PEPTÍDEOS ANTIMICROBIANOS
Maura Vianna Prates
Aluna de doutorado do curso de Pós-graduação do Departamento de
Biologia Celular da Universidade de Brasília/UnB.
[email protected]
Fotografias gentilmente cedidas pelo Prof. Antônio Sebben
s ameaças à saúde de
seres vivos causadas por
infecções de microrganismos resistentes a antibióticos e a vários agentes
germicidas vêm atingindo índices jamais registrados. Muitos microrganismos têm desenvolvido resistência tanto contra os já bem estabelecidos
antibióticos de uso convencional
quanto contra os antibióticos de última geração (Austin D. J., et al., 1999),
causando graves problemas de saúde
pública e vultosos prejuízos econômicos. O impacto da crescente resistência de microrganismos a medicamentos e a substâncias específicas
tem movimentado vários grupos de
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Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento
Carlos Bloch Júnior
Professor adjunto do Instituto de Química da Universidade
de Brasília/UnB, Pesquisador do Cenargen/Embrapa.
[email protected]
Uma alternativa no combate a microrganismos resistentes
pesquisa, assim como a indústria farmacêutica para desenvolvimento de
novas drogas que sejam capazes de
lidar efetivamente com as estratégias
de adaptação que esses organismos
elaboram, em face de todo o tipo de
situação adversa.
O surgimento da resistência a antimicrobianos é um exemplo clássico
de evolução em resposta a uma forte
pressão de seleção. Hospitais e outros estabelecimentos constituem uma
comunidade ecológica particular, na
qual diversos tipos de micróbios circulam e interagem entre si diretamente, por meio da reprodução e da
troca de plasmídeos, e/ou indiretamente, por meio de interações entre
pacientes e funcionários.
O corpo humano é um conhecido
habitat de uma microflora muito diversificada, composta de populações
benéficas, populações prejudiciais à
saúde e populações que vivem comensalmente, as quais exercem pouca influência sobre seu hospedeiro
em condições normais. A respeito
dos microrganismos patogênicos, a
maior preocupação é o surgimento
de cepas resistentes aos antimicrobianos disponíveis. Entretanto, os microrganismos comensais estabelecem
um tipo de problema diferente daquele imposto pelos microrganismos
patogênicos. Sob condições normais,
eles vivem em locais como a pele ou
o trato respiratório, causando pouco
ou nenhum problema. Porém, quando transferidos para regiões estéreis,
como a corrente sangüínea e os pulmões, eles podem ser maléficos e
provocar sérios distúrbios na saúde
do hospedeiro (Stewart F. M., et al.,
1998).
Uma vez que os antimicrobianos
são introduzidos para tratar os verdadeiros patógenos e não os comensais, vários fatores de transferência
de resistência são assim disseminados e podem ser transmitidos a linhagens sensíveis, por meio do contato
entre as células. Muitos fatores de
virulência, como, por exemplo, os de
Staphylococcus aureus, são carregados por plasmídeos e podem ser
consignados entre diferentes linhagens. Sem dúvida, esse é o principal
mecanismo para o rápido espalhamento de linhagens com resistência
múltipla (Brock, T. D., et al.,1994).
Além disso, o problema da resistência introduz questões relacionadas
com a duração e com a intensidade
do tratamento, com as estratégias que
envolvem o uso de várias drogas
concomitantemente e com o rigor
que deve ser obedecido por parte
dos pacientes.
PROBLEMÁTICA DA
RESISTÊNCIA A DROGAS
A infecção hospitalar vem despertando interesse não somente para a
área sanitária como também para a
econômica, devido, sobretudo, à versatilidade com que os microrganismos causadores têm driblado a ação
de drogas. A infecção hospitalar atinge dois milhões de norte-americanos
a cada ano e cerca de setenta mil
acabam morrendo. O S. aureus é um
dos microrganismos mais comumente encontrados em hospitais e um dos
principais agentes causadores da infecção hospitalar. A resistência da
bactéria S. aureus a antibióticos vem
crescendo assustadoramente, mesmo
em se tratando de drogas poderosas
e de amplo espectro como a meticilina. Em 1981, 5% da população de S.
aureus eram resistentes a este antibiótico. Dez anos depois a porcentagem aumentou para 38% e as estimativas atuais são de cerca de 50% de
Figura 1a:
Phyllomedusa tarsius:
"Perereca da Floresta"
- espécie amazônica
resistência à meticilina (http://
www.bhj.org/journal/1997/3901_jan/
special_064.htm).
Infecções causadas por microrganismos resistentes não atingem somente a saúde humana. Na pecuária,
grandes são os problemas enfrentados pelos criadores de gado leiteiro
susceptível à mastite, uma condição
inflamatória da glândula mamária causada por bactérias, (S.aureus, E. coli
e P. aeruginosa, principalmente) que
acarreta mudança das características
físicas do úbere e do leite, em vacas.
As perdas na indústria leiteira dos
Estados Unidos somam mais de dois
bilhões de dólares por ano. Os custos
incluem a diminuição da produção e
a perda da qualidade do leite, seja
provocada pela inflamação propriamente dita, seja causada pelo uso de
antibióticos para o tratamento e as
despesas com veterinários, com laboratórios e com a perda dos animais
(http://classes.aces.uiuc.edu/AnSci308/mastitisintro.html).
O mesmo quadro pode ser verificado no que diz respeito aos fitopatógenos. O surgimento de resistência
de fungos fitopatogênicos de importância agronômica é considerado um
fator limitante na eficácia e na vida
útil das mais variadas estratégias de
controle de doenças (Heaney S., et
al., 1994). Muitos gêneros tais como
Aspergillus, Botrytis, Venturia, Ustilago, Marnaporte, Colletotrichum, Alternaria, Cercospora, Cladosporium
e Penicillium, têm desenvolvido estratégias elegantes de resistência contra os fungicidas mais amplamente
empregados como os da classe dos
benzimidazóis, das estrobilurinas, das
fenoxiquinolinas e das anilinopirimidinas (Steffens, J. J., et al., 1996).
Nos últimos anos, tem-se constatado que mesmo fungicidas de amplo
espectro de ação como o Benomyl,
tornaram-se alvo de resistência. O
emprego deste fungicida tem-se mostrado cada vez mais ineficiente para
combater a antracnose, doença provocada pelo gênero Colletotrichum
sp., em culturas de diversas fruteiras
susceptíveis e, sobretudo, contra a
doença da “flor preta” em morango
(Tanaka, M. A. S., et al., 1997).
Conforme comentado anteriormente, o uso indiscriminado de drogas é o principal fator de indução à
resistência; contudo, a prevenção
desse abuso não é garantia de que a
susceptibilidade seja um fator reversível, uma vez que os efeitos provocados pelos antimicrobianos na fisiologia e ecologia dos microrganismos
impossibilitam, cada vez mais, o retorno ao estado de susceptibilidade
anterior. Dessa forma, o uso de novas
tecnologias para o desenvolvimento
de drogas mais eficazes constitui uma
estratégia promissora no campo da
biotecnologia, uma vez que possibilitará a iniciativa de prospeção de
novas classes de moléculas naturais
e/ou sintéticas, capazes de neutralizar ou de danificar o patógeno-alvo
ao invés de inviabilizá-lo geneticamente, inibindo assim o desenvolvimento da resistência (Heinemann, J.
A., et al, 2000). Atualmente, peptídeos antimicrobianos de origem animal
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento
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gas como o LOCILEX™, que é um
creme de uso tópico com ação microbicida e empregado no tratamento da
infecção de úlceras diabéticas. Além
disso, derivados da magainina II têm
sido amplamente aplicados nas terapias contra o câncer, no tratamento
de conjuntivites, de acne, de doenças
sexualmente transmissíveis, de micoses, além de serem drogas promissoras no tratamento da gripe (http://
www.magainin.com).
SUBSTÂNCIAS BIOATIVAS
DE ORIGEM NATURAL
Figura 1b: Leptodactylus ocellatus: "Rã-Manteiga" amplamente distribuída no Brasil
estão sendo utilizados como mode- diferenças significativas encontradas
los para o desenho de novas drogas na sensibilidade entre os microrgacom aplicação nas áreas agrícola e de nismos e as células vegetais têm
saúde. Para tanto, seqüências anfifíli- mostrado que tais peptídeos podem
cas de peptídeos vêm sendo dese- ser úteis como modelos para o desenhadas, sintetizadas e testadas in vi- nho de genes de resistência (Powell,
tro, a fim de permitirem a obtenção W. A., et al., 1995).
de genes com potencial de resistênO uso das magaininas na agriculcia a fitopatógenos, bem como com- tura não se restringe a cultivares
postos ativos para a fabricação de frutíferos ou alimentícios de um modo
drogas de amplo espectro e de múl- geral, mas abrange também o ramo
tipla aplicabilidade.
de plantas ornamentais geneticamente
Um exemplo dessa abordagem modificadas, as quais expressam gesão os análogos sintéticos da magai- nes de magaininas resistentes a funnina II, peptídeo proveniente da se- gos e outros patógenos causadores
creção da pele do anfíbio africano de lesões. Da mesma forma, a magaiXenopus laevis (Zasloff, M., 1987) nina II já vem sendo utilizada como
que foram testados com sucesso na princípio ativo na fabricação de droinibição da germinação de conídios de
Figura 1c:
Cryphonectria parasiDendrobates galactonotus:
tica, Fusarium oxysEspécie amazônica
porum f. sp. lycopersici, e Septoria musiva,
e que não provocaram nenhuma interferência detectável na
germinação de pólen
dos organismos hospedeiros, além de serem eficazes também
contra as bactérias
Agrobacterium tumefaciens,
Erwinia
amylovora e Pseudomonas syringae. As
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Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento
Venenos e toxinas de origem natural há muito representam uma fonte de fascínio para o homem, graças
aos seus extraordinários efeitos farmacológicos. Sua utilização científica
tem contribuído com sucesso para a
elucidação de vários mecanismos fisiológicos, como demonstrado por
Claude Bernard em seus experimentos clássicos da década de 1850, com
o “curare” (Erspamer, V., 1994), assim como sua exploração industrial
para o uso terapêutico, a exemplo de
várias comunidades indígenas e na
medicina popular (Daly et al. 1992).
Os vertebrados, mais precisamente os anfíbios da ordem Anura, representam um verdadeiro laboratório de
bioquímica, tendo em vista o arsenal
de toxinas que fabricam. Nas células
que revestem as paredes de glândulas granulares presentes na pele desses animais é produzida uma variedade de princípios ativos que compreendem moléculas alifáticas, aromáticas e heterocíclicas, além
de uma diversificada gama
de esteróides, de alcalóides, de aminas biogênicas, de derivados guanidínicos, de proteínas e de
peptídeos, incluindo-se
na produção desses dois
últimos, seus precursores
e todo o sistema enzimático envolvido na sua biossíntese. Essas moléculas acumulam-se em grânulos, os quais compõem
a luz de glândulas dérmicas e são liberadas mediante estímulos apropriados. Seu papel é muito
diversificado sobre as funções fisiológicas da pele ou na defesa
contra predadores e microrganismos. Grande número desses compostos já se encontra caracterizado estrutural e funcionalmente
(Sebben, A. et al., 1993).
Entre todos os tipos de moléculas mencionados acima, os peptídeos têm despertado bastante
interesse devido às suas atividades como mediadores farmacológicos e à descoberta de moléculas
homólogas ou análogas em tecidos do trato gastrointestinal e
sistema nervoso de mamíferos. O
exemplo mais freqüente de moléculas encontradas em ambos os grupos
são as taquicininas, as ceruleínas, o
hormônio liberador de tirotropina, as
bobesinas e os peptídeos opióides
(Erspamer, V. e Melchiorri, P., 1980).
O primeiro relato da ocorrência
de peptídeos com atividade antibacteriana e hemolítica na pele de anfíbio data de 1969, quando foi identificada a bombinina, um peptídeo de
24 resíduos de aminoácidos, proveniente da secreção cutânea do anuro
europeu Bombina variegata (Csordas, A. e Michl, H., 1970). No final da
década de 1980, foram isoladas as
magaininas de Xenopus laevis (Zasloff, M., 1987) e, somente a partir daí,
outros peptídeos com atividade microbicida de origens diferentes começaram a ser estudados mais detalhadamente. Atualmente, as magaininas representam uma das mais bem
estudadas classes de peptídeos antibióticos, os quais são considerados
efetores da imunidade inata, agindo
em uma primeira linha de defesa
contra infecções bacterianas e fúngicas nos organismos superiores (Zasloff, M., 1992; Boman, H. G., 1995;
Nicolas, P., 1995; Barra, D., et al.,
1998).
GLÂNDULAS DE VENENO
Especificamente nos anfíbios há
pelo menos dois tipos de glândulas
dérmicas denominadas mucosas e
granulares, além das glândulas parotóides posteriores aos olhos da maioria dos anuros. As mucosas encontram-se distribuídas no tegumento e
sua secreção umectante promove a
Figura 2:
Exemplar adulto de Physalaemus
fuscomaculatus. Notar o aspecto
granuloso da pele dorsal. Marcado pelo acúmulo de glândulas
granulosas
hidratação da pele por onde ocorrem
cerca de 90% das trocas gasosas (Orr,
R. T., 1986).
As glândulas granulares, também
chamadas glândulas serosas ou de
veneno, podem estar distribuídas ao
longo de todo o corpo ou concentradas em algumas áreas, formando protuberâncias, especialmente na região
dorsal do animal (Duellman, E. W. e
Figura 3:
Corte histológico da pele de anfíbio mostrando a epiderme (E) e as
glândulas granulosas (G) e mucosas (M) localizadas na derme.
Aumento: 100 X
Coloração: Azul de toluidina
Trueb, L., 1986). Em muitas espécies,
essas glândulas, juntamente com as
glândulas parotóides secretam substâncias bioativas que constituem um
“novo” sistema de defesa coordenado pelo sistema nervoso, diferente
daquele constituído pelas células T e B do sistema imune, e
detêm a capacidade de promover a síntese de peptídeos de
baixa massa molecular com atividade antimicrobiana de amplo espectro, efetivos contra bactérias e fungos. Tal ocorrência
poderia explicar a acentuada
resistência desses grupos de anfíbios a doenças (Nicolas, P e
Delfour, A., 1994).
O lume das glândulas serosas e das parotóides é rico em
grânulos que armazenam secreções tóxicas. Em situações de perigo,
um estímulo nervoso é recebido pelas paredes glandulares provocando
a contração da musculatura local e
causando uma descarga sincronizada
do seu conteúdo. Após a liberação da
secreção, o sistema glandular inicia
seu processo de regeneração, que
pode variar de poucas horas a alguns
dias, dependendo da espécie de anfíbio, até que o conteúdo do lume
glandular seja reconstituído (Delfino,
G., et al., 1990).
PEPTÍDEOS ANTIMICROBIANOS
Mais de cinqüenta peptídeos antimicrobianos de anfíbios já foram isolados, tendo como principal característica a natureza catiônica e a capacidade de permeabilizar membranas
de microrganismos. Podem ser agrupados segundo sua estrutura primária e muitos são encontrados em
indivíduos do mesmo gênero e até
mesmo em indivíduos de gêneros
distintos, pertencentes à mesma subfamília ou não. Em 1970, a bombinina
foi descrita como um peptídeo antibacteriano e hemolítico isolado da
secreção da pele do anfíbio B. variegata (Csordas, A. e Michl, H., 1970).
Pouco tempo depois, outras bombininas foram detectadas na secreção
do mesmo anfíbio, as quais diferiram
entre si por poucos resíduos de aminoácidos (Simmaco, M., et al., 1991).
Peptídeos do tipo bombinina também foram isolados da espécie B.
orientalis e mostraram pouquíssima
variação em relação aos encontrados
em B. variegata. As bombininas possuem amplo espectro de ação contra
microrganismos em geral, porém apreBiotecnologia Ciência & Desenvolvimento
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sentam toxicidade sezante. As dermaseptinas
letiva contra células
são moléculas catiôniAnfíbios
Peptídeos
sangüíneas, provocancas de 24 a 34 resíduos
Xenopus sp.
Magaininas
do a lise das mesmas
de aminoácidos que forBombina sp.
Bombininas
(Gibson, B. W., et al.,
mam uma cadeia linear
Phyllomedusa sp.
Dermaseptinas
1991).
com estrutura secundáRana brevipoda
Brevininas
A secreção da pele
ria aleatória em solvenLitoria sp.
Caerinas
de Xenopus laevis tamte aquoso, porém ordeRana rugosa
Gaegurinas
bém tem sido objeto
nada (α-hélice) quanRana rugosa
Rugosinas
de intensa investigação.
do em meio apolar (Mor,
Bufo bufo
Buforina
Nessa secreção, foram
A., et al., 1991; Mor, A.
Rana catesbeiana
Ranalexinas
detectados o TRH (hore Nicolas, P., 1994a; Mor,
Xenopus sp.
Xenoxinas
mônio liberador de tiA., et al., 1994; Mor, A.
Rana temporaria
Temporinas
rotropina), a xenopsie Nicolas, P., 1994b).
Litoria genimaculata
Maculatinas
na e a ceruleína, com
Outras espécies, tais
Rana esculenta
Esculentinas
potente atividade hipocomo P. rhodei e P.
Rana pipiens
Pipininas
tensora. Além desses
burmeisteri, também
Xenopus laevis
PGLa
peptídeos bioativos,
têm sido investigadas
Xenopus laevis
Xenopsina (fragmento precursor)
foram encontrados aincomo prováveis produXenopus laevis
Levitídeo (fragmento precursor)
da peptídeos homólotoras de peptídeos antiXenopus laevis
Ceruleína (fragmento precursor)
gos às bombininas, demicrobianos, da família
Litoria cerulea
Ceruleína
nominados magainidas dermaseptinas.
Litoria infrafrenata
Frenatina
nas, que também são
Além disso, peptídeos
encontradas no estômago do anfíbio, no que se refere ao conteúdo de relacionados com as dermaseptinas
porém sem função definida nesse peptídeos antimicrobianos da pele. foram detectados em outros hilídeos
órgão.
Foram detectados peptídeos com ati- dessa subfamília, nas espécies PaOs peptídeos de defesa isolados vidade antimicrobiana nas espécies chymedusa dacnicolor e Agalychnis
da pele de Xenopus sp. estão agrupa- R. esculenta (Simmaco, M., et al., annae, ambas provenientes da Amédos em subfamílias de acordo com 1993, 1994), R. brevipoda (Morikawa, rica Central (Wechselberger, C., 1998)
sua origem biossintética. A xenopsi- N., et al., 1992), R. catesbeiana (Cla- .
na e a ceruleína são moléculas de rk, D. P., et al., 1994) R. rugosa (Park,
As dermaseptinas exercem ativiestrutura e atividades farmacológicas J. M., et al., 1994; Suzuki, S., et al., dade lítica sobre bactérias gram-posianálogas às da neurotensina e da 1995) e R. temporaria (Simmaco, M., tivas e gram-negativas, protozoários
gastrina/CCK (colecistocinina) dos et al., 1996) denominados esculenti- ciliados, leveduras e fungos filamenmamíferos, respectivamente. Esses nas, brevininas, ranalexinas, rugosi- tosos em concentrações micromolapeptídeos adotam a estrutura de hé- nas e temporinas, respectivamente. A res (Fleury, Y., et al., 1998). Contudo,
lice anfifílica quando em ambiente particularidade encontrada nos pep- tais efeitos citolíticos não foram obhidrofóbico, sendo ativos em doses tídeos desse gênero é a sua estrutura- servados em células de mamíferos,
micromolares contra uma variedade ção secundária, a qual é decisiva no devido, possivelmente, à estrutura e
de bactérias gram-positivas, gram- modo de interação toxina/microrga- à composição da membrana celular
negativas, fungos e leveduras (Be- nismo, distinta de todas as outras até desses animais. De fato, estudos de
vins, C. L. e Zasloff, M., 1990). As então descritas (Simmaco M., et al., citólise usando lipossomas de difemagaininas I e II são peptídeos ho- 1998).
rentes composições fosfolipídicas e
mólogos que possuem um amplo
Na América do Sul, os hilídeos da crescente concentração de colesterol
espectro de ação antimicrobiana. Em subfamília Phyllomedusinae consti- (característica de animais superiores)
doses micromolares, interrompem o tuem uma fonte muito rica de peptí- mostraram maior resistência dessas
crescimento e/ou induzem a lise os- deos antimicrobianos. Atualmente membranas artificiais à ruptura (Bamótica de diversos tipos de bactérias quatro espécies do gênero Phyllome- tista, C. V. F., 1999). A adenoregulina
gram-positivas e gram-negativas e de dusa vêm sendo estudadas: P. bicolor de P. bicolor é um peptídeo de estruprotozoários. Elas são capazes de (Daly, J. W., et al., 1992; Mor, A., et al., tura similar às dermaseptinas, mas foi
induzir uma lise irreversível das célu- 1994; Charpentier, S., et al., 1998), P. isolada primeiramente por sua funlas tumorais hematopoiéticas e de sauvagei (Mor, A., et al., 1991; Mor, A. ção farmacológica neurotransmissotumores sólidos de diversas origens, e Nicolas, P., 1994a), P. distincta ra, que consiste na sua capacidade de
mas não provocam efeito sobre célu- (Batista, C., et al., 1999) e P. tarsius induzir a ligação de agonistas aos
las diferenciadas de eucariotos (Zas- (Prates, M. V., 1999). Nesse gênero receptores A1 de adenosina, provaloff, M., 1987).
foram detectados potentes agentes velmente devido à presença de DAs espécies do gênero Rana de antimicrobianos denominados der- aminoácidos em sua composição
diferentes áreas geográficas têm-se maseptinas, com amplo espectro de (Daly, J. W., et al., 1982). Posteriormostrado igualmente interessantes, atividade antimicrobiana e cicatri- mente, foi relatada sua atividade an34
Biotecnologia Ciência & Desenvolvimento
timicrobiana, semelhante a das outras dermaseptinas.
Da mesma forma, muitas espécies
australianas de anfíbios do gênero
Litoria têm sido estudadas por apresentarem peptídeos antimicrobianos.
As espécies L. xanthomera e L. chloris
revelaram a presença de peptídeos
antimicrobianos denominados caerinas (Stone, D. J. M., et al., 1992;
Steinborner, S. T., et al., 1997; Steinborner, S. T., et al., 1998), e as espécies L. splendida e L. cerulea, o peptídeo ceruleína, todos ativos contra
bactérias gram-positivas (Stone, D. J.
M., et al., 1992; Waugh, R. J., et al.,
1993). Já as espécies L. infrafrenata e
L. genimaculata apresentaram peptídeos denominados frenatinas e maculatinas (Raftery, M. J., et al., 1996;
Rosek, T., et al., 1998), sendo o
primeiro de amplo espectro e o segundo, com atividade semelhante à
das caerinas.
Na tabela, estão listados os principais peptídeos com atividade antimicrobiana encontrados nas secreções
da pele ou em outros órgãos de
anfíbios anuros.
CONCLUSÃO
O recente progresso da indústria
farmacêutica relacionado com a descoberta e a produção de novos agentes antimicrobianos não vem alcançando o sucesso desejado na contenção da mutagênese de resistência a
drogas desenvolvida pelos microrganismos. Enquanto os mecanismos de
resistência criados por muitos micróbios vêm-se tornando cada dia mais
eficazes, as drogas conhecidas mostram-se cada vez menos eficientes no
combate às patologias. A resistência
microbiana a drogas é um problema
complexo, uma vez que consiste no
produto de um processo natural e,
muito mais que isso, essencial, não
somente para a origem, como também para a evolução de todos os
seres vivos, o qual fundamenta-se na
mutação espontânea, na transferência e recombinação de genes, criando assim variabilidade genética atuante na seleção natural.
A bactéria Pseudomonas aeruginosa possuí em seu genoma alguns
genes codificadores de proteínas for-
madoras de bombas, as quais podem
ser a chave para a elucidação do
mecanismo de resistência contra diversas classes de antibióticos (Stover,
C. K., 2000). A hipótese aceita atualmente sugere que bactérias gramnegativas, grupo do qual a P. aeruginosa faz parte, podem resistir ao
efeito letal de muitos antimicrobianos, utilizando uma estratégia de
bombeamento dos agentes químicos
para fora das células bacterianas mais
rapidamente do que seu acúmulo no
interior destas. Dessa forma, tais proteínas formadoras de bombas teriam
a capacidade de conferir a essas
bactérias a propriedade de resistência (Nikaido, H., 1998). Ainda não foi
esclarecido o procedimento da evolução das bombas. Especula-se que
elas teriam surgido da necessidade
dos microrganismos em eliminar toxinas naturalmente presentes no seu
ambiente (Greenberg, E. P., 2000).
Sabendo disso, torna-se cada vez
mais importante a investigação e a
descoberta de drogas capazes de atuarem diretamente sobre a parede e a
membrana plasmática, provocando
lise e morte celular, ao primeiro contato. Até onde se tem registro, sabese que mesmo os mais sofisticados
mecanismos de defesa desenvolvidos pelos microrganismos ainda não
são suficientes para neutralizar uma
ação do tipo detergente produzida
por peptídeos de caráter catiônico.
O modo de defesa mediado pela
resposta humoral e celular confere
aos vertebrados uma proteção específica e de longa duração contra os
microrganismos patogênicos, porém
não é de forma alguma adaptado
para responder rapidamente e de
maneira eficaz a uma invasão microbiana local, por ocasião de uma lesão. Uma das descobertas mais interessantes a esse respeito revelou que,
além da resposta imune celular altamente específica, os vertebrados possuem um mecanismo químico de
defesa, composto por peptídeos antimicrobianos, análogo ao encontrado em invertebrados (Boman, H. G.
e Haltmark, D., 1987; Lehrer, R. I., et
al., 1991).
A maioria dos peptídeos antimicrobianos descritos até o momento
tem correspondentes de estrutura
idêntica ou similar nos mamíferos e
invertebrados. Sua presença nos vertebrados, considerada como efetora
ancestral da imunidade, possui muito
mais que um significado vestigial.
No que diz respeito às vantagens,
não é surpreendente o que esse
sistema de defesa química pode
conferir ao hospedeiro. De fato, um
repertório fixo, porém extenso, de
pequenos peptídeos antimicrobianos oferece aos animais superiores
um modo de controle particularmente rápido e eficaz contra a proliferação microbiana (Nicolas, P. e
Delfour, A., 1994).
As possibilidades de aplicação
dos peptídeos antimicrobianos pela
agroindústria, assim como pela indústria farmacêutica, são inúmeras.
Um trabalho sistemático de prospeção dessas moléculas, com identificação e síntese química em larga
escala, possibilitará, não somente
um grande avanço na produção de
novas drogas, melhor conhecimento biológico das espécies doadoras,
reconhecimento do valor de cada
uma delas, como novas categorias
de recursos genéticos e, por fim, a
necessidade de preservação desses
animais.
Agradecimentos: Os autores desejam agradecer ao Professor Antônio Sebben pelas fotos deste artigo,
à EMBRAPA-CENARGEN e à Fundação Universidade de Brasília.
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