder mediador em meio a conflitos. É uma tendência que tende a se agravar, segundo Almada. "Lugo parece temer o mesmo destino que Manuel Zelaya teve em Honduras, que caiu em 2009 em um golpe patrocinado pelas forças políticas", comentou. Para os próximos anos, na opinião de Almada, episódios de violência devem se repetir. "A pobreza no Paraguai é explosiva", comentou. O esgarçamento institucional em um país com uma fronteira terrestre notoriamente de baixo controle policial com o Brasil não deve ser uma questão menor para Brasília. Um incipiente movimento insurgente, o Exército do Povo Paraguaio, tenta se estruturar desde o governo anterior a Lugo. Sua cúpula está presa, mas o governo não conseguiu romper a cadeia de comando da organização. De acordo 96 com o que o próprio adido da Polícia Federal no Paraguai afirmou no ano passado, as principais organizações criminosas brasileiras estão presentes no país vizinho. Não há qualquer evidência de que a ponta mais radicalizada da insurgência paraguaia se conectou com o submundo brasileiro, mas cabe em relação a esta hipótese funesta lembrar a frase do escritor francês Victor Hugo: "Nada é mais poderoso quando a uma ideia chega seu tempo". 97 Teoria conspiratória na zona do euro Folha de São Paulo - 25 de junho de 2012 - Ensaio - Floyd Norris. Imagine que há duas décadas uma Alemanha recém-unificada resolvesse dominar a Europa, como a Alemanha previamente unificada havia tentado sem sucesso meio século antes. Dessa vez, ela usaria dinheiro em vez de armas. Não há evidência para essa teoria de conspiração. Mas, se houvesse, as coisas poderiam ter acontecido mais ou menos como aconteceram. O que se segue é uma breve história do euro. As frases em itálico foram inventadas para amparar a teoria conspiratória. Mas os fatos estão inalterados. Em meados de 1992, a experiência europeia com o câmbio semifixo estava sob pressão principalmente por causa da decisão do Bundesbank (o banco central alemão) de elevar os juros acentuadamente. Os termos generosos da unificação alemã haviam sobrevalorizado fortemente o marco alemão-oriental, causando inflação. Esses juros altos trouxeram uma enxurrada de dinheiro para a Alemanha. Como outras moedas europeias estavam atreladas ao marco, elas também subiram, afetando a capacidade dos países de competir nos mercados mundiais. Para manter esse atrelamento, esses países precisaram elevar seus juros quando suas economias já estavam fracas, piorando suas situações domésticas. Especuladores concluíram que o atrelamento cambial não poderia durar. Enormes vendas de liras italianas e libras esterlinas forçaram os governos a queimarem divisas para sustentar suas moedas. Em setembro, Grã-Bretanha e Itália abandonaram o atrelamento cambial. Suas moedas se depreciaram rapidamente. Outros foram atrás. Os britânicos culparam os alemães por seus juros altos. "Acusações tendenciosas de responsabilidade não vêm ao caso", respondeu o então chanceler alemão, Helmut Kohl. Para muitos europeus, a lição a tirar disso foi que as moedas comuns precisavam ser rígidas, para evitar qualquer ataque especulativo a uma moeda fraca. A Europa já havia decidido no Tratado de Maastricht, assinado naquele ano, a buscar um caminho para a união monetária. As regras não previam qualquer mecanismo real de implantação, mas não havia forma de um país deixar a zona do euro. 98 É concebível que a Alemanha tenha aprendido três coisas com a experiência de 1992. Primeiro, que sem um câmbio fixo suas empresas exportadoras enfrentariam o risco de desvalorizações competitivas periódicas no resto da Europa. Segundo, que a união monetária poderia ajudar as exportações se o valor do euro fosse mantido baixo por causa de economias menos competitivas. Finalmente, se a Alemanha adotasse uma política de juros baixos, os bancos poderiam abrir a torneira do crédito e criar um boom europeu financiado por dívidas. Isso causaria desequilíbrios. No fim das contas, países profundamente endividados enfrentariam uma crise, a qual só poderia ser solucionada se eles aquiescessem às políticas alemãs e cedessem uma grande parte da soberania nacional. Em julho de 1992, o Bundesbank elevou sua taxa básica de juros em 75 pontos, para 8,75%. Ao longo dos anos, ele cortaria rapidamente os juros. Quando o euro foi lançado, a taxa estava em 2,5%. Com o tempo, as exportações alemãs dispararam, enquanto seus vizinhos europeus usavam dinheiro emprestado para comprar produtos alemães. Os bancos alemães ajudaram a financiar bolhas imobiliárias na periferia. O momento crítico da crise pode ter sido quando os bancos irlandeses quebraram, no começo de 2009. Se o governo irlandês tivesse dito que iria garantir os depósitos, mas que empréstimos feitos aos bancos poderiam deixar de ser pagos, os bancos alemães estariam em apuros e provavelmente precisariam ser resgatados pelo governo da Alemanha. Em vez disso, o governo irlandês garantiu as obrigações bancárias -algo que ele não conseguiu bancar. A Irlanda é que precisou ser resgatada. A receita alemã para a Irlanda, como logo mais seria para outros países, foi a austeridade. Nos últimos anos, houve repetidas crises, com a Alemanha parecendo ser rígida até ceder na última hora e evitar um desastre, sem fazer nada que permitisse que as economias problemáticas crescessem. O fim do jogo talvez esteja próximo. Países com problemas podem permanecer na zona do euro, enfrentando vários anos de recessão. Ou podem abandonar o euro, talvez atraindo uma catástrofe, mas tendo mais liberdade para desvalorizar suas moedas. Ou eles podem entregar sua soberania e aceitar a liderança alemã sobre uma Europa unificada. Aí a Alemanha irá resgatá-los. Se a Europa não aceitar a oferta, e o euro se desintegrar, é difícil saber como será. Mas um novo marco alemão sem dúvida seria muito mais forte do que o euro é agora, tornando a vida bem mais difícil para os exportadores alemães. Isso leva alguns europeus a pensarem que a Alemanha está blefando e que ela irá continuar pagando a conta mesmo se não conseguir o que deseja. 99 O euro deveria selar a integração e a prosperidade europeias, assegurando que nunca mais o continente iria iniciar uma guerra mundial. Em vez disso, ele gerou ódio, recessão e ressentimento. Os gregos e outros veem nisso uma conspiração alemã. Os alemães veem uma conspiração para obrigá-los a pagar pelos pecados alheios. Se isso escapar ao controle, a economia mundial pode ser a perdedora, independentemente de alguma conspiração ter realmente existido. 100 CAPITULO VII O que veremos neste capítulo - História da Teoria dos jogos. Conceitos. Importância. - Teoria da escolha Racional. - O poder do eleitor. - Teoria das votações. - Teorema do eleitor mediano. - O jogo do apadrinhamento. 1. Introdução A Teoria dos Jogos surgiu como um campo da Matemática aplicada e desde 1944, quando o matemático húngaro John Von Neumann e o economista alemão Oskar Morgenstern lançaram o livro Teoria dos Jogos e Comportamento Econômico (The Theory of Games and Economic Behavior), é usada como ferramenta em estudos de estratégia. Segundo Ferguson (1988), a Teoria dos Jogos tem como objetivo geral avaliar o comportamento racional em situações nas quais os resultados dependem da interação das ações dos agentes envolvidos. A aplicação da teoria dos jogos à ciência política levou ao desenvolvimento de modelos teóricos que permitem avaliar o comportamento dos agentes (jogadores) - eleitores, estados, grupos de interesses e políticos envolvidos em diversas situações. 2. Breve História da Teoria dos Jogos A primeira referência objetiva conhecida da teoria dos jogos ocorreu em uma carta escrita por James Waldegrave em 1713. Nesta carta, Waldegrave propõem uma solução de estratégia mista de minimax para o jogo le Her3. 3 Descrição do jogo: 13 cartas de um mesmo naipe são embaralhadas. No início do jogo, o jogador 1 recebe uma carta X (que apenas ele vê), o jogador 2 recebe uma carta Y (que apenas ele vê) e uma carta Z é colocada sobre a mesa (que ninguém vê). O jogador 1 joga 101 Mas foi Antoine Augustin Cournot, matemático francês que viveu entre 1801 e 1877, com a publicação de Antoine Augustin Cournot Researches into the Mathematical Principles of the Theory of Wealth - Pesquisas sobre os Princípios Matemáticos da Teoria da Riqueza - em 1838 que estabeleceu os princípios teóricos da teoria dos jogos. Neste estudo mostra um modelo onde duas empresas que competem entre si comercializando um mesmo produto, decidem quais as quantidades que maximizam seus lucros – O Dupolio de Cournot. Em 1913 o matemático alemão Ernest Friedrich Ferdinand Zermelo (1871-1953) dá a sua contribuição ao fortalecimento da Teoria dos jogos. Ele demonstrou que o jogo de xadrez sempre tem uma solução, significando que para qualquer jogada de um participante, seu oponente tem uma estratégia vencedora. Esta demonstração foi importante para o estudo da técnica da indução inversa. Quatorze anos depois, em 1927, Félix Edouard Justin Emile Borel (1871-1956), outro matemático francês, usa pela primeira vez o conceito moderno de estratégia. Ele definiu este método, ao qual chamou de método de jogo, como um codigo que determina para cada circunstância possível exatamente o que o agente deve fazer. Borel escreveu certa vez: “Os problemas de probabilidade e análise que se propõem com relação à arte da guerra, ou especulações econômicas e financeiras, não são isentos de analogia com os problemas que dizem respeito a jogos, embora possuam um maior grau de complexidade”. O termo "jogos" utilizado por ele refere-se não a simples jogos que dependem de sorte, mas especificamente a jogos estratégicos. Posteriormente, em 1944, surge formalmente a Teoria dos Jogos com a publicação do livro Teoria dos Jogos e Comportamento Econômico (The primeiro: ele deve decidir se mantém a sua carta X ou a troca com a carta Y do jogador 2 (no segundo caso, o jogador 2 não pode se recusar a fazer a troca). Depois é a vez do jogador 2: ele deve decidir se mantém a sua carta ou a troca com a carta Z. Ganha quem tiver a carta de maior valor (J > Q)! 102 Theory of Games and Economic Behavior) do matemático húngaro John Von Neumann e do economista alemão Oskar Morgenstern. Nesta obra os autores desenvolveram a análise dos jogos de soma zero, definiram a representação dos jogos em forma extensiva além de discutirem a cooperação e a formação de coalização entre os agentes (jogadores). Apesar de ser considerada um marco no estudo da teoria dos jogos, a obra mostrou-se bastante restritiva ao concentrar o foco na análise dos jogos de soma zero, algo pouco aplicado na maioria das situações de interação entre indivíduos ou entre organizações. A partir de 1950, o matemático John F. Nash Jr, o economista John C. Harsanyi e o matemático e economista Reinhard Selten, avançaram no estudo da Teoria dos Jogos ao apresentarem ferramentas teóricas que possibilitaram a análise de uma maior variedade de modelos de interação. A contribuição de Nash foi de suma importância para a análise de uma classe muito maior de jogos. Ele mostrou o equilíbrio para jogos que não fossem de soma zero. Este conceito ficou conhecido como equilíbrio de Nash, situação em que a jogada de um agente será sempre a melhor resposta a estratégia de outro agente. Em 1965 Selten publicou um artigo cujo conteúdo principal é o modelo equilíbrio perfeito em subjogos. A partir deste conceito, Selten, diz que uma estratégia para ser ótima ter que levar em consideração todos os possíveis desdobramentos do processo de interação estratégica. A contribuição de Selten foi significativa, principalmente para a análise daqueles jogos que envolvem ameaças e compromissos, pois permitiu avaliar quais compromissos ou ameaças poderiam ser cumpridas. Não devemos esquecer de Robert J. Aumann, matemático cujos estudos possibilitaram entender que as relações entre indivíduos ou organizações tem uma boa chance de durar por tempo indeterminado. Esta ideia 103 está vinculada as premissas de cooperação, tempo de realização dos ganhos e respeito a um contrato. Como exemplos de situações que podem ser estudadas a partir da contribuição de Aumann podemos citar a formação de cartéis. Nesta estrutura de mercado as empresas abrem mão de parte da sua oferta para que o preço de mercado se eleve, mas existirá sempre a tentação de que uma ou todas empresas aumentem suas ofertas e, consequentemente, seus lucros decretando o fim do cartel. Finalmente citamos o trabalho de Thomas C. Schelling, The Strategy of Conflit. Neste livro Schelling, aplicando os preceitos da Teoria dos Jogos, mostra que uma forma convincente para anular uma ameaça é tornar a resposta a mesma imprevisível. Se o agente ameaçador não pode prever a reação a sua agressão, então seus riscos de perda aumentam de modo que ele irá preferir cessar a ameaça. Outra contribuição importante de Schelling foi a ideia do ponto focal. Este conceito mostra que mesmo em um ambiente em que há dificuldade de comunicação a coordenação entre os indivíduos pode levar a um bom resultado para todos. 3. Conceitos Como sabemos a Teoria dos Jogos é o estudo que descreve as relações de conflito e de cooperação entre agentes inteligentes e racionais. Estas relações são análogas a um jogo ao qual definimos como uma representação formal que possibilita a avaliação das interações entre aqueles agentes. Um jogo possui os seguintes elementos: 1) Agentes: Também chamado de jogadores podem ser quaisquer Indivíduos que tenha capacidade de decidir (pessoa física, empresas, governo, sindicato, partido políticos, etc..); 2) Estratégia: plano completo de ação, o que fazer em cada possível situação. Estratégia implica escolha e equilíbrio das opções apresentadas; 104 3) Interação: ação de cada agente afeta de alguma forma os demais envolvidos na situação; 4) Racionalidade: Suposição de maximização de sua utilidade; que os agentes buscam a 5) Pagamentos (payoffs) definidos para cada jogador. 4. A Teoria da Escolha Racional A teoria dos jogos tem como principal objetivo explicar como os agentes (jogadores), interagindo entre si, fazem suas escolhas. Assumindo que os agentes são racionais – procuram sempre maximizar suas recompensas - podemos estudar as escolhas, utilizando o método que considera as preferências de cada um. A Teoria da Escolha Racional. Para efeito do nosso estudo consideraremos válida a seguinte suposição: Num problema de escolha pessoal ou política existem um indivíduo e um conjunto de alternativas. O individuo fará sua escolha de acordo uma relação de preferência, representada como a seguir. I) Preferência fraca representada pelo símbolo: Exemplo: , onde lemos A é tão boa quanto B ou A é fracamente preferível a B ou ainda, A é preferível a B. III) Preferência estrita representada pelo símbolo: Exemplo: A B , onde lemos A é estritamente (sempre) preferível a B. III) Indiferença representada pelo símbolo: ~ Exemplo: A ~ B , onde lemos A e B são equivalentes. 5. Teoria dos jogos e Ciência política A Teoria dos Jogos auxilia o entendimento teórico - ou seja por meio de abstrações - do processo de decisão de agentes que interagem entre si. Desta forma, contribui para ampliar a capacidade de agir estrategicamente, permitindo conhecer, previamente, o melhor resultado para os jogadores (agentes) diante das estratégias disponíveis. 105 Pesquisas na ciência política também têm usado a teoria dos jogos. O jogo do apadrinhamento é um exemplo de aplicação da Teoria dos Jogos na política. Podemos ver outras aplicações na formação de alianças entre partidos e no resultado de uma votação. 6. O poder do eleitor Distâncias, pesos ou volumes são exemplos básicos de medições que podemos fazer com facilidade. Para tal usa-se um termo de comparação, metro, quilograma ou litro, conforme os casos. Existem porém, outras coisas que mesmo não sendo tão fáceis de medir, medimos diariamente com o auxílio de aparelhos mais complicados. Neste segundo caso, temos as temperaturas ou a intensidade de um terremoto. Um ponto em comum desses dois tipos de medições é fato de serem medidas absolutas, ou seja, uma vez fixada uma escala, um objeto ou acontecimento pode tomar um valor qualquer dentro da escala. Mas quando se trata de medir o poder, a situação é mais complicada, pois não devemos utilizar uma medida absoluta dado que o poder de alguém só pode, quanto muito, ser comparado com o de outra pessoa ou grupo. Em se tratando de um eleitor, uma boa maneira de avaliar seu poder, a capacidade de influenciar o resultado de uma eleição, é considerar que seu voto tem peso (poder) relativo, isto quer dizer que: "O índice de poder de um eleitor é a razão entre o seu poder e a soma dos poderes de todos os outros eleitores". 7. Teoria das votações A votação é talvez mais conhecida pelo seu uso em eleições, onde candidatos políticos são selecionados, em geral para a administração pública. O estudo das votações ou de sistemas de votação, a teoria da votações, surgiu no 106 século XVIII para tentar explicar qual o melhor sistema de votação a ser aplicado em uma disputa. Um sistema de votação ou sistema eleitoral é o meio de escolha entre um número de opções, baseado na entrada de um número de votos ele consiste em conjunto de regras de como os votantes podem expressar seus desejos, e como esses desejos são agregados para se obter um resultado final. A maioria dos sistemas de votação é baseada na regra da maioria, ou no princípio de que o vencedor de uma disputa é aquele que consegue mais da metade dos votos. Diferentes sistemas de votação podem ter diferentes resultados, particularmente nos casos onde não há uma clara preferência da maioria. Então, a escolha do(s) sistema(s) eleitoral(is) é um componente importante de um governo democrático. È praticamente impossível um sistema de votação contemplar ou satisfazer todos os critérios desejáveis. Isto foi provado pelo economista Kenneth Arrow em seu trabalho teorema da impossibilidade de Arrow. Nele, Arrow mostrou que várias características desejáveis de sistemas de votação são mutuamente contraditórias. Por esta razão, ao se avaliar um sistema de votação, é necessário decidir quais as características são mais importantes para determinada eleição. O conseso é que ele é composto basicamente dos seguintes elementos: I - a forma de cédula; II - o conjunto de votos permitidos; e III - o método de mensuração ou apuração do resultado. Esse resultado pode conter um único vencedor, ou pode envolver múltiplos vencedores como em uma eleição para um corpo legislativo. O sistema de votação pode também especificar como o poder de voto está distribuído entre os votantes, e como os votantes estão divididos em distritos eleitorais cujos votos são contados independentemente. 107 Sistema de votação, voto e democracia são elementos interligados. O voto é utilizado como característica básica da democracia desde o século VI a.C., quando esta foi introduzida em Atenas e desde então, a maioria das eleições foram conduzidas usando voto majoritário ou alguma variante. O voto ou a teoria do voto se tornou objeto de estudo acadêmico na época da Revolução Francesa quando, em 1770, Jean-Charles de Borda propôs a contagem de Borda como um método para eleger membros da Academia Francesa de Ciências. Esse sistema foi criticado pelo Marquês de Condorcet, que propôs um método de comparação par-a-par que ele tinha desenvolvido. Ele também escreveu sobre o paradoxo de Condorcet, que chamou de intransitividade das preferências da maioria. Por estas contibuições, Condorcet e Borda são usualmente creditados como os precussores nos estudos sobre sistemas de votações. 8. Teorema do eleitor mediano Um teorema importante no estudo da Ciência Política é o Teorema do Eleitor Mediano. Ele procura explicar o comportamento dos candidatos de uma eleição em função das preferências dos eleitores. Vejamos de maneira prática a demonstração desse teorema. Suponha que em uma eleição os eleitores estão uniformemente distribuidos em relação a questão em torno da qual se dará a eleição. A posição preferida pelo eleitor no que se refere à questão em debate nas eleições é chamada ponto ideal. A posição ideológica dos candidatos envolvidos no pleito está representada no gráfico a seguir onde um índice determina apenas o distanciamento destas posições. Figura 1 Esquerda = 0 Centro = 0,5 Direita = 1 108 De acordo com a figura, um eleitor que tem uma posição ideologica representada pelo indice 0,5 está exatamente na posição intermediaria entre as posiçoes ideologicas de esquerda e de direita. Supondo que os eleitores estão distribuidos uniformemente entre as posições ideologicas seus votos não estão concentrados em nenhuma posição ideologica. Sob essas premissas o comportamento dos eleitores poder ser representado como a seguir. Grá fico 1 núme ro de e le itore s 0 0,5 1 posiçã o ide ológica Antes de prosseguirmos temos que definir um conceito importante. O de leitor mediano. O eleitor mediano é aquele que divide a distribuição dos eleitores em torno de uma questão em duas partes iguais. No nosso caso, o eleitor mediano é aquele cujo ponto ideal é representado pelo indice 0,5 do Gráfico 1. Vamos supor que os eleitores preferem o candidado que mais se aproxima de suas posições. Desta forma, um eleitor representado pelo indice 0,5 irá preferir um candidato que estiver na posição 0,3 a um que estiver na posição 0,8. Consideradas essas premissas como nossos candidatos devem escolher suas plataformas politicas? O Gráfico 1 nos auxilia a encontrar a quantidade de votos que cada candidato pode obter. Por exemplo, se um candidato convencesse os eleitores que estivessem entre as posições 0 e 0,25 conseguiria 25% do total de votos (0,25 - 0). Já um candidato que consquistasse os votos dos eleitores posicionados entre 0,3 e 0,7 conseguiria 40% do total de votos (0,7-0,3). 109 Suponhamos que a plataforma política do candidato Verde tenha se situado na posição V mostrada no Gráfico 2. Neste caso, qual seria o melhor posicionamento do candidato Amarelo? Gráfico 2 número de eleitores 0 V 0,5 1 posição ideológica O melhor posicionamento do candidato Amarelo seria ligeiramente a direita de V, pois assim conquistará os votos que estiverem entre V e 1. Se V estiver em 0,3, o candidato Amarelo tera 70% dos votos (1 - 0,3). A lógica desse resultado é que mesmo que os eleitores mais próximos de 1 considerarem a posição de Amarelo distante de suas posições ideológicas, a posição desse candidato ainda se encontra mais próxima que a do candidato Verde. Dito de outra forma, o candidato que se situar mais próximo do ponto ideal do eleitor mediano terá maior chance de ganhar a eleição. Isto explica porque em algumas eleições majoritárias, os candidatos apresentam plataformas políticas muito parecidas. De maneira mais técnica, o Teorema do eleitor mediano diz que: Se as preferências de todos os eleitores apresentam um ponto ideal, então o ponto preferido do eleitor mediano é opção que vence a maioria das comparações (vencedor de Condorcet). 9. O jogo do apadrinhamento Um outro jogo político importante estudado pela Teoria dos Jogos na analise politica é jogo do apdrinhamento. 110 Considere, a seguinte situação: Dois candidatos, um da situação e outro da oposição, estão decidindo se se comprometem ou não em oferecer empregos a seus cabos eleitorais. Os candidatos sabem que oferecer empregos a seus cabos eleitorais faz com que eles trabalhem mais e aumentem suas chances de vencer a eleição. Mas sabem também, que os eleitores não aprovam esse tipo de procedimento. Uma vez feita a promessa ela será cumprida, pois se o candidato não honrar o compromisso terá dificuldade na próxima eleição. O candidado da oposição precisa mais deste procedimento, tendo em vista que o candidato da situação conta com as obras realizadas no seu governo. Esse jogo, com as escolhas e seus respectivos percentuais de recompensas, pode ser representado da seguinte forma: Figura 2 Candidato da situação Promete Candidato da oposição Não promete Promete 50, 50 (1) 60, 40 (2) Não promete 20, 80 (3) 40, 60 (4) A Figura mostra que: 1) Se o candidato da oposição prometer empregos a seus cabos eleitorais (Promete) e o candidato da situação também o fizer, cada um terá 50% dos votos dos eleitores. 2) Se o candidato da oposição prometer empregos e o candidato da situação não prrometer, o primeiro conseguirá 60% dos votos e o outro 40%. 3) Se o candidato da oposição não prometer empregos a seus cabos eleitorais (Promete) e o candidato da situação prometer, o primeiro terá 20% dos votos e o outro, 80% dos votos dos eleitores. 111 4) Se o candidato da oposição não prometer empregos e o candidato da situação não prometer também, o primeiro conseguirá 40% dos votos e o outro 60%. De acordo com a representação da Figura 2, qual a melhor estratégia (escolha) para os candidatos (jogadores)? Para o candidato da situação a opção Promete é melhor quando o candidato da oposição escolhe Promete, pois ele consegue 50% (1) dos votos contra apenas 20% se não prometer (3) e também quando o candidato da situação escolhe Não promete e ele consegue 60% dos votos (2) contra 40% se não prometer (4). Para o candidato da oposição a opção Promete é melhor quando o candidato da situação escolhe Promete, pois ele consegue 50% (1) dos votos contra 40% se não prometer (2) e também quando o candidato da oposição escolhe Não promete e ele consegue 80% dos votos (3) contra 60% se não prometer (4). Então, prometer empregos (Promete) é a melhor opção para qualquer jogador. Bibliografia Fiani, Ronaldo. Teoria dos Jogos com aplicações em Economia, Administração e Ciências Sociais. Rio de janeiro: Editora Elsevier, 2ª ed. 2006. 112 A Teoria dos Jogos na política: a concessão, a cenoura e o porrete Por Diogo Schelp - sábado, 31 de outubro de 2009 | 5:19 – Revista Veja Robert Aumann recebeu, em 2005, o Prêmio Nobel de Economia por seus estudos na área da Teoria dos Jogos. Suas teses ajudam a compreender os princípios que regem os conflitos e como se consegue convencer adversários a cooperar entre si. As teorias do judeu ortodoxo de 79 anos têm aplicação prática na economia, na diplomacia, em política e até em religião. Aumann começou a se interessar pelo assunto na década de 50, depois de conhecer John Nash - vencedor do Prêmio Nobel de Economia de 1994 e de receber a missão de desenvolver estratégias de defesa para os Estados Unidos em plena Guerra Fria. Aumann nasceu na Alemanha e sua família emigrou para os Estados Unidos em 1938, para fugir do nazismo. Um de seus filhos morreu na primeira guerra do Líbano, em 1982. Aumann, que vem ao Brasil no próximo dia 9 para uma série de palestras, concedeu a seguinte entrevista a VEJA, de sua sala na Universidade Hebraica de Jerusalém. O fato de sua vida ter sido marcada por dramas de guerras determinou seu interesse pelo tema? Sim, você está certo. A II Guerra Mundial e o constante estado de conflito em Israel, que se estende desde 1922, certamente me influenciaram. A convivência constante com guerras despertou em mim grande interesse pelo mecanismo das lutas armadas. Eu me considero um homem de paz. Mas a forma como os outros homens de paz querem acabar com as guerras não é eficiente. Eu quero paz, mas de um jeito diferente. O estudo da economia e da Teoria dos Jogos me ensinou que as coisas nem sempre são o que parecem. O funcionamento dessas ciências é mais complexo e tem relação com a maneira com que as ações de um indivíduo afetam outras pessoas. Essa interação depende de uma rede intrincada de participantes ou, como costumo chamar, jogadores. Por isso, não basta querer a paz para consegui-la. É preciso entender como esse desejo afeta outras pessoas. Dizer “eu quero paz” pode não trazer paz, mas guerra. Para minimizar as surpresas é preciso calcular com muito cuidado como uma ação leva a outras. O que é a Teoria dos Jogos? É uma ciência que examina situações em que dois ou mais indivíduos ou entidades lutam por diferentes objetivos, nem sempre opostos. Cada jogador tem consciência de que os outros também agem de forma a atingir as próprias metas. Um exemplo óbvio são os jogos recreativos ou esportivos, como o xadrez, o pôquer e o futebol, em que todos os participantes possuem metas próprias. No xadrez, cada peça movida por um jogador desencadeia uma série de reações no adversário. A compra de uma casa também pode ser analisada por meio da Teoria dos Jogos, mas sugere um cenário completamente diferente, pois o comprador tem objetivos comuns aos do vendedor. Ambos estão interessados em que o negócio se concretize. Alguns aspectos da negociação, porém, são opostos, porque o comprador quer um preço mais baixo e o vendedor um preço mais alto. Nessa disputa, o comprador analisa os movimentos do vendedor, e vice-versa. Cada um pensa sob o ponto de vista do outro para elaborar uma maneira de atuar. O mesmo vale para a política ou para a guerra. Minha pesquisa consiste em analisar as estratégias de situações interativas como essas. (…) De que maneira a Teoria dos Jogos pode ajudar a evitar ou solucionar guerras? 113 É preciso identificar os elementos comuns a diferentes situações de conflito. Em diversos conflitos atuais, há uma tentativa de resolver o problema tomando medidas para agradar à outra parte. Há quem pense que atender às demandas do adversário pode trazer a paz. Basta usar raciocínio lógico e analisar a história para ver que isso não é verdade. O senso comum diz que a II Guerra Mundial foi causada por Adolf Hitler. Há alguma verdade nisso, porque foi ele quem ordenou a invasão da Polônia em setembro de 1939. Mas o papel desempenhado pelo primeiro-ministro inglês Neville Chamberlain é frequentemente negligenciado. É impressionante ler os jornais daquele tempo e perceber quanto a retórica de Chamberlain era similar ao que ouvimos hoje em dia na diplomacia: “Nós temos de conseguir a paz, temos de entender o outro lado, temos de fazer concessões…”. Como a política de pacificação de Chamberlain? Ele estava tão obcecado em garantir a paz que passou a atender a todas as demandas de Hitler. Ao fim das negociações de Munique, em 1938, ele perguntou a Hitler se todas as exigências da Alemanha haviam sido atendidas. Hitler disse que sim. Chamberlain, então, voltou a Londres, exibiu pomposamente o acordo assinado com Hitler e proferiu a frase que entraria para a história dos piores erros de avaliação: “A paz em nosso tempo está assegurada”. Dias depois as tropas alemãs ocuparam os Sudetos. Meses depois tomaram a então Checoslováquia. Um ano depois Hitler invadiu a Polônia. Só então a Inglaterra declarou guerra à Alemanha. Hitler ficou furioso. Ele tinha razões para isso. Chamberlain levou-o a acreditar que a Inglaterra aceitaria qualquer coisa que ele fizesse, sem limites. As concessões de Chamberlain foram um incentivo para Hitler, e elas levaram o mundo à II Grande Guerra. Se fazer concessões não ajuda, que tipo de incentivo pode acabar com um conflito? É preciso dizer na mesa de negociação: “Não vamos aceitar essas demandas e, se vocês insistirem nelas, vamos revidar com violência”. Há dois tipos de incentivo: a cenoura e o porrete. Theodore Roosevelt dizia para falar com suavidade, mas ter sempre à mão um porrete. Se Chamberlain tivesse dito a Hitler em 1938 em Munique que não aceitaria certas demandas, Hitler teria de recuar, porque não estava ainda preparado para a guerra. Na crise dos mísseis de Cuba, em 1962, o presidente americano John Kennedy deixou claro aos russos que, se os mísseis não fossem retirados da ilha, os Estados Unidos agiriam. Com isso, Kennedy conseguiu a paz. (…) Essa é a maneira correta de tratar o Irã em relação aos seus planos de construir um arsenal nuclear? No caso do Irã, não fico muito preocupado. Mesmo que o governo iraniano consiga construir a bomba atômica, duvido que ele a utilize. Obviamente, isso daria ao Irã um bom poder de barganha, o que não é nada agradável. Não acredito que faria uso dessa arma, no entanto, porque Estados Unidos e Israel têm capacidade para responder a um ataque com um poder muito superior. É um pouco a lógica da Guerra Fria. O problema com o Irã não é o regime dos aiatolás querer utilizar a bomba, mas essa tecnologia cair nas mãos de grupos terroristas como a Al Qaeda, que não tem endereço. O que mantinha o equilíbrio durante a Guerra Fria é que um lado podia destruir o outro. A Al Qaeda não é um inimigo convencional com um país, uma capital e um povo. Ela pode atacar e não sofre retaliações. 114 Modelando comportamento : A teoria dos jogos na prática 3/9/2011 - http://www.economist.com/node/21527025?frsc=dg|a Software que modela comportamento humano pode fazer previsões, derrotar rivais e transformar negociações Para um homem que alega falta de expertise na área, Bruce Bueno de Mesquita, um acadêmico na Universidade de Nova York, fez algumas previsões políticas impressionantemente precisas. Em maio de 2010 ele previu que o presidente do Egito, Hosni Mubarak, cairia de poder dentro de um ano. Nove meses depois Mubarak fugiram para o Cairo em meio a protestos de rua em massa. Em fevereiro de 2008 o Sr. Bueno de Mesquita previu que o presidente do Paquistão, Pervez Musharraf, seria deixar o cargo até o final do verão. Ele tinha ido embora antes de Setembro. Cinco anos antes da morte do aiatolá iraniano Khomeini, em 1989, o Sr. Bueno de Mesquita havia indicado corretamente seu sucessor, e, desde então, tem feito centenas de previsões como consultor tanto para governos estrangeiros e do Departamento de Estado Americano, do Pentágono e as agências de inteligência. Qual é o segredo do seu sucesso? "Eu não tenho idéias, o jogo faz", diz ele. O "Jogo" do Sr. Bueno de Mesquita é um modelo de computador desenvolvido por ele e que usa um ramo da matemática chamado teoria dos jogos, que é freqüentemente usada por economistas para descrever como eventos vão se desenrolar e como pessoas e organizações agem no que eles consideram ser o seu melhor interesse. Valores numéricos são usados para represntar objetivos, motivações e influência de "players (jogadores)"- negociadores, líderes empresariais, partidos políticos e organizações de todos os matizes, e, em alguns casos, seus funcionários e torcedores. O modelo de computador, em seguida, considera as opções em aberto para os diversos agentes, determina a seu provável curso de ação, avalia sua capacidade de influenciar os outros e, portanto, prevê o curso dos acontecimentos. A influência de Mubarak, por exemplo, esgotou-se quando os cortes na ajuda americana ameaçou sua capacidade de manter capangas no exército e forças de segurança felizes. Então percebeu que os funcionários insatisfeitos estariam menos dispostos a usar a violência para acabar com os protestos de rua. Mesquita & Roundell, empresa do Sr. Bueno de Mesquita, é apenas um dos vários equipamentos de consultoria que executam simulações de computador, para escritórios 115 de advocacia, empresas e governos. A maioria dos conselhos para tomada de decisão é sobre política, no sentido mais amplo da palavra, a melhor forma de antecipar um julgamento, influenciar um júri, ganhar o apoio dos acionistas ou atrair eleitores indecisos para uma coalizão política e fazer concessões legislativas. Mas a alimentação de software com bons dados sobre todos os atores envolvidos é especialmente complicada em assuntos políticos. Reinier van Oosten, uma empresa holandesa que usa os modelos de negociações políticas e em comércio de instituições da União Europeia, observa que as previsões não se concretizam quando as pessoas inesperadamente cedem à emoções "não-racionais", como o ódio, em vez de perseguir o que é, aparentemente, seus melhores interesses. Classificando as motivações das pessoas é muito mais fácil, principalmente quando o dinheiro é o objeto principal. Assim, a modelagm do comportamento usando a teoria dos jogos está se mostrando particularmente útil quando aplicada à economia. Siga o dinheiro A Modelagem de leilões provou ser especialmente bem sucedida, diz Robert Aumann, um acadêmico da Universidade Hebraica de Jerusalém, que recebeu o prêmio Nobel de Economia em 2005 por seu trabalho em teoria dos jogos. Lances, sendo quantificados, facilitam a análise e previsão de como a resposta correta pode ser muito lucrativa. Empresas de consultoria estão contribuindo para ajudar clientes a tornar os leilões mais rentáveis ou torná-los menos onerosos. Em um leilão online em 2006, do espectro de radiofrequências licenças pela Federal Communications Commission dos Estados Unidos, Paul Milgrom, consultor e professor da Universidade Stanford, utilizou seu software de teoria dos jogos para ajudar um consórcio de licitantes. O resultado foi um triunfo. Quando o leilão começou, o software Dr Milgrom rastreaou as propostas dos concorrentes para estimar seus orçamentos para as 1132 licenças em oferta. Decisivamente, o software estimou os valores secretos dos licitantes em licenças específicas e determinou que certas licenças grandes estavam sendo supervalorizados. E dirrcionou clientes do Dr Milgrom para obter um conjunto de licenças menos caras. Dois de seus clientes, a Time Warner e a Comcast, pagaram cerca de um terço menos do que seus concorrentes, economizando quase US $ 1,2 bilhão. Avanços na teoria dos jogos tem acontecido rapidamente nos últimos anos e tornou evidente que não fazer uma análise adequada pode ser caro, diz Sergiu Hart, um colega do Dr. Aumann da Universidade Hebraica. Por exemplo, há alguns anos o governo de Israel adicionou uma torção nova para um leilão de refinaria de petróleo. Para incentivar lances maiores, o governo ofereceu um prêmio de US$ 12 milhões ao segundo lance mais alto. Foi um erro caro. Sem o incentivo, o lance mais alto teria sido cerca de US $ 12 milhões superior, uma análise mostrou que os participantes fizeram ofertas baixas porque o perdedor iria ficar rico. Combine essa quantia com o pagamento de prémios, e as perdas do governo somaram cerca de US$ 24 milhões. A conclusão, então, é "não é possivel saber qual é a solução" sem a ajuda de um software de modelagem, diz Brad Miller, modelador sênior da Charles River Associates, uma consultoria em Boston. A empresa projeta software de teoria dos jogos para modelar leilões industriais e a plotagem de fusões e aquisições corporativas. "O uso de modelagem faz com que os clientes empresariais fiquem mais inclinados a adotar estratégias de longo prazo." Software não é sempre necessário. Um estudante da Universidade Hebraica, por exemplo, demonstrou a perda de US $ 24 milhões do governo israelense usando papel e caneta. Ele levou cerca de dois dias, no entanto, de acordo com um professor lá. Software, naturalmente, é muito mais rápido. Mas acoleta e tratamento dos dados necessários requer e treinamento. Reinier van Oosten, a 116 consultoria holandesa, geralmente cobra €20,000-70,000 ($28,000-100,000) para resolver um problema utilizando o seu software, chamado DCSim, porque ele deve primeiro realizar longas entrevistas com especialistas. Seus clientes incluem órgãos governamentais na Holanda e no estrangeiro, e grandes empresas, incluindo IBM, um gigante de computador, e ABN AMRO, um banco holandês. PA Consulting, uma empresa britânica, desenha modelos sob medida para ajudar seus clientes a resolver problemas específicos em áreas tão diversas como fármacos, energia de combustíveis fósseis e a produção de programas de televisão. Agências do governo britânico contrataram a PA Consulting para construir modelos para testar esquemas regulatórios e das regras de zoneamento. Para dar um exemplo simples: se dois astutos vendedores de sorvetes compartilham uma longa praia, eles montaram seus estandes no meio da praia, explica Stephen Black, um modelador na sede da empresa em Londres. Infelizmente para os clientes potenciais nos extremos da praia, cada vendedor impede o outro de deslocalizar-no outro ponto que seria mais perto de mais pessoas. Ao introduzir um terceiro vendedor, no entanto, o equilíbrio é quebrado com uma sequencia de realocações e mudanças de preços. O uso de modelagem faz com que os clientes empresariais fiquem mais inclinados a adotar estratégias de longo prazo, o Dr. diz Black. Mas o software da teoria dos jogos também pode trabalhar bem fora da esfera da economia. Em 2007, militares dos Estados Unidos forneceram ao Sr. Bueno de Mesquita, informações para capacitá-lo a modelar o impacto político de mover um portaaviões próximo à Coréia do Norte (ele não revela os resultados). O software de teoria dos jogos pode até mesmo ajudar a localizar o esconderijo de um terrorista. Para executar simulações, Guillermo Owen da Naval Postgraduate School em Monterey, Califórnia, utiliza dados de inteligência da Força Aérea dos EUA para estimar em uma escala de 100 pontos a importância que um homem atribui a seus gostos (pesca, por exemplo) e as prioridades (restantes ocultos ou, em maior risco de descoberta, recrutamento de homens-bomba). Tais fatores determinam onde e como os terroristas decidem viver. attaches desempenhou um papel importante para encontrar o esconderijo de Osama bin Laden em Abbottabad, Paquistão, diz Owen. Para onde vamos? Juntamente com a corrida armamentista, a modelagem de software está cada vez mais elaborada, há também os esforços para desenvolver um software que pode ajudar na negociação e mediação. Duas décadas atrás Clara Ponsatí, um acadêmico espanhol, veio com uma idéia inteligente enquanto meditava sobre o processo de paz israelensepalestino. Como os negociadores em todos os lugares sabem, a primeira equipe a revelar tudo o que ele está disposto a sacrificar (ou pagar) perde considerável poder de negociação. Mas se nenhum dos lados revela as concessões que está disposto a fazer, as negociações podem entrar em colapso. Em um artigo publicado em 1992, o Dr. Ponsatí descreveu como o software poderia ser projetado para quebrar este impasse. A idéia do Dr Ponsatí era que se um mediador humano não era confiável, acessível e disponível, para conduzir as negociações, um computador poderia fazer o trabalho em seu lugar. Para a negociação as partes dariam as informações confidenciais sobre suas posições para o software após cada rodada de negociações. Uma vez que as posições de ambos os lados já não eram mutuamente exclusivas, o software poderia decidir a diferença e propor um acordo. Dr Ponsatí, agora chefe do Instituto de Análises Econômicas da Universidade Autônoma de Barcelona, diz que tais "máquinas de mediação" poderia lubrificar as negociações destravando informações que poderiam ser retidas por um adversário ou mediador humano. 117 Barry O'Neill, um teórico do jogo na Universidade da Califórnia, Los Angeles, descreve como um software criado recentement pode facilitar acordos de divórcio. Ao marido e mulher são dados um número de pontos que eles secretamente alocam para os bens domésticos que desejam. A esposa poderá informar ao software que a sua avaliação do carro da família é, digamos, 15 pontos. Se o marido coloca o valor do carro em 10 pontos, não pode depois alegar que ele merece mais o carro do que ela. Prevendo um fim ao conflito Os participantes precisam ter certeza de que a tecnologia da mediação é totalmente neutra. Para grandes negócios, empresas de auditoria acompanham de perto o desenvolvimento e utilização de software de modo a assegurar que nenhum agente obtém secretamente informação sobre as posições da outra parte na negociação, diz Benny Moldovanu, um teórico do jogo na Universidade de Bonn. Ele aconselha as empresas usarem o software para desenhar negociação para os regimes de privatização e mercados de venda por atacado de electricidade. Essa abordagem vai se espalhar para outros mercados de serviços públicos, como água, acredita ele. Pode este software de mediação de acordos de divórcio e preços ser utilizado para resolução de disputas políticas e militares? Teoricos da teoria dos jogos, que consideram todas essas questões serem variações do mesmo tipo de problema, desenvolveram um modelo conceitual intrigante de guerra. O "princípio da convergência", como é conhecido, afirma que conflito armado é, em essência, um exercício de coleta de informações. Beligerantes lutam para determinar a força militar e a vontade política de seus adversários, quando todos os lados têm avaliações "convergentes" precisas e idênticas, um acordo de rendição ou a paz pode ser forjada. Cada beligerante tem uma motivação forte para acertar o inimigo difícil e mostrar que valoriza muito grande uma vitória. Tal modelo poderia ser usado para refletir negativamente sobre a natureza humana. Mas alguns teóricos dos jogos acreditam que o modelo poderia ser aproveitada para ser um substituto mais viável para fazer negociações diplomáticas de conflito armado. 118 EXERCÍCIOS DE FIXAÇÃO 1) O paradoxo de Condorcet4. Considere um parlamento imaginário com 3 partidos em que os deputados possuem todos o mesmo ordenamento de preferências do seu respectivo partido. Considere ainda, que os partidos possuem o mesmo número de deputados. Chamaremos os partidos de Conservador, Moderado e Radical. Existem 3 propostas orçamentárias a serem votadas. a) Aumentar o número de propostas sociais (proposta G); b) Manter o número de propostas sociais (proposta M) e c) Reduzir o número de propostas sociais (proposta D); As preferências dos partidos estão representadas a seguir. Partido Ordem das preferências Conservador DGM Moderado M DG Radical GM D O processo de escolha será feito da seguinte forma: a) Na primeira votação será escolhida uma proposta entre as opções G e M; b) Na segunda votação será escolhida uma proposta entre as opções M e D. c) Na terceira votação será escolhida uma proposta entre as opções G e D. 1.1 Mostre quais seriam os resultados das votações e a ordem de preferência do parlamento. 1.2 Dada à ordem de preferência do item 1.1, podemos dizer que o parlamento é racional? 2) Considere uma eleição entre três candidatos, A, B, e C, que disputam um cargo politico na cidade Alfabetagama. Se um eleitor prefere o candidato A ao B e o B ao C, representamos sua preferência como A B C . A tabela a seguir mostra os tipos e quantidade dos eleitores, assim como suas respectivas preferências. 4 Marie Jean Nicolas Caritat, Marques de Condorcet (1743-1794), filósofo, matemático foi um dos precursores dos cientistas políticos modernos. Defendia a educação pública gratuita e igual para todos, igualdade de direitos para homens e mulheres, assim como indivíduos de todas as raças. Como matemático, deixou contribuições importantes em cálculo integral. Preso pela revolução francesa em 1794, foi encontrado morto em sua cela em 28/03/1794. 119 Tipo de eleitor I II III Número de votos Preferência 95 A B C 95 B AC C A B 110 Com base nestes dados, responda (demonstre seu raciocinio): a) Se os candidatos se enfrentassem em dois turnos na seguinte ordem: A versus B e, em seguida, o vencedor deste embate com C, qual seria o candidato eleito? b) E se a eleição fosse em um único turno, quem seria o candidato com maior rejeição e qual seria o eleito? 3) Plinio, o jovem, advogado romano do século 1 d.C, presidia o Senado Romano quando lhe foi apresentado o seguinte caso: Um Senador, Afranius Dexter, foi encontrado morto. A morte poderia ter sido suicidio ou assassinato pelas mãos de um de seus serviçais. O Senado foi convocado para decidir o destino desses serviçais. Os Senadores tinham tres opções - Absolvição (A), banimento (B) ou execução (E). A tabela a seguir mostra os tipos de decisão e o percentual de Senadores simpatizante de cada veredito. Percentual de Decisão Senadores Preferência Absolvição (A) 45 ABE Banimento (B) 35 B A E E B A Execução (E) 20 Havia duas possibilidades de condução da votação. Votar as propostas duas a duas ou em uma única vez. Plinio que era a favor da absolvição deveria optar por qual delas? Porque? Como Plinio poderia perder o caso, mesmo se o Senado escolhesse a sua opção favorita? (demonstre). 4) O Conselho Monetário Nacional (CMN) é o órgão normativo do Sistema Financeiro Nacional. O CMN é composto somente por 3 membros: o Ministro da Fazenda (MF), que é o presidente do Conselho, o Ministro de Orçamento e Gestão (MOG), e o Presidente do Banco Central do Brasil (PBC). Sendo o órgão deliberativo máximo do Sistema Financeiro Nacional, compete ao CMN adaptar o volume dos meios de pagamentos às reais necessidades da economia nacional e seu processo de desenvolvimento. Para isto o CMN pode autorizar a emissão de papel-moeda. Suponha que este mês o CMN irá se reunir para 120 decidir sobre o volume adequado de papel-moeda para a atual fase da economia brasileira. Existem somente três políticas em pauta: Elevar (E), Manter (M) ou Reduzir (R) o volume de papel-moeda. Os membros do CMN têm as seguintes preferências: a) MF : E M , M R, não R E b) MOG : M R, R E, não E M c) PBC : R E, E M , não M R 4.1 Dadas as preferências acima, podemos garantir que os membros do CMN são racionais? 4.2 Suponha que a preferência do Conselho Monetário Nacional (CMN) é definida por maioria de votos entre os 3 membros. Inicialmente vota-se somente entre as políticas E e M. Qual a preferida pelo CMN? 4.3 Agora vota-se somente entre as políticas E e R. Qual a preferida pelo CMN? 4.4 Por fim, vota-se somente entre as políticas M e R. Qual a preferida pelo CMN? 4.5 De acordo com os resultados de 2.3; 2.4 e 2.5, podemos dizer que o CMN é ra5ional? Por que?