UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS DEPARTAMENTO DE AGRONOMIA NOVO PERFIL DO PROFISSIONAL DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL BRUNO GOLÇALVES DE REZENDE DIAMANTINA 2012 UNIVERSIDADE FEDERAL DOS VALES DO JEQUITINHONHA E MUCURI FACULDADE DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS DEPARTAMENTO DE AGRONOMIA NOVO PERFIL DO PROFISSIONAL DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL Bruno Gonçalves de Rezende Orientador(a): Profº. M.Sc. Luiz Henrique Silvestre Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Agronomia como parte dos requisitos exigidos para a conclusão do curso. Diamantina 2012 2 NOVO PERFIL DO PROFISSIONAL DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL Bruno Gonçalves de Rezende Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Agronomia como parte dos requisitos exigidos para a conclusão do curso. APROVADO em 28/09/2012 ____________________________________________ Profº Luiz Henrique Silvestre – UFVJM Orientador ____________________________________________ Profª Marcela Carlota Nery – UFVJM 3 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................5 2. OBJETIVO...........................................................................................................6 3. REVISÃO DA LITERATURA ..........................................................................6 3.1 HISTÓRICO .......................................................................................................6 3.2 A EXTENSÃO RURAL NO BRASIL ..............................................................7 3.3 A NOVA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL – PNATER ..........................................................................................10 3.4 A NECESSIDADE DE UM NOVO PROFISSIONALISMO........................16 4. METODOLOGIA .............................................................................................20 4.1 PROPOSTA METODOLOGIA.......................................................................20 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO ......................................................................22 5.1 A PERCEPÇÃO DOS AGRICULTORES E AGRICULTORAS FAMILIARES....................................................................................................22 5.2 FORMANDOS DE CIÊNCIAS AGRÁRIAS..................................................24 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...........................................................................25 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................26 8. ANEXO 01 .........................................................................................................28 9. ANEXO 02 .........................................................................................................29 4 1. INTRODUÇÃO Atualmente as instituições formadoras de profissionais de ciências agrárias baseiam-se no modelo curricular que privilegia a divisão disciplinar e a especialização, introduzindo na formação desses profissionais uma visão da agricultura como um conjunto de técnicas agrícolas aplicadas, levando em consideração apenas os aspectos técnicos e, consequentemente, muitos profissionais que atuam na área de Assistência Técnica e Extensão Rural (Ater) limitam-se a difundir tecnologias. Ao longo do tempo, esse tipo de Ater, que era baseado na metodologia difusionista, causou muitos resultados negativos na agricultura familiar, como a exclusão social, migração para a cidade, contaminação do solo e da água pelo uso intensivo de agrotóxicos, dentre outros. A partir das críticas e dos resultados negativos gerados pela antiga metodologia da Ater, o MDA (Ministério de Desenvolvimento Agrário) responsabilizou-se pelas atividades de Ater, formulando a nova Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (PNATER) com o objetivo de fortalecer a agriculta familiar e a preservação do meio ambiente; adotar novos enfoques metodológicos e novas abordagens; trazer a comunicação num modelo dialético e dialógico, visto a interação entre o conhecimento dos agricultores e dos técnicos, o que privilegia a promoção da participação através de metodologias e enfoques coletivos e participativos. É neste contexto que a PNATER propõe às entidades que participem de um processo capaz de promover estratégias que levem a sustentabilidade sócio-economica e ambiental ao meio rural. Porém, atuar nessa nova perspectiva requer um novo perfil profissional, capaz de compreender as condições específicas e totalizadoras inerentes aos ecossistemas e agroecossistemas. Portanto, é imprescindível que a formação desses “novos” profissionais seja capaz de compreender a agricultura como atividade ademais da produção, e que este processo relaciona o homem ao ecossistema onde vive e trabalha, visto que, para os agricultores, as atividades que são desenvolvidas fazem parte de seu modo de vida e não apenas de um negócio. 5 2. OBJETIVO Avaliar a adequação do ensino de graduação em ciências agrárias com as diretrizes contidas na PNATER 2004, que exige um profissional que saiba atuar não apenas em aspectos técnicos, mas também em aspectos sociais, políticos, culturais e ambientais. 3. REVISÃO DA LITERATURA 3.1 HISTÓRICO O conceito de extensão rural, de forma organizada, surgiu nos Estados Unidos, na década de 80 do século XIX. Nesta época, os resultados das pesquisas realizadas nos Centros de Experimentação e nos Colégios Agrícolas precisaram ser divulgados entre os produtores rurais da região, o que deu origem ao “Extention Service”, que se apresentava com seus métodos pedagógicos próprios, caracterizados principalmente pelas demonstrações e o envolvimento com os produtores (SANTOS, 2008). Segundo o mesmo autor, essas demonstrações eram realizadas diretamente nas propriedades dos agricultores, geralmente no terreno de um líder comunitário, sob o princípio pedagógico do “ensinar a fazer, fazendo”. Ou seja, o técnico realizava a prática (ou a demonstração) na frente dos produtores e logo após esta atividade era repetida, comentada e avaliada pelos presentes. É nesse cenário que passou-se a entender a Extensão Rural como um processo cooperativo, baseado em princípios educacionais e com a finalidade de levar diretamente aos adultos e jovens do meio rural, ensinamentos sobre agricultura, pecuária e economia doméstica, visando modificar hábitos e atitudes da família, nos aspectos técnico, econômico e social, ou seja, estender ao povo rural conhecimentos e habilidades sobre práticas agropecuárias, florestais e domésticas, reconhecidas como importantes e necessárias à melhoria de sua qualidade de vida. 6 3.2 A EXTENSÃO RURAL NO BRASIL O serviço de extensão rural foi implantado no Brasil no ano de 1948, no Estado de Minas Gerais, devido em grande parte ao trabalho pioneiro desenvolvido pela Acar – Associação de Crédito e Assistência Rural, fundada no mesmo. Esta, por sua vez, foi fruto dos esforços feito pela “American International Association for Economic and Social Development” (A. I. A.), que empenhou-se em difundir o modelo de Serviço de Extensão norte-americano como meio de promover o desenvolvimento econômico e social de alguns países em fase de desenvolvimento (PORTILHO, 1999). O modelo norte-americano visava superar o atraso na agricultura, havendo a necessidade de “educar” o povo rural para que ele pudesse adquirir equipamentos e insumos industrializados necessários à modernização de sua atividade agropecuária. Esse modelo tinha como base fazer com que o homem do campo entrasse na dinâmica da sociedade de mercado, ou seja, que ele produzisse mais, com melhor qualidade e maior rendimento (COSTA, 2001). A difusão era baseada em um modelo “tecnicista”, isto é, com estratégias de desenvolvimento e intervenção que levam em conta apenas os aspectos técnicos da produção, sem observar as questões culturais, sociais ou ambientais (CAPORAL & COSTABEBER, 2000). As raízes “difusionistas” dizem respeito à divulgação, imposição ou extensão de um conceito, sem levar em conta as experiências e os objetivos das pessoas atendidas (COSTA, 2001). No contexto da política desenvolvimentista no momento pós-guerra, o Brasil iniciou os serviços de Assistência Técnica e Extensão Rural – Ater, com o intuito de promover melhorias das condições de vida da comunidade rural e apoiar o processo de modernização da agricultura, inserindo-se nas estratégias voltadas à política de industrialização do país (PNATER, 2007). A sua implantação no país se concretizou com o apoio de entidades públicas e privadas. Em 1956, com o apoio do governo do presidente Juscelino Kubitscheck, criou-se a Associação Brasileira de Crédito e Assistência Rural – ABSCAR, constituindo-se, então, um Sistema Nacional articulado com Associações de Crédito e Assistência Técnica Rural nos estados. Durante o governo de Ernesto Geisel, em 7 meados dos anos 70, o próprio “estatizou” o serviço de Ater, implantando o Sistema Brasileiro de Assistência Técnica e Extensão Rural – Sibrater, coordenado pela Empresa Brasileira de Extensão Rural e Assistência Técnica – Embrater e executado pelas empresas estaduais de Ater, as Empresas de Assistência Técnica e Extensão Rural – Emater (PNATER, 2007). Em 1990, o governo do presidente Fernando Collor de Melo extinguiu a Embrater, resultando na desativação do Sibrater e no abandono claro de todos os esforços antes realizados para garantir a existência de serviços de Ater no país. As tentativas de coordenação nacional por meio da Embrapa, posteriormente, pelo Ministério da Agricultura não foram capazes de evitar que as Emater ficassem à mercê das políticas de ajuste estrutural e das difíceis condições financeiras dos respectivos estados, além de se ver ampliada a influência dos interesses políticos dominantes em cada região sobre os destinos das entidades oficiais de Ater. Este afastamento do estado nacional resultou em um forte golpe aos serviços levando a uma crise sem precedentes na Ater oficial, que é tanto maior quanto mais pobres são os estados e municípios (MDA, 2004). A ausência do apoio federal e a inexistência de uma política nacional para o setor de Ater fizeram com que alguns estados da federação, num esforço de manutenção deste importante instrumento de política pública, reestruturassem os serviços dando-lhes diversas formas institucionais e criando novos mecanismos de financiamento e operacionalização das empresas oficiais, além de apoiarem outras entidades emergentes. Nesse período, surgiram e se expandiram várias iniciativas, visando suprir a carência e o vácuo deixado pelo estado, destacando-se aquelas patrocinadas pelas prefeituras, organizações não-governamentais e por organizações de agricultores, entre outros. Não obstante, cabe destacar a Lei Agrícola de 1991 da Constituição Federal de 1988, onde é determinado que a União mantenha serviços de Ater pública e gratuita para os pequenos agricultores, compromisso que o MDA resgata, a partir de agora, estabelecendo esta nova Política Nacional de Ater – PNATER, com vistas a atender as necessidades da agricultura familiar de forma coerente com as estratégias de desenvolvimento do país (MDA, 2004). A partir da crítica ao modelo difusionista e dos resultados negativos da Revolução Verde, além de um modelo inadequado de extensão rural, que predominou até recentemente no cenário agrícola brasileiro (LIMA, 2006), surgiram vários estudos, 8 avaliações e proposições alternativas, que partiram tanto de grupos de resistência que estavam dentro das entidades de extensão, como, principalmente, de setores acadêmicos, da sociedade civil organizada, das igrejas e de organizações de representação dos agricultores (CAPORAL & RAMOS, 2006). Por trás desse tipo de Extensão Rural, que foi dominante ao longo de várias décadas, estava um modelo de desenvolvimento urbano-industrial cuja viabilização necessitava que a agricultura cumprisse funções, entre as quais a de fornecedora de mão-de-obra e de consumidora de serviços e produtos industrializados, como as máquinas, os equipamentos, as sementes híbridas ou melhoradas, os agrotóxicos e fertilizantes químicos sintéticos, o que contribuía também com as exportações e com o superávit da balança comercial. Este modelo, que é fruto de decisões políticas, norteou a ação extensionista e, ao mesmo tempo, continua responsável pela concentração da terra, êxodo rural, baixa escolaridade no campo, redução da biodiversidade, poluição, exclusão social, desvalorização do trabalho na agricultura, empobrecimento no meio rural, dentre outros problemas (CAPORAL & RAMOS, 2006). É neste contexto que Paulo Freire destaca-se como um dos primeiros críticos do processo educacional e da extensão convencional, com a proposta de estabelecer uma relação dialética entre o agricultor e o extensionista para que houvesse a construção de conhecimentos apropriados a cada realidade prevalecendo à troca de saberes como uma forma de (re) valorização da cultura local (FREIRE, 1971). Esse quadro, somado à crítica histórica ao extensionismo convencional, fez com que a sociedade brasileira optasse por uma nova Ater, voltada para o fortalecimento da agricultura familiar e preservação do meio ambiente, além do compromisso com estratégias e formatos tecnológicos que levassem ao desenvolvimento sustentável e a tipos de agriculturas que respeitassem mais a natureza e provocassem menos impactos (CAPORAL & RAMOS, 2006). Em 2003, o Ministério do Desenvolvimento Agrário - MDA passou a ser responsável pelas atividades de Assistência Técnica e Extensão Rural – Ater, como estabelece o Decreto Nº 4.739, de 13 de junho daquele ano. Por delegação da Secretaria da Agricultura Familiar – SAF, um grupo de técnicos coordenou a elaboração da nova Pnater, promovendo um amplo processo de consulta a partir de audiências, encontros e seminários envolvendo representações dos agricultores familiares, de movimentos sociais e de prestadoras de serviços de Ater governamentais e não governamentais. Este 9 processo democrático e participativo, que envolveu mais de 100 entidades e mais de 500 pessoas, levou à construção de alguns consensos e a um conjunto de acordos e redundou no documento que sintetiza a Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural (MDA, 2004). 3.3 A NOVA POLÍTICA DE ASSISTÊNCIA TÉCNICA E EXTENSÃO RURAL PNATER Frente aos desafios impostos pela necessidade de implementar estratégias de produção agropecuária que sejam compatíveis com os ideais do desenvolvimento sustentável, os aparatos públicos de Ater terão que transformar sua prática convencional e introduzir outras mudanças institucionais para que possam atender às novas exigências da sociedade. As crises econômica e socioambiental, geradas pelos estilos convencionais de desenvolvimento, recomendam uma clara ruptura com o modelo extensionista baseado na “Teoria da Difusão de Inovações” e nos tradicionais pacotes da “Revolução Verde”, substituindo-os por novos enfoques metodológicos e outro paradigma tecnológico, que sirvam como base para que a extensão rural pública possa alcançar novos objetivos (MDA, 2004). A nova política de extensão rural Ater contrapõe-se à antiga proposta, porque esta seguia o modelo desenvolvimentista e difusionista modernizador, traduzido por pacotes de inovações tecnológicas. Ao contrário, a novidade da proposta atual é a de substituir as velhas práticas por novos enfoques metodológicos e novas abordagens (LIMA & JESUS, 2006), trazendo a comunicação num modelo dialético e dialógico, visto que propõe-se a interação entre o conhecimento dos agricultores e o conhecimento dos técnicos, privilegiando a promoção da participação através de metodologias e enfoques coletivos e participativos, na construção do conhecimento onde o público, o campesinato, é valorizado pelo saber que traz e que pode construir conjuntamente com o saber técnico, numa abordagem de diálogo de saberes (LIMA, 2006). É neste contexto que a Pnater propõe às entidades e agentes de extensão rural que participem de um processo capaz de promover e apoiar estratégias que levem à sustentabilidade socioeconômica e ambiental no meio rural. Atuar, nessa nova perspectiva, requer das entidades, de seus diretores, de seus gerentes e de seus agentes 10 uma nova postura de trabalho, um novo papel e um novo perfil, além de uma atuação baseada em métodos e técnicas que estimulem a participação. Uma nova Ater precisa ser, verdadeiramente, uma ação educativa, democrática e participativa (CAPORAL & RAMOS, 2006), como observado na 1ª conferência de Ater. A Política de Assistência Técnica e Extensão Rural tendo como princípios a agroecologia, o diálogo entre os saberes tradicionais e científicos, a abordagem territorial, considerando as especificidades de cada bioma e as diferentes identidades territoriais, é um instrumento estratégico e essencial para o acesso às políticas públicas no meio rural, a organização produtiva e econômica, e a implantação e consolidação do novo desenvolvimento rural sustentável, e deve ser fortalecida e consolidada (MDA, 2012). A nova Ater descreve como seus objetivos, um serviço que tem em vistas a contribuição para a melhoria da renda, da segurança alimentar, da diversificação da produção, da recuperação dos ecossistemas, da produção de alimentos sadios entre outros (SCARAMELO et al., 2009). O modelo de desenvolvimento com o qual nos comprometemos, tem como fundamentos o ordenamento fundiário com a realização de uma ampla e massiva reforma agrária e a garantia dos direitos territoriais, defesa e conservação dos recursos naturais e bens comuns, o fim das desigualdades, a soberania e segurança alimentar e nutricional, o fortalecimento da produção familiar e comunitária livre de agrotóxicos e transgênicos, bem como o cooperativismo solidário como estratégias de inclusão política, social, produtiva e econômica, além da ampliação do mercado interno do país (MDA, 2012). A idéia de desenvolvimento ao qual essa extensão rural atual está ligada vem de uma política que visa ampliação das possibilidades e, consequentemente, aumento das liberdades e diminuição da dependência de alguns setores sociais, que historicamente foram marcados como ignorantes e incapazes (SCARAMELO et al., 2009). Como afirma SEN (2000), “as liberdades não estão ligadas somente à riqueza e sim a uma qualidade de vida. O desenvolvimento julgado pela ampliação das liberdades deve eliminar as privações das pessoas”. 11 Segundo a missão e os objetivos estabelecidos na Pnater, o processo produtivo agropecuário deve adotar estratégias que assegurem a preservação ambiental. Por essa razão, o conceito de desenvolvimento rural sustentável é repetidamente enfatizado e a adoção dos princípios da agroecologia é recomendada. Nessa perspectiva, a ação extensionista precisa fazer uso de tecnologias e de formas de manejo que levem à construção de uma agricultura de base ecológica e, ao mesmo tempo, fortaleçam relações sociais mais equitativas, não só entre os agricultores familiares, mas entre todos os atores envolvidos, de modo a preservar a natureza e caminhar na direção do desenvolvimento rural sustentável (CAPORAL & RAMOS, 2006). As novas concepções de agricultura, que tomam como base os pressupostos da agroecologia e do desenvolvimento sustentável, que tem por objetivo “melhorias em seis dimensões principais: econômica, social, ambiental, cultural, ética e política” (CAPORAL, 2002) merecem destaque, pois, acredita-se que essas novas abordagens e estratégias de trabalho poderão romper com o modelo “modernizante” das décadas anteriores (SCARAMELO et al.,2009). A construção de agriculturas sustentáveis requer, portanto, um marco tecnológico baseado em outro paradigma, que trate de estabelecer uma nova e qualificada aproximação entre Agronomia e Ecologia, que leve ao manejo integrado de sistemas complexos. Isto exige técnicas e formas de manejo que se articulem entre si, respeitando princípios ecológicos básicos e gerando sistemas de produção que se assemelhem, em seu desenho e em seu funcionamento, aos ecossistemas naturais onde estão inseridos. Por estas e outras razões de natureza científica, a ciência e a tecnologia necessárias para a o desenvolvimento rural sustentável, com inclusão social, com fortalecimento da agricultura familiar, com produção de alimentos sadios e com preservação ambiental, devem basear-se num paradigma ecossocial, buscando alicerçarse nos princípios e bases epistemológicas da Agroecologia (GUZMÁN & WOODGATE, 2002). No entanto, é necessário enfrentar e superar os seguintes desafios, segundo a Declaração da 1° Conferência de Assistência Técnica e Extensão Rural (MDA, 2012). 1. Qualificar e ampliar a oferta de serviços de ATER, na perspectiva da sua universalização; 2. Construir um sistema nacional de ATER integrando as esferas atuantes neste serviço no governo federal, nos governos estaduais e municipais e incluindo as entidades não 12 governamentais de ATER, as organizações da sociedade civil e os movimentos sociais; 3. Articular as esferas estatais federal, estaduais e municipais e as organizações da sociedade civil, assegurando nas suas especificidades condições igualitárias de acesso aos recursos e de prestação de serviço de qualidade; 4. Estruturar o MDA e o INCRA para que possam responder às crescentes demandas de expansão da ATER, evitando a interrupção dos serviços e a instabilidade nas entidades prestadoras de serviços, bem como fortalecer o CONDRAF e seus comitês permanentes, garantindo as condições para a plena efetivação da PNATER; 5. Garantir recursos financeiros e orçamentários suficientes para a universalização e boa qualidade dos serviços, sem cortes e contingenciamentos que desestabilizam a execução dos serviços e a implementação da Política; 6. Garantir a formação continuada dos profissionais de ATER nos princípios, práticas e métodos da agroecologia, garantindo a expansão de uma ATER de qualidade centrada na promoção do desenvolvimento rural sustentável; 7. Universalizar a ATER priorizando estratégias de inclusão para os povos indígenas, as comunidades quilombolas e os povos e comunidades tradicionais ainda hoje à margem deste serviço; 8. Garantir que a ATER reconheça o papel e importância das mulheres no desenvolvimento rural, por meio da promoção da autonomia econômica na gestão, na produção e na comercialização fortalecendo sua cidadania, seu processo organizativo e o seu protagonismo; 9. Estabelecer estratégias de atuação que propiciem o acesso às políticas públicas para a juventude do campo, respeitando suas especificidades, garantido a sua inclusão nas dinâmicas sociais, culturais e organizativas de produção, agregação de valor, comercialização, formação e educação contextualizada como forma de garantir a sua permanência no meio rural e a sucessão na agricultura familiar; 10. Ampliar e fortalecer os serviços de ATER que promovam o desenvolvimento sustentável dos assentamentos da Reforma Agrária tendo como referência os princípios da agroecologia orientado para a inclusão social e produtiva e a segurança e soberania alimentar e nutricional; 11. Articular as ações e recursos do programa Brasil Sem Miséria a outras políticas, de modo a integrar os setores mais pobres a processos de desenvolvimento local, 13 comunitário ou territorial envolvendo os setores sociais mais dinâmicos e organizados; 12. Aperfeiçoar os processos de identificação das demandas, de formulação das chamadas de ATER e planejamento de ações a partir das realidades locais, assegurando o protagonismo das entidades representativas do público da PNATER, de modo a viabilizar o uso das metodologias participativas e das práticas da agroecologia, definidas como princípios orientadores da PNATER; 13. Propiciar que a ATER contemple a sociodiversidade com metodologias, projetos e formação que considere os públicos do campo, da floresta e da água; 14. Estabelecer ações multidisciplinares para os povos indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais, buscando valorizar o conhecimento popular existente e o respeito a sua autonomia e a preservação de suas culturas, valores e tradições; 15. Ampliar e fortalecer o serviço de ATER que promova o desenvolvimento sustentável, propiciando o acesso a uma ATER diferenciada e adequada para as populações indígenas, quilombolas e demais povos e comunidades tradicionais, garantindo uma abordagem que considere sua diversidade cultural, contribuindo para preservação das tradições e promovendo o etnodesenvolvimento; 16. Reconhecer e fortalecer o cooperativismo solidário como instrumento de organização econômica da agricultura familiar, assentados/as da reforma agrária, povos indígenas, quilombolas, povos e comunidades tradicionais e demais segmentos citados e contemplados na PNATER; 17. Assegurar que a Conferência Nacional de ATER seja realizada a cada quatro anos com a finalidade de avaliar as diretrizes da PNATER e deliberar sobre a implementação da política, garantindo que tais deliberações sejam acolhidas no Plano Plurianual subseqüente. Nós, participantes da 1a Conferência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural, conclamamos o governo federal, os governos estaduais e municipais, o congresso nacional e a sociedade a responder positivamente e com urgência a estas demandas, para que a ATER possa cumprir com eficiência o seu papel estratégico na construção do Brasil que queremos: um país rico e sem pobreza. Para dar conta destes desafios, os serviços públicos de Ater (realizados por entidades estatais e não estatais) devem ser executados mediante o uso de metodologias participativas, devendo seus agentes desempenhar um papel educativo, atuando como 14 animadores e facilitadores de processos de desenvolvimento rural sustentável. Ao mesmo tempo, as ações de Ater devem privilegiar o potencial endógeno das comunidades e territórios, resgatar e interagir com os conhecimentos dos agricultores familiares e demais povos que vivem e trabalham no campo em regime de economia familiar, e estimular o uso sustentável dos recursos locais. Ao contrário da prática extensionista convencional, estruturada para transferir pacotes tecnológicos, a nova Ater pública deve atuar partindo do conhecimento e análise dos agroecossistemas e dos ecossistemas aquáticos, adotando um enfoque holístico e integrador de estratégias de desenvolvimento, além de uma abordagem sistêmica capaz de privilegiar a busca de eqüidade e inclusão social, bem como a adoção de bases tecnológicas que aproximem os processos produtivos das dinâmicas ecológicas (MDA, 2004). Neste contexto, se foi um avanço ter uma proposta oficial com tal perspectiva, um desafio é implementar na prática de Ater um novo paradigma de trabalho e de desenvolvimento. Sobre o trabalho ou a prática extensionista, observa-se a preocupação com a transição e de que forma preparar ou formar os profissionais para tal implementação. Neste sentido, algumas estratégias são pensadas tendo como ponto de partida um processo de capacitação de técnicos e assessores técnicos para assegurar a implantação de um enfoque de Ater baseado em processos educativos potencializadores do crescimento do ser humano como cidadão e de um desenvolvimento local sustentável (LIMA, 2006). Assim, o processo de capacitação para a transição deverá ter um conteúdo capaz de formar os profissionais para atuarem como agentes de desenvolvimento local, com condições de investigar, identificar e disponibilizar aos agricultores, demais públicos da extensão e aos conjuntos das pessoas que vivem no meio rural um conjunto de opções técnicas e não técnicas, compatíveis com as necessidades dos beneficiários e com o espaço territorial onde estejam inseridos (MDA, 2004). Deste modo, como contribuir com a formação de profissionais para que estes atuem como agentes de uma proposta com tamanha responsabilidade? Segundo o pensamento de Paulo Freire (1971), tal projeto de formação para atuação na extensão rural deve contemplar que: Na concepção crítica esta capacitação não é um ato ingênuo de transferir ou ‘depositar’ contendas técnicas. É, pelo contrário, o ato em que o 15 proceder técnico se oferece ao educando com um problema ao qual ele deve responder; (...) não se faz mediante um trabalho meramente intelectualista, mas sim na práxis verdadeira, que demanda a ação constante sobre a realidade e a reflexão sobre esta ação que implica num pensar e atuar corretamente (FREIRE, 1971). Portanto, a nova Ater vai buscar seu modelo teórico-pedagógico no construtivismo, cujo ponto central é a premissa de que o homem-agricultor possui um acúmulo de conhecimentos históricos, culturais, individuais ou coletivos que fazem com que ele esteja inserido no mundo do saber. Esses conhecimentos precisam ser valorizados e incorporados como elementos fundamentais de uma estratégia de desenvolvimento rural, o que é quase impossível conseguir utilizando-se os métodos persuasivos da tradição extensionista (CAPORAL & RAMOS, 2006). 3.4 NECESSIDADE DE UM NOVO PROFISSIONALISMO Entre os desafios de uma extensão rural para o desenvolvimento sustentável está a necessidade de estabelecer-se um “novo profissionalismo”. Em efeito, como sabemos, uma das deformações geradas pelo modelo de desenvolvimento rural e agrícola ainda vigente foi a transformação imposta aos modelos de educação e formação de profissionais das ciências agrárias e outras áreas do conhecimento. E, lamentavelmente, a absoluta maioria das escolas de nível médio e superior das ciências agrárias continuam com o mesmo perfil de formação profissional da época dos convênios do Ministério da Educação e United States Agency for International Development - MEC-Usaid (SCARAMELO et al., 2009). Além disso, não se pode esquecer que existem fortes implicações ideológicas e políticas no ensino, presentes na dimensão “meritocrática” e de competição (status) que conformam a concepção educativa das sociedades atuais e que acabam introduzindo na formação dos profissionais alguns valores éticos individualistas, que são dominantes na sociedade e que se reproduzem, posteriormente, nas atitudes individuais e na prática dos agentes (CAPORAL, 2006). A partir dessa formação muitos profissionais ainda definem como o mais moderno e como ciência, certas práticas e experiências aprendidas apenas nas 16 universidades. Relegam e desclassificam no plano de superstições e descabimento, os anseios dos agricultores familiares e assentados. As experiências no campo, ou até mesmo a falta desta, no caso dos “rurbanos”, não tem merecido atenção devida de muitos técnicos, por inexperiência ou por puro preconceito. Sobre essa separação valorativa dos saberes, surge o dilema em que se acredita que apenas o saber produzido por instituição científica e de pesquisa é capaz de solucionar ou produzir soluções para a vida humana (COELHO, 2005). Muitas vezes não há essa possibilidade ou liberdade de ruptura em muitos dos cursos que formam profissionais para atuarem no meio rural. Muitos ainda são preparados para levar a tecnologia (mercadoria) salvadora, a partir da ideia de que “é vendendo produtos em empresa de insumos que vocês ficarão ricos”; “as Ematers pagam pouco”. Esse é um discurso muito comum entre docentes das agrárias. Quando muito, cria-se a expectativa nos estudantes de que eles serão agentes que irão retirar o campo do atraso e inserindo o agricultor no mercado por meio do aumento da produtividade, via uso de insumos industriais e maquinários. A base pedagógica dessas expectativas é uma concepção de educação que apenas transfere “conhecimentos” aos agricultores. Assim, muitos extensionistas, antes de indagar por que o agricultor faz assim e não do outro jeito, o técnico/ profissional, cientificado e academizado, considera que ele “faz tudo errado”, ou simplesmente conclui que “não é assim que se faz”. (COELHO, 2005). Segundo Coelho (2005), ainda permanece a idéia que só o conhecimento técnico organizado e codificado pela Universidade e instituições de pesquisa possui legitimidade para solucionar problemas cotidianos com competência. Ao longo da história da institucionalização das profissões agrárias, essa foi a dinâmica de conhecimento e de extensão que se contemplou. Nessa dinâmica de produção do saber, criaram-se um novo “Habitus” de investigação e as primeiras diferenciações profissionais, pois uns se encarregavam da pesquisa e outros da difusão do conhecimento mercadoria. Em realidade, em vez de formar profissionais que entendam as condições específicas e totalizadoras inerentes aos ecossistemas e agroecossistemas, o ensino nas universidades e escolas agrotécnicas brasileiras adotou um modelo que privilegia a divisão disciplinar, a especialização e, por conseqüência, os profissionais egressos sabem mesmo é fazer difusão de receitas técnicas e pacotes tecnológicos. Assim, os 17 profissionais que saem destas instituições de ensino, em geral, não tiveram a oportunidade de chegar a uma compreensão da agricultura como uma atividade que, ademais de sua "função de produzir bens", é um processo que implica uma relação entre o homem e o ecossistema onde vive e trabalha, sem considerar também, que, para muitos agricultores e agricultoras familiares, a atividade que desenvolvem é parte de seu modo de vida e não apenas um negócio. Em geral, durante a formação profissional não se faz sequer um momento de integração das disciplinas. Cada uma delas é repassada aos alunos em sua própria “gaveta”, isolada das demais e, quase sempre, alheia à realidade objetiva das pessoas e dos processos produtivos concretos. Esta primeira carência na formação limita os profissionais quanto à possibilidade de ter uma visão holística da realidade na qual vai atuar, o que minimiza sua possibilidade de ter uma compreensão da agricultura a partir dos princípios básicos dos processos naturais (CAPORAL, 2006). A segunda grande deformação na formação dos profissionais das ciências rurais e agrárias, segundo Caporal (2006), está relacionada com a distância abstrata com que se trata ao homem-agricultor. Em geral, se estuda muito sobre as máquinas e os insumos, o solo como substrato para sustentação da produção, são estudadas algumas culturas e a criação de alguns animais domésticos, mas muito pouco se estuda sobre o homem e a mulher trabalhadores da agricultura e o papel decisivo que eles têm na agricultura. O ensino costuma basear-se numa visão da agricultura como um conjunto de técnicas agrícolas aplicadas, sequer conseguindo integrar a agronomia com a ecologia. Portanto, a formação determina um estilo de profissionalismo, que pode ser entendido como um “profissionalismo normal”, ou seja, como aquele que se refere ao pensamento, valores, métodos e comportamentos dominantes em uma profissão ou disciplina, de maneira que, como a ciência normal, o profissionalismo normal é conservador, baseado numa estrutura de geração e transferência de conhecimentos, reforçada pela educação e pelo treinamento, pela hierarquia das organizações e por pautas de recompensa e carreiras, que tendem a reproduzir ações profissionais também conservadoras (CAPORAL, 2006). Logo, a implementação da Pnater exige um amplo processo de formação de profissionais com outro perfil, cujas bases podem ser buscadas nos conceitos, princípios e objetivos estabelecidos na Política Nacional de Ater. 18 Vale lembrar a necessidade de um novo profissionalismo, como afirma Chambers (1997), entre os problemas que dizem respeito às possibilidades de mudança, há uma inquietude permanente: se nós, como profissionais do desenvolvimento, temos sentimentos e mudaremos nosso comportamento, isto é, se estamos dispostos a abraçar as possibilidades de mudança e a atuar de forma inversa à convencional. Os desafios são lançados a todos. Para nós, os extensionistas, o principal desafio é conseguir falar menos e escutar mais; aprender a aprender e a facilitar processos de aprendizagem; proporcionar opções e serviços responsáveis e comprometidos com os beneficiários, que sejam animados por um novo profissionalismo. Não se trata, evidentemente, de uma mudança que afetaria só os extensionistas. Chambers (1997) também atribui responsabilidades a outros profissionais: para ele, economistas e burocratas devem apoiar a diversidade local; professores de universidades, institutos e escolas devem ir com seus alunos às comunidades para aprender, devem revisar os currículos, reescrever os livros de texto, dar menos aulas e ajudar mais os outros a aprender (CAPORAL & RAMOS, 2006). Com base nas afirmativas apresentadas até agora, pode-se afirmar que a nova extensão rural exige um “novo profissionalismo”, que se caracterize, em primeiro lugar, pela capacidade de colocar e ver as pessoas antes das coisas, com especial atenção aos grupos menos favorecidos. Como já se destacou, os métodos ajudam, mas não são suficientes para construir novas relações entre agentes de Ater e agricultores, de modo que os profissionais da Extensão Rural Agroecológica deveriam assumir novos conceitos, valores e comportamentos, ademais de novos métodos. Deve-se considerar que este “novo profissionalismo” é necessário, inclusive porque os métodos não são neutros, já que correspondem a contextos sociais, ideológicos, políticos e históricos, de modo que podem ser utilizados para levar a uma genuína capacidade de construção e organização, assim como podem ser utilizados apenas para satisfazer objetivos externos (PRETTY, 1995). Assim, segundo o mesmo autor, o “novo profissionalismo” requer que se reconheça que nem sempre o que pensamos e estabelecemos como necessidades dos indivíduos e grupos assistidos, correspondem às necessidades sentidas por eles mesmos, de modo que o agente deveria estar, cotidianamente, em busca dos valores próprios dos beneficiários. Por outro lado, estabelecer um “novo profissionalismo” exige que, ao contrário da especialização profissional, se adote uma formação mais multidisciplinar 19 ou pelo menos se amplie a capacidade de interagir com outras profissões e disciplinas. Como destacam diversos autores, este “novo profissionalismo” é mais um grande desafio, de modo que os agentes não devem se intimidar frente à complexidade e incerteza, próprios de ações que devem estar baseadas no diálogo e na participação. Portanto, há que se criar mecanismos capazes de influir na mudança curricular, pelo menos das ciências agrárias, de modo que possam ser estabelecidos currículos capazes de formar profissionais que tenham as habilidades para olhar a realidade com as lentes de um novo paradigma e atuar a partir de uma compreensão multidisciplinar e humanista e adotando métodos e pedagogias construtivistas. Em verdade, cabe às escolas de nível médio e às universidades, a iniciativa do processo de mudança curricular necessária para atender os imperativos do desenvolvimento sustentável e das novas práticas exigidas pela Pnater. Se não o fizerem, seguirão formando profissionais para o passado e não para o futuro (CAPORAL, 2006). O profissional da Ater, ao contrário do tradicional difusor de tecnologias, deve ser um mediador e um facilitador de processos de desenvolvimento, dando-se conta de que atua numa realidade concreta da qual faz parte e sobre a qual tem influência. Röling (1994) afirma que o processo de transição para a agricultura sustentável exige uma contínua observação do meio físico e uma permanente retro-alimentação, de forma que permita a construção de um corpo de dados, conhecimentos e saberes que serão mais profundos com o passar do tempo. Portanto, é preciso compreender que a informação técnica sozinha é insuficiente e que um novo enfoque extensionista deve estar baseado no paradigma da facilitação, pois ele é mais adequado para apoiar o desenvolvimento e a agricultura sustentáveis. 4. METODOLOGIA 4.1 PROPOSTA METODOLÓGICA Para a realização desta pesquisa foram realizadas entrevistas com agricultores familiares e discentes que cursavam o último período em cursos de ciências agrárias da UFVJM. Além das entrevistas, recorreu-se a observação participante para que o pesquisador avaliasse, no dia a dia da atividade extensionista, dificuldades e facilidades ao exercício do trabalho, que é o objetivo deste estudo. 20 Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com caráter exploratório, em uma amostra de 15 agricultores familiares para analisar a percepção dos mesmos em relação à assistência técnica e extensão rural recebida em suas propriedades ou em seus sistemas de produção. Quanto a composição da amostra, 60% se encontram na faixa etária de 40 a 60 anos de idade, 13,3% se encontram acima da idade de 60 anos e os outros 26,6% encontra-se na faixa etária de 30 a 40 anos de idade. Nessa mesma análise observa-se que 60% dos agricultores familiares são do sexo masculino e 40% do sexo feminino, sendo seu tempo de atuação como agricultores: 26,6% se encontram no campo entre 10 a 20 anos, 13,3% de 20 a 30 anos, 46,6% de 30 a 40 anos e 13,3% de 40 a 50 anos. Também foram realizadas entrevistas com alunos formandos dos cursos de ciências agrárias da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri – UFVJM, para analisar a percepção sobre a sua aptidão e/ou competência no serviço de assistência técnica e extensão rural. Observamos que do universo dos entrevistados que 100% se encontram numa faixa etária de 21 a 27 anos de idade, concentrando-se a grande maioria, ou seja, 80% entre 24 e 26 e que 93,3% são do sexo masculino. No referente ao estágio curricular foram executadas técnicas extensionistas visando o processo de educação não formal de forma contínua, sendo elas: Dinâmica de Grupo; Palestra Técnica; Mini-curso; Reunião; Demonstração Técnica; Dia de Campo e Visita Técnica. A Unidade Regional da Empresa de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER – MG), onde foi realizado o estágio que fomentou esta pesquisa, localiza-se na Rua Herculano Pena, número 133, Bairro Rio Grande, Diamantina, Minas Gerais. O trabalho realizado consistia em atender as comunidades rurais do distrito de Diamantina, sendo elas: Comunidade da Sopa, localizada a 15 Km de Diamantina, contando com a produção de hortaliças em horta comunitária; Comunidade de São João da Chapada, localizada a 33 Km de Diamantina, contando com o Grupo de Mulheres (22) responsáveis pela horta comunitária; Comunidade do Vau, localizada a 30 Km de Diamantina, atendendo a Associação de pequenos produtores; Comunidade do Inhaí, localizada a 45 Km de Diamantina, atendendo a Associação de agricultores familiares; Comunidade de Vargem do Inhaí, localizada a 60 Km de Diamantina, atendendo ao grupo beneficiários da fábrica de rapadura na comunidade; Comunidade de Maria Nunes, localizada a 42 Km de Diamantina, contando com o “Grupo de Fruticultura de 21 Maria Nunes” o cultivo da cultura do abacaxizeiro; Distrito de Conselheiro Mata, localizado a 46 Km de Diamantina, na Fazenda Senhor Antônio, cultivo do maracujazeiro; Distrito de Planalto de Minas, localizado a 72 Km de Diamantina, em uma Unidade Experimental, através do cultivo consorciado das culturas de mandioca, milho e feijão. Através do trabalho desenvolvido nestas Comunidades, adotou-se para esta pesquisa a metodologia da observação participativa, a qual permitiu estabelecer uma relação mais próxima com a Comunidade e, assim, perceber as dificuldades encontradas pelos agentes extensionistas (estudantes/agentes) que atuam no campo e nesta função. 5. RESULTADOS E DISCUSSÃO 5.1 A Percepção dos Agricultores e Agricultoras Familiares Do total de entrevistados 26,6% responderam que recebem assistência técnica diretamente, ou seja, por órgão governamental, neste caso a Emater, e que compreendem bem a tecnologia que é repassada. Alegou-se que técnicos mais experientes possuem uma linguagem adaptada, ou seja, a linguagem do produtor, adquirida pelo convívio com os agricultores facilitando a compreensão de todos envolvidos e não uma linguagem técnica. 73,3% responderam que não recebem assistência técnica nem de órgão governamental e nem de ONGs. A tecnologia repassada para este grupo é de forma indireta, sendo responsáveis por este repasse, líderes comunitários. Os agricultores que recebem assistência técnica de forma direta, responderam que a própria é repassada em suas propriedades e/ou lavouras e em reunião junto à associação. Os agricultores que recebem assistência técnica de forma indireta alegaramse ter recebido o repasse em reunião junto à associação. Questionando-se os agricultores se necessitavam de assistência técnica e como gostariam de receber essa assistência, 100% dos entrevistados alegaram que realmente a assistência técnica é essencial para eficiência do seu sistema produtivo. A principal reivindicação desses produtores é a questão da orientação técnica, ambiental, social e política dentro de suas propriedades e comunidades. Sobre a questão de como receber a 22 assistência, relataram que gostariam que fossem abordados com uma linguagem clara, ou seja, linguagem do produtor e não técnica, com acompanhamento e participação mais frequente do técnico, semanal ou quinzenal, com intuito de compreender melhor seus costumes e adquirir confiança da comunidade e visitas com disponibilidade de tempo maior, mais técnicos atuantes e com iniciativa, não sendo preciso chama-los para a visita. Questionado se a assistência técnica que recebem é suficiente para que ocorra evolução técnica e socioambiental de sua propriedade ou comunidade e se o técnico de Ater é capacitado de atender as suas necessidades, do total de entrevistados, os que alegam que recebem assistência técnica, 26,6% confirmam que sim, ou seja, os técnicos de Ater orientam bem os agricultores nas questões práticas e socioambientais e são capacitados em atender suas necessidades pelo fato de ter a linguagem do produtor e conhecimento técnico desejável. Percebe-se a necessidade de reformas estruturais e políticas na atuação dos serviços de Ater para o atendimento das necessidades reais desses agricultores corroborando o que os delegados/as da 1ª Conferência Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural - CNATER, que envolveu no processo de preparação mais de 40 mil participantes em conferências municipais, intermunicipais, territoriais, estaduais, setoriais e temáticas reunidos em Brasília entre os dias 23 e 26 de abril de 2012, quando reafirmaram a importância estratégica da Ater pública, de qualidade, gratuita e continuada, executada por instituições estatais e não estatais, para a construção do desenvolvimento rural sustentável e solidário tendo como protagonistas trabalhadores/as rurais, camponeses/as, acampados/as, assentados/as da reforma agrária, povos indígenas, povos de terreiro e ciganos/as, quilombolas, açorianos/as, atingidos/as por barragens mineradoras e hidrelétricas, extrativistas, seringueiros/as, quebradeiras de coco, fundos de pasto, faxinalenses, pescadores/as ar tesanais, ribeirinhos/as, aquicultores/as familiares, caiçaras, marisqueiros/as, retireiros/as, torrãozeiros/as, geraizeiros/as, vazanteiros/as, pomeranos/as, pantaneiros/as, caatingueiros/as, dentre outros/as segmentos citados e contemplados na Pnater, assim como as organizações que os representam. No que tange ao atendimento recebido percebe-se a necessidade de reformas curriculares para inserção de conhecimentos na prática da Extensão Rural devido a sua 23 complexidade de atuação e conhecimento generalistas e específicos exigidos, sendo muitas vezes de caráter interdisciplinar. 5.2 Formandos de Ciências Agrárias Questionado aos alunos formandos se reconheciam o que se entendia sobre assistência técnica, 100% dos entrevistados confirmaram que sim, baseando-se no princípio que a assistência técnica seria o processo de difundir o conhecimento técnico cientifico adquirido na universidade através de orientações, assessoramento, auxilio e apoio aos produtores rurais, visando o aumento da produtividade e rentabilidade de suas atividades. Questionado aos alunos formandos se reconheciam o que se entendia sobre extensão rural, 100% dos entrevistados confirmaram que sim, baseando-se no contexto da difusão de tecnologias, ou seja, transferir o conhecimento adquirido na universidade para o campo, introduzindo nos produtores novas tecnologias visando melhorias na produção e inserção nos mercado. Questionado aos alunos formandos se sentiam preparados para atuar na assistência técnica, 33,3% dos entrevistados responderam que não se sentiam preparados pela falta de prática, citando essa deficiência como papel da universidade. 66,6% dos entrevistados responderam que sim, ou seja, sentem preparado para atuar na assistência técnica, sendo que 70% acham que o conhecimento adquirido na universidade é suficiente para credencia-lo para atuação, 30% responderam que sentem preparados pelo fato de ter experiência prática adquirida fora da universidade. Questionado aos alunos formandos se sentiam preparados para na atuar na extensão rural, 53,3% confirmaram que não, sendo 100% destes justificando a falta de prática. 46,6% confirmaram que se sentem aptos para atuar como extensionistas, sendo que, 42,8% destes justificam ter prática na área e adquiriram fora da universidade, 57,15% justificam que a formação acadêmica o credencia para atuar, porém a falta de prática os deixam inseguros. Questionado aos entrevistados se já atuaram na área de extensão rural e quais a dificuldades encontradas 53,3% nunca atuaram e 46,6% já atuaram, apontando como principais dificuldades a adaptação de linguagem direcionada para o agricultor, adequação a realidade local, falta de conhecimento técnico, abordagem técnica e o 24 caráter difusionista na prática de extensão, onde a política pública tende a influenciar os agentes de Ater pela demanda de mercado. Percebe-se aqui que a partir de um conceito errôneo do processo educativo na atuação em extensão rural e o apoio técnico aos sistemas produtivos gerados na academia leva os profissionais de Ater a equívocas atuações junto ao seu público alvo devido a imposição institucional do cumprimento de metas impostas pelos programas e políticas públicas governamentais onde os indicadores de desenvolvimento são apenas numero de beneficiários atendidos. Além disso, percebe-se a formação voltada para o tecnicismo e produtividade do agronegócio. 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Considerando a forma como os agricultores familiares pretendem e precisam receber assistência técnica em suas comunidades e/ou propriedades, e como os acadêmicos formandos em ciências agrárias compreendem a assistência técnica e extensão rural, torna-se necessário uma reformulação curricular que garanta a formação do profissional de Ater para atender as novas exigências da sociedade para o desenvolvimento rural sustentável baseando-se nas diretrizes da Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. A partir da análise de observação participativa durante o estágio realizado nas comunidades pertencentes ao Distrito de Diamantina, observa-se se que os jovens não se encontram de forma ativa na zona rural e que as mulheres são a minoria nas atividades. Percebemos aqui a necessidade de construção de políticas públicas direcionadas à inserção das mulheres e dos jovens nas atividades rurais, o que implica a necessidade de um profissional que atue na área de mobilização comunitária, formação de lideranças e treinados pela academia. Portanto, a partir das dificuldades encontradas durante o estágio e da análise das entrevistas aplicadas torna-se necessário que o estudante, durante a sua formação, compreenda de forma clara e objetiva as possibilidades que os cercam como profissionais de ciências agrárias, e que as unidades de formação contribuam com essa percepção através da interação de disciplinas, estágios direcionados às áreas de atuação, práticas nas disciplinas e/ou entre disciplinas, vivência no meio rural, dentre outras práticas que possibilitem uma maior interação dos estudantes com as realidades do meio 25 rural, afim de prepará-los para atuarem de forma coerente com a realidade local e regional. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS CAPORAL, F. R. Política Nacional de Ater: primeiros passos de sua implementação e alguns obstáculos e desafios a serem enfrentados. In: RAMOS, L.; TAVARES, J. (Org.). Assistência Técnica e Extensão Rural: construindo o conhecimento agroecológico. Manaus: Ed. Bagaço, 2006. p. 9-34. CAPORAL, F. R.; COSTABEBER, J. A. Agroecologia e desenvolvimento rural sustentável. Perspectiva para uma nova extensão rural, v.1, nº1, p. 16-37, jan./mar., 2000. CAPORAL, F. R; RAMOS, L. F. Da extensão rural convencional à extensão rural para o desenvolvimento sustentável: Enfrentar desafios para romper a inércia. Disponível em: http://www.agroeco.org/socla/archivospdf/Da%20Extenso%20Rural%20Conven cional %20%20Extenso%20Rural%20para.pdf. 2006. CAPORAL, Francisco Roberto. Recolocando as coisas nos seus devidos lugares: um manifesto em defesa da extensão rural pública e gratuita para agricultura familiar. In.: Seminário Nacional: Decidindo políticas de extensão rural para o Brasil. 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A Pesquisa na Prática da Extensão Rural para o Desenvolvimento Sustentável: Alguns fundamentos epistemológicos. Recife, UFRPE. Doc mimeo. 2006. MDA - MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. MDA/SAF/Dater. 2004. MDA - MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO AGRÁRIO Política Nacional de Assistência Técnica e Extensão Rural. MDA/SAF/Dater. 2012. Acesso em setembro de 2012. Disponível em: < http://www.mda.gov.br/portal/noticias/item?item_id=9627230. PNATER, 2007. Política Nacional de Ater - Assistência técnica e extensão Rural. Brasília: Ministério do Desenvolvimento Agrário, Secretaria de Agricultura Familiar, Departamento de Assistência Técnica e Extensão Rural, 2007, 26p. PORTILHO, M. S. B. Extensão Rural: história e prática educativa informal. Educação e Filosofia, 13 (26) 129-140, jul./dez. 1999. PRETTY, J. N. Participatory Learning for Sustainable Agriculture. In: World Development, vol. 23, nº 8 pp. 1247-1263, 1995. RÖLING, N. 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São Paulo: Companhia das Letras, 2000. 27 ANEXO 01 Agricultor Familiar 1 - Nome: _____________________________________________________________________ Idade: _____ Sexo: M ( ) F( ) 2 - Quanto tempo atua como agricultor familiar? ______________________________________________________________________ 3 - Recebe assistência técnica? Sim ( ) Não ( ) Quanto tempo? ______________________________________________________________________ 4 - A assistência técnica que você recebe é: de órgão governamental (EMATER, IDENE, outros) ou órgão não governamental (ONGs)? ______________________________________________________________________ 5 - Você compreende a tecnologia que lhe é repassado? Sim ( ) Não ( ) Por que? ______________________________________________________________________ 6 - A assistência técnica que lhe é repassada ocorre em sua casa ou em reunião junto à associação? ______________________________________________________________________ 7 - Você acha que precisa de assistência técnica? Sim ( ) Não ( ) Por que? ______________________________________________________________________ 8 - Como você gostaria de receber essa assistência técnica? ______________________________________________________________________ 9 - A assistência que recebe é suficiente para que ocorra evolução prática e socioambiental em sua propriedade e/ou comunidade? Sim ( ) Não ( ) Por que? ______________________________________________________________________ 10 - Você acha o técnico de ATER é capacitado de atender suas necessidades? Sim ( ) Não ( ) Por que? 28 ANEXO 02 Alunos Formandos 1 - Nome: _____________________________________________________________________ Idade: _____ Sexo: M ( ) F( ) 2 - Curso __________________________________ Período ____________________ 3 - Você sabe o que é assistência técnica? Sim ( ) Não ( ) ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 4 – Você sabe o que é extensão rural? Sim ( ) Não ( ) ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 5 - Você se acha preparado para atuar na Assistência técnica? Sim ( ) Não ( ) Por que? ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 6 – Você se acha preparado para atuar na extensão rural? Sim ( ) Não ( ) Por que? ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 7 - Se já atuou na área de extensão rural qual/quais as principais dificuldades encontradas? ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ ______________________________________________________________________ 29