Medicamentos e Saúde Pública: copiar e inovar, é só começar
Autoria: Vera Maria da Motta Vieira, Pierre Ohayon, José Celestino Barros
Resumo
O artigo tem como objetivo discutir a capacidade de copiar e inovar como pressupostos para se
obter níveis crescentes de produção interna, garantindo o acesso da população aos medicamentos
de que necessita. Apresentam-se a utilização do poder de compra do governo como estímulo e
fortalecimento às empresas privadas, a produção pública de medicamentos e o desenvolvimento
de competências para inovar como alternativas para a resolução dessas questões. Em decorrência
da utilização dos licenciamentos compulsórios como política de promoção do acesso a
medicamentos pelo atual governo e através do estudo de caso de Farmanguinhos, o Instituto
Tecnológico em Fármacos, laboratório público produtor pertencente à Fundação Oswaldo
Cruz/Ministério da Saúde do Brasil enfatiza-se a importância do aprendizado tecnológico na
produção de anti-retrovirais (medicamentos para combate a AIDS), o que levou à redução dos
custos nas aquisições públicas, assim como a obtenção de poder de barganha em negociações
com fornecedores. Em conclusão, ressalta-se a necessidade de se investir em competências para
inovar como meio de promover a auto-sustentação, a competitividade e minimizar os efeitos
perversos do gap tecnológico no suprimento interno de insumos e no atendimento das demandas
de medicamentos para a promoção da saúde pública.
1. Introdução
O setor industrial farmacêutico é altamente estratégico para a saúde e o bem estar da população
de qualquer país, haja vista ser o medicamento ainda o principal meio de combater e curar as
doenças. Medicamentos são instrumentos imprescindíveis à assistência eficiente e segura à saúde;
portanto, instrumentos de inclusão social e soberania nacional (BARREIRO e FRAGA, 2005).
O aumento da expectativa de vida, proporcionado pelos novos medicamentos e tratamentos vem
causando impactos incomensuráveis, tanto no plano social quanto econômico das nações. A
indústria farmacêutica tem papel ímpar neste processo, curando, minimizando a dor, prevenindo
doenças e criando medicamentos inovadores (TAKAHASHI, 2005). Poucos setores influenciam
tanto os destinos da humanidade com suas descobertas e invenções (ZAGAMÉ, 2005).
Vários são os fatores, contudo, que contribuem para que a maior parte da população seja excluída
dos avanços terapêuticos através dos medicamentos: o alto preço praticado pelas transnacionais
no que se refere à comercialização de medicamentos patenteados; a ausência de medicamentos
para as chamadas doenças negligenciadas que acometem a população dos países pobres e em
desenvolvimento, para as quais a indústria farmacêutica não tem interesse comercial em
pesquisar e desenvolver, e o gap tecnológico existente entre os países inovadores e seus
seguidores, o que os impossibilita de produzir os medicamentos demandados por seus quadros
nosológico e epidemiológico específicos. Este fato configura uma “falha” de mercado (LALL,
2002) que deve ser reparada através da intervenção governamental, ou seja, através das políticas
públicas.
Nos países pobres e em desenvolvimento, onde há grande dependência externa de importação de
insumos e produtos farmacêuticos acabados, dada a fraca produção interna ou até mesmo sua
inexistência, essas políticas são complexas e difíceis de serem implementadas. A promoção do
acesso aos medicamentos à população se assenta no desenvolvimento produtivo, juntamente com
a definição de medidas de estímulo à pesquisa e à inovação, o aperfeiçoamento da regulação
sanitária e dos mecanismos de propriedade intelectual, (MORTELLA, 2006) dentre outras
questões de cunho econômico, tais como as políticas fiscal, tributária e cambial, que trazem
repercussão direta na competitividade empresarial.
Assim, para que o Governo Brasileiro possa exercer uma de suas principais responsabilidades
constitucionais - a de garantir o atendimento às necessidades básicas de saúde de sua população deve promover não só políticas de universalização do acesso a bens e serviços de saúde, na busca
de maior equidade social, como também fomentar a produção interna e a inovação tecnológica
em saúde, especialmente em fármacos e medicamentos.
A saúde pública depende da geração de novos medicamentos para combater novas doenças,
assim como para erradicar aquelas que ainda perduram. Em um país como o Brasil, em que 60%
de sua população estão excluídos do mercado, porque não têm poder aquisitivo para obter o
medicamento na farmácia, é dever do Estado promover os meios para o acesso desta parcela da
população aos medicamentos de que necessita.
Ampliar o acesso aos medicamentos requer necessariamente investimentos em pesquisa e
inovação, para que seja possível desenvolver tecnologias de produção, em atendimento à
demanda interna. Passa também pela criação de medicamentos mais eficazes no combate às
doenças do quadro sanitário nacional.
2. Inovações em Medicamentos
A busca por inovações é um dos principais elementos da concorrência no setor farmacêutico
(HASENCLEVER, 2004), sendo que a competitividade das companhias depende do aporte
contínuo de novos fármacos (HORROBIN, 2000). O medicamento inovador gera lucros
extraordinários para a empresa, sendo percebida uma relação direta entre a ordem de lançamento
de um medicamento e a quantidade vendida deste (COHEN, 2006; VIEIRA e FONSECA, 2004).
Poucos segmentos industriais dependem tão fundamentalmente da P&D para a própria
sobrevivência quanto o farmacêutico e, de fato, a descoberta de novas entidades químicas (NEQs)
candidatas a novos fármacos compreende uma cadeia complexa que necessita ser muito bem
articulada (BARREIRO e FRAGA, 2005) para o produto inovador chegar ao mercado.
O desenvolvimento de fármacos e medicamentos inovadores é impulsionado pela P&D, que por
sua vez depende de investimentos vultosos. Estima-se que o capital necessário para desenvolver
uma nova droga, incluindo os estudos após receber aprovação de agências reguladoras alcance
U$D 897 milhões (Von BRAUN e PUGATCH, 2005). Estas altas cifras estão relacionadas
principalmente à quantidade e qualidade dos ensaios toxicológicos e clínicos necessários para ter
o uso do medicamento aprovado pelos órgãos governamentais; e também pelos altos
investimentos necessários ao lançamento do novo produto.
A indústria farmacêutica é uma indústria intensiva em ciência, considerada de alta tecnologia e só
se viabiliza em larga escala; portanto só se mantém ganhando o mercado internacional
(BARTLETT e GHOSHAL, 2000).
2
As empresas brasileiras atuam no segmento dos similares e genéricos e ainda não alcançaram o
estágio tecnológico necessário para atuar no mercado global. Para nossas empresas saírem do
nicho do mercado de genéricos (cópias) só seria possível investindo em P&D, tornando-se
inovadoras. Essa condição permitiria ao País agregar valor aos produtos exportados, além de
gerar conhecimentos e riquezas para o crescimento econômico e social, permitindo à população
ter maior acesso aos medicamentos, ou seja, melhores condições de vida.
O Brasil já detém competências para inovar em todas as etapas da P&D farmacêutica
(FRENKEL, 2002; VIEIRA et al., 2005), mas falta-lhe capacidade de investimento. O mercado
farmacêutico brasileiro está estimado em U$D 11 bilhões, com crescimento anual de 12%.
Estima-se que atinja U$D 14,6 bilhões em 2010 (DATAMONITOR, 2005 apud RICHÉ, 2006).
Embora seja grande em termos de faturamento anual, é pequeno para as grandes corporações,
pois representa apenas em torno de 5% do mercado global. Para as empresas nacionais, porém,
representa um grande mercado e um porto seguro para seus modestos investimentos.
As empresas nacionais não possuem capacidade de investimento para competir com o forte
oligopólio internacional existente no setor. Desta forma, cada vez mais o mercado nacional é
dominado pelas transnacionais. Cada vez mais, o capital internacional se estabelece, o que não
necessariamente traz repercussões positivas para a economia e a sociedade. Cada vez mais,
nossas empresas se vêem segregadas no segmento dos genéricos (cópias) sem chance de inserção
no mercado global.
Em 1998, as vinte maiores empresas farmacêuticas respondiam por 63% do mercado nacional,
com sua líder (Novartis) dominando 6,5% deste mercado (FIUSA e LISBOA, 2003). Atualmente,
a maior empresa nacional é a Aché, com faturamento na ordem R$ 1,8 bilhões (FUZO, 2007).
Esta empresa investe 3,4% do seu faturamento, detendo 90 patentes em seu portfólio
(BRANDÃO et al., 2006, p. 37). O esforço de investir em pesquisa e desenvolvimento, embora
pequeno, resultou no estabelecimento de parcerias com universidades nacionais e pesquisadores
de renome internacional, tendo colocado no mercado, em 2005, seu primeiro medicamento
inovador, com P&D inteiramente realizados no País: o Acheflan - um antiinflamatório à base de
plantas, indicado para o tratamento de tendinites crônicas e dores musculares.
Apesar de o Governo promover políticas de incentivo a fusões e aquisições entre empresas
nacionais, oferecendo-lhes financiamentos a preços subsidiados (PROFARMA/ BNDES;
INOVAR / FINEP) para fortalecer-lhes o porte e, em conseqüência, dotar-lhes de maior
competitividade, ainda é muito incipiente o investimento em pesquisa e desenvolvimento nas
empresas, visto que cerca de 80% dos pesquisadores brasileiros trabalham em instituições
públicas de pesquisa, ao contrário dos países desenvolvidos, nos quais a maioria destes se
encontra no setor produtivo. Além disso, a PINTEC – Pesquisa Industrial de Inovação
Tecnológica de 2003 (IBGE, 2003) registrou uma queda no número de empresas brasileiras que
fazem P&D de forma contínua, em relação ao apurado na PINTEC de 2000, demonstrando que
somente incentivos governamentais não são suficientes para levar as empresas a inovar.
Por outro lado, políticas genéricas de cunho econômico, como o rebaixamento do valor das
alíquotas de importação, que favoreceram as transações comerciais internacionais de um modo
geral, causam sérios transtornos em um setor como o farmacêutico, que tem toda uma dinâmica
3
própria e problemas estruturais específicos. Essas medidas vêm trazendo efeitos nefastos sobre o
setor produtivo farmacêutico nacional.
O Brasil vem apresentando um encolhimento da industria de fármacos, levando a um aumento
das importações de intermediários, e até medicamentos acabados, trazendo um total
desbalanceamento nas importações/exportações (Balança Comercial). Nos últimos anos as
importações de fármacos subiram de U$D 300 milhões para cerca de U$D 1 bilhão (MDIC,
2004). A conseqüência dessa política é a alta dependência dos insumos para a produção interna
de medicamentos e a crescente desnacionalização do setor farmoquímico, embora para alguns
críticos esta seria apenas uma estratégia para geração de maior competitividade interna. O fato é
que, sendo desnacionalização ou não, havia em torno de quarenta empresas farmoquímicas
nacionais na década de 80; na década passada, ficaram somente doze; e, atualmente, subsistem de
seis a oito empresas farmoquímicas de capital 100% nacional (PINHEIRO, 2006). Constata-se,
portanto, que essa indústria vem dramaticamente declinando no Brasil, levando a uma
dependência crescente das importações e ao risco de aumentar cada vez mais os preços dos
produtos internamente. A abertura comercial não promoveu maior competição no setor nem
aumentou o acesso da população aos medicamentos. Ao contrário, se houve ganhos foram
apropriados pelas próprias empresas, seja através dos preços de transferência, na importação de
fármacos, seja devido ao aumento do preço dos medicamentos no mercado interno (maior
faturamento). Podemos imaginar o que acontecerá com o preço dos medicamentos no mercado
nacional e com os Programas de Saúde Pública de Assistência Farmacêutica quando chegarmos a
importar a totalidade dos insumos para a produção interna, a se manter esta tendência de aumento
das importações de fármacos.
3. Patente como Restrição ao Acesso a Medicamentos de Última Geração
O monopólio da patente repercute no acesso por parte da população carente aos medicamentos
inovadores, já que cinqüenta milhões de brasileiros estão fora do mercado regular de
medicamentos devido a seu baixo nível de renda, dependendo exclusivamente dos medicamentos
dispensados pelo Sistema Único de Saúde – SUS (OLIVEIRA, 2005). Por meio da patente, a
empresa inovadora detém o direito garantido pelo Estado de ser o fornecedor monopolista de
determinado insumo ou produto, durante certo intervalo de tempo (ÁVILA, 2006), o que
proporciona a remuneração dos investimentos realizados em P&D e sem o qual não haveria
incentivo à inovação. As empresas podem então definir os preços e suas margens de lucro para
seus medicamentos patenteados e geralmente o fazem colocando esses preços nas alturas.
O argumento para preços em patamares tão elevados é o de que é necessário remunerar os
investimentos em P&D para haver incentivo à invenção de novos medicamentos. Este argumento
é sempre invocado pelas empresas quando o alto preço dos medicamentos patenteados é
criticado. Sabe-se, porém, que os maiores investimentos não estão apenas na P&D, mas
sobretudo, no lançamento dos novos produtos, que chega a alcançar 30% do faturamento anual
das empresas (PhRMA, 2006). Essa prática no plano interno dos países pobres e em
desenvolvimento é fator impeditivo da população de baixa renda ter acesso a medicamentos de
última geração.
Frente às limitações naturais de recursos para efetuar as aquisições necessárias de medicamentos,
os Governos necessitam estabelecer políticas de controle de preços e negociação constante com
4
as grandes empresas. A Constituição Brasileira estabelece no parágrafo 4°, artigo 173 que: “a lei
reprimirá o abuso do poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da
concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros” (BRASIL, Constituição Federal, 1988).
Dessa forma, o Governo Brasileiro tem possibilidade de atuar na implantação de uma política de
genéricos, na intervenção dos preços e benefícios desse setor, dentre outras medidas que venham
a contribuir na redução das falhas de mercado (BRASIL, Ministério da Saúde, 2003, p. 6).
4. Patente como Restrição ao Acesso a Tecnologias de Última Geração
O monopólio da empresa detentora da patente se estende também à difusão da tecnologia nela
contida, impedindo a geração imediata de efeitos sociais positivos, pela restrição de acesso por
parte dos países seguidores aos processos tecnológicos geradores dos novos produtos. A patente
compreende uma descrição detalhada da invenção, que permite aos especialistas no assunto a
reproduzi-la, destacando diferenças existentes entre a tecnologia anterior e o avanço por ela
alcançado (OLIVEIRA et al., 2005). No momento em que este monopólio se extingue, pode
então ser acessível a todos, tornando-se assim um instrumento de difusão das tecnologias nelas
contidas. Permite-se a produção da cópia do medicamento de referência – gerando produtos
genéricos para o mercado nacional, beneficiando, assim, toda a população.
A cadeia produtiva de fármacos e medicamentos é a chave para construção da visão de futuro,
exigindo monitoramento sistemático e avaliação constante para reconhecimento das mudanças
tecnológicas e suas implicações nas políticas públicas, de modo a resolver o trade-off gerado
pelas patentes neste setor; ou seja, o dilema de equilibrar o necessário incentivo à inovação com a
necessidade de atender crescentemente à demanda interna de medicamentos.
Se as empresas nacionais farmacêuticas tão somente tivessem capacidade para desenvolver a
cópia dos medicamentos que anualmente têm suas patentes extintas, poderiam ampliar
rapidamente não só seu portfólio de produtos como também garantir um faturamento crescente,
mesmo que só atuando no segmento dos genéricos.
A prospecção tecnológica através de um sistema de monitoramento constante das mudanças
tecnológicas e das alterações no sistema de patentes é portanto uma ação estratégica que deverá
ser efetuada necessariamente pelo Brasil, tendo em vista o desenvolvimento do seu sistema
produtivo interno.
5. Capacidade de Assimilar Tecnologias como Pressuposto da Capacidade de Produzir e
Inovar
A eficácia no fornecimento permanente de medicamentos à população está diretamente
relacionada com a capacidade de produção local, que, por sua vez, depende de investimentos em
P&D, dada a limitação da oferta interna de insumos farmacêuticos por parte das empresas
nacionais. Importa-se atualmente, 82% dos insumos farmacêuticos demandados pelas empresas
nacionais (ABIQUIF, 2003).
A obtenção de novos princípios ativos (fármacos) é uma busca constante por parte das grandes
empresas, pois é o monopólio da tecnologia de fabricação do fármaco que traz lucros
5
extraordinários, na medida em que esse componente representa de 55% a 99% dos custos de
produção de um medicamento (PINHEIRO et al., 2006).
O processo de obtenção do fármaco é essencial para a manutenção do mercado internacional do
medicamento patenteado e, por isso, as empresas inovadoras não têm interesse em licenciar
tecnologias2 no setor farmacêutico. Então no setor farmacêutico, o aprendizado tecnológico
através do licenciamento de tecnologias é pouco provável que aconteça, uma vez que somente
tecnologias ultrapassadas são disponibilizadas aos seguidores.
O desenvolvimento de competências é a chave para alcançar um nível ótimo de eficiência na
atividade de produção de bens e serviços e para diminuir o risco de fracasso nestes processos,
posto que estas outorgam uma melhor e maior capacidade de assimilação do conhecimento,
favorecendo os desenvolvimentos futuros.
Cohen e Levinthal (1989) denominaram esta capacitação como a “capacidade de absorção da
empresa” dado que, através dela, adquire-se a habilidade de reconhecer o valor e a utilidade de
uma nova informação, assimilá-la e aplicá-la a usos comerciais, incrementando-se a capacidade
inovadora. Contudo, sabemos ser necessário um mínimo de conhecimentos tecnológicos como
pré-requisito que assegure a capacidade de assimilação e exploração ótima destes conhecimentos
a serem adquiridos, dado o caráter tácito e explícito do conhecimento (NONAKA e TAKEUCHI,
1995).
A necessidade de criar uma capacitação tecnológica prévia rompe com a hipótese introduzida por
Arrow (1962) que aponta que os custos de transferência de conhecimento (custo da imitação e
custo do processamento da informação já criada) sejam pequenos em relação aos custos de criar
um novo conhecimento. Tal hipótese se fosse certa, caberia somente àqueles países mais
desenvolvidos gerar tecnologia; e aos demais, apenas ter a capacidade de absorção.
A dimensão específica do conhecimento tecnológico rompe com a idéia neoclássica sobre a
existência de um conjunto de conhecimentos viáveis de livre acesso, posto que as empresas não
conhecem plenamente o espectro completo das soluções e alternativas para a resolução de seus
problemas; nem são capazes sozinhas de assimilar ou reproduzi-las em sua totalidade.
Apesar de o conhecimento científico ser publicado em revistas amplamente difundidas, este não
chega a ser um bem livremente acessível, uma vez que poucos possuem o conhecimento
científico especializado, ativamente implicado nesses temas. Além do fato de 70% das
tecnologias contidas na documentação de patentes serem descritas somente por este veículo
(OLIVEIRA et al., 2005), visto que para decodificar uma patente é necessário estar pelo menos
no patamar do estado-da-arte nela contida.
Frente ao argumento dos custos de transmissão nulos, Cohen e Levinthal, (1990) sugerem que,
em longo prazo, os custos da aprendizagem, no sentido amplo, é que asseguram a acumulação do
conhecimento e que podem ser elevados, já que a aquisição de capacidades tecnológicas é um
processo longo e custoso. Ademais, o custo de desenvolver a capacidade de absorção está ligado
notavelmente aos custos da aprendizagem.
6
O caráter cumulativo do conhecimento afeta positivamente o incentivo a inovar e melhora a
capacidade das empresas de produzir e desenvolver inovações futuras (visão neoschumpeteriana).
A capacidade de acumulação depende da quantidade de conhecimento a assimilar e da facilidade
de aprendizagem, fatores que variam com o tipo de conhecimento básico que cada indústria /setor
precisa reter em seus processos de produção e inovação. Por sua vez, incide negativamente sobre
o grau de apropriabilidade e positivamente sobre os fluxos de difusão, representando um fator
que ajuda a manter a posição no mercado e a antecipar futuros desenvolvimentos em relação aos
seus competidores.
6. Manter-se um Seguidor ou Tornar-se um Inovador: Eis a Questão!
Segundo De Nucci (2004), em entrevista concedida à Revista Eletrônica da FAPESP, o Brasil
não deveria promover inovações farmacêuticas; tampouco perseguir políticas para a promoção da
P&D. Para este farmacologista, a vantagem competitiva (capacidade de investimento e
competência tecnológica) dos países desenvolvidos em relação aos pobres e em desenvolvimento
é tamanha que não compensaria a estes últimos investirem em inovações.
Como se sabe, inovar em fármacos e medicamentos é uma atividade cara, complexa e intensiva,
geralmente não realizada por empresas de pequeno porte. Tendo em vista a falta de capacidade de
investimento em P&D das empresas nacionais, pelo seu baixo faturamento e por atuarem apenas
nos segmentos dos similares e genéricos, que não exige este tipo de atividade, compreende-se que
a afirmação do estudioso De Nucci possa fazer sentido para alguns. De fato, a inovação
farmacêutica nas empresas privadas nacionais é bastante rara, apesar de fundamental para sua
sobrevivência.
A distância tecnológica (gap) é muito grande, além de serem incipientes as competências
instaladas em algumas funções da P&D farmacêutica no País, tais como na pesquisa toxicológica
(pré-clínica) e pesquisa clínica, ensaios de fase I e II, por exemplo, que são as mais caras do
processo de trazer um medicamento à comercialização. A razão induz em acreditar que seria mais
barato comprar o medicamento no mercado internacional do que produzi-lo aqui no Brasil.
Atendo-se somente ao ponto de vista econômico, o País tenderia a ser apenas um comprador de
commodities e produtor de medicamentos, jamais um inovador.
Entretanto, como já vimos, para que as empresas possam se inserir no mercado global é
necessário investir significativamente em desenvolvimento de competências para inovar, pois a
inovação é fator de competitividade em setores based science como o farmacêutico. Sem inovar,
não há como combater as doenças presentes no quadro epidemiológico brasileiro, doenças essas
que os laboratórios privados não têm interesse em pesquisar. Em 2000, das onze maiores
companhias farmacêuticas, oito não desenvolviam fármacos para o combate a doenças
negligenciadas. Entretanto, no mesmo período, oito medicamentos contra disfunção erétil, sete
contra obesidade e quatro contra distúrbios do sono encontravam-se em teste (EATON, 2001).
Torna-se, assim, fundamental para o Brasil desenvolver competências tecnológicas para chegar a
novos fármacos, para produzir os medicamentos necessários ao atendimento das necessidades
nacionais, sob pena de ser comprometida sua soberania.
7
7. Poder de Compra Governamental como Instrumento de Política Pública
Nos países desenvolvidos, as compras governamentais constituem um instrumento de regulação
de mercado e de grande incentivo às empresas privadas. O papel do Estado usualmente se traduz
em políticas de encomendas tecnológicas, isenções fiscais e fomento à pesquisa. “Não há
industria tecnológica no mundo que não tenha se desenvolvido com o apoio do Estado”
(SALLES-FILHO apud BRANDÃO, 2006, p.33).
Nos países desenvolvidos onde a distribuição de renda é mais eqüitativa e a população tem alto
padrão de vida e salário, o acesso a medicamentos é feito por meio do seguro-saúde privado.
Assim, o cliente sai da consulta médica já com a medicação fornecida. As companhias de segurosaúde utilizam-se de empresas tipo Pharmaceutical Benefit Management – PBM que servem de
intermediários/negociadores com as indústrias e conseguem redução nos preços devido as
grandes quantidades de medicamentos comercializados.
No Brasil, a distribuição de medicamentos constitui requisito fundamental para a promoção do
acesso da população àqueles considerados essenciais (RENAME). As aquisições públicas de
medicamentos representam 30% do mercado nacional.
As compras governamentais na área de medicamentos engajam cerca de U$D 1,125 bilhões por
ano, sendo 45% para o SUS, 20% em AIDS, 11% em produtos estratégicos (Hanseníase, Fator
VIII, Malária, Insulina, Tuberculose) e 24% em gastos excepcionais, saúde mental e farmácia
(BRASIL, MDIC, 2003).
A implementação de uma Política de Aquisições de Medicamentos exige a definição de ações
conjuntas entre cada esfera de governo (federal, estadual, municipal), buscando a racionalização
alocativa e eqüitativa dos recursos destinados à Assistência Farmacêutica. Exige também um
estudo detalhado da capacidade produtiva e dos perfis de produção dos laboratórios produtores
públicos e privados, de modo que um não venha a competir com o outro, em um mercado tão
reduzido quanto o público.
Os laboratórios públicos podem ser utilizados para criar mercado para os fornecedores de
fármacos domésticos, direcionando suas licitações. Esses laboratórios podem ainda desenvolver
tecnologias de produção de fármacos e intermediários de síntese e licencia-las para os
laboratórios farmoquímicos nacionais, de modo a que eles possam ser parceiros fornecedores dos
insumos para a produção pública de medicamentos.
8. Produção Pública de Medicamentos: um Modelo Brasileiro em Questão
O Brasil dispõe de uma rede de laboratórios farmacêuticos públicos, ligados aos estados e ao
governo federal. Tal rede é um modelo sui generis no mundo. Este modelo de produção de
medicamentos por laboratórios públicos adotado pelo Brasil é bastante combatido por adeptos do
neoliberalismo econômico. Segundo De Nucci “Há um erro estratégico do governo: não é função
do setor público produzir medicamentos” (De NUCCI, 2004).
Entretanto, a teoria neoliberal que julga serem as livres forças de mercado que determinam a
competitividade entre as empresas e o receituário dos organismos internacionais não tem gerado
8
riqueza para os países pobres e em desenvolvimento, visto estarem as empresas destes países
excluídas do mercado globalizado, atuando apenas no mercado interno. Caso este modelo não
funcionasse não haveria o prestígio alcançado em Programas Governamentais, como o da AIDS,
cujo modelo está sendo exportado para os países africanos.
As origens dos Laboratórios Oficiais (cf. QUADRO 1) foram as mais variadas, com distintas
missões e em distintos setores (Setor Público Estadual, Federal, Universidades, Forças Armadas),
atendendo basicamente às políticas ministeriais e estaduais para o desenvolvimento da produção
de medicamentos, a exemplo do Programa da Farmácia Básica no nível federal e dos Programas
de Assistência Farmacêutica em Minas Gerais, São Paulo e Rio de Janeiro, sinalizando novas
funções públicas.
QUADRO 1 - Laboratórios Oficiais da Rede ALFOB, 2003
Laboratório
Vinculação
UF
Ano de
fundação
Personalidade
jurídica
Produção*
Laboratório de Tecnologia
Farmacêutica (LTF)
Universidade
Federal da
Paraíba
PB
–
Autarquia
193.080,0
Faculdade de Farmácia,
Odontologia e Enfermagem
(FFOE)
Universidade
Federal do Ceará
CE
–
Autarquia
7.200,0
Laboratório Químico Farmacêutico
do Exército (LQFE)
Comando do
Exército
RJ
1808
Administração
direta
209.419,4
Laboratório Farmacêutico da
Marinha (LFM)
Comando da
Marinha
RJ
1906
Fundação Ezequiel Dias (FUNED)
Secretaria de
Estado de Saúde
MG
1907
Instituto Vital Brazil S.A. (IVB)
Secretaria de
Estado de Saúde
RJ
1918
Instituto de Tecnologia de
Fármacos (FARMANGUINHOS)
Fundação
Oswaldo Cruz
RJ
1956
Indústria Química do Estado de
Goiás (IQUEGO)
Secretaria de
Estado de Saúde
GO
1964
Laboratório Farmacêutico do
Estado de Pernambuco SA
(LAFEPE)
Secretaria de
Estado de Saúde
PE
1967
Laboratório de Ensino, Pesquisa e
Extensão em Medicamentos
e Cosméticos (LEPMC)
Universidade
Estadual de
Maringá
PR
1967
Departamento
21.000,0
Laboratório Farmacêutico de Santa
Catarina (LAFESC)
Secretaria de
Estado de Saúde
SC
1969
Diretoria
38.400,0
Laboratório Químico Farmacêutico
da Aeronáutica (LAQFA)
Comando da
Aeronáutica
RJ
1971
Administração
direta
242.352,0
Administração
direta
Fundação
pública de
direito público
Sociedade de
economia
mista
Unidade
técnica
Sociedade de
economia
mista
Sociedade de
economia
mista
120.800,0
692.340,0
10.680,0
1.289.067,3
618.000,0
1.345.680,0
9
Fundação para o Remédio Popular
(FURP)
Secretaria de
Estado de Saúde
SP
1972
Fundação
pública de
direito público
3.903.840,5
Laboratório Farmacêutico do Rio
Grande do Sul (LAFERGS)
Fundação
Estadual de
Produção e
Pesquisa em
Saúde
RS
1972
Departamento
375.800,0
Laboratório Industrial
Farmacêutico de Alagoas (LIFAL)
Secretaria de
Estado de Saúde
AL
1974
Sociedade de
economia
mista
1.728.144,0
Laboratório de Produção de
Medicamentos (LPM)
Universidade
Estadual de
Londrina
PR
1989
Autarquia
especial
96.000,0
Núcleo de Pesquisa em Alimentos
e Medicamentos (NUPLAN)
Universidade
Federal do Rio
Grande do Norte
RN
1991
Órgão
suplementar
da UFRN
876,3
Laboratório Industrial
Sociedade de
Secretaria de
PB
1997
Farmacêutico do Estado da Paraíba
economia
Estado de Saúde
(LIFESA)
mista
Total
* Em milhões de unidades farmacêuticas/ano.
Fonte: Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Oficiais do Brasil, ALFOB 2005
80.000,0
10. 972.679,2
Os recursos públicos são limitados para realizar as aquisições de medicamentos dos laboratórios
privados que praticam preços abusivos e faturam alto, além de utilizar mecanismos como preços
de transferência (superfaturamento dos insumos importados) e poder de monopólio do mercado,
durante a vigência da patente de seus medicamentos. Além de dotar o governo de poder de
barganha junto às empresas produtoras, os laboratórios oficiais (embora atuem apenas no
segmento público de mercado) têm importante papel na regulação, funcionando em caráter
supletivo, desempenhando também uma função de regulação de preços, pela aferição dos custos
de produção. Existem medicamentos no Brasil, além disso, que são fabricados somente pelos
laboratórios oficiais, que dessa forma suprem estrategicamente o mercado e o regulam, servindo
de instrumento de política pública.
A produção dos laboratórios oficiais permite ao governo brasileiro promover maior acesso da
população carente e diminuir o preço dos medicamentos no mercado nacional. O exemplo dos
medicamentos ARVs demonstra que esta política produz resultados concretos, a despeito de toda
a concertação que fazem na mídia contra os laboratórios públicos, tentando caracterizar como
“roubo” de patente algo legítimo e legal como é o licenciamento compulsório, uma prerrogativa
do governo brasileiro estabelecida na sua lei de patentes.
9. “Quebra de Patente” ou Licenciamento Compulsório
Nos últimos quatro anos, o Brasil ameaçou emitir licenças compulsórias de ARVs, utilizando
uma salva-guarda legal contida na nossa Lei de Patentes. Diversas Organizações Não
Governamentais – ONGs, juntamente com o Ministério Público Federal ingressaram com uma
ação civil pública na Justiça Federal com o objetivo de impulsionar o Poder Executivo a realizar
10
o Licenciamento Compulsório do medicamento Kaletra. O pedido de liminar foi indeferido em
primeiro grau sob alegações pouco técnicas, pois assentam-se no argumento de que haveria a
probabilidade de um desabastecimento de ARVs em virtude da incapacidade de produção dos
laboratórios nacionais e na ausência de interesse público. Tal argumento é inconsistente na
medida em que o Brasil possui capacidade para produzir a segunda linha de medicamentos antiretrovirais . Esta é a conclusão do documento “ A produção de ARVs no Brasil, uma avaliação”
realizada pelo Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual da REBRIP- Rede Brasileira pela
Integração dos Povos, coordenado pela ABIA – Associação Brasileira Interdisciplinar de AIDS
(FORTUNAK e ANTUNES, 2006).
É política atual do Ministério da Saúde dar prioridade ao licenciamento compulsório, para
redução dos preços através da produção pública, quando os laboratórios detentores da patente se
mostrarem irredutíveis na negociação daqueles medicamentos considerados essenciais aos
Programas Governamentais de Saúde Pública.
Os laboratórios oficiais, caso detenham tecnologia para realizar a engenharia reversa, podem
lançar mão do licenciamento compulsório para produzir medicamentos estratégicos para a saúde
pública, neutralizando o efeito da patente no setor farmacêutico, que impede o acesso a esses
medicamentos para quem não pode pagar o alto preço pelo qual eles são ofertados nas farmácias.
O licenciamento compulsório não seria a melhor medida adotada por um governo para garantir o
acesso de sua população a medicamentos essenciais. Entretanto, diante da falta de interesse das
empresas farmacêuticas em licenciar tecnologias de produção de fármacos, o insumo
farmacêutico, esta é a melhor solução encontrada.
O governo, exercendo seu papel constitucional de promover o bem estar da população e resolver
os problemas da saúde pública, promove e financia a fabricação oficial que, além de ser
altamente econômica (por não visar lucro e não ter os custos de marketing e comercialização
embutidos), ainda obtém informações, monitorando a política governamental de controle de
preços.
10. Farmanguinhos e a Produção de ARVs
Farmanguinhos vem obtendo êxito em realizar inovações incrementais em produtos e processos
farmacêuticos, o que vem se refletindo nas políticas de medicamentos e no sucesso de programas
estratégicos de saúde pública do Ministério da Saúde (MS), com destaque internacional pela sua
participação no desenvolvimento tecnológico de medicamentos no combate à AIDS e doenças
negligenciadas. Vem se destacando também por sua articulação com os órgãos de fomento e
industriais para o estabelecimento de políticas para o desenvolvimento do setor farmacêutico. A
economia de U$D115 milhões nos gastos do governo brasileiro com a compra de medicamentos
do coquetel de AIDS, no período de 1997 a 2000, é um dos resultados do trabalho de
Farmanguinhos. Desde então, o Instituto vem produzindo anti-retrovirais que compõem o
coquetel e investindo no desenvolvimento tecnológico visando a disponibilidade e a regulação de
preços dos medicamentos patenteados, para ampliar o acesso aos portadores de HIV atendidos
pelo Programa DST/AIDS do MS. A pesquisa em novos fármacos, a formulação de antiretrovirais, associando dois ou três princípios ativos, novas formulações para os conhecidos
Aciclovir e o Fluconazol, pesquisa em princípios ativos usados contra as infecções oportunistas
11
da AIDS, e a nova forma medicamentosa para o Nevirapina, visando o uso pediátrico, além do
desenvolvimento de inovações tecnológicas ao redor de moléculas já conhecidas são realizações
atuais de Farmanguinhos.
Laboratório de Referência para o SUS, adequado às boas Práticas de Fabricação e ISO 9002,
Farmanguinhos vem instruindo laboratórios de outros países em desenvolvimento para a inserção
competitiva na corrida da produção de anti-retrovirais.
Atualmente em Farmanguinhos são produzidos sete dos dezesseis medicamentos que compõe o
coquetel: Didanosina, Estavudina, Indinavir, Lamivudina, Lamivudina+Zidovudina, Nevirapina e
Zidovudina. Além destes, pesquisou também as fórmulas do Efavirenz, comercializado pela
Merck e do Nelfinavir, da Roche – o que possibilitou ao Brasil negociar a redução do preço
destes medicamentos junto às duas transnacionais em 59 % e 40%, respectivamente, que antes
somavam juntos 36% de todo o gasto na compra dos anti-retrovirais feita pelo MS.
Farmanguinhos tem tido papel fundamental na redução dos gastos públicos através da produção
de medicamentos para atendimento aos problemas de saúde pública do País e ao longo de sua
curta existência (1956-2007) vem realizando uma trajetória institucional e tecnológica que a
diferencia dos demais laboratórios públicos produtores. O fato de ser um instituto tecnológico
integrante do complexo Fundação Oswaldo Cruz - Fiocruz traduz sua vocação para o ensino, a
pesquisa e o desenvolvimento tecnológico em fármacos e medicamentos.
Dentre iniciativas em prol do desenvolvimento tecnológico, Farmanguinhos firmou recentemente
Acordo de Cooperação Internacional com o Governo da Ucrânia para transferência de Tecnologia
para produção de Insulina, além de outro Acordo com o Governo da Nigéria para transferência de
tecnologia para a produção de anti-retrovirais, financiado pela Agência Brasileira de Cooperação
do Ministério de Relações Exteriores. (www.far.fiocruz.br).
No ano de 2008, Farmanguinhos pedirá credenciamento junto a CAPES do Curso de Mestrado
Profissional em Inovação Industrial Farmacêutica, visando formar pessoal comprometido com o
desenvolvimento tecnológico e a inovação farmacêutica, voltado para a resolução dos problemas
industriais internos. Desde 2005, vem desenvolvendo sistematicamente cursos de treinamento
funcional e programas de pós-graduação comprometidos com essa temática.
11. Conclusões
O Brasil necessita desenvolver competências em pesquisa e desenvolvimento tecnológico no
setor farmacêutico como meio de garantir ao País níveis de produção interna de medicamentos
compatíveis com a demanda; e deter a crescente dependência das importações de insumos, knowhow e de medicamentos acabados (inovadores). Sem inovar compromete-se não só a produção
interna de medicamentos, a competitividade das empresas nacionais e sua manutenção no
mercado, como também o acesso da população aos medicamentos de que necessita.
Os argumentos de que o gap tecnológico é tão grande que não convém desenvolver tecnologia e
sim importá-la; e de que é mais vantajoso comprar insumos e medicamentos acabados no
mercado externo do que produzi-lo internamente não se sustentam, pois sabemos quais poderão
ser as conseqüências para a saúde pública e segurança sanitária do País no futuro.
12
A experiência do Brasil com os ARVs confirma que é justificável a existência de uma rede oficial
de laboratórios produtores de medicamentos nos países pobres e em desenvolvimento.O caso do
laboratório estatal Farmanguinhos e da produção de anti-retrovirais comprova a eficiência dessa
política, assim como o reconhecimento internacional da política brasileira de combate à AIDS e a
exportação do modelo para os países africanos.
O compromisso de posterior fabricação no País está sempre sendo adiado, tendo em vista os
entraves ao licenciamento de patentes e, também, as dificuldades políticas e tecnológicas para
lançar mão do licenciamento compulsório.
Por que deveríamos nos ater apenas a genéricos e a me toos, quando o País pode inovar?
Notas
1. O medicamento é um bem que possui características econômicas especiais, tais como a
essencialidade do produto e a inelasticidade do preço. Alguns autores argumentam que por essas
razões, o medicamento deveria ser tratado como um “bem público” e que as patentes neste setor
industrial são geradoras de iniqüidades sociais.
2. Manter o monopólio de produção do insumo torna-se estratégico porque é uma maneira de
expandir o tempo da patente e, conseqüentemente, a manutenção dos lucros.
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Medicamentos e Saúde Pública: copiar e inovar, é só