XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 IMAGINÁRIO DE PROFESSORES SOBRE OS ALUNOS E CONFLITO NA ESCOLA Joyce Mary Adam de Paula e Silva – UNESP/Rio Claro Claudia M. S. Scotuzzi – SEE/Limeira Ana Beatriz Herminio – UNESP/Rio Claro Resumo: Considera-se que os conflitos e as dificuldades encontradas pela escola para desenvolver seu trabalho tem como elemento central o imaginário que professores possuem em relação ao espaço escolar, aos alunos e suas famílias. Assim, este trabalho tem como objetivo principal estudar o imaginário sobre os alunos que os professores das duas escolas estudadas possuem e a relação desse fato com os conflitos escolares. O referencial de análise fornecido pela sociologia do imaginário tem uma contribuição fundamental como referencial metodológico no estudo da instituição escolar por considerarmos que o conceito de imaginário vai além das construções intelectuais que podem ser elaboradas pelos sujeitos, manifestando-se concretamente nas imagens, histórias e lendas criadas por estes. O estudo foi realizado em duas escolas da periferia de uma cidade no interior do Estado de São Paulo. Palavras chave: imaginário e escola; relação professor-aluno; conflitos na escola. Introdução O presente trabalho refere-se ao estudo do imaginário de professores de duas escolas de periferia de uma cidade do interior do Estado de São Paulo. As duas escolas estão localizadas no mesmo bairro da cidade, em uma região considerada área prioritária pela Prefeitura Municipal para a prevenção da violência de jovens. Esta região, dada as carências socioeconômicas e os índices de violência urbana e criminalidade que apresenta, é considerada região foco do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (PRONASCI), conforme definido pela Prefeitura do Município. Considera-se que os conflitos e as dificuldades encontradas pela escola para desenvolver seu trabalho tem como elemento central o imaginário que professores possuem em relação ao espaço escolar, aos alunos e suas famílias. Assim, este trabalho tem como objetivo principal estudar o imaginário sobre os alunos que os professores das duas escolas estudadas possuem e a relação desse fato com os conflitos escolares. A técnica de pesquisa utilizada foi a de solicitar aos professores que em primeiro lugar respondessem a um questionário individual (anexo X). Após a resposta individual foram recolhidas as respostas, formados grupos e distribuído a cada grupo as respostas aleatoriamente, de maneira que quem respondeu participasse de grupo distinto ao da análise da resposta. As respostas foram analisadas por cada grupo e Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000742 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 2 posteriormente foi solicitado a cada grupo que fizesse um cartaz utilizando recortes de revista, que expressassem as principais questões respondidas pelos colegas. Na análise dos dados foram levadas em conta tanto as respostas dadas aos questionários quanto os cartazes feitos por cada grupo. A seleção das figuras e frases expressas nos cartazes foi considerada um fator de análise importante por corresponder ao que os professores consideraram questão fundamental. Na escola 1 participaram da dinâmica 21 professores e na escola 2 33 professores que dão aulas no Ciclo II do Ensino Fundamental, correspondendo a aproximadamente 40 % do total de professores de cada escola. A contribuição dos estudos sobre imaginário para a análise da instituição escolar. O referencial de análise fornecido pela sociologia do imaginário tem uma contribuição fundamental como referencial metodológico no estudo da instituição escolar por considerarmos que o conceito de imaginário vai além das construções intelectuais que podem ser elaboradas pelos sujeitos, manifestando-se concretamente nas imagens, histórias e lendas criadas por estes. Dessa forma o imaginário está presente tanto na estrutura e nas ações cotidianas como nos valores, princípios e cultura de cada grupo social. Taylor (2006) diferencia imaginário social e teoria social, em primeiro lugar por considerar o imaginário como sendo a forma como as pessoas “imaginam” seu entorno social apresentando-o por meio da cultura; em segundo lugar por considerar que a teoria é limitada a uma pequena minoria, enquanto que o imaginário é uma concepção coletiva de amplos grupos de pessoas senão da sociedade em seu conjunto; por último considera que o imaginário social é o que faz possível as práticas comuns e as legitimações das mesmas, dando sentido a tais ações enquanto grupo. O imaginário social na concepção de Taylor não é apenas ideologia, mas define conceitos e práticas que caracterizam os diferentes contextos históricos econômicos e sociais. Outro autor que trabalha com o conceito de imaginário e sua importância para a compreensão das instituições é Castoriadis (1982), que nos fala sobre o significado do imaginário na constituição das instituições, juntando imaginário e funcionalidade como elementos complementares nesse processo. Afirma que a instituição é uma rede simbólica, socialmente sancionada, onde combinam em proporções e em relações variáveis um componente funcional e um componente imaginário. (pág. 159). Tais afirmações de Castoriadis vêm no sentido de reafirmar o papel do imaginário na constituição das estruturas da sociedade, a partir da ação humana. Quando afirmamos, no caso da instituição que o imaginário só representa um papel porque há problemas “reais” que os homens não conseguem resolver, esquecemos, pois, por um lado, que os homens Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000743 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 3 só chegam precisamente a resolver esses problemas reais, na medida em que se apresentam, porque são capazes do imaginário; e por outro lado, que esses problemas só podem ser problemas, só se constituem como estes problemas que tal época ou tal sociedade se propõem resolver, em função de uma imaginária central da época ou da sociedade considerada. (pág. 162) Tais palavras de Castoriadis chamam a atenção para o poder do imaginário tanto em relação aos problemas reais criados em cada época como para a resolução dos mesmos a partir do imaginário. Assim, o imaginário não é só constituinte do problema como também está presente nos encaminhamentos dado pela sociedade, encaminhamentos estes que legitimam as ações correspondentes. Sintetizando as idéias dos dois autores citados podemos concluir que estes destacam o papel dos imaginários, criados nos diferentes contextos econômicos e sociais, como orientadores dos desenhos das estruturas sociais, bem como das verdades, valores, e ações que são legitimadas pelos indivíduos. Dessa forma, ao mesmo tempo em que o imaginário orienta o formato das instituições ele é construído pelos sujeitos em seu cotidiano. O imaginário que os diferentes grupos sociais têm de si mesmos e do contexto social, econômico e político, orienta e organiza as concepções de sujeito e os modelos de cidadão aceitos como participantes do grupo social. Nessas concepções surgem os incluídos e os excluídos, os aceitos e os não aceitos que de maneira inconsciente ou consciente minam as concepções de igualdade e justiça. Adotando este referencial para a análise da escola, consideramos que o imaginário a respeito da escola, construído por seus participantes, é um elemento importante para a compreensão das ações cotidianas, sua estrutura, relações de poder estabelecidas e os conflitos advindos dessas interações. Assim, as relações que se processam no cotidiano da escola são práticas estabelecidas e legitimadas pelo imaginário minimamente compartilhado e negociado entre seus membros, que se manifesta nas ações cotidianas. Portanto as relações na escola precisam ser compreendidas nessa dimensão maior que não somente a do individuo enquanto consciência individual, mas também enquanto ser social que elabora e reelabora os conceitos, impressões e sentimentos a partir das relações com o mundo vivido e experienciado tanto intra como extra-instituição. Retomando a idéia do imaginário de cada época como elemento importante na constituição das ações praticadas pelos diferentes setores sociais, trazemos aqui algumas reflexões sobre algumas características que compõem o imaginário do contexto econômico, político e social atual. Taylor (2006) coloca a questão de que o que imaginamos pode ser algo novo, construtivo, algo que abra novas possibilidades, mas também pode ser pura ficção, talvez perigosamente falsa. Coloca a pergunta sobre a possibilidade do falseamento do imaginário no Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000744 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 4 sentido de que este possa esconder ou ocultar certas realidades cruciais. Para esta questão responde claramente que sim e como exemplo cita nossa auto-imagem de cidadãos iguais em um Estado democrático que ignora a exclusão e a desigualdade de nossa sociedade. Sua argumentação é a de que se entendemos a “igualdade” como algo mais que um princípio legitimador, quer dizer, se imaginamos isto como uma realidade plenamente efetiva, o que temos feito é falsear a realidade, desviar o olhar para não ver os diversos grupos excluídos ou despossuídos ou imaginar que são os únicos responsáveis por sua situação (p.211). As conseqüências da desigualdade social para a produção da violência social e o reflexo na vida dos jovens têm sido estudadas por muitos pesquisadores em todo mundo. No Brasil, Zaluar, em diferentes artigos (2001, 1994, 1998 e 1999) aponta para o fator institucional da desigualdade no Brasil, e a conseqüência da mesma para a vulnerabilidade dos jovens pobres. Citando Dellasoppa et all (1999), destaca que estes consideram o modelo de desigualdade social do país como o que melhor explicaria as “causas” da violência no Brasil. Nessa linha de raciocínio, quando trazemos para análise a escola imaginada como instituição igualitária e justa, vemos que caímos no mesmo falseamento da realidade apresentada por Taylor, muito bem colocado por Dubet (2004) e por Martucelli (2001). Esses autores trazem questões que contribuem para a reflexão sobre o papel da escola e o imaginário que a circunda na sociedade atual e que são importantes para a discussão sobre a produção e reprodução da violência em seu interior. Ao discutir o que seria uma escola justa, Dubet (2004, p. 540) apresenta questões que colocam em cheque a ideia do modelo de igualdade de oportunidades meritocrático que pressupõe como sendo justo uma oferta escolar perfeitamente igual e objetiva, ignorando as desigualdades sociais dos alunos. Esta é uma questão presente no mundo todo e como aponta Dubet, nos diferentes países as pesquisas mostram que a escola que é freqüentada por alunos menos favorecidos, em geral, apresenta problemas semelhantes tais como: os entraves são mais rígidos para os mais pobres, a estabilidade das equipes docentes é menor nos bairros difíceis, a expectativa dos professores é menos favorável às famílias desfavorecidas, que se mostram mais ausentes e menos informadas nas reuniões de orientação, etc. Nesse sentido, a violência que se apresenta nas escolas, ainda tem um diferencial em termos de sua categorização e origem, mas é menos controlada nas escolas frequentadas pelos alunos menos favorecidos, que no caso do Brasil são as escolas públicas. A criminalização de ações que se enquadram na categoria de incivilidades é um elemento importante na discussão da violência escolar, pois como tem sido apontado por autores como Wacquant (2007), o comportamento dos jovens de periferia que muitas vezes aparentam ameaçadores para a sociedade e no caso em particular da escola aos professores, trata-se de uma reação às instituições sociais. De maneira geral, muitas instituições deixaram de Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000745 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 5 ter legitimidade para os jovens por não conseguirem oferecer a eles uma perspectiva de inserção social, mostrando-lhes um horizonte turvo e dentro de um cotidiano de miséria moral e material. Outro aspecto importante na discussão dos padrões de interação que vão se estabelecer na escola e que contribui para a produção e reprodução da violência escolar é o significado do conhecimento e da escola como instituição, aspecto este que a nosso ver se relaciona diretamente com o imaginário sobre a escola. Nesse sentido, Martucelli traz uma reflexão que contribui para esta discussão, que é a expectativa que envolve a escola em termos de sua responsabilidade para com a formação dos conceitos éticos e morais. Afirma que na modernidade, a escola, além de suas funções de transmissão de conhecimentos e de seleção social, tem sido associada a um duplo processo: por um lado, deveria permitir a integração dos indivíduos em sua sociedade, garantindo a continuidade da vida social. Por outro, norteia-se por uma figura ideal de indivíduo, representação coletiva à qual todos aderem de uma maneira ou de outra (p.258). No entanto, conclui que o que concretamente tem acontecido é o desenvolvimento de um individualismo vazio, cada vez mais voltado para as técnicas e competências individuais e cada vez menos certo de suas idéias. Como conseqüência de tal processo, Martucelli destaca o utilitarismo que permeia a formação oferecida pela instituição escolar, transformando as ações em seu interior como meros processos de preservação da vida organizacional. Como consequência as ações que se desenvolvem vão se restringir meramente à preservação da escola enquanto organização, levando professores e direção a abdicar de tarefas próprias do educador, pensado como alguém que se ocupa em fornecer, além do conhecimento técnico e científico, os valores universais do ser humano. O imaginário de uma escola nesses moldes é o da escola para um individuo ideal que se encaixa ou que deveria se encaixar perfeitamente tanto ao modelo de organização idealizada quanto de uma sociedade igualitária que parte do principio de que todos têm a mesma oportunidade e a mesma origem econômica e social. Para os professores os alunos não se encaixam nem na organização escolar imaginada, igualitária a princípio nem na imagem de aluno idealizado. Tal imaginário se choca com a realidade concreta provocando conflitos que opõem não somente alunos e escola, mas professores e escola. Nas considerações de Taylor sobre o imaginário social ele destaca a inseparabilidade do imaginário social do tempo e do espaço em que ele é criado, nesse sentido chamamos a atenção para aspectos do imaginário social em uma perspectiva que Sennett (2006) chama de “A nova Cultura do capitalismo”. Essa nova cultura do capitalismo definida por Sennett nos ajuda a compreender a organização escolar não somente na relação do aluno com a escola, mas também do professor Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000746 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 6 com a escola quando fazemos a reflexão das características do trabalho desse professor no contexto da escola atual. Sennett (2006,) se refere a três déficits sociais nesse contexto do novo capitalismo, que seriam: baixa lealdade institucional; diminuição da confiança informal entre os trabalhadores e enfraquecimento do conhecimento institucional. Estes três déficits estariam ligados por uma ferramenta intelectual que é o “capital social”, que seriam as redes de relacionamento em que as pessoas estariam vinculadas. O déficit de lealdade se relaciona diretamente com o nível de capital social. Organizações de alto capital social têm uma maior lealdade e vice-versa, nas argumentações de Sennett. O outro déficit, que é a diminuição da confiança informal entre os trabalhadores, refere-se à questão de saber com quem se pode contar em uma situação de pressão ou necessidade. Sennett afirma que a confiança informal necessita tempo para desenvolver-se e em um contexto em que as relações e as instituições são “líquidas”, como afirma Bauman (2004), a dificuldade para o estabelecimento dessa confiança fica prejudicada. O terceiro déficit apontado por Sennett que é o enfraquecimento do conhecimento institucional refere-se às certezas que acompanhavam a estrutura organizacional burocrática, o emprego e o amparo social que nesse novo contexto da flexibilização e precarização do trabalho se enfraqueceram. Utilizando-se das reflexões apresentadas por Sennett, que destacamos anteriormente, para analisarmos o que acontece no cotidiano da organização escolar podemos observar que estas características descritas por Sennett têm íntima relação com o imaginário sobre a escola e os conflitos e violência presentes em seu interior. O imaginário de uma escola igualitária, segura e que propicia a integração dos indivíduos à sociedade se choca com a ausência da lealdade, da confiança informal e com o conhecimento organizacional em diferentes aspectos. Análise do imaginário dos professores das duas escolas sobre os alunos A imagem que os professores têm de seus alunos pode ser observada nas frases que utilizaram para caracterizá-los. A imagem apresentada é em sua maioria negativa, tendo sido apresentadas somente algumas respostas mais positivas. Apesar da imagem negativa que expressam sobre os alunos, em geral responsabilizam os adultos, a mídia e o “sistema” como responsáveis pela situação que enfrentam na sala de aula e na escola. No grupo focal realizado com os professores das duas escolas, a palavras mais comuns utilizadas para caracterizar os alunos foram abandono, falta de limites, despreparo, desinteresse, falta de perspectiva, carência e outras que mostram a imagem negativa dos professores com respeito a eles. As falas dos professores destacadas abaixo ilustram essa imagem: - Quando penso nos alunos me vem a imagem da incerteza e tristeza. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000747 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 7 - a maioria dos alunos não tem bons exemplos em casa e não são incentivados de forma adequada. - Medo. - Crianças que vão à escola para aprender, bater papo ou beber leite. - A imagem que vem à cabeça com respeito ao aluno: um grande vazio e uma sociedade extremamente ignorante. - os alunos insistem em um comportamento negativo e falar em punição é proibitivo. - crianças sem respaldo familiar, sem carinho, sem orientação religiosa. - total falta de vontade de aprender por alguns. Brilho nos olhos dos alunos que desempenham realmente seu papel em sala de aula. - criança sem respaldo familiar, sem carinho, sem atenção, sem pais. - imagem dos alunos: crianças perdidas, sem orientação. - Péssimos alunos obtendo diploma que nada lhe servirá. Alguns professores apresentam uma visão positiva dos alunos, apontando os problemas sociais como responsáveis pela situação de abandono e falta de perspectiva dos alunos, como ilustram as falas a seguir: - Bons meninos, mas infelizmente a comunidade expõe princípios que estão em desacordo com o aprender na escola. - Bons alunos sendo massacrados por um sistema que ensina pouco e é insuficiente para uma boa carreira profissional Somente duas respostas apresentaram imagem positiva dos alunos: -“imagem boa, futuro promissor”. -Um grupo unido, na sua maioria com vontade de aprender, falta apenas estímulos e a descoberta da importância em cada conteúdo. Um dos professores da escola 1 colocou a expressão “medo”, refletindo o sentimento que alguns professores têm em relação aos alunos e o entorno do bairro, no entanto, no geral não ficou evidente preocupação com a segurança na relação entre professores e alunos. O cartaz de um dos grupos da escola 1, mostrado abaixo, representa a imagem negativa preponderante, mostrando as principais preocupações que estariam vinculadas principalmente ao uso de drogas, álcool e bullying. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000748 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 8 A responsabilização da mídia e da sociedade em geral pela situação de desinteresse e falta de perspectivas dos alunos é recorrente nas imagens apresentadas pelos professores nos cartazes. Tanto na escola 1, como denota o cartaz acima como na escola 2, cujo cartaz apresentamos a seguir apresentam um descompasso entre o mundo de fora da escola e o mundo de dentro dos muros da escola. As expressões presentes “informação x formação”, “as vozes do Brasil” e a seta indicando “escola da discórdia” e a “mídia e seu massacre” apresenta uma dissonância entre a escola e o mundo exterior representado pela mídia. A imagem de aluno apresentada é na maioria das falas a de vitima de famílias desestruturadas, da mídia e do sistema, assim como sujeitos sem futuro e desinteressados pelo conhecimento. O falseamento da realidade, ideia trabalhada por Taylor (2006) nesse caso, encontra-se no fato de que a escola enquanto instituição trabalha com uma escola imaginada, como instituição justa e igualitária e com alunos que não se encaixam nesse padrão. A escola, como afirma Dubet & Bellat ( ) se imagina como uma ilha de virtudes rodeada por ignorância. O imaginário da insegurança social e que coloca a responsabilização individual pela condição de vida promove uma imagem ameaçadora dos jovens de periferia à sociedade. No caso da escola esse imaginário contribui para um distanciamento entre professores e alunos e a não consideração das perspectivas e condição de vida desse jovem. Tal fato leva a escola à elaboração de estratégias e sistemas de defesa ao invés de propostas de envolvimento e acolhimento do aluno à instituição escolar, como ilustram os cartazes aqui apresentados, feitos pelos professores das escolas estudadas. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000749 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 9 No cartaz que segue, realizado por professores da escola 2, esse imaginário encontra-se representado. Analisando-se principalmente a figura maior colada, onde se encontra a frase “tu é bandido ou é comédia” e “perdidos no paraíso”, observa-se que mostram por um lado a real ou a falsa ameaça que sentem no cotidiano, assim como a dificuldade de lidar com essas situações, expressão presente nas outras figuras colocadas no cartaz. Esse imaginário se confirmará na análise dos dados dessa pesquisa onde são analisados os dados sobre o que disseram os professores sobre a escola do seu tempo e a escola de hoje. Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000750 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 10 Com respeito às ameaças reais que os alunos poderiam representar aos professores, de pesquisas que realizamos anteriormente (Salles & Silva, Relatório FAPESP, 2009) vimos que a ideia de que alunos frequentam a escola armados ou que são abordados com frequência por criminosos não se confirma. Não significa, no entanto, que essas preocupações não devam fazer parte das considerações do conjunto de professores e núcleo de gestão da escola, muito pelo contrário devem ser pensadas medidas preventivas e coletivas sobre essas questões. O que queremos destacar é que, a ameaça real é bem menor do que em geral a mídia, no calor de algum fato concreto de violência na escola, divulga. O que destacamos é que a imagem que a maioria dos professores apresentou dos alunos foi a de desamparo e desorientação, mais do que medo ou ameaça, embora tenhamos encontrado um caso ou outro de envolvimento de alunos com drogas e traficantes. Conclusão Finalizando a análise dos dados da pesquisa, podemos concluir que há um conflito significativo entre o imaginário dos professores sobre os alunos, demonstrado ora pelo medo que nem sempre é real, ora pela imagem do aluno enquanto vítima da família, da mídia e do sistema. Um aspecto importante a ressaltar é que poucas vezes foram apresentados pelos professores a escola como elemento a ser autoanalisado nesse processo institucional de interpelações na escola. Este fato reforça a fala de Dubet & Bellat, já citado anteriormente, da escola como uma ilha de virtudes cercada de ignorância por todos os lados. Concluímos destacando a necessidade de a escola fazer uma autoanálise, institucional, incorporando os elementos do imaginário presente para que todos possam desempenhar seu papel de maneira a levar à qualidade da educação. BIBLIOGRAFIA WACQUANT, L. Punir os pobres: a nova gestão da miséria nos Estados Unidos. 3ª ed. Rio de Janeiro: Ed. REVAN, 2007. SENNETT, R. La cultura del nuevo capitalismo. Barcelona, Editorial Anagrama, 2006 DUBET, F. O que é uma escola justa? São Paulo: Cadernos de Pesquisa. São Paulo: vol. 34, n. 123, pp. 539-555, 2004. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo. DUBET,F. ; BELLAT L’Hypocrisie scolaire. Pour un collège enfin démocratique. Éditions du Seuil, 2000. SALLES, L M F.; SILVA, J. M. A de P.; Violência na Escola: as influências do clima organizacional e das relações familiares Relatório de Pesquisa, 2009 - Fapesp). ZALUAR, A.Violência, crime organizado e poder: a tragédia brasileira e seus desafios". In: VELLOSO, J.P. (org.). Governabilidade, sistema político e violência urbana. Rio de Janeiro, José Olympio, 1994 Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000751 XVI ENDIPE - Encontro Nacional de Didática e Práticas de Ensino - UNICAMP - Campinas - 2012 11 ZALUAR, A. Para não dizer que não falei de samba, os enigmas da violência no Brasil". In: Schwartz, L. (org.). História da vida privada. São Paulo, Cia. das Letras, v. IV, 1998. ZALUAR, A. Um debate disperso: violência e crime no Brasil da redemocratização. São Paulo Perspec. vol.13 no.3 São Paulo July/Sept. 1999. Disponivel em: http://www.scielo.br/scielo. ZALUAR, A.; LEAL, M. C. Violência extra e intramuros. Revista Brasileira de Ciências Sociais, v. 16, nº 45, fev. 2001. CASTORIADIS, C. A Instituição Imaginária da Sociedade. RJ, 2ª. Edição. Paz e Terra, 1982. TAYLOR, C. Imaginários Sociales Modernos. Barcelona. Paidós, 2006 Junqueira&Marin Editores Livro 1 - p.000752