INSTITUTO AGRONÔMICO – IAC
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO EM AGRICULTURA TROPICAL E
SUBTROPICAL
NITROGÊNIO NA PRODUÇÃO DE CANA-DE-AÇÚCAR: ASPECTOS
AGRONÔMICOS E AMBIENTAIS
HELIO ANTONIO WOOD JORIS
Orientador: Heitor Cantarella
Tese apresentada ao Instituto Agronômico
(IAC) para obtenção do título de Doutor em
Agricultura Tropical e Subtropical na área de
concentração de Gestão de Recursos
Agroambientais
Campinas, SP
2015
“Pouco conhecimento faz com que as pessoas se sintam orgulhosas. Muito conhecimento, que
se sintam humildes. É assim que as espigas sem grãos erguem desdenhosamente a cabeça
para o Céu, enquanto que as cheias se baixam para a terra, sua mãe.”
Leonardo da Vinci
AGRADECIMENTOS
Expresso meus sinceros agradecimentos às pessoas e instituições sem as quais esse
trabalho não seria realizado.
A Deus, por toda a inspiração divina que governa nossas ações. Por ter me
proporcionado a vida e a capacidade de ir atrás de meus sonhos.
Aos meus pais, Helio Antonio Joris e Alcida Maria Wood Joris, pelo amor e apoio
incondicional em todas as fases de minha vida. Serão para sempre meu grande exemplo de
caráter e determinação. Meus heróis.
Ao meu amado irmão, Reinaldo Joris Netto (in memoriam), por ter sido sempre uma
pessoa fantástica e um irmão maravilhoso. Apesar de toda a dor da ausência, me alegra ter
usufruído da sua companhia e ter a certeza que a sua presença em minha vida me tornou um ser
humano muito melhor.
À minha namorada Lívia Sanches, por todo o amor e companheirismo em todos os
momentos. Aos seus pais, Paulo e Márcia Sanches, pela carinhosa acolhida e apoio.
Ao meu orientador, Dr. Heitor Cantarella, pela ideia da realização do presente estudo,
com excelente orientação e sábios conselhos. É para mim um grande exemplo profissional e
pessoal, e só tenho a agradecer a oportunidade de receber sua orientação.
Ao Instituto Agronômico (IAC), e em especial ao Programa de Pós-Graduação, por todo
o suporte proporcionado durante o meu doutorado.
A todos os professores do Programa de Pós-Graduação do IAC, e em especial à Dra.
Adriana P. D. Silveira e demais membros da Coordenação do Curso, pelo excelente trabalho
realizado.
Aos amigos e colegas de trabalho do IAC, pelo grande auxílio e amizade: Vitor Vargas,
Acácio Martins, Rafael Sousa, Johnny Soares, Zaqueu Montezano, Késia Lourenço, Renan
Vieira, Aline Puga e Thais Souza.
Aos funcionários do IAC, em especial aos funcionários do Centro de Solos e Recursos
Agroambientais, Renata Presta, José Luiz Domingues, Marilda Magalhães, Gizelda Pedro, Luis
Mosquim, Leonilde Souza e Anita Calado.
Aos pesquisadores da Agência Paulista de Tecnologia em Agronegócios (APTA), Dr.
André César Vitti, Dra. Raffaella Rossetto e Dr. Glauber Gava, pelo enorme auxílio nos
experimentos de campo e ideias para o presente estudo.
À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), pela bolsa
concedida durante o meu curso de doutorado e também durante o período de doutorado
sanduíche.
À FAPESP, pelo apoio financeiro à pesquisa (2008/56147-1).
Ao Oak Ridge National Laboratory (ORNL), pela excelente acolhida durante os sete
meses em que permaneci realizando o período de doutorado sanduíche. Em especial, às pessoas
Maggie Davis, Keith Kline, Melanie Mayes, Virginia Dale, Shujiang Kang, Gangsheng Wang,
Sujith Nair e Teresa Hurt.
A todas as demais pessoas e instituições que contribuíram com a minha formação e a
realização desse estudo. Muitas páginas seriam necessárias para denominar todos, e
provavelmente ainda cometeria injustiça com alguns. Entendo que, na vida, há muito mais a
agradecer, do que a pedir. E eu sou muito grato pela ajuda e apoio de todos. Muito Obrigado!
SUMÁRIO
RESUMO .................................................................................................................................... i
ABSTRACT ............................................................................................................................... ii
1. INTRODUÇÃO GERAL ....................................................................................................... 1
REFERÊNCIAS ......................................................................................................................... 6
2. EFEITOS DE LONGO PRAZO DO NITROGÊNIO APLICADO EM SOQUEIRAS DE
CANA-DE-AÇÚCAR: ALTERAÇÕES NO SISTEMA SOLO-PLANTA, BACTÉRIAS
DIAZOTRÓFICAS E APROVEITAMENTO DO 15N-FERTILIZANTE .............................. 12
RESUMO ................................................................................................................................. 12
ABSTRACT ............................................................................................................................. 13
2.1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................. 14
2.2 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................ 16
2.2.1 Localização, delineamento experimental e condução do experimento ................... 16
2.2.2. Alterações químicas do solo ................................................................................... 19
2.2.3. Acúmulo de nutrientes e produtividade .................................................................. 20
2.2.4 Tratamentos aplicados na 4ª soqueira ...................................................................... 21
2.2.5 Análises Estatísticas ................................................................................................ 22
2.3 RESULTADOS .............................................................................................................. 22
2.3.1 Atributos de solo e planta ao longo de quatro soqueiras ......................................... 22
2.3.2 Tratamentos adicionais aplicados na 4ª soqueira .................................................... 28
2.4 DISCUSSÃO .................................................................................................................. 35
2.4.1. Atributos químicos do solo ..................................................................................... 35
2.4.2. Acúmulo de nutrientes e produtividade de colmos ................................................ 37
2.4.3. Inoculação com bactérias diazotróficas e recuperação de 15N ............................... 41
2.5 CONCLUSÕES .............................................................................................................. 43
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 44
3. ADUBAÇÃO NITROGENADA EM CICLO COMPLETO DE CANA-DE-AÇÚCAR:
ASPECTOS AMBIENTAIS PARA PRODUÇÃO DE BIOENERGIA .................................. 52
RESUMO ............................................................................................................................. 52
ABSTRACT ......................................................................................................................... 53
3.1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 54
3.2 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................ 56
3.2.1 Descrição do experimento ....................................................................................... 56
3.2.2 Estimativas e simulação de cenários ....................................................................... 57
3.2.3 Estimativa do balanço energético ............................................................................ 58
3.2.4. Estimativa de emissão de gases efeito estufa (GEE) .............................................. 59
3.2.5 Estimativas a partir de outros ensaios com doses de N-fertilizante ........................ 60
3.2.6 Análises estatísticas ................................................................................................. 61
3.3 RESULTADOS .............................................................................................................. 61
3.4 DISCUSSÃO .................................................................................................................. 70
3.5 CONCLUSÕES .............................................................................................................. 75
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 76
MATERIAL SUPLEMENTAR ........................................................................................... 81
4.
ADUBAÇÃO
NITROGENADA
E
INOCULAÇÃO
COM
BACTÉRIAS
DIAZOTRÓFICAS NA CANA-DE-AÇÚCAR....................................................................... 83
RESUMO ............................................................................................................................. 83
ABSTRACT ......................................................................................................................... 84
4.1 INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 85
4.2 MATERIAL E MÉTODOS ............................................................................................ 87
4.2.1 Descrição das áreas experimentais e aplicação dos tratamentos ............................. 87
4.2.2 Teor de N na folha, acúmulo de N na parte aérea e produtividade de colmos ........ 89
4.2.3. Quantificação da contribuição da FBN por abundância natural de 15N ................. 90
4.2.4 Eficiência de uso de 15N-fertilizante........................................................................ 90
4.2.5 Análises Estatísticas ................................................................................................ 91
4.3 RESULTADOS .............................................................................................................. 92
4.4 DISCUSSÃO .................................................................................................................. 96
4.5 CONCLUSÕES ............................................................................................................ 101
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 101
5. AVALIAÇÃO DA EXTRAÇÃO DE NITROGÊNIO COM ANÁLISE DE EXTRATO DE
SEIVA E FOLIAR EM SOQUEIRAS DE CANA-DE-AÇÚCAR APÓS ADUBAÇÃO
NITROGENADA* ................................................................................................................. 107
RESUMO ........................................................................................................................... 107
ABSTRACT ....................................................................................................................... 107
5.1 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 108
5.2 MATERIAL E MÉTODOS .......................................................................................... 110
5.3 RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................................. 113
5.4 CONCLUSÕES ............................................................................................................ 120
REFERÊNCIAS ................................................................................................................. 120
6. CONCLUSÃO GERAL ..................................................................................................... 123
i
RESUMO
A cultura da cana-de-açúcar tem se consolidado como uma das principais matérias-primas para
a produção de bioenergia, além da importância já estabelecida para a produção de açúcar. Com
a produção de bioenergia, diversos questionamentos surgem em relação ao manejo e uso de
insumos, sendo que o uso de nitrogênio (N) é um dos principais tópicos que vêm sendo
discutidos. Diferenças na resposta ao N em função dos ciclos da cultura, baixas doses de N em
relação a outros países, altas quantidades de palha adicionados ao sistema, fixação biológica de
N (FBN) e o cultivo de variedades cada vez mais produtivas e responsivas ao N indicam a
necessidade de mais estudos relacionados ao tema. O objetivo desse estudo foi elucidar algumas
questões recentes a respeito do manejo do N na cana-de-açúcar, tais como: (i) Quais as
alterações no sistema com a aplicação consecutiva de N na soqueira em condições de alta
produtividade? (ii) O uso contínuo de altas doses de N pode comprometer a eficiência de uso
de parte do fertilizante nitrogenado em longo prazo, e a inoculação com bactérias diazotróficas
pode substituir o N a ser aplicado? (iii) A intensificação da produção de cana-de-açúcar com
altas doses de N e aumento na produtividade é viável do ponto de vista energético e ambiental?
(iv) Os efeitos benéficos das bactérias diazotróficas podem promover melhoria na eficiência de
uso do fertilizante nitrogenado? (v) Análises de extrato de seiva podem auxiliar nas avaliações
de resposta da cana à adubação nitrogenada? Estudos com cana-soca foram desenvolvidos para
tentar responder as questões acima descritas. O presente trabalho foi dividido em quatro
diferentes capítulos para avaliar tais questões. Resultados obtidos em áreas experimentais com
aplicação de N em cana-de-açúcar foram utilizados para as avaliações. A partir do primeiro
capítulo desse estudo, que teve o objetivo de responder as questões (i) e (ii), conclui-se que a
adubação nitrogenada em condições favoráveis para obtenção de altas produtividades resulta
em aumentos na produção, mas com possível acúmulo excessivo de N no sistema, ao passo que
baixas doses ou ausência de adubação nitrogenada resulta em balanço negativo entre N aplicado
e exportado, podendo comprometer a sustentabilidade do sistema. A partir da avaliação de
inoculação com bactérias diazotróficas e adubação com 100 kg ha-1 de N após aplicação de
doses de N (0, 60, 120 e 180 kg ha-1soqueira-1) nas três soqueiras anteriores, com aplicação de
sulfato de amônio enriquecido com 15N, conclui-se que o maior aproveitamento do Nfertilizante ocorre em condições de baixo aporte prévio de N mineral, ao passo que altas
produtividades são obtidas pelo maior aproveitamento de N do solo em condições de alto
aporte. A adubação nitrogenada não pode ser substituída pela inoculação com bactérias
diazotróficas, da maneira que é atualmente realizada. O segundo capítulo teve o objetivo de
responder a questão (iii), e a partir dos dados de adubação nitrogenada em longo prazo, concluise que a adubação nitrogenada, quando resulta em aumentos significativos de produtividade,
pode ser mais desejável que baixas doses ou ausência de adubação do ponto de vista energético
e ambiental, ao levar em consideração que o N exportado precisa ser minimamente reposto, e
baixas produtividades resultariam em demanda maior de terra para a produção da mesma
quantidade de energia. O terceiro capítulo buscou responder a questão (iv), e por meio da
avaliação em áreas experimentais onde foi realizada a inoculação com bactérias diazotróficas,
foi observado que a contribuição do N proveniente do ar, sem adubação nitrogenada, variou de
0 a 41%, sem diferenças aparentes com a inoculação, com alguns efeitos positivos na absorção
de N e produção de colmos. Duas áreas experimentais receberam a aplicação de 100 kg ha-1 de
sulfato de amônio enriquecido com 15N, com e sem inoculação, e os resultados originados
levaram à conclusão de que as bactérias podem melhorar a absorção de N-fertilizante em solo
arenoso, sem efeitos significativos nas condições de solo argiloso. O quarto capítulo buscou
responder a questão (v), e resultados em diferentes períodos mostraram sensibilidade da análise
de seiva a diferentes doses de N na cana-soca, sendo portanto uma ferramenta que pode auxiliar
na avaliação do comportamento da cultura ao manejo da adubação nitrogenada. Os resultados
desse estudo mostram a necessidade de otimizar o uso de N em cana-de-açúcar para obtenção
ii
de altas produtividades. A inoculação precisa ser mais bem estudada para trazer benefícios
significativos na produção de cana-de-açúcar.
Palavras-chave: Produção sustentável; Eficiência de uso de 15N; Bactérias diazotróficas
ABSTRACT
Brazilian sugarcane has been established as one of the main bioenergy feedstock, despite of the
known importance for sugar production. With bioenergy production, several question comes
up with regards to inputs use and management, whereas nitrogen (N) is one of the main
discussed topics. Distinct response to N because of crop cycle, low N rates compared to other
countries, high amounts of trash, biological nitrogen fixation and more productive and N
responsive varieties have indicated the need of more studies related to this subject. The aim of
this study was to investigate some recent questions about N management in sugarcane, such as:
(i) Which changes are expected after consecutive N application to sugarcane ratoon under high
yield potential? (ii) May the continuous use of high N rates prejudice fertilizer-N use efficiency
in long-term and diazothrophic bacteria inoculation can replace mineral N application? (iii) Is
it suitable intensify crop production by applying high N rates and achieving higher crop yields
from the energetic and environmental point of view? (iv) Does beneficial effects promoted by
diazothrophic bacteria improve fertilizer-N use efficiency? (v) Can sap extract analysis improve
the evaluation of sugarcane response to N fertilization? Ratoon-cane studies were carried out
to elucidate the questions described above. From the first chapter of this study, aiming to answer
questions (i) and (ii), it was concluded that N fertilization in favorable conditions to reach high
yields results in large yield increases, but possibly by accumulating excessive N in the system.
On the other hand, low N rates or absence of N application results in negative balance between
applied and removed N, potentially harming system sustainability. Diazothrophic bacteria
inoculation and N fertilization with 100 kg N ha-1 after N rates in previous ratoon cycles (0, 60,
120 and 180 kg ha-1 ratoon-1) were evaluated, with application of 15N-ammonium sulfate. It was
concluded that higher fertilizer-N use occurs under low previous N input, whereas high yields
are obtained when high amounts of N were accumulated in previous cycles. N fertilization
cannot be replaced by inoculation with diazothrophic bacteria. Second chapter aimed to answer
question (iii), and from N fertilization in long-term data, it was concluded that N fertilization,
when it results in yield increases, can be more desirable than low N rates from energetic and
environmental point of view. It takes in consideration that removed N needs to be replaced, and
low yields would result in higher land demand to produce the same amount of energy. Third
chapter aimed to answer question (iv), and by evaluating experimental trials with diazothrophic
bacteria inoculation and N fertilization, it was estimated 0-41% of N from the air, with no
effects because of inoculation and some positive effects on N use and stalk yield. Two trials
have received 15N-ammonium sulfate application, with and without inoculation. Results leaded
to conclude that these bacteria may improve fertilizer-N absorption in sandy soil, with no effects
under clayey soil. Fourth chapter aimed to answer question (v), and results from different
periods have shown sensibility of sap extract analysis to different N rates in ratoon-cane,
therefore is helpful tool to evaluate crop response to N fertilizer management.
Key words: Sustainable production; 15N use efficiency; Diazothrophic bacteria
1
1. INTRODUÇÃO GERAL
Mais de 9 milhões de hectares são atualmente cultivados no Brasil com a cultura de
cana-de-açúcar, produzindo em torno de 660 milhões de toneladas na safra 2013-2014
(CONAB, 2014). A expansão dessa cultura no Brasil foi impulsionada inicialmente para a
produção de açúcar. No início dos anos 1970, o etanol de cana-de-açúcar foi introduzido em
função da crise internacional do petróleo, que encorajou o governo brasileiro a criar o Proálcool,
que visava a produção de etanol como combustível para automóveis. Após um período de pouco
incentivo ao etanol nas décadas de 1980 e 1990, a expansão mais expressiva da cultura ocorreu
após o desenvolvimento da tecnologia Flex em 2003 (GOLDEMBERG; COELHO;
GUARDABASSI, 2008). A expansão da cultura foi sempre motivada por questões econômicas
e políticas; no entanto, o cultivo da cana-de-açúcar também apresenta vantagens no ponto de
vista ambiental, quando comparado com o cultivo de outras matérias-primas para bioenergia.
Os principais aspectos positivos são: baixo custo de produção, alta produtividade, baixo uso de
nitrogênio (N), ótimas relações de balanço de energia renovável/energia fóssil e bom potencial
de mitigação de gases efeito estufa (GEE) (CORTEZ, 2012).
Os aspectos positivos da produção de cana-de-açúcar para a produção de bioenergia
estão intimamente relacionados com produtividade da cultura e uso do N. No Brasil, a cana-deaçúcar é cultivada com doses relativamente baixas de N (90-120 kg ha-1). Em outros países
produtores de cana-de-açúcar, as quantidades de N aplicadas na cultura podem ser até 100%
superiores (150-250 kg ha-1) às doses empregadas no Brasil, com a obtenção de produtividades
similares (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). Com baixo uso de insumos, as
condições favoráveis de solo e clima resultam em altas produtividades da cultura nas regiões
produtoras brasileiras, fornecendo assim bons índices de produção de energia renovável em
relação ao total de energia fóssil gasto na produção agrícola e industrial. Nesse contexto, o uso
de fertilizantes nitrogenados é um componente-chave no balanço energético-ambiental da canade-açúcar para produção de biocombustíveis. A adubação nitrogenada em cana é responsável
por 23% da energia fóssil utilizada nas operações da cultura, e 19% da energia total gasta,
considerando também todas as etapas para a produção de bioetanol (GALDOS et al., 2010).
A adubação nitrogenada pode promover aumento da produtividade em ciclo de canaplanta, no entanto embora existente em algumas situações, a resposta da cana-planta ao N é
pequena e normalmente ocorre em doses baixas ( FRANCO et al., 2010; FORTES et al., 2013;
PENATTI, 2013). No estado de São Paulo, Cantarella; Trivelin; Vitti (2007) relatam que apenas
30% de uma compilação de mais de 70 ensaios em cana-planta mostraram respostas à aplicação
2
de N. Na cana-soca, as respostas à adubação nitrogenada são mais evidentes que em canaplanta, refletindo em maior vigor das soqueiras, aumentando assim o potencial produtivo da
cultura (PENATTI, 2013; VITTI; TRIVELIN, 2011). No ciclo de cana-soca, as condições são
mais favoráveis ao aproveitamento do N aplicado pois iniciam após a obtenção de altas
produtividades com baixas doses de N na cana-planta (PENATTI, 2013). Portanto, a
contribuição do N adicionado via fertilizante é maior em cana-soca do que em cana-planta. Ao
avaliar a contribuição de 15N-fertilizante em cana-planta e cana-soca no final do ciclo, Franco
et al. (2011) verificaram valores de aproximadamente 40% em cana-soca e 5% em cana-planta.
A crescente adoção, incentivada por legislação ambiental, da cana colhida sem despalha
a fogo, gera vários questionamentos para o manejo da adubação nitrogenada não só com
respeito às doses, mas também às fontes e modos de aplicação. Ao colher a cana mecanicamente
sem a queima prévia, mantém-se sobre a superfície do solo uma grande quantidade de resíduos
vegetais (10-15 t ha-1 de matéria seca), que correspondem às folhas secas, ponteiros e pedaços
de colmos. Esses resíduos representam um acúmulo considerável de massa seca e nutrientes
que podem provocar alterações importantes na disponibilidade de nutrientes (FRANCO et al.,
2013; TRIVELIN et al., 2013). Em longo prazo, esse acúmulo de resíduos pode resultar em
reduções na demanda de fertilizantes nitrogenados, porém em curto e médio prazo podem
ocorrer aumentos na necessidade de N-fertilizante (ROBERTSON; THORBURN, 2007;
TRIVELIN et al., 2013). Trabalhos mais recentes em cana-soca sem queima prévia têm
apresentado tendências a aumento nas doses de N para a cana-soca (VITTI et al., 2007;
ROSSETTO et al., 2010; FORTES et al., 2013; PENATTI, 2013;). Além da imobilização de N
causada pela grande quantidade de resíduos, as respostas positivas têm sido atribuídas ao uso
de variedades mais produtivas e responsivas (PENATTI, 2013).
Resultados recentes com resposta positiva da cultura a altas doses (>120 kg ha-1) de N
em cana-soca podem sugerir que doses baixas de N não são suficientes para os materiais
genéticos e sistemas de manejo com maior potencial produtivo, podendo comprometer a
produtividade e longevidade do canavial. Por outro lado, resultados de aproveitamento do 15N
fertilizante pela cultura mostram resultados normalmente inferiores a 40% em cana-soca
(TRIVELIN et al., 2002; TRIVELIN et al., 2002; VITTI, 2003; FORTES et al., 2011; VITTI
et al., 2011). Os baixos níveis de aproveitamento do N-fertilizante pela cultura é explicado por
possíveis perdas de N no sistema (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007) e à elevada
imobilização de N no solo (COURTAILLAC et al., 1998). Normalmente, a maior parte do N
absorvido pelas plantas é derivado do solo ao invés do fertilizante (DOURADO-NETO et al.,
2010). No entanto, o efeito cumulativo de adubações pode ser importante para a manutenção
3
da matéria orgânica e para o suprimento de N em longo prazo (VALLIS; KEATING, 1994).
Há a necessidade de estudos em longo prazo, que permitam avaliar a interação entre diferentes
ciclos de cana-soca em termos de uso e aproveitamento do N-fertilizante aplicado. Estudos
desenvolvidos em áreas de alta produtividade e potencial de resposta ao N-fertilizante podem
fornecer informações importantes a respeito do sistema solo-planta sob doses contrastantes de
N.
Possíveis aumentos na quantidade de N aplicada na cultura precisam no entanto ser
acompanhadas de aumentos proporcionais de produtividade para que não ocorram
comprometimentos nos índices ambientais para a produção de bioenergia. O alto consumo de
energia para a produção de fertilizantes nitrogenados pode ser um fator limitante,
principalmente se houverem aumentos consideráveis nas doses de N recomendadas para a
cultura. Alguns estudos (BODDEY et al., 2008; MACEDO; SEABRA; SILVA, 2008;
SEABRA et al., 2011) avaliaram o balanço de energia do etanol de cana e encontraram
resultados muito positivos, da ordem de 9,0 MJ MJ-1 (Energia renovável produzida / Energia
fóssil consumida). Além do balanço de energia, os fertilizantes nitrogenados também possuem
um papel importante no balanço de emissões de GEE do etanol de cana (CRUTZEN et al.,
2008; LISBOA et al., 2011). Esses estudos no entanto consideram doses fixas de N, de acordo
com a média utilizada em diversas unidades de produção de cana-de-açúcar. A intensificação
agrícola, que representa um melhor uso de elevadas quantidades de insumos, pode minimizar
os efeitos negativos de altas doses de fertilizantes pela obtenção de altas produtividades
(SNYDER et al., 2014, 2009), de maneira que maiores produtividades podem significar menor
demanda de terra. As avaliações dos aspectos ambientais afetados pela adubação nitrogenada,
como o balanço de energia e emissões de GEE precisam ser melhor estudados em diferentes
aportes de N e produtividade do sistema.
Por outro lado, a aplicação de N-fertilizante em quantidades próximas ou mesmo abaixo
da quantidade removida pelos colmos na colheita pode causar, em longo prazo, uma depleção
no estoque de N e matéria orgânica do solo. Porém há relatos de áreas cultivadas com cana-deaçúcar por várias décadas que não apresentam degradação, a despeito das baixas quantidades
de N adicionadas (URQUIAGA et al., 2012). Isso tem sido apontado como indicativo da
ocorrência de fixação biológica de nitrogênio (FBN) em áreas de cana-de-açúcar no Brasil
(URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992; BODDEY et al., 2003; HERRIDGE; PEOPLES;
BODDEY, 2008; URQUIAGA et al., 2012). Desde os primeiros trabalhos de Dobereiner
(1961), quando foram encontradas estirpes de bactérias fixadoras de N2 nos tecidos de cana-deaçúcar, muitos estudos foram desenvolvidos com a finalidade de encontrar associações com
4
bactérias diazotróficas em cana-de-açúcar (BALDANI et al., 2002). Estudos com diluição
isotópica em cana-de-açúcar apontaram 60% a 70% de N acumulado pelas plantas de algumas
variedades devido à FBN (URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992). Isto estimulou a busca por
bactérias eficientes em fixar N2 e desenvolver um inoculante a ser aplicado em campo, capaz
de impulsionar a FBN e potencialmente substituir parte do N aplicado (REIS; BALDANI;
URQUIAGA, 2009).
No entanto, a FBN em cana-de-açúcar é controversa. Estudos conduzidos na África do
Sul e Austrália sugerem que a FBN não contribui significativamente para a nutrição nitrogenada
da cultura nesses países (BIGGS et al., 2002; URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992;
HOEFSLOOT et al., 2005). A substituição de parte da adubação nitrogenada pela inoculação
poderia representar uma enorme economia para o setor, no entanto estudos realizados a campo
não indicam essa possibilidade. Os resultados de trabalhos recentes realizados com a cultura
têm mostrado respostas positivas em algumas condições e altamente dependente da variedade
utilizada (URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992; PEREIRA et al., 2013; SCHULTZ et al.,
2012, 2014). As respostas positivas que ocorrem não têm sido atribuídas a aumentos na FBN,
mas a efeitos benéficos promotores de crescimento, que comprovadamente ocorrem pela ação
de bactérias diazotróficas (URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992; DOBBELAERE;
VANDERLEYDEN; OKON, 2003; SARAVANAN; MADHAIYAN; THANGARAJU, 2007;
YADAV et al., 2009 TAULE et al., 2012; VIDEIRA et al., 2011). A melhoria no
desenvolvimento da cultura com a aplicação de inoculantes precisa ainda ser melhor estudada
sob condições de campo, em diferentes variedades. Possíveis efeitos benéficos podem também
promover aumento na eficiência de uso de insumos pela cultura, porém a interação entre a
inoculação e uso de fertilizantes nitrogenados precisa ser também melhor investigada.
Para uma adequada avaliação do estado nutricional e da resposta das plantas de canade-açúcar a diferentes aportes de N no sistema, o monitoramento da nutrição mineral da cultura
durante o seu desenvolvimento se faz necessário. As avaliações feitas diretamente nas plantas
integram todos os fatores de solo e ambientais. Para a maioria das culturas, o teor de nutrientes
na folha é uma ferramenta eficaz para diagnosticar o estado nutricional das plantas
(MALAVOLTA, 2006). No entanto, a análise foliar em cana normalmente apresenta pouca
sensibilidade às variações nutricionais na cultura e não é efetiva (ORLANDO FILHO et al.,
1999), sendo constantemente observadas diferenças na produção de colmos e atributos
tecnológicos em situações contrastantes de manejo nutricional, sem a detecção dessas
diferenças na análise foliar (FARONI et al., 2009; FRANCO et al., 2010).
5
Com a finalidade de se fazer um melhor uso do N-fertilizante na produção de cana-deaçúcar, e aumentar a eficiência no uso desse nutriente pela cultura, é importante conhecer os
momentos de maior absorção e formas de N mais absorvidas. A maior extração de N
proveniente do fertilizante normalmente ocorre no início do desenvolvimento da cultura
(FRANCO et al., 2011), normalmente até 90 dias após a rebrota em cana-soca. Dessa maneira,
análises foliares realizadas em período de máximo crescimento, normalmente 180 dias após
rebrota podem não ser eficazes em identificar diferenças devido à adubação nitrogenada. Um
monitoramento nutricional adequado no início de desenvolvimento da cultura potencialmente
possibilita alterações no manejo nutricional, assim como auxilia na tomada de decisões
referentes ao parcelamento da adubação, que pode ser necessária em casos de solos com baixo
teor de argila. O uso de análise de seiva pode ser uma alternativa viável para avaliação do status
de N na planta de cana-de-açúcar. A extração do líquido contido na nervura de folhas jovens,
genericamente denominado seiva, e a posterior quantificação de conteúdo de nutrientes tem
sido aplicada com sucesso em culturas olerícolas e frutíferas perenes como o citrus, no Brasil (
SOUZA et al., 2012; QUAGGIO et al., 2014). Não existem registros de uso dessa técnica para
a cana-de-açúcar, e a sua eficácia na cultura pode ser verificada por meio de testes em diferentes
condições de nutrição da cultura para o N, que tem sido o nutriente que apresenta maiores
dificuldades de recomendação.
Com base nesses questionamentos, as hipóteses consideradas nesse estudo foram: (i) os
efeitos da aplicação de N em cana-de-açúcar são visualizados de maneira mais intensa quando
se fazem aplicações consecutivas em longo prazo (ciclo completo); (ii) há diferenças no uso de
N proveniente do fertilizante pelas plantas de cana-de-açúcar (eficiência de absorção de N) em
função das condições de adubação nitrogenada em soqueiras anteriores; (iii) sob condições de
baixa adição de N-fertilizante no sistema, o balanço energético e emissão de GEE tende a ser
mais favorável que sob adição de altas doses de N. Porém, ao considerar a demanda adicional
de terra e a reposição mínima de N, o cenário pode se inverter; (iv) a inoculação com bactérias
diazotróficas pode ser favorável para a cultura da cana-de-açúcar, ao ser realizada em condições
de aplicação de N-fertilizante; (v) a análise de extrato de seiva pode ser uma ferramenta útil
para diagnóstico de estado nutricional relacionado ao N em diferentes fases de desenvolvimento
no início do ciclo.
Assim, para testar tais hipóteses, esse estudo foi dividido em quatro capítulos, dentro
dos seguintes objetivos:
a) Avaliar as alterações no solo e nas plantas de cana-de-açúcar em função de doses de Nfertilizante durante quatro soqueiras, e a influência do efeito residual do N aplicado na
6
4ª soqueira na resposta à inoculação com bactérias diazotróficas e aproveitamento do
15
N-fertilizante.
b) Estimar os impactos ambientais relacionados ao balanço de energia e emissões de GEE
em função de diferentes doses de N em ciclo completo de cana-de-açúcar, considerando
as situações hipotéticas de demanda adicional de terra e reposição de N sob condições
de balanço negativo entre N adicionado e N removido do campo.
c) Avaliar a reposta da cana-de-açúcar à inoculação com bactérias diazotróficas na
presença de adubação nitrogenada em cana-soca em diferentes locais e variedades.
d) Verificar o aproveitamento de
15
N-fertilizante pelas plantas de cana-de-açúcar após a
aplicação de 100 kg de N ha-1, na presença e ausência de inoculação em dois tipos de
solo (arenoso e argiloso).
e) Estudar o comportamento do N na cana-de-açúcar sob diferentes manejos de adubação
nitrogenada em dois locais e cinco épocas de amostragem, com a finalidade de analisar
a viabilidade da análise de extrato de seiva para o manejo de fertilizante nitrogenado na
produção de cana-de-açúcar.
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12
2. EFEITOS DE LONGO PRAZO DO NITROGÊNIO APLICADO EM SOQUEIRAS
DE
CANA-DE-AÇÚCAR:
ALTERAÇÕES
NO
SISTEMA
SOLO-PLANTA,
BACTÉRIAS DIAZOTRÓFICAS E APROVEITAMENTO DO 15N-FERTILIZANTE
RESUMO
O objetivo desse trabalho foi avaliar as alterações em longo prazo da adubação nitrogenada no
cultivo de cana-de-açúcar durante quatro soqueiras e a influência do efeito residual do Nfertilizante na resposta da cultura à inoculação com bactérias diazotróficas e aproveitamento do
15
N-fertilizante. O experimento foi implantado em Piracicaba-SP, no delineamento de blocos
ao acaso e 4 repetições, em março/2007. Doses de N-fertilizante foram aplicadas após a
brotação da 1ª soqueira (0, 60, 120 e 180 kg ha-1) e reaplicadas nas três soqueiras posteriores,
até a colheita da 4ª soqueira em setembro/2012. No último ciclo, entre outubro/2011 e
setembro/2012, as parcelas foram divididas para avaliação da inoculação com bactérias
diazotróficas e aplicação de 100 kg ha-1 de N em cada tratamento de adubação nitrogenada em
longo prazo, com implantação de microparcelas e aplicação de
15
N-sulfato de amônio para
avaliação do aproveitamento do N-fertilizante pelas plantas. O acúmulo de nutrientes aumentou
com as doses de N aplicadas, e a ordem de acúmulo dos nutrientes na parte aérea foi
K>N>Ca>Mg>S>P. Em todas as soqueiras avaliadas, ocorreu aumento linear na produtividade
de colmos, com um incremento médio de 175 kg de colmos para cada kg de N-fertilizante
aplicado. Considerando o balanço de entradas e saídas de N do sistema, a quantidade média
necessária para reposição do N exportado foi 69 kg de N ha-1ciclo-1, que representa 38,3% da
maior dose aplicada (180 kg ha-1). A inoculação com bactérias diazotróficas beneficiou a
nutrição mineral das plantas (assim como a aplicação de N-fertilizante), porém resultou em
produtividade de colmos inferior à aplicação de N (100 kg ha-1). O aproveitamento de
15
N-
fertilizante foi maior nas condições de ausência de aplicação de N nas soqueiras anteriores
(44,2%) que nas doses 60 (34,3%), 120 (24,8%) e 180 (31,8%). A inoculação com bactérias
diazotróficas não substitui a adubação nitrogenada. O solo é a principal fonte de N para as
plantas de cana-de-açúcar, porém a obtenção de altas produtividades depende de doses elevadas
de N-fertilizante para a manutenção do sistema.
Palavras-chave: Efeito residual; Saccharum spp.; Fixação Biológica de Nitrogênio
13
LONG-TERM EFFECTS OF N ON SUGARCANE RATOONS: CHANGES IN THE
SOIL-PLANT SYSTEM, DIAZOTHROPHIC BACTERIA AND RECOVERY OF
FERTILIZER-15N
ABSTRACT
The aim of this research was to evaluate long-term changes on soil and sugarcane plants as
affected by long-term nitrogen fertilization over four ratoons and residual effect of fertilizer-N
on crop response to diazothrophic bacteria inoculation and fertilizer-15N recovery. The trial was
established in Piracicaba-SP, in randomized blocks design, with four replications, in
March/2007. N-fertilizer rates were applied after regrowth in 1st ratoon (0, 60, 120 e 180 kg ha1
) and the treatments were reapplied over four ratoons, until the harvest of 4th ratoon, in
September/2012. Over this period, chemical soil changes, macronutrients accumulation and
stalk yield were evaluated. In the last cycle, between Oct 2011 and Sep 2012, plots were
fractioned to evaluate diazothrophic bacteria inoculation and application of N-fertilizer to all
plots (100 kg ha-1). Microplots were established in order to apply
15
N labelled fertilizer and
evaluate fertilizer-N recovery by sugarcane plants. After proper acidity alleviation, nitrogen
fertilization provided improvement on soil chemical conditions. Nutrient accumulation
increased after N rates application, and nutrients accumulation followed the order
K>N>Ca>Mg>S>P. In all ratoons, stalk yield increased in a linear fashion, and the mean
increment was 175 kg of fresh stalks for each kg of N applied. Based on the N inputs/outputs
balance, the N needed to replace removal was 69 kg of N ha-1cycle-1, which represents 38.3%
of higher N rate applied (180 kg ha-1). The fertilizer-15N recovery was higher (44.2%) after
absence of N application in previous ratoons than in the rates 60 (34.3%), 120 (24.8%) and 180
(31.8%). Diazothrophic bacteria did not replace nitrogen fertilization. Soil is the main source
for N nutrition of sugarcane plants, but in order to achieve high yields, it is important to apply
high fertilizer-N rates to the system.
Key words: Residual effect; Saccharum spp.; Biological Nitrogen Fixation
14
2.1. INTRODUÇÃO
A cana-de-açúcar é cultivada no Brasil com aplicação de doses de N-fertilizante muito
inferiores a outros países produtores de cana-de-açúcar (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI,
2007). Apesar disso, a grande demanda da cultura por N, alto custo financeiro e energético dos
fertilizantes nitrogenados, riscos ambientais relacionados à adição de N mineral no sistema e
outros questionamentos têm originado diversos estudos sobre adubação nitrogenada na canade-açúcar (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007; ROSSETTO et al., 2010a; PENATTI,
2013),. A adubação nitrogenada pode promover aumento da produtividade em cana-planta
(FORTES et al., 2013a; FRANCO et al., 2010a). No entanto, em geral a resposta é pequena e
ocorre em doses baixas, principalmente em virtude da incorporação de resíduos culturais e
melhorias nas condições de fertilidade do solo com a reforma e replantio do canavial
(CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007; FRANCO et al., 2007; VITTI et al., 2007b),
diferente do que ocorre na soqueira.
Nas soqueiras, que iniciam com a rebrota após a 1ª colheita e geralmente são conduzidas
durante quatro ciclos (podendo se estender por mais ciclos, dependendo do nível de produção),
as condições são mais favoráveis ao aproveitamento do N aplicado pois iniciam após a obtenção
de altas produtividades sob baixas doses de N-fertilizante na cana-planta (PENATTI, 2013).
Além disso, com o fim da queima prévia antes da colheita, grandes quantidades de palha com
alta relação C:N ficam sobre o solo e imobilizam boa parte do N orgânico (MEGDA et al.,
2012; VITTI et al., 2008, 2007a), tornando importante a adição de N mineral para garantir vigor
e produtividade das soqueiras (VITTI; TRIVELIN, 2011).
Trabalhos mais recentes conduzidos em cana-soca sem queima prévia têm apresentado
tendências a aumento nas doses de N para cana-soca (VITTI et al., 2007a; ROSSETTO et al.,
2010b; FORTES et al., 2013a; PENATTI, 2013). Além da imobilização de N causada pelo
grande volume de resíduos, as respostas positivas têm sido também atribuídas ao uso de
variedades mais produtivas e responsivas. Com a aplicação de N, é esperado que ocorra
aumento na absorção e acúmulo de N pelas plantas. Se a adubação nitrogenada resultar em
melhorias nas condições de fertilidade do solo, a absorção e acúmulo de outros macronutrientes
também pode ser mais elevada. Com isso, a exportação e a demanda de nutrientes também
aumentariam. No entanto, o uso de altas doses de N-fertilizante pode aumentar o estoque de N
do solo, uma vez que as adições de N ao sistema podem superar o N exportado pelos colmos.
Em longo prazo, diferentes aportes de N-fertilizante para a cana-de-açúcar podem
resultar em condições muito distintas. Ausência de aplicação de N ou doses muito baixas
poderiam resultar em exaustão do N orgânico do solo, prejudicando a sustentabilidade do
15
sistema. Porém existem relatos de diversas áreas de cana-de-açúcar cultivadas no Brasil com
adições de N inferiores à exportação e potenciais perdas de N, sem sinais de degradação após
várias décadas de cultivo, o que evidencia a entrada de N via fixação biológica de nitrogênio
(FBN) (BALDANI et al., 2002; BODDEY et al., 2003). Alguns estudos apontam a evidência
de ocorrência de FBN em cana (URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992; URQUIAGA et al.,
2012), com estimativas de contribuição de em torno de 40 kg ha-1ano-1 (HERRIDGE;
PEOPLES; BODDEY, 2008; URQUIAGA et al., 2012).
As evidências de ocorrência de FBN em cana-de-açúcar têm originado uma série de
estudos a partir do desenvolvimento de inoculantes com bactérias diazotróficas (OLIVEIRA et
al., 2003, 2002; REIS; BALDANI; URQUIAGA, 2009). A potencial economia de fertilizantes
nitrogenados proporcionada pelo uso desses produtos seria extremamente benéfica para a
sustentabilidade da produção brasileira de cana-de-açúcar (JAMES; BALDANI, 2012; DEL
GROSSO et al., 2014). No entanto, até o momento, os resultados de experimentos a campo com
inoculação de bactérias diazotróficas (CANTARELLA et al., 2012; MORAIS et al., 2011;
PEREIRA et al., 2013; SCHULTZ et al., 2012, 2014) não têm comprovado a hipótese de
substituição de adubos nitrogenados pela inoculação, entretanto indicam a ocorrência de efeitos
promotores de crescimento, que podem beneficiar a produção de cana-de-açúcar. Condições
contrastantes de adubação nitrogenada em ambientes com alto potencial produtivo podem
ajudar a verificar a eficácia da inoculação com bactérias diazotróficas em função de adubações
minerais anteriores.
Estudos realizados com aplicação de
15
N em cana-de-açúcar relatam que o
aproveitamento do fertilizante é geralmente variável em função de condições ambientais e de
manejo, permanecendo em diferentes níveis, normalmente abaixo de 40% em cana-soca
(TRIVELIN et al., 2002; VITTI, 2003; GAVA et al., 2003; FORTES et al., 2011; VITTI et al.,
2011). Essas variações no aproveitamento de 15N-fertilizante pela cultura estão associadas às
possíveis perdas de N no sistema solo-planta (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007) e à
elevada imobilização de N no solo (COURTAILLAC et al., 1998). Normalmente, a maioria do
N recuperado nas plantas cultivadas é derivado do solo ao invés do fertilizante (STEVENS;
HOEFT; MULVANEY, 2005; DOURADO-NETO et al., 2010; FRANCO et al., 2011).
Portanto, as recomendações de N-fertilizante baseadas em produtividade podem resultar em
aplicações excessivas ou insuficientes de N (THORBURN et al., 2011; OTTO et al., 2013). Por
outro lado, apesar do baixo aproveitamento do N-fertilizante aplicado em um ciclo de cana-deaçúcar, o efeito cumulativo de adubações pode ser importante para a manutenção da matéria
16
orgânica e para o suprimento de N em longo prazo (VALLIS; KEATING, 1994; VITTI et al.,
2007a).
Em geral, ensaios com adubação em cana-de-açúcar são feitos considerando a cana-deaçúcar como uma cultura anual (PENATTI, 2013). Estudos recentes têm mostrado a
importância da avaliação de diversos ciclos consecutivos (OLIVEIRA, 2011; VITTI et al.,
2011; FORTES et al., 2013a; PENATTI, 2013). Como uma cultura semi-perene, os tratamentos
aplicados em diferentes ciclos da cana-de-açúcar podem interagir e produzir resultados mais
conclusivos. Diferentes aportes de N via fertilizante em ciclos consecutivos de cana-de-açúcar
podem originar condições contrastantes de desenvolvimento das soqueiras e estoque de N no
solo, gerando condições mais favoráveis para a observação de resposta da cultura ao N aplicado,
à eficácia e contribuição da inoculação com bactérias diazotróficas e aproveitamento de
15
N
fertilizante.
Portanto, o objetivo desse trabalho foi avaliar as alterações no solo e nas plantas de canade-açúcar em função de doses de fertilizante nitrogenado durante quatro soqueiras, e verificar
o efeito residual do N aplicado na 4ª soqueira na resposta à inoculação com bactérias
diazotróficas e aproveitamento do 15N-fertilizante.
2.2 MATERIAL E MÉTODOS
2.2.1 Localização, delineamento experimental e condução do experimento
O experimento foi instalado na estação experimental da Agência Paulista de Tecnologia
em Agronegócios (APTA), situada em Piracicaba – SP, 22°43’S e 47°38’W, altitude de 546 m,
temperatura média anual de 22°C e precipitação média anual de 1400 mm, em um Latossolo
Vermelho distrófico, textura muito argilosa e moderada. A área é cultivada há mais de 20 anos
com cana-de-açúcar. Em março/2007, foi realizado o plantio da área. Após a colheita da canaplanta, em setembro/2008, os tratamentos com doses de adubo nitrogenado foram aplicados
para avaliação em cana-soca, sendo que os mesmos tratamentos foram repetidos nas três
soqueiras subsequentes. As avaliações experimentais foram realizadas entre os anos de 2008 a
2012, durante quatro ciclos de cana-soca consecutivos.
Antes do plantio em 2007, foi realizada aplicação de calcário em área total, na
quantidade de 3,5 t ha-1. O plantio foi realizado após gradagem e aração com arado de aiveca
para eliminação da soqueira anterior e incorporação do calcário, subsolagem e sulcação para a
disposição das mudas e fertilizante. No momento do plantio, foi realizada a adubação no sulco
de plantio com 48 kg ha-1 de N, 168 kg ha-1 de P2O5 e 96 kg ha-1 de K2O. A variedade IAC 92-
17
1099 foi plantada na quantidade de 15-20 gemas viáveis por metro, em espaçamento de 1,4 m.
Trata-se de uma variedade de porte muito ereto, maturação média-tardia, altíssima
produtividade agrícola, indicada para ambientes mais favoráveis, apresentando excelente
brotação de soqueiras, ótimo perfilhamento e manutenção da produtividade em cortes
avançados (UDOP, 2014). O alto potencial produtivo foi confirmado no ciclo de cana-planta,
com a obtenção de 216 t ha-1 de colmos na área, acima da produtividade normalmente observada
em cana-planta na região.
Amostras de solo foram retiradas antes da implantação do ensaio (fev/2007) e durante
o primeiro ciclo de cana-soca, em maio/2009 (média dos tratamentos), para avaliação dos
atributos químicos do solo em diferentes profundidades (Tabela 2.1). Nota-se que no momento
da amostragem, o solo apresentava alta acidez. Visando melhoria nas condições de acidez no
solo na superfície e subsuperfície, foi realizada a aplicação de 4 t ha-1 de calcário e 2 t ha-1 de
gesso agrícola após a colheita da primeira soqueira, em setembro/2009.
Tabela 2.1. Atributos químicos do solo em diferentes profundidades antes da implantação do
experimento (fev/2007) e no final da 1ª soqueira (maio/2009).
Prof.
cm
pH1
0-20
20-40
4,0
4,0
72,0
68,0
10,0
4,0
5,0
4,0
0-20
20-40
40-60
4,2
4,3
4,4
71
63
48
13
12
14
7,5
3,8
3,3
1 pH
H+Al Ca2+ Mg2+ K+
-------mmolc dm-3------2,4
1,7
M.O. P2
--mg dm-3-fev/2007
22,0 8,0
19,0 5,0
19,5
12,5
0,29
0,23
1,0
0,8
37,0
31,0
17,0
9,0
0,6
0,4
0,8
0,4
0,3
maio/2009
24,8 5,5
18
1,8
16,3 1,3
23,3
20,3
26,3
0,24
0,15
0,12
0,9
0,7
0,58
42
18,3
9,8
11,2
4,4
1,7
0,6
0,2
0,1
V
%
B
Cu
Fe Mn Zn
----------------mg dm-3--------------
em CaCl2 0,01 mol L-1, 2 P extraído por Resina
Após a colheita do ciclo de cana-planta, em setembro/2008, a área experimental foi
delineada em blocos ao acaso, com 4 tratamentos e 4 repetições. Cada parcela era constituída
de 10 linhas de cana-de-açúcar com 30 m de comprimento. O tamanho das parcelas foi superior
ao normalmente empregado em experimentos a campo com cana-de-açúcar, em função dos
propósitos de avaliação em longo prazo e eventual subdivisão das parcelas originais. Os
tratamentos aplicados foram diferentes doses de adubo nitrogenado: 0, 60, 120 e 180 kg ha-1 de
N. A aplicação do fertilizante foi realizada nas linhas, em faixas de 20 cm de largura, na posição
superior de acordo com o declive do terreno. Tais doses foram reaplicadas em cada soqueira,
de maneira que as doses acumuladas na 4ª soqueira foram 0, 240, 480 e 720 kg ha-1 (Tabela
2.2). Os ciclos de cana-soca foram de 11 a 13 meses, e as parcelas foram colhidas
18
mecanicamente, sem despalha a fogo. Após a colheita da 3ª soqueira em 2011, ocorreu fogo
acidental na área, causando a queima de restos culturais na ocasião.
A fonte de N utilizada foi nitrato de amônio, na 1ª, 2ª, e 3ª soqueira e sulfato de amônio
na 4ª soqueira. Na 4ª soqueira, houve a implantação de microparcelas para aplicação de
fertilizante enriquecido com
15
N, de maneira que foi necessário o uso de sulfato de amônio
nesse ciclo, devido à maior disponibilidade do sulfato de amônio marcado e à necessidade de
padronizar a mesma fonte no restante da área experimental. As diferentes doses de N foram
aplicadas logo após a primeira chuva no início de cada ciclo, para assegurar melhor absorção
do nutriente pelas plantas. Além do adubo nitrogenado, também foram aplicados 150 kg ha-1 de
K2O, na forma de cloreto de potássio, e 50 kg ha-1 de P2O5, na forma de superfosfato triplo no
início de cada ciclo. No início da 4ª soqueira, também foi realizada a aplicação de
micronutrientes (3 kg ha-1 de Zn e Cu, 2 kg ha-1 de B e 0,5 kg ha-1 de Mo).
Tabela 2.2. Ciclos de cana-de-açúcar avaliados e tratamentos aplicados
Ciclo
Período
Data de
colheita
1ª soqueira
set/2008-set/2009
05/08/2009
2ª soqueira
set/2009-ago/2010
17/08/2010
3ª soqueira
ago/2010-jul/2011
11/07/2011
4ª soqueira
jul/2011-ago/2012
02/08/2012
Doses de N
0
60
120
180
0
60
120
180
0
60
120
180
0
60
120
180
Quantidade
acumulada de N
kg ha-1
0
60
120
180
0
120
240
360
0
180
360
540
0
240
480
720
Durante a condução do experimento, as quantidades de chuva ocorridas no período
foram coerentes com as características da região, com verões chuvosos e invernos secos (Figura
2.1). Apenas durante a 1ª soqueira, a precipitação foi em geral menor que a média dos últimos
90 anos, porém em geral a ocorrência de chuvas foram similares à média, exceto em alguns
meses, entre 2010 e 2011, durante a 3ª soqueira.
19
500
Precipitação mensal
Temperatura máxima
Precipitação mensal média de 90 anos
Temperatura mínima
1ª soqueira: 942 mm
2ª soqueira: 1596 mm
3ª soqueira: 1649 mm 4ª soqueira: 1513 mm
30
400
25
350
300
20
250
15
200
150
Temperatura (°C)
Precipitação (mm)
450
35
10
100
5
50
0
0
J A S O N D J F MAM J J A S O N D J F MAM J J A S O N D J F MAM J J A S O N D J F MAM J J
2008
2009
2010
2011
2012
Meses e Anos
Figura 2.1. Precipitação e temperatura durante o período de desenvolvimento de quatro
soqueiras de cana-de-açúcar (2008-2011) em Piracicaba-SP.
2.2.2. Alterações químicas do solo
Para avaliação das alterações químicas do solo em função dos tratamentos aplicados em
diferentes profundidades, amostras de solo foram coletadas em novembro/2012, nas
profundidades de 0-10, 10-20, 20-40 e 40-60 cm. As amostras coletadas nas profundidades de
0-10 e 10-20cm foram divididas de acordo com a posição: linha e entrelinha. Nessas
profundidades foram retiradas, por meio de trado calador, 10 subamostras no meio da entrelinha
e 10 subamostras em uma faixa de 20 cm de largura nas linhas de cana-de-açúcar. Nas
profundidades de 20-40 e 40-60cm, as amostras foram retiradas em 6 diferentes pontos (posição
próxima à linha) por meio de trado holandês.
Os atributos químicos analisados foram: pH em CaCl2 0,01M, acidez potencial (H+Al),
Ca2+, Mg2+, K+ e P, N mineral no solo, nas formas de amônio (NH4+) e nitrato (NO3-1) e enxofre
(S-SO4), de acordo com os procedimentos de análises químicas do solo descritos em (RAIJ et
al., 2001).
20
2.2.3. Acúmulo de nutrientes e produtividade
Ao final de cada ciclo, foram realizadas avaliações biométricas para estimativa da
produtividade e do acúmulo de nutrientes pela parte aérea da cana-de-açúcar. Para realizar essa
avaliação, toda a parte aérea das plantas foi colhida em 2 metros de linha dentro de cada unidade
experimental (4 tratamentos e 4 repetições). Tais amostragens foram realizadas em locais
aleatórios, dentro das 6 linhas centrais.
Após a colheita das plantas em 2 m lineares, a massa foi obtida no campo, por meio de
pesagem em balança eletrônica. Após a pesagem, o material vegetal de cada amostra foi
triturado logo em seguida. Para a trituração, foi utilizada máquina picadora de forragem, sendo
a seguir obtida a subamostra, a qual foi colocada em sacos plásticos e encaminhada ao
laboratório. Em laboratório, as amostras foram pesadas em balança analítica antes e após
secagem em estufa ventilada a 65°C, para determinação de umidade. Com o valor de umidade
do material, a massa seca foi estimada em kg/ha.
As amostras secas em estufa foram moídas em moinho de facas tipo Wiley, e
posteriormente foram determinados os teores de N, P, K, Ca, Mg e S (BATAGLIA et al., 1983).
A partir dos teores de cada elemento em g kg-1 e da produção de massa seca de cada
compartimento (colmos, ponteiros e folhas secas), foi possível estimar o acúmulo de nutrientes
em kg ha-1. Para estimar o balanço de N no sistema, foi considerado o N acumulado nos colmos
em cada soqueira, em kg ha-1, e o N aplicado, em kg ha-1. Assim, o balanço de entradas e saídas
é a diferença simples entre esses valores.
A produtividade de colmos foi estimada por meio da avaliação biométrica em todas as
soqueiras avaliadas. Além do peso de colmos em 2 m de linha, foram contados o número de
colmos nos 2m coletados (para cálculo de peso de cada colmo) e também o número de colmos
em 3 linhas inteiras de cana em cada parcela. A estimativa de Toneladas de Colmos por Hectare
(TCH) foi então realizada de acordo com a equação abaixo, adaptado de Landell et al. (2005):
TCH = (𝑃𝑥𝐶) 𝑥
ℎ𝑎
𝐴
onde:
P = Peso estimado de cada colmo
C = Número de colmos em 3 linhas de 30m
ha = 10000 m2
A = Área de contagem de colmos (126 m2)
21
2.2.4 Tratamentos aplicados na 4ª soqueira
O ensaio foi originalmente implantado com o intuito de preparar a área com condições
contrastantes de aporte de N-fertilizante para eventuais avaliações adicionais por meio de
divisão das unidades experimentais. Em out/2011, após a colheita da 3ª soqueira, as parcelas
foram divididas em 3 partes, sendo que metade da parcela inicial permaneceu apenas como
controle dos tratamentos iniciais, com reaplicação das doses de N (0, 60, 120 e 180 kg ha-1). Na
outra metade, não foi feita a reaplicação dos tratamentos, e foi então dividida em duas partes,
sendo que os tratamentos para cada fração da parcela original foi a inoculação das soqueiras
com bactérias diazotróficas e aplicação de 100 kg ha-1 de N. Dessa maneira, após a subdivisão,
as parcelas com o tratamento original ficaram com 10 linhas de 15 m, e as parcelas com
aplicação de inoculante e 100 kg ha-1 de N ficaram com 5 linhas de 15 m cada uma. Nas parcelas
com aplicação de 100 kg ha-1 de N, foram implantadas microparcelas para aplicação de
15
N,
conforme métodos descritos em Trivelin et al. (1994). A aplicação de fertilizantes nos diferentes
tratamentos foi realizada na primeira quinzena de setembro/2011.
O inoculante utilizado foi produzido pela Embrapa Agrobiologia (REIS; BALDANI;
URQUIAGA,
2009),
(Gluconacetobacter
composto
por
diazotrophicus,
cinco
estirpes
Herbaspirilum
de
bactérias
seropedicae,
diazotróficas
Herbaspirilum
rubrisubalbicans, Azospirilum amazonense e Bulkholderia tropica). O produto foi obtido na
forma de gel, e após diluição em água (100 l ha-1 de calda), foi aplicado no início da brotação
da cultura. A aplicação do inoculante foi realizada em operação conjunta para a aplicação de
nematicida, que é realizada após a passagem de um disco de corte sobre a superfície das
soqueiras. Após a passagem do disco de corte e aplicação de nematicida sobre a soqueira, a
calda contendo as estirpes de bactérias diazotróficas foi pulverizada por meio do uso de
pulverizador costal.
Para avaliação da recuperação de 15N-fertilizante, foi utilizado sulfato de amônio como
fonte nitrogenada, com 5,29% de abundância em átomos 15N. A implantação das microparcelas
e os cálculos de recuperação de 15N-fertilizante foram realizados de acordo com o sugerido por
Trivelin et al. (1994). O sulfato de amônio enriquecido foi aplicado ao longo de 2m lineares em
cada subparcela (3 m2). No momento da colheita, foi realizada avaliação biométrica das
microparcelas. Foram coletadas as plantas em 1m da microparcela, deixando 0,5m de cada lado,
e também 1m de plantas nas linhas imediatamente adjacentes. As amostras foram separadas em
colmos, folhas secas e ponteiros, pesadas, secas em estufa e moídas em moinho tipo Wiley para
posterior análise em espectrômetro de massa da % de 15N recuperada pelas plantas, e os cálculos
22
de recuperação (%15N) do N-fertilizante e do N proveniente do fertilizante (NPPF – kg ha-1),
de acordo com as equações abaixo:
NPPF = [(A - C) / (B - C)] x NT,
RN (%) = (NPPF / NAF) x 100, onde:
NPPF: Nitrogênio na planta proveniente de
15
N-fertilizante; A: abundância de
15
N (% de
átomos) da planta; B: abundância de 15N (5,29 % de átomos) do 15N fertilizante; C: abundância
natural de 15N (0.366% de átomos); NT: conteúdo de N na planta (kg ha-1); RN: recuperação
percentual do 15N fertilizante na planta; NAF: dose de N da fonte aplicada.
2.2.5 Análises Estatísticas
Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância, por meio do teste de F
ao nível de 95% de confiança. Para comparar o efeito de doses de N usou-se a análise de
regressão polinomial, sendo que o teste de F foi utilizado para comparar as posições linha e
entrelinha na amostragem de solo. Para a comparação dos tratamentos aplicados na 4ª soqueira,
análise de contrastes ortogonais foram aplicadas e os contrastes foram comparados por meio do
teste de F.
2.3 RESULTADOS
2.3.1 Atributos de solo e planta ao longo de quatro soqueiras
As alterações químicas do solo a partir de amostras coletadas após a colheita da última
soqueira em 2012 podem ser visualizadas nas Tabelas 2.3 e 2.4. Nessa amostragem, houve uma
divisão nas camadas de 0-10 e 10-20 cm, de acordo com a posição: linha e entrelinha. Ao final
do ciclo, o pH do solo na camada de 0-10 cm permaneceu próximo ou superior a 5,0, na linha
e entrelinha, sem diferença entre os tratamentos de N (Tabela 2.3).
Variações nos teores de Ca2+ e Mg2+ na camada 10-20 cm indicam que a adubação
nitrogenada promoveu maior movimentação de calcário no perfil do solo (Tabela 2.3). As doses
de N aplicadas ocasionaram aumentos quadráticos nos teores de Ca2+ na camada 10-20 cm e
Mg2+ na camada 0-10 da entrelinha. Na camada 10-20 cm, foi também observado aumento
linear de Mg2+ na entrelinha (Tabela 2.3). As condições de acidez do solo foram diferentes
dependendo da posição de coleta. Na linha, nota-se pH mais ácido, maior teor de Al3+ e menores
teores de Ca2+ e Mg2+ que na entrelinha da cultura, independente da dose de adubo nitrogenado.
Tais diferenças da linha e entrelinha foram mais intensas na camada 0-10 cm, mas também
foram observadas na camada 10-20 cm (Tabela 2.3). Em camadas mais profundas, de 20-40 e
40-60 cm, não foram observadas diferenças nos atributos relacionados à acidez do solo.
23
Tabela 2.3. Alterações químicas de solo coletado em diferentes posições em nov/2012, 42
meses após última calagem, sob aplicação de doses de N consecutivamente em quatro soqueiras
de cana-de-açúcar
Dose N
kg ha
Al3+
pH(CaCl2)
Ca2+
-1
K+
P
-3
1
2
L
EL
L
EL
L
0
60
120
180
Média
Efeito
R2
5,0
4,7
4,9
5,1
4,9 b
ns
-
5,5
5,3
5,2
5,4
5,4 a
ns
-
5,3
6,0
4,8
7,3
5,9 a
ns
-
1,5
1,3
1,8
2,0
1,7 b
ns
-
21
16
18
18
18 b
ns
-
0
60
120
180
Média
Efeito
R2
4,7
4,7
4,7
4,6
4,7 b
ns
-
4,9
4,9
5,0
4,8
4,9 a
ns
-
10,0
7,8
6,8
11,8
9,1 a
ns
-
7,0
6,8
4,5
7,3
6,4 b
ns
-
13
16
17
14
15
ns
-
0
60
120
180
Efeito
R2
Mg2+
4,5
4,4
4,7
4,6
ns
-
14,0
13,3
11,0
12,0
ns
-
mmolc dm
EL
L
0-10 cm
23
12
25
11
25
11
24
13
24 a
12 b
ns
ns
10-20 cm
14
8
19
10
17
8
17
7
17
8b
Q*
ns
0,80
20-40 cm
11
11
11
10
ns
-
mg dm-3
L
EL
EL
L
EL
15
21
16
13
16 a
Q**
0,81
2,2
1,9
2,3
2,1
2,1
ns
-
1,5
1,8
2,7
2,3
2,1
L**
0,64
5,8
5,5
6,3
6,0
5,9
ns
-
5,5
5,3
6,8
7,0
6,2
ns
-
9
10
10
11
10 a
L*
0,98
1,5
1,3
1,8
1,6
1,6 a
ns
-
0,9
1,2
1,7
1,2
1,2 b
Q**
0,79
4,3
4,0
6,0
5,5
5,0
L*
0,59
3,8
4,3
6,0
3,8
4,5
ns
-
5
6
7
6
ns
-
0,6
0,8
1,0
0,9
L**
0,81
1,8
1,3
3,3
2,0
ns
-
4
5
5
5
ns
-
0,6
0,6
0,7
0,6
ns
-
1,8
1,3
2,0
1,8
ns
-
40-60 cm
0
60
120
180
Efeito
R2
4,5
4,6
4,8
4,6
ns
-
12,5
10,3
10,8
13,3
ns
-
10
10
9
11
ns
-
Análises de regressão para efeito significativo das doses de N: Linear (L), Quadrático (Q), * (P<0,05), ** (P<0,01)
e ns: não significativo. 1: Amostras de solo coletadas na região da linha (L) 2: Amostras de solo coletadas na região
da entrelinha (EL).
Os teores de K+ e P no solo analisados em 2012 também foram afetados pela adubação
nitrogenada (Tabela 2.3). Ocorreu aumento linear de K+ nas camadas 0-10 e 20-40 cm da
entrelinha, e aumento quadrático na camada 10-20 cm, também na entrelinha. O teor de P na
camada 10-20 cm na linha também aumentou linearmente com as doses de N. Na camada de
10-20 cm, o teor de K+ observado na linha foi superior ao teor observado na entrelinha.
Apesar da grande diferença nas quantidades totais de fertilizante nitrogenado aplicadas,
poucas diferenças foram observadas nos teores de amônio (NH4+) e nitrato (NO3-) (Tabela 2.4).
24
Aumentos nos teores de NH4+ e NO3- com as doses de N foram observados somente na
entrelinha da camada 0-10 cm. Houve aumento no teor de NO3-na camada 10-20 cm, nas duas
posições avaliadas e na camada de 20-40 cm, sem resposta significativa no teor de NH4+ nessas
profundidades. A adubação nitrogenada aumentou linearmente o teor de S-SO4 na camada mais
profunda (40-60 cm), sem efeito significativo nas demais profundidades. Na camada de 0-10
cm e 10-20 cm, os teores de NH4+, NO3- foram maiores na linha que na entrelinha (Tabela 2.4),
ao passo que os teores de S-SO4-2 foram superiores na linha apenas na camada 0-10 cm.
Tabela 2.4. Alterações nos teores de nitrato (NO3-), amônio (NH4+) e sulfato (SO4-2) do solo
coletado em diferentes posições em nov/2012, após aplicação de doses de N consecutivamente
em quatro soqueiras de cana-de-açúcar
N-NH4+
Dose N
1
18
17
18
18
18 a
ns
-
0
60
120
180
Média
Efeito
R2
18
18
16
16
17 a
ns
-
S-SO4-2
--------------- mg kg-1 --------------EL
L
EL
L
EL
0-10 cm
5
15
2
34
22
6
13
0,7
29
26
5
17
3
36
25
10
15
3
38
29
6b
15 a
2b
34 a
25 b
L*
ns
L*
ns
ns
0,5
0,5
10-20 cm
6
14
1
36
33
4
16
1
35
40
3
17
2
41
38
5
16
2
42
46
5b
16 a
2b
38
39
ns
L*
L*
ns
ns
0,67
0,74
20-40 cm
1
56
1
51
1
61
3
62
L*
ns
0,67
40-60 cm
1
44
0,4
53
1
63
2
63
ns
L*
0,91
2
L
0
60
120
180
Média
Efeito
R2
N-NO3-
0
60
120
180
Efeito
R2
3
4
3
3
ns
-
0
60
120
180
Efeito
R2
3
3
3
3
ns
-
Análises de regressão para efeito significativo das doses de N: Linear (L), * (P<0,05), ** (P<0,01) e ns: não
significativo. 1: Amostras de solo coletadas na região da linha 2: Amostras de solo coletadas na região da entrelinha
25
O acúmulo de N, P, K, Ca, Mg e S em diferentes partes das plantas para todas as 4
soqueiras avaliadas pode ser observado nas Tabelas 2.5 e 2.6. A adubação nitrogenada
aumentou o acúmulo de nutrientes pelas plantas, especialmente quando se considera o
acumulado de todas as soqueiras.
Tabela 2.5. Acúmulo de nitrogênio (N), fósforo (P) e potássio (K) em diferentes
compartimentos da cana-de-açúcar após aplicação de doses de N
Dose N
kg ha
-1
0
60
120
180
Efeito
R²
0
60
120
180
Efeito
R²
0
60
120
180
Efeito
R²
0
60
120
180
Efeito
R²
0
240
480
720
Efeito
R²
Nitrogênio (N)
Fósforo (P)
Potássio (K)
Colmo Ponteiro Folhas Colmo Ponteiro Folhas Colmo Ponteiro Folhas
secas
secas
secas
---------------------------------kg ha-1-------------------------------1ª soqueira (2008-2009)
100,5
43,9
15,7
18,3
6,1
1,6
122,5
92,7
16,6
107,7
42,4
15,8
19,7
5,4
1,5
128,5
87,4
14,3
115,5
39,5
24,5
22,3
5,7
2,3
139,2
85,9
18,8
97,4
39,1
25,8
21,7
5,6
2,2
153,7
75,9
22,1
ns
ns
L*
ns
ns
L*
L*
ns
ns
0,85
0,64
0,97
2ª soqueira (2009-2010)
43,5
40,4
10,4
12,5
6,0
0,71
150,6
82,9
11,0
61,7
32,8
9,7
17,6
4,9
0,66
223,1
67,1
8,9
70,2
42,0
11,4
16,1
6,0
0,97
234,4
78,7
12,2
90,5
38,2
13,1
20,1
5,2
0,71
249,2
66,4
12,9
L**
ns
ns
L*
ns
ns
L*
ns
ns
0,98
0,75
0,82
3ª soqueira (2010-2011)
51,6
35,3
8,0
9,6
4,8
0,43
75,5
58,3
2,2
55,6
59,0
8,9
11,9
6,1
0,68
80,5
83,3
3,2
51,3
37,2
7,8
8,9
5,5
0,50
71,0
61,0
1,8
55,1
47,1
7,7
10,9
5,4
0,52
76,6
67,2
2,1
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
4ª soqueira (2011-2012)
70,3
60,4
10,9
3,6
7,2
1,44
104,4
72,4
7,0
72,6
79,5
13,6
3,5
7,9
1,32
102,0
63,2
5,6
60,0
80,9
11,1
2,7
7,7
1,18
128,9
70,6
8,2
98,0
138,2
17,9
4,8
12,7
1,46
123,9
59,3
8,7
ns
L**
L*
ns
L*
ns
Q*
ns
ns
0,81
0,54
0,66
0,67
Acumulado 4 soqueiras
265,9
180,0
45,0
44,0
24,1
4,2
453,0
306,3
36,8
297,6
213,7
48,0
52,7
24,3
4,2
534,1
301,0
32,0
297,0
199,6
54,8
50,0
24,9
4,9
573,5
296,2
41,0
341,0
262,6
64,5
57,5
28,9
4,9
603,4
268,8
45,8
L*
L*
L*
L*
ns
L*
L*
ns
L*
0,66
0,73
0,82
0,76
0,53
0,96
0,62
Análises de regressão para efeito significativo das doses de N: Linear (L), * (P<0,05), ** (P<0,01) e ns: não
significativo.
26
Além de aumento no acúmulo de N, reflexo da adição de adubo nitrogenado ao solo, as
melhores condições de fertilidade do solo também promoveram aumento no acúmulo de P, K,
Ca, Mg e S. A ordem de acúmulo de nutrientes foi K>N>Ca>Mg>S>P, assim como observado
por OLIVEIRA (2011), após a aplicação de diferentes doses de N em soqueiras de cana-deaçúcar. As quantidades de N, P e K acumuladas pelos ponteiros foram sempre superiores às
quantidades acumuladas pelas folhas secas (Tabela 2.5).
Tabela 2.6. Acúmulo de cálcio (Ca), magnésio (Mg) e enxofre (S) em diferentes
compartimentos da cana-de-açúcar após aplicação de doses de N
Dose N
kg ha
-1
Colmo
0
60
120
180
Efeito
R²
43,6
44,6
44,4
41,6
ns
-
0
60
120
180
Efeito
R²
25,3
18,6
26,7
26,9
ns
-
0
60
120
180
Efeito
R²
50,4
56,4
50,4
56,7
ns
-
0
60
120
180
Efeito
R²
66,8
57,7
46,7
90,1
ns
-
0
240
480
720
Efeito
R²
186,1
177,3
168,2
215,3
ns
-
Cálcio (Ca)
Magnésio (Mg)
Enxofre (S)
Ponteiro Folhas Colmo Ponteiro Folhas Colmo Ponteiro
secas
secas
---------------------------------kg ha-1-------------------------------1ª soqueira (2008-2009)
28,3
38,5
36,4
10,4
17,2
21,2
9,2
24,2
42,3
38,1
9,9
15,4
21,4
8,9
23,6
54,0
42,8
10,3
20,4
25,6
9,0
23,9
50,6
34,5
9,5
17,8
23,6
8,7
ns
L*
ns
ns
ns
ns
ns
0,74
2ª soqueira (2009-2010)
23,2
47,9
8,1
7,9
8,1
7,5
10,8
19,9
36,9
6,5
6,7
6,5
5,9
8,9
27,4
36,2
8,9
9,9
8,9
7,7
12,3
25,1
41,7
9,1
8,7
9,1
8,2
10,3
ns
ns
ns
ns
ns
ns
ns
3ª soqueira (2010-2011)
14,4
8,9
34,2
8,3
2,8
25,0
8,2
18,4
10,4
31,9
9,0
2,5
28,1
9,8
17,5
10,2
24,3
9,3
2,5
20,5
10,9
20,3
10,5
35,7
9,6
2,7
30,6
9,8
L*
ns
ns
ns
ns
ns
ns
0,77
4ª soqueira (2011-2012)
24,4
10,1
47,4
14,0
6,9
33,5
9,1
28,1
9,3
39,7
18,7
7,3
22,5
12,1
31,5
6,9
30,8
21,8
5,2
17,7
12,3
50,8
11,2
69,3
35,7
8,4
41,7
22,9
L*
ns
ns
L**
ns
ns
L**
0,82
0,89
0,79
Acumulado 4 soqueiras
90,3
105,4 126,1
40,6
30,3
87,2
37,3
90,6
98,9
116,2
44,3
31,7
77,9
39,7
100
107,3 106,8
51,3
37
71,5
44,5
120,1
114
148,6
63,5
38
104,1
51,7
L*
L*
ns
L*
L*
ns
L**
0,88
0,61
0,94
0,81
0,95
Folhas
secas
11,8
10,4
12,8
13,2
ns
7,5
5,9
7,7
8,2
ns
1,7
1,8
1,8
1,9
ns
3,9
4,6
3,1
5,3
ns
24,9
22,7
25,4
28,6
ns
-
Análises de regressão para efeito significativo das doses de N: Linear (L) * (P<0,05), ** (P<0,01) e ns: não
significativo.
27
Todos os nutrientes avaliados apresentaram alto acúmulo nos ponteiros na 4ª soqueira
avaliada (Tabela 2.5; Tabela 2.6). No momento da colheita desse ciclo, as plantas apresentaram
níveis médios de °Brix inferior ao recomendado como ponto ideal de maturação para a colheita
(<16%) e também ATR médio em torno de 130. Isso demonstra que as plantas ainda não
estavam em ponto ideal para corte, apesar de terem sido cortadas com mais de 11 meses após o
último corte. No entanto, por necessidades logísticas, o corte foi realizado antes da maturação
ideal. Nessa fase, os ponteiros ainda representam uma importante porção das plantas, fazendo
com que o peso elevado dos ponteiros tenha causado esse maior acúmulo geral nos nutrientes,
uma vez que os teores de nutrientes não diferiram significativamente dos observados em anos
anteriores.
A produção de colmos aumentou linearmente com as doses de adubo nitrogenado em
todas as soqueiras (Figura 2.2). Com base nas equações, o aumento estimado na produção de
colmos em função da adubação nitrogenada, em kg de colmos por kg de N aplicado foi de 140,
180, 210 e 170 kg de colmos por kg de N na 1ª, 2ª, 3ª e 4ª soqueira, respectivamente.
Produtividade de colmos (t ha-1)
180
180
1a Soqueira
130
2a Soqueira
130
ŷ = 117,7 + 0,14x
R² = 0,95**
80
80
30
ŷ = 89,4 + 0,18x
R² = 0,86**
30
0
180
60
120
180
0
180
3a Soqueira
130
60
120
180
4a Soqueira
130
ŷ = 35,8 + 0,21x
R² = 0,91**
80
ŷ = 60,9 + 0,17x
R² = 0,93**
80
30
30
0
60
120
N adicionado (kg ha-1)
180
0
60
120
N adicionado (kg ha-1)
180
Figura 2.2. Produção de colmos de cana-de-açúcar em quatro soqueiras consecutivas com
aplicação de diferentes doses de N-fertilizante. **: significativo a P<0,01
O balanço de entradas (adição de N-fertilizante) e saídas (exportação de N pelos colmos)
é apresentado na Figura 2.3. Em todas as soqueiras, o balanço foi negativo nas doses 0 e 60 kg
ha-1, e positivo nas doses de 120 e 180 kg ha-1. Portanto, nas doses 0 kg ha-1 e 60 kg ha-1 poderia
28
ocorrer consumo de N orgânico do solo, ao passo que as doses 120 kg ha-1, e principalmente
180 kg ha-1, incrementaram o estoque de N orgânico do solo. Com base na equação estimada a
partir do acumulado em 4 soqueiras, a quantidade necessária para a reposição do N exportado
(N aplicado – N exportado)
Balanço de N
seria 69 kg ha-1ciclo-1.
450
350
ŷ = -257,2 + 0,92x R² = 0,99**
250
150
50
-50
-150
-250
0
240
480
720
-1
N adicionado (kg ha )
Figura 2.3. Balanço de nitrogênio (exportado – adicionado via fertilizante), de acordo com o
cultivo de soqueiras consecutivas após aplicação de doses de N-fertilizante. **: significativo a
P<0,01
2.3.2 Tratamentos adicionais aplicados na 4ª soqueira
Não foram observadas diferenças significativas (Pr>0,05) entre inoculação e aplicação
de N-fertilizante nos teores de nutrientes na folha diagnóstico da cana-de-açúcar, na
comparação em cada dose anterior de N (Tabela 2.7). Em comparação com a testemunha sem
N, a aplicação de inoculante promoveu aumento nos teores foliares de P e K (Tabela 2.7).
Nas situações em que não houve diferença significativa entre inoculação e N100, podese supor que a inoculação apresentou os mesmos benefícios que a aplicação de 100 kg ha-1 de
N, ou que ambos os tratamentos não apresentaram efeito. Para checar qual situação ocorreu, foi
feito um novo contraste comparando a inoculação, na média dos tratamentos das soqueiras
anteriores, com a testemunha absoluta para todas as variáveis analisadas. Ao comparar com o
tratamento controle, observa-se que houve aumento significativo no teor foliar de P, K, Ca e
Mg com a inoculação (Tabela 2.7).
29
Tabela 2.7. Teor de macronutrientes na folha +1 de cana-de-açúcar (4ª soqueira), durante fase
de máximo crescimento da cultura, com aplicação de N-fertilizante (100 kg ha-1) ou inoculação
com bactérias diazotróficas, sob diferentes quantidades de N-fertilizante adicionado nas 3
soqueiras anteriores.
N
Trat. 4ª
soqueira
N
P
K
Ca
Mg
S
------------------------------------- g kg-1 -------------------------------------Inoculação
15,8
1,5
8,22
4,2
2,0
1,6
N100
15,6
1,5
8,67
4,3
2,1
1,8
Pr>F*
0,8104
0,7519
0,0929
0,8058
0,2022
0,1084
Inoculação
14,6
1,5
8,3
4,0
1,9
1,6
180
N100
15,8
1,5
8,7
4,1
2,0
1,7
Pr>F
0,083
0,6737
0,1789
0,7488
0,1245
0,1638
Inoculação
15,9
1,5
8,4
4,0
2,1
1,6
360
N100
16,1
1,5
8,0
4,3
2,1
1,7
Pr>F
0,8104
0,4026
0,1731
0,3525
0,5095
0,3221
Inoculação
15,9
1,5
8,4
4,7
2,0
1,8
540
N100
16,5
1,5
8,4
4,7
2,1
1,8
Pr>F
0,346
0,916
0,9387
0,9169
0,2796
0,8775
Inoculação
15,6
1,5
8,3
4,2
2,0
1,7
Média
N100
16,0
1,5
8,5
4,3
2,1
1,7
Pr>F
0,1784
0,6737
0,3735
0,4859
0,0287
0,0438
Média
Inoculação
15,6
1,5
8,3
4,2
2,0
1,7
N0
15,5
1,4
7,6
3,6
1,8
1,6
Pr>F**
0,99
0,017
0,031
0,043
0,016
0,229
* Comparação entre as médias (Inoculação vs N100) por meio de análise de contrastes ortogonais
** Comparação entre a média dos resultados com inoculação e ausência de adubação nitrogenada
0
30
Houve maior acúmulo de N, P e K nos colmos (Tabela 2.8), N nas folhas secas (Tabela
2.9) e N nos ponteiros (Tabela 2.10) com a inoculação, em comparação com a ausência de
aplicação de N. A aplicação de 100 kg ha-1 de N resultou em maior acúmulo de N, P e K nos
colmos na maior parte das condições avaliadas, exceto no acúmulo de N, P e K na dose 0 kg
ha-1 e P em 180 kg ha-1 de N, onde não houve diferença entre aplicação de 100 kg de N ha-1 e
inoculação (Tabela 2.8). Ao comparar a inoculação com a ausência de adubação nitrogenada
em todas as soqueiras, observa-se maior acúmulo de N, P e K nos colmos no tratamento com
inoculação.
Tabela 2.8. Acúmulo de macronutrientes nos colmos de cana-de-açúcar (4ª soqueira), com
aplicação de N-fertilizante (100 kg ha-1) ou inoculação com bactérias diazotróficas, sob
diferentes quantidades de N-fertilizante adicionado nas 3 soqueiras anteriores.
N
kg ha-1
Trat. 4ª
soqueira
N
P
K
--------------- kg ha-1 ---------------
Inoculação
85,0
4,6
58,1
N100
93,2
4,3
53,0
0,504
0,628
0,333
Pr>F*
Inoculação
82,7
3,9
36,6
180
N100
103,6
4,0
49,6
Pr>F
0,096
0,86
0,019
Inoculação
74,7
4,4
32,6
360
N100
116,5
6,1
42,7
Pr>F
0,002
0,014
0,045
Inoculação
74,6
4,3
41,4
540
N100
100,1
5,8
60,2
Pr>F
0,005
0,026
0,002
Inoculação
79,3
4,7
46,9
Média
N100
103,4
4,7
46,7
Pr>F
0,02
0,271
0,151
Inoculação
79,3
4,7
46,9
Média
N0
70,3
3,6
36,9
Pr>F**
0,049
0,017
0,031
* Comparação entre as médias (Inoculação vs N100) por meio de análise de contrastes ortogonais
** Comparação entre a média dos resultados com inoculação e ausência de adubação nitrogenada
0
31
Aumento no acúmulo de nutrientes nas folhas secas com a aplicação de 100 kg ha-1 de
N em comparação com a inoculação foi observado no acúmulo de P e K na dose 0, N na dose
180 e N na média dos tratamentos (Tabela 2.9). Ao comparar a inoculação com a ausência de
aplicação prévia de N, não se observam diferenças significativas.
Tabela 2.9. Acúmulo de macronutrientes nas folhas secas de cana-de-açúcar (4ª soqueira), com
aplicação de N-fertilizante (100 kg ha-1) ou inoculação com bactérias diazotróficas, sob
diferentes quantidades de N-fertilizante adicionado nas 3 soqueiras anteriores.
N
kg ha-1
Trat. 4ª
soqueira
N
P
K
---------- kg ha-1 ----------
Inoculação
9,3
1,3
10,7
N100
12,4
1,8
18,8
Pr>F*
0,21
0,03
0,003
Inoculação
12,0
1,6
21,5
180
N100
19,6
1,8
18,2
Pr>F
0,005
0,473
0,179
Inoculação
13,9
1,4
15,4
360
N100
18,6
1,7
14,2
Pr>F
0,067
0,161
0,613
Inoculação
14,1
1,8
20,2
540
N100
14,5
1,7
17,3
Pr>F
0,312
0,212
0,213
Inoculação
12,3
1,5
16,9
Média
N100
16,3
1,6
15,8
Pr>F
0,0044
0,4818
0,1317
Média
Inoculação
12,3
1,5
16,9
N0
10,9
1,4
17,6
Pr>F**
0,078
0,676
0,751
* Comparação entre as médias (Inoculação vs N100) por meio de análise de contrastes ortogonais
** Comparação entre a média dos resultados com inoculação e ausência de adubação nitrogenada
0
32
Com relação aos macronutrientes acumulados nos ponteiros de cana-de-açúcar,
observou-se aumento no acúmulo de P no tratamento 0 kg ha-1 de N, e aumento de N em média
dos tratamentos de adubação nitrogenada (Tabela 2.10). Ao comparar a inoculação com o
tratamento controle, não foram observadas diferenças significativas.
Tabela 2.10. Acúmulo de macronutrientes nos ponteiros de cana-de-açúcar (4ª soqueira), com
aplicação de N-fertilizante (100 kg ha-1) ou inoculação com bactérias diazotróficas, sob
diferentes quantidades de N-fertilizante adicionado nas 3 soqueiras anteriores.
N
Trat. 4ª
soqueira
N
P
K
kg ha-1
Inoculação
60,1
7,0
125,8
N100
81,5
8,9
163,5
Pr>F*
0,075
0,032
0,083
Inoculação
71,2
7,0
136,9
180
N100
58,6
6,5
108,0
Pr>F
0,282
0,529
0,178
Inoculação
65,4
6,8
128,4
360
N100
72,5
7,5
151,8
Pr>F
0,54
0,399
0,273
Inoculação
85,9
9,5
196,0
540
N100
94,6
8,3
149,8
Pr>F
0,454
0,183
0,137
Inoculação
70,6
7,6
146,8
Média
N100
76,8
7,8
143,3
Pr>F
0,0517
0,1299
0,126
Média
Inoculação
70,6
7,6
146,8
N0
60,4
7,2
126,3
Pr>F**
0,078
0,676
0,751
* Comparação entre as médias (Inoculação vs N100) por meio de análise de contrastes ortogonais
** Comparação entre a média dos resultados com inoculação e ausência de adubação nitrogenada
0
A aplicação de N-fertilizante promoveu aumento na produção de colmos em
comparação com a inoculação após a aplicação de 0, 180 e 360 kg ha-1 de N nas 3 soqueiras
anteriores, ao passo que na maior dose aplicadas nas soqueiras anteriores (540 kg ha-1), não foi
observada diferença entre a inoculação e a aplicação de N-fertilizante (Figura 2.4). A
comparação entre os resultados de produção de colmos com inoculação ou na testemunha
absoluta (dados não mostrados) não resultou em diferença significativa.
33
Inoculação
Produção de colmos (t ha-1)
90
80
70
100 kg/ha de N
**
**
100
ns
**
Tratamentos originais
Inoculação
100 kg N/ha
90
80
70
60
60
50
50
40
y = 60,9 + 0,17x R² = 0,93**
40
30
30
20
20
10
10
0
y = 68,3 + 0,06x - 0,00005x2 R² = 0,77*
y = 56,9 + 0,04x R² = 0,84
0
0
180
360
540
0
180
360
540
-1
N adicionado nas 3 soqueiras anteriores (kg ha )
Figura 2.4. Produção de colmos de cana-de-açúcar (4ª soqueira) com aplicação de Nfertilizante (100 kg ha-1) ou inoculação com bactérias diazotróficas, sob diferentes quantidades
de N-fertilizante adicionado nas 3 soqueiras anteriores.
Houve maior absorção de N do fertilizante nos ponteiros após a ausência de aplicação
de N nas soqueiras anteriores (Tabela 2.11), ao passo que nos colmos e nas folhas secas as
menores proporções de 15N-fertilizante foram observadas nas doses intermediárias (180 e 360
kg ha-1 de N).
Tabela 2.11. Proporção (%) de N acumulado Proveniente do Fertilizante (NPDF) em diferentes
compartimentos da parte aérea de cana-de-açúcar em cultivo de 4ª soqueira, após a adição de
diferentes quantidades de N nas 3 soqueiras anteriores
% NPDF
Dose N longo
prazo
Colmos Folhas secas Ponteiros
kg ha-1
---------- % ---------0
19,9 a
18,1 a
18,3 a
180
14,3 b
17,3 ab
12,7 b
360
14,8 b
12,3 b
12,7 b
540
19,9 a
19,6 a
13,9 b
17,2
16,8
14,4
Média
CV %
12,2
14,9
12,6
Quando foi considerado o total de N acumulado na planta proveniente do fertilizante,
ocorreu predominantemente maior acúmulo após baixas doses de N nas soqueiras anteriores
(Figura 2.5) nos colmos e ponteiros, e consequentemente na parte aérea total (Figura 2.6). Na
parte aérea total, a % de recuperação de N-fertilizante em cada tratamento anterior foi de 44,2%
(0 kg ha-1), 34,3% (180 kg ha-1), 24,8% (360 kg ha-1) e 31,8% (540 kg ha-1).
34
% Recuperação
20
Recuperação (%) do 15Nfertilizante nos colmos
a
ab
ab
b
20
Recuperação (%) do 15Nfertilizante nas folhas
secas
20
15
15
10
10
10
5
5
15
0
a
a
a
a
0
180
360
540
0
0
180
360
540
Recuperação (%) do 15Nfertilizante nos ponteiros
a
ab
ab
b
5
0
0
180
360
540
N adicionado nas 3 soqueiras anteriores (kg ha-1)
Figura 2.5. Recuperação de 15N-Sulfato de amônio em diferentes compartimentos da parte
aérea de cana-de-açúcar, aplicado na dose de 100 kg ha-1 na 4ª soqueira, após adição de
diferentes quantidades de N nas 3 soqueiras anteriores. Letras iguais não diferem entre si pelo
teste de Tukey a 5% de probabilidade.
% Recuperação
50
40
Recuperação (%) do 15N-fertilizante na
parte aérea total
y = 40,8 - 0,03x
R² = 0,56*
30
20
10
0
0
180
360
540
N adicionado nas 3 soqueiras anteriores (kg ha-1)
Figura 2.6. Recuperação de 15N-Sulfato de amônio pela parte aérea de cana-de-açúcar, aplicado
na dose de 100 kg ha-1 na 4ª soqueira, após adição de diferentes quantidades de N nas 3 soqueiras
anteriores. *: P<0,05.
A maior recuperação de 15N-fertilizante observada nas parcelas controle não refletiram
em maior produtividade quando comparado com os demais tratamentos. O baixo aporte de N
na condição do tratamento controle (com 100 kg ha-1 de N na 4ª soqueira) não foi suficiente
para a obtenção de produtividades similares aos outros tratamentos, apesar do maior
aproveitamento do fertilizante, com a mesma dose de N nesse ciclo.
35
2.4 DISCUSSÃO
2.4.1. Atributos químicos do solo
As elevadas produtividades obtidas nos ciclos de cana-planta e 1ª soqueira aceleraram
o processo de acidificação do solo, com pH próximo a 4,0 no final do ciclo de 1ª soqueira, em
2009 (Tabela 2.1). Isso ocorre pela alta remoção de bases trocáveis, além do uso de altas doses
de N amoniacal em alguns tratamentos, o que resultou na necessidade de reaplicação de calcário
e gesso (para melhorar as condições na subsuperfície) durante a soqueira. A aplicação de
calcário e gesso agrícola em cana-soca é uma prática comum em canaviais, sendo recomendável
a realização de análises de solo após a colheita da 1ª ou 2ª soca para verificação das condições
de acidez do solo e permitir a aplicação de calcário e gesso em tempo hábil e assegurar bons
níveis de produtividade nas soqueiras subsequentes (LORENZETTI et al., 1992;
SPIRONELLO et al., 1997; PENATTI, 2013).
Os efeitos da adubação nitrogenada na acidificação do solo cultivado com cana-deaçúcar são normalmente observados até a profundidade de 20 cm (PRADO; PANCELLI, 2008).
A calagem na cana-soca precisa ser aplicada sobre a palha em superfície, e a reação fica limitada
à superfície, levando algum tempo até reagir em camadas mais profundas. A aplicação de altas
doses de N implica aumento na intensificação agrícola, dependendo portanto da obtenção de
elevadas produtividades para que o alto uso de N seja viável (KOLBERG; WESTFALL;
PETERSON, 1999). A acidificação causada pela adubação nitrogenada amoniacal pode ser um
fator limitante para a resposta da cana-de-açúcar ao N aplicado (DEBRECZENI;
KISMÁNYOKY, 2005; CANTARELLA, 2007) . Em solos com menor poder tampão, um ciclo
com altas doses de N e elevadas produtividades poderia limitar a produtividade do próximo
ciclo, e inclusive resultar na ausência de resposta à aplicação de N.
Os resultados da análise de solo de 2010 (dados não apresentados) mostraram que,
mesmo sem a aplicação de N, o solo estava ácido e em níveis similares às condições com
aplicação de altas doses de N, devido à remoção de bases trocáveis com a alta produtividade
obtida nos ciclos anteriores. Tais fatores indicaram a necessidade de aplicação de calcário em
toda a área, sem necessidade de discriminação entre tratamentos. Ainda existem dúvidas a
respeito da real necessidade de aplicação de calcário e gesso agrícola e qual a recomendação
para soqueiras de cana-de-açúcar sem queima (PENATTI, 2013). Em áreas de alto potencial
produtivo, a correção da acidez do solo é uma prática que garante a qualidade do solo e em
longo prazo sustenta a produção agrícola. Estudos são necessários nessas condições com
aplicação de diferentes doses de calcário e N em soqueiras de alta produtividade para futuras
recomendações.
36
Os resultados de análise de solo de 2012 indicam que, após 24 meses da aplicação de
calcário, houve correção da acidez em todos os tratamentos de adubação nitrogenada. No
entanto, observam-se pequenos aumentos nos teores de Ca+2, Mg+2 e K+ com a aplicação de
adubo nitrogenado (Tabela 2.3). Aumentos nos teores de cátions trocáveis em maiores
profundidades são normalmente benéficos para o desenvolvimento de raízes em camadas mais
profundas e absorção desses nutrientes pelas plantas (MORELLI et al., 1992). Em condições
de estresse hídrico, as plantas podem se beneficiar das melhores condições de fertilidade em
subsuperfície, onde há maior disponibilidade de água.
O aumento observado nos teores de K+ na entrelinha da cultura se deve principalmente
à decomposição de maior volume de restos culturais com maiores doses de N, que rapidamente
liberam K ao solo, além da ciclagem promovida pelo sistema radicular em profundidade. Devese ressaltar que altas doses de K2O foram aplicadas no solo (150 kg ha-1) em todos os
tratamentos, e em condições de menor desenvolvimento e produtividade como ocorreu na
ausência de aplicação de N, pode resultar em perdas de K.
Mesmo com aplicações de diferentes quantidades de N mineral ao solo, essa fração de
N no solo normalmente representa em torno de 5% do total, sendo que em torno de 95% do N
no solo permanece na forma orgânica. Isso explica a baixa variação nos níveis de N-NH4+ e NNO3- no solo, mesmo com níveis muito contrastantes de N-fertilizante aplicado, porém em
amostragem realizada ao final de 4 anos de avaliação. Uma das maiores preocupações com a
aplicação de altas quantidades de N no sistema é a lixiviação de NO3-, que pode resultar em
contaminação de lençóis freáticos (QAFOKU; SUMNER; RADCLIFFE, 2000; GHIBERTO et
al., 2011). No entanto, em solos profundos e com provável ocorrência de cargas positivas em
profundidade como o solo do presente estudo, a lixiviação de NO3- tem menor importância que
em solos arenosos e rasos (GHIBERTO et al., 2011, 2009; PENATTI, 2013).
O aumento no teor de S-SO4 na camada de 40-60 cm com as doses de N (Tabela 2.4)
foi resultado da aplicação de sulfato de amônio no último ciclo de avaliação. A aplicação de
altas doses de sulfato de amônio promove movimentação de SO42- para camadas mais profundas
(FOLONI; ROSOLEM, 2006). Existe também sinergismo entre N e S nas plantas
(MALAVOLTA; MORAIS, 2007). Ambos são constituintes de proteínas e aminoácidos nas
plantas, e a maior absorção de N quando ocorre aumento na disponibilidade é normalmente
acompanhada pela absorção de S, aumentando assim a demanda deste nutriente.
A variabilidade observada em função da posição de amostragem (linha ou entrelinha) é
esperada, uma vez que toda a fertilização mineral da cultura, nos cinco ciclos (cana-planta +
quatro soqueiras), foi realizada em uma faixa de aproximadamente 20 cm em torno da
37
linha/sulco. A variabilidade espacial da fertilidade do solo em culturas perenes e semi-perenes
adubadas em linha é conhecida, porém a amostragem na entrelinha têm sido apontada como
mais representativa e eficiente para recomendação de corretivos (PRADO; FERNANDES;
ROQUE, 2001). De fato, as recomendações de correção do solo na cana-soca foram baseadas
em análise da entrelinha, e resultaram em boas condições de fertilidade em ambas as posições.
A recomendação baseada na linha poderia resultar em excessiva aplicação de calcário. No
entanto, altas doses de N concentradas em locais específicos aplicadas consecutivamente ao
longo dos ciclos pode causar excessiva acidificação no local de aplicação, resultando em
redução no desenvolvimento de raízes nas regiões próximas à localização do fertilizante e
diminuindo assim a eficiência de uso do N aplicado.
2.4.2. Acúmulo de nutrientes e produtividade de colmos
Foi observada grande variação no acúmulo de macronutrientes pela cultura no final do
ciclo, entre tratamentos e também entre as soqueiras, além da esperada diferença entre
compartimentos da planta. Em geral, a cana-de-açúcar é dividida em três compartimentos
(colmos, folhas secas e ponteiros), sendo que os colmos representam o compartimento de maior
acúmulo para a maior parte dos nutrientes, devido à redistribuição para produção e acúmulo de
açúcares, e principalmente pela maior produção de massa seca. Como os colmos são removidos
na colheita, os nutrientes acumulados nesse compartimento são exportados (OLIVEIRA et al.,
2010). Os compartimentos de folhas secas e ponteiros representam o material que permanece
após a colheita (CARVALHO et al., 2013; FRANCO et al., 2013). A diferença entre eles é que
os ponteiros contêm as folhas verdes metabolicamente ativas, enquanto que as folhas secas
representam as partes senescentes. A concentração de nutrientes em diferentes partes das
plantas é dependente da atividade metabólica de cada compartimento (MARSCHNER, 2011).
Portanto, é esperado que nutrientes mais móveis na planta, como N, P e K sejam mais
acumulados nos ponteiros que nas folhas secas, ao passo que nutrientes menos móveis, como o
Ca, apresentam maior acúmulo nas folhas secas. Além disso, podem ocorrer diferenças no
acúmulo de nutrientes entre os diferentes ciclos na mesma área, devido às diferenças climáticas
e condições da soqueira, que influenciam diretamente a disponibilidade dos nutrientes e a
produção de massa seca (OLIVEIRA, 2011).
Apesar de ser esperado aumento no acúmulo de N com as doses de fertilizante,
houveram algumas situações de ausência de resposta às doses de N. O acúmulo de nutrientes
na cultura é dependente de diversos fatores, particularmente das condições climáticas, fase do
ciclo (OLIVEIRA, 2011) e variedade (OLIVEIRA et al., 2011). Apesar da grande variação
observada, ao considerar o acumulado das quatro soqueiras, aumentos lineares no acúmulo de
38
N foram observados em todos os compartimentos (Tabela 2.5). Tais resultados mostram a
importância da avaliação de ciclos consecutivos de soqueiras de cana-de-açúcar, para que se
obtenham valores que representam as variações que podem ocorrer no acúmulo de nutrientes
em função de diversos fatores, e assim auxiliar em futuras recomendações de adubação para
áreas de alta produtividade de cana-de-açúcar.
A alta acidez do solo observada nas camadas mais profundas (Tabela 2.3) pode causar
má formação de raízes. Como resultado, pode ocorrer limitação na exploração de camadas mais
profundas, e por consequência no acesso à água e nutrientes. Tal fato também pode ter
contribuído para o aumento linear na produção de colmos das quatro soqueiras avaliadas
(Figura 2.2).
Ao contrário do que normalmente ocorre em cana-planta, as respostas positivas de canasoca à adubação nitrogenada são mais frequentes (ORLANDO FILHO et al., 1999;
CANTARELLA, 2007). Franco et al. (2011) avaliaram a contribuição de
15
N-fertilizante em
cana-planta e cana-soca, e verificaram que nas soqueiras em torno de 40% do N nas plantas foi
proveniente do fertilizante, ao passo que na cana-planta a contribuição foi de apenas 5%. No
entanto, apesar de ser mais frequente que na cana-planta, as respostas das soqueiras de canade-açúcar ao N-fertilizante é em geral errática (CANTARELLA, 2007), sendo que em muitos
casos não são observadas respostas positivas à adubação nitrogenada. No entanto, trabalhos
recentes conduzidos em diferentes tipos de solo com a variedade SP 81-3250 mostraram
respostas lineares à adubação nitrogenada em soqueira até as doses de 175 kg ha-1 em solo
arenoso (VITTI et al., 2007b) e até 150 kg ha-1 em solo argiloso (FORTES et al., 2013a).
Houve grande variação na produtividade entre diferentes soqueiras, especialmente em
função de condições climáticas, além do decréscimo natural de produtividade no decorrer dos
ciclos de cana-soca. Nota-se que ocorreu excesso de chuvas nos meses de dezembro/2010 e
janeiro/2011, período de máximo crescimento da cultura. O excesso de chuvas nesses períodos
pode reduzir o potencial produtivo da cultura pelo decréscimo na energia solar disponível (alta
nebulosidade com chuvas). Tal condição afetou a produtividade no 3º ciclo de cana-soca, de
maneira que a produtividade foi até mesmo inferior à obtida no último ciclo.
É importante destacar as altas produtividades obtidas nas primeiras soqueiras e também
na cana-planta (216 t ha-1), antes da aplicação dos tratamentos. Essa elevada produção de
colmos foi resultado das ótimas condições de solo e clima em uma variedade altamente
responsiva. No entanto, altas produtividades também significam alta remoção de N e outros
nutrientes do sistema, que precisam ser supridos para as soqueiras subsequentes. Considerando
que a adubação nitrogenada na cana-planta (48 kg ha-1) provavelmente não foi suficiente para
39
suprir todo o N removido pela cultura, houve consumo do N orgânico do solo, mesmo
considerando a possibilidade de que em torno de 60 kg ha-1 (40 kg ha-1ano-1) de N tenha sido
proveniente da fixação biológica de N (HERRIDGE; PEOPLES; BODDEY, 2008;
URQUIAGA et al., 2012), outra fonte apontada como importante para a nutrição nitrogenada
de cana-de-açúcar e também um dos motivos apontados para a ausência de resposta da cultura
ao N aplicado em algumas situações. Portanto, nas condições do presente estudo, o uso de uma
variedade altamente responsiva, o alto consumo de N desde o ciclo de cana-planta, além das
melhorias observadas nos atributos químicos do solo, como a correção mais rápida do solo após
a aplicação de calcário na superfície em cana-soca resultou na resposta positiva ao N aplicado
em todas as soqueiras, com alta produtividade na dose de 180 kg ha-1 de N, superior à
comumente aplicada.
Normalmente, é recomendado em torno de 100 kg ha-1 de N em cana-soca, para a
produtividade de 80-100 t ha-1 de colmos em cana com queima prévia (SPIRONELLO et al.,
1997). Essa recomendação foi baseada em uma série de ensaios realizados nas décadas de 1980
e 1990, predominantemente com queima prévia antes da colheita. No entanto, o advento da
cana-crua, sem queima prévia antes da colheita, trouxe algumas dúvidas em relação ao manejo
da adubação nitrogenada. O manejo sem despalha a fogo potencialmente conserva o N no
sistema solo-planta. Porém, a taxa de mineralização desta palhada com alta relação C:N é lenta
(CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). Com alto aporte de resíduos, ocorre alta
imobilização do N contido nos resíduos e no solo. Além disso, nos últimos anos o uso de
variedades mais produtivas tem mostrado respostas lineares altamente positivas ao N aplicado.
Resultados de experimentos com cana-soca sem queima do Centro de Tecnologia de Cana-deaçúcar (CTC), reportados em Penatti (2013), mostraram respostas positivas lineares em solo
argiloso com aplicação de até 200 kg ha-1 de N e resposta quadrática em solos de textura média.
Resposta positiva linear à aplicação de N foi também reportada em solo arenoso com aplicação
de até 175 kg ha-1 de N (VITTI et al., 2007b) e em solo argiloso até 150 kg ha-1 de N (FORTES
et al., 2013a). Uma rede de experimentos conduzida com soqueiras sem queima em 15 áreas
experimentais no estado de São Paulo mostrou efeito quadrático ao N aplicado na média dos
ensaios, com maior produtividade estimada na dose de 148 kg ha-1 e maiores ganhos
econômicos na dose 120 kg ha-1 (ROSSETTO et al., 2010a).
Portanto, há uma tendência de aumento nas doses de N usado nas soqueiras de cana-deaçúcar, principalmente em ambientes com alto potencial produtivo. A nutrição inadequada da
cultura também pode resultar em reduções na produtividade entre soqueiras, havendo
necessidade de reforma do canavial. É importante observar que na última soqueira, a
40
produtividade da cultura sob altas doses de N foi superior a 70 t ha-1 de colmos. Normalmente,
quando a soqueira atinge produtividade abaixo de 70 t ha-1, é indicativo de necessidade de
reforma do canavial. Portanto, a nutrição equilibrada com nitrogênio pode auxiliar no aumento
da longevidade das soqueiras, diminuindo custos financeiros e impactos ambientais
relacionados à operação de preparo do solo e plantio.
Houve diferenças no balanço de N no sistema de acordo com a dose de N-fertilizante
aplicada (Figura 2.4). Nota-se que as diferenças aumentaram em magnitude de acordo com a
queda na produtividade das soqueiras. A recomendação de adubação nitrogenada em cana-deaçúcar é em função da produtividade a ser obtida (SPIRONELLO et al., 1997). No entanto,
recomendar a dose de N-fertilizante de maneira fixa ou de acordo com a produtividade esperada
pode causar problemas de excesso de N no sistema, uma vez que é muito difícil prever a
produtividade – especialmente em cultivos sem irrigação – e normalmente a produtividade real
é menor que a esperada (THORBURN et al., 2011).
Os dados cumulativos das quatro soqueiras avaliadas apontam que no tratamento
controle, sem aplicação de N, houve um balanço negativo de 257 kg ha-1 de N, ao passo que na
maior dose, 180 kg ha-1 ano-1, o balanço foi positivo, da ordem de 412 kg ha-1 de N. Sem
dúvidas, ambas condições são extremas e indesejáveis. Balanço altamente negativo pode causar
decréscimo na produtividade e degradação do solo em longo prazo, ao passo que balanços
altamente positivos e excesso de N no sistema pode aumentar os riscos de perdas de N por
lixiviação e desnitrificação. Por outro lado, também pode contribuir para o reservatório de N
orgânico do solo e favorecer o cultivo em longo prazo (VALLIS; KEATING, 1994;
DOBERMANN, 2007). Deve-se considerar também que normalmente de 10% a 40% do N
aplicado é efetivamente usado pelas plantas no ciclo, de acordo com dados compilados na
literatura por Cantarella, Trivelin e Vitti, (2007). Portanto, no mínimo 60% do N mineral
aplicado provavelmente permaneceu no solo após a colheita, embora maiores quantidades de N
proveniente do fertilizante possam ter sido absorvidas pelas plantas em fases anteriores do ciclo,
quando ocorre maior demanda por N (FRANCO et al., 2011). Visando apenas a reposição do
N exportado, seriam necessários apenas 69 kg ha-1ciclo-1 em média, de acordo com a equação
linear obtida na Figura 2.3. No entanto, nessa dose as produtividades seriam menores, dada a
resposta linear positiva observada (Figura 2.2).
A aplicação de N apenas com base na reposição do N exportado pode ser insuficiente,
devido à alta imobilização de N no solo com o grande volume de resíduos. Por outro lado, com
base apenas na produtividade e na lucratividade, estudos mais recentes têm mostrado que doses
muito altas de N podem ser necessárias, e uma parte considerável desse N aplicado permanecerá
41
no sistema, o que a longo prazo pode ser benéfico se o N permanecer no sistema, ou trazer
problemas ambientais, dependendo de cada condição de ambiente e manejo.
Altas quantidades de N aplicadas que não são removidas pela cultura poderiam também
nutrir a cultura em ciclos posteriores. No entanto, as quantidades de N liberadas no ciclo
seguinte à colheita são variáveis e normalmente baixas, raramente superior a 20% do N total
contido na palha (BASANTA et al., 2003; FORTES; TRIVELIN; VITTI, 2012). De qualquer
maneira, é esperado que em sistemas de cana colhida sem queima os nutrientes contidos na
palha possam retornar ao solo e melhorar a fertilidade química em longo prazo. Simulações têm
apontado que o aumento nas doses de N pode ser necessário a curto e médio prazo, porém a
longo prazo pode significar diminuições nas quantidades aplicadas com o aumento no
reservatório de N no solo (COURTAILLAC et al., 1998; ROBERTSON; THORBURN, 2007;
TRIVELIN et al., 2013).
2.4.3. Inoculação com bactérias diazotróficas e recuperação de 15N
Houve maior acúmulo de N (colmos, ponteiros e folhas secas), P e K (colmos) com a
inoculação em comparação com a ausência de aplicação de N (Tabela 2.8; 2.9; 2.10). Estudos
recentes em cana-de-açúcar que encontraram respostas positivas da inoculação no acúmulo de
N e biomassa das plantas cultivadas a campo têm atribuído tais respostas aos efeitos benéficos
promotores de crescimento, e não à fixação de N2 atmosférico (PEREIRA et al., 2013;
SCHULTZ et al., 2012, 2014). Os principais benefícios provenientes da ação das bactérias
diazotróficas atualmente conhecidos são a produção de hormônios, estímulo ao crescimento
radicular, antagonismo a patógenos e solubilização de nutrientes do solo (BENEDUZI et al.,
2013; TAULE et al., 2012). A produção de fitormônios, resulta, entre outros atributos, no
aumento da proliferação de raízes, o que por consequência pode ocasionar aumento nas
absorção de nutrientes (DOBBELAERE; VANDERLEYDEN; OKON, 2003). Além disso,
com maior número de raízes ativas, ocorre aumento na produção de exsudatos radiculares, o
que pode aumentar a disponibilidade de outros nutrientes, além do N (KENNEDY;
CHOUDHURY; KECSKÉS, 2004; DAS; SAHA; BENGAL, 2007).
Existem evidências nas condições brasileiras de que a cultura da cana-de-açúcar
cultivada pode utilizar N2 atmosférico naturalmente por meio da ação de bactérias diazotróficas
(URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992; URQUIAGA et al., 2012), sendo que a contribuição
da FBN natural tem sido estimada em torno de 40 kg ha-1ano-1 (HERRIDGE; PEOPLES;
BODDEY, 2008; URQUIAGA et al., 2012). Algumas estirpes de bactérias diazotróficas foram
isoladas para inoculação na cultura (OLIVEIRA et al., 2003, 2002; REIS; BALDANI;
URQUIAGA, 2009), com a finalidade de maximizar a fixação de N2 atmosférico e
42
eventualmente substituir parte do adubo nitrogenado aplicado. No entanto, os resultados desse
estudo em solo argiloso, com variedade altamente produtiva, não fornecem subsídios para a
recomendação de inoculação em substituição à adubação nitrogenada. Por outro lado, as
bactérias diazotróficas podem promover maior mineralização de N orgânico do solo (DAS;
SAHA, 2003; KENNEDY; CHOUDHURY; KECSKÉS, 2004; DAS; SAHA; BENGAL,
2007). Assim, em condições de alta adição de N-fertilizante, os efeitos benéficos da inoculação
poderiam ser maximizados, ao passo que em condições de baixo estoque de N orgânico, há
menor probabilidade de efeitos benéficos pela ação de bactérias diazotróficas.
A aplicação de N-fertilizante foi superior à inoculação na maioria das variáveis
estudadas. A inoculação com bactérias diazotróficas tem sido comparada com a adubação
nitrogenada na cana-de-açúcar em outros estudos e para algumas variedades podem ocorrer
produtividades similares às observadas após a aplicação de fertilizante nitrogenado
(OLIVEIRA et al., 2006; DAS; SAHA; BENGAL, 2007; SCHULTZ et al., 2012, 2014). No
entanto, diversas variedades não apresentam resposta significativa em biomassa ou
produtividade (GAVA et al., 2012; SCHULTZ et al., 2012; PEREIRA et al., 2013).
Os dados de recuperação de 15N-fertilizante ao final da 4ª soqueira – após aplicação de
100 kg ha-1 de N-sulfato de amônio – diferiram em função das condições contrastantes de aporte
de N nas 3 soqueiras anteriores. Os valores observados de recuperação de
15
N-fertilizante na
parte aérea das plantas de cana-de-açúcar são similares aos valores observados em outros
estudos realizados na cultura com aplicação de 15N, que variam de 7 a 40% do N aplicado em
cana-soca (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). Esses valores são considerados baixos
quando comparados com outras culturas (principalmente culturas anuais), e um dos fatores
apontados como determinantes para a baixa eficiência de uso do N-fertilizante em cana-deaçúcar é o efeito residual do fertilizante nitrogenado no solo e a elevada imobilização de N na
palha (COURTAILLAC et al., 1998).
Uma parte expressiva do N-fertilizante aplicado em cana-de-açúcar permanece no solo
e pode favorecer a produtividade em ciclos subsequentes (VALLIS; KEATING, 1994; VITTI
et al., 2011; VITTI, 2003). O N contido na palha proveniente de ciclos anteriores e no sistema
radicular também contribuem para a nutrição nitrogenada das plantas (OLIVEIRA et al., 1999;
TRIVELIN et al., 2002; FORTES et al., 2013b; VITTI et al., 2011), de maneira que o N
adicionado em um ciclo pode promover aumentos de produtividade em ciclos subsequentes
(OLIVEIRA et al., 1999; FRANCO et al., 2010b). Ao avaliar a mineralização e decomposição
da palha, Vitti et al. (2008) observaram maior mineralização (+10%) do N contido na palha
com a aplicação de N-fertilizante em comparação à testemunha. Portanto, nas condições em
43
que não houve aporte de N nas soqueiras anteriores, a quantidade de N no solo, resíduos e no
sistema radicular foi certamente inferior aos demais tratamentos, fazendo com que as plantas
apresentassem melhor aproveitamento do N-fertilizante aplicado, atingindo níveis superiores
(44,2%) aos valores médios observados em outros estudos com recuperação de 15N-fertilizante
em soqueiras de cana-de-açúcar. Outra questão a ser considerada é a queima acidental ocorrida
antes da rebrota da 4ª soqueira. A maior parte do N contido nos resíduos vegetais é perdido com
a queima (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007), porém, em virtude do baixo teor de N
normalmente encontrado nos resíduos culturais, dificilmente houveram efeitos no
aproveitamento de N-fertilizante observado no tratamento controle.
Não foi observada diferença significativa entre as doses de aplicação de N nas soqueiras
anteriores (60, 120 e 180 kg ha-1 soqueira-1) no aproveitamento de 15N do fertilizante. Por outro
lado, as maiores produtividades foram observadas com maiores doses de N-fertilizante, o que
resultou em correlação negativa entre a produção de colmos e recuperação de 15N-fertilizante
(dados não apresentados). A contribuição do N proveniente dos resíduos e da matéria orgânica
do solo para a nutrição nitrogenada das plantas é normalmente bem superior à contribuição do
fertilizante, conforme sugerem os resultados de estudos com aplicação de 15N em várias culturas
(DOURADO-NETO et al., 2010). Além disso, há um expressivo enriquecimento de partes
subterrâneas das plantas com N, conforme verificado por Vitti et al. (2007a). Portanto, o
enriquecimento de N no sistema observado nas maiores doses de N-fertilizante (Figura 2.3)
pode resultar em altas produtividades quando o cultivo é feito em solos argilosos com alto teor
de matéria orgânica, mesmo com baixo aproveitamento de N-fertilizante aplicado na safra.
Porém, é importante destacar que, em função da dinâmica de N no solo, o sistema fica sujeito
a riscos de perda do N não utilizado. Em longo prazo, esses resultados indicam que a adubação
em cana-de-açúcar em ambientes altamente produtivos deve ser realizada de maneira
abrangente, visando a sustentabilidade do sistema, ao invés da produtividade esperada para um
único ciclo de cultivo.
2.5 CONCLUSÕES
Em ambientes altamente produtivos, onde não há limitação de água e outros nutrientes,
a cana-de-açúcar pode responder positivamente a altas doses de N na soqueira, mesmo com a
obtenção de baixa produtividade média em soqueiras mais avançadas. Nessas condições, a
quantidade de N aplicada nas maiores doses supera a quantidade removida pelos colmos na
colheita. Se não ocorrer perdas elevadas de N por volatilização, desnitrificação e lixiviação,
essas altas doses de N-fertilizante podem promover enriquecimento do estoque de N no sistema.
44
A inoculação com bactérias diazotróficas pode favorecer a nutrição mineral da cana-deaçúcar, porém a substituição da adubação nitrogenada pela inoculação resulta em queda de
produtividade, exceto em situações com elevadas quantidades de N residual de ciclos anteriores.
O aproveitamento de N proveniente do fertilizante pode atingir valores em torno de 45%
do N aplicado em condições de baixo N residual no solo, ao passo que em solos adubados com
N em ciclos anteriores, o aproveitamento do N-fertilizante não supera 30%. No entanto, as
produtividades mais elevadas em cana-soca são obtidas em condições de alto suprimento de N
pelo solo.
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52
3. ADUBAÇÃO NITROGENADA EM CICLO COMPLETO DE CANA-DE-AÇÚCAR:
ASPECTOS AMBIENTAIS PARA PRODUÇÃO DE BIOENERGIA
RESUMO
A aplicação de fertilizantes nitrogenados é necessária para a obtenção de altas produtividades
em cana-de-açúcar, porém a produção desses insumos demanda altas quantidades de energia e
também ocasiona a emissão de gases de efeito estufa (GEE). Estudos recentes têm apontado a
viabilidade econômica do aumento nas quantidades de nitrogênio (N) aplicadas. Altas doses de
N podem ser ambientalmente indesejáveis, porém também podem resultar em menor demanda
de área agrícola para a produção de bioenergia. Alguns estudos têm apontado dados em função
de doses de N e produtividades médias em diversas usinas de balanço de energia (energia
produzida/energia consumida) e emissões de GEE na produção de cana-de-açúcar; o Nfertilizante têm sido um dos principais itens de consumo de energia e fonte de GEE. Com o
objetivo de comparar diferentes quantidades de N aplicadas em um ciclo completo de cana-deaçúcar, uma área experimental foi considerada, onde doses contrastantes de N foram aplicadas
(0 a 180 kg ha-1soqueira-1) e que resultaram em respostas positivas na produtividade da cultura.
A partir dos dados de produtividade e uso de N, estimativas foram realizadas para o cálculo de
balanço de energia e emissão de GEE nas diferentes condições de entrada de N no sistema.
Foram simulados dois cenários: Demanda adicional de terra para atingir a mesma produtividade
da maior dose de N e reposição de N onde o N exportado foi superior ao adicionado via
fertilizante. Estimativas também foram realizadas com base em outros ensaios com aplicação
de N-fertilizante. Baixas doses de N resultam em balanço de energia e emissão de GEE mais
favoráveis (9,0 e 8,2 GJ GJ-1; 9,8 e 10,2 kg CO2eq GJ-1) em comparação ao uso de altas doses
de N (7,6 e 7,2 GJ GJ-1; 11,01 e 11,02 kg CO2eq GJ-1), mesmo com a obtenção de menores
produtividades, apenas considerando as condições avaliadas no campo. Ao simular a demanda
adicional de terra, ocorre redução no balanço final de energia nas menores doses (7,4 GJ GJ-1),
e não resultou em grandes diferenças nas emissões de GEE. Com a reposição de N, simulando
futura reposição para evitar degradação do solo, também ocorrem reduções no balanço de
energia nas menores doses, porém ainda superiores aos demais tratamentos. Por outro lado, as
emissões são maiores em baixas doses de N onde há a necessidade de maior reposição desse
nutriente (11,9 kg CO2eq GJ-1), mostrando que não é viável o uso de doses de N abaixo do
necessário para reposição da quantidade exportada, pois eventualmente tal reposição seria
necessária para evitar a degradação do solo. Com base em estimativas a partir de outros ensaios
com aplicação de N-fertilizante, foi possível confirmar a tendência de redução no balanço de
53
energia e aumento nas emissões com aplicação de N-fertilizante, mesmo com aumentos
quadráticos na produção de colmos. Os maiores balanços de energia (6,5-9,1 GJ GJ-1) e menores
emissões (11,1-15,1 kg CO2eq GJ-1) foram observados em ambientes mais produtivos, em
comparação com ambientes de menor produtividade, independente da dose aplicada. A alta
demanda de energia e as emissões de GEE associadas à produção e uso de N não permitiram
que a intensificação agrícola com maior uso de N (apesar dos aumentos de produtividade)
melhorassem o balanço energético e ambiental e a produção de bioenergia. A otimização do
uso de N em cana-de-açúcar deve, portanto, ser um objetivo a ser perseguido.
Palavras-chave: Saccharum sp.; Cana-crua; sustentabilidade; óxido nitroso
NITROGEN
FERTILIZATION
IN
A
SUGARCANE
FULL
CYCLE:
ENVIRONMENTAL ASPECTS FOR BIOENERGY PRODUCTION
ABSTRACT
Nitrogen (N) fertilizers are required to achieve high crop yields in sugarcane. However, N
fertilizers also require large amounts of energy to be produced, and cause increases on
greenhouse gases (GHG) emissions. In Brazilian conditions, this crop usually requires lower
amounts of N than in other countries; however, recent studies have suggested economical
suitability of increasing N rates, whereas low N rates may not supply the N removed from the
field. High N rates might not be desirable for the environment, on the other hand may also
reduce land requirement for bioenergy production. Some studies have shown average data of
energy balance and GHG emissions on sugarcane production and fertilizer-N have been one of
the main causes of increases on energy inputs and GHG emissions. Aiming to compare different
amounts of N applied in a sugarcane full cycle, an experimental trial was evaluated under
distinct N rates and positive response of crop yield to N application. From crop yield data and
N use, estimative were performed in order to calculate the final energy balance and GHG
emissions under different N inputs. Two scenarios were also assumed: Extra land requirement
to reach the same yield under high N rates and N replacement in conditions of negative N
balance. Estimative were also calculate based on other trials evaluating N rates in sugarcane.
Low N rates give more positive energy balance and GHG emission results (9,0 e 8,2 GJ GJ-1;
9,8 and 10,2 kg CO2eqGJ-1), compared with higher N rates (7,6 e 7,2 GJ GJ-1; 11,01 and 11,02
kg CO2eqGJ-1), even with low crop yield under low N supply, only considering the field
54
conditions. After assuming extra land requirement, there is a decrease on final energy balance
of low rates (7,4 GJ GJ-1), and did not result in significant differences on GHG emissions.
Assuming N replacement to avoid soil degradation over time, there is also decrease on energy
balance of low rates, but still higher than other treatments. On the other hand, GHG emissions
are significantly higher where N replacement is necessary (11,9 kg CO2eq GJ-1), showing that
N rates below necessary to replace removed N are not suitable to be applied. Based on
estimative from other trials with fertilizer-N application, it was possible to confirm the trend on
energy balance reduction and increases on GHG emissions after fertilizer N application, even
after positive quadratic response on crop yield. Higher energy balances (6,5-9,1 GJ GJ-1) and
lower emissions (11,1-15,1 kg CO2eq GJ-1) were observed in high productive environments,
compared with low productive environments, regardless of N rate. The ecological
intensification by using high N rates in sugarcane might be suitable if result in crop yield
increase, because it demands less land. However, best crop management is necessary, in order
to avoid N losses.
Key words: Saccharum spp., Unburnt sugarcane, sustainability, nitrous oxide.
3.1 INTRODUÇÃO
O uso de nitrogênio (N) é importante para o desenvolvimento e produção de cana-deaçúcar, no entanto a produção de N-fertilizante consome grandes quantidades de energia fóssil
e altas emissões de gases efeito estufa (GEE) são também relacionadas com a adubação
nitrogenada (BODDEY et al., 2008; MACEDO; SEABRA; SILVA, 2008). A produção de
fertilizantes representa 22% do consumo de energia e 11% das emissões de GEE para a
produção de etanol (SEABRA et al., 2011). Além da produção industrial do fertilizante, a
adubação nitrogenada na agricultura em geral é a maior fonte de N-N2O (USSIRI; LAL, 2013).
Nas condições brasileiras, no entanto, a cana-de-açúcar demanda menores quantidades
de N-fertilizante que outros países, o que contribui para a obtenção de ótimos índices ambientais
na produção de etanol. Alguns casos reportam quantidades insuficientes de fertilizante para
repor o N exportado pelos colmos na colheita, sem apresentar sinais de degradação da cultura,
o que tem sido atribuído em grande parte à ocorrência de fixação biológica de nitrogênio (FBN)
(URQUIAGA et al., 2012). Porém, se as quantidades de N aplicadas não forem suficientes para
repor o N removido, e os balanços forem negativos mesmo ao considerar a contribuição natural
da FBN, pode ocorrer degradação do solo e perda de produtividade, principalmente em
55
variedades recentemente desenvolvidas com maior potencial produtivo, em sistema de colheita
sem queima, onde parte do N é imobilizado pela palha.
Muitos estudos com cana-planta e cana-soca (CASTRO; FRANCO; MUTTON, 2014;
OLIVEIRA et al., 1999; CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007; PRADO; PANCELLI,
2008; FRANCO et al., 2010; FORTES et al., 2013; PENATTI, 2013;) têm mostrado respostas
positivas da cana-de-açúcar ao N aplicado, principalmente em soqueiras, onde as quantidades
de N-fertilizante aplicadas são superiores e as respostas positivas têm ocorrido mesmo com a
aplicação de altas doses de N entre 170-200 kg ha-1 (VITTI et al., 2007; FORTES et al., 2013;
CASTRO; FRANCO; MUTTON, 2014). O fim da queima da palha antes da colheita
normalmente implica em aumento nas doses de N-fertilizante, uma vez que os resíduos de póscolheita (palha) que permanecem no solo no sistema sem queima possuem alta relação C:N, em
torno de 100, e causam imobilização do N do solo (FORTES; TRIVELIN; VITTI, 2012). Dessa
maneira, em condições de alta quantidade de resíduos deixadas no campo após a colheita, os
resultados têm indicado a necessidade de aumento nas doses de N aplicadas (PENATTI, 2013),
sendo recomendado com base em margens de maior contribuição econômica, a dose de 120130 kg ha-1 de N nas soqueiras (ROSSETTO et al., 2010; PENATTI, 2013). No entanto,
simulações têm indicado que o aumento nas doses de N em cana sem queima da palha pode ser
necessário em curto e médio prazo, até atingir um equilíbrio na ciclagem de N no sistema, de
maneira que em longo prazo as quantidades de N poderiam ser reduzidas (ROBERTSON;
THORBURN, 2007; TRIVELIN et al., 2013).
Além da imobilização de N no solo, também deve-se destacar a tendência no
desenvolvimento de variedades mais produtivas, inseridas em ambientes com condições para
obtenção de altas produtividades, que demandam maior quantidade de fertilizantes
nitrogenados, entre outros insumos. Porém, é necessário que o aporte de insumos na cultura da
cana-de-açúcar seja avaliado do ponto de vista de eficiência energética e emissões de GEE, para
que os atributos relativos à sustentabilidade da produção de etanol não sejam prejudicados.
Com a finalidade de produzir bioenergia, o consumo de energia fóssil durante a
produção agrícola e industrial precisa ser o menor possível do que a energia renovável contida
no etanol (BODDEY et al., 2008). Dessa maneira, o alto consumo de energia para produção de
fertilizantes nitrogenados pode ser um fator limitante, principalmente se há aumentos
consideráveis nas doses de N recomendadas para a cultura, sem um aumento proporcional de
produtividade. Alguns estudos (BODDEY et al., 2008; MACEDO; SEABRA; SILVA, 2008;
SEABRA et al., 2011) avaliaram o balanço de energia do etanol de cana e encontraram
resultados muito positivos, da ordem de 9,0 MJ MJ-1. No entanto, esses estudos consideram
56
doses fixas de N, de acordo com a média utilizada em diversas unidades de produção de canade-açúcar. Os efeitos de diferentes doses de N onde ocorrem respostas positivas ao N aplicado
são importantes de serem avaliados e podem auxiliar na determinação de quantidades a serem
aplicadas na cultura.
As emissões de GEE também têm sido indicadas como um fator limitante para o cultivo
de espécies vegetais com objetivo de produzir bioenergia, principalmente devido à adubação
nitrogenada (CRUTZEN et al., 2008; LISBOA et al., 2011). Isso pode ser minimizado de
acordo com os princípios da intensificação agrícola, com aumento na eficiência de uso de
nutrientes e obtenção de altas produtividades (SNYDER et al., 2014, 2009). Se o uso de altas
doses de N resultar em altas produtividades, isso pode significar menor demanda de terra,
reduzindo assim a competição entre culturas para alimentos e bioenergia.
O objetivo desse trabalho foi estimar os impactos ambientais relacionados ao balanço
de energia e emissões de GEE em função de diferentes doses de N em ciclo completo de canade-açúcar, considerando as situações hipotéticas de demanda adicional de terra e reposição de
N sob condições de balanço negativo entre N adicionado e N removido do campo.
3.2 MATERIAL E MÉTODOS
3.2.1 Descrição do experimento
Para avaliação da adubação nitrogenada no balanço de energia e emissão de GEE na
cana-de-açúcar, foram considerados os dados provenientes de uma área experimental localizada
em Piracicaba-SP (22°4’S; 47°38’W), 580 m de altitude, em um Latossolo Vermelho distrófico
(textura muito argilosa e moderada), com precipitação anual média de 1270 mm. A área
experimental foi implantada em março de 2007, quando a variedade IAC 92-1099 foi plantada.
A variedade utilizada é altamente produtiva e recomendada para ambientes de alta
produtividade (UDOP, 2014).
Antes do plantio, foi realizada a aplicação de calcário em área total, na quantidade de
3,5 t ha-1. O plantio foi realizado após gradagem e aração com arado de aivecas para eliminação
da soqueira anterior e incorporação do calcário, subsolagem e sulcagem para a disposição dos
colmos-semente e adubação. Foi realizada a adubação em área total no sulco de plantio com 48
kg ha-1 de N, 168 kg ha-1 de P2O5 e 96 kg ha-1 de K2O. O ciclo de cana-planta foi de 18 meses,
até a colheita, em setembro/2008.
Após a colheita da cana-planta, a área foi dividida em 16 parcelas de 10 linhas por 30m
de comprimento, com a finalidade de implantação de um delineamento experimental em blocos
57
ao acaso, com 4 tratamentos e 4 repetições para os ciclos posteriores de cana-soca. Os
tratamentos foram diferentes doses de N: 0, 60, 120 e 180 kg ha-1 de N por soqueira. A fonte
de N foi nitrato de amônio em 3 soqueiras e sulfato de amônio na última soqueira.
Entre setembro de 2008 e setembro de 2012, quatro soqueiras foram avaliadas, com as
doses de N sendo aplicadas no início da brotação de cada soqueira. Antes de cada soqueira, 150
kg de K2O foram aplicados e na última soqueira, 50 kg de P2O5 também foram aplicados. Além
da aplicação inicial de calcário (3,5 t ha-1), houve a aplicação de 4 t ha-1 durante a condução das
soqueiras. A área foi reformada em março de 2013. Portanto, o ciclo completo da cultura foi de
6 anos, considerando o ciclo de cana-planta, quatro ciclos de cana-soca e pousio antes da
reforma. Considerando o acumulado de quantidades de N adicionadas via fertilizante e
produção de colmos nos ciclos de cana-planta e 4 soqueiras, houve resposta positiva linear com
Produção de colmos (t ha-1)
o aumento nas quantidades de N aplicadas (Figura 3.1).
700
650
600
550
500
y = 511,4 + 0,18x
R² = 0,97**
450
400
0
200
400
600
800
-1
N-fertilizante adicionado (kg ha )
Figura 3.1. Produtividade de colmos de cana-de-açúcar em ciclo completo de 6 anos, em
função da aplicação de diferentes quantidades de N-fertilizante. **: P<0,01; Barras verticais
indicam o erro padrão da média (n=16).
3.2.2 Estimativas e simulação de cenários
A partir dos dados obtidos nesse estudo, informações de outros estudos com estimativas
de balanço de energia e emissão de GEE foram compiladas, com a finalidade de obter
informações referentes ao efeito de diferentes doses de N-fertilizante e produção de energia
nesses parâmetros. Além da avaliação das condições reais de campo, dois cenários foram
simulados.
Considerou-se que a alta produtividade observada na maior dose de N (Figura 3.1)
poderia ser obtida em menores doses de N com aumento da área cultivada. Com isso a
58
“Simulação 1” compreende a condição de cultivo de área adicional para obter a mesma
produtividade da maior dose (Tabela 3.1).
Para a “Simulação 2”, considerou-se que, apesar da obtenção de razoável produção de
energia mesmo na ausência de aplicação de N nas soqueiras, a exportação de N foi maior do
que o N adicionado doses de N-fertilizante (Figura 3.2). Portanto, existe a necessidade de repor
a quantidade de N exportada para que não ocorra degradação do solo em longo prazo (Tabela
3.1). A simulação considerou que essa reposição seria realizada em ciclos posteriores aos
avaliados nesse estudo. Nas doses 48 e 288 kg ha-1, haveria necessidade de reposição de N, nas
quantidades de 370,8 e 190,3 kg ha-1, respectivamente. Os dados de exportação de N no ciclo
de cana-planta não foram determinados, sendo feita a estimativa baseada em 0,82 kg de N por
tonelada de colmos produzida, valor observado na média das 4 soqueiras avaliadas.
Tabela 3.1. Índices para simulação de cenários de produção de um ciclo completo de cana-deaçúcar
N adicionado
N exportado – N aplicado (kg ha-1)
kg ha-1
48
288
528
768
Produção de
colmos
t ha-1
519,6
570,2
590,8
654,9
Área para máx.
produção
ha
1,26
1,15
1,11
-
N total
exportado
418,8
478,3
468,4
485,3
Necessidade de
reposição de N
kg ha-1
370,8
190,3
-
400
300
200
100
0
-100
-200
-300
-400
48
288
528
768
N-fertilizante adicionado (kg ha-1)
Figura 3.2. Balanço entre N exportado pelos colmos e N aplicado no ciclo completo de canade-açúcar (cana-planta + 4 soqueiras).
3.2.3 Estimativa do balanço energético
Para a estimativa do balanço de energia, os itens considerados e os índices de consumo
e produção de energia foram compilados a partir de Macedo; Seabra; Silva (2008). Foi
59
considerado o ciclo total de 6 anos, com colheita mecanizada em todas as colheitas e plantio
convencional, com preparo do solo antes do plantio. No estudo de Macedo; Seabra e Silva
(2008), a unidade de demanda de energia utilizada para cada item foi MJ por tonelada de cana
produzida. Esses índices foram considerados para operações de preparo do solo, corte,
carregamento e transporte de cana, transporte de insumos, outras atividades agrícolas,
herbicidas, inseticidas, sementes, maquinário, químicos e lubrificantes, construções e
equipamentos de acordo com a produção de colmos em cada tratamento. Na “Simulação 1”, a
produção de colmos seria igual para todos os tratamentos, porém em quantidades de área
diferentes. Portanto, os índices foram corrigidos de acordo com a área total considerada (Tabela
3.1).
Na estimativa de demanda de energia para calcário e fertilizantes, o cálculo foi feito de
acordo com a quantidade de produto aplicado. Para calcário, fósforo (P) e potássio (K), foram
considerados também os índices indicados em Macedo; Seabra; Silva (2008). Para o N aplicado,
foi considerado o índice obtido para a fonte nitrato de amônio, de 46,6 MJ kg-1 de N aplicado
(LAEGREID; BOCKMAN; KAARSTAD, 1999). Para as simulações dos cenários propostos,
as quantidades de calcário e fertilizantes aplicada foi considerada em função da área (Simulação
1) e da quantidade de reposição de N (Simulação 2).
Para estimativa de produção de etanol, o índice de 81 L de etanol hidratado por tonelada
de cana foi utilizado (SEABRA et al., 2011). A partir da quantidade de etanol produzida, a
quantidade de energia total foi calculada com base no poder calorífico do etanol de 21,45 MJ
L-1 (BODDEY et al., 2008). Dessa maneira, o balanço de energia (MJ MJ-1) foi estimado pela
divisão simples entre produção total de energia e consumo total de energia.
3.2.4. Estimativa de emissão de gases efeito estufa (GEE)
A estimativa de emissões de GEE foi determinada em todo o ciclo da cultura, e fontes
de GEE consideradas foram baseados em Macedo et al. (2008). Para a estimativa do presente
estudo, as fontes principais de GEE na produção de cana-de-açúcar, com maior contribuição no
balanço total de GEE de acordo com estimativas de Macedo et al. (2008) foram: Transporte e
operações agrícolas (879,7 kg CO2eq ha-1), produção de N-fertilizante, P-fertilizante (1,3 kg
CO2eq kg-1 de P2O5) e K-fertilizante (0,71 kg CO2eq kg-1 de K2O), emissão de N2O do solo,
emissão de CO2 pela calagem (0,477 kg CO2eq kg CO2 no calcário-1) e emissões resultantes da
produção de etanol na usina (2,2 kg CO2eq ton-1 de cana). Para a produção de N-fertilizante, o
índice determinado por Jenssen (2010) para a fonte nitrato de amônio foi de 3,1 kg CO2eq kg
de N-1. A emissão de N2O do solo foi estimada com base em experimentos recentes realizados
60
em áreas próximas à área experimental do presente estudo, em tipo de solo similar (VARGAS,
2014). Nesse estudo, diversas avaliações foram realizadas em cana-soca, sob diferentes doses
de N-fertilizante. Os fatores de emissão obtidos para o experimento de Piracicaba não diferiram
consideravelmente entre as doses, e foi considerado no presente estudo o fator de emissão
médio de 0,57% do N aplicado como fertilizante, emitido como N-N2O. Ao transformar em
CO2eq, o índice considerado para emissão de N2O foi de 2,06 kg CO2eq kg de N-1. As
estimativas em cada cenário simulado foram realizadas da mesma forma dos cálculos de
balanço de energia. A emissão relativa, em kg CO2eq GJ-1 foi calculada por divisão simples
entre a emissão total e a produção total de energia no ciclo completo.
3.2.5 Estimativas a partir de outros ensaios com doses de N-fertilizante
Para verificar as alterações no balanço de energia e emissões de GEE em função das
quantidades de N-fertilizante adicionadas em outras áreas experimentais, foram utilizados os
dados de Rossetto et al. (2010), que avaliaram 15 ensaios com cana-soca em diferentes regiões
do Estado de São Paulo para determinação de doses mais viáveis de N e K para aplicação na
cultura. Os ensaios foram realizados em diferentes ambientes de produção, que diferem de
acordo com a fertilidade do solo, e capacidade de retenção de água no solo. Esses ambientes
são simbolizados de A a D, de acordo com o potencial produtivo, sendo que ambiente A
significa ambientes com solos férteis, alta capacidade de armazenamento de água e ambientes
D possuem menor potencial, devido às características de solo e armazenamento de água
(PRADO et al., 2008). No estudo de Rossetto et al. (2010), as avaliações de produtividade de
colmos foram realizadas em diferentes áreas experimentais em todo o estado de São Paulo, e
em diferentes ciclos (1ª, 2ª ou 3ª soqueiras). Em média, ocorreu resposta quadrática positiva à
aplicação de N, e a dose considerada mais viável economicamente foi de 120 kg ha-1 de N em
média. Para possibilitar as estimativas de balanço de energia e emissão de GEE, foi necessário
estimar a produtividade em ciclo completo (cana-planta + 4 soqueiras). Os dados de
produtividade para as diferentes quantidades de N aplicadas em diferentes ambientes de
produção (B a D) são apresentados na Tabela 3.2.
De acordo com o padrão observado em diferentes áreas de produção de cana-de-açúcar,
as produtividades para os demais ciclos foram estimadas com base no fator 100% para canaplanta, 80% para 1ª soqueira, 70% para 2ª soqueira, 60% para 3ª soqueira e 50% para a 4ª
soqueira, conforme dados médios obtidos por Macedo et al. (2004). Foi considerada a média
dos resultados nas maiores doses de K-fertilizante (140 e 210 kg de K2O/ha) aplicadas. Portanto,
a quantidade total de K aplicada no ciclo foi estimada em 800 kg ha-1 (120 kg em cana-planta
61
+ 170 kg nas quatro soqueiras). A partir desses dados, a produção de energia foi calculada em
cada condição, e os balanços foram calculados da mesma maneira descrita anteriormente,
diferindo em relação às doses de N-fertilizante aplicadas.
Tabela 3.2. Dados de produção de colmos em ciclo completo de cana-de-açúcar em função de
diferentes doses de adubo nitrogenado e ambientes de produção* (adaptado de Rossetto et al.,
2010).
N
total
aplicado
Cana-planta
kg ha-1
60
300
540
780
60
300
540
780
60
300
540
780
60
300
540
780
1ª soca
2ª soca
3ª soca
------------------------ t ha-1 -------------------------Ambiente ‘B’
130,1
104,1
91,0
78,0
143,5
114,8
100,5
86,1
142,7
114,2
99,9
85,6
140,2
112,1
98,1
84,1
Ambiente ‘C’
124,0
99,2
86,8
74,4
134,7
107,8
94,3
80,8
142,2
113,8
99,5
85,3
144,7
115,8
101,3
86,8
Ambiente ‘D’
89,6
71,7
62,7
53,8
92,7
74,2
64,9
55,6
105,4
84,3
73,8
63,3
98,5
78,8
68,9
59,1
Ambiente ‘E’
90,0
72,0
63,0
54,0
93,0
74,4
65,1
55,8
100,7
80,5
70,5
60,4
101,5
81,2
71,0
60,9
4ª soca
65,0
71,8
71,4
70,1
62,0
67,4
71,1
72,4
44,8
46,4
52,7
49,2
45,0
46,5
50,3
50,7
*Os ambientes de produção foram baseados no tipo de solo (PRADO et al., 2008) e representam o
potencial produtivo de cada local, podendo ser entendido como: B: potencial alto; C: potencial médio; D:
potencial baixo e E: potencial muito baixo.
3.2.6 Análises estatísticas
Os resultados obtidos de balanço de energia e emissão relativa de CO2eq foram
submetidos à análise de variância, por meio do teste de F ao nível de 95% de confiança. Para
comparar o efeito de doses de N usou-se a análise de regressão polinomial.
3.3 RESULTADOS
Nas condições de campo, a adubação nitrogenada na cana-soca reduziu o balanço de
energia no sistema (Tabela 3.3). Nas menores doses de N, o maior consumo de energia ocorreu
com a colheita e transporte de cana, entre outras atividades agrícolas relacionadas ao consumo
de óleo diesel. Por outro lado, nas maiores doses de N o uso de fertilizantes nitrogenados passou
a representar o maior gasto de energia no sistema. A contribuição do uso de fertilizantes
62
nitrogenados para o gasto de energia total nas condições de campo foi 2,2% (48 kg N), 11,1%
(288 kg N), 18,2% (528 kg N) e 22,6% (768 kg N).
Tabela 3.3. Balanço de energia da produção de cana-de-açúcar em função da adubação
nitrogenada em longo prazo (Unidade: MJ/ciclo completo)
Quantidade de N aplicada (kg ciclo completo-1)
Entradas e saídas de energia
48
288
528
768
MJ/Ciclo
Entradas*
Operações Agrícolas1
6951 (6,9)13
6951 (6)
6951 (5,4)
6951 (4,7)
17303 (17,2)
18984 (16,3)
19674 (15,2)
21809 (14,9)
Transporte de cana3
19121 (19)
20980 (18)
21741 (16,8)
24101 (16,4)
Transporte de insumos4
5696 (5,7)
5696 (4,9)
5696 (4,4)
5696 (3,9)
20120 (20)
20120 (17,3)
20120 (15,5)
20120 (13,7)
6023 (6)
17207 (14,8)
28391 (21,9)
39575 (27)
6323 (6,3)
6323 (5,4)
6323 (4,9)
6323 (4,3)
3083 (3,1)
3083 (2,6)
3083 (2,4)
3083 (2,1)
3554 (3,5)
3554 (3,1)
3554 (2,7)
3554 (2,4)
9976 (9,9)
10946 (9,4)
11343 (8,8)
12575 (8,6)
260 (0,3)
285 (0,2)
295 (0,2)
327 (0,2)
2026 (2,0)
2223 (1,9)
2304 (1,8)
2554 (1,7)
100437
116352
129476
146669
519
570
590
654
42088
46186
47854
53046
902779
990520,2
1026485
1137908
Colheita
2
Outras atividades
5
Fertilizantes6
Calcário, herbicidas e inseticidas
Sementes8
Maquinário9
Químicos e lubrificantes
10
Construções11
Equipamentos
12
Total de entradas
7
Saídas
Produção de colmos, t ha-1
Produção de etanol, L ha-1
-1
Produção de energia, GJ ha
Balanço final de energia (MJ
8,99
8,51
7,93
7,76
MJ-1)
*: Todos os índices foram retirados de Macedo et al. (2008); 1: De acordo com área cultivada, 6951
MJ/ha; 2: De acordo com a produção de colmos, 33,3 MJ/t; 3: De acordo com a produção de colmos,
36,8 MJ/t; 4: De acordo com a área cultivada, 5696 MJ/ha; 5: De acordo com a área cultivada, 20120
MJ/ha; 6: De acordo com a quantidade de fertilizantes. N (46,6 MJ/kg), P (3,19 MJ/kg, considerando a
aplicação de 125 kg durante o ciclo) e K (5,89 MJ/kg, considerando a aplicação de 575 kg durante o
ciclo); 7: De acordo com a área cultivada, 6323 MJ/ha; 8: De acordo com a área cultivada, 3083 MJ/ha;
9
: De acordo com a área cultivada, 3554 MJ/ha; 10: De acordo com a produção de colmos, 19,2 MJ/t; 11:
De acordo com a produção de colmos, 0,5 MJ/t; 12: De acordo com a produção de colmos, 3,9 MJ/t. 13:
Valores entre parênteses indicam a porcentagem referente ao total de energia consumida.
Na simulação de terra adicional para atingir a produtividade máxima obtida na dose 768
kg de N (Tabela 3.4), ocorreu – como era esperado – um incremento no consumo de energia
em todos os fatores nas doses menores que 768 kg de N. Com o aumento na área cultivada, há
também aumento nas doses aplicadas de N nos outros tratamentos, destacando-se a contribuição
63
das atividades agrícolas no consumo de energia. A contribuição do uso de fertilizantes
nitrogenados para o gasto de energia total na “simulação 1” foi de 1,8% (60,5 kg N), 9,9%
(331,2 kg N), 16,8% (586,1 kg N) e 22,6% (768 kg N).
Tabela 3.4. Balanço de energia da produção de cana-de-açúcar em função da adubação
nitrogenada em longo prazo, simulando a necessidade de aumento da área de cultivo para
equiparação da produtividade obtida na maior dose de N (Unidade: MJ/ciclo completo)
Quantidade de N aplicada (kg ciclo completo-1)
Entradas e saídas de energia
60,5
331,2
586,1
768
MJ/Ciclo
Entradas
Operações Agrícolas
1
8758
7993
7646
6951
27480
25081
23990
21809
30368
27717
26512
24101
Transporte de insumos1
7177
6551
6266
5696
Outras atividades1
25351
23138
22132
20120
7588
19788
31230
39575
7968
7272
6956
6323
3885
3546
3392
3083
4478
4087
3909
3554
12575
12575
12575
12575
Construções3
327
327
327
327
Equipamentos3
2554
2554
2554
2554
138509
140628
147488
146669
Produção de colmos, t
654
654
654
654
Produção de etanol, L
53047
53047
53047
53047
1137908
1137908
1137908
1137908
Colheita2
Transporte de cana
Fertilizantes
2
2
Calcário, herbicidas e inseticidas1
Sementes
1
Maquinário1
Químicos e lubrificantes
3
Total de entradas
Saídas
Produção de energia, GJ
-1
Balanço final de energia (MJ MJ )
8,21
8,09
7,72
7,76
: Cálculos realizados de acordo com a área cultivada, dentro da simulação realizada em cada tratamento
(60,5 – 1,26 ha; 331,2 – 1,15 ha; 586,1 – 1,1 ha); 2: Cálculos realizados considerando a produção de
colmos, porém com correção dos fatores em função da área cultivada, devido ao maior consumo de
energia com essas atividades ao aumentar a área de cultivo; 3: Valores iguais em todos os tratamentos,
ao considerar a mesma produção de colmos em todos os tratamentos na simulação.
1
A simulação de reposição de N nos tratamentos com balanço negativo entre adição e
exportação durante o ciclo completo de cana-de-açúcar mostrou o aumento no consumo de
energia, principalmente na menor dose de N, devido à alta demanda de energia para a produção
de fertilizantes nitrogenados (Tabela 3.5). Os demais itens permanecem iguais às condições de
campo. Ao considerar a contribuição dos fertilizantes nitrogenados no consumo total de energia,
64
notam-se valores similares para todos os tratamentos, da ordem de 16,6% (48 kg N), 17,2%
(288 kg N), 18,2% (528 kg N) e 22,6% (768 kg de N).
Tabela 3.5. Balanço de energia da produção de cana-de-açúcar em função da adubação
nitrogenada em longo prazo, simulando a necessidade reposição de N nas condições de balanço
negativo entre N aplicado e exportado (Unidade: MJ/ciclo completo).
Entradas e saídas de energia
Quantidade de N aplicada (kg ciclo completo-1)
48
288
528
768
MJ/Ciclo
Entradas
Operações Agrícolas
6951
6951
6951
6951
Colheita
17303
18984
19674
21809
Transporte de cana
19121
20980
21741
24101
Transporte de insumos
5696
5696
5696
5696
Outras atividades
20120
20120
20120
20120
23302
26075
28391
39575
Calcário, herbicidas e inseticidas
6323
6323
6323
6323
Sementes
3083
3083
3083
3083
Maquinário
3554
3554
3554
3554
Químicos e lubrificantes
9976
10946
11343
12575
Construções
260
285
295
327
Equipamentos
2026
2223
2304
2554
117716
125220
129476
146669
519
570
590
654
42088
46186
47854
53046
902779
990520,2
1026485
1137908
Fertilizantes
1
Total de entradas
Saídas
Produção de colmos, t ha-1
Produção de etanol, L ha
-1
Produção de energia, GJ ha-1
Balanço final de energia (MJ MJ-1)
7,67
7,91
7,93
7,76
1
: Valores alterados em relação à Tabela 3.3, de acordo com a demanda de N a ser reposto nas condições
de balanço negativo.
As diferenças entre os tratamentos no balanço final de energia dentro de cada cenário
podem ser observadas na Figura 3.3. Houve diminuição linear significativa no balanço de
energia nas condições de campo e na “simulação 2”. No entanto, a magnitude nas condições de
campo foi de 0,0026 MJ MJ-1 para cada kg de N aplicado nas condições de campo, e 0,0011
MJ MJ-1 para cada kg de N aplicado na “simulação 2”. Na “simulação 1”, não houve diferença
significativa entre os tratamentos, portanto ao utilizar mais terra para o cultivo, a relação entre
produção e consumo de energia se equilibra com a intensificação agrícola por meio do uso de
doses elevadas de N nas soqueiras de cana-de-açúcar.
65
Doses de N em longo prazo
10
9,5
y = 9,02 - 0,002x
R² = 0,96**
9
8,5
8
7,5
7
Balanço de energia (MJ MJ-1)
0
200
400
600
800
Simulação 1: Demanda de terra
adicional
10
9,5
y = 8,27 - 0,0007x
R² = 0,88*
9
8,5
8
7,5
7
0
200
400
600
800
Simulação 2: Reposição de N nas
menores doses
10
9,5
9
y = ȳ = 7,82
8,5
8
7,5
7
0
200
400
600
800
N-fertilizante adicionado (kg ciclo completo-1)
Figura 3.3. Balanço de energia da produção de cana-de-açúcar, em diferentes situações de
campo e simuladas, em função de diferentes quantidades de N-fertilizante adicionadas ao
sistema, considerando um ciclo completo (cana-planta + 4 soqueiras). **: P<0,01.
As emissões estimadas de GEE nas condições de campo da cana-de-açúcar em ciclo
completo podem ser observadas na Tabela 3.6. Transporte e operações agrícolas respondem
pela maior quantidade de emissões de CO2eq do sistema, em qualquer tratamento de adição de
N no ciclo completo. Em geral, a contribuição da adição de N mineral (produção de fertilizante
+ emissão de N2O do solo) nas emissões totais foram de 2,8% (48 kg N), 14,8% (288 kg N),
24,1% (528 kg N) e 31,6% (768 kg N).
66
Tabela 3.6. Estimativa de emissão de gases efeito estufa (GEE) da produção de cana-de-açúcar
em função da adubação nitrogenada em longo prazo
Quantidade de N aplicada (kg ciclo completo-1)
Fontes de GEE
48
Operações de campo
288
528
768
kg CO2/Ciclo
Transporte e Operações Agrícolas*,1
5278
5278
5278
5278
148
892
1636
2380
Produção de P2O5-fertilizante*,2
143
143
143
143
,2
532
532
532
532
98
593
1087
1582
1469
1469
1469
1469
1149
1149
1149
1149
8820
10058
11297
12535
902
990
1026
1137
Produção de fertilizantes
Produção de N-fertilizante**,2
Produção de K2O-fertilizante*
Emissões do solo
Emissão de N2O do solo***,3
,1
Emissão de CO2 pela calagem*
Emissões da usina
Produção de etanol*,1
Total emissões,
completo-1
kg
Produção de energia, GJ
CO2
ciclo
Total CO2 eq GJ-1
9,77
10,16
11,01
11,02
*: Índices baseados em Macedo et al. (2008); **: Índice baseado em Jenssen (2010); ***: Índice baseado
em Vargas (2014). 1: Cálculos realizados de acordo com a área cultivada, em kg CO2eq ha-1; 2: Cálculos
baseados nas doses dos fertilizantes contendo N, P e K; 3: Cálculo baseado em fator de emissão de NN2O.
Os resultados de emissões foram muito similares quando se considerou a demanda
adicional de terra para cultivo na “simulação 1” (Tabela 3.7). O aumento na área de cultivo
ocasionou incremento nas quantidades totais de emissões, principalmente devido às emissões
de transporte e operações agrícolas. No entanto, a contribuição de N adicionado em relação às
emissões totais foi a mesma que a observada nas condições de campo, pois os valores
modificaram na mesma proporção em função da área de cultivo.
67
Tabela 3.7. Estimativa de emissão de gases efeito estufa (GEE) da produção de cana-de-açúcar
em função da adubação nitrogenada em longo prazo, simulando a necessidade de aumento da
área de cultivo para equiparação da produtividade obtida na maior dose de N
Quantidade de N aplicada (kg ciclo completo-1)
Fontes de GEE
60,5
Operações de campo
331,2
586,1
768
kg CO2/Ciclo
6650
6069
5858
52781
Produção de N-fertilizante
187
1026
1816
23801
Produção de P2O5-fertilizante
180
164
158
1431
Produção de K2O-fertilizante
671
612
591
5321
Emissão de N2O do solo
124
682
1207
15821
Emissão de CO2 pela calagem
1851
1689
1630
14691
1448
1322
1276
11491
11113
11567
12539
125351
Produção de energia, GJ
1137
1137
1137
11371
Total CO2 eq GJ-1
9,77
10,17
11,02
11,021
Transporte e Operações Agrícolas
Produção de fertilizantes
Emissões do solo
Emissões da usina
Produção de etanol, L ha-1
Total emissões,
completo-1
1
kg
CO2
ciclo
Valores não alterados em relação ao balanço de GEE original
Na “simulação 2”, que considerou a reposição de N ao sistema (Tabela 3.8), os valores
observados nas doses 48 e 288 kg de N foram muito diferentes, e função da grande quantidade
de N necessária para a reposição do balanço negativo, e à alta emissão de GEE relacionada ao
N-fertilizante, durante a produção do fertilizante na indústria e nas emissões de N2O no solo.
Nessa simulação, a contribuição do N adicionado (produção de fertilizante + emissão de N2O
do solo) nas emissões totais de GEE foi de 20,1% (48 kg de N), 22,4% (288 kg de N), 24,1%
(528 kg de N) e 31,6% (768 kg de N).
68
Tabela 3.8. Estimativa de emissão de gases efeito estufa (GEE) da produção de cana-de-açúcar
em função da adubação nitrogenada em longo prazo, simulando a necessidade de aumento da
área de cultivo para equiparação da produtividade obtida na maior dose de N, e reposição de N
nas condições de balanço negativo entre N aplicado e exportado
Quantidade de N aplicada (kg ciclo completo-1)
Fontes de GEE
48
288
Operações de campo
528
768
kg CO2/Ciclo
5278
5278
52781
52781
1298
1482
16361
23801
Produção de P2O5-fertilizante
143
143
1431
1431
Produção de K2O-fertilizante
532
532
5321
5321
862
985
10871
15821
1469
1469
14691
14691
1149
1149
11491
11491
10067
10374
112971
125351
902
990
10261
11371
11,89
11,15
11,011
11,021
Transporte e Operações Agrícolas
Produção de fertilizantes
Produção de N-fertilizante
Emissões do solo
Emissão de N2O do solo
Emissão de CO2 pela calagem
Emissões da usina
Produção de etanol, L
Total emissões,
completo-1
kg
Produção de energia, GJ
Total CO2 eq GJ-1
1
CO2
ciclo
Valores não alterados em relação ao balanço de GEE original
As diferenças entre os tratamentos na emissão relativa de GEE (CO2eq GJ-1) dentro de
cada cenário podem ser observadas na Figura 3.4. Conforme esperado, nas condições de campo,
apesar da maior produção de energia na maior dose de N, não foi suficiente para resultar em
menores taxas de emissão de GEE em comparação com uso de menores doses de N, mesmo em
condições de menor produção de energia. Ao aumentar a área de cultivo para equiparar a
produtividade obtida na maior dose nas condições de campo, poucas diferenças foram
observadas. Por outro lado, quando se considera a reposição de N, ocorre uma inversão na
resposta, de maneira que a maior emissão de GEE por GJ de energia produzida ocorre na menor
dose de N (48 kg de N), e decresce na taxa de 1,2 CO2eq MJ-1 para cada kg de N aplicado,
considerando a reposição de N posterior ao final do ciclo completo (cana-planta + 4 soqueiras).
69
Doses de N em longo prazo
12
11
10
y = 9,71 + 0,0019x
R² = 0,90**
9
8
0
400
600
800
Simulação 1: Demanda de terra
adicional
12
(CO2eq GJ-1)
200
11
10
y = 9,63 + 0,002x
R² = 0,93**
9
8
0
200
400
600
800
Simulação 2: Reposição de N
nas menores doses
12
11
10
y = 11,7 - 0,0012x
R² = 0,71*
9
8
0
200
400
600
800
N-fertilizante adicionado (kg ciclo
completo-1)
Figura 3.4. Balanço de emissões de GEE da produção de cana-de-açúcar, em diferentes
situações de campo e simuladas, em função de diferentes quantidades de N-fertilizante
adicionadas ao sistema, considerando um ciclo completo (cana-planta + 4 soqueiras). **:
P<0,01.
Com base nos dados estimados a partir de (ROSSETTO et al., 2010), nota-se que os
balanços de energia e de emissões de GEE foram diferentes de acordo com a dose de N aplicada
e também de acordo com o ambiente de produção (Tabela 3.9). Assim como ocorreu nas
estimativas a partir dos dados avaliados no presente estudo, houve decréscimo no balanço de
energia e aumento na estimativa de emissões com a aplicação de doses de N-fertilizante. Os
balanços de energia mais positivos e as menores emissões de GEE ocorreriam nos ambientes
de maior potencial produtivo. O uso de baixas doses de N na soqueira (60 kg ha-1) em ambientes
70
mais produtivos resultaria em maiores balanços de energia e menores emissões que na ausência
de aplicação de N nas soqueiras em ambientes menos produtivos. Os valores de balanço de
energia estimados variaram de 5,5 a 9,1 GJ GJ-1, e as estimativas de emissão de GEE variaram
entre 11,2 e 18,5 kg CO2eq GJ-1.
Tabela 3.9. Estimativa de balanço de energia e emissão de GEE em diferentes ambientes de
produção de cana-de-açúcar, após a aplicação de N em ciclo completo (estimativas a partir de
dados adaptados de Rossetto et al., 2010)
Ambiente de
produção*
60 kg N ha-1
Ambiente ‘B’
Ambiente ‘C’
Ambiente ‘D’
Ambiente ‘E’
9,1
9,1
8,7
8,6
Ambiente ‘B’
Ambiente ‘C’
Ambiente ‘D’
Ambiente ‘E’
11,2
11,4
13,0
13,0
300 kg N ha-1
540 kg N ha-1
Balanço de Energia, GJ GJ-1
8,5
7,2
8,4
7,2
7,8
6,5
7,8
6,7
Balanço de GEE, kg CO2eq GJ-1
11,6
13,6
11,9
13,6
14,1
15,9
14,0
16,3
780 kg N ha-1
6,5
6,5
5,6
5,5
15,1
14,9
18,5
18,2
Os ambientes de produção foram baseados no tipo de solo (PRADO et al., 2008) e representam o potencial
produtivo de cada local, podendo ser entendido como: B: potencial alto; C: potencial médio; D: potencial
baixo e E: potencial muito baixo.
3.4 DISCUSSÃO
Apesar das baixas doses de N aplicadas na cana-de-açúcar nas condições brasileiras,
existe uma tendência de aumentar as doses de N aplicado em algumas situações, como resultado
da colheita sem queima (maior imobilização de N), e também pelo uso de variedades mais
responsivas e adaptadas para ambientes de alta produtividade (FORTES et al., 2013; PENATTI,
2013; ROSSETTO et al., 2010). Projeções realizadas por (MACEDO; SEABRA; SILVA,
2008) indicam um cenário com a aplicação de 120 kg ha-1 na cana-soca para 2020. No entanto,
respostas positivas em doses mais elevadas que 120 kg ha-1 têm sido observadas (FORTES et
al., 2013; PENATTI, 2013), mesmo em solos arenosos (VITTI et al., 2007). No entanto, essas
respostas não são constantes e ocorrem situações com ausência de resposta ao N aplicado
(CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). De qualquer maneira, é necessário destacar que
incrementos nas doses de N aplicado podem prejudicar o balanço de energia e as emissões
relativas de GEE, se tais aumentos no N aplicado não vierem acompanhados de aumentos
proporcionais de produtividade.
O impacto ambiental da produção de etanol em cana-de-açúcar é regulado por: Impacto
global (balanço de energia da produção de bioetanol e impacto nas emissões de GEE) e impacto
71
local/regional (poluição da água e ar atmosférico e erosão do solo) (BODDEY et al., 2008). Os
impactos locais e regionais são causados principalmente pela queima da cana-de-açúcar antes
da colheita e produção em solos inadequados para o cultivo (solos rasos e com declividade
acentuada). Essas situações não ocorreram nesse estudo, e portanto não foram considerados os
impactos locais. No entanto, é importante salientar que, se as práticas de manejo não forem
suficientes para a obtenção do máximo potencial produtivo de uma determinada área, isso pode
resultar na necessidade de uso de outras áreas com problemas de erosão e riscos de
contaminação de lençóis freáticos.
Considerando todos os itens de gasto de energia para a produção de etanol a partir da
cana-de-açúcar, os fertilizantes, principalmente N, são responsáveis pelas maiores
contribuições, normalmente acima de 20% do total de energia gasta para a produção de etanol
(BODDEY et al., 2008; MACEDO; SEABRA; SILVA, 2008). Com as alterações nas doses de
N nas condições de campo, houve um decréscimo significativo no balanço de energia final
(Figura 3.3). Os valores de balanço de energia final com aplicação de N na cana-soca ficaram
abaixo das médias calculadas por Boddey et al. (2008), que obtiveram 9,07 MJ MJ-1, com
produtividade média de 76,7 t ha-1ano-1, 57,6 kg de N ha-1ano-1 e com base na colheita manual
de cana. Macedo; Seabra; Silva (2008) fizeram levantamentos das safras de 2002, 2005/06
(índices usados no presente estudo) e projeções para 2020. Considerando a produção de
eletricidade pelo bagaço, além da produção de etanol pela cana, com produtividade de 87,1 t
ha-1 ano-1 e doses de N de 48 kg ha-1 na cana-planta e 88 kg ha-1 na soqueira, esses autores
obtiveram, em média, balanços de energia de 9,0 MJ MJ -1 para a os anos 2005/2006. Foram
valores, portanto, similares aos obtidos nas condições de campo, com baixas doses de N
aplicadas (Tabela 3.2).
De modo geral, todos os balanços finais de energia resultaram em valores relativamente
altos, acima de 7,0 MJ MJ-1. Isso ocorre principalmente pela alta eficiência de produção de
biomassa da cana-de-açúcar, e às baixas doses de N aplicadas nas condições brasileiras. A
capacidade das plantas em produzir altas quantidades de biomassa com baixo suprimento de
insumos pode ser verificada pela alta produção de energia na ausência de aplicação de N nas
soqueiras, de maneira que os incrementos de produção de energia proporcionados pela
adubação nitrogenada não são suficientes para suprir a energia gasta com a produção do
fertilizante nitrogenado, ao considerar apenas a produção de colmos em 1 ha. No entanto,
quando o balanço de energia atinge altos níveis, diferenças de 1 ou 2 unidades na relação entre
consumo e produção de energia representa pouca diferença na proporção de energia
economizada em relação ao uso de combustíveis fósseis (BODDEY et al., 2008). Esses
72
balanços são superiores aos comumente observados na produção de etanol de milho, por
exemplo, que é em torno de 2,3, ou mesmo do biodiesel de canola da Europa (3,0) e óleo de
palma da Malásia (5,0) (CORTEZ, 2012).
É preciso levar em consideração a grande influência dos adubos nitrogenados nas
entradas e saídas de energia, e além disso, é preciso avaliar se a intensificação agrícola pelo uso
de altas doses de N pode ser mais sustentável para a produção de bioenergia, em função dos
recentes questionamentos referentes à competição de culturas para bioenergia e alimentos por
áreas de cultivo (LAPOLA et al., 2010; SEARCHINGER et al., 2008).
O uso da terra para bioenergia é uma questão que vem sendo amplamente discutida nos
últimos 10 anos, após o rápido crescimento da produção de bioenergia em larga escala no Brasil
e nos EUA. As principais preocupações se referem à competição de culturas para bioenergia e
alimentos por terra e também devido a possíveis mudanças indiretas de uso da terra (LAPOLA
et al., 2010; SEARCHINGER et al., 2008), embora não existam evidências convincentes de que
essas mudanças indiretas ocorram de maneira significativa (KHANNA; CRAGO, 2012; KIM;
KIM; DALE, 2009; KLINE; DALE, 2008). Além da produção de bioenergia, o sequestro de C
também é um benefício importante, principalmente em áreas degradadas ou com problemas de
manejo (DALE et al., 2011). Além disso, na produção de cana-de-açúcar, existem diversas
limitações logísticas, que praticamente inviabilizam a produção em raio superior a 30 km ao
redor das usinas. Além do transporte de colmos frescos de cana, o retorno dos resíduos também
é de extrema importância para a sustentabilidade do sistema, de maneira que quanto maior for
a área cultivada, maior será a distância a ser percorrida para que os resíduos retornem ao campo.
Os resultados mostraram também que aumentos na demanda de terra causam
diminuições importantes no balanço final de energia (Tabela 3.3; Figura 3.3), dado o alto
consumo de energia com operações de plantio, transporte e colheita, que são naturalmente
maiores com aumento da área de cultivo. Por outro lado, as emissões relativas de GEE não
aumentaram de maneira expressiva, pois a proporção entre a produtividade estimada (igual à
maior dose) e a entrada de insumos agrícolas (principal fonte de emissão de GEE) permaneceu
a mesma. As emissões naturais de CO2 do solo não foram estimadas, pois se considera que não
é uma fonte de GEE proveniente de C inerte na natureza, como ocorre com o uso de
combustíveis fósseis. Porém, mudanças de uso da terra podem causar elevadas perdas de CCO2, além de afetar a preservação ecológica e de biodiversidade (PAYNE, 2010). Estudos
recentes no entanto têm demonstrado que o C perdido na mudança de uso da terra para cultivo
da cana-de-açúcar é reestabelecido ao longo do tempo com o cultivo de cana-de-açúcar
(MELLO et al., 2014).
73
A intensificação agrícola resultante da aplicação de altas doses de N e obtenção de alta
produtividade parece ser uma alternativa mais viável do que aumentar a área cultivada com
baixas produtividades. Mas, é importante salientar que é imprescindível a resposta positiva da
cultura ao N aplicado e que outros insumos sejam também fornecidos em quantidades
adequadas. Além disso, o potencial produtivo de cada ambiente precisa ser respeitado. Outros
riscos ambientais, como contaminação de lençol freático, precisam também ser levados em
consideração, principalmente em condições de solos rasos. Por outro lado, um dos caminhos
sugeridos para a produção de bioenergia tem sido o uso de terras denominadas marginais. Terras
marginais são aquelas pouco viáveis para outras culturas comerciais, com a obtenção de baixas
produtividades devido a limitações de solo e clima (GELFAND et al., 2013). O uso dessas áreas
para bioenergia poderia, em adição às melhorias na preservação e cobertura do solo, aumentar
o valor da terra e o lucro dos produtores, que potencialmente resultaria em maiores
investimentos em práticas agrícolas mais modernas e eficientes. Nessas condições, não
haveriam problemas na obtenção de baixas produtividades, com baixo uso de insumos. No
entanto, ainda carecem mais estudos para melhor definição dessas áreas e da viabilidade para
produção de cana-de-açúcar ou de outras culturas com potencial para produção de bioenergia.
Baixas doses de N resultam em consumo de N do reservatório orgânico do solo, que
eventualmente precisariam ser repostos. Com a finalidade de evitar degradação do solo em
longo prazo, o consumo de N do solo precisa ser reposto a partir de outras fontes, normalmente
N-fertilizante mineral. A reposição de N pode também ser uma estratégia de recomendação em
condições de alto risco de contaminação ambiental (THORBURN et al., 2011). Portanto, nas
condições de ausência de aplicação de N nas soqueiras (48 kg ha-1 na cana-planta), houve uma
produtividade relativamente alta (86,6 t ha-1ano-1), de maneira que a maior parte do N usado
pela cultura foi provavelmente obtido da matéria orgânica do solo, além da possível entrada de
N via N2 atmosférico pela ação de bactérias diazotróficas (URQUIAGA et al., 2012). No
entanto, é importante destacar que a reposição do N exaurido do solo pode também ser realizada
pelo meio do cultivo de plantas para cobertura verde durante a reforma do canavial. Ambrosano
et al (2011) constataram que o cultivo de crotalária júncea pode adicionar em torno de 196 kg
ha-1 de N para o sistema.
Muitos estudos têm demonstrado a importância dos biocombustíveis de primeira
geração na redução de emissão de GEE. Essas reduções são entre 20-60%, sendo de 70 a 90%
para combustíveis de segunda geração, se as emissões provenientes da mudança de uso da terra
forem excluídas (PAYNE, 2010).
74
De acordo com as estimativas de GEE, as emissões seriam maiores com aumento na
dose de N. O aumento nas emissões de GEE em função do N aplicado na cana-de-açúcar tem
sido observado em estudos da Austrália (ALLEN et al., 2010; DENMEAD et al., 2010) e
também do Brasil (DO CARMO et al., 2013; SIGNOR; CERRI; CONANT, 2013; VARGAS,
2014). A emissão de N2O aumenta quando N-fertilizante é aplicado no solo. O Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) estabelece que 1% do N aplicado é emitido
na forma de N2O. Esse valor considera uma média geral para diversos solos, climas, espécies
vegetais e tipos de fertilizante. No entanto, é importante observar os dados específicos para
cada região, quando disponíveis.
O uso de N-fertilizante na agricultura é a maior fonte de emissões diretas e indiretas de
GEE (USSIRI; LAL, 2013). No entanto, existem evidências de que a maior parte do N2O
emitido é proveniente de N excedente do sistema (VAN GROENIGEN et al., 2010), devido
principalmente ao aumento de N mineral no solo, que serve como substrato para nitrificação e
desnitrificação. Isso indica que o aumento na eficiência de uso de N e no potencial produtivo
da cultura (intensificação agrícola) pode resultar em menor impacto das emissões de N-N2O
(VAN GROENIGEN et al., 2010). Dessa maneira, a simples redução nas quantidades de N
aplicado não parece ser a melhor decisão para diminuir as emissões de GEE em relação ao total
de energia produzida. Além disso, com técnicas e fontes mais eficientes, há evidências de que
altas produtividades e altas quantidades de insumos com baixas emissões de GEE não são
questões conflitantes em condições de manejo adequado (GRASSINI; CASSMAN, 2012).
A emissão de N2O pode aumentar linearmente ou exponencialmente com a dose de N
(HOBEN; GEHL; MILLAR, 2011; SIGNOR; CERRI; CONANT, 2013). No entanto, a
produtividade obtida é sensível às doses de N, principalmente na cana-soca. Em geral para a
maior parte das culturas comerciais, a viabilidade de reduzir a quantidade de N aplicado como
uma estratégia para mitigar N2O deve considerar os impactos econômicos, além de outros
aspectos geopolíticos (ARCHER; HALVORSON, 2010). A simples redução da dose de N sem
modificar outras práticas pode também transferir a produtividade perdida (e as emissões de N2O
associadas) para outra localização geográfica (VENTEREA et al., 2012).
Com base nesses resultados, pode-se concluir que muitos fatores precisam ser
considerados na definição da melhor dose de N para a cana-de-açúcar nos próximos anos com
o avanço do uso da cultura para fins bioenergéticos. Mais estudos são ainda necessários para
verificar o impacto de doses mais altas de N em diferentes condições, assim como do uso de
resíduos que podem contribuir com o aporte de N no solo, como a vinhaça. Normalmente, a
recomendação de doses de N e outros nutrientes para as culturas é realizada de acordo com a
75
maior lucratividade obtida. Porém, para cumprir requisitos de certificação para exportação do
etanol brasileiro, limites terão que ser respeitados para não afetar significativamente a eficiência
energética e as emissões de GEE. Simulações têm sugerido que em cana sem queima um novo
equilíbrio pode ser obtido em médio a longo prazo (ROBERTSON; THORBURN, 2007;
TRIVELIN et al., 2013), o que pode resultar em reduções nas demandas de N-fertilizante, de
maneira que seria portanto aceitável a aplicação de altas doses de N em curto e médio prazo,
promovendo enriquecimento do N do solo e reduzindo as emissões de N2O em longo prazo.
No que se refere à sustentabilidade ambiental dos biocombustíveis, baixos custos de
produção, alta produtividade média, alta relação entre produção de energia renovável e
consumo de energia fóssil e alto potencial de mitigação de GEE são atributos essenciais para
qualquer matéria-prima renovável em comparação ao uso de combustíveis fósseis (CORTEZ,
2012). A adubação nitrogenada influencia todos esses atributos. Em resumo, o uso de Nfertilizante aumenta os custos de produção, mas também aumenta a produtividade, resultando
em maior lucratividade. Também afeta diretamente o balanço de energia, contribuindo com
mais de 20% do total de energia consumida nas maiores doses de N. No que diz respeito à
mitigação de GEE, como mencionado anteriormente, o etanol de cana-de-açúcar apresenta
potencial de redução de mais de 60% em comparação com a gasolina. A adubação nitrogenada
em si pode também ser considerada um fator de mitigação, quando bem manejada e
eficientemente utilizada, promovendo aumentos significativos de produtividade, evitando
degradação do solo e considerando os possíveis impactos provenientes de mudanças diretas e
indiretas de uso da terra. Deve-se destacar, entretanto, que os resultados desse estudo mostraram
índices ambientais menos vantajosos com a aplicação de N, mesmo após aumentos lineares de
produtividade. Por outro lado, produção líquida de energia foi superior com o aumento das
doses de N. De qualquer maneira, tais condições mostram que a otimização de eficiência de uso
do N é um objetivo a ser perseguido.
3.5 CONCLUSÕES
As elevadas demandas de energia e emissões de GEE relacionadas ao uso de fertilizantes
nitrogenados resultam em queda no balanço de energia e aumento nas emissões totais de GEE.
Isso ocorre mesmo em condições de respostas positivas ao N na produção de energia pela canade-açúcar, o que demonstra a grande contribuição dos fertilizantes nitrogenados nos parâmetros
energéticos e ambientais. Por outro lado, a obtenção de altas produtividades em ambientes
favoráveis com a aplicação de doses elevadas de N pode trazer resultados mais adequados para
a produção de bioenergia a partir de cana-de-açúcar ao considerar o sistema de maneira global.
76
Ao aumentar a demanda de terra para produzir energia, o aumento no consumo de
energia devido principalmente às operações agrícolas de plantio e colheita resultam em
similaridade entre altas produtividades com altas doses de N em menor área e baixas
produtividades usando maior quantidade de terra no balanço final de energia. As emissões de
GEE permanecem menores em baixas doses de N do que a aplicação de altas quantidades de
N-fertilizante. Tais diferenças porém precisam ser melhor estudadas no que se refere aos
impactos ambientais do uso de N e das mudanças de uso da terra, levando em consideração os
questionamentos referentes ao uso da terra para produção de bioenergia.
A reposição de N em condições de balanço negativo (N adicionado < N exportado pelos
colmos) ocasiona redução no balanço final de energia, ao considerar a aplicação posterior de N
para suprir o estoque de N no solo. Aplicações de N abaixo do necessário para suprir as
quantidades exportadas podem causar maiores emissões de GEE que a aplicação de doses muito
superiores à exportação, se tal prática permanecer por muito tempo e ocasionar a necessidade
de adição de N-fertilizante para evitar a degradação do solo.
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81
MATERIAL SUPLEMENTAR
Tabela S 1. Índices de balanço de energia utilizados, de acordo com diferentes doses de N aplicadas em 15 diferentes localidades do estado de São
Paulo, considerando o ciclo de 12 meses de soqueira de cana-de-açúcar (dados adaptados de Rossetto et al., 2010).
Local
Produção de colmos
N0
N 60
N 120 N 180
---------- t ha-1 ----------
Produção de energia
N0
N 60
Gasto energético do N
N 120 N 180 N 0 N 60
---------- GJ ha-1 ----------
Balanço energético
N 120 N 180 N 0
MJ gasto / GJ produzido
N 60
N 120
N 180
-------- GJ GJ-1 ---------
Andradina
63,4
61,7
83,6
60,0
110,1
107,2
145,2
104,2
0,0
26,1
38,5
80,5
7,9
7,5
7,4
7,0
Araçatuba
65,3
70,9
84,2
87,3
113,4
123,1
146,3
151,7
0,0
22,7
38,2
55,3
7,9
7,6
7,4
7,2
Araras
128,0
137,0
131,1
134,7
222,4
238,0
227,8
234,0
0,0
11,7
24,5
35,8
7,9
7,7
7,6
7,4
Guaíra 1
64,0
68,7
78,1
82,7
111,3
119,4
135,7
143,6
0,0
23,4
41,2
58,4
7,9
7,6
7,4
7,2
Guaíra 2
100,0
111,3
110,4
110,8
173,7
193,4
191,8
192,5
0,0
14,5
29,2
43,6
7,9
7,7
7,5
7,4
Iracemápolis
90,4
101,8
103,9
102,0
157,0
176,9
180,6
177,2
0,0
15,8
31,0
47,3
7,9
7,7
7,5
7,3
Orindiuva
70,2
64,3
74,1
71,5
121,9
111,6
128,8
124,2
0,0
25,0
43,4
67,5
7,9
7,6
7,4
7,1
Planalto
45,9
51,7
45,5
46,6
79,8
89,8
79,0
80,9
0,0
31,1
70,8
103,7
7,9
7,5
7,1
6,8
Pradópolis
76,7
80,6
79,9
82,0
133,2
140,0
138,9
142,4
0,0
20,0
40,3
58,9
7,9
7,6
7,4
7,2
Promissão
92,7
94,2
94,2
92,0
161,1
163,7
163,6
159,8
0,0
17,1
34,2
52,5
7,9
7,7
7,5
7,3
Rib Preto
99,5
90,9
102,1
104,5
172,8
158,0
177,4
181,5
0,0
17,7
31,5
46,2
7,9
7,6
7,5
7,3
S.Rita
80,2
89,5
97,7
97,6
139,3
155,5
169,7
169,6
0,0
18,0
32,9
49,5
7,9
7,6
7,5
7,3
S J Barra
83,9
105,3
113,0
111,3
145,7
182,9
196,3
193,3
0,0
15,3
28,5
43,4
7,9
7,7
7,5
7,4
Piracicaba
100,0
111,3
110,4
110,8
173,7
193,4
191,8
192,5
0,0
14,5
29,2
43,6
7,9
7,7
7,5
7,4
Sertãozinho
89,2
99,0
93,3
80,6
155,0
172,0
162,1
140,0
0,0
16,3
34,5
59,9
7,9
7,7
7,5
7,2
82
Tabela S 2. Índices de balanço de gases de efeito estufa (GEE), de acordo com diferentes doses de N aplicadas em 15 diferentes localidades do
estado de São Paulo, considerando o ciclo de 12 meses de soqueira de cana-de-açúcar (dados adaptados de Rossetto et al., 2010).
Produção de colmos
Local
N0
N 60
N 120 N 180
---------- t ha-1 ----------
Emissão de GEE
Produção de energia
N0
N 60
N 120 N 180 N 0 N 60
---------- GJ ha-1 ----------
Balanço de GEE
relacionada ao N
N 120 N 180 N 0
kg CO2eq / GJ produzido
N 60
N 120
N 180
-------- kg CO2eq ha-1 ---------
Andradina
63,4
61,7
83,6
60,0
110,1
107,2
145,2
104,2
0,0
2,9
4,3
8,9
5,7
6,4
5,4
7,5
Araçatuba
65,3
70,9
84,2
87,3
113,4
123,1
146,3
151,7
0,0
2,5
4,2
6,1
5,6
5,7
5,3
5,5
Araras
128,0
137,0
131,1
134,7
222,4
238,0
227,8
234,0
0,0
1,3
2,7
4,0
3,4
3,5
3,8
4,0
Guaíra 1
64,0
68,7
78,1
82,7
111,3
119,4
135,7
143,6
0,0
2,6
4,6
6,5
5,7
5,8
5,6
5,8
Guaíra 2
100,0
111,3
110,4
110,8
173,7
193,4
191,8
192,5
0,0
1,6
3,2
4,8
4,1
4,0
4,3
4,6
Iracemápolis
90,4
101,8
103,9
102,0
157,0
176,9
180,6
177,2
0,0
1,8
3,4
5,2
4,4
4,3
4,5
4,9
Orindiuva
70,2
64,3
74,1
71,5
121,9
111,6
128,8
124,2
0,0
2,8
4,8
7,5
5,3
6,1
5,9
6,5
Planalto
45,9
51,7
45,5
46,6
79,8
89,8
79,0
80,9
0,0
3,4
7,8
11,5
7,5
7,4
8,9
9,3
Pradópolis
76,7
80,6
79,9
82,0
133,2
140,0
138,9
142,4
0,0
2,2
4,5
6,5
5,0
5,1
5,5
5,8
Promissão
92,7
94,2
94,2
92,0
161,1
163,7
163,6
159,8
0,0
1,9
3,8
5,8
4,3
4,6
4,9
5,3
Rib Preto
99,5
90,9
102,1
104,5
172,8
158,0
177,4
181,5
0,0
2,0
3,5
5,1
4,1
4,7
4,6
4,8
S.Rita
80,2
89,5
97,7
97,6
139,3
155,5
169,7
169,6
0,0
2,0
3,6
5,5
4,8
4,7
4,8
5,1
S J Barra
83,9
105,3
113,0
111,3
145,7
182,9
196,3
193,3
0,0
1,7
3,2
4,8
4,6
4,2
4,3
4,6
Piracicaba
100,0
111,3
110,4
110,8
173,7
193,4
191,8
192,5
0,0
1,6
3,2
4,8
4,1
4,0
4,3
4,6
Sertãozinho
89,2
99,0
93,3
80,6
155,0
172,0
162,1
140,0
0,0
1,8
3,8
6,6
4,4
4,4
4,9
5,9
83
4.
ADUBAÇÃO
NITROGENADA
E
INOCULAÇÃO
COM
BACTÉRIAS
DIAZOTRÓFICAS NA CANA-DE-AÇÚCAR
RESUMO
Estudos recentes têm apontado a inoculação com bactérias diazotróficas como potencialmente
favorável para a cana-de-açúcar devido a efeitos promotores de crescimento, ao invés de
aumento na fixação biológica de nitrogênio (FBN). As respostas são no entanto irregulares, e
há a necessidade de avaliações em diferentes condições ambientais e genéticas. Efeitos
benéficos provenientes da ação desses organismos podem resultar em melhor eficiência da
planta em aproveitar o nitrogênio (N) aplicado via fertilizante, porém a eficiência da inoculação
pode ser prejudicada na presença de adubos nitrogenados. Esse trabalho teve o objetivo de
avaliar a resposta da cana-de-açúcar à inoculação em diferentes locais e variedades após a
aplicação de adubo nitrogenado e verificar o aproveitamento de
15
N-Sulfato de amônio na
presença e ausência de inoculação. A eficiência da inoculação em termos de N foliar, acúmulo
de N e produção de colmos foi avaliada em cinco áreas experimentais do estado de São Paulo
em 1ª soqueira (Sales de Oliveira-SP, Jaú-SP, Piracicaba-SP e Santa Maria da Serra-SP). O
delineamento experimental foi em blocos ao acaso, no arranjo de parcelas subdivididas, com
quatro repetições. Nas parcelas, os tratamentos foram três variedades, e nas subparcelas, 100
kg ha-1 de N com e sem inoculação. Análises de abundância natural de 15N foram realizadas,
usando plantas invasoras próximas ás áreas experimentais como plantas de referência nãofixadoras. Microparcelas com aplicação de sulfato de amônio enriquecido com 1% de átomos
de 15N em excesso foram implantadas em duas áreas com solos distintos (argiloso - Piracicaba
e arenoso – Santa Maria da Serra), na mesma variedade, para determinação de aproveitamento
de 15N-fertilizante pelas plantas, em função da inoculação. Poucas diferenças foram observadas
em termos de N foliar, N acumulado e produção de colmos em função da inoculação, porém
em algumas variedades e locais, houve aumento no acúmulo de N e na produção de colmos
com a inoculação após a adubação nitrogenada. Os resultados de abundância natural de
15
N
variaram de 0 a 41% de contribuição da FBN, sem diferença aparente entre plantas inoculadas
e não inoculadas na ausência de adubação nitrogenada. Os resultados de 15N indicaram redução
na recuperação de 15N por causa da inoculação ( de 55,8 para 40,5 kg ha-1 de N) em solo argiloso
em análise realizada na fase de máximo crescimento, sem diferenças no final do ciclo (34 kg
ha-1 em média). Em solo arenoso, aumentos significativos no aproveitamento de 15N-fertilizante
84
com a inoculação ocorreram na fase de máximo crescimento, de 25,2 kg ha-1 para 45,3 kg ha-1
e no final do ciclo, de 25,5 kg ha-1 para 45,3 kg ha-1, considerando toda a parte aérea das plantas.
Esses resultados indicam que os benefícios da inoculação podem ocorrer, embora de maneira
errática, e potencialmente incrementam a eficiência de uso do N-fertilizante. No entanto, não é
recomendável substituir a adubação nitrogenada pela inoculação com as tecnologias e
variedades atualmente disponíveis.
Palavras-chave: Saccharum sp.; bioenergia; crescimento vegetal
NITROGEN
FERTILIZATION
AND
DIAZOTHROPHIC
BACTERIA
INOCULATION IN SUGARCANE
ABSTRACT
Recent studies have shown diazothrophic bacteria inoculation as being positive for sugarcane
development due to growth promotion, instead of nitrogen biological fixation (BNF). However,
crop responses are erratic to inoculation, and it is necessary to assess inoculation effects under
different genetic and environmental conditions. Benefits provided by these organisms might
result in higher plant efficiency to use the fertilizer nitrogen (N), but the presence of synthetic
fertilizers may prejudice inoculation efficiency. This study aimed to evaluate sugarcane
response to inoculation in different sites and varieties following N application and to assess
ammonium sulfate-15N recovery under presence or absence of inoculation. The inoculation
efficiency in terms of leaf N, N accumulation and stalk yield was evaluated in five experimental
sites of Sao Paulo state in first ratoon. Experimental design was randomized blocks, in splitplot arrangement and four replications. On plots, treatments were three varieties and on
subplots, 100 kg ha-1 N with and without inoculation. Natural
15
N abundance analysis were
performed, by using weeds as non-fixing reference plants. Microplots with ammonium sulfate
(1% 15N) were established in two sites of contrasting soils (sandy and clayey soils), using the
same variety, in order to determine fertilizer 15N recovery by plants. Only few differences were
observed in terms of leaf N, accumulated N and stalk yield as a function of inoculation.
However, in some sites and varieties there was increase on N accumulation and stalk yield after
inoculation under N application. Natural 15N abundance results varied from 0 to 41% of BNF
contribution, without apparent difference between inoculated and non-inoculated plants under
N fertilizer absence. Results of
15
N experiment have indicated reduction on
15
N recovery
85
because of inoculation (from 55,8 to 40,5 kg ha-1 of N) in the clayey soil on grand-growth
period, without differences at the end of the cycle (34 kg ha-1 on average). In the sandy soil,
significant increases were observed on fertilizer-15N recovery because of inoculation on grand
growth period (from 25,2 kg ha-1 to 45,3 kg ha-1) and at the end (from 25,5 kg ha-1 to 45,3 kg
ha-1), considering the whole aboveground plant. These results have indicated that inoculation
benefits may occur, although erratically, and potentially increase fertilizer-N use efficiency.
However, it is not recommended to replace N fertilization by inoculation with the currently
available technologies and varieties.
Key words: Saccharum sp., bioenergy, plant growth
4.1 INTRODUÇÃO
A cultura da cana-de-açúcar é cultivada em mais de 8 milhões de hectares no Brasil
(CONAB, 2014). As quantidades de N aplicadas na culturas são pequenas em comparação com
outras culturas (DEL GROSSO et al., 2014) e com outros países produtores de cana-de-açúcar
(CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). O cultivo da cultura em condições de baixo
suprimento de N e alta remoção pelos colmos por muitos anos, mas sem sinais claros de
degradação ou quedas de produtividade tem sido considerado como evidência de que a FBN
desempenha um importante papel no suprimento de N para a cultura (URQUIAGA; CRUZ;
BODDEY, 1992; BODDEY et al., 2003; URQUIAGA et al., 2012). A ocorrência de bactérias
diazotróficas fixadoras de N2 tem sido observada na cultura desde o trabalho de Dobereiner
(1961) e diversos trabalhos posteriores foram conduzidos com o objetivo de isolar e determinar
estirpes de bactérias diazotróficas que fazem associação com a cana-de-açúcar (BALDANI et
al., 2002).
A contribuição da FBN para a nutrição nitrogenada é altamente variável, dependendo
de inúmeros fatores ambientais e genéticos. Estudos conduzidos por meio de diferentes técnicas
para estimar a proporção de N proveniente da FBN apontam contribuição de 0 a 70%
(YONEYAMA et al., 1997), 25 a 60% (BODDEY et al., 2001) e até mesmo acima de 60%
(URQUIAGA; CRUZ; BODDEY, 1992). Em geral, Herridge; Peoples e Boddey (2008);
Urquiaga et al. (2012) assumem que em torno de 40 kg ha-1ano-1 são assimilados pelas plantas
de cana-de-açúcar em média via FBN. Possíveis aumentos na população dessas bactérias
diazotróficas, principalmente de estirpes que se associam mais facilmente com a cana-de-açúcar
poderiam incrementar a contribuição da FBN, por meio de maior colonização por esses
86
microrganismos e o N2 assimilado for transferido para a nutrição da cultura. Tais condições
podem ser estabelecidas pela inoculação das plantas com estirpes de bactérias diazotróficas.
Considerando o grande potencial de aproveitamento da cultura de cana-de-açúcar do N2
assimilado pelas bactérias diazotróficas, um inoculante foi desenvolvido com cinco estirpes de
bactérias diazotróficas pela Embrapa Agrobiologia, inicialmente com o objetivo de substituir a
adubação nitrogenada de plantio e parte do fertilizante aplicado nas soqueiras (REIS;
BALDANI; URQUIAGA, 2009). No entanto, resultados de campo têm mostrado respostas
irregulares à inoculação (CANTARELLA et al., 2012; GAVA et al., 2012; MORAIS et al.,
2011; PEREIRA et al., 2013; SCHULTZ et al., 2012, 2014), com ocorrência de respostas
positivas em algumas situações, sem indícios de serem resultado de FBN por meio de avaliações
de abundância natural de 15N (PEREIRA et al., 2013; SCHULTZ et al., 2012, 2014).
A ocorrência de respostas positivas da cultura à inoculação com bactérias diazotróficas,
sem contribuição de FBN, sugere que as bactérias inoculadas podem funcionar como agentes
benéficos para a promoção de crescimento das plantas. Esses efeitos provenientes de bactérias
diazotróficas foram comprovados em diversos estudos (BENEDUZI et al., 2013; DAS; SAHA,
2003; DAS; SAHA; BENGAL, 2007; DOBBELAERE; VANDERLEYDEN; OKON, 2003;
KENNEDY;
CHOUDHURY;
KECSKÉS,
2004;
SARAVANAN;
MADHAIYAN;
THANGARAJU, 2007; SEVILLA et al., 2001; SINGH et al., 2007; SUMAN et al., 2005;
TAULE et al., 2012; VIDEIRA et al., 2011; YADAV et al., 2009). Dentre outros efeitos
benéficos, pode ocorrer melhoria no desenvolvimento de raízes das plantas. O melhor
desenvolvimento radicular pode aumentar o aproveitamento de N adicionado via fertilizante.
O aproveitamento do N do fertilizante pela cana-de-açúcar é baixo, quando comparado
com outras culturas, sendo dificilmente superior a 40% (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI,
2007). Possíveis aumentos no aproveitamento de N-fertilizante após a inoculação com bactérias
diazotróficas representariam importante melhoria no sistema, pois reduz a quantidade de N que
permanece no sistema sujeito a perdas. No entanto, a maior parte dos estudos com inoculação
em campo têm comparado a inoculação com bactérias diazotróficas (sem adubação) e a
fertilização nitrogenada. O uso de fertilizantes nitrogenados em cana-de-açúcar podem causar
decréscimo no número e na capacidade fixadora das bactérias diazotróficas (BODDEY et al.,
2003). Dessa maneira, torna-se necessário avaliar a eficiência da inoculação na presença de
adubação nitrogenada em diferentes variedades e os possíveis benefícios das bactérias
87
diazotróficas no aproveitamento das plantas de cana-de-açúcar do N-fertilizante aplicado na
soqueira.
Os objetivos desse estudo foram: i) avaliar a resposta da cana-de-açúcar à inoculação
com bactérias diazotróficas na presença de adubação nitrogenada em cana-soca em diferentes
locais e variedades e ii) verificar o aproveitamento de 15N-fertilizante pelas plantas de cana-deaçúcar após a aplicação de 100 kg de N ha-1, na presença e ausência de inoculação em dois tipos
de solo (arenoso e argiloso).
4.2 MATERIAL E MÉTODOS
4.2.1 Descrição das áreas experimentais e aplicação dos tratamentos
Para avaliar os efeitos da inoculação com bactérias diazotróficas na resposta da canade-açúcar à aplicação de fertilizante nitrogenado, cinco áreas experimentais foram implantadas
e diferentes tratamentos foram implementados nos ciclos de cana-planta e 1ª soqueira. Essas
áreas foram conduzidas em diferentes regiões do estado de São Paulo: Piracicaba
(22º41’10,25’’ S; 47º38’54,70’’ W; 547 m altitude), Jaú (22º15’10,25’’ S; 48º34’6,26’’ W; 522
m altitude), Santa Maria da Serra (22º33’30” S; 48º16’41” W; 495 m altitude) e duas áreas em
Sales de Oliveira (20°49’27.6” S; 47º55’57.2” W; 730 m altitude). A precipitação pluviométrica
anual média de cada localidade é de 1427 mm (Sales de Oliveira), 1350 mm (Jaú), 1273 mm
(Piracicaba) e 1467 mm (Santa Maria da Serra).
Os experimentos foram conduzidos em diferentes tipos de solo (Tabela 4.1) com
delineamento de blocos ao acaso, esquema de parcelas subdivididas e quatro repetições. Nas
parcelas, os tratamentos foram três variedades para cada local (Tabela 4.1), e nas subparcelas
os tratamentos consistiram na presença e ausência de inoculação, sem aplicação de N e após a
aplicação de 100 kg ha-1 de N-Sulfato de amônio. Os mesmos tratamentos foram aplicados no
ciclo anterior, de cana-planta, porém a dose de N aplicada foi 60 kg ha-1 de N-ureia. Tais doses
de N são as quantidades comumente utilizadas em ciclos de cana-planta e soqueira de cana-deaçúcar, dependendo da produtividade esperada (SPIRONELLO et al., 1997).
88
Tabela 4.1. Variedades e tipos de solo nas áreas experimentais conduzidas em diferentes
municípios do estado de São Paulo
Local
Variedade
Tipo de solo
Sales de Oliveira #1
SP 81-3250
RB 85-5536
IAC 95-5000
Latossolo Vermelho
Sales de Oliveira #2
SP 81-3250
RB 86-7515
SP 93-3046
Latossolo Vermelho
Jaú
SP 81-3250
SP 95-5000
RB 85-5536
Latossolo Vermelho
Piracicaba
SP 81-3250
IAC 87-3396
CTC 14
Argissolo Vermelho-amarelo
Santa Maria da Serra
SP 81-3250
RB 93579
RB 86-7515
Neossolo Quartzarênico
As subparcelas das áreas experimentais foram constituídas de cinco linhas de dez metros
de comprimento nas duas áreas de Sales de Oliveira e em Piracicaba, e oito metros de
comprimento em Jaú, todas com espaçamento de 1,5 m entre linhas de cana-de-açúcar. Em
Santa Maria da Serra, as subparcelas foram constituídas de seis linhas de quinze metros de
comprimento, com espaçamento de 1,0 m. O plantio da cultura foi realizado após revolvimento
e preparo convencional do solo, com a distribuição manual de colmos semente em sulcos
abertos mecanicamente. No momento do plantio, os tratamentos de inoculação foram aplicados
nos colmos-semente após imersão por uma hora em solução aquosa de 100L contendo o produto
inoculante com bactérias diazotróficas. A inoculação foi realizada novamente após a brotação
da soqueira, por meio da pulverização do produto, também diluído em 100 L de água, após
passagem de disco de corte na superfície dos rizomas. A adubação de plantio foi realizada de
acordo com as recomendações da cultura, com P (140 kg ha-1 P2O5), K (120 kg ha-1 K2O), S
(60 kg ha-1), Zn e Cu (3 kg ha-1), B (2 kg ha-1) e Mo (0,5 kg ha-1). Na cana-soca, foram aplicados
50 kg ha-1 de P2O5, 120 kg ha-1 de K2O, 3 kg ha-1 de Zn e Cu, 2 kg ha-1 de B e 0,5 kg ha-1 de
Mo. Considerando a ocorrência de 2-3 gemas por seção de colmo, a distribuição dos colmossemente foi realizada com o objetivo de fornecer 8-10 gemas por metro quadrado nas áreas
experimentais, de acordo com o espaçamento aplicado.
O inoculante foi produzido e fornecido pela Embrapa Agrobiologia, sendo constituído
de cinco estirpes de bactérias diazotróficas: Pal5t, de Gluconacetobacter diazotrophicus;
Cbamc, de Herbaspirilum seropedicae; HRC54, de Herbaspirilum rubrisubalbicans; HCC103,
de Azospirilum amazonense; e PPe8T, de Bulkholderia tropica. Essas estirpes foram
previamente testadas e selecionadas por Oliveira et al. (2003, 2006). Com a finalidade de obter
o inoculante, as estirpes bacterianas foram cultivadas individualmente em meio de cultura
89
Dyg’s (RODRIGUES NETO; MALAVOLTA; VICTOR, 1986). Existem diversos meios sendo
estudados para melhor preservação das bactérias e eficiência de infecção das plantas. No ciclo
de cana-planta, foi utilizado o inoculante na forma de turfa, cujo preparo é descrito em Schultz
et al. (2012). Na soqueira, o inoculante utilizado foi na forma líquida, conforme descrito em
Pereira et al. (2013). Ambos produtos foram diluídos em 100 L de água limpa. No plantio, a
inoculação foi realizada pela imersão dos colmos-semente na suspensão de inoculante diluído
em água por aproximadamente 60 minutos. Na soqueira, a inoculação foi realizada por meio da
pulverização das brotações, com auxílio de disco de corte, permitindo a aplicação no interior
dos rizomas.
4.2.2 Teor de N na folha, acúmulo de N na parte aérea e produtividade de colmos
As avaliações do presente estudo foram realizadas no ciclo de 1ª soqueira, após os
tratamentos aplicados conforme descrição anterior. Amostras de folha foram retiradas para
avaliar o estado nutricional das plantas durante a estação de máximo crescimento, entre janeiro
e março, quando ocorre alta disponibilidade de água e luz solar sob temperaturas elevadas. Um
total de 30 folhas foram retiradas das plantas localizadas nas 3 linhas centrais de cada
subparcela, na posição +1, que consiste na 1ª folha a partir do topo com lígula visível
(SPIRONELLO et al., 1997). O terço médio das folhas sem a nervura foi seco em estufa (65°C),
moído em moinho Wiley e então a subamostra foi encaminhada para determinação de N total
da folha (BATAGLIA et al., 1983).
Na fase de maturação das plantas, 11-12 meses após a última colheita em cana-soca,
uma seção de 2 m lineares em cada subparcela foi amostrada para avaliação biométrica e
determinação de acúmulo de N. A parte aérea das plantas foi separada em folhas secas,
ponteiros e colmos. Esses compartimentos foram pesados no campo, e subamostras foram secas
(65°C), moídas em moinho tipo Wiley e analisadas para determinação de N total (BATAGLIA
et al., 1983), de maneira que o acúmulo de N em cada compartimento foi calculado com base
no teor de N e no peso total de cada compartimento em 2 m lineares, sendo então estimado por
ha. Após a coleta de material vegetal para determinação de N acumulado na parte aérea, a área
total foi colhida mecanicamente em Santa Maria da Serra e manualmente nas demais áreas, sem
queima prévia da palha. No momento da colheita, os ponteiros e as folhas secas foram
removidos, e os colmos foram pesados para posterior estimativa da produtividade em tonelada
de colmos por hectare.
90
4.2.3. Quantificação da contribuição da FBN por abundância natural de 15N
A contribuição da fixação biológica de nitrogênio (FBN) natural na cana-de-açúcar foi
avaliada pela técnica de abundância natural de 15N (δ15N), a qual foi desenvolvida inicialmente
para estimar a FBN de leguminosas, sendo posteriormente aplicada em gramíneas, como a canade-açúcar (YONEYAMA et al., 1997). Consiste na comparação entre os valores de δ15N
(relação entre
15
Ne
14
N) da cana-de-açúcar e de plantas vizinhas, geralmente invasoras, não
leguminosas, e que conhecidamente não possuem relações simbióticas com bactérias fixadoras
de N. Para essa avaliação, amostras de folhas +3 de plantas de cana não adubadas com N foram
retiradas em fevereiro/2012, nas áreas experimentais de Piracicaba, Jaú e Santa Maria da Serra.
Amostras de plantas invasoras foram retiradas próximo às parcelas experimentais, sendo
posteriormente processadas e a abundância natural de
15
N foi analisada. A estimativa de N
proveniente do ar (% Npda) foi calculada de acordo com Yoneyama et al. (1997):
% Npda = 100 x
(δ15N referência − δ15N fixadora)
δ15N referência
4.2.4 Eficiência de uso de 15N-fertilizante
Com a finalidade de verificar os efeitos das bactérias diazotróficas na eficiência de uso
do N-fertilizante, foi realizada a aplicação de fertilizante nitrogenado enriquecido com 15N para
estimativa da recuperação de 15N na presença e ausência de inoculação. A recuperação de Nfertilizante marcado com o isótopo
15
N (Sulfato de amônio com 1% de
15
N) foi avaliada em
duas áreas experimentais: Piracicaba (solo argiloso) e Santa Maria da Serra (solo arenoso), na
variedade SP 81 3250, na presença e ausência de inoculação com bactérias diazotróficas. O
fertilizante nitrogenado (sulfato de amônio), com 1% de átomos de 15N em excesso, foi aplicado
em microparcelas de 2 m de comprimento, na dose de 100 kg ha-1. O desenho e disposição das
microparcelas, além da condução e avaliação das mesmas, seguiram a metodologia proposta
por Trivelin et al. (1994).
Durante a fase de máximo crescimento da cultura, em março/2012, amostras de folha
+3 (terceira folha a partir do topo com lígula visível) foram coletadas nas microparcelas para
determinação da concentração de 15N nas plantas. A alta mobilidade de N na planta permite que
a concentração de 15N observada na folha +3 possa ser extrapolada para outras partes da planta,
de acordo com dados analisados por Franco et al. (2011). Dentro da subparcela, em posição
diferente da microparcela, amostras de planta inteira foram retiradas em 2m lineares, com a
divisão de ponteiros+folhas secas e colmos, para determinação do acúmulo total de N em cada
91
compartimento e posterior estimativa de recuperação de
15
N-Sulfato de amônio, conforme
metodologia sugerida por Franco et al. (2011).
Ao final do ciclo, foram coletadas as plantas em 1 m linear no interior da microparcela,
deixando 0,5 m de cada lado. Nas linhas adjacentes à microparcela, também foi realizada a
coleta de 1 m linear de plantas, que foram separadas em colmos, folhas secas e ponteiros,
pesadas, secas em estufa e moídas em moinho tipo Wiley para posterior análise em
espectrômetro de massa da % de 15N recuperada pelas plantas.
Os cálculos de recuperação (%15N) do N-fertilizante e do N proveniente do fertilizante
(NPPF – kg ha-1) foram realizados de acordo com as equações abaixo:
NPPF = [(A - C) / (B - C)] x NT,
RN (%) = (NPPF / NAF) x 100, onde:
NPPF: N na planta proveniente de
15
N-fertilizante; A: abundância de
15
N (% de átomos) da
planta; B: abundância de 15N (1,0 % de átomos 15N) do 15N fertilizante; C: abundância natural
de 15N (0.366% de átomos); NT: conteúdo de N na planta (kg ha-1); RN: recuperação percentual
do 15N fertilizante na planta; NAF: dose de N da fonte aplicada.
4.2.5 Análises Estatísticas
Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância em blocos ao acaso com
arranjo de parcelas subdivididas. As diferenças entre a presença e ausência de inoculação foram
comparadas pelo teste de F ao nível de 95% de confiança.
92
4.3 RESULTADOS
A partir dos dados de teor foliar de N (Tabela 4.2), foi observada redução no teor de N na folha
com a inoculação em Jaú, na variedade IAC 5000 e em Sales de Oliveira 1, na variedade RB
5536. Por outro lado, na mesma variedade em Sales 1, houve aumento no acúmulo total de N
pela parte aérea com a inoculação, sendo que o efeito observado em Jaú não se refletiu em
diferença significativa no N acumulado ao final do ciclo. Em Sales de Oliveira 2, ocorreu
aumento no acúmulo de N na variedade SP 81 3250 com a inoculação (Tabela 4.2). Algumas
diferenças foram observadas na produção de colmos da 1ª soqueira entre ausência e presença
de inoculação, porém de maneira errática (dados não apresentados).
Tabela 4.2. Teor de N na folha diagnóstico +1 e acúmulo total de N na parte aérea de cana-deaçúcar em diferentes locais e variedades, em função da aplicação de 100 kg ha-1 de N na
ausência (100) e presença de inoculação com bactérias diazotróficas (100 + I).
Variedade
100
N foliar
N acumulado
---------- g kg-1 ----------
---------- kg ha-1 ----------
100+I
Efeito
100
100+I
Efeito
Piracicaba
CTC 14
20,0
21,2
ns
112,7
161,7
ns
IAC SP 3396
19,9
19,5
ns
112,7
116,3
ns
SP 81 3250
20,9
20,5
ns
110,1
125,7
ns
Jaú
IAC 95 5000
18,2
16,6
*
116,2
85,5
ns
RB 5536
18,9
18,2
ns
112
126,3
ns
SP 81 3250
19,6
19
ns
114,9
116,7
ns
Santa Maria da Serra
RB 7515
16,1
16,9
ns
75,4
59,7
ns
RB 93579
18,3
18,7
ns
53,7
63,8
ns
SP 81 3250
16,4
16,3
ns
75,6
73,1
ns
Sales de Oliveira 1
IAC 95 5000
14,4
14,5
ns
85,7
75,8
ns
RB 5536
16,7
14,7
*
63,1
87,2
*
SP 81 3250
16,8
16,2
ns
67,1
84,7
ns
Sales de Oliveira 2
IAC 3046
18,0
17,4
ns
84,6
93
ns
RB 7515
15,4
16
ns
78
90,2
ns
SP 81 3250
16,5
16,6
ns
82,8
135,2
**
* e **: significativo a P<0,05 e P<0,01, respectivamente.
93
A diferença de abundância isotópica de 15N entre as folhas de cana-de-açúcar e plantas
invasoras não leguminosas fornece indícios de que houve entrada de N2 proveniente da
atmosfera nas plantas de cana-de-acúcar. As estimativas no entanto são variáveis, sendo que os
valores de % de Npda variaram de 0 a 41% (Tabela 4.3).
Os valores médios foram diferentes dependendo do local. Em solo argiloso de
Piracicaba, e em solo de textura média de Jaú, contribuição estimada foi de 27% (Piracicaba) e
31,8% (Jaú). Por outro lado, foram observados valores muito baixos no estudo de longo prazo,
em solo argiloso de Piracicaba e em solo arenoso de Santa Maria da Serra (Tabela 4.3).
Tabela 4.2. Estimativas de N derivado do ar, por meio de técnica de abundância natural de 15N
(δ15N), em amostras coletadas durante a fase de máximo crescimento das plantas.
Tratamento
Variedade
N0
N 0+I
N0
N 0+I
N0
N 0+I
SP-3250
SP-3250
IAC-3396
IAC-3396
CTC 14
CTC 14
N0
N 0+I
N0
N 0+I
N0
N 0+I
SP-3250
SP-3250
RB-5536
RB-5536
IAC-5000
IAC-5000
N0
N 0+I
N0
N 0+I
N0
N 0+I
SP-3250
SP-3250
RB-93579
RB-93579
RB-7515
RB-7515
Cana-de-açúcar
Planta vizinha
15
N
δ N (‰)
Espécie
N
(g kg-1)
(mg g-1)
Piracicaba (Textura argilosa)
Cynodon dactylon
15,5
4,602
15,1
Commelina difusa
13,3
6,232
23,3
Bidens pilosa
17,2
5,127
17,5
Sida rhombifolia
12,1
5,877
15,0
13,5
5,949
13,8
5,048
Jaú (Textura média)
Brachiaria plantaginea
15,0
3,683
18,2
Bidens pilosa
14,3
4,154
13,0
Digitaria sanguinalis
13,2
3,685
13,7
Cyperus rontundus
13,4
3,713
10,7
Amaranthus viridis
14,7
3,655
20,2
14,3
3,719
Santa Maria da Serra (Textura arenosa)
Commelina difusa
14,0
5,554
11,0
Cyperus rotundus
14,5
6,049
17,8
Digitaria
sanguinalis
17,6
5,482
14,9
Cynodon dactylon
17,5
5,224
13,7
Pennisetum setosum
14,0
4,744
12,6
13,1
4,600
δ N
(‰)
15
Npda*
%
6,252
8,747
5,956
8,913
41,0
16,5
31,3
21,3
20,3
32,4
4,032
5,888
5,959
5,175
6,549
33,3
24,8
33,3
32,7
33,8
32,6
5,613
4,739
5,442
5,667
5,045
0,0
0,0
0,0
1,5
10,5
13,2
* Estimativa realizada com base nos valores obtidos de δ15N
Na biometria realizada em abril, não houve diferença de acúmulo de N em diferentes
compartimentos da cana-de-açúcar em função dos tratamentos aplicados (adubação nitrogenada
e inoculação com bactérias diazotróficas). Após a aplicação de sulfato de amônio enriquecido
94
com
15
N, os cálculos percentuais de N proveniente do fertilizante não mostraram diferenças
significativas entre a ausência e presença de inoculação (Tabela 4.4).
Tabela 4.4. Acúmulo de N e % do N proveniente do fertilizante em biometria realizada no mês
de abril/2012, nas duas áreas experimentais, na variedade SP 81-3250.
Trat.
N 100
N 100+I
Teste F
N 100
N 100+I
Teste F
N acumulado (kg ha-1)
Ponteiro +
Colmo
Parte aérea
Folhas secas
Piracicaba
60,9
52,0
101,1
54,2
44,6
99,0
ns
ns
ns
Santa Maria da Serra
24,1
37,7
61,8
32,9
43,8
76,7
ns
ns
ns
Npdf %
50,9
41,2
ns
45,8
59,4
ns
ns: não significativo
Ao final do ciclo, o acúmulo de N nos diferentes compartimentos da planta foi
incrementado em Santa Maria da Serra pela inoculação, em adição à aplicação de 100 kg de Nfertilizante, sem efeitos significativos em Piracicaba. Houve aumento significativo no N
acumulado nos ponteiros, que se refletiu em aumento na parte aérea total em Santa Maria da
Serra (Tabela 4.5). No que se refere ao percentual do N acumulado que foi proveniente do
fertilizante nitrogenado aplicado (Npdf%), as estimativas indicam diminuição no N do
fertilizante acumulado nos colmos em Piracicaba, em função da inoculação (Tabela 4.5). Por
outro lado, houve aumento de N proveniente do fertilizante em todos os compartimentos
avaliados em Santa Maria da Serra.
Com base no total de N acumulado na planta e na proporção de N na planta proveniente
do fertilizante, foi possível estimar o total de N acumulado do fertilizante, em kg/ha (Figura
4.2). Na biometria de abril/2012, foram observados efeitos inversos em relação aos tratamentos
aplicados entre as áreas experimentais. Em Piracicaba, foi observada diminuição na quantidade
de N do fertilizante, em kg ha-1, após a inoculação, nos colmos e na parte aérea total,
consequentemente. Por outro lado, em Santa Maria da Serra, houve aumento no N acumulado
proveniente do fertilizante, em ponteiros + folhas secas, e nos colmos, sendo refletido em
aumento na parte aérea (Figura 4.2).
95
Tabela 4.5. Acúmulo de N e % do N proveniente do fertilizante em biometria realizada no final
do ciclo da cultura, nas duas áreas experimentais, variedade SP 81-3250.
Trat.
N acumulado (kg/ha)
Colmo
Ponteiro
Folhas
secas
N 100
N 100+I
Teste F
54
66,9
ns
30,2
31,7
ns
10,5
10,7
ns
N 100
N 100+I
Teste F
30,8
25,8
ns
20,6
37,4
**
19,7
17,5
ns
Npdf %
Parte
aérea
Colmo
total
Piracicaba
94,7
40,2
109,3
28,4
ns
*
Santa Maria da Serra
71,1
37
80,7
58,3
ns
**
Ponteiro
Folhas
secas
Parte
aérea
total
35,2
34,2
ns
48,9
39
ns
39,5
31,1
ns
34,5
50,3
*
35
52,6
*
35,7
53,4
*
* e **: significativo a P<0,05 e P<0,01, respectivamente.
Piracicaba (abril/2012)
80
100
100
100+I
*
60
40
ns
*
20
Npdf (kg ha-1)
Npdf (kg ha-1)
100
Piracicaba (fim do ciclo)
80
60
ns
40
20
Ponteiro +
Folhas secas
Colmos
**
*
*
20
0
Npdf (kg ha-1)
Npdf (kg ha-1)
100
100
100+I
60
40
ns
Ponteiros Folhas
secas
Parte aérea
Sta Maria da Serra (abril/2012)
80
ns
ns
0
0
100
100
100 + I
80
Colmos
Parte
aérea
Sta Maria da Serra (fim do
ciclo)
100
100 + I
60
*
40
*
20
ns
ns
0
Ponteiro +
Folhas secas
Colmos
Parte aérea
Ponteiros Folhas
secas
Colmos
Parte
aérea
Figura 4.1. N acumulado na planta de cana-de-açúcar, derivado do sulfato de amônio
enriquecido com 15N, 1% de abundância. * e **: significativo a P<0,05 e P<0,01,
respectivamente.
96
Ao final do ciclo, no entanto, não foram observados os mesmos efeitos negativos da
inoculação com relação ao uso de N do fertilizante em Piracicaba. Em Santa Maria da Serra, os
efeitos positivos da inoculação foram observados novamente, porém apenas nos ponteiros, que
se refletiram na parte aérea total (Figura 4.2).
A recuperação de N em abril foi superior à recuperação observada no final do ciclo em
média, principalmente em Piracicaba. Sem inoculação, a recuperação de N-fertilizante em
Piracicaba em abril foi superior a 50%, e em torno de 40% após inoculação. Em Santa Maria
da Serra, as avaliações de abril indicaram uma recuperação de em aproximadamente 30% sem
inoculação e em torno de 40% com inoculação, similar ao valor observado na presença de
inoculação em Piracicaba. Esses valores não mudaram significativamente na avaliação
realizada ao final do ciclo.
4.4 DISCUSSÃO
Os efeitos da inoculação nos teores foliares e acúmulo de N na parte aérea das plantas
foram em geral erráticos, com apenas três condições de diferença significativa: em Jaú, na
variedade IAC 5000, em Sales de Oliveira I, na variedade RB 5536 e em Sales de Oliveira II,
na variedade SP 81 3250 (Tabela 4.2). Em Jaú e Sales de Oliveira I, houve diminuição no teor
de N foliar com a inoculação. Tal diminuição pode ocorrer devido ao efeito de diluição
(JARRELL; BEVERLY, 1981), que ocorre normalmente em cana-de-açúcar (FARONI et al.,
2009). Porém, esse efeito ocorre quando a maior absorção de N acarreta em maior
desenvolvimento nas folhas, de maneira que isso seria detectado ao avaliar o acúmulo total de
N na planta. No entanto, entre os locais que também apresentaram aumento no teor de N foliar,
apenas em Sales de Oliveira I o acúmulo de N foi maior com a inoculação, ao passo que na
variedade IAC 5000 de Jaú não houve diferença significativa devido à inoculação. Em Sales de
Oliveira II, por outro lado, houve diferença apenas no acúmulo de N pelas plantas, com aumento
significativo devido à inoculação.
Para a maioria das culturas, o teor de nutrientes na folha é uma ferramenta eficaz para
diagnosticar o estado nutricional das plantas. No entanto, a diagnose foliar em cana
normalmente apresenta pouca sensibilidade às variações nutricionais na cultura e não é efetiva
(ORLANDO FILHO et al., 1999), sendo constantemente observadas diferenças na produção de
colmos e atributos tecnológicos em distintas situações de nutrição da cultura, sem haver
detecção das diferenças na análise foliar (FARONI et al., 2009; FRANCO et al., 2010).
97
Mesmo que tenha ocorrido em poucas situações, o aumento no acúmulo de N indica que
ocorreu ação de bactérias diazotróficas que foram adicionadas via inoculação nessas áreas e
variedades. Esse aumento pode ocorrer em função de incremento na fixação biológica de N, ou
por
efeitos
benéficos
causados
pelas
bactérias
diazotróficas
(DOBBELAERE;
VANDERLEYDEN; OKON, 2003; OLIVEIRA et al., 2006; GOSAL et al., 2012; PEREIRA
et al., 2013). Nas outras condições, onde nenhum efeito foi observado, as plantas podem não
ter se beneficiado da ação dessas bactérias quando bem nutridas com N via fertilizante, ou a
inoculação não foi eficiente em aumentar a população desses microrganismos nas plantas.
Os resultados de produtividade de colmos mostraram maior ocorrência de resultados
positivos em função da inoculação com bactérias diazotróficas do que os resultados observados
no teor foliar e acúmulo de N. No entanto, apenas na variedade SP 81 3250 em Sales de Oliveira
II, o aumento no acúmulo de N se refletiu em aumento na produtividade de colmos com a
inoculação. Portanto, a maior parte dos aumentos em produtividade observados dificilmente
estiveram relacionados com FBN nas plantas. Tal fato foi confirmado pelos resultados de
abundância natural de 15N, onde não foram detectadas diferenças significativas na quantidade
de N proveniente do ar entre plantas inoculadas e não inoculadas. Respostas positivas à
inoculação em algumas variedades e locais têm sido também observadas em outros estudos
realizados a campo com cana-de-açúcar (PEREIRA et al., 2013; SCHULTZ et al., 2012, 2014).
Os efeitos benéficos promotores de crescimento têm sido apontados como os principais fatores
que resultam em respostas positivas da inoculação e que também explicam o fato de essas
respostas serem normalmente erráticas.
Destaca-se que algumas variedades (SP 81 3250, IAC 95 5000 e CTC 14) responderam
positivamente à inoculação após a adubação nitrogenada, ao passo que outras variedades não
apresentaram tal tendência. Estudos recentes demonstram evidências de que a resposta à
inoculação com bactérias diazotróficas é dependente da variedade de cana-de-açúcar. Pereira
et al. (2013) testaram seis variedades e inoculação com bactérias isoladamente ou em coquetel,
como utilizado no presente estudo, e verificaram também que os ganhos de produção devido à
inoculação são diferentes entre variedades e estirpes de bactérias, sendo que a variedade RB
7515 foi a mais responsiva ao coquetel de estirpes de bactérias. A mesma variedade apresentou
aumento em matéria seca e acúmulo de N em ciclo de cana-soca em trabalho de Schultz et al.
(2012), ao passo que outra variedade (RB 72754) não respondeu à inoculação em nenhuma das
variáveis analisadas. No presente estudo, no entanto, não foram observadas respostas positivas
98
na variedade RB 7515 que foi cultivada em Santa Maria da Serra e Sales de Oliveira II. Com
base nos resultados obtidos em outros estudos, permite concluir que existe interação entre
variedade e resposta da cultura à inoculação, porém os resultados observados no presente
trabalho demonstram que o uso de variedades mais propensas a apresentar respostas positivas
não garante tal efeito em qualquer condição ambiental e agronômica.
O primeiro estudo que estimou a contribuição da FBN pelo método da abundância
natural de
15
N em cana-de-açúcar foi desenvolvido por Yoneyama et al. (1997) em diversas
áreas de cana-de-açúcar no Brasil, Filipinas e Japão. As estimativas desse estudo geraram
valores em torno de 30% de N proveniente do ar nas plantas. Outras estimativas realizadas no
Brasil por meio dessa técnica geraram valores entre 25 e 60% (BODDEY et al., 2001;
URQUIAGA et al., 2012). Estudos com capim-elefante usando plantas invasoras como
referência indicaram valores da ordem de 21 a 52% em cinco genótipos cultivados em solos de
baixa fertilidade (MORAIS et al., 2009). Essa grande variação nos valores de estimativa de
FBN por essa técnica gera dúvidas sobre a real contribuição da FBN para a nutrição nitrogenada
da cana-de-açúcar. Normalmente, as plantas invasoras são de menor porte que a cana-de-açúcar
e não conseguem explorar o mesmo volume de solo, de maneira que as invasoras
potencialmente absorvem menores proporções de N em comparação com a cana-de-açúcar
(BODDEY et al., 2001). Sendo assim, o uso das invasoras como referência pode subestimar a
FBN. Com a finalidade de melhorar as estimativas da FBN em cana-de-açúcar, recentemente
Baptista et al., (2014) propuseram que as medidas de contribuição do N do solo sejam feitas até
80 cm de profundidade em plantas comprovadamente não-fixadoras.
As técnicas para medida da contribuição de FBN em cana precisam ser melhor
estudadas, no entanto algumas estimativas podem ser realizadas. Com ressalvas à grande
variação na FBN aparente em cana-de-açúcar no Brasil, Japão, Filipinas, Austrália e África do
Sul, Herridge, Peoples e Boddey (2008) relatam que o valor mais realista para as condições
brasileiras de contribuição média da FBN é em torno de 40 kg de N ha-1ano-1, assumindo Npda
de 20% e extração de 200 kg ha-1 de N em média. Esse valor médio também foi observado em
estudo conduzido por 15 anos com cana-de-açúcar, após avaliações de abundância natural de
15
N e balanço de N total no solo (URQUIAGA et al., 2012).
Estudos recentes têm comparado plantas inoculadas e não-inoculadas em termos de
abundância de 15N, considerando as plantas não inoculadas como referência, para atestar se a
inoculação com bactérias diazotróficas promove aumentos na FBN pelas plantas. No entanto,
99
esses estudos mostraram ausência de contribuição da inoculação na FBN das plantas inoculadas
(SCHULTZ et al., 2012, 2014), assim como foi observado no presente trabalho. Por outro lado,
alguns efeitos positivos têm sido observados, como aumento na massa seca e acúmulo de N em
algumas variedades, que vêm sendo atribuído aos efeitos benéficos promotores de crescimento
(PEREIRA et al., 2013; SCHULTZ et al., 2012, 2014).
Diversos estudos conduzidos com cana-de-açúcar resultaram no isolamento de
diferentes estirpes de bactérias diazotróficas que fazem associação com a cultura e que, além
do potencial fornecimento de N2 atmosférico, também apresentam outros efeitos positivos. Os
principais efeitos observados têm sido a produção de hormônios de crescimento, como ácido
indol acético (SUMAN et al., 2005), solubilização de fosfatos (SINGH et al., 2007) e compostos
de zinco (SARAVANAN; MADHAIYAN; THANGARAJU, 2007), estímulo ao crescimento
radicular, aumentos no teor de C orgânico do solo e da extração de nutrientes na rizosfera
(SUMAN et al., 2005; YADAV et al., 2009; TAULE et al., 2012; BENEDUZI et al., 2013) e
mineralização do N orgânico do solo (DAS; SAHA, 2003; KENNEDY; CHOUDHURY;
KECSKÉS, 2004; TAULE et al., 2012;). Em geral, os efeitos promotores de crescimento agem
principalmente no sistema radicular da cultura (SEVILLA et al., 2001; SARAVANAN;
MADHAIYAN; THANGARAJU, 2007; VIDEIRA et al., 2011) e a produção de fitormônios
resulta em maior proliferação de raízes ativas e produção de exsudatos, com aumento na
absorção de nutrientes (DOBBELAERE; VANDERLEYDEN; OKON, 2003; KENNEDY;
CHOUDHURY; KECSKÉS, 2004; SEVILLA et al., 2001).
Tais efeitos promotores de crescimento não foram analisados no presente estudo, de
maneira que impossibilita determinar quais foram os efeitos que resultaram em melhoria do uso
do N-fertilizante aplicado em solo arenoso. Tais resultados sugerem que nas quantidades e
modos de aplicação de N-fertilizante aplicados em cana-de-açúcar nas condições brasileiras,
não há grandes limitações para a população de bactérias diazotróficas adicionadas via
inoculação, apesar do risco de diminuição de população desses organismos com o uso de
fertilizantes sintéticos nitrogenados (REIS JUNIOR et al., 2000; BODDEY et al., 2003;
KENNEDY; CHOUDHURY; KECSKÉS, 2004). No entanto, a diminuição de recuperação de
15
N-fertilizante com a inoculação em Piracicaba na fase de máximo crescimento precisam ser
também ser considerados, apesar de esses efeitos não terem ocorrido na produção de colmos.
A recuperação de
15
N-fertilizante pela cana-de-açúcar é normalmente baixa, variando
de 7 a 40% em cana-soca (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). No entanto, nas fases
100
de máximo crescimento, a recuperação do 15N-fertilizante pode ser superior (FRANCO et al.,
2011), antes das perdas ocorridas com a senescência da planta. Possíveis aumentos na
recuperação do
15
N-fertilizante no entanto não implicam necessariamente em aumentos na
produtividade de colmos, uma vez que a maior parte do N fornecido para as plantas é
proveniente do estoque de N orgânico do solo para a maioria das culturas (DOURADO-NETO
et al., 2010), principalmente em culturas semi-perenes e perenes.
O restante do N adicionado via fertilizante que não é aproveitado pelas plantas enriquece
o estoque de N do solo ou é perdido, principalmente por lixiviação, desnitrificação e
volatilização (REIS JUNIOR et al., 2000; CANTARELLA, 2007; VITTI et al., 2011). Em solo
arenoso, há maior suscetibilidade à perdas de N por lixiviação (OLIVEIRA et al., 2002).
Portanto, a maior recuperação de
15
N-fertilizante em solo arenoso poderia sugerir uma
diminuição nas quantidades de N necessárias com adição de inoculante em cana-soca, ao
assumir que o N que não foi absorvido pelas plantas seria perdido. Porém, em condições de
obtenção de altas produtividades, quantidades de N-fertilizante inferiores à remoção de N pelos
colmos pode resultar em depleção de N no solo em longo prazo. Além disso, as respostas
erráticas observadas à inoculação com bactérias diazotróficas geram questionamentos sobre a
ocorrência dos efeitos benéficos em diferentes climas e variedades. O aumento no estoque de
N orgânico do solo pode também favorecer o desenvolvimento de cultivos posteriores
(VALLIS; KEATING, 1994).
Em geral, esses resultados confirmam a possibilidade de ocorrência de resposta positiva
das plantas de cana-de-açúcar à inoculação com bactérias diazotróficas sob aplicação de Nfertilizante, devido aos efeitos benéficos promotores de crescimento, sem contribuição da FBN.
Tais efeitos podem melhorar o desenvolvimento da cultura e a eficiência do sistema. No
entanto, a ausência de resposta significativa na maior parte das condições avaliadas demonstra
a dificuldade em prever respostas positivas, mesmo em variedades e condições de solo e clima
mais propícias. Possíveis diminuições nas quantidades de N aplicadas na cultura são de grande
interesse econômico e ambiental. Porém, mesmo com o aumento observado no aproveitamento
de 15N-fertilizante em solo arenoso, não se recomenda modificar as recomendações de aplicação
de N na cultura nas atuais condições, uma vez que possíveis diminuições podem causar perdas
de produtividade e degradação do solo, principalmente em condições onde as bactérias
inoculadas não apresentam efeito. Estudos adicionais são ainda necessários para compreender
os efeitos promotores de crescimento proporcionados pelas bactérias diazotróficas e a resposta
101
das plantas de cana-de-açúcar em termos de eficiência de uso de nutrientes e produtividade das
plantas.
4.5 CONCLUSÕES
A inoculação com bactérias diazotróficas na presença de adubação nitrogenada em canasoca resulta em respostas positivas na absorção de N e produção de colmos em algumas
situações, porém de maneira errática. Com base nos dados de abundância natural de 15N, podese concluir que tais repostas, quando ocorrem, não são provenientes de fixação do N2
atmosférico.
A inoculação pode promover melhorias no aproveitamento de N-fertilizante aplicado na
cultura em solo arenoso, o que potencialmente diminui as perdas de N no sistema. No entanto,
isso não resulta necessariamente em ganhos de produtividade e não se recomendam alterações
nas doses de N atualmente utilizadas na cultura.
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107
5. AVALIAÇÃO DA EXTRAÇÃO DE NITROGÊNIO COM ANÁLISE DE EXTRATO
DE SEIVA E FOLIAR EM SOQUEIRAS DE CANA-DE-AÇÚCAR APÓS
ADUBAÇÃO NITROGENADA*
RESUMO
A adubação nitrogenada é importante para a cultura da cana-de-açúcar, do ponto de vista
agronômico e ambiental. Um melhor uso do nitrogênio (N) proveniente do fertilizante é
importante para o manejo da cultura, e para isso é necessário que se faça um monitoramento
adequado da nutrição nitrogenada. A análise de extrato de seiva é uma técnica que vem sendo
usada com esse propósito em outras culturas, e pode ser aplicada para a cana-de-açúcar. O
objetivo desse estudo foi avaliar o uso de N e a resposta da cana-de-açúcar à adubação
nitrogenada por meio de análise de extrato de seiva e tecido foliar. Duas áreas experimentais
foram conduzidas no ano agrícola de 2012-2013, em cana-soca, após a aplicação de 0, 50, 100
e 150 kg ha-1 de N. Cinco amostragens foram realizadas nas folhas mais novas da planta, nas
fases iniciais de desenvolvimento, quando foi avaliado o teor de N-nitrato, N-amônio e N total
no líquido presente na nervura central, e o N total no limbo foliar. O N mineral no extrato da
seiva aumentou como resultado da adubação nitrogenada na primeira coleta em solo de textura
média e até 120 dias após adubação em solo argiloso. Os teores de N total no extrato de seiva
seguiram comportamento semelhante. Os teores de N na folha diagnóstico aumentaram
linearmente nos dois locais com a adubação nitrogenada e apenas em Piracicaba houve aumento
na produtividade de colmos. A análise de N no extrato de seiva se mostrou eficiente no
monitoramento do status de N na cana em diferentes tipos de solo.
Palavras-chave: Saccharum spp.; amônio; nitrato; eficiência de uso de nitrogênio; estado
nutricional
EVALUATING
NITROGEN
UPTAKE
IN
SUGARCANE
RATOON
AFTER
FERTILIZATION BY USING LEAF AND SAP ANALYZES
ABSTRACT
The nitrogen fertilization is important for sugarcane crop, from agronomic and environmental
views. A better use of nitrogen from fertilizer is necessary for crop management, in order to
achieve it, an adequate nitrogen nutrition monitoring is necessary. Sap analysis is a technique
*: Artigo publicado. Referência: American Journal of Plant Sciences, v.5, 2014
108
that has been adopted with this objective in other crops, and can be used for sugarcane. The aim
of this study was to evaluate the nitrogen use and sugarcane response through sap and leaf tissue
analysis. Two experimental areas were carried out in 2012-2013, in ratoon-cane, after
application of 0, 50, 100 and 150 kg ha-1 of N. Five sampling were performed on the youngest
leaves, at initial development stages, when it was evaluated the content of N-nitrate, Nammonium and total N on the liquid present on leaf midribs, and total N on leaf tissue. The
mineral N on sap increased because of nitrogen fertilization at the first sampling in medium
texture soil and up to 120 days after fertilization in clayey soil. The total N content of sap
followed similar behavior. The leaf N content increased linearly in the two places because of
fertilization and only in Piracicaba there was increase on stalk yield. The sap analysis proved
to be efficient in monitoring nitrogen status in different soil types.
Key words: Saccharum spp.; ammonium; nitrate; nitrogen use efficiency; nutritional status.
5.1 INTRODUÇÃO
O nitrogênio (N), juntamente com o potássio (K), são os elementos minerais acumulados
em maiores quantidades na cultura de cana-de-açúcar. O N é um elemento essencial para a
produção vegetal e a absorção desse nutriente pela cana-de-açúcar varia de 100 a 300 kg ha-1
para a produção de 100 t ha-1 de colmos, de acordo com dados compilados de diversos autores
(CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007). O uso de fertilizantes nitrogenados é um
componente-chave no balanço energético-ambiental da cana-de-açúcar para produção de
biocombustíveis. A adubação nitrogenada em cana é responsável por 23% da energia fóssil
utilizada nas operações da cultura, e 19% da energia total gasta, considerando também todas as
etapas para a produção de bioetanol (GALDOS et al., 2010). Portanto, é preciso racionalizar o
uso de fertilizantes nitrogenados, com a finalidade de melhorar a sustentabilidade do cultivo de
cana-de-açúcar.
As quantidades de N utilizadas na cana-de-açúcar no Brasil são bem menores que em
outros países (CANTARELLA; TRIVELIN; VITTI, 2007), podendo promover aumento na
produtividade de cana-planta ou cana-soca. Na cana-soca, no entanto, as respostas ao N são
mais frequentes. Isso se reflete em maior vigor nas soqueiras, aumentando o potencial produtivo
da cultura. Franco et al. (2011) demonstraram que a contribuição do N proveniente do
fertilizante no momento da colheita de cana-de-açúcar foi em torno de 40% na cana-soca,
109
enquanto na cana-planta foi em torno de 5%, o que pode explicar a escassez de resposta da
cana-planta e fertilização nitrogenada em muitos estudos realizados na cultura nas últimas
décadas. No entanto, apesar da ocorrência de altas ou médias respostas na soqueira, as respostas
são irregulares e controversas.
Os baixos valores e irregularidade na eficiência de uso de N na cana-açúcar são
associadas ao efeito residual do fertilizante no solo e sua elevada imobilização
(COURTAILLAC et al., 1998), além de perdas no sistema solo-planta-atmosfera. No entanto,
o N imobilizado pode ficar no solo, na forma orgânica. Dourado-Neto et al. (2010) observaram
que a matéria orgânica foi a principal fonte de N para a produção agrícola, após estudas a
recuperação de 15N em ambientes tropicais de 9 países diferentes, sendo encontrado em média,
79% do N encontrado nas plantas proveniente da matéria orgânica do solo.
Para que se possa racionalizar o uso de fertilizantes na cultura, melhorando a sua
eficiência de uso pelas plantas, é importante conhecer os momentos e as formas mais absorvidas
pelas plantas. Conforme apontado por Franco et al. (2011), o momento de maior absorção de N
do fertilizante pela cultura ocorre em fases iniciais de desenvolvimento, nos primeiros 90 dias
após a adubação, antes da completa formação de biomassa. Com isso, a análise foliar, realizada
normalmente após o fechamento do dossel, pode não representar as respostas positivas da
adubação nitrogenada observadas na produtividade da cultura (FARONI et al., 2009; FRANCO
et al., 2010).
O adequado monitoramento nas fases iniciais podem permitir correções no manejo de
fertilizantes da cultura, assim como na tomada de decisões de parcelamento da adubação
nitrogenada, especialmente em solos com menor quantidade de argila. Devido à baixa
sensibilidade da análise foliar em cana-de-açúcar, surge a necessidade da busca por alternativas
para o melhor monitoramento do estado nutricional da cultura. A extração do líquido presente
nos tecidos celulares da planta, genericamente denominado de extrato de seiva, quantificação
dos nutrientes presentes é uma técnica usada em hortaliças e árvores frutíferas, sendo de
especial interesse para o manejo da adubação (SOUZA et al., 2012).
Assim, o objetivo desse estudo foi avaliar o status de N na cana-soca sob diferentes
doses de N fertilizante em diferentes locais e épocas de coleta, visando identificar fases de
maior acúmulo de N, formas predominantes e a viabilidade da análise de extrato de seiva na
cultura.
110
5.2 MATERIAL E MÉTODOS
O estudo foi desenvolvido em duas áreas experimentais localizadas no estado de São
Paulo, nos municípios de Jaú e Piracicaba. A área experimental de Jaú está localizada na região
centro-oeste do estado (22º15’10,25”S; 48º3’6,26”W; 522 m altitude), em Latossolo vermelho
distrófico, textura média. A área experimental de Piracicaba está localizada na região centrosul (22º41’10,15”S; 47º38’54,7”W; 547 m altitude) em um Latossolo vermelho distrófico,
textura argilosa. Em ambas áreas, experimentos foram instalados em 2010, quando a cana-deaçúcar foi plantada. Após a colheita da cana-planta, em agosto-setembro de 2011, e a colheita
da 1ª soqueira, em 2012, a 2ª soqueira foi avaliada no presente estudo. A variedade de cana
utilizada foi a SP 81-3250, nas duas áreas experimentais. O espaçamento de plantas foi de 1,5
m entre linhas. Amostras de solo foram coletadas em 2010, antes do plantio da cana, e
informações sobre condições do solo no início do experimento estão descritos na Tabela 5.1.
As condições climáticas estão descritas na Figura 5.1.
Tabela 5.1. Características químicas do solo nas áreas experimentais de cana-de-açúcar1
Prof.
MO
cm
g dm-3
pH
K
Ca
Mg
Al
H+Al
CEC
------------------------- mmolc dm-3 ------------------------
P
S
- mg dm-3 -
Argila
Silte
Areia
------------ % -----------
Jaú, SP
0-20
23
4,8
1,6
15,8
6,3
2,0
25,0
49,0
17,8
10,0
17,8
5,7
76,6
20-40
14
4,3
0,9
7,5
1,8
6,3
24,5
34,7
9,3
24,3
23,6
6,2
70,2
Piracicaba, SP
0-20
28
5,0
3,8
44,3
20,5
1,3
29,8
98,5
11,3
15,8
51,9
16,7
31,4
20-40
19
4,7
2,4
24,3
9,8
5,8
41,3
77,9
3,3
27,8
61,8
10,6
27,6
1:
Análises de solo foram realizadas de acordo com métodos descritos em Raij et al. (1997)
O delineamento experimental foi em blocos ao acaso, com quatro repetições. Quatro
tratamentos foram aplicados: 0, 50, 100 e 150 kg ha-1 de N, na forma de nitrato de amônio. As
doses de N foram definidas com base na recomendação para o estado de São Paulo de 100 kg
ha-1 de N para a cana-soca. Foi também realizada a adubação com P (50 kg ha-1 P2O5) e K (150
kg ha-1 K2O). A adubação foi realizada após a primeira chuva depois da colheita, quando as
plantas começaram a rebrotar.
Após a adubação com N, amostras para análise de tecido foliar e extrato de seiva foram
retiradas. Para evitar a destruição de plantas muito pequenas, e também para que as plantas
pudessem absorver o N adicionado pelo fertilizante, um período de 15 dias para Piracicaba e
30 dias em Jaú foi determinado para a primeira coleta. Em Piracicaba, as coletas subsequentes
111
ocorreram aos 40, 70, 120 e 150 dias após a adubação. Em Jaú, elas ocorreram aos 60, 90, 120
e 150 dias. Essas diferenças entre períodos de coleta ocorreram devido ao desenvolvimento
inicial mais demorado em Jaú, que não permitia a coleta aos 15 dias após a adubação. Após 150
dias, a menor ocorrência de chuvas e a maturidade das plantas não possibilita a extração de
grandes quantidades de extrato de seiva, mesmo em folhas mais novas. Assim, seria necessária
a coleta de um número muito excessivo de folhas, prejudicando o desenvolvimento das plantas
e a produtividade. De qualquer maneira, aos 150 dias o dossel da cana-de-açúcar encontra-se
fechado, sendo de menor importância o monitoramento nutricional nessa fase.
No momento da coleta, parte vegetal escolhida para análise de extrato de seiva foi a
folha mais nova desenvolvida, que corresponde à estrutura com maior fluxo de nutrientes,
especialmente nas fases iniciais de desenvolvimento. Além disso, folhas maduras não possuem
conteúdo muito grande de seiva, o que dificulta a extração para análises laboratoriais. A nervura
central das folhas mais novas foi retirada para análise de extrato de seiva, ao passo que o terço
médio do limbo foliar foi também separado para análise de N total no tecido foliar.
Para obter o extrato de seiva, foram coletadas 30 folhas novas por parcela, considerandose as linhas úteis da parcela, no período da manhã. As folhas foram acondicionadas em caixas
térmicas e encaminhadas ao laboratório. No laboratório, as nervuras centrais foram separadas
do limbo foliar. O tecido foliar foi limpo com água e levado para secagem a 65oC. As nervuras
foram limpas com gaze umedecida em água destilada, secas sobre papel toalha, cortadas em
frações de 1 a 2 cm e acondicionados em frascos plásticos com éter etílico padrão analítico. A
quantidade de éter utilizada foi a suficiente para cobrir o material, garantindo assim a completa
extração da seiva. Como a extração foi feita em material fresco, no máximo um dia após a
coleta, os ramos já foram colocados em éter e imediatamente congelados pelo período
aproximado de 15 dias, em freezer convencional, com temperatura próxima de -15oC. Após o
descongelamento, as amostras foram transferidas para funis de separação, com a finalidade de
separar os pigmentos vegetais dissolvidos em éter no extrato de seiva, os quais não são
miscíveis. O nitrogênio, nas formas de N-NH4+ e N-NO3-, foi determinado por destilação a
vapor (RAIJ et al., 2001), enquanto o N total foi determinado por digestão sulfúrica e destilação
a vapor (BATAGLIA et al., 1983). A solução extraída com éter etílico não foi apenas seiva,
uma vez que, devido ao congelamento das nervuras, ocorre o rompimento das células,
extravasando o suco celular. A solução extraída, portanto, é a seiva mais o conteúdo celular,
denominado extrato de seiva por convenção (SOUZA et al., 2012).
112
Próximo aos dias em que foram coletadas amostras para análise de seiva, amostras de
solo foram coletadas na camada de 0-10 cm, próximas às linhas de cana-de-açúcar, em 20-30
pontos por parcela. As amostras foram acondicionadas em gelo e levadas a laboratório para
extração com KCl 0,01 mol l-1, e posterior destilação a vapor para análise de N-NH4 e N-NO3,
conforme métodos descritos em Raij et al. (2001). As amostras de solo foram também pesadas
úmidas e após secagem em estufa a 105oC, para determinação do conteúdo de água.
35,0
300
30
30,0
250
25
25,0
200
20
20,0
150
15
15,0
100
10
10,0
50
5
5,0
0
0
0,0
Ago
Set
Out
Nov
Dez
Jan
Fev
Mar
Abr
Mai
Jun
Jul
Ago
35
Aug
Sep
Oct
Nov
Dec
Jan
Feb
Mar
Apr
May
Jun
Jul
Aug
Precipitação (mm)
350
Precipitação
Temperatura máxima média
Temperatura mínima média
Meses (2012-2013)
Meses (2012-2013)
Temperatura (ºC)
Piracicaba-SP
Jaú-SP
Figura 5.1. Precipitação mensal, temperaturas medias máximas e mínimas em Jaú e Piracicaba,
estado de São Paulo.
No mês de fevereiro de 2013, durante a fase de máximo crescimento da cultura, a folha
+1, que consiste na primeira folha com lígula visível a partir do topo, foi coletada em 30 plantas
de cada parcela nas duas áreas experimentais. As nervuras centrais foram removidas, sendo
mantido apenas o terço médio da lâmina foliar. Assim como o limbo foliar das folhas jovens
usadas para análise de extrato de seiva, as amostras foram secas em estufa, moídas e
posteriormente encaminhadas para digestão sulfúrica e destilação a vapor para determinação de
N total, conforme métodos descritos em Bataglia et al. (1983). Ao final do ciclo, as plantas
foram colhidas para determinação da produtividade de colmos. A área total das parcelas foi
colhida manualmente, e os colmos foram pesados, estimando-se a produtividade em toneladas
por ha.
113
Os resultados obtidos foram submetidos à análise de variância no modelo de parcelas
subdivididas (ANOVA – teste de F a 5% e 1% de probabilidade), e a testes de regressão (linear
e polinomial).
5.3 RESULTADOS E DISCUSSÃO
A umidade do solo foi distinta entre os locais, de maneira que o solo mais argiloso, em
Piracicaba, apresentou os maiores valores de umidade do solo em média (Figura 5.2). Mesmo
sob condições similares de chuva (Figura 5.1), as diferenças nas condições de umidade do solo
foram afetadas principalmente pelo teor de argila do solo, de maneira que o solo argiloso, em
Piracicaba foi o que apresentou maior teor de água em comparação com o solo de textura média,
em Jau. Em ambos os locais, a umidade do solo foi diretamente relacionada com a chuva
ocorrida nos períodos de coleta.
Em Piracicaba, os teores de nitrato e amônio foram significativamente maiores que em
Jau durante as fases iniciais. Porém, mesmo com aumento da umidade do solo nas amostragens
de 120 e 150 dias após adubação, os teores de N mineral do solo observados foram baixos e
similares a Jau. Em Jaú, os valores de N mineral do solo permanecerem em níveis
significativamente menores que em Piracicaba, mesmo pouco tempo após a aplicação do adubo
nitrogenado. A movimentação de N mineral proveniente da aplicação de fertilizantes no solo
depende de diversos fatores, como a concentração dos nutrientes em solução, da capacidade de
adsorção do elemento pelo solo, do pH (QAFOKU; SUMNER; RADCLIFFE, 2000), da
solubilidade do fertilizante (SCHUMMAN, 2001), do conteúdo de água do solo,
macroporosidade e extração pela cultura (GHIBERTO et al., 2011). No presente estudo, podese assumir que as maiores concentrações de N mineral na camada de 0-10 cm ocorreram nos
primeiros 30 dias após a adubação em Jau. Porém, devido à textura arenosa e baixa retenção de
água nessa camada, ocorrem condições mais favoráveis à nitrificação, de maneira que o Nnitrato é facilmente movimentado para camadas mais profundas do solo. Por outro lado, em
Piracicaba, os níveis de nitrato e amônio permaneceram em altos níveis, mesmo após 70 dias
da adubação. Mesmo com altos teores de água no solo, os níveis de nitrato observados foram
maiores em 40 e principalmente 70 dias após adubação.
114
Jaú-SP
Piracicaba-SP
Umidade (%)
Umidade do Solo
95
85
75
65
55
45
35
25
95
85
75
65
55
45
35
25
30
60
90
120
150
15
40
70
120
150
70
120
150
70
120
150
N mineral do solo (mg kg-1)
N mineral do solo (profundidade 0-10cm)
70
60
50
40
30
20
10
0
Amônio
Nitrato
30
60
90
120
150
70
60
50
40
30
20
10
0
15
40
N mineral na seiva (mg l-1)
N mineral na seiva de cana-de-açúcar
40
Amônio
Nitrato
30
40
30
20
20
10
10
0
0
30
60
90
120
Dias após adubação
150
15
40
Dias após adubação
Figura 5.2. Umidade média do solo e N mineral no solo na camada de 0-10 cm e N mineral no
extrato de seiva de cana-de-açúcar, em função de diferentes épocas relativas ao momento da
adubação, na média de doses de N aplicadas em cana-soca.
No extrato de seiva de cana-de-açúcar, pode ser observado que na primeira amostragem
em Jau, foi observada uma alta concentração de nitrato no extrato de seiva (Figura 5.2). Isso
mostra que nos primeiros 30 dias, houve grande absorção de N. Quando ocorre absorção
115
excessiva de N pela planta, há um acúmulo de nitrato, que não é reduzido na planta, e assim o
N não se associa à molécula de clorofila (DWYER, 1995). Portanto, o N absorvido
excessivamente na forma de nitrato não beneficia de maneira significativa o desenvolvimento
da cultura. Aos 60 dias após a adubação, os níveis de nitrato e amônio em Jau foram muito
similares, diminuindo a concentração na seiva ao longo do tempo, correspondendo aos baixos
teores de N mineral observados no solo nos períodos analisados. Em Piracicaba, as
concentrações de N mineral na seiva permaneceram elevados até 150 dias após a adubação.
Nesse local, as concentrações de amônio foram maiores que nitrato aos 15, 70 e 120 dias após
adubação. A alta disponibilidade de N proveniente da aplicação de nitrato de amônio ocasionou
maior concentração de nitrato no solo, porém há resultados em estudos da Austrália que
mostram que a cana-de-açúcar tem preferência pela absorção de amônio ao invés de nitrato.
Isso ocorre em solos bem supridos com N durante os primeiros três meses da estação de
crescimento (ROBINSON et al., 2011).
A maior absorção de N, independente da aplicação de fertilizante, ocorreu no início do
ciclo da cana-soca (Tabela 5.2). Em Jau, ocorreu aumento nos teores de nitrato e amônio na
seiva das plantas na primeira amostragem, com destaque para os altos teores de NO3- (Figura
5.2), e em menores concentrações totais, também foi observado aumento no teor de NO3- na
seiva, na 2ª amostragem, 60 dias após adubação. Em Piracicaba, foram observados aumentos
na concentração de NH4+ até 120 dias após adubação, e na concentração de NO3- aos 40, 70 e
120 dias após a adubação. Portanto, em solos mais argilosos, o uso de N proveniente do
fertilizante é maior, devido à permanência de N mineral no solo por mais tempo. As baixas
concentrações de NO3- na seiva da cana em Piracicaba na primeira coleta pode ser explicada
pelo curto período (15 dias) após a adubação. Mesmo com teores similares no solo (Figura 5.2),
a preferência por amônio nas primeiras fases de desenvolvimento, principalmente nos primeiros
30 dias (ROBINSON et al., 2011) pode explicar o comportamento observado nesse estudo.
Os teores de N total na seiva de cana-de-açúcar foram muito maiores que os teores de
N mineral (Tabela 5.3), em ambos locais. Em geral, houveram grandes teores de N total mesmo
na ausência de aplicação de fertilizantes, o que mostra absorção de N predominante na forma
orgânica do solo, porém aumentos no teor de N na seiva observados em Piracicaba mostram
que houve também alta assimilação de N proveniente do fertilizante. Por outro lado, em Jaú foi
observado aumento no teor de N total na seiva apenas aos 30 dias após adubação, sem efeito
nas coletas posteriores, e diminuição nos teores com o avanço de desenvolvimento da cultura.
116
No solo argiloso de Piracicaba, o aumento no teor de N total na seiva foi observado até 90 dias
após a adubação. Na última coleta, 150 dias após a adubação, os teores de N total na seiva foram
muito similares entre doses e locais.
Tabela 5.2. Nitrogênio mineral na seiva de cana-de-açúcar, em função de doses de N em
diferentes épocas de amostragem.
Dose N
kg ha
-1
1a amostragem1
2a amostragem1
3a amostragem1
4a amostragem1
5a amostragem1
NH4+
NH4+
NH4+
NH4+
NH4+
NO3-
NO3-
NO3-
NO3-
NO3-
----------------------------------------------------mg l-1---------------------------------------------------
0
13,5
5,2
10,1
10,2
Jaú-SP
9,3
7,9
6,9
7,1
5,2
4,5
50
14,2
15,7
23,9
49,5
16,2
11,4
8,2
12,3
9,2
10,1
9,5
7,9
7,2
8,3
7,5
8,2
4,2
4,5
5,3
6
18,6
54,7
11,1
18,7
12,7
8,7
8,2
8,1
4,6
5,1
Efeito
R²
L*
0,92
L**
0,95
ns
-
L*
0,7
ns
-
ns
-
ns
-
ns
-
ns
-
ns
-
0
50
22,9
3,7
15,5
6,4
Piracicaba-SP
16,4
2,8
14,7
6,8
6,9
7,6
26,7
32,5
2,7
3,4
28,6
30,6
22,2
36
23
33,3
23
33,3
15,4
17,8
7,1
10,6
8,5
9,6
6,1
7,3
35,7
3
26,9
31,8
31,9
31,9
25,8
15,8
10,2
7,6
L**
0,99
ns
-
Q**
0,98
Q**
0,97
L**
0,85
L**
0,99
L*
0,82
L**
0,89
ns
-
ns
-
100
150
100
150
Efeito
R²
1:
Amostragem da folha mais jovem para análise de seiva aos 30, 60, 90, 120 e 150 dias após adubação (Jaú-SP); 15, 40, 70,
120 e 150 dias após adubação (Piracicaba-SP). * e **: P<0,05 e <0,01, respectivamente.
Para avaliar a assimilação de N no tecido foliar, nas mesmas folhas onde a seiva foi
extraída da nervura central, o teor de N total foi analisado no limbo foliar (Tabela 5.3). Em Jau,
não foi observado qualquer resposta de N no tecido foliar à aplicação dos tratamentos de
adubação nitrogenada. Por outro lado, em Piracicaba, foram observadas respostas positivas à
adubação nitrogenada nas coletas onde também houve resposta positiva no N total da seiva.
Houve diminuição no teor de N no tecido com o tempo, em Piracicaba, fato que não ocorreu
em Jaú. As magnitudes de diferença, aos 15, 40 e 70 dias após adubação em Piracicaba foram
menores que observado para o N na seiva. Portanto, o N no extrato de seiva é uma metodologia
mais sensível a alterações de manejo da fertilidade que a simples extração de N no tecido foliar
de folhas mais jovens. Os valores consistentes de N total na seiva indicam que futuros níveis
117
críticos podem vir a ser estabelecidos, com o objetivo de avaliar o status de N nas plantas de
cana-de-açúcar.
Tabela 5.3. Nitrogênio total na seiva e tecido foliar a partir das mesmas plantas em cinco
diferentes épocas de amostragem
1a amostragem1
Seiva
Limbo
-1
mg L
g kg-1
2a amostragem1
Seiva
Limbo
-1
mg L
g kg-1
0
50
100
150
Efeito
R²
307,5
359,6
349,2
354,4
12,5
13
21,6
15
187,6
207,8
197,7
197,7
11
11,3
12,7
11,9
L*
0,50
ns
-
ns
-
ns
-
0
50
100
150
Efeito
R²
271
303,9
299,7
317,9
17,3
19,6
19,7
18,2
307,5
359,6
367,4
354,4
13,6
16,7
17,3
16,5
ns
ns
Piracicaba-SP
190,8
11,5
243,4
13,2
289,3
14,1
315,3
12,9
L*
0,80
Q*
0,98
Q*
0,98
Q**
0,99
L**
0,98
Dose N
kg ha-1
3a amostragem1
Seiva
Limbo
-1
mg L
g kg-1
Jaú-SP
126,7
9,9
146,9
9,9
147
8,1
139,4
9,5
Q**
0,98
4a amostragem1
Seiva
Limbo
-1
mg L
g kg-1
5a amostragem1
Seiva
Limbo
-1
mg L
g kg-1
182,5
167,3
179,9
167,3
10,4
9,9
7,6
10,1
91,2
93,8
108,9
108,9
11,2
9,9
9,3
10,8
ns
-
ns
-
ns
-
ns
-
114,6
106,5
111,5
93,8
9,5
9,8
10,9
9,3
114,8
106,5
111,5
100,6
10,4
10,2
10,6
10,5
ns
-
ns
-
ns
-
ns
-
1:
Amostragem da folha mais jovem para análise de seiva aos 30, 60, 90, 120 e 150 dias após adubação (Jaú-SP); 15, 40, 70,
120 e 150 dias após adubação (Piracicaba-SP). * e **: P<0,05 e <0,01, respectivamente.
Não foram encontrados estudos científicos na literatura a respeito de teores de nutrientes
no extrato de seiva das folhas de cana, usando as técnicas descritas nesse estudo. Alguns estudos
avaliaram a concentração de extrato de seiva nos colmos de cana (TEJERA et al., 2004, 2006).
Nesses estudos, foi observado que as principais formas de N encontrado no extrato de seiva dos
colmos são aminoácidos e proteínas (TEJERA et al., 2004), de maneira que a porcentagem de
N na forma de aminoácidos encontrada variou entre 50 e 70% para o extrato de seiva do
apoplasto e simplasto, enquanto a porcentagem de nitrato foi em torno de 10%,
independentemente da variedade de cana utilizada (TEJERA et al., 2006). Os resultados da
análise de extrato de seiva da folha do nosso estudo confirmam também essa proporção de N
mineral em relação ao N total nas fases iniciais de desenvolvimento da cultura.
118
A avaliação da folha +1, na fase de maior desenvolvimento da planta, aproximadamente
180 dias após a adubação, mostrou aumentos nos teores de N em ambos locais, de maneira que
apenas na ausência de aplicação de N, os níveis foram um pouco inferiores ao mínimo
recomendado de 18 g kg-1 (RAIJ et al., 1996). O aumento nos teores foliares em Jau não se
refletiram em aumentos na produtividade, ao contrário de Piracicaba, onde foi observado
aumento linear na produtividade. Portanto, a baixa resposta observada nos teores de N mineral
(Tabela 5.2) e N total (Tabela 5.3) no extrato de seiva em Jau foram mais coerentes com a
ausência de resposta na produtividade que a análise da folha diagnóstico. Por outro lado,
conforme se poderia prever com os resultados de análise de extrato de seiva em Piracicaba, se
refletiu em aumentos significativos na produtividade.
O uso de fertilizantes nitrogenados é um fator de grande importância no balanço
energético e ambiental da cana-de-açúcar, sendo que a adubação nitrogenada é responsável por
25% da energia fóssil utilizada nas operações da cultura (BODDEY et al., 2008). Portanto, é
necessário racionalizar o uso de fertilizantes nitrogenados, visando benefícios para a
sustentabilidade em longo prazo e para o balanço energético da cultura. Na cana-soca, as
respostas à adubação nitrogenada são mais observadas que em cana-planta no Brasil,
aumentando o vigor das soqueiras e o potencial produtivo da cultura (CANTARELLA;
TRIVELIN; VITTI, 2007; ORLANDO FILHO et al., 1999). Porém, estudos realizados com
15
N relatam que o aproveitamento do fertilizante pela cana-de-açúcar é normalmente abaixo de
40% em cana-soca (FRANCO et al., 2011; GAVA et al., 2003; TRIVELIN et al., 2002).
A imobilização de N no solo é um dos fatores que ajudam a explicar o baixo
aproveitamento de N-fertilizante pela cana-de-açúcar (COURTAILLAC et al., 1998). A matéria
orgânica é normalmente a principal fonte de N para a produção agrícola (DOURADO-NETO
et al., 2010), de maneira que a partir dos 90 dias após a aplicação do fertilizante nitrogenado,
foi provavelmente a principal fonte para extração de N para a cultura. Isso faz com que a maior
extração de N ocorra próximo à aplicação de fertilizantes em cana. Franco et al. (2011), após a
avaliação da eficiência de uso do
15
N em cana-soca, observaram que aos 30-60 dias após a
adubação da soqueira, a cana-de-açúcar havia absorvido praticamente todo o N que é
acumulado durante todo o ciclo da cultura. Além disso, durante os estágios iniciais da soqueira,
o N do fertilizante foi a principal fonte de N para as plantas. Portanto, em solos mais arenosos,
como em Jaú, o parcelamento da adubação pode ser necessário para que a planta consiga
119
aproveitar melhor o N do fertilizante, antes que ocorra lixiviação, prejudicando a nutrição da
cultura.
Embora recomendações específicas de adubação nitrogenada não sejam fornecidas em
função das análises foliares, deficiências ou desequilíbrios indicam onde adições ou mudanças
no programa de adubação são necessárias. Para muitas culturas, a análise foliar é uma
ferramenta eficiente no diagnóstico do estado nutricional das plantas (MALAVOLTA, 2006).
No entanto, a análise foliar em cana normalmente apresenta pouca sensibilidade às variações
nutricionais na cultura, sendo constantemente observadas diferenças na produção de colmos
sem detecção de diferenças na análise foliar (FARONI et al., 2009; FRANCO et al., 2010). Tal
controvérsia é normalmente explicada pelo efeito de diluição (JARRELL; BEVERLY, 1981) e
pela dificuldade na determinação da folha diagnóstico e da melhor época para coleta. No
presente estudo, foi possível detectar variações no teor de N na folha em função dos tratamentos
aplicados, porém nota-se que a magnitude de diferença foi menor que observado nos teores de
N total da seiva, assim como o aumento observado no N da folha em Jau não se refletiu em
aumento na produtividade em função das doses de N aplicadas.
Tabela 5.4. Conteúdo de nitrogênio na folha +1 e produção de colmos em plantas de cana-deaçúcar em função de doses de N em dois locais diferentes.
Folha +1
Dose N
kg ha-1
Jaú
Piracicaba
Produção de colmos
Jaú
-----g kg-1-----
Piracicaba
-----t ha-1-----
0
17,77
16,74
84,88
90,38
50
18,80
17,46
88,76
97,25
100
20,29
18,90
94,62
97,12
150
20,24
20,37
89,80
106,00
Efeito
Q**
L**
ns
L*
R²
0,96
0,98
-
0,89
* e **: P<0,05 e P<0,01, respectivamente
As diferenças observadas entre tratamentos nos resultados de nutrientes na seiva de
cana-de-açúcar mostram que a análise de extrato de seiva é uma ferramenta eficiente para
detectar diferenças nos tratamentos de adubação nitrogenada, e também analisar diferentes
formas de N na folha mais jovem em expansão. Além disso, permite que avaliações da dinâmica
do uso de nitrogênio em cana-de-açúcar possa ser melhor avaliada em estudos futuros. Com o
advento de novas técnicas que permitem a aplicação de nutrientes de maneira parcelada, como
120
a fertirrigação, a análise de extrato de seiva pode ser uma técnica promissora para auxiliar na
recomendação de fertilizantes ao longo do ciclo da cultura. Em comparação com outras técnicas
que permitem a avaliação da cultura pela coloração da folha, a análise de extrato de seiva
permite uma avaliação quantitativa, e também podem ser analisados outros nutrientes contidos
na seiva, podendo auxiliar na recomendação de adubação com fósforo (P), potássio (K), entre
outros nutrientes. Essa técnica vêm sendo muito utilizada na horticultura e em culturas perenes
de fruticultura (CADAHÍA; LUCENA, 2005; SOUZA et al., 2012). Na cultura da cana-deaçúcar, esse é o primeiro estudo que analisa essa técnica. Estudos futuros são ainda necessários
para avaliar a sensibilidade da técnica a diferenças de manejo com outros nutrientes, em
diferentes sistemas de manejo e variedades de cana-de-açúcar.
5.4 CONCLUSÕES
A absorção de N proveniente do fertilizante em cana-soca ocorre principalmente nos
períodos iniciais, e em solo de textura média, a absorção de N proveniente do fertilizante é
menor que em solo argiloso, quando aplicados em quantidades e épocas similares. Por
apresentar alta sensibilidade à aplicação de N fertilizante, a análise de extrato de seiva em canade-açúcar pode ser eficientemente utilizada para tomadas de decisão de parcelamento da
adubação e para melhor entendimento da dinâmica de absorção de N pela cultura.
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123
6. CONCLUSÃO GERAL
Altas doses de N (acima de 120 kg ha-1) em soqueiras de cana-de-açúcar podem
promover ganhos de produtividade em ambientes responsivos. Por outro lado, ausência de
aplicação de N nessas condições pode causar alto consumo do N do solo, principalmente em
função de altas remoções com a colheita. Essa situação de alta remoção de N pelas plantas, sem
a devida reposição via fertilizante, e considerando que a FBN potencialmente supre apenas
parte do N para as plantas, provoca maior demanda no uso de N-fertilizante ou empobrecimento
do solo em longo prazo. Mesmo considerando diferentes níveis de produtividade e adição de
N, os fertilizantes nitrogenados continuam sendo parte importante no balanço de energia e
emissão de GEE. A obtenção de altas produtividades com baixas doses (ou ausência) de N
favorece os índices de balanço energético e ambiental. Altas doses de N em todos os cenários
estudados resultaram em aumentos na emissão de GEE e reduções no balanço energético
líquido. Mesmo assim, esses foram bastante positivos em relação a outras matérias-primas
consultadas na literatura. Porém, outras dimensões de sustentabilidade, incluindo a econômica,
dão suporte ao uso de fertilizantes nitrogenados na cultura da cana-de-açúcar para produção de
bioenergia. Não há indícios de que a inoculação promove aumento na FBN em plantas de canade-açúcar. Por outro lado, alguns efeitos positivos podem ocorrer em função da inoculação,
como o aumento na eficiência de uso do N-fertilizante em condições de solo arenoso. Os
resultados desse estudo não dão suporte à possibilidade de diminuição nas quantidades de Nfertilizante aplicado na cana-de-açúcar com a inoculação de bactérias diazotróficas. A análise
de extrato de seiva se mostra uma técnica promissora para a avaliação em estágios iniciais da
cultura, fase em que o N adicionado pelo fertilizante apresenta maior importância no
desenvolvimento da cana-de-açúcar.
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nitrogênio na produção de cana-de-açúcar: aspectos