1 ADOÇÃO-REFLEXOS DO PROCEDIMENTO 1 Raquel Valenti Gonçalves* RESUMO: Sabe-se que, atualmente, no Brasil milhares são as crianças e adolescentes à espera de um lar. Assim como muitos são os casais ou pessoas (solteiras, viúvas, divorciadas) à espera de um filho para adotar. Porém, a realidade tem demonstrado que o instituto da Adoção em vigor, mostra-se lento e burocrático, fazendo, muitas vezes com que o procedimento demore anos para ser concluído. A burocracia do processo é capaz de gerar nessas crianças e adolescentes conseqüências psicológicas irreversíveis, já que há um perfil almejado pelos futuros adotantes. Dessa forma, com o objetivo de proporcionar celeridade processual e diminuir o tempo de permanência das crianças e adolescentes nos abrigos, foi sancionada pelo Presidente da República, Luis Inácio Lula da Silva em 03 de agosto de 2009 a Nova Lei Nacional da Adoção. A nova lei pretende reformular a legislação civil vigente relacionada ao assunto e vem sendo aguardada ansiosamente por milhares de pretendentes à adoção e pelas inúmeras crianças e adolescentes que vivem nos abrigos de nosso país. Nesse contexto, o presente artigo científico tem como objetivo compreender e analisar o contexto do instituto da Adoção no Direito Brasileiro. Palavras-chave: adoção-família- poder familiar-abandono. 1 INTRODUÇÃO Hodiernamente, vendo a burocracia com que ocorre todo o processo de adoção no Brasil e as conseqüências psicológicas que o abandono é capaz de gerar em uma criança e adolescente, é justificável que se estude como o Direito Brasileiro trata o Instituto da Adoção. Posteriormente, passaremos a analisar a nova Lei Nacional da Adoção que visa dar celeridade ao procedimento e conseqüentemente diminuir o tempo de permanência das crianças e adolescentes nos abrigos.Nesse passo, o presente trabalho teve como escopo compreender e analisar o instituto da adoção no direito brasileiro. A burocracia que envolve todo o procedimento, bem como as conseqüências psicológicas causadas em quem espera por um lar. Nesse passo, o presente artigo teve como escopo compreender e analisar o instituto da adoção no direito brasileiro. A burocracia que envolve todo o procedimento, bem como as conseqüências psicológicas causadas em quem espera por um lar. 1 Monografia apresentada como requisito para a aprovação na disciplina de Trabalho de Conclusão de Curso II, Curso de Ciências Jurídicas e Sociais da Faculdade de Direito, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, aprovada com grau máximo pela Banca Examinadora composta pelo orientador Prof. Dr Gilberto Flávio Aronne, Profa.Dra Marize Corrêa e Profa.Dra. Laura Antunes de Mattos, em 02/12/2009. * Acadêmica da Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. Email: [email protected] 2 A motivação deste trabalho surgiu, em decorrência de uma reportagem de televisão, mais especificamente exibida por meio do Jornal Hoje. A matéria fazia parte de uma série de cinco reportagens e retratava a burocracia enfrentada pelos pretendentes à adoção assim como a situação das crianças e adolescentes nos abrigos. O repórter então lançou a seguinte pergunta: “Se há tanta gente disposta a adotar e a ser adotada, o que dificulta a adoção em nosso país?” A partir daquele momento o tema fora definido, assim como a vontade de entender as razões do problema. A metodologia utilizada cingiu-se, basicamente, na pesquisa de estudos na doutrina, bem como em livros e artigos de psicologia. 2 FAMÍLIA E PODER FAMILIAR 2.1 A Família e a Legislação A lei de um país deve estar baseada na sua realidade. Diante de tal situação é possível observar, as principais alterações sofridas pela legislação brasileira, no tocante ao tema.Tomamos por base o Código Civil de 1916, para enfatizar que a família era considerada como um ente fechado, voltado para si mesmo. O status familiae era conferido apenas aos casados. O divórcio era proibido, só era possível haver a separação judicial e o cônjuge culpado pela separação do casal era punido severamente (perda da guarda dos filhos, perda do nome de casado, bem como a perda dos alimentos). O casamento, que decorria da vontade de Deus e que reforçava a influência da igreja, tinha por finalidade principal o cunho econômico (vínculos patrimoniais, mútua assistência e sustento da prole) e a procriação. Assim, a única forma de criar a família legítima era através do casamento (justas núpcias). Através do código, a família era tratada como um ente de produção de riqueza, tendo um caráter patrimonialista. Não havia um interesse em proteger a pessoa, mas os bens desta pessoa. Os institutos da tutela e curatela, assim como os impedimentos matrimoniais defendiam o patrimônio, não a pessoa. As relações surgidas fora do casamento não recebiam nenhum reconhecimento jurídico. Assim como os filhos, que eram considerados ilegítimos e não recebiam os direitos privativos dos filhos legítimos. Felizmente, a Constituição de 1988, bem como o novo Código Civil de 2002 vieram alterar esse código que não mais retratava a realidade do Brasil. Antes, porém, cabe ressaltar o 3 Estatuto da Mulher Casada, de 1962 (Lei nº 4121/62) como um importante avanço no desenvolvimento das mulheres. A partir do Estatuto, ela adquiriu a titularidade do poder familiar, juntamente com marido, bem como se tornou colaboradora do marido na chefia da sociedade conjugal. A constituição representou importante marco que transformou de forma radical o paradigma da família. Iniciaremos citando o art 1º, inciso III da Constituição Federal que faz referência a dignidade da pessoa humana como um de seus dos fundamentos. Com isso, foi possível a despatrimonialização do direito. A dignidade será alcançada pela pessoa por meio de sua família. Família que passa a ser considerada a partir do afeto entre as pessoas que a compõem. O elo de ligação passa a ser o afeto, com isso, percebe-se relacionamentos mais abertos e mais felizes, pois é na família que a pessoa cresce e adquire suas habilidades para a convivência familiar e social. Outro artigo constitucional que merece destaque é o de nº 227 onde se estabelece os deveres da sociedade, do estado e principalmente da família com relação aos filhos menores, a saber: o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar. Para ilustrar a situação, citaremos a afirmação de Gustavo Tepedino: A maior preocupação da atualidade é com a pessoa humana, o desenvolvimento de sua personalidade, o elemento finalístico da proteção estatal, para cuja realização devem convergir todas as normas de direito positivo, em particular aquelas que disciplinam o direito de família, regulando as relações mais íntimas e intensas do indivíduo no social.”2 No tocante ao novo Código Civil, vemos que o casamento passou a ser realizado a partir do sentimento de amor existente entre as pessoas. Os deveres do casamento passaram a ter uma nova interpretação. O dever de coabitação, por exemplo, prima por uma convivência harmoniosa, baseada no carinho, no respeito, assim como a fidelidade. O dever de mútua assistência consiste no apoio não só econômico, mas principalmente moral e psicológico que deverá haver entre os cônjuges em todos os momentos. Enfim, os deveres priorizam basicamente a boa convivência do casal, terminando com a antiga situação do Código de 1916, que fazia com que os casais mantivessem apenas a aparência de um casamento perfeito, enquanto que a realidade se apresentava de forma oposta. 2 TEPEDINO, Gustavo. Temas de direito civil. 2ª ed.ver. atualizada, Rio de Janeiro: Renovar, 2001. 4 Ao pai é destinado um papel mais participativo na vida do filho, cabendo à ele como à mãe a direção da sociedade conjugal no interesse do casal e dos filhos, conforme preconiza o art.1567 do Código Civil, bem como o sustento, guarda e educação dos filhos. Os filhos, também passaram a ter uma participação mais ativa com relação aos seus pais, pois antigamente, só restava-lhes aceitar todas as ordens impostas pelo patriarca. Após o novo Código, os filhos, que antes eram tidos como “ilegítimos” passaram a gozar dos mesmos benefícios dos demais irmãos, independente de terem sido gerados na constância ou não do casamento ou de terem ingressado na família por adoção. Situação tratada no art 1596 do Código Civil. Um outro aspecto importante é com relação às outras formas de constituição de entidades familiares como a união estável e a família monoparental, que passaram a receber a proteção jurídica. Cabe aqui destacar o art. 226, parágrafo 3º da Constituição Federal que diz: “é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento”. Bem como o art 226, parágrafo 4º que estatuí: “Entende-se também, como comunidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes”. Por fim, destacamos o Capítulo III do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/1990) que se refere à questão do direito à convivência familiar e comunitária, já citado anteriormente no art nº 227 da Constituição Federal. O destaque aqui, diz respeito a inclusão pelo Estatuto, da família substituta como alternativa para o exercício deste direito. Dessa forma, dentro deste capítulo encontramos disposições referentes à família natural através do art 25 com a seguinte redação: “Entende-se por família natural a comunidade formada pelos pais ou qualquer deles e seus descendentes”.Bem como, as disposições sobre a família substituta, nos artigos 28 a 32. A inclusão em família substituta, conforme o disposto no art. 28 somente poderá ser feita mediante guarda, tutela ou adoção, levando-se em conta o grau de parentesco e a relação de afinidade ou de afetividade, bem como, se possível, a opinião do menor. Assim, a família que antes se apresentava como um modelo fechado em si, tornou-se uma comunidade calcada no afeto, na democracia, na ajuda mútua, tendo por membros pessoas unidas. União esta que independe de laços consangüíneos, mas que depende dos laços do amor. 5 2.2 Poder Familiar. Primeiramente, faz-se necessário salientar que a antiga expressão “pátrio poder” foi alterada para “poder familiar” a partir do novo código civil de 2002, tal alteração foi necessária como forma de acompanhar a nova constituição familiar. Família esta dirigida conjuntamente pelo homem e pela mulher, uma vez que o anterior termo, “pátrio poder” conferia ao homem tal responsabilidade. Dessa forma, o instituto sofreu uma significativa modificação, deixando-se de priorizar o poder dos pais sobre os filhos, para constituir-se em um múnus, um direito-dever que não é livre, mas necessário no interesse de outrem, onde a cada dever do filho corresponde um direito do pai ou da mãe e a cada dever do pai ou da mãe corresponde um direito do filho. Arthur Marque da Silva Filho elucida: Essa modificação deriva, principalmente, da igualdade de direitos entre o homem e a mulher. O legislador preferiu, portanto, uma expressão mais condizente com a atual realidade, tendo em vista que a expressão “pátrio poder” fazia referência apenas ao papel do genitor como figura proeminente na relação parental, quando, na realidade, ambos os genitores possuem poderes iguais.3 O termo denota o poder exercido por ambos os pais relacionados aos cuidados, proteção, sustento, defesa, amparo que deverão ser dispensados aos filhos menores. Porém, a mudança foi muito mais intensa, não se trata apenas do poder dos pais em relação ao filho, trata-se sim, de uma questão de interesse, uma vez que o interesse dos pais deverá estar condicionado ao interesse do filho, em sua realização como pessoa que ainda está em formação. Dessa forma, se realça o dever dos pais. O exercício desse poder pressupõe o cuidado que eles deverão ter frente aos filhos. O dever de criá-los, alimentá-los e educá-los, conforme as condições da família. Decorre o poder familiar tanto da paternidade natural, como da filiação legal. Tais obrigações são personalíssimas, ou seja, dos pais em relação aos filhos. Não é possível renunciar, transferir, alienar e prescrever tal função, tal encargo. O poder, a autoridade dos pais sobre os filhos não deve ser vista de uma forma atroz, violenta e sim em um comportamento natural de respeito, de afeição, de boa convivência que deve permear a realidade das famílias. Para ilustrar tal afirmação, destacamos as palavras de Paulo Luiz Netto Lobo referente ao assunto: 3 FILHO, Arthur Marques da Silva.Adoção: regime jurídico, requisitos, efeitos, existência, anulação. 2ª ed., ver. atual, ampl- São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009. 6 A evolução gradativa deu-se no sentido da transformação de um poder sobre os outros em autoridade natural com relação aos filhos, como pessoas dotadas de dignidade, no melhor interesse deles e da convivência familiar. Essa é sua atual natureza. Assim, o poder familiar, sendo menos poder e mais dever, converteu-se em múnus, concebido como encargo legalmente atribuído a alguém, em virtude de certas circunstâncias, a que não se pode fugir. 4 2.2.1 Constituição e Destituição: O novo Código estabelece que o poder familiar será exercido conjuntamente pelo pai e pela mãe. Isso não significa dizer que os filhos são os sujeitos passivos, enquanto os pais os sujeitos ativos. Na verdade, tal colocação evidencia que ambos, pais e filhos são titulares recíprocos de direito. Já o Estatuto dispõe que o poder familiar será exercido pelo pai e pela mãe, “na forma que dispuser a legislação civil”. Porém, há famílias chefiadas por tios, primos, irmãos. Assim sendo, se não houver pai ou mãe ou ambos, caberá a esta pessoa tal função. O exercício do poder familiar está expresso no artigo 1634 do código civil e elenca as competências que os pais deverão dispensar aos filhos menores, tais como: educação e criação, tê-los em sua companhia e guarda, darem consentimento para casarem, nomearem tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver, ou sobrevivo não puder exercer o poder familiar, representá-los até os 17 anos nos atos da vida civil, e assisti-los após essa idade, nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento, reclamá-los de quem ilegalmente os detenha, exigir que lhes prestem obediência, respeito e serviços próprios de sua idade e condição. No Estatuto, não há competência, mas deveres que os pais deverão obedecer, conforme preceitua o artigo 22 “aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, sempre no interesse destes, o dever de cumprir as determinações judiciais”. Entretanto, o ordenamento prevê situações que podem ensejar a suspensão e/ou extinção do poder familiar. O estado tem a função de fiscalizar e pode suspender ou até excluir o poder familiar. São sanções aplicadas aos pais, mas não constituem pena. Não tem um intuito punitivo, pois visa preservar o interesse dos filhos. Tais situações estão previstas nos artigos 1635 a 1638 do Código Civil. Com relação à suspensão do poder familiar, que é uma medida menos grave, três são as hipóteses previstas no art 1637 do Código Civil. São elas: o descumprimento dos deveres a eles (pais) inerentes (tais deveres aparecem de modo 4 LOBO, Paulo L. N. Do Poder Familiar. In: Direito de Família e o novo Código Civil. Coordenação Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira. 3. ed., rev. atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. 179 p. 7 disperso pelo Código Civil, ECA e Constituição e já foram já citados anteriormente). A ruína dos bens dos filhos é outro motivo de suspensão do poder familiar e ainda a condenação em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão.A renomada Maria Berenice Dias afirma em relação à suspensão do poder familiar: Tanto é possível ocorrer com referência a um único filho, e não a toda a prole, como pode abranger apenas algumas prerrogativas do poder familiar. Em caso de má gestão dos bens dos menores, possível é somente afastar o genitor da administração, permanecendo com os demais encargos. 5 A extinção do poder familiar, que é sua interrupção definitiva deverá ocorrer sempre quando houver perigo permanente a segurança e a dignidade do filho e está expressa no artigo 1635 do Código Civil. São cinco as hipóteses que podem levar a extinção de tal poder. São elas: morte dos pais ou do filho, emancipação do filho, maioridade do filho, adoção do filho por terceiros, e perda em virtude de decisão judicial. Para que ocorra o previsto no inciso V do artigo 1635 do Código Civil, ou seja, a perda por decisão judicial, é necessário que ocorra alguma das hipóteses previstas no artigo 1638 do referido Código. A saber: castigo imoderado do filho, abandono do filho, prática de atos contrários à moral e os bons costumes e a reiteração de faltas aos deveres inerentes ao poder familiar. As hipóteses acima citadas, sempre levarão em conta o bem estar do menor, bem como as condutas que o direito considera ilícitas. A questão do castigo imoderado merece destaque, uma vez que evidencia que, em princípio, os pais poderiam castigar moderadamente seus filhos. Porém, de acordo com o artigo 227 da Constituição, os pais deverão colocar o filho a salvo de toda a violência e como o castigo físico é uma forma de violência, não seria permitido que tal castigo ocorresse, pois, iria ferir o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Conforme afirma Paulo Netto Lobo: “O poder disciplinar, contido na autoridade parental, não inclui, portanto, a aplicação de castigos que violem a integridade do filho”6. O Estatuto da Criança e Adolescente em seu artigo 24 preceitua que a perda ou suspensão do poder familiar será decretada judicialmente a partir da lei civil, ou ainda, se 5 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias .2.ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. 6 LOBO, Paulo L. N. Do Poder Familiar. In: Direito de Família e o novo Código Civil. Coordenação Maria Berenice Dias e Rodrigo da Cunha Pereira. 3. ed., rev. atual. e ampl., Belo Horizonte: Del Rey, 2003. 189 p. 8 houver o descumprimento injustificado dos deveres de sustento, guarda e educação dos filhos menores. Como já dito anteriormente, o Código dispõe que o poder familiar será exercido conjuntamente, por ambos os pais, tanto na vigência do casamento ou da união estável (1631), como após, pois o poder familiar decorre da paternidade e da filiação e não do casamento. Sobrevindo uma separação judicial, um divórcio ou a dissolução da união estável, ainda assim permanece o poder familiar, havendo apenas alteração no que diz respeito à convivência com o cônjuge que saiu de casa (1632). Se houver divergência entre os pais, poderá, qualquer um deles, recorrer ao juiz para buscar a solução do conflito. Por fim, se o pai não reconhecer o filho, este ficará sob poder familiar exclusivo da mãe, artigo 1633 do Código Civil. 2.2.2 Procedimentos de suspensão e extinção Os procedimentos relativos à perda ou suspensão do poder familiar estão dispostos no Estatuto da Criança e Adolescente (ECA) nos artigos 155 a 163. Um aspecto que vem gerando muita polêmica é com relação aos procedimentos de destituição e adoção. Serão necessárias duas ações autônomas ou em uma única ação poderá se destituir a guarda e conceder a adoção? Está legitimado para ingressar com pedido de suspensão ou extinção do poder familiar tanto o Ministério Público como aquele que tenha legítimo interesse (um dos genitores, qualquer parente ou ainda o conselho tutelar). 7 Como foi anteriormente citado, tem gerado muita polêmica a questão referente à ação de destituição do poder familiar e adoção. É possível ingressar com uma ação cumulando os dois pedidos, ou serão necessárias duas ações com pedidos separados? Uma de destituição e outra de adoção? Arnaldo Marmitt em sua obra “Adoção” sustenta: A adoção pressupõe a perda do pátrio poder. Sem este decreto prévio ela se torna inviável. Em razão disso sustentam alguns juristas que a demanda que objetiva a destituição do pátrio poder deve preceder àquela que visa decretar a adoção. Só após o trânsito em julgado da sentença que destitui do pátrio poder seria possível ingressar em juízo com o pedido de adoção. Entrementes não parece estarem com a melhor razão. Conforme art 292 do Código de Processo Civil, perfeitamente viável é a cumulação, num só processo, contra o mesmo 7 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. 9 réu, de vários pedidos, ainda que entre eles não haja conexão. Deduzse dessa norma instrumental a admissibilidade do pedido cumulativo, vez que a adoção apenas será concedida judicialmente após a decisão sobre a perda do poder familiar.8 Dessa forma, defende o autor, tendo por base o CPC, que é possível em um único pedido cumular duas ações, uma de destituição do poder familiar e outra e de adoção, o que tornaria o processo muito mais célere. Mas a realidade, entretanto, não demonstra tal celeridade. Pois, enquanto o processo está tramitando, o menor é deixado em abrigos ou colocado em família substituta e lá permanece por muito tempo, em virtude da demora de todo o procedimento. Por fim, destacamos o artigo 41, caput do Eca que prevê: “A adoção atribui a condição de filho ao adotado, com os mesmos direitos e deveres, inclusive sucessórios, desligando-o de qualquer vínculo com pais e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”. Assim, é possível observar que, implicitamente, há sim a destituição do poder familiar a partir da sentença da ação de adoção. 3.ADOÇÃO 3.1 A Nova Lei Nacional de Adoção. Em 03/08/2009, foi sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva a nova Lei Nacional da Adoção, após tramitar por dois anos no congresso. A nova lei representa uma total reformulação nas legislações atuais e pretende revogar alguns dispositivos do Código Civil, das Leis Trabalhistas e acrescentar vários dispositivos ao Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como revogar os considerados ultrapassados. A nova lei está baseada em três objetivos centrais: tornar mais célere o processo de adoção, buscando com isso reduzir o tempo de permanência nos abrigos, priorizar a permanência do menor na família de origem e ainda unificar o cadastro de adoção. Sabe-se que o processo de adoção é muito lento e burocrático, fazendo com que os menores passem anos nos abrigos à espera de uma família. Com a nova lei, o abrigo deverá estar localizado próximo à residência da criança. Assim, a partir de tal projeto a justiça deverá ser mais ágil, uma vez que haverá um limite de no máximo dois anos para uma criança permanecer em um abrigo. 8 MARMITT, Arnaldo. Adoção. Rio de Janeiro: Aide,1993. 10 A lei inova apresentando o conceito de “família extensa”, considerada a família que “se estende para além da unidade do casal, formada por parentes próximos com os quais a criança ou adolescente convive e mantém vínculos de afinidade e afetividade”.9 Assim, os parentes próximos (avós, tios, primos) poderão garantir a permanência do menor em sua família natural, a partir da atuação dos mesmos através da ampla defesa e contraditório, na fase da destituição do poder familiar (termo que ainda permanece no ECA como “pátrio poder“ e que a partir da nova lei será finalmente alterado). Dessa forma, primeiramente se tentará manter a criança em sua família de origem, não necessariamente com os pais biológicos, restando infrutífera esta tentativa, então o menor será encaminhado para adoção. A nova lei evidencia o objetivo com o verdadeiro bem-estar do menor. Assim os menores com idade superior a 12 anos serão ouvidos e esta oitiva será considerada pelo juiz, bem como serão ouvidos quando o adotante quiser trocar o prenome do adotando. Se buscará manter os irmãos unidos, assim o adotante terá que adotar todos os irmãos, a separação só ocorrerá se algum dos irmãos representar um risco para os demais. Haverá um único cadastro de adoção, possibilitando o cruzamento de dados em todo o país trazendo uma celeridade ao procedimento. Tal medida vai integrar as listas existentes nas Varas da Infância e da Juventude de todo o país, permitindo a centralização e o cruzamento de informações das crianças aptas à adoção, bem como dos candidatos a adotálas, pondo fim à situação do adotante estar inscrito em vários cadastros. Atualmente há 22 mil pessoas inscritas no cadastro nacional de pais adotantes. A idade para adotar será a de 18 anos, conforme estabelece o Código Civil e o adotado, bem como seus descendentes, terão direito a informações sobre sua origem, sobre seus pais biológicos. Um outro aspecto que merece destaque é o que diz respeito a adoção direta, ou seja, os pais biológicos poderão indicar para a Justiça as pessoas que tem interesse em adotar seu (s) filho (s). A nova lei pretende ainda, estimular a adoção de crianças ou adolescentes geralmente preteridos, ou seja, crianças maiores, negras, com deficiências físicas e/ou mentais. As crianças indígenas e as oriundas de comunidades quilombolas deverão ser adotadas em suas próprias comunidades, dessa forma, não perderão suas identidades culturais. 9 Projeto que estatui a nova Lei Nacional de adoção. Brasília, 2009. Disponível em <http:mercadante.com.br/notícias/ultimas/lei-nacional-de-adocao-e-aprovada-no-senado-e-segue-para-sançaopresidencial>.Acesso em: 30 jul. 2009. 11 Com relação à adoção por estrangeiros, esta só será possível depois de esgotadas as tentativas da adoção por brasileiros residentes no exterior e por fim, por estrangeiros. Hipótese em que haverá um acompanhamento da situação da criança /adolescente. Como acima foi exposto, a nova lei nacional de adoção representará verdadeira revolução e modernização do instituto da adoção. Para assim beneficiar as milhares de crianças que aguardam por um lar, bem como as milhares de famílias que anseiam por um filho. 3.2 O motivo de tanta demora. Atualmente, em todo Brasil existem 80.000 crianças e jovens em abrigos. Desse total, apenas 10% estão em condições jurídicas de serem adotados. A burocracia faz em média o processo durar aproximadamente uns quatro anos. Diante dessa situação espera-se que a nova lei venha alterar essa realidade e conseqüentemente diminuir o sofrimento de quem espera por um filho e de quem espera por uma família. A realidade demonstra que o tempo que leva para que se efetive a adoção pode ser bem variável, há casos em que a adoção ocorre de forma rápida, bastando apenas alguns meses para que seja concluída. Entretanto, na maioria das vezes, ela se arrasta e leva anos, para se concretizar. Nesse sentido, destacamos a afirmação de Belmiro Pedro Welter citado por Maria Berenice Dias a respeito do processo de adoção: Sustenta Belmiro Pedro Welter, não sem razão, a inconstitucionalidade do tortuoso, moroso e desacreditado processo de adoção judicial. O autor preconiza a dispensabilidade do cumprimento de todos os requisitos legais (1618 a 1629 e ECA 39 a 52), sob fundamento de que o reconhecimento do filho afetivo é consensual e voluntário. Argumenta ainda, ser inútil a via judicial, ou quando é dispensável o consentimento dos pais, por se tratar de infante em estado de vulnerabilidade social (1621§ 1º e 1624).10 Assim, pelas palavras do referido autor, torna-se evidente que tal procedimento é totalmente inconstitucional na medida em que é muito demorado. Mesmo havendo de um lado 10 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado,2005. 12 uma criança em um abrigo para ser adotada e, de outro, um casal disposto a adotá-la, tal procedimento poderá demorar anos, trazendo profundo sofrimento para ambas as partes. Em contrapartida, o Desembargador Thiago Ribas, que coordena a Comissão de Adoção Internacional do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro explica o motivo da demora no processo de adoção: O problema não é dos juízes. Fala-se em lentidão da Justiça e isso é um bordão comum, utilizado em todos os segmentos. Mas o que se prevê e o que tem que se cumprir é o que a lei determina. E a lei determina expressamente, que se deve dar uma preferência para a família biológica. Nesses abrigos, nós encontramos muitas crianças que são deixadas especialmente pelas mães porque estas se encontram em dificuldades. As mães deixam as crianças ali e vão freqüentando os abrigos. E há a necessidade de um acompanhamento, que é feito pelo Conselho Tutelar, do qual faz parte um promotor do MP, que deve cuidar de verificar quando essas crianças já não estão sendo mais procuradas com freqüência11 . Justificadamente, o Desembargador diz que é preciso ter certeza que a família biológica não quer mais a criança para que a mesma seja considerada apta para ser adotada. Entretanto, a realidade nos mostra que as crianças são completamente esquecidas nos abrigos e lá crescem sem amor, afeto e a proteção de uma família. Maria Antonieta Motta, em seu artigo intitulado “Adoção” destaca como conseqüências geradas pela morosidade: a desmotivação que a demora pode provocar no casal adotante, fazendo-os a não se comprometerem afetivamente como deveriam. Ou seja, o casal em um primeiro momento mostra-se motivado e em uma ótima fase no casamento. Porém, com a demora, o próprio relacionamento pode mudar, fazendo com que diminua a vontade de adotar. Nesse passo, afirma a autora: É louvável o objetivo da lei em comprovar a compatibilidade entre as partes e verificar as probabilidades de sucesso da adoção, e compreende-se que para isto uma série de cuidados e providências prévias à sua concretização devam ser tomados. Entretanto, o prolongamento demasiado do processo faz com que, quando os pais adotivos tenham finalmente a criança, muito já aconteceu na vida deles e na vida dela em um período decisivo para a formação sadia do psiquismo infantil.”12 11 RIBAS, Thiago. Por que adotar demora. Rio de Janeiro, 2008. Disponível em < http:// rjtv.g1.com.br>. Acesso em: 31 out. 2008. 12 Motta, M.A P. Adoção Algumas Contribuições Psicanalíticas. In: SUANNES, A . et al. Direito de Família e Ciências Humanas. Caderno de Estudos n° 1. São Paulo: Ed. Jurídica Brasileira, 1997. 124 p. 13 É um posicionamento voltado basicamente para o aspecto psicológico, uma vez que este “parto psicológico”, conforme denota a autora é importante para que o casal se prepare para o novo momento que irão vivenciar, porém, tal espera não deve ser muito longa, uma vez que o tempo pode fazer com que os sentimentos e as situações se alterem. O aspecto psicológico envolvido no procedimento da adoção, em especial, os efeitos nocivos do abandono, bem como a necessidade que a criança tem de ter uma família, o perfil desejado pelas famílias e a realidade dos abrigos serão tratados de forma mais aprofundada no capítulo a seguir. 4.CONSEQUÊNCIAS SOFRIDAS PELAS CRIANÇAS/ ADOLESCENTES QUE AGUARDAM PELA ADOÇÃO. 4.1 A criança e a família: mais que um direito, uma necessidade. A criança pode ser considerada como o ser mais frágil e dependente de toda a espécie animal. Para que possa sobreviver, ela depende totalmente daqueles que a geraram, seus pais, sua família. E mais especificamente de sua mãe, que representa seu elo de ligação com o mundo. O pai ocupa papel igualmente importante, na medida em que oferece segurança e proteção. Está cientificamente comprovado que, se a mãe tiver ao seu lado um companheiro que a ame, proteja e a ampare, ela conseguirá estar mais disponível e atenta para seu bebê. Se, entretanto, ela não receber esses cuidados de seu companheiro, possivelmente essa mãe desenvolverá sintomas depressivos e isso refletirá nos cuidados que terá com seu filho. Assim, as mães primeiramente precisam ser apoiadas e amparadas para que possam cuidar de seus bebês de uma forma sadia. Uma vez que, de acordo com Maria Aparecida Domingues Oliveira: “para a criança, a família representa proteção e, sobretudo, sobrevivência. Sobrevivência, neste caso, abrange o orgânico e o emocional”.13 A médica psiquiatra e psicanalista Maria Lucrecia Sherer Zavaschi, em seu estudo acerca da necessidade da família na vida da criança afirma: “para cada etapa do 13 OLIVEIRA, Maria A D. A neuro-psico-sociologia do abandono/mau trato familiar. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 286 p. 14 desenvolvimento temos tarefas específicas que dizem respeito à criança e à família”14. Para tanto, utiliza como referência os estudos de Erik Erikson, referente às “oito idades do homem”, bem como, as tarefas que deverão ser desenvolvidas em cada fase. Destacaremos, entretanto, o período compreendido entre o nascimento à adolescência. - Do nascimento aos 18 meses - CONFIANÇA BÁSICA: Consiste na primeira tarefa do bebê. Para que ele possa ser capaz de alcançá-la é preciso que ele tenha pais capazes de oferecer-lhe um ambiente, nas palavras da autora, “suficientemente previsível e bom”. Envolvendo aqui o suprimento orgânico (alimento) e emocional (afeto, compreensão e estímulos adequados). - Dos 18 meses aos 03 anos - AUTONOMIA: Para que a criança conquiste autonomia, é igualmente importante a participação ativa dos pais. Nesta fase, a criança costuma ter crises de birra e negativismo. Assim, é preciso que os pais permitam que a criança enfrente situações novas, próprias de sua idade sem expô-la ao perigo. -Dos 04 aos 05 anos - INICIATIVA X CULPA: Nesta fase, a criança é dona de seu corpo, iniciando atividades motoras de vários tipos por conta própria, assim como a linguagem e atividades imaginárias.Os pais ocupam papel fundamental nesse estágio, pois são eles que fomentarão na criança o senso de iniciativa ou culpa. Se os pais incentivarem, apoiarem e valorizarem as iniciativas da criança, ela terá desenvolvido o senso de autonomia. - Dos 06 aos 12 anos - INDUSTRIOSIDADE X INFERIORIDADE: Nesta etapa do desenvolvimento em que a criança já freqüenta o ambiente escolar é necessário que os pais não a compare com outras crianças, que, por exemplo, atingiu um melhor desempenho no processo de aprendizagem. Se isso ocorrer, possivelmente, a criança começará a desenvolver sentimentos de inferioridade e incompetência, uma vez que o que ela mais almeja é a aprovação de seus pais. A autora destaca ainda, nesta fase, que a escola representa uma segunda chance para a criança, cabendo ao professor estimulá-la e elogiá-la sempre que possível. -Adolescência - IDENTIDADE X CONFUSÃO: A adolescência é uma das fases mais difíceis do desenvolvimento humano. Uma vez que o adolescente busca um maior conhecimento sobre si, sobre sua identidade e pelo seu papel no mundo e na sociedade. Por este motivo, os pais deverão ser muito atentos e ter muita paciência para conseguirem orientar seu filho. 14 ZAVASCHI, Maria Lucrecia Sherer. A criança necessita de uma família. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 59 p. 15 De acordo com as etapas do desenvolvimento humano baseadas em Erik Erickson é possível observar que a criança NECESSITA de uma família desde o início, para que possa tornar-se um adulto independente, produtivo, realizado e feliz. Para isso ocorrer, o casal, ou seja, os pais precisam estar pré-dispostos para criar este ambiente agradável para seu filho. Infelizmente, por diversas razões tais como: abandono, negligência, abuso, maustratos, a criança acaba sendo privada de conviver com sua família. Essa privação, conforme estudaremos a seguir deixará profundas cicatrizes que perdurarão por toda a vida dessa criança. 4.2 O abandono como fator de risco para o desenvolvimento psicológico. Antes de iniciarmos o ponto referente ao objeto deste tópico, acreditamos que se faz necessário tecer algumas considerações acerca da prática do abandono. Quando se fala em abandono de crianças ou recém nascidos, nos vem à mente a imagem de uma família pobre, que vê nesta possibilidade a alternativa para que seu filho possa ter uma vida digna. Entretanto, é possível observar que tal prática está presente em todas as camadas da nossa atual sociedade. Embora seja verdade que é na camada mais baixa que vemos tais situações ocorrerem com maior freqüência. Geralmente, o ato de abandonar um filho, não é uma decisão tomada repentinamente, mas é uma questão que está relacionada com a história de vida de cada pessoa. Nesse passo, destacamos a pertinente afirmação de Telma Sirlei Favaretto: O abandono de uma criança é a concretização da violência social, familiar e afetiva, e reproduz as relações de opressão de uma sociedade, seja esse abandono produzido por uma decisão individual ou oriunda de pressões externas. É uma violência resultante do acúmulo de “pequenas” violências sofridas pela mulher em seu cotidiano, que impulsionam a prática de tal ato como que justificando o próprio abandono pelo Estado, sociedade e família (...). A mulher que abandona o filho, de alguma maneira, foi rejeitada pela família e, sentindo-se desamparada, com medo, insegura, com relação ao futuro, encontra como solução o abandono do filho. 15 15 FAVARETTO, Telma S. F. A mulher e o abandono de recém-nascido: uma análise transdiciplinar. In: CASTRO, A. et al. Pessoa, gênero e família: uma visão integrada do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. 139- 141 p. 16 A autora coloca que o ato de abandonar pode estar baseado em “questões externas”, como por exemplo: dificuldade financeira, representada como uma forma de violência invisível, onde o abandono seria uma forma de “proteger” a criança de situações de fome, frio, miséria. Diferentemente da violência visível, que pode ser representada pela agressão física, pelo abuso sexual sofrido pela mãe que vê no seu filho a lembrança constante do fato. A autora ainda apresenta a violência emocional sofrida pela mulher em sua família de origem, onde através de pronunciamentos e gestos, a mulher acaba por ter sua auto-estima ferida, fazendo-a abandonar seu filho, por sentir-se desamparada e incapaz de criar uma criança. A gravidez fora do casamento, bem como a mulher que engravida e é abandonada pelo companheiro, são outros fatores apontados pela autora que podem levar uma mãe a abandonar seu filho. Enfim, essas mães são mulheres, que na sua maioria não têm esperança de terem uma vida melhor, não enxergam nenhuma perspectiva de mudança em suas próprias vidas. Entretanto, não podemos atribuir apenas à mulher o ônus de abandonar o filho, uma vez que as hipóteses acima citadas referiram-se às situações onde a mulher estava só, sem a presença de um companheiro. Porém, é imperioso frisar que há sim muitas famílias, onde há um pai e uma mãe que acabam praticando atos de negligência, abuso e maus-tratos, para com seus filhos, fazendo com que os mesmos sejam privados de sua convivência. Um exemplo, que pode ser utilizado para ilustrar tal situação é o do casal dependente de drogas ou álcool que deixa o filho “abandonado” dentro da sua própria casa. Nessas situações, a separação com a família, (no caso, os pais) torna-se necessária, como uma forma de garantir a sobrevivência da criança. Conforme já falado no tópico anterior, quando um bebê nasce, ele não reconhece a diferença entre o mundo externo e ele próprio. Porém, ele consegue a partir de competências que já possui ao nascer, relacionar-se com o seu mundo. Mundo que será representado pelas pessoas que cuidam dele, que estão à sua volta, ou seja, seus pais. Assim, a família, representada pelos pais é muito importante, nesse estágio inicial da vida da criança, uma vez que é ela que vai dar ao filho o caráter de humanidade, é ela que vai moldar o ser humano. Com base, nessa primeira consideração, destacamos novamente as sábias palavras de Maria Lucrécia Sherer Zavaschi: As primeiras percepções do bebê devem ser prazerosas, à medida que suas necessidades são percebidas, e satisfeitas. Nesta idade (primeiros meses), a criança não tem condições de suportar muitas ou prolongadas privações. A criança saudável, portadora de privilegiada carga genética, de ambiente suficientemente bom e que recebe os 17 cuidados e o leite materno terá a sensação prazerosa de bem estar e verá o mundo inicialmente com o olhar do prazer, da segurança e da confiança. Nesse início, as sensações boas são identificadas com a mãe boa, primeiro objeto de seu amor, fonte de alimento e bem estar, representante assim do mundo. Levando a criança a uma sensação de CONFIANÇA. Para que o bebê tenha a sensação de confiança, precisa desenvolver uma experiência subjetiva descrita por Bowlby como APEGO “é um apaixonar-se, manter um vínculo como amar alguém. (...) A ameaça de uma perda real causa ansiedade, tristeza e, enquanto ambas as sensações despertam raiva. Finalmente a manutenção de um vínculo, sem ameaças, é vivida como uma fonte de segurança e seu prolongamento como uma fonte de alegria. 16 Assim, a autora evidencia a importância e a necessidade que o bebê tem de sua família. Entretanto, se o bebê for privado de tal convivência, certamente ele terá profundas lacunas em sua personalidade, lacunas que se expressarão através de falhas em seu desenvolvimento. Tais falhas serão representadas através de sensações desagradáveis, como, por exemplo, a de desintegrar-se, de cair em um abismo, de ter em sua mente a constante sensação de ansiedade como experiência constante, ao invés de segurança e tranqüilidade. Essas sensações desagradáveis ficam “gravadas” em sua mente, em seu sistema. Neuro endócrino e deixarão marcas que se renovarão a cada nova sensação de insegurança. Pode ocorrer que um bebê que tenha sofrido tal experiência, em sua vida adulta seja uma pessoa com tendência a sofrer de depressão, por exemplo. De acordo com Maria Aparecida Domingues de Oliveira, do nascimento, até aproximadamente os cinco anos de idade a criança está vivendo o período denominado de anos formativos. Ou seja, “é a fase da formação da estrutura nervosa que servirá de base para toda a vida do indivíduo. 17 Dos cinco aos sete e dos sete aos dezoito haverá uma formação em grau decrescente de intensidade. Isso, porém, não significa que o indivíduo não aprende após os dezoito anos, mas que tais processos, são mais marcantes e fortes nas primeiras fases da vida. Pois é a fase 16 ZAVASCHI, Maria Lucrecia Sherer. A criança necessita de uma família. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 63- 64. p 17 OLIVEIRA, Maria A D. A neuro-psico-sociologia do abandono/mau trato familiar. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 286 p. 18 em se forma a memória, que nunca será apagada, também denominada pela autora de engramas. Dessa forma, é nos anos formativos (do nascimento aos 5 anos) que a criança vai absorver os estímulos externos, principalmente os dolorosos, provenientes de situações de rejeição, maus tratos ou abandono. O cérebro da criança captará esses estímulos como: “ninguém gosta de mim”, “ninguém me quer”, “não tenho como sobreviver sem ninguém”, “vou morrer”. Esses pensamentos, sentimentos e sensações ocorrerão de forma subjetiva na mente da criança, uma vez que, devido sua tenra idade ela ainda não terá uma real consciência da situação. Porém, mesmo sem essa real consciência, seus instintos de sobrevivência desencadearão na tentativa de evitar esses estímulos dolorosos, várias reações hormonais, elétricas e químicas, formando um engrama (memória) de defesa que perdurará por toda sua vida. Assim, o estímulo doloroso, é capaz de alterar as estruturas do cérebro e tal modificação uma vez processada, ocorre de forma permanente. Nesse sentido, ensina a autora: A psicologia já demonstrou que o abandono, a rejeição e os maus tratos causam depressão e que esta, dependendo do grau de intensidade que acomete o indivíduo, pode levar a trágicas conseqüências [...]. As alterações no funcionamento cerebral decorrentes da ação punitiva do meio social- lembremos que o principal meio social da criança é a família- estão na raiz de muitos tipos de condutas inadaptadas, como a conduta violenta, e de patologias, como a depressão, a mania, o pânico, as fobias, as psicopatias, entre outras.189 Nessa mesma linha de pensamento, Paul D. Steinhauer, em seu estudo denominado “Adoção”, tece algumas considerações a respeito da situação de privação pela qual passa a criança, bem como dos problemas que tal fato pode acarretar posteriormente, quando essa criança for adotada: 18 OLIVEIRA, Maria A D. A neuro-psico-sociologia do abandono/mau trato familiar. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 286 287 p. 19 Crianças com uma história de privação severa e múltiplos lares, especialmente dentro dos primeiros dois anos de vida, correm maior risco de colapso de adoção. Essas crianças são passíveis de terem problemas mais freqüentes na escola, em seu comportamento social fora de casa e em suas relações sociais. Considerados em conjunto, estes inevitavelmente impõem tensão adicional sobre suas relações com seus pais adotivos, por mais compreensivos que esses possam ser.[...] A confusão de identidade durante a adolescência é exagerada para muitos adotados devido à freqüência de problemas de vinculação que arruínam gradualmente o senso de pertencer da criança dentro da família adotiva e a presença contínua (na fantasia ou na vida real) dos pais de nascimento. [...] Crianças adotadas são mais hostis, inseguras e carentes de atenção do que crianças não adotadas.[...] Fatores temperamentais herdados, especialmente quando agravados pelas seqüelas de longo prazo de privação e descontinuidade, deixam muitos adotados mais velhos com dificuldade de convivência sozinhos sem amor.19 O autor em seu estudo ultrapassa a situação inicial do abandono, para demonstrar as conseqüências que esta criança terá anos mais tarde. Conseqüências que poderão comprometer não só seu desenvolvimento emocional, como sua relação pessoal com sua própria família adotiva. Dessa forma, fica evidente que quando uma criança é separada de sua família, ocorrerá uma severa RUPTURA em seu desenvolvimento, pois, ela crescerá em condições desfavoráveis, será mais vulnerável e apresentará maior ansiedade frente a situações novas. Uma vez que ela terá por base modelos e padrões distorcidos, doentios, com os quais se identificará quando atingir a idade adulta fazendo com que o ciclo, que a ruptura se repita em relação ao seu filho e assim sucessivamente. No tópico seguinte veremos que existem milhares de famílias dispostas a adotar uma criança e tentar minimizar o sofrimento causado pela separação com sua família de origem. Entretanto, estudos demonstram que não é qualquer criança que se busca adotar, que há um perfil perseguido pela maioria dos futuros pais adotivos. 19 STEINHAUER, Paul. .Adoção. In: GARFINKEL, B. CARLSON, G; WELLER, E.Transtornos Psiquiátricos na Infância e Adolescência. Porto Alegre: Artes Médicas, 1992. 367 – 370 p. 20 4.3 O perfil desejado pelas famílias Quando se fala em adoção nos vêm à mente, a imagem de um casal ávido para dar amor, dar um lar para uma criança, para exercer a maternidade/paternidade. Porém, a realidade demonstra que esse casal já tem em mente a figura idealizada de uma linda criança, gordinha, saudável, de preferência recém nascida, ou com poucos meses de vida, do sexo feminino e que tenha alguma característica física parecida com a sua: a cor da pele, dos cabelos, dos olhos. Entretanto, quando esse mesmo casal visita um abrigo, em busca de seu filho perfeito acaba desenvolvendo um sentimento de frustração, pois, geralmente ao invés da criança dos sonhos, ele encontrará crianças reais. O tópico em análise tem por base um estudo científico desenvolvido por Lídia Levy e Eva G. Jonathan denominado: “A criança adotada no imaginário social”. Merece destaque a parte referente às características (físicas e mentais) que se busca ao adotar uma criança O estudo comprovou que entre as características almejadas por um casal quando busca adotar uma criança está o fato de que a mesma seja recém nascida. As autoras comprovaram que um dos preconceitos relacionados ao ato de adotar é o fator genético, ou seja, a herança genética trazida pela criança, poderia ser capaz de fazer da adoção um projeto de risco. Por este motivo, o futuro adotante acredita que, se a criança for recém-nascida, ele poderá fazer com que seu desenvolvimento ocorra a partir de suas crenças e convicções fazendo com que o fator genético não se manifeste com muita intensidade. Os candidatos a pais adotivos, também buscam uma criança saudável. Tal afirmação decorre do fato de que eles temem enfrentar uma situação para o qual não estejam preparados ou disponíveis. Um outro aspecto valorizado pelos pais adotivos refere-se à semelhança. Assim, eles buscarão uma criança com suas características físicas e raciais, para que a mesma possa ser identificada como pertencente àquele núcleo familiar. Os brasileiros evidenciaram uma preferência por crianças brancas e do sexo feminino. Isso se reflete no temor que eles tem que quando essa criança chegar à adolescência apresente “problemas” oriundos de sua carga genética, como por exemplo, uma tendência ao alcoolismo, ou ainda que o adolescente se revolte e prefira seus pais biológicos. Sendo uma menina, eles teriam a sensação de que seria mais “fácil controlar” do que se fosse um menino. Na realidade o casal quando chega ao abrigo acaba se deparando com crianças reais. Ou seja, crianças, feias, malcriadas, crescidas, uma vez que as mais novas vão embora, 21 enquanto as mais velhas acabam ficando. Crianças com problemas de saúde, (desnutridas, com doenças cardio-respiratórias, cegas, surdas, mudas). Crianças com problemas físicos (paraplegia, tetraplegia, falta de alguma parte do corpo, como um braço, por exemplo). Crianças com problemas mentais (síndromes, retardo, paralisia cerebral, neuróticas, psicóticas, deprimidas, esquizofrênicas). Enfim, tais crianças acabam sendo consideradas crianças inadotáveis, pois, apresentam algum tipo de “defeito” que faz com que ninguém as queira, com que sejam duplamente rejeitadas. Primeiro por seus pais biológicos, segundo pelos candidatos a pais adotantes. Tal rejeição faz com que elas sejam condenadas a permanecerem nos abrigos, a continuarem excluídas da sociedade e do direito de terem uma família e uma vida digna. Assim, muito se fala na demora da adoção, nas enormes filas, na imensa quantidade de crianças nos abrigos. O que, no entanto, não se fala, é que muitas pessoas ficam aguardando a criança “perfeita” e acabam desistindo de adotar a criança feia, doente, deficiente que lá está, esperando ansiosamente pela oportunidade de receber amor, carinho, proteção. De ter a chance de ter uma família, de ter uma vida digna, alegre e feliz, conforme garante nossa Constituição. 4.4 A realidade das instituições de abrigo O termo abrigar, a partir de acepções atuais pode ter os seguintes significados: refúgio, moradia, ninho, recanto, esconderijo, acolhida. É possível deduzir a partir dos termos citados uma noção de recolhimento e isolamento social. Analisando a história de nosso país é possível constatar que tais instituições existem desde o período colonial. Inicialmente, como uma forma de afastar dos olhos da sociedade questões que feriam a ordem social e a dignidade humana, ou seja, a situação de abandono de crianças e os maus-tratos na família. Atualmente, o abrigo é tido a partir do Estatuto da Criança e do Adolescente, como uma medida de proteção, porém tal medida deve ser aplicada a partir de situações excepcionais, quando a convivência familiar representar um risco para a criança ou adolescente. Diante dessa afirmação Rizzini & Rizzini lecionam, “o abrigo representa uma medida de proteção à criança que experimenta situações cotidianas de grave risco à sua integridade física, psicológica e sexual”.20 20 RIZZINI, I & RIZZINI, I. A institucionalização de crianças no Brasil: Percurso histórico e desafios presentes. Rio de Janeiro: Puc. 2004. 22 Assim sendo, o abrigo muitas vezes significa a chance que uma criança tem de continuar sobrevivendo, uma vez que oferece todos os cuidados básicos necessários para o seu desenvolvimento: moradia, alimentação, vestuário, cuidados diários. Contudo, o abrigo também acaba por expor esta criança ou adolescente a situações de risco, como, por exemplo, o risco de aumentar a ruptura de vínculos familiares e a segregação social, pois os abrigados não têm uma convivência social, como as demais pessoas, já que estão confinados, “presos”. O ECA também confere ao abrigo caráter de provisoriedade, devendo ser utilizado como uma forma de transição para colocação de criança ou adolescente O ECA também confere ao abrigo caráter de provisoriedade, devendo ser utilizado como uma forma de transição para colocação de criança ou adolescente em família substituta, não implicando em privação de liberdade. O abrigo deveria ser um local de moradia temporária, mas a realidade tem demonstrado que há crianças que passam a infância inteira no abrigo e quando atingem a maioridade são obrigadas a irem embora. Esses jovens saem dos abrigos sem nenhuma perspectiva de futuro e acabam muitas vezes, ingressando no mundo do crime, para voltarem novamente para uma “instituição”, já que não sabem sobreviver sozinhos. Nesse passo, afirma Dani Laura Peruzzolo: Mas não havendo a possibilidade de armar vínculos familiares, as crianças vão crescendo dentro da Instituição até alcançar a idade de 18 anos. Neste período, já adolescentes, são desligados da Instituição mesmo não estando preparados para iniciar um novo momento de suas vidas sozinhos, isto é, sem a tutela, o carinho, e muitas vezes, sem nenhuma referência externa ao abrigo que possa acolhê-lo nos momentos futuros. 21 A autora apresenta como alternativa para minimizar o problema, o desenvolvimento de propostas educacionais visando uma compreensão da realidade a partir de práticas de solidariedade, comunicação e diálogo. A nova Lei Nacional de Adoção como anteriormente foi falado está preocupada com as questões expostas no presente tópico, para tanto, regula um tempo mínimo de permanência da criança/adolescente nos abrigos, que é o de dois anos. Bem como um prazo para que ocorra a destituição do poder familiar. O que se busca com isso, é fazer com que a criança ou 21PERUZZOLO, Dani L. O desafio da educação para o desligamento de adolescentes institucionalizados em abrigos de proteção especial. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 286 – 287 p. 23 adolescente passe o menor tempo possível no abrigo. Para que futuramente, possa lembrar-se dele como um local de acolhida, de refúgio, que serviu de moradia temporária. E não como o local onde passou grande parte de sua infância, ou até mesmo toda ela. 5. CASUÍSTICA O último tópico do presente trabalho visa demonstrar a partir de um levantamento estatístico realizado por iniciativa de Procuradores e Promotores de Justiça das áreas da Família, Infância e Juventude, sob a coordenação da Procuradora de Justiça do Rio Grande do Sul Maria Ignez Franco Santos a realidade da situação das crianças e adolescentes que vivem em um abrigo. Para tanto, utilizou-se como base para pesquisa o “Núcleo de Abrigos Residenciais de Belém Novo” em Porto Alegre, que à época contava com 91 crianças e adolescentes. Esse número representava apenas 10% da população abrigada em Porto Alegre. O levantamento ocorreu no ano de 2001, precisamente em junho e teve a duração de um ano. Buscaremos a seguir destacar os dados estatísticos referentes aos aspectos que julgamos mais importantes da pesquisa realizada no abrigo. Dados que vêm de encontro com o que até o momento foi abordado em temos teóricos. • Sexo dos abrigados: • 45-meninos; • 46- meninas. • Cor dos abrigados: • Branca-45 crianças/adolescentes; • Negra-29 crianças/adolescentes; • Mista-17 crianças/adolescentes. • Saúde dos abrigados: • Portadores de deficiência mental-10 crianças/adolescentes; • Portadores de deficiência física-03 crianças/adolescentes; • Portadores de necessidades especiais-05 crianças/adolescentes; • Normais-73 crianças/adolescentes. • Grupos de Irmãos: • Número de grupos-22; 24 • Total de crianças/adolescentes-51; • Cadastrados para adoção-07 crianças/adolescentes. • Motivos do abrigamento: • Negligência-71 crianças/adolescentes; • Orfandade-03 crianças/adolescentes; • Abuso sexual-10 crianças/adolescentes; • Outros-07 crianças/adolescentes. • Idade da criança/adolescente à época do abrigamento: • Até 1 ano-09 crianças; • 1-4 anos-23 crianças; • 4-7 anos-28 crianças; • 7-10 anos-13 crianças; • 10-14 anos-07 crianças; • 14-17 anos-02 adolescentes; • Sem infgormação-09. • Idade atual: • Até 1 ano-01 criança; • 1-5 anos-12 crianças; • 6-9 anos-14 crianças; • 10-14 anos-29 crianças; • 15-18 anos-28 adolescentes; • 19-20 anos-05 adolescentes; • Sem informação-02 crianças/adolescentes. • Tempo de abrigamento: • Até 1 ano-18 crianças/adolescentes; • 1-2 anos-15 crianças/adolescentes; • 2-3-anos-09 crianças/adolescentes; • 3-4 anos-01 criança/adolescente; • 4-5 anos-03 crianças/adolescentes; • 5-6 anos-07 crianças/adolescentes; • 6-7 anos-04 crianças/adolescentes; • 7-8 anos-04crianças/adolescentes; 25 • 8-9 anos-01 criança/adolescente; • 9-10 anos-06 crianças/adolescentes; • 10-11 anos-05 crianças/adolescentes; • 11-12 anos-07 crianças/adolescentes; • 12-13 anos-02 crianças/adolescentes; • 13-14 anos-02 crianças/adolescentes; • Sem informação-07 crianças/adolescentes. • Situação Jurídica das crianças/adolescentes abrigados: • Indefinido-43 crianças/adolescentes; • Destituídos-36 crianças/adolescentes; • Suspensos-12 crianças/adolescentes. • Situação das crianças/adolescentes destituídas do poder familiar que recebem e/ou visitam seus familiares: • Visitam-11 crianças/adolescentes; • Não visitam-25 crianças/adolescentes. • Cadastrados para adoção (destituídos do poder familiar): • Sim-14 crianças e adolescentes; • Não-77 crianças/adolescentes. Com base no levantamento apresentado, o grupo de voluntários coordenado pela Procuradora de Justiça identificou que: -O procedimento de suspensão ou destituição do poder familiar leva em média três anos para ocorrer. Quando o ideal seria que levasse aproximadamente 06 meses; -As suspensões do poder familiar, de modo geral, não são revistas juridicamente, eternizando-se. O levantamento revelou que nenhum dos casos de suspensão (ou seja, 12 crianças/adolescentes) havia sequer sido apreciado; -Descompasso entre os abrigados e os cadastrados para adoção. Em um universo de 91 abrigados, apenas 36 estavam destituídos do poder familiar mas somente 14 estavam cadastrados para a adoção. Enquanto que 77 abrigados nem constavam do rol de disponíveis para a adoção. Os dados acima elencados vêm comprovar a difícil realidade de quem vive em um abrigo aguardando por um lar. 26 6 CONCLUSÃO Vimos ao longo do trabalho que a adoção visa colocar a criança ou adolescente ou até mesmo o adulto em uma família substituta, para que os mesmos tenham condições de se desenvolverem em um ambiente cercado de amor, cuidado e proteção. Essa família pode ser composta não somente por um casal, mas por pessoas solteiras, divorciadas, viúvas, estrangeiras, bem como pelos tutores ou curadores. A adoção atribui ao adotado os mesmos direitos de filho natural, inclusive os sucessórios, bem como rompe os laços com a família biológica. Assim, o ato de adotar deverá ser profundamente analisado pelo(s) futuro(s) adotante(s), uma vez que é irrevogável. Não há como se arrepender, pois, a responsabilidade assumida é para toda a vida. Através da pesquisa, foi possível observar que há um grande número de crianças nos abrigos. O abrigo tem por objetivo ser um local de passagem, onde provisoriamente a criança ou adolescente ficará até que possa voltar para sua casa, ao convívio de algum familiar ou ainda, até encontrar uma família substituta. Porém, a realidade infelizmente demonstra, que muitas crianças passam toda a infância no abrigo e quando saem já adultos não sabem como sobreviver no mundo “externo”, uma vez que somente conhecem a realidade do abrigo. Nessas situações, o ideal seria haver programas educacionais e de profissionalização para esses jovens. Percebemos também que a demora se deve principalmente a dois fatores: ao descaso das autoridades judiciárias em regulamentar a destituição do poder familiar, e ao perfil desejado pelas famílias. De acordo com os dados estatísticos apresentados pela Promotora de Justiça Maria Ignez Franco ficou evidente o distanciamento entre o que foi previsto no Estatuto da Criança e Adolescente e o que de fato ocorre. O direito da criança a uma família não é assegurado como deveria. Prova disso é o grande número de crianças que estão com seus processos de suspensão do poder familiar totalmente parados. Essa inércia faz com que o tempo de estadia nos abrigos aumente e quanto maior o tempo no abrigo, mais difícil será encontrar um lar. Assim, é possível observar que em muitos abrigos há muitas crianças ou adolescentes, que não estão aptas para adoção, ficando condenadas a crescerem sem uma família. Um outro aspecto importante consiste no fato de que os futuros adotantes têm em mente um perfil de criança e muitas vezes frustram-se quando se deparam com a realidade dos abrigos (crianças de mais idade, feias, com deficiências físicas e mentais, doentes). Os bebês são os mais desejados, seguidos de meninas brancas, assim tendem a não permanecerem por 27 muito tempo no abrigo. Aqueles que não correspondem ao padrão de “filho ideal” acabam rejeitados e excluídos do direito ao convívio familiar. As conseqüências sofridas por quem espera por uma família podem ser irreversíveis. Diversos estudos na área da psicologia evidenciam a necessidade vital que a família representa para uma criança. As crianças precisam de cuidado, de carinho, de amor e proteção vindos principalmente de seus pais. O bebê depende de sua mãe para sobreviver, pois é ela quem provê alimento para seu corpo e para sua mente. A partir do toque, do carinho da presença constante o bebê sentirá segurança e se desenvolverá de forma sadia. Crescer sem esse “alimento” certamente trará problemas psicológicos que se refletirão em sua vida adulta. A necessidade de uma família é indispensável não somente para os bebês, mas para todos, sejam crianças, adolescentes ou adultos. É na família que está a base do ser humano, sua fortaleza, de onde se adquire valores que futuramente serão transmitidos. A família, o lar deve representar segurança e proteção e deve ser repleta de respeito e de amor entre seus entes. Privar crianças ou adolescentes da convivência em família é o mesmo que deixá-las abandonadas “à própria sorte”. De acordo com o que foi acima exposto espera-se que a Nova Lei Nacional de adoção consiga diminuir essa triste realidade. Fazendo com que o abrigo possa cumprir seu real objetivo de ser um lugar de passagem, para que as crianças possam se lembrar da infância que tiveram com saudade e não com tristeza. Que a sociedade também se conscientize, principalmente, os governantes e autoridades judiciárias fazendo com que os direitos sejam realmente defendidos e respeitados. A partir da realização do trabalho pude perceber que realmente há burocracia no procedimento da adoção por parte das autoridades, há descaso por parte do Estado, mas também há muito preconceito em nossa sociedade. Descartar uma criança porque ela não tem a cor, a idade ou a saúde desejada é perder uma oportunidade de mudar a vida de alguém. É desperdiçar a chance, talvez única, de ser muito mais realizado, muito mais completo, muito mais feliz. 7.REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BRASIL. Projeto que estatui a nova Lei Nacional de adoção. Brasília, DF, 2009. Disponível em <http:mercadante.com.br/notícias/ultimas/lei-nacional-de-adocao-e-aprovada-no-senadoe-segue-para-sançao-presidencial>.Acesso em 30 jul. 2009. 28 DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 2. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. __________ O Direito ao Ninho. In: AZAMBUJA, Maria R. F.; SILVEIRA, M. V.; BRUNO, D. D.Infância em família um compromisso de todos. Porto Alegre: Instituto Brasileiro de Direito de Família, 2004. 14 p. FAVARETTO, Telma S. F. A mulher e o abandono de recém-nascido: uma análise transdiciplinar. In: CASTRO, A. et al. Pessoa, gênero e família: uma visão integrada do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2002. 139- 141 p. FILHO, Arthur Marques da Silva. 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