CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA, PESQUISA E EXTENSÃO
MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO LOCAL
ALDA MARIA SILVA FRANCISCO
AS PRÁTICAS DE GESTÃO E DE DOCÊNCIA NA REDE MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM, ESPÍRITO
SANTO, A PARTIR DA LEI 10.639/03
Belo Horizonte
2012
ALDA MARIA SILVA FRANCISCO
AS PRÁTICAS DE GESTÃO E DE DOCÊNCIA NA REDE MUNICIPAL
DE EDUCAÇÃO DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM, ESPÍRITO
SANTO, A PARTIR DA LEI 10.639/03
Dissertação apresentada à Banca de
Mestrado em Gestão Social, Educação e
Desenvolvimento
Local
do
Centro
Universitário UNA, como requisito parcial
à obtenção do título de Mestre.
Área
de
Concentração:
Inovações
Sociais, Educação e Desenvolvimento
Local
Linha
de
Pesquisa:
Processos
Educacionais: Tecnologias Sociais e
Gestão do Desenvolvimento Local
Orientadora:
Profa.
Gonçalves Quaresma
Belo Horizonte
2012
Dra.
Adilene
F818p
Francisco, Alda Maria Silva
As práticas de gestão e de docência na rede municipal de educação de
Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo, a partir da Lei 10.639/03. / Alda Maria
Silva Francisco. – 2012.
201f.: il.
Orientadora: Profa. Dra. Adilene Gonçalves Quaresma.
Dissertação (Mestrado) - Centro Universitário UNA, 2012. Programa de
Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local.
Bibliografia f. 102-105.
Ficha catalográfica desenvolvida pela Biblioteca UNA campus Guajajaras
“A luta pela superação do racismo e da discriminação
racial é [...] de todo e qualquer educador, independente do
teu pertencimento étnico-racial, crença religiosa ou
posição política.” (Relatório do Conselho Nacional de
Educação, 2004).
Agradecimentos
Agradeço primeiramente a Deus, pelo dom de viver, por todas as oportunidades em
minha vida e pelas bênçãos concedidas.
Ao meu esposo, Gilberto da Silva Francisco, por construir e partilhar as trilhas desta
empreitada com compreensão da minha ausência e doação do seu tempo, me
ajudando em tudo que podia, além da generosidade, paciência e sabedoria
dedicadas a mim e ao meu trabalho.
Ao incentivo de todos os colegas de trabalho do Centro Universitário São Camilo
(ES), especialmente ao apoio incondicional do Reitor, Padre João Batista Gomes de
Lima.
Aos companheiros de luta pela educação da EMEB “São Luiz Gonzaga”, por
acreditar em mim e pela compreensão.
Às Escolas da Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim e seus
gestores, pedagogos e professores em geral, que contribuíram e se dispuseram a
me situar na pesquisa com uma participação ativa.
À Professora Dra. Rosalina Batista Braga, que iniciou toda uma caminhada de
orientação afetuosa, ao mesmo tempo exigente e valiosa, a qual gerou o Projeto de
Pesquisa desta Dissertação.
À minha Orientadora Profa. Dra. Adilene Gonçalves Quaresma, pelo imenso apoio,
incentivo e grandes contribuições para o encaminhamento desta pesquisa, além de
se fazer sempre presente e estimuladora, o que muito elevou a minha autoestima.
Agradeço a todos que contribuíram direta ou indiretamente para a realização deste
trabalho.
A todos, muito obrigada!
Dedicatória
Dedico primeiramente aos meus pais, Alvino Bello da Silva e Analia da Conceição
Silva (in memoriam), pelo testemunho de vida, de dignidade, humildade e doação,
ensinando valores éticos, morais e espirituais. Com muita garra e determinação, eles
possibilitaram minha formação e a dos meus 13 irmãos.
Ao meu esposo, Gilberto da Silva Francisco, pela renúncia, valorização, luta, apoio e
histórias vividas cheias de compreensão, sabedoria e amor.
Aos meus filhos Gilmar, Anderson e Letícia da Silva Francisco, frutos do amor, os
quais me ensinaram o encantamento pelo ser humano.
Aos meus netos Marianna e Gabriel, na esperança de construção de um mundo
melhor e aos quais quero deixar como herança os exemplos de vida.
Dedico este trabalho a todos aqueles que acreditam em uma educação de
qualidade, sem distinção de nenhuma natureza, a fim de construirmos, desta
maneira, uma nação mais inclusiva, humana e solidária.
Resumo
Com a aprovação da Lei 10.639/03, tornou-se obrigatório que as escolas de
Educação Básica pública e privada trabalhem a História e a Cultura Afro-Brasileira.
Essa lei é resultado também de antigas reivindicações e negociações entre o
Movimento Negro e os órgãos do Estado, com destaque àqueles ligados à
Educação. Sabe-se que o negro enfrenta no país barreiras raciais e sociais no seu
cotidiano, uma vez que as desigualdades sociais estão presentes em nossa
sociedade como reflexo de uma estrutura construída ao longo de uma história de
escravização. Há séculos o negro enfrenta no país desigualdades provenientes do
regime escravocrata do Período Colonial, porém vem lutando pela construção de
espaços de liberdade e de direitos para maior bem-estar de seus descendentes.
Assim, o presente trabalho teve como objetivo principal analisar e compreender as
práticas no âmbito da gestão e da docência na realização e operacionalização da Lei
10.639/03 com vistas à superação do racismo nas escolas de Educação Básica do
município de Cachoeiro de Itapemirim. A História nos mostra que, a partir da vinda
dos negros para o Brasil, iniciou-se toda uma trajetória de luta de resistência, desde
os cativeiros, com a formação de quilombos e dos movimentos MNU e MN, de lutas
em prol da causa dos negros. Tudo isso visando à busca de humanização do seu
povo e prosseguindo com a formação de diversas entidades locais, regionais e
nacionais, numa trajetória de luta contra o racismo, discriminação e preconceito,
resultantes da predominância da cultura europeia no Brasil. É necessário
reconhecer, aceitar e conviver com essa diversidade, respeitando-se alguns
aspectos e desconstruindo outros. Os estudos teóricos foram baseados numa série
de fontes, desde textos clássicos sobre a temática, como o livro Casa Grande e
Senzala, de Gilberto Freyre, até textos de trabalhos mais recentes de diversos
autores, dentre eles Gomes (2007) e Munanga (1996, 2003, 2005 e 2006), dentre
outros. Esta pesquisa se fundamentou dentro de um contexto da teoria crítica da
educação, numa associação entre a pesquisa qualitativa e quantitativa de caráter
exploratório em que foram aplicados questionários, seguidos de entrevistas
semiestruturadas, onde se percebeu a importância de empenhar-se na construção
de uma prática pedagógica que destaque o negro como sujeito ativo na construção
de nossa sociedade. Este é um dos grandes desafios que se tem enfrentado na
Rede Municipal de Educação. Nesta perspectiva, foi elaborado um Produto da
Dissertação para proporcionar aos gestores, pedagogos e professores o
desenvolvimento de uma prática pedagógica voltada para a questão do racismo de
forma processual e inclusiva.
Palavras-chave: Lei 10.639/03. Educação. Racismo. Prática pedagógica.
Resumen
Con la aprobación de la Ley 10.639/03, se tornó obligatorio que las escuelas de
Educación Básica públicas y privadas trabajen la História y la Cultura Afro Brasilera.
Esa ley es resultado también de antiguas reivindicaciones y negociaciones entre el
Movimiento Negro y los órganos del Estado, con énfasis en aquellos ligados a la
Educación. Se sabe que el negro enfrenta en el país barreras raciales y sociales en
lo cotidiano, una vez que las desigualdades sociales están presentes en nuestra
sociedad como reflejo de una estructura construída a lo largo de una historia de
esclavización. Hace siglos el negro enfrenta en el país desigualdades provenientes
del régimen esclavista del Período Colonial, sin embargo viene luchando por la
construcción de espacios de libertad y de derechos para mayor bienestar de sus
descendientes. Así, el presente trabajo tuvo como objetivo principal analizar y
comprender las prácticas en el ámbito de la gestión y de la docencia en la
realización de operatividad de la Ley 10.639/03 con vistas a la superación del
racismo en las escuelas de Educación Básica del municipio de Cachoeiro de
Itapemirim. La Historia nos muestra que, a partir de la llegada de los negros a
Brasil, se inició toda una trayectoria de lucha de resistencia, desde los cautiverios,
con la formación de quilombos y de los movimientos MNU y MN, de luchas en pro de
la causa de los negros. Todo eso con el objetivo de buscar la humanización de su
pueblo y prosiguiendo con la formación de diversas entidades locales, regionales y
nacionales, en una trayectoria de lucha contra el racismo, la discriminación y el
prejuicio, resultantes del predominio de la cultura europea en Brasil. Es necesario
reconocer, aceptar y convivir con esa diversidad, respetándose algunos aspectos y
desarticulando otros. Los estudios teóricos fueron basados en una serie de fuentes,
desde textos clásicos sobre la temática, como el libro Casa Grande e Senzala, de
Gilberto Freyre, hasta textos de trabajos más recientes de diversos autores, entre
ellos Gomes (2007) y Munanga (1996, 2003, 2005 y 2006) entre otros. Esta
investigación se fundamentó dentro de un contexto de la teoría crítica de la
educación, en una asociación entre la pesquisa cualitativa y cuantitativa de carácter
exploratorio en que fueran aplicados cuestionarios, seguidos de entrevistas
semiestructuradas, donde se percibió la importancia de empeñarse en la
construcción de una práctica pedagógica que destaque al negro como sujeto activo
en la construcción de nuestra sociedad. Este es uno de los grandes desafíos que se
han enfrentado en la Red Municipal de Educación. Desde esta perspectiva, fue
elaborado un Producto de la Disertación para proporcionar a los gestores,
pedagogos y profesores el desenvolvimiento de una práctica pedagógica dirigida a la
cuestión del racismo de manera procesal e inclusiva.
Palabras llave: Ley 10.639/03. Educación. Racismo. Práctica pedagógica.
Abstract
With the approval of Law 10.639/03 it became mandatory for the basic education at
public and private schools work with the Afro-Brazilian, History and Culture. This law
is also the result of old claims and negotiations among the Black Movement and the
State sectors, especially those related to education. It is known that the black faces
in the country racial and social barriers in their daily lives, as are social inequalities in
our society, as a reflection of a structure built over a history of enslavement. For
centuries, the black face inequalities in the country from the slavery regime of the
Colonial Period, but are fighting for the construction of spaces of freedom and greater
rights for the welfare of their descendants. Thus, this study has as main objective
analyze and understand the practices in the management and teaching in the
implementation and operation of Law 10.639/03 aimed to overcoming racism in the
schools of basic education in the city of Itapemirim. History shows that from the
arrival of blacks in Brazil, started a whole trend of resistance struggle, from captivity,
with the formation of “quilombos” (runaways) or MNU and MN movements fighting for
the cause of blacks. All this in order to seek a humanization for these people, and
continuing with the formation of several local, regional and national entities, a record
of struggle against racism, discrimination and prejudice resulting from the dominance
of European culture in Brazil. It is necessary to recognize, accept and cope with this
diversity, respecting some aspects and deconstructing others. The theoretical studies
were based on a sort of sources, from classic texts about the subject, as the book
“Casa Grande e Senzala” by Gilberto Freyre to texts of more recent works of several
authors, like Gomes (2007), Munanga (1996, 2003, 2005 and 2006) among others.
This research was based within the context of a critical theory of education, an
association between the qualitative and quantitative research and exploratory
questionnaires that were applied, followed by interviews, where it was noted the
important endeavor in the construction of a pedagogical practice that highlights the
black as an active subject in the construction of our society. This is one of the biggest
challenges faced in the Municipal Education. With this in mind it was designed a
Dissertation's Product to provide administrators, teachers and educators a teaching
practice's development focused on the issue of racism in a procedural and inclusive
way.
Keywords - Law 10.639/03, education, racism, pedagogical practice
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
CEAFRO
Comissão de Estudos Afro-Brasileiros
CONAE
Conferência Nacional de Educação
ECA
Estatuto da Criança e do Adolescente
EEEF
Escola Estadual de Ensino Fundamental
EMEBs
Escolas Municipais de Educação Básica
DT
Designação Temporária
FNB
Frente Negra Brasileira
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
LDBEN
Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC
Ministério de Educação e Cultura
MN
Movimento Negro
MNU
Movimento Negro Unificado
OEA
Organização dos Estados Americanos
OIT
Organização Internacional do Trabalho
ONU
Organização das Nações Unidas
PCNs
Parâmetros Curriculares Nacionais
PNE
Plano Nacional de Educação
PPP
Projeto Político Pedagógico
Prof.
Professor
Q
Questionário
SEME
Secretaria Municipal de Educação
SEPPIR
Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade
Racial
TEN
Teatro Experimental do Negro
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Dados do Ensino Fundamental da Rede Municipal de Educação......
58
Quadro 2 - Quantitativos por Área de atuação dos Professores do 6º ao 9º ano
58
Quadro 3 - Categoria organizada para análise do Questionário...........................
66
Quadro 4 - Categoria organizada para análise das Entrevistas............................
78
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 –
Situação Funcional.........................................................................
67
Gráfico 2 –
Atuação..........................................................................................
67
Gráfico 3 –
Função na Atuação.......................................................................
67
Gráfico 4 –
Instituição de Formação................................................................
68
Gráfico 5
Habilitação Profissional.................................................................
68
Gráfico 6
Ano de Conclusão.........................................................................
69
Gráfico 7
Planejamento/Participação em Atividades Afro..............................
69
Gráfico 8
Caracterização na participação nas Atividades..............................
70
Gráfico 9
Vivência sobre a Questão do Racismo na Escola.........................
71
Gráfico 10
Conhecimento sobre a Lei 10.639/03.............................................
73
Gráfico 11
Propostas/ Atividades Étnico Racial recebidas..............................
74
Gráfico 12
Trabalhar a cultura Afro-Brasileira na sala de aula........................
75
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO......................................................................................................
13
2
O RACISMO NO BRASIL E OS MOVIMENTOS DE LUTA ANTIRRACISMO.....
21
2.1
Racismo: sua trajetória de luta, resistência e mudanças......................................
22
2.2
Discussões sobre raça e racismo.........................................................................
23
2.3
O racismo e as normativas internacionais e nacionais.........................................
28
2.4
O movimento negro (MN) ......................................................................................
36
3
A DISCUSSÃO SOBRE A QUESTÃO RACIAL: NA LEI E NA EDUCAÇÃO
41
3.1
As mudanças na questão racial na lei e na educação..........................................
44
4
4 A LEI E SUAS IMPLICAÇÕES NA PRÁTICA EDUCATIVA DAS ESCOLAS
DA REDE MUNICIPAL DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM...........................
53
4.1
O município de Cachoeiro de Itapemirim: breve histórico e a questão afro.........
53
5
METODOLOGIA...................................................................................................
62
5.1
Os caminhos da pesquisa.....................................................................................
62
6
AS PRÁTICAS DE GESTÃO E DOCÊNCIA NAS ESCOLAS MUNICIPAIS DE
CACHOEIRO
DE
ITAPEMIRIM
A
PARTIR
DA
LEI
10.630/03:
APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS DA PESQUISA....
65
6.1
O cenário, os sujeitos e percepções iniciais sobre o tema: os questionários.......
65
6.2
O contexto do racismo e as práticas pedagógicas desenvolvidas nas escolas a
7
partir da lei 10.639/03: os dados das entrevistas..................................................
77
CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................
96
REFERÊNCIAS....................................................................................................
102
APÊNDICE A: Questionário.................................................................................
105
APÊNDICE B: Entrevista......................................................................................
108
APÊNDICE C: - Quadro das escolas da rede municipal de educação de
Cachoeiro de Itapemirim.......................................................................................
110
APÊNDICE D: Produto de Dissertação...............................................................
111
ANEXO A: Sou negro ..........................................................................................
159
ANEXO B: Majestade África ................................................................................
160
ANEXO C: Kizomba, festa da raça.......................................................................
161
ANEXO D: Liberdade, Liberdade! Abra as asas sobre nós! ................................
162
ANEXO E: Lei 10.639/03....................................................................................
163
ANEXO F: Resolução nº 1, de 17 de junho de 2004 - Institui Diretrizes..............
164
ANEXO G: Resolução nº 1, de 17 de junho de 2004 – Parecer homologado.......
168
ANEXO H: Aprovação do Comitê de Ética............................................................ 199
13
1 INTRODUÇÃO
“Na luta contra o racismo, o silêncio é omissão”.
(Jacques d´Adesky)
Atualmente é de fundamental importância a implementação da Lei 10.639/03
nas Escolas de Educação Básica, pois trabalhar essa questão é uma grande
possibilidade de superação do racismo, uma vez que oportuniza o
conhecimento da trajetória histórica, costumes e práticas cotidianas, além de
gestores, pedagogos e professores fazerem uso de estratégias que possam
desconstruir a visão negativa dos africanos e dos afrodescendentes.
O presente estudo é fruto inicialmente de reflexões da minha vivência, pois a
escolha do tema perpassa o pessoal e se encontra entremeado com o desejo
de resgate de uma história coletiva que possa contribuir com a visibilidade dos
negros pelo viés da escola onde os gestores, pedagogos e docentes exercem
suas práticas educativas, e os discentes se constroem como sujeitos do
processo ensino-aprendizagem.
Iniciei minha carreira profissional em 1975 como professora do Ensino
Fundamental, em 1976 ingressei no Ensino Superior no Curso de Ciências –
Habilitação Matemática – e no mesmo ano comecei a atuar na área de Exatas
nas redes públicas e privadas. Fui enriquecendo minha prática pedagógica,
pois de 1983 a 1995 passei a atuar como Diretora da Escola Estadual de
Ensino Fundamental (EEEF) Oswaldo Machado em Cachoeiro de Itapemirim,
sendo reeleita várias vezes.
No período de 1996 a 2003 permaneci como professora de Matemática no
Ensino Fundamental e Médio nas redes públicas e privadas, sendo que em
2004 fui convidada a atuar como diretora escolar da EEEF Prof. Elísio Cortes
Imperial. A partir de 2005, com a municipalização das escolas de ensino
fundamental estaduais, fui convidada a assumir a Gestão da Escola Municipal
de Educação Básica (EMEB) São Luiz Gonzaga, uma escola localizada no
bairro considerado o segundo em número de negros do município. Depois de
14
um ano, passei pelo processo de eleição, obtendo 100% dos votos, e lá
permaneço até hoje.
Prosseguindo minha caminhada profissional e buscando novas perspectivas de
atuação, em 1997 iniciei minha atuação como Professora de Matemática no
Ensino Superior Privado nos cursos de Matemática e Pedagogia e, a partir de
2002, assumi a Coordenação do Curso de Matemática, estando nela até a
presente data.
Estes estudos são resultados das condições objetivas e subjetivas que
norteiam minha trajetória de vida, pois, desde primeiros anos de escola,
necessitava estudar muito, lutar para me destacar e provar que “apesar de
negra”, inferiorizada no ambiente escolar, não era pior que ninguém.
Nessa trajetória, tive bons e maus professores no que tange à discriminação
racial. Em minha infância, a grande maioria não percebia que nós, alunos
negros, éramos insultados e sofríamos agressões físicas, e que havia a recusa
de punir os responsáveis, achava-se melhor considerar “coisas de crianças”.
Muitos professores me tratavam de forma diferente e discriminatória; nas aulas,
explanavam sobre o negro e a escravidão nas formas mais desumanas e se
mantinham omissos à questão racial. Não tive nenhum professor ou professora
negra.
Hoje percebo que muitos deles agiam por desconhecimento – por não saber
como lidar com as situações constrangedoras enfrentadas pelas crianças
negras –, e outros, por omissão, pois compartilhavam o imaginário racista que
existia e ainda existe na nossa sociedade. Porém, isso tudo me impulsionou a
estudar sobre a temática e foram fundamentais em minha caminhada.
A partir da minha maternidade, se deu o momento em que intensifiquei minhas
reflexões sobre a relação entre o negro e a educação. Estas foram ganhando
corpo a partir das discriminações que os meus filhos sofriam na escola, como
se fosse normal acreditar que, porque se tem a pele mais clara, também se é
privilegiado, se tem o direito insultar, constranger a criança negra. Vale
15
destacar os desafios enfrentados durante toda minha caminhada profissional –
por ser mulher negra – que deixaram grandes marcas.
Agora, sendo avó, cresce em mim uma necessidade muito grande de intervir
de alguma forma, contribuindo com estudos e discussões para que a minha
história não se repita e que possa contribuir para ações que facultem reverter o
quadro do racismo, discriminação e preconceitos de nossa sociedade.
Por ter minhas vivências marcadas por discriminações (e as ver novamente
reeditadas na condição de mãe e avó), passei a realizar leituras e discussões
para um olhar mais crítico sobre a minha própria experiência como mulher,
negra, mãe e avó; buscando reescrever a minha história para que sirva de
incentivo, pois o negro, a partir da luta pela liberdade de ser e viver, tem uma
herança histórica a ser conhecida e enriquecida.
Hoje, como professora, gestora escolar e como coordenadora de curso,
acredito no papel do educador como mediador entre um saber culturalmente
acumulado pela humanidade, transformado em conteúdos escolares, e os
saberes construídos pelos alunos, transformados em suas vivências cotidianas,
tendo em vista a formação de seres humanos justos e comprometidos com o
bem coletivo.
Passei a ser militante das questões afro, participei das Etapas Municipais da
Conferência Nacional de Educação - CONAE, onde fui eleita delegada para a
O QUÊ Estadual e depois eleita também para a Nacional, sempre no Eixo VI,
em que se discutiu sobre Justiça Social, Educação e Trabalho: Inclusão,
Diversidade e Igualdade. Nesse processo ficou mais forte a percepção do
caminho de lutas e resistências do povo africano e sua repercussão nos
afrodescendentes. Isso me motivou a buscar um aprofundamento nessa
temática que poderá contribuir para a superação do racismo nas escolas e na
sociedade, pois uma pessoa que vivenciou situações de preconceito e racismo
pode contribuir a partir da densidade de sua experiência, com estudos voltados
para a transformação das relações étnico-raciais.
16
Portanto, com toda uma trajetória de vida motivada e norteada pelas condições
objetivas e subjetivas deste estudo, já que, em meu caminhar, tive de enfrentar
vários desafios como mulher, negra e pobre, isto pesou na minha construção
pessoal e profissional, deixando grandes marcas. Vale, porém, ressaltar que
essas dificuldades, por outro lado, me motivaram a desenvolver a cada dia uma
postura de luta e resistência, agora expressa na apresentação deste trabalho.
Depois de ingressar no Mestrado, percebi a possibilidade de contribuir para o
desenvolvimento das questões raciais no meu município e passei a fazer parte
da Comissão de Estudos Afro-Brasileiros - CEAFRO, do Município de
Cachoeiro de Itapemirim, no Espírito Santo.
Passando assim, a participar de estudos, discussão e reflexão sobre os papéis
diferenciados que os grupos sociais afro-brasileiros têm na definição das
questões econômicas e políticas do país e os significados das ações do
passado, repensando sobre os efeitos de ações realizadas ou deixadas de
realizar para uma sociedade verdadeiramente justa, solidária, fraterna e
igualitária.
Assim, vivemos em sociedades heterogêneas compostas por diferentes grupos
humanos com interesses, classes e identidades em conflito. Essas diferenças
vão desde características físicas até às psicológicas, sociais e culturais.
A diversidade humana sempre existiu e a humanidade expressava variadas
reações a esse respeito, porém o esforço pelo reconhecimento da diferença
sempre esteve presente na história, mas se destacou na década de 1990 pelos
movimentos e lutas de grupos, dentre eles o Movimento Negro.
Diversificar não significa formar grupos homogêneos com as mesmas
dificuldades e características, mas grupos heterogêneos, de forma a aproveitar
a diversidade existente para a troca de experiência e o crescimento de cada
um.
Apesar de a questão da diversidade humana estar ganhando mais espaço na
nossa sociedade, enfrentar o desafio de trabalhar a inclusão e diversidade na
17
sala de aula para a mobilização das potencialidades não é tarefa fácil. Há
alguns desafios que favorecem o trabalho diversificado com o currículo, com a
interdisciplinaridade e a mobilização das potencialidades dos gestores,
pedagogos e professores.
Foi uma grande conquista para se alcançar uma mudança expressiva para se
trabalhar a inclusão e diversidade, a aprovação da Lei 10.639/03, pois ela
tornou obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas escolas de
educação básica. Nesta perspectiva, a questão do trabalho com inclusão racial
precisa ser adequada à escola, que é a realidade local.
Essa lei é resultado também de antigas reivindicações e negociações entre o
Movimento Negro e os órgãos do Estado, com destaque àqueles ligados à
Educação.
Esta dissertação apresenta resultado da pesquisa sobre “As Práticas de
Gestão e Docência nas Escolas Públicas Municipais do Ensino Fundamental
do Município de Cachoeiro de Itapemirim a partir da Lei 10.639/03”, cujo tema
é o racismo nas escolas, pois ainda existem nos ambientes escolares várias
situações em que sua presença se manifesta. Tivemos como problema de
pesquisa levantado: Quais as implicações nas práticas pedagógicas dos
gestores, pedagogos e docentes para o enfrentamento do racismo a Lei
10.639/03?
Essa questão central de investigação foi focalizada nas práticas de gestão e
docência voltadas para superação do racismo no processo formativo da escola
básica do município de Cachoeiro de Itapemirim. Para tanto, foram
investigados práticas, projetos ou propostas de superação do racismo a partir
da gestão e da docência na perspectiva da Lei 10.639/03.
O objetivo geral foi analisar e compreender as práticas pedagógicas
executadas a partir da Lei 10.639/03, com vistas à superação do racismo nas
escolas pesquisadas.
18
Como objetivos específicos, a partir de uma análise da Lei 10.639/03,
buscou-se:
• levantar quais projetos e/ou atividades práticas já foram desenvolvidos nas
escolas do município de 2003 até o momento, na perspectiva de
problematizar e superar o racismo;
• identificar as dificuldades e/ou resistências para se desenvolverem, por
partes dos docentes e/ou gestores, as práticas na concepção da Lei
10.639/03.
O resultado é a elaboração, a partir dos resultados da pesquisa, de uma
proposta de Gestão Municipal que inclua um programa de formação específica
de gestores, pedagogos, professores e demais funcionários da educação para
trabalhar a superação do racismo com base na Lei 10.639/03.
A motivação para se refletir sobre este tema originou-se da constatação da
necessidade da mobilização dos educadores, participando e contribuindo na
construção de um novo modelo de educação para soluções das demandas
sociais, favorecendo um processo de inclusão, respeito às diversidades raciais
e aprendizado que produzam saberes em diferentes níveis de aprendizagens
para a formação de uma sociedade mais igualitária.
No decorrer deste trabalho, utilizamos uma série de fontes, desde textos de
diversos autores, dentre eles Gomes (2007), Munanga (1996, 2003,2005 e
2006) dentre outros.
A estrutura da dissertação compreende 5 capítulos: no Capítulo I, como
primeiro elemento norteador, destaca-se o entendimento e a abordagem sobre
o racismo: sua trajetória de luta, resistência e mudanças, enfocando
discussões sobre raça e racismo, sobre o racismo e as normativas
internacionais e nacionais e sobre o Movimento Negro (MN), que conseguiram
dar visibilidade aos graves problemas dessa população.
No Capítulo II atemo-nos à discussão sobre a questão racial na Lei e na
Educação a fim de se avançar na sua compreensão, pois esse é um dos
19
grandes desafios a serem superados pela população negra que, em sua
maioria, vive em condições precárias devido à distribuição injusta da riqueza e
a uma política econômica proveniente da classe dominante.
No Capítulo III ressaltamos a preocupação com a Lei e suas implicações na
prática educativa, destacando um breve histórico do Município de Cachoeiro de
Itapemirim e a questão afro, pois, quando se adquire consciência dos direitos
humanos e da cidadania, é possível reconhecer que eles ainda são
desrespeitados e muitas vezes ignorados.
No Capítulo IV nos dedicamos à metodologia desta pesquisa, onde enfocamos
toda sua trajetória: a escolha do tema, os sujeitos e as opções aplicadas
durante a coleta de dados.
No decorrer do capítulo V, apresentamos as Práticas de Gestão e Docência
nas escolas municipais de Cachoeiro de Itapemirim a partir da Lei 10.639/03,
por meio da Análise e discussão dos dados à luz dos questionários aplicados e
das entrevistas realizadas. Percebe-se que a Lei 10.639/ 03, que altera a Lei
9394/96 garante, no sentido legal, a inserção do “Ensino da História da África e
Cultura Afro-Brasileira” nos currículos escolares. Porém, ao observar as
práticas de gestão e docência, constatamos que há necessidade de um
trabalho mais de perto com esses profissionais.
Nas considerações finais, apresentamos algumas sínteses do trabalho
realizado e, ao mesmo tempo, fazemos uma reflexão sobre as possibilidades
do desenvolvimento de práticas pedagógicas para se trabalhar a questão do
racismo dentro da ótica da transformação social.
Podemos afirmar que o desafio desta pesquisa é, a partir da análise das
práticas pedagógicas no âmbito da gestão e da docência na realização e
operacionalização da Lei 10.639/03, com vistas à superação do racismo nas
escolas da Rede Municipal de Cachoeiro de Itapemirim, dos mecanismos
gerais de organização da sociedade atual – que são produtores de várias
formas de desigualdades –, refletir sobre as possíveis contradições presentes
20
no debate da implementação de práticas pedagógicas efetivas sobre o negro
brasileiro.
Assim, o estudo lança um olhar sobre o Produto da Dissertação, que visa
proporcionar aos gestores, pedagogos e professores formação continuada para
a promoção do desenvolvimento de uma prática pedagógica voltada para a
questão do racismo de forma processual e inclusiva. Tudo isso na perspectiva
da Lei 10.639/03, visando contribuir para os processos de gestão pedagógica
da Secretaria Municipal de Educação (SEME), de forma que inclua formação
de gestores, pedagogos, professores e demais funcionários da educação, com
vistas à melhoria da educação das relações étnico-raciais e ao ensino da
história e cultura africana e afro-brasileira nas escolas da rede municipal de
ensino de Cachoeiro de Itapemirim.
Este estudo é relevante para o tema no eixo de formação do curso, pois, por
ser um Mestrado em Gestão Social, Educação e Desenvolvimento Local,
amplia as formulações teóricas sobre a temática de inclusão do negro na
sociedade brasileira pelo desenvolvimento de um trabalho na educação,
fundamentado na Lei 10.639/03. Também contribui para impactar uma
ressignificação na prática pedagógica das escolas do país, primando por uma
educação de novas relações raciais que contribua para o respeito às diferenças
existentes entre os sujeitos, valorizando-os em toda a sua diversidade e na
construção de práticas educativas emancipatórias.
A relevância desta dissertação na área do conhecimento se dá por ser um
espaço de abertura para estudos, discussões, reflexões e avanços sobre
diversidade efetivando no cotidiano escolar a inclusão do negro como agente
histórico da sociedade brasileira. A relevância social desta pesquisa está
também, no fato de que ela poderá contribuir para uma prática pedagógica
inclusiva, rica e democrática dentro da grande heterogeneidade cultural do
povo brasileiro, além de tornar possível desenvolver nos afrodescendentes um
sentimento de elevação de autoestima e, de forma particular, estar contribuindo
para a mudança na melhoria de um ensino voltado para diversidade na Rede
Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo.
21
2 O RACISMO NO BRASIL E OS MOVIMENTOS DE LUTA ANTIRRACISMO
O resgate da memória coletiva e da história da comunidade negra não
interessa apenas aos alunos de ascendência negra. Interessa também aos
alunos de outras ascendências étnicas, principalmente branca, pois, ao receber
uma educação envenenada pelos preconceitos, eles também tiveram suas
estruturas psíquicas afetadas (Munanga).
Neste capítulo, busca-se enfocar a relação da teoria que embasa esta
pesquisa, que é voltada para educação, mediante a Lei 10.639/06 e as práticas
de gestão e docência, pois a nossa sociedade possui uma diversidade cultural
com o povo indígena, imigrantes asiáticos e negros. Além disso, o nosso
sistema educacional brasileiro possui sua estrutura fundamentada na história
europeia, não contemplando a pluralidade étnica e nem as características
regionais que fazem parte dessa realidade educacional.
Assim, é nesse contexto histórico, político, social, educacional e cultural que a
população negra construiu e constrói ainda no Brasil a sua identidade.
Percebe-se hoje que o enfoque nas relações étnico-raciais com estudos,
discussões e pesquisa tem contribuído influenciando para a formação de uma
identidade negra mais positiva. Daí a importância de se conhecer a história que
une o Brasil e a África, o que é essencial para entender toda a trajetória dos
negros desde sua vinda aprisionados e trazidos nos porões de navios para as
Américas por mais de três séculos. Em 1888 foi assinada pela princesa Isabel
a Lei Áurea, que visava à libertação dos escravos e à definição de seus
direitos, o tempo passou, o negro ainda continua a sofrer racismo,
discriminação e preconceito no Brasil, pois a História nos mostra que em 13 de
maio foi abolida a escravidão, porém sem nenhum projeto de beneficio social
para os negros e afrodescendentes.
Sabe-se que a diversidade étnico-cultural está presente de uma forma muito
forte na realidade brasileira por meio de diversas manifestações culturais,
dentre elas a música, dança, penteados, roupas, culinária, mas precisamos
22
tratar essas questões étnico-raciais reconhecendo seus valores e valorizando
identidades.
Nessa perspectiva, temos a Lei 10.639/03, promulgada pelo Presidente da
República em 9 de fevereiro de 2003 e regulamentada pelo Parecer
homologado em 19 de maio de 2004, que estabelece as Diretrizes Curriculares
Nacionais
para
a
Educação
das
relações
étnico-raciais,
trazendo
direcionamentos de sua implementação. Essa lei hoje é um desafio para uma
ação pedagógica centrada em um aporte teórico que ajude a pensar em
políticas e práticas que busquem reverter o racismo, discriminações e
preconceitos raciais e sociais construídos ao longo da história em nosso país.
Esta legislação abre uma nova demanda no campo educacional
brasileiro. Mais do que propor um reconhecimento da história da
África, da releitura da história do Brasil, das relações raciais e do seu
ensino, ela mobiliza uma dimensão delicada, ou seja, o
reconhecimento da diferença afrodescendente e indígena com o claro
propósito de reinterpretar e ressignificar a história e as relações
étnico-raciais no Brasil por meio dos currículos da educação básica
(LIMA et al, 2009, p. 13).
2. 1 Racismo: sua trajetória de luta, resistência e mudanças
Estudar o processo de implantação de projetos no Ensino Fundamental que
visam à superação do racismo requer a análise de alguns conceitos básicos,
dentre eles raça, racismo, etnia, discriminação e preconceito. Para isso,
focalizam-se autores como Gomes, Munanga e Souza, que oferecem
contribuições mais próximas para o problema de investigação.
A nossa sociedade é produto de um processo histórico que reuniu os povos
portugueses, índios e negros onde cada um teve sua seu papel na formação do
povo brasileiro. A história conta a importância dos negros, o regime de
escravidão vivido por eles, o que constituiu um estigma que deixaram grandes
marcas e raízes profundas do racismo com origem no regime escravocrata.
Nessa perspectiva, podemos afirmar que existem os termos preconceito,
discriminação e racismo. Os termos preconceito e discriminação, apesar de
possuírem significados diferentes, convergem, porque o preconceito representa
23
um sentimento de julgamento de valor provisório ao que parece inferior ou
diferente, portanto pode ser mudado. A discriminação já é a concretização do
preconceito, a sua consequência; pressupõe uma impossibilidade de
convivência entre os considerados diferentes, significa, na prática, a efetivação
do preconceito ou racismo.
2.2 Discussões sobre raça e racismo
Etnia, no interior das sociedades humanas, tem sido um termo usado para
designar qualquer agregado de pessoas que possuem os mesmos ancestrais,
crenças, valores, linguagem e que são identificadas como pertencentes a um
grupo que compartilha traços sociais e culturais.
Os autores Munanga e Gomes (2006) ressaltam a importância do tema quando
se trata das concepções de raça e racismo. Eles afirmam que
O racismo é um comportamento, uma ação resultante da aversão, por
vezes, do ódio, em relação a pessoas que possuem um
pertencimento racial observável por meio de sinais, tais como cor de
pele, tipo de cabelo, formato de olhos, etc. Ele é resultado da crença
de que existem raças ou tipos humanos superiores e inferiores, a qual
se tenta impor como única e verdadeira. Exemplo disso são as teorias
raciais que serviram para justificar a escravidão no século XIX, a
exclusão dos negros e a discriminação racial (MUNANGA & GOMES,
2006, p. 179).
Entretanto, os cientistas afirmam que não existem claras subdivisões na única
espécie humana, homo sapiens. Eles alegam que não existe raça humana,
pois as diferenças da cor de pele entre os seres humanos são determinadas
por fenótipos e não por genótipos. Somente estes caracterizariam raças
diferentes entre os homo sapiens.
Josué Laguardia afirma no seu texto que
“As expectativas de que os achados do sequenciamento do genoma
humano dariam fundamentação científica às classificações raciais
não se confirmaram e os dados divulgados tornaram popular a idéia
24
de que a espécie humana é geneticamente homogênea quando
comparada à maioria das outras espécies (LAGUARDIA, 2005, p.
14).
Munanga (2003) afirma que o conceito de raça hoje não tem nada de biológico,
pois está carregado de ideologia, escondendo a relação de poder e dominação.
Assim, alguns biólogos sugeriram que o conceito de raça fosse banido dos
dicionários e dos textos científicos, porém, ele persiste tanto no uso popular
como em trabalhos e estudos produzidos na área das ciências sociais.
Francisco Mauro Salzano, do Departamento de Genética da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul, em seu texto aborda que
Grupos dominantes tendem a relacionar a sua posição social com a
sua constituição biológica, podendo atribuir qualidades inferiores aos
grupos dominados e biologicamente diversos. Não há nenhuma
justificativa biológica para tal atitude. Ninguém provou, cientificamente
que grupos como os asiáticos seriam superiores de maneira absoluta
aos europeus ou africanos, por exemplo (SALZANO, 2007, p. 1).
De acordo com a interpretação do Movimento Negro (MN) e de vários
estudiosos do campo das relações raciais no Brasil, como Nilma Lino Gomes,
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva, Kabengele Munanga, raça é entendida
como uma construção social histórica, compreendida no seu sentido político
como uma ressignificação do termo construído na luta política pela superação
do racismo no Brasil, referindo-se ao reconhecimento de uma diferença, nos
remetendo à ancestralidade negra e africana. Trata-se, portanto, de uma forma
de classificação social construída nas relações sociais, culturais e políticas
brasileiras.
Tanto na sociologia como na antropologia não há mais espaço entre os seres
humanos para a consideração de raça superior ou inferior, mas não se pode
negar a existência do racismo em nossa sociedade. Segundo Azevedo (2004)
[...] o racismo brasileiro é mais ou menos perverso do que aquele
praticado em países nos quais as práticas racistas são abertas,
visíveis e reguladas por lei. Centenas de estudos acadêmicos,
denúncias e artigos na imprensa, escritos da militância negra e
depoimentos de vítimas do racismo, não deixam dúvida sobre a
perversidade do racismo praticado institucionalmente no Brasil.
25
Quanto a isso não haveria o que discutir entre aqueles que se
pretendem parte das fileiras anti-racistas. (AZEVEDO, 2004, p.215)
Munanga (2003) afirma que, de outro modo, o racismo é essa tendência que
consiste em considerar que as características intelectuais e morais de um dado
grupo são consequências diretas de suas características físicas e biológicas.
Com isso, quando se utiliza esse conceito no cotidiano, não se lhe atribuem os
mesmos conteúdos e significados; daí a falta do consenso até na busca de
soluções contra o racismo.
Azevedo (2004) afirma que:
[...] o racismo não deriva da raça, ou melhor, da existência objetiva da
raça, seja em termos biológicos ou culturais. O racismo constituiu- se
historicamente em diferentes contextos sociais do mundo moderno,
sistematizando-se como uma prática discursiva, à medida que as
teorias raciais científicas impuseram a noção de raça como verdade.
É o racismo que cria a raça; ou dito de outro modo, é o racismo que
opera o processo social e cultural de racialização. Esse processo de
racialização das pessoas que compõem uma dada sociedade alcança
pleno sucesso sobretudo quando conta com o apoio formal do Estado
na construção de uma ordem racial explícita. (AZEVEDO, 2004,
P.220)
Considerando a amplitude e a profundidade de sua produção sobre o tema, o
autor sugere que a partir dos anos 70 começa-se a mudança da concepção de
racismo, devido aos avanços nas Ciências Biológicas. “[...] Temos nesse caso
o uso popular do conceito de racismo, qualificando de racismo qualquer atitude
ou comportamento de rejeição e de injustiça social” (MUNANGA, 2003, p. 10).
Gomes (2005) apud Lopes (2008) afirma que “O racismo é uma ação motivada
pela aversão às pessoas por suas características físicas ou culturais
consideradas inferiores. Neste caso, pode ser individual ou institucional.”
(LOPES, 2008, p.23)
Com isso, raça em si, como conceito biológico, não é objeto de estudo das
ciências sociais, mas estas, ao estudar as relações raciais, não podem
prescindir do conceito de raça no científico ou no popular. O termo étnico, na
26
expressão étnico-racial, serve para marcar relações tensas das diferenças da
cor da pele, traços físicos, raízes culturais, valores e princípios de um povo. Um
desses embates teóricos se encontra na pertinência do conceito de raça ou
etnia entre as diferentes descendências populacionais no país. Assim, afirmase que
O conceito de raça é morfobiológico e o de etnia é sociocultural,
histórico e psicológico. Um conjunto populacional dito raça “branca”,
“negra” e “amarela”, pode conter no seu seio diversas etnias. Uma
etnia é um conjunto de indivíduos que, histórica ou mitologicamente
têm um ancestral comum; têm uma língua em comum, uma mesma
religião ou cosmovisão, uma mesma cultura e moram
geograficamente num mesmo território (MUNANGA, 2003, p. 12).
.
Podemos afirmar que o próprio conceito de raça é uma construção social e
histórica, produzida no interior das relações sociais e de poder, ao longo do
processo histórico. Já o racismo, entre os seres humanos, foi surgindo e se
consolidando aos poucos, caracterizando-se pelo tratamento diferenciado que
alguns grupos manifestariam em relação aos outros pelo fato de atribuir uma
relação determinista entre um grupo e suas supostas propriedades. Assim,
O racismo é visto como um problema cultural, moral, de
mentalidades, logo seu combate passa a ser caracterizado como uma
intervenção educativa, pedagógica e, consequentemente, dar ênfase
em intervenções no sistema escolar, visto como um dos espaços
educativos por excelência, como um espaço pedagógico e cultural
capaz de mudar imaginários, valores, culturas e condutas (ARROYO
apud GOMES, 2007, p. 113).
Esta pesquisa situa-se nas escolas de Educação Básica do município de
Cachoeiro de Itapemirim – Espírito Santo, no fluxo dos estudos e reflexões
sobre raça, racismo, discriminação e as relações étnico-raciais a partir dos
conflitos das identidades dos afrodescendentes na sociedade brasileira,
visando, por meio da Lei 10.639/03, identificar as ações para superação de
práticas racistas nas escolas.
De acordo com Azevedo (2004):
27
[...] a raça não passa de uma invenção de elites racistas, mas ela de
fato existe em termos sociais e simbólicos; se quisermos libertarmonos do racismo, precisamos afirmar a raça, porém, com fins
benéficos. Há ainda uma saída temporária para um tal imbróglio:
melhor empregar a palavra etnia em lugar de raça; a raça já está por
demais saturada de conotações biológico-racistas, etnia é mais
cultural, menos naturalizada, embora saibamos que a raciologia
nunca deixou de associar biologia e cultura ao definir as
características de cada grupo racial. (AZEVEDO, 2004, p.217)
Temos Gomes (2005) apud Lopes (2008) que afirma:
O conceito de raça possui conotação política e isso significa negar a
concepção biológica que hierarquizam as “raças”. O termo etnia
representa os diferentes povos e suas culturas. A autora esclarece
também que o termo étnico-racial para os intelectuais e militantes se
refere às representações histórico-sociais e culturais dos negros no
Brasil. Deste modo, a referência à raça está absolutamente
desvinculada da questão genética, mas é compreendido como uma
construção cultural. (LOPES, 2008, p.23)
Nesse sentido, esta pesquisa situa-se nas escolas, no contexto das discussões
sobre a construção de práticas educativas que visem à superação do racismo
nas escolas, a partir de Lei 10.639/03.
A discriminação é muito presente na sociedade e, de acordo com a Convenção
da Organização das Nações Unidas (ONU), de 1996, a discriminação racial
refere-se a qualquer distinção, exclusão, restrição ou preferências das
pessoas, baseadas em raça, cor, descendência, origem nacional ou étnica.
Antonio Olimpio de Sant’Ana apud Munanga, afirma que:
Preconceito é uma opinião preestabelecida, que é imposta pelo meio,
época e educação. Ele regula as relações de uma pessoa com a
sociedade. Ao regular, ele permeia toda a sociedade, tornando-se
uma espécie de mediador de todas as relações humanas. Ele pode
ser definido, também, como uma indisposição, um julgamento prévio,
negativo, que se faz de pessoas estigmatizadas por estereótipos
(SANT’ ANA, 2005, p. 62).
Assim, pode-se dizer que discriminação e preconceito possuem significados
diferentes, mas se convergem. Preconceito significa o julgamento na
28
pessoalidade, representa um sentimento de juízo provisório frente aos
argumentos racionais, que pode ser modificado, e a discriminação não é
abstrata, e sim uma ação na concretização do preconceito. Lopes (2008)
aborda sobre o preconceito afirmando que:
Desse modo, se ele é provisório, pode então ser modificado. Esse
juízo confere valor ao que parece inferior ou simplesmente diferente.
Por outro lado, a discriminação não é abstrata e sim uma ação na
concretização do preconceito. É quando, por exemplo, há uma
interferência, por mais sutil que seja na vida do outro, e desse modo,
efetiva-se o desrespeito à diferença. A discriminação então é a
consequência do preconceito. [...]A atitude discriminatória pressupõe
uma impossibilidade de convivência entre diferentes,[...] (LOPES,
2008, p.22)
2.3 O racismo e as normativas internacionais e nacionais
Existem normativas internacionais e nacionais que abordam o racismo.
Segundo Roland & Santoro (2007), tem-se uma longa história de luta contra o
racismo articulada por políticos, juristas e artistas. Os autores afirmam que o
termo racismo expressa o conjunto de teorias e crenças que estabelecem uma
hierarquia entre as raças, entre as etnias, podendo também ser atitude de
hostilidade em relação a determinadas categorias de pessoas.
A discriminação é a distinção, exclusão, restrição ou preferências, motivada por
raça, cor, sexo, idade, trabalho, credo religioso ou até mesmo por convicções
políticas. Preconceito já é a expressão de opinião, de sentimento, favorável ou
desfavorável, concebido sem exame crítico, ou ainda a atitude, sentimento ou
parecer insensato assumido em consequência da generalização apressada de
uma experiência pessoal ou imposta pelo meio, conduzindo geralmente à
intolerância.
Desde 1945 que a comunidade internacional muniu-se de vários instrumentos
para combater o racismo, a discriminação racial, a xenofobia e a intolerância
29
correlata. Somente na segunda metade do século XX, que poderia ser
chamada “a era dos Direitos Humanos das Nações Unidas”, surgiram avanços
que hoje podem ser considerados universais, para que a comunidade
internacional valorize o respeito à dignidade humana.
Vários documentos, como a Constituição Federal de 1988, a III Conferência
Mundial contra o Racismo de 2001 em Durban na África do Sul, o Plano
Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana, destacam que o combate ao racismo e à
discriminação racial.
Este combate é uma preocupação relativamente recente dos governos no
plano internacional, pois advém do período do pós-guerra, quando se formulou
a Declaração Universal dos Direitos Humanos e sua implementação nas
Nações Unidas.
Vale destacar que o artigo 1o da Constituição da República Federativa do Brasil
(BRASIL, 1988) afirma que todos os seres humanos nascem livres e iguais em
dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns
para com os outros em espírito de fraternidade. O artigo 4° diz que ninguém
será mantido em escravatura ou em servidão; a escravatura e o trato dos
escravos, sob todas as formas, são proibidos, e o artigo 5° afirma que ninguém
será submetido à tortura nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou
degradantes.
(BRASIL, 1988) aborda que de acordo com o Artigo 5º, inciso XLII da
Constituição Federal, a prática do racismo constitui crime inafiançável
imprescritível, sujeito a pena de reclusão nos termos da lei. Porém a realidade
social brasileira não acompanha o avanço do quadro jurídico, pois o racismo
continua nos dias atuais, sendo uma prática comum.
Temos hoje, diversos documentos que enfatizam a defesa contra a
discriminação, racismo e preconceito. Dentre eles, destacam-se:
30
•
Declaração Universal dos Direitos do Homem, adotada pela Assembleia
Geral da ONU, em 10 de dezembro de 1948, que defende um ideal comum
a ser atingido por todos os povos e todas as nações. Nesse ideal, todos os
indivíduos e todos os órgãos da sociedade devem se esforçar pelo ensino
e pela educação, desenvolvendo respeito pelos direitos e liberdades,
promovendo, por medidas progressivas de ordem nacional e internacional,
o seu reconhecimento e sua aplicação de forma efetiva, tanto entre as
populações dos próprios Estados membros, como entre as dos territórios
colocados sob a sua jurisdição;
•
Convenção Internacional sobre a Eliminação de Todas as Formas de
Discriminação Racial, em 1968, que se baseou nos princípios de dignidade
e igualdade inerentes a todos os seres humanos. Nela, todos os Estados
membros se comprometeram a tomar medidas separadas e conjuntas, em
cooperação com a Organização, para a consecução de um dos propósitos
das Nações Unidas: o de promover e de encorajar o respeito universal e a
observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais para
todos os cidadãos, sem discriminação de raça, sexo, idioma ou religião;
•
Declaração dos Direitos da Criança, que foi adotada pela Assembleia das
Nações Unidas de 20 de novembro de 1959 e ratificada pelo Brasil, em que
os povos das Nações Unidas reafirmaram sua fé nos direitos humanos
fundamentais, na dignidade e no valor do ser humano, buscando promover
o progresso social e melhores condições de vida dentro de uma liberdade
mais ampla. Vale destacar que o Princípio 10 diz que a criança gozará de
proteção contra atos que possam suscitar discriminação racial, religiosa ou
de qualquer outra natureza;
Isso demonstra que é necessário conscientizar a todos de todas as raças e
religiões, para os prejuízos que o racismo causa ao Brasil. Lopes afirma
que:
Silenciar o racismo ou manter práticas discriminatórias institucionais
em suas diversas formas e dimensões interfere negativamente na
31
vida de crianças e jovens. Sendo negros ou indígenas, a proporção é
bem maior, por representarem maioria nas escolas. (LOPES, 2008,
p.27)
•
Convenção n° 111 – sobre a discriminação em matéri a de emprego e
profissão. As convenções internacionais n° 100 e n° 111 foram os primeiros
dispositivos internacionais adotados pela Organização Internacional do
Trabalho - OIT e pela Assembleia Geral da ONU em 1965, entrando em
vigor em 1969, com o objetivo específico de promover a igualdade e
eliminar a discriminação. No seu Artigo 1,
declara que para os fins desta Convenção, o termo "discriminação"
compreende: toda distinção, exclusão ou preferência, com base em
raça, cor, sexo, religião, opinião política, nacionalidade ou origem
social, que tenha por efeito anular ou reduzir a igualdade de
1
oportunidade ou de tratamento no emprego ou profissão.
•
Declaração Sobre os Direitos das Pessoas Pertencentes a Minorias
Nacionais ou Étnicas, Religiosas e Linguísticas, aprovada pela resolução
47/135 da Assembleia Geral da ONU de 18 de dezembro de 1992. Seus
artigos contemplam:
Artigo 1º
1. Os Estados protegerão a existência e a identidade nacional ou
étnica, cultural, religiosa e linguística das minorias dentro de seus
respectivos territórios e fomentarão condições para a promoção de
identidade.
2. Os Estados adotarão medidas apropriadas, legislativas e de outros
tipos, a fim de alcançar esses objetivos.
Artigo 2º
1. As pessoas pertencentes a minorias nacionais ou étnicas,
religiosas e linguísticas (doravante denominadas “pessoas
pertencentes a minorias”) terão direito a desfrutar de sua própria
cultura, a professar e praticar sua própria religião, e a utilizar seu
próprio idioma, em privado e em público, sem ingerência nem
discriminação alguma.
2. As pessoas pertencentes a minorias têm o direito de participar
efetivamente na vida cultural, religiosa, social, econômica e pública.
1
Disponível em: www.iidh.ed.cr Acesso em 18 abr. 2011.
32
•
Declaração sobre a raça e os preconceitos raciais – aprovada e
proclamada pela Conferência Geral da Organização das Nações Unidas
para a Educação, a Ciência e a Cultura, reunida em Paris em sua 20a
reunião, em 27 de novembro de 1978. Diz em dois dos seus artigos:
Artigo 1
1. Todos os seres humanos pertencem à mesma espécie e têm a
mesma origem. Nascem iguais em dignidade e direitos e todos
formam parte integrante da humanidade.
2. Todos os indivíduos e os grupos têm o direito de serem diferentes,
a se considerar e serem considerados como tais. Sem embargo, a
diversidade das formas de vida e o direito à diferença não podem em
nenhum caso servir de pretexto aos preconceitos raciais; não podem
legitimar nem um direito nem uma ação ou prática discriminatória, ou
ainda não podem fundar a política do apartheid, que constitui a mais
extrema forma do racismo.
Artigo 2
1. Toda teoria que invoque uma superioridade ou uma inferioridade
intrínseca de grupos raciais ou étnicos que dê a uns o direito de
dominar ou de eliminar aos demais, presumidamente inferiores, ou
que faça juízos de valor baseados na diferença racial, carece de
fundamento científico e é contrária aos princípios morais étnicos da
humanidade.
2. O racismo engloba as ideologias racistas, as atitudes fundadas nos
preconceitos raciais, os comportamentos discriminatórios, as
disposições estruturais e as práticas institucionalizadas que provocam
a desigualdade racial, assim como a falsa ideia de que as relações
discriminatórias entre grupos são moral e cientificamente justificáveis;
manifesta-se por meio de disposições legislativas ou regulamentárias
e práticas discriminatórias, assim como por meio de crenças e atos
antissociais; cria obstáculos ao desenvolvimento de suas vítimas,
perverte a quem o põe em prática, divide as nações em seu próprio
seio, constitui um obstáculo para a cooperação internacional e cria
tensões políticas entre os povos; é contrário aos princípios
fundamentais ao direito internacional e, por conseguinte, perturba
gravemente a paz e a segurança internacionais.
3. O preconceito racial historicamente vinculado às desigualdades de
poder, que tende a se fortalecer por causa das diferenças
econômicas e sociais entre os indivíduos e os grupos humanos e a
justificar, ainda hoje essas desigualdades, está solenemente
2
desprovido de fundamento.
•
Convenção Relativa à Luta contra a Discriminação no Campo do Ensino,
adotada pela Conferência Geral da Organização das Nações para a
Educação, Ciência e Cultura, na sua 11ª sessão, reunida em Paris, de 14
2
Disponível em: www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/.../dec78.htm. Acesso em18 abr. 2011.
33
de novembro a 15 de dezembro de 1960. Essa convenção afirma o
princípio de não discriminação, proclamando o direito de todas as pessoas
à educação, além de considerar que a discriminação no campo da
educação constitui uma violação de direitos enunciados na referida
Declaração. Também considera que, nos termos da sua Constituição, a
Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura
propõe estabelecer a cooperação entre as nações a fim de assegurar o
respeito universal dos direitos humanos e igualdade de possibilidades de
educação;
•
Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e
Intolerância Conexa – realizada na cidade de Durban, África do Sul, entre
os dias 31 de agosto e 8 de setembro de 2001. Representou um evento de
suma
importância
nos
esforços
empreendidos
pela
comunidade
internacional para combater e erradicar o racismo, a discriminação racial e
a intolerância em todo o mundo. Grande parte do documento é dedicada a
medidas de prevenção, educação e proteção em nível nacional.
Existem Normativas Nacionais que enfatizam a questão do racismo no Brasil.
Dentre elas, destacam-se:
•
A Constituição Federal de 1988 que, em seu artigo 5º, incisos XLI e XLII,
dispõe:
XLI - a lei punirá qualquer discriminação atentatória aos direitos e
liberdades fundamentais;
XLII - a prática do racismo constitui crime inafiançável e imprescritível,
sujeito à pena de reclusão, nos termos da Lei.
O artigo 7º, inciso XXX da Constituição Federal assegura aos
trabalhadores em geral a proibição de ato discriminatório por motivo
de cor. (BRASIL, 1988)
•
O Estatuto da Igualdade Racial, aprovado pelo Senado Federal em 16 de
junho de 2010 estabelece diretrizes para a implementação de políticas
públicas de promoção da igualdade de direitos e oportunidades para o
34
enfrentamento do preconceito e discriminação racial que atingem a
população negra. Ressalta-se que
O inciso VI do Art. 1º estabelece que ações afirmativas são os
programas e medidas especiais adotados pelo Estado e pela
iniciativa privada para a correção das desigualdades raciais e para a
promoção da igualdade de oportunidades.
O parágrafo único do Art. 4º estabelece que os programas de ação
afirmativa constituir-se-ão em políticas públicas destinadas a reparar
as distorções e desigualdades sociais e demais práticas
discriminatórias adotadas, nas esferas públicas e privadas, durante o
processo de formação social do País. E os vários incisos deste artigo
dizem como se dará a participação da população negra, em
condições de igualdade de oportunidades, na vida econômica, social,
política e cultural do País: por meio, entre outros, da adoção de
programas e políticas de ação afirmativa na educação, cultura,
esporte e lazer, saúde, segurança, trabalho, moradia, meios de
comunicação de massa, financiamento públicos, acesso a terra, à
justiça, e outros (Inciso VII); do estímulo e fortalecimento de
iniciativas da sociedade civil, inclusive com prioridades no acesso a
recursos públicos (Inciso VI).
O Art. 15 diz explicitamente que o poder público adotará programa
das ações afirmativas e é sabido que cotas são uma das modalidades
3
de ação afirmativa na educação.
•
O Plano Nacional de Direitos Humanos visa contribuir para a ampliação e a
participação do Brasil no sistema global – da ONU, e regional – da
Organização dos Estados Americanos (OEA), para a promoção e proteção
dos direitos humanos, por meio da continuidade da política de adesão a
pactos e convenções internacionais e de plena inserção do País no sistema
interamericano. Enfatiza nos itens 119 a 124 a garantia do Direito à
Igualdade:
119. Apoiar o funcionamento e a implementação das resoluções do
Conselho Nacional de Combate à Discriminação - CNCD, no âmbito
do Ministério da Justiça.
120. Estimular a divulgação e a aplicação da legislação
antidiscriminatória, assim como a revogação de normas
discriminatórias na legislação infraconstitucional.
3
Disponível em: blog.planalto.gov.br
35
121. Estimular a criação de canais de acesso direto e regular da
população a informações e documentos governamentais,
especialmente a dados sobre a tramitação de investigações e
processos legais relativos a casos de violação de direitos humanos.
122. Apoiar a adoção, pelo poder público e pela iniciativa privada, de
políticas de ação afirmativa como forma de combater a desigualdade.
123. Promover estudos para alteração da Lei de Licitações Públicas
de modo a possibilitar que, uma vez esgotados todos os
procedimentos licitatórios, configurando-se empate, o critério de
desempate – hoje definido por sorteio – seja substituído pelo critério
de adoção, por parte dos licitantes, de políticas de ação afirmativa em
favor de grupos discriminados.
124. Apoiar a inclusão nos currículos escolares de informações sobre
o problema da discriminação na sociedade brasileira e sobre o direito
de todos os grupos e indivíduos a um tratamento igualitário perante a
4
lei.
•
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA): foi criado em 13 de julho de
1990, instituiu-se como Lei Federal nº 8.069, obedecendo ao artigo 227 da
Constituição Federal, adotando a chamada Doutrina da Proteção Integral.
Afirma que crianças e adolescentes são pessoas em desenvolvimento,
sujeitos de direitos e destinatários de proteção integral. Ele possui 267
artigos, que garantem os direitos e deveres de cidadania das crianças e
adolescentes, além de determinar a responsabilidade da família, do Estado
e da comunidade. Dos artigos destacamos:
Art. 5° - Nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer
forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade
e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou
omissão, aos seus direitos fundamentais.
Art. 58 - No processo educacional respeitar-se-ão os valores
culturais, artísticos e históricos próprios do contexto social da criança
e do adolescente, garantindo-se a estes a liberdade de criação e o
5
acesso às fontes de cultura.
Percebe-se que a Constituição demonstra reconhecer a existência do racismo,
e a discriminação para com a criança e adolescente ainda persiste, pois temos
muitos deles em situação de abandono nas ruas e albergues, além de sofrerem
4
5
Disponível em: http://portal.mj.gov.br. Acesso em 21 abr. 2011.
Disponível em: http://www.amperj.org.br/store/legislacao/codigos/eca_L8069.pdf. Aceso em 21 abr.
2011.
36
problemas de discriminação no ambiente escolar. As políticas públicas, porém,
ainda não se desdobraram em ação, em transformação da situação de
desamparo social, cultural e violências a que essas crianças ainda são
submetidas. A escola muitas vezes desconhece as discriminações que ocorrem
em seu contexto escolar e acaba permitindo que a diversidade e a questão
étnico-racial sejam motivo de preconceitos e violências.
Compete à escola reconhecer, valorizar e perceber a diversidade, a pluralidade
cultural existente em seu contexto para desenvolver um trabalho de formação
do ser humano, baseado na sua herança cultural e nas diferentes temáticas
visando garantir o acesso ao conhecimento das culturas produzidas
historicamente, sendo assim espaço para discussão sobre a diversidade
cultural, racial, social e econômica, local e do Brasil, buscando usufruir do
enriquecimento dos grupos sociais que a constitui.
2.4 O movimento negro (MN)
A história nos conta que desde o século XVI os negros, ao serem trazidos para
o Brasil, são vítimas de discriminação. Segundo Freyre (2006, P.391), “O Brasil
não se limitou a recolher da África a lama de gente preta que lhe fecundou os
canaviais e os cafezais” com um discurso fascista de superioridade de raça. No
entanto, eles já reagiam e lutavam por seus direitos de diversas maneiras,
dentre elas a capoeira6 na senzala7, que servia como defesa nas lutas contra
os Capitães do Mato.8
Além disso, formavam quilombos9, que eram comunidades com sua própria
organização social, que mantinham redes de alianças com outros grupos da
sociedade da época. O maior dos símbolos de resistência da luta negra pela
liberdade foi o Quilombo dos Palmares, que resistiu por mais de sessenta anos,
6
Técnica corporal de ataque e defesa, desenvolvida no Brasil a partir de fundamentos
introduzidos por escravos bantos.
7
Alojamento de escravos em engenhos e fazendas brasileiros.
8
Indivíduo empregado pelos senhores rurais com o propósito de capturar a laço ou a tiro
escravos fugitivos.
9
Grupos de escravos fugitivos que se abrigavam geralmente em locais longínquos de difícil
acesso e viviam segundo padrões africanos de organização social.
37
chegando a uma população de 20.000 habitantes, localizado na Serra da
Barriga, divisa do estado de Alagoas com Pernambuco. Seu líder era Ganga
Zumba, tio de Zumbi, que em 1678 aceitou do Governo de Pernambuco um
acordo de paz que não era favorável aos quilombolas, ocorrendo assim, uma
rebelião liderada por Zumbi, e este ficou governando por 15 anos o quilombo.
Em 20 de novembro de 1695, os bandeirantes Domingos Jorge velho e
Bernardo Vieira Melo mataram Zumbi em uma emboscada. A sua derrota não
acabou com as lutas e resistências dos negros: apesar de o quilombo ter se
desfeito, muitos negros conseguiram fugir pelo sertão e firmaram novas
comunidades. É o quilombo mais famoso da história brasileira.
Aguiar & Araujo (2010) nos mostram o espírito combativo e a luta dos negros
para serem tratados com dignidade:
Um dos grandes exemplos [...] é a Revolta da Chibata, ocorrida em
1910 e que teve como líder João Cândido Felisberto, negro e
marinheiro. As condições de trabalho dos marujos brasileiros no início
do século XX traduziam a permanência da mentalidade colonial
escravista junto à elite brasileira [...] Os marujos, na sua esmagadora
maioria negros e mulatos [...] Os castigos corporais eram alvo das
críticas dos marujos brasileiros, que também não tinham nenhuma
perspectiva de progressão na carreira, já que o oficialato continuava
nas mãos da elite. O movimento deflagrado por João Cândido e seus
companheiros em 22 de novembro de 1910, no Rio de Janeiro,
modificou a marinha brasileira. A partir daí as chibatadas foram
abolidas, assim como outros castigos físicos. O salário foi melhorado
e se instituiu a preparação e educação para os marinheiros [...] A
organização, a mobilização e a resistência de João Cândido
marcaram uma das primeiras entidades, se não a primeira, do
Movimento Negro Brasileiro: a Frente Negra Brasileira [...] carrega
marcas do seu tempo em sua organização e pauta de reivindicação
(AGUIAR & ARAUJO, 2010, p. 3-5).
A Constituição de 1988 reconheceu o direito dos remanescentes quilombolas às
terras que habitam, com direito ao título de propriedade. Além disso, os artigos
215 e 216 trazem menção ao direito de preservação e manifestação cultural.
O MN é um movimento de grande importância em virtude de suas lutas e
conquistas relacionadas às questões raciais. Primeiramente tivemos a Frente
Negra Brasileira - FNB, criada em 16 de setembro de 1931 em São Paulo,
38
cujas principais reivindicações eram educação, assistência social, saúde,
aquisição de bens e inserção social. Em 1936 transformou-se em partido
político e foi cassado pelo Estado Novo.
De acordo com Aguiar & Araujo (2010), em 1944 surgiu no processo de
democratização política pós-Estado Novo, o Teatro Experimental Negro (TEN),
fundado por Solano Trindade, com atividades educacionais como escola de
alfabetização e educação de jovens e adultos. Além de buscar ampliar as
condições de acesso dos negros ao mercado de trabalho e às artes, buscava
resgatar a cultura africana, com a fundação do jornal “Quilombo”, que envolvia
intelectuais negros e brancos, nacionais e internacionais, buscando também a
formação de novas lideranças.
Como os outros movimentos sociais, o MN, também durante o período de
ditadura militar, não pôde se organizar e não teve espaço. Na década de 70
retornou à militância de combate ao preconceito e racismo diante das
desigualdades raciais e sociais enfrentadas pelos negros no Brasil e
denunciava um país racista, com o objetivo de combater o mito da democracia
racial.
No Brasil nega-se ou redimensiona-se a importância e centralidade do racismo.
Há uma crença que somos uma democracia racial, onde afirmam que o período
da escravidão não foi um período tão ruim, pois os senhores de escravos eram
bons, afirmavam que os negros aceitavam de forma pacífica sua situação e
que reinava certa harmonia entre os senhores da casa grande e com o povo
negro da senzala.
Conforme Pereira (2002), o Movimento Negro Unificado (MNU) contribuiu muito
na busca do desenvolvimento da identidade do negro porque possui um papel
destacado no processo de uma identidade positiva do negro e da sua
conscientização política na vida nacional, pois este visa unir, moral e
politicamente a população afrodescendente.
39
O MNU surgiu em 07-07-78, em frente ao Teatro Municipal em São Paulo e,
em dezembro de 1979, aconteceu na cidade do Rio de Janeiro o seu 1º
Congresso no Brasil, que buscou trabalhar para colocar o problema da
discriminação racial em todos os âmbitos sociais e políticos.
Tudo isso, por meio de partidos políticos, associação de moradores, sindicatos,
grupos religiosos, grupos de mulheres e jovens, o que contribuiu para
reivindicação das políticas públicas de Ações Afirmativas e de lutas pela
promoção da igualdade racial em nosso país.
Esse movimento foi e continua sendo em vários estados a força política do
atual Movimento Negro Brasileiro, trabalhando sempre pela não discriminação
racial nos âmbitos políticos e sociais. Visa também fomentar um processo de
constituição da identidade do negro no país, enfrentando muitas lutas junto às
outras categorias sociais e à representação governamental, realizando ações
que foram determinantes para as conquistas de mudanças no cenário.
Destaca-se, dentre elas, o reconhecimento do racismo no Brasil pelo governo,
a criação da Secretaria Especial do Negro, além da criação em muitos estados
de conselhos estaduais, de coordenadoria do negro e outros órgãos. Sobre ele,
nos diz Munanga:
O debate demonstrou que somos uma sociedade democrática
porque uma questão social, como a racial, não é fácil de obter
consenso, sempre vai ter ponto de vista e opiniões diferentes,
unanimemente nunca vai acontecer [...] nunca vi tantos
pesquisadores brancos com argumentos tão preparados, tão fortes
em defesas das mudanças e em favor das políticas de ações
afirmativas. Houve época que estas questões pareciam ser apenas
de responsabilidades dos negros e do Movimento Negro, dos
intelectuais negros engajados [...] (MUNANGA apud RIBEIRO, 2003,
p. 6).
O MN promove discussões, lutas e reivindicações por meio de mobilizações
que impulsionam avanços em direção à redução das desigualdades sociais e
do racismo. Ele realizou, assim, muitas propostas que fizeram com que o
Estado instituísse medidas de reparação aos danos que o regime escravista,
40
as políticas de branqueamento da população e as exclusões oficiais do período
pós-abolição provocaram aos negros e seus descendentes.
Para o MN, a educação é um dos seus mais importantes eixos de luta, pois
vem através de sua longa trajetória denunciando as dificuldades educacionais
pelas quais passam os negros no Brasil, destacando o problema de acesso,
permanência e conteúdo ministrado nas escolas.
41
3 A DISCUSSÃO SOBRE A QUESTÃO RACIAL: NA LEI E NA EDUCAÇÃO
“[...] não é um problema dos negros no Brasil, mas sim um problema do Brasil,
que é dos negros, brancos e outros mais.” (Autor desconhecido).
A história social do negro no Brasil inicia-se com sua vinda para servir de mão
de obra barata. Ainda em sua terra natal, os negros foram aprisionados,
marcados com ferro em brasa para serem identificados pelos seus senhores e
posteriormente aportados para o Brasil, acorrentados para evitar revoltas e
conflitos, como mercadoria em porões de navios.
Aqui, como nos mostra Siqueira (2002), os negros, na sua maioria, não tinham
oportunidades de se preparem para uma vida de liberdade e digna, pois
Durante a vigência do sistema colonial escravista, os africanos no
Brasil tinham proibições formais, que lhes impediam de ter liberdade
e de se preparem para os sistemas nos quais deveriam viver na pósabolição. Essas proibições geravam doenças, mortes, banzos, desde
os navios negreiros, e, a partir daí, já acenavam para um futuro sem
liberdade e sem perspectiva de uma vida sem dignidade. Foi assim
que, no final da escravidão, os africanos foram atirados a sua própria
sorte – obrigados a viver livres num país onde foram escravos e que
os tornou livres sem nenhuma providência para serem trabalhadores
assalariados (SIQUEIRA, 2002, p. 78).
Nos diversos momentos do processo histórico, eles foram instrumentos de
trabalho e de renda na cultura canavieira, na extração aurífera, no cultivo de
café e no desenvolvimento da pecuária para setores dominantes da sociedade
brasileira, além de serem considerados seres inferiores, como nos mostra Cury
(2008):
Nossa Constituição Imperial de 1824, no capítulo das "Garantias dos
Direitos Civis e Políticos dos Cidadãos Brasileiros", reconhece, no art.
179, XXXII, como direito dos mesmos "a instrução primária gratuita".
Ora, o art. 6º da mesma Constituição, ao definir o para quem dessa
cidadania, tem como "cidadãos brasileiros os que no Brasil tiverem
nascido, quer sejam ingênuos ou libertos". Ora, os ingênuos são os
que nasceram livres e filhos de pais livres. São os livres e naturais do
país, são cidadãos ex generatione e ex jus soli. Já os libertos são
aqueles alforriados que, libertando-se da escravidão, recuperaram a
sua condição de homens livres. Assim, por oposição, a Constituição
42
Imperial não reconhece os escravos como cidadãos. Desse modo, o
estatuto da escravatura, tacitamente acolhido, tem, por abjeto que
seja, o outro como objeto, propriedade, mercadoria (CURY, 2008, p.
5).
Percebe-se assim que os negros escravos, por não serem considerados
cidadãos, não tinham acesso à instrução primária, lutavam contra as diversas
dificuldades que enfrentavam, como os castigos corporais, as torturas,
assenzalados entre pessoas de diversas etnias, línguas, costumes e tradições
e não aceitavam as condições subumanas a que eram submetidos.
No Brasil, mesmo com a abolição da escravidão em 13 de maio de 1888, com
a assinatura da Lei Áurea, os negros não foram tratados com dignidade, não
foram contemplados com políticas governamentais e não tiveram apoio
econômico.
O Brasil foi o último país a abolir formalmente o trabalho escravo, hoje é o
segundo contingente de população negra do mundo, onde quase metade da
população possui ascendência africana, ficando atrás somente da Nigéria.
A partir da Abolição e com a Proclamação da República, o negro
inicia sua luta por reconhecimento de sua cidadania, para se fazer
representar e inserir-se na nova sociedade. A 15 de novembro de
1889, o negro, ex-escravizado, torna-se cidadão como os demais
membros da sociedade, mas inicia-se uma maneira de manter o
tratamento desigual. Se antes exercia-se a violência física explicita,
esta já não poderia ser mantida, então, utiliza-se a linguagem, a
mentalidade, o imaginário, a ideologia para criar palavras, imagens,
formas e teorias que desprestigiam o negro, perpetuando e
reforçando o discurso anterior de inferioridade (CORENZA &
PEREIRA, s/d).
A abolição não lhes deu uma liberdade efetiva, pois não tinham profissão nem
instrução. Por muitos anos não tiveram condições de lutar pelos seus direitos,
mantendo-se, na maioria das vezes, nos limites da senzala, jogados à terrível
miséria em casebres. Sabemos que a grande parte da população afro-brasileira
vive em péssimas condições socioeconômicas, herdadas do período da
escravidão, pois a abolição não oportunizou a inserção dos negros na
sociedade com direito à educação, trabalho, saúde, por exemplo.
Os brancos sempre foram majoritários no total da população
brasileira. O Censo Demográfico de 2010 mostrou, porém, que,
naquele ano, a população negra superou a branca. Foram
43
encontrados 97 milhões de pessoas que se declararam negras, ou
seja, pretas ou pardas, e 91 milhões de pessoas brancas (IPEA,
2011, p. 17).
No Brasil, o negro encontra dificuldade para permanecer e ter sucesso no
processo de formação que lhe possibilite ter acesso ao conhecimento
historicamente produzido, com vistas a garantir-lhe condições para enfrentar a
realidade e buscar meios de superar a visão preconceituosa presente na
sociedade. Várias medidas foram tomadas para reprimi-los, até a proibição de
manifestações culturais. Assim, mantiveram-se presos a uma sociedade branca
que detinha todo o poder e ainda manifestava grande discriminação e
preconceito, uma vez que ela constitui o imaginário social que valoriza o branco
em todos os seus aspectos.
O imaginário social brasileiro é marcado por uma forte presença da
ancestralidade africana, que reelabora e se reconstrói com base na
herança legada pelos primeiros descendentes da África negra, que
aqui desembarcaram no âmbito do sistema colonial escravista, entre
os séculos XIV e XIX (SIQUEIRA, 2002, p. 75).
Além disso, havia as políticas eugenistas de branqueamento no currículo
escolar, que era formulada enaltecendo as características dos povos europeus,
não considerando as contribuições dos demais povos, inclusive dos africanos,
na formação da história e de cultura. Os europeus chegaram ao Brasil com as
leis pós-abolição, atuando no trabalho assalariado e para tornar o país branco.
Como mostra Siqueira, “[...] previsto na Teoria de Branqueamento, que se
complementava com o mito da democracia racial” (SIQUEIRA, 2002, p. 79).
Fundamentando-se em Silva Jr. (2002), pode-se dizer que discriminação é um
comportamento em que o indivíduo despreza um grupo, tratando-o mal,
julgando-o como um ser menor que os outros, excluindo-o. O preconceito, por
sua vez, é uma atitude composta por ideias criadas sem fundamentos, num
leque de emoções, levando a comportamentos hostis.
De modo geral, o atual povo brasileiro é proveniente de quatro
continentes: América, Europa, África e Ásia. Eles trouxeram em suas
bagagens e memórias coletivas elementos representativos dessas
culturas. É por isso que o Brasil, como país e como povo, oferece o
melhor exemplo de encontro de cultura e civilizações. Por essa razão,
44
aprender a conhecer o Brasil é aprender a conhecer a história e
cultura de cada um desses componentes (MUNANGA & GOMES,
2006, contracapa).
Daí, a necessidade de reconhecer, valorizar e perceber a diversidade, a
pluralidade cultural existente, o que nos permite compreender melhor o
contexto de formação do ser humano na sua herança cultural e nas diferentes
temáticas que devem ser incorporadas pela prática pedagógica da escola.
3.1 As mudanças na questão racial na lei e na educação
Com todas as dificuldades enfrentadas, negros e brancos, conscientes e
solidários em diminuir as desigualdades raciais, buscaram lutar desde a
escravidão por seus direitos e por sua dignidade. As mudanças começaram
ocorrer de forma muito lenta. De 3 de julho de1951 até 1988, a lei
antidiscriminatória, Lei nº 1.390, denominada “Lei Afonso Arinos”, considerava
as manifestações de racismo contravenção penal. Hoje, é crime inafiançável.
Nessa perspectiva, Gomes (2007) ressalta que
É nesse contexto histórico, político, social e cultural que os negros e
os negros brasileiros constroem suas identidades e, dentre elas, a
identidade negra. Como toda identidade, a identidade negra é uma
construção pessoal e social e é elaborada individual e socialmente de
forma diversa. No caso brasileiro, essa tarefa torna-se ainda mais
complexa, pois se realiza na articulação entre classe, gênero e raça
no contexto da ambiguidade do racismo brasileiro e da crescente
desigualdade social. É importante lembrar que a identidade
construída pelos negros brasileiros (pretos e pardos) se dá não
apenas por oposição ao branco, mas também pela negociação, pelo
conflito e pelo diálogo com este e outros grupos étnico-raciais
(GOMES, 2007, p. 98).
Pode-se afirmar que o mito da democracia racial vem sendo difundido e até
defendido por uma parcela da sociedade, falseando a ideia de que somos um
país que tem assegurado os mesmos direitos a brancos e negros: perante a lei
os direitos são iguais, mas no dia a dia há muitas situações de privação e
negação desses direitos.
45
Após a abolição da escravidão, uma aparente integração interétnica e
inter-racial sustentou por muito tempo a ideia de uma democracia
racial brasileira, o que dificultou a percepção das práticas racistas no
cotidiano e camuflou as condições perversas de desigualdades às
quais os negros e mestiços estiveram, e ainda estão submetidos
(BOTELHO, 2010, p. 5).
A discriminação tem sido promovida e reforçada no sistema educacional de
diversas maneiras, pois as condições pedagógicas da escola pública têm sido
fatores que fazem com que o próprio educador, sem perceber, vá reproduzindo
e reforçando a discriminação e o preconceito, pois, se a Lei 10.639/03 existe, o
professor não possui condições pedagógicas de aplicá-la. Segundo a UNICEF
(2008, p.5)
Essas crianças e adolescentes ainda vivem em contextos de
desigualdades. São vítimas do racismo nas escolas, nas ruas, nos
hospitais ou aldeias e, às vezes, dentro de suas famílias. Deparam-se
constantemente com situações de discriminação, de preconceito ou
segregação. Uma simples palavra, um gesto ou um olhar menos
atencioso pode gerar um sentimento de inferioridade, em que a
criança tende, de forma inconsciente ou não, a desvalorizar e negar
suas tradições, sua identidade e costumes (UNICEF, 2010, p. 5).
Assim, falar sobre preconceito racial no Brasil, seja nas escolas ou em
qualquer outro segmento da sociedade, causa constrangimento e tensões.
Estudo na CONAE afirma que
A produção social, cultural e histórica das diferenças não é
problemática em si. A questão é que, no contexto das relações de
poder, os grupos humanos não só classificam as diferenças como,
também, hierarquizam-nas, colocam-nas em escalas de valor e,
nesse processo, subalternizam uns em relação a outros. Quando os
vínculos sociais se quebram, devidos a processos autoritários, ao uso
da força e à colonização, o poder se exacerba, a ponto de um grupo
(PAIS?, nação, etnia, etc.) excluir, discriminar e segregar o outro,
devido a suas diferenças. Nesse processo, as diferenças são
transformadas em desigualdade (CONAE, 2010, p. 128).
Na escola, a discussão sobre o racismo deve ir além da denúncia e partir para
estudos, pesquisas, apresentações de propostas de formação enfocando a
escola, porque a questão do negro na educação é um problema social grave
em nossa sociedade, na qual está presente a desigualdade social vivenciada
por esse povo.
46
Sabe-se que o nosso sistema educacional possui práticas racistas que têm
contribuído com o racismo, preconceito, discriminação e com atitudes
discriminatórias com os alunos negros. Como por exemplo, as músicas
folclóricas, piadas, lendas, dentre outras.
Lopes (2008) aborda que:
[...] ao pesquisar tal tema na cidade de São Paulo no século XX,
identifica diversos elementos simbólicos preconceituosos presentes
na tradição oral - lendas, canções, rimas. Alguns exemplos desta
representação levam à compreensão da construção ideológica
negativista. O tipo físico aparece como legado desta representação
de inferioridade:
Deus quando fez o negro
Começou no calcanhar,
Quando chegou ao nariz,
Deu o diabo para acabar,
O diabo tinha preguiça,
Não queria trabalhar:
Deu um soco no nariz
E o acabou de esborrachar.
A ideologia neste quadro de inferiorização do índio e do negro
impregnou a
sociedade com imagens deturpadas sobre os mesmos. Ser um país
miscigenado
retirava o “peso” de ser um país constituído de uma maioria de
negros e índios. Em tal contexto, ser mestiço “aliviaria” tal sina.
(LOPES, 2008, p.44)
O MN se interessa pela situação do racismo na escola, visando atingir uma
proposta mais ampla de alteração no currículo, porque o racismo causa
impactos negativos do ponto de vista psicológico e social na vida de todo e
qualquer ser humano. Essa é uma forma de violação de direitos, condenável
em todos os países, sendo que no Brasil é considerado crime inafiançável.
Em virtude da grande expressão da militância do MN junto ao governo,
inúmeras vitórias foram alcançadas, dentre elas a criação da Secretaria
Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial - SEPPIR e a
promulgação da Lei 10.639/03 que torna obrigatório o ensino sobre História e
Cultura Afro-Brasileira nos estabelecimentos de Ensino Fundamental e Médio.
Além disso, a Lei estabelece ainda que se inclua no calendário escolar o dia 20
de novembro como Dia Nacional da Consciência Negra.
47
A importância de tudo isso é proporcionar a abertura de um espaço que
possibilite o debate, a discussão, a formação de uma consciência antirracista, a
discussão das políticas afirmativas para, a partir desse processo, abrirem-se
espaços de inclusão valorizando o negro como agente histórico da sociedade e
a criação de políticas públicas para beneficiar esses grupos historicamente
excluídos.
Nesse sentido, é importante lembrar que o MN vem, ao longo dos anos,
reivindicando revisão do currículo escolar nos diversos níveis de ensino formal.
A ausência da História Africana é uma das lacunas de grande
importância nos sistemas educacionais brasileiros. Esta ausência tem
quatro consequências sobre a população brasileira. Tomando o
ambiente brasileiro como de exclusões de criação de credos sobre a
inferioridade do negro, do africano e dos afrodescendentes. Desta
forma a ausência de uma história Africana, em primeiro lugar, retira a
oportunidade dos Afrodescendentes em construírem uma identidade
positiva sobre as nossas origens. Segundo, a ausência abre espaço
para hipóteses preconceituosas, desinformadas ou racistas sobre as
nossas origens, criando assim terreno fértil para produção e difusão
de ideias erradas e racistas sobre as origens da população negra
(CUNHA JR, 2008, p. 1).
Assim, a Lei 10.639/03 veio ao encontro dos anseios do MN para ressignificar a
história do povo negro no Brasil, servindo de estratégia para mudança do
autoconceito, devendo as escolas criar mecanismos para que essa lei seja
cumprida.
O Plano Nacional de Implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História da África e
Cultura Afro-Brasileira e Africana, aborda:
Assim, os preceitos enunciados na nova legislação trouxeram para o
Ministério da Educação o desafio de constituir parceria com os
sistemas de ensino, para todos os níveis, uma educação para as
Relações Étnico-Raciais, orientada para divulgação e produção de
conhecimentos, bem como atitudes, posturas e valores que eduquem
cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de
interagir e de negociar objetivos comuns, que garantam, a todos,
respeito aos direitos legais e valorização de identidade, na busca da
consolidação da democracia brasileira [...] (BRASIL, 2009, p10 -11).
48
Vale destacar que o Parecer CNE 03/2004 vem detalhando os deveres e
direitos dos sistemas educacionais e das demais instituições para realizar
ações de implementação da lei.
Importante ressaltar que tanto o Parecer 03 quanto a resolução 01
avançaram sobre os vetos sofridos pela Lei no Congresso.
Diferentemente do que muitos pensam, a lei não se resume ao ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. O Parecer estabelece
a temática da Educação das Relações Étnico-Raciais, a qual deve ser
adotada como constituinte do cotidiano escolar. Mais uma vez, a
pauta da comunidade negra traz benefícios para toda a população
brasileira quando busca combater toda forma de discriminação seja
ela racial, de gênero, de opção sexual ou de deficiência física.
Combater a discriminação no cotidiano escolar não é tarefa apenas
dos professores de História, Educação Artística e Português, como
profere a Lei, mas é obrigação de todo cidadão que faz da escola seu
espaço de atuação (AGUIAR & ARAUJO, 2010, p. 12-13).
Daí acredita-se ser necessário construir uma prática pedagógica que destaque
o negro como sujeito ativo na construção da sociedade. Esse é um dos
grandes desafios que temos enfrentado.
Nota-se que tanto a escola como a mídia apresentam a África somente como
berço de escravos brasileiros, continente de guerras tribais. Assim, será
importante valorizar a cultura afro-brasileira como uma cultura inter-racial
formada por inúmeros grupos em que se devem manter vivas suas
manifestações culturais e o fortalecimento de sua identidade étnica.
Para avançar na discussão, é importante compreender que a luta
pelo reconhecimento e o direito à diversidade não se opõe à luta
pela superação das desigualdades sociais. Pelo contrário, ela coloca
em questão a forma desigual pela qual as diferenças vêm sendo
historicamente tratadas na sociedade, na escola e nas polícias
públicas em geral. Essa luta alerta, ainda, para o fato de que, ao
desconhecer a diversidade, pode-se incorrer no erro de tratar as
diferenças de forma discriminatória, aumentando ainda mais a
desigualdade, que se propaga via a conjugação de relações
assimétricas de classe, étnico-raciais, gênero, diversidade religiosa,
idade [...] (CONAE, 2010, p. 128).
Nos dias atuais, porém, a subalternização dos saberes produzidos pela
comunidade negra, a presença de estereótipos raciais nos manuais didáticos, a
estigmatização do negro, os apelidos pejorativos e a versão pedagógica do
49
mito da democracia social são situações que precisam ser trabalhadas nas
escolas, para que possam ser superadas, devido ao fato de ser parte do
compromisso social e pedagógico da escola no combate ao racismo e à
discriminação racial, mas também por força da lei, pois a maioria da população
negra brasileira apresenta desqualificação de sua condição humana, como
baixa autoestima, condições de moradia precárias, bem como piores condições
de atendimento na saúde, trabalho e educação, além de sofrer piadas e
deboches.
Lopes (2008) enfatiza que:
Vê-se por estes poucos exemplos, o quanto o discurso ideológico
atrelado à linguagem, à cultura e às tradições, acaba por legitimar o
“lugar” destinado a tais grupos étnicos. Acrescenta-se a este conjunto
uma canção carnavalesca de Lamartine Babo: “O seu cabelo não
nega mulata, porque é mulata na cor. Mas como a cor não pega
mulata, mulata eu quero o seu amor”. Os sentidos aferidos à mulher
negra neste texto demonstram uma negação às diferenciações
inerentes à raça/etnia. Ainda hoje é possível verificar muitos destes
materiais sendo utilizados nas próprias escolas, sem uma análise dos
elementos presentes nos textos.
Algumas canções folclóricas como “Dança neguinha, eu não sei
dançar, pega no chicote que ela dança já”. Brincadeiras como “Boca
da nega” também fazem parte destas representações raciais. Além
deste imaginário racial outras formas de violências são constatadas
na história da infância no Brasil.(LOPES, 2008, p.45)
Essa situação revela mais um aspecto da Lei 10.639/03 no que tange à
ambiguidade do racismo brasileiro e sua expressão na educação. A Lei dá
autonomia às escolas para planejar os projetos e trabalhos de forma que
abranjam os temas a serem tratados na sala de aula, por outro lado, as escolas
convivem simultaneamente com diversas culturas. Logo, o papel do ensino
consiste em organizar, facilitar e, sobretudo, promover reflexões relativas a
práticas pedagógicas no sistema educacional municipal, na escola, nas salas
de aula e no processo ensino-aprendizagem acerca dessa temática, visando
educar para uma sociedade multirracial, pois, como afirma Amâncio (2008, p.
153-154)
A Lei 10.639/03 e suas respectivas diretrizes curriculares nacionais
trazem em si uma concepção emancipatória de conhecimento. Nelas
está contida a ideia de que conhecer e compreender a história e a
cultura africana e afro-brasileira é mais um passo no processo de
50
libertação do racismo ambíguo ainda impregnado no imaginário e nas
práticas sociais e pedagógicas. A ignorância tem sido ao longo da
história da humanidade um campo fértil para a propagação de
preconceitos. Dessa forma, a ignorância sobre a trajetória de ação,
luta, resistência, efervescência cultural e política da comunidade
negra brasileira têm sido empecilhos para a construção de uma
educação antirracista e que caminhe na perspectiva da diversidade
Assim, devem-se criar condições, promover espaços de discussão e estudos
para
que
se
efetive
um
trabalho
comprometido
com
a
verdadeira
implementação da Lei 10.639/03 em todas as escolas. Esta pesquisa verificou
como foi esse processo na Rede Municipal de Ensino no Município de
Cachoeiro de Itapemirim (ES).
Segundo Aguiar & Moreira (2010), a Lei 10.639/03 é um importante instrumento
de valorização do negro, de sua história e cultura, porém seu cumprimento
depende das três esferas: federal, estadual e municipal, de forma a
implementar mudanças nos currículos escolares, bem como na capacitação de
professores.
Essa lei abre caminhos para os afrodescendentes, pois incentiva o
estabelecimento de políticas de ações afirmativas para incluir positivamente a
população negra na nossa sociedade. Mas o fato de a lei existir não garante
sua implementação. Isso vai depender do comprometimento dos envolvidos no
processo.
De acordo com Nascimento (2003), essa lei traz a possibilidade de novos
ensinos e conteúdos, de novas metodologias e de novo objeto de estudo,
contemplando o papel social da desconstrução de práticas raciais e
preconceituosas.
Já Aguiar e Moreira (2010) nos dizem que
É lutando por políticas de inclusão que o negro vem conquistando seu
espaço na sociedade. No Brasil, muito já foi alcançado na conquista
de espaços privilegiados de poder, onde o negro não tinha acesso ou
ocupava papéis secundários, como nas altas cortes judiciais, nas
51
universidades públicas e nas telas de televisão e cinema. Uma
realidade que vem mudando aos poucos, e com ela a nossa
compreensão sobre democracia e sobre a variedade de instrumentos
que devem ser mobilizados na construção de maior justiça social
(AGUIAR & MOREIRA, 2010, p. 13-14).
Nesse contexto, é muito importante a promoção de espaços de pesquisa,
análise, reflexões e estudos sobre essa temática, na perspectiva de se
desenvolverem estratégias pedagógicas de práticas antirracistas.
Em relação às possibilidades de inclusão dos conteúdos previstos na Lei
10.639/03, a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 205, define a
educação como um direito social de todos, visando ao pleno desenvolvimento
da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o
trabalho. A Lei de Diretrizes e bases da Educação (LDBEN) 9394/96 no Art. 26
afirma que os currículos devem, além de ter uma base nacional comum, ser
complementados por uma parte diversificada, exigida de acordo com as
características regionais e locais da sociedade, da cultura, da economia e da
clientela. E no seu parágrafo 4º, afirma que o ensino da História do Brasil
deverá levar em conta as contribuições das diferentes culturas e etnias para a
formação do povo brasileiro, em especial das matrizes indígena, africana e
europeia. O Plano Nacional de Educação (PNE), dentro dos seus objetivos e
metas, destaca a inclusão de temas específicos da história, da cultura, dos
conhecimentos, das manifestações artísticas e religiosas do segmento afrobrasileiro das sociedades na formação de professores.
Temos também os Parâmetros Curriculares nacionais (PCNs), que são um
documento nacional que contribui como eixo norteador da proposta curricular
das escolas, para que elas formulem seu projeto educacional envolvendo toda
a equipe e primando pela melhoria da qualidade da educação, com a
corresponsabilidade de todos os educadores. Eles servem também para
subsidiar a elaboração ou a revisão curricular da educação nos estados e
municípios, mantendo diálogo com as propostas e experiências já neles
existentes. Também apresentam em seu bojo os Temas Transversais, que
possuem papel importante dentro do currículo. Um deles é a Pluralidade
52
Cultural, que enfatiza a importância de se abordarem nas disciplinas as
diversas heranças culturais da população brasileira, oportunizando informações
que podem contribuir para a formação de novas mentalidades para se trabalhar
a superação de todas as formas de discriminação e exclusão, fazendo dessa
característica um fator de enriquecimento cultural e de respeito às
diversidades.
Para viver democraticamente em uma sociedade plural é preciso
respeitar os diferentes grupos e culturas que a constituem. A
sociedade brasileira é formada não só por diferentes etnias, como
também por imigrantes de diferentes países. Além disso, as
migrações colocam em contato grupos diferenciados. Sabe-se que as
regiões brasileiras têm características culturais bastante diversas e
que a convivência entre grupos diferenciados nos planos social e
cultural muitas vezes é marcada pelo preconceito e pela
discriminação. O grande desafio da escola é reconhecer a
diversidade como parte inseparável da identidade nacional e dar a
conhecer a riqueza representada por essa diversidade etnocultural
que compõe o patrimônio sociocultural brasileiro, investindo na
superação de qualquer tipo de discriminação e valorizando a trajetória
particular dos grupos que compõem a sociedade (BRASIL, 1998, p.
117).
Nessa perspectiva, a Lei 10.639/03 se configura como uma política educacional
do Estado em complementação à Constituição Federal.
A Lei n. 10.639/2003, promulgada pelo presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, significou a concretização da pauta histórica de reivindicação
do movimento negro para a educação brasileira. É claro que todo o
racismo dos congressistas brasileiros fez com que o texto da Lei
tivesse vetos que, de alguma maneira, tentavam diminuir a revolução
proposta na escola brasileira. A proposta maior da Lei de Diretrizes e
Base 9394/1996 (LDB) em seus artigos 26-A e 79-B, é combater o
racismo na educação brasileira, oferecendo novos parâmetros
científicos e culturais de interpretação da realidade nacional,
propondo assim uma verdadeira escola multicultural (AGUIAR &
ARAUJO, 2010, p. 10).
É um trabalho que, embora complexo, dá oportunidade de se abordar de perto
a realidade de vida de professores, gestores e alunos que ali ensinam e
aprendem, pela grande oportunidade de conhecer as histórias de dignidade, de
conquista, de criação e de culturas dos povos que constituem o nosso país,
valorizando a singularidade de cada um e de todos.
53
4 A LEI E SUAS IMPLICAÇÕES NA PRÁTICA EDUCATIVA DAS ESCOLAS
DA REDE MUNICIPAL DE CACHOEIRO DE ITAPEMIRIM
"Meu país, doce terra de liberdade, eu te canto.
Terra onde meus pais morreram, terra do orgulho dos peregrinos,
De qualquer lado da montanha, ouço o sino da liberdade!"
Martin Luther King Jr.
Após compreender a trajetória do negro no Brasil, os caminhos traçados no
período da escravidão e os documentos que garantem os direitos humanos nas
diversas instâncias, faz-se necessário entender a trajetória da população afrobrasileira na luta por espaços de participação na sociedade, bem como a
valoração a ser dada à Lei nº 10.639/2003 nas práticas de gestão e docência
no Município de Cachoeiro de Itapemirim – Espírito Santo, visando estudar, na
perspectiva de analisar, resgatar e demonstrar as implicações e preocupações
sobre as relações entre raça e educação, no campo de reflexões e suas
exigências. Busca-se assim localizar quais são as temáticas que estabelecem
relações entre as questões étnico-raciais e o universo do Município de
Cachoeiro de Itapemirim, no estado do Espírito Santo, e na Educação da sua
Rede municipal de educação.
4.1 O município de Cachoeiro de Itapemirim: breve histórico e a questão
afro
Cachoeiro de Itapemirim é um município do Estado do Espírito Santo que se
encontra na microrregião da zona fisiográfica serrana do sul do estado, às
margens do rio Itapemirim.
Sua história, que teve início no século XVIII, está ligada ao rio Itapemirim, que
deu origem ao nome do município, porque foi seguindo seu curso que os
primeiros colonizadores formaram os lugarejos, ocorrendo o povoamento da
região sul da Capitania do Espírito Santo, região habitada por índios Puris.
54
Francisco Alberto Rubim foi quem governou a Capitania do Espírito Santo de
1812 a 1819, iniciando a colonização das terras.
Até 1850, quando Cachoeiro pertencia a Vila de Itapemirim, grandes
latifundiários dominavam a região de Itapemirim. Durante o ciclo da
cana de açúcar, Cachoeiro nunca passou de um povoado perdido às
margens do Rio Itapemirim. De um lado do rio existiam vinte fazendas
de açúcar. Estas abasteciam de aguardente e açúcar toda a província
e ainda exportavam, em grande quantidade, para o Rio de Janeiro.
O início do desenvolvimento da região ocorreu por volta de 1846,
quando surgiram as primeiras casas comerciais. Em 1876, a
navegação fluvial tornou-se uma atividade lucrativa na região.
Navegável a partir da Volta do Caixão, o rio Itapemirim era a via
natural para escoamento de mercadorias até o porto, na Barra de
Itapemirim. Até então, utilizavam-se apenas embarcações
pertencentes aos grandes comerciantes de Cachoeiro. Mas, naquele
ano, foi inaugurada a navegação a vapor (NOGUEIRA, 2010, p. 3).
Em 1856 foi criada a freguesia, denominada "São Pedro do Cachoeiro", com
abertura de estradas e a instalação do Quartel das Barras, praças para
proteger os primeiros colonizadores.
A presença do povo negro veio juntamente com a história do município:
O principal centro econômico da região sul capixaba, a cidade de
Cachoeiro de Itapemirm, recebeu grande leva de escravos,
principalmente a partir da metade do século XIX, em função do cultivo
do café, o que colaborou para a sua atual formação populacional,
hoje estimada em 150.740 habitantes, segundo dados do Instituto
Brasileiro de Geografia e estatística (IBGE) (OSÓRIO,1999, p. 32).
Em 1864 foi elevada à categoria de vila; em 1867 se deu a instalação do
município, e, em 26 de dezembro de 1899, Cachoeiro de Itapemirim ganhou
categoria de cidade.
A situação do negro no município prosseguia juntamente com a sua história,
pois “Em 1871, mesmo após a extinção do tráfico negreiro, Cachoeiro contava
com uma população escrava de 9.666 pessoas e, livres, 19.755, sendo que
entre estes incluiam-se negros alforriados.” (OSÓRIO,1999, p. 32).
Em 1887, buscou-se fazer a ligação de Cachoeiro com outras regiões da
província, inaugurando-se a primeira estrada de ferro do Estado do Espírito
55
Santo. E, inaugurou-se também a primeira ponte municipal que passou a ligar
os dois lados da cidade, onde a comunicação só ocorria por balsas e barcos
devido ao imenso rio.
Cachoeiro de Itapemirim foi a terceira cidade do país e a primeira do
Estado a adquirir luz elétrica, com uma usina instalada na Ilha da Luz.
Sua situação geográfica favoreceu também a implantação de
indústrias devido à facilidade dos meios de transporte, além das
condições naturais propícias. Inicialmente, as primeiras indústrias
eram estatais e com maquinários importados, na qual algumas
chegaram a funcionar e outras foram passadas para a iniciativa
privada (NOGUEIRA, 2000, p. 3).
As mudanças políticas ocorreram a partir de meados do século XIX, quando a
freguesia de São Pedro do Cachoeiro implementou a Lei Provincial n° 1, de 16
de julho de 1856.
De acordo com Nogueira (2000), Cachoeiro de Itapemirim pertencia política e
administrativamente ao município de Itapemirim. Seu desligamento se deu em
25 de março de 1867, tendo assim sua câmara municipal composta do
presidente, coronel Francisco Xavier Monteiro Nogueira da Gama com mais
cinco vereadores. Foi, porém, pelo decreto n° 4 de 26 de dezembro de 1889
que a vila de Cachoeiro de Itapemirim foi elevada à categoria de cidade. A
comarca de Cachoeiro de Itapemirim foi criada pela Lei n° 9, de 16 de
novembro de 1876 e extinta em 1878 pelo Ato no 13, de 18 de novembro de
1878, que a converteu em termo judiciário pertencente a Itapemirim. Em 13 de
maio de 1884, por proposta do Coronel Joaquim M. da Silva Lima, a Comarca
de Cachoeiro foi definitivamente restabelecida.
A questão do povo negro foi se desenvolvendo juntamente com o município,
pois seus habitantes vivenciaram o regime de escravidão da população de
origem africana no decorrer do regime na história do Brasil.
Após a Abolição, 1888, um percentual da população negra que
habitava o meio rural deslocou-se para a sede do município em busca
de novas oportunidades de trabalho. Esse processo foi acelerado na
década de 20 e 30, deste século, e no final dos anos 50 em diante
(...) (OSÓRIO, 1999, p. 32).
O município de Cachoeiro de Itapemirim ocupa uma área de 880,84 km² e está
localizado na latitude 20o50’58” e longitude 41o06’46”, altitude de 21 m e
56
distante 129 km de Vitória, capital do estado do Espírito Santo, a 398 km da
cidade do Rio de Janeiro e 490 km de Belo Horizonte.
Ocupa lugar de destaque no ranking do índice de desenvolvimento dos
municípios do Espírito Santo (IDM - ES 2000), onde se encontra na 6a posição,
sendo, dos municípios da região Sul do Estado, o que mais se destaca em
desenvolvimento.
A população na cidade é de aproximadamente 174.000 habitantes (segundo o
IBGE 2001), sendo a quinta maior do Estado, com uma população
economicamente ativa de mais de 60.000 pessoas.
A principal atividade de Cachoeiro de Itapemirim é o beneficiamento de pedras
ornamentais. Contando com aproximadamente 700 indústrias do ramo,
apresenta também destaque nas atividades de comércio e serviços –
principalmente na saúde.
Cachoeiro de Itapemirim é hoje, sobretudo, um centro de extrativismo e
beneficiamento mineral (mármores, granitos e moagem de calcário). Na
indústria, sobressaem a produção de cimento, calçados e laticínios, havendo
também significativa atividade pecuária e cafeicultora. Polo educacional do sul
capixaba, a cidade conta com estabelecimentos de ensino superior. Além de
ter filhos famosos como Roberto Carlos, Rubem Braga, Raul Sampaio, Jece
Valadão, possui uma das maiores jazidas de mármore do Brasil.
Cachoeiro de Itapemirim é o maior município do sul do Estado do Espírito
Santo e apresenta pontos de destaques conforme mapa abaixo:
Mapa10
10
http://www.cachoeiro.es.gov.br/mapaci.htm
57
Em relação à educação, o município conta com Ensino Superior, um Centro
Universitário com Cursos de graduação de Bacharelados e Licenciaturas, além
de cursos de pós-graduação. Cachoeiro tem também faculdades de Direito,
Administração e Ciências Contábeis – umas, presenciais e outras, à distância.
O muncípio atende uma demanda de Educação Infantil e Fundamental num
total de 53.578 alunos, de acordo com o Censo Escolar MEC/INEP 2009, tendo
na Rede Municipal 22.848 alunos; na Rede Estadual, 22.417 alunos e na Rede
Privada, 7.641 alunos.
Ao consultar também os documentos da Secretaria Municipal de Educação SEME de Cachoeiro de Itapemirim, descobriu-se que no ano de 2000, o
município tinha 16.292 alunos em 68 escolas; em 2010 a rede municipal possui
89 unidades de ensino, com 64 na zona urbana e 25 na zona rural, tendo 42
escolas de educação infantil, 31 de Ensino Fundamental e 16 escolas que
contemplam a Educação Infantil e Ensino Fundamental. Dos 22.848 alunos da
rede municipal, temos nas creches 3.120 alunos; na pré-escola, 4.889 alunos;
no Ensino Fundamental, 14.706 alunos e, na educação de jovens e adultos
(EJA), 133 alunos.
58
Para atender a toda essa demanda, a prefeitura tem um quadro
formado por 1.516 professores e pedagogos, além de 1.148
servidores que atuam no quadro administrativo – são merendeiras,
agentes de biblioteca, secretários escolares, entre outros
11
profissionais que garantem a segurança e o bem-estar das crianças .
Hoje, a Rede Municipal de Educação possui 91 escolas ao todo, desde
educação infantil ao 9º ano, atendendo 8.170 alunos da Educação Infantil e
14.574 alunos do Ensino Fundamental. Assim, temos o seguinte quadro
abaixo:
Quadros 1 – Dados do Ensino Fundamental da Rede Municipal de
Educação
SEGMENTOS
Nº DE GESTORES
Nº DE
Nº DE
TOTAL
PEDAGOGOS
PROFESSORES
GERAL
1º ao 5º ano
29
50
589
639
6º ao 9º ano
03: EMEBs: Anísio
80
508
588
Vieira Ramos,
Anacleto Ramos e
Athayr Cagnin
1º ao 9º ano
15
88
TOTAL
47
218
103
1.097
1.362
Fonte: Documento Oficial da SEME
O quadro de atuação dos professores do 6º ao 9º ano atualmente na Rede
Municipal de educação de Cachoeiro de Itapemirim é o seguinte:
Quadro 2 – Quantitativo por área de atuação dos Professores do 6º ao 9º
ano
ÁREAS
Português
11
Nº DE PROFESSORES
63
Disponível em: www.cachoeiro.es.gov.br Acesso em 08 abr. 2011.
59
Matemática
56
Ciências
52
História
37
Geografia
38
Artes
28
Inglês
25
Educação Física
62
Professor de Apoio
147
TOTAL
508
Fonte: Documento Oficial da SEME
A escola tem a função de ensinar, transmitir conhecimentos e de dar a
oportunidade à criança de aprender a conviver com outras dentro e fora do
ambiente familiar, além de formar cidadãos conscientes de seus direitos e
deveres e promover o seu desenvolvimento pessoal.
As escolas são compostas de diferentes olhares culturais, pois têm sua história
e preocupações, o que as faz diferentes uma das outras. Elas são o local ideal
para este trabalho, pois seu ambiente é formado por uma população com
diversos grupos étnicos, com seus costumes e suas crenças. Os seus
currículos devem ser abertos e flexíveis para atender às peculiaridades sociais
e culturais de seus alunos:
a cultura é constituída pelo conjunto dos saberes, fazeres, regras,
normas, proibições, estratégias, crenças, ideias, valores, mitos, que
se transmite de geração em geração, se reproduz em cada indivíduo,
controla a existência da sociedade e mantém a complexidade
psicológica e social. Não sociedade humana, arcaica ou moderna,
desprovida de cultura, mas cada cultura é singular. Assim, sempre
existe a cultura nas culturas, mas a cultura existe apenas por meio
das culturas (MORIN, 2001, p. 56).
A escola é também, o lugar em que todos os alunos devem ter as mesmas
oportunidades,
mas
com
estratégias
de
aprendizagens
diferentes
desenvolvendo um ensino que procura atender as questões da inclusão e
diversidade.
60
O aluno deve ser visto como um sujeito com aptidões e dificuldades
diferenciadas. Na educação escolar devemos procurar conciliar a diferença
individual, respeitando as diversidades culturais, sociais e individuais. Diante da
diversidade e dentro de diversas culturas, é de competência do professor ter
claros os objetivos e resultados que pretende alcançar.
Além disso, deve buscar promover discussão profunda e o resgate da memória
coletiva sobre as manifestações culturais dos afros e a sua história nacional,
regional e local que contribuiu e contribui ainda, com a construção da
identidade cultural brasileira e cachoeirense.
Percebe-se que a existência significativa de afrodescendentes no município,
principalmente em algumas comunidades, é muito forte:
Em Cachoeiro, a ocupação do Morro do Zumbi está diretamente
relacionada à chegada de ex-escravos e imigrantes italianos das
famílias Passamai e Secacato, que aí regularizaram suas posses em
1924...
O Morro do Zumbi é um bairro com população estimada em 9.235
moradores[..].Enquanto as lideranças comunitárias veem no nome
Zumbi um símbolo de resistência e luta, muitos moradores tentam
mudar esta designação, acreditando que o nome reforça a
discriminação de vários setores da sociedade por ser associado à
area pobre e marginalizada de Cachoeiro, de maioria negra
(OSÓRIO,1999, p. 33).
É necessário, então, identificar, trabalhar o preconceito e estereótipo presentes
nas comunidades de Cachoeiro de Itapemirim e, consequentemente, nas
escolas. Parte-se do suposto de que as mudanças decorrerão de exigências do
ato de ensinar e que elas se darão na mediação do professor entre os
conteúdos e os alunos, que as apreenderão para se constituírem como sujeitos
histórico-sociais, tomando consciência de que o Brasil, o município e a escola
são multirraciais e pluriétnicos.
É necessário também, reconhecer, aceitar e conviver com esta diversidade.
Respeitando alguns aspectos e desconstruindo outros, temos que:
61
O movimento negro cachoeirense Pixinguinha, através de pesquisa
de uma de suas lideranças, o jornalista José Paineiras Filho,
considera Cachoeiro de Itapemirim uma das cidades mais racistas do
Brasil. Paineiras Filho diz que “não há um empresário do mármore
que seja negro”. O setor é um dos que mais cresce na cidade. O
jornalista lembra que só conseguem ascender socialmente os negros
que são profissionais liberais, como professores, advogados e
comerciantes (OSÓRIO, 1999, p. 33).
Construir uma prática pedagógica que destaque o negro como sujeito ativo na
construção dessa sociedade é um dos grandes desafios que se tem
enfrentado. Daí, a necessidade de que na sala de aula ocorra a aquisição de
conhecimentos sobre a História da África e Afro-Brasileira promovendo uma
associação contínua entre o pensar e o agir nesta temática, ocasionando
reflexões e, consequentemente, levando a mudanças na prática docente.
Assim, fez-se indispensável esta pesquisa no município para que se promovam
estudos, reflexões acerca dos determinantes que levam os gestores e
professores a terem dificuldades de lidar na sua prática docente com a questão
do racismo, buscando-se fazer uma análise crítica do trabalho realizado nas
escolas sobre essa temática. De novo, aqui vem a temática, ou seja, identificar
práticas educativas e dificuldades
escolas a partir da lei.
para o enfrentamento do racismo nas
62
5 METODOLOGIA
Muitas pessoas pensam que estão a pensar
quando estão apenas a re-arrumar os seus preconceitos.
William James
A Metodologia deste trabalho se fundamentou dentro de um contexto da teoria
crítica
da
educação,
pois,
de
acordo
com
Alves-Mazzotti
&
GEWANDSZNAJDER (2004), o sentido da palavra crítica diz respeito à ênfase
na análise das condições de regulação social, desigualdade e poder, sendo
que seus teóricos dão ênfase ao papel da ciência da sociedade. Isso implica a
compreensão da realidade social e da realidade dos atores que a constroem,
procura investigar o que ocorre nos grupos e instituições, relacionando as
diferentes estruturas sociais e políticas, buscando compreender como as redes
de poder são produzidas, mediadas e transformadas.
5.1 Os caminhos da pesquisa
Esta pesquisa foi fundamentada numa associação entre a pesquisa qualitativa
e quantitativa de caráter exploratório. A qualitativa foi para estabelecer maior
aproximação do universo sociocultural dos sujeitos a serem investigados,
possibilitando a compreensão e o esclarecimento de sua temática. Assim, a
abordagem qualitativa refere-se à interpretação e reflexão dos dados,
enquanto, na quantitativa, os dados são mensuráveis e contáveis.
[...] conceituamos abordagem qualitativa ou pesquisa qualitativa como
sendo um processo de reflexão e análise da realidade através da
utilização de métodos e técnicas para compreensão detalhada do
objeto de estudo em seu contexto histórico e/ou segundo sua
estruturação. Esse processo implica em estudos segundo a literatura
pertinente ao tema, observações, aplicação de questionários,
entrevistas e análise de dados, que deve ser apresentados de forma
descritiva (OLIVEIRA, 2010, p. 37).
63
Segundo Alves-Mazzotti & GEWANDSZNAJDER (2004), a pesquisa qualitativa
é multimetodológica, pois usa uma grande variedade de procedimentos e
instrumentos de coleta de dados e será utilizada para apurar opiniões e
atitudes explícitas, tendo seus dados usados para complementar os
quantitativos.
A pesquisa de caráter exploratório objetivou proporcionar um levantamento dos
problemas na Rede Municipal de Ensino de Cachoeiro de Itapemirim em
relação às Práticas de Gestão e de Docência, a partir da Lei 10.639/03,
envolvendo levantamento documental, aplicação de questionário e entrevistas
com gestores, pedagogos e professores do 1º ao 9º ano.
Inicialmente foi feito levantamento bibliográfico do município, da SEME, das
escolas de Ensino Fundamental do 1º ao 9º ano, dos seus gestores,
pedagogos e professores buscando referências em fundamentos teóricos na
perspectiva
de
estabelecer
bases
conceituais
relativas
à
formação,
experiências e práticas realizadas na temática das relações étnico-raciais.
Na coleta de dados empíricos, foram aplicados 828 questionários (Apêndice A)
junto aos professores, pedagogos e gestores que atuam na rede desde 2003,
ano em que a Lei 10.639/03 foi sancionada. Recebeu-se a devolutiva de 210
questionários que serviram para identificar quais práticas pedagógicas foram
desenvolvidas no processo de implementação da lei e para elaboração de um
banco de dados sobre as práticas e/ou eventos desenvolvidos a partir da Lei
10.639/03 nas escolas e salas de aula.
A partir da análise dos questionários aplicados, foram selecionados os
profissionais para aprofundamento das questões étnico-raciais, tendo como
critério a inserção e/ ou a predisposição da inclusão das questões relativas à
população negra, em suas práticas.
Esse levantamento serviu para a definição de critérios e indicadores para a
seleção de escolas e de profissionais que participaram dos demais processos:
foram
as
entrevistas
semiestruturadas
(Apêndice
B),
com
11%
dos
64
questionários devolvidos. Assim, foram mapeados as escolas e os profissionais
que desenvolveram atividades significativas sobre a temática. Esta foi a
população amostral da pesquisa.
Nas escolas selecionadas, foram analisados o Projeto Político Pedagógico
(PPP), os projetos e os planos de aulas dos referidos professores, além dos
possíveis documentos específicos de projetos e atividades da Secretaria
Municipal de Educação (SEME).
No fluxo da pesquisa, teve-se em mente ir ampliando e incorporando novas
reflexões sobre as questões do tratamento sobre a igualdade racial no contexto
escolar, onde se buscou estabelecer um posicionamento teórico-metodológico
entre os atores da escola e a temática.
Nessa perspectiva, esta pesquisa pretendeu mapear e dialogar com diferentes
atores envolvidos no processo escolar. Tudo isso contribuiu para a análise dos
dados, propiciando condições de interpretações, construção e elaboração de
um Produto da Dissertação.
Todos os dados foram computados, analisados e quantificados para qualificar e
elaborar, de acordo com o resultado, uma proposta de gestão municipal que
sirva de referencial para a superação de práticas racistas nas suas escolas de
educação básica.
65
6 AS PRÁTICAS DE GESTÃO E DOCÊNCIA NAS ESCOLAS MUNICIPAIS
DE
CACHOEIRO
DE
ITAPEMIRIM
A
PARTIR
DA
LEI
10.630/03:
APRESENTAÇÃO, ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS DA PESQUISA
"Há três métodos para ganhar sabedoria: primeiro, por reflexão, que é o mais
nobre; segundo, por imitação, que é o mais fácil; e terceiro, por experiência,
que é o mais amargo." Confúcio.
6.1 O cenário, os sujeitos e percepções iniciais sobre o tema: os
questionários
Para a apresentação e discussão dos dados toma-se por referência a
categorização proposta por Oliveira (2010):
[...] a palavra categoria está relacionada à classificação ou, mais
precisamente, a um agrupamento de elementos que são
sistematizados pelo pesquisador (a) após a pesquisa de campo, ou
durante a análise de conceitos [...]
Quando falamos em Categorias teóricas estamos nos referindo às
leituras convergentes ao tema central do estudo. [...] que darão
sustentação à análise dos dados. [...] categorias empíricas emergem
da pesquisa de campo, onde para cada questão formulada ou para
cada item do roteiro de entrevista estabelecemos as categorias
empíricas. [...] As informações obtidas com aplicações dos
instrumentais de pesquisas (entrevistas/questionários), chamadas de
dados, devem ser sistematizadas para facilitar o processo de análise.
É a essa sistematização de respostas que damos o nome de unidade
de análise (OLIVEIRA, 2010, p. 94-97).
A fundamentação deste trabalho de pesquisa ancorou-se na aplicação de 848
questionários nas escolas de Ensino Fundamental da rede municipal, dos quais
se obteve a devolutiva de 210, conforme dados do quadro das escolas com
número de gestores, pedagogos e professores (Apêndice C).
Com o objetivo de se levantarem dados sobre a temática, o questionário
(Apêndice 1) foi aplicado aos profissionais da educação das Escolas Municipais
de Educação Básica (EMEBs) do Município de Cachoeiro de Itapemirim,
somente as do Ensino Fundamental.
66
Segundo Maria Marly de Oliveira: “O questionário pode ser definido como uma
técnica para obtenção de informações... sobre todo e qualquer dado que o
pesquisador (a) deseja registrar para atender os objetivos de seu estudo.”
(2007, p.83).
Os questionários foram enviados a todas as escolas em envelopes entregues
aos gestores em reunião. Após serem respondidos pelos profissionais das
escolas, foram deixados na recepção da SEME para a pesquisadora. Sendo
assim, para a análise dos questionários, os dados foram organizados nas
seguintes categorias:
Quadro3- Categorias organizadas para análise do questionário
Categoria 1
Situação funcional e tempo de serviço do servidor
Categoria 2
Formação dos servidores
Categoria 3
Participação e realização de atividades sobre racismo na
escola
Categoria 4
Conflitos e atitudes racistas percebidas na escola
Categoria 5
Nível de conhecimento e formação sobre a Lei 10.639/03
Categoria 6
Sobre a necessidade de se trabalhar a cultura afrobrasileira na escola
Categoria 1- Situação Funcional e tempo de serviço do Servidor
Este questionário oportunizou mensurar vários dados, onde se percebeu que
mais de 50% dos professores que o responderam é da categoria Designação
Temporária (DT). Esses profissionais não permanecem todos os anos na
mesma escola, o que dificulta fazer um trabalho contínuo
Gráfico 1: Situação Funcional
67
Como a pesquisa se deteve a partir do ano da aprovação da Lei 10.639/03,
teve-se como dado relevante, que 54,7% dos profissionais que responderam
ao questionário afirmam atuar na Rede Municipal de Educação de Cachoeiro
de Itapemirim a partir do ano de 2003, quando foi aprovada a Lei 10.639/03.
Gráfico 2: Atuação
Além disso, 50% deles formaram-se em Pedagogia, atuando como gestores,
pedagogos, professores do 1º ao 5º ano e como professores de apoio aos
demais 50% das outras áreas.
Gráfico 3: Função de Atuação
68
Tivemos 59% dos profissionais que se formaram no Centro Universitário São
Camilo Espírito Santo,que é o único Centro Universitário do Sul do estado e é
uma instituição privada e 80 profissionais citaram esta instituição e 40 citaram a
Faculdade de Filosofia Ciências e Letras “Madre Gertrudes de São José”, que
foi a que se transformou neste centro universitário.
Gráfico 4: Instituição de Formação
Outro dado importante é que 51% concluíram seus cursos em Pedagogia e os
demais concluíram em Letras, Matemática, Ciências Biológicas, História,
Ciências Sociais, Educação Física e Geografia, pois é exigido na legislação e,
consequentemente, no município que os profissionais que atuam como
pedagogos e professores de 1º ao 5º ano tenham o Curso de Pedagogia.
Gráfico 5: Habilitação Profissional
A maioria dos respondentes concluiu seu Curso Superior entre 2000 a 2010, o
que corresponde a 51,4%. Tivemos 26,1 % nos anos 90; 16,6% nos anos 80 e
69
5,4% nos anos 70, o que demonstra o acesso desses profissionais nas últimas
décadas ao curso superior na busca da qualificação.
Gráfico 6: Ano de Conclusão
Categoria 3: Participação e realização de atividades sobre racismo na escola
Na questão participação e realização de atividades sobre racismo na escola,
obtivemos 76,1 % de respostas que afirmam já ter planejado ou participado de
alguma atividade relacionada à cultura afro-brasileira na sua trajetória
profissional, enquanto 24, 9% marcaram não.
Gráfico 7: Planejamento e Participação em Atividades Afro
Os que responderam sim preencheram um quadro especificando a(s)
atividade(s), onde foi possível destacar que estas giravam em torno de
realização de sarau, Projeto Afro, Dia da Consciência Negra, visita à
70
Comunidade Quilombola e outras, envolvendo danças, bandeiras, comidas e
capoeira, culminando geralmente em 20 de novembro.
Percebe-se com isso, que há necessidade de se desenvolver um novo olhar
para a realização das atividades, de forma que não ocorram em datas e/ou
períodos pontuais. Nesse contexto, faz-se necessário uma reflexão os períodos
e as fontes utilizadas por estes professores quando tentam trabalhar a História
da África e cultura afro-brasileira, que não deve ser somente em 13 de maio ,
dia em que se comemora o dia da Luta contra o Racismo e nem só no dia 20
de novembro que é o Dia da Consciência Negra. Assim:
[...] queremos provocar outros sentidos para o currículo que possam
favorecer movimentos em direção à desconstrução, à rasura de
conceitos enclausurados que, de tão acostumados a esse
confinamento, custam a perceber a potência e a riqueza da vida
direcionada para pensar-sentir o que é currículo. Tendo como
motivação essa busca [...] defende a urgência de se pensar a escola
contextualizada em meio à complexidade e às tensões vividas na/da
sociedade contemporânea, assumindo-a em sua tessitura social e em
sua força inventada de outros mundos, de outras possibilidades de
vida para todos aqueles que frequentam. (FERRAÇO, 2011, P.11)
Na questão sobre atividades realizadas sobre a questão afro na escola, 71%
marcaram ter tido nas atividades desenvolvidas participação como assistente.
Somente 14% afirmam ter participado como propositor da atividade. Outros
citaram ter desenvolvido atividades com o curso de Ensino Religioso
abordando assuntos afros, desenvolvimento de projeto implantado na escola e
a necessidade de resgatar a inclusão de raças.
Gráfico 8: Caracterização da Participação nas Atividades
Ao questionar sobre as opções que retratam a vivência sobre a questão do
racismo, percebeu-se, de acordo com as opções assinaladas, que 95% dos
profissionais afirmaram que percebem conflitos em sala de aula, 77%
71
afirmaram perceber conflitos referentes à questão racial no recreio, 42,8%
afirmaram perceber essa questão na escola de forma clara, 29,5% disseram
perceber a questão racial na escola de forma sutil.
Gráfico 9: A- Vivência sobre a Questão do Racismo na Escola
Gráfico 9: B- Vivência sobre a Questão do Racismo na Escola
Nesta perspectiva, reafirmamos que os números revelam a existência de
conflitos raciais nas escolas.
Sendo assim, o racismo ambíguo brasileiro sempre foi um campo
fértil para a construção de ideologias e pseudoteorias raciais no
passado e para a perpetuação da desigualdade entre negros e
brancos que se mantém no presente... Diante do contexto das
relações raciais no Brasil anteriormente citado, não à escola brasileira
somente se mostrar sensível à diversidade de maneira geral e à
questão racial, em específico (GOMES, 2007, p. 101-102).
72
Categoria 4: Conflitos e atitudes racistas percebidas na escola
Evidencia-se também no gráfico anterior que, embora as respostas
demonstrem que há conflitos nas escolas, a maioria não sabe como agir diante
das situações que lá ocorrem.
Outros dados percebidos neste gráfico foram que 2,9% assinalaram que têm
preocupação antirracista; 24,1% afirmaram que existe preocupação antirracista
por parte dos colegas de trabalho; 14% afirmaram que na escola são
desenvolvidas atividades antirracistas, e 11% disseram que na escola existem
propostas antirracistas não desenvolvidas. Tivemos 13% que disseram existir
em seu planejamento de trabalho proposta(s) para enfrentamento dessa
questão, 10% afirmaram que existe proposta de trabalho no Projeto PolíticoPedagógico (PPP) da escola para se trabalhar esse ponto.
...a escola, sobretudo, a pública deverá inserir a questão racial no seu
projeto político-pedagógico, tomá-la como eixo das práticas
pedagógicas e articulá-la nas discussões que permeiam o currículo
escolar... A escola brasileira ao ser indagada pelo Movimento Negro
pela implementação de uma educação antirracista vive uma situação
de tensão entre configurar-se, de fato, como um direito social para
todos e, ao mesmo tempo, respeitar e reconhecer as diferenças
(GOMES, 2007, p. 102).
O gráfico, porém, apresenta 34,7% que afirmaram perceber atitudes racistas
em alguns alunos da escola, 40,6% disseram que percebem atitudes racistas
em alguns colegas de trabalho e somente 24,7% afirmaram que não percebem
preocupações e/ou atividades antirracistas na escola.
Categoria 5- Nível de Conhecimento e Formação sobre a Lei 10.639/03
Ao serem indagados no questionário sobre a Lei 10.639/03, tivemos 20,4%
que afirmaram não ter nenhuma informação sobre ela; 14,7% marcaram saber
que ela existe, mas não conhecem o seu conteúdo, 44,7% afirmaram não
conhecer seu conteúdo, mas já ter ouvido comentário sobre ela; somente 10%
marcaram que conhecem o seu conteúdo e 10% marcaram que já participaram
de discussões e/ou debates sobre ela.
73
Gráfico 10: Conhecimento sobre a lei 10.639/03
Isso é bastante preocupante, pois há um número significativo que afirmou não
ter nenhuma informação sobre a Lei e que não conhecem seu conteúdo.
Entretanto, essa nova situação encontra as escolas, os educadores e
as educadoras do Brasil em uma situação de insegurança e
desconhecimento diante do trato pedagógico da diversidade étnicoracial. Há na educação escolar, um imaginário pedagógico que tende
a considerar que a questão racial é uma tarefa restrita aos
professores e professoras que assumem publicamente uma postura
política diante da mesma ou um assunto de interesse somente dos
professores (as) negros (as) (GOMES, 2007, p. 103).
Assim, se confirma a necessidade de um trabalho mais efetivo com os gestores
e docentes das escolas da Rede Municipal de educação, de forma a adquirir
fundamentação teórica para o desenvolvimento de um trabalho de melhoria de
sua prática pedagógica no que tange à questão da história da África e cultura
afro-brasileira.
Ao perguntar: “Na sua trajetória profissional na Rede Municipal de Ensino,
quantas vezes recebeu desse órgão informação e/ou proposta de atividades
que tivessem caráter antirracista ou de afirmação da cultura afro-brasileira,
56,6% marcaram nenhuma, 34,2% marcaram uma e 9,2% marcaram duas.
Alguns, porém, citaram de forma não significativa participação em cursos e
seminários, formação continuada, formação na escola, dias de estudos na
escola, com ênfase ao tema com projeto e culminância em novembro, danças e
encenações referentes à questão afro.
74
Gráfico 11: Propostas/Atividades Étnico Recebidas
Sobre a questão de participação a encontros, estudos ou cursos que tenham
abordado a Lei 10.630/03, as respostas a questão aberta foram diversas, com
números não expressivos de participantes em Curso sobre a História da África
e Afro-Brasileira, realizado em parceria com a SEME e o Centro Universitário
São Camilo no ano de 2007.
Verifica-se que a grande maioria dos entrevistados não participou das
atividades no I Seminário Regional Sul de Igualdade Racial com Palestras no
Pavilhão da Ilha da Luz em 2007, Projeto no Quilombo de Monte Alegre,
formações com Dia de Estudos realizados na escola e no I Fórum de Escolas
Públicas e Privadas das Relações Étnico-Raciais do Município de Cachoeiro de
Itapemirim em 2011. Fica claro que, embora saibam da obrigatoriedade da Lei,
os respondentes conhecem pouco sobre ela por questão de falta de formação.
Assim, evidenciamos outro ponto preocupante: as poucas capacitações, cursos
e eventos realizados para os profissionais da educação não estão atingindo a
maioria dos professores.
Categoria 6: Sobre a Necessidade de se trabalhar a Cultura Afro-Brasileira na
escola
Em relação à pergunta sobre a necessidade de se trabalhar a cultura afrobrasileira em sala de aula, 10% considerou desnecessário; em contrapartida,
90% consideraram necessário. Isso mostra que, mesmo sem grandes
conhecimentos teóricos da Lei 10.639/03 e da temática, os professores
percebem a necessidade de estas serem trabalhadas.
75
Questionados se há necessidade de se problematizar o racismo em sala de
aula, 27,6% marcaram que é necessário e de fácil abordagem; 62% marcaram
necessários e de difícil abordagem; 5,7% assinalaram desnecessários e 4,7%
assinalaram que nunca pensaram na questão.
Gráfico 12: Trabalhar a Cultura Afro-Brasileira em Sala de Aula
Ao finalizar o questionário, foi aberto um espaço para se colocar algum
comentário, e vale destacar algumas das respostas:
•
Como professora de Ciências trabalho raça na genética e faço trabalhos
interdisciplinares com os professores de história e geografia (Q3).
•
Gostaria de ter maior envolvimento com os assuntos relacionados com a
cultura afro-brasileira, é do meu interesse (Q25).
•
Na maioria dos casos, percebo discriminação, elas estão mais ligadas às
religiões de matrizes africanas (Q51).
•
Para mim, penso ser difícil abordar tal assunto com ênfase, pois me sinto
angustiada e indignada pelo tratamento dos antepassados (Q25).
•
Gostaria que a rede oferecesse informações sobre o tema (Q78).
•
Acredito que precisamos implementar nas escolas palestras, cursos e
outros envolvendo alunos, professores e comunidade, pois nem todos
conhecem a Lei 10.639/93 (Q95).
•
Na
escola EMEB “São Luiz Gonzaga” a questão afro-brasileira é trabalhada de
76
modo significativo, não só com a participação da escola, mas também da
comunidade e também de autoridade convidada (Q112).
•
É importante que se trabalhe o preconceito racial para que a criança cresça
entendendo o assunto, aceite e compreenda as diferenças (Q153).
•
Quanto mais conhecemos, melhor para lidarmos com a situação e repassála no nosso dia a dia (Q175).
•
Tema importante para ser discutido, já que estamos vivendo num momento
que aceitação das diferenças é essencial para se viver numa sociedade
com direitos iguais para todos (Q183).
•
Na maioria das vezes que ocorreu este tipo de atividade na escola, houve
participação apenas dos professores de história, assim, os outros não se
envolveram (Q195).
•
Trabalhamos os temas em datas pontuais e diluímos nos conteúdos.
Porém devo assinalar que não percebo atitudes racistas nesta comunidade
(Q199).
•
Apesar de trabalharmos esta questão pontualmente no Dia da Consciência
Negra, estamos sempre atentos no cotidiano escolar a essas e outras
questões. Em nossa escola, a discriminação por raça – quando acontece –,
são fatos isolados, e o trabalho é realizado pontualmente (Q201).
•
Eu me empenho para promover sistematicamente discussões em sala de
aula visando novas posturas entre alunos e comunidade. Acredito na ação
das
pessoas
contra
atitudes
que
marginalizem
e
preconceituem,
independente de onde estão e da função que exercem. Chegaremos lá! (Q
219).
Percebe-se nos dados apresentados que as escolas vêm, dentro das suas
condições e esforços, desenvolvendo um trabalho, porém há muito para ser
feito, para que se possa atender devidamente a proposta da Lei 10.639/03.
Para isso serão necessárias mudanças profundas e transformações na
estrutura das práticas pedagógicas das escolas e, consequentemente, na
formação continuada dos professores.
Sendo que cada vez mais as sociedades humanas são atravessadas
por relações sociais, culturais e econômicas de uma crescente
complexidade, a Educação necessita não apenas de conhecer o
mundo, mas fornecer instrumentos de interpretação, inclusão e
77
participação. O diálogo conceptual e pedagógico entre diferentes
experiências, conhecimentos e abordagens metodológicas amplifica,
de forma significativa, os horizontes e os instrumentos educativos
(CUNHA & REIS (2006) apud GOMES, 2007, p. 31).
Assim, precisamos acreditar que essa mudança é possível e, para isso, urge
procurar os meios, caminhos para oferecer a esses profissionais capacitações
para que possam desenvolver um trabalho mais processual da Lei 10.639/03.
6.2 O contexto do racismo e as práticas pedagógicas desenvolvidas nas
escolas a partir da lei 10.639/03: os dados das entrevistas
A entrevista foi utilizada para se apreender melhor a forma de como o racismo
se concretiza nas escolas e quais são as práticas pedagógicas desenvolvidas,
tendo em vista problematizá-lo e trabalhá-lo na perspectiva da Lei 10.639/03
nas escolas do Ensino Fundamental do Município de Cachoeiro de Itapemirim.
De acordo com Oliveira:
A entrevista é um excelente instrumento de pesquisa por permitir a
interação entre pesquisador (a) e entrevistado (a) e a obtenção de
descrições detalhadas sobre o que está se pesquisando... Em
pesquisa, o termo população ou universo significa a totalidade de
pessoas que habita uma determinada área geográfica, ou o conjunto
de elementos que compõem o objeto de nosso estudo (OLIVEIRA,
2007, p. 86-87).
Assim, para definir a composição das entrevistas a serem aplicadas e
analisadas, foram selecionados 11% dos questionários devolvidos das escolas,
nos quais os profissionais assinalaram ter desenvolvido e estarem abertos a
desenvolver um trabalho que permitirá trazer à tona questões que desejavam
investigar, a saber: a concepção dos gestores, pedagogos e docentes sobre as
relações raciais na escola e na sala de aula.
Nessa perspectiva, foram feitas análises do objeto de estudo dando atenção à
especificidade de cada profissional entrevistado, buscando identificar pontos
comuns. Por telefone, a escola e os profissionais selecionados foram
comunicados e combinou-se o melhor dia e horário para as entrevistas. Os
dados coletados nas entrevistas organizaram nas seguintes categorias de
análise:
78
Quadro 4- Categorias organizadas para análise das Entrevistas
Categoria 1
Os sujeitos entrevistados
Categoria 2
Percepção sobre o racismo na sociedade e na escola
Categoria 3
Sobre as possíveis causas da origem do racismo
Categoria 4
Situações reais de racismo, discriminação e preconceito na
escola e seu enfrentamento
Categoria 5
Dificuldades encontradas para se trabalhar o racismo na
escola
Categoria 6
Atividades planejadas e desenvolvidas na escola sobre a
História da África e Afro-Brasileira
Categoria 7
Ações para se romper com o racismo na escola
Categoria 8
Grau de conhecimento da Lei 10.639/03
Categoria 9
Comentários livres dos entrevistados
Categoria 1: Os sujeitos Entrevistados
Para o desenvolvimento desta pesquisa, tivemos a devolução de 210
questionários dos profissionais da Educação englobando gestores, pedagogos
e professores de todas as áreas, sendo 33,4% tem idade acima acima de 30
anos; 16,6% acima de 40 anos e 4,1% acima de 50 anos. 45,8 % não
informaram a idade, porém aparentavam em média 50 anos.
Em relação ao tempo de atuação na Rede Municipal de Educação, 50%
declararam ter entre 1 a 10 anos; 33,4% de 10 a 20 anos e 16, 6% mais de 20
anos. Em relação ao tempo na mesma escola, 87,9% declararam ter de 1 a 10
anos de atuação e 12,1% declararam ter de 10 a 15 anos. Percebe-se que
mais de 50% dos entrevistados são maiores de 30 anos e possuem em média
10 anos de atuação na Rede Municipal de Educação, isto é, já estavam
atuando quando a Lei 10.639/03 foi promulgada.
Categoria 2: Percepção sobre o Racismo na Sociedade e na Escola
79
Na questão Percepção do Racismo, na qual se indagou como é vista a
questão do racismo, discriminação ou preconceito na sociedade, as colocações
das 24 entrevistas foram enriquecedoras, como por exemplo:
É com muita tristeza até, que pelo tempo e pela contribuição dos
negros a gente já era pra se ter um respeito muito grande, e na
verdade assim existe hoje uma dívida muito grande para com esse
povo e o que está se fazendo ainda é pouco perto do que nós
devemos para eles, mas já estamos avançando (Entrevistado 4).
Eu vejo como uma coisa ainda muito marcante, apesar de os tempos
modernos, está cada vez mais derrubando o preconceito a
discriminação a sociedade tem encarado com mais naturalidade,
porém uma naturalidade disfarçada as pessoas fingem que aceitam,
acho que por uma questão mesmo de controle social de querer dizer
que a coisa está controlada, ah! O racismo está controlado, então
isso é querer mascarar, é dizer que aceitam, mas ainda vejo que no
interior mesmo não aceitam (Entrevistado 12).
Lamentável que nós em pleno século XXI com todas essas formas de
tecnologia, com todas essas formas de conhecimento que nos levam
a conhecer mais e mais o mundo e as pessoas, ainda vemos isso
presente na nossa sociedade e por incrível que pareça muitas
pessoas se negam a ver isso.Mas para mim é nítido, é cristalino esse
preconceito, essa discriminação apenas porque a pele é diferente, a
cor da pele é diferente da sua própria, pois eu lamento que isto
exista. E, nós como professor temos um papel fundamental nisso.
Fico mais triste ainda quando vejo próprios colegas de profissão
perpetuando ajudando a afirmar o preconceito isto é inconcebível e
temos que lutar mesmo para que isso seja afastado das escolas e
dos centros de ensino (Entrevistado 10).
Em geral, nota-se que existe na sociedade racismo, discriminação ou
preconceito de forma disfarçada e também que dentro das escolas existem
profissionais que possuem atitudes racistas. Segundo Gomes ( 2007,p.101)
“[...], o racismo ambíguo brasileiro sempre foi um campo fértil para a
construção de ideologias e pseudoteorias raciais no passado e para a
perpetuação da desigualdade entre negros e brancos que se mantém no
presente.”
A pergunta sobre como eles vêem a questão do racismo, da discriminação e do
preconceito na escola teve as seguintes respostas:
Bom é preocupante, pois se a escola não está atenta para isso nós
estaremos formando cidadãos futuros, muito preconceituosos que
serão altamente prejudiciais a nossa sociedade (Entrevistado 5).
80
Ainda acontece infelizmente, até por falta de conscientização até
vindo dos pais mesmo porque algumas escolas tem feito um bom
trabalho nesse tema (Entrevistado 8).
Ao se analisarem as colocações acima, percebe-se a questão do racismo, da
discriminação e do preconceito na escola, nos seus ambientes, o que
demonstra a necessidade de um trabalho com a equipe escolar. Souza (2009)
aponta que a temática das relações étnico-raciais, ainda que demandadas pela
sociedade, ainda que possuam uma lei que enfatiza sua obrigatoriedade nos
currículos e muitas pessoas reconheçam sua importância, ela ainda não faz
parte de forma prática do fazer pedagógico da escola.
Vale destacar que há uma intensidade na discriminação das religiões de
matrizes africanas, abordadas de diversas formas nas “falas” dos entrevistados
e bem declaradas nesta especificamente:
Bom, como eu mais trabalhei até hoje em escola de periferia onde
existe muitos alunos negros e negras então eu não consegui perceber
nitidamente o preconceito a questão da cor, no entanto eu percebo
muito preconceito em relação a religião, quando tem assim uma
religião que tem uma origem de matrizes Africanas, isso gera muito
preconceito ainda, entre os alunos muita coisa que não está
esclarecida, igual ao candomblé, a macumba, enfim isso ainda está
muito intranhado na mente dos alunos. (Entrevistado 2).
Lopes (2008) enfoca que:
A aversão declarada à religiosidade africana e afro-brasileira fere a
dignidade e o direito à liberdade religiosa. A instituição escolar
brasileira, em sua maioria, admite a simbologia do cristianismo em
seus diferentes espaços e até mesmo apregoa seus princípios. No
entanto, assumir outra religião torna-se desconfortável para muitos
estudantes que preferem o silêncio frente a uma possível
discriminação religiosa. Esta situação pode também desencadear
formas de exclusão. (LOPES, 2008, p.26)
Categoria 3: Sobre as possíveis causas da Origem do Racismo
No questionamento sobre a opinião de quais seriam as origens do racismo,
discriminação ou preconceito na escola, foi dito que:
81
O racismo olha, ele é um fato Histórico, se você for pegar a História,
se forem analisar desde os tempos de Hitler, a gente já vai ver toda
uma questão de discriminação, de caça a Judeus, de caça aos
negros.
Eu acho que o a racismo na escola é cultural, eu acho que o racismo
ele não nasce na escola ele nasce na família, se você tem uma
criança e você educa essa criança com termos tipo negão, neguinho,
macaco essa criança provavelmente vai crescer sendo racista
(Entrevistado 19).
A origem está dentro da família começa na família, pois a família de
uma forma ou outra influencia muito a criança quanto a sua formação,
dependendo de como a pessoa age, ela vai influenciar esta criança
que vai para a escola que de alguma forma está discriminado a outra,
não só com a questão do negro, como a questão da pobreza.
Também a criança quando vê alguém da família dele olhando mais
de cima uma pessoa menor discriminando na forma dela ser mais
humilde ou de cor ela passa a agir desta forma inconscientemente,
então ela se desenvolvendo e depois se transforma em um racista
(Entrevistado 21).
O racismo e o preconceito no Brasil ele tem origem histórica, ele
remonta obviamente a questão da própria formação povo brasileiro, a
presença, por exemplo, da própria questão do negro trazido da África
para o Brasil. Este foi inserido aqui no nosso país na economia no
principio açucareira, depois nas outras atividades econômicas. Foi
sendo construída uma estrutura institucional do racismo, que embora
tenha havido umas alterações, algumas melhorias durante o tempo,
ela vem melhorando alguma coisa, mas o racismo ainda permanece
de maneira muito presente na nossa sociedade. Então eu acredito
que o racismo tenha origem histórica e está muito relacionado ao
desconhecimento e a maneira como essas pessoas tratam esta
questão (Entrevistado 24).
Nota-se que a origem do racismo é histórica, porém está presente nas famílias,
que acabam perpetuando o racismo, discriminação ou preconceito de geração
a geração. De acordo com Santos & Silva (2005), o racismo é histórico,
abrangendo uma dimensão nacional, exigindo muito empenho de todos os
setores, principalmente da escola – que é uma estrutura governamental –, pois
toda a sociedade civil organizada deve dialogar e agir para eliminar as
desigualdades sociorraciais.
Categoria 4: Situações Reais de Racismo, Discriminação e Preconceito na
escola e o seu enfrentamento
Ao serem questionados se já presenciaram alguma situação de racismo,
discriminação ou preconceito na escola envolvendo aluno ou algum
profissional, as respostas foram:
82
Esta envolvendo aluno sim, até por coleguinhas falando que são
beiçudo, olha o neguinho, as canelas dele está russa quer dizer que
ele não toma banho, porque ele é preto, minha mãe falou que ele é
preto por isso que ele fica com a canela russa todos esses tipos
mesmos (Entrevistado 22).
Já presenciei algumas situações, tipo o que acontece algumas vezes,
a gente observa o aluno, por exemplo, chamando o coleguinha de
macaco, chamando o coleguinha de urubu, quer dizer falando do
cabelo, cabelo de Bombril, falando do nariz quer dizer, falando da
própria cor da pele. Então a gente vê cotidianamente estas relações
de racismo dentro da escola, de professores para aluno eu não vi,
mas já vivenciei na pele isso como negro que sou (Entrevistado 24).
Quanto à questão de religião eu vejo constantemente, até porque a
questão de religião de matriz africana ficou ridicularizada no
imaginário popular escutasse macumba, ou a pessoa fala ou se
souber que vai a umbanda ah! Cruz credo, é então preconceito com
relação a matriz a origem do momento na maioria dos lugares onde
estou. Essa questão do presenciar é não vejo muito nitidamente eu
vejo brincadeiras, brincadeiras de mau gosto, essas brincadeiras é
que são generalizadas, eu vejo isso essas brincadeiras, com questão
do homossexual, do negro, do baixinho então essas infâncias pelo
menos eu vejo nos meus alunos na escola parece que dá impressão
que está no mesmo nível ou pelo menos visto dentro da escola com
relação aos alunos que são adolescentes (Entrevistado 2).
Aluno já, principalmente em se tratando de tipo de cabelo, formato de
nariz, tom de pele, cor de olhos, outro assim tem cabelo seco, outro
tem cabelo liso acontece muito entre os alunos (Entrevistado 2).
Pelas respostas, observa-se que nas escolas há presença de situações de
racismo, discriminação ou preconceito envolvendo aluno ou algum profissional,
e que estas precisam ser trabalhadas. De acordo com Souza (2009), o que
importa é que temos o desafio de reunir nossas partes, nossas dimensões
esquartejadas pelo racismo diante de toda a diversidade étnica que possuímos
e buscar construir como educadores uma pedagogia para a real população
brasileira.
Ao se questionar se já enfrentaram situações constrangedoras de racismo,
discriminação ou preconceito na escola e qual foi sua atitude, obtivemos como
resposta:
[...] presenciei sim, alunos falando que não quer sentar perto do
coleguinha porque ele é isso, ele é aquilo, a cor é diferente, então a
gente trabalha os valores e é por aí (Entrevistado 11).
Já, já envolvendo aluno e profissional. A atitude na hora? Foi de inibir
aquela ação, de agir com autoridade e mostrando num tom de
igualdade num discurso de igualdade, é assim que devemos agir
(Entrevistado 12).
83
Em algumas escolas que eu já trabalhei já presenciei alguns alunos
rejeitando professor, precisando da intervenção por parte do Diretor,
Pedagogo para se ter uma conversa com esse aluno, e realmente
presenciei de aluno rejeitando professor.No primeiro momento eu
tentei conversar com essa pessoa, falar desse assunto com ela,... a
passar pra ele que o preconceito não leva a nada, que nós temos que
conviver com as diversidades e temos que respeitar as diferenças,
que nós somos iguais na aparência física, são iguais perante as leis,
perante a Deus, temos os mesmos direitos é só a questão de respeito
e a diversidade, isso que tentei passar para esse aluno (Entrevistado
16).
Nós presenciamos a todo instante em um simples fato de um aluno
falar oh! Neguinho, oh! Negão! Isso já é um racismo, é comum a
gente tenta corrigir, ma é comum. Agora um racismo mais exorbitante
a ponto de ofender, eu nunca presenciei. Em sala de aula, repreendi
sempre neste sentido de aluno meu algumas vezes, já era habituado
a agir desta maneira a chamar o colega de negão, vem cá negão,
negão? O nome desse negão que ele usa é até o Wilson, e eu falei
pra ele, rapaz você está fazendo um racismo indireto, sem querer
você está cometendo um racismo com ele,e, o pior este cidadão que
já está sofrendo com este racismo, ele já se auto titula negão, você
vê que o próprio negro já se coloca em uma visão racista, eu tentei
corrigir ele a não agir desta maneira (Entrevistado 19).
Assim, depreende-se que o racismo é um fenômeno presente concretamente
na estrutura da sociedade brasileira, e a luta por sua superação constitui um
elemento importante para a construção de novas dinâmicas de relações
sociais. GOMES (2007) enfatiza que essa nova situação encontra as escolas,
os gestores, pedagogos e professores em situação de insegurança e
desconhecimento para o tratamento pedagógico das questões étnico-raciais.
Questionados se perceberam se algum profissional enfrentou situações de
racismo, discriminação ou preconceito no ambiente de trabalho, alguns
responderam que:
Já presenciei, mas a gente fica um pouco sem graça, em ver o
próprio colega exclui o outro (Entrevistado 6).
Não, não em nenhuma escola que eu trabalhei eu nunca percebi com
esse profissional não sempre houve muito respeito quanto a isso
(Entrevistado 18).
Na minha escola tem um professor negro, e os alunos ficam fazendo
chacotas dele por trás, ridicularizando-o, por que ele era muito
risonho, aí falava que ele faz macaquice coisas desses gêneros que
estamos cansados de ver por aí (Entrevistado 23).
Já percebi sim, até por parte da família do aluno falou que a
professora estava ensinando coisas de Macumba, que não ia deixar a
filha dançar, não ia deixar a filha nem participar daquelas aulas que
84
estavam falando daquela cultura negra, só que ela usou outros
termos não falou cultura negra (Entrevistado 22).
Pessoalmente não, mas já ouvi vários casos, inclusive de mães que
invadiram a sala discriminando professor verbalmente por causa da
cor, porque a filha não queria estudar com o professor por causa da
cor, coisa deste tipo (Entrevistado 12).
A maioria dos entrevistados afirmou ter percebido que algum profissional
enfrentou situações de racismo, discriminação ou preconceito no ambiente de
trabalho; os que não presenciaram, apontaram conhecimentos de relatos
relacionados a essa situação. Porém três entrevistados (12%), afirmaram não
ter percebido e não informaram nenhum relato ocorrido. Gomes (2007) pontua
que há na educação escolar um imaginário pedagógico que tende a considerar
que a questão racial é tarefa somente dos profissionais da educação que
assumem publicamente uma postura política diante deste assunto.
Categoria 5: Dificuldades encontradas para trabalhar o Racismo na Escola
Todos os entrevistados são unânimes em afirmar que já enfrentaram situações
constrangedoras de racismo, discriminação ou preconceito na escola e que
buscaram ter alguma atitude de coibir a situação, porém dá para se notar que,
apesar da boa vontade, falta conhecimento para lidarem com a situação.
Perguntando-se aos entrevistados quais as dificuldades que os profissionais
têm de trabalhar a questão do racismo, discriminação ou preconceito na
escola, as respostas foram bem diretas:
Apesar de vermos muita informação na mídia, o que se chega para a
escola não é tanto quanto se deveria chegar, então, eu acho que a
falta, é de profissionais capacitados para se fazer formação, fazer
palestras, fazer oficinas para que instrua mais os profissionais e
também os alunos para que também possamos acabar com isso
(Entrevistado 23).
Na questão especificamente com relação à religião de matriz africana
a resistência que os próprios profissionais estão imersos a esses
preconceitos é professam religião cristã como sinônima de verdade
oficial, quando não reconhecem muitas às vezes as diversidades na
questão religiosa (Entrevistado 2)
A dificuldade maior é que o tempo do profissional às vezes é tão
corrido dentro do seu planejamento, dentro daquilo que ele tem que
aplicar em termo de conteúdo, que as vezes ele não consegue inserir
85
essa prática do trabalho, de orientação, de educação contra o próprio
racismo, que agora está mudando um pouco, nós estamos tendo até
mesmo que inserir na grade curricular alguns conteúdo para ser
trabalhados nesse sentido. Então, está melhorando a situação, mas
ainda tem alguns profissionais que ainda estão muito resistentes a
essas questões que devem ser trabalhados todos os dias, a cada
momento da disciplina ele deve ser trabalhado (Entrevistado 5).
É que durante muito tempo dentro do currículo foi uma questão que
não foi introduzida, teve sim, dias específicos para se trabalhar o dia
do negro, a abolição e isso ficou culturalmente nas escolas e foi uma
coisa que foi inserida naturalmente no cotidiano escolar para se
trabalhar. Agora, com a Lei 10.639, eu tenho voltados os olhos para
esse trabalho contínuo, de buscar este tema constantemente nos
nossos trabalhos, sempre que vamos desenvolver um projeto, ter um
olhar pra esta situação, isso é importante realmente (Entrevistado
14).
Eu acho que a primeira dificuldade é a questão de conhecimento de
conteúdo, é de formação. [...] eu acredito também que uma
dificuldade, é que as vezes o professor quer tratar deste tema de
maneira muito pontual, então em uma data específica, em um
momento específico, em uma questão específica, [...] estas questões
que precisam estar inseridas no currículo e que muitas vezes não
estão, então o que acontece com o professor, não está no currículo
eu não preciso dar, não está posto, não preciso tratar, outra problema
que eu vejo também, é que as vezes o professor faz vista grossa
mesmo para esta situação e não querem tratar de maneira muito
efetiva, porque as vezes não acham que a sociedade brasileira é
racista não tem preconceito (Entrevistado 24).
A dificuldade da informação de uma coisa que já está enraizada nas
pessoas nesse tempo todo, nesse período todo de não conhecerem a
importância do negro e não terem o devido respeito (Entrevistado 4).
Todos os entrevistados mostram que os profissionais têm dificuldades para
trabalhar a questão do racismo, discriminação ou preconceito na escola e
enfocam diversos fatores, que vão desde formação profissional, questão
curricular da Educação Básica, falta de capacitação e falta de apoio
administrativo. De acordo com Lima (2009), a contribuição da perspectiva
multicultural em educação pode ser adequada e enriquecedora, pois
problematiza os mecanismos que reforçam as relações de poder que
constroem
as
diferenças
através
de
uma
prática
curricular
e,
consequentemente, a melhoria de como trabalhar a questão do racismo,
discriminação ou preconceito na escola.
CATEGORIA 6- Atividades planejadas e desenvolvidas na escola sobre
história da África e afro-brasileira
86
Ao questionar os entrevistados sobre quais atividades são planejadas e
desenvolvidas em sua escola para se trabalhar a História da África e AfroBrasileira, eles apontaram como planejadas: dia de estudos sobre a temática –
consta no PPP da maioria das escolas; participação em cursos sobre a Lei
10.639/03 e sobre a História da África e Afro-Brasileira; Visita à Comunidade
Quilombola de Monte Alegre; realização de eventos, como Feira Geo-História;
comemoração do Dia da Consciência Negra e Africanidade. Percebe-se,
porém, que os eventos foram realizados, mas poucas escolas fizeram a Visita à
Comunidade Quilombola de Monte Alegre; o Dia de estudos e cursos sobre a
Lei 10.639/03 e sobre a História da África e Afro-Brasileira não ocorreram.
Nós temos a feira de História que trabalhamos todo ano, então nós
trabalhamos envolvendo não só a questão do negro, mas a questão
do índio. Também, a gente trabalha as duas etnias e dentro desta
feira, por exemplo, na minha área, que é área de exatas, nós
trabalhamos com os meninos com pesquisas, vamos ao quilombo,
nós buscamos verificar como que é o passado deles, como que é
hoje, juntamos as realidades eles analisam, discutem e apresentam
trabalhos também (Entrevistado 3).
A gente aqui trabalha no 5º ano com algumas palavras que vieram de
origens negras, está sempre trabalhando em artes as diferenças
então a cultura negra é uma cultura muito rica e trabalha também
sobre os tipos de comidas típicas e então tudo isso já está no
contexto escolar (Entrevistado 22).
Tem a Feira de Geo-História que trabalha muito a questão do
afrodescendente e a nossa escola está localizada no Bairro Zumbi,
nós precisamos de um trabalho todo voltado para essa interação,
porque o nome Zumbi de onde veio isso, como que era a vida do
povo que foi morar naquela localidade, fazendo um resgate da cultura
afro, porque eles também se sentem menosprezados, porque a
maioria dos moradores do bairro é negro. Então a gente faz oficinas,
algumas palestras, para poder levar essa valorização da cultura afro,
da cultura musical porque lá eles têm grupos de Maculelê, grupos de
rodas de capoeira tudo isso (Entrevistado 23).
Percebe-se que todas as escolas realizam atividades relacionadas à
Cultura da África e Afro-Brasileira, porém de forma pontual, em datas
específicas, o que precisa ser revisto, como afirma um professor:
Geralmente a escola ela já tem dentro do seu calendário momentos
para ser trabalhado isso, na época mesmo da consciência negra em
novembro, em que se trabalha no período de comemoração ao
Zumbi. Há alguns momentos culturais também que a gente tenta
resgatar a cultura negra para dentro da escola, mas é pouco ainda eu
acho que deveríamos criar maiores ou mais momentos para ser
trabalhado e agora fica a cargo de cada professor de cada disciplina
e de estar também inserindo esses conteúdos dentro de seus
ensinamentos (Entrevistado 5).
87
[...] às vezes o professor quer tratar deste tema de maneira muito
pontual, em uma data específica, em um momento específico, em
uma questão específica, quando na verdade isso precisa ser
trabalhado processualmente, a outra questão importante é a questão
do currículo, a gente acredita muito que a inserção desse ensino no
currículo... (Entrevistado 24).
Daí a necessidade de se fazer um trabalho com os gestores, pedagogos e
professores a partir da Lei 10.639/03, pois, além de levantar uma série de
princípios a respeito da questão racial e educação, torna-se possível
apresentar um conjunto de indicações de conteúdos a serem abrangidos pelo
currículo nas diferentes áreas do conhecimento. Oliveira et al apud Lima (2009)
afirmam que a Lei 10.639/03 não é fácil de se aplicar, pois a questão curricular
se desdobra na necessidade de uma nova política educacional de formação
para gestores, pedagogos e professores para que, assim, possa reverter
positivamente às novas gerações uma nova interpretação histórica e uma nova
abordagem da construção dos saberes.
É importante desenvolver um trabalho contínuo sobre a história da África e da
cultura afro-brasileira, fazendo-se um resgate do verdadeiro passado dos
negros, da sua real história e enfatizando a resistência ao tráfico e à
escravidão, bem como sua religiosidade, suas manifestações culturais, suas
contribuições no multiculturalismo do nosso país, além da ampliação da
consciência social, histórica e de valorização dos negros no Brasil e no mundo.
Assim, os gestores, pedagogos e professores terão oportunidades de
desenvolver nas escolas um trabalho processual no decorrer do ano letivo,
pois, ao entrevistar os professores sobre sua prática de sala de aula, tivemos a
oportunidade de obter relatos que apontaram:
Olha, nós já trabalhamos com os alunos no próprio resgate desta
cultura Brasileira dentro da escola de como conhecer a realidade na
prática dos Quilombolas, indo a alguns assentamentos quilombola
para podermos participar. O mais interessante é quando você
trabalha com aluno na teoria mas quando você leva eles a vivenciar
isso na prática, então a gente teve a oportunidade de estar visitando
dois assentamentos e dentro desses quilombos de conhecer a cultura
afro-brasileira na sua essência e os alunos aproveitaram bastante
88
onde que trouxemos essa experiência pra dentro da escola
(Entrevistado 5).
A feira afro-brasileira que a gente já trabalhou o costume, a culinária,
as vestimentas, as músicas, as danças, religião porque na verdade
tudo que nós temos está ligado ao povo afro-brasileiro (Entrevistado
4).
Usamos o Laboratório de Informática pesquisamos a influência negra
na nossa vida e a biblioteca também possui vários livros que tratam
desses assuntos, jornais, revistas e vai nos auxiliando e fazendo com
que esses assuntos sejam tratados com mais naturalidade
(Entrevistado 7).
Eu trabalhei aquele livro de história Menina Bonita do Laço de Fita,
então fiz a construção da boneca e coloquei junto com os
trabalhinhos que eles fizeram para poder eles perceber essas
diferenças também (Entrevistado 11)
[...] sempre trabalhamos com música afrodescendente, trabalho sobre
a beleza do negro, que o negro tem, a sua dança, o manejo dele,
destacando que cada sua raça tem sua beleza, mas que o negro
também tem a sua beleza, sua qualidade.... (Entrevistado 17).
Além disso, os entrevistados disseram que as atividades são desenvolvidas,
porém em data específica e pontual, o que implica na necessidade de um
trabalho mais intenso com os gestores, pedagogos e professores sobre a
História da África e da Cultura Afro-Brasileira, para que possamos atender as
prerrogativas da Lei 10.639/03. De acordo com Arroyo apud Gomes (2007, p.
114), “O avanços têm sido significativos e promissores, porem lentos. Ainda há
muito a avançar [...] os avanços no diálogo inter-racial e intercultural no
cotidiano das escolas são limitados”.
Categoria 7: Ações para acabar com o racismo na escola
Ao serem indagados sobre quais seriam as ações para se acabar com racismo,
discriminação ou preconceito na escola e qual o papel do gestor, pedagogo e
professor, os entrevistados disseram que:
Primeiro muito diálogo, muito planejamento interdisciplinar com esse
tema, conscientização na família trazendo a família para escola
trazendo palestras com estes temas também a Secretaria de
Educação envolvendo palestras que chamem as famílias para
falarem deste assunto que apareça mais na mídia, porque certo
tempo apareceu na mídia e depois acabou ninguém se fala mais
diversidade e nem cultural (Entrevistado 8).
89
Eu acredito que o pedagogo ele poderia fazer é criar um recurso de
estudos de se aprofundar mais a lei, trabalhar as atividades
constantemente, não só no período onde se comemora a consciência
negra no dia 20 de novembro... (Entrevistado 13).
... envolver mais a comunidade, trazer palestrante pessoas que tem
embasamento teórico neste assunto tem que se conscientizar a
família escola e família tem que estar juntas neste sentido
(Entrevistado 16).
Olha se tiver uma ação que venha acabar com o racismo talvez hoje,
seja até um pouco utopia. Agora existem ações que possa eliminar.
Eu acredito na força do seminário, se começar a trabalhar
individualmente com a turma, com a classe se você tem, com apoio
da pedagoga e do seu diretor... (Entrevistado 19).
Eu acho que a questão central é inserir essa questão no dia a dia,
porque na escola a gente convive em conflito cotidiano, então
perceber uma situação e intervir, e a medida do possível quando há
essa abertura estabelecer um diálogo e a sensibilização pra que esse
tipo de preconceito não volte a ocorrer isso no âmbito da sala de aula.
É claro com relação a diretor e pedagogo cabe tentar articular não
digo um projeto, mas trazer pessoas para promover um debate,
principalmente pessoas inseridas no movimento social. Na verdade,
falar de preconceito o acadêmico pensa que é uma coisa, mas quem
está inserido no movimento social e convive cotidianamente com o
preconceito, possuem uma visão também interessante nessa
questão. Então acho interessante estar convidando pessoas para
participar da vida escolar, visitando, principalmente pessoas que
professam religião de matriz africana, por isso eu bato muito nesta
tecla, porque há um desconhecimento muito grande sobre esta
questão de religião matriz africana. Assim, trazer pessoas que
professam esse tipo de religião esse tipo de credo é importante,
porque na verdade há ignorância, desconhecimento sobre essas
questões (Entrevistado 2).
Ao analisar as questões colocadas sobre ações para acabar com racismo,
discriminação ou preconceito na escola, os entrevistados enfatizam ações
concretas que envolvam todos os profissionais da escola e declaram a
importância do papel do gestor na liderança das ações, do pedagogo como
articulador do fazer pedagógico no tema e do professor como executor,
apoiado pelos demais e envolvendo a comunidade. Nesta perspectiva, Gomes
(2007) enfatiza que a escola brasileira está desafiada a realizar uma revisão de
posturas, valores, conhecimentos e currículos na perspectiva étnico-racial.
Categoria 8: Grau de conhecimento da Lei 10.639/03
Na pergunta aos entrevistados se conhecem a Lei 10.639/03, somente 12%
afirmaram conhecê-la, e a maioria foi unânime a dizer que:
90
Conhecer, eu conheço, mas não a fundo... (Entrevistado 5).
Conheço, mas apesar de nunca ter lido (Entrevistado 15).
Olha eu conheço, mas não tanto assim (Entrevistado 16).
É conheço, é contra o preconceito racial eu nunca li exatamente, mas
eu tenho consciência do tema contra o racismo (Entrevistado 17).
Já, eu não tenho ciência dela ainda na íntegra, mas a gente conhece,
a gente trabalha com ela desde 2003 que comecei a trabalhar com
ela desde 2003 (Entrevistado 18).
Por auto, mas eu nunca li esse assunto da Lei não (Entrevistado 19).
Não, não conheço, eu conheço às vezes falando pelo número da Lei
eu não sei, mas sei do que se trata (Entrevistado 20).
Infelizmente não (Entrevistado 23).
Percebe-se que há urgência de se trabalhar a Lei 10.639/03 com os
profissionais da educação por, de acordo com GOMES (2007), não somente
devido ao fato de ser parte do compromisso social e pedagógico da escola no
combate ao racismo e á discriminação racial, mas também pela sua força como
lei. Ao questionar os entrevistados sobre que práticas educativas deveriam ser
concretizadas em sua escola para atender os princípios e recomendações da
Lei 10.639/03, as respostas tenderam para:
Formação. Se tivesse mais cursos sobre a lei esclarecimento, um dia
de estudo só de análise, por exemplo, pode ser feito na escola, pois
quando você abre para a rede toda você tem um espaço muito maior,
pois quando se trabalha dentro da escola tivesse momentos de
estudos dedicado a essas lei a gente trabalhar, estudar cada ponto
da lei, pontuando e vê desde de que ponto nós podemos estar
trabalhando para fazer valer mais essa lei na escola, dentro da escola
nos momentos de formação continuada é importante (Entrevistado 3)
Maior capacitação de todos os professores, porque todo mundo tem
que entender essa Lei para se trabalhar bem (Entrevistado 4)
Conhecimento sobre a lei, informações diversas e que isto pudesse
acontecer em todo o ano letivo e não só no período em que se
comemora a consciência negra no Brasil que é 20 de novembro e sim
ter um prática constante (Entrevistado 7).
Eu creio que deveria se adequar igual para Português, História e
Geografia, tentar se fechar não ficar massificando, pois às vezes as
pessoas acham que temos que pegar um dia, entendeu, um mês,
uma época e ficar todo mundo falando só daquilo ali. Eu penso que
teria de ser uma coisa contínua, sempre, de uma forma ou de outra,
estar trabalhando naquilo, se eu achar uma reportagem legal eu
posso chegar lá e trabalhar com um seminário, abrir um debate,
dentro de Geografia, posso trabalhar a localização, trabalhar a cultura
91
como esses povos, que eram ricos, o que aconteceu com eles. Então,
várias áreas trabalhando, mas não em períodos determinados, tendo
em mente que se deve falar sempre (Entrevistado 9).
É fundamental a prática e o conhecimento da Lei... (Entrevistado 13)
[...] capacitar mais os nossos professores, informá-los, porque os
professores para falar desse tema, eles têm que estar bem
informado, então nesses estudos estar buscando informar, focar
neste assunto com os professores, envolvendo a família que é
importante e a comunidade... (Entrevistado 14).
[...] eu acho que falta mesmo é um pouco mais de incentivo das
pessoas que estão dentro da escola para nos dar esta prática, pois
querendo ou não, em nossa sociedade o negro ele é tratado como tal
porque a gente aceita... (Entrevistado 19).
Eu acho que as atitudes que deveriam ser tomadas junto a escola,
junto a superintendência de educação ter mais ênfase e não só
quando chega a semana da consciência negra tem as apresentações
periódicas, tem estudos periódicos é sobre este assunto para estar
concretizando mais, dando mais ênfase a criança que quanto mais
você bate na tecla mais a criança vai estar aprendendo então não
deixar só para uma certa data e sim estar trabalhando sempre
(Entrevistado 21).
[...] eu acho que se deveria fazer uma coisa mais efetiva, um circuito
de palestras, mas assim coma exigência da participação de todos
porque assim fica muito livre a pessoa vai porque quer acho que
deveria, já que é uma Lei ela deveria ter obrigatoriedade dentro das
secretarias para que os professores tivessem essa formação mesmo
para poder não se ter desculpa se eu não faço porque eu não sei...
(Entrevistado 23).
Uma primeira sugestão é não trabalhar esse tema pontualmente,
como disse anteriormente, eu não posso trabalhar o treze de maio no
vinte de novembro porque isso não é inserir, não é colocar em prática
esta Lei, outra coisa importante é entender que isso é uma Lei, e,
como Lei ela precisa ser cumprida,... ela está relacionada ao Ensino
Fundamental, Médio e também ao Ensino Superior e também as Pósgraduações as especializações de modo em geral então ela não pode
ser trabalhada pontualmente... o ensino da História da cultura AfroBrasileira não pode ser trabalhada só em História e em Geografia,
nem Artes ou em Língua Portuguesa, ela precisa ser trabalhada em
Língua Portuguesa, ela precisa ser trabalhada em História, Geografia,
Ensino Religioso, Artes, Educação Física todos os componentes
curriculares e aí o que acontece às vezes fica tudo em cima das
costas dos professores de História e de Geografia então ele precisa
de uma formação mais global para que todos os professores tenham
acesso a elas e é uma leitura mais aprofundado dessa questão do
racismo no Brasil e acho que isso é um papel importante
(Entrevistado 24).
Assim, constata-se que os entrevistados estão conscientes da necessidade de
realização de ações para melhoria das práticas educativas para concretização
da aplicação da Lei 10.639/03 nas escolas do município de Cachoeiro de
92
Itapemirim, para que, assim, os seus princípios e recomendações possam ser
atendidos. Segundo Paula (2005) apud Santos & Silva (2005), para mudar e
transformar a realidade em que vivemos, precisamos conhecê-la, entendê-la e
aceitar nossas limitações e fragilidades, para que possamos construir ações
coletivas que nos ajudem a mudar a realidade que nos incomoda.
Categoria 9: Comentários livres dos entrevistados
Ao solicitar aos entrevistados que fizessem algum comentário a mais, se
houvesse e se assim o desejassem, eles colocaram “falas” de otimismo,
esperança e determinação. Como por exemplo:
Um comentário final é que, eu acho muito importante essa pesquisa a
respeito desse assunto, pois nós vivemos em uma sociedade muito
preconceituosa e ao mesmo tempo racista, mesmo que digam e
tentam parecer que não, nós que defendemos a causa e temos
consciência, temos o dever, na formação e devemos sempre voltar a
esse assunto,, sempre debatendo e sempre dando formação,
principalmente aos alunos, para ajudar na formação de uma
sociedade mais justa e igualitária (Entrevistado 5).
Pra trabalhar esse assunto eu me coloco como parte integrante dele,
falo da minha formação familiar, falo onde os meus antepassados
eram senhores de fazenda que se casou com uma escrava e mostro
o meu cabelo, a cor da minha pele para que eles possam perceber
que todos nós sofremos essas influências e que temos de valorizar as
nossas origens Entrevistado 7).
Como eu disse no início o preconceito existe tem muitas pessoas que
não demonstram, mas no fundo ainda são preconceituosas e espero
que no futuro as pessoas se amem mais, não olhem para a pele do
outro, mais sim, olhem por dentro, que olhem a alma. As pessoas
ultimamente estão vendo tanto a pele, o corpo, tanto o material,
vendo mais o externo do que o interno. Então para acabar com isso
tem se olhar mais a alma do outro, o ser (Entrevistado 8).
[...] isso é importante pra estar levando a democracia para todas as
esferas da sociedade (Entrevistado 10).
É muito importante levantar um questionamento sobre este assunto,
eu acho que só resolve o problema quando a gente levanta a causa
desse problema, pois se ele vai abafar nunca seremos resolvidos
então nós temos que questionar, tem que falar pra que a coisa
comece a mudar (Entrevistado 14).
Esse assunto sobre o racismo é um assunto que eu tenho interesse,
porque como professor estar em sala de aula para gente conviver
com tanta injustiça, com tanta humilhação (Entrevistado 16).
93
A questão do racismo, preconceito e discriminação são na minha
concepção um dos problemas mais sérios assim, graves que a nossa
sociedade enfrenta, porque, porque são questões graves? Porque em
alguns momentos as pessoas fazem vista grossa para este problema
do racismo e ao longo da história fomos conhecendo e como a gente
vai vendo que ideologicamente foi sendo construído no Brasil, que
temos uma Democracia racial. Achamos que no Brasil as pessoas
todas são tratadas iguais e da mesma forma isso vai escondendo na
verdade uma ferida aberta, séria, profunda que precisa ser tratada.
Só que na maioria das vezes ele é visto como uma questão
secundária ma ela é séria, porque ela envolve a escola, ela envolve a
família, envolve o Sistema Político, envolve as questões econômicas,
então é um problema muito sério (Entrevistado 24).
Só tenho que agradecer pela oportunidade de estar tratando um
pouquinho desse tema essa é um tema que estamos lidando bastante
com ele e que nos toca diretamente não só por sermos negros, mas
por sermos educadores e por lidarmos com essa criança que é negra,
de estarem com sua autoestima às vezes feridas, de estar com sua
iniciativa às vezes também frustrada, de estar retida dois, três, quatro
anos e a gente precisa, precisa gritar contra o racismo eu acho que a
nossa sociedade, o Brasil é um país maravilhoso, muito extraordinário
e ele precisa dar o exemplo do tratamento dessa questão
(Entrevistado 24).
Observa-se que as entrevistas proporcionaram reflexão e responsabilidade em
todos os posicionamentos dos profissionais, com riqueza dos depoimentos,
experiências, dos fragmentos, na esperança de um desenvolvimento de uma
proposta enriquecedora, que faça a diferença na prática pedagógica de gestão
e docência na Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim, no
Espírito Santo, promovendo uma sociedade mais justa e igualitária.
Paula (2005) apud Santos & Silva (2005) afirma que o Brasil precisa aprender a
olhar e se ver, pois precisamos construir uma pedagogia multirracial e popular
que ajude a educar o Brasil com raça, uma vez que nossa sociedade só se
desenvolverá quando combater as desigualdades sociais.
Houve o cuidado de separar os pontos a serem questionados a partir das
categorias escolhidas: Situação Funcional e Tempo de Serviço do Servidor,
Formação dos Servidores, Participação, Realização de Atividades sobre
Racismo na Escola, Conflitos, Atitudes Racistas Percebidas na Escola, Nível
de Conhecimento, Formação Sobre a Lei 10.639/03. Tudo isso, visando à
necessidade de se trabalhar a História da África e Cultura Afro-Brasileira na
escola, onde se buscaram múltiplos olhares de um mesmo objeto, o que
94
propiciou novas perspectivas que tornaram possível a sua ampliação da
interpretação.
Assim, conviver com a diferença é o grande desafio para se discutir a temática
da inclusão. Hoje a intolerância perante o diferente é um dos grandes motivos
da exclusão escolar. É necessário denunciar a realidade nas escolas e na
sociedade, pois existem barreiras curriculares e de atitudes, falta de
conhecimento e de sensibilização e não divulgação dos direitos dos cidadãos,
que são fatos que precisam ser combatidos para se diminuir o preconceito e a
desigualdade social.
Pensar em inclusão social nos remete, necessariamente, ao seu
reverso: a exclusão social. Os dados da realidade brasileira e
mundial, são tão marcantes quanto a exclusão, que, ao pensar em
um projeto sobre ética e cidadania, somos levados a estabelecer a
inclusão como um desejo, uma realidade que só se alcançará com
grandes transformações sociais e políticas (LODI, 2003, p. 8).
Essa inovação não se faz apenas pela obrigatoriedade da lei, mas na quebra
de paradigmas, envolvendo os gestores, pedagogos, professores, alunos e a
comunidade no levantamento e na busca de soluções para os problemas que
enfrentam sobre inclusão e diversidade, imprimindo a essa mudança um
caráter de construção coletiva, isto é, de toda equipe escolar. Nesse contexto,
define-se este fazer como tecnologia social:
...conjunto de técnicas, metodologias transformadoras, desenvolvidas
e/ou aplicadas na interação com a população e apropriadas por ela,
que representam soluções para a inclusão social e melhoria das
condições de vida (DAGNINO, 2009, p. 7).
Nesse processo, é necessária a mobilização de todos do espaço escolar, de
forma a participar e contribuir na construção de um novo modelo de educação
e que as soluções surjam das demandas sociais no diálogo com as
necessidades identificadas. Desse modo se favorecerá um processo de
aprendizado
para
a produção
de
saberes
em
diferentes níveis
de
aprendizagens para que se consiga alcançar inclusão nas escolas trabalhando
a questão do racismo na sociedade, propiciando possibilidades de se
95
conseguirem progressos significativos no trabalho dos gestores, pedagogos e
professores com a Lei 10.639/03 e por meio da adequação das práticas
pedagógicas à diversidade.
É como eu falei no começo, a escola tem que estar voltada para um
trabalho se preocupando com esse racismo velado que ele existe e
que nós temos a preocupação de mostrarmos para os nossos alunos
que nós somos iguais independentes de raça,classe social, de físico
esse é o papel da escola é promover a igualdade dentro das
diferenças (Entrevistado 14).
Nas entrevistas, procurou-se detectar e perceber as concepções dos sujeitos
entrevistados nas questões também voltadas ao racismo, discriminação,
preconceito racial e à Lei 10.639/03, com as categorias: Os sujeitos
entrevistados, Percepção sobre o racismo na sociedade e na escola, Sobre as
possíveis causas da origem do racismo, Situações reais de racismo,
Discriminação e preconceito na escola e seu enfrentamento, Dificuldades
encontradas para se trabalhar o racismo na mesma. Atividades planejadas e
desenvolvidas na escola sobre a História da África e Afro-Brasileira, Ações
para acabar com o racismo na escola grau, Conhecimento da Lei 10.639/03 e
Comentários livres dos entrevistados. Percebeu-se que a relação dialógica com
as questões raciais requer investimento na compreensão e melhoria da práxis
dos gestores, pedagogos e professores no que tange às questões da Lei
10.639/03.
Eu acredito que talvez por falta de apoio da administração, pela parte
que muitas vezes nós nos sentimos muito sozinhos, falta suporte
talvez por causa do tempo, talvez oportunidade na escola pra que
este tema seja abordado, as vezes na comemoração na festinha para
comemorar isso aí, mas, uma coisa mais séria que se pede realmente
para se combater o racismo, então fica difícil (Entrevistado 16).
Segundo Munanga & Gomes (2006), aprender a conhecer o Brasil é aprender a
conhecer a história e cultura de cada um dos seus componentes para que
assim possamos entender a nossa história e identidade, começando pelo
estudo de todas as matrizes culturais, de forma que reflitam na nossa sala de
aula.
96
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Eu tenho um sonho que minhas quatro pequenas crianças vão um dia viver em
uma nação onde elas não serão julgadas pela cor da pele, mas pelo conteúdo
de seu caráter. Eu tenho um sonho hoje!
Martin Luther King Jr.
Esta pesquisa sobre “As Práticas de Gestão e Docência no Município de
Cachoeiro de Itapemirim a partir da Lei 10.639/03” teve a finalidade de
apresentar reflexões no que se refere a analisar e compreender as dificuldades
no âmbito da gestão e da docência na realização e operacionalização da Lei
10.639/03, com vistas à superação do racismo nas escolas de Educação
Básica.
Neste ano em que comemoramos oito anos de aprovação da lei 10.639/03,
verifica-se a existência do racismo, preconceito e discriminação nas escolas, e
poucas ações concretas. Conclui-se que é necessário desenvolver um trabalho
de forma processual, pois trabalhar a diversidade é de suma importância, já
que esta é muito mais que cultura, é a construção social e cultural no processo
histórico, nos fazendo enxergar as diferenças. Assim, é de suma importância
que os educadores tenham em seu papel desconstruir o conceito negativo
colocado pelos grupos elitizados sobre o povo negro.
Segundo Souza (2009), apesar de a promulgação da Lei 10.339/03 ser uma
resposta da luta do MN e de todos que acreditam numa sociedade mais
igualitária e democrática, sua aplicabilidade não tem sido fácil. A pesquisa de
trabalho com relações étnico-raciais na escola, na perspectiva da Lei
10.639/03, aponta o importante papel da instituição escolar, da gestão da
escola e do professor na sala de aula em desenvolver de forma democrática e
participativa
trabalhos
dinâmicos,
coletivos,
articulados,
enraizados
e
conceitualmente sólidos, voltados para a educação das relações étnico-raciais
e promovendo a aquisição de conhecimentos.
97
Mediante estudos realizados e dentre os resultados encontrados, destaca-se
que as metodologias trouxeram resultados satisfatórios como a percepção das
dificuldades dos gestores, pedagogos e docentes de trabalharem a questão do
racismo, pois, apesar de maneira esporádica, de forma pontual, estes sentem a
necessidade de estudar a Lei 10.639/03, bem como se aprofundar na história
da África e cultura afro-brasileira. Entretanto, alguns valores ainda se mantêm
em patamares muito altos, como a questão da dificuldade de se lidar na sala de
aula, e na escola de maneira geral, com situações de racismo, discriminação e
preconceito.
Tudo isso foi depreendido das respostas dos entrevistados quando
questionados sobre que práticas educativas deveriam ser concretizadas em
sua escola para atender os princípios e as recomendações da Lei 10.639/03.
Dentre várias respostas, destacam-se as seguintes:
Formação, pois se tivesse mais cursos sobre a Lei, esclarecimentos,
um Dia de Estudo só de análise, por exemplo,que pode ser feito na
escola, pois quando você abre para a rede toda você tem um espaço
muito maior, pois quando se trabalha dentro da escola momentos de
estudos dedicado a essas lei a gente poderia estudar cada ponto da
Lei, pontuando e vê desde de que ponto nós podemos estar
trabalhando para fazer valer mais essa Lei na escola, assim, dentro
da escola momentos de formação continuada é importante
(Entrevistado 3).
Conhecimento sobre a lei, informações diversas e que isto pudesse
acontecer em todo o ano letivo e não só no período em que se
comemora a consciência negra no Brasil que é 20 de novembro e sim
ter um prática constante (Entrevistado 7).
Acho que a questão central é inserir essa questão no que acontece
no dia a dia, porque na escola a gente convive em conflito cotidiano,
perceber uma situação e intervir. Quando há essa abertura
estabelecer um diálogo e a sensibilização pra que esse tipo de
preconceito não volte a ocorrer isso no âmbito da sala de aula [...]
(Entrevistado 2).
[...] eu não posso trabalhar o treze de maio no vinte de novembro
porque isso não é inserir, não é colocar em prática esta Lei, outra
coisa importante é entender que isso é uma Lei, e, como Lei ela
precisa ser cumprida, [...] precisa-se de formação para este
profissional porque eu quero frisar isso porque, por exemplo, a Lei
10.639 o ensino da História da cultura Afro-Brasileira não pode ser
trabalhada só em História e em Geografia, nem Artes ou em Língua
Portuguesa, ela precisa ser trabalhada em Língua Portuguesa, ela
precisa ser trabalhada em História, Geografia, Ensino Religioso,
98
Artes, Educação Física todos os componentes curriculares e aí o que
acontece às vezes fica tudo em cima das costas dos professores de
História e de Geografia então ele precisa de uma formação mais
global para que todos os professores tenham acesso a elas e para
uma leitura mais aprofundada dessa questão do racismo no Brasil e
acho isso um papel importante (Entrevistado 24).
Nesta perspectiva, a questão do trabalho com inclusão racial precisa ser
adequada à escola, que é a realidade local. Para isso, são necessárias
mudanças de paradigma na educação e na sociedade, de forma que estas
repensem o seu papel e vejam como serão inserido nessa nova realidade, para
que a educação não fique só nas mãos dos educadores, mas de todos: família,
escola, igreja e sociedade em geral, pois a educação é muito importante.
Gomes (2007) aponta que, para se ampliar a responsabilidade do Estado
diante das múltiplas dimensões e complexidades no que tange à questão
racial, é necessário instigar o MEC, secretarias de educação e escolas a
buscarem alternativas para implementar, de forma efetiva, políticas que visem
garantir a totalidade dos direitos da população negra.
No decorrer da pesquisa, percebeu-se a necessidade de se trabalhar a questão
do racismo na escola de forma mais enfática, mas ficou claro que a grande
demanda é iniciar um trabalho contínuo com os gestores, pedagogos e os
professores da Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim sobre
a Lei 10.639/03 e a História da África e a Cultura Afro-Brasileira.
Um trabalho de forma interdisciplinar e articulada ao PPP de cada escola, para
que se possa dar mais visibilidade aos negros que contribuíram na construção
da história do Brasil e do mundo. Assim se dará, consequentemente, mais
segurança aos gestores, pedagogos e professores para desenvolverem um
trabalho na escola e, ao mesmo tempo, dar aos alunos mais interesse pelas
questões étnico-raciais.
Para que essa transformação ocorra, há a necessidade de se refletir: “Que
sujeito estamos formando?”, e daí, promover inovações nas escolas para que
atendam à implementação da Lei 10.639/03, incrementando o sistema de
99
gestão e intensificando no PPP novas relações para a construção de novas
formas de trabalho na prática pedagógica sobre o racismo, discriminação e
preconceito.
É na escola que o indivíduo aprende e põe em prática os primeiros princípios
da cidadania e respeito à diversidade, é onde se desenvolvem as habilidades
intelectuais e cognitivas, onde se aprende a socialização, convivência em
grupo
e
a
aprendizagem
lida
com
as
diferenças individuais,
significativa
numa
desenvolvendo
perspectiva
uma
social:
escola/professor/aluno/pais/comunidade.
Em relação aos avanços na Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de
Itapemirim, houve no ano de 2010 a criação do CEAFRO, que vem atuando de
uma forma um tanto tímida. Vale destacar que de 2003 até a presente data
foram feitos dois eventos pela Rede Municipal de Educação: o I Seminário
Regional Sul de Igualdade Racial, para todos os profissionais, com palestras e
atividades diversificadas no Pavilhão da Ilha da Luz, em 2007, e o I Fórum de
Escolas Públicas e Privadas das Relações Étnico-Raciais do Município de
Cachoeiro de Itapemirim, em 2011, para representantes das escolas. Em 2007
foi oferecido um Curso de Formação para representantes de algumas escolas
sobre História da África e Cultura Afro-Brasileira em parceria com o Centro
Universitário São Camilo Espírito Santo, e que não atingiu um número
significativo de profissionais da Rede Municipal de Educação.
Considerando que as perspectivas desta pesquisa são “As Práticas de Gestão
e Docência a partir da Lei 10.639/03”, pode-se afirmar que o questionário, onde
se buscou mensurar a percepção do racismo, discriminação, preconceito racial
a luz da Lei 10.639/03, atingiu seu objetivo
Na entrevista, obtivemos inúmeros posicionamentos. Dentre elas destacamos:
“[...] se tivesse mais cursos sobre a Lei, esclarecimentos, um Dia de Estudo só
de análise, por exemplo, que pode ser feito na escola [...]”(Entrevistado 3).
“Bom, eu acho que a questão central é inserir essa questão no que acontece
no dia a dia [...] (Entrevistado 2).
100
Nesta perspectiva, percebe-se que é necessário desenvolver um trabalho de
formação continuada com os gestores, pedagogos e professores da Rede
Municipal de Cachoeiro de Itapemirim enfocando a Lei 10.639/03 e História da
África e Cultura Afro, refletindo-se: “Como se tem lidado com a diversidade?
Qual conhecimento é necessário adquirir? Como enfrentar a questão do
racismo na escola?”, para que, a partir daí, se coloque um eixo pedagógico
com a diversidade e se busque desenvolver na sala de aula um trabalho de
releitura da escravidão, do Continente Africano, dos negros que se destacaram
nesta trajetória de luta até os dias de hoje e muito outros olhares. Tudo isso
deve ser norteado, pautado pelo princípio da relação humana e ética. Sabemos
que a educação tem muito a caminhar para uma efetiva formação profissional,
lutando pelo direito à formação continuada.
Diante de tudo isso, foi elaborado um Produto da Dissertação (Apêndice D), de
forma inovadora, que visa a um trabalho de conscientização, um trabalho
processual e contínuo para gestores, pedagogos e docentes, capacitando-os
para a realização de mudanças efetivas em prol da transformação da realidade
da diversidade racial nas escolas da Rede Municipal de Cachoeiro de
Itapemirim.
Mantoan (2005) afirma que inclusão é a nossa capacidade de entender e
reconhecer o outro, forma de conviver e compartilhar com pessoas diferentes,
e é nos bancos escolares que se aprende a dividir responsabilidades e a
repartir tarefas. Assim, a capacitação e a participação são alternativas que nos
direcionam a olhar a diversidade e trabalhar com ela e não contra ela,
contribuindo muito para que o processo educacional possa alcançar melhores
resultados na formação do aluno como verdadeiro cidadão. E também, no
trabalho do professor, que deve ser um educador e um profissional-cidadão,
capaz de exercer seu profissionalismo por meio da consciência crítica sobre o
saber que se socializa na escola.
Nesta perspectiva, é importante reconhecer e valorizar a diversidade como
elemento enriquecedor do processo de ensino-aprendizagem, fazendo, com
101
isso, com que os professores tenham sensibilização e consciência do modo
como atuam, para promover a aprendizagem de todos os alunos permitindo
que todos tenham possibilidades de construir um conjunto de saberes. Para
isso será proposto um Produto da Dissertação que venha atender as
necessidades dos gestores, pedagogos e professores, no que tange trabalhar
na escola atividades multidisciplinares voltadas para a questão do racismo,
discriminação e preconceito, com vistas a atender a Lei 10.639/03.
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105
APÊNDICES
Apêndice A - Questionário
Prezado:
Estamos realizando uma pesquisa nas escolas do município e por isso
solicitamos, por gentileza, que responda às perguntas abaixo relacionadas.
Suas informações são de fundamental importância para esta pesquisa.
Escola: ________________________________________________________
Nome:__________________________________________________________
1- Você atua na Rede Municipal de Ensino como efetivo, contratado ou
designação temporária (DT):
( ) de 2003 em diante ( ) depois de 2003
2-
Você atua como: ( ) gestor ( ) pedagogo ( ) professor de ____________
3- Você se formou em qual instituição? Qual sua habilitação e ano de
conclusão?
Instituição: __________________________________________________
Habilitação___________________________________________________
Ano de Conclusão: ___________________
4- Você já planejou ou participou de alguma atividade relacionada à cultura
afro-brasileira na sua trajetória profissional? ( ) sim ( ) não
5-
Se você respondeu “sim” à pergunta anterior, preencha o quadro a seguir:
Atividade
Ano de
Realização
Escola
Breve descrição
106
6- Na(s) atividade(s), sua atuação se caracterizou por:
( ) participação como assistente;
( ) propositor da atividade;
( ) organizador da atividade;
( ) todas as alternativas;
( ) outras. Especifique: _______________________________________
7- Marque com x a opção ou opões que retratam sua vivência sobre a
questão do racismo.
( ) Percebo essa questão na escola de forma clara.
( ) Percebo essa questão na escola de forma sutil.
( ) Percebo conflitos referentes a essa questão em sala de aula.
( ) Percebo conflitos referentes a essa questão no recreio.
( ) Existe(m) em meu planejamento de trabalho proposta(s) para
enfrentamento dessa questão.
( ) Existe proposta de trabalho no Projeto Político Pedagógico (PPP) da
escola para se trabalhar essa questão.
( ) Tenho preocupação antirracista.
( ) Existe preocupação antirracista por parte dos meus colegas de trabalho.
( ) Percebo atitudes racistas em alguns colegas de trabalho.
( ) Percebo atitudes racistas em alguns alunos da escola.
( ) Na escola são desenvolvidas atividades antirracistas.
( ) Na escola existem propostas antirracistas não desenvolvidas.
( ) Não percebo preocupações e/ou atividades antirracistas na escola.
8-
Sobre a Lei 10.639/03,
( ) não tenho nenhuma informação sobre ela.
( ) sei que existe, mas não conheço o seu conteúdo.
( ) não conheço seu conteúdo, mas já ouvi comentário sobre ela.
( ) conheço o seu conteúdo.
( ) já participei de discussões e/ou debates sobre ela.
107
9- Se você já participou de algum encontro, estudos ou curso que tenham
abordado a Lei 10.630/03 situe-os nas linhas a seguir.
____________________________________________________________
____________________________________________________________
10- Na sua trajetória Profissional na Rede Municipal de Ensino, quantas vezes
recebeu desse órgão informação e/ou proposta de atividades que tivessem
caráter antirracista ou de afirmação da cultura afro-brasileira?
( ) Nenhuma
( ) Uma. Qual? _____________________________________________
( ) Mais de uma.
Quais?_____________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
11- Sobre trabalhar a cultura afro-brasileira em sala de aula, você considera:
( ) desnecessário ( ) necessário
12- Sobre problematizar o racismo em sala de aula, você considera
( ) necessário e de fácil abordagem.
( ) necessário e de difícil abordagem.
( ) desnecessário.
( ) nunca pensei na questão.
13- Coloque a seguir algum comentário a mais se houver e se assim o desejar.
____________________________________________________________
___________________________________________________________
____________________________________________________________
____________________________________________________________
108
Apêndice B – Entrevista
Identificação do sujeito entrevistado:
a) Nome:
b) Formação:
c) Tempo na rede:
d) Tempo na escola:
e) Idade:
1- Como você vê a questão do racismo, discriminação ou preconceito na
sociedade?
2- Como você vê a questão do racismo, discriminação ou preconceito na
escola?
3- Em sua opinião, quais seriam as origens do racismo, discriminação ou
preconceito na escola?
4- Você já presenciou alguma situação de racismo, discriminação ou
preconceito na escola envolvendo aluno ou algum profissional?
5- Você já enfrentou situações constrangedoras de racismo, discriminação ou
preconceito na escola? Qual foi sua atitude?
6- Qual (quais) são as dificuldades que os profissionais têm de trabalhar a
questão do racismo, discriminação ou preconceito na escola?
7- Você percebe algum profissional enfrentando situações de racismo,
discriminação ou preconceito no ambiente de trabalho?
8- Quais atividades são desenvolvidas em sua escola para trabalhar sobre a
História da África e Afro-brasileira? Explique
109
9- Qual (quais) atividade(s) relacionada(s) à cultura afro-brasileira você
planejou e realizou durante sua trajetória profissional a partir de 2003?
Quais foram mais significativas e por quê?
10- Qual (quais) seriam as ações para se acabar
com racismo,
discriminação ou preconceito na escola? Qual o papel do gestor,
pedagogo e professor?
11- Você conhece a Lei 10.639/03?
12- Que práticas educativas deveriam ser concretizadas em sua escola
para atender os princípios e recomendações da Lei 10.639/03?
13-Faça algum comentário a mais se houver e se assim desejar.
Obrigada!
110
Apêndice C - Quadro das escolas da rede municipal de educação de
Cachoeiro de Itapemirim
Nº
Nomes das EMEBs
01
02
EMEB “Anacleto Ramos”
EMEB "Anísio Vieira de Almeida
Ramos"
EMEB “Áurea Bispo Depes"
EMEB “Galdino Theodoro da Silva”
EMEB “Jácomo Silotti”
EMEB “Jenny Guárdia”
EMEB “Julieta Deps Tallon”
EMEB “Luiz Marques Pinto”
EMEB “Luiz Pinheiro”
EMEB “Luiz Semprini”
EMEB “Maria das Dores Pinheiro
Amaral”
EMEB “Maria Stael de Medeiros
Teixeira”
EMEB “Monte Alegre”
EMEB “Monteiro Lobato”
EMEB “Nossa Senhora das Graças”
EMEB “Oscar Montenegro Filho”
EMEB “Oswaldo Machado”
EMEB “Pe. Gino Zatelli”
EMEB “Prof. Athayr Cagnin”
EMEB “Prof. Deusdedit Baptista”
EMEB “Prof. Elísio Cortes Imperial”
EMEB “Prof. Florisbelo Neves”
EMEB
“Prof.
Pedro
Estellita
Herkenhoff ”
EMEB
“Profa.
Gércia
Ferreira
Guimarães”
EMEB “Profa. Mª do Carmo
Magalhães”
EMEB “Rev. Jader Gomes Coelho”
EMEB “São Francisco de Assis”
EMEB “São Luiz Gonzaga”
EMEB “São Vicente”
EMEB “Newton Braga”
EMEB “Prof. Valdyr Freitas”
EMEB “Zilah Lima de Moura”
TOTAL
03
04
05
06
07
08
09
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31
32
Gestor
Professores
40
30
Total
01
01
Pedagogos
04
04
01
01
01
01
01
01
01
01
01
03
06
03
02
03
05
02
02
02
20
43
25
27
28
44
15
17
30
24
50
29
30
32
50
18
20
33
01
03
20
26
01
01
01
01
01
01
01
01
01
01
01
01
03
02
02
02
02
03
02
01
03
07
10
28
17
22
15
17
20
22
10
41
40
12
33
20
25
18
20
24
25
12
45
48
10
03
17
16
01
04
26
31
20
01
01
05
07
06
01
01
01
01
01
01
01
32
03
02
02
01
04
03
01
82
22
20
12
13
30
35
12
730
26
23
14
15
35
38
14
848
11
10
13
45
35
Responderam
10
10
10
10
07
11
05
19
05
10
13
210
111
Apêndice D – Projeto de Dissertação
CENTRO UNIVERSITÁRIO UNA
INSTITUTO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA,
PESQUISA E EXTENSÃO
MESTRADO EM GESTÃO SOCIAL, EDUCAÇÃO E DESENVOLVIMENTO
LOCAL
PRODUTO DA DISSERTAÇÃO
Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre a Cultura Afro –
brasileira nas Escolas a partir da Lei 10.639/03
ALDA MARIA SILVA FRANCISCO
ORIENTADORA: Profª Dra Adilene Gonçalves Quaresma
Belo Horizonte
2012
112
ALDA MARIA SILVA FRANCISCO
Este Produto foi elaborado a partir da Dissertação de Mestrado intitulada “As
Práticas de Gestão e de Docência na Rede Municipal de Educação de
Cachoeiro de Itapemirim, Espírito Santo a partir da Lei 10.639/03”de Alda
Maria Silva Francisco sob a orientação da Profª Dra Adilene Golçalves
Quaresma
Belo Horizonte
2012
113
Educar para a inclusão é não separar o lugar e o tempo de aprender do lugar e
do tempo de ensinar. Onde e quando se aprende também se ensina. E todos
ensinam e aprendem. Nesse processo, o papel do educador é dar sentido a
essa construção. A formação não pode se dar no vazio (ANTUNES &
PADILHA, 2004).
114
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO......................................................................
115
2
JUSTIFICATIVA...................................................................
118
3
REFERENCIAL TEÓRICO...................................................
121
4
PÚBLICO-ALVO...................................................................
126
5
OBJETIVOS.........................................................................
126
6
METODOLOGIA...................................................................
127
7
RECURSOS..........................................................................
139
8
CRONOGRAMA ...................................................................
139
9
AVALIAÇÃO.........................................................................
130
10
REFERÊNCIAS...................................................................
130
APÊNDICES.........................................................................
132
ANEXOS
159
115
INTRODUÇÃO
Aqui está o grande desafio da educação como estratégia na luta contra o
racismo, pois não basta à lógica da razão científica que diz que biologicamente
não existem raças superiores e inferiores, como não basta a moral cristã que
diz que perante Deus somos todos iguais, para que as cabeças de nossos
alunos possam automaticamente deixar de ser preconceituosas. Como
educadores, devemos saber que, apesar da lógica da razão ser importante nos
processos formativos e informativos, ela não modifica por si o imaginário e as
representações coletivas negativas que se tem do negro e do índio na nossa
sociedade.
(MUNANGA, 2005)
A educação é um grande mecanismo de transformação da sociedade. Ela é
essencial no processo de formação da sociedade e também abre caminhos
para a preparação de uma verdadeira cidadania.
Cada escola é composta de diferentes olhares culturais, pois tem na sua
história suas preocupações, o que a faz diferente das outras, e os seus
currículos devem ser abertos e flexíveis para atender as peculiaridades sociais
e culturais de seus alunos. Ela também é o local ideal para se trabalhar a
questão do racismo, pois é o ambiente formado por uma população com
diversos grupos étnicos, com seus costumes e suas crenças.
Lidar com as diferenças não é fácil, é uma das maiores dificuldades do ser
humano. Em relação às diversidades, na maioria das vezes, revelam-se a
tensão, a intolerância, a discriminação e o preconceito, que são como uma
porta negativa sem fundamentos para com as diferenças manifestadas nas
várias dimensões da vida humana.
Assim, é papel da escola buscar promover o ser humano de forma democrática
e com sua integralidade, estimulando a formação de valores, hábitos e
comportamentos para que se respeitem as diferenças e as características
próprias de grupos e minorias. Ela deve buscar proporcionar diversos
conhecimentos e aprendizagens para que consiga propiciar um ensino de
116
qualidade a todos, respeitando os conhecimentos prévios, aqueles que cada
um traz consigo, valorizando-os e acrescentando novos conhecimentos.
Segundo Gomes,
O percurso de normatização decorrente da aprovação da Lei nº
10.639/03 deveria ser mais conhecido pelos educadores e
educadoras das escolas públicas e privadas do país. Ele se insere
em um processo de luta pela superação do racismo na sociedade
brasileira e tem como protagonistas o Movimento Negro e os demais
grupos e organizações partícipes da luta antirracista. Revela também
uma inflexão na postura do Estado, ao pôr em prática iniciativas e
práticas de ações afirmativas na educação básica brasileira,
entendidas como uma forma de correção de desigualdades históricas
que incidem sobre a população negra em nosso país (GOMES,
2011).
Nessa perspectiva, o trabalho com inclusão e diversidade tem passado por
mudanças paradigmáticas tanto na abordagem dos termos inclusão e
diversidade quanto no questionamento da ordem vigente, tornando-se um tema
atual e relevante que precisa ser adequado à escola dentro da sua realidade
local.
Vivemos em sociedades heterogêneas compostas por diferentes grupos
humanos com interesses, classes e identidades em conflito. Essas diferenças
vão desde as características físicas até às psicológicas, sociais e culturais.
Diversificar não significa formar grupos homogêneos com as mesmas
dificuldades e características, mas aproveitar a diversidade existente no grupo
para a troca de experiências e o crescimento de cada um. Historicamente, a
escola tem dificuldades para lidar com a inclusão e a diversidade, o que faz
com que as diferenças tornem-se problemas. A mudança mais expressiva para
se trabalhar a inclusão e diversidade foi à aprovação da Lei 10.639/03, que
tornou obrigatório o ensino da História e Cultura Afro-Brasileira nas Escolas de
Educação Básica.
Nesta perspectiva, foi feita a Pesquisa intitulada “As Práticas de Gestão e
Docência na Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim, Espírito
Santo, a partir da Lei 10.639/03”, onde se percebeu a necessidade de
117
proporcionar aos gestores, pedagogos e professores formação continuada para
o desenvolvimento de uma prática pedagógica voltada para a questão do
racismo, de forma processual, inclusiva e interdisciplinar.
Eu acho que deveria ser mais bem divulgado a Lei, o número da Lei
porque às vezes trabalha tudo que está sendo imposto na Lei e na
verdade a gente não está sabendo que está trabalhando essa Lei na
escola [...] (Entrevistado 22).
[...] eu acho que falta mesmo é um pouco mais de incentivo das
pessoas que estão dentro da escola para nos dar esta prática pois
querendo ou não em nossa sociedade o negro ele é tratado como tal
porque a gente aceita [...] (Entrevistado 19).
[...] capacitar mais os nossos professores, informar os professores
porque os professores para falar desse tema ele tem que estar bem
informado então nesses estudos estar buscando informar, focar neste
assunto com os professores, envolvendo a família que é importante, a
comunidade de como se discute esses assuntos igual sempre estar
buscando [...] (Entrevistado 14).
Esta pesquisa tem como produto final o Projeto intitulado “Práticas
Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre a Cultura Afro-brasileira nas
Escolas a partir da Lei 10.639/03” que visa atender às expectativas dos
profissionais da educação garantindo dois grandes eixos: Formação de
Professores, como uma proposta de Formação Continuada, e a questão
pedagógica, educacional e instrumental, de forma processual e interdisciplinar
no decorrer de todo o ano letivo.
Buscando assim, desenvolver um trabalho que passe a fazer parte do cotidiano
escolar, do imaginário pedagógico e da política educacional do município de
Cachoeiro de Itapemirim, e não mais sendo a Lei vista simplesmente como
uma legislação específica, vindo do MEC, mas algo que faça parte da prática
educativa cotidiana.
Percebeu-se também durante a pesquisa a necessidade de se trabalhar um
projeto de intervenção que primasse pela importância e valorização da cultura
negra no interior das escolas do município, criando espaços para a aquisição
de conteúdos da História da África e da Cultura Afro-Brasileira, bem como as
manifestações artísticas que possam proporcionar reflexão crítica da realidade
118
e afirmação positiva dos valores culturais negros pertencentes à nossa
sociedade como um todo.
Assim, o eixo Formação de Professores, enfatizará a educação das relações
étnico-raciais, a História da África e Afro-Brasileira, a partir da Lei 10.639/03,
oportunizando a aquisição de conhecimentos teórico-práticos. O eixo da
questão pedagógica, educacional e instrumental será voltado para o
Referencial Curricular do Município, para o PPP das escolas e para os planos
de ensino e de aula do professor, ambos primando para despertar a
consciência crítica a respeito da necessidade de combater o racismo,
discriminação e o preconceito nas escolas da Rede Municipal de Educação de
Cachoeiro de Itapemirim, à luz da Lei 10.639/03, possibilitando visibilidade dos
negros pelo viés da escola. Gestores, pedagogos e docentes deverão exercer
suas práticas educativas voltadas para um trabalho processual e interdisciplinar
e para que os discentes se construam como sujeitos do processo ensinoaprendizagem.
2 JUSTIFICATIVA
Mediante pesquisa realizada, os resultados encontrados foram satisfatórios.
Percebeu-se que os gestores, pedagogos e professores buscam trabalhar
fundamentalmente a questão do combate ao racismo na escola a partir da lei
10.639/03, porém de maneira esporádica, de forma pontual. No entanto, eles
manifestam a necessidade de estudar a Lei 10.639/03, bem como de se
aprofundarem em estudos sobre História da África e Cultura Afro-Brasileira.
Entretanto, alguns valores ainda se mantêm em patamares muito altos, como a
dificuldade de se lidar na sala de aula e na escola, de maneira geral, com
situações de racismo, discriminação e preconceito.
Nesta perspectiva, a questão do trabalho com inclusão racial precisa ser
adequada à escola, que é a realidade local. Para isso, são necessárias
mudanças de paradigma na educação e na sociedade, de forma que estas
119
repensem o seu papel e vejam como serão inseridas nessa nova realidade, de
forma que a educação não fique só nas mãos dos educadores, mas de todos:
família, escola, Igreja e sociedade em geral, pois a educação é muito
importante.
Tudo isso é resultado de um novo cenário que se configura na sociedade e na
educação do século XXI, visando a novas perspectivas para o gestor,
pedagogo e professor inseridos no mercado de trabalho, sob diversas
abrangências, vivendo assim um momento particular de discussões sobre a
superação do racismo, discriminação e preconceito a partir da Lei 10.639/03.
Apesar da promulgação da Lei 10.639/03 constituir-se em uma
resposta às demandas do Movimento Negro e a todos aqueles que
vêm lutando por uma sociedade brasileira mais democrática a sua
aplicação não tem sido uma tarefa fácil: muitas vezes os professores
não se sentem motivados em cumprir leis que consideram vir de
escalões superiores, não se sentem preparados para lidar com as
questões e tem aqueles que ainda acreditam no mito da democracia
racial ou acreditam “tocar na ferida”, preferindo o silêncio para “não
provocar constrangimentos” (SOUZA, 2009, p.8).
Apesar de a questão da diversidade humana estar ganhando mais espaço,
enfrentar os desafios de trabalhar a inclusão e diversidade na sala de aula para
a mobilização das potencialidades não é tarefa fácil. Há alguns desafios que
dificultam o trabalho diversificado, como o currículo, a interdisciplinaridade e o
domínio do assunto.
O preconceito leva à discriminação, ocasionando problemas de interação entre
os alunos e entre alunos e professores o que tem feito com que a sala de aula
venha a tornar-se local de exclusão social.
Neste contexto, este Produto da Dissertação intitulado “Práticas Pedagógicas e
Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas Escolas a partir da Lei
10.639/03”, será tentativa de resgatar a dificuldade de se trabalhar a questão
do racismo pelos gestores, pedagogos e professores nas Escolas de Educação
Básica do Município de Cachoeiro de Itapemirim primando por uma formação
continuada para melhoria da prática pedagógica. Isso, buscando executar um
120
trabalho em sala de aula de forma processual, interdisciplinar, com aquisição
de domínio do conteúdo da Lei 10.639/03, da História da África e Cultura AfroBrasileira, buscando desenvolver um trabalho de reflexão e consciência crítica
dos professores e alunos.
[...] Há diferenças entre as aulas – enriquecidas pelo diálogo com os
alunos, o que possibilita retomar e aprofundar a análise de diversos
aspectos dos temas apresentados, agregar problemas e refazer
argumentos [...] o que inclui retomar o trabalho de reflexão [...] como
ponto de partida para novos pensamentos (HERNANDEZ, 2008, p.
16).
Assim, Gestores, Pedagogos e Professores deverão participar de Formação
Continuada iniciando por analisar as contribuições decorrentes da promulgação
da Lei Federal nº 10.639/03, na prática educativa, tendo em vista trabalhar em
prol do respeito às diferenças no ambiente escolar, da valorização cultural do
povo negro, com o intuito de formular uma perspectiva pedagógica que aponte
algumas alternativas de intervenção no currículo prescrito.
De acordo com Gomes,
A escola tem papel importante a cumprir nesse debate. E é nesse
contexto que se insere a alteração da LDB, ou seja, a Lei nº
10.639/03. Uma das formas de interferir pedagogicamente na
construção de uma pedagogia da diversidade e garantir o direito à
educação é saber mais sobre a história e a cultura africanas e afrobrasileiras. Esse entendimento poderá nos ajudar a superar opiniões
preconceituosas sobre os negros, a África, a diáspora; a denunciar o
racismo e a discriminação racial e a implementar ações afirmativas,
rompendo com o mito da democracia racial (GOMES, 2011).
Será necessário refletir, discutir e trabalhar o racismo, estruturando uma
educação antirracista para os gestores, pedagogos e professores que atuam
diretamente na escola com os alunos e com a comunidade, visto que o racismo
é uma herança colonial e um elemento estrutural das sociedades modernas e
que continua presente em práticas educativas.
A oficialização do ensino da História e Cultura Afro-Brasileira no currículo da
rede pública e privada de ensino do país é um grande marco no sentido de
121
introduzir na educação brasileira a valorização da história dos negros e a
participação de outras culturas e não apenas a europeia.
Além da necessidade de diminuir as desigualdades sociorraciais históricas
existentes em nossa sociedade, fortalecendo e promovendo a reconstrução
das relações étnico-raciais no ambiente escolar em todo o país e, em especial,
no Município de Cachoeiro de Itapemirim pela vivência democrática, ética e
cultural necessária, com participação de todos os membros da comunidade
escolar. Assim,
[...] nos instiga a pensar sobre os atuais desafios teórico-práticos para
o trabalho com as relações raciais no cotidiano escolar. [...] de forma
visceral, questões que afetam a todos que fizeram da negritude uma
causa de lutas em suas vidas, e, em especial na educação (SOUZA,
2009, p. 8).
O diferencial deste Produto consiste em redirecionar, corrigir rumos
pedagógicos e também de propiciar aos gestores, pedagogos e professores
uma relação interdisciplinar com o estudo da Lei 10.639/03, com o ensino de
História e Cultura Afro-Brasileira na Educação Básica na Rede Municipal de
Educação do Município de Cachoeiro de Itapemirim, com ação contínua e
processual.
3 REFERENCIAL TEÓRICO
Hoje, mais do que nunca, a Educação não pode mais ficar presa a velhas
concepções sem atender as necessidades da sociedade. A inclusão é uma
realidade que precisa ser vista dentro do novo conceito de que é importante
permitir que as questões afro aprovadas na Lei 10.639/03 sejam estudadas
para sua aplicabilidade efetiva nas escolas.
A questão do racismo, preconceito e discriminação são na minha
concepção um dos problemas mais sérios, graves que a nossa
sociedade enfrenta. São questões graves, porque em alguns
momentos as pessoas fazem vista grossa para o problema do
racismo, que ao longo da história fomos conhecendo como que, a
gente vai vendo como ideologicamente foi sendo construído no Brasil
de que temos uma Democracia racial, de que nele as pessoas todas
são tratadas iguais, da mesma forma, isso vai escondendo na
verdade uma ferida aberta, séria, profunda e precisa ser tratada. Só
122
que na maioria das vezes ele é visto como uma questão secundária
ma ela é séria, porque ela envolve a escola, ela envolve a família,
envolve o sistema Político, envolve as questões econômicas, então é
um problema muito sério (Entrevistado 24).
No decorrer da pesquisa, percebeu-se a necessidade de se trabalhar a questão
do racismo na escola de forma mais enfática, mas ficou claro que tudo deve
iniciar-se com um trabalho com os gestores, pedagogos e os professores da
Rede Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim.
Eu acho que as dificuldades maiores é a questão da família, porque
quando essa criança traz de casa essa questão do preconceito e aí
fica muito mais difícil você tirar da cabecinha da criança, agora
quando a criança tem consciência às vezes ela chega aqui, mas a
gente chama a família, conversa com a família e ficam admirados que
não são eles que ensinam, então fica complicado aí, quando vem da
família a questão do preconceito Entrevistado 18).
Eu acho que as atitudes que deveriam ser tomadas junto à escola,
junto à Secretaria de Educação dando mais ênfase e não só quando
chega a Semana da Consciência Negra. Devem-se ter as
apresentações periódicas, estudos periódicos sobre este assunto
para estar concretizando mais, dando mais ênfase a criança, pois
quanto mais você bate na tecla mais a criança vai aprender, então
não deixar só para certa data e sim estar trabalhando sempre
(Entrevistado 21).
Para que a transformação ocorra, é necessário promover inovações nas
escolas, a fim de que atendam a implementação da Lei 10.639/03,
incrementando o sistema de gestão e intensificando um trabalho do pedagogo
e docentes na melhoria da prática pedagógica voltada para o ensino da História
da África e cultura Afro-Brasileira, de forma processual e interdisciplinar.
A problematização sobre inclusão tem se ampliado de forma progressiva na
sociedade brasileira nessa última década, envolvendo tanto as práticas
cotidianas dessas relações, os embates e ações políticas como as construções
conceituais. A inclusão denuncia o abismo existente entre o velho e o novo na
instituição escolar brasileira. A inclusão é reveladora desse abismo que precisa
ser preenchido com ações democráticas a favor do paradigma da diversidade.
[...] Isso revela o quanto a questão racial é um assunto que extrapola
fronteiras nacionais. Ela é uma questão de todos nós e possui uma
dimensão histórica, cultural, social, política, econômica e educacional
que deveria ser mais debatida e discutida. [...] tal diálogo é possível,
sim,e caminha no sentido de que o sistema escolar, as escolas,e os
123
docentes assumam como função a garantia dos direitos culturais dos
coletivos étnico-raciais que fazem parte de nossa formação social,
política e cultural (GOMES, 2007, p. 8-9).
Nessa perspectiva, precisa ser levado em consideração o papel dos
movimentos sociais na efetivação dessas mudanças, em especial do
Movimento Negro, que há muito tempo vem lutando pela implementação de
políticas públicas que garantam o acesso dos negros e pobres da sociedade
aos direitos essenciais a vida, como emprego, moradia, educação e saúde.
Além de garantir o reconhecimento das diferenças como marca de todo um
trabalho dedicado à humanidade e não somente como uma forma de se
justificarem os processos de desrespeito e discriminações sofridos desde sua
vinda para o Brasil até os dias de hoje.
De acordo com Souza:
Em pleno século XXI, não é raro encontrarmos a concepção de que o
cotidiano escolar é um espaço neutro com proposta de ensino
aprendizagem desprovida de valor que favoreçam qualquer grupo
social. Mas, na verdade, o que se tem são várias ações escolares
que, raramente, favorecem a população mais pobre e oprimida. Como
a população negra, em sua maioria, está inserida nesse grupo, podese dizer que muitas escolas ainda não valorizam atividades
pedagógicas que valorizem esta população. [...] As manifestações
culturais, políticas e econômicas dos povos africanos e afrobrasileiros, com contribuições mais significantes para uma sociedade
moderna não são consideradas (SOUZA, 2009, p. 7).
É importante criarem-se novas relações para se construírem novas formas de
trabalho, pois o conhecimento do trabalho só pode ser feito pelos profissionais
que o realizam. A escola é uma instituição de mediação social, ela pode
somente reproduzir valores a serviço dos interesses do mercado, do capital ou
pode ser um espaço também de invenção, em que as contradições surgem,
mas são encaradas como possibilidade de crescimento, investigação,
potencialidade para o movimento de mudança social. Daí a importância de a
escola buscar ter em seu PPP um questionamento ao currículo monocultural,
refletindo que momento histórico a comunidade quer comemorar, refletir a
visão universalista ao lidar com o outro, apelando para a teoria de que “somos
todos iguais” e que, assim, é cruel não falar da história do outro, é uma forma
124
de discriminação. O currículo ajuda a produzir representações e deve produzir
sujeitos pensantes capazes de reescrever sua história, daí a necessidade de
se refletir: “Que sujeito está-se formando? Que cidadão se quer formar?”.
O ensino e a aprendizagem seriam mais relevantes e significativos e,
em consequência, o alunado veria que as instituições escolares lhes
são de enorme ajuda para conhecer e entender seu próprio entorno,
outros lugares mais afastados, o mundo e a vida neste planeta cada
vez mais globalizado e, portanto, independente (SANTOMÉ apud
FERRAÇO, 2011, p. 63).
É necessário, ao trabalhar a Lei 10.639/03 pelos gestores, pedagogos e
professores da Rede Municipal de Cachoeiro de Itapemirim, refletir como se
tem lidado na prática lidar com a diversidade, para que, a partir daí, se coloque
um eixo pedagógico com a mesma.
É importante que se busque desenvolver na sala de aula um trabalho de
releitura da escravidão, do Continente Africano, dos negros que se destacaram
nesta trajetória de luta até os dias de hoje e muitos outros olhares. Tudo isso
deve ser norteado, pautado, pelo princípio da relação humana e ética.
Para trabalhar relações raciais no espaço escolar, o professor, além
de conhecer sobre o assunto, deverá estar comprometido
politicamente com certas questões que diz respeito às consequências
das experiências que as crianças negras passam. [...] Mas, há de se
percorrer um longo caminho para que o professorado, como
categoria, compreenda a importância de sua prática e se dispa da
ingenuidade de acreditar na ingenuidade do seu trabalho, de suas
ações e de sua postura (SOUZA, 2009, p. 64).
A questão da diversidade humana está ganhando mais espaço, mas enfrentar
o desafio de trabalhar a inclusão e diversidade na sala de aula para a
mobilização das potencialidades não é tarefa fácil, pois a sociedade brasileira é
pluriétnica e pluricultural.
O Brasil é um país de grande extensão territorial, intensa diversidade
Regional, racial e cultural. Ele se destaca como uma das maiores
sociedades multirraciais do mundo e abriga um continente
significativo de descendentes de africanos dispersos na diáspora[...]
Mas em que contexto histórico, social, cultural e político as
identidades negras se constroem no Brasil? (GOMES, 2007, p. 9798).
125
Sabe-se que após a promulgação da constituição de 1988 o Brasil vem, a
cada dia, buscando efetivar a condição de um Estado democrático de direito
com ênfase na cidadania e na dignidade da pessoa humana.
A sanção da Lei 10.639/2003 foi uma grande iniciativa, um grande passo inicial
rumo ao povo negro brasileiro, porque ela abre caminho para que o Brasil
adote medidas para corrigir os danos nas diversas dimensões: materiais,
físicas, psicológicas e outras que também são resultantes do racismo e de
formas conexas de discriminação, que implicam, por exemplo, em condições
econômicas, sociais e educacionais desiguais para a população negra
brasileira. O negro ainda possui uma realidade marcada de preconceito,
racismo e discriminação aos descendentes, que historicamente enfrentam
dificuldades para o acesso e permanência nas escolas.
O Racismo é um comportamento, uma ação resultante da aversão,
por vezes do ódio, em relação a pessoas que possuem um
pertencimento racial observável por meio de sinais, tais como cor da
pele, tipo de cabelo, formato de olhos, etc. Ele é resultado da crença
de que existem raças ou tipos humanos superiores e inferiores, a qual
se tenta impor como única e verdadeira (MUNANGA, 2006, p. 179).
É na escola que o indivíduo aprende e põe em prática os primeiros princípios
da cidadania, respeita a diversidade, desenvolve suas habilidades intelectuais
e cognitivas, aprende a se socializar, conviver em grupo e a lidar com as
diferenças individuais, desenvolvendo uma aprendizagem significativa numa
perspectiva social: escola/professor/aluno/pais/comunidade, pois estes são
sujeitos sociais pertencentes a diferentes grupos étnico-raciais com histórias de
vida, representações, experiências, identidades, crenças, valores e costumes
próprios que interagem no ambiente escolar, formando e enriquecendo o
contexto da diversidade.
Assim, a inclusão e a participação são alternativas que nos direcionam a olhar
a diversidade e trabalhar com ela, e não contra ela, contribuindo muito para o
processo educacional alcançar melhores resultados na formação do aluno
como verdadeiro cidadão e no trabalho do professor, que deve ser um
126
educador e um profissional-cidadão, capaz de exercer seu profissionalismo
pela consciência crítica sobre o saber que se socializa na escola.
4 PÚBLICO-ALVO
Participarão
diretamente
desse
projeto
Gestores,
pedagogos
e
seus
respectivos professores, além de pedagogos da Secretaria Municipal de
Educação (SEME).
5 OBJETIVOS
5.1- Geral
Promover formação continuada de gestores, pedagogos e professores para
uma educação das relações étnico-raciais, sobre a História da África e AfroBrasileira a partir da lei 10.639/03, proporcionando a oportunidade de aquisição
de conhecimentos teóricos e práticos e despertando a consciência crítica a
respeito da necessidade de combater o racismo, discriminação e o preconceito.
5. 2- Específicos
• Estudar a lei 10.639/03 e suas implicações.
• Estudar, refletir e discutir sobre a herança cultural africana e suas
contribuições para a formação da sociedade brasileira.
• Estimular o convívio com a diversidade cultural étnica e a troca de
experiências.
• Identificar, conhecer, valorizar e promover as manifestações culturais de
grupos sociais, visando assim à conscientização sobre dignidade e
igualdade.
• Desenvolver o respeito mútuo, a solidariedade, o espírito crítico com
diálogo e compreensão entre as diferentes culturas.
127
• Identificar as variações linguísticas trabalhando o respeito, de acordo
com as situações de produção do vocabulário afro.
• Trabalhar para a superação da discriminação relacionada às diferentes
formas de falar, vestir, dentre outras, do povo brasileiro, por meio de
atividades prazerosas e desafiadoras.
• Promover a valorização da identidade cultural do grupo étnico Afrobrasileiro.
• Destacar e divulgar a contribuição da cultura africana na formação da
cultura brasileira.
• Promover reflexões, tendo em vista a construção de estratégias que
contribuam para o resgate da autoestima da etnia negra.
• Promover reflexão sobre o preconceito embutido nos rótulos, apelidos
atribuídos aos negros que ocasionam a construção do sentimento de
submissão de um grupo étnico.
• Identificar a capoeira, danças narrativas e cantos afro-brasileiros,
estimulando o contato com elementos de socialização.
• Incentivar e desenvolver trabalhos objetivando a inclusão cultural e a
cidadania ativa dos movimentos culturais negros.
• Realizar oficinas para gestores, pedagogos e professores.
6 METODOLOGIA
A metodologia deste Produto será desenvolvida em dois grandes eixos:
Formação de Gestores, Pedagogos e Professores, como uma proposta de
Formação Continuada, e a questão pedagógica, educacional e instrumental de
forma processual e interdisciplinar. Após cada módulo, os profissionais, que
computarão horas a combinar com o grupo de profissionais envolvidos,
deverão aplicar em sua escola o que contará como atividades de práticas
pedagógicas e terão de produzir um relatório com fotos, depoimentos e outros
materiais para possíveis apresentações na Rede Municipal.
Eixo 1: Formação de Professores como uma proposta de Formação
Continuada:
128
Este eixo visa contribuir para a aquisição de fundamentação teórica e reflexões
da Lei 10.639/03, da História da África e da Cultura Afro-Brasileira.
• Módulo 1- Estudo da Lei 10.639/03;
• Módulo 2- Estudo e discussão sobre História da África;
• Módulo 3- Cultura afro-brasileira;
• Módulo 4- Um novo olhar sobre a História Nacional, Regional e Local;
• Módulo 5- Seminário: Discutindo a Questão Étnico-Racial.
Eixo 2- questão pedagógica, educacional e instrumental de forma processual e
interdisciplinar.
Este eixo promoverá reflexões e proposições acerca do trabalho pedagógico
sobre a Lei 10.639/03, da História da África e da Cultura afro-brasileira nos
documentos da escola e no fazer pedagógico na sala de aula.
• Módulo A- Conhecendo a minha escola;
• Módulo B- Dialogando com os documentos Pedagógicos;
• Módulo C- Dialogando com a sala de aula;
• Módulo D- Articulando teorias às Práticas Étnico-Raciais das Escolas;
• Módulo E- Seminário Final.
Será proposto que cada módulo tenha suas respectivas atividades teórico práticas correspondendo a 10 h, totalizando assim 100 h de projeto.
Dentre as ações, teremos nos módulos a realização de oficinas pedagógicas
intercaladas entre os dois módulos, com atividades teórico-práticas realizadas
nas escolas pelos participantes visando articular teoria e prática e estimular os
demais profissionais a participarem das atividades que o Projeto propõe.
As oficinas serão enriquecidas com produção de material didático; realização
de pesquisa sobre o tema em estudo; exibição de slides, filmes, vídeos e DVD;
estudos e debates; produção de dicionários de dialeto afro; Rodas de
Conversa, enfocando a implantação da Lei 10.639/03 no Currículo Escolar;
129
formação de professores e as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais.
7 RECURSOS:
7.1 Humanos: gestores, pedagogos e professores das escolas e da SEME,
palestrantes e promotores das oficinas.
7.2 Materiais: espaço físico, data show, papel ofício para elaboração de textos
e apostilas para os participantes, livros de literaturas, revistas, jornais, pincéis
atômicos, cola, papel cenário, tesouras, colas, atividades diversas, folhas A4,
máquina fotográfica, sbanner, som, sucatas, slides, filmes, vídeos, CD e DVD.
8- CRONOGRAMA
Módulos
Apresentação do
Projeto SEME e as
escolas
Módulo 1- Estudo da
Lei 10.639/03
Módulo 2- Estudo e
discussão sobre
História da África
Módulo 3- Cultura
Afro-Brasileira
Módulo 4- Um novo
olhar sobre a História
Nacional, Regional e
Local
Módulo 5- Seminário:
Discutindo a
Questão Étnico Racial
Módulo AConhecendo a minha
escola
Módulo BDialogando com os
documentos
pedagógicos
Mar.
X
Abr.
Maio
Jun.
Jul.
Ago.
Set.
X
X
X
X
X
X
X
Out.
Nov.
Dez.
130
Módulo CDialogando com a
sala de aula
Módulo DArticulando teorias às
Práticas Étnicoraciais das Escolas
Módulo E- Seminário
Final
Confraternização e
Avaliação Final
X
X
X
X
E mais: relatórios, fotografias e filmagens das oficinas e práticas desenvolvidas;
aprofundamento de estudos em direção à religiosidade, a partir do interesse
manifestado pelos participantes; exploração da presença da corporeidade na
maioria das manifestações da arte e da cultura afro-brasileira.
9- AVALIAÇÃO:
A avaliação será processual, de diferentes estratégias, por meio da observação
na participação das oficinas, anotações e das demais atividades propostas,
além dos registros dos momentos vivenciados durante a intervenção
pedagógica, relatos e relatórios. Haverá também uma avaliação final por meio
de relatos e preenchimento de uma pequena ficha para se colherem opiniões e
críticas.
10- REFERENCIAS
BENJAMIN, Roberto Emerson Câmara. A África está em nós; história e cultura
afro-brasileira. João Pessoa PB: Grafset, 2004.
BÔAS, Juliana Villas et al.Brasil Multicolorido: um novo olhar. Belo Horizonte:
Edição do autor, 2010.
BRASIL. Ministério da Educação. Plano Nacional de Implementação das
Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico Raciais
e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana. Brasília:
Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, 2009.
131
_______. Ministério da Educação. Conselho Nacional de Educação. Parecer
CNE/CP n. 03/2004. Dispõe sobre As Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-brasileira e Africana. Diário [da] República Federativa do Brasil, Brasília,
DF, 19 maio 2004b.
_________. Ministério da Educação. Orientações e ações para a educação das
relações étnico raciais. Brasília: MEC, 2010.
FERRAÇO,Carlos Eduardo. Currículo e educação básica: por entre redes de
conhecimentos, imagens, narrativas, experiências e deveres. Rio de Janeiro:
Rovelle, 2011.
GENTILE, Paola. África de todos nós. São Paulo: Nova Escola, p42-49, Nov,
2005
GOMES, Nilma Lino (org). Um olhar além das fronteiras: educação e relações
raciais. Belo Horizonte: Autêntica, 2007.
_________________ Educação, relações étnico-raciais e a Lei 10.639/03.
http://www.acordacultura.org.br/artigo-25-08-2011. Visitado em 17/01/2012.
HERNANDEZ, Leila Leite. A áfrica na sala de aula: visita à história
contemporânea. 3ed,São Paulo: Selo Negro, 2008.
MUNANGA, Kabengele; GOMES, Nilma Lino. O negro no Brasil de hoje. São
Paulo: Global, 2006.
_____________, Kabengele (org). Superando o racismo na escola. Brasília:
Ministério da Educação: Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização e
Diversidade, 2005.
ROCHA, Rosa Margarida de Carvalho. Educação das Relações Étnico-Raciais.
Belo Horizonte; Mazza Edições, 2007.
SOUZA, Maria Elena Viana (org). Relações raciais o cotidiano escolar: diálogos
com a lei 10.639/03. Rio de Janeiro: Rovelle, 2009.
132
APÊNDICES
Apêndice 1- “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 1: Formação de Professores como uma Proposta de Formação
Continuada:
Oficina 1- Módulo 1: Estudo da Lei 10.639/03
Objetivo: Estudar a Lei 10.639/03 e os conceitos de racismo, discriminação e
preconceito baseado no texto abaixo.
1- A Lei 10.639/03 e sua importância na Educação
Por meio de data show, será apresentada a Lei 10.639/03 (Anexo A da
Dissertação) em seguida, em pequenos grupos receberão a Lei, que
deverão ler, discutir e apresentar as possíveis dúvidas.
2- Trabalhando Mapa Conceitual
Sua tarefa será ler individualmente o texto 2.1 desta dissertação, intitulado
de Racismo: Sua Trajetória de Luta, Resistência e Mudança, da página 22 a
33 para escolher, no mínimo, 5 palavras-chave que garantam o
entendimento do texto.
Agora, em grupos de 5 alunos (A), façam as atividades que seguem.
Com as palavras listadas individualmente, organize o quadro abaixo:
PALAVRAS CHAVES
A.1
A.2
A.3
A.4
A.5
133
3- Escolham no mínimo 6 e no máximo 12 das palavras encontradas por vocês.
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
_______________________________________________________________
1- Com as palavras escolhidas, organizem um mapa conceitual.
Orientações para a elaboração do mapa:
a. identifique os conceitos-chave do conteúdo que vai mapear e ponha-os em
uma lista. Limite entre seis e dez o número de conceitos;
b. ordene os conceitos, colocando-os mais gerais, mais inclusivos, no topo do
mapa e, gradualmente, vá agregando os demais até completar o diagrama
de acordo com o princípio da diferenciação progressiva. Algumas vezes é
difícil identificar os conceitos mais gerais, mais inclusivos; nesse caso é útil
analisar o contexto no qual os conceitos estão sendo considerados ou ter
uma ideia da situação em que tais conceitos devem ser ordenados;
c.
se o mapa se refere, por exemplo, a um parágrafo de um texto, o número
de conceitos fica limitado pelo próprio parágrafo. Se o mapa incorpora
também o seu conhecimento sobre o assunto, além do contido no texto,
conceitos mais específicos podem ser incluídos no mapa;
d. conecte os conceitos com linhas e rotule essas linhas com uma ou mais
palavras-chave que explicitem a relação entre os conceitos. Os conceitos e
as palavras-chave devem sugerir uma proposição que expresse o
significado da relação.
e. setas podem ser usadas quando se quer dar um sentido a uma relação. No
entanto, o uso de muitas setas acaba por transformar o mapa conceitual
em um diagrama de fluxo;
f.
evite palavras que apenas indiquem relações triviais entre os conceitos.
Busque relações horizontais e cruzadas;
g. exemplos podem ser agregados ao mapa, abaixo dos conceitos
correspondentes. Em geral, os exemplos ficam na parte inferior do mapa;
h. geralmente, o primeiro intento de mapa tem simetria pobre e alguns
conceitos ou grupos de conceitos acabam malsituados em relação a outros
que estão mais relacionados. Nesse caso, é útil reconstruir o mapa;
134
i.
talvez, neste ponto, você já comece a imaginar outras maneiras de
fazer o mapa, outros modos de hierarquizar os conceitos. Lembre-se que não
há um único modo de traçar um mapa conceitual. À medida que muda sua
compreensão sobre as relações entre os conceitos, ou à medida que você
aprende, seu mapa também muda. Um mapa conceitual é um instrumento
dinâmico, refletindo a compreensão de quem o faz no momento em que o faz;
j. compartilhe seu mapa com colegas e examine os mapas deles. Pergunte o que
significam as relações, questione a localização de certos conceitos, a inclusão
de alguns que não lhe parecem importantes, a omissão de outros que você
julga fundamentais. O mapa conceitual é um bom instrumento para
compartilhar, trocar e “negociar” significados;
Exemplo de um mapa conceitual
135
Após a elaboração do mapa, troque-o com outro grupo, indicado pela
professora promotora da oficina, o qual deverá avaliar:
Sim
As
informações
estão
organizadas
hierarquicamente?
As implicações entre os elementos estão claras, ou
seja, é possível verificar entre as palavras relações,
tipo, “é”, “tem” etc.?
A estrutura do mapa representa adequadamente as
relações pretendidas pelo texto?
Mostra entendimento do conceito ou princípio,
manifestada no emprego da terminologia adequada?
Constrói um mapa conceitual apropriado e completo?
O mapa é fácil de interpretar?
Avaliadores
1.
2.
3.
4.
5-
Não
Às vezes
Rubrica
2- Refaçam o mapa para entregar à professora.
3- Após a construção do mapa, discutam no grupão:
a- Você concorda com as ideias contidas no texto? Por quê?
b- Como gestor, pedagogo ou professor, você considera viável transpor para
a prática os princípios pedagógicos acima apresentados? Argumente.
Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas
Escolas a partir da Lei 10.639/03”
1ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Março
Prezado Profissional:
Iniciamos nossa Formação Continuada e vimos a importância de se
trabalharem as questões étnico-raciais na escola no decorrer de todo ano
letivo. Assim, como estamos no mês de março, a primeira atividade é pesquisar
sobre personalidades negras que deixaram ou estão deixando sua contribuição
nos diversos setores da sociedade, como expressões culturais, desportivas,
artísticas, políticas, musicais, religiosas etc. e desenvolver em sua escola uma
prática educativa que deverá ser comprovada por relatório com fotos enviados
à SEME.
Sugestão de leitura: MUNANGA & GOMES. O negro no Brasil de hoje. São
Paulo: Global,cap7, 2006
Sucesso!
136
Apêndice 2: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas, a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 2- questão pedagógica, educacional e instrumental de forma
processual e interdisciplinar.
Oficina 2- Módulo A- Conhecendo a minha escola
Objetivo: Verificar a realidade de sua escola para proporcionar aos
professores, alunos e comunidade condições de apropriarem-se de novos
saberes sobre a Lei 10.639/03, História da África e Cultura Afro-Brasileira.
Desenvolvimento:
1- Iniciaremos com a Dinâmica “Você me Completa” seguida de partilha.
2- Abordagem com o aparelho data show sobre “Superando o Racismo na
Escola”, baseado no livro de Kabengele Munanga.
3- Em grupos, estudos, reflexão e discussão dos textos do livro “Superando
Racismo” de Kabengele Munanga, com seleção de palavras.
4- Cada grupo receberá uma folha de papel cenário e pincéis atômicos onde
escreverão as palavras e apresentarão por meio delas o seu texto.
5- Serão informados da importância de conhecerem os diferentes olhares que
temos na escola sobre a questão étnico-racial.
6-
Apresentação do questionário, que deverá ser aplicado, e dos dados
deverão ser computados pela escola.
Práticas pedagógicas e inovações metodológicas sobre o racismo nas escolas
a partir da Lei 10.639/03”
2ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Abril
Prezado Profissional:
Vimos nesta Oficina a importância de conhecer o perfil de nossa Comunidade
Escolar em relação a questão étnico-racial, assim, a tarefa teórico - prática
deste mês é a aplicação nas escolas do questionário (anexo C). Você deverá
computar e elaborar um relatório com fotos e outros materiais e enviar à SEME.
Sucesso!
137
Apêndice 3: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 1: Formação de Professores como uma proposta de Formação
Continuada
Atividade 2- Módulo 2- Estudo e discussão sobre História da África
Objetivo: identificar tempo e espaço da origem dos grupos africanos que
vieram para o Brasil, reconhecendo o tráfico humano como uma atividade
fundamental para o capitalismo mercantilista, identificando também os
diferentes tipos físicos entre os africanos e perceber os diferentes tipos de
religião, costumes e línguas presentes na África.
Desenvolvimento
a) Iniciar questionando sobre o que sabem, que ideias e opiniões, dúvidas
ou hipóteses têm sobre a África, buscando valorizar seus conhecimentos.
A seguir, passar um vídeo sobre o Continente Africano e, em seguida,
propor novos questionamentos.
b) Formar 7 pequenos grupos que receberão materiais de sucatas diversos
e textos do livro “Origens africanas do Brasil contemporâneo: história,
línguas, culturas e civilizações”, de Kabengele Munanga, que deverão ler,
refletir, discutir e apresentar de forma criativa.
c) Finalizando, cada grupo discutirá como esse tema pode ser trabalhado
em sua escola e escolherá um relator para apresentá-lo. Essas
apresentações serão entregues, e a SEME providenciará uma cópia para
cada escola.
138
“Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas
Escolas a partir da Lei 10.639/03”
3ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Maio
Prezado Profissional:
Dando continuidade à nossa tarefa teórico-prática nas escolas, você deverá
escolher uma temática sobre a África, de acordo com a oficina realizada, e
aplicar em sua escola. Em seguida elaborar um relatório com fotos e outros
materiais e enviar à SEME.
Referência Bibliográfica:
MUNANGA, Kabengele. Origens africanas do Brasil contemporâneo: histórias,
línguas, culturas e civilizações. São Paulo: Global, 2009.
Sucesso!
139
Apêndice 4: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 2- questão pedagógica, educacional e instrumental de forma
processual e interdisciplinar.
Oficina 4- Módulo B - Dialogando com os documentos Pedagógicos
Objetivo: estudar, refletir e discutir a importância de se articular teoria e prática
nas questões raciais fundamentando-se na Lei 10.639/03 no âmbito da escola,
no que tange aos currículos e práticas escolares para afirmar a história, a
memória e a identidade do povo negro e dos afrodescendentes, reestruturando
os seus documentos normativos pedagógicos, promovendo a inserção da
temática racial no PPP com reflexões, debate teórico e reflexivo sobre a
questão racial e sua efetivação.
Desenvolvimento:
1- Mensagem de abertura no aparelho data show e som: Circo de Soleil
seguida de partilha espontânea.
2- Em grupos, estudo do texto “Orientações para (re)elaboração do Projeto
Político
Pedagógico
das
Escolas
Municipais”,
do
site:
http://www.smec.salvador.ba.gov.br/site/documentos/espacovirtual/espaco-praxispedagogicas/GEST%C3%83O/orientacoes%20para
20elaboracao....pdf
3- Em grupos, analisar se o PPP da sua escola contempla na sua concepção
a Lei 10.639/03 de forma explícita e o ensino da História da África e Cultura
Afro-Brasileira de forma articulada aos conteúdos de diferentes áreas. Em
grupos, discutir e registrar como sua escola pode envolver professores,
alunos, gestores, pedagogos e a comunidade na implementação efetiva
para um trabalho estratégico sobre diversidade étnico-racial.
140
4- Escolher um relator do grupo para apresentar e entregar à SEME, que fará
cópia como sugestão para todas as escolas.
“Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas
Escolas a partir da Lei 10.639/03”
4ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Junho
Prezado Profissional:
Vimos nesta Oficina a importância de analisar o Projeto Político Pedagógico da
Escola (PPP) e reconstruí-lo em consonância com o Referencial Curricular
Municipal, de forma a refletir no Plano de Ensino e de Aula. Assim você deverá
coletivamente retomar este trabalho na escola e elaborar um relatório com
fotos e outros materiais e enviar à SEME.
Sugestão: Proposta de Trabalho da página 132 do Livro “A História da África na
Educação Básica”, de Rosa Margarida de Carvalho Rocha.
Sucesso!
141
Apêndice 5: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 1: Formação de Professores como uma Proposta de Formação
Continuada
Atividade 5Módulo 5- Seminário Municipal: Discutindo a Questão Étnico-Racial
Objetivo: participar de discussão, reflexão e trocas de experiências sobre as
questões Étnico-Raciais desmitificando visões equivocadas e realizar relatos
de experiências.
Desenvolvimento
1- Decorar o ambiente com banner e demais trabalhos das escolas da Rede
Municipal de Educação de Cachoeiro de Itapemirim.
2- Realizar a abertura com apresentação afro de uma escola da Rede
Municipal de Educação
3-
Compor a mesa com as autoridades: Prefeito Municipal, Secretária
Municipal de Educação, Presidente da Comissão de Estudos AfroBrasileiros (CEAFRO) e demais autoridades presentes.
3- Cantar o Hino Nacional (Estilo Afro) e o Hino do Município.
4- Convidar as autoridades presentes para fazer a abertura do evento.
5- Convidar os palestrantes para compor a mesa:
• Profa. Msc Jaqueline Ramalho Nogueira - Coordenadora do Curso de
História do Centro Universitário São Camilo - ES e da Rede Estadual
de Ensino. Tema: O Negro no Espírito Santo;
• Psicólogo Msc Ricardo Souza, do Centro Universitário São Camilo - ES.
Tema: A Questão Étnico-Racial no Brasil e no Mundo;
• Prof. Msc Adilson dos Santos - Coordenador do Referencial Curricular
da Rede Municipal de Educação e Professor do Centro Universitário
São Camilo - ES. Tema: Trabalhando a Questão Racial à Luz da Lei
10.639/03;
142
• Pedagoga MSc Keila Cristina Belo Oliveira – Profª do Consultora
Educacional
Tema: A Questão Étnico-Racial na Educação Infantil;
• Msc Alda Maria Silva Francisco - Coordenadora do Curso de Matemática
do Centro Universitário São Camilo - ES. Mediadora.
4- Plenária.
5- Relatos de Experiência das escolas selecionadas previamente.
6- Apresentação do grupo de dança da Comunidade Quilombola do Distrito
de Monte Alegre - Cachoeiro de Itapemirim.
143
Apêndice 6: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 1: Formação de Professores como uma proposta de Formação
Continuada
Oficina 6- Módulo 3- Cultura Afro-Brasileira
Objetivo: Explorar e discutir a questão do racismo e da cultura afro-brasileira
para entender nossa história e identidade.
Desenvolvimento
1- Apresentar no aparelho data show um vídeo sobre a vinda dos negros para
o Brasil e abrir para discussões.
2- Formar sete grupos. Cada um receberá figuras recortadas em 5 partes
para realização da seguinte dinâmica:
1º) cada aluno recebe um pedaço de uma figura;
2º) os alunos procuram as outras partes para formarem a figura;
3º) quando os alunos formam a figura, sentam-se em grupo e falam o que
entenderam da figura;
4º) depois de todos os grupos falarem sobre a figura, cada um recebe um texto
do livro “O Negro no Brasil de Hoje, de Kabengele Munanga e Nilma Lino
Gomes, relacionado à figura, o qual deverão ler, refletir, discutir e
apresentar de forma criativa;
5º) os grupos apresentam sua produção;
6º) finalizando, cada participante deverá, em círculo, avaliar com uma palavra
o que foi a oficina de hoje.
“Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas Escolas a
partir da Lei 10.639/03”
6ª Tarefa Teórico - Prática do Mês de Agosto
Prezado Profissional:
Este mês você deverá escolher uma temática sobre Cultura Afro-Brasileira de
acordo com a oficina realizada e aplicar em sua escola. Em seguida elaborar um
relatório com fotos e outros e enviar à SEME.
Referência Bibliográfica:
MUNANGA & GOMES. O negro no Brasil de hoje. São Paulo: Global, cap7, 2006.
Sucesso!
144
Apêndice 7: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 2- questão pedagógica, educacional e instrumental de forma
processual e interdisciplinar.
Oficina 7- Módulo C: Dialogando com a sala de aula
Objetivo: Vivenciar atividades contextualizadas voltadas para a inserção das
questões étnico-raciais aplicáveis na sala de aula.
Desenvolvimento
1ª)
Explorando
a
questão
afro
na
Música.
Uma
adaptação
de:
http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html? aula=5438
Objetivo: Explorar e aprofundar a reflexão sobre a questão afro na música, de
forma a contribuir para o desenvolvimento sensorial, emocional e cultural dos
alunos.
Desenvolvimento
1-
Questionar quais contribuições os negros trouxeram para o Brasil.
2-
Estimular todos a cantarem as duas músicas abaixo, percebendo sons,
ritmos, instrumentos musicais.
a) Kizomba, festa da raça (Anexo D)
b) Liberdade, Liberdade! Abra as asas sobre nós! (Anexo 4)
3-
Fazer esclarecimentos sobre cada uma das músicas quanto aos seus
autores e personagens retratados nas letras.
4-
Colorir as palavras afros e procurar o significado no dicionário, anotandoo de acordo com o sentido da palavra na frase.
5-
Formar grupos para reler as letras, procurando entender o significado de
cada uma das estrofes.
6-
Em grupos, discutir cada uma das estrofes com os colegas e o professor.
145
7-
Cada dois grupos ficará com um mesmo samba para responder, por
escrito, às questões relativas à interpretação de cada um dos sambas
com os seguintes comandos.
COMANDO A
De acordo com o samba-enredo Liberdade, Liberdade! Abra as asas sobre
nós!,
discuta quem foi o responsável pela abolição da escravatura no Brasil.
Apresente sua resposta cantando uma estrofe da música.
COMANDO B
De acordo com o samba-enredo Kizomba, festa da raça, discuta quem foi o
responsável pela abolição da escravatura no Brasil.
Apresente sua resposta cantando uma estrofe da música.
COMANDO C
Discuta e reflita se esses dois sambas-enredo fazem a mesma interpretação
histórica sobre a abolição da escravidão. Justifique sua resposta.
COMANDO DDiscuta qual dos dois sambas-enredo se assemelha à História Oficial sobre a
abolição? Fundamente sua resposta
Discuta qual dos dois sambas-enredo se assemelha à História Oficial sobre a
abolição. Fundamente sua resposta.
5- ATIVIDADES PARA TODOS OS GRUPOS
Estas atividades são para se trabalharem as possibilidades interpretativas a
serem exploradas por alunos, professores, pedagogos e gestores no debate
dos dois sambas-enredo.
146
Atividade 1
Na leitura e compreensão das letras é possível perceber que os dois sambasenredo fazem interpretações diferentes sobre a Abolição da Escravidão. A
interpretação oficial sobre a abolição aparece no samba-enredo Liberdade,
Liberdade! Abra as asas sobre nós! De acordo com essa interpretação, em 13
de maio de 1888, a Princesa Isabel acabou com a escravidão no Brasil,
concedendo a liberdade aos escravos por meio da assinatura de uma lei, a Lei
Áurea, entrando para a História como uma heroína, a redentora.
Observe que a estrofe que menciona o fato traz a leitura de que o sujeito da
ação é a princesa – ao escravo coube dançar e comemorar o grande feito, o
fim da sina. A letra, além de reforçar um dos mitos mais tradicionais sobre a
abolição, também faz alusão a outros mitos igualmente cristalizados na história
oficial do Brasil. Por exemplo, quando cita o Duque imortal, numa referência a
Duque de Caxias, consagrado como herói, sobretudo por sua participação na
guerra à qual a letra do samba se refere: a Guerra do Paraguai, ocorrida de
1865 a 1870, envolvendo o Brasil, a Argentina e Uruguai contra o Paraguai.
Nesta guerra, Caxias foi nomeado comandante das forças aliadas (exércitos do
Brasil, Argentina e Uruguai). Ao contrário de Caxias, os escravos negros que
lutaram e morreram na Guerra do Paraguai, muitos deles buscando a conquista
da sua liberdade, não são mencionados pela História Oficial. Mas Caxias
garantiu a sua imagem na galeria dos heróis e a partir dela foi instituída uma
outra data comemorativa: o 25 de agosto, data do seu nascimento,
institucionalizado como o dia do soldado.
Outra referência sintomática na letra da música, na última estrofe, diz respeito
à bravura realizada por um certo Marechal (Marechal Deodoro da Fonseca),
numa certa noite quinze reluzente (15 de novembro de 1889) quando o
Marechal que proclamou (proclamou a República no Brasil) foi presidente
(Marechal Deodoro da Fonseca foi o primeiro presidente da República do
Brasil, governando de 1889 a 1891). Observa-se que na letra da música há um
desfile de heróis e fatos relacionados à História do Brasil.
147
Atividade 2
O samba-enredo Kizomba, festa da Raça traz outra interpretação. A letra do
samba foi composta no ano em que se comemorou o centenário da Abolição
da Escravidão no Brasil: 1988. E nela não há nenhuma referência à Princesa
Isabel ou à Lei Áurea. Há sim, uma valorização da figura de Zumbi, Anastácia e
Clementina. Zumbi, reconhecido como um dos líderes do Quilombo dos
Palmares, tornou-se uma referência para o movimento negro.
A escrava Anastácia, considerada um símbolo da resistência negra à
escravidão. E Clementina de Jesus, sambista negra que pertencia à
comunidade de Vila Isabel. A letra do samba enfatiza aspectos da cultura afrobrasileira e figuras importantes para o movimento negro dentro de uma
perspectiva de valorização da luta e resistência dos escravos no processo de
Abolição da Escravidão. Há uma clara defesa em favor da recuperação de uma
interpretação dos escravos como sujeitos contra aquela visão que reverencia a
princesa e caracteriza os escravos como seres passivos e alienados.
Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas Escolas a
partir da Lei 10.639/03”
7ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Setembro
Prezado Profissional:
Neste mês você deverá trabalhar em sua escola músicas voltadas para temática
étnico-racial, explorando-as de acordo com sua criatividade. Em seguida, elaborar
um relatório com fotos e outros materiais e enviar à SEME.
Sucesso!
148
Apêndice 8: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 1: Formação de Professores como uma Proposta de Formação
Continuada
Oficina 8 - Módulo 4- Um novo olhar sobre a História Nacional, Regional e
Local
Objetivo: construir um novo olhar sobre a História nacional, regional e local
ressaltando a contribuição dos negros e desmitificando visões equivocadas.
•
Para iniciar a oficina de hoje será feita, em forma de jogral, a leitura da
poesia “Sou Negro” de Solano Trindade (anexo A), seguida de partilha
espontânea.
•
Após a leitura individual da poesia “Majestade África” de Paulo Vaz & Cissa
(Anexo B), você deverá retirar dela expressões afros e pesquisar seus
significados.
•
Em grupos, partilhar as palavras pesquisadas.
•
Em grupos, observar, analisar e discutir a charge abaixo com o olhar sobre
a questão afro:
Paulo Vaz & Cissa afirmam que: “Ilê, refresca a memória, pois ao longo da
história, o negro é antecessor”. Releia o tópico e responda: Você concorda com
a abordagem do autor? Argumente para validar sua resposta.
149
Explique como podemos lidar com a questão do racismo, discriminação e
preconceito na escola.
Relacione a tirinha abaixo com a poesia de Paulo Vaz & Cissa.
•
De acordo com a sua área de ensino e/ou função que exerce na escola,
selecione uma atividade que permita ao educando construir significados e
atribuir sentido ao conteúdo aprendido pesquisando em livros didáticos
e/ou revistas pedagógicas. Justifique a sua escolha com embasamentos
teóricos e apresente para a turma.
“Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas
Escolas a partir da Lei 10.639/03”
8ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Outubro
Prezado Profissional:
Neste mês comemora-se o “Dia das Crianças”. Você poderá aproveitar para
trabalhar em sua escola poesias com temáticas Afros usando da criatividade.
Em seguida, elaborar um relatório com fotos e outros materiais e enviar à
SEME.
Sucesso!
150
Apêndice 9: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 2- questão pedagógica, educacional e instrumental de forma
processual e interdisciplinar.
Oficina 9- Módulo D: articulando teorias às Práticas Étnico-Raciais das
Escolas
Objetivo: Vivenciar práticas diversas para estudos, reflexões e proposições
acerca da melhoria da prática educativa nas questões étnico-raciais na sala de
aula.
Atividade 1 – Cinema na escola:
Este é um rico recurso didático-pedagógico que desperta o interesse, funciona
como agente socializador e enriquecedor da cultura afro-brasileira.
Desenvolvimento
Reunir duas ou mais turmas acompanhadas de seus professores, que
inicialmente deverão fazer uma abordagem sobre o objetivo do filme,
destacando o que os alunos deverão observar para melhor interação no debate
posterior sobre a questão do negro, da diversidade étnico-racial no Brasil e no
mundo.
Sugestões de Filmes:
• Zumbi dos Palmares
• Construtores do Brasil
• Macunaíma
• Um Grito de Liberdade
OBS.: o livro “Negritude, Cinema e Educação” de Edileuza Penha de Souza
(Organizadora) aborda sobre inúmeros filmes nacionais e internacionais.
Atividade 2– Construção de álbum afro
Objetivo:
Trabalhar
a
questão
afro-brasileira
valorizando
a
interdisciplinaridade, estabelecendo um clima favorável ao desafio, com
151
atividades motivadoras, com oportunidades de interação social e de trocas de
experiências, ajudando-os a pensar historicamente o processo histórico do
negro no Brasil.
Desenvolvimento
• Cada pessoa deverá trazer textos e figuras afros.
• Serão formados grupos de 5 pessoas.
• Cada grupo deverá utilizar seus materiais e construir um álbum com
capa, textos, figuras e conclusão.
• Em seguida, será feita a apresentação e exposição.
• O professor faz o fechamento enfatizando a importância de se ter
refletido sobre o reconhecimento, reparação e valorização no negro em
nossa sociedade e no país.
Atividade 3- Grandes negros brasileiros
Objetivo: Identificar negros que se destacaram na História no Brasil e suas
contribuições na trajetória histórica do país.
Desenvolvimento
• Iniciar
com
questionamento:
Qual
(quais)
negro(s)
brasileiro(s)
se
destacaram no Brasil que vocês conhecem?
Deixarem partilhar e, em seguida, apresentar slides com alguns negros
brasileiros que se destacaram no Brasil.
• Prosseguindo, formarão grupos e cada grupo receberá um texto sobre
“Homens e Mulheres Negros: nota de vida e de sucesso”, de Kabengele
Munanga e Nilma Lino Gomes, que deverão ler, discutir os trechos
selecionados para o seu grupo e apresentar de forma criativa.
• Finalizando, deverão escrever num cartão o que acharam da atividade e
quais contribuições trouxeram para seu crescimento pessoal.
• À proporção que forem partilhando, deverão colar numa folha de papel
cenário que ficará exposta na sala de aula e/ou em outro espaço visível da
escola.
152
Referência Bibliográfica:
MUNANGA, Kabengele, GOMES, O negro no Brasil de hoje. São Paulo:
Global, p. 199-222, 2006.
Atividade 4- Estudo sobre Africanos no Brasil: origens e contribuições
Objetivo: estudar, refletir e discutir sobre as origens e contribuições dos
Africanos no Brasil visando à construção de uma pedagogia antirracista,
promovendo o respeito às diversidades e às peculiaridades do povo brasileiro.
Desenvolvimento
•
Inicialmente deve-se questionar aos alunos como veem a história dos
afro-brasileiros e dos africanos.
•
Em grupos, fazer a leitura de textos diversos do livro “Africanos no
Brasil: Origens e contribuições”, de Kabengele Munanga e Nilma Lino
Gomes, de forma que cada grupo receberá o seguinte comando:
GRUPO 1- Leia, reflita e discuta o texto. Selecione palavras-chave, faça um
cartaz e apresente o que entenderam do texto.
GRUPO 2- Leia, reflita e discuta o texto. Elabore uma paródia e apresente à
turma.
GRUPO 3- Leia, reflita e discuta o texto. Selecione palavras-chave, faça um
ACRÓSTICO e apresente o que entenderam do texto.
GRUPO 4- Leia, reflita e discuta o texto. Selecione palavras-chave e
apresente em forma de NOTICIÁRIO DE TV o que entenderam do texto.
GRUPO 5- Leia, reflita e discuta o texto. Apresente em forma de DISCURSO
POLÍTICO o que entenderam do texto.
• Após a construção das atividades, os grupos apresentarão seus comandos.
O Professor deverá fazer o fechamento destacando a importância do
153
respeito às diversidades e às peculiaridades na sala de aula, na família,
comunidade e na sociedade brasileira.
Referência Bibliográfica:
MUNANGA, Kabengele, GOMES. O negro no Brasil de hoje. São Paulo:
Global, p. 18-23, 2006.
Atividade 6- Explorando a Literatura na sala de aula
Objetivo: trabalhar a literatura afro-brasileira para a inserção do tema étnicoracial no currículo e na sala de aula visando à incorporação da dimensão racial
e à elevação da autoestima da criança negra.
Desenvolvimento
• O professor deve criar todo um ambiente para leitura na sala, pátio ou uma
área livre da escola.
• Ele deve questionar sobre quais situações de racismo, discriminação ou
preconceito já vivenciaram ou presenciaram e abrir para partilhas.
• Explanar sobre algumas práticas racistas existentes em nossa sociedade.
• Formar grupos em que cada um deles receberá um livro de literatura afrobrasileira que deverá ler, discutir a apresentar de forma criativa.
Sugestões de livros:
1- Mãe Dinha - Maria do Carmo Galdino
2- Minha mãe é negra sim! - Patrícia Santana
3- Livro do Professor- Maria Catarina Evaristo
4- Que cor é a minha cor? - Matha Rodrigues
5- Lindara- Sonia Rosa
6- Zumbi - Walter Vetillo
7- Betina - Nilma Lino Gomes
8- Gosto de África: história de lá e daqui - Joel Rufino dos Santos
•
Após
as
apresentações,
os
grupos
trabalharão
com
sucatas
reproduzindo algo que expresse seu sentimento em relação à leitura e
discussão realizada.
154
•
Eles deverão partilhar quais contribuições a leitura trouxe para sua vida.
•
Para fechar a atividade, o professor explanará sobre a importância de
atitudes éticas como premissa fundamental para uma verdadeira
educação das relações étnico-raciais.
Atividade 7- Hemeroteca: estudos sobre a Lei 10.639/03, as questões afrobrasileiras e Matrizes Africanas
Objetivo: estabelecer um olhar crítico sobre a lei 10.639/03, as questões afrobrasileiras e Matrizes Africanas visando aproximar o aluno da realidade
cotidiana e possibilitando a contextualização das questões raciais no dia a dia
escolar, bem como a produção e construção do conhecimento.
Desenvolvimento
•
O professor formará grupos com os alunos e cada grupo ficará
responsável por uma temática.
•
Os participantes farão a seleção das informações, artigos sobre
racismo, discriminação, preconceito, a Lei 10.639/03, Matrizes
Africanas e
temas voltados
para
as questões afro-brasileiras
consistentes com informações específicas, como dados, estatísticas,
acontecimentos históricos, descobertas científicas, gráficos, crônicas,
ilustrações entre outras.
•
A seguir, faz-se uma roda de conversa nos grupos e depois um grande
círculo com toda a turma para apresentação de diferentes reportagens
coletadas.
•
Prosseguindo, eles irão para trabalho em grupo utilizando também
revistas, jornais, folha branca; cola; tesoura e pincel, explorando as
manchetes do jornal e os artigos, montando um mural.
•
Agora, os grupos criarão um texto opinativo e/ou charge.
•
Organizarão a hemeroteca da sala, apresentando-a para todos os
participantes.
•
O professor faz a conclusão elencando referencias e princípios que
contribuam para uma verdadeira educação étnico-racial visando a uma
construção harmônica.
155
Atividade 8- O Negro e sua Religiosidade
Objetivo: estudar, discutir e pesquisar as religiões de Matrizes Africanas
praticadas nas regiões do Brasil e suas características, enfatizando o respeito
às opções religiosas da comunidade escolar e da sociedade.
Desenvolvimento
•
O professor faz um planejamento conjunto entre os demais
profissionais de outras áreas para que todas as disciplinas possam
estar envolvidas com a temática.
•
Matemática se encarregará da pesquisa das religiões na sala de aula
e/ou das famílias, trabalhando porcentagem e dados estatísticos,
História enfoca a questão histórica das religiões de matrizes africanas
praticadas no Brasil desde o século XVIII. Geografia abordará as
regiões, territórios dessas religiões. Ciências enfatizará a melanima,
as doenças comuns na raça negra e comida utilizadas nos cultos. Arte
ficará com a exploração da realização de trabalhos artísticos,
Educação Física com a corporeidade e Português com os verbetes,
entrevista e produção de texto.
•
Podem-se convidar pessoas da comunidade para uma roda de
conversa, deve-se antes conversar com os alunos sobre a questão
ética e comportamental.
•
Finalizando, faz-se uma “Mostra Cultural” aberta à comunidade.
•
É importante avaliar com os alunos e com os profissionais envolvidos
os pontos positivos e negativos.
Referência bibliográfica:
BENJAMIN, Roberto Emerson Câmara. A África está em nós; história e cultura
afro-brasileira. João Pessoa PB: Grafset, p. 29 – 47, 2004
156
“Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o Racismo nas
Escolas a partir da Lei 10.639/03”
9ª Tarefa Teórico-Prática do Mês de Novembro
Prezado Profissional:
Neste mês comemora-se o Dia da “Consciência Negra”, vamos dar ênfase às
atividades, assim você deverá escolher pelo menos duas das atividades
vivenciadas e trabalhar em sua escola. Em seguida elaborar um relatório com
fotos e outros materiais e enviar à SEME.
Sucesso!
157
Apêndice 10: “Práticas Pedagógicas e Inovações Metodológicas sobre o
Racismo nas Escolas a partir da Lei 10.639/03”
Eixo 2- Questão Pedagógica, Educacional e Instrumental de forma
processual e interdisciplinar.
Atividade 10: Módulo E- Seminário Final: Educação das Relações ÉtnicoRaciais a Luz da Lei 10.639/03
Objetivo Geral: Ampliar o debate e discussões sobre Educação das Relações
Étnico-Raciais à luz da lei 10.639/03, visando ao aprofundamento dos
conhecimentos das relações étnico-raciais e de sua contribuição para a análise
de questões relacionadas à formação educacional e cultural contemporânea
envolvendo aspectos teórico-metodológicos no trato pedagógico com essa
temática em sala de aula.
Objetivos específicos
•
Difundir as discussões étnico-raciais no ambiente escolar.
•
Debater questões relacionadas às relações étnico-raciais e suas
implicações para a educação e na sociedade.
•
Apresentar ações pedagógicas fundamentadas na Lei 10.639/03 em
desenvolvimento nas Unidades Escolares Municipais.
•
Prestar homenagem a personalidades afrodescendentes do Município.
•
Realizar furdunço, valorizando a cultura afro-brasileira local.
Desenvolvimento
•
Abertura com as autoridades: Prefeito Municipal, Secretária Municipal de
Educação, Presidente da Comissão de Estudos Afro-Brasileiros
(CEAFRO) e demais autoridades presentes.
•
Apresentação do grupo de dança da Comunidade Quilombola do Distrito
de Monte Alegre- Cachoeiro de Itapemirim.
•
Palestra: Educação, relações étnico-raciais e a Lei 10.639/03- Profa.
Dra. Nilma Lino Gomes
158
•
Apresentação afro de uma Escola da Rede da Municipal de Educação.
•
Palestra: Aprender, ensinar e relações étnico-raciais na escola:
compromisso de todos - Prof. Msc Adilson Santos.
•
Apresentação afro de uma Escola da Rede da Municipal de Educação.
•
Música, memória e identidade cultural afro-brasileira- Prof. Dr. Marcelo
Ribeiro
•
Plenária
•
Relatos de Experiência das escolas selecionadas previamente
•
Furdunço - Abertura com a Cantora Lecy Brandão e, a seguir, os grupos
de Caxambu e pagodes da cidade.
159
ANEXOS
Anexo A
SOU NEGRO
A Dione Silva
Sou Negro
meus avós foram queimados
pelo sol da África
minh'alma recebeu o batismo dos tambores atabaques, gonguês e agogôs
Contaram-me que meus avós
vieram de Loanda
como mercadoria de baixo preço plantaram cana pro senhor do engenho novo
e fundaram o primeiro Maracatu.
Depois meu avô brigou como um danado nas terras de Zumbi
Era valente como quê
Na capoeira ou na faca
escreveu não leu
o pau comeu
Não foi um pai João
humilde e manso
Mesmo vovó não foi de brincadeira
Na guerra dos Malês
ela se destacou
Na minh'alma ficou
o samba
o batuque
o bamboleio
e o desejo de libertação...
Da página 9 do livro “A África está em nós” de Roberto Benjamin.
160
Anexo B
Agora, um pouco de canto e poesia do Ilê Aiyê
Majestade África
Paulo Vaz & Cissa
Ilê, refresca memória
Pois ao longo da história
O negro é antecessor.
Pois tudo que nasceu na África
Foi tomado de graça
O mundo inteiro tragou
Cultura, reza, crença e dança
Tempestade de bonança, tudo tem seu valor
Seja do banto, seja de gêge ou do nagô
O mundo inteiro colhe o que a África plantou.
Graças a Deus
Sou o que sou
Ilê é bebida fina
Que eu canto da esquina
O mundo inteiro provou.
África berço da cultura, ciência e arquitetura
Ouro refinado pó, Gênesis da sociedade
Forte ancestralidade, paciência de Jó
Tapete persa emoldurado
Amas de leite jorrando para toda a nação
O poço de bondade divinal
Ilê Aiyê é a cópia da África original
Enciclopédia que o mundo pesquisa
Se infiltra, analisa, pau pra toda construção
Ninho de celebridades de escritos sagrados
De total comunhão
Celeiro negro de beleza
Culto ávido de nobreza
Nossa pedra angular
Não adianta nosso brilho ofuscar
Pois os joelhos se curvam
Pra majestade passa
p. 35 do livro no site
http://www.ceao.ufba.br/livrosevideos/pdf/literatura%20afrobrasileira_cIII.pdf.
Visitado em 13/12/11
161
Anexo C
Composição de: Rodolpho, Jonas e Luis Carlos da Vila
Interpretação de: Gera
Sambas-Enredo das Escolas de samba do Grupo 1 - Rio de Janeiro (disco).
São Paulo: RCA, 1987
Kizomba, festa da raça
Valeu Zumbi
Numa mesma emoção
O grito forte dos Palmares
Esta Kizomba é nossa constituição
Que correu terras céus e mares
Esta Kizomba é nossa constituição
Influenciando a Abolição
Que magia
Zumbi valeu
Reza ageum e Orixá
Hoje a Vila é Kizomba
Tem a força da Cultura
É batuque, canto e dança
Tem a arte e a bravura
Jogo e Maracatu
E um bom jogo de cintura
Vem
menininha
pra
dançar
o
E a beleza pura dos seus rituais
Caxambu
Vem
menininha
Faz valer seus ideais
pra
dançar
o
Vem a Lua de Luanda
Caxambu
Para iluminar a rua
Ô ô nega mina
Nossa sede é nossa sede
Anastácia não se deixou escravizar
De que o Apartheid se destrua
Ô ô Clementina
Vem a Lua de Luanda
O pagode é o partido popular
Para iluminar a rua
Sacerdote ergue a taça
Nossa sede é nossa sede
Convocando toda a massa
De que o Apartheid se destrua
Nesse evento que com graça
Valeu
Gente de todas as raças
Valeu Zumbi
162
Anexo D
Liberdade, Liberdade! Abra as asas sobre nós!
Compositores: Niltinho Tristeza, Preto Jóia, Jurandir, Vicentinho
Intérprete: Dominguinhos da Estácio
Samba-enredo das Escolas de Samba do Grupo 1 - Rio de Janeiro (disco). São
Paulo: RCA, 1988
(Olha a Imperatriz chegando...)
em verde e branco por aí
Liberdade, Liberdade
brilhando na Sapucaí!
abra as asas sobre nós
E da guerra
e que a voz da igualdade
Da guerra nunca mais
seja sempre a nossa voz
esqueceremos do patrono, o duque
Vem ver, vem reviver comigo amor
imortal
o centenário em poesia
A imigração floriu
nesta pátria, mãe querida
de cultura o Brasil
O império decadente,
A música encanta
muito rico incoerente
E o povo canta assim
era fidalguia
E a princesa
É por isso que surgem
Pra Isabel, a heroína
Surgem os tamborins
que assinou a lei divina (Graças a
Vem emoção
Deus!)
a bateria vem
negro dançou, comemorou
no pique da canção
o fim da sina.
e a nobreza enfeita o luxo do salão,
Na noite quinze reluzente
vem viver
Com a bravura finalmente
Vem viver o sonho que sonhei
O Marechal que proclamou
ao longe faz-se ouvir
foi Presidente
163
ANEXO E
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
LEI No 10.639, DE 9 DE JANEIRO DE 2003.
o
Altera a Lei n 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que
estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para
incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade
da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras
providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional
decreta e eu sanciono a seguinte Lei:
Art. 1o A Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, passa a vigorar acrescida
dos seguintes arts. 26-A 79-A e 79-B:
"Art. 26-A. Nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio, oficiais e
particulares, torna-se obrigatório o ensino sobre História e Cultura AfroBrasileira.
§ 1o O conteúdo programático a que se refere o caput deste artigo incluirá o
estudo da História da África e dos Africanos, a luta dos negros no Brasil, a
cultura negra brasileira e o negro na formação da sociedade nacional,
resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e
políticas pertinentes à História do Brasil.
§ 2o Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão
ministrados no âmbito de todo o currículo escolar, em especial nas áreas de
Educação Artística e de Literatura e Histórias Brasileiras.
§ 3o (VETADO)"
"Art. 79-A. (VETADO)"
"Art. 79-B. O calendário escolar incluirá o dia 20 de novembro como ‘Dia
Nacional da Consciência Negra’."
Art. 2o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação.
Brasília, 9 de janeiro de 2003; 182o da Independência e 115o da República.
LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA
Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 10.1.2003
Retirado do www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/.../L10.639.htm em13/11/10
164
ANEXO F
Presidência da República
Casa Civil
Subchefia para Assuntos Jurídicos
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
CONSELHO PLENO
RESOLUÇÃO Nº 1, DE 17 DE JUNHO DE 2004. (*)
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
O Presidente do Conselho Nacional de Educação, tendo em vista o disposto no
art. 9º, § 2º, alínea “c”, da Lei nº 9.131, publicada em 25 de novembro de 1995,
e com fundamentação no Parecer CNE/CP 3/2004, de 10 de março de 2004,
homologado pelo Ministro da Educação em 19 de maio de 2004, e que a este
se integra, resolve:
Art. 1° A presente Resolução institui Diretrizes Cu rriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana, a serem observadas pelas Instituições de ensino,
que atuam nos níveis e modalidades da Educação Brasileira e, em especial,
por Instituições que desenvolvem programas de formação inicial e continuada
de professores.
§ 1° As Instituições de Ensino Superior incluirão n os conteúdos de disciplinas e
atividades curriculares dos cursos que ministram, a Educação das Relações
Étnico-Raciais, bem como o tratamento de questões e temáticas que dizem
respeito aos afrodescendentes, nos termos explicitados no Parecer CNE/CP
3/2004.
(*) CNE/CP Resolução 1/2004. Diário Oficial da União, Brasília, 22 de junho de
2004, Seção 1, p. 11.
165
§ 2° O cumprimento das referidas Diretrizes Curricu lares, por parte das
instituições de ensino, será considerado na avaliação das condições de
funcionamento do estabelecimento.
Art. 2° As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas
constituem-se de orientações, princípios e fundamentos para o planejamento,
execução e avaliação da Educação, e têm por meta, promover a educação de
cidadãos atuantes e conscientes no seio da sociedade multicultural e
pluriétnica do Brasil, buscando relações étnico-sociais positivas, rumo à
construção de nação democrática.
§ 1° A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e
produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que
eduquem cidadãos quanto à pluralidade étnico-racial, tornando-os capazes de
interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, respeito aos
direitos legais e valorização de identidade, na busca da consolidação da
democracia brasileira.
§ 2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana tem por objetivo o
reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afrobrasileiros, bem como a garantia de reconhecimento e igualdade de
valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas,
europeias, asiáticas.
§ 3º Caberá aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios desenvolver as Diretrizes Curriculares Nacionais instituídas por esta
Resolução, dentro do regime de colaboração e da autonomia de entes
federativos e seus respectivos sistemas.
Art. 3° A Educação das Relações Étnico-Raciais e o estudo de História e
Cultura Afro-Brasileira, e História e Cultura Africana será desenvolvida por meio
de conteúdos, competências, atitudes e valores, a serem estabelecidos pelas
Instituições de ensino e seus professores, com o apoio e supervisão dos
sistemas de ensino, entidades mantenedoras e coordenações pedagógicas,
atendidas as indicações, recomendações e diretrizes explicitadas no Parecer
CNE/CP 003/2004.
166
§ 1° Os sistemas de ensino e as entidades mantenedo ras incentivarão e
criarão condições materiais e financeiras, assim como proverão as escolas,
professores e alunos, de material bibliográfico e de outros materiais didáticos
necessários para a educação tratada no “caput” deste artigo.
§ 2° As coordenações pedagógicas promoverão o aprof undamento de estudos,
para que os professores concebam e desenvolvam unidades de estudos,
projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes curriculares.
§ 3° O ensino sistemático de História e Cultura Afr o-Brasileira e Africana na
Educação Básica, nos termos da Lei 10639/2003, refere-se, em especial, aos
componentes curriculares de Educação Artística, Literatura e História do Brasil.
§ 4° Os sistemas de ensino incentivarão pesquisas s obre processos educativos
orientados por valores, visões de mundo, conhecimentos afro-brasileiros, ao
lado de pesquisas de mesma natureza junto aos povos indígenas, com o
objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas para a educação
brasileira.
Art. 4° Os sistemas e os estabelecimentos de ensino poderão estabelecer
canais de comunicação com grupos do Movimento Negro, grupos culturais
negros, instituições formadoras de professores, núcleos de estudos e
pesquisas, como os Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, com a finalidade de
buscar subsídios e trocar experiências para planos institucionais, planos
pedagógicos e projetos de ensino.
Art. 5º Os sistemas de ensino tomarão providências no sentido de garantir o
direito de alunos afrodescendentes de frequentarem estabelecimentos de
ensino de qualidade, que contenham instalações e equipamentos sólidos e
atualizados, em cursos ministrados por professores competentes no domínio
de conteúdos de ensino e comprometidos com a educação de negros e não
negros, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes, palavras que impliquem
desrespeito e discriminação.
Art. 6° Os órgãos colegiados dos estabelecimentos d e ensino, em suas
finalidades, responsabilidades e tarefas, incluirão o previsto o exame e
encaminhamento de solução para situações de discriminação, buscando-se
criar situações educativas para o reconhecimento, valorização e respeito da
diversidade.
167
§ Único: Os casos que caracterizem racismo serão tratados como crimes
imprescritíveis e inafiançáveis, conforme prevê o Art. 5º, XLII da Constituição
Federal de 1988.
Art. 7º Os sistemas de ensino orientarão e supervisionarão a elaboração e
edição de livros e outros materiais didáticos, em atendimento ao disposto no
Parecer CNE/CP 003/2004.
Art. 8º Os sistemas de ensino promoverão ampla divulgação do Parecer
CNE/CP 003/2004 e dessa Resolução, em atividades periódicas, com a
participação das redes das escolas públicas e privadas, de exposição,
avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagens de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educação das Relações
Étnico-Raciais.
§ 1° Os resultados obtidos com as atividades mencio nadas no caput deste
artigo serão comunicados de forma detalhada ao Ministério da Educação, à
Secretaria Especial de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional
de Educação e aos respectivos Conselhos Estaduais e Municipais de
Educação, para que encaminhem providências, que forem requeridas.
Art. 9º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário.
Roberto Cláudio Frota Bezerra
Presidente do Conselho Nacional de Educação
168
ANEXO G
PARECER HOMOLOGADO(*)
(*) Despacho do Ministro, publicado no Diário Oficial da União de 19/5/2004.
Resolução Nº 1, de 17 de junho de
2004.
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
INTERESSADO: Conselho Nacional de Educação
UF: DF
ASSUNTO: Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
CONSELHEIROS: Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (Relatora), Carlos
Roberto JamilCury, Francisca Novantino Pinto de Ângelo e Marília AnconaLopez
PROCESSO N.º: 23001.000215/2002-96
PARECER N.º:
CNE/CP003/2004
COLEGIADO:
APROVADO EM:
CP
10/3/2004
I – RELATÓRIO
Este parecer visa a atender os propósitos expressos na Indicação CNE/CP
6/2002, bem como regulamentar a alteração trazida à Lei 9394/96 de Diretrizes
e Bases da Educação Nacional, pela Lei 10.639/200, que estabelece a
obrigatoriedade do ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana na
Educação Básica. Desta forma, busca cumprir o estabelecido na Constituição
Federal nos seus Art. 5º, I, Art. 210, Art. 206, I, § 1° do Art. 242, Art. 215 e Art.
216, bem como nos Art. 26, 26 A e 79 B na Lei 9.394/96 de Diretrizes e Bases
169
da Educação Nacional, que asseguram o direito à igualdade de condições de
vida e de cidadania, assim como garantem igual direito às histórias e culturas
que compõem a nação brasileira, além do direito de acesso às diferentes
fontes da cultura nacional a todos brasileiros.
Juntam-se a preceitos analógicos os Art. 26 e 26 A da LDB, como os das
Constituições Estaduais da Bahia (Art. 275, IV e 288), do Rio de Janeiro (Art.
306), de Alagoas (Art. 253), assim como de Leis Orgânicas, tais como a de
Recife (Art. 138), de Belo Horizonte (Art. 182, VI), a do Rio de Janeiro (Art. 321,
VIII), além de leis ordinárias, como lei Municipal nº 7.685, de 17 de janeiro de
1994, de Belém, a Lei Municipal nº 2.251, de 30 de novembro de 1994, de
Aracaju e a Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de 1996, de São Paulo.12
Junta-se, também, ao disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei
8.096, de 13 de junho de 1990), bem como no Plano Nacional de Educação
(Lei 10.172, de 9 de janeiro de 2001).
Todos estes dispositivos legais, bem como reivindicações e propostas do
Movimento Negro ao longo do século XX, apontam para a necessidade de
diretrizes que orientem a formulação de projetos empenhados na valorização
da história e cultura dos afro-brasileiros e dos africanos, assim como
comprometidos com a de educação de relações étnico-raciais positivas, a que
tais conteúdos devem conduzir.
Destina-se, o parecer, aos administradores dos sistemas de ensino, de
mantenedoras de estabelecimentos de ensino, aos estabelecimentos de
ensino, seus professores e a todos implicados na elaboração, execução,
12
Belém – Lei Municipal nº 7.6985, de 17 de janeiro de 1994, que “Dispõe sobre a inclusão, no
currículo escolar da Rede Municipal de Ensino, na disciplina História, de conteúdo relativo ao
estudo da Raça Negra na formação sociocultural brasileira e dá outras providências”.
Aracaju – Lei Municipal nº 2.251, de 30 de novembro de 1994, que “Dispõe sobre a inclusão,
no currículo escolar da rede municipal de ensino de 1º e 2º graus, conteúdos programáticos
relativos ao estudo da Raça Negra na formação sociocultural brasileira e dá outras
providências.
São Paulo – Lei Municipal nº 11.973, de 4 de janeiro de 1996, que “Dispõe sobre a introdução
nos currículos das escolas municipais de 1º e 2º graus de estudos contra a discriminação”.
170
avaliação de programas de interesse educacional, de planos institucionais,
pedagógicos e de ensino. Destina-se, também, às famílias dos estudantes, a
eles próprios e a todos os cidadãos comprometidos com a educação dos
brasileiros, para nele buscarem orientações, quando pretenderem dialogar com
os sistemas de ensino, escolas e educadores, no que diz respeito às relações
étnico-raciais, ao reconhecimento e valorização da história e cultura dos afrobrasileiros, à diversidade da nação brasileira, ao igual direito à educação de
qualidade, isto é, não apenas direito ao estudo, mas também à formação para
a cidadania responsável pela construção de uma sociedade justa e
democrática.
Em vista disso, foi feita consulta sobre as questões objeto deste parecer, por
meio de questionário encaminhado a grupos do Movimento Negro, a militantes
individualmente, aos Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, a
professores que vêm desenvolvendo trabalhos que abordam a questão racial, a
pais de alunos, enfim a cidadãos empenhados com a construção de uma
sociedade
justa,
Encaminharam-se
independentemente
em
torno
de
mil
de
seu
pertencimento
questionários
e
o
racial.
responderam
individualmente ou em grupo 250 mulheres e homens, entre crianças e adultos,
com diferentes níveis de escolarização. Suas respostas mostraram a
importância de se tratarem problemas, dificuldades, dúvidas, antes mesmo de
o parecer traçar orientações, indicações, normas.
Questões introdutórias
O parecer procura oferecer uma resposta, entre outras, na área da educação, à
demanda da população afrodescendente, no sentido de políticas de ações
afirmativas, isto é, de políticas de reparações, e de reconhecimento e
valorização de sua história, cultura, identidade. Trata, ele, de política curricular,
fundada em dimensões históricas, sociais, antropológicas oriundas da
realidade brasileira, e busca combater o racismo e as discriminações que
atingem particularmente os negros. Nesta perspectiva, propõe à divulgação e
produção de conhecimentos, a formação de atitudes, posturas e valores que
eduquem
cidadãos
orgulhosos
de
seu
pertencimento
étnico-racial
–
descendentes de africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de
171
asiáticos – para interagirem na construção de uma nação democrática, em que
todos, igualmente, tenham seus direitos garantidos e sua identidade valorizada.
É importante salientar que tais políticas têm como meta o direito dos negros se
reconhecerem na cultura nacional, expressarem visões de mundo próprias,
manifestarem com autonomia, individual e coletiva, seus pensamentos. É
necessário sublinhar que tais políticas têm, também, como meta o direito dos
negros, assim como de todos cidadãos brasileiros, equipadas, orientados por
professores qualificados para o ensino das diferentes áreas de conhecimentos;
com formação para lidar com as tensas relações produzidas pelo racismo e
discriminações, sensíveis e capazes de conduzir a reeducação das relações
entre diferentes grupos étnico-raciais, ou seja, entre descendentes de
africanos, de europeus, de asiáticos, e povos indígenas. Estas condições
materiais das escolas e de formação de professores são indispensáveis para
uma educação de qualidade, para todos, assim como o é o reconhecimento e
valorização da história, cultura e identidade dos descendentes de africanos.
Políticas de Reparações, de Reconhecimento e Valorização, de Ações
Afirmativas
A demanda por reparações visa a que o Estado e a sociedade tomem medidas
para ressarcir os descendentes de africanos negros, dos danos psicológicos,
materiais, sociais, políticos e educacionais sofridos sob o regime escravista,
bem como em virtude das políticas explícitas ou tácitas de branqueamento da
população, de manutenção de privilégios exclusivos para grupos com poder de
governar e de influir na formulação de políticas, no pós-abolição.
Visa também a que tais medidas se concretizem em iniciativas de combate ao
racismo e a toda sorte de discriminações.
Cabe ao Estado promover e incentivar políticas de reparações, no que cumpre
ao disposto na Constituição Federal, Art. 205, que assinala o dever do Estado
de garantir indistintamente, por meio da educação, iguais direitos para o pleno
desenvolvimento de todos e de cada um, enquanto pessoa, cidadão ou
profissional. Sem a intervenção do Estado, os postos à margem, entre eles os
afro-brasileiros, dificilmente, e as estatísticas o mostram sem deixar dúvidas,
romperão o sistema meritocrático que agrava desigualdades e gera injustiça,
172
ao reger-se por critérios de exclusão, fundados em preconceitos e manutenção
de privilégios para os sempre privilegiados.
Políticas de reparações voltadas para a educação dos negros devem oferecer
garantias a essa população de ingresso, permanência e sucesso na educação
escolar, de valorização do patrimônio histórico-cultural afro-brasileiro, de
aquisição das competências e dos conhecimentos tidos como indispensáveis
para continuidade nos estudos, de condições para alcançar todos os requisitos
tendo em vista a conclusão de cada um dos níveis de ensino, bem como para
atuar como cidadãos responsáveis e participantes, além de desempenharem
com qualificação uma profissão.
A demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento, valorização e
afirmação de direitos, no que diz respeito à educação, passou a ser
particularmente apoiada com a promulgação da Lei 10639/2003, que alterou a
Lei 9394/1996, estabelecendo a obrigatoriedade do ensino de história e cultura
afro-brasileiras e africanas.
Reconhecimento implica justiça e iguais direitos sociais, civis, culturais e
econômicos, bem como valorização da diversidade daquilo que distingue os
negros dos outros grupos que compõem a população brasileira. E isto requer
mudança nos discursos, raciocínios, lógicas, gestos, posturas, modo de tratar
as pessoas negras. Requer também que se conheça a sua história e cultura
apresentadas, explicadas, buscando-se especificamente desconstruir o mito da
democracia racial na sociedade brasileira; mito este que difunde a crença de
que, se os negros não atingem os mesmos patamares que os não negros, é
por falta de competência ou de interesse, desconsiderando as desigualdades
seculares que a estrutura social hierárquica cria com prejuízos para os negros.
Reconhecimento requer a adoção de políticas educacionais e de estratégias
pedagógicas de valorização da diversidade, a fim de superar a desigualdade
étnico-racial presente na educação escolar brasileira, nos diferentes níveis de
ensino.
Reconhecer exige que se questionem relações étnico-raciais baseadas em
preconceitos
que
desqualificam
os
negros
e
salientam
estereótipos
depreciativos, palavras e atitudes que, velada ou explicitamente violentas,
expressam sentimentos de superioridade em relação aos negros, próprios de
uma sociedade hierárquica e desigual.
173
Reconhecer é também valorizar, divulgar e respeitar os processos históricos de
resistência negra desencadeados pelos africanos escravizados no Brasil e por
seus descendentes na contemporaneidade, desde as formas individuais até as
coletivas.
Reconhecer exige a valorização e respeito às pessoas negras, à sua
descendência africana, sua cultura e história. Significa buscar, compreender
seus valores e lutas, ser sensível ao sofrimento causado por tantas formas de
desqualificação: apelidos depreciativos, brincadeiras, piadas de mau gosto
sugerindo incapacidade, ridicularizando seus traços físicos, a textura de seus
cabelos, fazendo pouco das religiões de raiz africana. Implica criar condições
para que os estudantes negros não sejam rejeitados em virtude da cor da sua
pele, menosprezados em virtude de seus antepassados terem sido explorados
como escravos, não sejam desencorajados de prosseguir estudos, de estudar
questões que dizem respeito à comunidade negra.
Reconhecer exige que os estabelecimentos de ensino, frequentados em sua
maioria por população negra, contem com instalações e equipamentos sólidos,
atualizados, com professores competentes no domínio dos conteúdos de
ensino, comprometidos com a educação de negros e brancos, no sentido de
que venham a relacionar-se com respeito, sendo capazes de corrigir posturas,
atitudes e palavras que impliquem desrespeito e discriminação.
Políticas de reparações e de reconhecimento formarão programas de ações
afirmativas, isto é, conjuntos de ações políticas dirigidas à correção de
desigualdades raciais e sociais, orientadas para oferta de tratamento
diferenciado com vistas a corrigir desvantagens e marginalização criadas e
mantidas por estrutura social excludente e discriminatória. Ações afirmativas
atendem ao determinado pelo Programa Nacional de Direitos Humanos13, bem
como a compromissos internacionais assumidos pelo Brasil, com o objetivo de
combate ao racismo e a discriminações, tais como: a Convenção da UNESCO
de 1960, direcionada ao combate ao racismo em todas as formas de ensino,
bem como a Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação
Racial, Xenofobia e Discriminações Correlatas de 2001.
13
Ministério da Justiça. Programa Nacional de Direitos Humanos. Brasília, 1996.
174
Assim sendo, sistemas de ensino e estabelecimentos de diferentes níveis
converterão as demandas dos afro-brasileiros em políticas públicas de Estado
ou institucionais, ao tomarem decisões e iniciativas com vistas a reparações,
reconhecimento e valorização da história e cultura dos afro-brasileiros, à
constituição de programas de ações afirmativas, medidas estas coerentes com
um projeto de escola, de educação, de formação de cidadãos que
explicitamente se esbocem nas relações pedagógicas cotidianas. Medidas que,
convém, sejam compartilhadas pelos sistemas de ensino, estabelecimentos,
processos de formação de professores, comunidade, professores, alunos e
seus pais.
Medidas que repudiam, como prevê a Constituição Federal em seu Art.3º, IV, o
“preconceito de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de
discriminação” e reconhecem que todos são portadores de singularidade
irredutível e que a formação escolar tem de estar atenta para o
desenvolvimento de suas personalidades (Art.208, IV).
Educação das relações étnico-raciais
O sucesso das políticas públicas de Estado, institucionais e pedagógicas,
visando a reparações, reconhecimento e valorização da identidade, da cultura
e da história dos negros brasileiros depende necessariamente de condições
físicas, materiais, intelectuais e afetivas favoráveis para o ensino e para
aprendizagens; em outras palavras, todos os alunos negros e não negros, bem
como seus professores, precisam sentir-se valorizados e apoiados. Depende
também, de maneira decisiva, da reeducação das relações entre negros e
brancos, o que aqui estamos designando como relações étnico-raciais.
Depende, ainda, de trabalho conjunto, de articulação entre processos
educativos escolares, políticas públicas, movimentos sociais, visto que as
mudanças éticas, culturais, pedagógicas e políticas nas relações étnico-raciais
não se limitam à escola.
175
É importante destacar que se entende por raça a construção social forjada nas
tensas relações entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como
harmoniosas, nada tendo a ver com o conceito biológico de raça cunhado no
século XVIII e hoje sobejamente superado. Cabe esclarecer que o termo raça é
utilizado com frequência nas relações sociais brasileiras, para informar como
determinadas características físicas, como cor de pele, tipo de cabelo, entre
outras, influenciam, interferem e até mesmo determinam o destino e o lugar
social dos sujeitos no interior da sociedade brasileira.
Contudo, o termo foi ressignificado pelo Movimento Negro que, em várias
situações, o utiliza com um sentido político e de valorização do legado deixado
pelos africanos. É importante, também, explicar que o emprego do termo
étnico, na expressão étnico-racial, serve para marcar que essas relações
tensas devidas a diferenças na cor da pele e traços fisionômicos o são também
devido à raiz cultural plantada na ancestralidade africana, que difere em visão
de mundo, valores e princípios das de origem indígena, europeia e asiática.
Convivem, no Brasil, de maneira tensa, a cultura e o padrão estético negro e
africano e um padrão estético e cultural branco europeu. Porém, a presença da
cultura negra e o fato de 45% da população brasileira ser composta de negros
(de acordo com o censo do IBGE) não têm sido suficientes para eliminar
ideologias, desigualdades e estereótipos racistas. Ainda persiste em nosso
país um imaginário étnico-racial que privilegia a brancura e valoriza
principalmente as raízes europeias da sua cultura, ignorando ou pouco
valorizando as outras, que são a indígena, a africana, a asiática.
Os diferentes grupos, em sua diversidade, que constituem o Movimento Negro
brasileiro, têm comprovado o quanto é dura a experiência dos negros de ter
julgados negativamente seu comportamento, ideias e intenções antes mesmo
de abrirem a boca ou tomarem qualquer iniciativa. Têm, eles, insistido no
quanto é alienante a experiência de fingir ser o que não é para ser
reconhecido, de quão dolorosa pode ser a experiência de deixar-se assimilar
por uma visão de mundo que pretende impor-se como superior e, por isso,
universal e que os obriga a negarem a tradição do seu povo.
Se não é fácil ser descendente de seres humanos escravizados e forçados à
condição de objetos utilitários ou a semoventes, também é difícil descobrir-se
176
descendente dos escravizadores, temer, embora veladamente, revanche dos
que, por cinco séculos, têm sido desprezados e massacrados.
Para reeducar as relações étnico-raciais, no Brasil, é necessário fazer emergir
as dores e medos que têm sido gerados. É preciso entender que o sucesso de
uns tem o preço da marginalização e da desigualdade impostas a outros. E
então decidir que sociedade queremos construir daqui para frente.
Como bem salientou Frantz Fanon14, os descendentes dos mercadores de
escravos, dos senhores de ontem, não têm, hoje, de assumir culpa pelas
desumanidades provocadas por seus antepassados. No entanto, têm eles a
responsabilidade moral e política de combater o racismo, as discriminações e,
juntamente com os que vêm sendo mantidos à margem, os negros, construir
relações raciais e sociais sadias, em que todos cresçam e se realizem
enquanto seres humanos e cidadãos. Não fossem por estas razões, eles a
teriam de assumir, pelo fato de usufruírem do muito que o trabalho escravo
possibilitou ao país.
Assim sendo, a educação das relações étnico-raciais impõe aprendizagens
entre brancos e negros, trocas de conhecimentos, quebra de desconfianças,
projeto conjunto para construção de uma sociedade justa, igual, equânime.
Combater o racismo, trabalhar pelo fim da desigualdade social e racial,
empreender reeducação das relações étnico-raciais não são tarefas exclusivas
da escola. As formas de discriminação de qualquer natureza não têm o seu
nascedouro na escola, porém o racismo, as desigualdades e discriminações
correntes na sociedade perpassam por ali. Para que as instituições de ensino
desempenhem a contento o papel de educar, é necessário que se constituam
em espaço democrático de produção e divulgação de conhecimentos e de
posturas que visam a uma sociedade justa. A escola tem papel preponderante
para eliminação das discriminações e para emancipação dos grupos
discriminados, ao proporcionar acesso aos conhecimentos científicos, a
registros culturais diferenciados, à conquista de racionalidade que rege as
relações sociais e raciais, a conhecimentos avançados, indispensáveis para
consolidação e concerto das nações como espaços democráticos e igualitários.
14
FRANTZ, Fanon. Os Condenados da Terra. 2.ed. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira,
1979.
177
Para obter êxito, a escola e seus professores não podem improvisar. Têm que
desfazer
mentalidade
racista
e
discriminadora
secular,
superando
o
etnocentrismo europeu, reestruturando relações étnico-raciais e sociais,
desalienando processos pedagógicos. Isto não pode ficar reduzido a palavras e
a raciocínios desvinculados da experiência de ser inferiorizados vivida pelos
negros, tampouco das baixas classificações que lhe são atribuídas nas escalas
de desigualdades sociais, econômicas, educativas e políticas.
Diálogo com estudiosos que analisam, criticam estas realidades e fazem
propostas, bem como com grupos do Movimento Negro, presentes nas
diferentes regiões e estados, assim como em inúmeras cidades, são
imprescindíveis para que se vençam discrepâncias entre o que se sabe e a
realidade, se compreendam concepções e ações, uns dos outros, se elabore
projeto comum de combate ao racismo e a discriminações.
Temos, pois, pedagogias de combate ao racismo e a discriminações por criar.
É claro que há experiências de professores e de algumas escolas, ainda
isoladas, que muito vão ajudar.
Para empreender a construção dessas pedagogias, é fundamental que se
desfaçam alguns equívocos. Um deles diz respeito à preocupação de
professores no sentido de designar ou não seus alunos negros como negros ou
como pretos, sem ofensas.
Em primeiro lugar, é importante esclarecer que ser negro no Brasil não se limita
às características físicas. Trata-se, também, de uma escolha política. Por isso,
o é quem assim se define. Em segundo lugar, cabe lembrar que preto é um dos
quesitos utilizados pelo IBGE para classificar, ao lado dos outros – branco,
pardo, indígena – a cor da população brasileira.
Pesquisadores de diferentes áreas, inclusive da educação, para fins de seus
estudos, agregam dados relativos a pretos e pardos sob a categoria negros, já
que ambos reúnem, conforme alerta o Movimento Negro, aqueles que
reconhecem sua ascendência africana.
É importante tomar conhecimento da complexidade que envolve o processo de
construção da identidade negra em nosso país. Processo esse, marcado por
uma sociedade que, para discriminar os negros, utiliza-se tanto da
desvalorização da cultura de matriz africana como dos aspectos físicos
178
herdados pelos descendentes de africanos. Nesse processo complexo, é
possível, no Brasil, que algumas pessoas de tez clara e traços físicos
europeus, em virtude de o pai ou a mãe ser negro(a), se designarem negros;
que outros, com traços físicos africanos, se digam brancos. É preciso lembrar
que o termo negro começou a ser usado pelos senhores para designar
pejorativamente os escravizados e este sentido negativo da palavra se estende
até hoje. Contudo, o Movimento Negro ressignificou esse termo dando-lhe um
sentido político e positivo. Lembremos os motes muito utilizados no final dos
anos 1970 e no decorrer dos anos 1980, 1990: Negro é lindo! Negra, cor da
raça brasileira! Negro que te quero negro! 100% Negro! Não deixe sua cor
passar em branco! Este último utilizado na campanha do censo de 1990.
Outro equívoco a enfrentar é a afirmação de que os negros se discriminam
entre si e que são racistas também. Esta constatação tem de ser analisada no
quadro da ideologia do branqueamento que divulga a ideia e o sentimento de
que as pessoas brancas seriam mais humanas, teriam inteligência superior e,
por isso, teriam o direito de comandar e de dizer o que é bom para todos. Cabe
lembrar que, no pós-abolição, foram formuladas políticas que visavam ao
branqueamento da população pela eliminação simbólica e material da presença
dos negros. Nesse sentido, é possível que pessoas negras sejam influenciadas
pela ideologia do branqueamento e, assim, tendam a reproduzir o preconceito
do qual são vítimas. O racismo imprime marcas negativas na subjetividade dos
negros e também na dos que os discriminam.
Mais um equívoco a superar é a crença de que a discussão sobre a questão
racial se limita ao Movimento Negro e a estudiosos do tema e não à escola. A
escola, enquanto instituição social responsável por assegurar o direito da
educação a todo e qualquer cidadão, deverá se posicionar politicamente, como
já vimos, contra toda e qualquer forma de discriminação. A luta pela superação
do racismo e da discriminação racial é, pois, tarefa de todo e qualquer
educador, independentemente do seu pertencimento étnico-racial, crença
religiosa ou posição política. O racismo, segundo o Artigo 5º da Constituição
Brasileira, é crime inafiançável e isso se aplica a todos os cidadãos e
instituições, inclusive, à escola.
179
Outro equívoco a esclarecer é de que o racismo, o mito da democracia racial e
a ideologia do branqueamento só atingem os negros. Enquanto processos
estruturantes e constituintes da formação histórica e social brasileira, estes
estão arraigados no imaginário social e atingem negros, brancos e outros
grupos étnico-raciais. As formas, os níveis e os resultados desses processos
incidem de maneira diferente sobre os diversos sujeitos e interpõem diferentes
dificuldades nas suas trajetórias de vida escolar e social. Por isso, a construção
de estratégias educacionais que visem ao combate do racismo é uma tarefa de
todos os educadores, independentemente do seu pertencimento étnico-racial.
Pedagogias de combate ao racismo e a discriminações elaboradas com o
objetivo de educação das relações étnico/raciais positivas têm como objetivo
fortalecer entre os negros e despertar entre os brancos a consciência negra.
Entre os negros, poderão oferecer conhecimentos e segurança para
orgulharem-se da sua origem africana; para os brancos, poderão permitir que
identifiquem as influências, a contribuição, a participação e a importância da
história e da cultura dos negros no seu jeito de ser, viver, de se relacionar com
as outras pessoas, notadamente as negras. Também farão parte de um
processo de reconhecimento, por parte do Estado, da sociedade e da escola,
da dívida social que têm em relação ao segmento negro da população,
possibilitando uma tomada de posição explícita contra o racismo e a
discriminação racial e a construção de ações afirmativas nos diferentes níveis
de ensino da educação brasileira.
Tais pedagogias precisam estar atentas para que todos, negros e não negros,
além de ter acesso a conhecimentos básicos tidos como fundamentais para a
vida integrada à sociedade, exercício profissional competente, recebam
formação que os capacite para forjar novas relações étnico-raciais. Para tanto,
há necessidade, como já vimos, de professores qualificados para o ensino das
diferentes áreas de conhecimentos e, além disso, sensíveis e capazes de
direcionar
positivamente
as
relações
entre
pessoas
de
diferentes
pertencimentos étnico-racial, no sentido do respeito e da correção de posturas,
atitudes, palavras preconceituosas. Daí a necessidade de se insistir e investir
para que os professores, além de sólida formação na área específica de
atuação, recebam formação que os capacite não só a compreender a
importância das questões relacionadas à diversidade étnico-racial, mas a lidar
180
positivamente com elas e, sobretudo criar estratégias pedagógicas que possam
auxiliar a reeducá-las.
Até aqui apresentaram-se orientações que justificam e fundamentam as
determinações de caráter normativo que seguem.
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana – Determinações
A obrigatoriedade de inclusão de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
nos currículos da Educação Básica trata-se de decisão política, com fortes
repercussões pedagógicas, inclusive na formação de professores. Com esta
medida, reconhece-se que, além de garantir vagas para negros nos bancos
escolares, é preciso valorizar devidamente a história e cultura de seu povo,
buscando reparar danos, que se repetem há cinco séculos, à sua identidade e
a seus direitos. A relevância do estudo de temas decorrentes da história e
cultura afro-brasileira e africana não se restringe à população negra, ao
contrário, dizem respeito a todos os brasileiros, uma vez que devem educar-se
enquanto cidadãos atuantes no seio de uma sociedade multicultural e
pluriétnica, capazes de construir uma nação democrática.
É importante destacar que não se trata de mudar um foco etnocêntrico
marcadamente de raiz europeia por um africano, mas de ampliar o foco dos
currículos escolares para a diversidade cultural, racial, social e econômica
brasileira. Nesta perspectiva, cabe às escolas incluir no contexto dos estudos e
atividades, que proporciona diariamente, também as contribuições históricoculturais dos povos indígenas e dos descendentes de asiáticos, além das de
raiz africana e europeia. É preciso ter clareza que o Art. 26A acrescido à Lei
9.394/1996 provoca bem mais do que inclusão de novos conteúdos, exige que
se repensem relações étnico-raciais, sociais, pedagógicas, procedimentos de
ensino, condições oferecidas para aprendizagem, objetivos tácitos e explícitos
da educação oferecida pelas escolas.
A autonomia dos estabelecimentos de ensino para compor os projetos
pedagógicos, no cumprimento do exigido pelo Art. 26A da Lei 9394/1996,
permite que se valham da colaboração das comunidades a que a escola serve,
do apoio direto ou indireto de estudiosos e do Movimento Negro, com os quais
estabelecerão canais de comunicação, encontrarão formas próprias de incluir
181
nas vivências promovidas pela escola, inclusive em conteúdos de disciplinas,
as temáticas em questão. Caberá, aos sistemas de ensino, às mantenedoras, à
coordenação pedagógica dos estabelecimentos de ensino e aos professores,
com base neste parecer, estabelecer conteúdos de ensino, unidades de
estudos, projetos e programas, abrangendo os diferentes componentes
curriculares. Caberá, aos administradores dos sistemas de ensino e das
mantenedoras prover as escolas, seus professores e alunos de material
bibliográfico e de outros materiais didáticos, além de acompanhar os trabalhos
desenvolvidos, a fim de evitar que questões tão complexas, muito pouco
tratadas, tanto na formação inicial como continuada de professores, sejam
abordadas de maneira resumida, incompleta, com erros.
Em outras palavras, aos estabelecimentos de ensino está sendo atribuída
responsabilidade de acabar com o modo falso e reduzido de tratar a
contribuição dos africanos escravizados e de seus descendentes para a
construção da nação brasileira; de fiscalizar para que, no seu interior, os alunos
negros deixem de sofrer os primeiros e continuados atos de racismo de que
são
vítimas.
Sem
dúvida,
assumir
estas
responsabilidades
implica
compromisso com o entorno sociocultural da escola, da comunidade onde esta
se encontra e a que serve, compromisso com a formação de cidadãos atuantes
e democráticos, capazes de compreender as relações sociais e étnico-raciais
de que participam e ajudam a manter e/ou a reelaborar, capazes de decodificar
palavras, fatos e situações a partir de diferentes
perspectivas, de desempenhar-se em áreas de competências que lhes
permitam continuar e aprofundar estudos em diferentes níveis de formação.
Precisa, o Brasil, país multiétnico e pluricultural, de organizações escolares em
que todos se vejam incluídos, em que lhes seja garantido o direito de aprender
e de ampliar conhecimentos, sem ser obrigados a negar a si mesmos, ao grupo
étnico/racial a que pertencem e a adotar costumes, ideias e comportamentos
que lhes são adversos. E estes, certamente, serão indicadores da qualidade da
educação que estará sendo oferecida pelos estabelecimentos de ensino de
diferentes níveis.
Para conduzir suas ações, os sistemas de ensino, os estabelecimentos e os
professores terão como referência, entre outros pertinentes às bases filosóficas
e pedagógicas que assumem, os princípios a seguir explicitados.
182
CONSCIÊNCIA POLÍTICA E HISTÓRICA DA DIVERSIDADE
Este princípio deve conduzir:
−
à igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos;
−
à igualdade básica de pessoa humana como sujeito de direitos;
−
à compreensão de que a sociedade é formada por pessoas que pertencem
a grupos étnico-raciais distintos, que possuem cultura e história próprias,
igualmente valiosas e que em conjunto constroem, na nação brasileira, sua
história;
−
ao conhecimento e à valorização da história dos povos africanos e da
cultura afro-brasileira na construção histórica e cultural brasileira;
−
à superação da indiferença, injustiça e desqualificação com que os negros,
os povos indígenas e também as classes populares às quais os negros, no
geral, pertencem, são comumente tratados;
−
à desconstrução, por meio de questionamentos e análises críticas,
objetivando eliminar conceitos, ideias, comportamentos veiculados pela
ideologia do branqueamento, pelo mito da democracia racial, que tanto mal
fazem a negros e brancos;
−
à busca, da parte de pessoas, em particular de professores não
familiarizados com a análise das relações étnico-raciais e sociais com o
estudo de história e cultura afro-brasileira e africana, de informações e
subsídios que lhes permitam formular concepções não baseadas em
preconceitos e construir ações respeitosas;
−
ao diálogo, via fundamental para entendimento entre diferentes, com a
finalidade de negociações, tendo em vista objetivos comuns; visando a
uma sociedade justa.
FORTALECIMENTO DE IDENTIDADES E DE DIREITOS
O princípio deve orientar para:
−
o desencadeamento de processo de afirmação de identidades, de
historicidade negada ou distorcida;
−
o rompimento com imagens negativas forjadas por diferentes meios de
comunicação, contra os negros e os povos indígenas;
183
−
os esclarecimentos a respeito de equívocos quanto a uma identidade
humana universal;
−
o combate à privação e violação de direitos;
−
a ampliação do acesso a informações sobre a diversidade da nação
brasileira e sobre a recriação das identidades, provocada por relações
étnico-raciais;
−
as excelentes condições de formação e de instrução que precisam ser
oferecidas, nos diferentes níveis e modalidades de ensino, em todos os
estabelecimentos, inclusive os localizados nas chamadas periferias
urbanas e nas zonas rurais.
AÇÕES EDUCATIVAS DE COMBATE AO RACISMO E A DISCRIMINAÇÕES
O princípio encaminha para:
−
a conexão dos objetivos, estratégias de ensino e atividades com a
experiência de vida dos alunos e professores, valorizando aprendizagens
vinculadas às suas relações com pessoas negras, brancas, mestiças,
assim como as vinculadas às relações entre negros, indígenas e brancos
no conjunto da sociedade;
−
a crítica pelos coordenadores pedagógicos, orientadores educacionais,
professores, das representações dos negros e de outras minorias nos
textos, materiais didáticos, bem como providências para corrigi-las;
−
condições para professores e alunos pensarem, decidirem, agirem,
assumindo
enfrentando
responsabilidade
e
superando
por
relações
discordâncias,
étnico-raciais
conflitos,
positivas,
contestações,
valorizando os contrastes das diferenças;
−
valorização da oralidade, da corporeidade e da arte, por exemplo, como a
dança, marcas da cultura de raiz africana, ao lado da escrita e da leitura;
−
educação patrimonial, aprendizado a partir do patrimônio cultural afrobrasileiro, visando a preservá-lo e a difundi-lo;
−
o cuidado para que se dê um sentido construtivo à participação dos
diferentes grupos sociais, étnico-raciais na construção da nação brasileira,
aos elos culturais e históricos entre diferentes grupos étnico-raciais, às
alianças sociais;
184
−
participação de grupos do Movimento Negro, e de grupos culturais negros,
bem como da comunidade em que se insere a escola, sob a coordenação
dos professores, na elaboração de projetos político-pedagógicos que
contemplem a diversidade étnico-racial.
Estes princípios e seus desdobramentos mostram exigências de mudança de
mentalidade, de maneiras de pensar e agir dos indivíduos em particular, assim
como das instituições e de suas tradições culturais. É neste sentido que se
fazem as seguintes determinações:
−
O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, evitando-se
distorções, envolverá articulação entre passado, presente e futuro no
âmbito de experiências, construções e pensamentos produzidos em
diferentes circunstâncias e realidades do povo negro. É um meio
privilegiado para a educação das relações étnico-raciais e tem por objetivos
o reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afrobrasileiros, garantia de seus direitos de cidadãos, reconhecimento e igual
valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas,
europeias, asiáticas.
−
O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana se fará por
diferentes meios, em atividades curriculares ou não, em que: - se
explicitem, busquem compreender e interpretar, na perspectiva de quem o
formule, diferentes formas de expressão e de organização de raciocínios e
pensamentos de raiz da cultura africana;
−
promovam-se oportunidades de diálogo em que se conheçam, se ponham
em comunicação diferentes sistemas simbólicos e estruturas conceituais,
bem como se busquem formas de convivência respeitosa, além da
construção de projeto de sociedade em que todos se sintam encorajados a
expor, defender sua especificidade étnico-racial e a buscar garantias para
que todos o façam;
−
sejam incentivadas atividades em que pessoas – estudantes, professores,
servidores, integrantes da comunidade externa aos estabelecimentos de
ensino;
185
–
de diferentes culturas interatuem e se interpretem reciprocamente,
respeitando os valores, visões de mundo, raciocínios e pensamentos de
cada um;
−
O ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, a educação das
relações étnico-raciais, tal como explicita o presente parecer, se
desenvolverão no cotidiano das escolas, nos diferentes níveis e
modalidades de ensino, como conteúdo de disciplinas,15 particularmente,
Educação Artística, Literatura e História do Brasil, sem prejuízo das
demais16, em atividades curriculares ou não, trabalhos em salas de aula,
nos laboratórios de ciências e de informática, na utilização de sala de
leitura, biblioteca, brinquedoteca, áreas de recreação, quadra de esportes e
outros ambientes escolares;
−
O ensino de História Afro-Brasileira abrangerá, entre outros conteúdos,
iniciativas e organizações negras, incluindo a história dos quilombos, a
começar pelo de Palmares, e de remanescentes de quilombos, que têm
contribuído para o desenvolvimento de comunidades, bairros, localidades,
municípios, regiões (exemplos: associações negras recreativas, culturais,
educativas, artísticas, de assistência, de pesquisa, irmandades religiosas,
grupos do Movimento Negro). Será dado destaque a acontecimentos e
realizações próprios de cada região e localidade;
−
Datas significativas para cada região e localidade serão devidamente
assinaladas. O 13 de maio, Dia Nacional de Denúncia contra o Racismo,
será tratado como o dia de denúncia das repercussões das políticas de
eliminação física e simbólica da população afro-brasileira no pós-abolição,
e de divulgação dos significados da Lei áurea para os negros. No 20 de
novembro será celebrado o Dia Nacional da Consciência Negra,
entendendo-se consciência negra nos termos explicitados anteriormente
neste parecer. Entre outras datas de significado histórico e político deverá
15
Os conteúdos referentes à História e Cultura Afro-Brasileira serão ministrados no âmbito de
todo o currículo escolar, em especial nas áreas de Educação Artística e de Literatura e História
Brasileiras.
16
Neste sentido, ver obra que pode ser solicitada ao MEC: MUNANGA, Kabengele, org.
Superando o Racismo na Escola. Brasília, Ministério da Educação, 2001.
186
ser assinalado o 21 de março, Dia Internacional de Luta pela Eliminação da
Discriminação Racial;
−
Em História da África, tratada em perspectiva positiva, não só de denúncia
da miséria e discriminações que atingem o continente, nos tópicos
pertinentes se fará articuladamente com a história dos afrodescendentes
no Brasil e serão abordados temas relativos: – ao papel dos anciãos e dos
griots como guardiãos da memória histórica; -à história da ancestralidade e
religiosidade africana; – aos núbios e aos egípcios, como civilizações que
contribuíram decisivamente para o desenvolvimento da humanidade; às
civilizações e organizações políticas pré-coloniais, como os reinos do Mali,
do Congo e do Zimbabwe; – ao tráfico e à escravidão do ponto de vista dos
escravizados; – ao papel de europeus, de asiáticos e também de africanos
no tráfico; - à ocupação colonial na perspectiva dos africanos; - às lutas
pela independência política dos países africanos; - às ações em prol da
união africana em nossos dias, bem como o papel da União Africana, para
tanto; - às relações entre as culturas e as histórias dos povos do continente
africano e os da diáspora; - à formação compulsória da diáspora, vida e
existência cultural e histórica dos africanos e seus descendentes fora da
África; - à diversidade da diáspora, hoje, nas Américas, Caribe, Europa,
Ásia; - aos acordos políticos, econômicos, educacionais e culturais entre
África, Brasil e outros países da diáspora.
−
O ensino de Cultura Afro-Brasileira destacará o jeito próprio de ser, viver e
pensar manifestado tanto no dia a dia, quanto em celebrações como
congadas, moçambiques, ensaios, maracatus, rodas de samba, entre
outras.
−
O ensino de Cultura Africana abrangerá: - as contribuições do Egito para a
ciência e filosofia ocidentais; - as universidades africanas Timbuktu, Gao,
Djene que floresciam no século XVI; - as tecnologias de agricultura, de
beneficiamento de cultivos, de mineração e de edificações trazidas pelos
escravizados, bem como a produção científica, artística (artes plásticas,
literatura, música, dança, teatro) política, na atualidade.
−
O ensino de História e de Cultura Afro-Brasileira, se fará por diferentes
meios, inclusive, a realização de projetos de diferentes naturezas, no
decorrer do ano letivo, com vistas à divulgação e estudo da participação
187
dos africanos e de seus descendentes em episódios da história do Brasil,
na construção econômica, social e cultural da nação, destacando-se a
atuação de negros em diferentes áreas do conhecimento, de atuação
profissional, de criação tecnológica e artística, de luta social (tais como:
Zumbi, Luiza Nahim, Aleijadinho, Padre Maurício, Luiz Gama, Cruz e
Souza, João Cândido, André Rebouças, Teodoro Sampaio, José Correia
Leite, Solano Trindade, Antonieta de Barros, Edison Carneiro, Lélia
Gonzáles, Beatriz Nascimento, Milton Santos, Guerreiro Ramos, Clóvis
Moura, Abdias do Nascimento, Henrique Antunes Cunha, Tereza Santos,
Emmanuel Araújo, Cuti, Alzira Rufino, Inaicyra Falcão dos Santos, entre
outros).
−
O ensino de História e Cultura Africana se fará por diferentes meios,
inclusive a realização de projetos de diferente natureza, no decorrer do ano
letivo, com vistas à divulgação e estudo da participação dos africanos e de
seus descendentes na diáspora, em episódios da história mundial, na
construção econômica, social e cultural das nações do continente africano
e da diáspora, destacando-se a atuação de negros em diferentes áreas do
conhecimento, de atuação profissional, de criação tecnológica e artística,
de luta social (entre outros: rainha Nzinga, Toussaint-L’Ouverture, Martin
Luther King, Malcom X, Marcus Garvey, Aimé Cesaire, Léopold Senghor,
Mariama Bâ, Amílcar Cabral, Cheik Anta Diop, Steve Biko, Nelson
Mandela, Aminata Traoré, Christiane Taubira).
Para tanto, os sistemas de ensino e os estabelecimentos de Educação Básica,
nos níveis de Educação Infantil, Educação Fundamental, Educação Média,
Educação de Jovens e Adultos, Educação Superior, precisarão providenciar:
−
Registro da história não contada dos negros brasileiros, tais como em
remanescentes de quilombos, comunidades e territórios negros urbanos e
rurais.
−
Apoio sistemático aos professores para elaboração de planos, projetos,
seleção de conteúdos e métodos de ensino, cujo foco seja História e
Cultura Afro-Brasileira e Africana e a Educação das Relações ÉtnicoRaciais.
188
−
Mapeamento e divulgação de experiências pedagógicas de escolas,
estabelecimentos de ensino superior, secretarias de educação, assim como
levantamento das principais dúvidas e dificuldades dos professores em
relação ao trabalho com a questão racial na escola e encaminhamento de
medidas para resolvê-las, feitos pela administração dos sistemas de ensino
e por Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros.
−
Articulação entre os sistemas de ensino, estabelecimentos de ensino
superior, centros de pesquisa, Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros,
escolas, comunidade e movimentos sociais, visando à formação de
professores para a diversidade étnico-racial.
−
Instalação, nos diferentes sistemas de ensino, de grupo de trabalho para
discutir e coordenar planejamento e execução da formação de professores
para atender ao disposto neste parecer quanto à Educação das Relações
Étnico-Raciais e ao determinado nos Art. 26 e 26A da Lei 9394/1996, com
o apoio do Sistema Nacional de Formação Continuada e Certificação de
Professores do MEC.
−
Introdução, nos cursos de formação de professores e de outros
profissionais da educação: de análises das relações sociais e raciais no
Brasil; de conceitos e de suas bases teóricas, tais como racismo,
discriminações, intolerância, preconceito, estereótipo, raça, etnia, cultura,
classe social, diversidade, diferença, multiculturalismo; de práticas
pedagógicas, de materiais e de textos didáticos, na perspectiva da
reeducação das relações étnico-raciais e do ensino e aprendizagem da
história e cultura dos afro-brasileiros e dos africanos.
−
Inclusão de discussão da questão racial como parte integrante da matriz
curricular, tanto dos cursos de licenciatura para Educação Infantil, os anos
iniciais e finais da Educação Fundamental, Educação Média, Educação de
Jovens e Adultos, como de processos de formação continuada de
professores, inclusive de docentes no Ensino Superior.
189
−
Inclusão, respeitada a autonomia dos estabelecimentos do Ensino
Superior, nos conteúdos de disciplinas e em atividades curriculares dos
cursos que ministra, de Educação das Relações Étnico-Raciais, de
conhecimentos de matriz africana e/ou que dizem respeito à população
negra. Por exemplo: em Medicina, entre outras questões, estudo da
anemia falciforme, da problemática da pressão alta; em Matemática,
contribuições de raiz africana, identificadas e descritas pela EtnoMatemática; em Filosofia, estudo da filosofia tradicional africana e de
contribuições de filósofos africanos e afrodescendentes da atualidade.
−
Inclusão de bibliografia relativa à história e cultura afro-brasileira e
africana às relações étnico-raciais, aos problemas desencadeados pelo
racismo e por outras discriminações, à pedagogia antirracista nos
programas de concursos públicos para admissão de professores.
−
Inclusão,
em
documentos
normativos
e
de
planejamento
dos
estabelecimentos de ensino de todos os níveis - estatutos, regimentos,
planos pedagógicos, planos de ensino; - de objetivos explícitos, assim
como de procedimentos para sua consecução, visando ao combate do
racismo, das discriminações, e ao reconhecimento, valorização e ao
respeito das histórias e culturas afro-brasileira e africana.
−
Previsão, nos fins, responsabilidades e tarefas dos conselhos escolares e
de outros órgãos colegiados, do exame e encaminhamento de solução
para situações de racismo e de discriminações, buscando-se criar
situações educativas em que as vítimas recebam apoio requerido para
superar o sofrimento e os agressores, orientação para que compreendam
a
dimensão
do
que
praticaram
e
ambos,
educação
para
o
reconhecimento, valorização e respeito mútuos.
−
Inclusão de personagens negros, assim como de outros grupos étnicoraciais, em cartazes e outras ilustrações sobre qualquer tema abordado
na escola, a não ser quando tratar de manifestações culturais próprias,
ainda que não exclusivas, de um determinado grupo étnico-racial.
190
−
Organização de centros de documentação, bibliotecas, midiotecas,
museus, exposições em que se divulguem valores, pensamentos, jeitos
de
ser
e
viver
dos
diferentes
grupos
étnico-raciais
brasileiros,
particularmente dos afrodescendentes.
−
Identificação, com o apoio dos Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, de
fontes de conhecimentos de origem africana, a fim de selecionarem-se
conteúdos e procedimentos de ensino e de aprendizagens;
−
Incentivo, pelos sistemas de ensino, a pesquisas sobre processos
educativos orientados por valores, visões de mundo, conhecimentos afrobrasileiros e indígenas, com o objetivo de ampliação e fortalecimento de
bases teóricas para a educação brasileira.
−
Identificação, coleta, compilação de informações sobre a população
negra, com vistas à formulação de políticas públicas de Estado,
comunitárias e institucionais.
−
Edição de livros e de materiais didáticos, para diferentes níveis e
modalidades de ensino, que atendam ao disposto neste parecer, em
cumprimento ao disposto no Art. 26A da LDB, e, para tanto, abordem a
pluralidade cultural e a diversidade étnico-racial da nação brasileira,
corrijam distorções e equívocos em obras já publicadas sobre a história, a
cultura, a identidade dos afrodescendentes, sob o incentivo e supervisão
dos programas de difusão de livros educacionais do MEC – Programa
Nacional do Livro Didático e Programa Nacional de Bibliotecas Escolares
(PNBE).
−
Divulgação, pelos sistemas de ensino e mantenedoras, com o apoio dos
Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, de uma bibliografia afro-brasileira e
de outros materiais como mapas da diáspora, da África, de quilombos
brasileiros, fotografias de territórios negros urbanos e rurais, reprodução
de obras de arte afro-brasileira e africana a serem distribuídos nas
191
escolas da rede, com vistas à formação de professores e alunos para o
combate à discriminação e ao racismo.
−
Oferta de Educação Fundamental em áreas de remanescentes de
quilombos, contando as escolas com professores e pessoal administrativo
que se disponham a conhecer física e culturalmente, a comunidade e a
formar-se para trabalhar com suas especificidades.
−
Garantia, pelos sistemas de ensino e entidades mantenedoras, de
condições humanas, materiais e financeiras para execução de projetos
com o objetivo de Educação das Relações Étnico-raciais e estudo de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, assim como organização de
serviços e atividades que controlem, avaliem e redimensionem sua
consecução, que exerçam fiscalização das políticas adotadas e
providenciem correção de distorções.
−
Realização, pelos sistemas de ensino federal, estadual e municipal, de
atividades periódicas, com a participação das redes das escolas públicas
e privadas, de exposição, avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades
do ensino e aprendizagem de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
e da Educação das Relações Étnico-Raciais; - assim como comunicação
detalhada dos resultados obtidos ao Ministério da Educação, à Secretaria
Especial de Promoção da Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de
Educação, e aos respectivos conselhos Estaduais e Municipais de
Educação, para que encaminhem providências, quando for o caso.
−
Adequação
dos
mecanismos
de
avaliação
das
condições
de
funcionamento dos estabelecimentos de ensino, tanto da educação
básica quanto superior, ao disposto neste Parecer; inclusive com a
inclusão nos formulários, preenchidos pelas comissões de avaliação, nos
itens relativos a currículo, atendimento aos alunos, projeto pedagógico,
plano institucional, de quesitos que contemplem as orientações e
exigências aqui formuladas.
192
−
Disponibilização deste parecer, na sua íntegra, para os professores de
todos os níveis de ensino, responsáveis pelo ensino de diferentes
disciplinas
e
atividades
educacionais,
assim
como
para
outros
profissionais interessados a fim de que possam estudar, interpretar as
orientações, enriquecer, executar as determinações aqui feitas e avaliar
seu próprio trabalho e resultados obtidos por seus alunos, considerando
princípios e critérios apontados.
Obrigatoriedade do Ensino de História e Cultura Afro-Brasileiras,
Educação das Relações Étnico-Raciais e os Conselhos de Educação
Diretrizes são dimensões normativas, reguladoras de caminhos, embora não
fechadas a que historicamente possam, a partir das determinações iniciais,
tomar novos rumos. Diretrizes não visam a desencadear ações uniformes,
todavia, objetivam oferecer referências e critérios para que se implantem
ações, as avaliem e reformulem no que e quando necessário.
Estas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, na
medida em que procedem de ditames constitucionais e de marcos legais
nacionais, na medida em que se referem ao resgate de uma comunidade que
povoou e construiu a nação brasileira, atingem o âmago do pacto federativo.
Nessa medida, cabe aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios aclimatar tais diretrizes, dentro do regime de
colaboração e da autonomia de entes federativos, a seus respectivos sistemas,
dando ênfase à importância de os planejamentos valorizarem, sem omitir
outras regiões, a participação dos afrodescendentes, do período escravista aos
nossos dias, na sociedade, economia, política, cultura da região e da
localidade; definindo medidas urgentes para formação de professores;
incentivando o desenvolvimento de pesquisas bem como envolvimento
comunitário.
A esses órgãos normativos cabe, pois, a tarefa de adequar o proposto neste
parecer à realidade de cada sistema de ensino. E, a partir daí, deverá ser
competência dos órgãos executores - administrações de cada sistema de
ensino, das escolas - definir estratégias que, quando postas em ação,
193
viabilizarão o cumprimento efetivo da Lei de Diretrizes e Bases que estabelece
a formação básica comum, o respeito aos valores culturais, como princípios
constitucionais da educação tanto quanto da dignidade da pessoa humana
(inciso III do art. 1), garantindo-se a promoção do bem de todos, sem
preconceitos (inciso IV do Art. 3) a prevalência dos direitos humanos (inciso II
do art. 4°) e repúdio ao racismo (inciso VIII do ar t.4°).
Cumprir a Lei é, pois, responsabilidade de todos e não apenas do professor em
sala de aula. Exige-se, assim, um comprometimento solidário dos vários elos
do sistema de ensino brasileiro, tendo-se como ponto de partida o presente
parecer, que junto com outras diretrizes e pareceres e resoluções, têm o papel
articulador e coordenador da organização da educação nacional.
II – VOTO DA COMISSÃO
Face ao exposto e diante de direitos desrespeitados, tais como:
•
o de não sofrer discriminações por ser descendente de africanos;
•
o de ter reconhecida a decisiva participação de seus antepassados e da
sua própria na construção da nação brasileira;
•
o de ter reconhecida sua cultura nas diferentes matrizes de raiz africana;
−
diante da exclusão secular da população negra dos bancos escolares,
notadamente em nossos dias, no ensino superior;
−
diante da necessidade de crianças, jovens e adultos estudantes sentiremse contemplados e respeitados, em suas peculiaridades, inclusive as
étnico-raciais, nos programas e projetos educacionais;
−
diante da importância de reeducação das relações étnico/raciais no Brasil;
−
diante da ignorância que diferentes grupos étnico-raciais têm uns dos
outros, bem como da necessidade de superar esta ignorância para que se
construa uma sociedade democrática;
−
diante, também, da violência explícita ou simbólica, gerada por toda sorte
de racismos e discriminações, que sofrem os negros descendentes de
africanos;
−
diante de humilhações e ultrajes sofridos por estudantes negros, em todos
os níveis de ensino, em consequência de posturas, atitudes, textos e
materiais de ensino com conteúdos racistas;
194
−
diante de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil em
convenções, entre outro os da Convenção da UNESCO, de 1960, relativo
ao combate ao racismo em todas as formas de ensino, bem como os da
Conferência Mundial de Combate ao Racismo, Discriminação Racial,
Xenofobia e Discriminações Correlatas, 2001;
−
diante da Constituição Federal de 1988, em seu Art. 3º, inciso IV, que
garante a promoção do bem de todos, sem preconceitos de origem, raça,
sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação; do inciso 42
do Artigo 5º que trata da prática do racismo como crime inafiançável e
imprescritível; do § 1º do Art. 215 que trata da proteção das manifestações
culturais;
−
diante do Decreto 1.904/1996, relativo ao Programa Nacional de Direitos
Humanas que assegura a presença histórica das lutas dos negros na
constituição do país; - diante do Decreto 4.228, de 13 de maio de 2002,
que institui, no âmbito da Administração Pública Federal, o Programa
Nacional de Ações Afirmativas; - diante das Leis 7.716/1999, 8.081/1990 e
9.459/1997 que regulam os crimes resultantes de preconceito de raça e de
cor e estabelecem as penas aplicáveis aos atos discriminatórios e
preconceituosos, entre outros, de raça, cor, religião, etnia ou procedência
nacional;
−
diante do inciso I da Lei 9.394/1996, relativo ao respeito à igualdade de
condições para o acesso e permanência na escola; diante dos Arts 26, 26
A e 79 B da Lei 9.394/1996, estes últimos introduzidos por força da Lei
10.639/2003, proponho ao Conselho Pleno:
a) instituir as Diretrizes explicitadas neste parecer e no projeto de Resolução
em anexo, para serem executadas pelos estabelecimentos de ensino de
diferentes níveis e modalidades, cabendo aos sistemas de ensino, no
âmbito de sua jurisdição, orientá-los, promover a formação dos professores
para o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, e para
Educação das Relações Ético-Raciais, assim como supervisionar o
cumprimento das diretrizes;
b)
recomendar que este Parecer seja amplamente divulgado, ficando
disponível no site do Conselho Nacional de Educação, para consulta dos
professores e de outros interessados.
195
Brasília-DF, 10 de março de 2004.
Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva – Relatora
Carlos Roberto Jamil Cury – Membro
Francisca Novantino Pinto de Ângelo – Membro
Marília Ancona-Lopez – Membro
III – DECISÃO DO CONSELHO PLENO
O Conselho Pleno aprova por unanimidade o voto da Relatora.
Sala das Sessões, 10 em março de 2004.
Conselheiro José Carlos Almeida da Silva – Presidente
CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO
PROJETO DE RESOLUÇÃO
Institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações ÉtnicoRaciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
O Presidente do Conselho Nacional de Educação, tendo em vista o disposto no
Art. 9º, do § 2º, alínea “C”, da Lei nº 9.131, de 25 de novembro de 1995, e com
fundamento no Parecer CNE/CP 003/2004, de 10 de março de 2004, peça
indispensável do conjunto das presentes Diretrizes Curriculares Nacionais,
homologado pelo Ministro da Educação em de 2004,
RESOLVE
Art. 1° - A presente Resolução institui Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura
Afro-Brasileira e Africana, a serem observadas pelas instituições de ensino de
Educação Básica, nos níveis de Educação Infantil, Ensino Fundamental,
Educação Média, Educação de Jovens e Adultos, bem como na Educação
Superior, em especial no que se refere à formação inicial e continuada de
professores, necessariamente quanto à Educação das Relações ÉtnicoRaciais; e por aquelas de Educação Básica, nos termos da Lei 9394/96,
196
reformulada por forma da Lei 10639/2003, no que diz respeito ao ensino
sistemático de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, em especial em
conteúdos de Educação Artística, Literatura e História do Brasil.
Art. 2° - As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africanas
se constituem de orientações, princípios e fundamentos para o planejamento,
execução e avaliação da Educação das Relações Étnico-Raciais e do Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana.
Art. 3° As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações
Étnico-Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana
têm por meta a educação de cidadãos atuantes no seio da sociedade brasileira
que é multicultural e pluriétnica, capazes de, por meio de relações étnicosociais positivas, construírem uma nação democrática.
§1° A Educação das Relações Étnico-Raciais tem por objetivo a divulgação e
produção de conhecimentos, bem como de atitudes, posturas e valores que
eduquem cidadãos quanto ao seu pertencimento étnico-racial – descendentes
de africanos, povos indígenas, descendentes de europeus, de asiáticos –
capazes de interagir e de negociar objetivos comuns que garantam, a todos, ter
igualmente respeitados seus direitos, valorizada sua identidade e assim
participem da consolidação da democracia brasileira.
§2º O Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana, meio privilegiado
para
a
educação
das
relações
étnico-raciais,
tem
por
objetivo
o
reconhecimento e valorização da identidade, história e cultura dos afrobrasileiros, garantia de seus direitos de cidadãos, reconhecimento e igual
valorização das raízes africanas da nação brasileira, ao lado das indígenas,
europeias, asiáticas.
Art. 4° Os conteúdos, competências, atitudes e valo res a serem aprendidos
com a Educação das Relações Étnico-Raciais e o estudo de História e Cultura
Afro-Brasileira, bem como de História e Cultura Africana, serão estabelecidos
pelos estabelecimentos de ensino e seus professores, com o apoio e
supervisão dos sistemas de ensino, entidades mantenedoras e coordenações
pedagógicas, atendidas as indicações, recomendações, diretrizes explicitadas
no Parecer CNE/CP 003/2004.
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Art. 5° Os sistemas e os estabelecimentos de ensino poderão estabelecer
canais de comunicação com grupos do Movimento Negro, grupos culturais
negros, instituições formadoras de professores, núcleos de estudos e
pesquisas, como os Núcleos de Estudos Afro-Brasileiros, com a finalidade de
buscar subsídios e trocar experiências para planos institucionais, planos
pedagógicos, planos e projetos de ensino.
Art. 6º Os sistemas de ensino e as entidades mantenedoras incentivarão e
criarão condições materiais e financeiras, assim como proverão as escolas,
seus professores e alunos de material bibliográfico e de outros materiais
didáticos necessários para a educação das Relações Étnico-Raciais e o Ensino
de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana; as coordenações pedagógicas
promoverão o aprofundamento de estudos, para que os professores concebam
e desenvolvam unidades de estudos, projetos e programas, abrangendo os
diferentes componentes curriculares.
Art. 7º As instituições de Ensino Superior, respeitada a autonomia que lhe é
devida, incluirão nos conteúdos de disciplinas e atividades curriculares dos
diferentes cursos que ministram, a Educação das Relações Étnico-Raciais,
bem como o tratamento de questões e temáticas que dizem respeito aos
afrodescendentes, nos termos explicitados no Parecer CNE/CP 003/2004.
Art. 8° Os sistemas de ensino tomarão providências para que seja respeitado o
direito de alunos afrodescendentes também frequentarem estabelecimentos de
ensino que contem com instalações e equipamentos sólidos, atualizados, com
professores competentes no domínio dos conteúdos de ensino, comprometidos
com a educação de negros e não negros, no sentido de que venham a
relacionar-se com respeito, sendo capazes de corrigir posturas, atitudes,
palavras que impliquem desrespeito e discriminação.
Art. 9° Nos fins, responsabilidades e tarefas dos ó rgãos colegiados dos
estabelecimentos de ensino, será previsto o exame e encaminhamento de
solução para situações de discriminação, buscando-se criar situações
educativas para o reconhecimento, valorização e respeito da diversidade.
§ Único: As situações de racismo serão tratadas como crimes imprescritíveis e
inafiançáveis, conforme prevê o Art. 5º, XLII da Constituição Federal de 1988.
Art. 10 Os estabelecimentos de ensino de diferentes níveis, com o apoio e
supervisão dos sistemas de ensino desenvolverão a Educação das Relações
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Étnico-Raciais e o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana,
obedecendo as diretrizes do Parecer CNE/CP 003/2004, o que será
considerado na avaliação de suas condições de funcionamento.
Art. 11 Os sistemas de ensino incentivarão pesquisas sobre processos
educativos orientados por valores, visões de mundo, conhecimentos afrobrasileiros, ao lado de pesquisas de mesma natureza junto aos povos
indígenas, com o objetivo de ampliação e fortalecimento de bases teóricas para
a educação brasileira.
Art. 12 Os sistemas de ensino orientarão e supervisionarão para que a edição
de livros e de outros materiais didáticos atenda ao disposto no Parecer
CNE/CP 003/2004, no comprimento da legislação em vigor.
Art. 13 Aos conselhos de Educação dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios caberá aclimatar as Diretrizes Curriculares Nacionais instituídas por
esta Resolução, dentro do regime de colaboração e da autonomia de entes
federativos e seus respectivos sistemas.
Art. 14 Os sistemas de ensino promoverão junto com ampla divulgação do
Parecer CNE/CP 003/2004 e dessa Resolução, atividades periódicas, com a
participação das redes das escolas públicas e privadas, de exposição,
avaliação e divulgação dos êxitos e dificuldades do ensino e aprendizagens de
História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e da Educação das Relações
Étnico-Raciais; assim como comunicarão, de forma detalhada, os resultados
obtidos ao Ministério da Educação, à Secretaria Especial de Promoção da
Igualdade Racial, ao Conselho Nacional de Educação e aos respectivos
Conselhos Estaduais e Municipais de Educação, para que encaminhem
providências, que forem requeridas.
Art. 15 Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação, revogadas as
disposições em contrário.
Brasília (DF), 10 de março de 2004.
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Anexo H
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FRANCISCO, Alda Maria Silva. AS PRÁTICAS DE GESTÃO E DE