Revista Brasileira de Produtos Agroindustriais, Campina Grande, v.11, n.1, p.27-33, 2009
ISSN 1517-8595
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PRODUÇÃO DE BIOETANOL DE BAGAÇO DE CANA-DE-AÇÚCAR
Julliana Ribeiro Alves dos Santos1, Ester Ribeiro Gouveia2
RESUMO
O objetivo deste trabalho foi avaliar a produção de bioetanol a partir do bagaço de cana-deaçúcar, após pré-tratamento por explosão a vapor e hidrólise enzimática para a conversão de
celulose em glicose. A hidrólise enzimática também foi realizada com material deslignificado.
As fermentações foram realizadas em meios à base dos hidrolisados enzimáticos de bagaço de
cana-de-açúcar a 30°C. As eficiências das hidrólises enzimáticas alcançaram 44%, independente
do material utilizado. Entretanto, a hidrólise com o material deslignificado foi 30% mais rápida.
A deslignificação aumentou em 10% o rendimento de bioetanol em relação à glicose e em 96%
em relação ao bagaço.
Palavras-chave: bagaço, hidrólise, bioetanol, Saccharomyces.
BIOETHANOL PRODUCTION FROM SUGAR CANE BAGASSE
ABSTRACT
The aim of this work was to evaluate the production of bioethanol from sugar cane bagasse,
after pre-treatment by steam explosion and enzymatic hydrolysis to convert cellulose in glucose.
The enzymatic hydrolysis also was carried out with delignified material. The fermentation were
carried out in the media based on hydrolysates from sugarcane bagasse at 30 ° C. The
efficiencies of enzymatic hydrolysis reached 44%, regardless of the material used. However, the
hydrolysis with the delignified material was 30% faster. The detoxification increased 10% the
yield of bioethanol in relation to glucose and in 96% on the bagasse.
Keywords: bagasse, hydrolysis, bioethanol, Saccharomyces.
INTRODUÇÃO
O bagaço de cana-de-açúcar, para a maior
parte dos países tropicais, é um dos principais
materiais lignocelulósicos utilizados para a
bioconversão em etanol, uma vez que
apresentam alta concentração de carboidratos,
baixo conteúdo relativo de lignina, fácil
utilização, baixo custo de colheita, de transporte
e de armazenagem Pandey & Soccol (2000).
Materiais lignocelulósicos, como o bagaço
de cana-de-açúcar, são os mais abundantes
complexos orgânicos de carbono na forma de
biomassa de planta e consistem principalmente
de três componentes: celulose, hemicelulose e
lignina (Badhan et al., 2007).
_______________________
Protocolo 1132 de 20/06/2008
1
Pesquisadora, Biomédica, UFPE, Departamento de Antibióticos, Av. Prof. Moraes Rêgo, Cidade Universitária, Recife-PE,
[email protected], (81) 21268346
1
Professora Adjunta, Doutora em Engenharia Química, UFPE, Departamento de Antibióticos, Av. Prof. Moraes Rêgo,
Cidade Universitária, Recife-PE, [email protected], (81) 21268346
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Produção de bioetanol de bagaço de cana-de-açúcar
A hidrólise enzimática desses materiais é
conduzida através de enzimas celulases, que são
altamente específicas. Celulases são usualmente
uma mistura de diversas enzimas. Os três
maiores grupos de celulases que estão
envolvidas no processo de hidrólise são:
endoglucanases;
exoglucanases
e
betaglucosidase (Sun & Cheng, 2002). As celulases
quebram a celulose em celobiose, que é
subsequentemente clivada a glicose pela betaglucosidase (Palmqvist & Hahn-Hãgerdal,
2000). As endoglucanases agem de forma
aleatória, clivando ligações beta, dentro da
molécula da celulose; as celobiohidrolases
(exoglucanases) remo-vem as unidades de
celobiose a partir das extremidades da cadeia da
celulose e a β-glicosidase quebra celobiose em
duas unidades de glicose (Lima et al., 2005).
Segundo Martin et al. (2006), a hidrólise é
necessária para a conversão de polissacarídeos
da lignocelulose a açúcares fermentescíveis.
A hidrólise enzimática é conduzida em
condições amenas de pH e de temperatura (pH
= 4,8 e temperatura = 45-50° C) e não apresenta
problemas de corrosão, como observado nas
hidrólises com ácidos e/ou com bases (Duff &
Murray, 1996). Entretanto, para uma eficiente
hidrólise
enzimática,
é
necessário
primeiramente
submeter
o
material
lignocelulósico a um pré-tratamento, para
disponibilizar a celulose ao ataque enzimático.
Os processos de pré-tratamentos de materiais
lignocelulósicos podem ser térmicos, químicos,
físicos, biológicos ou uma combinação de todos
esses, o que dependerá do grau de separação
requerido e do fim proposto (Ferraz et al., 1994;
Carrasco, 1992).
Devido às condições empregadas nos prétratamentos térmicos e químicos, é originada
uma série de compostos que podem atuar como
inibidores potenciais tanto da hidrólise
enzimática, quanto da fermentação. Os tipos de
compostos tóxicos e suas concentrações em
hidrolisados lignocelulósicos dependem tanto
da matéria-prima, quanto das condições
operacionais empregadas no pré-tratamento. Os
produtos de degradação, que são potenciais
inibidores da fermentação, se agrupam em três
categorias: derivados furânicos (furfural e 5hidroximetilfurfural - HMF), ácidos orgânicos
fracos (como ácido acético) e derivados
fenólicos (Palmqvist & Hahn-Hãgerdal, 2000).
O objetivo deste trabalho foi comparar a
produção de bioetanol utilizando hidrolisados
enzimáticos de dois tipos de material
lignocelósico, ou seja, bagaço de cana-de-
Santos & Gouveia
açúcar pré-tratado por explosão a vapor com e
sem deslignificação.
MATERIAIS E MÉTODOS
Microrganismo
O
microrganismo utilizado
nas
fermentações foi uma linhagem de levedura
industrial, Saccharomyces cerevisiae UFPEDA1238, cedida pela Coleção de Culturas do
Departamento de Antibióticos da Universidade
Federal de Pernambuco.
Meios de Cultura
O meio de cultura utilizado para a
conservação do microrganismo foi o meio GLP,
em tubo de ensaio inclinado, contendo: glicose
(20 g/L), extrato de levedura (5 g/L), peptona (3
g/L) e ágar (1,5 % P/V). Na preparação do
inóculo, também foi utilizado o meio GLP,
porém sem adição de ágar.
Os meios de fermentação à base de
hidrolisado enzimático, foram suplementados
com (NH4)2SO4 (1 g/L), K2HPO4 (0,5 g/L),
MgSO4.7H2O (0,25 g/L), extrato de levedura (2
g/L), peptona (1 g/L). O pH do meio de
fermentação foi ajustado para 5,0.
Hidrólise Enzimática
Foram realizadas hidrólises enzimáticas
com dois tipos de bagaço de cana-de-açúcar. Na
hidrólise A, foi utilizado um bagaço pré-tratado
por explosão a vapor, cedido pela Escola de
Engenharia de Lorena (EEL-USP). Na hidrólise
B foi utilizado este material, mas após
deslignificação com NaOH. Antes de cada
hidrólise, os bagaços foram submetidos à
moagem no pulverizador modelo Pulverisette
14 da FRITSCH (20 mesh).
Na hidrólise enzimática A, a concentração
de bagaço utilizada, desde o início do processo
foi de 186,16 g/L. Esta hidrólise foi realizada
em frascos de erlenmeyer de 500 mL, contendo
48 mL de tampão citrato (pH = 4,8), 2 mL de
preparação comercial da enzima Celluclast e 10
g de bagaço. Os frascos foram mantidos em
mesa incubadora rotativa, modelo C25KC
Incubator Shaker, marca New Brunswick
Scientific, à 50° C e 150 rpm, durante 67 horas.
Antes da hidrólise B, foi realizada a
deslignificação do bagaço pré-tratado por
explosão a vapor, em reator do tipo autoclave
eletrônica, modelo: AU/E-20, do fabricante
Regmed Indústria Técnica de Precisão Ltda.
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Produção de bioetanol de bagaço de cana-de-açúcar
Foram transferidos para o reator, 0,5 Kg do
bagaço, 10 L de água destilada e 100 g de
NaOH. A mistura permaneceu à 100° C,
durante 1 hora, sob agitação de 100 rpm. Após
a deslignificação, a polpa foi separada do licor
por filtração. Foram efetuadas 7 lavagens, cada
uma com 2,5 L de água destilada à 700C, para a
retirada da lignina que ainda estava impregnada
no material.
A hidrólise B foi realizada em frascos de
erlenmeyer de 500 mL, contendo 48 mL de
tampão citrato 50 mM (pH = 4,8), 2mL da
mesma preparação comercial de enzima
utilizada na hidrólise A e 10 g de bagaço prétratado com vapor e deslignificado com NaOH.
Com 24 horas de hidrólise, foram adicionados
40 mL de tampão citrato, pois o volume de
tampão que foi utilizado no início da hidrólise
não foi suficiente para homogeneizar a mistura.
A concentração de bagaço alcançada no final da
hidrólise, que durou 79 horas, foi de 105,08
g/L.
No final das hidrólises A e B, cada mistura
foi filtrada em papel de filtro quantitativo (de
80 g/m2; cinza 0,00005 g; permeabilidade ao ar:
3 L/s m2 e porosidade da maioria dos poros de 8
µm) para separar o hidrolisado da polpa. O
hidrolisado foi novamente filtrado em
membrana de 0,45µm para a quantificação de
carboidratos, ácidos orgânicos, HMF, furfural e
fenóis totais.
Fermentações
Inicialmente, a linhagem foi repicada em
tubo de ensaio contendo o meio GLP sólido
(pH = 7,0), o qual foi mantido a 300C durante
24 horas. Após esse período, o inóculo foi
preparado através de outro repique em frasco de
erlenmeyer de 250 mL contendo 50 mL de meio
GLP líquido (pH = 7,0), o qual foi
acondicionado a 250 rpm e a 300C, por 12
horas, em mesa incubadora rotativa da New
Brunswick Scientific C25KC.
A fermentação A (utilizando o hidrolisado
enzimático A) foi realizada em frascos com
dimensão de 8,4 cm x 2,4 cm. Um volume de
1,8 mL (10% V/V) do inóculo foram
transferidos para os frascos contendo 16,2 mL
do meio de fermentação, à base do hidrolisado
enzimático A. Os frascos foram mantidos a 30°
C, sem agitação.
As fermentações utilizando o hidrolisado
enzimático B foram realizadas sem (“B1”) e
com (“B2”) agitação (80 rpm). Na primeira
situação (B1), foram realizadas fermentações
em frascos semelhantes aos da fermentação A,
Santos & Gouveia
29
também a 300C. Na segunda situação (B2),
foram realizadas fermentações em frascos de
erlenmeyer de 125 mL, contendo 16,2 mL do
meio de fermentação e 1,8 mL de inóculo, os
quais foram mantidos à 30° C, sob agitação de
80 rpm em mesa incubadora rotativa da New
Brunswick Scientific C25KC.
Métodos Analíticos
Determinação de CO2
A formação de CO2 foi determinada pela
perda de peso, efetuando-se a pesagem dos
frascos em balança semi-analítica da Sartorius
BP3100S, após leve agitação manual durante 1
minuto.
Determinação de biomassa
A determinação da biomassa foi realizada
por gravimetria. Um volume de 10 mL das
amostras das fermentações, no início e no final
das fermentações, foi filtrado em membrana de
0,45 µm, previamente pesadas em balança
analítica da Sartorius BB121S. A biomassa foi
seca em estufa, a 80°C, por 24 horas.
Determinação de carboidratos, ácido acético,
glicerol e etanol
As determinações das concentrações de
carboidratos, ácido acético, glicerol e etanol
foram realizadas por cromatografia líquida de
alta eficiência (CLAE), utilizando um
cromatógrafo líquido da Agilent HP 1100. As
condições cromatográficas foram: coluna Rezex
ROA-Organic Acid H+ (8%), ácido sulfúrico 5
mM como fase móvel, detecção por índice de
refração. Vazão de 0,6 mL/min e temperatura
de 450 C foram utilizadas na determinação de
carboidratos e de ácido acético. Enquanto que,
vazão de 1,0 mL/min e temperatura de 300 C
foram utilizadas na determinação de glicerol e
de etanol (Rocha, 2000).
Determinação de fenóis totais
Fenóis totais foram determinados pelo
método colorimétrico de Folin-Ciocalteau
(Singleton et al., 1999). A 0,5 mL do
hidrolisado diluído adicionaram-se 2,5 mL do
reagente de Folin-Ciocalteau (10% V/V) e 2,0
mL de carbonato de sódio (7,5% P/V),
incubando-se em banho termostático a 50° C,
durante 5 minutos. Para a quantificação da
concentração de fenóis totais foi construída uma
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Produção de bioetanol de bagaço de cana-de-açúcar
curva
de
calibração
com
diferentes
concentrações de ácido gálico, nas mesmas
condições do método colorimétrico de folinciocalteau.
Determinação de hidroximetilfurfural e de
furfural
Para a determinação de HMF e de furfural
também foi realizada por CLAE em
cromatógrafo líquido da Agilent HP 1100.
Foram utilizadas as seguintes condições
cromatográficas: coluna C-18 (Beckman),
acetonitrila 11,2% V/V e ácido acético (1%)
88,8% V/V como fase móvel, detecção UV em
274 nm, vazão de 0,8 mL/min e 25°C (Rocha,
2000).
Determinação da atividade enzimática
A determinação da atividade enzimática foi
baseada na metodologia proposta por Ghose
(1987), que mede a atividade celulolítica em
termos de unidades de papel de filtro por
mililitro da solução enzimática original.
Os tubos de ensaios continham 50 mg do
substrato (Papel de filtro quantitativo de 80
g/m2; cinza 0,00005 g; permeabilidade ao ar: 3
L/s m2 e porosidade da maioria dos poros de 8
µm), 1 mL do tampão citrato de sódio (50 mM,
pH = 4,8) e 0,5 mL da enzima diluída. Os tubos
controles da enzima não continham o substrato
e o tubo controle do substrato não continha a
enzima. Os tubos padrões de glicose continham
0,5 mL da diluição de glicose e 1 mL do
tampão. Os tubos foram incubados em banho
termostatizado a 50°C por 60 min. Após o
período de incubação, adicionaram-se 3 mL do
ácido
dinitrossalicílico
(DNSA)
para
interromper a reação enzimática. Para dosar os
açúcares redutores totais os tubos foram
colocados exatamente por 5 min em banho de
água fervente. A leitura da absorvância foi feita
em espectrofotômetro da Agilent HP 8453 a
540 nm. Usando a curva de calibração da
glicose foi possível determinar a concentração
de glicose liberada em cada reação enzimática.
A concentração da enzima foi estimada para
exatamente 2 mg de glicose liberada durante a
reação enzimática (definição de Filter Paper
Unity - FPU), através da equação da reta entre
as concentrações de glicose após cada reação e
os logaritmos das respectivas diluições da
enzima.
Santos & Gouveia
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Hidrólise enzimática do material sem e com
deslignificação
Antes de realizar as hidrólises enzimáticas,
foi necessário medir a atividade da preparação
enzimática comercial para poder calcular as
quantidades de enzima que seriam utilizadas
nas hidrólises. A atividade enzimática (AE) da
enzima Celluclast utilizada nas hidrólises
enzimáticas foi igual a 86,14 FPU/mL.
A partir do resultado da atividade
enzimática, foi possível calcular a quantidade
necessária de enzima para as hidrólises,
considerando que a dosagem de enzima
comumente utilizada nas hidrólises está entre 7
e 33 FPU/g substrato (Sun & Cheng, 2002).
Neste trabalho foram utilizados 17,2 FPU/g de
bagaço. Entretanto, após 46 horas, foram
adicionados mais 2 mL da enzima na hidrólise
B, uma vez que a conversão de celulose em
glicose já tinha alcançado o mesmo valor
encontrado para a conversão com o material
não deslignificado (hidrólise A). Supunha-se
que se aumentando a quantidade de enzima
poderia aumentar a conversão, entretanto, após
mais 33 horas, a conversão manteve-se
constante.
O cálculo da eficiência de hidrólise foi
obtido a partir da quantidade de glicose
formada (Tabela 1), que foi convertida em
celulose pela multiplicação por 0,9 (Rocha,
2000), bem como pelo conhecimento dos teores
de celulose nas polpas de bagaço com (85,6 %)
e sem deslignificação (49,9%), utilizadas nas
hidrólises enzimáticas.
Tabela 1. Composição dos hidrolisados
enzimáticos
Componente
(g/L)
Glicose
Xilose
Fenóis totais
Ácido acético
A
B
44,11
2,32
0,77
0,30
45,65
0,77
0,09
0,005
Martin et
al. (2002)
23,5
9,0
4,1
4,0
As eficiências das hidrólises enzimáticas
alcançaram valores de aproximadamente 44%
em ambos os casos. No caso da hidrólise B, foi
encontrado este valor com apenas 46 horas,
mantendo-se assim até 79 horas. Entretanto, a
presença de lignina provavelmente diminuiu o
acesso das enzimas ao substrato, quando se
utilizou o material não deslignificado (hidrólise
A). Dessa forma, o processo foi mais lento que
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Produção de bioetanol de bagaço de cana-de-açúcar
aquele observado quando foi utilizado o
material deslignificado (hidrólise B). Por outro
lado, a presença de lignina não foi o fator
limitante da hidrólise enzimática B, mas,
provavelmente a alta concentração de glicose
com 46 horas, que pode ter inibido a ação das
celulases.
A atividade das endoglucanases é inibida
pela celobiose e menos extensivamente pela
glicose. As enzimas beta-glucosidases são
inibidas pela glicose (Phlipidis et al., 1993).
Sun & Cheng (2002) sugeriram diversos
métodos que têm sido desenvolvidos para
reduzir a inibição, incluindo a suplementação
de beta-glucosidases, durante a hidrólise, e a
remoção de açúcares durante a hidrólise,
através da ultrafiltração.
Na Tabela 1, observam-se as composições
dos hidrolisados A, B e de um hidrolisado de
bagaço de cana-de-açúcar obtido por Martin et
al. (2002). No presente trabalho, não foram
encontradas quantidades detectáveis de furfural
e de HMF. Isso provavelmente ocorreu devido
o
material
lignocelulósico
ter
sido
exaustivamente lavado após o tratamento por
explosão a vapor e após a deslignificação. No
hidrolisado obtido por Martin et al. (2002),
além dos compostos apresentados na Tabela 1,
também
foram
encontrados
compostos
furânicos (furfural 1,1 g/L; HMF 0,2 g/L).
Os hidrolisados enzimáticos A e B
apresentaram concentrações de xilose, ácido
acético e fenóis muito menores que àquelas
encontradas por Martin et al. (2002), quando
realizaram hidrólise com bagaço de cana-deaçúcar também pré-tratado por explosão à
vapor.
Comparando-se os hidrolisados A e B,
observa-se que houve uma redução de 88% de
fenóis, de 98% de ácido acético e de 67% de
xilose, quando o material foi deslignificado.
Martin et al. (2002), quando realizaram um
tratamento químico de deslignificação com
Ca(OH)2, encontraram reduções de 80% e 18%,
para fenóis e ácido acético, respectivamente.
Esses autores não encontraram redução no teor
de xilose.
Saccharomyces cerevisiae apresenta uma
única desvantagem que é a incapacidade de
metabolizar xilose (Jeffries & Shi, 1999; HahnHägerdal et al., 2001). Entretanto, em
concentração de 3 g/L de xilose, não foi
observado queda no rendimento em etanol em
fermentações utilizando a mesma levedura do
presente trabalho (Santos & Gouveia, 2007).
Dentre os inibidores da fermentação
identificados nos hidrolisados dos materiais
Santos & Gouveia
31
lignocelulósicos, os compostos fenólicos,
gerados a partir da degradação da lignina, são
os mais tóxicos (Palmqvist & Hahn-Hãgerdal,
2000). Como na hidrólise B foi utilizado um
material deslignificado, quantidade muito
pequena de fenóis totais foi encontrada.
Fermentações dos hidrolisados enzimáticos
Após a obtenção dos hidrolisados
enzimáticos A e B, os mesmos foram utilizados
na preparação dos meios das fermentações,
denominadas de A e B, respectivamente. As
fermentações foram realizadas em duplicata e
as amostras foram retiradas no início e no final
de cada fermentação. O acompanhamento da
formação de CO2, por perda de peso, além da
observação visual de espuma (Foto 1), serviu
para estimar o tempo final da fermentação.
O perfil de CO2 (g) em todas as
fermentações foi crescente até 17 horas.
Entretanto, nas fermentações B (hidrolisado de
polpa com deslignificação), os valores de CO2
foram aproximadamente 4 vezes maiores que
àqueles observados nas fermentações A
(hidrolisado enzimático de polpa sem
deslignificação). Na fermentação A (Tabela 2),
observou-se uma menor produção de biomassa,
provavelmente, porque nesta fermentação foi
utilizado um hidrolisado enzimático que
continha uma maior concentração de compostos
fenólicos, uma vez que ácidos orgânicos fracos
diminuem a produção de biomassa, mas
somente a partir de concentrações maiores que
6 g/L (Palmqvist & Hahn-Hãgerdal, 2000).
Foto 1. Fermentações com o hidrolisado B sem
agitação.
A maior produção de biomassa e o
maior rendimento (YX/G) ocorreram na
fermentação B2. A oxigenação favoreceu a
formação de materiais necessários à produção
de biomassa. Em aerobiose, o açúcar é
transformado em biomassa, CO2 e água, e, em
anaerobiose, a maior parte é convertida em
etanol e CO2 (Lima et al., 2001). Os
rendimentos em biomassa (YX/G) concordam
com aqueles obtidos por Martin et al. (2002),
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Produção de bioetanol de bagaço de cana-de-açúcar
32
para material sem e com deslignificação. Esses
autores também obtiveram maiores rendimentos
Santos & Gouveia
em biomassa
deslignificado.
quando
utilizaram
material
Tabela 2. Resultados das fermentações com os hidrolisados sem e com deslignificação.
Fermentação
Gc
Ed
YE/G
Xe
YX/G
YE/B
(g/L)
(g/L)
(g/g)
(g/L) (g/L)
(g/g)
A
32,8
9,5
0,29
0,24 0,007
0,051
Martina
20,8
6,0
0,29
0,61 0,002
0,10
B1
34,1
10,8
0,32
1,07 0,031
0,10
B2
34,2
9,1
0,27
1,89 0,055
0,09
Martinb
20,8
9,5
0,46
1,43 0,067
0,16
a
Fermentação de hidrolisado não deslignificado
Fermentação de hidrolisado deslignificado
Glicose, d Etanol
e
Biomassa
b
c
Com relação à produção de bioetanol,
houve um aumento de cerca de 10% no
rendimento em etanol (YE/G) da fermentação no
hidrolisado B1 (0,32 g/g), em relação ao
hidrolisado A (0,29 g/g). Por outro lado, na
fermentação com agitação (B2), o rendimento
foi inferior àquele obtido na fermentação com o
hidrolisado sem deslignificação (A).
O rendimento em etanol em relação ao
bagaço utilizado (YE/B) também foi maior nas
fermentações com deslignificação. Na verdade,
observa-se um aumento de 96%, entre os
resultados da fermentação A (0,051 g etanol/ g
bagaço seco ) e da fermentação B (0,1-0,09 g
etanol/ g bagaço seco).
Comparando-se os resultados obtidos
durante a fermentação B1 com os resultados
obtidos por Martin et al. (2002), utilizando um
material também deslignificado, observa-se que
estes autores encontraram um rendimento de
etanol em relação ao bagaço, 60 % maior,
provavelmente por terem utilizado uma
levedura recombinante capaz de metabolizar
xilose, uma vez que o material continha alta
concentração deste açúcar (Tabela 1). Por outro
lado, o rendimento de 0,10 g etanol/g bagaço
obtido na fermentação B1 foi igual àquele
obtido por Martin et al. (2002), quando
utilizaram material não deslignificado.
CONCLUSÕES
A presença de lignina na hidrólise do
material não deslignificado foi um fator
limitante ao acesso das enzimas e,
conseqüentemente, a presença de compostos
fenólicos provenientes da presença de lignina
no hidrolisado A, desfavoreceu a produção de
bioetanol. Por outro lado, a deslignificação
aumentou em 10% o rendimento de etanol em
relação à glicose e em 96% em relação ao
bagaço.
AGRADECIMENTOS
Os
autores
agradecem
à
FINEP
(Financiadora de Estudos e Projetos) e à
FACEPE (Fundação de Amparo à Ciência e
Tecnologia do Estado de Pernambuco) pelo
apoio financeiro.
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