UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA GUILHERME EMÍLIO SCHUCK A SUSTENTABILIDADE NAS LICITAÇÕES EM FACE DO PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE Palhoça 2014 GUILHERME EMÍLIO SCHUCK A SUSTENTABILIDADE NAS LICITAÇÕES EM FACE DO PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso de Graduação em Direito da Universidade do Sul de Santa Catarina como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel. Orientador: Prof. Patrícia Oliveira França, Msc. Palhoça 2014 TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE A SUSTENTABILIDADE NAS LICITAÇÕES EM FACE DO PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte ideológico e referencial conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Sul de Santa Catarina, a Coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de todo e qualquer reflexo acerca deste Trabalho de Conclusão de Curso. Estou ciente de que poderei responder administrativa, civil e criminalmente em caso de plágio comprovado do trabalho monográfico. Palhoça, 5 de novembro de 2014. ____________________________________ GUILHERME EMÍLIO SCHUCK AGRADECIMENTOS Quero agradecer, em primeiro lugar, a Deus, que esteve do meu lado ao longo de toda a minha jornada. Aos professores, que me acompanharam durante a graduação, em especial, à Profa. Patrícia Oliveira França, que com muito louvor e paciência, contribuiu para a conclusão deste trabalho. Aos meus amados pais, Cezar e Ângela, que me motivaram e deram força para superar os desafios da vida. Deixo aqui minha gratidão por tudo que vocês fizeram por mim, pois, eu, mais do que ninguém, sei o quanto batalharam para patrocinar meus estudos. Ao meu filho, João Antônio, razão de eu lutar cada dia para me tornar um homem melhor. Peço desculpas ao meu “pequeno” pelos dias de ausência, assim como pelos momentos em que tive que abrir mão do futebol e do videogame para me dedicar à vida acadêmica. À minha namorada Manoella, que aturou meu “mau humor” durante a elaboração do presente trabalho, sempre pronunciando palavras motivadoras e sendo meu porto seguro. Aos meus colegas, amigos e familiares. Enfim, agradeço a todos que, de alguma forma, contribuíram para o meu aprendizado e construção deste trabalho. “Que os vossos esforços desafiem as impossibilidades, lembrai-vos de que as grandes coisas do homem foram conquistadas do que parecia impossível”. (Charles Chaplin) RESUMO A preocupação com o meio ambiente percorre os mais variados segmentos da sociedade, não se divergindo no âmbito do Poder Público. A forma de contratação do Estado, em regra licitação, ganha relevância no cenário atual, diante da considerável movimentação de recursos financeiros efetuada pela Administração. A Lei n. 8.666/93, que traz orientações gerais para a realização de certames licitatórios, sofreu importante mudança ocasionada pela Lei n. 12.349/10, dando nova redação ao artigo 3º da Lei de Licitações, passando a prever a necessidade dos processos licitatórios cumprirem seu papel no desenvolvimento nacional sustentável. No entanto, tal mandamento trouxe à tona a ideia de afronta ao princípio da economicidade, visto que as medidas ecológicas tornam-se mais caras do que as tradicionais. Todavia, conforme demonstrado, tanto a vantajosidade quanto a visão de economia futura descaracterizam a violação da economicidade e legitimam a atuação do Administrador no cumprimento da nova determinação legal. Destarte, a presente pesquisa tem por objetivo central verificar a viabilidade das licitações sustentáveis em face do princípio da economicidade. Busca-se, ademais, estudar o surgimento do Estado Constitucional e a sua influência no Direito Administrativo, discorrer sobre a importância do desenvolvimento sustentável no Brasil e a Implementação de políticas públicas, bem como estabelecer a ligação entre as licitações públicas e o desenvolvimento nacional sustentável. Este procedimento monográfico utiliza o método dedutivo, o procedimento monográfico e a técnica de pesquisa bibliográfica, baseados na legislação e doutrinas. Palavras-chave: Licitações sustentáveis. Desenvolvimento nacional sustentável. Lei n. 8666/93. Princípio da economicidade. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 09 2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E ESTADO CONSTITUCIONAL: CONTRATAÇÕES PÚBLICAS ................................................................................................................ 11 2.1 ESTADO CONSTITUCIONAL E INTERESSE PÚBLICO: NOÇÕES CONCEITUAIS E CRITÉRIOS PARA A SUA AFERIÇÃO E DELIMITAÇÃO ............ 11 2.2 A PRINCÍPIOLOGIA APLICÁVEL À ADMINISTRACÃO PÚBLICA ..................... 16 2.2.1 Princípio da Legalidade ................................................................................. 17 2.2.2 Princípio da Moralidade ................................................................................. 18 2.2.3 Princípio da Impessoalidade ou Finalidade ................................................. 18 2.2.4 Princípio da Publicidade ................................................................................ 19 2.2.5 Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade....................................... 20 2.2.6 Princípio da Eficiência ................................................................................... 21 2.2.7 Princípio da Segurança Jurídica ................................................................... 22 2.2.8 Princípio da Motivação .................................................................................. 23 2.2.9 Princípio da Autotutela .................................................................................. 24 2.2.10 Princípio da Continuidade do Serviço Público .......................................... 25 2.2.11 Princípio da Presunção de Legalidade ....................................................... 25 2.2.12 Princípio da Supremacia do Interesse Público .......................................... 26 2.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA SOBRE A FORMAÇÃO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS E O SEU REGIME NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ............................................................................................................. 27 3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL E A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................................................ 32 3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL......... 32 3.1.1 Delimitação histórica e conceitual de desenvolvimento sustentável ........ 33 3.1.2 Relatório Brundtland e a Agenda 21 ............................................................. 38 3.1.3 Sustentabilidade como Direito Fundamental ............................................... 41 3.2 CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICAS ............................................................. 43 3.3 LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS COMO INSTRUMENTO DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ORDEM ECONÔMICA ........................................................................ 46 4 LICITAÇÕES PÚBLICAS SUSTENTÁVEIS À LUZ DO PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE ................................................................................................... 52 4.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL: DOCUMENTOS LEGAIS 52 4.1.1 Política Nacional do Meio Ambiente – Lei 6.938/81 ..................................... 53 4.1.2 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – art. 225 ........... 56 4.2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AMBIENTAIS APLICÁVEIS ÀS LICITAÇÕES PÚBLICAS................................................................................................................. 60 4.3 CONCEITO DE LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS ................................................. 65 4.4 EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA MEDIDA PROVISÓRIA N. 495/2010 QUE DEU ORIGEM À LEI 12.349/2010 ..................................................................................... 69 4.5 O PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE NAS LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS ...... 71 5 CONCLUSÃO ........................................................................................................ 76 REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 78 9 1 INTRODUÇÃO O art. 37, XXI, da Constituição Federal determina, ressalvados os casos específicos, a necessidade de licitação quando da contratação de obras, bens, serviços e alienações. A regulamentação geral do Instituto das Licitações ficou a encargo da Lei n. 8.666/93, a qual norteia as etapas do certame. O mundo jurídico, a fim de moldar-se e atender da melhor forma possível os anseios da coletividade, convive com a necessidade de readequação da realidade, não sendo diferente nas licitações. Dessa forma, é importante mencionar a recente alteração no art. 3º da lei de licitações, direcionando as contratações públicas para a promoção do desenvolvimento nacional sustentável. A nova imposição legal vai ao encontro da evolução das políticas humanitárias que a sociedade está vivenciando, bem como à nova visão de desenvolvimento, que contempla outros aspectos, além do econômico. Em que pese essa modificação pareça simples, na prática a licitação sustentável se depara com alguns obstáculos, já que para alcançar seus objetivos de forma proba, os certames licitatórios precisam respeitar alguns princípios, como por exemplo o da economicidade. Face o exposto, a problematização desta pesquisa consiste em indagar-se: as licitações sustentáveis são viáveis em face do princípio da economicidade? As alternativas ecológicas custam mais caro do que as tradicionais. Contudo, conforme verifica-se nesta pesquisa, as licitações sustentáveis são perfeitamente possíveis e viáveis, quando analisadas em conjunto com o princípio da vantajosidade e à visão de economia futura. A motivação do autor se deu pelo fato de ser um surfista, amante da natureza, e entender que o Estado tem grande responsabilidade para com a preservação do meio ambiente. Destarte, registra-se como objetivo geral deste estudo verificar a viabilidade das licitações sustentáveis em face do princípio da economicidade. Já, os objetivos específicos, por seu turno, visam estudar o surgimento do Estado Constitucional e a sua influência no Direito Administrativo, discorrer sobre a importância do desenvolvimento sustentável no Brasil e a Implementação de políticas públicas, bem como estabelecer a ligação entre as licitações públicas e o desenvolvimento nacional sustentável. 10 O método de abordagem utilizado é o dedutivo, porquanto é com base na legislação existente, como regramento geral e, diante de um novo panorama voltado para a sustentabilidade, que surgirão os elementos para se alcançar os objetivos propostos. Com relação à natureza, é utilizado o método qualitativo, advindo dos conceitos e teorias dos autores pesquisados. O método de procedimento adotado é o monográfico. A técnica de pesquisa é a bibliográfica, baseada na legislação e doutrinas. O presente trabalho foi estruturado por cinco seções, sendo a primeira e a última, dedicadas à introdução e à conclusão, respectivamente. A segunda seção trata do surgimento do Estado Constitucional e sua influência no Direito Administrativo. Apresentam-se temas como noções introdutórias, conceituais e critérios para aferição e delimitação do interesse público, a principiologia aplicável à Administração Pública, bem como a evolução histórica dos contratos administrativos e seu regime no ordenamento jurídico brasileiro. A terceira seção aborda o desenvolvimento sustentável no Brasil e a implementação de políticas públicas. Logo, apresenta noções introdutórias ao desenvolvimento sustentável, conceitua políticas públicas e, ao final, instiga o leitor ao próximo capítulo, ao passo que traz a noção de licitação sustentável como instrumento de intervenção do Estado na ordem econômica. Por derradeiro, a quarta seção discorre sobre o tema principal: as licitações públicas sustentáveis à luz do princípio da economicidade. Para isso, examina os precursores legais do desenvolvimento sustentável no Brasil, os princípios do direito ambiental aplicáveis às licitações públicas, o conceito de licitações sustentáveis, a exposição de motivos da Medida Provisória nº 495/2010 que deu origem à Lei nº 12.349/2010, bem como o princípio da economicidade nas licitações sustentáveis. 11 2 ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA E ESTADO CONSTITUCIONAL: CONTRATAÇÕES PÚBLICAS “Que os vossos esforços desafiem as impossibilidades, lembrai-vos de que as grandes coisas do homem foram conquistadas do que parecia impossível”. Charles Chaplin O surgimento do Estado Constitucional foi uma conquista da população que não mediu esforços para pôr fim a um passado repleto de incertezas e falta de garantias. Por intermédio da evolução político/social é que se chegou à concepção de Estado Constitucional que temos hoje. Deste modo, o presente capítulo monográfico tem como objetivo central estudar o surgimento Estado Constitucional e sua influência no Direito Administrativo. Para tanto, a seguir, serão abordados assuntos como a evolução do Estado Constitucional, a busca pela efetivação do interesse público, princípios norteadores da Administração Pública, bem como a evolução histórica da formação dos Contratos Administrativos e seu regime no ordenamento jurídico brasileiro. 2.1 ESTADO CONSTITUCIONAL E INTERESSE PÚBLICO: NOÇÕES CONCEITUAIS E CRITÉRIOS PARA SUA AFERIÇÃO E DELIMITAÇÃO Diversas foram às transformações pelas quais o Estado brasileiro passou ao longo dos tempos. A concepção de Estado Constitucional que temos hoje foi fruto da evolução política e social do país. Com efeito, é possível afirmar que o Estado é “resultado de uma lenta e gradual evolução organizacional de poder, que não se confunde com as formas de agrupamentos antigas”.1 Segundo Pontes de Miranda, o Estado, tal como conhecemos atualmente, iniciou-se apenas no século XV. O mesmo doutrinador define o Estado Constitucional como: “[...] o conjunto de todas as relações entre os poderes públicos e os indivíduos, ou daqueles entre si”, ressaltando que “desde que cesse qualquer possibilidade de 1 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008, p. 3. 12 relações de tal espécie, o Estado desaparece. Desde que surja, o Estado nasce”.2 Para Alexandre de Moraes, são duas as qualidades do Estado Constitucional: Estado de Direito e Estado democrático. O Estado de Direito caracteriza-se por apresentar as seguintes premissas: (1) primazia da lei, (2) sistema hierárquico de normas que preserva a segurança jurídica e que se concretiza na diferente natureza das distintas normas e em seu correspondente âmbito de validade; (3) observância obrigatória da legalidade pela administração pública; (4) separação de poderes como garantia da liberdade ou controle de possíveis abusos; (5) reconhecimento de personalidade jurídica do Estado, que mantém relações jurídicas com os cidadãos; (6) reconhecimento e garantia dos direitos fundamentais incorporados à ordem constitucional; (7) em alguns casos, a existência de controle de constitucionalidade das leis como garantia ante o despotismo do Legislativo.3 O que deve ser observado é que “a evolução da instituição acabou culminando no surgimento do Estado de direito, noção que se baseia na regra de que, ao mesmo tempo em que o Estado cria o direito, deve sujeitar-se a ele”.4 Para Celso Antônio Bandeira de Mello é através da visão de Estado de Direito que “o Direito Administrativo nasce”. Diante dessa percepção é possível observar que é “o Direito que regula o comportamento da Administração”.5 Segundo Marçal Justen Filho, o Direito Administrativo é: O conjunto das normas jurídicas de direito público que disciplinam as atividades administrativas necessárias à realização dos direitos fundamentais e a organização e o funcionamento das estruturas estatais e não estatais encarregadas de seu desempenho.6 A figura do direito administrativo só passou a existir no Brasil em meados do século XX, pois, até então, as Constituições careciam de um capítulo que tratasse especificamente sobre a administração e seus servidores.7 Nesse sentido, aduz Odete Medauar: MIRANDA, Pontes, 1946 apud MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 3. 3 MORAES, Alexandre de. Direito constitucional. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2008. p. 4. 4 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direto administrativo. 24. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 2. 5 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 37. ed. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 47. 6 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 6. 7 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 50. 2 13 Com a expansão da atividade administrativa, sobretudo no âmbito social e econômico, registra-se a tendência paralela de inserção, nas Constituições, de preceitos que antes figuravam em leis sobre matéria administrativa. As Constituições contemporâneas demonstram a realização dessa tendência, pelo modo mais amplo e profundo com que se ocupam da Administração Pública. A Constituição brasileira de 1988 alinha-se a essa tendência. No Título III, denominado “Da organização do Estado”, traz o Capítulo VII, intitulado “Da administração pública”, com quatro seções, uma das quais dedicadas aos servidores públicos. 8 “Foi a Constituição Federal de 1988 que trouxe o início do processo de redemocratização do país”. Ocorreu no Brasil uma nova ordem constitucional “que tem como principal desafio a busca da adequação à realidade”.9 A nova Carta Magna, a doutrina e a jurisprudência, tiveram o papel de modificar um passado retrógrado, e criar esperança para uma população que estava farta de injustiças.10 Com o início do novo modelo constitucional, constataram-se problemas em função de sua interpretação, diante disso, surge, então, um novo modelo de hermenêutica que se diferencia do modelo de interpretação clássica.11 Para Barroso, “[...] a resposta para os problemas está integralmente no sistema jurídico e o intérprete desempenha uma função técnica de conhecimento, de formulação de juízos de fato”.12 Seguindo o pensamento de Barroso, é possível analisar que surge uma nova era para o Poder Judiciário, o qual passa a ter legitimidade para formular um juízo de interpretação, podendo reputar um fato como aplicação da Lei. Para o mesmo doutrinador, “[...] as normas são percebidas como regras, enunciados descritivos de condutas a serem seguidas, aplicáveis mediante subsunção”.13 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010. p. 50. 9 BARROSO, Luiz Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-9-MAR%C7O-2007LUIZ%20ROBERTO%20BARROSO.pdf>. Acesso em: 01 ago. 2014. 10 FRANÇA, Patrícia de Oliveira. Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 21. 11 FRANÇA, Patrícia de Oliveira. Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 22. 12 BARROSO, Luiz Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-9-MAR%C7O-2007LUIZ%20ROBERTO%20BARROSO.pdf>. Acesso em: 01 ago. 2014. 13 BARROSO, Luiz Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do direito. Disponível em: <http://www.direitodoestado.com/revista/RERE-9-MAR%C7O-2007LUIZ%20ROBERTO%20BARROSO.pdf>. Acesso em: 01 ago. 2014. 8 14 O surgimento do Estado Constitucional, em que pese tenha se deparado com extrema resistência, contribuiu para evolução do direito no País, pois trouxe uma característica mais contemporânea para a legislação nacional e acompanhou a tendência Europeia. Além disso, foi mediante o nascimento do Estado Constitucional que passou a existir no Brasil a figura do Direito Administrativo.14 Tendo em vista a evolução que o País estava vivendo, o Estado passou a objetivar a limitação pelo Direito, direcionando-a para a busca da efetivação do interesse público.15 Para uma reflexão acerca do “interesse público”, necessário se faz observar o conceito elaborado por Breus para o tema em debate: Tendo por base os debates político, jurídico e social, busca-se a delimitação do que seja “interesse público”, por meio do estudo do Direito Administrativo moderno, que encontrou sua força estruturante e legitimadora na proteção aos direitos individuais frente ao Estado, em razão da aplicação do princípio de legalidade. Além disso, o Estado visa a empreender a busca por satisfação das necessidades e dos interesses coletivos, que autorizariam, inclusive, a outorga à Administração Pública, de prerrogativas e privilégios próprios.16 Em observação ao conceito acima exposto, é possível visualizar, inicialmente, a dificuldade de limitar o alcance do interesse público, “parte por tratarse da legitimidade dos direitos fundamentais, parte por estar ligado ao interesse coletivo”.17 Embora inexista consonância acerca da definição de interesse público, citada expressão “está ligada diretamente ao interesse da sociedade, por tratar-se de um direito indisponível que deve ser colocado em supremacia face ao interesse do particular”.18 Na lição de Breus, “interesse público é mais abrangente do que direitos fundamentais, não devendo ser restringindo a eles, pois, pode-se perder o seu sentido 14 FRANÇA, Patrícia de Oliveira. Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 22. 15 FRANÇA, Patrícia de Oliveira. Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 22. 16 BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no estado constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela administração pública brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 105. 17 FRANÇA, Patrícia de Oliveira. Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 22. 18 FRANÇA, Patrícia de Oliveira. Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 23. 15 plural, coletivo, que engloba os direitos fundamentais sociais”.19 Outra constatação importante é que não se pode confundir interesse público com interesse do aparato estatal, pois o Estado deve ter como norte garantir a uniformização e a continuação das políticas públicas, não podendo confundir meras conveniências administrativas com o interesse da coletividade. Nesse sentido, explica Justen Filho que “O interesse público não consiste no interesse do aparato estatal. O Estado, como sujeito de direito, pode ter certas conveniências, de modo semelhante ao que ocorre com qualquer sujeito privado.”20 Superando-se a questão conceitual de “interesses públicos”, passa-se a verificar a sua aplicabilidade no Direito Administrativo. Foi pelo surgimento do Direito Administrativo que o poder Estatal passou a ser exercido por lei, assim como a ideia de que o interesse público atuaria como legitimador da atuação estatal, pois “[...] estaria realizando o interesse de todos os membros da sociedade, buscando o bem comum, que, nessa perspectiva, era compreendido sob a rubrica do interesse público”.21 Assim, dúvida não resta de que o surgimento do Direito Administrativo foi um marco para o surgimento da preocupação com interesse público, além de ser um limitador do exercício do Poder Estatal e garantidor dos Direitos Fundamentais. O sentido de interesse público serve também para formular diferenciação entre os direitos público e privado, estando o primeiro direcionado à proteção do direito público e o segundo ao regramento do direito privado. Por meio dessa diferenciação é que ocorreu o surgimento do Princípio da Supremacia do Interesse Público, o qual dispõe que o interesse público prevalece sobre o do particular, desenvolvendo-se, então, o direito público. Nesse sentido, reforça Justen Filho: A supremacia do interesse público significa sua superioridade sobre os demais interesses existentes em sociedade. Os interesses privados não podem prevalecer sobre o interesse público. A indisponibilidade indica a impossibilidade de sacrifício ou transigência quanto ao interesse público, e é BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no estado constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela administração pública brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 287. 20 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 66. 21 BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no estado constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela administração pública brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 114. 19 16 uma decorrência de sua supremacia.22 O Princípio da Supremacia do Interesse Público é um dos norteadores da administração pública. No ponto de vista legal, ele funciona no sentido de restringir ou prever sanções para as atividades sociais ou coletivas. No entanto, o princípio supracitado será mais bem aprofundado no item “2” deste capítulo. O interesse público no âmbito legal ou judicial tem o enfoque de fazer com que o interesse coletivo prevaleça sobre o do particular, surgindo, então, “[...] medidas restritivas e sancionatórias das atividades pessoais ou coletivas”.23 Por todo o exposto, é possível concluir que com o surgimento do Estado Constitucional passou a existir a figura do Direito Administrativo, oportunidade em que o Estado passa a ser o responsável por resguardar o interesse público e pela gestão da sociedade, pois é o detentor da função administrativa. 2.2 A PRINCÍPIOLOGIA APLICÁVEL À ADMINISTRACÃO PÚBLICA Inicialmente, para que se compreenda o conceito de Princípios da Administração Pública, é necessária uma breve definição sobre Princípios, pois estes estão presentes em todo o ordenamento jurídico e servem como forma de basear e nortear o direito. Nesse sentido, Miguel Reale define que: Princípios são, pois verdades ou juízos fundamentais, que servem de alicerce ou de garantia de certeza a um conjunto de juízos, ordenados em um sistema de conceitos relativos à dada porção da realidade. Às vezes também se denominam princípios certas proposições, que apesar de não serem evidentes ou resultantes de evidências, são assumidas como fundantes da validez de um sistema particular de conhecimentos, como seus pressupostos necessários.24 JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito daministrativo. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 59. BREUS, Thiago Lima. Políticas públicas no estado constitucional: problemática da concretização dos direitos fundamentais pela administração pública brasileira contemporânea. Belo Horizonte: Fórum, 2007. p. 131. 24 REALE, Miguel. Filosofia do Direito. 11. ed. São Paulo: Saraiva. 1986. p. 60. 22 23 17 Consoante o acima exposto, observa-se que princípios são a fonte basal de todas as ciências, não se divergindo no direito e, consequentemente, no Direito Administrativo, já que os quais servem de alicerce.25 Destaca-se que tendo em vista a divergência na doutrina acerca do tema, o autor, irá fundamentar seus estudos, com base na lição de Meirelles, e utilizará, de forma complementar, outros doutrinadores do Direito Administrativo. 2.2.1 Princípio da Legalidade O princípio da legalidade está fundamentado no art. 5º, II, da Constituição Federal. De acordo com tal princípio “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. 26 Por sua vez, Hely Lopes Meirelles define: A legalidade, como princípio de administração significa que o administrador público está, em toda sua atividade funcional, sujeito aos mandamentos da lei, e as exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.27 Mediante o princípio em comento é que se cria a definição de que os atos da administração pública estão restritos ao que está previsto em Lei. O conceito que se cria é de que “na administração pública não há liberdade nem vontade pessoal. Enquanto na administração particular é lícito fazer tudo o que lei não proíbe, na administração pública, só é possível fazer o que a lei autoriza”.28 Face o exposto é possível concluir que em função da legalidade, o agente público torna-se um “refém” da lei, estando restrito ao que nela estiver determinado. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao. htm>. Acesso em: 13 maio 2014. 26 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao. htm>. Acesso em: 13 maio 2014. 27 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 89. 28 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 89. 25 18 2.2.2 Princípio da Moralidade A moralidade é definida no art. 37, caput da CF/88, e dispõe que “nem tudo que é legal é honesto”.29 Nos termos da moralidade, é preciso entender que “o agente administrativo, como ser humano dotado da capacidade de autuar, deve, necessariamente, distinguir o bem do mal, o honesto do desonesto”. 30 Hely Lopes Meirelles conceitua: A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput). Não se trata - diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito – da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como “o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da administração.31 Nessa linha de raciocínio, conclui-se por princípio da moralidade aquele que decide que todo e qualquer ato da administração pública deve preocupar-se com os padrões éticos e morais presentes na sociedade. Para que isso ocorra, há de se distinguir o certo e do errado, o honesto do desonesto, sempre focando em não causar prejuízos para outrem. 2.2.3 Princípio da Impessoalidade ou Finalidade O princípio da impessoalidade ou finalidade está presente no art. 37, caput, da Constituição Federal. Agir de forma impessoal significa ter como norte o interesse público. Qualquer ato que vise à promoção pessoal do agente que o pratica, sujeitar-se-á à invalidação. Meirelles discorre sobre o assunto: O princípio da impessoalidade, referido na Constituição de 1988 (art. 37 caput) nada mais é que o clássico princípio da finalidade, o qual impõe ao administrador público que só pratique um ato para o seu fim legal. E o fim BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 13 maio 2014. 30 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 90. 31 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 90. 29 19 legal é unicamente aquele que a norma de Direito indica expressa ou virtualmente como objetivo do ato, de forma impessoal.”32 A impessoalidade do agente é apresentada de forma inequívoca no §1º, art. 37 da Constituição Federal: Art. 37, §1º: A publicidade dos atos, programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem a promoção pessoal de autoridades ou servidores públicos.33 Portanto, conforme Diploma Legal acima citado, fica em evidência a necessidade de que a prática do ato administrativo atinja somente o fim a ele previsto. Por outro lado, a doutrina menciona a hipótese do interesse público coincidir com o de particulares, situação que ocorre normalmente nos atos administrativos negociais e nos contratos públicos. Nessa hipótese, “é lícito conjugar a pretensão do particular com o interesse público”34. Sendo assim, o que o princípio em apreço veda é a prática do ato que não vise interesse ao público ou conveniência para a administração, todavia, existindo interesse mútuo entre público e particular, sem que haja favoritismo, não há que se falar em desvio de finalidade. 2.2.4 Princípio da Publicidade O princípio em epígrafe tem por norte assegurar a transparência na gestão pública, exigindo ampla divulgação dos atos praticados pela administração, possibilitando, então, o seu controle e conhecimento pelos interessados em geral. Não há validade do ato enquanto não houver sua publicidade. Hely Lopes Meirelles discorre sobre o assunto: O princípio da publicidade dos atos administrativos, além de assegurar os efeitos externos, visa a propiciar seu conhecimento e controle pelos interessados diretos e pelo povo em geral [...], e, para tanto, a mesma MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 93. 33 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 13 maio 2014. 34 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 93. 32 20 Constituição impõe o fornecimento de certidões de atos da Administração, requeridas por qualquer pessoa, para defesa de direitos ou esclarecimento de situações (art. 5º, XXXIV, “b”), os quais devem ser indicados no requerimento.35 A publicidade como princípio encontra previsão legal no caput do art. 37 da Constituição Federal. Para Meirelles, referido princípio “abrange toda a atuação estatal, não só sob o aspecto de divulgação oficial de seus atos, como também, de propiciação de conhecimento da conduta interna de seus agentes”.36 Cabe aqui ressaltar que ao passo que a Constituição Federal confirma a publicidade, ela também a restringe. Seguindo esse pensamento, Meirelles afirma que “sob pena de lesar os princípios da impessoalidade, finalidade e moralidade, a publicidade não poderá caracterizar promoção pessoal do agente público (CF, art. 37,§1º)”.37 O papel da publicidade enquanto princípio é exigir ampla divulgação dos atos praticados pela Administração Pública, no sentido de levar conhecimento para particulares, e de possibilitar uma eventual fiscalização pelos mesmos. Por outro lado, é inequívoco que nenhum agente público poderá se beneficiar do dispositivo legal, e utilizar-se da publicidade para promoção pessoal. 2.2.5 Princípios da Razoabilidade e Proporcionalidade Diferentemente dos princípios anteriormente abordados, que estavam previstos de forma taxativa na Constituição Federal, o princípio da razoabilidade e proporcionalidade está implícito no Texto Constitucional de 1988. Seguindo essa esteira de raciocínio, Suzana de Toledo afirma que “o princípio da proporcionalidade é concretizado diretamente da essência dos direitos fundamentais e a ausência de cláusula sobre o conteúdo essencial dos direitos fundamentais em nossa Constituição não obsta o seu conhecimento”.38 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 96. 36 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 97. 37 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 98. 38 BARROS, Suzana de Toledo. O princípio da proporcionalidade e o controle de constitucionalidade das leis restritivas de direitos fundamentais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2000. p. 102. 35 21 Para que se entenda os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, obrigatório se faz observar o conceito de Meirelles para o tema em comento. Sem dúvida pode ser chamado de princípio da proibição de excesso, que, em última análise, objetiva aferir a compatibilidade entre os meios e os fins, de modo a evitar restrições desnecessárias ou abusivas por parte da Administração Pública, com lesão aos direitos fundamentais. Como se percebe, parece que a razoabilidade envolve a proporcionalidade, e viceversa. 39 Nesse diapasão, observando-se a excelente definição de Meirelles, é possível perceber que a razoabilidade e a proporcionalidade “trabalham juntas”, ou seja, estão ligadas uma à outra. A conduta da Administração Pública deve atentar-se para que exista uma adequação entre “os meios e os fins”, de modo que os direitos fundamentais sejam resguardados. Importante ressaltar que é inegável que a aplicação da razoabilidade e proporcionalidade está presente com maior incidência na discricionariedade administrativa, “servindo-lhe de instrumento de limitação, ampliando o âmbito de seu controle, especialmente pelo Judiciário ou até mesmo pelos Tribunais de Contas”.40 Assim, a preocupação do legislador foi em conter a discricionariedade dotada pelo administrador público, de modo que este não haja de forma excessiva e que acabe por perder a razão de ser, da norma que o apoiou. 2.2.6 Princípio da Eficiência Agir de forma eficiente é uma obrigação da Administração Pública e de seus agentes, inexistindo dúvidas de que sua atuação não deve ser burocrática, de forma que prejudique a perfeição no seu rendimento funcional. Para Hely Lopes Meirelles, eficiência: É o mais moderno princípio da função administrativa, que já não se contenta em ser desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e de seus membros.41 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 94. 40 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 94. 41 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 98. 39 22 “A Emenda Constitucional nº 19, de 4-6-98, inseriu o princípio da eficiência entre os princípios constitucionais da Administração Pública, previstos no art. 37, caput. A Lei nº 9.784 também fez referência a ele no art. 2º, caput”.42 Para Odete Medauar “eficiência é o princípio que norteia toda a atuação da Administração Pública. O vocábulo liga-se à ideia de ação, para produzir resultado rápido e preciso”.43 Pelo exposto, conclui-se que a eficiência nada mais é do que a busca pela qualidade, pela presteza e rendimento funcional, levando-se em consideração os critérios morais e legais necessários, garantindo à sociedade que a atuação administrativa irá utilizar da melhor forma possível os recursos públicos visando evitar desperdícios. 2.2.7 Princípio da Segurança Jurídica O princípio da segurança jurídica impede que haja desconstituição de atos ou situações jurídicas sem prévia justificação, tendo em vista a repercussão social gerada no momento de vigência. Para Hely Lopes Meirelles, segurança jurídica é: O princípio da segurança jurídica é considerado como uma das vigas mestras da ordem jurídica, sendo, segundo J.J Gomes Canotilho, um dos subprincípios básicos do próprio conceito do Estado de Diteiro. Para Almiro do Couto e Silva, um “dos temas mais fascinantes do Direito Público neste século é o crescimento da importância do princípio da segurança jurídica, entendido como princípio da boa-fé dos administrados ou da proteção da confiança. A ele está visceralmente ligada a exigência de maior estabilidade das situações jurídicas, mesmo daquelas que na origem apresentavam vícios de legalidade”. [...]”44 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 83. MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 141. 44 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros. 2008. p. 99. 42 43 23 O art. 53, da Lei 9.784/99 dispõe que “a administração deve anular seus próprios atos, quando eivados de vício de legalidade, e pode revogá-los por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos”. 45 Entretanto, em função do princípio da segurança jurídica é possível que “[...] no cotejo de dois subprincípios do Estado de Direito, o da legalidade e o da segurança jurídica, este último prevaleça sobre o outro, como imposição da justiça material”.46 Seguindo a linha de raciocínio supra, é imprescindível que o Judiciário respeite situações que foram consolidadas pelo tempo, não podendo ficar alheio ao fato de que os administrados estavam amparados pela boa-fé. Diante disso, é possível que, havendo vício de legalidade em ato administrativo, o interesse público sobressaia, deixando de ser necessário o restabelecimento da legalidade, visto que poderia causar um mal maior do que a preservação do status quo. Tal situação poderá ocorrer em função do Princípio da Segurança Jurídica. 2.2.8 Princípio da Motivação Mediante o princípio supracitado, a Administração Pública tem o dever de indicar os fundamentos de fato e de direito que a levou tomar determinada decisão. A falta de motivação leva à invalidação e à ilegitimidade do ato.47 Para Hely Lopes Meirelles “no direito público o que há de menos relevante é a vontade do administrador”.48 Ainda, o mesmo doutrinador afirma que “a motivação, portanto, deve apontar a causa e os elementos determinantes da prática do ato administrativo, bem como o dispositivo legal em que se funda”. 49 BRASIL. Lei 9.784/1999, de 29 de janeiro de 1999. Regula o processo administrativo no âmbito da Administração Pública Federal. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm>. Acesso em: 09 maio 2014. 46 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 100. 47 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 100. 48 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 101. 49 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 101. 45 24 Há quem defenda que os atos discricionários devam ser motivados; no entanto, o autor da presente monografia acompanha o raciocínio de Meirelles que defende a desnecessidade de motivação do ato em referida situação. Para o autor acima citado, “[...] Claro está que em certos atos administrativos oriundos do poder discricionário a justificação será dispensável, bastando evidenciar a competência para o exercício desse poder e a conformação do ato com o interesse público”.50 Por fim, entende-se por motivação que a administração tem a obrigação de motivar todo e qualquer ato que edita, pois atua no interesse do coletivo. O fato dos agentes públicos exercerem suas funções visando ao interesse público faz com que seja necessária a motivação dos seus atos, no sentido de se comprovar que a sua atuação está amparada por Lei. 2.2.9 Princípio da Autotutela Conforme o presente princípio a Administração Pública poderá exercer o controle de legalidade dos atos por ela praticados. Para Odete Medauar: Em virtude desse princípio, a Administração deve zelar pela legalidade de seus atos e condutas e pela adequação dos mesmos ao interesse público. Se a Administração verificar que atos e medidas contem ilegalidades, poderá anulá-los por si própria: se concluir no sentido da inoportunidade ou inconveniência, poderá revogá-los.51 Na mesma linha de raciocínio supra, Maria Sylvia Zanella Di Pietro defende que “pela autotutela a administração exerce o controle dos próprios atos, com a possibilidade de anular os ilegais e revogar os inconvenientes ou inoportunos, independente de recurso ao Poder Judiciário”.52 Por fim, conclui-se que a Administração Pública exerce o controle e a fiscalização de seus atos, podendo anulá-los em virtude de vício de legalidade. Por MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 101 e 102. 51 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2013. p. 144. 52 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 73. 50 25 outro lado, caso seja verificada a inoportunidade ou inconveniência dos atos administrativos, a Administração poderá revogá-los. 2.2.10 Princípio da Continuidade do Serviço Público “Por esse princípio, entende-se que o serviço público, sendo a forma pela qual o Estado desempenha funções essenciais ou necessárias à coletividade, não pode parar”.53 Sendo assim, conclui-se que, em função das atividades exercidas pela Administração Pública estarem voltadas ao atendimento da coletividade, é essencial que o funcionamento da “máquina pública” seja ininterrupto. 2.2.11 Princípio da Presunção de Legalidade Em função do princípio em discussão é que se presume que os atos praticados pela Administração Pública são legítimos. [...] a presunção de legalidade, abrange dois aspectos: de um lado, a presunção de verdade, que diz respeito à certeza dos fatos; de outro, a presunção da legalidade, pois, se a Administração Pública se submete à Lei, presume-se, até prova em contrário, que todos os seus atos sejam verdadeiros e praticados com observância das normas legais pertinentes. 54 Todavia, a presunção não é absoluta, ou seja, “trata-se de presunção relativa (juris tantum) que, como tal, admite prova em contrário. O efeito de tal presunção é inverter o ônus da prova.” 55 Portanto, a conclusão que se tira, observando-se os conceitos trazidos, é de que as decisões da Administração possuem presunção de veracidade, ou seja, estão em conformidade com a Lei. No entanto, tal prerrogativa não é absoluta, pois, caberá a quem alegar a ilegalidade do ato administrativo o ônus da prova. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 74. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 72. 55 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 72. 53 54 26 2.2.12 Princípio da Supremacia do Interesse Público Entende-se pela supremacia do interesse público que sempre que o interesse da coletividade coincidir com o do particular, aquele irá prevalecer sobre este. A previsão legal do referido princípio é encontrada de forma expressa no art. 2º, caput, da Lei 9.784/99, e especificado no inciso II, do parágrafo único do mesmo artigo.56 Celso Antônio Bandeira de Mello discorre sobre o assunto: O princípio da supremacia do interesse público sobre o interesse privado é princípio geral de Direito inerente a qualquer sociedade. É a própria condição de sua existência. Assim, não se radica em dispositivo específico algum da Constituição, ainda que inúmeros aludam ou impliquem manifestações concretas dele, como, por exemplo, os princípios da função social da propriedade, da defesa do consumidor ou do meio ambiente (art. 170, III, V e VI), ou tantos outros. Afinal, o princípio em causa é um pressuposto lógico do convívio social.57 Com efeito, foi por meio do conceito de interesse público que “o Direito deixou de ser apenas instrumento de garantia dos direitos sociais do indivíduo e passou a ser visto como meio para consecução da justiça social, do bem-estar coletivo.”58 Ante o exposto, observa-se que a supremacia do interesse público é motivo de desigualdade jurídica entre administração e administrados. Seguindo tal concepção, é possível que o Estado efetue a desapropriação de um bem do particular objetivando o interesse coletivo. Cabe ao Estado, por intermédio da administração, garantir o bem-estar social e tomar providências que sejam relevantes para o interesse público. Concluído o estudo sobre a principiologia aplicada à Administração Pública, a seguir será estudada a evolução histórica dos contratos administrativos e seu regime jurídico. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 70 e 71. 57 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 24. ed. São Paulo: Malheiros, 2007. p. 93. 58 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p.105. 56 27 2.3 EVOLUÇÃO HISTÓRICA SOBRE A ADMINISTRATIVOS E O SEU FORMAÇÃO REGIME NO DOS CONTRATOS ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO Na Idade Média, em função de o povo ser pouco evoluído, os contratos não eram vistos como algo essencial. No ponto de vista do sistema econômico arcaico, sua utilização era tida como algo recriminado.59 Por outro lado, com a evolução dos tempos e a ascensão do capitalismo, “a figura contratual passa a ter caráter objetivamente essencial ao funcionamento do sistema econômico”.60 A origem dos contratos ocorreu na França, como reflexo do amadurecimento da Revolução Francesa, época em que a burguesia promoveu a ascensão do capitalismo. Foi mediante o Código de Napoleão que se inaugura a época da “primazia contratual”, período em que a relação entre as partes pôde ser perfectibilizada de forma livre e voluntária, levando-se em consideração a igualdade e a liberdade dos contratantes.61 Reforçando o acima exposto, Enzo Roppo aduz que: Não se pode certamente atribuir-se ao mero acaso o fato de as primeiras elaborações da moderna teoria do contrato, devidas aos jusnaturalistas do século XVII e em particular ao holandês Grotius, terem lugar numa época e numa área geográfica que coincidem com a do capitalismo nascente; assim como não é por acaso que a primeira grande sistematização legislativa do direito dos contratos (código civil francês, Code Napoleon, de 1804) é substancialmente coeva do amadurecimento da Revolução Francesa, e portanto, da vitória histórica conseguida pela burguesia, à qual o advento do capitalismo facultou funções de direção e domínio de toda a sociedade.62 Com a evolução dos tempos, foi-se observando que a parte economicamente mais forte sempre se encontrava em situação mais benéfica do que 59 PALERMO, Fernanda Kellner de Oliveira. Escorço do contrato administrativo. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/contrato.pdf >. Acesso em: 14 maio 2014. 60 PALERMO, Fernanda Kellner de Oliveira. Escorço do contrato administrativo. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/contrato.pdf >. Acesso em: 14 maio 2014. 61 PALERMO, Fernanda Kellner de Oliveira. Escorço do contrato administrativo. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/contrato.pdf >. Acesso em: 14 maio 2014. 62 ROPPO, Enzo. O contrato. Trad. Ana Coimbra e M. Januário C. Gomes. Coimbra: Almedina,1988. p.25-26 apud PALERMO, Fernanda Kellner de Oliveira. Escorço do contrato administrativo. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/contrato.pdf >. Acesso em: 14 maio 2014. 28 a parte economicamente mais fraca, ocorrendo um desnível cada vez maior entre as ambas.63 No intuito de dar equidade entre os contratantes, o Estado, por intermédio do Juiz Administrador, passou a intervir na relação contratual “como se fosse parte interessada, retirando do contrato seus traços de privatismo e colocando-o sob o império do Direito Público”. Essa fase foi denominada como “dirigismo contratual”, momento em que ocorreu a publicização do contrato e desapareceu a autonomia de vontade das partes.64 Na Europa, sobretudo na Itália e Alemanha, houve resistência à figura do contrato administrativo, pelo fato de que algumas correntes defendiam que o princípio que deveria vigorar nos contratos era o de igualdade entre as partes. Todavia, nem mesmo a pressão e resistência de certos países impediram a evolução do Direito Público à época, mais especificamente, no tocante aos contratos administrativos. Nessa senda, “a teoria do contrato administrativo teve seus elementos fundamentais elaborados nas decisões do Conselho de Estado francês e acabou por firmar-se”.65 O Brasil passou a ter as contratações públicas regulamentadas pela Lei n. 8.666/93 de 21 de junho de 1993, também conhecida como Lei de Licitações e Contratos Administrativos, e suas alterações (Leis n. 8.883/94, 9.032/95 9.648/98 e 9.854/99). Com efeito, foi por meio dos contratos administrativos que a Administração pôde formalizar compromissos com terceiros, sejam eles fornecedores, prestadores de serviços, permissionários ou concessionários, tendo como foco o contínuo funcionamento dos serviços públicos. No Estado brasileiro, os contratos celebrados pela Administração Pública ocorrem de forma subsidiária ao Direito Civil apenas no que se refere aos princípios contratuais. Este raciocínio é extraído da doutrina de Romeu Felipe Bacellar Filho que baseia seu entendimento na previsão legal contida no art. 22, inciso XXVII, da PALERMO, Fernanda Kellner de Oliveira. Escorço do contrato administrativo. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/contrato.pdf >. Acesso em: 14 maio 2014. 64 PALERMO, Fernanda Kellner de Oliveira. Escorço do contrato administrativo. Disponível em: <http://sisnet.aduaneiras.com.br/lex/doutrinas/arquivos/contrato.pdf >. Acesso em: 14 maio 2014. 65 MEDAUAR, Odete. Direito administrativo moderno. 16. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012. p. 235. 63 29 Constituição Federal que concede privativamente à União legislar sobre normas gerais de licitação e contratação.66 Para Maria Zanella Sylvia Di Pietro, há controvérsias entre os doutrinadores a respeito dos contratos administrativos, havendo pelo menos três correntes que discorrem sobre o tema em comento: 1. A que nega a existência de contrato administrativo; 2. A que, em sentido diametralmente oposto, acha que todos os contratos celebrados pela Administração são contratos administrativos; 3. A que aceita a existência dos contratos administrativos, como espécie do gênero contrato, com regime de direito público, derrogatório e exorbitante do direito comum .67 Em breve síntese, a primeira corrente defende a existência de uma desigualdade do contrato administrativo com o contrato em si, “pois no contrato administrativo não são observados o princípio da igualdade entre as partes, a autonomia da vontade e a força obrigatória das convenções”. Já, a segunda corrente, aponta que todo contrato que envolve a Administração Pública é contrato administrativo, “pois em todas as celebrações contratuais que a Administração Pública se envolve, esta é sempre resguardada pela literalidade da legislação do regime jurídico administrativo, observando-se a competência, forma, procedimento, finalidade”. Já, a terceira corrente, que é a majoritária no regime jurídico brasileiro, “concorda com a existência do contrato administrativo, porém este tem características próprias que fazem uma imensa distinção dos contatos do direito privado”.68 Celso Antônio Bandeira de Mello, ao conceituar contrato administrativo, afirma que este é o “ajuste que a Administração Pública, agindo nessa qualidade, firma com o particular ou outra entidade administrativa para a consecução de objetivos de interesse público, nas condições estabelecidas pela própria Administração”. 69 Outra definição importante para Contratos Administrativos pode ser encontrada no art. 2º, da Lei. 8.666/93, a ver: BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Contrato Administrativo. In BACELLAR FILHO, Romeu Felipe; MOTTA, Paulo Roberto Fereira; CASTRO, Rodrigo Pironi Aguirre de (Org.). Direito Administrativo Contemporâneo: estudos em memória ao Professor Manoel de Oliveira Francisco Sobrinho. Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 314. 67 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 14. ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 239. 68 FREIRE, Antônio Rodrigo Cândido. Contratos administrativos. Disponível em: <http://www.jurisway.org.br/v2/dhall.asp?id_dh=7193>. Acesso em: 19 maio 2014. 69 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 214. 66 30 Artigo 2º: Para os fins desta Lei, considera-se contrato todo e qualquer ajuste entre órgãos ou entidades da Administração Pública e particulares, em que haja um acordo de vontades para formação de vínculo e a estipulação de obrigações recíprocas, seja qual for a denominação utilizada.70 Sobre as características dos Contratos Administrativos pode-se observar que este é formal, oneroso, cumulativo e intuitu personae. Para Hely Lopes Meirelles, a formalidade se dá “[...] porque se expressa por escrito e com requisitos especiais”; a onerosidade ocorre “[...] porque remunerado na forma convencionada”; já, a cumulatividade “[...] porque estabelece compensações recíprocas e equivalentes para as partes”; e por fim, intuitu personae “[...] porque deve ser executado pelo próprio contratado, vedadas, em princípio, a sua substituição por outrem ou a transferência de ajuste”.71 No que se refere ao regime jurídico dos contratos administrativos, segundo Di Pietro, é possível observar que o regime jurídico administrativo caracteriza-se por prerrogativas e sujeições. “As prerrogativas conferem à Administração Pública a supremacia sobre o particular. Já, as sujeições, são os limites os quais a Administração deve respeitar para garantir a finalidade pública”.72 O regime jurídico dos contratos administrativos está delineado no art. 58 da Lei nº 8.666/93. Aludido artigo estabelece: Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a eles, a prerrogativa de: I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades de interesse público, respeitados os direitos do contratado; II - rescindi-los, unilateralmente, nos casos especificados no inciso I do art. 79 desta Lei; III - fiscalizar-lhes a execução; IV - aplicar sanções motivadas pela inexecução total ou parcial do ajuste; V - nos casos de serviços essenciais, ocupar provisoriamente bens móveis, imóveis, pessoal e serviços vinculados ao objeto do contrato, na hipótese da necessidade de acautelar apuração administrativa de faltas contratuais pelo contratado, bem como na hipótese de rescisão do contrato administrativo. 73 70 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 19 maio 2014. 71 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 34. ed. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 122. 72 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 264. 73 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 19 maio 2014. 31 “Esses incisos são as chamadas, pela doutrina, cláusulas exorbitantes. Por elas, chega-se à distinção entre o contrato administrativo e o contrato de direito privado”.74 De acordo com doutrina determinante, os contratos administrativos detêm “cláusulas exorbitantes”, que de acordo com a opinião de Di Pietro “seriam ilícitas em contratos celebrados entre particulares, por conferir privilégios a uma das partes (a Administração) em relação à outra". Tal análise se dá pelo fato de que a Administração detém de prerrogativas para proteger o interesse público.75 Todavia, não é possível tratar essa exorbitância do contrato administrativo de maneira absoluta, pois, segundo Estorninho, “hoje não se pode mais considerar as prerrogativas da Administração Pública no contrato administrativo como caracterizadoras de uma natureza jurídica ou de um conteúdo totalmente incompatíveis com o direito privado”.76 Corroborando com a afirmação da supracitada autora, e observando a dificuldade de defender que os contratos administrativos possuem exorbitância, Celso Antônio Bandeira de Mello aduz que “o chamado contrato administrativo, de modo algum, configura relação em que assistem vantagens e poderes apenas para uma das partes”, pois, “se assim fora, como é curial, jamais o Poder Público encontraria quem com ele travasse tais avenças".77 Por fim, observa-se que a exorbitância do contrato administrativo não suporta a evolução do direito contratual contemporâneo. Existe compatibilidade entre contrato público e privado, de modo que a Administração não encontre dificuldade em contratar com particulares e o interesse público seja resguardado. O próximo capítulo monográfico, terá como foco o estudo do desenvolvimento sustentável no Brasil e a implementação de políticas públicas. GASPARINI, Diógenes. Direito administrativo. 17. ed. Atualizada por Fabrício Motta. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 772. 75 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 272. 76 ESTORNINHO, Maria João. Réquiem pelo contrato administrativo (Reimpressão). Coimbra: Almedina, 2003. p. 332. 77 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 17. ed. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 221. 74 32 3 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL E A IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS Acompanhando a evolução desordenada da sociedade, é possível observar o quanto o crescimento da indústria, das cidades e da população tem causado danos significativos ao meio ambiente. O desenvolvimento é necessário, todavia, diante das modificações climáticas e dos transtornos causados ao solo, ar e água, etc., é possível observar a preocupação do homem contemporâneo para com a sustentabilidade. A Constituição Federal de 1988 assegurou maior participação democrática da sociedade civil, bem como, enfatizou a necessidade de políticas públicas de proteção e preservação ambiental e, elencou, inclusive, um rol taxativo de direitos fundamentais, dentre eles, o direito ao meio ambiente. Nesse contexto, o presente capítulo irá discorrer sobre a importância do desenvolvimento sustentável no Brasil e a Implementação de políticas públicas, demonstrando que ambos foram inseridos a partir do Texto Constitucional vigente e são de extrema relevância, do ponto de vista social. 3.1 NOÇÕES INTRODUTÓRIAS AO DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL Desde a sua essência, os seres humanos causam prejuízos à natureza, sejam eles de maior ou menor intensidade, o que traz consequências negativas para o planeta, do ponto de vista sustentável. A justificativa para tal atitude é a busca pela sobrevivência, pois da natureza extraem-se alimentos, matérias-primas, água e etc. Todavia, juntamente com o progresso no conceito de desenvolvimento, a sociedade passou a visualizar a sustentabilidade como forma de garantir às próximas gerações as mesmas condições naturais presentes na atualidade. A evolução sobre a temática teve seu marco inicial em meados da década de 70, em especial, no ano de 1972, ano em que foi realizada a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano. Dessa feita, o objetivo da presente seção será discorrer acerca da introdução do desenvolvimento sustentável ao ordenamento jurídico internacional e nacional. Para tanto, a seguir, serão abordados temas como a delimitação histórica e 33 conceitual do desenvolvimento sustentável, a sustentabilidade como direito fundamental, bem como, o relatório de Brundtland e a Agenda 21. 3.1.1 Delimitação histórica e conceitual de desenvolvimento sustentável Dá analise perfunctória do planeta Terra, é possível observar que as condições do meio ambiente não são as melhores. É perceptível, no entanto, que ao longo dos anos, o tema sustentabilidade passou a ser alvo de preocupação pelo mundo inteiro, visando-se à preservação dos recursos naturais e à minimização de impactos ambientais irreversíveis. Atualmente, segundo Barral, tem-se o pensamento de que o “esgotamento dos recursos naturais, com enfoque no processo de entropia global, pode ser definido como a tendência que o planeta tem de caminhar em direção a um contínuo processo de deterioração”. Ocorre, que tal concepção, é fruto da evolução jurídico/científica e não foi acolhida pela sociedade do dia para a noite. 78 Nesse sentido, observa-se que a noção de desenvolvimento que temos hoje diverge totalmente da que existia no passado, pois, antigamente, acreditava-se que crescimento econômico e sustentabilidade eram termos antagônicos.79 Segundo Luciane Martins de Araújo “em todo o contexto da história da humanidade havia uma prevalência dos interesses econômicos sobre os problemas ambientais”. Defendia-se que “o custo ambiental resultante da degradação ocorrida nesse processo produtivo seria neutralizado com o progresso das nações”.80 A visão de desenvolvimento predominante à época pode ser extraída do material de Furtado, o qual afirma que “o desenvolvimento é, basicamente, aumento do fluxo de renda real, isto é, incremento na quantidade de bens e serviços por unidade de tempo à disposição de determinada coletividade.”81 BARRAL, Welber; PIMENTEL, Luiz Otávio. Direito ambiental e desenvolvimento. Florianópolis: Fundação Boiteux, 2006. p. 13. 79 PÉRCIO, Gabriela Verona. Contratações sustentáveis – considerações sobre políticas públicas, governança ambiental e a nova Lei nº 12.349/10. Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (LIC), Curitiba: Zênite, n. 219. p. 504. 80 ARAÚJO, Luciane Martins de. Energias Renováveis em busca da Sustentabilidade. In OLIVEIRA, Carina Costa de; SAMPAIO, Rômulo Silveira da Rocha (Org.). A economia do verde no contexto do desenvolvimento sustentável: a governança dos atores públicos e privados. Rio de Janeiro: FGV, Direito Rio, 2011. 81 FURTADO, Celso. Desenvolvimento e subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Fundo de Cultura, 1961. p. 115. 78 34 Por sorte, o crescimento da indústria e dos padrões de consumo fez com que o homem refletisse sobre o padrão de vida em sociedade e, consequentemente, chegasse a um novo e mais moderno conceito de desenvolvimento. 82 A definição para desenvolvimento é encontrada na Resolução n. 41/128 da ONU (Organização das Nações Unidas) e traduzida por Paulo Affonso Leme Machado:83 Um processo global, econômico, social, cultural e político que visa a melhorar continuamente o bem-estar do conjunto da população de todos os indivíduos, embasado em suas participações ativa, livre e significativa no desenvolvimento e na partilha equitativa das vantagens que daí decorrem.84 Vasconcellos também discorre sobre o assunto e acrescenta que: O desenvolvimento, em qualquer concepção, deve resultar do crescimento econômico acompanhado da melhoria da qualidade de vida, ou seja, deve incluir as alterações da composição dos produtos e a alocação de recursos pelos diferentes setores da economia, de forma a melhorar os indicadores de bem estar econômico e social (pobreza, desemprego, desigualdade, condições de saúde, alimentação, educação e moradia).85 Portanto, em face aos conceitos acima expostos, conclui-se que fundamentalmente o desenvolvimento está ligado ao crescimento econômico, conforme se defendia no passado. Ocorre, todavia, que referido critério não é absoluto. Ou seja, a ele devem ser acrescidos outros aspectos, tais como: cultura, política e, sobretudo, melhora na qualidade de vida. A preocupação do homem com a qualidade de vida fez com que o assunto sustentabilidade entrasse em pauta pelo mundo. Segundo Juarez de Freitas esta deve ser tratada como “prova emergencial da racionalidade dialógica, interdisciplinar, criativa, antecipatória, medidora de consequências e aberta”.86 82 OLIVEIRA, Gilson Batista: Uma discussão sobre o conceito de desenvolvimento. Disponível em: <http://www.unifae.br/publicacoes/pdf/revista_da_fae/v5_n2_maio_agosto_2002/uma%20discussao% 20sobre%20o%20conceito%20de%20desenvolvimento.pdf>. Acesso em: 14 ago. 2014. 83 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 72. 84 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 72. 85 VASCONCELOS, Marco Antônio; GARCIA, Manuel Enriquez. Fundamentos de economia. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 205. 86 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 29. 35 Para Édis Milaré, um ambiente sustentável é aquele em que a “coletividade busca ampliar, cada vez mais, sua capacidade de sustentação para suprir as necessidades de sua população e assegurar-lhe o bem estar”.87 Acerca da sustentabilidade Paulo Affonso Leme Machado aduz que: A noção de sustentabilidade funda-se em pelo menos dois critérios: primeiro, as ações humanas passam a ser analisadas quanto à incidência de seus efeitos diante do tempo cronológico, pois esses efeitos são estudados no presente e no futuro: segundo, ao se preocupar em fazer um prognóstico do futuro, haverá de ser pesquisado que efeitos continuarão e quais as consequências de sua duração.88 O mesmo autor menciona mais um elemento, que seria a equidade intergeracional. Ocorre que “essa noção só viria a compor o quadro dos elementos da sustentabilidade, quando juntássemos ao termo sustentabilidade o conteúdo ambiental, passando-se a um novo conceito - sustentabilidade ambiental”.89 Sendo assim, constata-se que, em se tratando de sustentabilidade, três elementos precisam ser considerados: “o tempo, a duração de efeitos e a consideração do estado do meio ambiente em relação ao presente e ao futuro”.90 A evolução dos pensamentos, à época, sobre os temas desenvolvimento e sustentabilidade fez com que, em 1972, em Estocolmo, Suécia, fosse realizada a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Ambiente Humano. Na oportunidade foram criados o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a Declaração sobre o Meio Ambiente Humano, os quais tratavam de princípios relativos ao meio ambiente, que a partir de então, deveriam ser respeitados. 91 Para Araújo, referida Conferência foi de extrema relevância para a evolução dos pensamentos socioambientais, pois: Ela é considerada um marco na história ambiental mundial ao trazer para a agenda internacional as discussões em torno do meio ambiente, mormente MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 76. 88 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 71. 89 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 71. 90 MACHADO, Paulo Affonso Leme: Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p.71. 91 ARAÚJO, Luciane Martins de. Energias Renováveis em busca da Sustentabilidade. In OLIVEIRA, Carina Costa de; SAMPAIO, Rômulo Silveira da Rocha (Org.). A economia do verde no contexto do desenvolvimento sustentável: a governança dos atores públicos e privados. Rio de Janeiro: FGV, Direito Rio, 2011. p. 214. 87 36 em função de que a degradação ambiental causada pelo ser humano ultrapassa as fronteiras dos países, os limites políticos, afetando regiões e populações em todos os cantos do mundo.92 Segundo Flávio Tayra, a década de 80 foi o marco dos primeiros atos sustentáveis. Referido período foi norteado por catástrofes que repercutiram por todo o mundo. Neste sentido: 93 Nessa década permeada por grandes catástrofes ambientais, desenvolviamse paralelamente os esforços conjuntos de organismos internacionais com o fito de estabelecer novos parâmetros globais em questões relacionados com o crescimento econômico e o meio ambiente. 94 O primeiro conceito de Desenvolvimento Sustentável surgiu de forma clara no ano de 1983, ano em que foi criada pela Assembleia Geral da ONU, a Comissão Mundial sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD). O relatório dessa Comissão, denominado “Nosso Futuro Comum” foi apresentado à Assembleia Geral das Nações Unidas em 1987. 95 “O desenvolvimento sustentável pretende satisfazer as necessidades do presente sem comprometer os recursos equivalentes de que farão uso no futuro outras gerações”. Esta foi a primeira definição de desenvolvimento sustentável, que foi divulgada como um “princípio diretor para o planejamento do desenvolvimento econômico pela WCED (World Commission on Environment and Development)”. 96 Para Paulo Affonso Leme de Machado, “desenvolvimento sustentável é uma locução verbal em que se ligam dois conceitos. O conceito de sustentabilidade passa a qualificar ou caracterizar o desenvolvimento”. 97 92 ARAÚJO, Luciane Martins de. Energias Renováveis em busca da Sustentabilidade. In OLIVEIRA, Carina Costa de; SAMPAIO, Rômulo Silveira da Rocha (Org.). A economia do verde no contexto do desenvolvimento sustentável: a governança dos atores públicos e privados. Rio de Janeiro: FGV, Direito Rio, 2011. p. 214. 93 TAYRA, Flávio. O conceito do desenvolvimento sustentável. Campina Grande–PB, Revista de economia e desenvolvimento sustentável, 2007. Disponível em: <http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:B5fUl5UN8xoJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em: 18 jul. 2014. 94 TAYRA, Flávio. O conceito do desenvolvimento sustentável. Campina Grande–PB, Revista de economia e desenvolvimento sustentável, 2007. Disponível em: <http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:B5fUl5UN8xoJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em: 18 jul. 2014. 95 TAYRA, Flávio. O conceito do desenvolvimento sustentável. Campina Grande–PB, Revista de economia e desenvolvimento sustentável, 2007. Disponível em: <http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:B5fUl5UN8xoJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em: 18 jul. 2014. 96 DERANI, Cristiane. Direito ambiental econômico. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 111. 97 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. 37 Édis Milaré define o desenvolvimento sustentável como “aquele que atende as necessidades do presente sem comprometer a possibilidade de as gerações futuras atenderem a suas próprias necessidades”. 98 O mesmo autor afirma que “a principal característica do desenvolvimento sustentável consiste na possível e desejável conciliação entre o desenvolvimento integral, a preservação do meio ambiente e a melhoria da qualidade de vida”. 99 Gabriela Verona Pércio, que também discorre sobre o assunto, aduz que: [...] o conceito de ‘desenvolvimento sustentável’ propõe-se a enlaçar definitivamente os conceitos de crescimento econômico e conservação ambiental e, portanto, de economia e meio ambiente desse modo, desenvolvimento sustentável pressupõe equilíbrio entre crescimento econômico e conservação do meio ambiente, servindo de morada comum para ambos os conceitos originalmente antagônicos. 100 A introdução do conceito de desenvolvimento sustentável no Brasil “se deu primeiramente por ocasião do estabelecimento de diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição pela Lei n. 6.803, de 02.07.1980”.101 No entanto, foi mediante a edição da Lei n. 6.938/81 que o País passou a ter formalmente uma Política Nacional do Meio Ambiente. Referida Lei “é uma espécie de marco legal para todas as políticas públicas de meio ambiente a serem desenvolvidas pelos entes federativos”.102 Incumbe salientar que até a vigência da Lei mencionada “cada Estado ou Município tinha autonomia para eleger as suas diretrizes políticas em relação ao meio ambiente de forma independente, embora não demonstrassem interesse pela temática”.103 São Paulo: Malheiros, 2012. p.73. 98 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 77. 99 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 71. 100 PÉRCIO, Gabriela Verona. Contratações sustentáveis – considerações sobre políticas públicas, governança ambiental e a nova Lei nº 12.349/10. Revista Zênite – Informativo de Licitações e Contratos (LIC), Curitiba: Zênite, n. 219. p. 504. 101 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 80. 102 FARIAS, Talden Queiros: Aspectos gerais da política nacional do meio ambiente – comentários sobre a Lei nº 6.938/81. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1544>. Acesso em: 12 ago. 2014. 103 FARIAS, Talden Queiros: Aspectos gerais da política nacional do meio ambiente – comentários sobre a Lei nº 6.938/81. Disponível em: 38 Foi a partir de então que passou a existir “uma integração e uma harmonização dessas políticas tendo como norte os objetivos e as diretrizes estabelecidas na referida lei pela União”.104 De acordo com Luís Paulo Sirvinskas, a Lei n. 6.938/81 definiu conceitos básicos como o “de meio ambiente, de degradação e de poluição e determinou os objetivos, diretrizes e instrumentos, além de ter adotado a teoria da responsabilidade”.105 Ante o exposto, infere-se que o desenvolvimento sustentável pode ser comparado a um tripé, que tem como pilares sustentadores aspectos econômicos, ambientais e sociais, os quais devem estar estritamente ligados. Adiante, serão discorridos o relatório de Brundtland e Agenda 21, temas que tiveram papel promissor para o surgimento dos pensamentos ecológicos. 3.1.2 Relatório Brundtland e a Agenda 21 O Relatório de Brundtland, também conhecido como nosso futuro comum, foi elaborado pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento – CMMAD, no ano de 1983, e presidido pela médica Gro Harlem Brundtland, à época Primeira Ministra da Noruega.106 Brundtland era mestra em saúde pública e sua escolha ocorreu pelo Secretário Geral da ONU “à medida que sua visão da saúde ultrapassa as barreiras do mundo médico para os assuntos ambientais e de desenvolvimento humano”.107 Da doutrina de Flávio Tayra, extrai-se que Gro Harlem Brundtland possuía “[...] a incumbência de reexaminar as questões críticas do meio ambiente e de <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1544>. Acesso em: 12 ago. 2014. 104 FARIAS, Talden Queiros: Aspectos gerais da política nacional do meio ambiente – comentários sobre a Lei nº 6.938/81. Disponível em: <http://www.ambitojuridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=1544>. Acesso em: 12 ago. 2014. 105 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 3. ed. São Paulo: Saraiva, 2005. p. 59. 106 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 107 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 39 desenvolvimento, com o objetivo de elaborar uma nova compreensão do problema, além de propostas de abordagem realistas”.108 No ano de 1987 foi publicado pela Comissão de Brundtland um Relatório inovador denominado “nosso futuro comum”. Conforme mencionado anteriormente, referido Relatório trouxe o primeiro conceito de desenvolvimento sustentável para o discurso público e apontou para a incompatibilidade entre desenvolvimento sustentável e os padrões de produção e consumo vigentes à época.109 Colhe-se do estudo de Tayra, que a Comissão não se limitou às questões ambientais, mas também ratificou que o desenvolvimento sustentável está relacionado a outros aspectos, dentre eles, problemas sociais como pobreza, alimentação, saúde e moradia. Neste sentido:110 O Relatório mostrou que a possibilidade de um estilo de desenvolvimento sustentável está intrinsecamente ligado aos problemas de eliminação da pobreza, da satisfação das necessidades básicas de alimentação, saúde e habitação e, aliado a tudo isto, à alteração da matriz energética, privilegiando fontes renováveis e o processo de inovação tecnológica.111 “As amplas recomendações feitas pela Comissão levaram à realização da Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, que colocou o assunto diretamente na agenda pública, de uma maneira nunca antes feita.”112 Sendo assim, no ano de 1992, no estado do Rio de Janeiro, a Cúpula da Terra, como ficou conhecida, adotou a Agenda 21. Esta se batizava como “um diagrama para a proteção do nosso Planeta e seu desenvolvimento sustentável” e era, TAYRA, Flávio. O conceito do desenvolvimento sustentável. Campina Grande–PB, Revista de economia e desenvolvimento sustentável, 2007. Disponível em: <http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:B5fUl5UN8xoJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em: 06 ago. 2014. 109 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 110 TAYRA, Flávio. O conceito do desenvolvimento sustentável. Campina Grande–PB, Revista de economia e desenvolvimento sustentável, 2007. Disponível em: <http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:B5fUl5UN8xoJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em: 06 ago. 2014. 111 TAYRA, Flávio. O conceito do desenvolvimento sustentável. Campina Grande–PB, Revista de economia e desenvolvimento sustentável, 2007. Disponível em: <http://scholar.googleusercontent.com/scholar?q=cache:B5fUl5UN8xoJ:scholar.google.com/&hl=ptBR&as_sdt=0,5>. Acesso em: 06 ago. 2014. 112 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 108 40 sobretudo, resultante da culminação de duas décadas de trabalho, cujo intuito era preparar o mundo para o século XXI.113 Na Agenda 21, os governos delinearam um programa detalhado para a ação para afastar o mundo do atual modelo insustentável de crescimento econômico, direcionando para atividades que protejam e renovem os recursos ambientais, no qual o crescimento e o desenvolvimento dependem. As áreas de ação incluem: proteger a atmosfera; combater o desmatamento, a perda de solo e a desertificação; prevenir a poluição da água e do ar; deter a destruição das populações de peixes e promover uma gestão segura dos resíduos tóxicos.114 Cabe ressaltar que da mesma forma que o Relatório de Brundtland, a Agenda 21 também contempla além das questões ambientais, aspectos que podem prejudicar o bem-estar da humanidade. São eles: “a pobreza e a dívida externa dos países em desenvolvimento; padrões insustentáveis de produção e consumo; pressões demográficas e a estrutura da economia internacional”.115 Édis Milaré, afirma que a Agenda 21 é oriunda de “relatórios, experiências e posicionamentos anteriores das Nações Unidas”, tais como o Relatório Dag Hamarskjold e o Relatório de Brundtland, acrescidos “por documentos e posições das ONGs do meio ambiente”. O mesmo autor, prossegue afirmando que o conteúdo da Agenda 21 “é um conjunto amplo e diversificado de diretrizes que, no suceder-se de seus vários capítulos, recorre frequentemente a outros textos das Nações Unidas”.116 Ainda, seguindo o que diz Édis Milaré, é possível compreender que a Agenda 21 é uma “espécie de documento consensual que se liga diretamente a interesses internacionais e supranacionais”, reforçando que suas considerações ambientais “abrem caminho para questões socioeconômicas estruturais”. 117 Seguem abordagens da Agenda 21 que merecem destaques: Estímulo à cooperação, seja internacional, seja dentro dos países; ênfase na gestão ambiental descentralizada e participativa; valorização e incremento do 113 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 114 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 115 NAÇÕES UNIDAS NO BRASIL. A ONU e o meio ambiente. Disponível em: <http://www.onu.org.br/a-onu-em-acao/a-onu-e-o-meio-ambiente/>. Acesso em: 06 ago. 2014. 116 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 103 e 104. 117 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.p. 103. 41 poder local; multiplicação de parcerias para o desenvolvimento sustentável; mudança nos padrões de consumo e nos processos produtivos. 118 “A implementação da Agenda 21 tem subsidiado legislações locais, estaduais, internacionais, e, oportunamente, subsidiará um ordenamento jurídico internacional.”119 Pelo acima discorrido, conclui-se que a Agenda 21 foi um documento de extrema relevância, que teve a incumbência de afastar o antigo modelo no qual a insustentabilidade era predominante. Em que pese por todo planeta ainda existam problemas direcionados à sustentabilidade, é nítido que o Relatório de Brundtland e a Agenda 21 deixaram seu legado, ainda que os mais céticos não queiram vê-lo. 3.1.3 Sustentabilidade como Direito Fundamental O constitucionalismo contemporâneo surgiu com a ideia de proteção aos direitos de solidariedade, que também podem ser conceituados como direitos de terceira dimensão. Dentre esses direitos, apontam-se a paz, a autodeterminação dos povos, o desenvolvimento, o meio ambiente, a qualidade de vida, etc.120 Segundo Pedro Lenza, a partir do século XXI, inicia-se uma nova perspectiva em relação ao constitucionalismo, que pode ser denominada neoconstitucionalismo, constitucionalismo pós-moderno, ou ainda, pós-positivismo. Segundo o mesmo autor, dentro dessa nova realidade, busca-se, acima de tudo, a eficácia constitucional na concretização dos direitos fundamentais.121 Nas palavras do professor João Trindade Cavalcante Filho, os direitos fundamentais podem ser considerados "[...] como os direitos básicos para qualquer ser humano, independentemente de condições pessoais específicas. São direitos que MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.p. 103. 119 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.p. 103. 120 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 14. ed. rev., atual. e ampl. EC n. 62/2009. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 53. 121 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 14. ed. rev., atual. e ampl. EC n. 62/2009. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 55. 118 42 compõem um núcleo intangível de direitos dos seres humanos submetidos a uma determinada ordem jurídica”.122 É cediço que a Constituição Federal de 1988 consagrou de forma importante diversas garantias e direitos fundamentais. O art. 225 do referido Diploma Legal, destacou o meio ambiente como sendo “essencial à sadia qualidade de vida”123 do povo, e ainda, impôs um dever de preservação praticamente ilimitado, introduzindo a ideia de que as questões pertinentes ao meio ambiente são de suma importância para o conjunto da sociedade. No Brasil, na visão de Juarez de Freitas, a sustentabilidade é observada como “um valor supremo de estrutura constitucional”.124 Dessa forma, interpretando a afirmação do autor, verifica-se que essa supremacia, trazida pela Carta Maior, dá-se no sentido de respeitar a vida, a dignidade da pessoa humana e o desenvolvimento. Paulo Affonso Leme Machado, afirma que o caput do art. 225 da CF é antropocêntrico, pois trata o meio ambiente como “um direito fundamental da pessoa humana, como forma de preservar a ‘vida e a dignidade das pessoas’”. 125 De acordo com o mencionado autor, é incontestável no cenário mundial que a destruição ambiental “[...] compromete a possibilidade de uma existência digna para humanidade e põe em risco a própria vida humana”.126 Édis Milaré, que também discorre sobre o assunto, aduz que o meio ambiente é um direito fundamental e, consequentemente, indisponível: Como todo direito fundamental, o direito ao ambiente ecologicamente equilibrado é indisponível. Ressalta-se que essa indisponibilidade vem acentuada da Constituição Federal pelo fato de mencionar-se que a preservação do meio ambiente deve ser feita no interesse não só das presentes, como igualmente das futuras. Estabeleceu-se, por via de consequência, um dever não apenas moral, como também jurídico e de natureza constitucional, para as gerações atuais de transmitir esse ‘patrimônio’ ambiental às gerações que nos sucederem e nas melhores condições do ponto de vista do equilíbrio ecológico. 127 FILHO, João Trindade Cavalcante. Teoria geral dos direitos fundamentais. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/repositorio/cms/portaltvjustica/portaltvjusticanoticia/anexo/joao_trindadade__teor ia_geral_dos_direitos_fundamentais.pdf>. Acesso em: 17 out. 2014. 123 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 28 ago. 2014. 124 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012.p.109. 125 MACHADO, Paulo Affonso Leme: Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 153. 126 MACHADO, Paulo Affonso Leme: Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 153. 127 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 189. 122 43 Machado complementa que “o meio ambiente é um bem coletivo de desfrute individual e geral ao mesmo tempo”, ao passo que o uso do prenome indefinido ‘todos’, inserido no texto do caput do art. 225 da CF “[...] alarga a abrangência da norma jurídica, pois, não particularizando quem tem direito ao meio ambiente, evita que se exclua quem quer que seja”.128 Vale destacar que o tema sustentabilidade está inserido no Capítulo VI do Titulo VIII, do capítulo dirigido à Ordem Social da CRFB/88. No entanto, “alcança da mesma forma inúmeros outros regramentos inseridos ao longo do texto nos mais diversos títulos e capítulos, decorrentes do conteúdo multidisciplinar da matéria”. 129 Nessa senda, extrai-se da lição de Juarez Freitas, que o desenvolvimento sustentável, na nossa Constituição, encontra amparo em vários dispositivos: [...] o conceito de desenvolvimento incorpora o sentido da sustentabilidade por força da incidência de outros dispositivos constitucionais, tais como, o art. 174, parágrafo primeiro (planejamento do desenvolvimento equilibrado), o art. 192 (o sistema financeiro tem de promover o desenvolvimento que serve aos interesses da coletividade), o art. 205 (vinculado ao pleno desenvolvimento da pessoa), o art. 218 (desenvolvimento científico e tecnológico, com o dever implícito de observar os ecológicos limites) e o art. 219 (segundo o qual será incentivado o desenvolvimento cultural e socioeconômico, o bem-estar e a autonomia tecnológica).130 Por derradeiro, conclui-se que por meio da promulgação da Constituição Federal de 1988, o direito ao meio ambiente passou a ser considerado um direito fundamental, pois está objetivamente ligado ao bem-estar, à sadia qualidade de vida, ao desenvolvimento, bem como ao compromisso de as gerações atuais não comprometerem os recursos naturais das quais as gerações subsequentes farão uso. 3.2 CONCEITO DE POLÍTICAS PÚBLICAS Nas constituições contemporâneas é possível constatar a inserção de um rol de direitos fundamentais extenso. O princípio dessa reconstrução dos sistemas MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20.ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012.p.151. 129 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 184. 130 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p.111. 128 44 jurídicos sociais ocorre, principalmente, após a metade do século XX, sob a influência do pós-Segunda Guerra Mundial, período em que houve a experiência da banalização dos Direitos Humanos pelos regimes nazista e fascista.131 A forma encontrada à época “para se edificar uma sociedade lastreada no respeito à dignidade da pessoa humana e na promoção da igualdade e do bem-estar social, ocorreu mediante a inserção de normas constitucionais de conteúdo programático”.132 A reforma dos sistemas jurídicos sociais teve seu marco nos países europeus e, posteriormente, repercutiu por todo o ocidente. No Brasil, foi mediante a promulgação da Constituição Federal de 1988 que se verificou a superação a um regime político repressivo e autoritário. O Texto Constitucional “buscou criar uma sociedade alicerçada no respeito e na dignidade da pessoa humana, através da positivação de um extenso rol de Direitos Fundamentais, entre eles os de índole social”133. O que se verifica do atual Texto Constitucional, é que este assegurou maior participação democrática, o que gerou corresponsabilidade da sociedade nas decisões democráticas.134 Nesse diapasão, a doutrina faz menção para a necessidade da atuação do Estado estar aliada à participação social. Segundo explica Oliveira, cabe ao Estado contemporâneo aumentar os vínculos com a sociedade civil, “[...] habilitando a organização administrativa para bem corresponder ao desafio de potencializar os efeitos positivos que a experiência com instrumentos participativos pode acarretar no desenvolvimento das ações estatais”.135 Corroborando com o que aduz Oliveira, a professora Patrícia França destaca que a participação social é necessária na concretização das políticas públicas, pois, essa participação “[...] além de ser uma forma de exercício da 131 FRANÇA, Patrícia de Oliveira: Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 93. 132 FRANÇA, Patrícia de Oliveira: Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 93. 133 FRANÇA, Patrícia de Oliveira: Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 93. 134 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 25/08/2014. 135 OLIVEIRA, Gustavo Henrique Justini de. Participação administrativa. A&C Revista de Direito Administrativo e Constitucional. Belo Horizonte, ano 05, n. 20, abr./jun. 2005. p. 191. 45 cidadania, também garante que esses instrumentos sejam adequados à realidade contemporânea, caracterizada pela imensa diversidade de necessidades sociais”.136 Para Bandeira, dois aspectos principais da participação popular se sobressaem: Um deles é o seu caráter de elemento essencial da própria ideia de democracia. O outro é o seu importante papel instrumental, derivado da funcionalidade da participação para a articulação de atores sociais e para a viabilização de processos de capacitação e de aprendizado coletivo, extremamente relevantes para a promoção do desenvolvimento. 137 À luz do exposto, infere-se que a Constituição Federal de 1988 acompanhou a tendência dos países europeus, dando ênfase aos direitos sociais, em especial à dignidade da pessoa humana. A abrangente interação entre governo e sociedade, em prol da efetivação dos direitos sociais fundamentais é necessária para a concretização das políticas públicas.138 Para Celso Antônio Bandeira de Mello, “política pública é um conjunto de atos unificados por um fio condutor que os une ao objetivo comum de empreender ou prosseguir um dado projeto governamental para o País”.139 Jessé Torres Pereira Junior e Marinês Restelatto Dotti, que também discorrem sobre o assunto, afirmam que “a política pública é fenômeno próprio do Estado que entretenha relações respeitosas de recíprocas influências com a sociedade”.140 Para Patrícia Oliveira França: Política pública pode ser conceituada como o principal instrumento de atuação estatal para a efetivação dos direitos sociais, bem como dos direitos econômicos e culturais, sendo, portanto, um mecanismo estatal direcionado para a concretização dos objetivos do Estado Constitucional. 141 FRANÇA, Patrícia de Oliveira: Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 97. 137 BANDEIRA, Pedro. Participação, articulação de atores sociais e desenvolvimento regional. Texto para discussão nº 630. Brasília: IPEA, 1999. p.10. 138 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 25. ed. rev. e atual. até Emenda Constitucional 56, de 10.12.2007. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 802. 139 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 25. ed. rev. e atual. até Emenda Constitucional 56, de 10.12.2007. São Paulo: Malheiros, 2008. p. 802. 140 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres; DOTTI, Marinês Restelatto. Políticas públicas nas licitações e contratações administrativas. 2. ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 27. 141 FRANÇA, Patrícia de Oliveira: Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 98. 136 46 E ainda, segundo a mesma autora: Política pública é um meio de atuação do gestor público, na fixação de metas, medidas de ação e critérios para o melhor aproveitamento das verbas públicas, por meio de instrumentos aptos a efetivar direitos sociais, mediante a utilização de recursos dirigidos à sociedade, estabelecendo-se quais são as necessidades básicas e prioritárias da coletividade. 142 Por fim, conclui-se que as políticas públicas envolvem ações e programas de governo, cujo objetivo é implementar o que lhes cabe operar, visando, efetivamente, cumprir o disposto na Constituição Federal.143 3.3 LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS COMO INSTRUMENTO DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA ORDEM ECONÔMICA Segundo a Constituição Federal, a ordem econômica é o conjunto de normas constitucionais em que se definem os objetivos e as modalidades de intervenção do Estado no ponto de vista econômico. Vale frisar, no entanto, que a legitimação do Estado para atuar no âmbito econômico se justifica apenas para proteger os princípios constitucionalmente estabelecidos, em especial, a função social.144 De acordo com Hely Lopes Meirelles, o Estado atua na ordem econômica “[...] para coibir os excessos da iniciativa privada e evitar que desatenda às suas finalidades, ou para realizar o desenvolvimento nacional e a justiça social”. 145 Segundo supracitado autor, a intervenção do ente estatal deve obedecer à forma instituída pela Constituição Federal, de modo que não ocorra de maneira arbitrária e a critérios pessoais das autoridades. Nesse diapasão: Essa intervenção, entretanto, não se faz arbitrariamente, por critérios pessoais das autoridades. É instituída pela Constituição e regulada por leis federais que disciplinam as medidas interventivas e estabelecem o modo e a 142 FRANÇA, Patrícia de Oliveira: Estado constitucional de direito e políticas públicas. Palhoça: Unisul, 2012. p. 100. 143 PEREIRA JUNIOR, Jessé Torres; DOTTI, Marinês Restelatto. Políticas públicas nas licitações e contratações administrativas. 2. ed. rev., atual. e ampl. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 30. 144 BITTENCOURT, Marcus Vinícios Corrêa. Modalidades de intervenção do Estado na ordem econômica. Rio Grande: Âmbito Jurídico, 2014. Disponível em: <http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=590>. Acesso em: 26 ago. 2014. 145 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 38. ed. São Paulo: Malheiros. 2011. p. 659. 47 forma de sua execução, sempre condicionada ao atendimento do interesse público, ao respeito dos direitos individuais garantidos pela mesma Constituição.146 Importante destacar que o Estado atua na área econômica de duas maneiras: Estado Regulador e, alternativamente, Estado Executor. Nas palavras de Carvalho Filho, o Estado Regulador “[...] cria normas, estabelece restrições e faz um diagnóstico social das condições econômicas. É um fiscal da ordem econômica organizada pelos particulares”. 147 O amparo legal acerca do Estado Regulador está contido no art. 174 da Constituição Federal, o qual dispõe que: Constituição Federal, art. 174: Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.148 Por outro lado, enquanto Executor, o ente estatal atua direta e indiretamente como exercente de atividade econômica, em uma esfera que compete, prioritariamente, à iniciativa privada. A respeito da atuação direta, Carvalho Filho ensina que “[...] o próprio Estado se incumbe de explorar a atividade econômica através de seus órgãos internos”.149 Já, na forma de atuação indireta, o “Estado cria pessoas jurídicas a ele vinculadas e com atribuições destinadas à execução de atividades mercantis”. É o caso das sociedades de economia mista e empresas públicas. Vale ressaltar que ambas “são empresas autônomas, com personalidade jurídica própria, que não se confundem com o Estado, mas são por este controladas”.150 Ainda com relação à atuação de forma indireta, pode o Estado optar pela realização de suas atividades, por intermédio de particulares, quando não dispuser de MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 38. ed. São Paulo: Malheiros. 2011. p. 659. 147 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direto administrativo. 24. ed. rev. ampl. e atual. até 31.12.2010. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 838. 148 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 25 ago. 2014. 149 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direto administrativo. 24. ed. rev. ampl. e atual. até 31.12.2010. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 851. 150 JÚNIOR, Edvanil Albuquerque Duarte. Intervenção direta do Estado no domínio econômico e discricionariedade administrativa. Disponível em: <http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/2953/Intervencao-direta-do-Estado-no-dominioeconomico-e-discricionariedade-administrativa>. Acesso em: 28 ago. 2014. 146 48 “[...] conhecimento, de recursos materiais ou de pessoal necessários para a execução dos serviços ou a produção de bens que necessita”, ou, quando verificar que é economicamente mais vantajoso.151 Por fim, ratifica-se que “[...] seja qual for a posição que assuma, o Estado, mesmo quando explora atividades econômicas, há de ter sempre em mira o interesse, direto ou indireto, da coletividade”.152 A forma de o Estado buscar com particulares colaboradores, prestação de serviço e adquirir bens para o exercício de suas atividades deve ocorrer por contrato administrativo precedido de licitação. Eis um exemplo de intervenção estatal na ordem econômica de forma indireta. O processo licitatório, nos termos do art. 37, XXI da Constituição Federal, deve, com exceção de casos específicos e previstos em Lei, anteceder os contratos celebrados entre a Administração Pública e particulares. Em outras palavras, a licitação pública é o processo necessário, via de regra, para a Administração adquirir, de forma mais vantajosa, determinado bem ou serviço de particular colaborador.153 Nesta esfera, Mello conceitua licitação da seguinte forma: É um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas.154 A Lei n. 8.666/93, que regulamenta em linhas gerais o instituto das licitações e contratações administrativas, teve seu art. 3º alterado por força da Lei n. 12.349/10, acrescendo àquele diploma a parte “e a promoção do desenvolvimento sustentável”,155 surgindo então, as licitações sustentáveis. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 12. 152 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direto administrativo. 24. ed. rev. ampl. e atual. até 31.12.2010. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011. p. 838. 153 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 28/08/2014. 154 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 20. ed. São Paulo: Malheiros, 2006. p. 492. 155 BRASIL. Lei nº 12.349, de 15 de dezembro de 2010. Altera as Leis n. 8.666, de 21 de junho de 1993, 8.958, de 20 de dezembro de 1994, e 10.973, de 2 de dezembro de 2004; e revoga o § 1º do art. 2º da Lei n. 11.273, de 6 de fevereiro de 2006. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Lei/L12349.htm>. Acesso em: 28 ago. 2014. 151 49 Conforme se verificará de forma mais aprofundada no capítulo subsequente, a licitação sustentável busca, além do melhor preço, a melhor proposta para o meio ambiente. Assim, eis uma forma inteligente de o Estado intervir na ordem econômica, promover o desenvolvimento sustentável, bem como estimular a indústria a produzir de maneira ecologicamente viável. As relações de produção e consumo têm crescido consideravelmente nos últimos anos, tal fato se deve à ascensão do capitalismo e a melhora no padrão de vida dos brasileiros. Atualmente, segundo texto do Governo Federal, “[...] o nível e o estilo de consumo se tornam a principal fonte de identidade cultural, de participação na vida coletiva, de aceitação em um grupo e de distinção com os demais”.156 Todavia, o ritmo desenfreado da indústria, objetivando sempre o crescimento econômico, tem ocasionado danos de elevada monta aos ecossistemas. “Já estamos consumindo 50% a mais do que o planeta é capaz de repor”. Ou seja, a situação é tão alarmante que “se o elevado padrão de consumo dos cidadãos dos países desenvolvidos fosse estendido à população mundial, seriam necessários hoje vários planetas Terra para atender a demanda por alimentos e produtos”.157 Da breve exposição da relação capitalismo versus meio ambiente, visualiza-se a necessidade de mudanças, sendo que estas devem começar, principalmente, pelo Estado, pois, “os governos exercem um papel indutor na economia ao criar leis, incentivos, impostos, mas também, sendo os consumidores mais ativos do mercado”.158 Segundo Barcessat, a licitação sustentável é uma alternativa e “[...] deve ser vista como instrumento de direito econômico, e não apenas administrativo”.159 Meirelles, referindo-se à finalidade econômica da Licitação sustentável, entende que esta atua na busca do desenvolvimento e “[...] do fortalecimento de BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Cidadania e Consumo Sustentável. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/sedr_proecotur/_publicacao/140_ publicacao09062009025703.pdf>. Acesso em: 23 set. 2014. 157 INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - IDEC. Consumo Sustentável: o que fazer por nós e pelo planeta. Disponível em: <http://www.idec.org.br/uploads/publicacoes/publicacoes/folheto-consumo-sustentavel.pdf>. Acesso em: 23 set. 2014. 158 BRASIL. MINISTÉRIO DO MEIO AMBIENTE. Cidadania e Consumo Sustentável. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/sedr_proecotur/_publicacao/140_ publicacao09062009025703.pdf>. Acesso em: 23 set. 2014. 159 BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 78. 156 50 cadeias produtivas de bens e serviços domésticos, usando-se para esse fim o poder de compra governamental”.160 É de conhecimento geral, que o governo destina, anualmente, parte significativa de sua receita ao adimplemento de contratos relativos a serviços e fornecimento dos mais diversificados produtos. Dessa forma, é presumível que o Estado utilize seu poder regulatório e influência no rumo do setor produtor para promover o desenvolvimento nacional sustentável, objetivo fundamental da República. Nessa senda, verifica-se com o auxílio dos dados extraídos do Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão que “o governo brasileiro consome 15% do Produto Interno Bruto (PIB) anual em produtos e serviços, algo em torno de R$ 600 bilhões”161, o que reforça ainda mais a necessidade da sustentabilidade estar presente nas contratações públicas. Diante do dado supra, observa-se a coerência de Barcessat ao afirmar que “o Estado não só poderá, mas agora deverá, sem sombra de dúvidas, utilizar as licitações sustentáveis como meio de fomentar uma atividade, restringi-la ou até mesmo desestimulá-la”.162 Ou seja, de acordo com referido autor, na verdade, passou a ser uma obrigação do ente estatal agir de modo a apoiar ou restringir uma atividade com base na sustentabilidade.163 O poder público é um dos consumidores de maior atuação no mercado, por conseguinte, as suas contratações precisam atender a função social juntamente com as necessidades dos entes federativos. De maneira semelhante pensa Christianne de MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 37. ed. atual. por Eurico de Andrade Azevedo, Délcio Balestero Aleixo e José Emmanuel Burle Filho (até a EC 67, de 22.12.2010). São Paulo: Malheiros, 2011. p. 284. 161 BRASIL. MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO. Contratações Públicas Sustentáveis. Compras Sustentáveis na Administração Pública ganham em eficiência econômica. Disponível em: <http://cpsustentaveis.planejamento.gov.br/?p=1897>. Acesso em: 18 set. 2014. 162 BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 76. 163 BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 76. 160 51 Carvalho Stroppa, ao concluir que “[...] sendo o Estado, um grande comprador, ele poderia usar deste ‘poder’ para fomentar o desenvolvimeto socioambiental”.164 O próprio Governo Federal, no ano de 2011, entendeu, por meio das licitações “influenciar o mercado e contribuir para a consolidação de atividades produtivas que favoreçam o desenvolvimento sustentável[...]”.165 Reforçando o acima exposto, Justen Filho explana que: A contratação administrativa também se revela como um importante instrumento de implementação de políticas públicas no âmbito econômico e social. Os valores desembolsados pelo Estado por meio de contratos administrativos são muito relevantes. Por isso, as referidas contratações administrativas tornam-se um meio não apenas de satisfazer as necessidades imediatas do Estado. Também são um instrumento de incentivo e fomento como atividades reputadas como socialmente desejadas. 166 Pelo discorrido, é possível concluir que as licitações sustentáveis encontram amplo respaldo legal e exercem importante papel no que diz respeito ao interesse público. É imprescindível, destarte, que o ente estatal, sendo um dos maiores consumidores de produtos e serviços, enquanto executor da atividade econômica, priorize as contratações que promovam o desenvolvimento sustentável da nação brasileira. O capítulo monográfico subsequente terá como objeto de estudo as licitações sustentáveis sob o ponto de vista econômico, principalmente à luz do princípio da economicidade. STROPPA, Cristiane de Carvalho apud BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 77. 165 BRASIL. MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO. Contratações Públicas Sustentáveis. Guia de compras sustentáveis para Administração Federal. 2010. Disponível em: <http://cpsustentaveis.planejamento.gov.br/wp-content/uploads/2010/06/Cartilha.pdf>. Acesso em: 23 set. 2014. 166JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos (atualizados de acordo com a Lei Federal nº 12.349/2010). 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 12. 164 52 4 LICITAÇÕES PÚBLICAS SUSTENTÁVEIS À LUZ DO PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE A licitação sustentável é fruto da recente evolução legislativa, cujo escopo foi se readequar às necessidades contemporâneas de preservação do meio ambiente. Essa evolução não aconteceu do dia para a noite e esbarra no princípio da economicidade pelo fato de as medidas ecológicas apresentarem maior valor econômico do que as usuais. No presente capítulo, verificar-se-á a aplicabilidade do princípio da economicidade em face das licitações sustentáveis e, estabelecer-se-á, paralelamente, uma relação entre as licitações públicas e o desenvolvimento sustentável. Para atingir o objetivo, serão abordados temas como o desenvolvimento sustentável no Brasil, princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações, o conceito de licitações sustentáveis, a exposição de motivos da medida provisória de n. 495/2010 que deu origem à Lei n. 12.349/2010 e, por fim, o princípio da economicidade nas licitações sustentáveis. 4.1 DESENVOLVIMENTO SUSTENTÁVEL NO BRASIL: DOCUMENTOS LEGAIS No Brasil, até a década de 80, inexistia uma norma que regulamentasse o desenvolvimento nacional sustentável. Ocorre, que a repercussão mundial sobre essa temática fez com que o legislador se ativesse à proteção ambiental. Diante disso, no dia 2 de julho de 1980, foi sancionada a Lei n. 6.803, a qual estabelecia diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição.167 A Política Nacional do Meio Ambiente, no entanto, foi criada por meio da Lei infraconstitucional n. 6.938/81, legislação esta que foi recepcionada pela Constituição Federal de 1988 em quase todos os aspectos.168 BRASIL. Lei 6.803, de 02 de julho de 1980. Dispõe sobre as diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição, e dá outras providências. Disponível em: <http://www.ibama.gov.br/emergencias/wp-content/files/LEI%20No%206803-80.pdf>. Acesso em: 03 set. 2014. 168 BRASIL. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938compilada.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 167 53 A Carta Magna, por sua vez, tratou o meio ambiente como realidade natural e, ao mesmo tempo, social, inserindo-o textualmente no rol dos Direitos Fundamentais. O art. 225, ademais, teve papel promissor no âmbito do Direito Ambiental, ao passo que revelou uma nova concepção ligada aos direitos difusos.169 Sendo assim, tendo em vista a relevância da Lei n. 6.938/81 e do art. 225 da Constituição Federal para o regime jurídico ambiental nacional, ambos serão objeto de estudo a seguir. 4.1.1 Política Nacional do Meio Ambiente – Lei n. 6.938/81 Conforme já dito anteriormente, foi por intermédio da promulgação da Lei n. 6.938 de 31 de agosto de 1981 que o País passou a ter formalmente uma Política Nacional do Meio Ambiente. Referido diploma instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente – SISNAMA, o qual é integrado por órgãos federais, estaduais e municipais, responsáveis pela proteção do meio ambiente.170 Dessa forma, a lei em epígrafe, segundo Lilian Castro de Souza, “estabelece conceitos, instrumentos, penalidades, cria o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) e o Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA), órgãos incumbidos de zelar pela proteção e melhoria da qualidade ambiental”. 171 Segundo a doutrina, a Lei infraconstitucional em comento é de grande relevância para o cenário ambiental nacional, pois no seu texto, especificamente no art. 3º, inciso I, encontra-se disposta a definição legal de Meio Ambiente.172 Ainda, em observação à Lei n. 6.938/81, é possível constatar que a Política Nacional do Meio Ambiente torna efetivo o princípio matriz contido no caput do art. 225 da CRFB/88, garantindo a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado e, além disso, deu origem aos princípios do Direito Ambiental, que posteriormente foram contemplados pela Carta Maior.173 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 170 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 595. 171 SOUZA, Lilian Castro de. Política nacional do meio ambiente e licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 106. 172 FIORILLO, Celso Antônio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 76. 173 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 169 54 A exemplo de princípio do Direito Ambiental, fundado na Lei n. 6.938/81, menciona-se o Princípio da Precaução. Para Machado, “entre os instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente colocou-se a ‘avaliação dos impactos ambientais’, (art. 9º)”.174 Assim, segundo o mesmo autor, “incontestável tornou-se a obrigação de prevenir ou evitar o dano ambiental quando o mesmo pudesse ser detectado antecipadamente”.175 Portanto, pode-se afirmar, tranquilamente, que a Constituição Federal recepcionou aludida legislação. No mesmo sentido, Fiorillo destaca “que o advento da Constituição proporcionou a recepção da Lei n. 6.938/81 em quase todos os aspectos”176, possibilitando o “[...] prosseguimento à Política Nacional de Defesa Ambiental”.177 Sirvinskas, que também discorre sobre o assunto, reforça a importância da Lei n. 6.938/81 para ordenamento jurídico brasileiro, pois, “nela está traçada toda a sistemática necessária para a aplicação da política ambiental (conceitos básicos, objeto, princípios, objetivos, diretrizes, instrumentos, órgãos, responsabilidade objetiva, etc)”.178 Destaca-se como objetivo da Lei n. 6.938/81, segundo Lilian Castro de Souza, “a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida visando assegurar, no país, condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana”.179 Em consonância com o acima exposto, colhe-se do art. 2º, do já citado Diploma Legal, os objetivos da Política Nacional do Meio Ambiente, a ver: Art. 2º. A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País, condições ao desenvolvimento socioeconômico, aos MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p.97. 175 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p.97. 176 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 76. 177 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 76. 178 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 137. 179 SOUZA, Lilian Castro de. Política nacional do meio ambiente e licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. reimpr. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 105. 174 55 interesses da segurança nacional e à proteção da dignidade da vida humana.180 Acerca dos objetivos supra expostos, Sirvinskas elucida que: [...] preservar é impedir a intervenção humana na região, procurando manter o estado natural dos recursos ambientais. Melhorar é permitir a intervenção humana no meio ambiente com o objetivo de melhorar a qualidade dos recursos ambientais, realizando o manejo adequado das espécies animais e vegetais. Recuperar, por fim, é permitir a intervenção humana, buscando a reconstituição da área degradada e fazer com que ela volte a ter as mesmas características da área original.181 Assim, em análise aos conceitos legal e doutrinários acostados acima, é possível concluir que a Lei n. 6.938/81 tem como norte dar guarida ao desenvolvimento sustentável contemporâneo, ressalvando a importância do crescimento socioeconômico, assim como a necessidade de preservar, resguardar e recuperar o meio ambiente natural.182 Incumbe ressaltar, segundo Sirvinskas, que as diretrizes da Política Nacional do Meio Ambiente são organizadas em normas e planos, cujo objetivo é orientar a ação dos governos da União (Estados, Distrito Federal e Municípios) no que se refere à preservação da qualidade ambiental e à manutenção do equilíbrio ecológico.183 Nesse contexto, a fim de regulamentar as normas e planos, antes referidas, o art. 2º da Lei n. 6.938/81, prevê, taxativamente, os seguintes princípios, que devem ser observados pelo Poder Público: I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido, tendo em vista o uso coletivo; II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar; III - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais; IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas; BRASIL. Lei n. 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938compilada.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 181 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 134. 182 BRASIL. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938compilada.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 183 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 137. 180 56 V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras; VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a proteção dos recursos ambientais; VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental; VIII - recuperação de áreas degradadas; IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação; X - educação ambiental a todos os níveis do ensino, inclusive a educação da comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente.184 Paulo de Bessa leciona que “a política ambiental é ação eminentemente executiva, muito embora não seja a ela limitada”.185 Logo, a responsabilidade na formulação das políticas públicas ambientais é conjunta entre o poder executivo e os demais poderes da União.186 Por fim, conclui-se que a Lei n. 6.938/81 estabeleceu padrões que tornam plausível o desenvolvimento sustentável, mediante instrumentos e mecanismos capazes de conferir ao meio ambiente maior proteção, antes mesmo da Constituição Federal de 1988. 4.1.2 Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 – art. 225 As Constituições que antecederam a de 1988 nunca trataram do meio ambiente de forma específica e global. Na verdade, o Texto Supremo, em ótima hora, captou a consciência de que é preciso conviver em harmonia com a natureza, tratando o bem ambiental de forma inovadora. Segundo o que dispõe Freitas, o desenvolvimento constitucionalmente exigido somente se explica se associado à sustentabilidade, em especial, ao que está relacionado no art. 225 da CRFB/88, o qual dispõe que:187 CRFB/88, art. 225: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de BRASIL. Lei 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação, e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L6938compilada.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 185 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 119. 186 ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 119. 187 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 111 e 112. 184 57 vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.188 O fato de o legislador ter feito uso do pronome relativo “todos” no caput do art. 225, gerou sentido subjetivo ao bem ambiental. Segundo Fiorillo, “por intermédio desta visão o direito ambiental teria por objeto a tutela de toda e qualquer vida”. 189 Diante de tal afirmação, é possível verificar a subjetividade trazida pelo artigo em comento, pois o direito ao meio ambiente abriga e rege a vida em todas as formas, não restringindo-se à humana.190 A ideia de bem, desvinculado à vida humana, está fundamentada no §1º, incisos II e V, do art. 225. Segundo Fiorillo, o patrimônio genético é uma das formas de exemplificar outras formas de vida, que encontra abrigo no presente dispositivo. 191 Todavia, o patrimônio genético foi devidamente assegurado pela Lei n. 11.105/2005 e não será aprofundado nesta monografia. Apenas a título de curiosidade, a fim de demonstrar tamanha subjetividade criada pelo legislador na redação do art. 225, cita-se a lição de Fiorillo acerca deste tema: O patrimônio genético merece proteção jurídica em face de relacionar-se à possibilidade trazida pela engenharia genética de utilização de gametas conservados em seres vivos, possibilitando a criação e o desenvolvimento de uma unidade viva sempre que houver interesse. Daí, em decorrência do evidente impacto da engenharia genética na pecuária, na avicultura, na agricultura etc., o entendimento constitucional de organizar as relações jurídicas advindas da complexibilidade de aludido tema. 192 Segundo Édis Milaré, o Texto Constitucional na esfera ambiental é visto como o mais avançado do Planeta, pois, tratou o meio ambiente de forma totalmente desvinculada, ou seja, foram reconhecidas características próprias, sem qualquer conexão com o instituto da posse e propriedade, e ainda, criadas obrigações simultâneas entre a população e o Estado.193 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 21 set. 2014. 189 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 83. 190 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 83. 191 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 83. 192 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 83. 193 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 185. 188 58 Neste sentir, supracitado autor explica que: [...] o art. 225, que preenche o capítulo do meio ambiente, chega a explicitar o bem comum como causa e, ao mesmo tempo, decorrência do meio ambiente ecologicamente equilibrado. Neste sentir, vê-se com clareza meridiana que o “bem de uso comum do povo” gera sua facilidade e, simultaneamente, é produzido por ele - o mesmo povo -, porquanto esse bem difuso deve ser objeto da proteção do Estado e da própria sociedade para usufruto de toda a nação.194 Na visão de Machado, o Poder Público passa a figurar não como proprietário dos bens ambientais (fauna, águas e flora), “[...] mas como gestor, que administra bens que não são dele e, por isso, deve explicar convincentemente sua gestão”.195 A ideia de Estado gestor do meio ambiente, fica em evidência na leitura do §1º, inciso I, do art. 225 da CF, o qual dispõe que é dever do Poder Público “preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais”.196 Celso Antônio Pacheco Fiorillo, neste sentido destaca quatro concepções fundamentais contidas no art. 225, no âmbito do Direito Ambiental, que são: a) de que todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado; b) de que o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado diz respeito à existência de um bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, criando em nosso ordenamento o bem ambiental; c) de que a Carta Maior determina tanto ao Poder Público como à coletividade o dever de defender o bem ambiental, assim como o dever de preservá-lo; d) de que a defesa e a preservação do bem ambiental estão vinculadas não só às presentes como também às futuras gerações.197 Para Fiorillo, o fato de o art. 225 preceituar que é dever do Poder Público e da coletividade preservar e defender o meio ambiente, torna legitimado passivo em ação de responsabilidade civil àquele que não atender ao dispositivo. Por conseguinte, todos podem encaixar-se no conceito de poluidor e degradador ambiental.198 MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.p. 186. 195 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 155. 196 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 197 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 67 e 68. 198 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 104. 194 59 Ainda na lição de Fiorillo, “o Direito Ambiental é ciência nova, porém autônoma. Esta independência lhe é garantida porque o direito ambiental possui os seus próprios princípios diretores, presentes no art. 225 da Constituição Federal.”199 Portanto, o art. 225 dá origem a diversos princípios do direito ambiental, tais quais, o princípio do desenvolvimento sustentável, o princípio do poluidor pagador, entre outros.200 Machado elucida que o art. 225, concomitantemente com o art. 1º e art. 170, ambos da Constituição Federal, concretizam um Estado Democrático e Ecológico de Direito.201 Canotilho complementa a ideia de Machado, trazendo algumas características que devem nortear o Estado para que ele venha a ser um Estado Democrático Ambiental, quais sejam: “a concepção integrada, que se refere à proteção global e sistêmica do meio ambiente; institucionalização dos deveres fundamentais ecológicos; agir integrado da Administração; tensões e conflitos do Estado Constitucional e princípio da responsabilidade”.202 Luís Paulo Sirvinskas entende que o meio ambiente equilibrado deve ser interpretado conciliando o binômio desenvolvimento (art. 170, VI, da CF) versus meio ambiente (art. 225, caput, da CF).203 Assim, compatibilizar meio ambiente e desenvolvimento significa considerar os problemas ambientais dentro de um processo contínuo de planejamento, atendendo-se adequadamente às exigências de ambos e observando-se as suas inter-relações particulares a cada contexto sociocultural, político, econômico e cológico, dentro de uma dimensão tempo-espaço. Em outras palavras, isto implica dizer que a política ambiental não se deve erigir em obstáculo ao desenvolvimento, mas sim em um de seus instrumentos, ao propiciar a gestão racional dos recursos naturais, os quais constituem a sua base material.204 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 85. 200 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 set. 2014. 201 MACHADO, Paulo Affonso Leme. Direito ambiental brasileiro. 20. ed. Rev., atual. e ampl. São Paulo: Malheiros, 2012. p. 178. 202 DIAMANTINO, Ediberto. O estado democrático de direito e a proteção da propriedade. Disponível em: <http://www.reid.org.br/arquivos/00000016-REID001_EdibertoDiamantino.pdf>. Acesso em: 17 out. 2014. 203 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 74. 204 SIRVINSKAS, Luís Paulo. Manual de direito ambiental. 7. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva. p. 36 apud MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário, 2001, p. 74. 199 60 Por fim, José Afonso da Silva afirma que o art. 225 da CRFB/88 compreende três conjuntos de normas: O primeiro, “aparece no caput, onde se inscreve a norma matriz, reveladora do direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado”;205 O segundo, “encontra-se no §1.º, com seus incisos, que versa sobre os instrumentos de garantia e efetividade do direito enunciado no caput do artigo”;206 O terceiro, “compreende um conjunto de determinações particulares, em relação a objetos e setores, referidos nos §§2.º a 6.º, que por tratarem de áreas e situações de elevado conteúdo ecológico, merecem desde logo proteção constitucional”.207 Face o exposto, conclui-se que o art. 225 da Constituição Federal tratou a defesa, a preservação e o patrimônio ambiental de forma genérica. Contudo, não resta dúvida que o referido Diploma impôs a obrigação de preservar o meio ambiente para as presentes e futuras gerações. 4.2 PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS AMBIENTAIS APLICÁVEIS ÀS LICITAÇÕES PÚBLICAS O direito positivo é amparado por princípios regulamentadores, que servem para auxiliar na compreensão e consolidação da norma jurídica. O Direito Ambiental e o Direito Administrativo, enquanto ramificações do direito positivo, são igualmente congregados por esses princípios. Da mesma forma, a Lei n. 8.666/93, a qual regulamenta as licitações e contratos administrativos, contempla um rol de princípios que devem ser observados pela Administração na elaboração dos editais licitatórios e, futuramente, nas contratações.208 Nesse sentir, o objetivo da presente seção será discorrer sobre os princípios do direito ambiental, contidos no art. 225 da Constituição Federal, que 205 SILVA, José Afonso: Direito ambiental constitucional. p.54 apud MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 189. 206 SILVA, José Afonso: Direito ambiental constitucional. p.54 apud MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.p. 189. 207 SILVA, José Afonso. Direito ambiental constitucional. p.54 apud MILARÉ, Édis. Direito do Meio Ambiente: a gestão ambiental em foco: doutrina, jurisprudência, glossário. 7. ed. rev., atual. e reform. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011. p. 189. 208 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 17. ed. Atualizada por Fabrício Motta. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 536. 61 proporcionam fundamento ao Poder Público para optar pela aquisição de bens e serviços sustentáveis. Inicialmente, incumbe mencionar a imensa diversificação doutrinária no que se refere aos princípios do direito ambiental, portanto, as fundamentações utilizadas para falar sobre o tema serão as doutrinas de Celso Antônio Pacheco Fiorillo e Veridiana Bertogna, bem como a Constituição Federal. Segundo Veridiana Bertogna, os princípios do Direito Ambiental que mais se aplicam ao tema licitações sustentáveis são os seguintes: princípio da obrigatoriedade da intervenção estatal; princípios da precaução e da prevenção; princípios do poluidor e da responsabilização; princípio da ubiquidade; princípio da solidariedade intergeracional ou equidade.209 Referidos princípios serão tratados, respectivamente, a seguir. O Princípio da Intervenção Estatal ou do Desenvolvimento Sustentável encontra-se esculpido no art. 225 da CF e, segundo Fiorillo, o fato de se constatar que os recursos ambientais não são inesgotáveis, torna inadmissível que o desenvolvimento das atividades econômicas ocorra alheio a esse fato.210 Segundo supracitado autor: [...] o princípio de desenvolvimento sustentável tem por conteúdo a manutenção das bases vitais de produção e reprodução do homem e de suas atividades, garantindo igualmente uma relação satisfatória entre os homens e destes com o meio ambiente, para que as futuras gerações também tenham a oportunidade de desfrutar os mesmos recursos que temos hoje à nossa disposição.211 No que se refere à intervenção do Estado, Veridiana Bertogna afirma que a atuação do Poder Público não está restrita à ação repressiva, contida no Poder de Polícia. Segundo a mesma autora, “a Lei Magna exige prestações positivas, por parte do Estado, visando eficácia da proteção ambiental. O Estado torna-se, aqui, intervencionista, sempre objetivando assegurar ao máximo o equilíbrio ambiental”. BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 4. 210 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 87. 211 DIAFÉRIA, Adriana: Biodiversidade e patrimônio genético no direito ambiental brasileiro. São Paulo: Max Limonad, 1999,p. 31 apud FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012.p. 87. 209 62 Ainda, com amparo na lição de Bertogna, colhe-se que “a intervenção estatal obrigatória na proteção ambiental, de forma a garantir as necessidades das gerações futuras, não pode ser olvidada quando o próprio Poder Público age na amplitude que as contratações públicas exigem”.212 Porquanto, “é neste contexto que o Estado, enquanto poderoso agente econômico, encontra vasto campo de atuação para cumprimento dos deveres que lhes foram outorgados pela Constituição Federal”.213 O Princípio da Prevenção e da Precaução, segundo Fiorillo, “[...] é um dos mais importantes que norteiam o direito ambiental”,214 “[...] uma vez que os danos ambientais, na maioria das vezes, são irreversíveis e irreparáveis”.215 De acordo com o autor acima citado, a prevenção e a precaução são sustentáculos do direito ambiental, ao passo que há impossibilidade de restabelecer às condições naturais idênticas quando houver deterioração. Para Celso Antonio Pacheco Fiorillo: A prevenção e a preservação devem ser concretizadas por meio de uma consciência ecológica, a qual deve ser desenvolvida através de uma política de educação ambiental. De fato, é a consciência ecológica que propiciará sucesso no combate preventivo do dano ambiental. Nessa senda, faz-se necessário que as políticas públicas ambientais do governo atuem “na defesa contra o perigo ambiental iminente, no afastamento ou diminuição de risco para o ambiente, na proteção à configuração futura do ambiente”.216 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 89. 213 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 91. 214 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 126. 215 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 127. 216 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 94. 212 63 Veridiana Bertogna, por sua vez, aduz que a prevenção e a precaução “[...] constituem-se em normas jurídicas vinculantes, dotadas de efetiva juridicidade”217, motivo pelo qual devem estar presentes nas decisões políticas e jurídicas do Estado. É possível fazer a ligação entre prevenção, precaução e licitações públicas, de modo que se houver a aquisição de bens e serviços pela Administração de forma sustentável, “o Poder Público estará atuando de forma positiva para a proteção ambiental e colocando em prática políticas de gestão preventiva e inibitória de riscos ambientais”.218 O Princípio do Poluidor Pagador e da Responsabilização, igualmente aos princípios discorridos acima, encontra amparo no art. 225 da Constituição Federal. De início, é necessário que se entenda que esse princípio não possui o intuito de possibilitar que haja poluição em troca de pagamento. Outrossim, como muito bem exposto por Fiorillo, “não se podem buscar através dele formas de contornar a reparação do dano, estabelecendo-se uma liceidade para o ato poluidor, como se alguém pudesse afirmar ‘poluo, mas pago’”.219 O Princípio do Poluidor Pagador e da Responsabilização pode ser visualizado sob duas órbitas, quais sejam: “a) busca evitar a ocorrência de danos ambientais (caráter preventivo); b) ocorrido o dano, visa à sua reparação (caráter repressivo)”.220 Veridiana Bertogna complementa que “pela aplicação deste princípio, impõe-se ao sujeito econômico (produtor, consumidor, transportador), que nesta relação pode causar um problema ambiental, arcar com os custos da diminuição ou afastamento do dano”.221 A observação do princípio em comento é de suma importância, por parte da Administração, no momento da análise mais vantajosa, pois, “[...] consumado o BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 94. 218 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 94. 219 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 96. 220 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 96. 221 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 96. 217 64 dano ambiental, sua reparação é sempre incerta ou exige custos excessivamente onerosos”.222 O Princípio da Ubiquidade, nas palavras de Fiorillo “[...] visa a demonstrar qual é o objeto de proteção do meio ambiente, quando tratamos dos direitos humanos, pois toda atividade, legiferante ou política, sobre qualquer tema ou obra deve levar em conta a preservação da vida e, principalmente, sua qualidade”.223 Ainda na visão do nobre autor, a ubiquidade: [...] vem a evidenciar que o objeto de proteção do meio ambiente, localizado no epicentro dos direitos humanos, deve ser levado em consideração toda vez que uma política, atuação, legislação sobre qualquer tema, atividade, obra etc. tiver que ser criada e desenvolvida. Isso porque, na medida em que possui como ponto cardeal a tutela constitucional a vida e a qualidade de vida, tudo que se pretende fazer, criar ou desenvolver deve passar por uma consulta ambiental, enfim, para saber se há ou não a possibilidade de que o meio ambiente seja degradado.224 Veridiana Bertogna acrescenta que “toda a atuação administrativa que levar em consideração os aspectos de degradação ambiental estará dando cumprimento, em última instância, ao comando constitucional que determina a preservação da sadia qualidade de vida para as presentes e futuras gerações”.225 Finalmente, o Princípio da Solidariedade Intergeracional ou Equidade, em que pese não tenha sido debatido por Fiorillo, pode ser aprofundado com base nos conceitos trazidos por Veridiana Bertogna. A mesma autora, no intuito de discorrer sobre o princípio epigrafado, faz menção à lição de Augusto Di Trindade Amado, o qual dispõe que: Por este princípio, que inspirou a parte final do caput do art. 225 da CRFB/88, as presentes gerações devem preservar o meio ambiente e adotar políticas ambientais para a presente e as futuras gerações, não podendo utilizar os recursos ambientais de maneira irracional de modo que prive os seus BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 98. 223 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 138. 224 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de direito ambiental brasileiro. 13. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 137. 225 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 99. 222 65 descendentes do seu desfrute. Não é justo utilizar recursos naturais que devem ser reservados aos que ainda não existem.226 Como de costume, fazendo uma ligação dos princípios contidos no art. 225 da Carta Maior com as contratações públicas, Veridiana Bertogna afirma que “[...] a proposta mais vantajosa somente pode ser aquela que atenda ao imperativo ético de preservação dos recursos naturais para as gerações futuras, relacionada, portanto, à aquisição de bens e produtos sustentáveis”.227 Dá análise do exposto, é possível concluir que, em todos os princípios do Direito Ambiental está presente, intrinsecamente, a questão da formulação das políticas públicas. É dever do Estado, enquanto executor da atividade econômica, dar prioridade ao desenvolvimento sustentável nas decisões administrativas. Diante disso, tendo em vista que os princípios analisados buscam a qualidade do meio ambiente e a proteção da existência humana, é imprescindível que a Administração priorize a sustentabilidade nas licitações. 4.3 CONCEITO DE LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS É consabido que as compras na Administração Pública são efetuadas por meio de um procedimento administrativo denominado licitação, procedimento este que encontra amparo legal na Lei n. 8.666/93, a qual tem o papel de regulamentar o artigo 37, inciso XXI da Constituição Federal, bem como instituir normas para as licitações e contratos administrativos.228 A licitação, equivale a uma oferta destinada a toda coletividade de pessoas que preencham os requisitos legais e do edital, cabendo à Administração, selecionar a proposta mais conveniente, a fim de que seja resguardado o interesse público. 229 AMADO. Direito ambiental sistematizado. p. 42 apud BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 99. 227 BERTOGNA, Veridiana. Princípios constitucionais ambientais aplicáveis às licitações sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 100. 228 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 28 set. 2014. 228 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 28 set. 2014. 229 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p. 283. 226 66 Hely Lopes Meirelles, que discorre sobre o assunto, aduz que: Licitação é o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse, inclusive o da promoção do desenvolvimento econômico sustentável e fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos. Como procedimento, desenvolve-se através de uma sucessão ordenada de atos vinculantes para a Administração e para os licitantes, o que propicia igual oportunidade a todos os interessados e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos. Tem como pressuposto a competição.230 Ainda sobre as licitações, Celso Antônio Bandeira de Mello acrescenta: Licitação é um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na ideia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir.231 A sustentabilidade, por sua vez, chegou aos certames licitatórios, de forma inequívoca, pela da edição da Lei n. 12.349/10, a qual promoveu alteração no art. 3º da Lei n. 8.666/93, acrescentando ao dispositivo que a proposta mais vantajosa leve em conta, também, “a promoção do desenvolvimento sustentável”.232 Justen Filho, destaca que a proposta adotada pelo art. 3º é no sentido de que a contratação administrativa funcione como incentivo a promover o desenvolvimento nacional sustentável. Para o mesmo autor, “[...] isso significa a existência de uma relação de causalidade, cuja intensidade pode ser variada, entre a contratação administrativa e objetivos relacionados ao desenvolvimento nacional”.233 Em outras palavras, “a contratação administrativa deve buscar práticas amigáveis ao meio ambiente, reduzindo ao mínimo possível os danos ou o uso inadequado dos recursos naturais”.234 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 38.ed. São Paulo: Malheiros. 2011. p. 283. 231 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 28. ed. rev. e atual. até Emenda Constitucional 67, de 22.12.2010. São Paulo: Malheiros, 2011. p. 528. 232 GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 17. ed. Atualizada por Fabrício Motta. São Paulo: Saraiva, 2012. p. 534. 233 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos (atualizados de acordo com a Lei Federal nº 12.349/2010). 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 64. 234 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos (atualizados de acordo com a Lei Federal nº 12.349/2010). 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 64. 230 67 De forma simples, define-se licitação sustentável, ou, conforme sustenta Barcessat “ecoaquisição”, “compra verde”, “licitação positiva” ou ainda “compra ambientalmente amigável”235 como aquela que considera, em conjunto com os princípios norteadores da licitação, a proposta mais “[...] apta a gerar, direta ou indiretamente, o menor impacto negativo e, simultaneamente, os maiores benefícios econômicos, sociais e ambientais”.236 Nessa esteira, Meneguzzi complementa que a licitação sustentável é tida como forma de a Administração contribuir para o desenvolvimento sustentável, de forma proba, sem, no entanto, comprometer o futuro do planeta, a ver: A licitação sustentável constituiria, em síntese, uma tentativa da Administração Pública colaborar com o desenvolvimento sustentável, ou seja, com um desenvolvimento no qual há progresso material, tecnológico, mas sem comprometer a existência saudável de gerações futuras, sem esgotamento dos recursos naturais não renováveis, preservando as condições habitáveis de vida que ainda restam no planeta. 237 Bim, por sua vez, ao tratar sobre o tema adiciona que se trata de esforço do ente Estatal, com amparo legal, a fim de promover a consciência institucional do consumo sustentável: É um esforço governamental com base jurídica, propiciado não apenas por ela, mas principalmente pela consciência institucional do consumo sustentável (educação ambiental) para adquirir bens, serviços e obras com reduzido impacto ambiental em comparação com outros que servem à mesma finalidade.238 Justen Filho acresce que “[...] esse procedimento licitatório se orienta à realização de duas finalidades essenciais, que são a concretização do princípio da BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 67. 236 FREITAS, Juarez. Sustentabilidade: direito ao futuro. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 238. 237 MENEGUZZI, Rosa Maria. Conceito de licitação sustentável. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 298. NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitação pública e contrato administrativo. 2. ed. rev. e ampl. 1. reimpr. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 35. 238 BIM, Eduardo Fortunato. Considerações sobre a juridicidade e os limites da licitação. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 177. 235 68 isonomia e a obtenção da proposta mais vantajosa (inclusive sob o prisma do desenvolvimento nacional sustentável)”.239 Porquanto, cediço que dentre as finalidades da licitação, destaca-se a promoção da igual oportunidade aos que desejam participar do procedimento licitatório (isonomia). Ocorre, que juntamente com a obrigatoriedade da adição de critérios que possibilitem o desenvolvimento sustentável, promovida pela redação da Lei n. 12.349/10, surgiu a ideia de afronta ao princípio da igualdade. Todavia, visando desde já afastar tal posição, cabe expor o que ensina Barcessat: Em síntese: o que a lei proíbe são exigências que não se sustentem juridicamente, que não guardem consonância com o objeto e objetivos da licitação. O Administrador Público, ao optar pelo objeto que venha a contribuir para um meio ambiente saudável, não estará ferindo o princípio da isonomia no momento da descrição do objeto, como, por exemplo, ao exigir que os móveis sejam da madeira certificada, material elétrico que tenha certificado de baixo consumo de energia, etc. Portanto, não há que se falar em violação do princípio da igualdade se as exigências constantes do edital estiverem afinadas com o objeto e objetivos da licitação, desde que respaldados pelos princípios prestigiados pelo legislador constitucional. Superado o empasse acima levantado, observar-se-á, a seguir, que as licitações sustentáveis são fruto da evolução legislativa nacional. O art. 170, VI, após a alteração ocasionada pela EC n. 42/2003, dispõe como princípio a ser observado a “defesa do meio ambiente, inclusive, mediante tratamento diferenciado, conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação”.240 De fato, referido Diploma Legal pode ser considerado decisivo para a posterior inserção da sustentabilidade nas licitações, pois, prevê a possibilidade de tratamento diferenciado para produtos mais benéficos do ponto de vista ambiental. Di Pietro aponta como aspectos relevantes para a promoção do desenvolvimento sustentável no País e posterior positivação nas licitações a edição da Lei n. 12.187/09, que dispõe da Política Nacional sobre Mudanças do Clima, e da Lei n. 12.305/10, que trata da Política Nacional de Resíduos Sólidos. 241 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos (atualizados de acordo com a Lei Federal nº 12.349/2010). 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 58. 240 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 28 set. 2014. 241 DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito administrativo. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2012. p.384. 239 69 Da mesma forma, segundo Ferreira, as Leis elencadas fortaleceram as licitações sustentáveis e contribuíram para a alteração do art. 3º da Lei n. 8.666/93, a ver: O advento das novas leis, Lei n° 12.187, de 29.12.2009, e Lei n° 12.305, de 2.8.2010, que instituíram a Política Nacional sobre Mudança do Clima e a Política Nacional de Resíduos Sólidos, assim como, mais recentemente, a Lei 12.349, de 23.12.2010, que deu nova redação ao art. 3°da Lei 8.666/93, trouxeram um importante fortalecimento à implementação de desenvolvimento da política pública das chamadas licitações sustentáveis – já antes em harmonia com a legislação e a Constituição da República, mas que agora recebem especial reforço a partir destas novas leis. 242 Pelo discorrido, tem-se que a licitação sustentável é uma política pública promissora, resultante da evolução legislativa nacional. É sabido, ademais, que a sociedade clama por um meio ambiente equilibrado, diante disso, qualquer atitude útil e eficaz que objetive este fim, merece ser vista de forma positiva. 4.4 EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS DA MEDIDA PROVISÓRIA Nº 495/2010 QUE DEU ORIGEM À LEI Nº 12.349/2010 No dia 18 de junho de 2010, foi encaminhada à Presidente da República a exposição de motivos (E.M.I. nº 104/MP/MF/MEC/MCT), que subvencionou a edição da Medida Provisória n. 495/2010, a qual, a posteriori, foi convertida na Lei n. 12.349/2010.243 Exposição de Motivos Interministerial N° 104/ MP/MF/MEC/MCT, visava a alteração da Lei n. 8.666/93 nos seguintes termos: [...] a presente proposta de Medida Provisória altera o caput e os §§ 1º e 2º do artigo 3º da Lei nº 8.666/93 e propõe a inclusão dos parágrafos 5º a 12 a esse dispositivo, bem como referências correlatas nos seguintes. Outras modificações referem-se à inclusão dos incisos XVII, XVIII e XIX ao artigo 6º, bem como à inserção do inciso XXXI ao artigo 24 e do inciso V ao artigo 57. Por fim, estabelece-se em seu art. 2º que o disposto na Medida Provisória se FERREIRA, Maria Augusta Soares de Oliveira. As licitações públicas e as novas leis de mudança climática e de resíduos sólidos. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 117. 243 BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 242 70 aplica à modalidade licitatória denominada pregão, de que trata a Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002.244 Dentre os motivos argumentados, destacou-se a “necessidade de adoção de medidas que agreguem ao perfil de demanda do setor público diretrizes claras atinentes ao papel do Estado na promoção do desenvolvimento econômico e fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos”,245 o que já ocorria em outros países. No mesmo sentido, diante do relevante gasto do setor público com obras e serviços, à época, algo em torno de R$ 57,6 bilhões (parágrafo 10), verificou-se a necessidade de dar melhor eficiência e qualidade para esses gastos, de modo que as compras governamentais pudessem promover o desenvolvimento do mercado interno.246 Além de promover o desenvolvimento econômico nacional, mencionavase, paralelamente, a necessidade de o setor público dar ênfase ao fortalecimento de cadeias produtivas de bens e serviços domésticos, dentre elas, à instituição de incentivos à pesquisa e à inovação.247 A Exposição de Motivos Interministerial, em comento, abordou outras propostas que, por não estarem vinculadas ao tema da presente monografia, não serão discorridas. De fato, a Medida Provisória n. 495/2010 foi publicada no Diário Oficial da União, no dia 20 de Julho de 2010, justificada “pela necessidade de ações tempestivas que promovam a indústria e os prestadores de serviços brasileiros, incentivando-os a aprimorarem a qualidade de seus produtos e serviços”.248 Rosa Maria Meneguzzi, aponta como relevante o fato de a medida provisória privilegiar: BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 245 BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 246 BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 247 BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 248 BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 244 71 [...] produtos manufaturados (feitos com mão de obra manual) e serviços nacionais, elaborados com obediência a normas técnicas brasileiras, como também, a produtos manufaturados e serviços nacionais resultantes do desenvolvimento feito no país, bem como a serviços provenientes dos Estados-Partes do Mercosul, após confirmação do Protocolo de Contratações Públicas daquele mercado [...].249 Na visão de Valente, o intuito da exposição de motivos da medida provisória 495/2010 é “agregar às finalidades das licitações públicas um papel de indução do desenvolvimento nacional, por intermédio do poder de compra governamental”.250 Vale frisar que o texto original da Exposição de Motivos, conforme redação do parágrafo 6, restringia-se à “promoção do desenvolvimento econômico nacional”251. Entretanto, na conversão da Medida Provisória para a Lei n. 12.349/10, foi acrescida a palavra “sustentável” à redação do caput art. 3º da Lei 8.666/93. Para Rosa Maria Meneguzzi, a introdução do adjetivo sustentável “[...] revela o apreço que o Congresso Nacional possui com o tema ambiental”.252 Conclui-se, por fim, que a Medida Provisória n. 495/2010 tinha a incumbência de fortalecer o mercado interno, utilizando para isso, as licitações públicas. Ao passo da conversão dessa Medida em Lei (Lei n. 12.349/10), foi acrescentada a sustentabilidade às contratações pela Administração Pública, o que reforça a ideia de que as licitações devem respeitar o equilíbrio do Planeta. 4.5 O PRINCÍPIO DA ECONOMICIDADE NAS LICITAÇÕES SUSTENTÁVEIS Os processos licitatórios, como já exposto anteriormente, devem pautar-se na observância de princípios, os quais visam nortear e legitimar o certame. Nessa senda, o princípio da economicidade é um dos mais observados, haja vista que está MENEGUZZI, Rosa Maria: Conceito de licitação sustentável. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 32. 250 VALENTE, Manoel Adam Lacayo. Marco legal das licitações e compras sustentáveis na administração pública. 2011. Disponível em: <http://www2.camara.leg.br/documentos-epesquisa/publicacoes/estnottec/tema1/2011_1723.pdf>. Acesso em: 19 set. 2014. 251 BRASIL. E.M.I. N° 104/ MP/MF/MEC/MCT. 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Exm/EMI-104-MP-MF-MEC-MCT-MPV495-10.htm>. Acesso em: 18 set. 2014. 252 MENEGUZZI, Rosa Maria: Conceito de licitação sustentável. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 35. 249 72 relacionado, diretamente, com o dinheiro público que será desembolsado pela Administração na obtenção do objeto da licitação. Outrossim, o fato de o dinheiro utilizado ter natureza pública, induz ao Administrador o dever de atuar com cuidado e responsabilidade, levando-se em conta todas as possibilidades, a fim de alcançar, no ponto de vista econômico, o contrato mais satisfatório. De forma resumida, Niebuhr discorre que “o princípio da economicidade impõe que a Administração firme contratos vantajosos sob o ponto de vista econômico-financeiro, pagando aos contratados o menor preço, desde que a proposta, como um todo seja exequível”. 253 Acompanhando o ponto de vista de Barcessat, entende-se por tal princípio que a gerência dos recursos financeiros deve ocorrer de forma que a Administração obtenha os “maiores benefícios pelos menores custos”.254 Sob a ótica de Justen Filho, o Administrador deve buscar todas as informações sobre o objeto da licitação, atentando-se tanto para aspectos qualitativos quanto quantitativos: A economicidade consiste em considerar a atividade administrativa sob o prisma econômico. Como os recursos públicos são extremamente escassos, é imperioso que sua utilização produza os melhores resultados econômicos, do ponto de vista quantitativo e qualitativo. Há dever de eficiência gerencial que recai sobre o agente público. Ele tem o dever de buscar todas as informações pertinentes ao problema enfrentado.255 Diante do dever de obediência do princípio da economicidade, há quem diga que a nova redação do artigo 3º da Lei n° 8.666/93 acarretaria problemas para os futuros processos licitatórios, justificando referido posicionamento na aparente colisão entre as licitações sustentáveis e a obediência ao princípio da economicidade.256 NIEBUHR, Joel de Menezes. Licitações públicas e contratos administrativos. Belo Horizonte: Fórum, 2012. p. 628. 254 BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 76. 255 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010a. p. 67. 256 BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 76. 253 73 Alternativas “verdes” ou sustentáveis, há cada dia mais estão presentes no mercado de produção e consumo. Entretanto, não se pode olvidar a possibilidade de maior custo dos produtos sustentáveis perante os demais. Optar pela preservação do meio ambiente pode acarretar um desembolso imediato maior, por parte do comprador, podendo surgir, como já exposto, um empecilho para realização da licitação sustentável, uma vez que o dinheiro utilizado é público e seria abstruso imaginar até que ponto essa opção se justificaria. 257 Para resolver tal empasse, bem como legitimar a inserção de itens que levam ao desenvolvimento nacional sustentável nos editais licitatórios, chama-se a atenção para o princípio da vantajosidade, o qual traz a ideia de visão futura, economia a médio/longo prazo e “abrange a economicidade”.258 Acerca do tema, Justen Filho aduz: Ao optar-se por um produto de melhor qualidade existe uma segurança presumida de que gastos com futuros reparos e consertos serão menores ou mais raros. Quando compramos uma casa, por exemplo, levamos em conta a qualidade dos materiais utilizados, local de construção, questões de segurança, entre outros aspectos, tudo visando nosso conforto e economia futuros, mesmo que para isso paguemos um pouco a mais no momento da compra.259 De forma análoga, temos às licitações sustentáveis, ou seja, paga-se mais no presente, objetivando à saúde da coletividade e economia futura com obras, produtos, serviços, etc., que inevitavelmente serão necessários para repor as condições ambientais atuais. Adiante, junta-se a lição de Barcessat que resume bem essa ideia: Outrora, os exegetas mais conservadores poderiam argumentar que a incorporação da variável ambiental às licitações não atenderia ao princípio da economicidade. Todavia, tal argumento não mais se sustenta, vez que a adoção da variável ambiental às licitações atende a economicidade. Eventual aumento imediato de custo de produtos e serviços pode ser compensado, a médio e longo prazo, pela redução dos danos ambientais. 260 BRASIL. MINISTÉRIO DO PLANEJAMENTO, ORÇAMENTO E GESTÃO. Contratações Públicas Sustentáveis. Compras Sustentáveis na Administração Pública ganham em eficiência econômica. Disponível em: <http://cpsustentaveis.planejamento.gov.br/?p=1897>. Acesso em: 18 set. 2014. 258 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010a. p. 67. 259 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010a. p. 67. 260 BARCESSAT, Lena. Papel do estado brasileiro na ordem econômica e na defesa do meio ambiente: necessidade de opção por contratações públicas sustentáveis. In: SANTOS, Murillo 257 74 Dessa forma, indubitavelmente o princípio da economicidade será atendido na realização de editais que tenham como norte a sustentabilidade. O Administrador deve ter em mira os aspectos ambientais do país, levando em consideração a melhor solução do ponto de vista financeiro e ambiental. Logicamente, de acordo com Justen Filho, não se pode exigir que o Agente Público faça previsões do futuro. Qualquer decisão que seja, ainda que segurada da da maior cautela necessária, é passível de erro, podendo, portanto, não ser a melhor para o futuro.261 Em síntese, a economicidade avaliada de maneira coerente tem de observar os estudos feitos no presente, baseados em padrões normais de conduta, de modo que eventos aleatórios e futuros não são parâmetros para posterior condenação de decisão tomada pela Administração.262 Por outro lado, isso ocorre quando se trata do princípio da vantajosidade. Segundo tal princípio, a Administração tem o dever de assegurar-se que está realizando o contrato mais vantajoso possível, fazendo uma análise de cada caso concreto, visando o atendimento do interesse coletivo. Nesse sentido, Justen Filho aduz o seguinte: A apuração da vantagem depende da natureza do contrato a ser firmado. A definição dos custos e dos benefícios é variável em função das circunstancias relativas à natureza do contrato e das prestações dele derivadas. A vantajosidade de uma contratação é um conceito relativo, na acepção de que as circunstâncias é que determinam a consistência da maior vantagem possível. A fixação da vantagem buscada pela Administração é imprescindível para determinar o critério de julgamento e o tipo de licitação a serem adotados. Somente é possível formular as regras do procedimento licitatório após a Administração determinar os benefícios que pretenderá obter e os custos que se disporá a assumir. Mais precisamente, incumbir-lhe-á precisar a natureza dos benefícios e os custos visados. 263 Logo, tem-se que o lado financeiro do certame não é a única coisa a ser levada em conta. O processo licitatório, quando bem feito, vai além da análise do Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 76. 261 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010a. p. 67. 262 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010a. p. 67. 263 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos. 14. ed. São Paulo: Dialética, 2010a. p. 66. 75 montante a ser gasto. O estudo generalizado dos aspectos do objeto licitado, incluindo gastos, objetivos, prazos, etc., é imprescindível para que se obtenha o êxito do processo licitatório. Neste aspecto, vale mencionar o que expõe Bim: A própria Lei de Licitações (art. 45, §1º), ao definir os tipos de licitação, preceituou que, no tipo menos preço, será vencedor aquele que “apresentar proposta de acordo com as especificações do edital ou convite” e cumulativamente o menor preço. Ela mesma reconhece que o menor preço não é o suficiente, ainda que obviamente necessário. Mesmo no pregão, onde indubitavelmente o menor preço detém a primazia, devem ser observadas as especificações técnicas, os parâmetros mínimos de desempenho e qualidade definidos no edital.264 Importante salientar que a economicidade é importantíssima, pois impõe dever ao Agente de zelar pelo dinheiro público; todavia, deve ser analisada juntamente com a vantajosidade e o desenvolvimento sustentável, até porque, segundo Justen Filho, não há hierarquia entre os princípios das licitações. O que se espera, então, é a melhor tecnologia do ponto de vista econômico e ambiental, desde que isso não acarrete em custo muito elevado para os cofres públicos.265 A respeito, Bim ressalta que não se espera a melhor tecnologia ou a mais cara, pois, “em suma, a limitação do custo desarrazoado da melhor tecnologia disponível comprovadamente apta para o menor impacto ambiental restringe a exigibilidade de tecnologia”.266 A verdade é que o Administrador deve analisar a peculiaridade de cada caso concreto, cabendo a este verificar se os gastos extras são aceitáveis, embora nem sempre seja tarefa simples. As alternativas sustentáveis são plausíveis, vantajosas e amparadas pelo art. 3º da Lei n. 8.666/93, tornando lícita a escolha mais ecológica ainda que o custo imediato sofra aumento.267 BIM, Eduardo Fortunato. Considerações sobre a juridicidade e os limites da licitação. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 190-191. 265 JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos (atualizados de acordo com a Lei Federal nº 12.349/2010). 15. ed. São Paulo: Dialética, 2012. p. 69. 266 BIM, Eduardo Fortunato. Considerações sobre a juridicidade e os limites da licitação. In: SANTOS, Murillo Giordan; BARKI, Teresa Villac Pinheiro (Coord.) Licitações e contratações públicas sustentáveis. Belo Horizonte: Fórum, 2011. p. 210. 267 BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8666cons.htm>. Acesso em: 19 ago. 2014. 264 76 Conclui-se que o eventual aumento dos custos do certame não é, de fato um problema, mas sim um detalhe inerente à aquisição de bens ecologicamente corretos. Ademais, restará atendido o princípio da vantajosidade e haverá, normalmente, uma economia futura de recursos. 77 5 CONCLUSÃO A inserção de critérios sustentáveis no ordenamento jurídico nacional e, consequentemente, nos certames licitatórios, é fruto da longa evolução da sociedade, que, com o passar dos tempos, passou a visualizar o desenvolvimento, não somente sob o aspecto econômico, mas também sob as políticas humanitárias. O Desenvolvimento nacional sustentável nos certames licitatórios não é algo positivado sem maiores cuidados na Lei de Licitações e Contratos Administrativos. A credibilidade dessa perspectiva é oriunda da preocupação do legislador para com o tema, que ao longo dos anos, pôde perceber os transtornos irreversíveis causados ao Planeta pela devastação desenfreada. Finalmente, é possível afirmar que os certames licitatórios, para o bem da sociedade, passam a servir, de forma inequívoca, como instrumento para promoção do desenvolvimento nacional sustentável mediante a alteração sofrida na Lei n. 8.666/93. Essa reforma legislativa é um avanço importantíssimo para o direito positivo e, se realmente atendida, de grande valia para cumprir o disposto nos arts. 170, VI e 225, ambos da Constituição Federal. Passa-se a exigir dos agentes públicos um cuidado ainda maior na gestão administrativa, especialmente, em conciliar os princípios basilares do Direito Administrativo com os do direito ambiental, os quais convergem para a supremacia do interesse público. Estamos diante de uma política pública pertinente e promissora, que no entanto, esbarra com problemas de cunho econômico. Isso se dá em virtude de as alternativas sustentáveis serem atualmente mais caras que as usuais, de modo que, em um país como o Brasil, cujos recursos são limitados, embora haja imposição legal, a sustentabilidade não seja muitas vezes aplicada. O Governo é um consumidor assíduo do mercado que constantemente faz a aquisição de bens e serviços, sendo que o caminho para isso, via de regra, é a licitação. Embora exista obrigação recíproca entre Estado e particular, incumbe àquele o dever de propagar o exemplo, a fim de que haja o incentivo ao cidadão na realização de compras e atos sustentáveis. Existem aqueles que afirmam a infração das licitações sustentáveis para com o princípio da economicidade, o que de fato não ocorre, conforme demonstrado no item 4.5. Na maioria das vezes, a alternativa ecológica acarreta maiores gastos 78 aos cofres públicos, todavia, esse gasto extra é plenamente justificável com base no princípio da vantajosidade, bem como na economia futura com a melhora do meio ambiente. É necessária uma atuação ética e abrangente por parte do Administrador Público quando das análises referentes do objeto da licitação e da elaboração do edital. Em síntese, nem sempre a proposta mais vantajosa é aquela de melhor valor econômico, cabendo a esse Administrador considerar os valores e benefícios em cada caso concreto, procurando atender o preceito fundamental do direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado e as obrigatoriedades do certame. Cabe lembrar, ademais, que a qualidade de vida da sociedade é o objetivo almejado direta ou indiretamente pelo ente estatal nos processos licitatórios. Inegavelmente, o meio ambiente saudável atua como pressuposto para essa qualidade de vida, cabendo, dessa forma, exceto nos casos que se isso resulte grave aumento de valores, à Administração optar pela licitação sustentável. Infere-se que esta pesquisa atendeu aos objetivos que se propôs, ao passo que verificou a viabilidade das licitações sustentáveis em face do princípio da economicidade. O modelo atual das licitações é de adequação a um novo paradigma, advindo da evolução do comportamento e da mentalidade humana, atendendo aos anseios sociais. A rotina administrativa deve estar motivada em atender a função social, logo, vale a pena o maior desembolso no presente para economizar no futuro e entregar às próximas gerações as mesmas condições naturais atuais. Não se espera uma mudança do dia para a noite, até porque a própria noção de desenvolvimento sustentável é recente. Porém, objetiva-se que a presente pesquisa sirva de motivação para outros estudos e pensamentos, a fim de que cada vez mais o Estado preserve o meio ambiente ecologicamente equilibrado nas suas contratações. 79 REFERÊNCIAS ANTUNES, Paulo de Bessa. Direito ambiental. 14 ed. São Paulo: Atlas, 2012. ARAÚJO, Luciane Martins de. Energias Renováveis em busca da Sustentabilidade. In OLIVEIRA, Carina Costa de; SAMPAIO, Rômulo Silveira da Rocha (Org.). A economia do verde no contexto do desenvolvimento sustentável: a governança dos atores públicos e privados. Rio de Janeiro: FGV, Direito Rio, 2011. p. 213-227. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 02 nov. 2014. BRASIL. Lei nº 6.803, de 02 de julho de 1980. Dispõe sobre as diretrizes básicas para o zoneamento industrial nas áreas críticas de poluição, e dá outras providências. 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