CASO CLÍNICO: Meningites Pedro Brandão Roberta T. Tallarico Coordenadora: Dra. Luciana Escola Superior de Ciências da Saúde(ESCS)/SES/DF Brasília, 20 de junho de 2007. www.paulomargotto.com.br Caso Clínico • H. R. D., 2 anos, negro, natural da cidade do Rio de Janeiro. • QP: febre e cefaléia há dois dias. • HDA: Há 2 dias início do quadro com febre não aferida e cefaléia pela manhã. À tarde, passou a apresentar vômitos tendo feito tratamento sintomático com metoclopramida. À noite, apresentou lesões cutâneas que pioraram na manhã do dia seguinte, evoluindo também com sonolência. Transferido para o Hospital sendo iniciado antibioticoterapia (ampicilina+cloranfenicol). Caso Clínico • Ao exame: – Temperatura retal - 39ºC – Hipocorado+/4+, hidratado, acianótico, anictérico. – Hipotenso (75x45mmHg), taquicárdico (140 bpm), taquipneico (32 irpm sem esforço). – Prostrado, sonolento,com rigidez de nuca, sem déficit focal de força, presença de sinal de Kernig. – Presença de lesões petequiais com áreas de confluência, principalmente em MMII, acometendo também tórax e MMSS. – Restante do exame sem alterações. Caso Clínico • Resultado do líquor – – – – 9.783 cel/mm3 PMN 100% Proteinorraquia >1g% Glicose - 0mg/dl Caso Clínico • Resultados dos exames laboratoriais – – – – – – Creatinina -1,1 mg/dL Uréia - 68 mg/dL Sódio sérico -139 mEq/L Potássio - 3,0 mEq/L Hematócrito - 33,4% Plaquetas - 101.000/mm3 Leucócitos - 5200 (21% seguementados e 47% batões) Caso Clínico • Evolução – Evoluiu com regressão das lesões petequiais (crostosas), porém houve persistência da febre e da rigidez de nuca. Apresentou artralgia em joelho direito no terceiro dia de internação. Foi utilizada aspirina como anti-inflamatório e antitérmico, obtendo-se regressão da febre e da artralgia. – Recebeu alta após duas semanas de internação sem seqüelas neurológicas. Diagnósticos Diferencias • Desidratação • Doenças febris hemorrágicas (Dengue hemorrágica) • Febre purpúrica brasileira • Septicemias • Encefalites Meningites bacterianas ou meningoencefalites; – Meningite: Bacteriana X Viral Sinais de irritação meníngea • Rigidez de nuca • Kernig • Brudzinski Meningite viral – Agente Etiológicos • Enterovírus - 80% • Herpes simples • EBV • Varicela zoster • Vírus da caxumba • Sarampo • Arbovírus • Treponema pallidum e outros Meningite Viral - Quadro clínico • Síndrome clínica clássica • Irritação meníngea • Hipertensão intracraniana: cefaléia, náuseas vômitos • Toxemia: febre, mal estar • Sinais menígeos: Kerning e Brudsinsk • Curso benigno e auto limitado Meningite Viral - Laboratório Pressão Citologia Perfil citológico Proteínas Glicose Lactato Exame de visualização direta (% positividade) Cultura Meningite Viral Normal Pouco aumentada Predomínio de linfócitos Normal Normal Normal 50% Meningite Viral - Tratamento • Corticosteróides – Se sintomas muito proeminentes – 0,4mg/kg/dia de 12/12h por 2 dias • Acyclovir – Meningites por Herpes Vírus Meningite Bacteriana •Definição: infecção/inflamação das meninges causadas por bactérias •História Natural: – Bacteremia silenciosa, originada por germes da orofaringe (mais comum) – Infecção por extensão de um foco próximo •Sinusite •Otite •Trauma •Neurocirurgia Meningite Bacteriana - Clínica: História de IVAS ou diarréia, otite, celulite periorbitária, pneumonia Febre, prostração, hipoatividade, letargia/ alteração do nível de consciência, cefaléia, náuseas, vômitos Associados a sinais de irritação meníngea (dor e rigidez cervicais) Meningite Bacteriana - Quadro Clínico • A clínica decorre fortemente da resposta do hospedeiro ao agressor, e conseqüente ação das citocinas • Possui 2 padrões predominantes: – 1° : início súbito, manifestações rapidamente progressivas de choque, púrpura, CID, e do nível de consciência, que pode resultar em morte em 24h. – 2°:meningite precedida por sintomas do trato respiratório ou gastrintestinal, seguidos por sinais inespecíficos do SNC, como letargia e irritabilidade. (padrão mais comum) Meningite Bacteriana - Quadro Clínico • Outras manifestações: agitação, irritabilidade, fotofobia, anorexia, mialgia, artralgia, taquicardia, hipotensão, rash cutâneo petequial ou púrpura, edema de papila. • <2 anos: faixa etária mais acometida (sinais meníngeos costumam estar AUSENTES) • <3 meses: quadro inespecífico. – Porém, pode ser observado abaulamento de fontanela, convulsões e rigidez nucal Meningite Bacteriana - Etiologia Idade 0a2m Agentes Etiológicos S. Grupo B(49%), E.Coli (18%), L. momocytogenes (7%) Pseudomonas, Salmonella, Proteus Tratamento Cefotaxima+ ampicilina. Ceftriaxona sem ↑ Bb. Associar ampicilina pelo risco de Liesteria. Podese usar tb ampi + genta ou amica (como na sepse precoce) 2m a 5 a S. pneumoniae, H. influenzae tipo B (não vacinados), Cefotaxima ou Ceftriaxona ou (ampi+clorafenicol) N. meningitidis N. meningitidis S pneumoniae Penicilia cristalina ou ampicilina Acima de 5 a Meningite Bacteriana - Etiologia Condição Agentes Etiológicos Imunodeprimido Pseudomonas, S aureus, Ceftazidime + S coagulase -, Salmonella, ampicilina L. monocytogenes, fungos Derivação(DVPDVE) ou Trauma Craniano S. Pneumoniae (fístula para ouvido,nariz, seios da face, e fratura de base de crânio) S. coagulase (fratura externa) Tratamento Ceftazidime + vancomicina Meningite Bacteriana - Patogenia • Ocorre quando fatores de virulência se sobrepõe ao mecanismo de defesa do organismo. • Primeiro, há colonização e adesão à mucosa, com conseqüente invasão da mesma. Para isso, a bactéria secreta IgA do hospedeiro protease • Segundo,no espaço intravascular, a bactéria com sua cápsula polissacarídica impede a ativação do complemento via alternativa. • Terceiro, para atingir o SNC, as bactérias utilizam os pilli para cruzar a barreira hemoliquórica. Meningite Bacteriana - Patogenia • No líquor a proliferação bacteriana é favorecida devido à quase ausência de imunoglobulinas e do sistema complemento. • Componentes da superfície bacteriana (peptideoglicano + ácido teicóico do S.Pneumoniae e lipopolissacarídeo do H. influenzae) resposta inflamatória no SNC e rompimento da barreira hemo liquórica Meningite Bacteriana - Fatores de risco • Defeitos específicos da imunidade do hospedeiro, como: – – – – – Produção de imunoglobulinas alterada em resposta a patógenos encapsulados Defeitos no sistema complemento (infecção recorrente) Defeitos do sistema properdina (doença letal) Disfunção esplênica ou asplenia(aumenta chance de sepse) Defeito dos linfócitos T ( infecção por L. Monocytogenes) Meningite Bacteriana - Fatores de risco • Ausência de imunidade contra patógenos específicos associados à baixa idade; •Colonização recente; •Contato íntimo com portadores; •Aglomeração; •Pobreza; •Raça negra; •Sexo masculino; •Possivelmente ausência de aleitamento materno para lactentes de 2-5 meses de idade Meningite Bacteriana - Diagnóstico • É confirmado por análise do LCR em todos casos suspeitos: microorganismos na coloração Gram e cultura, uma pleicitose neutrofílica, nível de proteína elevado e concentração de glicose reduzida • Além disso, deve-se observar diretamente o líquor ( pressão e aspecto) – Turvo: celularidade – Xantocromia: hemorragia intracraniana, icterícia, [ ] ↑ de proteínas Gram leuco diferen ptn glicose Ausência germes Menor 7/mm mono>75% PMN=0 20-45 mg/dl >50mg/dl >75%glic. Normal< ausência germes 3m 15a20 RNPT: 0-25 PMN <75% <120 RNPT:até 61%de RNPT: PMN <170 >50 >75%glic. RNPT> 24 RNT>34 Bacterem Presença ia típica bactérias Em geral 500-1000 Predom. PMN 75%-95% <40 <66% glicemia Normal >3m 100-500 virótica ausência de 10-1000 germes Predom. linfócito 50-200 em alguns casos tuberc Quase n aparece Predom linfócito <30 50-500 1003000 Meningite Bacteriana - Diagnóstico • Repetir líquor após 48h em: – – – – – Todos RN; Falta de melhora clínica em 24-48h após início da ATB; Febre prolongada ou reaparecimento da febre; Meningite por pneumococos resistentes ou Enterococos; Imunossuprimidos Meningite Bacteriana - Diagnóstico • As contra-indicações da PL são: – – – – Evidências de HIC; Comprometimento cardiopulmonar; Infecção da pele sobre o local da PL; Trombocitopenia (relativa) *Nesses casos iniciar terapia empírica imediata *A TC (para evidenciar abscesso e HIC) também não pode adiar o tratamento. Meningite Bacteriana - Diagnóstico • Outros exames: – Hemograma; – Hemocultura(+ 80%); – Plaquetas; – TAP; – PCR (diferenciar etiologia tuberculosa, herpética e HIV); – Glicemia; – Função renal; – Raio x de tórax; – TC/RM; – Detecção de antígenos bacterianos (aglutinação de partículas de látex) Meningite Bacteriana - Diagnóstico • Indicação de TC/RM: – Sinais de focalização e de HIC; – Ausência de resposta ao tratamento Antimicrobiano; – Suspeita de encefalite herpética, de foco parameníngeo, tumores e hemorragias • Detecção de antígenos bacterianos: – pacientes que estavam em antibioticoterapia quando culturas foram colhidas. (glicose, ptn e neutrófilo do LCR não se alteram tanto como cultura e Gram pelo uso do ATB) Meningite Bacteriana - Diagnóstico Diferencial • Meningite viral; • Meningite por bactérias atípicas, fungos e parasitos; • Abscessos retrofaríngeos; cerebral, parameníngeo • Faringite ou adenite cervical grave; • Pneumonia em lobo superior • Artrite ou osteomielite em vértebras cervicais; • Hemorragia subaracnóidea; • Tétano; • Pielonefrite grave; • Tumores intracranianos; • Intoxicações por metais pesados Meningite Bacteriana - Tratamento Antimicrobiano • O tratamento dos casos suspeitos deve começar imediatamente após a coleta do LCR, com ATB venosa dirigida para germes mais prováveis. • Nos maiores de 2 m: Ceftriaxiona(100mg/Kg/d/2 doses) ou Cefotaxima(300mg/Kg/d/4 doses) Alternativa:Clorafenicol(100mg/Kg/d/4d)+ampicilina(400mg/Kg/d/4d) • Cepas resisitentes às cefalosporina de 3°: associação de Ceftriaxona ou Cefotaxima com Vancomicina (60mg/Kg/d/4d) Meningite Bacteriana - Tratamento Antimicrobiano • Cultura meningocócica: penicilina cristalina ou ampicilina na dose de 200 a 400mg/Kg/d/4d • Cultura pneumocócica sensível: penicilina ou Ampicilina • Cultura pneumocócica resistente: ceftriaxona (ou cefotaxima) associada à vancomicina ou com vancomicina associada à rifampicina • Cultura de H. influenzae: ceftriaxona ou, nos alérgicos, clorofenicol • Tempo de tratamento: 7 d c/ 5d afebris na meningocócicas, 10d na haemophilus, 14-21d p/ gram -, e 21d p/ as estafilocócicas. Meningite Bacteriana - Tratamento Antimicrobiano • Nos RN e menores de 2 m: – 1° escolha é as Cefalosporina de 3°, melhor Cefotaxima, pois Ceftriaxona tem contra- indicação relativa. – Associação de ampi+genta ou amica também é eficaz – Se suspeitar de L. monocytogenes, manter ampicilina (200mg/Kg/d) associada à cefalosporina de 3°. – Germes multirresistentes: cefepime ou meropenem/imipinem + aminoglicosídeo Meningite Bacteriana - Terapêutica de suporte • Controle da hidratação, pressão arterial, volume urinário, peso da criança, avaliação neurológicas repetidas • Corticoterapia: – Dexametasona(0,15mg/Kg/dose EV 6/6hpor 2 a 4 dias) iniciada 30 min antes da 1° dose de ATB; – Maiores de 2 m; – Reduz seqüelas auditivas na meningite por Haemophilus; – Melhora a mortalidade e seqüelas nas pneumocócicas Meningite Bacteriana - Terapêutica de suporte • Convulsões: – Terapia imediata com diazepan EV ou Lorazepam; – Monitorizar glicemia, eletrólitos; – Terapia de manutenção: fenitoína (menor efeito sedativo no SNC que fenobarbital) • HIC: intubação, hiperventilação, furosemida e manitol • SIADH: restrição hídrica, mas evitar hipovolemia Meningite Bacteriana - Complicações • Convulsões (focais ou generalizada) devido a cerebrite, infarto ou anormalidades eletrolíticas. Ocorre em 20-30% dos casos. • Sinais de localização • Hipertensão Intracraniana em decorrência dos edemas. É traduzida por cefaléia em crianças maiores e abaulamento da fontanela em crianças menores, além de paralisia do nervo oculomotor e abducente • SIHAD que resulta em hiponatramia e hipoosmalaridade sérica com sódio e osmolaridade urinária aumentados Meningite Bacteriana - Complicações • Seqüelas neurológicas, como déficits motores e cognitivos, retardo neuro psicomotor • Abscesso cerebral, cerebrite, coleção subdural • Hidrocefalia que é mais comum no período neonatal Meningite Bacteriana - Profilaxia • Meningococos: contatantes do lar, especialmente cça pequenas; contatantes da creche (nos últimos 7 d); exposição direta às secreções; dormiu e comer no mesmo cômodo. – Rifampicina 10mg/Kg/vez de 12/12h por 2d • Haemophilus: contatantes do lar com menos de 48 m e imunização incompleta; contatantes do berçário ou creche(para crianças menores de 2a incompletamente vacinadas); Se ocorrer 2° caso dentro de 60d, administrar em todas crianças. – Rifampicina 20mg/Kg/d por 4 dias Suspeita de meningite? • Solicitar exames laboratoriais • Solicitar exames de imagem, se necessário. • Realizar exame de líquor após confirmada ausência de hipertensão intracraniana • Iniciar antibioticoterapia empírica Meningite Asséptica X Bacteriana Aspectos clínicos ♦ Asséptica • Início insidioso • Sintomas gerais mais brandos - melhor condição clínica • Presença de conjutivite, miocardite e pericardite • Aumento de parótidas ♦ Bacteriana • Início rápido • Sintomas gerais mais importantes • “Olhar parado”, febre alta, hipoatividade e coma • Manifestações hemorrágicas e exantema Meningite Asséptica X Bacteriana Aspectos Liquóricos Meningite Asséptica Meningite Bacteriana Cor Incolor Opalescente Aspecto Límpido Turvo Células Aumentadas (20 a 1.000) Linfócitos ou PMN no início Aumentadas (acima de 1.000) PMN Proteínas Abaixo de 100mg% Acima de 100mg% Normal (2/3 da glicemia) Diminuída Ausentes Presentes Glicose Globulinas Tratamento – Meningite bacteriana Idade Agente mais provável Esquema terapêutico Esquema alternativo < 3 meses Strepto B., Listeria, E. coli, Pneumo. Cloranfenicol+ Gentamicina 3 m. a 18 anos & 18 a 50 anos > 50 anos Meningo, Pneumo, Hemophylus Ampicilina+ Ceftrioaxona (ou cefotaxima) Ceftriaxona (ou cefotaxima) + Vancomicina Ampicilina+ Ceftrioaxona (ou cefotaxima) Meningo, Listeria, Gram - Meropenem ou Cloranfenicol Ampicilina + Ciprofloxacina Referências Bibliográficas 1. 2. 3. 4. 5. 6. Baldacci, E.R. Meningite Bacteriana in Pediatria Básica,Marcondes, TOMO II, 9° edição, Sarvier, 2003 Prober, C.G. Infecções do Sistema Nervoso Central in Tratado de Pediatria, Nelson, 17°edição, Guanabara, 2004 Murahovschi, J. Meningoencefalites in Pediatria Diagnóstico e Tratamento, 6° edição, Sarvier, 2003 Oliveira, R.G. Meningite in Blackbook Pediatria, 3° edição, Black Book, 2005 Manual Merck, 2006. Manual da FUNASA, 2004.