Universidade Federal do Rio de Janeiro Centro de Filosofia e Ciências Humanas Escola de Serviço Social A CRIMINALIZAÇÃO DA POBREZA PELO OLHAR DO ADOLESCENTE EM SITUAÇÃO DE VULNERABILIDADE SOCIAL. Rute Noemi da Silva Souza Orientação: Prof Joana Garcia Rio de Janeiro, agosto de 2007. “Pobreza não é culpa. Pobreza é injustiça.” (John Wesley- Inglaterra, 1753) 2 Agradecimentos: Aos alunos do projeto "Fala Sério!" que me ajudam a ratificar o meu compromisso e identificação com os pobres; à Joana Garcia pela tolerância com minha postura às vezes refratária ao discurso acadêmico; ao Amir Geiger, sempre solidário e generoso nas discussões e à Miriam Guindani pelas críticas contundentes e bem vindas. 3 Resumo: Há, em nossa sociedade, a prática de criminalizar os pobres com o suposto de que representam ameaça e que por isso, amedrontam e justificam, na lógica perversa estabelecida pelas elites, a segregação e a penalização daqueles. Um segmento que tem sido vítima dessa lógica são os jovens, negros e favelados, que tem sofrido processos intensivos de exclusão e desproteção, por não terem emprego, não são assimilados pelo mercado de trabalho e são seduzidos pelo tráfico, que tem exercido a função de patrão em lugar do Estado, oferecendo a eles salário, prestígio e poder. O presente trabalho trata de ver, pela ótica do adolescente vulnerabilizado socialmente, como se dá esse processo de criminalização no seu cotidiano e como se sente diante dessa situação. Através de grupos focais e de uma pesquisa direta aplicada em 40 adolescentes, tanto do “morro”, quanto do “asfalto”, podemos perceber as possíveis diferenças de visão de mundo de acordo com as classes sociais a que pertencem, o que nos faz refletir sobre o processo ideológico historicamente construído para justificar a criminalização. Palavras-chave: Juventude, criminalização, pobreza. 4 Índice: 1.INTRODUÇÃO: ................................................................................................... 6 2.NOTAS METODOLÓGICAS ................................................................................ 9 3.MARCO TEÓRICO ..............................................................................................12 4.PESQUISA DE CAMPO.......................................................................................20 Quadros demonstrativos das visões dos adolescentes entrevistados ......................20 ............................................................................................................................27 Grupos focais .......................................................................................................28 5.CONCLUSÃO ......................................................................................................39 6.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ...............................................................43 7.GLOSSÁRIO: .......................................................................................................45 8.ANEXOS: .............................................................................................................47 5 1. INTRODUÇÃO: O tema “Adolescente em conflito com a Lei” sempre me seduziu. Talvez por ter sido, desde a minha meninice, uma transgressora em potencial. Consequentemente escolhi este tema para ser objeto de pesquisa no meu trabalho de conclusão de curso. Como relacionar a condição de pobreza e a aplicação de medida sócioeducativa de internação para o jovem que comete ato infracional? Existe um nexo causal entre os dois? Leituras, pensares e preocupações me cercaram. Finalmente o projeto de pesquisa ficou pronto. Mas o poeta Fernando Pessoa, com sua sensibilidade ímpar, diz que “a realidade é sempre mais ou menos do que nós queremos. Só nós somos sempre iguais a nós próprios”... Daí que me vi enredada pelas circunstâncias na hora de aplicar a pesquisa. Muitas barreiras pessoais e políticas, entre elas a da mudança de direção do DEGASE, órgão onde buscaria o maior número de informações e dados para elaboração do trabalho. Mas, ao mesmo tempo em que a dificuldade apareceu, outra possibilidade se abriu de forma avassaladora (nada como uma boa orientadora do lado!): por que não pesquisar o grupo de adolescentes que freqüenta o Projeto “Fala Sério!” que tenho a oportunidade de coordenar? São trinta adolescentes entre os 12 e 15 anos, em situação de vulnerabilidade social, moradores do Morro dos Macacos, Vila Isabel, Rio de Janeiro, que trazem histórias de discriminação vivenciadas, quase que cotidianamente, por serem pobres e moradores de favela. Assim, pesquisar tal grupo me pareceu interessante e necessário, pois essas histórias vividas trazem elementos que podem contribuir efetivamente na discussão sobre o tema, pois apontam para um processo de culpabilização, de exclusão e de baixa auto-estima, em função da pobreza. Abandonei, portanto, o projeto inicial e me debrucei neste novo projeto, a fim de pesquisar a criminalização da pobreza sob o olhar do adolescente em situação de vulnerabilidade social. Perceber, captar e refletir sobre o tema, principalmente com eles, pode cooperar no processo de construção de cidadania que se pretende exercer, tendo os adolescentes como sujeitos de participação e transformação da realidade vivida. 6 O projeto desenvolvido com os adolescentes, denominado “Fala Sério!” começou em fevereiro de 2007, numa iniciativa da Igreja Metodista em Vila Isabel, com o intuito de ser um espaço de construção de cidadania. Como os adolescentes atendidos já freqüentavam outro projeto de assistência da referida Igreja, fui convidada a desenvolver este projeto especificamente para atendê-los, além de implantá-lo e implementá-lo na função de coordenadora e “oficineira” de Temáticas de Cidadania, cujas aulas dadas me propiciaram um contato mais estreito e de troca com os adolescentes, permitindo a prática adotada dos grupos focais que subsidiaram esse trabalho. A forma como procurei conduzir o trabalho sem premeditação foi extremamente favorável à sua utilização posterior para fins deste trabalho. Baseada na perspectiva de favorecer a participação crítica dos jovens, procurei criar coletivamente um espaço de reflexão e debate propositivo. Nesta medida, as reuniões se constituíam em encontros de experiências, vivências, valores e dramas individuais e coletivos. A moldura para este processo de re-significação dos relatos de cada um e de todos foi a cidade e suas “armadilhas”: a vida pública em oposição ou em sintonia ao universo privado, os atores distintos e semelhantes que compõem a rede de relações destes jovens, os projetos individuais e coletivos. Vale considerar as características deste grupo como referência para este trabalho. Em que medida jovens moradores de um território podem se constituir um grupo de referência, revelador, exemplar ou mesmo significativo para este estudo? Certamente há virtudes e problemas inteiramente associados às características deste grupo. De positivo convém considerar que se consideram como uma grande família, têm uma ligação afetiva relativamente forte, sabem dos dramas uns dos outros e de certa forma se ajudam, e diante da relação de confiança estabelecida entre nós, eles se colocaram sem qualquer constrangimento expondo seus dramas e vivências. No entanto, mesmo diante destas vantagens para um pesquisador, outros desafios se colocaram. Vencer problemas como tamanho do grupo, restrito ao mesmo território, com perfil social semelhante, com histórias de vida tão parecidas e com a violência permeando seus cotidianos, poderia comprometer e empobrecer os encontros bem como o resultado desejado, o que felizmente não ocorreu diante da metodologia adotada e da necessidade deles em falar de suas experiências, ainda que tão novos. 7 Ouvir os jovens foi fundamental, pois qualquer outra fala que não viesse deles não nos traria a riqueza de suas percepções e a maneira autêntica como se colocam diante da realidade vivida por eles. Afinal, diante do processo de criminalização em que vivem e que pretendemos maturar aqui, eles têm cada vez menos voz e suas opiniões são desvalorizadas por serem pobres e por serem jovens. Nesse processo, se sentiram sujeitos de suas histórias. 8 2. NOTAS METODOLÓGICAS Diante da riqueza do contato direto com o usuário do projeto, que traz em seu cotidiano as marcas e o estigma de sua condição de pobre, optei por privilegiar o grupo focal, técnica de pesquisa qualitativa, que levasse em conta as inquietações que o grupo traz, sua percepção e entendimento acerca da realidade de exclusão em que vive. O grupo focal é um tipo de instrumento de pesquisa que, ao mesmo tempo, beneficia-se das interações, como as favorece. Sua viabilidade como forma de obtenção de conhecimento foi mediada pelo tempo e pela confiança dele decorrente. Os jovens, ao criarem uma identidade como participantes de um grupo, facultaram-me a chance de explorar valores, contradições, intercessões e antagonismos. Os jovens são muito mobilizados pela influencia do grupo. Constroem seus argumentos e explicitam-nos, sobretudo a partir das interações com outros jovens que lhes sejam significativos. A identidade deste grupo é construída pelo pertencimento a um bairro, um território com características próprias. A faixa etária também delimita um campo de interesses, valores e atitudes. As preferências de lazer, consumo e sociabilidade também favorecem uma maior integração entre os mesmos. Minha pesquisa buscou perceber quem é esse adolescente e ouvir suas falas a partir do aprofundamento e da reflexão; perceber em seu discurso as dificuldades que aparecem e que trazem, diante de sua condição. O método utilizado favoreceu sobremaneira as discussões bem como as proposições levantadas por mim, já que o grupo focal propicia uma aproximação maior entre facilitador e participantes diante de sua metodologia propositiva e inclusiva. O risco que corremos foi o de ter "respostas prontas" por parte dos adolescentes mais tímidos, que tinham dificuldade em explicitar suas idéias e sentimentos e em alguns momentos tendiam a repetir as falas dos mais desenvoltos. Mas, conhecendo o grupo e percebendo essa tendência, procurei estimulá-los a superar a timidez, desafiando-os a expor o que sentiam e não o que os outros achavam. Esse processo foi interessante porque todos se soltaram, e falaram sem bloqueios de suas vivências. 9 Outro momento do estudo se deu através de uma pesquisa aberta com jovens de dois segmentos distintos. O primeiro deles é constituído pelos freqüentadores do projeto “Fala Sério!”, desenvolvido pelo Ministério de Ação Social da Igreja Metodista em Vila Isabel, aqui já pontuado. Este grupo é de jovens de baixa renda, moradores do Morro dos Macacos, no Bairro de Vila Isabel. Este morro é conhecido por seu envolvimento ativo com a Escola de Samba, do mesmo nome, mas também por seu caráter violento, cujo tráfico, ligado à facção "amigos dos amigos" (ADA) é tida como muito violenta e seu chefe atual, impõe terror com seu caráter autoritário e "absolutista" no comando do tráfico. Os Jovens estudam em escolas públicas da região, em sua absoluta maioria e independentemente da idade, estão cursando o ensino fundamental. Seus pais, em sua totalidade, não passaram da primeira série do primeiro grau. O lazer da grande maioria deles é o Shopping, que fica próximo ao morro onde residem. Na verdade, o shopping acaba sendo o único espaço de lazer que tem, já que no bairro não há nenhum outro espaço onde podem se divertir. Vale dizer que andam pelo shopping mas não consomem as ofertas oferecidas como cinema e área de lazer com jogos eletrônicos do estabelecimento. Costumam também freqüentar os bailes funk do morro, mesmo os que tem pouca idade e verbalizam que "apesar do perigo vão assim mesmo e que suas mães deixam". O segundo segmento é composto por outros 21 adolescentes que freqüentam a Igreja Metodista em Vila Isabel mas não são moradores do morro. Todos são de classe média, muitos frequentam escolas particulares e outros são alunos do Colégio Pedro II. Também vão aos Shoppings mas usufruem das "benesses" que estes oferecem, tais como cinema, lanches, roupa de grife e áreas de lazer. Costumam viajar com a família e ir a acampamentos oferecidos pela Igreja. Tem um estilo de se vestir muito próximo ao da maioria dos adolescentes do Rio de Janeiro. Na verdade são bem representativos dos jovens brasileiros. Tal distinção foi adotada como forma de perceber semelhanças e distinções entre adolescentes de classes sociais diferentes diante de questões e proposições semelhantes. Eles responderam a um questionário com perguntas diretas, mas sem alternativas prévias de resposta. As perguntas foram construídas, observando-se a 10 preocupação de não conduzi-los nas respostas, mas sim que eles pudessem expressarse livremente e de acordo com sua linguagem e compreensão das formulações feitas. Tivemos apenas a preocupação de levantar perguntas que atendessem o nosso referencial teórico adotado e que com as respostas, poderíamos ter um leque de sentimentos e vivências vindas dos adolescentes O preenchimento do questionário aplicado se deu em momentos distintos: os do projeto responderam depois de uma discussão na Oficina de Temáticas de Cidadania. Vale registrar uma certa dificuldade por parte de alguns em responder as perguntas e algumas delas tiveram respostas voltadas para questões pessoais tais como: ao responder a pergunta "qual o seu maior sonho na vida", uma menina respondeu: "não ter que lavar pratos em casa". Os adolescentes de classe média responderam o questionário num domingo, em uma chamada "Escola Dominical" onde os fiéis se reúnem para culto e aprendizagem das coisas da religião. A turma dos adolescentes, portanto, depois de consultada e informada sobre a pesquisa, prontificou-se a responder o questionário. Interessante observar que os adolescentes do projeto, que não tem vínculo religioso com a Igreja, foram tão “religiosos” quanto os que se assumem enquanto tal, quando em suas respostas, apontaram Deus como a "coisa mais importante de suas vidas" e têm uma leitura moral no enfrentamento de alguns dos problemas sociais que apontaram em suas respostas, moral típica de cidadãos brancos e de classe média. Assim, através de grupos focais e de pesquisa aberta, levantei dados e falas do grupo que sinalizam que este adolescente em situação de vulnerabilidade social se sente excluído porque mora no morro; se sente vigiado no shopping porque é negro e pobre e que, embora tenha sonhos de uma vida melhor, não acredita muito que esses sonhos podem se realizar. 11 3. MARCO TEÓRICO Vivemos ainda sob o mito da pobreza como indolência, vadiagem e crime? A pobreza é ainda tratada como uma questão moral? O jovem pobre é mais violento do que o jovem de classe média? É prerrogativa do jovem pobre a prática de ato infracional? Os atos infracionais cometidos por um ou outro são tratados de forma diferenciada em função da classe social a que pertencem? Essas questões têm estado presentes na discussão e reflexão de profissionais que trabalham com o adolescente pobre, pois está cada vez mais evidenciada a exclusão e criminalização desse segmento da sociedade que são os jovens, negros e favelados. É imperioso aprofundar tal reflexão para que percebamos que há um movimento excludente, elitista e conservador que perpassa as políticas públicas estabelecidas. Essas políticas acabam reforçando a criminalização da pobreza e a vulnerabilização dos jovens, tornando-se uma ameaça para os modelos de segurança propostos como se a pobreza produzisse criminalidade.. Podemos constatar isso se observarmos que o inchaço das prisões têm aumentado sobremaneira no sistema jurídico vigente, sendo o perfil da população carcerária, em sua grande maioria, formado por negros, jovens e pobres, e a maioria desses jovens privados de liberdade, cometeu crime de furto, o que, pelo ECA, não demandaria medida de privação de liberdade segundo o artigo 122, que prevê tal medida apenas para os atos infracionais cometidos mediante grave ameaça ou violência à pessoa; esses adolescentes poderiam cumprir penas alternativas, se as políticas não fossem excludentes, como aponta o relatório da Anistia Internacional, do ano de 2005. Outro paradigma dessa política estabelecida é o da inserção invasiva e violenta que o poder público pratica nas favelas sob o pretexto de prender traficantes. Na verdade há sim, uma prática recorrente do poder público, de considerar e tratar todos os moradores de comunidades periféricas como potenciais criminosos. É só observarmos a atuação do poder Judiciário que tem expedido Mandados de busca genéricos, que permitem que o policial possa revistar as casas de todos os moradores de uma favela em busca de traficantes. 12 Há outro aspecto que precisa ser observado em nosso sistema sócio-jurídico, que prevê uma rede de proteção para a criança, através do Estatuto da Criança e do Adolescente, com políticas públicas de garantia de direitos que, mesmo negligenciados na prática, garantem a proteção. Quanto ao adolescente essa rede não funciona, ainda que o Estatuto da Criança e do Adolescente aponte para a aplicação de medidas sócio-educativas e veja o adolescente com um ser em desenvolvimento, a lógica tem sido outra. Banaliza-se a concepção de que ele é potencialmente bandido, recebe esse tratamento pela mídia, que reforça o discurso da penalização da pobreza e se cometer ato infracional, é tratado como adulto na aplicação das penalidades. A grande imprensa, alinhada aos interesses das elites, alimenta e reforça a visão histórica de pobreza e criminalidade; se refere ao jovem pobre que comete ato infracional, como “menor” e ao de classe média que comete o mesmo ato, como “adolescente” ou jovem. Observa-se então, que há um crescente processo de demonização dos jovens. Ao sistema capitalista não interessa criar políticas públicas que incluam esses jovens no mercado de trabalho, optando por considerá-los descartáveis e desnecessários à sociedade produtiva. Passam a ser tratados como bandidos. Então, “O bandido é todo setor que sobrou do mercado, é todo setor pobre que geograficamente é identificado: é favelado. E com isso vem uma questão de etnia, econômica, social, ideológica que vem acompanhando esse processo de criminalização da pobreza” (Freixo, in “Imprensa reforça lógica da criminalização”, NPC, 2006). Não é por acaso que os setores retrógrados da sociedade querem reduzir a maioridade penal para 16 anos, com o argumento classista e equivocado de que se o jovem pode votar e pode dirigir, ele pode ser responsabilizado penalmente. Tais argumentos denotam o preconceito enraizado desse setor bem como o desconhecimento da lei. Primeiro, porque o voto não é obrigatório, é facultativo; segundo, porque carro é privilégio dos filhos da burguesia. Adolescente pobre não tem carro! Terceiro, porque o adolescente que comete ato infracional é responsabilizado, não pelo Código Penal, mas por uma legislação específica que é o ECA. É interessante perceber que as justificativas para se reduzir a menoridade penal 13 cabem aos adolescentes ricos, aumentando-lhes o privilégio e para o jovem pobre aumenta-se a punibilidade. É preciso, então, esgotar essa discussão. Analisar conceitos como pobreza, criança e adolescente, “menor” e criminalização da pobreza, é importante para perceber historicamente como foram compreendidos e traduzidos na forma de conceitos e práticas. Irma Rizzini, em “O Elogio do Científico – A construção do menor na prática jurídica, 1993, aponta o fosso existente entre teoria e prática no atendimento ao menor, já que menor e criança são vistos de maneira diferente pela justiça no período entre 1923 e 1941. Para ela, faltava objetividade no tratamento da questão, uma vez que o menor era visto por um viés subjetivo: a moral, que gerava a possibilidade de seu comportamento ser encarado como caso de polícia. Apesar do caráter “científico” adotado para diagnosticar o menor, via-se o caráter maniqueísta, com a moral perpassando de forma subliminar, pois detectava-se o menor entre normalidade e anormalidade. Mesmo se fazendo uma leitura social do menor considerado problema, observava-se claramente a predominância das motivações individuais como elementares na prática da infração. O ranço moral era determinante na avaliação e diagnóstico apresentados. Existia um conluio entre a justiça, a medicina e a psiquiatria no diagnóstico, a fim de justificar medidas jurídicas de banimento e afastamento do menor do convívio social. O discurso médico psiquiátrico ratificava a prática jurídica de adoecer o menor para alijá-lo da sociedade. Mesmo com um discurso aparentemente voltado para todos os fatores que geravam a delinqüência, o valor moral e os interesses de classe é que determinavam. Nessa elaboração conceitual que diferenciava menor e criança, perpassava a leitura ideológica e de classe do profissional que atendia o menor e/ou a criança. É como se a criança coubesse no campo teórico e o menor no campo prático. Aí se evidenciava a dicotomia entre teoria e prática, onde os referenciais teóricos não valiam para se considerar o menor como uma criança e todas as suas implicações. Com a vivência do ECA, há de fato um salto qualitativo mas para o senso comum, a criança ou adolescente que comete ato infracional, continua sendo menor. 14 Sérgio Adorno em “Criança: a lei e a cidadania” 1991, diz que o direito e a ordem jurídica avançam na medida em que as transformações da sociedade impingem novas políticas públicas para o tratamento da questão da criança e do adolescente que comete ato infracional. Toda a sociedade é parte nesse processo. É necessário que todos os profissionais envolvidos com esse adolescente sejam educadores, inclusive o judiciário. Segundo o autor, parece que o judiciário e a polícia ainda não compreenderam esse papel. O ECA traz em seu bojo a observação dessas recomendações: envolver toda a sociedade, inclusive o judiciário no processo educativo desenvolvido junto a adolescentes em situação de risco. O Brasil não observou as regras de Beijing, permanecendo com uma legislação e uma prática repressiva com relação ao adolescente, dando um caráter de pena no tratamento junto ao adolescente que comete ato infracional. A sociedade civil demorou muito para iniciar esse movimento de libertação da “menorização” e na prática, ele ainda continua. Renato Janine Ribeiro, em seu texto “A Sociedade contra o Social ou a Sociedade privatizada”, publicado no jornal Folha de São Paulo em 27/06/1993, ao trabalhar com o conceito de sociedade, diz que ele vem do século XVIII, quando sociedade (la societé) significava gravitar em torno da corte, baseado numa leitura de Alfredo Bosi. Já no século XIX, passa a ser “la bonne compagnie” que significa boa companhia, só que nesse século, a sociedade não se regia pela economia. Quando esta se torna referencial, a sociedade passa a ser o conjunto dos que detém o poder econômico, dos que produzem eficientemente e o detém o lucro. O social diz respeito ao carente, às políticas de minoração da miséria. Ele é inferior e não alcança a sociedade. Em “Crianças do Tráfico”, um estudo publicado por Luke Dowdney, 2003, que pesquisa crianças em situação de violência armada organizada no Rio de Janeiro, constata que cada vez mais crianças e adolescentes participam de disputas territoriais das facções de drogas no Rio de Janeiro como “soldados” em situação de guerra. Pode-se apreender desse estudo que a realidade da droga alterou conceitos como respeito, por exemplo, onde o tráfico, que antigamente procurava esconder suas atividades, vendendo de forma discreta sem permitir que as crianças vissem suas ações, hoje se mostra e pratica uma política de ostentação. Hoje virou um “poder paralelo”, lugar de trabalho e remuneração para os adolescentes, cujo trabalho é organizado como uma empresa. 15 Neste lugar de trabalho assalariado, criou-se um novo patamar para a conceituação de “criança”, pois no tráfico a idade não importa e sim a capacidade da criança de estar “preparada”, ou seja, poder manusear uma arma. Ela deixa de ser criança quando perde a inocência isto é, assimila a mentalidade do crime e passa a pensar como um criminoso. O tráfico considera como responsabilidade pessoal a opção da criança em envolver-se com o “movimento”, tendo que estar preparado, inclusive, para morrer. As crianças entram para ao tráfico aparentemente sem coação ou força. É um processo “voluntário” de ascensão diante da possibilidade de salário fixo e poder. Mas a “escolha voluntária” passa pela falta de opções e pela pobreza, já que nas comunidades onde residem há uma mentalidade estabelecida de que as crianças devem trabalhar depois da escola para ajudar no orçamento familiar. O tráfico, então, passa a ser um “patrão que dá oportunidades iguais a todos os moradores” e oferece aos adolescentes da favela todas as oportunidades que o mercado formal lhes nega. Mais ou menos 1% da comunidade está ligada ao tráfico, mas toda a população padece do preconceito do “asfalto”, além de serem vítimas da violência imposta pelo tráfico. O termo favela tem se tornado sinônimo de tráfico junto à mídia, o que dificulta a inserção dos moradores no mundo do trabalho, por exemplo, e legitimado o abuso de autoridade por parte da polícia. Há o estigma construído de que o povo favelado é pobre, criminoso e perigoso. Lícia Valladares, em “Cem anos pensando a pobreza no Brasil” in “Cooperativismo e desigualdade – A construção do espaço público no Brasil”, 2000, aponta que há uma multiplicidade de discursos sobre a pobreza que foram se justapondo ao longo dos anos, como o sanitarista, o jurídico, o político e o econômico, analisados em três períodos distintos: virada do século XIX/XX; décadas de 50 e 60 e as décadas de 70 e 80. Nesses períodos aparecem concepções distintas de pobreza urbana: na virada do século, os trabalhadores se contrapunham aos vadios e o cortiço era a referência espacial. Nas décadas de 50-60, o conceito se deu como população marginal/subemprego e população de baixa renda, sendo a favela a referência espacial. Nas décadas de 70-80, surgiu o setor informal ligado a estratégias de sobrevivência e o antagonismo se deu entre trabalhadores pobres x bandidos sendo a periferia a referência espacial. 16 No século XIX é que a “pobreza urbana” apareceu como problema aos olhos da elite nacional, diante da passagem da sociedade brasileira para uma ordem capitalista. O conceito de pobreza estava ligado às condições de saúde, junto aos espaços insalubres de moradia já que os cortiços colocavam em risco a saúde dos moradores. Além disso, o cortiço era considerado pelas elites como “o berço do vício e do crime” pois nele se concentravam “as classes perigosas”. A pobreza transformava o indivíduo, automaticamente, em perigoso, segundo a concepção de Chalhoub (1986:48). Essa concepção de “classe perigosa” se deu em função das revoltas populares que se desencadearam no final do século XIX. A construção ideológica da pobreza passava pela visão de trabalho formal, ou seja, o pobre era aquele que não se transformava em trabalhador, que estava fora do mercado formal de trabalho. E mais, considerava-se a prática da ociosidade e da pobreza como responsabilidade individual e não uma questão social. Nos anos 50-60, a pobreza passou a ser vista como questão social já que a economia deixou de ser agro-exportadora para ser urbano-industrial. Com o inchaço das cidades, as favelas foram se impondo nas cidades em expansão, tornando-se paradigma de desenvolvimento econômico desigual. É vista como questão social porque o desenvolvimento econômico não foi capaz de criar empregos em quantidade suficiente para atender os migrantes que vinham do campo, expulsos pelo próprio desenvolvimento econômico. O indivíduo deixou de ser o responsável pela condição de pobreza, sendo o mercado o responsável por essa demanda. Os pobres deixaram de ser vadios ou ociosos e passaram a ser vistos como massa de excluídos e marginalizados. A favela concentrou esse contingente de marginalizados pelo sistema e passaram então a ser “os favelados”. Pobreza passou a ser sinônimo de carência, onde as necessidades biológicas e sociais do indivíduo são maiores do que o atendimento que elas recebem. Nas décadas de 70-80, o processo de urbanização continuou. O país viveu a fase do “milagre econômico”, mas a pobreza se disseminou por toda a rede urbana e com maior concentração nas pequenas e médias cidades. Houve um processo de “periferização”, que se deu pelo crescimento rápido e desordenado através de loteamentos irregulares, muitos clandestinos, nas franjas metropolitanas das cidades. Este processo de periferização se deu também pela segregação espacial da classe trabalhadora para as regiões afastadas do centro, com a 17 precarização de serviços urbanos. O favelado passou a ser “morador de periferia” vindo a ser os novos excluídos pelo capitalismo brasileiro. A pobreza, para a economia, ganhou novas nomenclaturas com a abordagem do mercado “formal” e “informal”. Neste, a referência não é o emprego, mas sim trabalho por conta própria ou trabalho independente. Consideravam trabalhadores, ainda que não absorvidos pela economia formal, todos os que desenvolviam alguma atividade econômica. O “trabalhador pobre” vai contrapor-se ao bandido, pois este se opõe ao trabalho por associá-lo à escravidão, diante da baixa remuneração e das condições de trabalho dadas. Alba Zaluar em “Um século de favela: Crime, medo e política, 1998, pontua que durante o período de redemocratização, aguçou o surgimento dos movimentos populares. As favelas e bairros populares enfrentaram problemas como a falta de serviços públicos, além do processo de organização transacional do crime, com a entrada dos cartéis colombianos e do tráfico de drogas, com pesados armamentos, o que afetou os movimentos sociais. Tal fenômeno (violência/crime violento) causou a cultura do medo em todas as classes sociais afetando suas inter–relações e enfraquecendo a capacidade de mobilização dos movimentos sociais, já que o governo permaneceu na prática de corrupção e clientelismo como estratégia de manutenção. Mesmo combatendo o clientelismo, os movimentos populares acabaram repetindo essa prática quanto à segmentação, que é um dos pilares do clientelismo. Outro problema foi a corrupção: ao receberem verba do governo, os movimentos populares acabaram repetindo esse hábito. Já na introdução da “A máquina e a revolta”, Alba Zaluar trabalha o medo da população, sentido não pelo inesperado, mas pelo construído pela mídia. Há segundo ela, um processo de estigmatização dos pobres e uma ambigüidade vivida diante da possibilidade de romper a barreira que separa as classes sociais. É necessário romper o tabu dos estigmas; romper a separação e a distância entre as classes. Somos iguais perante a lei? Ela pergunta. E responde: Nem perante a lei nem perante a riqueza produzida. Mas há entraves maiores e subliminares que bloqueiam o contato social. Os pobres estão vivendo como que o avesso da civilização: nossa visão sobre eles é de quem passa na porta (dos pobres urbanos), mas não penetra seu mundo por ser perigoso. 18 Gertrude Himmelfarb em “La idea de la pobreza – Inglaterra a princípios de la epoca industrial”, 1984, faz um estudo da cultura da pobreza, referenciando-se em Londres do século XIX. Sua população havia triplicado. As minas, as estradas de ferro e os trabalhos na indústria contribuíram para esse crescimento desordenado da cidade. Londres era um grande centro industrial, tinha um grande porto e era um grande provedor de serviços com uma grande concentração de consumidores e uma enorme fonte de necessidades, ou seja, era a capital política, financeira, comercial social e cultural da Inglaterra, mas também era a “capital da pobreza”. Uma cidade de atmosfera fétida. Detectou-se em Londres, em meio a essa riqueza sem paralelo, novos problemas sociais e novas formas de pobreza. Segundo a autora, um jornalista da época chamado Henry Mayhew foi quem popularizou a idéia de uma pobreza que não era fenômeno econômico, mas cultural, falando assim, da “cultura da pobreza”. Ele passou, então, a ser uma referência para historiadores e sociólogos pelo seu estudo e pesquisa sobre o proletariado no século XIX, escrevendo sobre população de rua e mostrando suas estratificações. Ele via a pobreza como uma forma de patologia social, muito mais cultural que econômica. Todos os autores aqui trazidos, parecem concordar entre si que a realidade da criminalização da pobreza é um processo histórico imposto pelas elites, que adotam uma prática ostensiva de exclusão, tanto do mercado de trabalho quanto da sociedade num sentido mais amplo, como a periferização, o que só aumenta o lucro e os privilégios das classes dominantes e reforça a miséria dos pobres. 19 4. PESQUISA DE CAMPO O trabalho de campo constituiu-se como um “recurso de confirmação” de supostos conceituais que orientaram este trabalho. Ouvir os jovens, através de técnicas distintas, usando pretextos também diversos, foi uma estratégia clara de confrontar pressupostos com a narrativa dos protagonistas de um discurso frequentemente produzido por outros. Os jovens não são considerados aqui detentores de uma verdade inequívoca pela sua condição de protagonistas. Como os valores dominantes permeiam os discursos de modo indistinto, o discurso dos jovens também sofre tais influências. Por esta razão, valores associados à criminalização da pobreza, embora criticados também podem ser reproduzidos. Como indicado na introdução deste trabalho, a pesquisa de campo consistiu na realização de um duplo esforço de captação do discurso: de modo individual, através de um questionário aberto e de modo coletivo, através de reuniões grupais, orientadas por temas focais. Abaixo, indico – em quadros sintéticos – um conjunto de caracterizações e temas que foram objeto desta “escuta” junto aos jovens. As perguntas foram constituídas a partir das leituras, do universo de interesse dos jovens, já caracterizado no trabalho anteriormente exercido, bem como nas próprias inclusões feitas pelos jovens de temas e problemas que faziam sentido para eles. Algumas das questões – de natureza mais subjetiva – foram apresentadas para servir de pretexto para o debate, de modo que através delas os jovens pudessem se expor, explicitar e rever seus valores. Quadros demonstrativos das visões dos adolescentes entrevistados Optei por separar os resultados colhidos entre os 21 adolescentes de classe média (os do asfalto) e os 19 adolescentes que residem no morro dos Macacos a fim de perceber com mais acuidade se suas visões de mundo são diferenciadas e onde se dão as diferenças, em função da classe social que pertencem. As perguntas foram apresentadas em formato de formulário para os dois grupos, em momentos distintos, e são esses os dados apurados: 20 Quadro 1 - Idade e escolaridade dos entrevistados: Idade/escolaridade Ensino fundamental Ensino médio Ensino superior De 11 a 14 anos 29 - - De 15 a 20 anos - 10 1 A idade dos entrevistados vai dos 11 aos 20 anos, mas a maioria (35 adolescentes) está na faixa dos 12 aos 16 anos, o que os aproxima no jeito de sentir. A escolaridade ficou dividida entre os que cursam o ensino médio (9), os que já completaram o ensino médio (2); um deles está cursando o ensino superior. A maior parte deles (29) está cursando o ensino fundamental com uma concentração maior entre a 5ª e 6ª séries. Vejo que os adolescentes que moram no Morro dos Macacos estão “defasados” em relação aos adolescentes do asfalto, pois, se considerarmos suas idades que estão niveladas, a série escolar daqueles ainda se concentra no ensino fundamental. Os adolescentes do asfalto, na faixa dos 11 aos 14 anos já se encontram cursando o ensino médio. Quadro 2 - Quais os três principais problemas que afetam a sociedade?1 classe/ problemas alegados Moradores do Moradores Morro dos Macacos do “asfalto” 1- Condutas pessoais negativas 3 9 12 2 - Lógicas sociais perversas 5 3 8 3 - Descaso do Estado 5 4 9 4- Eventos negativos dispersos 4 3 7 5 – Desprezo social, falta de pertencimento 3 - 3 6- Valores predatórios 3 1 Total 3 As indicações apresentadas são as mais recorrentes na fala dos entrevistados 21 O que é: 1- formas de responsabilização do indivíduo e de seu comportamento pouco cooperativo 2- padrões de sociabilidade e interação social motivados por violência, desrespeito 3- precarização da atenção e das funções que competem ao Estado 4- situações consideradas episódicas da vida social que tem conotações negativas 5- sentimento de não fazer parte, exclusão social 6- alegação de valores que enfraquecem o tecido social Tal categorização constitui-se uma estratégia de agrupar os diferentes tipos de problemas apresentados pelos jovens. Os exemplos mais indicativos de cada uma destas categorias são: a violência (27); corrupção (10); preconceito (6); racismo (5) e drogas (5). A seguir os hospitais, o baixo salário mínimo, a falta de educação para crianças e o racismo aparecem citados. Os adolescentes do morro apontaram problemas intimamente ligados a eles, tais como tiroteio, discriminação na rua por serem favelados e confundidos com bandido; falta de cursos para crianças do morro, pobreza e miséria. Nota-se que a violência é o principal problema para os adolescentes, independentemente da classe social. 22 Quadro 3- O que você acha da polícia? classe/ o que acha da polícia Moradores do Morro dos Moradores do Macacos “asfalto” Boa Total - 3 3 10 9 19 Normal 5 - 5 Necessária 2 1 3 Mais ou Menos 2 8 10 Ruim As respostas dadas apontam que grande parte é contra a polícia e muitos deles, principalmente os do Morro, usam palavras depreciativas para dizer o que pensam da corporação. Colocam os policiais como responsáveis pela matança no morro, “piores que os traficantes” e que tem como prioridade a guerra. Três apontam a polícia como necessária, embora inoperante e ineficaz. Este grupo se confunde com os que a consideram mais ou menos (10), mas como apareceram as duas categorias, foi respeitada a nomenclatura. Outro grupo (5) diz que a polícia é normal e que está fazendo o seu trabalho, embora esteja recebendo pouco e está mal equipada para trabalhar. Neste grupo, as respostas aparecem de forma dúbia, como sendo a polícia “boa e má”, “tenta fazer algo, mas não consegue” etc. Uma pequena minoria diz que a polícia é boa e um não respondeu. 23 Quadro 4- O que você acha do tráfico? classe/ o que acha do tráfico Moradores do Moradores Morro dos Macacos do “asfalto” Normal Ruim Muito ruim Não respondeu/não sabe explicar Forma encontrada pelos moradores para sobreviver/ recurso comercial Um dos grandes problemas que não deixa o Rio de Janeiro crescer Não devia existir Total 2 5 7 2 - 4 6 1 1 2 9 13 3 1 - 7 7 4 1 5 A maioria considera o tráfico ruim ou muito ruim e o classifica como algo horrível, que atrapalha a nossa cidade, estimula a violência e que deve ser erradicado. Vale registrar que um adolescente disse que o tráfico é “a forma encontrada pelos moradores da comunidade para sobreviver”. Embora tenha aparecido minoritariamente, essa fala costuma fazer parte do imaginário da classe média com relação aos moradores da favela. Quadro 5- QUAL O SEU MAIOR SONHO NA VIDA? Classe/ sonhos Ter casa própria/ sair do morro Moradores do Morro Moradores dos Macacos do “asfalto” 5 1 Total 6 Ter uma profissão 7 3 10 Ter sucesso profissional - 5 5 Ser feliz/ ter uma vida melhor 4 6 10 Estudar e se formar - 1 1 Ajudar e/ou constituir família 2 2 4 Respeitar as pessoas/aceitar as diferenças 1 1 2 Ser famoso(a)/ viajar - 2 2 A absoluta maioria das respostas aponta para sonhos individuais. Apenas dois adolescentes apontaram sonhos que incluem a coletividade. Um disse que seu maior sonho é “ver as pessoas viver a vida” e outro disse que quer “ver as pessoas tratando 24 com naturalidade as diferenças e não aceitando a violência, a pobreza e a destruição das matas”. Muitas respostas incluem a família e o sonho de ter uma casa melhor para alocá-las. Para os adolescentes do morro, ter uma casa própria significa sair do morro. Ficou bem demarcado que os sonhos dos adolescentes do asfalto passam pelo sucesso profissional, sonho que nenhum adolescente do morro apontou. Quadro 6- O QUE MAIS IMPORTA NA VIDA PARA VOCÊ? Classe/o que mais importa na vida Moradores do Moradores Total Morro dos Macacos do “asfalto” Deus/família/amigos 10 15 25 Estudo 3 - 3 Trabalho 2 - 2 Dignidade/simplicidade/liberdade/paz 1 6 7 Tirar a família do morro 3 - 3 A maioria dos adolescentes citou o trinômio “Deus, família e amigos” como a coisa mais importante. Deve-se pontuar que os adolescentes do “asfalto” têm uma prática religiosa ligada à Igreja Metodista, mas os adolescentes do morro não professam essa fé, mas declararam o referido trinômio como a coisa mais importante em suas vidas. Há que se observar também que as respostas dadas pelos adolescentes do asfalto são, em geral, subjetivas, diferente dos adolescentes do morro que inseriram o trabalho, estudo e a saída do morro como coisas mais importantes. Interessante registrar a fala de um adolescente do asfalto que disse que “a vida não é muito importante, mas para se aproveitar melhor é necessário pé no chão, determinação e simplicidade”. 25 Quadro 7- SE VOCÊ TIVESSE UM SUPER -PODER COMO USARIA E FARIA O QUE COM ELE? Classe/ super- poder empregado para: Moradores do Moradores Total Morro dos Macacos do “asfalto” Salvar vidas 3 - 3 Mudar o mundo ou o jeito de ser das pessoas 2 1 4 Acabar com a violência/tráfico 5 6 11 salvar a natureza - 2 2 Fazer o bem 8 6 14 Usar para favorecimento próprio e dos - 3 3 1 2 3 conhecidos Nada/ não sabe/ não respondeu A maioria colocou seus “super-poderes” a serviço da coletividade. Melhorariam o mundo, acabariam com a violência e o tráfico, tirariam as crianças das ruas... Alguns, em minoria, usariam para benefício próprio. Interessante observar que condicionam a ajuda ao próximo e o fazer o bem a ter super-poderes, o que pode significar que não vêem possibilidade de fazer o bem ou ajudar sendo quem são. Penso que a fragilidade que sentem e vivenciam em seus cotidianos de adolescentes, pode ser um indicativo dessa idéia de necessitar de super-poderes para ajudar o próximo. 26 Quadro 8- O QUE VOCÊ PENSA SOBRE A REDUÇÃO DA MENORIDADE PENAL? Posições sobre a redução da menoridade penal Adolescentes Adolescentes do morro A favor, porque o adolescente tem Total do asfalto - 6 6 - 3 3 - 3 3 consciência do que faz A favor, porque tem que pagar por seus atos Contra, não resolve/ precisa de outras saídas para o problema Útil/ solução para a criminalidade - 3 3 Não é a solução – tem que estudar e - 2 2 - 4 4 praticar esportes Não sabe/ não respondeu/ resposta e justificativa contraditórias Essa pergunta foi respondida somente pelos adolescentes do asfalto. Todos os adolescentes do Morro não souberam respondê-la. Nota-se que a maioria das respostas concorda com a redução da menoridade penal. E os argumentos usados para justificar a redução são os mesmos que a maioria da sociedade utiliza (já sabem o que fazem; se comete crime tem que pagar; sabem que não vão ficar presos etc). Observase também que há confusão de alguns adolescentes na compreensão do tema, pois as respostas dadas foram contraditórias. 27 Grupos focais Foram realizados cinco encontros entre os adolescentes do morro dos Macacos para que se apurasse mais de perto e de forma subjetiva, suas percepções e sentimentos a respeito da sua condição social e como se vêm diante da discriminação que sofrem em função dessa condição. Os encontros se deram durante as oficinas de Temáticas de Cidadania, ministradas às segundas–feiras junto aos adolescentes usuários do Projeto “Fala Sério!”. GRUPO FOCAL I – “A mãe de Alana” Material didático: recorte de matéria publicada no Jornal O Globo de 14/04/2007 Realizado em 18/4/07 com a presença de 18 adolescentes. Nos três primeiros meses de aula do projeto “Fala Sério!” a discussão sobre a violência se fez presente e necessária diante da realidade vivenciada pelos adolescentes de forma intrínseca e dolorosa para eles: o assassinato de Alana, uma adolescente de 13 anos, vizinha e colega de escola da maioria deles. Foi um assassinato com muita repercussão na mídia. Uma das matérias publicadas no Jornal O Globo, trazia uma reportagem com a mãe da Alana, que perguntada sobre seu sonho, respondeu ao repórter: “Moço, quem mora no morro não tem sonho”. A matéria de jornal, com a foto da mãe de Alana, foi utilizada como recurso didático para a discussão em grupo. A foto, colorida e em tamanho grande foi colocada no centro da roda e foi solicitado ao grupo que dissesse quais as “falas” que a foto trazia. Dor, desesperança, desespero, e tristeza foram os sentimentos identificados pelos adolescentes ao observarem a foto. Quando apresentados à frase dita pela mãe da Alana, foram estimulados a discutir sobre ela, se colocando e apresentando seus sonhos. Os adolescentes presentes, com exceção de uma que disse não ter sonhos, disseram que seu sonho era sair e tirar a família da favela. Quanto aos seus sonhos à longo prazo, apareceram os seguintes desejos: ser advogado, manicure, médica, recepcionista, policial, atriz (“mas sabe que não vai 28 conseguir”), veterinária, capitão da aeronáutica, fisioterapeuta, empresário, marinheira e jogador de futebol (4). Interpelados se achavam que podiam sonhar e correr atrás dos seus sonhos, se mostraram reticentes, como se de fato não acreditassem muito no seu direito de sonhar e na possibilidade de concretização deles. Vale pontuar que mesmo reticentes, alguns disseram que vão correr atrás dos seus sonhos e que têm direito de sonhar como qualquer pessoa do “asfalto”. Quando perguntados se conseguem se identificar com a família da Alana, disseram que sim e não. Sim, porque são da mesma favela e não porque fazem críticas corriqueiras à família, como se os dramas cotidianamente vividos não fossem os mesmos. Questionados sobre isso, disseram que são diferentes e se colocaram numa posição superior à da família como se o drama vivido fosse conseqüência de algum desvio por ela cometido. Comentaram que a mãe bebe e que não gosta de trabalhar. Ficou claro que praticaram um juízo moral com relação à mãe, embora solidários na dor, porque dizem que isso pode acontecer a qualquer hora com eles e que a polícia é que tem responsabilidade na morte da adolescente. Fica uma sensação de banalização da dor, pois a morte tem sido tão corriqueira que eles se mostram anestesiados diante da tragédia. GRUPO FOCAL II – “Moradores da Mangueira enfrentam a policia” Material didático: - foto publicada no Jornal O Globo, de 23/03/2007. - musica “É” de Gonzaguinha Realizado em 14/5/07 com a presença de 17 adolescentes Tratou de analisar a manifestação que aconteceu no morro da Mangueira, vizinho ao morro dos Macacos, quando os moradores fecharam as ruas próximas ao morro e enfrentaram a polícia que, segundo eles, assassinou um morador inocente, sem qualquer envolvimento no tráfico. A foto, colorida e de tamanho grande, foi colocada no centro da roda pra que todos pudessem analisar o movimento e os personagens nela envolvidos. A seguir a foto circulou entre os adolescentes para que eles examinassem mais de perto e dissessem quais as “falas” da foto. 29 Apareceram as mais diversas leituras. A maioria dos adolescentes não conseguiu captar o sentimento e a intenção proposta. Usaram adjetivos que não combinavam com a imagem. Apenas dois adolescentes foram precisos em suas falas: verbalizaram que o jovem que enfrenta a polícia o faz porque tem consciência do seu direito e porque a comunidade está com ele nesse movimento de protesto. Indagados se não podem fazer o mesmo, disseram que na comunidade deles tem muito “X9” e que não têm coragem de se expor porque podem ser mortos pelos traficantes. Disseram que a comunidade é muito desunida e que cada um só quer se dar bem e resolver o seu problema. Disseram desconhecer o que faz uma associação de moradores e que quem manda no morro é o tráfico. Pensam que o tráfico tem o dever de resolver as questões que aparecem na comunidade, inclusive as de família. Uma adolescente contou que procurou o comando porque seu padrasto batia nela e na irmã. Ele foi ameaçado de morte caso continuasse batendo nas enteadas. Segundo ela isso é bom, porque eles “impõem moral” e todos obedecem ao tráfico. Ao analisarem a letra da música, disseram que é correta e que concordam que ninguém pode fazer o outro de otário. Questionados se o tráfico não faz isso, disseram que é diferente, porque eles têm a força. E a força dos moradores? Pra eles é difícil raciocinar dessa maneira. Só uma adolescente disse que “se o povo se juntasse, poderia tirar o tráfico do morro e acabar com a violência dos policiais, como foi na novela” (na novela “vidas opostas” em cartaz na Rede Record, os moradores de uma favela fictícia expulsaram o tráfico do morro). Indagados sobre a novela, disseram amar porque é o que acontece na vida real e a maioria das coisas que passam lá, eles vivenciam. Ficou bem evidenciada a falta de prática dos adolescentes de se ver enquanto grupo ou coletividade que tem força e que pode reverter sua história. Trazem ainda uma concepção bem umbilical e orgânica de encarar os problemas coletivos. É a família e mais especificamente a mãe, que é objeto da preocupação deles, que precisam ser preservados e ter suas questões resolvidas, ainda que a coletividade fique em segundo plano. 30 GRUPO FOCAL III – “Uólace e João Vitor” “Uólace e João Vitor”, em Cidade dos Homens. Direção: Cesar Charlone, Kátia Lund, Paulo Lins, 2002 – Globo Filmes Realizado em 13/6/06 com a presença: 21 alunos. Todos assistiram ao filme com muita vontade. As meninas deram gritinhos de prazer ao reconhecer os atores, que são seus ídolos. Total identificação. O filme mostra a trajetória de dois adolescentes, um de comunidade carente (Uólace) e outro de classe média (João Vítor), mas ambos com desejos e problemas comuns, dada a conjuntura de violência. Durante a exibição um adolescente manifestou sua identificação com o personagem principal, quando o Uólace está sozinho em casa e reclama que a semana ainda está na metade e que a comida da casa acabou, que está sem dinheiro e sozinho, já que a mãe, doméstica, dorme no emprego e só retorna paras casa no sábado. O referido adolescente, na cena acima descrita diz que “esse aí sou eu!”. Interessante observar que a mãe do adolescente não trabalha fora, mas apresenta um quadro de transtorno mental que a deixa prostrada e sem desejo de fazer qualquer coisa para os filhos. Para o adolescente, independentemente da presença física da mãe, a carência e a falta de comida são as mesmas do personagem. Ao término do filme lhes foi perguntado quais as semelhanças e diferenças entre os dois personagens. A primeira diferença apontada por todos, a mais evidenciada e determinante nas relações sociais é que um é preto e o outro, branco. O preto mora na favela e o branco mora no asfalto. “Será que o branco não mora também na favela” (a vista de seu apartamento é só a favela)? Uma menina respondeu que ele vive o risco da bala perdida, mas mesmo assim é diferente de morar “lá dentro”. Quanto às semelhanças, disseram num primeiro momento que não tinha, mas chamados a refletir, descobriram que sim e perceberam que elas são maiores do que eles imaginavam: querem comer a mesma coisa (hambúrguer), desejam a mesma marca de tênis, vivenciam perdas (o amigo do João Vitor vai embora para outra cidade e o Uólace vive sem a mãe durante a semana), têm preconceitos com relação às diferenças, os pais de ambos são ausentes e não cumprem com seus deveres junto aos filhos e ambos são reféns do medo, da violência e da bala perdida. 31 Uma cena do filme que incomodou os adolescentes foi a que mostra os dois personagens numa loja de calçados para experimentar o tênis que era objeto de desejo de ambos e a vendedora da loja os trata de forma visivelmente diferente. João Vitor é bem tratado por ser branco e potencial comprador; na visão preconceituosa da vendedora que é negra; ela não hesita em entregar-lhe o par do tênis desejado, mesmo ele não tendo dinheiro para comprar. Já Uólace, mal consegue experimentar um pé, pois a vendedora parte do pressuposto que ele, favelado e preto não vai comprar o tênis e se lhe entregar o par nas mãos, corre o risco de ter o tênis roubado. Essa cena resgatou neles as diversas situações de discriminação vividas: uma adolescente contou que estava na rua com uma amiga “preta” (ela também é negra) e que uma garota uniformizada, “de escola rica” olhou para elas e atravessou a rua correndo, visivelmente assustada. Outra adolescente contou que estava com a prima, “que é preta“, e que uma velhinha olhou assustada para elas, agarrou a bolsa e apertou o passo pra não ser assaltada. Disse se sentir humilhada com isso, mas disse que isso aconteceu por causa da prima, porque se estivesse sozinha isso não teria acontecido. Vale registrar que a referida adolescente é negra, embora tenha um tom de pele mais claro, mas não se vê como tal. O que ficou visível nessa discussão é que os adolescentes têm profunda empatia com os atores do filme já que são “negros e favelados” como eles, o que denota um sentimento de identificação, muito positivo. Mas têm muita dificuldade em perceber que, como adolescentes, independentemente de classe e etnia, têm as mesmas angústias e sofrimentos, típicos da condição de adolescente. Ficou visível que a sua condição de vida os coloca sempre na posição de perdedores, o que dificulta a possibilidade de ver o outro de forma mais próxima e semelhante. Quando estimulados a perceber que mesmo em classe sociais diferentes, os personagens têm muito em comum, foi como se lhes tirasse um peso das costas e apareceu a sensação de proximidade, mesmo diante da presença ostensiva e inevitável da favela. Duas falas foram lapidares: uma adolescente que é “negra e favelada” disse que “tem medo de sair de casa e não voltar mais”. Esse sentimento é o mesmo que move a classe média branca. Por fim, outro adolescente, na mesma condição, disse que “a gente é pobre, mas é igual no sentimento”. 32 GRUPO FOCAL IV - “Meu Nome é João” Vídeo produzido pela Associação Beneficente São Martinho e IBASE em 1991. Realizado em 25/5/07, com 4 alunos presentes. Diante da presença de poucos alunos, vou referir-me a eles por suas iniciais. O interesse deles no vídeo foi muito grande. Assistiram e vibraram durante as partes mais emocionantes do filme. A expressão deles durante a exibição, era de total identidade. Torceram pelo personagem principal, como num jogo de futebol, mas quando perguntados se conseguiam se identificavam com ele, foram reticentes e só uma manifestou que tinha em comum a favela. A conversa foi bem intimista. De todos os encontros esta foi a mais profícua e rica. Identificaram assim os personagens: Clara: a cabeça do João (a consciência) Jura: do mal João: do bem, mas perto do mal Juiz/madame/jornalista/empresária/professor/policial: não verbalizaram que representavam a sociedade mas detectaram que “rejeitavam o João por ele ser pobre, não o reconheciam como pessoa e não deixavam o João entrar”. Perguntados se conseguiam se identificam com a estória, G disse que não. P disse que sim e apontou como comum entre ela e o João, a favela: “as pessoas da rua me olham de cara feia. Elas têm medo da gente. As velhinhas brancas escondem a bolsa junto ao corpo como se a gente fosse roubar elas”. R disse que isso dá tristeza porque ela não é bandida! C e G disseram que dá raiva porque o segurança do shopping sempre os segue quando estão por lá, achando que vão roubar coisas. R disse que vai lá, mostra logo o dinheiro para o segurança e diz a ele que não vai roubar nada. Perguntados se precisam mostrar o dinheiro e se eles têm o direito de andar livremente no shopping, P respondeu que não tem que mostrar nada porque ela não é bandida, mas contou que foi com a irmã às Lojas Americanas para comprar fralda pro nenê (sua irmã já é mãe aos 15 anos) e o segurança as seguiu e ela pegou o dinheiro e mostrou pra ele que ia comprar e não roubar nada. “Só assim eles param de seguir a gente”. 33 Questionados se achavam legal ter roupa de marca, todos disseram que queriam ter um tênis “irado” e que queriam comprar roupa do shopping e não na “Sai de Baixo” (loja popular em Vila Isabel). R sonhou alto: “ah, um dia vou ter um tênis da marca”. Já o G disse que nunca vai poder ter um. P chama a atenção de G: “não diga nunca, que uma hora você vai poder comprar. Eu nunca digo que não posso. Sei que vou ter um, um dia”. Ter documentos muda o quê? “Muda tudo porque só bandido não tem documento”. Essa foi uma fala unânime. P diz que o cunhado dela não sabe nem escrever o nome e por isso é bandido. Pergunto se é importante saber ler e escrever e se é por isso que o bandido em geral é analfabeto. Ficaram reticentes, mas C disse que sim e também pontuou que seu tio que é chefe do tráfico, mal assina o nome. E o “doutor que comete crime?”, perguntei. “Ah, é diferente, responderam todos. Eles não vão pra cadeia porque ‘são doutor’ e são brancos”. Sobre a família no crime, G disse que o pai era do Exército. Roubou armas de lá e fugiu para o morro. Virou bandido. Morreu assassinado pela polícia. Seu irmão mais velho é chefe do tráfico em outro morro da cidade. R conta que o tio morreu assassinado pelo tráfico, era bandido. O irmão é “dono de boca” e que sua irmã foi expulsa do morro por ter traído a confiança deles. C tem irmão e primo no tráfico, todos no morro dos Macacos. Disse que isso é bom e ruim porque as pessoas a respeitam, mas sabe que eles serão mortos pela polícia. P teve o pai assassinado na frente da irmã mais nova. Era do “movimento”. Perguntados se são pobres, G disse que é classe média. P e R se disseram pobres mas que são decentes e diferentes da maioria dos moradores da favela. C disse que não sabe o que é. Questionados sobre o futuro, disseram que é muito difícil ter uma vida legal, mas acham que a vida pode melhorar. Suas falas e desejos apontavam para um processo cotidiano e velado (nem tanto) de exclusão diante de sua condição de favelados. Tanto que a parte mais dolorosa para eles foi admitir que são perseguidos no shopping porque têm cara de pobre. 34 É como se dissessem que as roupas que usam e a cor de suas peles denotassem sua condição de favelados. O que chamou atenção foi o fato de verbalizarem sua angústia enquanto favelados, mas não aceitam ser rotulados como pobres já que se acham diferentes da maioria dos moradores de sua comunidade. Para eles, muitos moradores são bandidos mesmo sem fazer parte do tráfico, pois se comportam muito mal e querem sempre se dar bem. GRUPO FOCAL V – A história de L. Realizado em 25/06/07 Presentes: 10 adolescentes Esse tema chegou por iniciativa de um adolescente do grupo que trouxe sua história espontaneamente. Creio que o clima de confiança e pertencimento foi determinante para dar conta de expor sua história. L. é um menino de 12 anos. Freqüenta os projetos ligados à Igreja Metodista desde os 7 anos. Hoje está no “Fala Sério!”. Inúmeras vezes, chegou acompanhado de seu pai, sentado na garupa da bicicleta. Outras tantas vezes seu pai foi buscá-lo no fim das aulas. Sempre foi brincalhão e adora jogar bola. Seu sonho é ser jogador de futebol. Desde que nasceu, mora no Morro dos Macacos com sua mãe e um irmão por parte de mãe. Seus outros meio irmãos são bem mais velhos que ele: um deles é chefe do tráfico em outro morro da cidade e uma irmã mora com um traficante na comunidade em que residem. Sua mãe, de uns tempos pra cá, começou a apresentar sintomas de transtorno mental, mas o marido cuidava dela, o que minorava os efeitos da doença sobre L. e o irmão. No início de fevereiro deste ano, o pai de L., com 36 anos, faleceu em função de um coágulo no cérebro. Desde então L. não é mais o mesmo. Vive carrancudo, sujo e amassado já nas primeiras horas do dia. Está sempre de mau humor. Não manifesta qualquer interesse 35 em qualquer atividade proposta, exceto o futebol e o teatro, onde demonstra ter grande potencial. Sua mãe piorou sensivelmente desde a morte do marido. Se antes já demonstrava desinteresse pela vida, hoje se auto-mutila, tem surtos constantes, não sai da cama, não cuida dos filhos e só se levanta ao fim da tarde para ir à Igreja. Sua irmã e vizinha é quem socorre os dois sobrinhos. L. costuma ir ao Shopping para passear e ver as novidades, como ele mesmo diz. Numa dessas idas, estava com seu irmão brincando num aparelho eletrônico no corredor do shopping. Um segurança aproximou-se deles e perguntou como tinham adquirido as fichas para o brinquedo. Eles responderam que tinham achado. O segurança mandou que eles saíssem do brinquedo e do shopping. Seu irmão saiu imediatamente, mas L. não aceitou e disse ao segurança que não sairia porque não é bandido e não estava fazendo nada de mais. Correu e se escondeu numa loja de brinquedos e ali ficou “viajando num vídeo game”, segundo disse. De repente percebeu que um vendedor da loja o observava de forma estranha, como se ele estivesse em atitude suspeita. O vendedor falava ao telefone. Minutos após, o segurança que o havia expulsado do shopping, apareceu na loja e veio em sua direção. L. conseguiu se desvencilhar de todos e começou a correr pelo shopping sendo seguido por um grupo de seguranças. Escondeu-se por algum tempo no banheiro. Para sair do shopping sem ser pego, segurou a mão de uma “dona” que não conhecia e explicou a ela o que estava acontecendo. Segundo ele, a cara do segurança era de ódio e só não fez nada com ele, pois pensou que a senhora fosse sua mãe. Dias depois, L. voltou ao shopping. O mesmo segurança o abordou logo na entrada e o proibiu de entrar. L. esbravejou e disse ao segurança que não era bandido e que ia entrar, sim. O segurança acionou pelo rádio um colega que apareceu imediatamente e ambos arrastaram L. para fora do shopping. L. contou isso com muita raiva. Disse que tem medo dos seguranças, pois eles são muito grandes mas que se pudesse matava os dois. 36 L. tem faltado ao projeto. Seu irmão, que também é aluno, diz que ele tem ficado na rua até as três horas da madrugada, por isso não dá conta de acordar cedo para ir às oficinas pela manhã. Seu irmão também trouxe a notícia de que L. tem brincado com arma de fogo junto aos garotos do “movimento”. O que será de L.? Penso que ao trazer sua história, L. demonstrou estar apreendendo as discussões feitas na oficina, já que sua história é paradigmática; L. se sentiu discriminado, mal tratado e desrespeitado no seu direito de ir e vir, no único lugar onde podia transitar com segurança, apesar dos olhares vigilantes sobre ele. Sua história mobilizou os demais adolescentes, pois entendem sua mudança com a morte do pai e são solidários com a doença da mãe; quanto à discriminação que sofreu no shopping, vibraram e torceram por L. quando contava sua história. Interessante observar que se portaram como ouvintes de uma história de mocinho e bandido, onde L. era o mocinho e o segurança, o bandido. Foi assim a discussão: Ser pobre é crime? Eles unanimemente responderam que não e uma adolescente disse que pobre é uma classe social. Por que então o segurança do shopping olha vocês de cara feia? “Porque ele acha que a gente é menino de rua, porque ele acha que a gente é pobre e porque ele acha que a gente vai roubar alguma coisa”. Outra adolescente diz que para ir ao shopping, “tem que ir arrumado e se a gente aparecer lá de chinelo, eles pensam que está entrando lá pra roubar, mas como a gente vai roubar, cheio de segurança, cheio de câmera, se sabe que vai ser preso?”. Pedi a eles que refletissem sobre a frase dita, “mas como a gente vai roubar...” Se tivessem chance, pegariam alguma coisa em alguma loja? A maioria disse que não, embora alguns ficaram reticentes e se entreolharam; L. disse que “dá vontade só pra sacanear os seguranças que são pretos como ele mas acham que são donos de tudo”. Refletimos sobre como assumimos esse papel que colocam sobre nós. “Posso ir ao shopping sem dinheiro”? Todos, em coro, responderam que não! Levados a refletir, disseram que sim, podem ir sem dinheiro porque o shopping é um lugar aberto e público. E lá não é só pra rico! 37 Uma adolescente disse que no morro tem muita gente que faz coisa que bandido faz. Perguntada como é isso, ela disse que pra ser bandido não precisa segurar uma pistola, mas que pode roubar, cheirar, ter vícios, matar pessoas... A turma reagiu. Uma adolescente disse que o pai fuma maconha, mas não é bandido; que nem todo “cheirador” é bandido. Essa fala causou constrangimento entre eles diante da franqueza da adolescente ao defender seu pai que é usuário de droga; tentaram minimizar o peso da fala, mas foram questionados se essa não é uma visão preconceituosa (achar que todo usuário de droga é bandido). Uma adolescente disse que “é assim que a gente vê e é assim que pensam da gente”. “Quem é que diz que quem mora no morro é bandido?” Ao serem perguntados, responderam: “a televisão! Quem aparece na televisão é rico. O morro só aparece quando tem tiroteio. Só mostram a desgraça do morro e preto só aparece na TV como bandido”. Pergunto a eles quem é que pode fazer alguma coisa para essa situação mudar? Todos responderam que pra mudar, depende de todo o mundo. Senti claramente a falta de convicção na resposta dada. É como se, já impregnados do estigma da pobreza, não soubessem o que fazer nem se vissem sujeitos para melhorar ou mudar essa condição, mesmo dizendo que a mudança depende de todos. Essa situação me remeteu à discussão sobre os moradores da Mangueira que enfrentaram a polícia para protestar, quando os adolescentes verbalizaram sua dificuldade com a comunidade em que vivem: a desunião dos moradores e a apatia que denotam ter diante da realidade em que vivem. 38 5. CONCLUSÃO Tanto os referenciais teóricos apontados, que são contundentes na análise histórica e na afirmação do processo estrutural de criminalização da pobreza na sociedade brasileira, quanto os dados apurados na pesquisa direta e nos grupos focais, apontam para uma prática solidificada de exclusão e de penalização dos jovens, que alijados do mercado formal de trabalho são periferizados por sua condição de “pobres e pretos” e por serem moradores de comunidades dominadas pelo tráfico de drogas. O que se pode apreender de forma inequívoca nessa lógica, é que numa sociedade que não cria aspectos tendencialmente igualitários, gera-se um processo de autodestruição social, onde os valores não são universalizados; as igualdades passam a ser desiguais e as diferenças geram desigualdade entre as diversas camadas da população. Tal afirmação se confirma diante da visão da classe média e das elites em exercer uma prática excludente e de subalternidade sobre qualquer setor da sociedade que ameace ou coloque em risco sua pseudo-estabilidade, como se as relações estabelecidas entre as classes sociais fossem estanques: o pobre é bandido; o favelado é traficante; os militantes do movimento dos sem-terra e os do sem-teto são criminosos e há que afastá-los do convívio social para que haja paz. É como se o clima de medo e insegurança gerados pelas (in)diferenças, propiciasse uma prática repressiva e legitimasse uma política de penalização dos segmentos pobres, que têm uma prática de sobrevivência que amedronta e desestabiliza as elites. E assim o é na prática! As falas trazidas pelos adolescentes pesquisados que se encontram em situação de risco social, são claras para percebermos o quanto trazem em si o estigma da pobreza; o quanto se acham diferentes e humilhados por não poderem reproduzir a lógica do capital e as exigências e padrões da burguesia, e se sentem excluídos em função de sua condição e de sua cor. É uma lógica perversa que criminaliza a classe social que não tem acesso ao mercado formal de trabalho, portanto não gera lucro, e não propicia ao capital a maisvalia. 39 É urgente rever essa lógica. Os adolescentes precisam ser respeitados como cidadãos, precisam ter oportunidades, precisam ter visibilidade e sentimento de pertença. Precisam ter acesso ao mercado formal de trabalho (ainda que como aprendizes), para que se sintam incluídos e sujeitos na construção de suas histórias, já que a adolescência, afinal, é um momento de construção de identidade, de valores, de ideais e de utopias. Ë necessário construir, então, uma política de cidadania que privilegie os adolescentes, que lhes propicie garantias e direitos. Permitir que eles se desenvolvam sem o estigma da pobreza como impeditivo de sua cidadania. Para isto é necessário que haja vontade política dos poderes públicos e pressão dos setores organizados da sociedade para mudar essa lógica de exclusão. Esses adolescentes precisam ser vistos com outros olhos. Se eles tiverem um tratamento digno, que proporcione a reflexão, a compreensão de seu papel diante do mundo e de sua história, poderão se reorganizar num projeto de vida diferente, que estimule a inclusão e a construção da cidadania. Há que se desconstruir a lógica equivocada de que o adolescente pobre é ameaça para a sociedade. Ele vem sendo alijado por sua situação de pobreza de forma reiterada e sistemática: são assassinados cada vez mais pelo poder público que deveria protegê-los através de políticas públicas. Temos visto, não uma política de inclusão, mas de extermínio: a questão social se reduziu à caso de polícia. É necessário que todos os setores da sociedade envolvidos com os adolescentes se vejam como educadores e sujeitos no processo de mudança e se disponibilizem a criar pontes e redes de inclusão e de acolhimento para o adolescente. Essa fala não terá qualquer ressonância se de fato não nos enxergarmos como responsáveis por esse processo. Na verdade, temos tido, enquanto profissionais, uma postura acomodada e distante da necessidade desses adolescentes e, muitas vezes, uma prática institucionalizada que reforça a exclusão e ajuda a aumentar o estigma. Não podemos negar que o Estatuto da Criança e do Adolescente pode ser um instrumento fundamental nesse processo. Desde a sua promulgação em 1990, ele trouxe para o debate a discussão de temas antes estrategicamente esquecidos pela elite branca, adulta e masculina: criança e adolescente têm direitos! Trouxe ainda em seu bojo medidas protetivas para as crianças e adolescentes que, se implementadas, vão dar sustentação às ações sócio-educativas necessárias para, pelo menos, minimizar o drama dos adolescentes pobres e sem acesso. 40 Não posso deixar de dizer que embora seduzida por esse tema, ele me é muito doloroso e me causa um profundo desalento, pois vejo cotidianamente, ao trabalhar com os adolescentes pesquisados, como têm em seu desenvolvimento um comprometimento, inclusive cognitivo por causa da estigmatização, da exclusão e da ausência de políticas que os contemplem! Embora digam que são iguais, que precisam ser respeitados, eles sabem (e é um saber que passa pela carne e pelas entranhas ideologizadas) que não valem nada, que não são respeitados, e que metem medo na população que mora no asfalto. Suas falas, algumas subliminares, e suas práticas, apontam para uma ausência de pertencimento, para uma vida tão sem sentido e sem oportunidades que a favela, de fato, torna-se um gueto, um mundo a parte, e o pior, um lugar impenetrável para a sociedade, e é ali onde o adolescente estigmatizado pela pobreza se sente sujeito... Sem a pretensão de apresentar algo conclusivo sobre o tema, penso que é preciso desmontar a falsa política de proteção existente e construir uma política de inclusão onde caia por terra o hermetismo do poder judiciário e a tendência lombrosiana de aplicar medidas sócio-educativas de internação. Penso que o Serviço Social pode ter um papel fundamental nesse processo de pressão e transformação que a sociedade precisa passar e que os seus profissionais precisam ter mais competência política para intervir e influenciar nas instâncias em que atuam, bem como para denunciar as práticas abusivas frequentemente cometidas contra os adolescentes. É preciso ainda que as instituições e organizações que trabalham com esses adolescentes acreditem que ainda é possível transformar a realidade através da reflexão e de uma prática coletiva voltada para a cidadania. É preciso ter coragem de tocar as trombetas para que os muros caiam e ter força para novas e instigantes construções aí, sim, inclusivas. Penso, por fim, que uma frase lida num muro pichado pelo movimento anarquista, sintetiza toda essa discussão: “se não há justiça para os pobres, então que não haja paz para os ricos”. Não temos outra saída senão a inclusão e a construção da justiça. 41 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: ADORNO, Sérgio et alli. Criança; a lei e a cidadania. RJ, UFRJ, 1991. BATISTA, Vera Malaguti in Difíceis Ganhos Fáceis – Droga e juventude pobre no Rio de Janeiro; Freitas Bastos Editora, 1998. DOWDNEY, Luck in Crianças do tráfico, RJ, Editora 7 Letras, 2003 FRASSETO, Flávio. Apuração de ato infracional e execução de medida sócio educativa: Considerações sobre a defesa técnica de adolescentes. RJ: ANCED, 2005. FREIXO, Marcelo in Imprensa reforça lógica da Criminalização. Entrevista ao Boletim do Núcleo Piratininga de Comunicação, www.piratininga.org.br, Rio de Janeiro, 2006. HIMMELFARB, Gertrude – La Idea de la pobreza - Inglaterra a princípios de la época industrial. Editora Fondo de Cultura Econômica, México, 1988. MIRANDA, Ana Paula Mendes de; MELLO, Kátia Sento Sé & DIRK, Renato. Dossiê Criança e Adolescente. Arquivo disponível em www.isp.rj.gov.br, Rio de Janeiro: ISP, 2007. NICODEMOS, Carlos et alli. Projeto Atitude Legal. Defesa, garantia e promoção de direitos humanos dos adolescentes autores de ato infracional – RJ, Revista Atitude Legal, 2005. RIBEIRO, Renato Janine. “A sociedade Contra o Social ou a Sociedade privatizada”, in A sociedade contra o social - O alto custo da vida pública no Brasil. SP: Cia. das Letras, 2001. 42 RIZZINI, Irma. “O Elogio do Científico – a Construção do “Menor” na prática jurídica”, in A criança no Brasil hoje: desafio para o terceiro milênio. RJ, Editora Universitária Santa Úrsula, 1993. SILVA, Maria Therezinha Nóbrega da, et alli No mundo da rua – Alternativas à aplicação de medidas sócio-educativas. RJ, ABSM, 2001. SOARES, Luiz Eduardo e GUINDANI, Miriam in A Violência do Estado e da Sociedade no Brasil Contemporâneo, Revista Nova Sociedade, no. 208, 2007. TEIXEIRA, Patrícia Calmon Rangel et alli. Estatuto da Criança e do Adolescente. Ministério Público do Espírito Santo, CAIJ, 2002. VALLADARES, Lícia “Cem anos pensando a pobreza (urbana) no Brasil” in Corporativismo e Desigualdade - A construção do espaço público no Brasil. RJ: Rio Fundo Editora, IUPERJ, 2000. ZAFFARONI, Eugenio Raúl in A esquerda tem medo, não tem política de segurança pública in Revista Brasileira de Segurança Pública, edição 1, 2007. ZALUAR, Alba. “Crime, medo e política” in Um século de favela. RJ: FGV, 1998. ZALUAR, Alba. A Máquina e a Revolta. SP: Ed. Brasiliense, 2000. Filmes: “Uólace e João Vitor”, em Cidade dos Homens. Direção: Cesar Charlone, Kátia Lund, Paulo Lins, 2002. “Meu nome é João”. São Martinho/IBASE, 1991. 43 7.GLOSSÁRIO: SOCIAL – remete a uma política que procura minimizar a miséria. Diz respeito ao carente. É aquilo que não pode tornar-se sociedade ( fala de Renato Janine Ribeiro). SOCIEDADE - designa o conjunto dos que detém o poder econômico. Diz respeito ao eficiente, ao que gera lucro (idem). MENOR- expressão utilizada com o cunho moral para designar a criança/adolescente que comete ato infracional, tendo como sinônimos, “vadio”, “vicioso”, “órfão”, “criminoso”(Irma Rizzini). MENORIZAÇÃO - prática repressiva com relação ao adolescente, dando um caráter de pena no tratamento dado ao menor que comete ato infracional (Sérgio Adorno). CRIANÇA - é detentora de direitos garantidos em lei e tem em torno de si uma rede de proteção integral. Mas no mundo do tráfico, é aquela que ainda não está preparada para manusear uma arma, que ainda não tem mentalidade do crime. A idade não é determinante nesse caso, e sim sua performance para trabalhar como “soldado” do tráfico (Luke Dowdney). FAVELA – sinônimo de tráfico junto à mídia (idem). TRÁFICO - Patrão que dá oportunidade de trabalho a todos os adolescentes que o mercado formal lhes nega. Local de trabalho acessível e assalariado para os adolescentes (ibidem). POBREZA – construção ideológica que gera estigmatização dos pobres criando uma barreira que separa as classes sociais. Os pobres vivem o avesso da civilização: seu mundo é impenetrável por ser perigoso (Alba Zaluar). 44 MEDO – construído pela mídia. Com a organização transacional do crime e com o aumento da violência, gerou-se a cultura do medo em todas as classes sociais afetando suas inter-relações (idem) PERIFERIZAÇÃO – segregação espacial da classe trabalhadora para as regiões afastadas do centro urbano, com precarização dos serviços urbanos (Lícia Valladares). MORADOR DE PERIFERIA – o favelado. O novo excluído pelo capitalismo brasileiro (idem). ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente. Conjunto de medidas legais protetivas para as crianças e adolescentes. CRIMINALIZAÇÃO – processo histórico de preconceito contra adolescentes, que por serem pobres são, naturalmente, vistos como criminosos ou potencialmente criminosos. 45 8. ANEXOS: Anexo 1: Roteiro da Pesquisa Anexo 2: Matéria do Jornal o Globo utilizada no Grupo Focal I Anexo 3: Foto publicada no Jornal o Globo utilizada no Grupo Focal II Anexo 4: Artigo de minha autoria sobre a “mãe de Alana” Anexo 5: Projeto “Fala Sério!” 46