SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL REVISTA TRIMESTRAL DE JURISPRUDÊNCIA ORGANIZADA PELO SERVIÇO DE DIVULGAÇÃO Volume 100* (Páginas 1 a 466) Abril de 1982 REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL PODER JUDICIÁRIO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Ministro Francisco Manoel XAVIER DE ALBUQUERQUE (19-4-72), Presidente Ministro João Baptista CORDEIRO GUERRA (26-9-74), Vice-Presidente Ministro DJACI Alves FALCÃO (22-2-67) Ministro José Carlos MOREIRA ALVES (20-6-75) Ministro Pedro SOARES MUNOZ (8-8-77) Ministro DECIO Meirelles de MIRANDA (27-6-78) Ministro Luiz RAFAEL MAYER (15-12-78) Ministro FIRMINO Ferreira PAZ (24-6-81) Ministro José NERI DA SILVEIRA (1-9-81) Ministro ALFREDO BUZAID (30-3-82) Ministro OSCAR Dias CORRÊA (26-4-82) COMISSÃO DE REGIMENTO Ministro DJACI FALCÃO Ministro SOARES MUNOZ Ministro OSCAR CORRÊA Ministro NERI DA SILVEIRA — Suplente COMISSÃO DE JURISPRUDENCIA Ministro MOREIRA ALVES Ministro DECIO MIRANDA Ministro RAFAEL MAYER COMISSÃO DE DOCUMENTAÇÃO Ministro MOREIRA ALVES Ministro RAFAEL MAYER Ministro NERI DA SILVEIRA COMISSÃO DE COORDENAÇÃO Ministro CORDEIRO GUERRA Ministro SOARES MUNOZ Ministro DECIO MIRANDA PROCURADOR-GERAL DA REPÚBLICA Doutor INOCÊNCIO Martires COELHO REVISTA TRIMESTRAL DE JURISPRUDÊNCIA SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL PETIÇÃO N? 66 — DF (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Interessado: Samuel Monteiro. Petição objetivando a declaração de inconstitucionalidade de dispositivos de decreto federal, por haver o Procurador-Geral da República determinado o arquivamento de representação com o mesmo objetivo. Sendo o Procurador-Geral da República o dominas Iltis da ação direta para declaração, em tese, de inconstitucionalidade de lel ou ato normativo federal ou estadual, é inadmissível a propositura direta dessa ação pelo interessado eventual nessa inconstitucionalidade. Petição indeferida. ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em indeferir a petição e determinar o seu arquivamento, nos termos do voto do Ministro Relator. Brasília, 12 de dezembro de 1979. — Antonio Neder, Presidente — Cunha Peixoto, Relator. RELATORIO Sr. Ministro Cunha Peixoto: Samuel Monteiro ingressou com a presente Petição, na qual esclarece, verbis: «1. Em 09/02/1979, o Supte. encaminhou longa exposição — fartamente corroborada em documentação sólida e idônea — ao Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da República, para provocação de Declaração de Inconstitucionalidade dos artigos 3? e 4?, ambos do Decreto Federal n? 31.794, de 17/11/1952 (Anexo n? I e documentos juntos). Em 14/02/1979, a Procuradoria Geral da República, recebeu o expediente, conforme se comprova com o Anexo n? II (A.R.). Todavia, já no dia 09/03/1979, sem qualquer justificação, sem qualquer fundamentado jurídica e sem motivação não atentando para a gravidade e a relevância jurídica da matéria — S. Exa., o Doutor Procurador-Geral da República, 2 R.T.J. - 100 Indeferiu a petição do Supte., mandando arquivá-la. Tal despacho foi publicado no Diário da Justiça de 21/03/1979, que circulou em São Paulo no dia 23/03/1979 (Anexo n? III). 4. Diante da alta relevância da matéria que está contida na cópia autêntica constante do Anexo I e documentos juntos e mesmo porque, no Sistema Constitucional Brasileiro, somente as decisões dos magistrados fazem coisa julgada, retirando — através do Plenário do S.T.F. — a norma Irrita, do campo jurídico, estamos encaminhando esta Petição a Vossa Excelência, uma vez que inócua seria própria Constituição Federal vigente, se a Declaração de Inconstitucionalidade de ato normativo federal, lel ou regulamento, dependesse única e exclusivamente da vontade do Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da República. E mesmo porque, somente o Plenário do Supremo Tribunal Federal, com quorum especifico, poderá declará-la ou não» E após argumentar no sentido da inconstitucionalidade dos dispositivos regulamentares referidos, conclui o peticionário: «9. Diante das relevantes razões de Direito consubstanciadas na cópia autêntica e documentos juntos, da exposição dirigida ao Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da República — Processo P.G.R. n? 37.896-79 — o Supte. requer a Vossa Excelência: Que seja encaminhado ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, o expediente constante da Petição e dos seus anexos, já protocolizados na Procuradoria-Geral da República, sob n? 37.896-79, — agora reproduzidos por cópia autêntica — para que se decida da Inconstitucionalidade dos artigos 3? e 4?, do Decreto Federal n? 31.794, de 17.11.1952, por violarem frontalmente o artigo 153, ff 2? e 23 da Magna Carta.» A Petição, que foi dirigida ao eminente Presidente deste colendo Supremo Tribunal e a mim distribuida, encaminhada com vistas à Procuradoria-Geral da República, recebeu o parecer de fls. 125/128, subscrito pelo nobre Procurador-Geral, Professor Firmino Ferreira Paz, que se manifestou pelo indeferimento do pedido, pois cabe exclusivamente ao Procurador-Geral da República, conforme reiterada jurisprudência deste Pretório Excelso, a iniciativa de encaminhar a representação para que se declare genericamente a inconstitucionalidade de lei, ato normativo ou ato governamental. E acrescenta não caber no caso, também, a avocatória, já que não se trata de causa, na acepção técnica do termo mas, sim, de decisão do Procurador-Geral tomada em processo administrativo referente a representação que lhe foi encaminhada pelo peticionário, conforme já ficou decidido na Reclamação n? 95-8-SP (Ementário do STF n? 1.125-1). Juntou ainda o peticionário os documentos de fls. 139/142, tendo o nobre Procurador-Geral se manifestado novamente pelo indeferimento do pedido (fls. 144/45), nos seguintes termos, verbis: «Entretanto, a Petição está predestinada a arquivamento porque seu único objetivo é provocar a avocação, pelo Colendo Supremo Tribunal Federal, de processo administrativo cuja decisão é de competência, constitucionalmente definida, do Procurador-Geral da República. Não se trata, aqui, de causa processada perante outros juizos ou Tribunais, mas sim de procedimento administrativo de R.T.J. —100 argüição de inconstitucionalidade de Lei em tese em que apenas o Procurador-Geral da República é o senhor do exame do cabimento de pedir a prestação jurisdicional. E submetida a argüição de inconstitucionalidade a sua decisão, entendeu de não propor a ação direta por não vislumbrar a inconstitucionalidade argüida. Em conseqüência, determinou o arquivamento do pedido. Não tendo remédio recursal, o interessado usou do direito de petição, mas fé-lo impropriamente, objetivando avocatória não prevista na Constituição Federal.» E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto, (Relator): 1. O peticionário encaminhou representação à Procuradoria:Geral da República objetivando a propositura, por esse Orgão, de ação direta para que fosse declarada a inconstitucionalidade dos arts. 3? e 4? do Decreto Federal n? 31.794, de 17.11.1952. O Sr. Procurador-Geral da República, entretanto, por não vislumbrar a pretendida inconstitucionalidade, determinou, mediante despacho exarado no expediente, o arquivamento do pedido. Irresignado, ingressou o requerente com a presente Petição, postulando diretamente perante este Pretório Excelso o exame da matéria, com a conseqüente declaração da inconstitucionalidade dos dispositivos regulamentares já referidos. 2. Nos termos dos dois pareceres subscritos pelo nobre ProcuradorGeral, Professor Firmino Ferreira Paz, é totalmente insubsistente o pedido. Já se firmou a jurisprudência deste Pretório Excelso no sentido de que, sendo o Procurador-Geral da 3 República constitucionalmente o dominus litis da ação direta para que seja declarada em tese a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo federal ou estadual ( art. 119, I, letra L da EC n? 1/69 — Redação dada pela Emenda n? 7/77), cabe-lhe decidir da conveniência ou não do atendimento das representações que lhe forem dirigidas com esse objetivo. Pelo mesmo motivo, não pode o representante, ao ver indeferida a sua pretensão pelo Procurador-Geral, vir diretamente ao Colendo Supremo Tribunal pleitear a declaração dessa inconstitucionalidade, já que lhe falta legitimidade para propor diretamente esse tipo de ação. De igual modo, como bem esclareceu a Procuradoria-Geral, amparada em precedente deste Colendo Supremo Tribunal, não é caso de avocatória, pois inexiste, na acepcão técnico-processual, causa proposta perante qualquer juízo ou tribunal, já que a representação feita junto à Procuradoria-Geral e a decisão nela exarada são meros atos administrativos, estranhos à esfera do Poder Judiciário. Indefiro o pedido e determino o arquivamento do processo. EXTRATO DA ATA Pet. 66 — DF — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Interessado: Samuel Monteiro. Decisão: Indeferiu-se a petição e determinou-se o seu arquivamento, nos termos do voto do Ministro Relator. Decisão uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Muiloz, Decio Miranda e Rafael Mayer. Ausente, licenciado, o Sr. Ministro Lei- R.T.J. - 100 4 Brasília, 12 de dezembro de 1979 — tão de Abreu. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Dr. Alberto Veronese Aguiar, SecreUri°. Paz. AÇÃO CIVEL ORIGINÁRIA N? 142 — Si' (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Soares Mufioz. Autor: Instituto Nacional de Previdência Social — Réu: Estado de São Paulo. Ação Cível Originária. Incompetência. — Verificada a incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar originariamente ação civel, deverá ela ser declarada, ainda que a competência tenha sido reconhecida em decisão anterior. E que as decisões, que rejeitam preliminar de incompetência absoluta no curso do processo, são sempre de cognição incompleta, no sentido de que, até o julgamento final da causa podem ser modificadas. ACORDÃo Vistos, Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, à unanimidade de votos, e na conformidade das notas taquigráficas; acolher a exceção de incompetência e determinar a remessa dos autos à Justiça Federal do Estado de São Paulo. Brasília, 13 de novembro de 1980 — Antonio Neder, Presidente — Soares Muiloz, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Soares Mufloz: O Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários e Empregados em Serviços Públicos propôs, em 1965, ação ordinária de cobrança contra o Estado de São Paulo, para haver deste as contribuições que lhe cabem como empregador, referentes aos meses de julho a dezembro de 1959, no montante de Cr$ 26.418.393,00, além dos juros moratórios vencidos após 30-04-60, na taxa de 7% ao ano até 04-09-60, e dai em diante à taxa de 1% ao mês. Contestada a ação, o Dr. Juiz de Direito da 1! Vara da Fazenda Nacional, ao ensejo do despacho saneador, deu-se por incompetente para conhecer da causa e determinou a remessa dos autos ao Supremo Tribunal Federal ( fls. 25). A Corte, em acórdão de 07-10-1970, relatado pelo eminente Ministro Di aci Falcão, reconheceu a sua própria competência, recebendo embargos deciaratórios à decisão anterior que determinara a devolução do processo ao juizo de origem. O acórdão, proferido nos embargos declaratórios, está encimado pela seguinte ementa: «Ementa: Embargos de declaração. Seu recebimento, em face da existência de ponto contraditório (art. 862 do Código de Pro- R.T.J. — 100 cesso Civil), Reconhecimento da competência do Supremo Tribunal Federal, para processar a ação.» ( fls. 48). A fls. 49 dei por saneado o processo, salientando que as preliminares suscitadas na contestação se acham vinculadas com o mérito, e determinei, depois de julgar legitimas as partes, se abrisse vista, sucessivamente, ao autor, ao réu e ao Dr. Procurador-Geral da República, para arrazoarem os dois primeiros e apresentar parecer o terceiro, todos no prazo de cinco dias. O Instituto alegou que, em face do decurso do tempo, os valores em cobrança são outros e que a correção monetária, pedida na inicial, deverá ser aplicada a partir da vigência da Lei n? 4.357, de 16-07-1964. O Estado de São Paulo, de seu turno, sustentou, em síntese, que é ilegal o pedido do autor, porquanto a empregadora nada deve pagar a C.A.P. pelas jóias e aumentos de vencimentos dos empregados. Pede, por fim, que, se não declarada prescrita, seja a ação a final julgada improcedente e condenado o autor nas custas e em honorários advocaticios. A Proclaradoria-Geral da República, em parecer aprovado pelo seu eminente titular e elaborado pelo ilustre Procurador Walter José de Medeiros, argüiu a incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar originariamente a causa e postulou a devolução dos autos à Justiça Federal de 1? Instância de São Paulo, verbis: «Pelo acórdão cuja ementa se lê às fls. 48, conclui-se ter o Supremo Tribunal reconhecido sua competência para processar ação ajuizada nos idos de 1965, pelo então Instituto de Aposentadoria e Pensões dos Ferroviários e Empregados em Serviços Públicos, contra a Fa- zenda Pública do Estado de São Paulo, para cobrança de contribuições referentes aos meses de julho a dezembro de 1959, de que a Ré se tornou devedora, em face de disposições regulamentares que sujeitaram os servidores da Estrada de Ferro Sorocabana, de propriedade do Governo paulista, ao regime de previdência social do Autor. Essa decisão plenária da Excelsa Corte, tomada, em 15 de abril de 1970, por composição inteiramente diversa da atual, já que de seus integrantes só remanescem os eminentes Ministros Djaci Falcão e Thompson Flores (fl. 36), reflete a orientação então dominante no Tribunal acerca da exegese do art. 119, I, d, da Constituição Federal, com redação que, dada pela Emenda n? 1, de 17 de outubro de 1969, daquela data até esta parte não 'mais alterou. Modificou-se, porém, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que, hoje, a respeito da norma constitucional aludida, tem como pacifico o entendimento sobre sua incompetência para processar e julgar causa entre, de um lado, autarquia federal — como é o caso do autor, hoje substituído pelo INPS — e, de outro, Estado Federado onde aquela esteja situada ou tenha representação. Desse teor, por exemplo, é o acórdão proferido na Ação Cível Originária n? 238, relator o Exmo. Sr. Ministro Latão de Abreu, que fé-lo encimar com ementa assim redigida: «Ação Civel Originária intentada pelo Instituto Nacional de Previdência Social contra o Estado de Santa Catarina. Embora se trate de entidade autárquica com sede fora do Estado nele possui superintendência e Procuradoria. Diante disso, a competência para processar e julgar 5 R.T.J. — 100 6 não é do Supremo Tribunal Federal, mas da Justiça Federal Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal quanto à interpretação do artigo 119. I, d, da Constituição Federal» (DJ de 13-6-77, pág. 3.899). Nessa mesma trilha poderiam ainda ser invocadas as decisões proferidas nas ações cíveis originárias n?s 169, 201, 230, 282, 283, 285 e 289. Não cabe, por outro lado, objetar com a existência do venerando acórdão de f. 44, porquanto a incompetência absoluta, como preleciona a doutrina, não se prorroga, devendo, nos termos do art. 113 do CPC, ser declarada de oficio e podendo ser alegada em qualquer tempo e grau da jurisdição. Dal a nulidade que se impõe declarada, até mesmo ex officio, daquele v. decisório, pois, em matéria de competência absoluta, de ordem eminentemente pública, não há falar em preclusão. Não é outro, a propósito, o ensinamento de Hélio Tornaghi, em escólio ao artigo 245 do Código de Processo Civil, quando afirma que, «no plano processual as nulidades absolutas são declaráveis de oficio e a qualquer tempo ficando a salvo da preclusividade». Nestas condições, quer o Ministério Público Federal, por este seu representante, argüir, em face da jurisprudência invocada, a incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar originariamente a demapda, declarada, em conseqüência, a nulidade do v. acórdão de f. 44 e seguintes. Requer-se, ainda, com apoio no art. 113, § 2? do CPC, a remessa dos autos à Justiça Federal de São Paulo, a competente para o processo e julgamento da (fls. 63 a 65). E o relatório. -ação.» VOTO O Sr. Ministro Soares Mutloz (Relator): O acórdão de fls. 48 deste Plenário não impede que seja reexaminada a questão atinente à incompetência absoluta do Supremo Tribunal Federal para processar e julgar a causa. E que as decisões, que rejeitam preliminar de Incompetência absoluta no curso do processo, são sempre de cognição incompleta, no sentido de que, até o julgamento final, podem ser modificadas. O Prof. Galeno Lacerda, na sua tese de concurso O Despacho Saneador, salienta: «O problema da preclusão de decisões no curso do processo é substancialmente diverso do problema da preclusão das decisões terminativas. Enquanto nestas o magistrado esgota a jurisdição extinguindo a relação processual, naquelas ele conserva a função jurisdicional, continua preso à relação do processo. Em face desta premissa, a pergunta se impõe: Pode o magistrado, que conserva a jurisdição, fugir ao mandamento de norma imperativa, que o obriga a agir de oficio, sob pretexto de que a decisão interlocutória precluiu? Reconhecido o próprio erro, poderá a falta de impugnação da parte impedi-lo de retratar-se? Terá esta, com sua anuência, tal poder de disposição sobre a atividade ulterior do Juiz? A resposta, evidentemente, no caso, deve ser negativa. Se o juiz conserva a jurisdição, para ele não R.T.J. — 100 preclui a faculdade de reexaminar a questão julgada, desde que ela escape à disposição da parte, por emanar de norma processual imperativa. Dai se conclui que a preclusão no curso de processo depende, em última análise, da disponibilidade da parte em relação à matéria decidida. Se indisponível a questão, a ausência de recurso não impede o reexame pelo juiz. Se disponível, a falta de impugnação importa concordância tácita à decisão. Firmase o efeito preclusivo não só para as partes, mas também para o juiz, no sentido de que vedada se torna a retratação. Comprovemos, porém, a exatidão da tese, mediante o exame de casos concretos. Inicialmente, consideremos questões relativas à nulidade absoluta do ato processual. Poderá precluir a decisão que repele nulidade dessa ordem? Evidentemente, não. Verificado o erro, a qualquer tempo deverá o juiz retratar-se, a fim de cumprir a norma imperativa ditada pelo interesse público. Assim, embora haja pronúncia judicial no sentido da validade do ato, poderão ser sempre reexaminadas questões relativas à incompetência absoluta, à suspeição, à litispendência, à ausência de juízo prejudicial necessário, à falta de personalidade da parte, à prática de ato do oficio por não-serventuário, à fraude do processo. Tais vidos tornam absolutamente nulo o ato processual, e a decisão interlocutória que errôneamente o considerasse válido nenhuma eficácia teria» (fls. 160/162). 7 Se assim é no tocante ao Juiz de primeiro grau, assim também deve ser em relação aos Tribunais nas ações de sua competência originária. Verificada a incompetência absoluta, deverá ela ser declarada, ainda que a competência tenha sido reconhecida em decisão anterior, que, como já disse, não tem efeito preclusivo. Ante o exposto e pelo aduzido no parecer, acolho a preliminar de incompetência e determino a devolução dos autos á Justiça Federal de 1? grau em São Paulo. EXTRATO DA ATA ACOr. 142 — SP — Rel.: Min. Soares Mufioz. Autor: Instituto Nacional de Previdência Social. (Advs.: Olavo de Castro e outros). Réu: Estado de São Paulo. (Advs.: Luiz Rangel de Freitas e outro). Decisão: Acolheu-se a exceção de incompetência e determinou-se a remessa dos autos à Justiça Federal do Estado de São Paulo. Decisão uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão. Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, Decio Miranda e Rafael Mayer. Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Cordeiro Guerra. ProcuradorGeral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 13 de novembro de 1980 — Alberto Veronese Aguiar, Secretário. — 100 REPRESENTAÇÃO N? 955 — PR (Tribunal Pleno) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Rafael Mayer. Representante: Procurador-Geral da República — Representada: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Funcionalismo. Adicional por tempo de serviço. Lei estadual (constiturionalidade). Constituição Federal, art. 13, V (interpretação). Limites máximos de remuneração. Os Estados estarão adstritos, em obervtincia ao art. 13, V, In fine, da Constituição, aos limites máximos de remuneração estabelecidos em lel federal, entendida como lei com essa matéria especifica, e com expressa destinaçâo ao plano das entidades federadas. Não tem correspondência com a previsão constitucional a lei federal, que, simplesmente voltada para a circunscrição administrativa da União, limita-se a estabelecer remuneração dos servidores federais. Representação julgada improcedente. ACOFtDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, na Sessão Plena, na conformidade da ata de julgamentos e notas taquigráficas, por maioria de votos, julgar improcedente a Representação. Brasília, 20 de maio de 1981 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Rafael Mayer, Relator para o Acórdão. RELATÓRIO O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O eminente Sr. ProcuradorGeral da República representa no sentido de o Supremo Tribunal declarar a inconstitucionalidade do inciso II, do art. 70, da Constituição do Paraná com a Emenda n? 3/71. Leio na f. 8 o texto integral do sobredito art. 70: «Art. 70 — O funcionário terá acréscimo aos vencimentos: I — de cinco em cinco anos de exercício, cinco por cento, até completar vinte e cinco por cento; II — ao completar trinta anos de exercício, cinco por cento por ano excedente, até o máximo de vinte e cinco por cento. — A incorporação dos acréscimos será imediata, inclusive para efeito de aposentadoria, e será computada igualmente sobre as alterações dos vencimentos. — São reconhecidas as mesmas vantagens aos integrantes das corporações militares». Informando a respeito do assunto, fé-lo assim o nobre Presidente de Assembléia Legislativa do Paraná (folhas 19 a 22): «2. A aludida representação pretende seja declarada a «inconstltucionalidade do inciso II, f10 art. 70, da Emenda n? 3/71 à Constituição do Estado do Paraná, que, permitindo ao funcionário estadual, ao completar 35 anos de servico, perceber 50% de acréscimo aos vencimentos, considerando que já o inciso I do mesmo artigo assegura 25% de adicionais nos primeiros 25 anos de serviço, viola a regra imperativa do art. 13, inciso V, da Emenda Constitucional n? 1/69, tendo em R.T.J. — 100 vista que a lei federal reguladora da concessão de adicionais ao servidor público federal (Lei 4.345, de 26-6-64) estabelece um máximo de 35% concedidos, parceladamente, à razão de 5% por qüinqüênio de efetivo exercício (art. 10 da Lel n? 4.345)». «3. Se a norma federal apontada devesse ser aplicada ao funcionário público estadual, por força do art. 13, inciso V, da Constituição Federal, como sustenta a representação, ela deveria representar, não um máximo, mas um mínimo de garantia para o funcionário estadual, de acordo com a doutrina e o entendimento da nossa Corte Suprema. «3.1. Ao comentar o dispositivo constitucional em apreço, o prof. Manoel Gonçalves Ferreira Filho, titular da cadeira de Direito Constitucional da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, sustenta que «As normas referentes aos funcionários públicos (Vide infra arts. 97 e seguintes) são estendidas pela Constituicão aos funcionários estaduais e municipais. Gozarão estes, pois, no mínimo, dos direitos e vantagens constitucionalmente atribuídos aos funcionários federais. Seus direitos e vantagens não poderão, Jamais, ser menores, conquanto possam ser maiores». (Os gritos são nossos). (Comentários á Constituição Brasileira, vol. 1?, pág. 135)». «3.2. Esse entendimento está de acordo com a orientação do Supremo Tribunal Federal, no sentido de que as garantias e direitos estabelecidos nas normas federais constituem um mínimo para o funcionário estadual ou municipal. 9 «No Recurso Extraordinário n? 77.993, de Mato Grosso, o seu ilustre relator, Ministro Thompson Flores, declarou que «Óbice não existe na Carta em questão (Constituição Federal) que permite a contagem do referido tempo para o fim mencionado (recebimento de adicional). bastante que o Estado o admita. A expressão constitucional é um mínimo». (in Rev. Trimestral de Jurisprudência, vol. 74/157). «3.3. Nesse mesmo Julgamento, o Min. Xavier de Albuquerque assim se pronunciou: também entendo que o art. 102, 3?, da Constituição, assegura a contagem recíproca e integral do tempo de serviço federal, estadual e municipal, para os efeitos de aposentadoria e disponibilidade, mas não exclui nem proíbe que a legislação da União, do Estado ou do Município possa mandar computá-lo para efeitos que não os da inativação». (In Rev. Trimestral de Jusrisprudénela, vol. 74/158). «3.4. O Recurso Extraordinário n? 80.078, de que foi relator o Min. Leitão de Abreu, tem a ementa seguinte: «Funcionário público. Tempo de Serviço. O art. 102, 3?, da Emenda Constitucional n? 1/69, não é limite máximo, no sentido do art. 13, V, dessa Carta Politica, mas garantia mínima do funcionário. A pessoa de Direito Público não pode restringir essa garantia, mas não está impedida de computar o tempo de serviço para outros efeitos». (In Rev. Trimestral de Jurisprudência, vol. 73/963). «3.5. De acordo com esse entendimento, o fato de a norma federal 10 R.T.J. — 100 conceder, aos funcionários federais, 35% de adicionais por tempo de serviço, não impede que o legislador estadual conceda maior percentagem de adicionais ao funcionário estadual. O que ela não poderia fazer é dar menos do que foi atribuído ao funcionário federal. «4. Ressalte-se, neste passo, que a autorga de adicionais por tempo de serviço em percentagem superior à estabelecido na Lei n? 4.345, Para o funcionalismo federal, não constitui uma peculiaridade paranaense adotada em suas constituições desde a de 1947. Outros Estados pela sua legislacão ordinária, também assim têm procedido. Outros, ainda, o asseguram em suas constituições, como a do Acre, art. 91, VIII; a de Mato Grosso, art. 121, XII; e a de São Paulo, art. 92, VIII. Também o Senado Federal, pela sua Resolução n? 58, de 1972, em seu artigo 392, garante, aos seus servidores, adicionais por tempo de serviço bem superiores aos estabelecidos na Lei 4.345 citada. «4.1. Todos os Estados, que assim procedem, estão agindo regularmente, dentro da sua esfera de competência. A gratificação adicional por tempo de serviço constitui matéria integrante do regime jurídico do funcionário estadual e este é da competência residual dos Estados. Excluídas as restrições de natureza constitucional e aquelas decorrentes de leis ordinárias expressamente referidas na Constituição, o que sobra é da competência residual dos Estados e Municípios. Estabelece a Constituição (art. 109) que lei federal definirá o regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios, o que significa que, aos Estados e Municípios, deferiu a competência para legislar sobre o regime jurídico de seus servidores, no qual se inclui, como já foi dito, o adicional por tempo de serviço. «4.2. Por isso mesmo, o Estatuto dos Funcionários Públicos da União, embora seja norma federal, não substitui os estatutos dos funcionários públicos estaduais ou municipais, que continuam em plena vigência. Também a recente norma federal, que instituiu a contagem recíproca de tempo de serviço na atividade pública e particular para efeito de aposentadoria, não se estende ao funcionalismo estadual e municipal. Igualmente, pelos mesmos fundamentos, não se pode admitir a aplicação, ao funcionalismo estadual e municipal, da norma do art. 10, da Lei n? 4.345. «4.3. Não é outro o entendimento do Prof. Celso Antonio Bandeira de Mello. Em simpósio realizado em São Paulo, em 1970, sobre o regime dos servidores públicos municipais ante a Emenda Constitucional n? 1/69, teve ele a oportunidade de examinar a disposicão do art. 13, V. E afirmou: «Entendo eu que o art. 13, V, só pode ser bem interpretado, se conjugadamente com os arts. 108 e 109, da Carta Constitucional de 1967, com a redação que lhe deu a Emenda n? 1, de 69. Diz o art. O disposto nesta seção aplica-se aos funcionários dos três Poderes da União e aos funcionários, em geral, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios. E diz o art. Lei Federal, de iniciativa exclusiva do Presidente da República, respeitado o art. 97 e seus 1? e no 2? do art. 108, definirá: I. o regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios; II. a forma e as condições de provi- R.T.J.— 100 mento dos cargos públicos; e III. as condicões para aquisição de estabilidade. São portanto três artigos que devem ser interpretados em conjunto. Não vejo nenhuma espécie de razão para o art. 108, que manda aplicar a Estados e Municípios o disposto nesta seção; não vejo nenhuma outra razão para esse dispositivo, senão a aceitação que tomo eu, mais como expressa do que como implícita, de que os Estados e Municípios organizam o regime de seus servidores do modo que lhes aprouver, desde que respeitados os princípios consagrados nesta seção. E mais me fortaleço neste entendimento, ao considerar que o art. 109 estabelece que, através de lei federal, se estabelecerá o regime jurídico, o estatuto dos funcionários da União, o que torna claro que não é lei federal que o estabelecerá para os Estados e Municípios, se necessário fosse ainda aduzir este último argumento». «... se for preciso acrescentar ainda alguma coisa, eu referiria aquele principio interpretativo do texto constitucional, que aceitamos funcionasse como critério hermenêutico, qual seja o de que a autonomia municipal é princípio prestigiado pela nossa lei maior e, em conseqüência, em casos onde dúvida de interpretação pudesse existir, no concernente à matéria em principio incidente no âmbito do Município, repito, quando dúvida pudesse haver, prevaleceria a inteligência que prestiglasse o principio da autonomia municipal». (In Revista de Direito Público, vol. 14, págs. 317/18). (Os grilos são nossos). E prossegue mais adiante: «Eu entendo por regime jurídico a disciplina feita pelo direito 11 das relações entre funcionário e Estado; entendo toda e qualquer disciplina e não apenas a constitucional. Há um regime jurídico constitucional e há um regime jurídico, que, por certo, há de se afinar ao regime constitucional, mas que é mais amplo». (Revista de Direito Público, vol. 14, pág. 321). Como entendo que regime jurídico do servidor público é uma expressão bastante ampla e que se refere a toda e qualquer disciplina das relações entre funcionário e Estado, não se restringe evidentemente ao regime jurídico constitucional, quer dizer, as normas constitucionais que disciplinam as relações entre funcionário e Estado. Havendo, pois, um conceito de regime jurídico constitucional do funcionário, entendo que o regime jurídico do funcionário público da União não se aplica obrigatoriamente a Estados e Municípios. Entendo que o regime jurídico constitucional, como é absolutamente óbvio, se aplica aos Estados e Municípios e não me pareceria necessário sequer que se tivesse dito que se aplicaria a Estado e Municípios. De maneira que, sendo o cerne da nossa discussão, o problema do conceito de regime jurídico, coloco agora, inclusive para demonstrar que não se esgota de modo nenhum a delimitação de direitos e deveres de servidores naquilo que está no texto constitucional. Darei exemplos absolutamente normais: o problema da licença prêmio, o problema da conversibilidade ou não da licença prêmio, o problema do gozo ou não de férias no mesmo ano ou o da necessidade de já haver completado um ano para poder gozar férias, o adicional por tempo de serviço, há uma série de direitos e deveres e pode haver uma série de proibições, 12 R.T.J. — 100 de limitações ao exercício de atividades por parte do funcionário, estabelecidas no Estado, no Município, à luz da conveniência, à luz até das peculiaridades locais. E tudo isso, no meu modo de entender, são direitos e deveres fixados na via constitucional. Sendo assim, colocar-se-ia a questão de se saber se o regime jurídico, isto é, o conjunto de direitos e deveres de funcionários estaduais e municipais será o mesmo que o estabelecido pela União para seus servidores, para seus funcionários, ou pelo contrário. Estados e Municípios têm se restringido unicamente, como é óbvio, em obediência àqueles princípios na Constituição consagrados. Opto pela inteligência de que Estados e Municípios têm plena liberdade na determinação de seus direitos, do regime juridko de seus funcionários, respeitados os princípios constitucionais, por esse acervo de razões, que já enuncie e considero que seria ocioso repetir. (Os grifos são nossos). (Revista de Direito Público, vol. 14, pág. 322). «4.4. Nesse simpósio compareceu o Ministro Seabra Fagundes, que, a respeito da matéria focalizada, emitiu os seguintes conceitos: «... tudo gira em torno de saber se o regime jurídico dos servidores estaduais e municipais é apenas regido pela Constituição e por leis federais ou pela Constituição e leis locais. Eu tenho a impressão que o regime jurídico dos servidores dos Estados e dos Municípios sofre uma dupla regência. Ele é regido pela Constituicão nos seus princípios básicos fundamentais e eventualmente pela lei federal, quando prevista aqui na própria Constituição, explicitamente na Constituição. Mas há um resíduo para esse regime, que fica à lei local, dentro daquela exemplificação do Bandeira de Mello. Quer dizer: há coisas que não têm cabimento na lei federal, porque a Constituição não deferiu à lei federal esta matéria. Então esse resíduo fica para a lei local. Então em relação à licença-prêmio, adicional, a lei local é que vai dispor a respeito. Isso é regime do funcionário, é relação do funcionário com o empregador, que, no caso, é o Estado ou o Município». (In Revista de Direito Público, vol. 14. págs. 323/24). «4.5. Desse modo, tendo em vista que a disposicão do artigo 10, da Lei Federal n? 4.345, não está expressamente prevista na Constituição Federal e, ainda, que a gratificação adicional por tempo de serviço, constituindo matéria componente do regime jurídico dos funcionários estaduais, pertence à competência residual dos Estados, — é indiscutível que ela não se aplica aos servidores estaduais, devendo a representação ajuizada, por isso mesmo, ser julgada improcedente». Em seu parecer de folhas 24 a 28, sustentou o nobre Procurador-Geral da República: Reservando-se para uma análise ulterior do mérito, esta Procuradoria-Geral argüiu a inconstitucionalidade do artigo 70, inciso da Constituição do Estado do Paraná, que concede ao servidor público local, a partir do trigésimo ano de serviço, adicionais à razão de 5% ao ano, fazendo destarte com que o montante da vantagem alcance o índice ao cabo de trinta e cinco anos de trabalho. A peça inicial ponderou que, na esfera da União, por força da Lei n? 4.345/64 esse adicional ia- R.T.J. — 100 mais ultrapassa a ordem dos 35%, limite que seria aplicável ao serviço público dos Estados federados á luz do art. 13, Inciso V, da Constituição da República. Prestando informações, a Presidência da Assembléia Legislativa do Estado do Paraná ilustra seu texto com jurisprudência dessa alta Corte e com selecionada doutrina. A primeira não trata especificamente do tema em debate. A segunda, porém, aborda-o com percuclência, mas não logra convencer da legitimidade do dispositivo impugnado. O problema da extensão das normas da Constituição Federal, em matéria de funcionalismo, aos Estados e Municípios, tem sofrido entendimento variável, quer na doutrina, quer na jurisprudência, inclusive na deste colendo Supremo Tribunal Federal. Comprova-o a afirmação do eminente Ministro Luiz Gallotti, nestes termos, verbis: «A doutrina de que as Constituições Estaduais não podem restringir, mas podem ampliar os direitos outorgados aos funcionários públicos pela Constituição Federal existiu realmente e teve apoio do Supremo Tribunal, mas foi derrogada por textos legais supervenientes». (RTJ vol. 58, pág 306). E também a lição de Hely Lopes Meirelies, quando adverte, verbis: «Se até a Constituição de 1967 os dispositivos constitucionais pertinentes ao funcionalismo eram vistos apenas como mínimos de garantia dos servidores públicos e só se impunham integralmente por recomendação da boa doutrina e pela moralizadora 13 orientação jurisprudencial, a partir de então passaram a ser normas de observância obrigatória em todas as esferas administrativas, situação mantida pela Emenda de 1969 (Constituição da República, arts. 13, V, e 108). Com isso, fica prejudicada qualquer discussão sobre a possibilidade de sua restrição ou ampliação, uma vez que, atualmente, constituem mesmo «um código de direitos e obrigações fundamentais que devem ser respeitados pelos Estados e Municípios (e, também, pela União, acrescentamos) em suas leis ordinárias», como ensina Themistocles Cavalcanti. » (Direito Administrativo Brasileiro, 4, ed., pág. 393). Não significa esse entendimento que os Estados tenham perdido sua autonomia para regular suas relações com seus servidores, mas, tão-somente que, ao d1scipliná-las estão obrigados a respeitar os princípios constitucionais especificados na Constituição Federal. Daí, a liberalização do entendimento deste colendo Supremo Tribunal, de que nos dão conta os julgados citados e parcialmente transcritos nas Informações da egrégia Assembléia Legislativa, quando admitiram a legitimidade de leis estaduais que prescreveram a contagem recíproca do tempo de serviço para efeito de percepção de adicionais, e não só para aposentação ou disponibilidade. a. E o retorno declarado ao principio de que a Constituição Federal estabelece apenas os limites mínimos quanto a direitos e vantagens dos funcionários, podendo as Constituições de leis estaduais ultrapassá-los, em beneficio de seus servidores. 14 R.T.J. — 100 Data venta, entendemos que, se é certo que o art. 109 da Constituição, referindo-se apenas aos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios, assegurou a autonomia dos Estados para regular o regime jurídico de seus servidores, não menos certo é que os artigos 13, V, e 108, tornam obrigatório o respeito pelo Estado dos princípios constitucionais referentes aos funcionários públicos. Entre esses princípios, de obediência obrigatória, não apenas como um mínimo, mas, expressamente, como um máximo, está o previsto no art. 13, V, parte final, quando preceitua, verbis: «V — as normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal». não há que falar, aí, em garantia minima, pois expressamente proibiu a Constituição Federal que fosse atribuída aos funcionários estaduais e municipais remuneração superior aos limites máximos estabelecidos em lei federal. Não se cuida, aqui, sequer do limite de remuneração que vigorou até época recente, mas já desaparecido, que fixara em 90% dos vencimentos de Ministro de Estado a remuneracão dos servidores públicos federais. «14. Determina o transcrito inciso V, do art. 13 da Constituição, a observância dos limites máximos estabelecidos ( tudo no plural) na lei federal, ou seja, os diversos limites fixados para cargos ou funções idênticas. Assim, não podem um Promotor, um Juiz de Direito, um Delegado de Polícia, um Fiscal de Tributos, etc. estaduais perce- ber remuneração superior à fixada em lei federal para os mesmos cargos ou seus equivalentes. Essa matéria, ou seja, remuneração de servidores, é a única em que os Estados são obrigados a respeitar, não apenas os princípios constitucionais referentes aos funcionários, mas o limite estabelecido em lei federal, nos termos do inciso V, do art. 13, da Constituição. No que diz respeito à gratificação adicional por tempo de serviço, os chamados qüinqüênios, portanto, previstos e fixados em lei federal pode a lei estadual instituíla para os servidores do Estado, mas observado o limite máximo estabelecido naquela lei. Assim se a Lei n? 4.345/64, que a disciplina, estabelece gratificação de 5% por qüinqüênio de serviço, até o máximo de 7 (sete) qüinqüênios, representando o total de 35% sobre os vencimentos, inconstitucional, em face da Constituição Federal é a Constituição do Estado do Paraná (art. 70, II), quando os concede de forma a que, com o mesmo tempo de serviço — 35 anos — os adicionais atinjam a 50% dos vencimentos, pois ultrapassa o limite máximo fixado pela lei federal correspondente. Assim, pelas razões expostas, opinamos no sentido de que se julgue procedente a Representação, para, declarar a inconstitucionalidade no art. 70, II, da Constituição do Estado do Paraná». II — o relatório a ser copiado pela Secretaria para cumprir a segunda parte do art. 177 do Regimento Interno. VOTO O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O art. 13, caput, da Constituição de 1967 com a Emenda n? 1 de R.T.J. — 100 1969, expressa que o Estado-membro deverá organizar-se e reger-se pela Carta Política e leis que adotar, desde, porém, que respeite os princípios estabelecidos naquela Constituição, e, ainda, os que se acham indicados na referida norma. Dentre os princípios a que se reporta o mencionado preceito está incluído, no seu inciso V, o de o Estado-membro aplicar, ao servidor estadual e ao municipal, os limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal. Sucede, porém, que a Constituição do Paraná de 8 de maio de 1967 com a Emenda Constitucional n? 3 de 29.5.1971 veio a dispor, no seu art. 70, II, que ao completar trinta anos de exercício, o funcionário terá direito a uma gratificação de cinco por cento ao fim de um ano excedente, até o máximo de vinte e cinco por cento. Ora, do que dispõe a citada regra da Constituição paranaense bem se vê que o seu texto concede uma gratificação adicional por tempo de serviço que é maior do que a prevista no art. 10, caput, da Lei Federal n? 4.345, de 26.6.1964, para os funcionários da União, visto que esta última é clara no exprimir que a gratificação adicional por tempo de serviço prevista no art. 146 da Lei n? 1.711, de 28.10.52 tem o limite de cinco por cento ao fim de cada qüinqüênio, isto é, até , trinta e cinco por cento no máximo, quando é certo que a discutida regra paranaense concede, ao funcionário que completar trinta anos de serviço, um adicional de cinco por cento ao ano, donde a conclusão de que, aos trinta e cinco anos de serviço, receberá o funcionário do Paraná o adicional de cinqüenta por cento calculado sobre o quanto de seus vencimentos. Deve reconhecer-se, pois, que o questionado preceito da Constituição do Paraná é contrário ao padrão federal e, por isto, não pode subsistir. 15 Note-se que o art. 13, V, da Constituição Federal de 1967 com a Emenda n? 1, de 1969, expressa que os Estados-membros devem respeitar os limites máximos de remuneração estabalecidos em lei federal. Por conseguinte, não se tem como sustentar o entendimento da eg. Assembléia Legislativa do Paraná, segundo o qual a limitação imposta no art. 13, V, da Constituição Federal de 1967, com a Emenda Constitucional n? 1, de 1969, diz respeito com o mínimo da remuneração estabelecida em Lei Federal, e não com o máximo dessa remuneração. O referido entendimento Importa no extirpar do texto federal agora discutido a locução limites máximos, e uma tal extirpação não pode ser feita pelo Intérprete Os precedentes a que se reporta, em suas informações, a eg. Assembléia Legislativa do Paraná, versaram temas diferentes do agora questionado, e, por isto, não lhe são aplicáveis. Com efeito, no RE n? 77.993, de Mato Grosso, pelo que se lê na RTJ, 74/154 a 158, o STF discutiu e Julgou a questão de ser admissivel, para o efeito de se aumentar o quanto da gratificação adicional, a contagem do tempo de serviço que certo Juiz prestou a outro Estado. Julgou-se nesse acórdão que se pode computar, nos termos da legislação mato-grossense, o tempo do serviço federal e municipal que um Juiz de Mato Grosso prestou em antes do seu ingresso na Magistratura desse Estado, isso para o efeito de se lhe conceder a gratificação correspondente a esse tempo, visto que o 0 3?, do art. 102, da Constituição Federal de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, não proíbe o seu cômputo para outros efeitos. 16 R.T.J. — 100 Vê-se que o referido precedente desta Corte não questionou o tema de ser proibido ao Estado-membro ultrapassar os limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal. E de se dizer o mesmo no tocante ao segundo precedente indicado pela eg. Assembléia Legislativa do Paraná, qual seja o acórdão que o STF proferiu no julgamento do RE n? 80.078, também de Mato Grosso, acórdão esse que discutiu a mesma questão versada no anterior, e a Julgou afirmando que o Estadomembro pode admitir a contagem do tempo de serviço público federal ou municipal para outros efeitos que não os previstos no art. 102, § 3?, da Constituição Federal de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, e que uma tal contagem não é contrariante do art. 13, V, da referida Carta Política. A matéria proposta nesta representação é a que diz respeito com o limite máximo da remuneração estabelecias em lei federal, limite que o Estado-membro deve observar, e não, claro isto, aos efeitos que produz o cômputo do serviço público federal, estadual ou municipal. Quaisquer que sejam tais efeitos, eles devem corresponder a uma certa quantia, e essa quantia não pode ultrapassar o limite fixado em lei federal. Pelo que se lê no art. 13, V e VI, da Constituição de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, o constituinte adotou o critério de proibir que os funcionários estaduais e municipais percebam remuneração que seja superior à dos funcionários federais, e, também, o de vedar que os deputados estaduais recebam subsídios e ajuda de custo em quantia maior do que a prevista em lel para os deputados federais. Trata-se de critério político. para obstar que, no ponto, o Estado-fnembro possa conferir a seus funcionários e a seus deputados um tratamento mais vantajoso do que o previsto pela União para seus funcionários e deputados. Relevante, no caso, não é a espécie de remuneração, mas, isto sim, o seu quanto. Ao funcionário da União é vedado receber de gratificação adicional por tempo de serviço uma quantia superior a cinco por cento de seus vencimentos em cada qüinqüênio até o máximo de sete qüinqüênios, e tal proibição é extensiva também ao funcionário estadual, e, obviamente, ao municipal. Dir-se-á que o discutido preceito do art. 13, V, da Consituição de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, não pode ser aplicado sem que haja uma lel federal especifica, e de alcance nacional, que expresse quais os limites máximos de remuneração que devam ser observados. Estou em que um tal entendimento não poderá prevalecer porque a lei de natureza específica e alcance nacional (isto é, uma lei federal que disponha sobre a matéria de serviço estadual e municipal) já se acha expressamente prevista no art. 109 da Constituição Federal de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, e essa regra não se refere a limite máximo de remuneração do servidor estadual e municipal. Se o constituinte não incluiu, no citado art. 109, a matéria da remuneração máxima do servidor estadual e municipal, e somente o fez no referido art. 13, V, é porque ele se orientou no sentido, que logo se percebe, de adotar, como limite máximo de remuneração, o estabelecido em qualquer lei federal. R.T.J. — 100 17 Note-se que o mencionado art. 109 se refere: a) ao regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios; b) ã forma e ás condições de provimento dos cargos públicos (obviamente federais, estaduais e municipais); c) às condições para o fim de aquisição da estabilidade (pelo servidor federal, estadual e municipal). ção do servidor federal, pode ser aplicada, desde logo, como limitadora do máximo da remuneração do servidor estadual e municipal. II — Julgo procedente a representação para declarar a inconstituclonalidade, que me parece manifesta, do art. 70, II, da Constituição do Paraná de 8.5.67 com a Emenda Constitucional n? 3 de 29.5.71. Nenhum preceito expressa o art. 109 sobre o limite máximo de remuneração do servidor estadual e municipal. VOTO Por conseguinte, os limites máximos a que se reporta o supracitado inciso V, do art. 13, são evidentemente os fixados por lel federal comum, e não especifica. Atente-se para o fato de que as regras do art. 13, I a IX, da Constituição Federal de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, afirmam o princípio de que, no tocante às respectivas matérias, deve o Estado-membro subordinar-se ao que dispõe o texto constitucional, visto que os mencionados preceitos impõem a supremacia da União Federal sobre os Estados-membros, donde a certeza de que são auto-aplicáveis. Não importa que algumas de tais matérias estejam previstas na Constituição e outras estejam inscritas em leis. Relevante no pormenor é que as normas constitucionalte legais re guladoras do assunto sejam imperativas, caráter este que o art. 13, I a IX, lhes confere. Parece-me, pois, que não é necessária uma lel federal especificamente reguladora do art. 13, V, da Constituição de 1967 com a Emenda n? 1 de 1969, para se aplicar o citado preceito constitucional. Qualquer norma que, baixada pela União, disponha sobre a remunera- O Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Presidente, antes de entrar nesta nobre Casa, o que multo me honra, tive oportunidade de, exercendo função administrativa, apreciar proposições sobre a preocupação de certos órgãos do Poder Executivo relativamente à aplicação aos funcionários estaduais dos limites de remuneração estabelecidos na lei federal, como decorrentes da aplicação deste art. 13, inciso V, da Emenda Constitucional n? 1/69. Verifiquei, então, que essa lei federal, que ai se reclama, não é aquela voltada para o plano federal, com eficácia para a circunscrição administrativa da União, mas, dentro daquela distinção estabelecida ultimamente pela doutrina, com muita razão de ser, entre lei federal e lei nacional, esta é que se reclama, com destinação e eficácia para o plano das entidades federadas. O que se exigiria, no caso, não era a lei federal existente para o âmbito da União, a estender-se, automaticamente, aos Estados, sem mesmo dizê-lo, mas uma lei que tivesse como objetivo específico estabelecer limites para os funcionários estaduais. A própria diversidade de estruturação funcional não poderia recomendar que se aplicasse automaticamente limites de remuneração de servidores federais a servidores estaduais, sendo de anotar que o dispositivo constitucional não se refere a simples teto, mas a limites, no plu- 18 R.T.J. — 100 ral, o que supõe a consideração de situações e categorias funcionais diversas. Como se aplicariam os limites sem as especificações funcionais? Qual o critério de verificação da paridade das situações sem a explicitação e correlação das funções? Eu me perguntaria ainda: será que teria limites superiores de remuneração e modesto funcionário do Estado do Paraná, que, em virtude desses qüinqüênios, percebe ínfima importância, relativamente ao funcionário federal? Assim, minha concepção a respeito disso é que, não existindo lei federal específica estabelecendo quais os limites dessa remuneração — porque importaria ela até em desconsiderar as diversas situações do Estado —, não se verifica a integração da norma constitucional para sua observância, sendo esta a interpretação mais favorável à autonomia remanescente do Estado, que somente padece restrição de modo expresso e excepcional. Desse modo, pedindo vênia ao eminente Relator, julgo improcedente a representação. VOTO O Sr. Ministro Dedo Miranda: Sr. Presidente, peço vênia ao eminente Ministro Relator para acompanhar o voto do eminente Ministro Rafael Mayer. Também a mim me parece que a referência do inciso V do art. 13 da Constituição apenas se relaciona com a lei específica federal cujo alvo seja estabelecer limites máximos de remuneração de servidores públicos, e não com os próprios limites superiores, in concreto, das remunerações ordinárias comuns dos funcionários federais. Consideração diversa levaria a que, na operação de comparação do máximo se somassem os vencimen- tos básicos com as vantagens a eles adjacentes, para então verificar se o funcionário de categoria idêntica, com o mesmo tempo de serviço, com as mesmas promoções, estaria igualado ou superando o funcionário de Idênticas características, do âmbito federal. Nem isso me parece possível. Mas, aqui, quer-se ir mais longe. Procura-se isolar um componente da remuneração do funcionário para Comparar, exclusivamente, este componente. Acentuo este aspecto como reforço de meu ponto de vista, porque me parece que a comparação só poderia decorrer de uma lei federal especifica, que visasse a fixar parâmetros às remunerações dos funcionários estaduais: ou um parâmetro localizado em determinada parte do estipêndio ou o parâmetro global. Com essas considerações, Sr. Presidente, e com a vênia devida ao eminente Relator julgo improcedente a representação. EXTRATO DA ATA Rp. 955-PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Repte.: Procurador-Geral da República. Repda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Decisão: Pediu vista o Ministro Soares Murloz, após o voto do Ministro Relator julgando procedente a representação, e dos votos dos Ministros Rafael Mayer e Decio Miranda, julgando-a improcedente. Impedido o Senhor Ministro Leitão de Abreu. Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Antonio Neder, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mtarloz, Decio Miranda e Rafael Mayer. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 12 de março de 1981 — Alberto Veronese Aguiar, Secretário. R.T.J. — 100 VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Soares Mufloz: O Dr. Procurador-Geral da República argüiu, na presente representação, a inconstitucionalidade do inciso II do art. 70 da Emenda n? 3/71 á Constituição do Estado do Paraná, sob o fundamento de que ele, permitindo ao funcionário estadual, ao completar 35 anos de serviço, perceber 50% de acréscimo dos vencimentos, considerando que já o inciso I do mesmo artigo assegura 25% de adicionais relativos aos primeiros 25 anos de serviço, viola flagrantemente a regra imperativa do art. 13, inciso V, da Emenda Constitucional n? 1/69, tendo em vista que a lei federal reguladora da concessão de adicionais ao servidor público federal (Lei n? 4.345, de 26.6.64) estabelece um máximo de 35% concedidos, parceladamente, a razão de 5% por qüinqüênio de efetivo exercício (art. 10 da Lei n? 4.345). Dispõe o art. 13, inciso V, da Constituição da República: «Os Estados organizar-se-ão e reger-se-ão pelas Constituições e leis que adotarem, respeitados, dentre outros princípios estabelecidos nesta Constituição... as normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a apficação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidadas em lei federal.» Discute-se qual seja a lei federal a que se reporta o preceito constitucional, insta dizer, se á lei que regula a remuneração dos servidores federais ou se a uma lei destinada, especificamente, a fixar os limites máximos de remuneração dos funcionários estaduais e municipais. Em prol da exigência de uma lei federal especifica militam dois argumentos. 19 O primeiro reside na verificação de que a norma constitucional suscita, realmente, dúvida em sua interpretação, devendo prevalecer a que assegura a autonomia dos Estados, que é a regra, porquanto as restrições constituem exceções que, como tal, devem ser entendidas. O segundo argumento anima-se no confronto do inciso V com o inciso VI do mesmo artigo 13, pois se aquele houvesse erigido as vantagens percebidas pelos funcionários da União em teto intransponivel para os Estados e Municípios na remuneração de seus funcionários, teria assim disposto, Inequívoca e expressamente, como o fez o inciso VI, proibindo aos Estados pagar, a qualquer título, aos deputados estaduais mais de dois terços dos subsídios e da ajuda de custo atribuídos em lei aos deputados federais. Ou, então, teria estabelecido, como o fez no f 4?, do mesmo art. 13, no qual prescreveu que os postos ou graduações das policias militares estaduais não podem ter remuneração superior à fixada para os postos e graduações correspondentes no Exército. O estabelecimento de tetos de remuneração para os servidores estaduais constitui providência complexa, em face da diversidade dos Estados da Federação, que conta ao lado de Unidades superdesenvolvidas outras subdesenvolvidas e algumas em fase de desenvolvimento. Ademais, para verificar-se o teto federal, não é possível confrontar-se apenas uma de suas parcelas, no caso os adicionais por tempo de serviço, mas a remuneração total. A exigência de uma lei especial, enfrentando tais peculiaridades, se me afigura indispensável à aplicação do inciso V do art. 13 da Constituição da República. A lei federal, R.T.J. — 100 20 exigida por esse dispositivo, não é, pois, a que regula os vencimentos e vantagens dos servidores da União, mas aquela que for editada com esse tini específico. Objeta-se que o art. 109 da Constituição Federal não incluiu, entre as hipóteses em que exige lei federal de iniciativa do Presidente da República, a matéria de remuneração máxima dos servidores estaduais e municipais. Á lei no entanto, a que se refere o art. 13, inciso V, não se confunde com a prevista no art. 109, nem esta exclui a viabilidade daquela, pois ambas emanam de preceitos constitucionais da mesma hierarquia, que não se excluem `expressamente, nem se contradizem em sua substância. Ademais, a objeção se anima em argumento a contrário, o qual, acentua Carlos Maximiliano, «embora muito prestigioso outrora, é mal visto hoje pela doutrina e pouco usado pela jurisprudência» (Hermenêutica e Aplicação do Direito, pág. 291, 3? ed.). Do fato de se mencionar uma hipótese, ou algumas hipóteses, não se deduz a exclusão de todas as outras, a menos que aquelas tenham sido enunciadas de maneira taxativa. Com vênia do eminente Ministro Antonio Neder, julgo improcedente a reclamação, acompanhando os nobres Ministros Rafael Mayer e Decio Miranda. VOTO tados têm liberdade em sua organização, excetuados os casos previtos na Constituição. Ora, o art. 13, inciso V, dispõe que lel federal estabelecerá o teto máximo de remuneração dos funcionários estaduais, que não pode ser superior à dos funcionários federais. Evidentemente que se trata de uma lei geral, e não especial, destinada a regular adicionais dos funcionários federais, que estabelece, para esses, o máximo de sete qüinqüênios. A questão de adicional de vencimentos é de competência de cada Estado. Tanto isso é verdade que, para se limitar os adicionais da magistratura a sete qüinqüênios, foi necessário que a lel orgânica assim estabelecesse expressamente: «A gratificação adicional de 5%, por tempo de serviço, até o máximo de sete». Foi a Lei Geral da Magistratura que estabeleceu, com relação à magistratura, o teto que, antes, apesar de vigorar a Constituição variava de Estado a Estado e, em alguns, não tinha limite. O mesmo ocorre com relação ao funcionário público, razão por que estou inteiramente de acordo com os votos que me antecederam, julgando Improcedente a representação. EXTRATO DA ATA Rp. 955 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Rpte.: Procurador-Geral da República. Rpda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Senhor presidente, de início, tenho a dizer que estou inteiramente de acordo Decisão: Pediu vista o Ministro com os argumentos expendidos pelos Cordeiro Guerra, após o voto do Mieminentes Ministros Soares Muiloz, nistro Relator, julgando procedente Rafael Mayer e Decio Miranda, a representação, e dos votos dos Miacrescentando ainda estarmos em nistros Rafael Mayer, Decio Miranuma República Federativa, e, nes- da, Soares Mufioz e Cunha Peixoto ta, no tocante a funcionários, os Es- julgando-a Improcedente. R.T.J. — 100 Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Antonio Neder, Cordeiro Guerra, Cunha Peixoto, Soares Mufoz, Dedo Miranda e Rafael Mayer. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Moreira Alves e Leitão de Abreu. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 26 de março de 1981 — Alberto Veronese Aguiar, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: Pergunta-se, nesta Representação, se é licito ao Estado regular as gratificações adicionais por tempo de serviço de modo diverso, ou mais liberal, que o previsto na lel federal pertinente à mesma gratificação outorgada aos funcionários da União, em face do inciso V do art. 13 da Constituição Federal. O eminente Ministro Antonio Neder, relator, entende que não é necessária uma lei especifica para estabelecer o teto da remuneração máxima do servidor estadual ou municipal, pois essa limitação deflui do próprio texto do inciso V do art. 13 da Constituição Federal, que se refere a limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal, e não exige que essa lel seja especifica ou complementar. Os eminentes Ministros Decio Miranda, Rafael Mayer, Soares Muboz e Cunha Peixoto divergem do eminente relator, sustentando que não basta uma lei federal disciplinadora da matéria, necessária é que haja uma lel específica estabelecendo um limite máximo aos vencimentos dos funcionários estaduais ou municipais, tal como ocorre com a Lei Orgânica da Magistratura, art. 65, VIII, que restringe o número de qüinqüênios a sete. 21 Não me impressiona esse argumento, porque, sendo o Poder Judiciário Nacional, a própria Constituição previu a submissão das Justiças Estaduais à Lei Orgânica da Magistratura Nacional, compleméntar e especial, art. 194, e o art. 112, parágrafo único, da própria Constituição estabelece: *Lei complementar, denominada Lei Orgânica da Magistratura Nacional, estabelecerá normas relativas à organização, ao funcionamento, à disciplina, às vantagens, aos direitos e deveres da Magistratura, respeitadas as garantias e proibições previstas nesta Constituição ou dela decorrentes.» Em relação aos funcionários públicos o art. 109 da Constituição Federal não exigiu uma lel complementar para estabelecer o regime juddico dos servidores da União, do Distrito Federal e dos Territórios, e multo menos, em relação aos servidores estaduais e municipais. Basta, na matéria, a existência de lei federal ordinária. O art. 13 da Constituição Federal estabeleceu a observância, entre outros, dos princípios que enumera, o do inciso V.: «As normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal.» Ora, na espécie, o regime de gratificação adicional por tempo de serviço, norma relativa aos servidores públicos, está disciplinado em lei federal, que limita o número de qüinqüênios ao máximo de 35%. Não pode, a meu ver, data venta, essa norma relativa a funcionários públicos, estabelecida em lei federal, ser negada ou ultrapassada por lei local, porque, neste particular, os 22 R.T.J. — 100 Estados não têm autonomia, já que a Constituição impõe a sua submissão às normas federais. Restringir-se o preceito a uma norma especifica de caráter geral, não imposta pelo art. 109 da Constituição Federal, seria criar uma condição onde ela não é imposta, ou seja, exigir-se na lei complementar fora dos casos previstos na Constituição. A meu ver, o art. 13 da Constituição Federal visa à uniformidade de critérios legislativos em matéria de funcionários públicos e seus vencimentos, estabelecendo um teto, quer quanto aos vencimentos base, quer quanto às vantagens acrescidas a ele. O critério estabelecido na Constituição Estadual impugnada, a meu ver, extrapola o limite da lei federal, e assim, data venia, não pode subsistir, do mesmo modo, que não poderiam ter os funcionários estaduais ou municipais vencimentos base superiores aos servidores federais. Por outro lado, em relação aos funcionários públicos, o limite de remuneração foi estabelecido em lei federal para os funcionários da União, não entendeu necessário a Constituição dispor expressamente como o fez em relação aos deputados e militares. Se se admitisse, a ultrapassagem dos tetos estabelecidos quanto aos adicionais, nada impediria a inobservância dos limites dos vencimentos base federais, por normas estaduais. Os critérios de remuneração dos funcionários públicos, em todo pais, devem ser uniformes, isto é, os estabelecidos em lei federal mesmo ordinária. Em conseqüência, não obstante o peso dos argumentos em contrário, acompanho o eminente relator. EXTRATO DA ATA Rp. 955 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Repte.: Procurador-Geral da República. Reptda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Decisão: Pediu vista o Ministro Moreira Alves, após os votos dos Ministros relator e Cordeiro Guerra, Julgando procedente a representação, e os votos dos Ministros Rafael Mayer, Decio Miranda, Soares Mufoz e Cunha Peixoto, julgando-a improcedente. Impedido o Sr. Ministro Leitão de Abreu. Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Antonio Neder, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Soares Mufloz, Dedo Miranda e Rafael Mayer. Ausente, Justificadamente, o Senhor Ministro Cunha Peixoto. Procurador-Geral da República, Dr. Frimino Ferreira Paz. Brasília, 02 de abril de 1981 — Alberto Veronese Aguiar, Secretário. VOTO ( VISTA) O Sr. Ministro Moreira Alves: 1. — A divergência entre os votos já proferidos se adstringe a saber se a lel federal, a que alude o inciso V do artigo 13 da Constituição — «as normas relativas aos funcionários públicos, inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal» — é lei federal que estabeleça limites máximos de remuneração aos funcionários federais (e esses limites deverão ser observados pelas Constituições e leis estaduais) ou se é lei federal apenas na sua origem, mas não quanto aos seus destinatários, já que integrada somente por normas em que a União determina, diretamente, os limites máximos de remuneração dos servidores estaduais e municipais. R.T.J. — 100 2. — A meu ver, quer pela interpretação literal, quer pela interpretação lógica, correta é a primeira dessas duas correntes. Com efeito, sempre que a Constituição Federal determina que a Constituição e as Leis Estaduais observem a aplicação de normas federais, estas são as que se dirigem diretamente aos agentes políticos ou servidores federais, como se vê dos incisos VIII e IX desse mesmo artigo 13, e isso até porque se se tratasse de lei nacional, ela incidiria diretamente sobreps servidores estaduais e municipais, não sendo necessário que os Estados-membros, em sua Constituição ou em suas, leis, aplicassem principio cuia incidência independeria da atuação legislativa deles. Por isso mesmo, esse artigo 13 não determina que os Estadosmembros apliquem, nas suas Constituições e Leis, os princípios de leis inequivocamente nacionais, como a lei ordinária nacional relativa a «normas gerais sobre orçamento, despesa e gestão patrimonial e financeira de natureza pública; taxa judiciária, custas e emolumentos remuneratórios dos serviços forenses, de registros públicos e notariais; de direito financeiro; de seguro e previdência social; de defesa e proteção da saúde; de regime penitenciário» (art. 8?, XVII, c), ou como a lei complementar nacional relativa a normas gerais de direito tributário (art. 18, § 1?), ou como a lei complementar nacional referente a regime jurídico de servidores, a forma e condições de provimento dos cargos públicos, bem como a condições para aquisição de estabilidade (art. 109), ou com a lei complementar nacional de limites de despesas de pessoal (art. 64: «Lei Complementar estabelecerá os limites para as despesas de pessoal da União, dos Estados e dos Municípios»). Em nossa liguagem técnica constitucional, a expressão «aplica-se» (ou similares, como 23 ocorre com «aplicação») não se usa quando se quer aludir a incidência direta (como sucede com a incidência de leis nacionais nos Estados e Municípios), mas quando se quer estender norma legal que tem um destinatário específico a outros destinatários, como se vê, inequivocamente, no próprio art. 13, incisos VIII e IX, no art. 108 e em seu § 1?, e no artigo 158, § 5?. Por outro lado, quando a Constituição se refere a leis nacionais, ela usa da expressão alei complementar ou lei federal» mas explicita que se trata de lei federal que regula determinada matéria diretamente para a União, os Estados e os Municípios. Assim, no artigo 64 («Lei complementar estabelecerá os limites para as despesas de pessoal da União, dos ,Estados e dos Municípios») e no artigo 109, I («Lei federal, de iniciativa exclusiva do Presidente da República, respeitado o disposto no artigo 97 e seu § 1? e no § 2? do artigo 108, definirá: I — o regime jurídico dos servidores públicos da União, do Distrito Federal e dos Territórios»). Ora, no inciso V, parte final do artigo 13 («inclusive a aplicação, aos servidores estaduais e municipais, dos limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal») não se alude aos servidores federais, como se faria se se tratasse de lei nacional. Dal, urna de duas: ou se admite que essa lei federal tenha por destinatários exclusivos os servidores estaduais e municipais, e, nesse caso, se permitiria que a União, por lei ordinária, pudesse estabelecer que os limites máximos de remuneração dos servidores estaduais e municipais fossem até inferiores aos que ela admite para os servidores federais; ou se dá à parte final do inciso V do artigo 13 a interpretação que se coaduna com a sua letra e 24 R.T.J. — 100 com o sistema adotado pela Constituição em questões similares, como as atinentes aos limites de remuneração de policias militares e de magistrados estaduais, que se fazem com a observância da paridade de limites de vencimentos de niveis equivalentes nos âmbitos federal e estadual (art. 13, § 4?, e art. 144, § 4?). Não tenho dúvida em acolher essa segunda interpretação. Ela se compatibiliza melhor com a autonomia dos Estados, não permitindo que lei ordinária federal possa estabelecer limites máximos de remuneração para os servidores estaduais e municipais que sejam inferiores aos dos servidores federais; quando a Constituição quer estabelecer tal disparidade o faz expressamente, como se vê do disposto no inciso VI do seu artigo 13 («a proibição de pagar, a qualquer título, a deputados estaduais mais de dois terços dos subsídios e da ajuda de custo atribuídos em lei aos deputados federais, bem como de remunerar mais de oito sessões extraordinárias mensais»). Ela se harmoniza com os demais dispositivos que tratam de remuneração, e que visam, sempre, a estabelecer como limites máximos os que a União paga a seus servidores, e isso porque, se os servidores da União podem ser lotados no território de qualquer dos Estadosmembros, a remuneração máxima a eles atribuída pode ser observada como limite máximo (os limites mínimos é que podem variar em função do custo de vida nos Estados) para os servidores de qualquer desses Estados-membros. Por fim, não vejo qualquer problema em se aplicar aos Estados-membros os limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal para os servidores federais. A parte final do inciso V do artigo 13 da Constituição Federal não diz respeito à paridade de níveis de vencimento de categorias semelhantes na União, nos Estados-membros e nos Municípios. Alude ele a «limites máximos de remuneração», expressão que, por ser mais genérica do que «vencimento», abrange quaisquer vantagens pecuniárias, além do vencimento atribuído a cada categoria funcional. O uso do plural «limites máximos de remuneração», uma vez que não se trata de paridade de níveis de vencimentos para categorias funcionais, se fez exatamente para significar que a limitação a que os servidores estaduais e municipais estão sujeitos não é o máximo que, concretamente, algum servidor federal possa perceber da União computados os vencimentos e todas as vantagens outras, inclusive de ordem pessoal (nesse caso, não teria sentido o plural «limites máximos», pois o limite seria um só: o desse total), mas sim, os limites máximos de cada uma das parcelas integrantes da remuneração do servidor, à semelhança, aliás, do que explicitou a Lei Orgânica da Magistratura. Por isso mesmo, o inciso V do artigo 13 da Constituição Federal se refere a limites máximos de remuneração estabelecidos em lei, ou seja, de modo abstrato. Por tudo isso, em meu entender, pelo dispositivo constitucional em causa, nenhum servidor estadual ou municipal poderá perceber vencimento-padrão superior ao mais alto pago pela União, nem ter vantagens, em número e em quantia, superiores às máximas admitidas pela legislação federal aos seus servidores. No caso, um desses limites máximos — o relativo a adicionais — não foi respeitado, razão por que, com a devida vênia dos que pensam em contrário, acompanho o eminente relator. R.T.J. — 100 VOTO Sr. Ministro Djaci Falcão: Sr. Presidente, peço vênia ao eminente Relator para acompanhar os votos dos eminentes Ministros que entendem, na espécie, não ocorrer a inconstitucionalidade, porque, nos termos do inciso V do art. 13, não posso chegar a uma conclusão de inobservância, no que diz respeito à locução «limites máximos de remuneração estabelecidos em lei federal», pois não existe a lei federal ai prevista. Julgo improcedente a representação. VOTO Sr. Ministro Xavier de Albuquerque (Presidente): Prescindo do exame da questão, que foi suscitada em votos de alguns eminentes Colegas, de se referir a Constituição, a lei de caráter nacional, ou não, mas lei especial que se destine, precipuamente, a reger a remuneração de funcionários estaduais, ou a leis regedoras de remuneração de funcionários federais. Prescindo do exame destas questões. Para mim, a disposição constitucional federal, com a qual é confrontada a norma constitucional estadual impugnada, quer-se referir a eventuais tetos de remuneração dos servidores federais. Para que a norma estadual colidisse com essa regra, seria mister demonstrar-se que a remuneração total, auferida por funcionário favorecido com o percentual de 50% aos 35 anos de serviço, alcança valor absoluto superior ao teto acaso fixado na lei federal. E assim que entendo a disposição, e não como foi declinado nos votos do Relator e dos colegas que o acompanham. não pode ser ela, a meu ver, diferentemente entendida. Não há nor- 25 ma alguma da Constituição que obrigue os Estados a pagarem adicionais por tempo de serviço a seus funcionários. E se eles entenderam de pagá-los, não há norma alguma que lhes imponha o critério do qüinqüênio. Porém, pagar triênios, como podem pagar decênios. E onde haverá de ficar o limite de 5 qüinqüênios, ou 35 anos, se esse número não é múltiplo, nem de 3, nem de 10? Está-se a ver, a meu sentir, que a norma constitucional do inciso V, do art. 13, diz respeito aos chamados tetos de remuneração, que foram muito usados nos anos 50 a 70 e que, de certo modo, caíram em desuso no estágio atual do nosso Direito Administrativo. Em relação aos magistrados, não, porque a Lei Orgânica é expressa em dizer que nenhuma vantagem se lhes atribuirá, fora das que ela prevê, nem em bases ou limites superiores aos nela fixados. Mas, em relação ao funcionalismo comum, não me parece que a legislação estadual esteja coarctada pela norma constitucional trazida a debate. Desse modo, acompanho o voto do eminente Ministro Rafael Mayer, data venta dos que se pronunciaram em sentido contrário. EXTRATO DA ATA Rp. 955 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Rpte.: Procurador-Geral da República. Rpda.: Assembléia Legislativa do Estado do Paraná. Decisão: Julgou-se improcedente a Representação, vencidos os Ministros Relator, Cordeiro Guerra e Momira Alves. Votou o Presidente. Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djacl 26 R.T.J. - 100 Falcão, Antonio Neder, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufioz, Decio Miranda, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 20 de maio de 1981. — Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretário. REPRESENTAÇÃO N? 1.026 — RJ (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves. Representante: Procurador-Geral da República — Representados: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e O Governador do Estado do Rio de Janeiro. Representação de inconstitucionalidade. Poder do Estado-membro, em face da estrutura das Câmaras Municipais, de adaptação das normas constitucionais federais relativas ao processo legislativo. Limites. Não viola os artigos 13, ILI, e 51, § 2?, da Constituição Federal o § 2? do art. 188 da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, que fixa o prazo de vinte dias para que a Câmara Municipal aprecie projeto de lei de iniciativa do Prefeito, se este, por entender urgente a medida, o solicitar. Representação de inconstitucionalidade que se julga improcedente. o poder de solicitar à Câmara a ACORDA° Vistos, relatados e discutidos estes apreciação de projetos de lei no prazo autos, acordam os Ministros do Su- de vinte dias, em oposição ao que premo Tribunal Federal, em Sessão prescreve o art. 13, inciso III, combiPlenária, na conformidade da ata do nado com o art. 51, § 2?, da Constituijulgamento e das notas taquigráfi- ção da República. cas, por maioria de votos, julgar imSolicitadas informações, foram procedente a Representação. elas prestadas pelo Exmo. Sr. GoBrasília, 26 de novembro de 1980. vernador do Estado, a fls. 56/61, e — Xavier de Albuquerque, Presiden- pela Assembléia Legislativa Estadual, a fls. 63/74. te — Moreira Alves, Relator A fls. 77/83, assim se manifesta a RELATÓRIO Procuradoria-Geral da República, do Dr. Moacir Antonio O Sr. Ministro Moreira Alves: em parecerda Silva, devidamente Atendendo à solicitação da Câmara Machado aprovado pelo Municipal de volta Redonda (RJ), o da República: Dr. Procurador-Geral Exmo. Sr. Dr. Procurador-Geral da República argüi a inconstitucionall«Por solicitação da Câmara Mudade do 2? do artigo 188 da Constinicipal de Volta Redonda, a presente representação argüi a intuição do Estado do Rio de Janeiro, que versando o processo legislativo constitucionalidade do 2?, do art. no âmbito municipal, dá ao Prefeito 188, da Constituição do Estado do R.T.J. — 100 Rio de Janeiro, na parte em que fixa o prazo de vinte dias para que a Câmara aprecie projeto de lei de iniciativa do Chefe do Executivo, se este, julgando urgente a medida, assim o solicitar. E este o teor do dispositivo em referência: «Art. 188. O Prefeito pode enviar à Câmara Municipal projetos de lei sobre qualquer matéria, que serão apreciados no prazo de quarenta e cinco dias, a contar de seu recebimento, se assim o solicitar. 2° Caso julgue urgente a medida, o Prefeito pode solicitar a apreciação do projeto em vinte dias». Entende a Câmara Municipal que a regra transcrita, ao estabelecer o prazo de vinte dias, contraria os arts. 13, III, e 51, 20, da Lei Fundamental, pois, no âmbito federal, o Congresso Nacional dispõe de quarenta dias para a apreciação de projetos de lei, em regime de urgência, em caso de solicitação do Presidente da República. Em suas informações de fls. 5661, sustenta o Exmo. Sr. Governador do Estado, em suma, que a Câmara de Vereadores não se integra no Poder Legislativo, de maneira que o constituinte estadual tinha liberdade ampla para disciplinar o assunto, por força do que dispõe o art. 13, ff 1?, da Constituição Federal. A Egrégia Assembléia Legislativa do Estado, por seu turno, entende que compete ao Estado-membro dispor sobre o processo legislativo municipal, mas não está obrigado a seguir literalmente as regras estabelecidas na Constituição da República. Considera invocando observação de Hely Lopes Meirelles, que o prazo de urgência pode ser 27 reduzido a um tempo razoável para deliberação, sem ofensa à Carta Magna . art. 13, III, da Constituição, estende aos Estados-membros o principio pertinente ao processo legislativo. Como assinala José Afonso da Silva, trata-se de regra que se inclui entre as de controle federal sobre a organização das unidades federativas (Estado-membro da Constituição Federal in RDP 16, p. 17). O principio estende-se, assim, obrigatoriamente também para os Municípios, mesmo porque a sua criação e organização constituem matérias da competência dos Estados, embora sua autonomia venha definida na própria Constituição Federal. art. 200, por seu turno, prescreve que as disposições da Constituição Federal ficam incorporadas, no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. O dispositivo apresenta inovação em relação ao art. 188, na redação de 1967, pois este previa uma fase preliminar de adaptação das Cartas Estaduais ás normas da Constituição Federal. A incorporação sobreviria apenas no caso de omissão dos Estados em reformarem suas Constituições no prazo de sessenta dias. De qualquer forma, mesmo em face do texto atual, a incorporação não elimina a adaptação. A propósito, observa-se,' em primeiro lugar, que a incorporação tem precisamente o sentido de prevenir eventuais omissões dos Estados na reforma de suas Constituições em face do novo texto da Constituição Federal ou mesmo desvios dos mandamentos de cumprimento obrigatório (Raymundo Faoro, Excesso de Adaptação das Cartas Estaduais ã Constituição de 1967, RDP n? 7, p. 208), mas não paralisa o poder constituinte estadual, 28 R.T.J. — 100 que poderá proceder à aludida reforma de suas normas básicas, adaptando-as aos princípios obrigatórios da Carta Magna. A autonomia dos Estados, com efeito, consiste basicamente na capacidade de auto-organização, no poder de elaborar a sua própria Constituição, de estabelecer seus princípios e normas básicas, pois a autonomia implica sempre em competência legislativa (Pinto Ferreira, Curso de Dir. Constitucional, 3. ed., 1974, v. 1, p. 95). A incorporação não ilide o poder de revisão, de reforma ou de modificação da Constituição do Estado. E certo que a autonomia dos Estados-membros encontra limites nos princípios a que devem obrigatória observância, estatuídos na Constituição Federal, mas também estão livres para dispor o que lhes aprouver em âmbito material diverso. Não pode subsistir dúvida, portanto, de que a incorporação de maneira alguma impede que o poder constituinte estadual elabore, reforme sua Constituição ou a adapte ao paradigma federal. Pelo contrário, o próprio art. 13 da Constituição Federal dispõe que os Estados devem organizar-se e reger-se pelas Constituições e leis que adotarem, respeitados os princípios da Lei Fundamental. Por outro lado, é inerente ao poder de elaboração ou de reforma da Constituição Estadual, em face de nova ordem constitucional no âmbito federal, um processo de adaptação. A expressão «no que couber», contida no art. 200 da Constituição Federal, já denota a necessidade de ajustamento aos princípios contemplados na Lei Suprema da Nação. A organização estadual e a municipal têm aspectos peculiares, ca- racteristicas próprias, que as tornam inconfundíveis entre si, ou com o organismo federal. Essas diferenças impõem a adaptação dos princípios constitucionais federais, na medida das discrepâncias estruturais entre essas três entidades políticas. Segundo o testemunho de Caio Tácito, Relator Geral da Comissão de Juristas do antigo Estado da Guanabara, encarregada de adaptar a Constituição local ao texto da Constituição Federal de 1967, não é tão simples o ajustamento das Constituições dos Estados ao paradigma federal (As Constituições Estaduais e sua Adptação à Carta Federal In RDA 89, pág. 431). As dificuldades maiores situam-se precisamente nas regras pertinentes aos chamados princípios constitucionais extensíveis (Constituição, art. 13, II a IX), entre os quais se inclui o relativo ao processo legislativo. Nesse processo de adaptação, há regras indesviáveis, consideradas fundamentais ao controle federal, entre as quais se inserem, por exemplo, em matéria de processo legislativo, as relativas à iniciativa reservada, ao poder de ementa do órgão legiferante e mesmo as referentes ao quorum requerido para a aprovação dos atos legislativos. Outras, porém, não podem ser seguidas inteiramente à risca, em face das diferenças entre a organização federal e a estadual ou municipal. No que se refere ao processo legislativo, a nota distintiva básica entre a União e os Estados e Municípios esta em que o Congresso Nacional é bicameral, ao passo que as Assembléias Legislativas e Câmaras de Vereadores têm composição unicameral. Por essa razão, impossível, por exemplo, falar em incorporação de regras de processo legislativo que definem a tra- R.T.J. - 100 imitação de projetos pelas duas Casas do Congresso Nacional. O mesmo se observa com relação aos prazos para apreciação de projetos em regime de urgência solicitada pelo Chefe do Executivo. Ora, se o prazo de quarenta dias foi fixado na Constituição Federal ( art. 51, § 2?) tendo em vista que a apreciação se faz em sessão conjunta do Congresso Nacional, a necessidade de constituição de Comissão Especial para proferir parecer sobre o projeto, e ainda o número de parlamentares, é evidente que o legislador constituinte estadual, considerando a constituição unicameral das Câmaras de Vereadores ou mesmo o número de seus membros, pode estabelecer prazo menor, para a apreciação dos projetos, em caso de urgência solicitada pelo Chefe do Executivo local. A fixação de prazos diversos do previsto no art. 51, § 2?, da Carta Magna, para deliberação das Assembléias ou das Câmaras em nada ofende o princípio do processo legislativo, correspondendo, antes, a uma medida legitima e razoável de ajustamento da Carta Estadual ao paradigma federal, em atenção às peculiaridades das organizações estadual e municipal. Os vários Estados têm, por isso mesmo, estabelecido prazos menores do que o fixado no aludido art. 51, § 2?, da Constituição Federal, para a apreciação de projetos em regime de urgência pelas Assembléias Legislativas. Assim é, por exemplo, que a constituição de Pernambuco (EC. n? 2, de 25.3.70, art. 32, § 1?), do Piauí (EC n? 1, de 31.1.71, art. 17, § 5?), do Rio Grande do Norte (EC n? 4, de 5.6.74, art. 26, § 3?), de Santa Catarina (EC n? 1, de 20.1.70, art. 60), da Paraíba (EC nt 1, de 16.6.70, art. 31, § 2?), do Pará (EC nt 1, de de 29.10.69, art. 61, § 2?), de Magoas (EC n? de 29 15.12.69, art. 33, § 2?), e do Maranhão (EC n? 1, de 28.2.70, art. 26, § 2?) fixam o prazo de trinta dias para a apreciação em caráter de urgência , se os respectivos Governadores ó solicitarem. A EC n? 1, de 30.9.70, do Estado do Amazonas prevê o prazo de quinze dias (art. 27, § 2?): E certo que a liberdade do legislador constituinte estadual na fixação desse prazo é limitada, não podendo chegar ao ponto de restringir a apreciação dos projetos pela Câmara de Vereadores. O prazo de vinte dias previstos no art. 188, § 2?, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, porém, não implica, por si só, uma limitação dessa prerrogativa, não tornam materialmente impossível a apreciação dos projetos. Se o prazo fosse tal que impedisse a deliberação, a inconstitucionalidade deveria ser reconhecida porque a regra pertinente Importaria em suprimir as atribuições legiferantes das Câmaras Municipais. Correta, por isso, esta ponderação de Hely Lopes Meirelles, referindo-se ao prazo de urgéncia»... o de urgência pode ser reduzido a um tempo razoável para deliberação, geralmente a metade do prazo comum, como se observa na generalidade das disposições constitucionais pertinentes» (Dir. Municipal Brasileiro 3. ed., 1977, p. 761). Em face do exposto, parece-nos de todo improcedente a presente representação.» E o relatório, do qual a Secretaria deverá remeter cópia a todos os Srs. Ministros. Brasília, 28 de agosto de 1980. O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Nada tenho que acrescentar ao bem lançado parecer da Procuradoria-Geral da República, cuja fun- 30 R.T.J. — 100 damentação acolho para julgar improcedente a presente representação. EXTRATO DA ATA Rp. 1.026 — RJ — Rel.: Min. Moreira Alves. Repte.: ProcuradorGeral da República. Repdos.: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e o Governador do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Pediu vista o Min. Leitão de Abreu, após q voto do Ministro Relator que julgou improcedente a representação. Falou pela Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro o Advogado Américo Gonçalves Valério Filho. Presidência do Sr. Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mulloz, Decio Miranda e Rafael Mayer. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 17 de setembro de 1980 — Dr. Alberto Veronese Aguiar, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Leitão de Abreu: No conceito de federação se contêm certas notas que são essenciais a essa forma de governo. Não quer isso dizer, contudo, que essa instituição política, no seu desenho prático, haja de corresponder a uma noção lógica, rigidamente definida. Resguardados elementos, que lhe são impreteríveis, é comum denotar a federação, na ordem positiva, feições peculiares, plasmadas pelo embate das idéias políticas. De modo que a fisionomia do sistema federativo, ao Invés de ser traçada, exclusivamente, a golpes de lógica, é delineada, também por imposições históricas. Variam, pois, entre si, os sistemas federativos, notadamente quanto à maior autonomia das entidades federadas e a maior ou menor soma de autoridade do poder central. Além disso flutuam, no tempo, as opiniões ou teorias quanto à idoneidade que revestiria a federação, como fórmula política e administrativa, para acudir às exigências do desenvolvimento econômico e social da nossa época. Ora se preconiza, como acontece, especialmente, nos Estados Unidos, um novo federalismo, que volte as costas a princípios já envelhecidos, inerentes à antiga idéia federalista, ora se anuncia, gravemente, que a federação está em declínio, não só no ocidente, como em outros horizontes. Esse o diagnóstico, por exemplo, do Professor Karl Loewestein, de quem se afirma haver pronunciado oração fúnebre sobre o corpo do federalismo, por se achar este divorciado da filosofia política da época, na qual predomina o imperativo do planejamento econômico, incompatível com as concepções liberais, em que se funda a idéia federalista. O nosso federalismo, sem as antecedências históricas do federalismo norte-americano, nele tem as suas raízes. A concepção de um federalismo dualista, que marcava, até bem pouco, quando irrompeu vitoriosamente a idéia de um novo federalismo, de um federalismo cooperativo, o sistema dos Estados Unidos, não podia ser estranha à nossa ordem Institucional. Ainda que aos Estados jamais se houvesse reconhecido a amplitude de poderes, no que toca à sua capacidade legislativa, de que gozavam essas pessoas políticas, na União Americana, a autonomia que se arrogaram entre nós alguns Estados-membros, com a implantação da República, assumiu proporções, por vezes, certamente inesperadas. R.T.J. — 100 Relembre-se, por ser o mais si gnificativo, o caso do Rio Grande do Sul, que, usando largamente da franquia de que se reputava investido, já no preâmbulo da Constituição, que editou aos 14 de julho de 1891, declarava que a promulgação desse estatuto político se fazia «em nome da Família, da Pátria e da Humanidade». Menos afoito, o Estado de Minas Gerais, fiel a velha concepção quanto à fonte de todo o poder, deixava consignado que a sua Constituição se decretava e promulgava «em nome de Deus Todo Poderoso». Os representantes do povo paulista, por sua vez, como que num rapto divinatório, no preâmbulo, onde adotavam, decretavam e promulgavam sua Constituição, declaravam «de ora em diante autônomo e soberano o Estado de São Paulo, como parte integrante dos Estados Unidos do Brasil». Mais de um Estado terá introduzido, no corpo de suas Cartas Políticas, prescrições que não quadravam, se estritamente interpretadas,, com a Carta Política da União. Nenhum, porém, terá excedido mais, na ilberalidade com que interpretaram a sua competência autoorganizatória, do que o Rio Grande do Sul. Decidiu a Carta Política sulista, simplesmente, reduzir a competência da Assembléia Legislativa, acerca da elaboração das leis, ás de natureza financeira, quais as de fixação anual da despesa e receita do Estado, assim como a de impor alguns tributos, isto é, impostos e taxas, enumerados no instrumento constitucional. Quanto ao restante, provia o Presidente do Estado, mediante processo que, na verdade, não tolhia o caráter discricionário com que lhe era dado legislar. Sejam quais forem as razões, umas de ordem filosófica, outras de índole política, que contribuiram para essa exacerbação da autoridade presidencial, a verdade é que está implícita, na adoção desse siste- 31 ma, a idéia de que o órgão legislativo tem coisas mais importantes a fazer do que legislar. Por mais paradoxal que possa parecer essa concepção, que alguns, menos sóbrios, chamariam de absurda, tal doutrina não tem o mérito da orginalidade. Em livro clássico, cuja primeira edição ocorreu em 1867 — quase um quarto de século antes da promulgação da Constituição Rio-grandense — Walter Bagehot, enumerando as funções da Câmara dos Comuns, não começa com a função legislativa. Indica, em primeiro lugar, a função eletiva, função mediante a qual escolhe o Primeiro Ministro e os demais componentes do Gabinete, ou seja, o Poder Executivo. Essa — diz Bagehot — a mais importante função da Câmara dos Comuns. A segunda função é a expressiva, aquela pela qual se manifesta a opinião do povo inglês sobre todas as matérias. A terceira função é a pedagógica. Uma grande assembléia, cujas sessões sejam públicas, integradas por homens notáveis, não se situa no meio de uma sociedade sem que altera essa sociedade. Deve alterá-la para melhor, ensinando á nação aquilo que ela não sabe. Se a grande assembléia, cujo papel assim se encarece, cumpre essa missão, ou até que ponto o faz, é coisa que o célebre constitucionalista transfere para ulterior exame. Vem, em quarto lugar, a função informativa, pela qual se colocam peránie a nação, por via dos debates parlamentares, as grandes questões que podem interessá-la. Qualquer idéia, qualquer credo, qualquer sentimento ou reivindicação — observa o grande publicista — em cuja defesa se levante certo número de respeitáveis deputados ingleses pode parecer á maior parte dos ingleses uma opinião falsa e perniciosa. Entretanto, é uma opinião com a qual, na esfera intelectual, se há de contar. Inclino-me a considerar essa função — frisa Bagehot — como a 32 R.T.J. — 100 segunda função do Parlamento, na ordem de importância, porquanto nos proporciona ouvir aquilo que, aliás, não ouviríamos. Por fim — prossegue o insigne analista político «existe a função legislativa, cuja grande importância seria grotesco negar, importância que eu só nego ser igual à da gestão executiva de todo o Estado ou à educação política dada pelo Parlamento a toda a Nação». Admite Bagehbt, entretanto, existirem fases em que a legislação é mais importante do que as que acima se mencionam, indicando os casos em que isso acontece. Escrita em face do sistema britânico, essa página deve ser interpretada, no que entende com a posição que aí se confere ao legislativo, tendo-se em conta as peculiaridades do ordenamento jurídico inglês, onde a criação do direito se faz — ou se fazia, predominantemente, mediante a common law», não mediante a lei proprie dieta. A crescente importância desta, no entanto, faz com que hoje o juiz trate a lei — the statute não mais como a exceção, mas como a base do direito afrouxando, assim, com a consternação dos seus fiéis, a rigidez ao velho e venerável dogma do stare dedais. Voltando ao presidencialismo da primeira Constituição sulriograndense — espécie de neo-presidencialismo precoce, que faria inveja, talvez, ao consagrado, hoje, em outros estatutos constitucionais a redução que, em benefício do Poder Executivo, se impôs à atividade legislativa não ocasionou perturbação maior à ordem pública, embora se murmurasse, permanentemente, dentro e fora das fronteiras gaúchas, contra esse regime constitucional, que se argüia de desacatar a Carta Politica da União. Se, pelo não exercício de atribuições que, pela Constituição Federal lhe competiam, isto é, pelo não exercício da plenitu- de da função legislativa, não- sofreu detrimento a ordem pública, já isso não ocorreu, quando se desempenhou, em certo momento, de uma das atribuições, que a Constituição Estadual lhe dava: a de fazer a apuração da eleição do Presidente do Estado (art. 56, n? 8?). A acusação de que o resultado, que deu por obtido, não refletia a vontade das urnas desencadeou a chamada Revolução de 23, a que pôs termo, depois de muito derramamento de sangue, a «Paz de Pedras Altas» que viria marcar o começo do fim, da primeira Constituição do Rio Grande do Sul, cujo fim mesmo ocorreu com a Revolução de 1930. Embora tenha estabelecido continuarem em vigor as Constituições Federais e Estaduais, estas a bem pouco ficaram reduzidas porque, pelo Decreto que instituiu o governo Provisório, ficou «confirmada, para todos os efeitos, a dissolução do Congresso Nacional, das atuais Assembléias Legislativas dos Estados (quaisquer que sejam as suas denominações). Câmaras ou Assembléias Municipais e quaisquer outros órgãos legislativos ou deliberativos existentes nos Estados, nos municípios, no Distrito Federal ou Território do Acre e dissolvidos os que ainda não tenham sido de fato». Suspenderam-se, ao mesmo tempo, as garantias constitucionais e autorizou-se o Governo Provisório a nomear um interventor federal para cada Estado, interventor ao qual se deferiram, na sua órbita de ação, as largas atribuições que se autoconferia o Governo Provisório. O reingresso no Estado de Direito ocorreu com a promulgação da Constituição Federal de 1934. Conquanto esse instrumento constitucional haja introduzido, em nossa ordem Política e social, inovações do mais alto relevo — inovações recebidas pelas constituições posteriores, R.T.J. — 100 dela, sob o ângulo que aqui interessa, pouco há dizer-se, dado seu curto periodo de vigência. Em compensação, nada é possível dizer da Constituição de 1937, a não ser que, à imitação do Decreto que, em 1930, instituiu o Governo Provisório, dissolveu, em Disposição Transitória, que se tornou permanente, a Câmara dos Deputados, o Senado Federal, as Assembléias Legislativas e as Câmaras Municipais, ficando o Presidente da República, enquanto não se reunisse o Parlamento Nacional, com o poder de expedir decretos-leis sobre todas as matérias da competência legislativa da União, competência que, na órbita dos Estados, estendeu-se aos Interventores Federais. Promulgada a Constituição de 1946, os constituintes gaúchos, ao elaborar a Constituição Estadual, dando razão, novamente, a Montesquieu, para quem todo órgão tende a hipertrofiar a sua competência, tentaram repetir a façanha dos constituintes locais de 1891. Desta feita, porém, ao invés de insistirem na hipertrofia do Executivo, ensaiaram confiscar-lhe atribuições, inerentes à forma presidencialista de Governo, mediante a instituição de Governo Parlamentar, caracterizado pela instituição de Gabinete, constituído por um Secretariado, cujos integrantes, indicados pela Assembléia, eram da confiança desta, devendo demitirse, quando vitoriosa moção de desconfiança. Os autores dessa Carta Estadual não tiveram, porém, a fortuna dos constituintes de 1891, cuja soberba autonomista praticamente não foi quebrada, pois a ilegitimidade do presidencialismo, que implantaram, resistiu a todas as peripécias ou increpações, até que a Constituição que o consagrava foi levada, depois de quase quarenta anos, para o grande cemitério a que a Revolução de 1930 fez recolher, não se sabe se piedosa ou impiedosamente, todas as Constituições, sem faltar a Consti- 33 tuição Federal. Não cabe dizer que não contavam os instituidores do parlamentarismo, na órbita do Estado gaúcho, com a função areopagitica do Supremo Tribunal. Políticos experientes, alguns de largo saber jurídico, os caudilhos da idéia parlamentarista tinham consciência de que, desde a Constituição Federal de 1934, se dera ao Supremo Tribunal, então Suprema Corte, competência para ingerir-se no processo de intervenção federal, somente realizável, para assegurar a observância dos chamados princípios sensíveis ou explícitos, quando, mediante provocação da Procuradoria-Geral da República, o mesmo Tribunal, tomando conhecimento da lei que houvesse decretado a intervenção, lhe declarasse a constitucionalidade. Sabiam, também, aqueles condutores políticos que a Constituição Federal de 1946, em presença de cuja catadura inflexivelmente presidencialista ousavam enxertar, na Constituição local, a idéia parlamentarista, desenvolvera o instituto da representação, para autorizar se provocasse, por seu intermédio, a censura do Supremo Tribunal sobre ato estadual, que infringisse principio constitucional sensível. Acolhida a representação, isto é, declarada a inconstitucionalidade da lei, autorizada ficava, então, a decretação da intervenção federal. A representação passou, destarte, a vir antes da lei federal; em lugar de provocar a apreciação da constitucionalidade desta, dava lugar à censura da constitucionalidade do ato estadual havido por incompatível com a Carta Política da União. A argüição de inconstitucionalidade do parlamentarismo que se embutiu na Constituição Rio-Grandense não tardou. Nem demorou o pronuncià: mento do Supremo Tribunal Federal que, em memorável julgamento — memorável pelo brilho dos votos pro- 34 R.T.J. — 100 feridos, entre os quais se destacou, particularmente, o do Relator, Ministro Castro Nunes, concluiu não ser compatível a forma de Governo, que na Carta Rio-Grandense se adotara, com os princípios rigidamente presidencialistas da Carta Política da União. A querela de inconstitucionalidade, por via da qual se cortou esse sonho autonomista, não foi a primeira que se trouxe ao Supremo Tribunal. Outras, posto que menos expressivas, já haviam sido articuladas. Essa forma de controle em tese da constitucionalidade de lel ou ato normativo estadual — também aplicável à lei federal — não nos é certamente peculiar, pois tem similar, por exemplo, na República Federal da Alemanha. O controle aí dos atos normativos estaduais não se exerce, contudo, de modo tão frequente como entre nós, visto que, na federação germânica, maior é o grau de autonomia reservada às entidades federadas. Além de muito mais restrita a competência legislativa que aqui se reconhece aos Estados, estes se acham sujeitos, em mais alto grau, quanto à sua organização, à observância do modelo estabelecido na lei fundamental. Seja, no entanto, porque se considere que a competência dos Estados se deve interpretar ampliativamente, diante da regra de que lhe pertencem os poderes não enumerados, seja porque os interesses políticos trabalhem no sentido do fortalecimento das unidades federadas, o certo é que, na estrutura jurídico-organizacional dos Estadosmembros, se registram freqüentes desvios da moldura federal, naquilo que dentro dela se deve conter imperativamente. Donde a multiplicação de representações, mediante as quais se intenta extirpar do ordenamento jurídico dos Estados disposições normativas havidas como inconstitucionais. Entre as representações de inconstitucionalidade encaminhadas à apreciação do Supremo Tribunal se encontra a de n? 1.026, oriunda de expediente, no qual a Câmara Municipal de Volta Redonda solicitou ao Procurador-Geral da República que submetesse ao exame desta Corte a argüição de inconstitucionalidade do § 2? do art. 188, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro, e conseqüentemente do # 2? do art. 84, da Lei Complementar n? 1 (Lei Orgânica dos Municípios), de 17.12.75, que «fixam um prazo de vinte dias para a votação em regime de urgência, contrário aos quarenta dias fixados pelos §§ 2? dos artigos 51 e 41, respectivamente, das Constituições da República e do Estado, ex vi do mandamento do art. 13, Inc. III, da Constituição Federal». O § 2? do art. 51, da Constituição Federal, estatui que «se o Presidente da República julgar urgente o projeto poderá solicitar que a sua apreciação seja feita em sessão conjunta do Congresso Nacional, dentro do prazo de quarenta dias». Por sua vez, dispõe a Constituição do Estado do Rio de Janeiro, no § 2?, do art. 41, que «se o Governador julgar urgente o projeto, poderá solicitar que a sua apreciação seja feita dentro do prazo de quarenta dias». Nos dois casos, na falta de deliberação dentro desse prazo, consideram-se aprovados os projetos. Assevera-se que a regra posta no § 2° do art. 51 da Constituição Federal integra o processo legislativo, disciplinado na Carta Politica da União. Como, no art. 13, III, desse estatuto político, se determina cumprir aos Estados respeitar, nas Constituições e Leis que adotarem, os princípios concernentes ao processo legislativo, conclui-se que contraria a Constituição Federal a prescrição exarada no art. 188, § 2?, da Constituição do Rio de Janeiro, prescrição segundo a qual «caso julgue urgente a medida, o Prefeito pode R.T.J. solicitar a apreciação do projeto (pela Câmara Municipal) em vinte dias». Responde-se que a Constituição Federal, no artigo 200, manda incorporar as disposições dela constantes, no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. Logo, haveria, no tocante ao processo legislativo, possibilidade de adaptação das regras constitucionais, no que coubesse, aos Estados. Não é essa, todavia, a conseqüência que cumpre extrair do que se estabelece no mencionado art. 200. O que nele se diz é que as disposições constantes da Constituição Federal ficam incorporadas, no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. Pergunta-se: não terá ficado incorporada, por força dessa cláusula constitucional, ao direito constitucional legislado dos Estados, a regra do I 2? do art. 51, da Constituição Federal? A resposta afirmativa se me afigura impor-se, nesse particular, pois cabe aplicar, na órbita estadual, quanto ao Governador e à Assembléia Legislativa, o que se preceitua, na esfera fede ral, no tocante ao Presidente da República e ao Congresso Nacional, quando funcione em sessão conjunta. Só há falar-se em adaptação desse principio constitucional, na sua incorporação ao direito legislado dos Estados, no concernente à mudança das expressões pelas quais se designam, no plano estadual, o Chefe do Poder Executivo e o órgão legislativo. Nenhuma alteração comporta, entretanto, o prazo dentro no qual, por ser urgente o projeto, solicite o Chefe do Poder Executivo a sua apreciação. De quarenta dias é o prazo fixado, em tal caso, para a apreciação do projeto em sessão conjunta do Congresso Nacional; de quarenta dias há de ser, também, por aplicação do disposto no art. 200 da Constituição Federal o prazo para a apreciação do projeto, pela Assembléia Legislativa. — 100 35 Pela incorporação, com a cláusula no que couber, posta no art. 200 da CF, das disposições desta ao direito constitucional dos Estados, o prazo para a aprovação dos projetos ditos de urgência é, como se viu, de quarenta dias. Sustenta-se, no entanto, que a clásula no que couber governa também a adaptação das Cartas Estaduais aos princípios constitucionais da União. Assevera-se que essa adaptação há de recair, também, não obstante a regra do art. 13, III, da Lel fundamental, onde se manda respeitar o processo legislativo, sobre o que a seu respeito al se estabelece; se assim não fora, os Estados teriam de adotar, forçosamente, o sistema bicameral, nos moldes previstos na Constituição Federal. E sabido que alguns Estados, cerca de dez, incorporaram às suas Cartas Políticas, no regime da Constituição de 1891, o sistema bicameral. E excusado apurar se, debaixo da Constituição de 1934, algum Estado persistiu nessa orientação ou se a ela se finou. Basta assinalar-se que, sob a Constituição de 1946, nenhum Estado adotou o sistema bicameral. E isso suficiente para que não se possa atribuir às regras constitucionais pbsteriores, que impuseram expressamente aos Estados a observância do processo legislativo da União, o intento de incluir nesse processo a parte que diz com a participação nele de duas casas legislativas à maneira do que se verifica na órbita federal. Aliás, como ninguém se lembrou, até agora, desde a Constituição de 1891, de argüir a inconstitucionalidade da não implantação, na ordem estadual, do sistema bicameral, não seria, pelo menos, curial que, nesta altura, mesmo ante o postulado que manda os Estados observarem o processo legislativo da União, se viesse aventar querela de inconstitucionalidade, em relação ás Cartas Políticas dO Estado que deixaram, sem nenhuma discrepância entre 36 R.T.J. — 100 de inserir, no seu ordenamento constitucional, ao lado das Assembléias Legislativas, órgão correspondente ao Senado. Da possibilidade de não inclusão de órgão dessa natureza no corpo das Constituições Estaduais não se tira, entretanto, o reconhecimento de que os Estados, no tocante ao delineamento do processo legislativo, possuam o arbítrio de modificar princípios essenciais a esse processo. Entre esses princípios se conta o estabelecido no 2? do art. 51, da Constituição Federar, onde se assina o prazo de quarenta dias para a apreciação de projeto considerado urgente pelo Chefe do Executivo. Preceito de índole especial, pois dele pode resultar, no caso de não apreciação do projeto dentro do prazo, ter-se o mesmo como aprovado, não pode esse prazo, dada a sua natureza, ser diminuído ao alvedrio dos Estados-membros. Que essa regra, pela qual se faz possível obter a aprovação de lel até pela intencional negativa de quorum para a votação do projeto possui qUid especial mostra a própria Constituição, primeiro quando determina a sua não aplicação aos projetos de codificação, segundo quando, no tocante às emendas constitucionais, exige, para a sua aprovação, votação expressa e efetiva, com maioria qualificada. Admitir, aliás, que a título de adaptação, com base na cláusula — no que couber — o constituinte estadual possa reduzir, a seu talante, o prazo de quarenta dias, a que se refere o 2?, do art. 51, da Constituição Federal não se coaduna, aliás, nem com os termos do art. 13, item III, dessa Carta Política, nem com o modo estrito com que o Supremo Tribunal tem intepretado os imperativos estatuídos nesse artigo. Marca, nesse particular, a orientação desta Corte a decisão que tomou acerca da argüição de inconstitucionalidade de preceito da Constituição paulista, onde se regulava matéria concernente à fiscalização financeira, exercida pela Assembléia Legislativa, com o auxílio do Tribunal de Contas. Estipulava-se nesse preceito que se o Tribunal de Contas solicitasse que a Assembléia Legislativa se pronunciasse sobre contrato impugnado pelo mesmo Tribunal e, se o não fizesse a Assembléia, dentro do prazo de trinta dias, a impugnação se reputaria subsistente. Entendeu, porém, o Supremo Tribunal, aplicando ao caso o item IV, do art. 13. da Constituição Federal, que esta dispunha a respeito do assunto e que, ao fazê-lo, estabelecia que, se o Congresso Nacional, no. prazo de trinta dias, não se pronunciasse sobre a impugnação, esta se considerava insubsistente. Concluiu, portanto, que, dando a Constituição paulista como subsistente a impugnação, no silêncio da Assembléia, quando a Constituição Federal, no silêncio do Poder Legislativo, reputava insubsistente a impugnação, o mandamento constitucional do Estado era ilegítimo, porque estava adstrito à observância do Item IV, do art. 13, da Constituição Federal, que impõe aos Estados a observância dos princípios constitucionais da União acerca da fiscalização orçamentária e financeira. Lembra-me — relator que fui do processo — ter defendido a compatibilidade da cláusula estadual com o sistema constitucional, uma vez que, sobre se não haver desviado do princípio concernente à fiscalização financeira, imposto à observância dos Estados-membros, a Constituição paulista, na aplicação desse princípio, usava até de maior rigor do que a Carta Federal, pois, enquanto esta reputa insubsistente a Impugnação, quando sobre ela não se manifesta, no prazo de trinta dias, o Poder Legislativo, a Constituição paulista considerava que o de- R.T.J. — 100 curso do prazo, sem manifestação da Assembléia Legislativa, importava haver-se como subsistente a impugnação. Maior razão milita, no caso vertente, para que se haja como intocável o modelo federal, quanto ao prazo para a apreciação do projeto de lei, que o Chefe do Executivo declare urgente. Lá se cuida, simplesmente, da apreciação, no prazo de trinta dias, de contrato, que tenha sofrido impugnação do Tribunal de Contas, apreciação cuja falta, dentro do prazo, redunda em manter-se o contrato. Aqui, no entanto,se trata de prazo estabelecido na Constituição Federal para que se aprecie projeto de lei, sob pena de se ter o projeto como aprovado, se a votação não se verificar até o final desse prazo. Dispõe-se, nesta hipótese, ~tinto, quanto a uma das formas pelas quais se pode dar a aprovação de projeto de lei, independente de votação. Vale dizer: disciplina-se um dos processos de criação do ato legislativo; regula-se, pois, a feitura da própria lei. Ora, se a Constituição Federal ao prover acerca do caso em que a aprovação do projeto de lei pode verificar-se independente de votação, estipula que isso só ocorrerá se o projeto não for apreciado dentro de quarenta dias, não é licito aos Estados reduzir esse prazo, porque, se o fizerem, estarão restringindo o período dentro do qual os membros do corpo legislativo podem, segundo a Carta Federal, apreciar o projeto, mediante votação, seja para emendá-lo, ou negar-lhe aprovação, seja para aprová-lo. Diminuir o prazo para o exercício dessa faculdade, natural ao órgão legislativo, redunda, pois, em por embaraços, não autorizados na Carta Federal, ao uso da autonomia, a que, fora dos limites traçados na Lei fundamental, o corpo legllativo está intitulado. Não se argumente que menos importantes são as leis estaduais e mu- 37 nicipais, porquanto, no que toca aos interesses estaduais ou municipais, os projetos de lei pedem ser havidos como de suma importância. Ademais, se fosse menor a sua importância, não haveria razão, também, para que a sua apreciação fosse julgada mais urgente do que a dos projetos de lei federal, de modo que, ao Invés dos largos quarenta dias, estabelecidos pela Constituição Federal, para a sua apreciação, se deveriam estipular prazos menores, redutíveis a não se sabe quanto tempo. Não colhe, de outra parte, a alegação de que, por ser menor a composição dos corpos legislativos estaduais e municipais, lhes será mais fácil deliberar em menos tempo: Quanto aos Estados, estes, em geral, assim não pensam, porque são raros os que encurtaram os prazos para a apreciação dos projetos, sujeitos a aprovação pelo decurso do tempo. Ademais, e maior ou menor dificuldade em deliberar, acerca da aprovação ou não, de projeto de lei, não constitui o elemento que figura como decisivo para a fixação de prazo destinado a deliberação, uma vez que esse elemento reside na urgência do projeto, urgência que não será maior para os Estados e Municípios do que para a União, onde o prazo, para a apreciação do projeto, por ser este urgente, é de quarenta dias. A anomalia constitucional, consistente na redução do prazo para a apreciação de projetos de lei, reputados urgentes, cresce de ponto no que toca à regra estatuída na Constituição do Estado do Rio de Janeiro, art. 188, f 2?, onde se prescreve: «Caso julgue urgente a medida, o Prefeito pode solicitar a apreciação do projeto em vinte dias». Com a assinação desse prazo — vinte dias para a apreciação do projeto — estima-se, certamente, que os profetos, pronunciados como urgentes, não são apenas urgentes, mas urgentíssimos. Mas se o são, porque não estabelecer 38 R.T.J. - 100 prazo menor para a sua apreciação, por exemplo, quinze dias, dez dias, cinco dias? Replica-se que não seria razoável. Pergunta-se, no entanto, a partir de que limite o prazo deixaria de ser razoável, para tornar-se, por não revestir esse característico, inconstitucional a sua estipulação? Ainda! Se razoável, para alguns mu.licipios, de menor porte, seria o prazo razoável para outros, onde os projetos de lei lidem com problemas de maior complexidade? A .Constituição do Estado do Rio de Janeiro cortou a questão, porque, no seu entender, o prazo que é razoável para o menor dos seus municípios é razoável, também, exempli gratia, para o Município do Rio de Janeiro, onde se situa, com todos os seus problemas, uma das megalópolls, com que a idade contemporânea atemoriza ou aflige os gestores da coisa pública. Essa Carta Constitucional, tratando igualmente, no que concerne ao processo de formação da lei, cujo projeto se tenha definido como urgente, municípios entre os quais reina, quanto à composição dos corpos legislativos, flagrante desigualdade, municípios entre os quais impera, no que toca aos problemas que lhes são peculiares, indiscutível disparidade, trata igualmente — § 2? do art. 188 — entidades desiguais, rompendo, assim, com o princípio de igualdade. Tudo isso concorre para demonstrar que o contribuinte estadual, no caso, procedeu de modo arbitrário. Sobre esses argumentos se alteia, contudo, decisivamente, o que concerne à intocabilidade, no que tange à apreciação dos projetos, que o Chefe do Poder Executivo pronuncie como urgentes, da regra estabelecido no § 2?, do art. 51, da Constituição Federal. Por estes fundamentos, julgo procedente, data venta, a presente representação para declarar inconstitucional o § 2?, do art. 188, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. EXTRATO DA ATA Rp. 1.026 — RJ — Rel.: Min. Moreira Alves. Repte.: ProcuradorGeral da República. Repdos.: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e o Governador do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Pediu vista o Ministro Rafael Mayer, após o voto do Ministro Relator, que julgou improcedente a representação: e do voto do Minisro Leitão de Abreu, que julgou procedente a representação, para declarar a inconstitucionalidade do § 2?, do art. 188, da Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, Decio Miranda e Rafael Mayer. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 15 de outubro de 1980 — Alberto Veronese Aguiar, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Rafael Mayer: Ao dispor sobre o processo legislativo, no capitulo do Poder Legislativo Estadual, a Constituição do Estado do Rio de Janeiro, em confronto com o modelo federal, regulou o procedimento abreviado, no artigo 41, pelo qual são apreciados pela Assembléia Legislativa, projetos de lei sobre qualquer matéria, enviados pelo Governador, no prazo de sessenta dias, enquanto no modelo federal esse prazo é de quarenta e cinco dias, sucessiva e distintamente, para cada uma das casas do Congresso (art. 51). E o procedimento urgente, pelo qual a apreciação será no prazo de quarenta dias (art. 40, § 2?), coincidente com o disposto no art. 51, § 2?, para a reunião conjunta do Congresso Nacional. Em um e outro ca- — 100 so se tem a aprovação tácita do projeto, como enviado, se decorrido o prazo, dentro nele não se deliberar. Entretanto, na parte sobre Organização Municipal, no capitulo relativo ao processo legislativo das Câmaras Municipais, conceituadas como órgãos legislativos do Município, determina-lhes a observância do principio da aprovação tácita dos projetos enviados pelo Prefeito, pelo decurso do tempo sem deliberação, mediante o procedimento abreviado, em quarenta e cinco dias ( art. 188) e em procedimento urgente, vinte dias (art. 188, § 2?). Somente com relação à ultima hipótese é irrogada a mácula de inconstitucionalidade. Desde logo, data venta, não me parece que ele ocorra Decerto, o art. 200, da Constituição Federal, na redação da Emenda n? 1, reza que as disposições constitucionais federais ficam incorporadas, no que couber, ao direito constitucional legislado dos Estados. Não se admita, porém, que essa incorporação seja capilar e milimétrica, pois a própria cláusula modal, concede a flexibilidade indispensável para o atendimento das realidades circunstanciais destinatárias da incorporação. A interpretação desse dispositivo não se faz isoladamente mas, como em boa hermenêutica, sistematicamente com o art. 13 da Constituição, onde enumerados os chamados princípios extensíveis, dentre os quais o processo legislativo, sem desprezar o critério político do regime. No regime federativo, a autonomia pode ser reduzida ao máximo, conquanto não ao ponto de ser anulada de todo a capacidade de autoorganização, o que comporta uma margem de variações e módulos alternativos, desde que não desbordem do quadro dos princípios, que são 39 princípios, estes a serem indeclinavelmente observados na organização estadual. Cuido, portanto, não esteja afastado o poder estadual de realizar a adaptação de suas Constituições, e, pela própria natureza da adaptação, acomodar os princípios federais ás realidades estruturais peculiares do Estado. A circunstância de que não se tenha reiterado no atual art. 200 a primeira parte do art. 188 da redação original da Constituição de 1967 não retira obviamente o poder de emenda constitucional, de âmbito estadual, no sentido aqui proposto. pois a norma primitiva visava facultar tãosomente um procedimento excepcional de reforma constitucional, sem que a sua inexistência implique em desfazer-se o procedimento ordinário de revisão. Não é despiciendo que diversas Constituições Estaduais tenham adotado a redução ora de um ora de outro prazo, o que reflete uma consideração comum sobre diferenças indisfarçáveis a desaconselhar a aplicação rígida e formal de um paradigma que tem outros pressupostos institucionais. Basta ver a mais saliente que é a característica unicameral das Assembléias Legislativas para que não se tenha al o perfeito reflexo de uma condição temporal imposta, no plano federal, a duas câmaras, ou à reunião das duas, com bem mais numerosa composição e complexa organização e funcionamento. Ai o poder autonómico se exerce legitimamente. Guarda-se o principio do processo legislativo, pelo qual se assegura ao Executivo, com a primazia que modernamente se lhe tem reconhecido, a realização do interesse de ter prontamente apreciado, livre de obstruções, o projeto que julgue merecedor de urgência. Não ofende o principio que o de- 40 R.T.J. - 100 curso do prazo se faça em tempo menor, atendendo às peculiaridades locais e a critério do constituinte estadual, desde que não se infirme a possibilidade da pertinente manifestação parlamentar, enfim desde que seja razoável, usual expressão de notória conotação jurídica. VOTO O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque (Presidente): Peço licença à maioria qualificada, que já se formou, para acompanhar o voto do eminente Ministro Leitão de Abreu. Procurei, na jurisprudência da CaSe a colocação me soa válida fren- sa, algum precedente a respeito do te à organização dos poderes do Es- tema, porque me parecia difícil que, tado, maior significação assumirá se tantos anos depois da inovação, não o equacionamento se fizer diante da se houvesse cuidado dele. Na verdaorganização municipal, à qual as de, nada encontrei que representasse exame frontal, pelo Tribunal, do Constituições estaduais e leis orgâni- o que está fazendo objeto da cas municipais transferem os mol- problema des federais com maior índice de representação. discrição e critério mais amplo de Mas, em certa representação da adaptabilidade. E o ponto sob exame Guanabara, a Rp 823, de que foi Rediz precisamente sobre organização lator o eminente Ministro Adalício municipal. As difrações que ai sofre Nogueira, cujo acórdão está publicaa aplicição dos princípios extensivos do na RTJ 56/601, examinou-se a arsão ainda mais patentes, pois a si- güição de inconstitucionalidade de tuação institucional não apresenta preceito constitucional estadual que, uma réplica para o recebimento do a propósito do prazo para a apreciamodelo, já que nem o esforço dos ção do projeto, fixava-o em tempo municipalistas convence de que o maior do que o estabelecido na ConsMunicípio tenha autonomia política, tituição Federal. Alegava-se que esIntegre a federação ou se organize norma era inconstitucional, porpela divisão de poderes. A Câmara sa discrepava do modelo federal. O Municipal, — que não representa um que voto eminente Relator, acompapoder legislativo como o da União ou nhadodosem acréscimos pelo Tribudo Estado, — justifica, se não recla- nal, foi repelindo a argüição e se remada, por sua estrutura, pelo seu di- portando, repetindo-a à observação mensionamento e por sua competên- feita no parecer da Procuradoria-Gecia, um tratamento compatível com ral, no sentido de que inconstituclosua escala institucional e peculiari- nalidade haveria se o prazo fosse dade organizacional. Para a obser- menor, mas, não, maior, porque em vância do princípio do processo le- nada coartava a atuação do Poder gislativo, e para o procedimento de Legislativo. Todavia, não se enfrenurgência vigente para o Congresso tou, na verdade, a questão. Esta foi Nacional, bem consentâneo com a a única referência que encontrei nos sua realidade é a estipulação do pra- precedentes. zo de vinte dias, mais talvez do que os quarenta daqueloutro, acomodada De todo modo, parece-me que a a uma situação complexa que aqui questão da limitação do prazo para se apresenta bem simples. apreciação dos projetos do Executivo entesta com o princípio, que a tuPelo exposto, data venha, acompa- do preside, das relações entre os Ponho o voto do eminente Relator, jul- deres, que hão de ser harmônicas e gando improcedente a representa- em termos que permitam o pleno exercício da atuação de cada qual. ção. 41 R.T.J. — 100 Não creio, por isso, que os limites temporais traçados na Constituição Federal para que as Casas Legislativas apreciem projetos do Executivo, possam ser reduzidos ainda mais nas áreas estadual e municipal. Penso que eles já são o mínimo suportável para poderem conviver com o principio constitucional da harmonia e independência dos Poderes. O prazo de vinte dias, que se marca na Constituição do Estado do Rio de Janeiro para que as Câmaras Municipais — por exemplo, a Câmara Municipal do município do Rio de Janeiro — apreciem projetos mandados pelos Prefeitos, é uma irrisão. O sistema constitucional federal, a meu ver, pode ser decalcado, mas sem maior aflição para as Casas Legislativas. No máximo, o que se pode fazer no âmbito estadual e municipal é repetir os prazos dados na Constituição Federal; diminui-los ainda mais, a meu ver, agride o postulado da harmonia entre os Poderes. Por isso, acompanho o voto do eminente Ministro Leitão de Abreu e Julgo procedente a representação. EXTRATO DA ATA Rp. 1.026 — RJ — Rel.: Min. Moreira Alves. Repte.: ProcuradorGeral da República. Repdos.: Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro e o Governador do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Julgou-se improcedente a representação, vencidos os Srs. Ministros Leitão de Abreu e Xavier de Albuquerque, (Presidente). Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Soares Mufioz, Decio Miranda e Rafael Mayer. Ausentes, justificadamente, os Srs. Ministros Antonio Neder e Cunha Peixoto. ProcuradorGeral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 26 de novembro de 1980 — Alberto Veronese Aguiar Secretário. REPRESENTAÇÃO N? 1.062 — MS (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda. Representante: Procurador-Geral da República — Representado: Assembléia Legislativa e Governador do Estado. Constitucional. Organização Judiciária Estadual. Vedadas emendas que determinem aumento de despesa, ou estranhas ao objeto da proposta do Tribunal de Justiça, nessas duas proibições incidiu a emenda de que resultou o art. 341 da Lei n? 39, de 18.12.1979, do Estado de Mato Grosso do Sul, segundo o qual a partir de 1? de janeiro de 1982 a Comarca de Dourados passaria a Entrância Especial. A uma, porque a emenda determina aumento de despesa, ainda que em exercido subseqüente ao imediatamente seguinte à votação da proposta. A duas, porque a atribuição de status de Comarca Especial, a outra sede que não a da Capital, envolve definição implícita de requisitos dessa qualificação, o que não fora objeto da proposta do Tribunal de Justiça. 42 R.T.J. - 100 ACORDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, julgar procedente a Representação e declarar inconstitucionalidade do artigo 341, da Lei o? 39, de 18 de dezembro de 1979, do Estado de Mato Grosso do Sul. Brasilia, 7 de outubro de 1981 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Dedo Miranda, Relator. RELATOR 10 O Sr. Ministro Decio Miranda: Atendendo a solicitação do Colando Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul, o ProcuradorGeral da República oferece representação ao Supremo Tribunal Federal, para que declare a inconstitucionalidade do art. 341 da Lei n? 39, de 18 de dezembro de 1979, Código de Organização Judiciária do referido Estado, que teria sido votado com desatenção ao art. 144, § 5?, da Constituição Federal. Na proposta enviada pelo referido Tribunal à Assembléia Legislativa, para modificação de dispositivos da Lei• de Organização Judiciária do Estado, e isso em cumprimento ao preceito do art. 139 da Lel Complementar n? 35, de 14.3.79, Lei Orgânica da Magistratura Nacional, houve por bem aquela Assembléia acrescentar o art. 341, que veio a figurar no texto da nova Lei, o? 39, de 18.12.79, a dizer que «a partir de primeiro de janeiro de 1982, a Comarca de Dourados passará a Entráncia Especial». (Fls. 14). Solicitadas informações, vieram as da douta Assembléia Legislativa (fls. 22-35) e as do Senhor Governa- dor do Estado, estas acompanhadas de parecer do Procurador-Geral do Estado (fls. 43-9) as primeiras defendendo a subsistência do preceito impugnado, as segundas apoiando a argüição de inconstitucionalidade. As informações da Assembléia Legislativa, prestadas por seu Presidente, Deputado Londres Machado, contestam que a disposição impugnada importe em aumento de despesa, aferida tal circunstância em relação a despesa prevista no projeto, ou que haja resultado de emenda estranha ao objeto da proposta. E assim concluem: «Ao argumento que a elevação da Comarca a Entrância Especial acarretará um aumento de cinco cargos de juizes de entrância especial em 1982 e, conseqüentemente, o aumento de despesas, pode-se contra argumentar dizendo-se que poderá — até 1982 — ocorrer a diminuição de Comarcas no Estado, que compensarão aquele aumento ou então que o número de vagas previstas para a segunda entrância não estará totalmente preenchido, havendo dessa forma uma compensação dentro do orçamento anual; afastando, assim, a hipótese da ocorrência do aumento de despesas. Ai, então, seria discutir o futuro, o que está por acontecer, o que pode ou não ocorrer daqui a algum tempo. Vale a pena observar que só encontramos alguma referência de caráter financeiro, no Projeto, em seu artigo 329, que diz: «Artigo 329 — As dotações orçamentárias consignadas ao Poder Judiciário, ser-lhes-ão creditadas, em duodécimo, até o quinto dia do mês seguinte ao vencido, ressalvadas aquelas destinadas a atender despesas cujo montante exija maiores recursos.» R.T.J. — 100 Se aceitássemos — ad argumentandum — cornc válida a alegação do ilustre Presidente do T.J. de M.S., diriamos, uma vez ainda, que não houve aumento de despesas, els que o próprio T.J., na proposta original, remete todas as despesas à «lei orçamentária», conforme se depreende, claramente, da simples leitura do artigo 329. O que houve, então, foi a manifestação popular, através de seus legítimos representantes, no sentido de elevação da Comarca. Essa elevação, terá o respaldo suficiente na previsão orçamentária a ser votada no ano de 1981, para entrar em vigor a 1? de janeiro de 1982, e onde, o Tribunal deverá solicitar a cobertura necessária ao cumprimento da lei ora votada, sancionada e promulgada. A não aceitação da emenda, seria o mesmo que se passar, ao Poder Legislativo, o diploma de simples chancelador da vontade do Judiciário e do Executivo e a quem caberia, tão só e unicamente, aprovar In totum ou In totum rejeitar o que fosse encaminhado à sua consideração. Nesse caso, então, indagaríamos: e onde fica a manifestação de vontade popular? e como fica o artigo 6? da Constituição Federal, que reconhece três poderes do Estado? e como se explicaria a Independência dos poderes do Estado? São indagações que, evidentemente, permanecerão acaso seja cerceado o legitimo direito do parlamentar de emendar projeto de iniciativa reservada, mesmo «sem aumentar a despesa prevista no projeto», como diz Manoel Gonçalves Ferreira Filho e como é o caso em exame.» (Fls. 33-5). Já o parecer adotado pelo Senhor Governador considera, em conclu- 43 são, ser «inquestionável que o art. 341, do Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado, que eleva á categoria de entrância especial a Comarca de Dourados, a partir de 1982, resultando de emenda aditiva da proposta de modificação daquele diploma legal apresentado pelo Tribunal de Justiça à Assembléia Legislativa, constitui grave e flagrante afronta ao principio de exclusividade da iniciativa do Poder Judiciário, consagrado pelo 5? do art. 144 da Constituição Federal». (Fls. 49). A Procuradoria-Geral da República, em parecer do Procurador Walter José de Medeiros, aprovado pelo Procurador-Geral, Doutor Inocênclo Mártires Coelho, oficia pela procedência da argüição de inconstituclonalidade, salientanto, na parte precípua, o que se segue: «Sustenta-se em resumo que, ao elevar a comarca de Dourados á entrância especial, teria o Legislativo local, a um só tempo, oferecido emenda estranha ao objeto da proposta inicial e ainda determinante do aumento da despesa pública, porquanto tal elevação implicaria aumento de mais cinco cargos de juizes, com ofensa ao dispositivo constitucional mencionado. A matéria em exame, ainda que sob outros ângulos, já foi enfrentada pelo Supremo Tribunal, como, por exemplo, na Representação n? 1.009, de Mato Grosso, em que se reputou inconstitucional dispositivo de lei estadual onde se previa aumento do número de comarcas não indicadas pelo Tribunal, a quem, privativamente, compete a iniciativa do processo legislativo para tanto. Desse precedente foi relator o eminente Ministro Rafael Mayer que, em brilhante voto, pôs em destaque a solução de equilíbrio encontrada pela redação do atual 44 R.T.J. - 100 art. 144, 5?. da Constituição, onpesa pública, pela necessidade de, segundo S. Exa., «remanesce conseqüente da ampliação do núa dominância da experiência e do mero de juízes, importou também interesse maior do Tribunal de em aprovação de emenda estranha Justiça no imprimir as linhas e os ao objeto da proposta. elementos da organização judiciáNestas condições, opina a Procuria dos Estados», acrescentando radoria-Geral pela procedência da em seguida: representação a fim de que seja declarado inconstitucional o art. «Assim é que, na redação dada 341 da Lei n? 39, de 18 de dezembro pela Emenda 7 ao â 5? do art. 144 de 1979, do Estado de Mato Grosso da Constituição, a proposta de aldo Sul (Código de Organização e teração da divisão e organização Divisão Judiciárias).» (Fls. 52-3). judiciária, do Tribunal de Justiça 2 o relatório. à Assembléia Legislativa, tem a sua substância sob o resguardo da formal vedação de emendas VOTO estranhas ao objeto da mesma proposta ou que sejam determiO Sr. Ministro Decio Miranda (Renantes de aumento de despesa, para assegurar o evitamento de lator): As informações do Senhor critérios ou de soluções não con- Presidente da Assembléia Legislatidizentes com a conveniência do va põem ênfase, como se viu, na asserviço judiciário de que o Tribu- sertiva de que a proibição de emenda que aumente a despesa somente nal se faz intérprete». se relaciona com a «despesa previsMais recentemente, na Repre- ta», como está dito no art. 57, parásentação n? 1.043, do Maranhão, de grafo único, da Constituição, o que que saiu vencedor o voto do emi- significaria «despesa prevista no nente Ministro Soares Minioz, pre- projeto». valeceu na Suprema Corte a tese Ora, aduz o nobre informante, o da inconstitucionalidade do disposi- projeto em causa não continha dispotivo de lei local que cria comarca sição sobre a quanto montaria a desou vara em locais diferentes dos pesa com a execução da lei dele reIndicados na proposta, não por sultante. ofensa ao requisito relativo ao auDal, entender improcedente a armento da despesa, mas por importar em aprovação de emenda estra- güição. Sem necessidade de conferir o arnha ao objeto da. proposta (DJ de gumento com as disposições genéri7.8.81). cas da Constituição relativas ao proNa hipótese em comento, embo- cesso legislativo (Seção V do Capítura não se trate da criação de co- lo VI do Título I), é bem de ver que, marca, a verdade é que a elevação no atinente à elaboração das leis de de Dourados, em Mato Grosso do organização judiciária dos Estados, Sul, de segunda entrância, para en- a regra pertinente situa-se na vedatrância especial, por, obra de ção de emendas «estranhas ao objeto emenda parlamentar, fora da pro- da proposta ou que determinem auposta originária do Tribunal, cons- mento de despesa», consoante o art. titui sem dúvida, ofensa ao 144, 5?, da mesma Carta, disposiprincípio Inscrito no 5? do art. 144 ção especifica sobre o processo legisda Constituição Federal, pois, lativo das leis de Organização Judialém de implicar aumento da des- ciária dos Estados. 95 R.T.J. — 100 Aqui, desenganadamente, não é necessário que se trate de despesa quantitativamente prevista no projeto, nem mesmo é indispensável que o projeto a preveja, se aprovado anteriormente à confecção do orçamento que haja de inclui-la. Basta, à proibição, que a emenda tenha como efeito, objetivamente, aumento na despesa global do Estado. Suficiente este aspecto para configurar-se a argüida inconstitucionalidade. Mas também prospera a argüição pela eiva da estraneidade em relação ao objeto da proposta. O Estado de Mato Grosso do Sul tem apenas uma Comarca de Entrãncia Especial: a que compreende o Município da Capital e alguns Municípios circunvizinhos. Erigir em Comarca Especial a que tenha sede em Município outro, que não o da própria Capital, envolve asserto implícito, mas relevante, sobre aspecto que não fora objeto da proposta, a saber, a definição de requisitos que, a par do já consagrado pela simples circunstância da sede na Capital do Estado, determinariam ou autorizariam a transformação de Comarca do interior do Estado em Comarca de Entrancia Especial. Dessa especial e imprescindível definição não cuidou a proposta do Tribunal de Justiça. A atribuição de status de Entranda Especial a Comarca do Interior do Estado exige proposta prévia de definir qualificações suficientes para essa elevação, tema submetido á iniciativa de outro Poder, dos que formam o sistema tripartite. Não poderia ter resultado, como no caso resultou, de deliberação autónoma do Poder Legislativo, a cuja independência no elaborar normas de organização judiciária o atual ordenamento constitucional não confere tal amplitude. A definição de princípios básicos sobre classificação das Comarcas, matéria de singular relevo na Organização Judiciária Estadual, depende da conjugação harmoniosa da iniciativa do Poder Judiciário com deliberação do Poder Legislativo. Isto posto, acolho, por seus dois fundamentos, a argüição de inconstitucionalidade do art. 341 da Lei n? 39, de 18 de dezembro de 1979, que institui o Código de Organização e Divisão Judiciária do Estado de Mato Grosso do Sul e dá outras providências. o meu voto. VOTO O Sr. Ministro Néri da Silveira: A elevação da comarca de Dourados, de 2! entrância, para entrância especial, equiparando-a, dessarte, á comarca da Capital, Campo Grande, ofende, sem dúvida, o art. 144, 5?, da Constituição, verbis: «fi 5? — Cabe privativamente ao Tribunal de Justiça propor ao Poder Legislativo a alteração da organização e da divisão judiciárias, vedadas emendas estranhas ao objeto da proposta ou que determinem aumento de despesa». A elevação de grau de comarca é matéria de organização judiciária, não sendo admissivel emenda a proposta do Poder Judiciário sobre dita matéria, tal como a de que provei o o art. 341, da Lei n? 39/1979, Código de Organização Judiciária do Estado de Mato Grosso do Sul. Estou, assim, de acordo com o eminente Ministro Relator, no que concerne à infringência do art. 144, â 5?, da Constituição. 46 R.T.J. — 100 Em verdade, comarca de entrâneia especial possui status superior, em confronto com comarca de segunda ou terceira entrâncias, correspondendo, atualmente, à situação da comarca da Capital. A elevação cogitada importa em aumento de despesa e não é objeto de proposta do Tribunal de Justiça, que não pretendeu comarca do interior na condição de entrância especial. lar se exerce de acordo com a Constituição e as leis: se a Constituição condiciona a manifestação da Assembléia à iniciativa do aumento de despesa, não há restrição injustificável à soberania popular. Gostaria de aduzir com referência às informações do Presidente da Assembléia, de que a soberania popu- Brasília, 7 de outubro de 1981 — Jonas Célio Monteiro Coelho,. Secretário. Por outro lado, quando a lei defere à Assembléia aprovar ou não a proposta do Poder Judiciário, evidentemente lhe reserva não só altíssima atribuição, como põe em suas mãos Pelos dois fundamentos apontados rejeitar a proposta do Judiciário. no brilhante voto do Sr. Ministro ReNão vejo apoucamento da Assemlator, acompanho, pois, S. Exa., para julgar procedente a Representa- bléia Legislativa, e assim não creio ção e declarar inconstitucional o art. que esteja restaurando, pura e sim341, da Lei n? 39/1979, que dispõe so- plesmente, o preceito que existia na bre o Código de Organização Judi- Constituição de 1969, com a devida ciária do Estado de Mato Grosso do vénia do Ministro Cunha Peixoto. Sul. EXTRATO DA ATA VOTO Rp-1.062 — MS — Rel.: Min. Decio O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Se- Miranda. Repte.: Procurador-Geral nhor Presidente, estou de acordo da República. Repda.: Assembléia com o eminente Relator apenas na Legislativa e o Governador do Estasegunda parte do seu voto, isto é, do. por ter havido aumento de despesa. Admitida a impossibilidade de emenDecisão: Julgou-se procedente a das nos projetos de organização judi- Representação inconsciária, voltaríamos à primitiva reda- titucionalidade edodeclarou-se artigo 341, da Lei ção da Constituição de 1969, em que n? 39, de 18 de dezembro 1979, do a organização era exclusiva compe- Estado de Mato Grosso dodeSul. Impetência dos Tribunais, nas suas resoluções. Se, mandado um projeto de dido o Ministro Firmino Paz. organização, não se pode modificaPresidência do Senhor Ministro lo, o projeto representa a própria lei Xavier de Albuquerque. Presentes à de organização judiciária. Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Decio MiranVOTO da, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete, Firmino Paz e Néri da Silveira. O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: Ausente, justificadamente, o MinisSr. Presidente, estou de acordo com tro Soares Mufloz. Procurador-Geral o eminente Relator, data venta do da República, Dr. Inocêncio Mártires Coelho. eminente Ministro Cunha Peixoto. R.T.J. — 100 47 AÇÃO REscisORIA N? 1.097 — PR " (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra. Autores: Sylvia Tellini Lopes — Ré: União Federal. — Ação Rescisória. Legitimidade dos sucessores do autor para propó-la. Precedente: AR n? 887, SP — RTJ 86/748. Inocorrência dos fundamentos invocados. Aplicação da Súmula 371. Improcedência. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão Plenária, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, á unanimidade de votos em julgar improcedente a ação rescisório. Brasília, 15 de outubro de 1981. — Xavier de Albuquerque, Presidente — Cordeiro Guerra, Relator RELATÓRIO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: A presente ação é proposta, pela viúva de Clotário de Macedo Lopes, visando rescindir o V. Acórdão da Egrégia 1, Turma, prolatado no Re 85.185 - Paraná, em 21.2.1978, assim ementado: «1. Lel n? 4.746-42, que transformou a Rede de Viação Paraná — S. Catarina em autarquia da União. Lei n? 2.752-56, art. 1? Direito a dupla aposentadoria. Súmula do STF, verbete 371. Ferroviário admitido como servidor autárquico não tem direito à dupla aposentadoria. Precedente do STF. 6. RE conhecido e provido. ( fls 108). Fundamentou-o o voto do eminente Ministro Antonio Neder, relator, concebido nestes termos: «O Eg. Tribunal a quo decidiu que o recorrido Clotário de Macedo Lopes era funcionário público ao ensejo da transformação da Rede de Viação Paraná - S. Catarina em autarquia, e que, por isso ele conservou esse status depois da mencionada transformação, donde a procedência do que postula nesta demanda, que foi ajuizada em 1969. Sucede que, ao julgar, em 1966 o Mandado de Segurança 15.046 impetrado pelo mencionado Clotário de Macedo Lopes e por outros, o Plenário do STF, apreciando a mesma questão agora discutida, julgou em votação uniforme,que os então Impetrantes, inclusive o recorrido Clotário sempre foram considerados servidores autárquicos, isto é, nunca foram funcionários Públicos. E o que se lê no acórdão copiado nas fls. 89-93 do qual foi Relator o nobre Ministro A.M.Vilas Boas. Esse acórdão veio para os autos com a petição do RE, e sua existência não Mi sequer mencionada pelo recorrido Clotário ao redigir a petição inicial desta demanda, falta que impediu fosse considerado nas instâncias ordinárias o contendo material desse julgado. 48 R.T.J. — 100 De qualquer forma, é indiscutível que o acórdão impugnado está em divergência com esse paradigma, cuja cópia se lê nos autos ( fls. 89-93). Doutro lado, se o referido Clotário e outros foram sempre considerados servidores autárquicos, qual o diz sobredito aresto do STF, não se tem como defini-los de outro modo, isto é , não se pode julgar que o mencionado Clotário tinha a qualidade que afirma, de funcionário público federal, quando, por força de Dec-lei 4.746-42, foi a Rede de Viação Paraná-S. Catarina transformada em autarquia da União. Vê-se do exposto,que o acórdão impugnado emprestou errónea de finição jurídica ao fato da causa, visto que definiu como funcionário público federal quem, por decisão do STF não tem essa qualidade. E assim julgando a controvérsia, o eg. Tribunal a quo impediu a incidência no caso, da regra indicada pela União no seu recurso, o art. 1? da lei 2.752-56, ou, mais precisamente o seu 1 único, norma que concede o direito a dupla aposentadoria aos que eram funcionários ao ser instalado o regime autárquico daquela Rede e, ainda mais, julgou em termos claramente contrário à jurisprudência indicada pela Recorrente, afinal condensada no verbete 371 da Súmula, verbis: «Ferroviário,que foi admitido como servidor autárquico, não tem direito a dupla aposentadoria.» Assim, embora o valor da causa seja menor do que o fixado no art. 308. IV, do Regimento Interno do STF (redação anterior à da Emerda n? 3-75), combinado com o Decreto número 64.442-69, conheço do recurso porque se configura, na espécie, a segunda exceção a que se refere o caput daquela regra regimental. E do recurso conhecendo, julgo a causa como expressa o art. 307, in fine do Reg. Int. Quanto ao mérito, estou em que prevalece a fundamentação deduzida no RE, pela qual a Recorrente se reportou ao voto que o nobre Ministro Decio Miranda proferiu no Tribunal .Federal de Recursos ao julgar a Apelação Civel n? 30.057 A essência desse voto está transcrita no relatório. Na verdade, o Recorrido não era funcionário público antes de se transformar em autarquia a Rede de Viação Paraná-S. Catarina (como,aliás, decidiu o STF no MS 15.046, fls. 89-93), e, por isto, ao proceder-se à referida transformação, passou ele a funcionário autárquico (lel 2.284-54). Se o Recorrido não teve jamais a qualidade de funcionário público da União, não pode aceitar-se o entendimento de que faz jus a duas aposentadorias, uma pelo Tesouro Nacional, outra de natureza previdenciária. Dou provimento ao recurso para julgar a ação improcedente e condenar o vencido a que pague as custas e os honorários advocaticlos, estes na quantia de cinco mil cruzeiros, pois, no caso, não houve condenação em dinheiro e a Procuradoria da República demonstrou zelo na defesa da União e trabalhou nas duas instâncias ordinárias e na do STF (CPC, art, 20 1 4?). Recolher-se-á ao Tesouro Nacioral a quantia dos honorários advocaticios a serem pagos à vencedora porque seus procuradores recebem vencimentos pelo exercido dos respectivos cargos. — too Alento a que se configura na espécie o caso previsto no art. 16 combinado conto o art. 17, III, do CPC, visto que o Reeorrldo omitiu intenclettaiMente o tato de que fera vencido, antes, cento impetrante do MS 15.046, essencial pata o julgamento desta califa, deve responder pelos prejultos que produziu na fleeotrente, os queda, no cate, «estão indenizados pela verba de honorários. (fls. 1047).» Alicerça a ação a invocado do que Clotário de Macedo Lopes era funcionário público antes de ser tramite:nada em autarquia a Rede Viação Paraná-S. Catarina, e, como tal. continuou a servi-Ia, após a transfOrmação, e ainda, "peia de sua incorporação à Rede frerroviária Federal S.A., e, etn conseqüência, assistia-lhe o direito liquido e certo de se aposentar pelo Tesouro Nacional sem prejulto da aposentadoria pelo Instituto de Previdência a que estava compulttoriamente vinculado, nos termos do Dee-lei 2.004, de 7.3. art. 485, V e IX do CPC, sustentando 1940; DeeretMel 8.821, de 24.1.1946, Lei 2.752, de 10.4.1956. Sustenta a autora que o julgado impugnado desatendeu ao tato de ser o seu marido funcionário público, o q ue foi certificado a fl. 11 dos autos em apenso. Invoca. ainda, desataiçaa às Mantem 279, 454. 294 e 400. Contestando a ação, a União Fedeal alega pite o autor não era funcionário público antes da autorização da fleflé, e, cenneeitententente, não teria direito ft MS aparderette ria (Lei 2.752, de 10.4.198e, 1 ~Co de) art. lt), conforme nunterems julgados e a Súmula 371. Que a condição jurídica do autor não é matéria de fato, mas de direito e, quando multo.seria é de aplicar-se a Súmula 343. 49 Concitando: «Finalmente, a espancar qualquer dúvida quanto à correção do acórdão rescindendo, temos que o falecido:, marido da Autora era Procurador de 2! categoria, fls, 33, conforme sua ficha funcional e referido na sentença inicial f. 44. Ora, a Ré União Federal nunca possuiu em seu quadro da Administração Direta Procuradores Autárquicos, mas, sim, Procuradores da República. Tal fato, relevante e fundamental mesmo, passou desapercebido ao exame procedido pelas Meilen proferidas neste caso. Aliás, no referente a tal aspecto da situação fática, podemos invocar os Mandados de Segurança 15.150, Relatar Ministro Luiz Gallotti e 15.281, Relator Victor Nunes, cujos acórdãos anexamos, relativos a pedidos de dupla aposentadoria de procuradores da Estrada de Perro Central do Brasil. Realmente, pretender que procurador autárquico tem direito a dupla aposentadoria é demais, é pretender juntar legislação distintas para casos distintos no que melhor aprouver. Ou bem o servidor é autárquico, por ser procurador, ou não o é. Ser e não ser, ao mesmo temo°, parece-nos que a legislação não permite. Também nesse ponto invocável é, no mínimo, a Súmula 343 em face dos precedentes retro aludidos» (fls. 134135) . Arrazoaram as partes impugnando os seus pontos de vista, e a douta Procuradoria-Geral da República, afinal assim se manifesta: «Com fundamento no art. 485, itens V e IX, do CPC, propõe Sylvia Tellinl Lopes, na qualidade de pensionista de Clotário de Macedo Lopes, et-ferroviário falecido, ação rescisória contra a União Federal, para desconstituir acórdão R.'r J. - 100 da Egrégia Primeira Turma do STF, proferido no RE. 85.185 ( fls. 128-143), que traz a seguinte ementa: I.Lei n? 4.746-42, que transformou a Rede de Viação Paraná-S. Catarina em autarquia da União. 2. Lei n? 2.752-56, art. 1?. Direito à dupla aposentadoria. 3.Sümula do STF, verbete 371. Ferroviário admitido como servidor autárquico não tem direito à dupla aposentadoria. Precedentes do STF. 6. Recurso extraordinário conhecido e provido. Alega a autora, em resumo, que o acórdão embargado dissentiu das súmulas 279,454,291 e 400, e de julgados que a elas deram aplicação, bem como ofendeu a legislação federal anterior e posterior à transformação da Rede em Autarquia, que atribuiu e reconheceu a condição de funcionário público ao ex-servidor, contrariando as provas do processo. Contestou a União Federal, sustentando que os antigos funcionários da Rede de Viação Paraná-S. Catarina só passaram à condição de servidores autárquicos com o advento do Dec-Lei 4.746, de 25.9.1942, de modo que se impunha mesmo a aplicação da Súmula 371 ao caso Acrescentou que a jurisprudência do STF, em relação aos servidores da antiga Rede de Viação Paraná-S.Catarina,sempre foi orientada nesse sentido. Observa-se preliminarmente, que há obstáculo no próprio julgamento do mérito da presente rescisório. Há, com efeito, coisa julgada material representada pela decisão proferida pelo STF no MS 15.046DF, em 17.2.1966 (Eis. 89 e 93 do apenso), requerido por Clotario de Macedo Lopes e outros contra ato do Presidente da República, que indeferira seus pedidos de aposentadoria pelo Tesouro Nacional. Considerou o Egrégio Plenário que os então impetrantes só passaram à condição de servidores autárquicos com o advento do Decreto n? 4.746,do 25.9.1942, e assim aplicou a Súmula 371, que tem o seguinte teor: «Funcionário que foi admitido como servidor autárquico não tem direito à dupla aposentadoria.» O venerando acórdão rescindendo aludiu a essa decisão precedente do Pretório Excelso, limitandose, porém, a considera-1a para configuração da divergência, pois tendo sido trazido para os autos apenas com a interposição do recurso extraordinário, não fora possível às instâncias ordinárias considerar o conteúdo material desse juizado. Apenas a ausência de prequestionamento, portanto, impediu o reconhecimento da coisa julgada no acórdão rescindendo. Entretanto, a decisão prolatada no MS 15.046 surge como óbice intransponível à pretenção da autora. Se a rescisório pode ter por fundamento a ofensa à coisa julgada (CPC, art. 485, IV), também a ré na ação pode argüi-la como exceção ou como matéria de defesa. A União argüiu a coisa julgada nas razões de fls. 180-1, inexistindo, portanto, obstáculo ao seu reconhecimento. A coisa julgada, com efeito, poder ser argüida como exceçãO ou em qualquer fase do processo sendo questão suscetível de ser reconhecida até mesmo de oficio Lopes da Costa, Dir. Proc. Civil, 1947, v. 2, p.170, n? 214, e José Frederico Marques, Inst. de Dir. Proc. Civil v. 5, p. 1. 03). R.T.J. No MS 15.046, Clotário de Macedo Lopes e outros servidores da Viação Paraná-S. Catarina requereram também a aposentadoria pelo Tesouro Nacional, com fundamento na mesma lei 2.752, de 1956, invocando a condição de funcionários Públicos, antes da transformação da ferrovia em entidade autárquica operada pelo Dec. 4.746, de 25.09.42. O reconhecimento da existência da coisa julgada implica em extinção do processo, sem julgamento do mérito, nos termos do art. 267, V, do CPC. No mérito, nota-se que a jurisprudência do STF está orientada no sentido de que, antes do Dec-lei 4.746, de 1942, os servidores da Rede não tinham a condição de servidores públicos (MS 15.046, 15.047, 15.062, 15.066, 15.172, 15.173, 15.174 e 15.175, fls. 102). Durante a emancipação, surgida com o Dec-lei n? 2.073, de 1940, a Rede Viação Paraná-S. Catarina manteve a personalidade Jurídica de direito privado e seus empregados continuaram submetidos à legislação trabalhista. Somente com advento do Dec-lei 4.746, de 1942, passaram á condição de servidores autárquicos (MS 15.066, relatado pelo Exmo. Sr. Ministro Luiz Gallotti. Em face do exposto, o parecer é pela declaração de extinção do processo ou pela improcedência da ação. Brasília, 28 de maio de 1961. — Moacir Antônio Machado da Silva. Procurador da República» (fls. 184-187). É o relatório que submeto à consideração do eminente Ministro Moreira Alves, Revisor. Brasília, 2 de setembro de 1981.— Cordeiro Guerra, Ministro Relator. — 100 51 VOTO Sr. Ministro Cordeiro Guerra (Relator): Tem-se admitido nesta Corte, e não é contestado nos autos, a legitimidade dos sucessores das partes para a propositura de ação rescisória (AR 887-SP, Relator Ministro Antonio Neder- RTJ 86-748), assim, está a viúva legitimada a pedir a rescisão do julgado em que foi vencido o marido. v. acórdão rescindendo, para negar a dupla aposentadoria pretendida pelo autor, partiu do pressuposto de que ele sempre foi considerado servidor autárquico, e isto com base no julgado no Mandado de Segurança n? 15.046, relatado pelo eminente Ministro Vilas Boas, ris. 89-93, do apenso, e em que era impetrante, entre outros, o autor da ação. Leio o acordão mencionado: «Sr. Presidente, o caso é assim exposto no parecer do eminente Ministro Oswaldo Trigueiro, quando servia como Procurador-Geral da República, a fl. 163: «Clotário de Macedo Lopes e outros impetraram mandado de segurança por haver a autoridade impetrada indeferido os seus pedidos de aposentadoria pelo Tesouro Nacional (dupla aposentadoria de que trata a lei n? 2.752, de 1956). 2 . Alegam que, sendo servidores da Viação ,Paraná-S. Catarina, são funcionários públicos federais, amparados pela Lei 3.115-57. 3. O Senhor Presidente da República remeteu as informações de fls. 118-121, firmadas pelo consultor Jurídico do Ministério da Viação e Obras Públicas,que esclarecem não terem os impetrantes o direito que se arrogam, uma vez que são servidores autárquicos, de Quadro extinto do Ministério da Viação, e 52 R.T.J. — 100 os autárquicos estão expressamente excluídos do benefício da dupla aposentadoria, pelo parágrafo único do art. 1? da lei n? 2.752, de 1956. Opinamos pelo indeferimento do pedido, uma vez que a pretensão dos impetrantes não encontra guarida na lei e é contrariada por jurisprudência pacífica. Realmente, a Rede Viação Paraná-Santa Catarina era empresa particular. Não importa que em 1930 tenha estado sob intervenção militar. O seu pedido não teve, por isso, mudado o stattis jurídico, continuando como empregado de empresa particular. O Decreto 4.746, de 25 de setembro de 1942, transformou a ferrovia em entidade autárquica, passando seus empregados a servidores autárquicos. São autárquicos até hoje, de Quadro extinto do M.V.O.P. sendo que no caso, vários dos impetrantes estão aposentados pelo IAPFESP Argumentam, ainda, com um parecer da Comissão de Classificação de Cargos e a lei n? 3.115, de 1957. O recente parecer do atual Consultor-Geral da República, n? 055-11, D.O. de 6.8.64, que.confirma entendimento antigo, inclusive o parecer 259-2, D.O. de 17.5.59, do então Consultor-Geral Dr. Gonçalves de Oliveira, fulmina o citado parecer d0 C.C.C., e reafirma que a lei 3.115, de 1957, conservou o status jurídico dos servidores autárquicos das ferrovias. 8. A jurisprudência dessa Colando Corte está consubstanciado na Súmula 371, Ferroviário autárquico não tem direito a dupla aposentadoria, excluído que foi pelo disposto no parágrafo único do art. 1? da lel n? 2.752-56.» É o relatório.» VOTO O Sr. Ministro Vilas Boas (Relator): De acordo com a Súmula 371, indefiro o pedido. Diz ela: «Ferroviário que foi admitido como servidor autárquico não tem direito a dupla aposentadoria.» Esses funcionários da Rede Viacão Paraná-S. Catarina sempre foram considerados serviddres autárquicos. O D. 4.746, de 1942, assim os declarou.» (Fls. 90-92 do apenso). Estabelecido, por sentença transitada em julgado, a condição de funcionário autárquico do marido da autora, no julgamento do Mandado de Segurança n? 15.046—DF, não haveria como rever, em ação ordinária, não ressalvada, essa conclusão. Errónea, portanto,era a qualificação jurídica dada no acórdão recorrido aos fatos da causa, e inaplicáveis à espécie as Súmulas 279, 454, 291 e 400, impunha-se o provimento do recurso extraordinário, nos termos da Súmula 371, que dispõe: «Ferroviário,que foi admitido como servidor autárquico, não tem direito a dupla aposentadoria.» Por conseqüente, não foi negada vigência ao parágrafo único do art. 1? da lei 2.752, de 1956, pois ao ser instalado o regime autárquico, não era o autor servidor ou funcionário público. Sustenta a autora, que o julgado revisando se alicerçou em erro de fato, resultante de atos e documentos da causa, por força do documento de fls. 11 do apenso - certidão passada pelo Departamento de Pessoal da Rede Ferroviária Federal S.A — fls. 11 a 14). Entretanto, se a certidão em referência é válida sobre os fatos e atos que especifica, não pode ser aceita R.T.J. — 100 como decisiva para definir, no campo do direito, a situação Jurídica do servidor, Já que a qualificação Jurídica da natureza do vinculo empregaticio é deferida á Justiça, em havendo controvérsia sobre a mesma. Na espécie, o v. acórdão revisando não admitiu um fato inexistente, curvou-se à coisa Julgada. Não considerou inexistente um fato efetivamente ocorrido, pelo contrário, decidiu em decorrência lógica, de julgado definitivo anterior,que naõ foi rescindido. 53 Por isso, a rescisória se arrima nos incisos V e IX do artigo 485 do Código de Processo Civil. 2. — Improcedem, porém, ambas as alegações. Com efeito, para Julgar como julgou, o acórdão rescindendo não se fundou em erro de fato, mas partiu da premissa — que é verdadeira — de que esta Corte, anteriormente, ao indeferir o mandado de segurança 15.046, de que um dos impetrantes era Clotário de Macedo Lopes, decidira que não tinha sido funcionário ~tico, mas sempre autárquico, racflo por que se lhe aplicava a Súmula 371 deste Tribunal. Não vejo, assim, configuradas as hipóteses dos incisos V e IX do art. 485 do CPC e, por via de consequênEm rigor, o acórdão rescindendo, cia, Julgo improcedente a ação, con- ao Julgar a causa, poderia ter entendenada a autora nos ónus da sucum- d$o que a questão então em debate bência, fixados os honorários em Já havia sido decidida, com trânsito 20% sobre o valor dado à causa. em Julgado naquele mandado de segurança, de que participara como um dos impetrantes Clotário de Macedo VOTO Lopes e' um que, Julgando-se o mérito da impetração (os impetrantes O Sr. Ministro Moreira Alves — 1. atacavam o ato que lhes negara a Dois são os ',Lindar/tentos da presente dupla aposentadoria), se indeferira a rescisória: segurança sob o fundamento de que « ferroviário que foi admitido como — que o acórdão rescinderido, servidor autárquico, não tem direito ao negar a dupla aposentadoria, a dupla aposentadoria (Súmula 371)» violou várias disposições legais (Os. 89 dos autos em apenso). Prefe(art. 1? dó Decreto-lel 2.004/40; riu no entanto, reafirmar a mesma art. 3? do Decreto-lei 8.821/46; art. decisão, partindo da premissa ante1? da Lei 2.752/56, todos relativos à riormente firmada pela Corte. De dupla aposentadoria; e arts. 14 e 16 qualquer sorte, não poderia o acórda lei 163/50; art. 15 e il§ 2? e 4? da dão rescindendo ter decidido o mériLei 3.115/57; art. 1? da Lei 2.284/54; to de maneira diversa, sob pena de art. 1? do Decreto 42.380/57; art. 2? ofender coisa Julgada. do Decreto 52.084/63; e art. 19 e seu parágrafo (mito da Lel 3.780/60; e Por cedro lado, essa mesma circunstância afasta a violação dos vá— que o acórdão rescindendo rios dispositivos legais invocados na se fundou em 'erro de fato, resul- rescisória: o acórdão rescindendo estante de atos ou de documentos da tava Jungido à coisa Julgada antecausa, os quais atestavam que Clo- rior, razão por que, ainda que quisestário de Mácedo Lopes era funcio se, não poderia reexaminar a maténário federal já antes da transfor- ria que Já havia sido decidida antes, mação da Rede em autarquia. havendo trânsito em Julgado. 54 R.T.J. — 100 3. — Em face do exposto. Julgo improcedente a presente ação, condenando a autora nas custas e em honorários de advogado que fixo em 20% do valor atribuído à causa, bem como determinando, se unânime a decisão, a reversão, em favor da ré,do depósito. EXTRATO DA ATA AR 1.097 — PR — Rel.: Min. Cordeiro Guerra. Rev. Min. Moreira Alves. Autora: Sylvia Tellini Lopes ( Advs.: Luiz Gastão L. I3ório e Aquiles R. de Oliveira). Ré: União Federal. Decisão: Julgou-se improcedente a Ação, unanimemente. Impedido o Ministro Firmino Paz. Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djact Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufioz, Decio Miranda, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete, Firmino Paz e Néri da Silveira. Procurador-Geral da República, Dr. Inocêncio Mártires Coelho. Brasília, 15 de outubro de 1981. — Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretario. AÇÃO RESCISORIA N? 1.120 (AgRg) — (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Rafael Mayer. Agravante: Superintendência Nacional da Marinha Mercante — SUNAMAM — Agravada: Imesa Veículos Ltda.. Ação rescisória. (Agravo Regimental). Depósito prévio. Autarquia. CPC, art. 488, único (exegese). Despacho de indeferimento da inicial (art. 490, II, CPC). — Os entes públicos isentos do depósito prévio para a ação rescisória, a que se refere o parágrafo único do art. 488 do CPC, compreendem tão somente a União, os Estados e os Municípios, não se estendendo o benefício aos órgãos de administração indireta dessas entidades públicas, inclusive as respectivas autarquias. Indeferimento da inicial ( art. 490, II do CPC). Agravo Regimental improvido. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, em conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, à unanimidade, em negar provimento ao agravo. Brasília, 29 de outubro de 1981. — Moreira Alves, Presidente — Rafael Mayer, Relator. O Sr. Ministro Rafael Mayer: A Superintendência Nacional da Marinha Mercante, autarquia federal, intenta ação rescisória contra a Imesa Veículos Ltda., visando a rescindir, com fundamento no art. 485, V, do CPC e art. 259 do RI/STF, o acórdão proferido pelo Plenário desta Corte, no ERE 89.413-RJ. Requereu a citação da Ré, e dando à causa o valor 55 R.T.J. — 100 de Cr$ 100.000,00, declarou não dever o recolhimento do depósito previsto no art. 488, II, do CPC, à luz do que dispõe o seu parágrafo único. Em face da Inicial, o Relator despachou nesses termos: «Intime-se a Autora para a efetivação, no prazo de dez dias, para a efetivação do depósito a que alude o art. 488, II do CPC». o despache; em Publicado 18.08.1982, a Autora apresentou petição reafirmando a sua isenção do depósito, visto gozar como autarquia, das mesmas prerrogativas concedidas ã União. Em despacho datado de 06.10.1981, publicado em 14.10.1981, foi indeferida a inicial, nos termos do art. 490, II, do CPC, in verbis: «Trata-se de ação rescisória intentada por autarquia atribuído o valor de Cri 100.000,00. Verificando que a inicial não foi acompanhada do depósito a que alude o art. 488, II do CPC, intirnelparaque o efetivasse, em despacho publicado a 18.08.1981. Veio a Autora, escusando-se de fazê-lo, por entender estar revestida das prerrogativas concedidas por lei à União (fls. 55). Entretanto, a exegese correta do parág. único do art. 488 do CPC não permite se estenda o privilégio além das entidades nele mencionadas, isto é, a União, o Estado, o Município e o Ministério Público, pois o preceito reclama uma interpretação de sentido estrito. Indefiro, portanto, a inicial, nos termos do art. 490, II do Código de Processo Civil». Dai a interposição do presente agravo regimental, argumentando, em resumo, que é inaplicável à Autora o art. 488, II, pois as multas se equiparam às custas e destas estão isentas as autarquias, como se vê do art. 2?, VI, c/c o art. 9? da Lei n? 6.032/74. Mantido o despacho agravado por seus fundamentos vai o recurso a Julgamento do Egrégio Plenário. E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Rafael Mayer (Relator): Cuido válido o entendimento de que a norma do parágrafo único do art. 488 do CPC que excepciona da exigência do depósito de 5% sobre o valor da causa, como requisito extrínseco da propositura da ação rescisória, a União, o Estado, o Município e o Ministério Público, não é extensiva aos órgãos, de administração indireta das mencionadas entidades públicas, inclusive as autarquias respectivas. Dèsde logo, a espécie é inconfundível, por sua natureza, função e destinação, do conceito de custas, pois enquanto estas são «aquela parte das despesas relativas à expedição e movimentação dos feitos, taxadas por lei», a multa, em que se pode transformar o depósito, no caso de improcedência da rescisória por unanimidade, tem o caráter de penalidade ou sanção, funcionando, no caso, como medida preventiva contra o impensado exercido de ataque à coisa Julgada (Cfr. Amaral Santos, Primeiras Linhas, 11/261 e segs.: Pontes de Miranda Tratado da Ação Rescisória, 497). Não colhe, portanto, argumento da Agravante no invocar, na hipótese, a legislação especifica, Inclusive isencional, sobre custas. Em se tratando de norma excepcional, porquanto institutiva de um privilégio, pede a hermenêutica que se lhe dê interpretação estrita, a excluir de sua abrangência o, —ates que nela não estão nomeadamente contemplados. 56 R.T.J. - 100 Do ponto de vista sistemático, sempre que a lei processual, como qualquer outro ordenamento, quer privilegiar de maneira ampla as entidades de direito público de administração direta e indireta, emprega o conceito global da Fazenda Pública, como por exemplo nos arts. 27, 188, 197, 240, 475, III, 511, 730 e outros, enquanto dispõe, distinta e especificamente, com relação às entidades político-administrativas centralizadas, isto é, a União, o Estado' e o Município, em preceitos outros, por exemplo, os arts. 12, I, 475, I, 816, (1173 do CPC. O entendimento jurisprudencial desta Corte se tem pautado pela observância dessa distinção conceituai posta na lei, assim é que, a exemplo, não considera as autarquias contempladas pelo principio do duplo grau de jurisdição, nos termos do art. 475, II, que somente o prevê nas decisões contra a União, o Estado e o Município, e no entanto, tem-nas como beneficiárias do prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer, conferidos à Fazenda Pública pelo art. 188 do CPC. 2 conseqüente, nessa linha a interpretação do parágrafo único do art. 488 do (PC, em sua estrita catalogação dos entes públicos isentos do depósito prévio para a ação rescisório, compreendidos tão-somente a União, os Estados e os Municípios. Não contemplada, portanto, a Autora como beneficiária da isenção, e por ela descumprida a satisfação desse requisito, no prazo que se lhe deu, de acordo com o art. 284 do CPC, não haveria fugir à norma imperativa do art. 490, II, da lei processual, no sentido do indeferimento da inicial. Pelo exposto, nego provimento ao agravo. VOTO O Sr. Ministro Next da Silveira: Sr. Presidente. Estou de acordo com o eminente Relator, pelos fundamentos do seu voto. Em verdade, tem sido essa a orientação exegética dos dispostivos do Código de Processo Civil, ao se estabelecer a distinção entre Fazenda Pública e pessoas administrativas matrizes. Assim, corrente o entendimento, no que concerne ao art. 475, incisos II e III, do Código de Processo Civil. O referido inciso II respeita à sujeição obrigatória ao duplo grau de jurisdição da sentença desfavorável apenas às pessoas matrizes, Isto é, à União, aos Estados e aos Municípios. Já outra tem sido a compreensão do inciso III do art. 475, cio CPC, ao se referir a Fazenda Pública, entendendo-se, então, aí, compreendidas, também, as respectivas autarquias. Por igual, o art. 188, do Código de Processo Civil estabelece: «Computar-se-á em quádruplo o prazo para contestar e em dobro para recorrer quando a parte for a Fazenda Pública ou o Ministério Público». Por isso, dito prazo especial do art. 198, do CPC, beneficia não só as pessoas matrizes, mas também suas autarquias. Ora, o art. 488 do código de Processo Civil, ao tratar da ação rescisório, estabelece, no seu inciso II: — depositar a importância de 5% (cinco por cento) sobre o valor da causa, a titulo de multa, caso a ação seja, por unanimidade de votos, declarada inadmissível, ou improcedente. Parágrafo único. Não se aplica o disposto no número II à União, ao Estado, ao Município e ao Ministério Público». R.T.J. — 100 57 dessa Dentro compreensão, parece-me, assim, inequívoco que as autarquias não estão contempladas na exceção do parágrafo único do art. 438, do Código de Processo Civil, devendo, dessa maneira, efetuar o depósito a que se refere o inciso II, do mencionado dispositivo. Nego provimento ao agravo regimental. Decisão: Negou-se provimento ao Agravo Regimental, unanimemente. Impedidos os Ministros Xavier de AlbUqUerque, Presidente, e Cordeiro Guerra. Presidiu o Julgamento o Ministro Moreira Alves. Presidência do Senhor Ministro Moreira Alves, no impedimento do Ministro Xavier de Albuquerque (Presidente). Presentes á Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mudos, Dedo Miranda, RaEXTRATO DA ATA fael Mayer, Firmino Paz. e Néri da AR. 1.120 — (AgRg) — RJ — Rel.: Silveira. Ausentes, justificadamente, Min. Rafael Mayer. Agte.: Superin- os Ministros Djaci Falcão, Cordeiro tendência Nacional da Marinha Mer- Guerra e Clovis Ramalhete. cante (SUNAMAM). (Advs.: José Procurador-Geral da República, Dr. Roberto C. Boilmann e Márcio Luiz Inoeêneio Mártires Coelho.. Brasília, 29 de outubro de 1981 — Borges). Agda.: IMESA — Veículos Ltda. ( Advs.: João Dodsworth Cor- Jeitos Célio Monteiro Coelho, Secredeiro Guerra e outros). tário. RECURSO CRIMINAL N? . 1.391 — MT (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Recorrentes: Rubens Gonçalves Martins e outros —Recorrido. Ministério Público Militar. Assalto a estabelecimento de crédito — Processo Instaurado e julgado na vigência do Decreto-lei 896/49 (art. 27), com recurso para o Supremo Tribunal Federal — Advento da nova lei de segurança nacional (Lei n? 6.620/78), que deixou de tipificar o delito quando praticado sem motivação político-subversiva. Preliminares rejeitadas. Autoria comprovada. Inocorrência de abolltio crimina. Aplicação da lei mais favorável, com a adequação das penas á mesma figura delituosa prevista no Código Penal, art. 157, g 2?, I e II, observados os critérios de sua fixação constantes da decisão condenatória. Recurso Criminal parcialmente provido. cas, por unanimidade de votos, em ACÓRDÃO dar provimento em parte do recurso Vistos, relatados e discutidos estes criminal nos termos do voto do Miautos, acordam os Ministros da Pri- nistro Relator. meira Turma do Supremo Tribunal Brasília, 27 de novembro de 1979 — Federal, na conformidade da ata do Thompeon Flores, Presidente — Julgamento e das notas taquigráfi- Cunha Peixoto, Relator. — 100 38 RELATORIO O Sr. Ministro Cunha Peixoto: O minucioso parecer da ProcuradoriaGeral da República, subscrito pelo Dr. Aristides Junqueira Alvarenga, regularmente aprovado pelo ilustre Sub-procurador Geral, Doutor Francisco de Assis Toledo, relata com propriedade a espécie, verbis: 1 — Rubens Gonçalves Martins, Jorge Nunes Barcelos e Anizio Alberto da Silva, juntamente com outro, foram denunciados perante a Auditoria da 9? C.J.M., como incursos no artigo 27 do D.L. 898/69, porque no dia 7 de agosto de 1973, em Cuiabá, Mato Grosso, participaram do roubo a bancários que transportavam numerário do Banco do Estado de São Paulo S.A. a ser depositado no Banco do Brasil S A., subtraindo-se de um deles a importância de Cr$ 90.000,00 (denúncia de fls. 2/3). 2 — Finda a instrução criminal, o Conselho Permanente de Justiça, para a Aeronáutica, condenou cada um a dez anos de reclusão, além da pena acessória de suspensão dos direitos políticos, por igual prazo (Sentença de fls. 330/341). 3 — Inconformados, os três apelaram para o Egrégio Superior Tribunal Militar, que entretanto, à unanimidade, negou provimento aos apelos, em Acórdão datado de 8 de agosto de 1977 e assim ementado: «Assalto — Confissões coerentes, colhidas no inquérito, em corroboração com outros elementos dentro dos autos. Assaltantes contumazes, portadores de longa folha penal. Deixa-se de corrigir a pena, à falta de recurso do M.P. Desprovidas as apelações.» (fls. 466/476). 4 — Novamente irresignados, interpurseram recurso ordinário, em 5 julho de 1978 (fls. 525), alegando, como preliminar, a incompetência da Justiça Militar e, no mérito, insuficiência de prova para a condenação (razões de fls. 526/530). 5 — A argüição de incompetência da Justiça Castrense há de ser repelida. Objeto do roubo descrito na denúncia foi dinheiro pertencente a estabelecimento de crédito. O fato ocorreu e foi julgado na vigência do D.L. 898/69, que, em seu artigo 27, dizia constituir crime contra a segurança nacional qualquer assalto a estabelecimentos de crédito e financiamento, independentemente da natureza de sua motivação. E tem sede constitucional a competência da Justiça Militar, relativamente aos crimes contra a segurança nacional. Não descaracterizava o delito definido no artigo 27 do D.L. 898169 o fato de ter sido o assalto perpetrado fora do estabelecimento de crédito. Por diversas vezes, essa Suprema Corte entendeu tipificado tal crime, quando se tratava de assalto a carro transportador de numerário pertencente a estabelecimentos bancários. Não seria a natureza do transporte que teria o condão de notificar a capitulação do delito, tanto mais que, o transporte humano haveria de merecer maior proteção do que o mecânico. Saliente-se, ainda, que a descrição da denúncia não deixa dúvidas de que os autores do roubo, postados na proximidade da agência do Banco do Brasil S.A., sabiam que uma das vitimas transportava numerários, porque estava ela escoltada por um guarda. R.T.J. — 100 Afastada fica, pois, a pretensa incompetência da Justiça Militar, subsistindo, assim, a decisão do Superior Tribunal Militar, que rejeitou a argüição feita pelo Ministério Público, antes do inicio da ação penal (V. Acórdão de fls. 93/95). 6 — Outra questão preliminar a ser enfrentada, com reflexos na admissibilidade do recurso ordinário, é a da novatio legis. Com a superveniência da Lei n? 6.620, de 17 de dezembro de 1978, surgiu, com relação à figura do art. 27 do D.L. 898/69, revogado pela nova lei, problema de direito intertemporal, já que o tipo penal nele descrito («assaltar, roubar ou depredar estabelecimento de crédito ou financiamento, qualquer que seja a sua motivação») não foi reproduzido na nova lei de segurança nacional. De acordo com esta, só é crime contra a segurança do Estado o assalto, o roubo, ou a depredação com finalidade atentatória à segurança nacional, (art. 26), não se fazendo mais distinção entre estabelecimentos de crédito ou financiamento e quaisquer outros. Em suma, os assaltos a banco, sem motivação político-subversiva, como o retratado nestes autos, deixaram de ser crime contra a segurança nacional, pelo que torna-se impossível a adequação da pena imposta ao recorrente a qualquer cominação prevista na nova lei de segurança nacional. Mas, tal fato é e sempre foi delituoso, com previsão no artigo 157 do Código Penal comum, não se podendo, pois, cogitar em abolitio criminis, que conduziria no absurdo de se colocar em liberdade todos os assaltantes e ladrões comuns de alta periculosidade, condenados durante a vigência da revogada lei. 59 7 — Surge, assim, o problema da alteração de competência, eis que o crime de assalto a estabelecimento crediticio, antes crimes contra a segurança nacional, com processo e julgamento afetos à Justiça Militar Federal, passou a ser crime comum, cujo processo e julgamento compete à Justiça comum. 8 — Embora, com a edição da Lei n? 6.620/78, não caiba mais recurso ordinário contra decisão condenatória relativa a crime de roubo a bancos, no caso em exame, parece-nos se deva prosseguir no julgamento do recurso ordinário interposto na vigência da lei 1-evogada, de acordo com o principio de direito intertemporal, pelo qual «a competência recursal se fixa pela lei vigente na data da sentença» (CJ 6.123-RS Rel. Min. Leitão de Abreu, D.J.U. 29/9/78). Qualquer outra solução contrária viria em detrimento do réu, ferindo o princípio constitucional da «ampla defesa, com os recursos a ela inerentes». 9 — Superada a preliminar de conhecimento e afastada a ocorrência da abolltio criminis, analisemos as provas dos autos. 10 -- A prova material do crime é induvidosa e está estampada no Boletim de Ocorrência de Ri 23, bem como hos autos de exames de corpo de delito de fls. 24/25, além da prova testemunhal. 11 — Quanto à autoria, Rubens Gonçalves Martins (fls. 128v. e 4/10 do apenso) e Anizio Alberto da Silva (fls. 131v) confessaram, extrajudicialmente a prática do assalto, embora, em Juizo, tenham negado validade à confissão anterior (fls. 175/176 e 179/180). Já o recorrente Jorge Nunes Barcelos negou sua participação, so R.T.J. — 100 tanto no interrogatório policial (fls. 129v.), como no judicial (fls. 177/178). 12 — Embora retradas em Juízo, às confissões de Rubens e Anízio não se pode negar valor, dada a impossibilidade de serem fruto de imaginação policial. Basta a leitura das declarações de Rubens Gonçalves Martins, nos autos em apenso, para se firmar o convencimento de que as alegadas sevícias, mesmo que existentes, não foram a ponto de impedi-lo, inclusive, de se identificar falsamente perante a autoridade policial, usando o nome de Valdomiro Veiga. 13 — Quanto a Jorge Nunes Barcelos, a chamada dos co-réus anula a negativa de sua participação no crime. Saliente-se, ainda, que a confissão extrajudicial do outro participe, Jorge dos Santos, é harmônica com as dos dois recorrentes e relata a at tação de Jorge Nunes Barcelos, no assalto ( fls. 132/133). 14 — Apesar de se declararem, perante o Conselho de Justiça, como conhecidos entre si, «na esfera do estelionato, achaque», (fls. 176) e ladrões de automóveis (fls. 177/180), querem fazer crer que não foram os autores do roubo narrado na denúncia. 15 — Estando, pois, conjunto probatório a autorizar a condenação dos recorrentes, há de ser improvido o recurso ordinário quanto ao mérito. 16 — Entretanto, há de se adequar a pena privativa de liberdade a eles imposta à cominação prevista no artigo 157, $ 2?, I e II, do Código Penal, por se tratar de lei mais benigna. 17 — Ao roubo ou assalto a estabelecimento de crédito, sem resultado morte ou lesão corporal grave, era cominada a pena de reclusão de 10 a 24 anos pelo artigo 57, caput, do D.L. 898/69, vigente à época, quer da prolação da sentença, quer do V. Acórdão recorrido. Pelo Código Penal comum o mesmo fato é apenado abstratamente com reclusão de 4 a 10 anos, e multa, de três cruzeiros a quinze cruzeiros, com aumento de um terço até metade, em face do emprego de armas e concurso de agentes. 18 — A pena de 10 anos de reclusão aplicada aos recorrentes foi a mínima prevista no artigo 27 do diploma legal revogado, embora não houvesse neste previsão de causas especiais• de aumento, como no Código Penal comum. 19 — Reduzida a pena mínima para 4 anos, consoante a legislação penal comum, e acrescida a esta mais um terço, em virtude das causas especiais contempladas no I) 2? do artigo 157, do C.P., tem-se a pena de 5 anos e 4 meses de reclusão. 20 — Adotando-se o mesmo critério para a pena de multa, não hão de ser apenados os recorrentes em Cr$ 4,00 (valor anterior à vigência da Lei n? 6.416/77). 21 — Por todo o exposto, somos pelo provimento parcial do recurso ordinário, tão-só para que sejam aplicadas a cada recorrente as penas de 5 anos e 4 meses de reclusão e Cr$ 4,00 de multa, como 1w cursos no artigo 157, $ 2?, I e II, do Código Penal, desprezando-se a pena acessória de suspensão dos direitos políticos a todos aplicadas. 22 — Relativamente à adequação da pena de Jorge dos Santos, já de- R.T.J. — 100 finitivamente condenado, somos pela restituição do expediente de fls. 627/647 ao Juiz Auditor solicitante (solicitação contida no expediente juntado por linha). E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — Nos termos do jurídico parecer da douta ProcuradoriaGeral da República, que integra o relatório e cujos fundamentos incorporo a este voto, como razões de decidir, é de se dar provimento apenas parcial ao recurso, tão-somente para adequação da pena à vista da superveniência da Lei n? 6.620/78, que deixou de tipificar como crimes contra a segurança nacional roubos praticados contra estabelecimentos de crédito por criminosos comuns, em motivação subversiva, como é o caso sob exame. 2 — A preliminar de incompetência da Justiça Militar, sob o fundamento de que o roubo fora perpetrado na rua, contra dois funcionários, do Banco, foi suficientemente refutada no acórdão recorrido. A prova dos autos demonstra que o crime foi praticado já às portas da agência local do Banco do Brasil, contra dois funcionários do Banco do Estado de São Paulo, um deles facilmente indentificável, pois era um guarda de vigilância, os quais transportavam numerário pertencente ao último Banco, para depósito no primeiro, sendo Certo que os recorrentes chegaram a manter forte tiroteio com os funcionários assaltados, que saíram feridos, como, ainda, dispararam vários tiros na direção da entrada da agência do Banco do Brasil. Assim, sendo vitima a agência local de um estabelecimento de crédito, pouco importa, para a caracteri- 61 zação da competência, na vigência do Decreto-lei n? 808/89, o melo de transporte empregado pela agência bancária, vez que os réus tinha conhecimento de que se tratava de funcionários a serviço do Banco. Como salientou o Dr. Arbaides Junqueira Alvarenga, a hipótese se assemelha ao assalto a carro transportador, sendo pacífica a jurisprudência neste Pretório Excelso a respeito da matéria. 3 — Por outro lado, também já se pacificou neste colendo Tribunal o entendimento de que o fato de a nova Lei de Segurança Nacional não mais tipificar o crime de assalto a Banco sem motivação políticosubversiva, não acarreta a abolição da figura penal, vez que está ela expressamente prevista no Código Penal, em seu art. 157 e parágrafos. 4 — No mérito, limitam-se os recorrentes à negativa de autoria. As declarações extrajudicias dos recorrentes Rubens Gonçalves Martins — codinome Valdomiro Veiga — e Jorge dos Santos — codinome Nelson R. ou Nelson Pereira dos Santos — (não recorrente, este último), em confronto com o contexto probatório, não deixam, entretanto, dúvida sobre a participação de todos os recorrentes no assalto. O primeiro deles — Rubens — declarou que, formaram — ele e os demais sentenciados — uma quadrilha com o objetivo de praticarem crimes nos Estados de Goiás e Mato Grosso. A seguir, com riqueza de detalhes, descreve o assalto objeto deste processo, para, em conclusão, esclarecer que, (c... quem efetivamente participou do assalto, além do declarante, o que também agora faz constar, foram seus conhecidos Nelson Ro- 62 R.T.J. - 100 drigues, Anízio Alberto da Silva e não Anizio Matos da Silva, e Fernando de Tal, cujo nome verdadeiro o declarante não sabe se é o mesmo». E certo que o recorrente Jorge Nunes Barcelos — coginome George Bauer Neto ou Domingos Moura — negou sua participação, mas o coreu Rubens já havia declarado que, «... Jorge, neste momento (o da partilha do fruto do roubo) trocava o pneu do Opala nada lhe sendo entregue, pois o mesmo receberia sua parcela quandô houvesse passado o perigo...» O co-sentenciado Jorge dos Santos, por sua vez, declarou que, «... em data de sete daquele mesmo mês, postaram-se de manhã bem cedo, nas proximidades da agência do Banco do Brasil, em Cuiabá, Mato Grosso, sendo que Rubens dirigia a C-10, em cuja carroceria se encontrava o declarante e Anizio, enquanto que Jorge dirigia o Opala». Finalmente, um dos réus — Rubens Gonçalves Martins, — foi preso na região após intensa perseguição policial, tendo apontado, conforme transcrição retro, os demais comparsas Todos os participes do crime eram já criminosos de elevada periculosidade, conforme eles próprios confessam. Ficou, pois indubitavelmente provada a autoria do crime, ao contrário do que afirmam os recorrentes, os quais sequer tentaram provar a sua permanência em outro local quando da prática do delito, o que seria extremamente fácil caso fossem verídicas suas alegações. 5 Isto pacto, seria de se negar provimento ; recurso. Ocorre, porém, que o crime imputado aos recorrentes, e pelo qual foram condenados com base no Decreto-lei n? 898/69, não mais se encontra tipificado na Lei de Segurança Nacional vigente, o que, leva à necessidade da adequação das penas com base no crime de roubo, figura penal idêntica, previsto no art. 157 e seus parágrafos do Código Penal. Todos os recorrentes foram condenados à pena mínima prevista no art. 27 do Decreto-lei n? 898. Essa pena corresponde, na lei penal comum — art. 157 do CP — a quatro anos de reclusão, a qual deverá ser acrescida de um terço, em vista das causas especiais de aumento previstas no § 2? do referido artigo. Isto posto, nos termos do parecer da douta Procuradoria-Geral, dou provimento parcial ao recurso, tão-somente para, fazendo a adequação das penas, fixar para cada recorrente a pena de cinco (05) anos e quatro (04) meses de reclusão e multa de Cr$ 4,00, por incursos no art. 157, § 2?, 1 e II, do Código Penal, desprezando-se a pena acessória de suspensão de direitos políticos a todos aplicada. A adequação da pena do cosentenciado Jorge dos Santos, que não recorreu, estando já definitivamente condenado, deverá processarse perante o Juízo competente, pelo que determino desentranhamento do expediente de fls. 627/647 e sua conseqüente remessa ao Juiz Auditor da C.J.M., que o fez remeter a este colendo Supremo Tribunal. VOTO O Sr. Ministro Soares Mufloz: Sr. Presidente, no voto que proferi no R.Cr. 1.387, ressalvei hipótese idêntica à espécie sub Judice, motivo pelo qual a esse pronunciamento me reporto: R.T.J. — 106 «Não tenho dúvida em aderir a essa orientação, quando a punição aplicada pela lel antiga foi objeto de individualização, no respectivo quantum, variável entre os extremos obstratamente cominados. Assim, se o crime, pela lel revoltada, era punido com a pena de dez a quinze anos de reclusão, e a nova lei passou a puni-lo com a pena de reclusão, de oito a dez anos, a retroatividade benigna restringe-se a corrigir o quantum da pena para oito anos» ( fls. 1/2). Ante o exposto, concordo com o eminente Ministro Cunha Peixoto, conhecendo do recurso e lhe dando provimento parcial. 63 EXTRATO DA ATA RCr 1.391 — MT — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Rectes.: Rubens Gonçalves Martins e outros( Adv.: Riga Nabukatsu). Recdo.: Ministério Público Militar. Decisão: Deram provimento em parte nos termos do voto do Ministro Relator, decisão unânime. Presidência do Sr. Ministit Thompson Flores. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufi oz e Rafael Mayer, Subprocurador-Geral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 27 de novembro de 1979 — Antonio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. SENTENÇA ESTRANGEIRA 14? 2.816 República Federal da Alemanha Presidente: O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque. Requerentes: Chrlstoph Bauer e Peter Ralf Bauer, representados pela Procuradoria-Geral da República — Requerido: Rolf Albert Bauer. Sentenças estrangeiras. Alimentos. Homologação concedida. Vistos. A Procuradoria-Geral da República, na qualidade de instituição intermediária e em nome dos menores Christof e Peter Ralf Bauer, requereu a homologação de duas sentenças da Justiça alemã, pelas quais ficou Rolf Albert Bauer, alemão, ora residente e domiciliado no Brasil, condenado a prestar alimentos aos seus referidos filhos. Citado por carta de ordem, o requerido contestou às fls. 71/73, Juntando documentos às fls. 75/78. Os requerentes replicaram, sempre representados pela Procuradoria Geral da República, às fls. 82/83. Em virtude de a referida Procuradoria-Geral, atuar, no caso, como instituição intermediária, nos termos da Convenção de Nova Iorque sobre a prestação de alimentos no estrangeiro e do art. 26 da Lei n? 5.478, de 25.7.68, e de conseqüentemente patrocinar os interesses dos requerentes, estando, por isso, impedida de oficiar como Órgão do Ministério Público, nomeei Procurador-Geral da República ad hoc o advogado Professor Josaphat Marinho. Com vista dos autos, S. Exa. neles exarou o seguinte parecer ( fls. 88/93): «Os requerentes, filhos menores do requerido, são representandos 69 R.T.J. — 100 pela Procuradoria-Geral da República, como «instituição intermediária», nos termos do art. 26 da Lei n? 5.748, de 25-7-68, e da Convenção sobre prestação de alimentos no estrangeiro, promulgada com o Dec. 56.826, de 2.9.965. Pedem, na forma da inicial, que «Sejam homologadas a sentença do Tribunal Regional de Kiel, de 21 de setembro de 1971, e a decisão do Tribunal da Comarca de Munique, de 10 de abril de 1974, para que as mesmas em se tornando executórias no Brasil possibilitem a exigência das prestações alimentares devidas» (fl. 2). Em verdade, a sentença do Tribunal Regional de Kiel (Fls. 6-12), devidamente traduzida (fls. 13-18), revela que, ao ser decretado o divórcio do requerido e de Lore Bauer (fls. 13 e 17), foi assegurada «contribuição ao sustento» dos requerentes, filhos menores do casal (fl. 14). A par disso, a decisão do Tribunal de Munique, na «Vara para ações de aluguel, sustento, descendência de filhos, partilhas heranças ou pensões e da assistência jurídica» (fl. 21), concedeu aos requerentes «o Direito de Pobre» para a primeira instância, incluindo a execução forçosa», como garantia ao recebimento do «sustento mensal de 175-DM» para cada qual deles (fl. 21) — correspondente à pensão estipulada na sentença de divórcio do Tribunal de Kiel (fl. 14) —, além de «pensão adicional mensal de 50-DM», em beneficio igualmente de um e do outro (fl. 21). De outro lado, por provocação da autoridade judiciária da Comarca de Esslinger e «mediante o Tribunal de Comarca de Ntirtingen», foi solicitado à Procuradoria-Geral da República junto ao Supremo Tribunal Federal», com documentação informativa (fls. 26e 29-34), «realizar e executar os direitos ao subsídio (alimentos) dos dois filhos menores (fls. 26-27). Expressamente é pedido. «... o obséquio de aplicar todas as possíveis medidas adequadas, em harmonia com o Convênio das Nações Unidas, para levar a efeito a contribuição ao sustento e de impor e procurar executar a cobrança junto ao pai ...» (g. 28). O pedido resultou da circunstância de o requerido encontrar-se residindo no Brasil (fl. 27, in fine), com endereço no Estado do Rio Grande do Sul (fl. 3), onde recebeu intimação regular (fl. 69 e v.). Ora, a Lei n? 5.478, de 25-7-968, que «dispõe sobre ação de alimentos», atribui competência ao Procurador-Geral da República no sentido de agir como «instituição intermediária» (art. 26). No mesmo passo, a «Convenção sobre prestação de alimentos no estrangeiro», promulgada com o Dec. n? 56.826, de 2-9-965, estabelece que «a Autoridade remetente transmitirá os documentos à instituição intermediária designada pelo Estado do demandado» (art. IV). Demais, a Convenção mencionada prescreve, ainda, que «a instituição intermediária, atuando dentro dos limites dos poderes conferidos pelo demandante, tomará, em nome deste, quaisquer medidas apropriadas para assegurar a prestação de alimentos» (art. VI). Confrontando o pedido da justiça alemã com essas disposições normativas, ressalta a titularidade da Procuradoria-Geral da República, como instituição intermediária, para agir, bem assim a legitimidade R.T.J. — 100 do procedimento usado preliminarmente — homologação das sentenças (Reg. Int. art. 215). E certo que o requerido argüi, do ponto de vista formal: a falta de autenticação, pelo Consulado brasileiro, das peças remetidas da Alemanha (fl. 72); a inexistência de prova do trânsito em julgado da sentença do Tribunal de Munique (fl. 72); c) «em nenhum momento, no processo de execução de alimento que tramitou pelo Tribunal de Munique, há alusão sobre a citação do contestante como Réu» (fl. 73). Sem dúvida, o Regimento Interno da alta Corte enumera como «requisitos indispensáveis à homologação da sentença estrangeira» a satisfação das duas formalidades reclamadas (art. 217, III e IV). Mas, quanto à primeira delas, como observou a douta Procuradoria, cabe notar que as peças originárias «tiveram trânsito direto entre as Autoridades definidas pela Convenção de Nova Iorque, prescindindo, portanto, da chancela consular» (fl. 82). A propósito da outra exigência, atente-se em que a decisão do Tribunal de Ele!, que dissolveu o casamento e fixou originariamente a «contribuição de sustento», resultou de conciliação (fl. 14), e há declaração de que transitou em julgado em 21 de setembro de 1971 (fl. 18). No processo de execução, no Tribunal de Munique, não há, realmente, atestação de trânsito em julgado, como salientou o requerido, e de igual modo não se vê referência a citação do requerido. 65 Ocorre, porém, em contrariedade a todas as alegações do requerido, o disposto no art. VI, n? 2, da Convenção promulgada: «Antes de transmitir os documentos, a Autoridade remetente certificar-se-á de que estes últimos se encontram, pela lei do Estado demandante, em boa e perfeita forma». Há de presumir-se, pois, normalmente, a regularidade da documentação e, em conseqüência, a correção dos atos nela retratados. Somente motivo ponderoso deve afastar essa presunção. Tal motivação inexiste no caso, até porque requerido, tentando discutir logo montante da pensão, declara ter feito remessa à ex-esposa, à conta dessa obrigação, de certa importância — o que significa reconhecimento de divida, mesmo com a ressalva de que o «valor» reclamado *é incorreto» (fl. 73). Não havendo, como não há, negativa da divida, nem alegação de prejuízo, qualquer problema ou dificuldade sobre o valor dos alimentos deverá ser objeto de discussão e decisão posteriormente, após a homologação das sentenças, como decorre, aliás, da inicial (fl. 2). Acresce, em apoio dessa orientação, que a justiça alemã, no pedido formulado, solicitou à Procuradoria-Geral da República «o obséquio de aplicar todas as possíveis medidas adequadas» contra o requerido. «... para que este seja obrigado a pagar os alimentos correspondentes às necessidades mínimas, ou então na devida proporção em relação à situação em que se encontra, se não for conforme ao acima exposto» (fl. 58). 66 R.T.J. — 100 A alternativa explicitamente aberta confere à «instituição intermediária» margem de prudente arbítrio, bastante para apreciação de problema que não haja sido posto, porventura, na execução, pela alegada falta de ciência do processo. E o que poderá ocorrer, com a ressalva de que o preceituado no art. VI, n? 2, citado, recobre os atos documentados da presunção de regularidade. As regras gerais do Regimento Interno (art. 217) não constituem, a nosso ver, obstáculo ao entendimento exposto. n de boa hermenêutica que as normas genéricas não devem ser interpretadas durante ou como dogmas, antes com a indispensável a flexibilidade ajustá-las as diferentes situações. Quanto maior o sentido social da solução pleiteada, como no caso, em que se cuida de prestações alimentares devidas a filhos menores, tanto mais se há de assegurar a finalidade superior da lei. E de ver, também, que, no concernente à soberania nacional, à ordem pública e aos bons costumes, a que se refere o Regimento (art. 216), o resguardo deles emerge das próprias cláusulas da Convenção invocada, a que aderiu o Brasil. Por fim, afigura-se-nos improcedentes a alegação do requerido, não desdobrada nem esclarecida, de que o pedido de homologação «não atendeu também aos Itens 3 e letra c do item 4, do artigo III do Decreto-lei 56.826, de 2 de setembro de 1965» ((l. 73). Além do lapso na referência a Decreto-lei, •ao passo que se trata de decreto executivo, os preceitos referidos são, rigorosamente, da Convenção promulgada. O art. III, em seu item 3, prescreve que «o pedido deverá ser acompanhado de todos os documentos pertinentes, inclusive, se necessário, de uma procuração que autorize a instituição intermediária a agir». O item 4, c, do mesmo art. III, acentua que «a autoridade remetente tomará todas as medidas que estiverem a seu alcance», compreendendo «uma exposição pormenorizada dos motivos nos quais for baseado o pedido, o objeto deste e qualquer outras informações pertinentes, inclusive as relativas à situação econômica do demandante e do demandado». Na solicitação que faz a justiça alemã, foram anexadas cópias dos elementos essenciais do processo de divórcio e da fixação de alimentos ((ls. 36 e 59-62), daí se inferindo, claramente, entre outras particularidades, a dissolução do casamento, a individuação das partes, a condição de menores dos filhos beneficiários, o valor da pensão estimada. A ausência do requerido da Alemanha, apontada no pedido de providência à instituição intermediária (fl. 57, In fine), resulta indubitável pelo recebimento da citação, por ele, em nosso país, no Rio Grande do Sul (fl. 69 e v.). Quanto à situação econômica dos interessados: os requerentes são menores, e o requerido estando aqui, perante a justiça brasileira deverá definir, no tempo próprio, suas disponibilidades. Prudentemente, a Autoridade remetente reservou ampla esfera de apreciação oportuna desse aspecto pela Procuradoria-Geral da República. Esse órgão, por sua vez, juntou a documentação recebida ao pedido inicial, como demonstrado, consolidando a pretensão que lhe fora endereçada. R.T.J. — 100 Diante dessas razões, e considerando que todas as peças apresentadas estão regularmente traduzidas, somos de parecer que as sentenças analisadas podem ser homologadas, nos termos do pedido, salvo melhor entendimento do eminente Presidente do Supremo Tribunal Federal». 67 Isto posto, nos termos do parecer transcrito, cujos judiciosos fundamentos acolho e adoto como razões de decidir, homologo as sentenças de que se trata. Brasília, 20 de maio de 1981 — Ministro Xavier de Albuquerque, Presidente. SENTENÇA ESTRANGEIRA N? 2.907 República do Paraguai Presidente: O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque. Requerente: Manfred Krauss — Requeridos: Viktor Krauss e Sofia Krauss ou seus sucessores. Sentença estrangeira de aprovação de informação sumária de testemunhas sobre estado de filiação. Homologação denegada. Vistos. Manfred Krauss, alemão, residente no Paraguai, requereu a homologação da sentença de 6 de junho de 1978, pela qual o Juiz de Primeira Instància em matéria civil do Segundo Turno, em Assunção, aprovou a informação sumária de testemunhas ali promovida pelo requerente com o fito de comprovar ser filho de Viktor Krauss e Sofia Krauss. Intimado para indicar os nomes e endereços dos requeridos, para lhes serem feitas as citações, o requerente escusou-se nos termos da petição de fls. 16. Com vista dos autos, assim opinou a Procuradoria-Geral da República, em parecer exarado pelo Subprocurador-Geral José Francisco Rezek e aprovado pelo Procurador-Geral Inocêncio Mártires Coelho ( fls. 19/20): «O texto da decisão judiciária que ora se pretende homologar (trad. ás fls. 8, do original de fls. 10) não permite saber qual o fundamento da competência da Justi- ça paraguaia para conhecer da espécie (Reg. Int. do S.T.F., art. 217, inciso I), nem tampouco menciona o transito em julgado (idem, inciso III). A peça fundamental deixa claro, ademais, que não houve citação de quem quer que seja. Nem mesmo algo do gênero de um chamamento edital de interessados incertos (idem, inciso II). Tudo isso, porém, não são mais que reflexos incidentes do extraordinário fato principal: a pretensa prova de filiação com a singeleza de uma justificação judicial comum, e sem cautelas primárias como a exata identificação do postulante e de seus indigitados pais. Destes, não disse o juizo paraguaio nem mesmo se vivos ou mortos, e, na primeira hipótese, onde econtráveis. Convergem, no caso, a ordem pública (art. 216) e três dos valores formais do art. 217 do Regimento Interno, para inviabilizar o êxito do pedido de homologação». Pelo indeferimento». R.T.J. — 100 68 Isto posto, nos termos do pare- cer transcrito, indefiro o pedido de homologação. Brasília, 1? de julho de 1981 — Ministro Xavier de Albuquerque, Presidente. CONFLITO DE JURISDIÇÃO N? 6.215 — MS (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Suscitante: Tribunal Federal de Recursos — Suscitado: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. — Conflito de Jurisdição — Tráfico Interno de drogas. Competêneia. Tendo o réu sido processado e absolvido na 1! Instância, com base no art. 12 da Lei n? 6.386/76, a competência para o julgamento do recurso é do Tribunal de Justiça do Estado. Conflito conhecido, para declarar-se competente o Tribunal de Justiça, suscitado. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos em conhecer do conflito e julgar competente o Tribunal suscitado. Brasília, 14 de novembro de 1979 — Antonio Neder Presidente — Cunha Peixoto, Relator. RELATÓRIO Corumbá-Bauru, encontraram uma sacola de couro, cor escura dentro da qual continha dois pacotes de uma erva verde, denominada vulgarmente maconha; procedidas as diligências ficou provado que os pacotes contendo as substâncias entorpecentes pertenciam ao denunciado e ao menor, que pretendiam após usarem, vendê-la, sendo que tais pacotes foram adquiridos no Paraguai». O Juiz, entendendo ser a maconha do menor, absolveu o réu Sebastião da Paz, com o que não concordou o representante local do Ministério Público, que interpôs recurso de apelação. O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Na comarca de Três Lagoas, o Representante do Ministério Público denunciou a Sebastião da Paz, dando-o Tribunal de Justiça do Estado como incurso nas sanções do art. 12 deOMato Grosso do Sul não conheceu da Lei n? 6.368, de 21 de outubro de do recurso, entendendo que se trata1976, porque: va de tráfico com o Exterior. «Na madrugada do dia 16 de feOs autos foram remetidos ao Trivereiro do corrente ano (1977), os Agentes Federais, que faziam fis- bunal Federal de Recursos, que suscalização de rotina no trem da citou o presente conflito negativo de N.C.B. que fazia o percurso de jurisdição. R.T.J. A Procuradoria-Geral da República assim se manifestou, verbis: «1. Por maioria, deliberou a 4! Turma do Tribunal Federal de Recursos declarar-se incompetente à apreciação da controvérsia, que alcança o nível recursal, fazendo-o com suporte no entendimento do ilustre Min. Guelros Leite; assim relevado, verbis; «Não encontro provada, todavia, a modalidade de tráfico, levando-se em conta o local da apreensão da mercadoria, as circunstâncias do fato e a pequena quantidade encontrada». (Vide: fls. 133). 2 — Foi, conseqüetemente, suscitado o incidente, negativo de competência, ante prévia manifestação do coleglado estadual, igualmente. declinando do exercitar a Jurisdição, no caso. 3 — Data maxima venta, há o tráfico internacional de entorpecentes. 4 — Fiquemos com as declarações do acusado, e do menor, que o acompanhava, como prestadas perante o magistrado a que, verbis: «Que o menor que foi em companhia do denunciado chegando em Ponta Porã foi para o Paraguai lá ficando 5 dias e de vez em quando vinha a Ponta Porá e se avistava com o denunciado; que o referido menor disse ao denunciado que tinha amigos no Paraguai». (Vide' fls 35-v, grifamos). «Que quando o depoente saiu do Paraguai Já saiu com a bolsa de sua propriedade e com a maconha dentro, tendo adquirido a maconha no Paraguai; que o depoente e v-nprou a maconha para fazer usu LLei >. (Vide: fls. 76 v, grifamos). 69 — 100 5 — Ora, assim bem caracterizado o trafico internacional, da maconha, à espécie incide a primeira parte da Súmula n? 522, verbis: Súmula n? 522: «Salvo ocorrência de tráfico para o Exterior, quando então a competência será da Justiça Federal, compete à Justiça dos Estados o processo e Julgamento dos crimes relativos a entorpecentes». 6 — E de se conhecer do conflito; mas para fixar a competência na 4! Turma do Tribwjal Federal de Recursos».. o relatório. VOTO O Sr. Ministre* CUnha PebtOto (Relator): 1 — O réu foi denunciado apenas pela posse de substância tóxica, nos termos do art. 12 da Lei 6.368, de 21 de outubro de 1976, não fazendo a denúncia referência ao art. 18 da mesma Lel, que trata de tráfico com outros países. E foi com base nessa denúncia que o acusado foi processado e absolvido na 1! Instância. Não se cogitou, tanto na denúncia quanto na sentença, de tráfico com o Exterior. Assim, nos termos da denúncia e da sentença, a competência é da Justiça Estadual, e não da Federal, vez que o processo trata de posse para venda de tóxico apreendido em território nacional. Não nos parece possível e jurídica a pretensão da Procuradoria-Geral da República de examinar elementos probatórios, num conflito de Jurisdição, para decidir sobre qual a justiça competente. Este colendo Supremo Tribunal Federal, no Conflito de Jurisdição n? 6.183, relatado pelo eminente Ministro Thompson Flores, decidiu: 70 R.T.J. — 100 «Verificando-se da denúncia, a qual não sofreu aditamento, que o delito atribuído ao réu foi o do art. 12, 1, sem qualquer referência ao art. 18, I, ambos da Lei 6.386/76, e, assim, resultou apreciada pelo juiz de direito, evidencia-se que sentenciou ele no exercício de sua competência ordinária, jamais, com a delegada a que se refere o art. 27 do citado Diploma. EXTRATO DA ATA CJ. 6.215 — MS — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Suste.: Tribunal Federal de Recursos. Susdo.: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul. Interessados: Sebastião da Paz, (Adv.: Lúcio Queiroz Moreira) e o Ministério Público Estadual. Decisão: Conheceu-se do conflito e julgou-se competente o Tribunal suscitado. Decisão uniforme. Presidência do Senhor Ministro Cabe, pois, ao Tribunal de Justiça, e não ao Tribunal Federal de Antonio Neder. Presentes à Sessão Recursos, julgar a apelação inter- os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuposta daquele veredicto»." querque, Cordeiro Guerra, Cunha Peixoto, Soares Murioz, Dedo MiranNo caso em apreço, também a de- da e Rafael Mayer. Ausente, licennúncia não mereceu qualquer adita- ciado, o Sr. Ministro Leitão de mento para o envolvimento de tráfi- Abreu. Ausente, justificadamente, o co com outro país. Sr. Min. Moreira Alves. ProcuradorGeral da República, o Dr. Finnino 2 — Por estes motivos, conheço do Ferreira Paz. Brasília, 14 de novembro de 1979 — conflito e declaro competente o Tribunal de Justiça de Mato Grosso, Alberto Veronese Aguiar, Secretásuscitado. rio. CONFLITO DE JURISDIÇÃO N? 6.252 — SP (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Suscitante: Tribunal Federal de Recursos — Suscitado: Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região. Empresa sob o regime de intervenção federai. Reclamação trabalhista contra ela ajuizada. Caso de competência da Justiça do Trabalho, por não estarem em causa os objetivos do confisco e da intervenção (A.C. n? 99173, artigos 1? e 2?). Simples assistência ad adjuvandum não desloca competência. Conflito conhecido, competente o suscitado, Tribunal de Trabalho da 2! Região. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer do conflito, dando pela competência do suscitado, o Colendo Tribunal Regional do Trabalho da 2! Região. Decisão unânime. Brasília, 06 de agosto de 1980. — Antonio Neder, Presidente — Leitão de Abreu, Relator R.T.J. — 100 RELATORIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: A Primeira Turma do Tribunal Federal de Recursos suscitou conflito negativo de jurisdição em acórdão assim ementado: «Reclamação trabalhista. Benedito Cardoso Pinto e outros contra Companhia Brasileira de Cimento Portland Perus. Despedida em fraude à Lel, obstativa da estabilidade (CLT., art. 499, § 3?). Decisão Unânime da Décima Sétima Junta de Conciliação e Julgamento. «Recurso ordinário. Intervenção da União Federal, na segunda instância, pedindo a remessa dos autos ao Tribunal Federal de Recursos, em face de seu interesse superveniente, pois o acervo ou patrimônio líquido da reclamada fora confiscado e incorporado ao Patrimônio Nacional, nos termos do Decreto n? 74.728, de 18 de outubro de 1974 ». «Não conhecimento do recurso. Incompetência da Justiça do Trabalho. Remessa dos autos ao Tribunal Federal de Recursos ». «Não conhecimento do recurso, contra o voto do Ministro Relator, em razão da Incompetência do Tribunal». «Conflito negativo de jurisdição suscitado para o Supremo Tribunal Federal» ( f. 143). Pela Procuradoria-Geral da República, o Procurador Moacir Antônio Machado da Silva emitiu o seguinte parecer• «Em reclamação trabalhista ajuizada contra a Cia. Brasileira de Cimento Portland Perus, empresa sob intervenção federal, a União declarou, inicialmente, a inexistência de interesse na causa 71 (f.79). Prosseguindo o feito, a MM. 17! Junta de Conciliação e julgamento de São Paulo julgou procedente a ação, assegurando aos reclamantes indenização em dobro, por entender caracterizada a dispensa tendente a obstar a aquisição da estabilidade. «Após a interposição de recurso, a União Federal interveio no feito, para afirmar seu interesse a requerer a remessa dos autos ao egrégio Tribunal Federal de Recursos, tendo em vista que, por força do Decreto n? 74.228, de 18-1074, superveniente à decisão, o patrimônio liquido da reclamada fora confiscado e incorporado ao Patrimônio Nacional, passando a constituir entidade pública federal. «O egrégio Tribunal Regional do Trabalho declinou de sua competência, entendendo caracterizada a hipótese prevista no artigo 125, 2?, da Constituição ». «Por seu turno, o egrégio Tribunal Federal de Recursos também se julgou incompetente e suscitou conflito perante o Supremo Tribunal Federal, sob o fundamento de que a União fora chamada a pronunciar-se e o fez declarando seu desinteresse no feito». «Np Conflito de Jurisdição n? 6.157 (DJ de 06-06-80, pág. 4.134), decidiu o Supremo Tribunal Federal que compete à Justiça do Trabalho processar e julgar reclamação trabalhista ajuizada contra empresa sob regime de intervenção federal e que a simples assistência ad adjuvandum da União não desloca a competência para a Justiça Federal». «E, com efeito, o confisco e a incorporação do patrimônio liquido da empresa não têm o efeito de extingüi-la, de forma que a União R.T.J. — 100 72 Reclamação trabalhista contra ela ajuizada. Caso de competência da Justiça do Trabalho, por não estarem em causa os objetivos do confise da intervenção (A.C. n? 99/73, «O Ato Complementar n? 99, de co 1? e 2?). Simples assistência 04-10-73, aliás, deixa clara essa artigos ad adjuvandum desloca compeconclusão ao prescrever que, nos tência. Conflito não compefeitos em andamento, as empresas tente o suscitado,conhecido, sob intervenção continuarão repre- lho da 2? Região.» Tribunal do Trabasentadas pelos procuradores por elas constituídos ( art. 2?).» De acordo com esse precedente, e «Não se verifica, portanto, a hi- reportando-me ao voto que então pótese do artigo 110 da Constitui- proferi, conheço do conflito e dou peção que constitui a regra específi- la competência do suscitado, o Coca sobre a competência da Justiça lendo Tribunal Regional do Trabalho Federal em matéria trabalhista. A da 2? Região. intervenção da União, como assistente, em nada altera a questão, EXTRATO DA ATA sendo inaplicável o artigo 125, I, da Constiuição, no que concerne à jurisdição trabalhista. E, aliás, o que resulta da parte final da ementa CJ 6.252 — SP — Rel.: Min. Leitão da decisão proferida pelo Supremo de Abreu. Suste.: Tribunal Federal Tribunal no C.J. 6.157». de Recursos. Susdo.: Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região. «A reclamação trabalhista, por Interessados: Benedito Cardoso Pinsua própria índole, não envolve to e outros ( Advs.: Francisco Ary matéria relativa ao confisco ou à Montenegro Castelo e outros) e Cia. intervenção, em si, razão por que a Brasileira de Cimento Portland Pecompetência não passa à Justiça rus (Advs.: Nylva Alves Nogueira e outros). Federal». não substituiu a reclamada na relação de direito substancial deduzida em juizo». «Pelo conhecimento do conflito, declarada a competência do eg. Tribunal suscitado» (fls. 149-151). o relatório. VOTO Sr. ~listro Leitão Le Abreu (Relator): Em apoio do parecer, a Procuradoria-Geral da República invocou decisãO do Supremo Tribunal Federal, tomada no julgamento do C.J. n? 6.157, publicado no D.J. de 0606-80. Traz o acórdão, do qual fui relator, a seguinte ementa: «Empresa sob o regime de intervenção federal. Decisão: Conheceu-se do conflito e deu-se pela competência do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região. Decisão uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, Decio Miranda Rafael Mayer. Procurador-Geral da República, o Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 6 de agosto de 1980 — Alberto Veronese Aguiar, Secretário. R.T.J. — 100 73 CONFLITO DE JURISDIÇÃO N? 6.286 — (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Suscitante: Junta de Conciliação e Julgamento de Maceió — Suscitado: Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas. Ação ajuizada por trabalhadores avulsos contra o Sindicato dos Estivadores, reclamando participação nos valores entregues pelo Instituto do Açúcar e do Álcool. Caso que não se enquadra na competência da Justiça do Trabalho. Conflito conhecido, declarando-se a competência da Justiça comum do Estado. ACORDAO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros. do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em conhecer do conflito e declarar competente a Justiça comum do Estado. Brasília, 21 de maio de 1981 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Leitão de Abreu, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: Apresento como relatório o parecer do Procurador Moacir Antônio Machado da Silva, aprovado pelo Procurador-Geral da República Firmino Ferreira Paz: «1 — Trabalhadores avulsos vinculados ao Sindicato dos Estivadores do Estado de Alagoas ajuizaram ação contra este, perante o Juízo da Vara de Maceió, reclamando participação nos valores entregues pelo Instituto do Açúcar e do Álcool ao Sindicato, para distribuição entre os associados, a titulo de compensação pelo decréscimo de trabalho resultante do funcionamento do Terminal Açucareiro de Maceió. 2 — A ação foi julgada procedente em primeira instância, mas a eg. 2? Câmara do Tribunal de Justiça do Estado, entendendo que a controvérsia é oriunda de relação de emprego, julgou incompetente a Justiça comum dó Estado e determinou a remessa dos autos ao eg. Tribunal Regional do Trabalho da 6! Região. 3 — O MM. Juiz Presidente da Junta de Conciliação e Julgamento de Maceió, entretanto, suscitou conflito negativo perante o Supremo Tribunal, considerando que não há litígio decorrente de relação de emprego, pois o Sindicato opera como simples intermediário na, distribuição dos recursos, não se configurando a hipótese do art. 142 da Constituição Federal. 4 — Tem razão ó Juizo suscitante. Não se trata de litígio entre empregado e empregador, nem existe lei atributiva de competência à Justiça do Trabalho, a autorizar a subsunção da causa à regra do artigo 142 da Constituição. O litígio envolve, de um lado, trabalhadores avulsos e, de outro, o Sindicato respectivo, que, por força de convênio, recebe recurso do Instituto do Açúcar e do Álcool e os aplica em complemento da remuneração dos associados e em obrigações sociais vinculadas a essas complementações, como compensação de natureza social e de caráter transitório 74 R.T.J. — 100 pela diminuição do trabalho, decorrente do funcionamento do Terminal Açucareiro. 5 — Não se caracteriza a relação de emprego entre os associados e qualquer das partes do convênio. Sob esse aspecto, acrescente-se que a simples existência do convênio não atribui à Autarquia a qualidade de litisconsorte do Sindicato, afastando assim qualquer possibilidade de cogitar-se de competência da Justiça Federal (CJ 6.029, RTJ 84-78). 6 — Nos casos em que o Sindicato opera como intermediário entre os tomadores do serviço e os trabalhadores avulsos para pagamento destes e satisfação dos encargos sociais, correspondentes, a Jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está firmada no sentido de que a competência para o processo e Julgamento dos litígios entre os associados e o Sindicato é da Justiça Comum (CJ 5.029, RTJ 84-78; CJ 6.039; 1)J de 9-8-77; CJ 6.090, DJ de 31-10-7i; C.J 6.108; DJ de 30-6-78; CJ 6.241, DJ de 16-5-80; e RE 88.287; DJ de 30-5-80). 7 — Essa orientação também prevalece evidentemente nos casos em que os associados reclamam a participação de recursos provenientes do Instituto do Açúcar e do Alcool. No Julgamento do CJ 6.029PE, por exemplo, em que os associados pleiteavam do Sindicato respectivo tanto os recursos provenientes dos tomadores de seus serviços quanto os a da Autarquia, a conclusão foi pela competência da Justiça Comum. 8 — Pelo conhecimento do conflito, declarada a competência da Justiça Comum do Estado de Magoas. ( fs. 27 a 29). E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator): Como se trata de conflito entre Tribunal e o órgão judicante de primeiro grau, isto é, Junta de Conciliação e Julgamento, àquele não subordinado, conheço do conflito e, nos termos do parecer da Procuradoria-Geral da República, que se reporta a precedentes do Supremo Tribunal, aplicáveis ao caso, declaro competente a Justiça Comum do Estado. Determino, em conseqüência, a remessa dos autos da ação ordinária ao. suscitado. Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas, para que aprecie a apelação, como for de direito. EXTRATO DA ATA CJ. 6.286 — AL — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Suste.: Junta de Conciliação e Julgamento de Maceió. Susdo.: Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas. Interessados: Genivaldo José de Oliveira e outros. (Advs.: Ezir Colaço Rodrigues Costa e outra) e Sindicato dos Estivadores do Estado de Alagoas. ( Adv.: Antônio Aleixo Paes de Albuquerque). Decisão: Conheceu-se do conflito e deu-se pela competência do Tribunal suscitado. Decisão unânime. Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Antonio Neder, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mtuloz, Decio Miranda, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília, 21 de maio de 1981 — Jonas Céllo Monteiro Coelho, Secretário. R.T.J. — 100 75 MANDADO DE SEGURANÇA N? 20.201 — DF (Tribunal Pleno) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Requerente: Silvio Meyer Fontenelle — Requerido: Senhor Presidente da República. Mandado de segurança — Ato de demissão por acumulação ilegal de cargos — Nulidade — Funcionário do extinto DCT, declarado em remanejamento por não ter sido integrado ao quadro de servidores da ECT, quando da transformação daquele departamento, e que passou a exercer, concomitaiitemente, relação de emprego com a Aço Minas Gerais S/A — Açominas — Sua demissão, sob o fundamento de acumulação ilegal de cargos, após indeferimento de pedido de exoneração. — Não sendo pacifica a caracterização da Açominas, anteriormente á aquisição de seu controle acionário pela SIDERBRAS, como entidade de economia mista, e sendo razoável, dado o aspecto negociai da transformação, que fosse facultado aos servidores, após a encampação, o direito de opção, coexistiu, por parte do impetrante, a má-fé em que se fundou o ato demissório. Segurança concedida, com votos vencidos em parte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, em conceder a segurança nos termos do pedido, vencidos, quanto a extensão do deferimento os Ministros Relator, Rafael Mayer, Decio Miranda e Thompson Flores. Brasília, 19 de setembro de 1979 — Antonio Neder, Presidente — Cunha Peixoto, Relator para o acórdão. RELATÓRIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: Cuida-se de pedido de segurança contra ato do Senhor Presidente da República. Estes, segundo a narração do impetrante, os fatos que culminaram com a decisão presidencial, contra a qual se insurge: «Em 7 de junho de 1974, através da Portaria n? 840, do Diretor Regional da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT) no Ceará, o impetrante foi declarado em remanejamento, por não ter sido integrado ao quadro de servidores da referida empresa pública, ficando outrossim afastado da função que até então exercera no extinto Departamento de Correios e Telégrafos, como oficial de administração, nível 16, e sendo colocado á disposição do Dasp e do Ministério das Comunicações, para efeito de um futuro aproveitamento. «Em 23 de fevereiro de 1976, já perdurando, portanto, por quase dois anos, a situação de inatividade acima mencionada, o impetrante foi admitido como empregado da Aço Minas Gerais S.A. (Açominas), sediada em Belo Horizonte, Estado de Minas Gerais, passando a exercer a função de Chefe do Ga- 76 R.T.J. — 100 binete da Presidência da referida empresa. «Em 23 de setembro do mesmo ano, tendo decidido fixar definitivamente sua residência naquela cidade, o impetrante foi ao Ceará para apresentar seu pedido de exoneração do cargo público do qual estava afastado (doc. 2), não tendo tido posteriormente qualquer notícia a respeito do andamento do mesmo pedido, ressalvada a suspensão do pagamento de seus vencimentos, ocorrida a partir de Janeiro de 1977. «Em fins de maio de 1977 o impetrante veio a ter conhecimento do indeferimento de seu pedido de exoneração através do expediente Cl/SID 1.507/77, originário de Fortaleza e datado de 23.05.77, nos seguintes termos: Assunto: Pedido de exoneração 1 — Vimos solicitar seu pronunciamento urgente sobre o assunto tratado nos expedientes de referência. Casc tenha assumido novo emprego, deverá V. Sa. remeter imediatamente requerimento de exoneração, através desta regional. 2 — Esclarecemos que seu pagamento está suspenso desde janeiro/77 em virtude do pedido feito em outubro/76 e que não pôde ser encaminhado em face da anterioridade com que requeria a exoneração. «Tendo em vista o não encaminhamento do pedido anterior, o impetrante apresentou novo pedido de exoneração, em junho de 1977, acompanhado de declaração do Chefe da Seção de Pessoal da Açominas, quanto a seu emprego na mesma empresa (doc. 3). Surpreendentemente, entretanto, o novo pedido tampouco teve encaminhamento, sob a alegação de ter sido instaurado inquérito adminis- trativo para apurar uma eventual acumulação de cargos pelo impetrante (doc. 4). Na verdade apenas em 02 de setembro de 1977, através da Portaria n? 810 do Diretor Regional da ECT, è que veio a ser designada a comissão incumbida de apurar aquela acumulação (doc. 5). «A aludida Comissão de Inquérito, embora concluindo pela acumulação dos dois cargos pelo impetrante, entendeu que a mesma não decorrera de má fé (doc. 6) e opinou pelo encerramento do processo, com o encaminhamento regular do primeiro pedido de exoneração que fora formulado pelo impetrante. «No mesmo sentido manifestaram-se o Assessor Jurídico e diversas chefias da Diretoria Regional da ECT, todos opinando pelo encaminhamento do primeiro pedido de exoneração do impetrante, com sua desvinculação a partir de 22.02.76, e a conseqüente restituição das importâncias que lhe haviam sido pagas entre 23 de fevereiro e 31 de dezembro de 1976 (docs. 7 a 10). «A decisão administrativa final, entretanto, tomada com base em pronunciamento da Consultoria Jurídica da ECT (docs. 11, 12 e 13) e da Assessoria e da Diretoria Geral do Departamento de Pessoal do Ministério das Comunicações (docs. 14, 15 e 16), foi no sentido de que estava caracterizada a má fé na acumulação de cargos que incorrera o impetrante (doc. 17). «Dai a pena de demissão que foi imposta ao impetrante por decreto de 04.01.79, do Exmo. Sr. Presidente da República, publicado no Diário da União de 05.01.79 (doc. 18). R.T.J. — 100 «E contra o ato de demissão em apreço que ora se insurge o impetrante, não só por inexistir, no caso, qualquer acumulação de cargos públicos, como porque, ainda quando houvesse, efetivamente, tal acumulação, não teria havido, absolutamente, a imputada má fé e, em qualquer circunstância, teriam sido nulos, de qualquer forma, os processos administrativos que precederam e pretensamente justificaram aquela demissão, uma vez que os mesmos não observaram as normas legais aplicáveis, tudo conforme se demonstrará a seguir» (fl. 2/4). Sustenta-se, inicialmente, não ser a Aço Minas Gerais S.A. empresa de economia mista, não se configurando, assim, a acumulação vedada pelo artigo 99, 2? da Constituição Federal. Alega-se, ainda, que a Aço Minas Gerais S.A. sempre agiu, em relação ao impetrante, como empresa essencialmente privada, quer porque não exigiu dele, à época da admissão, a declaração de que ele não exercia cargo de natureza pública, quer porque o registrou no Programa de Integração Social (PIS). Argumenta-se, a seguir, ter sido ilícita a recusa da exoneração, que foi pleiteada por duas vezes. Assevera-se, ainda, não se haver assegurado ao impetrante o direito de opção, antes da abertura do processo administrativo. Por fim, argúi-se não ter havido prova da má fé do impetrante no tocante à alegada acumulação de cargos. Diante disso, pede: «Com fundamento no que ficou exposto, o impetrante vem pedir se digne esse egrégio Tribunal conceder-lhe a segurança para o fim de declarar nulo e de nenhum efeito o ato de sua demissão, dada a sua flagrante ilegalidade, com a conseqüente sustação de todo e 77 qualquer ato dele decorrente, direta ou indiretamente, notadamente a rescisão do contrato de trabalho celebrado entre a Açominas e o impetrante e a restituição das importâncias por ele recebidas na vigência do mesmo contrato» (fls. 24). As informações, encaminhadas a esta Corte pelo Senhor Presidente da República, foram prestadas pelo Diretor-Geral do Dasp, nos seguintes termos: «Preliminarmente, improcede a segurança impetrada, pois a matéria tratada escapa ao âmbito restrito do mandado de segurança, por envolver exame de fatos e de provas, somente deslindáveis através de ação ordinária, de acordo com jurisprudência mansa e pacifica não só do Colendo Supremo Tribunal Federal como de todos os demais Tribunais do Pais. «Quanto ao mérito o pedido é totalmente desprovido de qualquer respaldo jurídico, como ficará demonstrado a seguir. «Não resta a menor dúvida de que a Aço Minas Gerais S.A. — Açominas, subsidiária da Siderbrás, que dela detém a maioria do capital, é uma Sociedade de Economia Mista, estando, inclusive, dessa forma, catalogada no Cadastro de Administração Federal, publicação da Secretaria de Planejamento da Presidência da República (2! edição, seção 46, pág. 9). Assim, sobre os seus servidores incide a proibição existente no f 2? do artigo 99 da Constituição Federal. «Sociedade de Economia Mista não é somente aquela criada pela União, em virtude de lei específica, mas, também, a que for instituída por entidade da Administração Indireta, em decorrência de 78 R.T.J. — 100 autorização legal pertinente, constante da lei institucional da entidade principal ou de lei casuística. Este é o entendimento da Administração Pública, expresso, inclusive, em parecer da Consultoria Geral da República, de n? L-154/77, publicado no Diário Oficial de 26.07.1977, in verbis: 'De acordo com essa conceituação, sociedade de economia mista será não somente aquela criada pela União, em virtude de lei especial com a detenção do controle acionário; sê-lo-á, igualmente, *a que vier a ser instituída, por entidade da Administração Indireta (autarquia, empresa pública ou sociedade de economia mista), em face de autorização legislativa pertinente, que poderá constar da própria lei institucional e não, necessariamente, de lel casuística, assegurado sempre o controle acionário por parte da entidade instituidora. Logo, as sociedades filiais, satélites ou subsidiárias, criadas, em tais pressupostos, pelas sociedades de economia mista matrizes, são iniludivelmente, sociedades de economia mista, ditas de segundo grau, material e formalmente integrantes da Administração Indireta.' «conforme se vê do artigo 3? da Lei n? 5.919, de 17.09.1973, que autorizou a sua constituição, na redação dada pelo artigo 2? da Lei n?, 6.159, de 06.12.1974, a Siderbrás poderá criar subsidiárias: Artigo 3? — A Siderbrás exercerá o controle acionário das empresas siderúrgicas, cuias ações com direito a voto pertençam em sua maioria à União ou a entidade de Administração Federal Indireta, as quais passarão à condição de suas subsidiárias, podendo ainda criar outras subsidiárias e associar-se minoritariamente a empresas privadas que exerçam atividades siderúrgicas e afins. «Desse modo, sendo a Açominas uma sociedade de economia mista, o impetrante, ao ingressar no seu quadro de pessoal, incidiu em acumulação proibida, já que detinha, de há muito, o cargo de Oficial de Administração nos Correios e Telégrafos. «Quanto aos argumentos desenvolvidos pelo ex-servidor de que a pena de demissão que lhe foi aplicada é ilegal porque ilícita foi a recusa dos seus dois pedidos de exoneração e não ficou provada a sua má fé na acumulção, também, não têm consistência Jurídica. Os pedidos de exoneração além de apresentados muito depois da ocorrência da acumulação ilícita, foram feitos sob termos condicionais, que a Administração, após examiná-los todos, achou por bem não aceitalos, antes de instaurar o processo administrativo para apuração minuciosa dos fatos. Tendo em vista o nível cultural do impetrante e sobretudo o fato de ser bacharel em direito, entendeu-se caracterizada a acumulação ilícita, com má fé, que desenganadamente houve, e decidiu-se, recusando os pedidos de exoneração, demitir o servidor do cargo que ocupava na área federal. «Finalmente, vale ressaltar que o argumento de que a não concessão do prazo de opção pode levar à nulidade do ato de demissão, não tem qualquer base legal, visto como o parágrafo único do artigo 53 da Lei n? 4.242, de 17.07.1963, não revogou as disposições do argigo 193 da Lei n? 1.711, de 28.10.1952, pois o que o legislador teve em mira, apenas, foi criar mais uma forma de fiscalização das acumulações, a ser realizada depois de publicado o resultado do censo periódico dos servidores públicos da União, das Autarquias e entidades R.T.J. — 100 paraestatais, que deveria ser efetivado pelo Instituto Brasileiro de Georgraf ia e Estatística» ( fls. 92/96). Do parecer da Procuradoria-Geral da República transcrevo a parte final, verbis: «Como se nota, pretende-se não apenas exame de matéria de fato, mas, principalmente, exame de critério seguido pela Administração Federal de respeito à lei. *Em conclusão, o ato impugnado obedeceu à legislação pertinente e não foi praticado com abuso de poder e o seu desfecho, se de se lamentar, não é de ser imputado à autoridade requerida mas, sim, ao próprio impetrante. «Somos pelo indeferimento do mandado de segurança» (fls. 102). E o relatório. 79 cargos ( artigo 193, parágrafo único, da Lei n? 1.711, de 28.10.52), está revoltada pela Lei n? 4.242, de 17 de julho de 1963, na qual se determinou: «Artigo p3 — O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística realizará censo periódico dos servidores públicos da União, das Autarquias e entidades paraestatais. «Parágrafo único — Publicado o resultado do censo, com os elementos precisos de identificação, tempo de serviço, cargo ou função do servidor, vencimentos e vantagens ou proventos percebidos, o servidor que acumular cargos, funções ou proventos com violação dos preceitos legais terá o prazo de 30 dias para manifestar opção por um deles,sob pena de instauração de processo administrativo pelo Departamento Administrativo do Serviço Público». Afirma-se que, em caso absolutamente idêntico, o Supremo Tribunal, VOTO por sua antiga Terceira Turma, tade ilegal demissão de funcionáO Sr. Ministro Leitão de Abreu chou rio, por lhe não haver sido assegura(Relator): Deixando de lado a ordem do o direito de opção, previsto na Lei pela qual são articulados os funda- 4.242/63. Transcreve-se, para commentos em que o impetrante apóia a da assertiva, parte conclusua pretensão, começo pelo exame provação siva do voto do relator, assim concedaquele em que se sustenta ter sido bida: ferido dispositivo legal, que asseguraria ao servidor que acumular car«O artigo 53, parágrafo único, da gos, funções ou proventos, com vioLei n? 4.242, de 17.07.63, silencia solação dos preceitos legais, o prazo de bre a prova da boa fé, exigida no trinta dias para manifestar opção artigo 193 da Lel n? 1.711, para a por um deles, sob pena de instauraopção por um dos cargos. Prevê ção de processo administrativo. Enaquele dispositivo outro meio de frento, desde logo, essa argüição, verificação da acumulação proibiporquanto, se procedente, seria ela da e assegura o direito de opção, bastante para a concessão do manantes da instauração do processo dado, independente do exame das administrativo, sem fazer distinoutras alegações, formuladas pelo ção entre as hipóteses de boa ou requerente. má fé do funcionário. Na espécie, não foi assegurado ao impetrante o Assevera-se, a tal propósito, que a direito de opção. regra estatutária, onde se preceitua que, provada, em processo, a má fé, «Dou provimento ao recurso, pao funcionário, que incorrer em acura restabelecer, na conclusão, a mulação proibida, perderá ambos os sentença de primeira instância.» ao — 100 Esse voto é extremamente sintéti- em prol da tese que defende, entenco, de modo que precisa ser inter- deu, na verdade, que a regra do artipretado em face do relatório. Neste, go 193 da Lei 1.711, quanto à prova entretanto, não se diz, explicitamen- da boa fé no tocante à acumulação te, se a acumulação foi acusada pelo de cargos, fora modificada pelo articenso, a que se refere a Lei 4.242, go 53 da Lei n? 4.242, o qual assegura nem se a instauração do processo ao servidor, que acumular cargos inadministrativo se deu sem que hou- devidamente, o prazo de trinta dias vesse corrido o prazo de 30 dias, den- para optar por um deles. tro no qual se deveria manifestar a Apesar da reverência de que é creopção por um dos cargos. Está dito, contudo, no citado relatório, que o dor, por todos os títulos, o precedenimpetrante fora nomeado para o car- te a que se arrima o impetrante, não go, que configuraria a acumulação me parece que a Lei n? 4.242 haja esproibida, em 24.03.60, antes, portan- tabelecido, acerca da acumulação de to, da Lei 4.242, que é de 17 de julho cargos, regra geral, aplicável a tode 1963. Ora, não Havia, ainda, decorri- dos os casos em que se verifique o do o prazo de 30 dias, assinado por exercício indevido de cargos públiesse diploma legal para a opção, cos. Como se depreende do que está quando, em 3 de agosto seguinte se dito, não implícita, mas explicitarepresentava contra ele perante a mente no artigo 53 desse ato legislaAdministração Central, para que au- tivo, o direito nele assegurado diz torizasse o processo administrativo. respeito à acumulação de cargos reEste foi determinado mediante Por- velada pelo censo periódico, cuja taria de 31.12.63. De resto nem pode- realização se determinou. Aliás nem ria tratar-se, nessa hipótese, de caso mesmo se afirma, nos autos, ter esse a saber, o concernente ao de incidência do artigo 53, parágrafo trabalho, único, como resultado de ofensa ao censo, sido efetuado, ou, se o foi, esdireito de opção, ai previsto, uma tar ele sendo levado a efeito, periodivez que a Lei n? 4.242, que é de 17 de camente, como prescreve a lei. De julho de 1963, cuida, no artigo 53, de qualquer maneira, realizado ou não censo periódico, que manda realizar', o censo periódico dos servidores púdos servidores públicos da União, blicos, o certo é que a regra da opdas autarquias e entidades paraesta- ção, nos termos constantes do artigo tais De todo improvável é que o pri- 53, parágrafo único, da Lei 4.242, vameiro censo, que se determinou fos- lia e valerá unicamente no tocante se periódico, se tenha realizado com aos achados em acumulação pelo rapidez tal que haja antecedido, seja censo. Quanto aos demais casos, em a representação da autoridade admi- que for surpreendida, pela adminisnistrativa, a quem estava subordina- tração, acumulação indevida de cardo o funcionário em causa, seja o ato gos públicos, aplicável é o artigo 193 da Administração Central que man- e seu parágrafo único, do Estatuto dou instaurar o inquérito, uma vez dos Funcionários Públicos da União, que o primeiro desses atos, como já preceito em que não se garante ao se observou, é de 3 de agosto de 1963, actunulante, submetido a processo, o cerca de uma quinzena após a expe- prazo de trinta dias para optar por dição da Lei n? 4.242, e o segundo é um dos cargos acumulados. Desacode 31.12.63, isto é, somente alguns lho, diante disso, o argumento, suscimeses após a edição do mesmo di- tado pelo impetrante, de que, por não se lhe dar oportunidade para opploma legislativo. tar por um dos cargos, ilegítimo é o Parece exato, assim que o acór- ato que o demitiu do serviço público dão, invocado pelo ora impetrante federal. R.T.J. 100 Queixa-se o impetrante, também, de que lhe foi negada, injustamente, a exoneração que pediu. Regular, isento de vicio, fora, no seu entender, o pedido que fizera; não obstante, a pretexto de que o requerimento, que apresentara, denotava defeito, a administração lhe negou o desligamento do cargo que ocupava, ferindo-lhe, com isso, direito irrecusável. O impetrante que, desde junho de 1974, era funcionário em remanejamento, pois, não tendo sido integrado no quadro da Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos, a que pertencia, fora posto à disposição do DASP para futuro aproveitamento, foi admitido, em 23 de fevereiro 1976, como se viu do relatório, como empregado da Aço Minas Gerais S.A. (Açominas),com sede em Belo Horizonte. Corridos sete meses, ou seja, a 23 de setembro do mesmo ano, entrou com pedido de exoneração do cargo de cujo exercício estava afastado, cargo que se achava lotado no Estado do Ceará Nessa petição, protocolada a 27 de setembro, solicitou o requerente, que era Oficial de Administração, fosse a exoneração, que pleiteava, concedida a partir de 1? de janeiro de 1977, isto é, cerca de três meses após, dispensado-se-lhe a permanência em exercício dos 40 dias da lei. O pedido de exoneração, no entanto, foi indeferido, em 15.10.76, sob o fundamento de que era fora de propósito solicitar dispensa dos 40 dias e pedir exoneração a partir de data indicada no requerimento. Posto não seja usual pedir exoneração e fixar a data em que esta, no futuro, deva vigorar, não incorre esse pedido em ilegalidade. O funcionário, não estando sujeito a processo administrativo, tem direito a exoneração, se o pedir (Lei 1.711, artigo 75, I). Nem poderia deixar de ser as- 81 sim, uma vez que o serviço público profissional não é prestado de modo compulsório. Em face disso, pode a administração, quando muito, estabelecer, para assegurar a continuidade do serviço, prazo razoável de permanência do funcionário no exercido do cargo, a pós o Pedido de exoneração. Foi isso que se fez, aliás, com a regulamentação da exoneração a pedido pelo. Decreto n? 45.807, de 15.04.59. no qual se estatui: «Artigo 1? — O pedido de exoneração do funcionário, previsto no artigo 75, item I, da Lei 1.711, de 28 de outubro de 1952, deverá ser dirigido ao Presidente da República e apresentado ao chefe imediato do requerente, com firma reconhecida.» «Artigo 2? — Após a apresentação do pedido a que se refere o artigo 1", ,o funcionário deverá conservar-se em exercício durante quarenta dias.» «Artigo 3? — A permanência em exercício, durante quarenta dias, a que se refere o artigo 2?, poderá ser dispensada, se não houver prejuízo para o serviço público, a critério do chefe da repartição ou serviço, em que estiver lotado o funcionário.» Como ao funcionário assiste o direito de desligar-se do serviço público, mediante pedido de exoneração, quando o entender, nada impede, em princípio, que, apresentando o requerimento pelo qual pleiteia a desvinculação do cargo, estipule a data a partir da qual queira que o pedido vigore. Não incorreu o impetrante, por conseguinte, em ilegalidade, quando, ao produzir o seu pedido de exoneração, requereu que este produzisse efeito a partir de 1? de janeiro de 1977, cerca de três meses depois de protocolado o requerimento. Não havia motivo juridico, destarte, para que, por essa razão, se trancasse o encaminhamento do pedido de exoneração ao Presidente da República. Pareceu, contudo, por outro lado, ao autor do despacho indeferitório que era fora de propósito, tam- 82 R.T.J. - 100 bém, o pedido de dispensa dos quarenta dias. Porém, ainda aqui, não se fez justiça ao impetrante, porquanto o prazo de quarenta dias de permanência no cargo se exige para que a administração, perante o pedido de exoneração do funcionário, possa prover no sentido de que o serviço desempenhado pelo requerente não sofra interrupção. Ora, no caso vertente, tendo o impetrante solicitado que o pedido de exoneração somente vigorasse cerca de três meses depois de protocolado, notificada estava a administração, com antecedência maior de quarenta dias, que não mais poderia, a partir de 1? de janeiro de 1977, contar com o serviço do requerente. Quando isso não bastasse, cumpriria, ainda, ter em conta que o requerente não se achava no exercido de suas funções, uma vez que delas estava afastado havia cerca de dois anos, por haver passado ao que, na gíria administrativa, se chama funcionário em remanejamento. Contraditoriamente, porém, tirando conseqüências práticas do pedido de exoneração, a autoridade administrativa, suspendeu, a partir de 1? de janeiro de 1977, data a contar da qual o requerente pediu vigorasse o seu requerimento de exoneração, o pagamento dos vencimentos concernentes ao cargo que ocupava. Segundo documento transcrito, pelo impetrante, a fls. 3, documento cujos termos não são contestados, antes, de certa forma, corroborados, a administração comunicou, em fins de maio de 1977, que o pagamento fora suspenso desde janeiro em virtude do pedido feito em outubro de 1976, pedido que não pôde vir a ser encaminhado em face da anterioridade com que a exoneração fora requerida. Logo, não obstante se afirmar que o pedido de exoneração não havia sido encaminhado em face da anterioridade com que se formulava o pedido, afirmava-se que, por força dessa petição, se havia suspenso o pagamento da retribuição pecuniária ligada à titularidade do cargo. A fls. 39, consta informação, datada de 17 de fevereiro de 1978, onde se diz que o DR do Ceará fizera expediente ao interessado aconselhando-o a pedir exoneração, caso tivesse assumido novo emprego. Não se esclarece, contudo, o momento em que a sugestão, em tal sentido, se efetuou. Mas o certo é que o impetrante reiterou o pedido em requerimento ao qual anexa declaração da Açominas, onde se diz ser ele empregado dessa entidade, desde 23.2.76, na qual exercia a função de Chefe do Gabinete da Presidência (fls. 31). Meses mais tarde, isto é, a 4 de outubro de 1977, a Diretoria Regional do Ceará informava ao requerente, em resposta à carta que este lhe enviara, que o seu pedido de exoneração (agora já o segundo pedido), não tivera encaminhamento, em virtude de haver sido instaurado inquérito administrativo para apurar acumulação de cargos em que possivelmente incorrera, como funcionário de Sociedade de Economia Mista (fls. 32). A recusa de encaminhamento do segundo pedido de exoneração se apóia, no entanto, em fato diferentes, consistente, como se viu, na possível acumulação do cargo de Oficial de Administração com emprego em Sociedade de Economia Mista. Essa sociedade, Açominas S.A., todavia, então já não era estadual, uma vez que passara para a Órbita federal, em virtude da obtenção do seu controle acionário pela Siderbrás, da qual se tornara subsidiária. Em faceS dessa transposição da Açominas S.A. de uma para outra pessoa política, sem a existência de lei, que houvesse atribuído, diretamente, a essa entidade, no âmbito da União, o status de sociedade de economia mista, entende o impetrante que tal condição não lhe é reco- R.T.J. — 100 nhecivel, não havendo falar-se, destarte, em acumulação de cargos públicos, quando um deles como tal não se pode considerar. Encontra-se nos autos brilhante parecer oferecido, quando Consultor Geral da República, pelo hoje Ministro Rafael Mayer, onde Sua Excelência examina, com agudeza e profundidade, inclusive perante a nova Lei das Sociedades Anônimas, a condição jurídica das sociedades de economia mista, para distingui-las em sociedade de economia mista de primeiro grau (matriz) e sociedade de economia mista de segundo grau (subsidiária). Da ementa desse parecer o nobre Subprocurador da República, que oficiou no presente caso, Dr. Mauro Leite Soares, cita a seguinte passagem: «O conceito de sociedade de economia mista, como integrante da Administração Indireta, supõe, sob o aspecto formal, a concorrência de dois requisitos essenciais, ou seja, a criação em virtude de lei autorizativa e a participação majoritária da entidade mater, de modo permanente e indeclinável» (fls. 100). No corpo do parecer frisava o então Consultor Geral da República: «... sociedade de economia mista será não somente aquela criada pela União, em virtude de lei especial, com a detenção do controle acionário; sê-lo-á, igualmente, a que vier a ser instituída, por entidade da Administração Indireta ( autarquia, empresa pública ou sociedade de economia mista), em face de autorização legislativa pertinente, que poderá constar da própria lei institucional e não, necessariamente, de lei casuística, assegurado sempre o controle acionário por parte da entidade instituidora. Logo, as sociedades filiais, satélites ou subsidiárias, criadas, em tais pressupostos, pelas sociedades de economia mista matrizes, são, iniludivelmente, sociedades 83 de economia mista, ditas de segundo grau, material e formalmente integrantes da Administração Indireta». Dito isto, anotava, em seguida, «Ainda em conseqüência da mesma conceituação, não obstante composto, o respectivo capital, de recursos públicos e privados, não são, formalmente, sociedades de economia mista aquelas em que ocorra participação minoritária do capital público, salvo se a lei, excepcionando, expressamente, ao arrepio dos princípios, conceituá-las como de economia mista...» ( fls. 105). Não se discute, no caso, que a participação da Siderbrás na Açominas é majoritária, de sorte que a primeira, ao assumir o controle acionário da segunda, lhe teria comunicado status, que formalmente possui, de sociedade de economia mista. Desta sorte, cumpriria concluir quê impetrante, como empregado da Açominas S.A., depois que a Siderbrás assumiu o controle acionário desta, teria incorrido em acumulação proibida de cargos públicos. Sucede, no entanto, que esse não é o ângulo sob o qual deve a questão ser examinada. O que importa saber, na hipótese, não é se a Açominas, como subsidiária da Siderbrás, passou a constituir sociedade de economia mista, tornando aplicável aos titulares de seus cargos ou empregos a proibição de acumular, mas se a Açominas S.A., antes de passar ao controle acionário da Siderbrás, detinha a condição de sociedade de economia mista. Importa que essa questão se coloque porque o impetrante pediu exoneração do cargo, de que era titular no serviço público federal (cargo de Oficial de Administração) antes da assunção, pela Siderbrás, do controle acionário da Açominas. O seu primeiro requerimento de exoneração como se verifica a fls. 28, foi protocolado, como já foi dito, a 27 de setembro de 1976, ao passo que é de outubro seguinte, a decisão da Dl- 84 — too retorta da ~minas de transformar os créditos da Siderbrás em capital social, decisão pela qual esta entidade veio assumir o controle acionário da Açominas (fls. 60/61). Em conseqüência dessa decisão, a Siderbrás, como se verifica do documento de fls. 63, é arrolada como detentora, em 8 de novembro de 1976, de 58,83% das ações da Açominas S.A. Ostentaria, no entanto, a ~minas, quando sob o controle de capitais mineiros, a condição de sociedade de economia mista estadual? O exame dos elementos constantes dos autos induzem à conclusão de que o Estado de Minas Gerais não teve o intuito de atribuir-lhe esse caráter pois, aliás, teria procedido como fez em relação à Metamig, à qual conferiu, explicitamente, no ato constitutivo, a condição de sociedade de economia mista. Está dito, realmente, na Lei n? 2.462, de 13 de outubro de 1961: «Artigo 1? — Fica o Governo autorizado o organizar e incorporar, no Estado, uma sociedade de economia mista, denominada «Metais de Minas Gerais S.A. — Metamig» e destinada à exploração, industrialização, transporte, exportação e qualquer outra forma de aproveitamento econômico de minérios, e que se regerá pela Lei das Sociedades Anônimas». Além disso, no artigo 4?, estabeleceu o mesmo diploma legal que seria de 51% a participação do Estado na formação do capital social, dispondo, ainda, no artigo 5?, que as ações correspondentes a essa participação mínima seriam inalienáveis. Assim não se procedeu, no entanto, quando se cuidou da instituição da Açominas, porquanto no artigo 1? da Lei n? 2.865, de 12.09.63, que autoriza a constituição dessa entidade, se prescreveu, simplesmente: «Fica o Governo fio Estado autorizado a participar, majoritária ou minoritariamente, através da Metais de Minas Gerais, S.A. — Metamig, da Constitui- cão de uma sociedade que se denominará Açominas S.A., destinada a industrializar os minérios da região do Vale do Paraopeba». Acareando-se uma lei com outra, verifica-se que a primeira é categórica ao caracterizar a Metamig como sociedade de economia mista, indo ao ponto de prescrever a inalienabilidade das ações que asseguravam ao Estado o controle acionário da entidade, enquanto a segunda, além de não definir a sociedade como de economia mista admite que a participação do Estado seja najoritaria ou minoritária, deixando claro, desse modo, que não tinha por indispensável o controle acionário da entidade criada, a qual poderia, assim, passar a outras mãos. Nada admira, pois, que o Estado, durante determinado período, haja perdido a sua posição majoritária na aludida sociedade, como se colhe do quadro de fls. 63, onde se acusa, em 31.12.73, a detenção da maioria do capital por entidades privadas. Desse modo, se com base em outros critérios, seja possível sustentar que a Açominas, desde a sua criação, exibia o perfil de sociedade de economia mista, é inegável ser justificável manter-se dúvida razoável quando à sua caracterização conto tal, enquanto esteve sob o domfuno de capitais do Estado de Minas Gerais. Afirma-se, certamente, que essa entidade, em 26 de setembro de 1977, se declarou sociedade de economia mista (fls. 35). Mas é preciso ter em conta que essa declaração se enunciou quando o seu controle acionário já estava em poder da &derbrás, da qual passara ser subsidiária ou entidade satélite. Tudo isso explica, por outro lado, haver a administração da Açominas, enquanto subordinada ao Estado, dispensado ao impetrante tratamento que era privativo dos trabalhadores em empresa privada. R.T.J. — 100 Por tudo isso, não caberia alegar — coisa que, no momento, aliás, não se fez — para obstar o encaminhamento do primeiro pedido de exoneração, formulado pelo impetrante, estar ele incurso em acumulação proibida. Poderá dizer-se que, entre o pedido de exoneração, 27 de setembro, e a data que o requerente indicou para a vigência da ruptura do vinculo de emprego, 1? de janeiro, a Açominas passou à condição de subsidiária da Siderbrás, adquirindo, destarte, o status de sociedade de economia mista. Nesse período, portanto, teria havido, de qualquer modo, acumulação proibida, capaz de justificar a demissão, dada a má fé com que teria procedido o impetrante. Contra esse argumento milita, P o -rém,epiolugad formal, ou melhor, negociai, que presidiu á aquisição, pela Siderbrás, do controle acionário da Açominas. Admitindo-se, para efeito de raciocínio, que essa entidade haja, por tal caminho, sido atraída para a órbita das sociedades de economia da União, não se deu isso de maneira solene, traduzida na declaração imediata e expressa de que adquirira, na esfera federal, essa feição jurídica. Enfraquece, depois disso o vigor do aludido argumento a circunstância de que, em tais casos, a saber, no de transformação de uma entidade privada em entidade pública, é natural facultar-se prazo para que os servidores da entidade transformada, que ocupem outro cargo público, manifestem opção por um dos cargos de que sejam titulares. Não havia razão Jurídica, por conseguinte, para que se negasse ao Impetrante o encaminhamento do seu primeiro pedido de exoneração, já porque, embora formulado de modo não usual, comportava interpretação que o tornava isento de qualquer vicio, já porque não se alegou, para 85 isso, estar o requerente incurso em acumulação proibida, já porque essa alegação, se tivesse sido levantada, não teria consistência, no que toca ao período em que a Açominas permaneceu sob o controle acionário de capitais do Estado, já, enfim, porque, no curto período que vai de 27 de setembro de 1° de janeiro, era licito, pelo menos, manter dúvida quanto à aquisição, pela Açominas, da qualidade de sociedade de economia mista da União e, quando assim não fosse, era mister que se tivesse facultado, logo após o trânsito dessa entidade da órbita estadual para a federal, prazo para que os servidores, que ocupassem cargos na entidade encampada, realizassem opção, se ocupassem outro cargo público, insuscetível de acumulação. Como o impetrante tinha direito, pois, a que se lhe deferisse a exoneração solicitada, 'legitimo se fez o ato de demissão que depois se lhe impôs, a pretexto de má-fé relativamente à acumulação de que era acusado. A invalldade da demissão não requer, porém, no caso, se anule o ato demissório, porquanto, se este não pode subsistir como tal, pode valer, não obstante, como ato de exoneração. Viável se torna, assim, na espécie, converter, por interpretação, o ato de ruptura do vínculo do emprego, mediante a imposição de pena disciplinar, em ato de desfazimento da relação de emprego, a pedido do próprio funcionário. A figura da conversão não encontra, por certo, fundamento explícito, ao menos entre nós, no direito positivo, contrariamente ao que sucede no tocante ao direito alemão, onde esse instituto se acha consagrado dogmaticamente. Mas aí mesmo talvez isso ocorra somente no campo do direito privado, ou seja, no artigo 140 do BGB, onde se estatui que, correspon- as R.T.J. — 100 dendo um ato jurídico nulo às exigências de outro ato Jurídico, valerá este último, se admissivel ter este sido querido, caso houvesse conhecimento da nulidade (Entspricht emn nichtiges Rechtsgeschilaft den Erfordernissen eines anderen Rechts- • geschilafts, so gilt das letztere, wenn anzunehmen ist, dass dessen Geltung bei Kenntnis der Nichtigkeit gewollt sem würde». Apesar de editada essa regra quanto ao direito privado, o certo é, no pentanto, que a sua aplicação transcendeu a órbita privatistica, pois se tem entendido que nela se exprime um principio geral de direito, qual o da conservação do próprio direito. É certo que, no direito administrativo germânico, se faz invocável, também para justificar a incidência desse postulado, a analogia legis. Mas em outros países, em que se não pode recorrer à analogia, por não haver texto legal, que lhe sirva de apoio, tem bastado, para firmar a legitimidade da conversão, a própria evidência da sua juridicidade. Não se deixa embaraçar, assim, pela falta de lei, que autorize a conversão, uma das vezes oraculares do direito público peninsular, Sana Romano, quando escreve: «Questa (la conversione) si ha quando un atto che è invalido come atto di un dato tipo, puó considerarsi come atto di un altro tipo, del quale continne tutti gli elementi necessari, formali e sostanziali, come quando, p. es., una concessione amministrativa relativa a beni non demaniali pilei valere como locazione. La conversione puó essere stabllita dalla legge (ma di questa sua specie non pare che si abbiano esempi nel diritto amminisCativo) o dalla volontà, expressa, o meno, dell'autorità, con la quale debe concorrere anche la volonta di colui o di coloro ai quale l'atto si rivolge, se si tratta dl um atto per cul questa é un presupposto indispensablle alia sua et:lenda» (Corso dl Dirit- to Amministrativo, 2? ed., 1932, p. 285). Mais fácil é operar-se, aliás, a conversão no direito público, e particularmente no direito administrativo, do que no direito privado, uma vez que aqui predomina a autonomia de vontade, prevalecem geralmente os móveis subjetivos das partes, a sua utilidade particular, entretanto que ali impera o interesse público, a cuja promoção se subordina a vontade do agente, vontade que, por estar vinculada a um fim, pode e deve ser interpretada em face de critérios objetivos. Além disso, como os atos administrativos gozam da presunção de validade, impõe-se aplicar, em relação a eles, com mais rigor, a regra hermenêutica, onde se diz que a rainha das interpretações é a que salva o ato e não a que o nulifica. No caso vertente, não é possível salvar, simpliciter, o ato impugnado. E viável, contudo, salvá-lo, em parte, mediante a sua conversão em outro, já que para isso concorrem todos os requisitos. Não pode haver dúvida de que a autoridade, que praticou o ato de demissão, se houvesse tido conhecimento da nulidade desse ato, haveria concedido a exoneração requerida pelo ora impetrante. Indubitável, também, que satisfeitas estão as demais exigências para a conversão, ou seja, a competência do agente, a forma do ato, a sua causa, a vontade daquele a quem diz respeito o ato resultante da conversão. Nessas condições, concedo, em parte, a segurança para converter o ato de demissão, cuja nulidade se argúi, em ato de exoneração do impetrante, do cargo de Oficial de Administração a partir de 1? de janeiro de 1977, deixando de pronunciar-me quanto à parte do pedido, que diz respeito à sustação da rescisão do contrato de trabalho entre o impetrante e a Açominas, uma vez que esta não Integra a lide. R.T.J. — 100 VOTO O Sr.Ministro Cunha Peixoto: Sr. Presidente, dentro da linha de raciocínio do eminente Relator, ponhome inteiramente de acordo com as premissas do magnifico voto de S. Ex? . Apenas discordo de S. Ext na conclusão. Concedo a segurança integral, para anular o ato de demissão. VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: Sr. Presidente, defiro a segurança, para anular o ato, porque a Lei do IBGE faculta o direito de opção a quem for apanhado em fraude, acumulando. Esse funcionário foi levado por uma contingência. Depreende-se, facilmente, que o Departamento ia ser extinto e ir-se-ia criar a Empresa de Correios e Telégrafos. Ele ficou em remanejamento e procurou fixar um destino na vida. Logo que se fixou, pediu exoneração, que lhe foi negada, por duas vezes embora a partir da primeira vez lhe tenham retirado os vencimentos. Não creio que ele estivesse de má-i fé. Mas, mesmo que estivesse, o IBGE é exatamente num órgão adequado a descobrir aqueles que fraudam a lei de acumulação. A lei, nesses casos de fraude manifesta, dá direito de opção ao funcionário. E ele não teve esse direito. Concedo a segurança, integraimente, de acordo com o eminente Ministro Cunha Peixoto. VOTO O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: Sr. Presidente, não tenho dúvida em acompanhar o eminente Relator, quanto à fundamentação que desfecha, em seu douto voto na ilegitimidade do ato demissório. 87 Estou embaraçado, porém, para me situar no dissenso que se instalou com relação á sua conclusão. Percebo que o eminente Relator, além da excelente fundamentação teórica que utilizou, funda-se na consideração pragmática de dar desfecho final ao problema, evitando que aquele primitivo pedido de exoneração, de setembro de 1976, ainda vá retomar, agora, o seu curso, depois que houve até processo administrativo por acumulação. O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator): Eminente Ministro, aqui há uma consideração. Se o Presidente da Repúlica houvesse indeferido o pedido de exoneração, não poderia fazer-se, no caso, a • conversão, a que se refere o meu voto. Sucede, porém, que o ato teve o seu encaminhamento trancado, de modo que sobre o pedido de exoneração não chegou a manifestar-se o Chefe do Governo. 2 possível supor, assim, que se tivesse este tomado, no tempo próprio, conhecimento do pedido de exoneração, deferiria a solicitação, porquanto o requerente possuía direito ao que pedia. possível supor, ainda, que, se ao lhe ser submetido o ato de demissão, houvesse sabido que esse ato não podia ser praticado, por ilegal, teria, então, deferido o pedido de exoneração. Ora, cabe a conversão de um ato jurídico nulo em outro ato jurídico, quando se tenha como admissivel que este outro ato haveria sido querido, se se houvesse conhecido a nulidade do primeiro. Por me parecer admissivel, em primeiro lugar, que o Chefe do Governo, diante do conhecimento da nulidade do ato de demissão, teria querido o ato de exoneração, tal qual lhe fora requerido. e por ser inegável, de outra parte, que o funcionário, que sofreu a denüssão, queria a exoneração, a R.T.J. - 100 88 conversão da primeira na segunda se acha, a meu ver, plenamente autorizada. O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: Talvez não seja muito ortodoxa, ou, pelo menos, não sela costumeira, a solução do deferimento parcial da segurança para operar a conversão do ato impugnado. Mas ela se ajusta, como a justifica o eminente Relator, às condições do caso que Siamos examinando. E do ponto de vista da sua compatibilidade com o direito público, parece-me indiscutível que o principio tem adequação. Creio que a pova mais evidente de que ele a tem, na área do direito público, ainda que nascido nos domínios do direito privado, é o principio da fungibllidade dos recursos no direito processual, que constitui desdobramento do principio da conversão do ato jurídico. Acompanho o eminente Relator. VOTO O Sr. Ministro Thompson Flores: Senhor Presidente. Também estou de acordo com o eminente Relator, inclusive, no pertinente à forma pela qual defere o pedido. Dois aspetos impressionaram-me desde a primeira hora. É que o requerente formulou dois pedidos de exoneração. Um, ao tempo em que era ainda servidor da Sociedade de Economia Mista, forma atingida por via transacional. O outro, posterior, insistindo na primeira súplica, a qual fora trancada e não chegara ao seu destino concessionário. Neise interim ocorreu sua demissão, a qual ensejou o mandamuns. Em tais termos, quando ocorresse a acumulação proibida, ainda assim, não poderia o pedido de exoneração ser interceptado. A rigor, ortodoxamente, o mandado caberia ser concedido, para anular o ato impugnado, de exoneraçRo, e determinar o destrancamento do pedido de exoneração. Propõe, todavia, o eminente Relator, a conversão da demissão em exoneração. Ou seja, pragmaticamente, por mais breve caminho atingir o mesmo resultado. Desvinculado já o requerente da Administração, converte apenas o modus. A tal resultado chegou S. Exa. o eminente Relator, invocando o direito estrangeiro, vezes várias, fruto de inspiração de nossas decisões. Posto que ousada a tese, mas criadora do direito, alimenta-se, todavia, em fontes salutares. E o papel construtivo que predominantemente exerce o S.T.F., como o tem feito, especialmente, a Suprema Corte Americana. Folheava os autos para ver os termos do pedido formulado pelo peticionário. Leio a fls. 24. Diz: «Com fundamento no que ficou exposto, o Impetrante vem pedir se digne esse Egrégio Tribunal conceder-lhe a segurança para o fim de declarar nulo e de nenhum efeito o ato de sua demissão, dada a sua flagrante ilegalidade, com a conseqüente sustação de todo e qualquer ato dele decorrente, direta ou indiretamente, notadamente a rescisão do contrato de trabalho celebrado entre a Açorninas e o Impetrante e a restituição das importâncias por ele recebidas na vigência do mesmo contrato.» Creio que a conversão não é extra ou ultra pedia. Antes nela se contém, posto que de forma mais pragmática, fugindo à ortodoxia. R.T.J. — 100 Nestes termos, também defiro o pedido. como voto. VOTO Sr. Ministro Djaci Falcão: Sr. Presidente, nada tenho a acrescentar às brilhantes considerações aduzidas pelo eminente Relator. Todavia, tratando-se, como se trata, de mandado de segurança, com pedido, determinado e não alternativo, divirjo, na conclusão, de S. Exa. Afigura-se-me inviável a operação adotada no voto do eminente relator. Prefiro acompanhar o entendimento esposado pelos eminentes Ministros Cunha Peixoto e Cordeiro Guerra, concedendo a segurança, dada a ilegalidade do ato demissório. Concedo o writ integralmente. E o meu voto. RETIFICAÇÃO DE VOTO Sr. Ministro Soares Muãoz: Sr. Presidente, peço a palavra. Estou deveras impressionado, Sr. Presidente com o brilhante voto que acaba de proferir o eminente Ministro Leitão de Abreu e um tanto perplexo com a sua conclusão. Parece-me que a conversão proposta por S. Exa., do ato administrativo demissionário em exoneração, poderá surpreender o impetrante, que, nesta altura, já não terá mais interesse talvez, em reiterar o pedi-1 do de exoneração que fez há muito tempo, e que foi indeferido. As considerações que acabam de ser feitas pelo eminente Relator demonstram que não havia acumulação , proibida em relação àquela sociedade, que não era sociedade de economia mista, e o cargo público que o Impetrante desempenhava. A pretensão exonerativa não está no pedido e, em se tratando de man- 89 dado de segurança, parece-me que ela não poderá ser feita, por isso resolvi retificar o meu voto, para acompanhar os pronunciamentos dos eminentes Ministros Cunha Peixoto, Cordeiro Guerra, e Djaci Falcão. Concedo, pura e simplesmente, o mandado de segurança, para anular o ato demissário tal como foi pedido, em face de sua nulidade. RETIFICAÇÃO DE VOTO O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: Sr. Presidente, o debate deixa-me intranqüilo, porque o fato de eu acompanhar o eminente Relator não significa — como não me parece que importe nisso o voto de S. Exa. — que eu dê ao impetrante menor sorna de razão do que ele possU ter. Todavia, se o meu voto, acompanhando o eminente Ministro Relator, pode ser tomado como restritivo do direito do impetrante, não desejarei mantê-lo. A minha intranqüilidade leva-me a buscar outro caminho, com a devida vênia do eminente Relator. Considero que o decreto do Presidente da República, que demitiu o impetrante com a nota infamante da má-fé, é ilegal e não pode subsistir. Estaria de acordo, pela consideração pragmática de dar solução definitiva à quizila, em acompanhar, como comecei por fazê-lo, o eminente Relator, para dar a esse decreto o conteúdo de ato de exoneração desde 1/1/77. Mas isso me aflige, porque pode ser menos do que o impetrante pede; e não tenho razão para lhe reduzir o deferimento do mandado de segurança. Prefiro, pedindo licença ao eminente Relator, reconsiderar, também, o meu voto. Concedo a segurança, pura e simplesmente, para anular o decreto impugnado. 90 R.T.J. — 100 Maria de Oliveira Paredes e pelo Reqdo. o Procurador-Geral da República Dr. Firmino Ferreira Paz. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Leitão de Abreu, Cordeiro Decisão: Concedeu-se a segurança Guerra, Moreira Alves, Cunha Peinos termos do pedido, vencidos, xoto, Soares Mufloz, Dedo Miranda quanto a extensão do deferimento os e Rafael Mayer. Procurador-Geral Ministros Relator, Rafael Mayer, da República, substituto, o Dr. Gildo Dedo Miranda e Thompson Flores. Correa Ferraz. Impedido o Sr. Min. Moreira Alves. Brasília, 19 de Setembro de 1979 — Falaram.: Pelo Reqte. a Dra. Santa Alberto Veronese Aguiar, Secretário. EXTRATO DA ATA MS. 20.201 — DF — Rel.:Min. Leitão de Abreu. Reqte.: Silvio Meyer Fontenelle. ( Advs.: Roberta Maria Caruso, Paulo Seabra de Noronha e outros). Reqdo.: Senhor Presidente da República. MANDADO DE SEGURANÇA N? (Tribunal Pleno) 20.298 — DF Relator: O Sr. Ministro Firmino Paz. Impetrante: Leopoldo Konte — Autoridade coatora. Mesa do Senado Federal. — E jurisprudência tranqüila do Supremo Tribunal Federal (Súmula 270) que não cabe ação de mandado de segurança; para se discutir matéria relativa a enquadramento de funcionário público, face ao Plano de Classificação de Cargos, se há envolvimento de exame de provas ou de situação funcional complexa. — Ação de mandado de segurança não conhecida. ACOFtDA0 Vistos e relatados estes autos de Mandado de Segurança n? 20.298-0, do Distrito Federal, em que é impetrante Leopoldo Konte e autoridade coatora a Mesa do Senado Federal, decide o Supremo Tribunal Federal, em sessão plena, por maioria de votos, não conhecer do pedido, de acordo com as notas juntas. Brasília, 12 de novembro de 1981 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Firmino Paz, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Leopoldo Konte propôs a pre- sente ação de pedir mandado de segurança à Mesa do Senado Federal, ao fundamento, no essencial de que lhe fora negado o «direito líquido e certo ao enquadramento como Técnico em Comunicação Social» (grifos do original). 2 — Alegou o autor desta ação de segurança, ao longo da inicial, serlhe legitima a postulação de enquadramento no cargo de Técnico em Comunicação Social, que lhe proclamou o douto Consultor Geral do Senado Federal (fl. 2). Fora habilitado em provas de desempenho profissional de Técnico em Comunicação Social (fl. 7). Demais disso, na prova de classificação, diz ele, fora o se- R.T.J. — 100 gundo na ordem classificativa (fl. 10). Outros, porém, lhe passaram à frente ( fl. 14). Ai, em resumo, e no essencial, o que se contém na petição inicial. 3 — Informações, prestou-as o eminente Senador Jarbas Passarinho, Presidente do Senado Federal, ao encaminhar ao eminente Ministro Xavier de Albuquerque, honrado Presidente desta Suprema Corte, informações prestadas pelo douto Consultor Geral do Senado Federal, de que destaco as seguintes passagens, verbis: «Vindo, então, ao nosso exame, emitimos, sobre o pedido, o Parecer 90/77 ( doc. n? 2). Dissemos, em suma, o seguinte: que o ponto nuclear da questão estava em esclarecer se a prova de desempenho funcional, prestada pelo Requerente, a fim de habilitar-se ao enquadramento na Categoria de Técnico em Comunicação Social, teria sua validade limitada no tempo ou não; que, se a validade daquela prova persistisse, então a sua habilitação ao que pleiteia não poderia ser contestada; que, dentro do critério fixado pela Comissão Diretora, à proporção que houvesse vaga, poderia ser chamado, para ocupá-la, pela ordem, o servidor habilitado de mais tempo no Senado; que o fato de o Requerente haver prestado, no Senado, outro exame interno, e aprovado, ter sido enquadrado como Assistente Legislativo, não significava anulação da prova de desempenho a que fora anteriormente sujeito e em que logrou, também, aprovação, nem tampouco, em renúncia à expectativa de seu aproveitamento como Técnico em Comunicação Social; 91 e) sujeitando-se à seleção e enquadramento para Assistente Legislativo, isso queria dizer, somente, que, embora nessa nova posição nela ficaria apenas aguardando a oportunidade de ser posicionado na Categoria de Técnico em Comunicação Social, para a qual fora legalmente habilitado; f ) que o prazo de validade da prova de desempenho funcional (concurso interno), era de quatro anos, de acordo com o disposto na Emenda Constitucional n? 8, de 14 de abril de 1977, estando o recurso do Suplicante dentro do prazo; que, já tendo sido habilitado, em prova de desempenho, para Técnico em Comunicação Social, não caberia ao Peticionário fazê-lo novamente perante a Corege, pois a primeira prova de seleção não fora anulada, nem poderia a Corege invalidá-la, pois só a Comissão Diretora teria competência para tanto; que a tarefa da Corege não co- lidiu com a da Comissão instituída pelo Ato n? 26/1974, da Presidência do Senado; que, se o Requerente já estava habilitado, inclusive por ter sido aprovado na prova de desempenho funcional, porque e para submetêlo a outra prova de seleção; e que, dentro das normas legais aplicáveis à espécie, era legitima a postulação de Leopoldo Konte, de ser aproveitado como Técnico em Comunicação Social. Foi pedido, pelo Diretor Geral, o exame da matéria também pelo Conselho de Administração, mas não consta, do processo, o pronunciamento desse órgão, presumindose não tinha ele falado a respeito. 92 R.T.J. — 100 judicial e mandamental a «direito liquido e certo ao enquadramento como Técnico em Comunicação Social» do quadro de funcionários do Senado Federal. Enquadramento funcional previsto na Lei n? 5.645, de 10 de dezembro de 1970, em que se estabelecem diretrizes para a classificação de cargos do serviço civil da União e autarquias federais. 2 — Há decidido, iterativamente, este Colendo Supremo Tribunal Federal, o que se lê da Súmula, n? 270, verbis: «Não cabe mandado de segurança para impugnar enquadramento da Lei n? 3.780, de 12-7-60, que envolva exame de prova ou de situação funcional complexa.» Na Lei n? 3.780, de 1960, a que se alude na Súmula, •n? n 270, o enquadramento funcional ré previsto nos artigos 19 e seguintes. Ao advento da Lel n? 5.645, de 10 de dezembro de 1970, criou-se novo Plano de Classificação, extinto, às expressas (artigo 14), o Plano de Classificação de Cargos, regulado, anteriormente, na Lei n? 3.780, de 1960. 3 — Seguindo a orientação jurídica da Súmula 270, após o advento da Lei n? 5.645, de 1970, decidiu-se no Supremo Tribunal Federal, sendo Relator o eminente Ministro Xavier de Albuquerque, verbis: «Não cabe mandado de segurança para impugnar atos individuais de implantação, mediante transposição ou transformação de cargos, do novo Plano de Classificação de Cargos (Lei 5.645, de 10-12-70), quando envolva exame de prova ou de situação funcional complexa. Mandado de segurança não conhecido» (Rev. Trim. de Jurisp. do VOTO STF, 77/399). No mesmíssimo sentido, há outros O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Leopoldo Konte, o autor desta pronunciamentos desta Suprema ação de segurança, pleiteou proteção Corte, a exemplo, proferido no Man- Finalmente, indo, com outros processos, à Comissão Diretora, esta, pelo Parecer n? /81 (doc. n? 3), sob o fundamento de que «tais pedidos, contudo, contrariam frontalmente as normas que regem a aplicação, nesta Casa, dos Institutos da Progressão e Ascenção Funcionais», e «que o exame de cada um desses pedidos por parte da Comissão Diretora, em separado, é desaconselhado, pois além de desprovidos de amparo legal, o atendimento de qualquer um desses, converter-se-ia em gritante injustiça para com os demais servidores da Casa», decidiu arquivar o pedido. São estas Senhor Presidente, as Informações que, dentro dos elementos disponíveis, julgamos por bem prestar a Vossa Excelência, para efeito de se instruir o Mandado de Segurança n? 20.298-0, conforme solicitação do Excelentíssimo Senhor Presidente do Supremo Tribunal Federal» (fls. 164/166). Consta das informações, ao cabo de contas, que o deferimento do pleiteado pelo autor desta ação de segurança, sobre desprovido de «amparo legal,» «converter-se-ia em gritante injustiça para com os demais servidores da Casa», donde o arquivamento do pedido. 4 — Ouvida, a douta Procuradoria-Geral da República se manifestou pela improcedência da ação de segurança, especialmente, à consideração do previsto na Súmula n? 270, deste Colendo Supremo Tribunal Federal (fls. 185/187). E o relatório. R.T.J. — 100 dado de Segurança n? 20.063, do Distrito Federal, de que fora Relator o eminente Ministro Antonio Neder (Rev. Trim. de Jurisp., 78/89). 4 — No caso dos autos, que se lê na petição inicial, pretende o autor da impetração que, por via de mandado de segurança, se lhe «reconheça de imediato, o direito à designação» ao enquadramento seu na categoria funcional de Técnico em Comunicação Social. 5 — Q autor, em suma, impugna o enquadramento funcional de outros funcionários. Julga ter sido bem classificado em concurso. Reclama de critério de enquadramento funcional adotado pelo Senado Federal Discute, em suma, matéria de facto, para concluir por violação de direito subjectivo certo e liquido. 6 — Diante do exposto, não conheço da ação de segurança. E o meu voto. 93 VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Néri da, Silveira: Leopoldo Konte submeteu-se a prova de desempenho funcional, realizada em 19-9-1974, para enquadramento na Categoria Funcional de Técnico em Comunicação Social, do Grupo Outras Atividades de Nível Superior, do Quadro Permanente do Senado Federal, de conformidade com a Resolução n? 45, de 1973, da referida Casa Legislativa, editada com vistas à implantação da Lei n? 5.645, de 1012-1970, dispondo o art. 5? da Resolução, verbis: «Art. 5?. Os cargos ocupados serão transformados ou transpostos mediante inclusão dos respectivos ocupantes nas correspondentes Categorias Funcionais, do maior para o menor nível, nos limites da lotação estabelecido para cada área de especialidade por ordem rigorosa de classificação dos habilitados no processo seletivo a que se refere o EXTRATO DA ATA art. 7? desta Resolução.» Alega o impetrante que, não obsMS-20.298 — DF — Rel.: Min. Firmino Paz. Impte.: Leopoldo Konte. tante obter o 2t lugar no processo se(Advs.: Alberto Francisco Torres e letivo para inclusão na Categoria outro). Autoridade Coatora.: Mesa Funcional de Técnico em Comunicação Social, velo a ser preterido por do Senado Federal servidores, para uma das Decisão: Pediu vista o Ministro outros trinta e vagas que constiNéri da Silveira, após o voto do Re- tuíram a cinco lotação ideal da mencionalator, não conhecendo do pedido. Fa- da Categoria Funcional, lou pelo Impte. o Dr. Alberto Fran- cinqüenta e dois candidatoshavendo aprovacisco Torres. dos na seleção. Presidência do Senhor Ministro Consoante esclarece o requerente, Xavier de Albuquerque. Presentes sessão os Senhores Ministros Djaci na inicial, foi admitido, no Senado Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira Federal, como Redator, CLT, em 13Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufloz, 8-1974 (fls. 15), o que está conformaDecio Miranda, Rafael Mayer, Cló- do às fls. 77. vis Ramalhete, Firmino Paz e Néri Relativamente à alegado preterida Silveira. Procurador-Geral da Re- ção, fato que me fez ter dúvida a pública, Dr. Inocêncio Mártires Coe- propósito da impetração e do voto inlho. deferitório do eminente Relator é de Brasília, 11 de novembro de 1981 — registrar que nenhuma prova enconJonas Célio Monteiro Coelho, Secre- trei no exame dos autos, abonatória da assertiva vestibular. O que se tário. 94 R.T.J. — 100 afirma nos autos, nos diversos pronunciamentos da Secretaria do Senado Federal, é ter sido adotada como critério seletivo a antiguidade dos concorrentes, o que vedado não se fazia, segundo a sistemática do Plano de Classificação de Cargos. Nesse sentido, de resto, o parecer do Dr. Consultor-Geral do Senado Federal invocado pelo impetrante, conclui, verbis ((is. 120): «Não se cuida, é bom salientar, de um direito a que a Comissão Diretora tenha de curvar-se. Mesmo se se tratasse de concurso público, o Senado não estaria obrigado a nomear o servidor para o cargo pretendido. O que a Alta Direção da Casa não poderia fazer seria enquadrar como Técnico em Comunicação Social outro servidor, que tivesse feito a mesma prova do Requerente, desde que esse fosse mais antigo da Casa.» Foi admitido, nos autos, que o impetrante poderia ser atendido em sua súplica, se assim houvesse por bem a Comissão Diretora, desde que existisse vaga, uma vez respeitados os critérios fixados no Ato n? 26/74 ((is. 120). Não se trata, portanto, de direito líquido e certo a ser garantido, na via eleita. Ademais disso, não encontrei prova de o requerente, de fato, mesmo na prova de habilitação, haver excedido aos demais enquadrados com prioridade. Superado, assim, este aspecto fundamental do pedido, penso que a situação real do peticionário no Quadro Permanente do Senado Federal está corretamente descrita, na Informação de fls. 132, verbis: «Dos assentamentos funcionais do requerente consta que sua admissão nesta Casa se deu no dia 13 de agosto de 1974, para exercer o emprego de Redator, sujeito, as- sim, ao regime jurídico da Consolidação das Leis do Trabalho, conforme autorização da Presidência do Senado Federal Em 1? da junho de 1976, com a aprovação do Quadro de Pessoal CLT desta Casa, verificada com a publicação do Ato n? 8, de 1976, da Comissão Diretora, no DCN II de 1? de julho de 1976, teve o seu emprego de Redator incluído no Plano de Classificação de Cargos instituído pela Lei n? 5.645, de 1970, na Categoria Funcional de Assistente Legislativo, Classe «A». Por último, de conformidade com o Ato n? 33, de 1976, da Comissão Diretora, publicado no DCN II de 06 de dezembro de 1976, teve o seu emprego transformado em cargo do Quadro Permanente, na mesma Classe e Categoria Funcional que já pertencia.» Dessa maneira, havendo o emprego de Redator do impetrante sido transformado em emprego e, depois, em cargo do Quadro Permanente, sua movimentação, de uma Categoria a outra, ou de um grupo a outro, dependerá do atendimento às regras do concurso público ou da ascensão ou progressão funcionais. Essa será a solução possível, segundo o sistema em vigor, aplicável no Senado Federal, com base nas Diretrizes da Lei n? 5.645, de 1970. Verifica-se, de outra parte, que, não havendo sido de caráter classificatório a prova de desempenho funcional, mas apenas de verificação de requisitos básicos para o exercício do cargo de Técnico em Comunicação Social, ou de habilitação às funções, a 1! Secretaria da Mesa Diretora, tendo em conta que 52 eram os candidatos habilitados e apenas 35 as vagas, segundo a lotação ideal estabelecida previamente, conforme o art. 6?, I, da Lei n? 5.645/1970, decidiu fixar, como critério de classificação, a data de admissão dos contratados, no Senado Federal. Assim, te- R.T.J. — 100 95 riam preferência para o enquadraVOTO mento aqueles que possuíssem o Sr. Ministro Clovis Ramalhete: maior tempo de serviço nessa Casa Senhor Presidente, não acompanho Legislativa. No particular, em reali- os votos dos eminentes Ministros Redade, nenhum dos enquadrados pos- lator e Néri da Silveira. Concedo a suía menor antiguidade no Senado ordem. Federal que o impetrante ( fls. 141). Foi pela Mesa do Senado mandado Penso que esse critério, se even- realizar um concurso arrematado tualmente não seria de considerar-se por concurso de seleção. A Resoluo melhor, não infringiu a Lel n? ção n? 45, do Senado Federal é clara. 5.645/1970, que deixou á Administra- Determinou a criação de uma Banca ção fixar os critérios de seleção. Examinadora. Incumbiu-a de ministrar as aulas e de proceder ao critéEm 1976, o impetrante veio a ser rio seletivo para habilitação, em proaprovado no concurso interno para vas de desempenho funcional. E Assistente Legislativo, integrando- mais, estatuiu que os cargos transse, assim no Plano de Classificação formados ou transpostos deverão ser de Cargos, na Categoria Funcional ocupados mediante ordem rigorosa de Assistente Legislativo, Classe «A» de classificação dos habilitados no (fls. 91/93 e 98). processo seletivo. Nem era necessário dizê-lo, porque concurso é feito No exame do pedido inicial, cum- para estabelecer a ordem de colocapre observar, desde logo, que as pro- ção e de habilitação para fins de novas de desempenho funcional, com- meação. petitório interno, para a aplicação do Plano de Classificação de Cargos, ut Não há direito liquido e certo de Lei n? 5.645 de 1970, têm, em concursado, a ser nomeado, é certo. principio, validade restrita por sua A administração, quando abre conprópria natureza, até o primeiro curso, não se vincula à obrigação de preenchimento dos cargos que com- nomear. Vincula-se, porém, a nopõem a lotação ideal da Categoria mear guardando a ordem da classifiFuncional correspondente. Após, os cação. Não pode preterir ninguém. O claros surgidos preenchem-se por Senado passou, no entanto, a noconcurso _público, ascensão ou proDentre os 52 habilitados para gressão funcionais, conforme discipli- mear. as 35 vagas, continua o impetrante na estabelecida' Essa a dinãmica do sem estar nomeado, não obstante sistema implantado pela Lei n? sua colocação em segundo lugar, 5.645/1970. conforme consta da petição inicial e Na hipótese, mesmo se se admitis- constar o fato em vários documentos se a aplicação dos princípios gerais, no processo. quanto a concursos públicos, não poSr. Ministro Néri da Silveira: deria a validade da prova de desempenho funcional prestada pelo impe- Não há prova disso nos autos. trante ultrapassar o prazo de quatro Sr. Ministro Clovis Ramalhete: anos, de acordo com o disposto no art. 97, 3?, da Constituição, na re- Tem razão, talvez, V. Exa. em dizer dação introduzida pela Emenda que não há prova. Mas, qual a prova que falta? Seria o caso de vir, na inConstitucional n? 8, de 14-4-1977. formação, a listagem com a classifiDo exposto, não conheço do pedi- cação. Mas a informação silencia e do. nem nega. 96 R.T.J. — 100 O Sr. Ministro Néri da Silveira: Não houve classificação. A prova é Meramente de habilitação. Dentre todos os que estão classificados, na área de recrutamento, verificam-se os que têm condições para o exercício do cargo. Depois, dentre todos os que têm condições para o exercício do cargo, é feita a classificação, de acordo com critério adotado. Este, no caso, foi o da antigüidade no Senado Federal. Dentre os que tinham habilitação, foram aproveitados os primeiros contratados. Realmente, conforme verifiquei, isso ocorreu. O impetrante entrou para o Senado Federal no dia 14 de agosto de 1974 e não há nenhum, dentre os constantes da relação, que tenha entrado depois dessa data em que o impetrante ingressou. Se tivesse verificado o contrário, reconheceria a preterição, porque teria sido quebrado o critério que á Administração é licito estabelecer. A implantação do Plano de .Classificação de Cargos deferiu à administração estabelecer critério de classificação do pessoal, particularmente do pessoal CLT. Assim, essa prova não é classificatória. É meramente de habilitação, de verificação de condições básicas. O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: Ouvi o voto de V. Exa. com proveito, para meu enriquecimento pessoal, mas não para elucidação do voto que profiro. Porque o que leio nos autos é que ficou estabelecido, no art. n? 7 da Resolução, que haveria uma ordem rigorosa de classificação dos habilitados no processo seletivo. Portanto, houve classificação. Habilitado foi o impetrante, mas lhe está sendo negado o direito de verificar, em que posição ficou nesta classificação. E como lhe está sendo negado? Com certo desconforto e espanto, encontro, às fls. 43 e 48, a informação da Diretora da Subsecreta- ria do Pessoal. Nela, está asseverado que esta servidora não possui elementos quanto à realização do concurso. Isto é de espantar, depois de haver uma resolução do Senado, no sentido de que se fizesse um curso de formação, para poder haver transposições ou transformações de cargos, e outra Resolução estabelecendo que, ao cabo disso, seria feita rigorosa classificação dos concursados. Parece-me que a informação, que declara não possuir elementos, quanto à realização desse concurso, está acrescentando algo à negativa de direito ao impetrante. Fundado numa Resolução que determinou esse curso, no qual foi classificado em segundo lugar, o Impetrante alega preterição de seu direito à nomeação A informação está comunicando os fatos, para conhecimento deste Supremo Tribunal Federal. O que me causa espanto, dado os termos da própria Resolução, é que não haja apontamentos a respeito de curso e do concurso. Encontro por isso lesado o direito liquido e certo do impetrante. Ele não terá o direito de ser nomeado, se ninguém o foi. A administração, quando abre concurso, não se vincula à obrigação de nomear. Mas, se passou a nomear, como provado, e se no caso trata-se de transformação de cargo ou transposição, que o concurso dava oportunidade... O Sr. Ministro Néri da Silveira: Foi um mero teste de capacidade. Adotou-se o critério de aproveitar nas vagas os habilitados nesse teste de capacidade, por ordem de ingresso no Senado Federal Todos ingressaram no Senado, por aprovação da Presidência. Então, foi adotado esse critério, levando em conta a antiguidade de todos os que estão dentro dessa área de recrutamento e tenham feito teste com resultado satis- R.T.J. — 100 fatório. O número atingiu a 52. Foi o que aconteceu em todas as repartições, também nos tribunais, com a implantação do Plano de Classificação de Cargos. Sr. Ministro Clovis Ramalhete: A intervenção do eminente Ministro Néri da Silveira, como sempre, honra o meu voto. Entendo, entretanto, em contrário, que houve classificação, porque a resolução estabeleceu que deveria haver rigorosa ordem de classificação dos habilitados. Por este motivo, concedo a ordem. VOTO Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Presidente, seguindo a orientação da Jurisprudência desta Corte, que se firmou, inclusive, numa súmula, em relação ao enquadramento, multo mais simples e sumário do que estes que se fazem mediante implantação e transposição no Plano de Classificação de Cargos ora em vigor, e á vista da Lei n? 3.780, acompanho o voto do eminente Ministro Relator, indeferindo a ordem 97 que temos sob exame, o critério, que se instituiu, fora o da antiguidade daqueles que viessem a ser habilitados. Se o impetrante não logrou ser enquadrado, isto se verificou porque, embora primariamente habilitado, seu grau de antiguidade não o favorecia. Não conheço do mandado. VOTO (PRELIMINAR) Sr. Ministro Soares Mulloz: Sr. Presidente, data venha do voto do eminente Ministro Clovis Ramalhete, acompanho o eminente Relator para negar apenas o direito líquido e certo do impetrante, visto que falta, nos autos, a comprovação da alegada preterição que ele teria sofrido no concurso a que se submeteu. Não conheço do mandado, mas ressalvo ao impetrante a via ordinária. EXPLICAÇÃO Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Sr Presidente, como Relator, não conheci do mandado de seguranVOTO (PRELIMINAR) ça, exatamente porque não encontrei Sr. Ministro Decio Miranda: Sr. demonstrada, nos autos, a prova da Presidente, também acompanho o existência do alegado direito líquido voto do Sr. Ministro Néri da Silveira, e certo. Também, tive de levar em com a vênia devida ao Sr. Ministro consideração a jurisprudência pacifica, sumulada, do Supremo Tribunal Clovis Ramalhete. Federal — Súmula 270 —, segundo a O que se alega tratar-se de concur- qual: so foi, na verdade, apenas — como «Não cabe mandado de seguranse deu de modo geral na implantaça para impugnar enquadramento ção do último Plano de Classificação da Lei n? 3.780, de 12-07-60, que ende Cargos — uma prova de habilitavolva exame de prova ou de situação, quer dizer, verificou-se quem tição funcional complexa.» nha a habilitação mínima para ingressar num determinado nível funApós essa sumulação, em outros cional. E habilitação básica, não um acórdãos, o Supremo Tribunal, — concurso. Realizada esta fase de ha- em que V. Exa., Sr. Presidente foi bilitação, o segundo passo era a ob- dos maiores propugnadores — entenservância de critérios, que os diri- deu que, em se tratando de enquagentes das repartições ficaram auto- dramento funcional, tudo é matéria rizados a estabelecer em atos nor- complexa que depende da existência mativos, para a segunda fase da de prova da produção de provas, e operação classificatória. No caso essa matéria só pode ser discutida 98 R.T.J. — 100 4 pelas leis ordinárias. O facto de uma EXTRATO DA ATA Resolução declarar que a classificaMS-20.298 — DF — Rel.: Min. Flrção deve ser rigorosamente obedecida, feita a classificação rigorosa, dal mino Paz. Impte.: Leopoldo Konte. não nasce direito subjetivo de nin- (Advs.: Alberto Francisco Torres e guém. Todos sabemos que o direito outro). Autoridade Coatora: Mesa do subjetivo, efeito jurídico, nasce de Senado Federal. facto jurídico previsto em lei; não, Decisão: Não se conheçeu da impeem Resolução administrativa. A Re- tração, vencidos os Ministros Clovis solução não tem força de Incidir, pa- Ramalhete e Cunha Peixoto, que dera produzir efeito jurídico. Emanada la conheceram e deferiram a segude autoridade inferior, na ordem rança. Ausente, ocasionalmente, o constitucional, não pode, absoluta- Ministro Moreira Alves. mente, estabelecer regra que inciPresidência do Senhor Ministro dindo, dê lugar ao nascimento de di- Xavier de Albuquerque. Presentes à reito subjetivo. O nascimento de di- Sessão os Senhores Ministros Djaci reito subjetivo, público ou privado, é Falcão, Moreira Alves, Cunha Peixode ser previsto em lei federal. Data to Soares Mufloz, Decio Miranda, venha, a Resolução não incide, para Rafael Mayer, Firmino Paz, Clovis gerar direito subjetivo de ninguém. Ramalhete e Néri da Silveira. AuAssim, não vejo, absolutamente, sente, justificadamente, o Ministro no caso, a prova evidente da existên- Cordeiro Guerra. Procurador-Geral cia de direito subjetivo. E não conhe- da República, Dr. Inocêncio Mártici da ação de mandado de seguran- res Coelho. ça, por Inexistência de direito subjeBrasília, 12 de novembro de 1981 — tivo certo e líquido. Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretário. Obrigado. HABEAS COFtPUS N? 57.409 — FtJ (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Paciente: Antônio Marcelo Braga Coelho — Coator: Tribunal de Justiça do Estado. Habeas Corpus — Citação-edital — Erro de data na convocação do citando para se ver processar e interrogar, constante da publicação do edital — Inexistência de retificação — Nulidade da citação editalicia. Pedido de habeas corpus deferido. ACÓRDÃO Brasília, 27 de novembro de 1979 — Thompson Flores — Presidente — Cunha Peixoto — Relator. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal RELATÓRIO Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráfI- O Sr. Ministro Cunha Peixoto: — O cas, por unanimidade de votos, em parecer da Procuradoria-Geral da deferir o pedido de habeas corpus. República, subscrito pelo Dr. Aristi- R.T.J. — 100 99 des Junqueira Alvarenga (fls. 28-29), julho de 1973, às 13 horas, para o ato que esclarece a matéria sub judice, de interrogatório. é do seguinte teor: Entretanto, esse edital, que foi pu«1. Antônio Marcelo Braga Coe- blicado no Diário Oficial do Estado lho, em seu próprio favor, impetra de 5-7-73 (fl. 4), convocou o paciente ordem de habeas corpus, contra o para comparecer no Forum, para Tribunal de Justiça do Estado do ciência da acusação é se ver interroRio de Janeiro, que, por sua 3? Câ- gar, no dia 24 de julho de 1972. mara Criminal, condenou-o a cinco Por outro lado, conforme informa anos e quatro meses de reclusão e o nobre Presidente do Tribunal indimulta de Cri 15,00, além de um gitado coator, às fls. 10-11, não foi ano de medida de segurança deten- feita a retificação da data publicada tiva, ao dar provimento ao apelo com erro, seja quanto ao dia, quer do Ministério Público, contra a quanto ao ano designados para comsentença absolutória, do MM. Juiz parecimento do citando. da 22? Vara Criminal da Comarca Este fato, aliado ainda à não fixado Rio de Janeiro. ção do edital no local, de costume, Nulidade da citação por edital é no Forum, invalida a citação edio único fundamento do pedido for- talícia. mulado pelo réu revel (fls. 2). Neste sentido já decidiu esta egré2 — As informações de fls. 10-11, gia Primeira Turma, no julgamento do ilustre Desembargador Carlos do HC n? 56.895-DF, de que foi relaLuiz Bandeira Stampa, bem como tor o eminente Ministro Rafael Maos documentos que as instruem, re- yer (Sessão de 24-4-79). velam que o edital de citação do Por estes motivos, de acordo com paciente fixava a data de 25 de julho de 1973 para o interrogatório o parecer da douta Procuradoria(fls. 17). Contudo, na publicação no Geral, defiro o writ para decretar, Diário Oficial constou, erronea- em relação ao paciente-impetrante, mente, a data de 24 de julho de a nulidade do processo, a partir da 1972 (fls. 18) sem que houvesse citação por edital, inclusive. correção posterior. EXTRATO DA ATA Se não bastasse a imprecisão da data estampada na publicação, 1:1C — 57.409 — RJ — Rel.: Min. inexistiu certidão de afixação do Cunha Peixoto. Pte. e Impte.: Antôedital na porta do edificio, onde nio Marcelo Braga Coelho. Coator: funciona o Juízo, tornando inválida Tribunal de Justiça do Estado. a citação, consoante reiterada juDecisão: Deferiram o pedido, nos risprudência desse Excelso Tributermos do voto do Ministro-Relator, nal. 3 — Pelo exposto, somos pelo de- decisão unânime. Presidência do Sr. Ministro ferimento do writ. Thompson Flores. Presentes à SesE o relatório. são, os Senhores Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares VOTO Mufioz e Rafael Mayer. Subprocurador-Geral da República, o Dr. FranO Sr. Ministro Cunha Peixoto (Re- cisco de Assis Toledo. lator): — O edital de citação do Brasília, 27 de novembro de 1979 — paciente-impetrante, cuja cópia se Antônio Carlos de Azevedo Braga — encontra à fl. 17, fixava o dia 25 de Secretário. R.T.J. — 100 RECURSO DE HABEAS COFtPUS N? 57.502 — (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Recorrente: José Bonifácio Libânio Mathias — Recorrido: I Tribunal de Alçada do Estado. Habeas Corpus — Lei Orgânica da Magistratura Nacional — Competência dos Tribunais de Justiça e de Alçada. Não tendo ainda o Estado-membro procedido à adaptação de sua organização judiciária, no período de seis meses referido no art. 139 da Lel Orgânica da Magistratura Nacional permanece a competência residual dos Tribunals'cle Alçada, conforme precedente do S.T.F.. Recurso de habeas corpus provido para determinar que o habeas corpus seja julgado,pelo Tribunal de Alçada. ACORDA° 2 — O I Tribunal de Alçada, entretanto, por sua Segunda Câmara CriVistos, relatados e discutidos estes minal, não conheceu do writ por enautos, acordam os Ministros da Pri- tender que, meira Turma do Supremo Tribunal «... trata-se, na hipótese, de criFederal, na conformidade da ata do me punido com reclusão, cuja julgamento e das notas taquigráficompetência, em face do disposto cas, por unanimidade de votos, em nos arts. 108 n? III, 139 2? e 146 da dar provimento ao recurso de Lei 035-79, passou a ser do Egrégio habeas corpus. Tribunal de Justiça, competência Brasília, 16 de novembro de 1979 — esta ratione materiae, a que não ThomPson Flores — Presidente — pode, por isso, furtar-se de aplicar Cunha Peixoto — Relator. o Juizo» (Acórdão de fl. 17). 3 — Recorre o paciente, postulando RELATOR IO seja determinado ao Tribunal a quo, O Sr. Ministro Cunha Peixoto — 1 que conheça e julgue o pedido de — A favor de José Bonifácio Libânio habeas corpus, já que «deu-se, no caMathias, condenado a dois anos de so presente, a exclusão de apreciareclusão como incurso nas penas do ção judicial de uma lesão de direito art. 155, 4?, II. do Código Penal, individual (§ 4?, art. 153 da Constituiimpetrou-se perante o Tribunal de ção Federal), sendo certo ainda de Justiça do Estado do Rio de Janeiro que não se estabelece conflito de jurisdição entre Tribunais de Justiça e ordem de habeas corpus. Alçada do mesmo Estado, face à O Vice-Presidente do referido Tri- de hierarquia que o relaciona» ( fl. 21). bunal, entretanto, determinou a remessa dos autos ao Primeiro Tribu4 — A Procuradoria-Geral da Renal de Alçada, «nos termos do art. pública, em parecer subscrito pelo 250, do 1? c/c o art. 67, do Código Dr. Aristides Junqueira Alvarenga de Organização e Divisão Judiciá- ( fls. 27-28), manifesta-se pelo conherias (Resolução n? 1 de 21 de março cimento e provimento do recurso, a de 1975) e Provimento n? 5/79 do fim de que o I Tribunal de Alçada do Conselho da Magistratura de 16 de Estado do Rio de Janeiro conheça do pedido de habeas corpus, vez que esmaio de 1979». R.T.J. — 100 se colendo Supremo Tribunal, em Sessão Plenária de 10-10-79, decidiu uniformemente pela competência residual do Tribunal de Alçada ao julgar, em caso idêntico, o HC 57.377 (D.J.U. de 17-10-79, p. 7.729). E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator) — O acórdão proferido no precedente citado no parecer da Procuradoria-Geral da República, relatado pelo eminente Ministro Soares Muhoz, está assim ementado: «Ementa: Lei Orgânica da Magistratura. A competência, por ela estabelecida, para os Tribunais de Justiça e de Alçada, somente entrará em vigor urna vez findo o' prazo de seis meses fixado no art. 139, se antes o Estado não houver procedido á adaptação de sua organização judiciária. Habeas Corpus concedido para determinar que os anteriores habeas corpus sejam julgados pelo Primeiro Tribunal de Alçada.» 101 Tratando-se de matéria idêntica, dou provimento ao recurso para determinar que o I Tribunal de Alçada do Estado conheça do pedido de habeas corpus e o julgue como entender de direito. EXTRATO DA ATA RHC — 57.502 — RJ — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: José Bonifácio Libânio Mathias. (Adv.: Nilo Batista). Recdo.: Tribunal de Alçada do Estado. Decisão: Deu-se provimento ao recurso de Habeas Corpus, decisão unânime. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes á Sessão os Senhores Ministros )(avier de Albuquerque, Cunha Peixoto Soares Muiloz e Rafael Mayer. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 16 de novembro de 1979 — António Carlos de Azevedo Braga — Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.090 — RS (Primeira Turma) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Soares Mufioz. Recorrente: Laurindo Fortuna — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Prisão do devedor de alimentos. Verba fixada provisoriamente nos autos de ação revisional. Admissibilidade dessa fixação e legalidade da prisão exarada por motivo do não pagamento dos alimentos provisórios. Habeas Corpus indeferido. Recurso desprovido. ACORDAO Vistos, Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, por maioria de votos, e na conformidade das notas taquigráficas, negar provimento ao recurso. Brasília, 02 de setembro de 1980 — Thompson Flores, Presidente — Soares Mufloz, Relator para o acórdão. RELATÓRIO O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Adoto como relatório, por esclarecer 102 R.T.J. — 100 com propriedade a espécie, o parecer da Procuradoria-Geral da República, subscrito pelo Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa e aprovado pelo Professor Francisco de Assis Toledo, Subprocurador-Geral, Ui-verbis: «1 — Cuida-se de pedido de habeas corpus — ora em grau de recurso — formulado contra ordem de prisão exarada por motivo de inadimplência concernente ao pagamento de alimentos — fixados de plano e em caráter provisório — nos autos de ação revisional. 2 — Alega o impetrante ser ilegal o constrangimento, porque, a seu ver, a ação revisória de alimentos não comporta a elevação, de plano, da verba alimentar anteriormente em vigor. 3 — O writ foi indeferido pelo aresto de fls. 46-50, cujos fundamentos o voto do relator assim enunciou: «A Lei 6.014 de 1973, adaptando a Lei 5.478 ao Código de Processo emprestou ao art. 773 maior elastério, incluindo a prisão civil nele cominada quer se cuide de pagamentos de alimentos provisórios, quer de verba fixada 'definitivamente. Parecem óbvios os motivos: a perda da liberdade tem cabimento tendo em linha de conta a natureza da obrigação e a necessidade social de cobrar o devedor recalcitrante. Certo o caso é de revisão. Mas o art. 13 da Lel n? 5.478-68 que manda aplicar o diploma no que couber às ações ordinárias de separação, nulidade, relação de casamento, revisão de pedidos alimentares e respectivas execuções ampara o ato do juiz é claro. No caso dos autos o juiz restabeleceu pensão• em dois salários mínimos regionais por mês de acordo com fixação condizente e com as necessidades de sustento e criação das filhas. A requerente reclamou falta de condições para prover o próprio sustento e de filhas estudantes com Cr$ 450,00 mensais. Como se lê a fls. 31 ao devedor impendia saldar as pensões em débito ou comprovar a impossibilidade. Em vez disso passou a impugnar a carta precatória. Como se vê, tática protelatória e com ela vem prejudicando a mulher e a prole. Assim sendo revogo a liminar e denego a ordem pois reputo legítima, fundada e legal a prisão do paciente. Lembro o despacho do juiz: «Cumpre ao devedor pagar as prestações alimentícias em débito, ao em vez de pretender impugnar a carta precatória ou alegar e provar a sua impossibilidade. Em conseqüência do pedido pelo credor, bem como do solicitado pelo Ministério Público, decreto a prisão do réu por 45 dias.» O devedor, portanto, não aduziu razões demonstrativas da impossibilidade do pagamento, nem toca nele. Alega questões de índole meramente processual relacionadas com a precatória. E técnica utilizada erroneamente. Trata-se de alimentos desatendidos. A prisão é permitida e inteiramente legal.» 4 — Daí, o apelo de fls. 52-53, que reitera as alegações inicialmente deduzidas pelo impetrante. 5 — Não merece acolhimento, todavia, a irresignação em causa. 6 — O art. 4? da Lei n? 5.478, de 25/07/68 dispõe que, ao despachar R.T.J. — 100 o pedido inicial na ação de alimentos, o Juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita. 7 — O art. 13 da mencionada lei, por seu turno, estabelece que o nela disposto se aplica, no que couber, à revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos. 8 — Cabível, dessarte, em face do aludido diploma legal, a fixação de alimentos provisórios em ação de revisão. 9 — E certo que o impetrante, invocando a restrição contida em lei — «no que couber» — sustenta que existe incompatibilidade entre a fixação de alimentos provisionais e a decisão objeto do pedido de revisão. 10 — Tal incompatibilidade, entretanto, a nosso ver inexiste. A revisão dos alimentos tem como fato gerador a alteração das condições financeiras das partes; e a finalidade dela é ajustar à situação nova o quantitativo anteriormente fixado. Ora, se ao pleitear a revisão o devedor o faz porque já se. encontra modificada a situação financeira das partes, não há motivo para que persista até a decisão final, que ajustará a verba alimentícia às modificações verificadas, a cláusula de alimentos fixados anteriormente. Seria, aliás, contrário ao espirito da lei — a Exposição de Motivos lembra que «a fome não espera» — e ao objetivo dos alimentos, a pretendida inadmissibilidade do reajuste provisório dos mesmos. 11 — Sobre o tema em debate, Nelson Carneiro teve ocasião de afirmar (in «A Nova Ação de Alimentos,» 1° ed., páginas 118-119, R. de Janeiro Freitas Bastos, 1969), in verbis: 103 «A Lei n? 5.478 autoriza que seu rito seja observado, no que couber, pelas ações de revisão, que agravam, reduzem e até extinguem o encargo. Se os alimentos que se querem modificar forem tão desatualizados que reclamem correção imediata, nada obsta a que o juiz, ao despachar a inicial da ação de majoração, ou no curso dela, fixe outros, em caráter provisório.» 12 — Sem razão, portanto, o impetrante, quando afirma ser inadmissível a fixação de alimentos provisórios em ação de revisão. Pelo improvimento do recurso, face ao exposto é o parecer.» É o relatório. VOTO Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — O problema cinge-se em saber se é possível a fixação de alimentos provisionais em ação revistonal de alimentos. Juiz, apoiado pelo acórdão recorrido, é pela afirmativa, tendo fixado alimentos provisionais em ação revisional e, como o recorrente não efetuou o pagamento, decretou-lhe a prisão por quarenta e cinco dias. 2 — Os alimentos provisionais são cabíveis quando a parte que os procura não tem meios de subsistência. objetivo da lei, concedendo alimentos provisionais, antes de iniciar a lide, ou durante a sua pendência, é assegurar ao autor a subsistência. Assim, destinam-se eles à subsistência do alimentando durante a lide, bem como às despesas que tiver de fazer com esta. 3 — A hipótese não se ajusta à revisão das sentenças proferidas em pedidos de alimentos, pois aqui a subsistência do requerente já está assegurada com os alimentos fixados na ação. 104 R.T.J. - 100 E nem se diga que prevalece o espírito da lei, quando, ponderadas as circunstâncias do caso concreto o juiz se convencer de que o valor revidendo é írrito, dada a defasagem provocada pela inflação, e quando as condições econômicas do alimentante permitem desde logo a correção, porque ninguém melhor do que o alimentando para saber se a quantia recebida é ou não suficiente para sua subsistência, e se demorou a solicitar o revisionamento, é de presumir que até aquele momento a quantia recebida lhe estava sendo bastante. Dai estar expresso, no art. 13, que a lei disciplinadora dos alimentos se aplica também «à revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos» no que couber. Ora, a índole do pedido provisional não se coaduna com o da revisão. A essência de um e outro são diferentes e, como a concessão de alimentos provisionais constitui uma exceção, pois independe de qualquer prova, ou melhor, fica ao arbítrio do juiz, não se pode aplicar aquele no caso deste, sem dispositivo expresso de lei. Se, já foi estabelecido de maneira definitiva o alimento, não se pode falar em fixação provisória Esta, aliás, é a orientação do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. O eminente Desembargador Niro Teixeira de Souza, no despacho concessivo de liminar do habeas corpus, assinalou: «Segundo a jurisprudência prevalente neste Tribunal, tem-se entendido que descabe prisão civil em decorrência de majoração provisional, els que esta também é inadmitida.» (fls. 36). 4 — Estes autos mostram o acerto da conclusão. O processo de revisionamento dos alimentos, com pedido de fixação provisória de novos, deu entrada em juizo no dia 01 de outubro de 1977, tendo o Juiz fixado os alimentos provisórios em 24-11-77 (fls. 12). Entretanto, a audiência para conciliação e prova só foi marcada para 15 de maio de 1978, tendo se realizado, nesse dia, sem a presença da autora (fls. 19). A revisão depende de prova e a autora, não se sabe o motivo, desinteressou-se do próprio andamento do processo. Ora, se não cabe a fixação de alimentos provisionais em ação de revisão, ilegal é a prisão pela falta de pagamento dos alimentos ali fixados, merecendo, pois, provimento o recurso. Dou provimento ao recurso. EXTRATO DA ATA RHC. 58.090 — RS — Rel.: Min: .Cunha Peixoto. Recte.: Laurindo Fortuna (Adv.: Eghlio Barros Costa). Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Decisão: Adiado o julgamento por haver pedido vista o Ministro Soares Mufloz, após o voto do Min. Relator, que dá provimento ao recurso. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Resek. Brasília, 26 de agosto de 1980 — Antônio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Soares Muiloz: Sr. Presidente, o eminente Ministro Cunha Peixoto, Relator, conclui o seu brilhante voto, dizendo: R.T.J. — 100 «Ora, se não cabe a fixação de alimentos provisionais em ação de revisão, ilegal é a prisão pela falta dos alimentos ali fixados, merecendo, pois, provimento o recurso.» Em sentido contrário, manifestara-se a Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do ilustre Procurador Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa, In verbis: «O art. 4? da Lei n? 5.478, de 257-68 dispõe que, ao despachar o pedido inicial na ação de alimentos, o Juiz fixará desde logo alimentos provisórios a serem pagos pelo devedor, salvo se o credor expressamente declarar que deles não necessita. O art. 13 da mencionada lei, por seu turno, estabelece que o nela disposto se aplica, no que couber, à revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos. Cabível, dessarte, em face do aludido diploma legal, a fixação de alimentos provisórios em ação de revisão. E certo que o impetrante, invocando a restrição contida em lei — «no que couber» — sustenta que existe incompatibilidade entre a fixação de alimentos provisionais e a decisão objeto do pedido de revisão. Tal incompatibilidade, entretanto, a nosso ver, inexiste. A revisão dos alimentos tem como fato gerador a alteração das condições financeiras das partes; e a finalidade dela é ajustar á situação nova o quantitativo anteriormente fixado. Ora, se ao pleitear a revisão o devedor o faz porque já se encontra modificada a situação financeira das partes, não há motivo para que persista até a decisão final, que ajustará a verba alimentícia às modificações verificadas, a cláusula de alimentos fixados anteriormen- 105 te. Seria, aliás, contrário ao espirito da lei — a Exposição de Motivos lembra que «a fome não espera» — e ao objetivo dos alimentos, a pretendida inadmissibilidade do reajuste provisório dos mesmos. Sobre o tema em dabate, Nelson Carneiro teve ocasião de afirmar (in «A Nova Ação de Alimentos», 1! ed., páginas 118-119, R. de Janeiro, Freitas Bastos, 1969), in verbis: «A Lei n? 5.478 autoriza que seu rito seja observado, no que couber, pelas ações de revisão, que agravam, reduzem e até extinguem o encargo. Se os alimentos que se querem modificar forem tão desatualizados que reclamem correção imediata, nada obsta a que o juiz, ao despachar a inicial da ação de majoração, no curso dela, fixe outros, em caráter provisório.» Sem razão, portanto, o impetrante, quando afirma ser inadmissível a fixação de alimentos provisórios em ação de revisão. Pelo improvimento do recurso, face ao exposto» (fls. 66-68). Com a vênia do eminente Ministro Cunha Peixoto, penso que é possível a fixação de alimentos provisórios na ação revisional a que a pensão, assim estabelecida, deve ser paga pelo réu, sob pena de prisão. O art. 13 da Lei n? 5.478/68 determina que «o disposto nesta Lei aplica-se igualmente, no que couber, às ações ordinárias de separação, nulidade e anulação de casamento, à revisão de sentenças proferidas em pedidos de alimentos e respectivas execuções.» A ressalva «no que couber» pressupõe a existência de incompatibilidade entre alguns dos dispositivos da lei e as ações enunciadas no art. 13. 106 R.T.J. - 100 Existiria incompatibilidade entre a concessão de alimentos provisórios e a ação revisional se a sentença, nesta proferida, tivesse eficácia ex num, vale dizer, a partir dela. Entretanto, expresso é o art. 13, § 2?, no sentido de que «em qualquer caso, os alimentos fixados retroagem à data da citação.» E esta Primeira Turma, no RE 86.064, Relator Ministro Rafael Mayer, decidiu «nas ações de revisão, os alimentos retroagem à data da citação» (Jurisprudência Brasileira, v. 31, p. 69). Ora, se nas ações de revisão, os alimentos retroagem à data da citação inicial, tudo está a recomendar que sejam fixados provisoriamente no início da demanda, para que atendam, desde logo, às necessidades atuais e inadiáveis do alimentando. Não consulta à natureza jurídica da pensão alimentar procrastinar o pagamento das prestações, vencidas no curso da lide, para a execução. Ademais, em prol da legalidade da concessão de alimentos provisórios nas ações de revisão, milita o § 1? do art. 13, verbis: «Os alimentos provisórios fixados na inicial poderão ser revistos a qualquer tempo, se houver modificação na situação financeira das partes...». Ora, se os próprios alimentos provisórios poderão ser revistos, a fim de mantê-los atualizados às necessidades do alimentando e aos recursos da pessoa obrigada, razão não há para negar-se essa atualização provisória no limiar da ação revisional, fundada na modificação da situação financeira das partes. Ante o exposto, nego provimento ao recurso, «data venia» dos votos dos eminentes Ministros Cunha Peixoto e Rafael Mayer. RECONSIDERAÇÃO DE VOTO Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Presidente, estou convencido dos argumentos trazidos pelo eminente Ministro Soares Mufioz, porque me parece que a função dos alimentos provisionais em relação às ações primitivas de alimentos se repete ou se reitera no problema das ações revisionais, porque são as necessidades imediatas que ditam os alimentos provisionais. Pode haver uma defasagem tal nos alimentos que tenham sido anteriormente deferidos que a lei possa ser interpretada no seu sentido teológico de conceder provisoriamente aquele aumento, para atender a tais necessidades. Assim, data venta do eminente Relator, reconsidero o meu voto, para ficar de acordo com o Ministro Soares Mufioz, negando provimento. VOTO Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: Também entendo ser compatível com a ação de revisão de alimentos a fixação, nela, de alimentos provisionais; sendo compatível, não há constrangimento ilegal a ser reparado na hipótese. Data vénia do eminente Relator, acompanho o voto do Sr. Ministro Soares Mufioz, negando provimento ao recurso. VOTO Sr. Ministro Thompson Flores (Presidente): Peço vênia ao eminente Relator para -acompanhar o voto do eminente Ministro Soares Mtuloz, harmônico com o parecer da douta Procuradoria-Geral da República. Nego, assim, provimento ao recurso. R.T.J. — 100 EXTRATO DA ATA RHC. 58.090 — RS — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: Laurindo Fortuna (Adv.: Egídio Barros Costa). Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul. Decisão: Negado provimento, vencido o Ministro Cunha Peixoto (Relator). 107 Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Resek. Brasília, 02 de setembro de 1980 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. HABEAS CORPUS N? 58.134 — PR (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Paciente e Impetrante: Hélio Queiroz Barboza ou Hélio Queiroz Barbosa — Coator: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná. Inidoneidade da revisão criminal para apreciar, no caso, aleijano de extinção da punibilidade, pela prescrição. Indeferimento do pedido de habeas corpus. Envio dos autos ao Tribunal dà Alçada, para que aprecie, pelo mérito, a alegação de prescrição, desde que o S.T.F. não tem competência originária para o seu julgamento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, indeferir o pedido, remetendose os autos ao Tribunal do Paraná. Brasília, 05 de setembro de 1980. — Djaci Falcão, Presidente e Relator RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão: Hélio Queiroz Barboza impetra habeas corpus em seu próprio benefício, alegando, em resumo, que foi condenado ao cumprimento da pena de quatro (4) anos de reclusão, como incurso no art. 171, caput, c/c o art. 51, § 2?, do Código Penal; que a pena foi reduzida para dois (2) anos; que pleiteou em revisão criminal a extinção da punibilidade, pela prescrição da pretensão executória, deixando de ser conhecido o pedido por ser inviável mediante revisão. Espera, em conclusão, que seja deferida a ordem com a decretação da extinção da punibilidade. O pedido vem instruído com os documentos de fls. 9 a 48. Após as informações de fls. 51, a Procuradoria-Geral da República emitiu o seguinte parecer: «1 — Hélio Queiroz Barbosa, em benefício próprio, ajuíza pedido de habeas corpus, inconformado com a decisão do Grupo de Câmaras Criminais do Tribunal de Alçada do Paraná, que não conheceu de pedido revisional, por ele manifestado, com o intuito de ver reconhecida a prescrição da pretensão executória de pena recebida. 108 R.T.J. — 100 2 — Disse, a propósito, o ilustre Juiz Mattos Guedes, relator da matéria, verbis: Não se pode conhecer do pedido. Como se vê dos itens do artigo 621, do Código de Processo Penal, o pretendido reconhecimento da prescrição não se encaixa em nenhum deles, e não é possível que se alargue tanto o instituto de revisão criminal, para permitir a discussão a respeito da extinção da punibilidade, matéria privativa, nesta altura do processo, do habeas corpus, como demonstra o artigo 647, item VII, do mesmo livro penal. Não ocorre qualquer dúvida a este respeito. A se admitir tal, data venta, seria desvirtuar a revisão criminal'. (vide: fls. 57). 3 — Incensurável esta colocação. 4 — Não está normativamente autorizada, a discussão em sede de revisão criminal sobre o tema prescricional. 5 — E foi unicamente isso o declarado no julgado analisado, dai porque improcedente é o inconformismo do impetrante, nesta perspectiva, e incabível é o conhecimento, pela Suprema Corte, da alegaria realidade prescricional, que não foi debatida na instância colegiada, para onde devem tornar os presentes autos à apreciação do tópico. 6 — Concluímos, pois, o parecer no sentido do indeferimento do argumento que quer validar o pedido revisional ao reconhecimento da prescrição, com a devolução dos autos à instância colegiada a quo à apreciação da alegada prescrição, porque sobre isto não enunciara Juizo de Mérito. Brasília, 29 de agosto de 1980 — Cláudio Lemos Fonteies, Procurador da República Aprovo: José Francisco Rezek, Subprocurador-Geral da República» ( fls. 61 a 63). VOTO O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator): Parece-me correto o entendimento sufragado no acórdão que apreciando o pedido de revisão criminal, dele não conheceu, por não se enquadrar em nenhum dos incisos do art. 621 do C.P. Penal. Com efeito, não se cogita de «sentença condenatória contrária ao texto expresso da lei penal ou à evidência dos autos;" nem de sentença baseada «em depoimentos, exames ou documentos comprovadamente falsos.» e nem tampouco, de novas provas conducentes à inocência do condenado, ou «de circunstância que determine ou autorize diminuição especial da pena.» Nas circustâncias do caso é inidôneo o pedido de revisão criminal. Vale ponderar que não se aponta uma decisão condenatória que se contraponha, de modo evidente, a preceito legal. O remédio adequado ao caso, por sinal mais célere, é o habeas corpus. Aliás, conforme dispõe o art. 648: «A coação considerar-se-á ilegal: VII — quando extinta a punkt:intdade.» Finalmente, considerando que o Tribunal de Alçada não teve ensejo de apreciar o tema da prescrição, no seu mérito, resta o indeferimento do writ, com a remessa dos autos ao mencionado Tribunal para que sobre ele se manifeste. E o meu voto. R.T.J. — 100 EXTRATO DA ATA HC. 58.134 — PR — Rel.: Min. Djaci Falcão. Pacte.: Hélio Queiroz Barboza ou Hélio Queiroz Barbosa. Impte.: Hélio Queiroz Barboza ou Hélio Queiroz Barbosa. Coator.: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná. Decisão: Indeferido o pedido, remetendo-se os autos ao Tribunal do Paraná. Unânime. 109 Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 05 de setembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.259 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Hilkias Marinho Nunes — Recorrido . Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Re-ratificação de denúncia. O recebimento da mesma não está submetido às condições previstas no art. 384 do C.P.P. Recurso ordinário improvido. ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componente da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, negar provimento ao recurso. Brasília, 26 de setembro de 1980 — Djaci Falcão — Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão — O aresto objeto deste recurso tem o seguinte teor: «— A modificação da denúncia antes de consumada a prescrição com base em capitulação do delito rejeitada, interrompe o curso da mesma prescrição. — Não cabe habeas corpus, quando a prescrição não se consumou. Vistos, relatados e discutidos estes autos de habeas corpus, n? 5.526 da Comarca de Nilópolls, em que é impetrante Dr. Paulo FrÓes Machado e paciente Hilkias Marinho Nunes, acordam em Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro denegar a ordem, por unanimidade, de votos. Assim decidem pelos fundamentos do douto parecer da Procuradoria-Geral da Justiça que a este se incorpora na forma regimental. Rio de Janeiro, 30 de junho de 1980 — Pedro Bandeira Steele — Presidente — Osny Duarte Pereira — Relator» ( fls. 32). O parecer em que se baseou a decisão tem o seguinte teor «A hipótese dos autos reveste-se da maior simplicidade: 110 R.T.J. — 100 O paciente foi denunciado, como Incurso nas penas do art. 129 § 1?, n? I do Código Penal, por ter produzido disparos de arma de togo contra sua companheira Odranice de Aragão Macedo. No curso do processo, na fase de diligência, o patrono do paciente intimado a requerimento da querendo, para, Promotoria manifestar-se (fls. 18), requereu fosse julgada extinta a punibilidade pela prescrição, com fundamento no art. 108, n? IV do Código Penal (fls. 19). O mencionado pedido não chegou a ser decidido pelo ilustre Juiz a quo. Contudo, ao ter vista dos autos para manifestar-se sobre a pretensão do acusado, a Promotoria, por ter entendido que a mencionada denúncia descreve conduta que 'embora caiba na descrição do art. 121, § 2?, inciso II, c/c art. 12 n? II, ambos do Código Penal, foi erroneamente, d.v., capitulada no art. 129 § 1?, n? I do mesmo Código' (fls. 20). requereu a re-ratificação da peça vestibular 'haja visto que, com a definição jurídica, correta, agora dada ao fato narrado a prescrição não operou' (fls. 21). A pleiteada re-ratificação foi recebida, tendo sido determinada a abertura de vista à defesa (fls. 23), que peticionou na mesma data, pretendendo a reforma do despacho (v. Item IV das informações de fls.). Antes de mais nada, cumpre salientar que, na melhor das hipóteses, não pode ficar sem qualquer crítica a morosidade com que vem se arrastando a ação penal de que tratam os autos sendo data venia, a nosso ver, inaceitáveis as explicações contidas no Item 9? das informacões. Além disso, é de se ressaltar, que, como a denúncia foi recebida em 25-4-68 (item 1? das informações), a primeira capitulação dada ao delito, antes da re-ratificação, não havia ainda sido atingida pela prescrição. Por último, a re-ratificar a capitulação da peça inicial, o ilustre representante do Ministério Público usou da faculdade concedida pelo art. 569 do C.P.P., isto é, supriu omissão da denúncia, o que importou na alteração da capitulação do Assim sendo e, como a hipótese não é a do art. 384, § único do C.P.P., como corretamente sustenta o Juiz informante, a Procuradoria da Justiça opina no sentido de ser denegada a ordem. Rio de Janeiro, 30 de junho de 1980 — Antonio Cláudio Bocaiúva Cunha — Procurador da Justiça em exercício» (fls. 28 a 30). Em tempo hábil foi interposto o recurso ordinário, como se vê da petição de fls. 34 a 38, que leio. A Procuradoria da República emitiu o seguinte parecer «1 — O paciente foi denunciado como incurso no art 129, § 1?, I, do Código Penal (v. fls. 8-8verso), tendo sido a denúncia recebida a 25-468 (v. fls. 9 verso). 2 — A defesa requereu, através da petição de fls. 19, que fosse julgada extinta a punibilidade, em virtude de prescrição. 3 — O representante do Ministério Público, todavia, re-ratificou a denúncia, a 5-2-80, dando o paciente como autor do crime previsto no art. 121, § 2?, II, c/c o art. 12, II, do Código Penal (v. fls. 20-21). R.T.J. — 100 111 4 — A re-ratificação foi objeto do em que o Juiz, encerrada a instrudespacho de 26-2-80, que a recebeu ção, vislumbra — em face de pro(v. fls. 23). va de circunstância elementar não contida explícita ou implicitamente 5 — Dai, a impetração de fls. 2-7, na denúncia ou na queixa — a posargüindo a inadmissibilidade da alsibilidade de nOva definição juríditeração havida na denúncia, bem ca do fato. como sustentando que a narrativa 12 — No caso, entretanto, cuidanela contida não autorizava a impuse de iniciativa do órgão causador, tação, ao paciente, de autoria de propondo imputação parcialmente tentativa de homicídio. O despacho diversa da contida na primitiva deque recebeu a re-ratificação tradunúncia. Cogita-se, em parte, de noziria, em conseqüência, ilegal consva ação penal, cuja instauração é trangimento. condicionada ao Juízo de admissi6 — Com base em tais alegações, bilidade externado no despacho o impetrante assim deduziu os obque recebe a re-ratificação. jetivos do pedido: 13 — Não há como se confundir, ser dada como extinta, por dessarte, a hipótese da remotivo de prescrição, a punibiliratificação da denúncia com a codade ou, em caso contrário, gitada pelo art. 384 do C.P.P. A incidência deste dispositivo pressuser tornada sem efeito a repõe a iniciativa do próprio juiz, no ratificação da denúncia, admititocante á nova imputação, e disda pelo MM. Juiz, por via do qual pensa a renovação do sumário. o Paciente, denunciado por crimes de lesões corporais, passou 14 — Não são aplicáveis à reratificação da denúncia, portanto, a responder, sem forma nem fias exigências legalmente previstas gura de direito, por delito de tenpara a desclassificação de que tratativa de homicídio. ta o art. 384 do C.P.P. 7 — O writ, foi denegado pelo 15 — Dessarte, a circunstância aresto de fls. 32, que adotou os funde não terem sido satisfeitas no cadamentos do parecer de fls. 28so, aquelas exigências, não consti30. tui motivo-de nulidade do despacho que delas prescindiu. 8 — Recorreu, então, o impetrante, insistindo nas alegações que IniPelo improvimento do recurso, cialmente formulara. em face do exposto, é o parecer. Brasília, 17 de setembro de 1980 9 — Toda a argumentação do re— Alvaro Augusto Ribeiro Costa — corrente se propõe a demonstrar Procurador da República. que não é permitido ao juiz alterar a classificação dada ao fato na deAprovo: Francisco de Assis núncia sem fazê-lo na ocasião próToledo — Subprocurador-Geral da pria — a da emissão da sentença República (fls. 43 a 45). — e sem observar o que estabelece o art. 384 do C.P.P. VOTO 10 — Equivocada, porém, afigura-se-nos a tese suscitada no apelo. O Sr. Ministro Djaci Falcão — O 11 — Não tem aplicação à espé- recurso não merece acolhida. Seguncie o art. 384 do CPP, vez que esse do ficou esclarecido no juizo de oridispositivo diz respeito à hipótese gem, antes de se operar a extinção 112 R.T.J. - 100 da punibilidade, pela prescrição da pretensão punitiva, o representante do Ministério Público 1'e-ratificou a capitulacâo expressa na denúncia, usando da faculdade prevista no art. 569 do Código de Processo Penal. Não se cogita, no caso, da incidência do art. 384, do citado diploma, que pressupõe a iniciativa do próprio juiz. Dai, o acerto do acórdão recorrido negando a concessão da ordem. EXTRATO DA ATA RHC — 58.259 — RJ — Rel.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Hilkias Mari- nho Nunes. (Adv.: Paulo Fróes Machado). Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Negado provimento. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djacl Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprociwadorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 26 de setembro de 1980 — Hélio Francisco Marques — Secretário. HABEAS CORPUS N? 58.377— DF (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Paciente: Almindo Lopes da Silva — Coator: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Júri. Legítima defesa putativa. Necessidade do desdobramento dos quesitos, à semelhança do que se dá na legítima defesa real. No caso, negado o quesito sobre a injustiça da agressão, deixou de se configurar a excludente da legítima defesa. Habeas corpus indeferido. ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, indeferir o pedido. do em favor de Almindo Lopes da Silva, em que se alega: «O paciente foi pronunciado, pelo Presidente do Tribunal do Júri do Distrito Federal, em 22 de novembro de 1977, conforme sentença em anexo, doc. n? 1. RELATORIO 2 — Libelado em 09 de dezembro de 1977, conforme doc. n? 2, anexo, foi dito libelo retificado em 2 de outubro de 1978, consoante doc. n? 3, junto. O Sr. Ministro Djaci Falcão: Trata-se de habeas corpus impetra- 3 — Em 07 de novembro de 1978, o paciente foi submetido a julgamento pelo Tribunal Popular, con- Brasilia, 04 de novembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente e Relator R.T.J. — 100 forme termo de interrogatório e Ata anexos, docs. Wh; 4 e 5. 4 — Ao Júri foram formuladas 4 séries de quesitos, conforme cópias anexas, docs. Ws 6, 7, 8 e 9. 5 — Proferida a sentença em anexo, doc. nt 10, houve Apelação da Defesa e da Acusação, consoante termos anexos, docs. Ws 11 e 12. 6 — Para melhor entendimento de questão jurídica que se tratará adiante, junta-se também as razões de Apelação da Defesa, doc. n? 13. 7 — Por Acórdão de 24 de outubro de 1978, o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal, em manifesta contradição, deu provimento a Apelação da Defesa, parcialmente, e deu também provimento ao apelo do M P , consoante ementa a seguir transcrita: (.(A legítima defesa não se perfaz sem o concurso de todas as circunstâncias previstas na lei, as quais quando se cuidar de defesa putativa, deverão ser desdobradas em igual número de quesitos para deliberação do Júri. Mantém-se o veredito condenatório bem alicerçado na prova dos autos, provando-se parcialmente o recurso do réu-apelante somente para reduzir a pena imposta, face à inexistência de agravantes. Cassa-se a decisão do Júri quando em manifesto divórcio com a prova dos autos, provendose o apelo do Ministério Público para submeter os outros réus a novo julgamento.» (junta-se cópia integral do retendo Acórdão, doc. n? 14). 8 — Ocorre Doutos Ministros, que o processo é manifestamente nulo, a partir do julgamento levado 113 efeito pelo Tribunal Popular e. o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal, tornou-se autoridade coatora, porquanto, não acatou os reclamados do paciente, embora a Jurisprudência dessa Suprema Corte lhe seja inteiramente favorável, consoante Acórdão proferido no RE n? 61.479. cuja cópia segue anexa, doc. n? 15. a 9 — Com efeito, a contradição do julgamento proferido pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal é tão gritante, que a própria ementa manda submeter outros réus a Júri, no caso, olvidando-se de que no processo a que o paciente responde não existe co-réus. 10 — A nulidade é absoluta, porque a formulação de outros quesitos, em caso de erro de fato, consoante bem esclarece o Acórdão da Suprema Corte, tomado como paradigma, provoca nas respostas dos Senhores Jurados, tremenda contradição, como ocorreu no presente caso. 11 — No julgamento do RE n? 61.479, trazido St colação, ficou bem demonstrado que o erro de fato não se confunde com a leéptima defesa. No caso tratado pelo presente habeas corpus, o 3? quesito formulado na primeira série, englobava a tese do erro de fato e sua resposta afirmativa, prejudicava os demais quesitos, como bem já reconheceu o Supremo Tribunal Federal no recurso citado. 12 — Como se vé, o julgamento do Júri mantido pelo Tribunal apontado como coator, vulnerou os artigos 484 e 489, do Código de Processo Penal. 13 — A nulidade apontada é abconsoante o parágrafo único do artigo 564, do Código de Processo Penal. soluta 114 R.T.J. — 100 14 — Nulo também é o processo, em decorrência de haver o Tribunal a pio, cindido o julgamento de competência do Tribunal Popular. Não é possível admitir que o mesmo Corpo de Sentença haja acertado e errado ao mesmo tempo. A decisão não pode ser manifestamente contrária à prova dos autos, somente parcialmente, como entendeu o Tribunal coator. Ora, a dar valia ao Acórdão impugnado pelo presente writ, estaria retirando do Júri a sua soberania Constitucional porque estatia-lhe reconhecendo legitimidade só quando satisfeitos fossem os interesses do Ministério Público. 15 — E impossível juridicamente, no caso, cindir o julgamento, não só porque o libelo é único, mas sobretudo porque, somente são cassadas as decisões do Júri manifestamente contrárias à prova dos autos. Como então ser manifesta só parcialmente? Como decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça do Distrito Federal. 16 — A única solução para o caso é anular o processo a partir do julgamento do Júri, não há outra forma, salvo melhor juízo. Por se tratar de nulidade absoluta é perfeitamente sanável pelo habeas corpus, dai a impetração» (fls. 2 a 5). O pedido vem instruído com os documentos de fls. 6 a 43. Prestadas as informações de fls. 48 a 49, manifestou-se o Ministério Público pelo indeferimento do pedido (fls. 51 a 58). VOTO O Sr. Ministro Djact Falcão (Relator): Acertado é a meu ver, o entendimento exposto no parecer do Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa, In verbis: «6 — Não se configurou, em verdade, o argüido erro de questionário, nem ocorreu contradição nas respostas dadas aos quesitos. 7 — O questionário obedeceu aos ditames do art. 484, IV e VI do C.P.P. e, no tocante à circunstância de haver o juiz desdobrado o quesito relativo à tese do erro de fato, nenhuma censura lhe deve ser feita; antes, evidencia o uso de boa técnica, obstativa de quesitação complexa. 8 — Doutra parte, ao afirmar que o réu, em conseqüência de erro plenamente justificado, resultante do fato de ter a vítima feito gesto de que iria apanhar ou pegar alguma coisa, supôs achar-se diante de uma agressão à sua pessoa (sic), o júri não emitiu assertiva incompatível com a resposta ao quesito seguinte, segundo a qual a suposta agressão não era injusta. 9 — Outrossim, há que ser feita distinção entre a hipótese cogitada nos presentes autos e a subjacente ao julgamento, na Suprema Corte, do RE n? 61.479. Na hipótese paradigma, cuidava-se de formulação de quesito concernente à atualidade ou iminência da agressão, depois de já haver sido respondida afirmativamente a indagação acerca da ocorrência de erro de fato. Supõe-se, pela leitura do aresto modelo (v. fls. 39-43), que o quesito pertinente ao erro de fato fora redigido de modo a englobar todos os requisitos necessários à caracterização da tese que lhe dera origem. Diversa, entretanto, como já se viu, foi a técnica usada no questionário impugnado pelo impetrante. R.T.J. — 100 10 — No que diz respeito à alegada incindibilidade do julgamento pelo júri, igualmente não assiste razão ao impetrante. 11 — Nesse particular, o voto do relator da apelação observou: — «O Egrégio Tribunal de Justiça, em recente sessão plenária, decidiu, contra meu voto entre outros, pela cindibllidade do julgamento do Júri. O caso então versado não guarda nenhuma analogia com este. Aqui, cogitase do exame de mérito de três (03) decisões absolutórias e de uma condenatória, todas distintas entre si. Por mais forte razão, aqui, o exame isolado de cada uma daquelas decisões imporá solução autônoma para cada uma delas. Assim como o Conselho de jurados julgou separadamente cada uma das imputações do libelo, assim também à Turma cumpre julgar os recursos isolando o mérito de cada um dos crimes.» 12 — E verdade que o art. 79 do C.P.P. impõe a unidade de processo e julgamento quando houver conexão; e que, ao enumerar as exceções a essa regra, não cogita da hipótese de que ora se cuida. 13 — No entanto, sendo diversos os pontos da acusação e havendo autonomia entre as condutas respectivas, nada impede que subsista julgamento na parte que não foi objeto da irresignação do Ministério Público, porquanto a unidade de julgamento dos crimes conexos não é absoluta (v. HC n? 53.108-GB, 2! T., Rel.: Min. Xavier de Albuquerque, aud. de publicação de 05-03-75). 115 Pelo indeferimento do writ, em face do exposto, é o parecer» (fls. 56 a 58). Realmente, «o questionário da legitima defesa putativa deve ser desdobrado em tantos quesitos quantos são os da legitima defesa real». E o que sustenta o Prof. José Frederico Marques, invocando a jurisprudência (ver «O Júri no Direito Brasileiro», 2! edição, pág. 269). Na mesma diretriz coloca-se o Prof. Hermino Alberto Marques Porto, ao versar o tema no livro «Júri», pág. 266, no qual observa que a decisão tomada no RE 61.479, relatada pelo saudoso e eminente Ministro Hermes Lima (RTJ 45/ 4fY7), é de todo isolada. Ante o exposto, indefiro o pedido. EXTRATO DA ATA HC-58.377 — DF — Rel.: Min. Djaci Falcão. Pacte.: Almindo Lopes da Silva. Impte.: Jason Barbosa de Faria. Coator: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Decisão: Indeferido o pedido, à unanimidade de votos. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leitão Soares. Brasília, 04 de novembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. R.T.J. — 100 116 RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.423 — GO (Primeira Turma) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Soares Mufioz. Recorrente: Rubens Antonio Ferreira Rosa — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. Denúncia. Co-autoria. Não há dúvida de que a denúncia deve conter a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias (art. 41 do C.P.P.) e que, em se tratando de autoria coletiva, é indispensável que a peça inicial da ação penal descreva, ainda que resumidamente, a conduta delituosa de cada um dos participantes (RE 75.401-SP, relatar Mln. Bilac Pinto). Todavia, o cumprimento dessas exigências formais pressupõe que as indagações policiais forneçam ao órgão do Ministério Público as mencionadas circunstâncias e particularidades. Omisso ou falho que seja o inquérito a respeito das circunstâncias do fato criminoso ou da participação individual dos seus co-autores, nem por isso o órgão do Ministério Público estará impedido de oferecer a denúncia, visto que, para a instauração da ação penal, basta a prova da existência do crime e indícios da autoria. Recurso de habeas corpus desprovido. ACORDACr Vistos, Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, por maioria de votos, e na conformidade das notas taquigráficas, negar provimento ao recurso. Brasília, 18 de novembro de 1980 — Thorapson Flores, Presidente — Soares Munas, Relatar pio acórdão RELATORIO O Sr. Ministro Cunha pacato: O parecer da Procuradoria-Geral da República, subscrito pelo Dr. Alvaro Augusto Ribeiro Costa e aprovado pelo Professor Francisco de Assis Toledo, ilustrado Subprocurador-Geral, retrata com fidelidade a espécie sub judice, In verbis: 1 — «O paciente responde a processo em que lhe é imputada a coautoria no crime de roubo qualificado (art. 157, § 2?, 1 e II do C.P.). 2 — Em seu favor, foi impetrado habeas corpus, mediante alegativa de nulidade da denúncia, que, asem descrever o modo como o paciente teria concorrido para a prática do delito» (sie), seria «omissa no tocante a requisito essencial e, por conseguinte, inepta, confusa, polêmica e sem técnica» (sic, (ls. 03). 3 — Tendo sido denegado o writ pelo are-sto de fls. 29-31, o impetrante reiterou as alegações inicialmente deduzidas, o que fez através do apelo de fls. 32-35. 4 — Improcede, todavia, a irrasignação em causa. 5 — Ao prestar as informações de fls. 20-21, a autoridade inicialmente apontada como coatora assinalou: — «Realmente, o paciente foi preso e autuado em flagrante delito, à 01 hora da madrugada, do dia 14 do mês de agosto p.p., pelo R.T.J. — 100 Dr. Delegado de Policia do Primeiro Distrito Policial desta Comarca, acusado de ter, juntamente com Antonio da Silva Lima Filho e dos menores: Ronaldo Ferreira Rosa e Aloysio Ferreira Silva, assaltado a Milton Rodrigues da Silva e Elcio de Assis, na Praça Tamandaré, nesta Capital. Também é verdadeiro que o representante do Ministério Público, em exercido legal, neste Juizo, ofereceu denúncia contra o paciente e Antonio da Silva Lima Filho, incursando-os nas penas do artigo 157, g 2?, incisos I e II do Código Penal Brasileiro, e a denúncia está redigida, exatamente conforme o exposto pelo Dr. Advogado impetrante. A denúncia foi, sim, por mim recebida e, ao recebê-la, estive atento às diretrizes dos artigos 41 e 42 do Código de Processo Penal, não encontrando nenhuma justificativa legal para rejeltá-la. Veja Vossa Excelência que o paciente praticou o delito, segundo ele próprio narra, nas declarações que prestou em Polícia, em companhia de mais três elementos, num trabalho conjunto, praticando, todos eles, atos indistintos de execução do crime. Entendo, pois, que, em casos como tais, não exige a lei que a denúncia descreva com minúcias, a participação de cada agente na prática do assalto, sobretudo, quando, nem os próprios assaltantes fazem esta distinção. 6 — Diante das considerações acima enunciadas, afigura-se incensurável o aresto recorrido, quando pondera: «Bem examinada a peça atacada, vê-se que, embora de forma resumida, descreve os fatos e circunstâncias que levaram à classificação final do delito. 117 Induvidosamente qualificado o paciente, atribui-lhe haver, com outro comparsa, igualmente qualificado, ambos armados, assaltado as duas vítimas, de quem subtraíram importâncias em dinheiro, além do carro, abandonando-as, posteriormente, em um dos setores desta Capital. Suficientemente descritos o roubo e as circunstâncias autorizadoras do aumento da pena, consistentes no uso de arma e concurso de duas pessoas, pelo menos. Suscinta a peça vestibular no processo, mas precisa a acusação. Nulidade, na hipótese, haveria se embaraço intransponivel ou cerceamento resultasse para a defesa, de tal modo que impossível lhe fosse exercitar-se de maneira objetiva e eficiente. A denúncia, porém, além de narrar os fatos com clareza, conquanto sumariamente, ainda se reporta ao inquérito que a instrui, e onde poderão ser supridos pequenos defeitos que porventura encerre. Cumpre, ademais, notar que, em se tratando de ação conjunta, nem sempre é possível precisar, já na fase inaugural da ação penal, a conduta delitiva de cada um, o que será buscado na instrução criminal, quando não desnecessária a particularização, por haverem todos, de igual forma, concorrido para o evento delituoso. Não é inepta a denúncia que, embora suscintamente, narra o fato delituoso e suas circunstâncias, possibilitando à defesa exercitar-se de maneira objetiva e incircunscritas». R.T.J. — 100 118 7 — E certo que a jurisprudência tem considerado indispensável a individualização, na denúncia, das condutas dos participes do delito em hipóteses de autoria coletiva. 8 — Não há de ser entendida, porém, de modo absoluto essa orientação, porquanto hipóteses há — como a dos autos — em que a conduta dos co-autores se dá de maneira indistinta, sendo impossível individualizá-la. Em tais casos, se a descrição da maneira como ocorreram os fatos propicia à defesa amplo exercício de contraditório, não há motivo para decretação de nulidade. O parecer, em face do exposto, sugere o inlprovimento do recurso». E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — A denúncia, cuja inépcia formal é alegada pelo recorrente (cópia «xerox» de fl. 22), está vazada nos seguintes termos: «O infra-assinado, 13? Promotor de Justiça em Goiânia, por suas atribuições legais, vem com base no inquérito policial junto, denunciar Antonio da Silva Lima Filho, brasileiro, solteiro, mecânico, com 22 anos de idade, natural de Belo Horizonte — M.G. residente no «Hotel do Silvio» próximo a Estação Rodoviária do Dergo e Rubens António Ferreira Rosa, brasileiro, solteiro, sem profissão, com 18 anos de idade, residente na Rua U80A, Quadra 54, Lote 14, Vila União, pelo fato delituoso que abaixo expõe. As últimas horas do dia 13 do mês fluente, Milton Rodrigues da Silva e Elcio de Assis, aqui vítimas, se encontravam na Praça Tamandai-é, quando conversavam no interior de um carro FIAT de propriedade de Elcio. De repente surge 2 dois elementos armados de f aca e uma mauser Beretta, obrigando-os a passarem para o banco trazeiro do veículo onde estavam. Daí, deslocaram o carro, e, adiante, pegaram dois outros marginais e foram para o Setor Sul, onde deixaram as vítimas, depois de roubarem da primeira uma bolsa de couro contendo documentos pessoais e a quantia de Cr$ 500,00, roubando da segunda vitima o carro FIAT e a quantia de Cr$ 1140,00 em dinheiro. Face ao exposto pede-se a instauração do processo-crime, citando-se o indiciado para todos os seus termos, pena de revelia, com intimação das testemunhas abaixo arroladas, por ter o referido indiciado incorrido nas sanções do artigo 157, § 2?, incs. I e II do Código Penal». 2 — Embora lamentável que urna ação penal não possa prosperar pelo descuido na feitura de uma peça simples como é a denúncia, a leitura da peça cuja invalidade se pretende, e que acabo de fazer em todo o seu teor, demonstra, «hl ictu oculi», que não foram atendidos os requisitos legais indispensáveis à formulação de uma acusação. Em primeiro lugar, o denunciante sequer esclareceu se os «dois elementos» referidos na denúncia seriam os denunciados parecendo, à primeira vista, que estes respondem por atos praticados por terceiros não identificados. Pode-se alegar estar implícito na denúncia tratar-se dos acusados, entre eles o paciente. Mas, examinando-se a denúncia imparcialmen- R.T.J. — 100 te, pode-se chegar também à conclusão oposta, ou seja, que a acusação foi formulada contra quem não cometera o delito. Em segundo lugar, refere-se expressamente a peça vestibular acusatória a quatro agentes do crime, deixando de esclarecer porque omitira na acusação dois deles. 119 tos» nela mencionados seriam efetivamente os acusados, bem como ao motivo pelo qual deixou de incluir na acusação dos dois participes, conduz à perplexidade, dificultando a defesa. Nem se alegue, como fez o egrégio Tribunal a quo que os autos de inquérito, por referidos na vestibular acusatória, supririam tais lacunas, pois a ação penal se instaura com a denúncia, cujos requisitos de validade estão taxativamente expressos no art. 41 do Estatuto Processual. É certo que o auto de prisão em flagrante, juntado aos autos com a informação do Juiz indigitado coator, esclarece que dois assaltantes seriam menores de dezoito (18) anos e, portanto, inimputáveis. Mas tal Entendo, com a jurisprudência reifato não consta da denúncia, e forço- terada e pacífica desta Excelsa Corsamente dela teria de constar, mes- te, que a denúncia não deve conter mo porque a exclusão sem justifica- obrigatoriamente elementos secuntiva ofenderia o princípio da indivisi- dários, facilmente identittcáveis nas bilidade da ação penal, além de omi- peças do inquérito. tir agravante expressamente previsAmpliar-se essa jurisprudência, ta no art. 45, III, do Código Penal, caso a participação dos menores não entretanto, ao ponto de se pretender pudesse tipificar o crime previsto no que o inquérito policial substitua a denúncia, naquilo de essencial que art. 1? da Lei n? 2.252, de 01-7-54. ela deve conter, seria estabelecer o Por outro lado, o já mencionado caos no processo penal, não podendo auto de prisão em flagrante, no qual as partes, sequer, apreender os limiforam ouvidos, além das testemu- tes em que foi posta a lide. E é evinhas sacramentais, as vitimas e os dente que essa subversão da ordem indiciados, fornece, conforme já di- processual provoca objetivamente to, todos os elementos necessários à um cerceamento de defesa incomformulação de uma acusação eficaz, patível até mesmo com preceito que atenda as exigências legais, fato constitucional. este que invalida o argumento do 3 — Pode-se argumentar que a acórdão recorrido, endossado pela douta Procuradoria-Geral, sobre a inépcia da denúncia, se reconhecida, impossibilidade de se descrever o fa- implicará na soltura dos réus, com to delituoso com todas as suas cir- possível prejuízo para a ordem púcunstâncias elementares, conforme blica. exigido no art. 41, do Código de ProContraponho a este argumento, encesso Penal. tretanto, o de que maior prejuízo, inE certo que algumas dessas falhas clusive para a ordem pública, é a inpoderiam ser supridas oportunamen- segurança do cidadão provocada pelo te, nos termos da lei. Não é menos desrespeito às normas legais, sejam certo, entretanto, que uma denúncia elas do direito material ou formal, lacunosa, omissa inclusive quanto à mesmo porque o afastamento comreal participação dos denunciados no pulsório do convívio da sociedade só evento criminoso, vez que sequer in- encontra amparo no principio consaforma com clareza se os «elemen- grado da paz e segurança social. 120 R.T.J. — 100 4 — Convicto de que a denúncia, no caso sub indica não contém descrição de elementos essenciais passíveis de proporcionar uma defesa eficaz, dou provimento ao recurso, para, reconhecendo a inépcia formal dessa peca preambular acusatória, anular o processo, reinstaurando-se a ação penal com obediência aos ditames legais. E nos termos do art. 580 do Código de Processo Penal, estendo os efeitos dessa decisão ao co-réu António da Silva Lima Filho. Determino, em conseqüência, a expedição de alvaPás de soltura a favor de ambos os denunciados, ultrapassados que estão os prazos para conclusão da instrução criminal. denúncia deve conter a exposição do fato criminoso com todas as suas circunstâncias (art. 41 do C.P.P.) e que, em se tratando de autoria coletiva, é indispensável que a peça inicial da ação penal descreva, ainda que resumidamente, a conduta delituosa de cada um dos participantes (RE 75.401-SP, relator Min. Bilac Pinto). O cumprimento dessas exigências formais pressupõe que as indagações policiais forneçam ao órgão do Ministério Público as mencionadas circunstâncias e particularidades. Omisso ou falho que seja o inquérito a respeito das circunstâncias do fato criminoso ou da participação individual dos seus co-autores, nem por isso o órgão do Ministério Público estará impedido de oferecer a denúncia, visto que, para a instauração da EXTRATO DA ATA ação penal, basta a prova da existência do crime e indícios da autoRHC 58.423 — GO -- Rel.: Min. Cu- ria. nha Peixoto. Recte.: Rubens Antonio No caso sub judice, o paciente, inFerreira Rosa (Adv.: Paulo Nasser). Recdo.: Tribunal de Justiça do Esta- terrogado no auto de prisão em flagrante, confessou ter praticado o asdo de Goiás. salto dizendo, textualmente: Decisão: Adiado o julgamento por *que na data de ontem, por volta haver pedido vista o Ministro Soares das 23,00 horas, mais ou menos, o Mialloz, após os votos dos Ministros declarante juntamente com AntoRelator e Rafael Mayer, que davam nio da Silva Lima Filho e dos meprovimento ao recurso. nores Ronaldo Ferreira Rosa e Aloysio Pereira da Silva, ambos de Presidência do Senhor Ministro 16 anos de idade, resolveram assalThompson Flores. Presentes à Sestar e roubar um veículo FIAT que são os Senhores Ministros Xavier de se achava estacionado na Praça Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Tamandaré desta capital, bem coMufioz e Rafael Mayer. Subpromo os ocupantes do mesmo: que, curador-Geral da República, Dr. depois de coagirem as vitimas, Francisco de Assis Toledo. determinando-as para que passassem para o banco trazeiro, levaBrasília, 11 de novembro de 1980 — António Carlos de Azevedo Braga, ram as mesmas até o Setor Sul, Secretário. para logo em seguida abandonáIas; que, de posse do veículo e dos VOTO (VISTA) pertences das vitimas, o declarante e seus colegas se dirigiram até a O Sr. Ministro Soares Mufioz: Sr. Praça Cívica, a fim de comprarem Presidente, não há dúvida de que a gasolina, local onde foram detidos R.T.J. — 100 pelos policiais da R.P. 011, que os conduziram a este Distrital; que o declarante já foi preso várias vezes; que esclarece mais o declarante que, quanto a arma, tipo «Beretta» usada no crime, eles a jogaram debaixo de um «táxi» estacionado na Praça Bandeirantes, enquanto que a faca, tipo punhal, foi apreendida em poder do declarante e seus companheiros» ( fls. 16). Idênticas são as declarações do outro acusado (fls. 15 e v.). De seu turno, as duas vítimas, depondo no auto de prisão em flagrante, declararam, cada uma a sua vez: «que no momento em que o declarante se achava conversando com Elcio de Assis (nome da outra vitima) no interior do veiculo FIAT eis que se aproximam do veículo dois indivíduos , um de cada lado do carro, estando ambos armados com faca e «Beretta»; que, logo em seguida ditos individuos coagiram o depoente e seu amigo no sentido de passarem para o banco trazeiro do carro e assim feito, os citados indivíduos colocaram o FIAT em movimento e após andarem por alguns metros pararam o veículo, momento em que mais dois indivíduos adentraram no mesmo carro; que, nova -ment,oviculfpsmvimento, tendo aqueles indivíduos abandonado o depoente e seu amigo Elcio de Assis no Setor Sul, que, dai o depoente e seu amigo Elcio pegaram uma carona, voltando para a Praça Tamandaré, local onde se deu o fato e, quando procuravam os policiais, tomaram conhecimento de que os acusados já haviam sido agarrados» (fls. 13, 14 e 15). Razão assiste ao parecer da Procuradoria-Geral da República, 121 quando, após salientar que a jurisprudência tem considerado indispensável a individualização, na denúncia, das condutas dos participantes do delito em hipótese de co-autoria, acentua que «não há de ser entendida, porém, de modo absoluto essa orientação, porquanto hipóteses há, — como a dos autos — em que a conduta dos co-autores se dá de maneira indistinta, sendo impossível individualizá-la. Em tais casos, se a descrição da maneira como ocorreram os fatos propicia à defesa amplo exercício do contraditório, não há motivo para a decretação da nulidade» (fls. 49). Realmente, confrontados os elementos constantes do auto de prisão em flagrante, única peça probatória juntada aos autos do writ, e os termos da denúncia, verifica-se que esta contém, ainda que resumidamente, o fato criminoso e as suas circunstâncias essenciais. A participação dos dois assaltantes se fez conjuntamente, sem atos distintos. A falta, na denúncia, de alusão aos menores, referidos no auto de prisão em flagrante, não constitui causa de nulidade absoluta, mesmo porque as vítimas não incluiram, como participantes do assalto, os dois outros individuos que, depois deles, segundo elas, entraram no automóvel, e nenhuma alusão fizeram a menores. Se a instrução vier a esclarecer qual tenha sido a participação de cada um dos acusados no assalto, e, bem assim, o concurso de outras pessoas, nada impedirá que tais particularidades sejam apreciadas na sentença final, observadas pelo juiz as regras estabelecidas no artigo 383 e 384 do Código de Processo Penal, inclusive providenciando em que o Ministério Público adite a denúncia, se houver possibilidade de nova definição jurídica que importe na R.T.J. — 100 122 aplicação de pena mais grave ou na de serem incluídos outros acusados na ação. Reconheço a existência dos outros defeitos apontados no douto voto do eminente Ministro Cunha Peixoto; penso, entretanto, que eles não bastam para qualificar a denúncia de inepta. Ante o exposto, nego provimento ao recurso, com a máxima vênia dos respeitáveis votos dos eminentes Ministros Cunha Peixoto e Rafael Mayer. VOTO O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: Sr. Presidente, nego provimento ao recurso, com a máxima vênia do eminente Ministro Cunha Peixoto. Estou de acordo, em princípio, com as linhas gerais e doutrinárias do voto do eminente Relator, mas temo que S. Exa. se haja excedido em rigor, quando, ao fazer a critica da denúncia, concluiu por sua inépcia e inteira desvalia. Parece-me que, dados os necessários descontos, diante da realidade cotidiana da nossa Justiça Criminal, é possível contemporizar com os defeitos que, se existentes na denúncia, não me parece que levem à sua imprestabilidade. Acompanhando o voto do eminente Ministro Soares Mufioz, também nego provimento ao recurso. VOTO O Sr. Ministro Thompson Flores: (Presidente) — Peço vênia para acompanhar os votos dos eminentes Ministros Soares Miuloz e Xavier de Albuquerque. Como eles, admito que inepta não é a denúncia; atende ela, a meu ver, quanto satis, para levar ao conhecimento do recorrente, qual a acusação que lhe faz o Ministério Público, de molde a que se possa, com amplitude, dela, acusação, ge 'defender. Além disso, aliada aos elementos do flagrante e demais subsídios decorrentes do inquérito que instruem a respectiva denúncia, mais nitidamente se pode capacitar da amplitude do crime que se lhe imputa, bem como as circunstâncias em que teria sido praticado. Por fim, quaisquer omissões ou retificações outras podem ser feitas no decurso da instrução, até à sentença, como é expresso o C.P.P. Assim, também nego provimento ao recurso, data venia. EXTRATO DA ATA RHC 58.423 — GO — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: Rubens Antonio Ferreira Rosa (Adv.: Paulo Nasser) . Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás. Decisão: Negado provimento ao recurso, vencidos os Mins. Relator e Rafael Mayer. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Francisco Resek. Brasília, 18 de novembro de 1980 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. R.T.J. — 100 123 HABEAS CORPOS N? 58.464 — DF (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves. Paciente: Márcio Barbosa Lima — Aut. Coatora: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Habeas corpus. Júri. Quesitos. Excesso culposo em legitima defesa. Utile per Mutilem non vitiatur. Alegada a legitima defesa, ainda quando os jurados respondam negativamente ao quesito relativo ao uso de meios necessários, mister se faz, sob pena de nulidade do Julgamento, se manifestem sobre aquele que lhe é complementar, e que diz respeito á ocorrência, ou não, do excesso culposo. Tratando-se, porém, de condenação por dois crimes distintos, com penas aplicadas especificamente com relação a cada um deles (e, no caso, são diversas, dada a diferença de circunstâncias), é de aplicar-se o principio segundo o qual utile per Mutilem nom vitiatur, uma vez que, com referência à série de quesitos relativa a um deles, não se verificou o vício acima aludido. Habeas corpus deferido em parte. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, deferir, em parte, o pedido de habeas corpus. Brasília, 14 de novembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente — Moreira Alves, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves: São estas as informações prestadas pelo Exmo. Sr. Presidente do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (fls. 18/19): «a) O paciente foi denunciado, processado e pronunciado nas penalidades do artigo 121, duas vezes, combinado com os artigos 12, II e 51, todos do Código Penal. Libelado e submetido a julgamento pelo Tribunal Popular, em sessão realizada em 8 de fevereiro do ano fluente, o Júri reconheceu que o paciente tentou contra a vida de Paulo Roberto Martins e Durval Cândido Martins, filho e pai, respectivamente. Todavia, quanto à primeira série de quesito, negou-se a escludente de criminalidade prevista no artigo 19, II, do Código Penal legitima defesa. Entretanto, na segunda série, o Júri reconheceu que o fato foi praticado em defesa da pessoa do paciente, caindo a excludente no quesito da moderação dos meios usados, por cinco votos contra dois. Efetivamente, não foi questionado ao Júri o excesso. d) Em decorrência, o ilustre Presidente do Tribunal julgou prejudicados os quesitos restantes, com exceção ao relativo à existên- 124 R.T.J. - 100 eia de circunstância atenuante, prolatando, em seguida, a sentença. Condenou o paciente a cumprir a pena de sete anos de reclusão pelas duas tentativas. e) Inconformado, o condenado apelou da decisão. Processado regularmente o recurso, o Representante do Ministério Público opinou, preliminarmente, pelo provimento, por entender que o Egrégio Supremo Tribunal Federal eté totalmente favorável à tese do apelante». Entretanto, a douta Câmara Criminal houve por bem negar provimento ao recurso, à unanimidade, em sessão realizada em 23-10-80. Para melhores esclarecimentos, junto seguem fotocópias dos quesitos, termos de votação, sentença e parecer do M.P.» A fls. 30/31, assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer do Dr. Cláudio Lemos Fonteles: «A pretensão liberatória requerida pelo Dr. Raul Livino Ventim de Azevedo em favor de Márcio Barbosa Lima proclama a nulidade do julgamento pelo Conselho de sentença porque, uma vez negada a necessidade dos meios usados na repulsa à agressão injusta e iminente, reconhecida previamente, não poderia o MM. Juiz Presidente dar por prejudicado, como fez, as demais indagações atinentes à moderação na utilização destes meios e ao excesso, se doloso, ou culposo (vide: fls. 8). Procede a pretensão, porque embasada em vasta manifestação jurisprudencial, inclusive desta Suprema Corte, como mencionado a fls. 3/6, e o seu conhecimento originário é autorizado, porque se bem que inexistente nos autos o teor completo do julgado colegiado, cer- tidão há assentando terem sido rejeitadas as preliminares suscitadas pela defesa — fls. 28 —, no recurso de apelação, e o parecer da Subprocuradoria-Geral da Justiça, no apelo, alude ao tema, emprestando-lhe a adesão, não acolhida judicialmente (vide: fls. 26/27). Pelo deferimento do solicitado para que, anulado in totum o julgamento, pois se duas (2) séries de quesitos foram propostas ao Conselho de Sentença, e só em uma delas reconheceu-se o vício insanável — fls. 20/21 e 22/23 —, nem por isso examinar-se-á a realidade do ato único de decidir, ainda que sob forma complexa, seja Márcio Barbosa Lima submetido a novo Júri pelos eventos perpetrados.), É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator). No caso, como duas eram as vítimas, houve duas séries de quesitos. Na primeira, relativa à vítima Paulo Roberto Martins, não houve qualquer vicio, uma vez que os jurados negaram o quesito da legítima defesa. Na segunda, referente à vitima Durval Cândido Martins, a legitima defesa foi admitida, negado, Porém, o quesito de serem os meios necessários, razão por que os demais quesitos foram tidos como prejudicados. Ora, esta Corte já firmou o entendimento de que — como ainda recentemente julgou esta Segunda Turma, no HC 57 625 — « alegada a legítima defesa, ainda quando os jurados respondam negativamente ao quesito relativo ao uso dos meios necessários, mister se faz, sob pena de nulidade do julgamento, se manifestem sobre aquele que lhe é complementar, e que diz respeito à ocorrência, ou não, do excesso culposo». R.T.J. — 100 Sucede, porém, que o vício em causa só ocorreu com relação á vitima Durval Cândido Marfins, tendo a sentença condenado o paciente por concurso material de crimes, estabelecendo penas distintas para cada um deles, como se lê, a fls. 10: «Vistos, etc. Na conformidade da decisão do Júri, reconhecendo haver o réu Márcio Barbosa de Lima praticado, por duas vezes, o crime previsto no artigo 121 c/c o art. 12 item II, todos do Código Penal, condenoo: a) em relação à vitima Paulo Roberto Martins, à pena base de 7 anos de reclusão, diminuindo-a de 4 anos e 6 meses, tornando-a definitiva em 2 anos e 6 meses de reclusão; b) em relação à vitima Durval Cândido Martins, à pena base de 7 anos de reclusão, diminuindo-a de 2 anos e 6 meses, tornando-a definitiva em 4 anos e 6 meses de reclusão, penas estas aplicadas cumulativamente por força do artigo 51 caput do Código Penal, totalizando, 7 anos de reclusão. Na fixação da pena, considerei as diretrizes previstas no artigo 42 do Código Penal, especialmente os antecedentes do réu, anteriormente condenado por tentativa de furto; á menor e maior intensidade das lesões sofridas pelas vitimas, bem como ao reconhecimento, por parte do Júri, de militar circunstância atenuante especifica ( artigos 48, III do Código Penal) a favor do réu. O réu não possui as condições previstas na Lei 5.941/73, razão pela qual deve ser o mesmo recomendado na prisão em que se encontra. Custas, pelo condenado cujo nome será lançado no rol dos culpados. Publique-se e intime-se.». 125 Assim sendo, e tendo em vista o princípio jurídico segundo o qual utile per mutilem non vitiatur, não há razão, já que se trata de dois crimes distintos, com vítimas diversas, e praticados — como reconheceu o próprio júri — em circunstâncias diferentes (daí, a diversidade de penas), para que se anule a decisão com relação àquele dos dóis com relação ao qual não houve qualquer nulidade. Em face do exposto, defiro, em parte, o presente habeas corpus, para, declarando a nulidade do julgamento apenas no tocante à vitima Durval Cândido Martins (mantida, portanto, a condenação no concer: nente à vitima Márcio Barbosa de Lima), determinar que seja o paciente submetido a outro julgamento pelo Júri quanto à primeira das duas mencionadas vitimas. EXTRATO DA ATA HC. 58.464 — DF — Rel.: Min. Moreira Alves. Pacte.: Márcio Barbosa Lima (Impte.: Raul Livino Ventim de Azevedo). Coator: Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios. Decisão: Concedido em parte nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Moreira Alves e Decio Miranda. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Cordeiro Guerra. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 14 de novembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. R.T.J. - 100 126 RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.527 — PR (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves. Recorrente: João Maria de Oliveira — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Habeas carpes. Excesso de prazo. Competência. Justiça Militar Estadual. Excesso de prazo superado. Civil que comete crime militar em co-autoria com policial militar estadual. Impossibilidade de cisão do fato. Continência Precedentes do STF: RHC 57.540 e FtHC 57.624. Recurso ordinário a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráfIcas, por unanimidade de votos, negar provimento ao recurso ordinário. Brasília, 18 de dezembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente — Moreira Alves, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves: É este o teor do acórdão recorrido (fls. 38/39): «Acordam, em Grupo de Câmaras Criminais, à unanimidade de votos, denegar a ordem. Assim decidem, porque improcedente a alegação da inicial de encontrar-se o paciente preso em virtude de prisão preventiva decretada pelo Dr. Juiz de Direito da Comarca de Cornai° Procópio, incompetente ratione materiae, por ter este egrégio Grupo de Câmaras Criminais, ao julgar o conflito de jurisdição n? 4/80, firmado a competência da Justiça Militar do Estado para o respectivo processo (fls. 17 a 20). Com efeito, revelam os autos que o acusado teve a sua prisão cautelar decretada pelo ilustre juiz Auditor da Justiça Militar Estadual, em 27 de agosto próximo findo, seguindo o processo os seus trâmites regulares, no juízo competente, fls. 29 a 30 e 31 a 32. Diante disso, torna-se obviamente sem objeto o segundo argumento da impetração, ligado ao excesso de prazo. Não há, pois, constrangimento a sanar através do presente writ. Custas na forma da lei.» Interposto recurso ordinário, sobre ele assim se manifesta a Procuradoria-Geral da República, em parecer do Dr. Francisco de Assis Toledo (fls. 56/59): «Argüindo excesso de prazo de custódia provisória e ilegalidade do decreto cautelar — vez que exarado por juiz Incompetente — pleiteou o paciente o wrft, colimando soltura. O pedido foi denegado pelo aresto de fls. 38/39. Dai, o apelo de fls. 41/43, mediante o qual o paciente, além de reiterar as alegações inicialmente deduzidas, sustenta que não poderia, na qualidade de civil — e em R.T.J. — 100 face do art. 144, § 1?, d, da vigente Lei Maior — ser julgado perante a Justiça Militar estadual. As informações de fls. 26 — prestadas a 6/10/80 — noticiam, In verbis: «Foi decretada a prisão preventiva do réu pelo MM. Juiz de Cornélio Procópio, em data de 17 de janeiro do corrente ano. O conflito de Jurisdição n? 4-80 tornou nulo o decreto de prisão preventiva (Acórdão 9.314). Por este Juiz Auditor foi decretada a prisão preventiva do réu João Maria de Oliveira e outros, em data de 27 de agosto do ano corrente. O acusado foi interrogado em data de 19 de setembro passado. (Anexo fotocópias)». Pelo que se vê do documento de fls. 45, a denúncia contra o paciente foi recebida a 26/8/80, pelo Juiz Auditor. Superada, portanto, ficara a demora ocorrida antes dessa data, noticiada pelo requerente a 11.8.80 (fls. 03). No que diz respeito à argüida incompetência do Juizo castrense, deve ser notado, em primeiro lugar, que o processo tem curso no foro militar em virtude de acórdão proferido no julgamento do Conflito de Jurisdição n? 04/80 — pelo Grupo de Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná — assentado nas considerações assim deduzidas: «De acordo com o relato dos acusados que invadiram a cadeia pública para libertar os presos, vários policiais estão envolvidos no evento, além de estarem acusados de receberem vultosa soma em dinheiro para levarem a termo o assalto, que culminou com a libertação de todos os presos recolhidos naquele presidio. 127 Os marginais que invadiram a cadeia pública, por ocasião da invasão furtaram quatro revólveres, sendo três deles pertencentes a Policia Militar, e um outro a um civil. Após várias investigações, a policia conseguiu prender três dos marginais liberados da cadeia pública. O plano estava adredemente preparado com auxilio principalmente do soldado Silvestre, que invadiram a Delegacia e libertaram os presos. Os marginais presos posteriormente, confessaram a participação dos milicianos, que receberam certa importância em dinheiro para facilitar a invasão à Delegacia. A doutra Promotoria de Justiça, também entende que os indiciados pertencem só aos quadros da vida civil, como militar filiados a Policia Militar do Estado. O parecer da ProcuradoriaGeral da Justiça, opinando fosse julgado improcedente o conflito negativo de jurisdição, está apoiado em recente acórdão do Excelso Pretório que assim decidiu: «A separação do processo, para submeter os civis ao Juizo da Justiça comum e os militares ao Juízo da Justiça Militar, importaria em cindir um só e mesmo fato delituoso para transferir a apreciação e julgamento de Juízes diversos, arriscando comprometer o prestigio da Justiça. Um mesmo fato, praticado nas mesmas circunstâncias de tempo, lugar e resultado, não pode sofrer valoração diversificada». O Capítulo V, que trata da competência por conexão ou continência, em seu artigo 78, inciso IV, do C.P.P. define com acerto a competência da Justiça Mili- 128 R.T.J. — 100 tar, quando especifica que: no concurso entre a jurisdição comum e a especial, prevalecerá esta, considerando-se mesmo que é impossível cindir a ação dos coautores». Não vemos, data venta, o que reparar nessa decisão, pois também já sustentamos ponto de vista idêntico no RHC 57.624 e no RHC 57.540. Pelo improvimento é o parecer.» E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator): Acolho integralmente o parecer da Procuradoria-Geral da República que bem demonstra, não só que está superado o excesso de prazo alegado, mas também que, no caso, não há a pretendida incompetência da Justiça Militar Estadual, uma vez que se configura hipótese já examinada por esta Corte nos RHC 57.540 e 57.624, 2! Turma, relator o Sr. Ministro Decio Miranda, e em cujas ementas se lê: «Competência. Justiça Militar. Civis que, em co-autoria com OfI- dal da Força Pública Militar estadual, cometem crime militar. Impossibilidade de cisão do fato. Continência que acarreta a fixação da competência da Justiça Militar, nos termos do art. 78, IV, do CPP, e 9?, III, a, do CPM». Nego, pois, provimento ao presente recurso. EXTRATO DA ATA RHC 58.527 — PR — Rel.: MM. Moreira Alves. Recte.: João Maria de Oliveira (Adv.: Dirceu Fernandes). Ftecdo.: Tribunal de Justiça do Estado do Paraná. Decisão: Negado provimento. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Dedo Miranda. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Leitão de Abreu, Suprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 18 de novembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. HABEAS COFtPUS N? 58.809 — MG (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder Paciente: João Francisco de Macêdo — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Os bons antecedentes a que se refere o 2?, do art. 408. do C. Pr. Penal, com a redação do art. 1? da Lei n? 5.941 de 22.11.973, abrangem não só os penais, mas, também, os que se referem ao comportamento do réu como tal, isto é, o seu comportamento em face do processo a que responde. Se o réu se acha foragido, não merece havido como pessoa de bons antecedentes. Doutro lado, se o réu deixa de atender ao pessoal chamamento judiciário para o julgamento, não merece definido como pessoa de bons antecedentes. Caso em se decretou a prisão do réu pelo fato de não comparecer ao Júri para ser julgado. É legal a medida. 3. Petição de habeas carpas indeferida. R.T.J. — 100 ACÓRDÃO 129 II — Em vez de informar acerca da petição de habeas corpos, o nobre Vistos e relatados estes autos de Presidente do eg. Tribunal de JustiPetição de Habeas Corpus n? 58.809, ça de Minas Gerais houve por bem do Estado de Minas Gerais, em que remeter-me os três volumes dos aupaciente João Francisco de Macê- tos do processo criminal a que resdo e coator o Tribunal de Justiça do ponde o Paciente, autos esses que li referido Estado, decide o Supremo para me inteirar da questão suscitaTribunal Federal, por sua Primeira da pelo Paciente. Turma, unanimemente, indeferir o III — A eg. Procuradoria-Geral da pedido, de acordo com as notas jun- República oficiou emitindo este patas. recer do nobre Procurador Alvaro Augusto Ribeiro Costa, fls. 48 e 49: Brasília, 19 de maio de 1981 — «1 — Através da impetração sob Antonio Neder, Presidente e Relator. exame, o paciente almeja permanecer em liberdade até o novo julRELATORIO gamento, pelo Júri, a que deverá se submeter, por força de acórdão O Sr. Ministro Antonio Neder (Reque, para esse fim, deu provimento lator): I — O Tribunal do Júri da Coa recurso da acusação, oposto à marca de Itulutaba, Minas Gerais, sentença que anteriormente o ababsolveu o réu João Francisco de solvera (v. fls. 35/38). Macêdo. «2 — Não se verifica no caso, todavia, constrangimento ilegal ou Ao apelo do Ministério Público deu abusivo. provimento o eg. Tribunal de Justiça do Estado. — Embora primário e sem antecedentes desabonadores, sua cusPelo acórdão que proferiu no caso, tódia fora decretada através da dedeterminou aquela Casa egrégia se liberação de fls. 21, porque, deirecolhesse o Réu à prisão. xando de comparecer ao julgamenPor não se conformar com essa orto para o qual fora intimado, desdem, João Francisco de Macêdo velo cumprira uma das condições estater ao Supremo Tribunal Federal belecidas no despacho de fls. com a petição de habeas corpus de 18v./19 para o beneficio da liberdafls. 2 a 7 para impugná-la. de provisória. Sustenta: a) que é primário e tem «4 — Sendo assim, impunha-se a bons antecedentes, e que, por isso, é prisão do mesmo, como conseqüênde se lhe reconhecer o direito de percia necessária do provimento do manecer em liberdade, como expresapelo do Ministério Público, porsa o 2?, do art. 408, do C. Pr. Penal, que restabelecida a situação antede novo redigido pelo art. 1?, da Lel rior ao julgamento anulado. nt 5.941, de 22.11.1973; b) que foi ab«Pelo indeferimento do writ, dessolvido pelo Tribunal do Júri, donde sarte, o parecer.» o seu direito à liberdade, como disIV. É o relatório. põe o art. 596 daquele Código com a redação da citada Lel; c) que, mesmo fosse condenado, o seu recurso VOTO de apelação dar-lhe-ia o direito à liberdade, como se lê no art. 594 do referido Código com a redação da O Sr. Ministro Antonio Neder (Remencionada lei. lator): I — O acórdão pelo qual o eg. 130 R.T.J. — 100 Tribunal de Justiça de Minas Gerais ordenou a prisão do Paciente foi proferido em 11.12.80, 1. 35. Pois bem, aos 18.6.80, ao ensejo da Terceira Reunião da Terceira Sessão do Tribunal do Júri da Comarca de Itulutaba, o Paciente foi apregoado para se submeter ao julgamento, mas não compareceu. Verificando a ausência do agora Postulante, o MM. Juiz Presidente daquele Tribunal do Júri proferiu a seguinte decisão, f. 21: «Conforme consta da certidão do Sr. Oficial de Justiça, o acusado tivera regular intimação de seu julgamento. Acontece que o mesmo acusado estava sob o benefício da liberdade provisória, condicionada a comparecer a todos os atos do processo. Assim, deliberadamente, não comparecendo o réu a esse ato solene de seu julgamento, não mais faz jus ao benefício que lhe fora concedido. Por essas razões, revogo o benefício já referido, concedido ao réu João Francisco de Macedo, determinando que contra o mesmo seja expedido mandado para que se recolha o acusado á cadeia pública, onde o mesmo aguardará a inclusão do seu processo na próxima pauta de julgamento.» Vê-se do exposto que o eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais tinha fundada razão para ordenar fosse o Paciente recolhido à prisão. E que, deixando ele de comparecer ao Júri que deveria julgá-lo, e o fazendo sem justificar sua ausência, o Paciente perdeu a qualidade que até então podia alegar, de ter bons antecedentes. E que os bons antecedentes a que se refere o 2?, do art. 408, do C. Pr. Penal, com a redação do art. 1? da Lei n? 5.941 de 22.11.1973, abrangem • não só os penais, mas, também, os que se referem ao comportamento do réu como tal, isto é, o seu comportamento em face do processo a que responde. Se o réu se acha foragido, não merece havido como pessoa de bons antecedentes. Doutro lado, se o réu deixa de atender ao pessoal chamamento judiciário para o julgamento, não merece definido como pessoa de bons antecedentes. Deve o réu demonstrar, por sua primariedade e por seus bons antecedentes, que se comporta, normalmente, em sua vida individual, familiar, profissional e social, como indivíduo sempre atento à regra moral de conduta, e que o fato criminoso que lhe é imputado constitui um acidente que lhe não compromete a normalidade psíquica e também ética. No caso agora discutido, o Paciente foi acusado pelo MP de ser coautor de homicídio qualificado pela circunstância de o haver cometido na emboscada (entocaiado). Apesar disso, a Justiça permitiu que respondesse em liberdade ao processo. Deu-se, porém, que deixou de comparecer ao Júri para ser Julgado, embora recebesse intimação pessoal. Perdeu, é claro, a qualidade por força da qual se defendeu livre. II — Nego o habeas corpus e mando se devolvam imediatamente os autos apensados (Apenso n? 58.809). VOTO O Sr. Ministro Soares Muiloz: Sr. Presidente, estou de acordo com o voto de V. Exa. Apenas, entendo que a circunstância de o réu ser foragido não induz maus antecedentes. Entretanto, a circunstância de o réu estar sendo processado em liberdade e de 131 R.T.J. — 100 Decisão: Indeferiu-se o pedido. Votação uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mufioz, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. SubprocuradorEXTRATO DA ATA Geral da República, o Dr. Francisco HC 58.809 — MG — Rel.: Min. An- de Assis Toledo. tonio Neder. Me.: João Francisco de Macêdo. Impte.: Lincoin Avila BorBrasília, 19 de maio de 1981 — ges. Coator: Tribunal de Justiça do António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. Estado de Minas Gerais. não ter comparecido ao Tribunal do Júri autoriza a sua prisão, porque, com esse procedimento, está impedindo a aplicação da lei penal. Assim, acompanho o voto de V. Exa., indeferindo o pedido. HABEAS CORPUS N? 58.839 — MT (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Paciente: Agnaldo Coelho Júnior — Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. Criminal. — Denúncia fundada em auto de prisão em flagrante, por porte de pequena quantidade de maconha para uso do indiciado, mas desacompanhados, o auto de flagrante e a denúncia, do laudo de constatação da natureza do material apreendido com o detido. — Ilegalidade da denúncia por contrariar o 1? do art. 22 da L. 6.368/76. O auto de apreensão, nem por estar assinado por policiais, pode suprir o exame que a lei quer que Peritos Oficiais, para a prova da materialidade do delito. Deparada com Ilegalidade em processo, pode o relator, no Supremo Tribunal Federal, votar pela concessão exofficio de habeas comas. — Habeas corpos que se concede ez-offIclo para anular o processo desde a denúncia. ACORDA() RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, não conhecer do pedido e conceder a ordem ex-officio. Brasília, 15 de setembro de 1981 — Cunha Peixoto, Presidente — Clovis Ramalhete, Relator. O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: 1. Agnaldo Coelho Júnior impetrou habeas corpus ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso, contra o Juiz de Direito da Comarca de Rondonópolis, perante o qual responde à ação penal como incurso no art. 16 da Lel 6.368/76, por porte de certa quantidade de maconha para uso próprio, tendo sido preso em flagrante. 132 R.T.J. - 100 Viu ser-lhe indeferida a ordem, pelo Tribunal, com base em que o pedido envolvia apreciação da prova. 2 — Reitera o pedido, agora dirigido por petição a este Supremo Tribunal. — Queixa-se do constrangimento de estar respondendo à ação penal, por uso de entorpecente, ação ilegalmente iniciada. É que a denúncia está desacompanhada do laudo de constatação da natureza tóxica da substância, que se alega ter sido com ele apreendida. No•entanto esse laudo de constatação da natureza do produto apreendido é exigido pelo 1? do art. 22 da Lei, «para efeito da lavratura do auto de flagrante e do oferecimento da denúncia, no que tange à materialidade do delito»; mas que não foi produzido, diz a petição. 3 — De fato, pela denúncia de fls. 14/15, o paciente responde à ação penal, pois trazia consigo certa quantidade de maconha, tida como para seu uso. Preso em flagrante, o auto do flagrante delito e a denúncia não se fizeram acompanhar do Laudo de Constatação da natureza do corpo de delito apreendido, para prova da materialidade do delito. 4 — Solicitadas as informações, o Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso remeteu, adotando-as, aquelas que lhe prestara o Juiz coator. Na peça o magistrado de 1? grau havia informado ao Tribunal: «Ressalto ainda que a digna Autoridade policial não teve as cautelas devidas, quando da lavratura do Auto de Prisão em Flagrante, bem como não teve também o Promotor Público quando do oferecimento da denúncia, já que esta velo a juízo sem a prova material da infração noticiada, fato esse que contraria, sobremaneira, o já citado SI 1? do art. 22 da lei que nega a matéria. Da mesma forma, o nobre colega que respondia por esta Vara Criminal em 09-10-79, não observou a ausência da prova material do crime. Agora, este informante, no sentido de ordenar o feito, determinou a elaboração do respectivo laudo de constatação. Entretanto, tal tarefa está se tornando difícil, posto que com a mudança de Delegado de Polícia ocorrida em janeiro do corrente ano, o novo Bacharel não está conseguindo encontrar a referida substância. O certo é que em Juízo ela não se encontra». 5 — A Procuradoria-Geral da República opina, a fls. 79-82, e sugere uma alternativa: ou não se conheça do pedido, em face do art. 119, II da Constituição, pois que, por esse pedido diretamente ao Supremo Tribunal Federal, o paciente substitui o recurso ordinário, que devera ter oposto ao acórdão do Tribunal. ou caso se conheça, que se conceda parcialmente o habeas corpus, — «para anulação do processo ab initio sem prejuízo de sua renovação». É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete (Relator): 1 — O paciente impetrara, setembro de 1980, recurso de habeas corpus ao Tribunal do Estado, contra o Juiz da Comarca. Foilhe indeferido. Reitera agora o pedido, mas apresentado diretamente ao Supremo Tribunal Federal, ao qual o pedido não chega sob a forma de recurso ordinário. 2 — Há óbice a reconhecê-lo como recurso no pedido inicial, convertendo o presente habeas corpus, que recurso é, naquele recurso ordinário, e assim se estaria usando a fungibilidade dos recursos penais autorizada pelo Cód. de Processo Penal, no art. 579. R.T.J. — No caso porém, dada a perda de prazo, não é possível ao julgador transmudar um recurso em outro. 3 — Entretanto, no curso do processo verifico que o paciente sofre violência por ilegalidade. (Regimento Interno, art. 188, II). De fato, preceitua o 1? do art. 22 da Lei 6.368/76: «Para efeito da lavratura do auto de prisão em flagrante e do oferecimento da denúncia, no que tange à materialidade do delito, bastará laudo de constatação da natureza da substância, firmado por Perito Oficial ou, na falta deste, por pessoa idónea escolhida de preferência entre as que tiverem habilitação técnica». 4 — Esta exigência reitera e exige forma especial à perícia, geralmente exigida, para denúncia, nos crimes que deixam vestígio, materialidade chamada de corpo de delito. De fato, Cód. Proc. Penal, art. 158: «Quando a infração deixar vestígio, será indispensável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo supri-lo a confissão do acusado.» 5 — Ora, verifico a juntada do «Inquérito Policial» (fls. 16-38), incluído o Relatório do Delegado (fls. 37-38). E leio a Denúncia, a fls. 14/15. 100 133 6 — Não há que se pensar em suprir a nulidade, agora. Porque a informação do Tribunal a este Supremo Tribunal, dá notíciè da sua impossibilidade, à vista do extravio do que foi apreendido, «pequena quantidade de erva conhecida por maconha» (Auto de Apreensão, fls. 23). Este Auto de Apreensão não se confunde, substancialmente, com aquele outro, o Auto de Constatação da natureza da substância apreendida; (1?) — porque foi apenas apreendida sem melhor exame e pelo policial condutor com as testemunhas leigas, do flagrante; (2?) — porque a lei exige Auto de Constatação por Perito oficial, e investigador de Policia não é Perito. 7 — Pelo exposto, entendo que deparo no processo, que o paciente está sofrendo o constrangimento ilegal de responder à ação penal, iniciada por denúncia que não apresenta a materialidade da existência do delito sob a forma prescrita em lei. E nula, a denúncia. 8 — Acolho o Parecer da Procuradoria-Geral da República. Concedo a ordem, para anular o Processo. E o meu voto. VOTO (PRELIMINAR) O Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Presidente, estaria possivelmente, Desacompanhados do indispensá- de acordo, no mérito, com a apreciavel «Auto de Constatação» da natu• ção feita pelo eminente Ministro Rereza da substância, o auto de fla- lator, quanto á invalidade da prisão grante e a denúncia não bastam pa- em flagrante e quanto à conseqüente ra comprovar a materialidade do de- nulidade do processo lito, como o exige o 1? do art. 22 da O que questiono é se a concessão Lei 6.368/76. de habeas corpus, de ofício, em tais Deparo pois com a ilegalidade do condições, não importaria em conconstrangimento da ação penal, ini- tornar, de múltiplas maneiras, as ciada pela denúncia, mas com con- proibições e as normas constituciotrariedade da lel. nais, porque decorre da Constituição 134 R.T.J. — 100 que o Supremo Tribunal Federal não poderá apreciar pedido de habeas corpus, quando seja ele sucedâneo de recurso. EXTRATO DA ATA HC 58.839 — MT — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Pte.: Agnaldo Coelho Júnior. Imptes.: Manoel José Araújo Se, num caso como este, o Supre- Azevedo Neto, Rafael Eugênio de mo Tribunal Federal apreciasse e Azeredo Coutinho, José de Magaconcedesse, de ofício, ordem de lhães Barroso e outros. Coator: Trihabeas corpus, em pedidos feitos ori- bunal de Justiça do Estado de Mato ginariamente, sem a intermediação Grosso. de recurso, estaria amplamente liberado o caminho para que as impetraDecisão: Adiado o julgamento por ções fossem feitas sucessivamente, haver pedido vista o Ministro Soares infringindo uma clara disposição so- Murloz, após o voto do Ministro Relabre competência constitucional, des- tor que concedia ex-officio do conhecendo a missão fundamental Habeas Corpus e Ministro Rafael da Carta Magna, que é a competên- Mayer que dele não conhecia. Falou cia das competências. como Impte.: O Dr. José Magalhães Barroso. Em segundo lugar, isso também importaria em que o Supremo TribuPresidência do Senhor Ministro nal Federal estaria conhecendo de Cunha Peixoto. Presentes à Sessão pedido de habeas corpus no qual a os Senhores Ministros Soares Mufloz, autoridade coatora é um juiz de pri- Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. meiro grau, desbordando, igualmen- Subprocurador-Geral da República, te, ai dos limites de sua competên- o Dr. Francisco de Assis Toledo. cia. Brasília, 01 de setembro de 1981 — Quando o Código de Processo Penal — que é repetido pelo nosso Re- Antônio Carlos de Azevedo Braga, gimento — fala em concessão de Secretário. ofício, de ordem de habeas corpus, VOTO (VISTA) tem em mira conhecimento que tem o juiz de um constrangimento ilegal O Sr. Ministro Soares Multoz: Pedi no curso de um processo, outro, por exemplo, no recurso extraordinário. vista para conferir a possibilidade Não se trata do conhecimento limi- de, no caso, conceder-se de ofício o nar em uma petição de habeas habeas corpus, tal como votou o Recorptas, que teria até de não ser co- lator, eminente Ministro Clovis Ranhecida, por incompetência, e que, malhete. Concordo com S. Exa. O tendo por objeto, exclusivamente, o auto de prisão em flagrante e a deconstrangimento ilegal, redundaria núncia se acham desacompanhados no total aniquilamento da ordem do laudo de constatação da natureza processual e da ordem de competên- tóxica da substância, que se alega cias em matéria de habeas corpus. A apreendida em poder do paciente. E principal norma é a norma de com- esse exame, consoante as informapetência, e a interpretação da norma ções, dificilmente poderá ser feito, regimental não deve conduzir a seu porque a pequena quantidade da substância apreendida se acha exdesconhecimento. traviada. Acompanho, pois, o voto do Por isso, peço vênia ao eminente eminente Ministro Clóvis RamalheRelator para não conhecer do recur- te, concedendo, de oficio, o wrft para anular o processo ab initio. so. R.T.J. — 100 135 VOTO EXTRATO DA ATA O Sr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Presidente, não concedo a ordem, porque entendo que o nosso Regimento e o Código de Processo Penal, ao falarem na concessão de oficio quando o Juiz conhecer no curso de processo de ilegal constrangimento, não estão a referir-se ao processo de habeas comas, quando não tenha de ser conhecido liminarmente, porque, senão, seria a própria subversão da competência constitucional estabelecido em cláusula negativa, qual o do pedido originário como sucedâneo do recurso ordinário não interposto. No recurso extarodinário criminal, ou em qualquer recurso que o Supremo venha a conhecer, tem lugar a concessão de oficio. Mas no habeas corpus que o Supremo Tribunal não pode conhecer — para o qual não é competente, se dele conhece e o Concede, está se sobrepondo a uma norma de competência constitucional, fazendo tabula rasa das ordens de competência indicadas no texto maior com relação ao remédio heróico. HC 58.839 — MT — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Poete • Agnaldo Coelho Júnior. Imptes.: Manoel José Araújo Azevedo Neto, Rafael Eu gênio de Azeredo Cadinho, José de Magalhães Barroso e outros. Coator: Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso. Decisão: Não conheceram do pedido de Habeas Corpus e o concederam ex-officio por maioria de votos. Vencido o Ministro Rafael Mayer. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão os-Senhores Ministros Soares Miuloz, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 15 de setembro de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 58.943 — MG (Segunda Turma) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Decio Miranda. Recorrente: José Reis de Miranda — Recorrido: Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais. Penal. Perito. Funcionário público. No conceito de funcionário público, segundo o art. 327 do Código Penal, insere-se o perito judicial. Calúnia contra ele irrogada, em razão de seu oficio, é punível com o aumento do art. 141, II, e mediante a representação a que alude o art. 145, parágrafo único, do Código Penal. de julgamentos e das notas taquigráACÓRDÃO ficas, por maioria de votos, negar Vistos, relatados e discutidos estes provimento ao recurso. autos, acordam os Ministros do SuBrasília, 4 de setembro de 1981 — premo Tribunal Federal, em Segun- Djaci Falcão, Presidente — Decio da Turma, na conformidade da ata Miranda, Relator para o Acórdão. R.T.J. — 100 136 RELATÓRIO O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator) — O Dr. José Reis de Miranda, propôs, em causa própria, ação de habeas corpus, porque, denunciado pelo competente órgão do Ministério Público, à base do previsto nos artigos 138; 141, II; 67, II; 69, IV, todos do Código Penal, não cometera o crime de calúnia contra a pessoa do perito Walter de Freitas, que não é funcionário público, e, portanto, não podia o impetrante ser denunciado (fls. 2-8). 2 — Nos autos de execução cambiaria proposta a Maria de Fátima Cançado, diz-se, na denúncia, o autor da ação de habeas corpus, por via de memorial apresentado ao Juízo, advogado da executada, disse, do perito Walter de Freitas, o seguinte, verbis: «(...) o advogado que esta subscreve, apesar de infelizmente não poder provar, tomou conhecimento através de informações, de que o marido da devedora estaria pagando, ao Sr. Perito nomeado por este Juizo, a importância de Cr$ 3.000,00 ( três mil cruzeiros) mensais. Por quê? ... Para quê?...» (Denúncia, fls. 10. Destaque do original). E continua a denúncia, verbis: «Depois de incriminar, severamente, o perito-vitima, alega o mesmo advogado que «não fazemos tais afirmações aleivosamente...» depois de asseverar que «colhendo informes sobre o comportamento daquele Sr. Perito, não conseguimos obtê-los muito elogiosos e recomendáveis, deixando perceber que as informações sobre ele eram autênticas» (Denúncia, fls. 10). Aí, pois, os fundamentos da denúncia. 3 — Processada a ação proposta, a Egrégia Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais julgou improcedente a ação de habeas corpus, e denegou a ordem (fls. 50), ao fundamento, resumido, de que perito exerce função pública, e, assim, é funcionário público, para os efeitos penais (fls. 52); logo, cabia a denúncia, em vez de queixa-crime. 4 — Irresignado, o advogado José Reis de Miranda interpôs o presente recurso ordinário, em que arguiu: a) que, não sendo o perito funcionário público, não podia o Dr. Promotor Público denunciá-lo; e b) não cometera o crime de calúnia, que lhe fora Imputado. E o relatório. . VOTO O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): — Constitui fundamento principal da douta decisão recorrida, para denegar o pedido de habeas corpus, a consideração preliminar de que perito é funcionário público, para efeito penal. E o que examinarei, em primeiro lugar. 2 — Declarou-se, no Código Penal, que, verbis: «Art. 327. Considera-se funcionário público, para os efeitos penais, quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função pública». Funcionário Público, ainda que para efeitos penais, é de ser, necessariamente, a pessoa que exerça ou seja titular de poderes jurídicos inerentes à função pública do Estado. 137 R.T.J. — 100 Há de ser órgão do Estado. E pessoa que representa o Estado. E o próprio Estado, agindo, praticando actos essencialmente estatais. Funcão pública é função do Estado, posta na relação Estado Sociedade. A remuneracão e a duração da função pública não participa, a rigor, do conceito de funcionário público. São elementos secundários. De igual, a relação jurídica empregaticia, sendo termo relacional o Estado. Em suma e ao cabo de contas, fundamental, essencial, nuclear, ao conceito de funcionário público, para efeitos penais, é o ser a pessoa órgão presentativo do Estado, ao exercício de poderes jurídicos estatais. E o que penso. 3 — A meu ver, data venta, perito, em Juizo, indicado ou não pelo Juiz, não é funcionário público. O pronunciamento pericial, laudo, seja o que for, é acto de ciência especializada. Acto de saber dirigido à orientação do Juiz. E acto informativo. Nada mais do que isso. Não é acto do Estado, ou inerente às funções estatais. 4 — Partindo-se dessa fundamentação, é parte ilegítima de denunciar o Ministério Público, autor da denúncia. 5 — Diante do exposto, dou provimento ao recurso de habeas corpus, para anular o processo, a partir da denúncia, inclusive, por ser o Ministério Público parte ilegítima de oferecer a denúncia, tudo na forma da lei. E o meu voto. VOTO O Sr. Ministro Decio Miranda — Sr. Presidente, não estou longe de concordar com o eminente Relator, porque, realmente, o perito não é funcionário público, como não o são outras figuras que, apesar de despidas dessa qualidade, podem, no exercício de uma função pública, como é o caso do perito, praticar atos que para fins penais se equiparam aos atos do funcionário público. O importante não é a titularidade permanente do agente, mas a sua titularidade ocasional ou transitória. Há uma como que investidura num serviço público transitório; tanto isto é verdadeiro que o perito presta compromisso, no sentido de exercer, sob as pepas da lei, a dignidade do munas. Assim, Sr. Presidente, o meu voto, neste passo, diverge do que acaba de pronunciar o eminente Relator, o que enuncio com o respeito devido à lição proferida por S. Exa. Nego provimento ao recurso. EXTRATO DA ATA RHC 58.943 — MG — Rel.: Min. Firmino Paz. Recte.: José Reis de Miranda. (Advs.: Helvécio de Jesus Resende Chaves e outro). Recdo.: Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais. Decisão: Adiado o julgamento por haver pedido vista o Ministro Moreira Alves, depois dos votos do Relator que dava provimento ao recurso e do Ministro Decio Miranda que negava provimento. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão, os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Decio Miranda e Fir- R.T.J. - 100 138 mino Paz. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 1 de setembro de 1981 — Hélio Francisco Marques, — Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Moreira Alves : 1 — Correta se me afigura a posição dos que entendem que o conceito de funcionário público estabelecido no artigo 327 do Código Penal se aplica não apenas aos crimes praticados por funcionários contra a administração em geral, mas também a todos os demais crimes previstos no referido Código e na legislação extravagante aos quais seja ele pertinente. Nesse sentido, Inclina-se a doutrina pátria (além de Frederico Marques e de Magalhães Noronha, citados no parecer da ProcuradoriaGeral da República, veja-se também, Heleno Fragoso, Lições de Direito Penal, Parte Especial, 3! edicão, págs. 390-391). Por outro lado, na amplitude da abrangência dada pelo Código Penal ao conceito de funcionário público para os efeitos penais se enquadra o perito judicial. Esse problema tem sido aprofundado pelos penalistas italianos, que se defrontam com mais dificuldades do que as existentes em face do nosso artigo 327, uma vez que este adotou conceito unitário de funcionário público, ao passo que a codificação penal italiana faz distinção entre funcionário público, encarregado de serviço público e pessoa que exerce serviço de necessidade pública. Mas, também na Itália se entende que as pessoas, que colaboram com o órgão judicante com declarações que atestam fatos, são consideradas, para efeitos penais, funcionários públicos. É o que acentua, entre outros Antolisei (Manuale di Diritto Penale, Parte Speciale, vol. II, 3? ed., n? 176, págs. 600-601), ao prelecionar que também se consideram funcionários públicos, no campo penal, «le persone che nel processo, collaborando con gli organi giudicanil, fanno attestazioni che sono destinate alia prova: testimoni, periti, interpreti, ecc.» E Heleno Fragoso (ob. cit., ri? 1051, pág. 392), após citar Maggiore — que salienta que se a função «é tal que o sujeito forme ou concorra para que se forme a vontade do Estado para a obtenção de fins públicos, quem nela está investido se transforma em órgão da administração pública, e, somente por isso, torna-se funcionário público» —, reconhece que são «funcionários públicos o jurado (exerce função jurisdicional) e a testemunha em processo judicial.» 2 — Em face do exposto, e com a devida vênia do eminente relator, acompanho o voto do Sr. Ministro Decio Miranda, que nega provimento ao presente recurso. EXTRATO DA ATA RHC — 58.943 — MG — Rel.: Min. Firmino Paz. Ftecte.: José Reis de Miranda. (Advs.: Helvécio de Jesus Resende Chaves e outro). Recdo.: Tribunal de Alçada do Estado de Minas Gerais. Decisão: Negado provimento ao recurso, vencido o Relator. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Ministro Cordeiro Guerra. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 4 de setembro de 1981 — Hélio Francisco Marques — Secretário. R.T.J. — 100 139 RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.047 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra. Recorrente: Anazilto Paiva da Silva — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Curador. Menor. 'Inquérito policial. Não constitui nulidade a falta de nomeação de curador ao réu menor no inquérito policial que investiga crime que enseja processo de rito ordinário, mormente quando na instrução foram dadas todas as garantias à defesa. Precedente: HC 57.189 — 1 — SP. RHC improvido. 2 — Sobre não se constituir em ACORDA() nulidade a ausência de curador a Vistos, relatados e discutidos estes indiciado menor, no rito processual autos, acordam os Ministros da Secomum, como proclama o Supregunda Turma do Supremo Tribunal mo Tribunal Federal (vide: emenFederal, na conformidade da ata de ta do ilustrado Min. Rafael Mayer julgamento e das notas taquigráfino HC 57 189 — RTJ 91/476 DJ 10-9cas, á unanimidade de votos, em ne79 — 6.677), no debatido é inócua a gar provimento ao recurso. proclamação de qualquer irregulaBrasília, 21 de agosto de 1981 — ridade formal no auto de prisão em Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro flagrante, posto que a instância de Guerra, Relator. conhecimento já se concluiu com a condenação de Anazilto (vide: f. RELATORIO 6). O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: 3 — Somos pelo improvimento. Trata-se de réu condenado por crime Brasília, 13 de agosto de 1981 — de estupro com violência real, que Cláudio Lemos Fonteles, Procuraimpetrou diversos habeas corpus; o dor da República». ( fls. 55/56). primeiro de n? 58.963, não conhecido, pelo 'Plenário, e por mim relatado, f. É o relatório. 63, na consideração de que o constrangimento seria de juiz de primeiVOTO ro grau, ou poderia ser interposto O Sr. Ministro Cordeiro Guerra para suprir a falta de recursos ordi(Relator): De conformidade com nário, f. 67. jurisprudência desta Corte, HC Neste recurso postula o recorrente a57.189 — RTJ 91/476, e nos termos do a nulidade do processo, pelos motivos bem apreciados no parecer da parecer acima transcrito, nego prodouta Procuradoria-Geral da Repú- vimento ao recurso. blica, assim concebido: EXTRATO DA ATA «I — O presente recurso, também da lavra do Dr. Jayme Boa RHC. 59.047 — RJ — Rel.: Min. Vista, e elaborado em favor de Anazilto Paiva da Silva, almeja a Cordeiro Guerra. Recte.: Anazilto soltura do recorrente porque não Paiva da Silva (Adv.: Jayme Boa se lhe teria dado curador ao ato de Vista). Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro prisão em flagrante. 140 R.T.J. - 100 Decisão: Negado provimento. Unâ- mino Paz. Subprocurador-Geral da nime. República, Dr. Mauro Leite Soares. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Brasília, 21 de agosto de 1981 — Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Hélio Francisco Marques, SecretáMoreira Alves, Decio Miranda e Fir- rio. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.052 — CE (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. 1? Recorrente: Fernando Ballalai Alves Júnior — 2? Recorrente: João Holanda de Castro e outros — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Ceará. Crime. Peculato por desvio em proveito alheio. — Necessário o convencimento da irregularidade ou ilegalidade da aplicação dos dinheiros públicos, feita pelo servidor, para a caracterização da figura penal. É também imputável como réu de peculato, quem não seja servidor público, desde que haja contribuído ou participado da ação em tese criminosa, de quem o seja; será tido então e em tese como coautor. Se o Contrato com a Administração foi concluído quando vigentes condições conhecidas do Imposto de Importação de um bem indispensável à execução de contrato, mas sobreveio nova regulamentação tributária, onerosa e imprevisível, ocorreu (dato do Príncipe», o qual legitima a revisão da economia do contrato, quanto às condições primitivas. Averiguação de nulidade ou anulabllidade de Contrato Administrativo não encontra via própria na ação penal por peculato. Recurso de habeas empes que se provê, em parte, para conceder a ordem por inépcia da denúncia. ACORDA° RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: autos, acordam os Ministros da Pri- 1 — Os Advogados Raul Chaves e meira Turma do Supremo Tribunal Luiz Cruz de Vasconcelos recorrem Federal, na conformidade da ata do do Acórdão do Tribunal de Justiça julgamento e das notas taquigráfi- do Ceará, que lhes negou ordem de cas, por empate de votos, dar provi- habeas corptis impetrada em favor mento aos recursos parcialmente, de Fernando Ballalai Alves Júnior e nos termos do art. 150, III, do Regi- outros, denunciados por crime de pemento Interno, para considerar inep- culado ao Juiz Criminal de Fortaleta a denúncia. za. — O acórdão recorrido igualmente negou habeas corpus aos demais Brasília, 8 de setembro de 1981 — co-réus, servidores públicos, que o Cunha Pebcoto, Presidente — Clovis haviam solicitado pelos mesmos fundamentos. Ramalhete, Relator R.T.J. — 100 Os impetrantes alegam falta de justa causa e inépcia da denúncia. 2 — O 1? Recorrente é o diretor e representante legal do Consórcio de empresas, vencedor de concorrência pública aberta pela Companhia de Agua e Esgotos do Ceará — CAGECE, e por isso, o contratante da obra da construção do denominado «terminal oceânico», de Fortaleza. Os demais recorrentes exerciam funções de direção da empresa pública estadual, a contratante desta obra com o consórcio de empresas dirigido pelo 1? Recorrente, e são eles — Octavio Soares Falcão, João Holanda de Castro e Antonio Carlos Godinho. 3 — A empresa pública tendo aberto concorrência adjudicou a obra ao Consórcio vencedor, firmando o respectivo contrato, em 12.V.77. 4 — Os fatos que são tidos como peculado e que se imputam, em coaUtoria, ao Presidente do Consórcio e a esse grupo de Diretores da empresa pública, constam da longa peça de denúncia, passível de ser resumida. 5 — Em síntese, ocorreu o seguinte, entre as partes contratantes da obra: — O Consórcio Concic-Bouygues Offshore, em 12.V.77, firmou com a CAGECE, contrato de construção do terminal oceânico de Fortaleza. — Detalhe relevante no caso consiste em que, no Parágrafo Segundo da Cláusula XV do Contrato, o consórcio se obrigou a importar por compra ou a arrendar, a plataforma auto-elevatória «Mer d'Ivoire», especificado na proposta vencedora da concorrência, por intermédio da consorciada francêsa Boygues Offshore, que então se achava fundeada no Havre. 141 6 — Prossegue a denúncia, agora descrevendo qual o fato criminoso que imputa aos pacientes: — O consórcio, por seu Presidente Ballalai Alves Júnior, 1? Recorrente, em carta de 30.V.78 aos diretores da empresa pública contratante da empreitada, pleiteou um Aditivo ao Contrato, a fim de lhe ser ressarcido aquilo que denominou de «custos não orçados» (denúncia, fls 15). Justificou-se, o Presidente do consórcio e 1? Recorrente, com o que denominou de «imprevisão nos contratos», pois que suscedera, às condições aceitas pelas partes no contrato, quanto à importação da plataforma, do Havre, a superveniência da Resolução CACEX 590, que dispôs sobre depósito compulsório de 100% do valor da impOrtação, que era no caso orçada em 2.500.000 dólares. — Assim, informou o Consórcio e narra a denúncia —, que se tornara «impossível importar a Plataforma Submarina, a que se comprometera utilizar na sua proposta como equipamento indispensável à execução da obra». — Descreve ainda a denúncia: — o fato impusera ao Consórcio, a locação de certa Plataforma, à ECEX (denúncia, fls. 15). 7 — A seguir a denúncia historia a tramitação desta proposta de revisão contratual, pelos órgãos da empresa pública contratante, ar CAGECE. Este Aditivo velo a ser aprovado e pago, em menor valor do que o pretendido pelo consórcio empreiteiro, por decisão de algum modo envolvendo os co-réus, que à época eram dirigentes da empresa pública. 8 — Este é o fato criminoso narrado pela denúncia, como consistindo em peculato, praticado em coautoria pelo representante legal do consórcio empreiteiro, o 1? Recorrente, e pelos dirigentes da empresa pública, envolvida neste adicional de 142 R.T.J. — 100 contrato autOrIzativo de pagamento — Otomar Soares Falcão, Presisuplementar da empreitada, sob o dente da CAGECE, que não obstante título de «custos não orçados». o Parecer favorável, dado pelo serviço jurídico da empresa, para sua 9 — E de ser no entanto registrada maior certeza antes de autorizar a neste Relatório, a posição dos co- lavratura do Aditivo e o pagamento, réus, quer a do Diretor do Consórcio entendeu, conforme narra a denúncontratante, e quer a da administra- cia, de solicitar Parecer ao jurista ção da CAGECE, a empresa pública Milton Tavares, de Salvador, Bahia, o qual opinou pela legalidade do pacontratante da empreitada: gamento suplementar ern ressarci— Fernando Ballalai Alves Júnior, mento. diretor do consórcio Internacional viRegistro que a cifra afinal paga ao torioso na concorrência pública que, Consórcio montou á quantia menor em razão disso, contratou construir do que a pretendida. a obra; dele é a carta de 30.5.78 (fl. 10 — Estes os fatos narrados na 23), em que o Consórcio solicitou o a qual a todos dá como inressarcimento de prejuízos, invocan- denúncia, cursos no 312 do código Penal, do o fator imprevisível da Resolução c/c o art. 25,art. dada a co-autoria. CACEX 590, que desequilibrou inter11 — impetradas ordens de habeas namente o Contrato, e especificou, na carta, que o pagamento solicitado corpus por falta de justa causa e se destinava a custos não orçados inépcia da denúncia, os pedidos fooriginariamente na proposta à con- ram julgados em conjunto; mas recorrência, os quais era provenientes cusada a ordem, pela Camara Crido arrendamento de uma Platafor- minal do Tribunal de Justiça do Ceama Submarina, à empresa ECEX, e rá. obras de reparos nela, tudo como Os Impetrantes recorrem agora ao narra a denúncia a fls. 13/15. Supremo Tribunal Federal contra esse acórdão que lhes recusou o — Antonio Carlos Santos Godinho, habeas corpus, e cuja ementa é a segerente da GEFOR, órgão de plane- guinte: jamento e controle técnico dos pro«Habeas corpus, pacientes integramas de abastecimento d'água e grantes do mesmo processo. esgoto de Fortaleza e de seus aspectos financeiros, — como informa ainAlegações sobre inepcia da deda a denúncia, a fls. 17, e quem opinúncia e falta de justa causa. nou favoravelmente ao pagamento Crime em tese, que envolve mados chamados custos não orçados, téria de próvas, nos estreitos limirequerido pelo Consórcio empreiteites do writ. Inadmissibilidade. ro sob fundamento de imprevisão do contrato, e disso é acusado na deAmpla defesa terão os pacientes núncia; no decorrer da ação criminal. Ordem denegada». — Dr. João Hollanda de Castro, da 12— A Procuradoria-Geral da Reassessoria jurídica da empresa pública que, em Parecer jurídico, opi- pública opina a fls. 190, por seu ilusnou pelo deferimento do Aditivo em tre Subprocurador Francisco de Asressarcimento, «visto lhe ser aplicá- sis Toledo, o qual resume o alegado vel, como escreveu, a teoria da im- fato criminoso, como consistente em previsão», sendo incluido entre os Pleitear e receber com má fé, um reajuste de preço de empreitada. réus na denúncia; R.T.J. — 100 pronunciamento do Subprocurador dá noticia do Parecer fornecido para este caso, por Pontes de Miranda, quanto ao reajuste; e transcreve trecho do saudoso jurisconsulto nestes termos: «Não há qualquer elemento que se possa invocar contra a validade eficácia do contrato de empreitada e do que a ele se acrescentou, para que as circunstâncias não prejudicassem os contratantes. — Este é o meu Parecer. ( a )— Pontes de Miranda.» 13 — Após transcrever o Parecer de Pontes, sobre a legalidade e a eficácia do Aditivo do Contrato, o douto Subprocurador da República passa a opinar quanto ao aspecto penal do caso: «Colocada a questão nestes precisos termos, não vemos como capitular na figura de peculato, o fato imputado a Fernando Ballalai Não era funcionário público, não se apropriou de bem público de que tinha a posse em razão do cargo, não subtraiu bem nas mesmas circunstâncias, nem poderia tê-lo desviado, se não o detinha». acrescenta, o ilustre Subprocurador: «Ficamos no entanto na inépcia da denúncia, sem avançar o sinal sobre a alegada falta de justa causa. No habeas corpus, examina-se aspecto formal da peça acusatória», — diz o Parecer (fls. 195). 14 — Quanto aos demais impetrantes, opina o Subprocurador que, a ser verdade que cometeram o ato para satisfação de interesse ou sentimento pessoal, «cometeram pelo mênos o crime de prevaricação — art. 319, CP». Na conclusão, o Parecer da Subprocuradoria inclina-se pela concessão do habeas corpus, por inépcia da denúncia, quanto ao 1? Paciente. o relatório. 143 VOTO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: (Relator) 1 — No fato narrado na denúncia, vê-se que dirigentes de uma empresa pública do Estado do Ceará, portanto servidores públicos, decidiram a revisão para maior, do preço da obra, objeto de Contrato Administrativo adjudicada em concorrência pública. Autorizaram esse pagamento à parte privada contratante, fundados em fato que dizem ter sido imprevisível, que é atribuído à Administração Federal, o qual teria causado dano á parte contratante particular. Foram por isso denunciados por peculato, art. 312 CP, os dirigentes da Empresa Pública cearense que de algum modo participaram da decisão e da ordem do pagamento, bem como encontra-se denunciado o representante legal da pessoa jurídica privada contratante da obra pública, este por haver solicitado o suplemento de pagamento e, assim, propriciado a despesa extra-contratual, autorizada pelos funcionários denunciados por peculato. 2 — Como peculato, entende-se o mesmo crime de apropriação indébita, mas tendo servidor público por agente e, por sujeito passivo, a Administração, lesada pela apropriação ou pelo desvio, em proveito próprio ou alheio, de dinheiro ou outro bem ( art. 312 CP). A denúncia, narrando que o acréscimo ao pagamento foi deferido à empresa contratante, exclui a espécie do peculato com furto. A modalidade do crime imputado, portanto, será a do peculato por desvio em proveito alheio. — Desvio importa em irregularidade. 3 — O parecer do Subprocurador da República adverte: — «O fato do aditivo contratual ser ou não nulo ou anulável não descaracteriza por si só 144 B.T.J. — loo a destinação do dinheiro empregado no pagamento do preço da obra. De resto esta matéria, extremamente complexa, não pode ser deslindada em ação penal, o que parece ter sido objetivo da denúncia, que mais se assemelha a uma petição inicial de ação civil do que a uma formal acusação penal». Alinho-me com esse entendimento. 4 — Mas neste caso, o douto Subprocurador da República descarta do crime, o 1? Recorrente, o Presidente do Consórcio, por não ser funcionário, nem ter tido a posse do bem. Não me impressiona o suficiente, esta ponderação. Há na denúncia, como co-réus, servidores públicos que tinham a disponibilidade juriclica dos dinheiros; e figuram denunciados como co-autores do peculato. Estou em que o particular também pode figurar em denúncia de crime de peculato, se ocorra concurso de agentes, aplicáveis então os arts. 25 e 26 do Código Penal. — Neste sentido, Hungria, em Comentários, v. IX, p. 339, e Magalhães Noronha, em Código Penal, v. IV, p. 223. Por outro lado não me parece configurado que tenham os funcionários praticado crime de prevaricação (Código Penal, art. 315); pois não omitiram nem retardaram ato de ofício, nem praticaram ato contra disposição expressa de lei. 5— O deslinde do presente Recurso de habeas corpus restringe-se a verificar se estão presentes, ou não, os elementos constitutivos da figura do peculato, por desvio em proveito alheio, como decorre dos fatos narrados pela denúncia. Tratando-se de habeas corpus por falta de justa causa, há que se ver, na estrutura lógica da construção da denúncia, se os fatos narrados conduzem à conclusão da imputação do crime. 6 — Saio da leitura atenta da denúncia e do acórdão, que negou o habeas comias, com os fatos narrados, que embasam a ação penal iniciada. Veja-se: Fato relevante, declarado pela denúncia, é a data do contrato de construção da obra do terminal submarino, como resultado da concorrência pública. — Este contrato foi datado em 12.V.77, — leio-o na denúncia, a fls. 13. Outro fato relevante, também declarado pela denúncia, consiste no conteúdo da Cláusula XV deste contrato, transcrita na integra a fls. 14, pela denúncia, e na qual o Consórcio se obrigou à importação de uma certa Plataforma submarina, tal como «especificada em sua proposta técnica e outros equipamentos», — diz a denúncia. 7 — Por conseguinte, se o Contrato abrigou a obrigação, contida na proposta técnica e apresentada no curso da concorrência, referente à esta Importação da plataforma submarina, como diz a denúncia —, é então manifesto que tal proposta foi formulada pelo Cotiaórcio, na vigência da Resolução CACEX 534 de 8.XII.77, que na época não dispunha sobre depósito compulsório de 100% do valor da importação. Esta exigência só surgiu depois da adjudicação da empreitada ao Consórcio, pois foi posta em vigor, pela publicação, no DO de 22.IV.77, da Resolução CACEX 590, após o processo da Concorrência, portanto. 8 — Vê-se que a empreitada, para a qual fora aberta concorrência pública — diz a denúncia, fls. 13, e nela venceu o Consórcio Concic-Bouygues Offshore (fls. 13), correu toda ela. como ato administrativo formalizado sob a vigência da Resolução CACEX 534, de 8.XII.77, que não exigia o depósito prévio para importações. R.T.J. — 100 Assim, na verdade, a exigência contida na Resolução 590' é fato posterior e imprevisível. Causou ao contratante particular, o comportamento que vem' narrado pela denúncia (fls. 15) e que diz conter co-autoria em peculato. O diretor do Consórcio dirigiu carta a CAGECE, dizendo que se tornara a obra «bem mais onerosa» e «pretendeu da CAGECE a emissão de um Aditivo ao Contrato, aduzindo em P rime iro litigar — diz a denúncia, fls. 14 — ter sido impossível importar a Plataforma Submarina, a que se cemprometera utilizar, na sua proposta, como equipamento indispensável à execução da obra, face às instruções constantes do. Comunicado CACEX 590, que dizia respeito ao chamado depósito compulsório». 9 — Este o comportamento do Consórcio, por seu representante, e que é descrito na denúncia como sua participação pessoal no peculato. 10 — Registro que a denúncia se contradiz e colide, com os fatos que narrou, quando assevera o dolo da empreiteira no seguinte trecho de fls. 15: «Descabida e de manifesta má-fé, a pretensão, visto que a empreiteira, ao entrar na concorrência, não desconhecia a existência de uma exigência legal de depósito compulsório, para as importaerma». Se tais tivessem sido os fatos, se a concorrência tivesse tido editais já sob a vigência do Comunicado CACEX 590, — que é bem posterior —, então sim, poder-se-ia por de pé, esta denúncia. Mas se a denúncia declara que houve concorrência, que foi julgada, que a obra foi adjudicada ao Consórcio e o contrato, — ato formal final — só veio a ser assinado em 12.V.77 (de núncia, fls. 13), tenho como con- 145 seqüente qUe os licitantes, -- o Consórcio entre eles — participararn de concorrência na vigência do ComCACEX 534, de 8;XII.77; — o qual não exigia o depósito compulsório. 11 — De tudo concluo que não há Weito penal a ser apurado em contraditório da ação criminal. Trata-se no caso, de uni incidente intprevistvel, na execução do Contrato Administrativo. A empreiteira solicitou a aplicação da cláusula rebtis sie stantibuas ao Contrato Administrativo de empreitada, que tinha firmado com a empresa pública do Estado do Ceará,_eis tudo. conhecido que esta cláusula rebus ate stantibus foi resposta no mundo jurídico, durante a PI Gtterra, pelo Conselho de Estado da França, na decisão famosa do caso da Cia. de Gás de Bordeau. — Deu lugar à teoria da imprevisão, que fez fortuna em toda parte. A denúncia fala na aplicação pelos denunciados, da teoria imprevisão, ao Contrato. Eles próprios a invocam, na petição de habeas corpus, afim de demonstrar a legitimidade do aditivo ao contrato e a legalidade da revisão do preço da empreitada. certo é que, evoluindo na doutrina, a teoria da imprevisão apartouse. Distingue-se hoje, a álea extraordinária decorrente de fato imprevisivel, de uma outra álea extraordinária, a decorrente de fato da própria Administração. Esta, restaura a velha expressão do factUfn principias, «fato do Príncipe». Ambas geram efeito de indenizar, aquela mais que esta última.. — No caso presente, vê-se nos termos da denúncia, que ocorreu aos contratantes, na área estadual; um factum principia decorrente de decisão normativa tomada na área federal, no CACEX, quando passou a im- 146 R.T.J. — 100 Federal; em saber da competência funcional dos dirigentes da Empresa Pública estadual: em indagar da correta tomada de decisão da despesa. Contém, todo o complexo quadro, matéria apropriada para a Justiça Civil, mas não para a criminal, desde logo impulsionada por denúncia de peculato. 14 — Nem vejo os fatos, tal como narrados pela denúncia, o crime de peculato de desvio, antes afigurandose-me tratar de um incidente na execução de Contrato Administrativo, com decisões tomadas por seus Diretores, no exercício de sua função. O ato de uma entidade pública, se produz efeitos de imprevisível dano, Se a revisão do contrato foi nula — em obrigação contraida por outra por ilegalidade, ou anulável — por entidade pública, se agravam Con- erro ou dolo, não é a ação penal, a tratos desta outra, constitui igual- via própria para a apuração. mente «fato do príncipe». — A hipóCom tais fundamentos, conheço tese é versada por Os-waldo Aranha Bandeira de Mello («Principio de Di- dos recursos e dou provimento para reito Administrativo», v. I, p. 603). extinguir a ação penal por falta de — No caso, o Com.-CACEX 590, ato justa causa. normativo federal, de efeitos lesivos EXTRATO DA ATA sobre a obrigação de importar assumida pelo Consórcio, em Contrato RHC. 59.052 — CE — Rel.: Min. com entidade estadual, ainda que sendo ato normativo federal consti- Clovis Ramalhete. 1? Ftecte.: Fertuiu «ato do príncipe», sobre esse Con- nando Balialai Alves Júnior (Adv.: trato Administrativo estadual, — da- Raul Chaves). 2? Recte.: João Holanda a matéria que disciplinou e a da de Castro e outros (Adv.: Luiz competência da Administração Fe- Cruz de Vasconcelos). Ftecdo.: Tribuderal, hábeis legalmente para eficá- nal de Justiça do Estado do Ceará. cia sobre o Contrato, na esfera estaDecisão: Adiado o julgamento por dual. haver pedido vista o Ministro Rafael após o voto do Ministro Rela13 — Entendo, com a Subprocura- Mayer, tor que deu provimento ao recurso. doria da República, tratar-se de Falou pelo Recte.: o Dr. Raul ChaqueStfio de responsabilidade, para ves. cuia apuração a via penal é imprópria. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão Saber se o aditivo e o pagamento os Senhores Ministros Soares Mufioz, conseqüente, fundados na cláusula Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. rebus Mc stantibus, revestiram-se de Subprocurador-Geral da República o legalidade, ou não, envolve questões Dr. Francisco de Assis Toledo. jurídicas referentes à execução do Contrato Administrativo, surpreendiBrasília, 25 de agosto de 1931 — do por alteração de fato lesiva, im- António Carlos de Azevedo Braga, posta no caso pela Administração Secretário. por condição imprevisível, ruinosa à execução do contrato, e inexistente ao tempo da conclusão deste no Ceará, pelo Consórcio, com a empresa estatal co-contratante. 12 — Ato normativo é substancialmente um ato legislativo; e constituise em facttim principis. Nada o impede. Em regra gera direito indentzatório amplo, ao contratante lesado. Laubadère é incisivo: — *La loi formelle constitue de maniere Typique un «fait du prince» (*Tralté des Cont. Admm), v. III, p. 27, nota 5). R.T.J. — 100 VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Rafael Mayer: A proposta acusatória descreve crime de autoria coletiva, consistente em comportamentos de funcionários públicos em tomo da realização de um aditivo a contrato de construção de um interceptor oceânico, envolvendo onerosa remuneração adicional, motivada pela locação de uma plataforma, em contrário ao estipulado originariamente, pois o contrato primitivo previa a compra da plataforma, pela empreiteira, o que se não fez, o pagamento se fez, por meio do aditivo, fora da previsão do contrato originário, a titulo de «custos não orçados», num montante aproximado de cinqüenta milhões de cruzeiros. Diz a denúncia que, com essa operação, ilegítima face aos termos do contrato, a realizada com má-fé, tendo em mira o proveito ilícito da empreiteira, efetivamente alcançado, o Estado sofreu considerável prejuízo de ordem patrimonial. Detém-se, ainda, a descrever a participação dos diversos figurantes na consumação do crime que é qualificado como peculato (art. 312 do CP). Referindo-se aos segundos Recorrentes, denunciados, como dirigentes ou categorizados funcionários do órgão público, incumbido da administração do contrato, a denúncia diz que «concorreram para desviar, em proveito alheio, vultosa verba com prejuízo patrimonial do Estado» (fls. 21), descrevendo a conduta de cada qual, na linha do que chama uma «trama bem urdida, que ia se desenvolvendo passo a passo», em torno da aprovação, assinatura e final pagamento do aditivo, mediante a autorização daquele dos denunciados que tinha a disponibilidade do dinheiro público. 147 E a súmula do que está na peça acusatória, em matéria de narrativa, se lhe extraem as demasias e impropriedades ou o estilo farfalhante. E diante dessa substância factual, cuido inviável o trancamento da ação penal, por falta de justa causa, do mesmo modo como pareceu ao eminente Subprocurador-Geral, embora lhe houvesse sugerido tipificação diversa da que consta da denúncia. Com efeito a descrição dos fatos da proposta acusatória tem correspondência com figuras criminais tipificadas, esta ou aquela, mas parecendo-me razoável seja aquela mesma da incriminação. Em todo caso, a eventualidade de nova definição jurídica até a sentença, facultada na lei processual, afasta a argüição da impossibilidade jurídica da proposição inicial, como está. Os aspectos civis que o negócio jurídico implica não excluem nem prejudicam os aspeCtos criminais que podem envolver o comportamento dos figurantes. A circunstância de que se trate de um termo aditivo formalizado e cumprido, segundo os padrões administrativos, não impede a indagação de responsabilidade criminal subjacente. Não fosse assim, digo em tese, o aspecto formal a que necessariamente se sujeitam os atos e contratos da Administração. Importaria, per se, num 13111 of indemnity de probidade administrativa, o que não é jurídico nem ético. Pelo mesmo princípio é que a jurisprudência é referia de casos em que não se tem por inepta a denúncia por peculato, ainda que o funcionário tenha as contas aprovadas. Eliminar a eventual criminalidade dos fatos da denúncia, extremamente complexos e apurados em inquérito policial, processo administrativo e inquérito parlamentar, não encontra 148 R.T.J. — 100 âmbito adequado nos lindes deste remédio processual. Mesmo o argumento dos segundos Recorrentes, quanto à Portaria CACEX 590, está sujeito à controvérsia, quanto à correlação de datas com a feitura do contrato, além de que não é razão explicativa cabal para o que vem narrado na denúncia. Carecendo de evidências, devo afastar, data venta, o fundamento de falta de justa causa para a propositura da ação penal, pondo-me de acordo no ponto, com o douto parecer. Entretanto, no tocante ao primeiro Recorrente, o pronunciamento do eminente Subprocurador tem a denúncia como inepta com relação a ele, opinando que se dê provimento parcial para que assim fique declarado. Cuido, no entanto, data venia, que •a denúncia não é omissa no descrever a sua participação no fato, não se cingindo esta à apresentação da proposta de um anódino aditivo, pois, de acordo com a denúncia, aí reside o núcleo em torno do qual se desenvolveu toda a operação delitiva que teria resultado em proveito do Recorrente. Essa atuação, dada como vinculada ao contexto da autoria coletiva, tem indicação bastante, na denúncia, inclusive para fazer saber da acusação de que se deve defender, como se vê deste tópico: (fls. 19). «De maneira insofismável, esta comprovado que o Estado sofreu considerável prejuízo de ordem patrimonial em todo esse lastimável acontecimento. O Consórcio a sua vez, sob a Presidência do Dr. Fernando Ballalai Alves Júnior, participou decisivamente de toda essa ilicitude, sendo o principal interessado em auferir a vantagem econômica de que resultou para o Estado do Ceará, a escandalosa operação. Contando com a conivente atuação de Otomar, Godlnho e João Holanda, obteve para a sua empresa, proveito econômico ilícito, e não entregou ao pública a obra que se comprometeu a realizar em condições técnicas de utilização adequada, conforme o parecer da Sub-Comissão da C.P.I., em seu Relatório e suas Conclusões (anexos)». Ora, a atribuição de co-responsabilidade a estranho ao serviço público, por crime de peculato, sobretudo quando se trata de quem seria o beneficiário do desvio, é fato que em tese se acomoda com a lei penal. Por isso, data venta, descrevendo uma atuação que a isso corresponde, a denúncia não me parece Inepta. Finalmente, o trato do mesmo assunto, sob o prisma civil, em várias questões propostas no juízo competente, não é de molde a inibir o curso da ação penal, ainda que certos pontos possam ter ai deslinde adequado. E que a suspensão obrigatória do processo penal somente se dá quando a existência da infração dependa da solução de controvérsia sobre o estado civil da pessoa, a ser dirimida no juizo próprio, como está no art. 92 do CPP. Mas se o reconhecimento do crime depender da solução civil de questão complexa e difícil, em ações já propostas, a suspensão do processo-crime é facultativa, Pela aplicável é o art. 93. Pelo exposto, data venha, nego provimento. VOTO O Sr. Ministro Soares Mufloz: Sr. Presidente, a denúncia, segundo compreendi, imputa aos pacientes o fato de ter um deles, na qualidade de empreiteiro, recebido a importância maior do que a ajustada no respecti- R.T.J. — 100 vo contrato, e os demais, por terem, na qualidade de funcionários, contribuído para que se vulnerasse o contrato, atribuindo importância maior ao empreiteiro em detrimento do erário público. Estou em que esse fato constitui, em tese, crime e que autoriza o recebimento da denúncia tal como foi recebida. Dr. Francisco de Assis Toledo, Subprocurador-Geral da República: V. Exa. me permite um esclarecimento sobre matéria de fato? A denúncia atribui aos acusados não terem pago ou terem recebido importância maior do que a estipulada no contrato, mas sim terem pago e recebido importância em função de um aditivo contratual que a denúncia reputa nulo. O pagamento foi feito tal qual consta do contrato. O problema todo reside em saber se o aditivo é nulo ou não é nulo. Não houve um tostão acima do preço ajustado no contrato. Sr. Ministro Soares Mufioz: Reitero o que acabo de dizer. Os acusados, dois deles como funcionários e o outro como empreiteiro, participaram de uma operação em virtude da qual foi paga a um deles, com conivência das demais, importância superior à ajustada no contrato. Dr. Subprocurador-Geral da República pondera que esse pagamento foi feito de acordo com o aditivo que a denúncia reputa nulo. Ora, Sr. Presidente, o nulo é como se não existisse: o nulo não tem eficácia jurídica, não entra no mundo válido das relações jurídicas. De sorte que, se a denúncia diz que o aditivo é nulo, só a instrução irá apurar se realmente o é e se efetivamente houve essa operação que a denúncia cónsidera ilegal e criminosa e que, em tese, se apresenta como tal. Acompanho o voto do eminente Ministro Rafael Mayer, negando provi- 149 mento aos recursos data venta do eminente Ministro ClOvis Ramalhete. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Presidente): Neste caso, a importância do meu voto é decisiva, porque se trata de Recurso de Rabeas Corpus, e, empatando, há concessão. Já havia firmado meu ponto de Vista, quando dos debates e do voto do Ministro Clovis Ramalhete. Ouvi com atencão o brilhante pronunciamento de S. Exa., o eminente Ministro Rafael Mayer, agora acompanhado pelo eminente Ministro Soares Muiloz. O caso em apreço cinge-se, a meu ver, a um pedido de reajustamento em contrato de serviço público. Os diretores da companhia estatal que autorizaram o pagarnento o fizeram com base em pareceres de juristas ilustres. Podem ser civilmente responsáveis; mas, dizer-se que desviaram bens públicos ou co-meteram ilícito penal, há uma grande direfença. O problema é, pois, saber se, neste caso, há peculato ou prevaricação e estes crimes não se configuram na espécie. Poderia o ilícito penal de apropriação indébita. Mas, para que seja válida a denúncia quanto a apropriação indébita, é indispensável que se identifique aquele que ficou com a coisa, o que não ocorreu neste processo. Data venta dos eminentes Ministros Rafael Mayer e Soares Muiloz, dou provimento aos recursos para considerar inépta a denúncia. RETIFICAÇÃO DE VOTO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete (Relator): Senhor Presidente, ouvindo as ponderações de V. Exa. e a leitura do voto do Ministro Rafael Mayer, animo-me a retificar a conclusão do voto que proferi como Relator, afirmando a falta de justa cau- 150 R.T.J. — 100 Entendo que devemos retirar a sa, para entender que a denúncia foi Inepta, tanto mais que, lembrado pe- projeção prestigiosa de uma decisão lo eminente Ministro Rafael Mayer, do Supremo Tribunal Federal sobre existem ações, paralelamente e no a formação de convicção do juiz Ciâmbito civil, sobre as mesmas ques- vil. Donde a razoabilidade de, neste tões que o Ministério Público, preci- momento, aproveitar para estar na pitadamente, tentou, em denúncia honrosa companhia de V. Exa., retiinepta, colocar na ação penal. Evi- ficando a conclusão do meu voto. — dente é que, se o Supremo Tribunal Dou provimento aos recursos, parFederal se antecipar, dizendo que cialmente, por inépcia da denúncia. não haver justa causa, estará, de alE o voto. gum modo, interferindo no desenvolvimento das ações cíveis paralelas. ADITAMENTO AO VOTO Há certa razoabilidade no fundamento, que enuncio, da retificação do meu voto, com o fito de deixar o juiz O Sr. Ministro Cunha Peixoto civil, que está verificando a legalida- (Presidente): Em virtude da retifide ou não, desse aditivo de paga- cação do voto, feita pelo eminente mento, livre do peso de uma decisão Ministro Clovis Ramalhete, concordo Supremo Tribunal Federal, que do com S. Exa., no tocante à inépcia dê por falta de justa causa; pois isso, da denúncia. de modo oblíquo, significaria dizer da licitude desse aditivo contratual. Com este fundamento, que acho raEXTRATO DA ATA zoável, retifico o meu voto de Relator, na conclusão, e julgo inepta a Min. RHC. 59.052 — CE — denúncia. Clovis Ramalhete. 1? Recte.: FerBallalai Alves Júnior (Adv.: Há uma ação declaratória, propos- nando Raul Chaves). Recte.: João Holanta pelo consórcio, para que o juiz de- da de Castro e2?outros (Adv.: Luiz clare se foi, ou não, lícito, o aditivo Cruz de Vasconcelos). Recdo.: Tribuao contrato administrativo a ele ad- nal de Justiça do Estado do Ceará. judicado, com majoração de preço, dada a superveniência do fato do Decisão: Deram provimento parpríncipe. E que durante o desenvolvimento da concorrência não era cialmente ao recurso de Habeas previsto o depósito de 100% do valor Corpus, nos termos do art. 150 III de uma importação, orçada, na pró- do RI, para considerar inépta a depria denúncia, em dois milhões e Meneia. Vencidos os Ministros Rafael Mayer e Soares IVIufloz. quinhentos mil dólares. Feita a adjudicação, sobreveio a Resolução da CACEX, estabelecendo o depósito compulsório de 100% do valor da importação. Ela introduziu tamanho desequilíbrio no interior do contrato administrativo, que fez com que os licitantes, vencedores da concorrência, viessem a propor esse aditivo. Se esse aditivo foi, ou não, eivado de ilegalidade é matéria já entregue ao juiz civil. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Soares Mufloz, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 8 de setembro de 1981 — Antônio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. R.T.J. — 100 151 RECURSO DE BARBAS CORPUS Nt 59.116 — RJ (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Recorrente: Reginaldo Batista — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Prisão preventiva. Entre seus requisitos encontra-se o da proteção ft paz pública mediante recolher-se preso o réu. Hipótese em que o delito de homicidio gerou odiosidade e clima de vinganças entre familiares, coincide com os fins da prisão preventiva em proteção da paz pública. • Recurso de habeas arpes a que se nega provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do Julgamento e das notas taquigrátlcas, por maioria de votos, negar provimento ao recurso. Brasília, 15 de setembro de 1981 — Cunha Peixoto, Presidente — Clovis Ramalhete, Relator RELATÓRIO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: 1 — Reginaldo Batista, comerciário que até foi caixa na Chebade Transportes S/A, em desavença com seu Primo Washington, recebeu um tiro na perna. Tempos depois, em Campos onde reside, novo encontro; desta feita Reginaldo, pressentindo que Washington ia atirar, foi quem atirou; e Washington morreu. — Este fato criminoso incumbe ao Júri da cidade de Campos apreciar e decidir. 2 — Reginaldo encontra-se preso, preventivamente. O Juiz fundamentou a prisão no inicio do inquérito: necessidade da garantia da ordem pública e assegurar a aplicação de lei penal. Requerido, depois de tempos, o relaxamento da prisão, o Juiz não apreciou o pedido. Sobreveio toda a Instrução e depois, a pronúncia. Na sentença, o Juiz narra o fato (fls. 13/14), mas decidiu que compete ao Júri decidir o caso. E acrescenta: «Os motivos determinantes da custódia legal permanecemo ( fls. 16). 3 — O defensor do Impetrante instrui o pedido com documentação tendente a demonstrar a personalidade do acusado. Declaração abonadora, da empresa em que esteve ultimamente empregado, em que era caixa, e «nada existindo que possa desabonar a conduta.» Um outro, da empresa Equipo, no mesmo sentido. Certificado da Secretaria de Educação e Cultura da conclusão de curso na. Escola Supletiva Saldanha da Gama. Curso de «motivação pessoal,» no Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Pessoal. «Diploma de Honra», passado pela Escola Supletiva, da Secretaria de Educação e Cultura, — «como prémio pela sua irrepreensível conduta». — Diploma de curso de datilografia — Titulo de Técnico em Contabilidade, pela escola oficial Já referida (fls. 17/22). 4 — Impetrada ordem de habeas corpus o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro negou-a, após ouvido o Juiz, que informou que a desavença entre os primos, dos quais um morreu, está ampliada para a familia, 152 R.T.J. — 100 tudo devido a questões de imóvel. Na informação, escudado no Promotor que servira em ambas as Comarcãs, Juiz fala em «confronto entre membros da família Batista» que «está tomando foros de vindita» (fls. 34), com fatos ulteriores envolvendo Irmãos das partes do drama do lio- lo já causado pelo homicídio e prejudicar o processo. O Juiz e o Promotor da Comarca deduzo que são neste caso os melhores censores. Ambos dão notícia do perigo à paz pública, decorrente de livrar-se solto o réu, enquanto perdura a odiosidade e desejos de vingança, entre membros da família. A contragosto, nego provimento ao recurso E o meu voto. Conclui por dizer que os motivos da custódia permanecem e não aplica o facultativo do §2? do art. 408 do Código Penal. 5 — Como relatado, o Tribunal de VOTO Justiça negou a ordem, donde o recurso, no qual a Procuradoria-Geral O Sr. Ministro Cunha Peixoto da República opina pelo não provi- (Presidente): Data venta do eminente Relator, vou discordar de seu vomento. to. Não é possivel negar a liberdade E o relatório. ao paciente, só porque a família da vítima ameaçou vingar. Acabaríamos com a liberdade provisória; basVOTO taria que a familia da vitima dissesse que, solto o réu, o mataria. Data O Sr. Ministro Clovis Ramalhete venta, acho que isso não é-argumen(Relator): Nego prOvimento. Não há to para se negar a liberdade provisóilegalidade na prisão decretada. O ria. Nunca se deu prisãO preventiva Acórdão manteve a decisão do Juiz, para garantir o réu. À conclusão o qual revela conhecimento imediato contrária acabaria com o objetivo da dos fatos na localidade da personali- Lei Fleury. A ordem pública, neste dade do réu, fundada a prisão, no ca- caso, pão justificaria a negativa de so, na tutela à paz pública. pedido de liberdade provisória, que é Entendo insuficientes, como requi- um direito, hoje, do acusado no Brasito determinante de prisão preventi- sil. va, a estrita presença da mataria/1Dou provimento ao recurso. dade do delito e a exclusiva prova da autoria que são pressupostos da proCONFIRMAÇÃO DO VOTO cedibilidade, assim Isolados. Fundado apenas neles Seria autorizar a anO Sr. Ministro Clovis Ramalhete tecipada condenação, e pospor a ela, (Relator): Senhor Presidente, eu me o desenvolvimento da defesa. penitencio da insuficiência do meu Prisão preventiva é necessidade relatório. Da leitura do processo, reda polítka penal, mas constitui me- sulta que a odiosidade também está dida eitcepcional. animando o paciente. Uma vez solto, Há que formarem o quadro, outros em confrontação com seus parentes, elementos, de lei, como a proteção à na pequena cidade de Campos, ele paz pública e o resguardo da ação próprio poderá repetir o delito. penal. Mantenho o meu voto, em proteção No caso presente, entretanto, mal- à paz pública, que poderia vir a ser grado o bom passado do paciente, a perturbada. Tomo conhecimento da atual odlosidade pode ampliar o aba- situação trazida ao processo pelo 153 R.T.J. — 100 Promotor, que serviu numa Comarca e na outra, e acompanhou o desenvolvimento da quizilla entre as famílias, até mesmo a questão possessória referente a terras. Por isso nego provimento ao recurso, apesar da minha notória inclinação liberal em matéria de habeas corpus. Essa gente poderá ser vitima do próprio Ódio, do próprio sentimento de indignação. E melhor deixar serenar os ânimos, até que o Júri decida. EXTRATO DA ATA RHC 59.116 — RJ — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Recte.: Reginaldo Batista (Advs.: Sebastião Tavires Campista e outro). Recdo.: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Decisão: Negaram provimento ao recurso de Habeas Corpus. Vencido o Ministro Presidente. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Soares Mufloz, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 15 de setembro de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.175 — RJ (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Recorrente: Eduardo Alberto Arvid Johnston — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro. Cr minai. — Habeas Corpus contra ordem de prisão preventiva. Cabe ás instâncias superiores, o controle da presença, em cada caso, dos requisitos autorizativos do decreto de prisão preventiva pelo Juiz. Se resulta de laudo psiquiátrico a convicção da permanência de periculosidade do réu, à paz pública, com iminente perigo, deve ser mantida a ordem de prisão cautelar. — Recurso de habeas corpus a que se nega provimento. ACORDA() RELATORIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do Julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e lhe negar provimento. O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: Em favor de Eduardo Alberto Arvid Johnston, os ilustres Advogados Nélio Roberto Seidl Machado e Gerardo de Majela Melo Fortes, impetraram habeas corpus ao Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, fundados em falta de justa causa para mantê-lo em prisão preventiva, à disposição do Juiz da 4! Vara Criminal, no Rio de Janeiro. 2 — A custódia preventiva decorre de decisão do Juiz que preside o su- Brasília, 01 de setembro de 1981 — Cunha Peixoto, Presidente — Clovis Ramalhete, Relator 154 R.T.J. — 100 mário por crime de homicídio, de que é acusado o Paciente de haver cometido contra a sua ex-esposa, Christel Arvid Johnston, em 09 de março deste ano. 3 — O Paciente, consta dos autos, após o crime viajou para São Paulo, mas passada a pertubação inicial, regressou ao Rio e apresentou-se ao Delegado que presidia o Inquérito. Este já havia realizado buscas do Réu e, por não bem sucedidas, requereu ao Juiz da 4! Vara Criminal a prisão preventiva. O mandado não chegou a ser cumprido, dada a apresentação espontânea do acusado. 4 — Os Advogados impetrantes solicitaram a revogação da prisão preventiva. O juiz manteve-a por entender que persistiam as condições que lhe haviam ditado a decisão. 5 — Argumentam os impetrantes, que a prisão foi decretada no inicio do Inquérito Policial, que constituira, aos olhos do julgador, uma dada versão dos fatos. Mas que o contraditório é de lei, na ação penal e, ademais, a fase do Inquérito Policial é aquecida pelo estrépito e sensação da eclosão do crime. Passada a situação e encerrado o sumário de culpa, entendem não subsistirem as razões do decreto de clausura preventiva. Aduzem que a presunção de inocência dos acusados até a sentença, que os convença, torna mais odiosa a prisão preventiva, sendo que, no caso, o direito a defender-se solto é pleiteado por indivíduo primãrlo, comerciante, estabelecido com negócio de comissaria aduaneira e assessoria de importação e exportação. Foi juntada documentação comprovante. 6 — Os sucessivos pedidos de reconsideração de custódia preventiva, o Juiz Presidente do 4? Tribunal do Juri indeferiu, tendo os patronos reiterado o entendimento da desnecessidade da custódia de réu que se apresentara espontaneamente. 7 — No recurso, não foram os impetrantes melhor sucedidos, quando o Tribunal decidiu: «HC — Prisão preventiva: ninguém melhor que o Juiz do Processo para aquilatar da necessidade ou conveniência da medida. Decreto fundamentado. Descabimento de sua revogação. Denegação da ordem». (as. 102). 8 — Deste acórdão, recorrem. A Procuradoria-Geral da República oficiou a fls. 120, opinando pelo não provimento do recurso, já que o Juiz, no decreto da prisão, fundamentou tê-lo feito em garantia da ordem pública e por conveniência da instrução criminal. 9 — Peça fundamentada, a ser apreciada, é o despacho de prisão, pois contra ele é que se impetrou a ordem de habeas corpus e, agora, recorre-se. A fls. 42, diz o Magistrado que se acham presentes os dois requisitos da faculdade da lei, ao Juiz, constantes do art. 312 do Código de Processo Penal para a prisão preventiva, a saber, a prova da materialidade do crime — o homicídio, e os indícios da autoria atribuível ao ora Paciente, Eduardo Alberto Arvid Johnston. E fundamenta a decisão. Quanto à garantia da ordem pública, convenceu-se de que a prisão preventiva do- então indiciado se impunha, pelos fatos antecedentes já apurados no Inquérito, da violenta passionalidade do acusado, voltada não somente contra a esposa, a qual matou, mas também contra a pessoa do pai desta, seu ex-sogro, envolvido também na tragédia da família. E registra o despacho (fls. 42) que diz a testemunha «Carlos» a fls. 11 do Inquérito, que o Paciente «no dia seguinte ao crime tal testemunha via o indiciado na porta do prédio onde trabalha o pai da vitima». Acrescen- R.T.J. — 100 ta o despacho que a vitima havia solicitado proteção policial, dizendo-se ameaçada de morte pelo ora paciente, mas desatendida veio a sucumbir a seus disparas. Aduz o Magistrado: ao ato praticado pelo indiciado é revelador de que sua presença, em liberdade constitui-se em uma efetiva ameaça». Decidiu a prisão preventiva, diz, que «não somente para garantia da ordem pública, como ainda para conveniência da instrução criminal.» Este o resumo da longa inicial dos impetrantes e suas razões de recurso, o do acórdão e do despacho decisório da prisão. A Procuradoria-Geral da República é contrária ao deferimento do pedido. E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete (Relator): 1. Decretação e revogação de prisão preventiva constituem faculdade do Juiz do Júri, a ele atribuída pelo art. 408 e § 2? do Código de Processo Penal, ao sentenciar a pronúncia, podendo não prender o pronunciado se for primário e de bons antecedentes, ou revogar sua prisão, neste caso, se já se encontrar sob custódia. E faculdade atribuída ao Juiz, por lei. 2 — Entretanto, tratando-se no caso da prisão preventiva de violenta inversão dos fatos, o do encarceramento preceder ao julgamento, estou em que, às instâncias Superiores, cabe a verificação da legalidade da decisão de cada caso, buscando a adequação do despacho decisório, à presença dos requisitos legais desta prisão antecipada, que, sem dúvida, deve constituir ato excepcional numa sociedade juridicamente organizada. 155 3 — «Ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem de autoridade competente», — garante a Constituição (153, § 12); e o juiz «a relaxará se não for legal» — insisteme ainda a Constituição — A instrução criminal será contraditória, assegura ela, a todos (153, § 16). Tal regime de garantias, é pelmeiro constitucional, e só depois, legal. Está a indicar, às instâncias superiores, que a faculdade atribuída ao Juiz, de decretar prisão preventiva, não assegura o pleno arbítrio dele, nesta decisão extrema. Donde, a verificação controladora, pelas instâncias hierárquicas acima do Juiz, dos pressupostos de lei para seu despacho ordenatório de encarceramento cautelar. 4 — No caso de homicídio presente, a decisão de prender antecedeu a sentença de pronúncia. Não é pois senão o caso dos arts. 312 e seguintes do CPP, que se tem sob as vistas. Aqui não se trata então, como pressupostos que conduzem a faculdade do Juiz, o acusado ser primário e ter bons antecedentes, como o quer o § 2? do art. 408 do CPP, no ato da pronúncia. Narram os Impetrantes que estava ainda em curso, o Inquérito. E logo o Juiz decretou a prisão preventiva. Convencera-se de que era o caso de garantir a ordem pública e a conveniência da instrução do processo, à vista de depoimentos já colhidos no Inquérito Policial. 5 — Terminado o Inquérito, concluída a prova acusatória os patronos requereram a reconsideração do despacho, a fim de que se livre solto, o acusado. 6 — Cabe indagar se proceda, a convicção do Juiz, da permanência dos motivos que o convenceram, apoiado pelo acórdão recorrido. 156 R.T.J. — 100 10 — Ora, é a defesa quem autenti7 — Tratando-se de efeito legal de prova simples, não sendo operado ca, com esta prova cientifica, a suexame de prova complexa e contra- posição do Juiz sobre a permanência ditória, entendo que, sempre que ale- da periculosidade do acusado à orgada falta de justa causa em habeas dem pública, com ressaibo vingativo comias, é admissivel o exame da agora contra o sogro, com sentimento auto-destrutivo voltado em despeiprova direta. to pela rejeição do próprio filho. 8 — No caso sob julgamento, convenci-me da razão que teve o 11 — Saio do exame dos fatos, a Juiz, mantida pelo acórdão recorri- que minha função judicante me comdo, ante a leitura do despacho e de peliu, tomado pela acabrunhante documentos com ele condizentes. convicção de que, se é certo que em geral os passionais não reincidem e Homicida passional, o acusado, esvaziam-se, exangues, em remorso lembra-me o caso dele, a lição dos e auto-acusação, após eliminarem o maiores em criminologia, de que a objeto de seu. amor — lição que me descarga emocional do homicídio do dão os clássicos de psicologia judiente amado, em regra esvazia a pe- ciária, no tema, e aos quais os penariculosidade do delinqüente, que se listas excessivamente abstratos, depõe sem mais dispor do objeto de masiadamente legistas repressivos sua contraditória pressão emocional, contradizem, — se tudo me parece que o fez matar a quem ama. — Um certo, quanto aos passionais em gepassional não reincide. ral, quanto a este Paciente, no entanto, a ele me volto, cheio da soli9 — Não obstante, foi no caso tra- dariedade que os desgraçados me zido aos autos pela defesa, um Lau- inspiram; e nego-lhe a ordem a fim do Psiquiátrico sobre o estado do Pa- de que, tal como teme o Juiz e teme ciente, após a tragédia em que ma- o acórdão recorrido, não vá ele tou sua ex-esposa, à qual se vincula- acrescentar mais fatos, a seu inforva por um envolvimento emocional, túnio. obsessivo e violento. homem precisa de tratamenAssina esse laudo, o renomado Do- to.Esse Não o que fazer, por ora, cente de Psiquiatria Rawlison Pres- com seu tem direito de ir livremente, petes Lemos. las ruas da cidade. Descreve o estado depressivo, viziConheço do recurso e nego provinho de idéias de auto-extermínio, que no momento corroem' o Paciente. Co- mento, por haver constado a presenmo etiologia da síndrome depressi- ça dos requisitos de lei, para a priva, o Psiquiatra adianta estar pre- são preventiva, nos termos do art. sente — «a decorrência de antigas e 312 do Código de Processo Penal: a graves desavenças com a ex-esposa garantia da ordem pública e a cone com os sogros — que culminaram veniência da instrução criminal. com a trágica morte de D. Christel». E o voto. Que o filho do acusado «se recusa a sequer ouvi-lo no telefone, depois de EXTRATO DA ATA se ter constituído no objeto do extremado amor do seu pai». Conclui o FtHC 59.175 — RJ — Rel.: MM. Cloconhecido clinico, que o acusado apresenta «quadro depressivo — an- vis Ramalhete. Ftecte.: Eduardo Alberto Arvid Johnston ( Advs.: Nélio sioso». R.T.J. — 100 157 Roberto Seldl Machado e Gerardo de Presidência do Senhor Ministro Majela Melo Fortes). Recdo.: Tribu- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão nal de Justiça do Estado do Rio de os Senhores Ministros Soares Mulloz, Janeiro). Rafael Mayer, e Clovis Ramalhete. Subprocurador-Geral da República, Decisão: Conheceram do recurso o Dr. Francisco de Assis Toledo. mas lhe negaram provimento. DeciBrasília, 1 de setembro de 1981 — são unânime. Falou pelo Impte. o António Carlos de Azevedo Braga, Dr. Nélio Roberto Seidl Machado. Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.191 — PB (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Recorrente: José Guilherme, vulgo «Dedé» — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. Criminal. Crime de dano. — Sendo o dano de pequena valia e estando ressarcido pelo responsável, antes da denúncia, é de ser julgada extinta a punibllidade. — Decidir-se como tendo força de extinguir a purabilidade, o ressarcimento do dano de pequena monta, é entendimento de estimulo ao encerramento de controvérsias e cabe no poder criativo dos juizes na aplicação da lei penal. — Recurso de habeas torpes que se conhece e provê. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso, e dar-lhe provimento. Brasília, 15 de setembro de 1981 — Cunha Peixoto — Presidente — Clovis Ramalhete — Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Clóvis Ramalhete — O caso é cómico. Numa pequena cidade, o Juiz, dizem que implica com o Prefeito e o Delegado. Então surge o popular De- dé, que corta folhas da palmeira do pátio da Prefeitura. Dai, se arma a disputa judicial. Não fosse a austeridade desta Corte, no relatório eu tomaria de empréstimo ou a pena do cronista Stanislaw Ponte Preta ou uma câmera de cinema de diretor de comédia italiana. Passo a relatar. José Guilherme viu ser indeferido pelo Tribunal de Justiça da Paraíba o pedido de habeas corpus contra a denúncia por crime de dano, que o Promotor da Comarca ofereceu contra ele, ao Juiz, por haver cortado palmas da copa de uma pequena palmeira, que cresce no pátio externo do prédio da Prefeitura de Magoa Grande. — Por isso agora, recorre, no prazo de lei. 158 R.T.J. — 100 2 — A poda na copa da pequena palmeira ocorreu em 16 de setembro do ano passado. O Prefeito logo chamou o autor do dano à responsabilidade. Por isso, José Guilherme em carta pediu desculpas pelo ato ao Prefeito e dispôs-se a reparar o prejuízo. Prefeito, João Basco Carneiro, mandou que peritos avaliassem o prejuízo. Estes concluíram pela quantia de Cri 200,00. E foi paga pelo recorrente, e recolhida aos cofres da Municipalidade. Prefeito enviou então ao Delegado um ofício tudo relatando, — as desculpas, a avaliação, o ressarcimento; — e declarou que não mais pretendia que se procedesse contra José Guilherme. Deu então por encerrado o caso da palmeira. (doc. 1, fls. 8). 3 — Mas sucedeu que o Juiz então baixou Portaria. E determinou ao mesmo Delegado que abrisse Inquérito. Este ato do Juiz surgiu três meses depois de reparado o dano, conforme oficio em que o Prefeito se deu por satisfeito (Portaria do Juiz, fls. 9). -- O Delegado, só devido à Portaria do Juiz, determinou a formal instauração do Inquérito (doc. do Delegado, fls. 7). 4 — O advogado Renato Galdino da Silva impetrou então uma ordem de habeas corpus ao Tribunal de Justiça, ao ver o Paciente incriminado em denúncia por crime de dano, que foi recebida. Alegou estar o Paciente prejulgado por esse Juiz. Assevera que esse Magistrado vive «às turras» com o Delegado e o Prefeito do lugar. Fundamenta o habeas corpus em inépcia da denúncia, à vista de que não existe a queixa do Prefeito; multo pelo contrário. Tribunal de Justiça da Paraíba, negou a ordem de habeas corpus, pois que se trata de crime de dano contra bem do Município — que tal é a pequena palmeira, com suas folhas decepadas. — Diz o acórdão que o habeas corpus não é remédio próprio para dirimir a questão de direito suscitada pelo despojamento da copa da pequena palmeira do pátio da Prefeitura. 5 — Tendo o Impetrante recorrido ao Supremo Tribunal Federal, a Procuradoria-Geral da República em certo e preciso Parecer do Dr. Cláudio Lemos Fonteles, opina pelo provimento do recurso para a concessão do habeas corpus à vista do oficio do Prefeito e considerado o comportamento do Paciente com o ressarcimento do dano e seu pedido de desculpas, pela falta. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete — (Relatar) — 1 — A denúncia deu inicio à ação penal, mas após o ressarcimento do dano. O prejuízo às folhas da pequena palmeira montou em Cr$ 200,00, segundo a avaliação na Prefeitura. E a Administração declara-se integralmente indenizada pelo autor da danificação. O caso dos autos dá noticia do ato inconsiderado que praticou o Paciente e ora Recorrente, ao cortar folhas da copa da pequena palmeira, que viceja no pátio da Prefeitura. O dano, que é de pouca monta, foi avaliado e reparado pelo Paciente, até mesmo antes da abertura do Inquérito. 2 — Tudo visto e considerado, e tal como na Súmula 554, e na jurisprudência do STF sobre cheque sem provisão e ainda, como na lei, quanto a peculato culposo, se o dano ao patrimônio público é reparado antes da denúncia, também no caso de crime de dano de pequena valia, sou do entendimento de que, caso seja ressarcido o prejuízo antes da denúncia, se tenha por extinta a punibilidade. R.T.J. — 100 159 E sábia a criação da jurisprudên3 — Na questão trazida pelo precia desta Corte quanto à extinção da sente recurso, sou da opinião que, punibilldade por emissão de cheque tratando-se do apoucado valor da cosem provisão, no caso de o paga- pa podada da pequena palmeira que mento anteceder à denúncia. Nesse integra o patrimônio municipal, sensentido RHC 49.104, 51.231, 53.160, do o réu primário e havendo ele re53.604 e 82.663 (RTJ 60-654, 66-402, 73- parado o dano mediante avaliação 115, 75-732 e 77-648, corresponden- pela autoridade —, deve ser considetes). rada extinta a punibilidade, já que a Igualmente manda a Lei penal que indenização foi anterior ao início da ao Estado faleça a sua pretensão pu- ação penal pela denúncia. E o voto. nitiva, no caso de peculato culposo, se o ressarcimento ocorrer até a senEXTRATO DA ATA tença irrecorrivel (Código Penal, 3?, do art. 312). A reparação do dano dá causa à extinção da punibilidade. RHC 59.191 — PB — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Recte.: José GuiTais incentivos à reparação produ- lherme, vulgo «Dedé». (Adv.: Renato zem estímulo que é socialmente útil. Galdino da Silva). Recdo.: Tribunal O mesmo, criação da jurisprudên- de Justiça do Estado da Paraíba. cia, deve ser aplicado aos casos de Decisão: Conheceram do recurso e crime de dano, mormente aos de pe- lhe deram provimento. Decisão unâquena valia. Nem se diga que a im- nime. precisão do que se entenda por *pePresidência do Senhor Ministro quena valia» impede a prévia defini- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão ção do crime. os Senhores Ministros Soares Mufloz, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e A Lei penal, ela própria, refere-se Nérl da Silveira. Subprocuradora estelionato de «pequeno valor» no prejuízo (11 1?, art. 171). Igualmente Geral da República o Dr. Francisco na lei penal, o furto de pequena valia de Assis Toledo. Brasília, 15 de setembro de 1981 — merece trato benevolente que não abre portas de prisão a culpado (Có- Antônio Carlos de Azevedo Braga — Secretário. digo Penal, art. 155, I 2?). RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.199 — MG (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda. Recorrente: Isalas Cipriano da Silva — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais. Penal. Menor inimputável. Anulado o processo pela menoridade do agente ao tempo do crime, depois de cumprida cerca de metade da pena e atestando o estabelecimento penai a plena recuperação do paciente para a sociedade. Concessão de «habeas comuto), para que a soltura do paciente não fique condicionada à sua apresentação ao Juiz de Direito de Comarca distante, para eventual consideração de medidas que, na situação atual, não teriam sentido. 160 R.T.J. — 100 ACÓRDÃO tTistos, relatados e discutidos estes autos, ao:ordem os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata de julgamentos, e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, prover o recurso para lhe conceder a ordem nos termos do voto do relator. portador da carteira rosa de 1! Classe, conferida, ao mesmo pela Comissão de Classificação e Tratamento do Estabelecimento», e, mais, «que o referido sentenciado presta serviços na Secretaria do Estado do Interior, no Almoxarifado, com zêlo e dedicação.» (fls. 4). No primeiro Recurso de habeas corpus (n? 58.968, de que também fui Brasília, 18 de setembro de 1981 — relator, julgado em 16 de junho do Djaci Falcão — Presidente — Decio corrente ano), meu voto, com apoio Miranda — Relator. da Turma, negou a ordem, pela consideração de que «o art. 99 da Lel n? RELATORIO 6.697, de 10-10-79 (Código de Menores) autoriza o encaminhamento à autoriO Sr. Ministro Decio Miranda — dade judiciária — o Juiz de Menores Pela segunda vez, o Dr. Adalberto — do menor de dezoito anos a quem Ferraz, advogado judiciário da Peni- se atribua a autoria de infração petenciária de Neves, dirige:se ao Su- nal, para fins de apuração da mespremo Tribunal em favor do preso ma (art. 100) — sendo certo que, paIsalas Cipriano da Silva. ra os efeitos da referida lei, deve ser considerada a idade do menor à data Trata-se de paciente que, co-autor do fato — cabendo àquela autoridade de bárbaro latrocínio, veio a ser con- determinar as providências, quanto denado a pena de 21 anos de reclu- à sua liberdade, que melhor atensão dam a seus Interesses» No curso da execução penal, e Desta vez, o parecer da Procuraquando cerca de nove anos de cum- doria-Geral República, da lavra primento da pena já haviam decorri- do Dr. AlvarodaAugusto Ribeiro Costa do, foi o processo anulado, por se ve- e aprovação do Dr. Francisco de Asrificar que o paciente era menor, sis Toledo, oficia pelo provimento do inimputável, ao tempo do fato. recurso, para que, deferido o writ, se imediato alvará de soltura Anulando o processo, o Tribunal expeça favor do paciente, a ser cumprilocal determinou fosse o paciente em do se por al não estiver preso e sem conduzido, da Penitenciária das Ne- prejuízo medidas que o Juiz de ves, em que se encontra, à presença Menoresdas de Caratinga venha a endo Dr. Juiz de Direito da Comarca tender cabíveis.» (fls. 37-42). de Caratinga, goro da ação penal e É o relatório. da execução. Essa providência se perde, todavia, em desencontros burocráticos e o paciente continua preso, já com nove anos de cumprimento da pena anulada, tendo se casado no curso da execução penal, e atestando o estabelecimento penal que «vem mantendo nesta Penitenciária ótimo comportamento carcerário, sendo VOTO O Sr. Ministro Dedo Miranda (Relator) — Dou provimento ao recurso, para que a soltura do recorrente independa de sua prévia apresentação ao Dr. Juiz de Direito da Comarca de Caratinga. R.T.J. — 100 A ressalva de eventuais providências a cargo do Juiz de Direito de Caratinga diria respeito a medidas de segurança que, no quadro descrito no relatório, não mais teriam propósito, podendo, até, representar detrimento à plena reincorporação do paciente à sociedade. Ele está radicado, pelo casamento, pelo cumprimento da pena, e pelo trabalho, na região de Belo Horizonte, no centro do Estado, e fazê-lo trasladar para apresentação ao respectivo Juiz de Direito, à Comarca de Caratinga, na região leste, palco de seu antigo crime, para eventuais medidas de segurança, que, de resto, nosso aparelhamento assistencial não tem condições de executar, seria providência totalmente inútil, além de altamente prejudicial à situação de aparente recuperação, em que se encontra o recorrente. Dou provimento ao recurso para conceder a ordem, determinando se 161 , expeça alvará de soltura ao paciente, se por al não estiver preso. E o meu voto. EXTRATO DA ATA RHC 59.199 — MG — Rel.: Min. Dedo Miranda. Recte.: Isaias Cipriano da Silva. (Adv.: Adalberto Ferraz. Recrio.: Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, Decisão: Provido o recurso para conceder a ordem nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 18 de setembro de 1981 — Hélio Francisco Marques — Secretário. HABEAS CORPUS N? 59.219 — DF (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda. Paciente: Odilon Ferreira da Cunha — Coator: Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Processual Penal. 1) Prazo judicial. Publicação do acórdão embargável no órgão oficial com a só indicação «Defensoria Pública* e omissão do nome ou número do Defensor Público encarregado do caso. Nulidade da intimação. 2) Condenado em decisão não-unânime, proferida na apelação do Ministério Público, permanece o réu em liberdade enquanto oferece embargos infringentes. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigrãficas, à unanimidade de votos, conceder a ordem. Brasília, 18 de setembro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Dedo Miranda, Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Decio Miranda: Condenado o paciente em apelação, por maioria de votos, à pena de quatro • 162 R.T.J. — 100 anos de reclusão pela prática de lesão corporal seguida de morte (art. 129 3?), a noticia da publicação do respectivo acórdão foi inserida no «Diário da Justiça» com a menção «Adv.: Defensoria Pública», relativamente ao órgão encarregado da defesa. Dai o presente habeas corpus, originalmente apresentado ao Colendo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e por este encaminhado ao Supremo Tribunal Federal, após dèbater e afastar a competência do Plenário daquele Colegiado. A Procuradoria-Geral da República, em parecer do Procurador Claudio Lemos Fonteles, com aprovação do Subprocurador-Geral Francisco de Assis Toledo, oficia pela concessão da ordem verbis: 4 — Quanto ao mérito, procede a pretensão. 5 — Caracterizado fica que a intimação do julgado colegiado fezse sem a individuação do Dr. Defensor Público — vide: (fls. 6), e assim tal realidade caracteriza cerceamento de defesa porque é da lavra do ilustrado Min. Dedo Miranda orientação jurisprudencial, que assim se põe. verbis: «Processual Penal. Prazo judicial. Publicação do acórdão no órgão oficial com a só indicação Defensoria Pública e omissão do nome do defensor dativo ou número do Defensor Público. Nulidade da intimação do acórdão». (H.C. n? 57.828 D.J. 23.5.80, 3.733). 6 — Pelo deferimento do pedido para que se proceda à intimação nominada, pela publicação, ou pessoal do Dr. Defensor Público, sendo irrelevante a ponderação do ilustre Des. Waldir Meuren, como está à fls. 33 de que o Dr. Defensor Público teve vista dos autos, porque ali mesmo se diz que a Defensoria Pública assim foi convocada a examinar a conta, em execução e, de qualquer forma, não se tem a plena certeza de que o Defensor Público em exercido na Vara das Execuções Criminais fora o mesmo que desempenhara o patrocínio do réu, na Instância recursal. 7 — Reitera-se o deferimento do pedido». (fls. 42-4). E o relatório. «1 — Em favor de Odilon Ferreira Cunha, o Dr. Biron Cardoso Leite ajuizou pedido de habeas corpus, relevando cerceamento de defesa porque não intimado pessoalmente o Dr. Defensor Público da decisão condenatória, lavrada na instância recursal. 2 — Declarada a incompetência da Turma, os autos foram remetidos à composição plenária do Tribunal de Justiça do D.F. — fls. 24 — que, por maioria, não conheceu da anpetração, remetendo-a a exame da Suprema Corte (vide: fls. 27). 3 — Efetivamente, quer a Turma, quer o Colegiado em sua exVOTO pressão total, jamais poderiam apreciar o writ, porque a Turma Criminal do sodallcio, a nivel de O Sr. Ministro Decio Miranda (Rerecurso de apelação, esgotara a lator): Merece atendimento a súplica instância recursal — fls. 7 —, e as- do paciente, nos termos do parecer, sim, a ilícita coação, de tal emer- que invoca o precedente desta Turgente, haveria mesmo de ser trata- ma, de que fui relator, no HC 57.828, da originariamente perante a Su- a dizer que, para a intimação da deprema Corte. fesa por publicação no «Diário da R.T.J. — 100 Justiça», não basta constar a vaga designação «Defensoria Pública», senão que é necessário indicar pelo nome o defensor dativo, ou pelo número ou nome o Defensor Público. No caso dos autos, a ordem de habeas corpus, ora concedida para que se refaça a publicação com força de intimação, envolve também a soltura do réu. Foi ele preso em execução do acórdão condenatório, que se teve por transitado em julgado mediante a defeituosa intimação. E este o entendimento do Supremo Tribunal Federal (H.C. 53.555, 2? Turma em 5.8.75, RTJ 75/102; HC 55.547, 2? Turma em 8.11.77, RTJ 83/760). . Defiro a ordem para mandar que seja posto em liberdade o paciente, se por al não estiver preso, e para determinar seja o acórdão condenatório republicado com indicação precisa do nome ou número do Defensor 163 Público encarregado da defesa do paciente. E o meu voto. EXTRATO DA ATA HC 59.219 — DF — Rel.: Min. Decio Miranda. Pacte.: Odilon Ferreira da Cunha. Impte.: Biron Cardoso Leite. Coator: Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Decisão: Concedida a ordem nos termos do voto do Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira Alves, Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 18 de setembro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.396 — DF (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Firmino Paz. Recorrente: Flávio Tomaz Pereira Lopes — Recorrido: Tribunal de Justiça do Distrito Federal. «A identificação criminal não constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado já tenha sido identificado civilmente» (Súmula n.° 568, do STF). Recurso a que se nega provimento. ACORDA() Brasília, 27 de novembro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Firmino Vistos e relatados estes autos de Paz, Relator. Recurso de Habeas Corpus n? 59.3968, do Distrito Federal, em que é reRELATORIO corrente Flávio Tomaz Pereira LoO Senhor Ministro Firmino Paz pes e recorrido Tribunal de Justiça do referido Estado, decide o Supre- (Relator): Flávio Tomaz Pereira mo Tribunal Federal por sua Segun- Lopes, por seu advogado, propôs da Turma, unanimemente, negar ação de habeas corpus, ao fundaprovimento ao recurso de acordo mento de que, indiciado em inquérito com as notas juntas. policial e se julgando inocente, sofre 164 — ioo o ideal constrangimento de ser identificado criminalmente, sendo, Já, Identificado civilmente, no distrito da culpa. A ação de habeas corpus fora julgada improcedente (fls. 30). Houve recurso (fls. 34/35). A douta Procuradoria-Geral da República, ouvida, opinou, à vista da Súmula n? 568, desta Suprema Corte, pelo improvimento do recurso (fls. 46). 2 o relatório. VOTO O Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Dispõe-se na Súmula n? 568, deste Supremo Tribunal Federal, verbis: «A identificação criminal não constitui constrangimento ilegal, ainda que o indiciado já tenha sido identificado civilmente». Esse, o entendimento predominante, sumulado, do Supremo Tribunal Federal. 2. Posto se cogite de medida desnecessária e, para pessoa inocente, humilhante, nego provimento ao recurso, em obséquio à copiosa jurisprudência da Corte Suprema. 2 o meu voto. EXTRATO DA ATA RHC 59.396 — DF — Rel.: Min. Firmino Paz. Recte.: Flávio Tomaz Pereira Lopes (Adv.: Ari Soares Ferreira). Recdo.: Tribunal de Justiça do Distrito Federal. Decisão: Negado provimento. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 27 de novembro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.424 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira. Recorrente: Roberto Correia Ribeiro — Recorrido: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo. Habeas Corpus. Aditamento à denúncia, no curso da instrução criminal, em face de prova testemunhal, em Juízo, que veio esclarecer aspectos importantes sobre a participação do paciente no evento tido como delituoso. Não se aplica, ao caso, o art. 18 do Código de Processo Penal. Aditamento á denúncia e o disposto no art. 569 do mesmo Código. Se a prova, que serviu de base ao aditamento à denúncia, Procede, ou não, dirá a sentença. Não cabe, entretanto, ao paciente pretender opor-se à apuração de sua responsabilidade criminal, como coreu, na espécie. Recurso desprovido. julgamentos e notas taquigráficas, à ACÓRDÃO unanimidade, negar provimento ao recurso. Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Pri- Brasília, 10 de novembro de 1981. meira Turma do Supremo Tribunal — Cunha Peixoto, Presidente — Néri Federal, na conformidade da ata de da Silveira, Relator. R.T.J. — 100 RELATORIO 165 gou, unanimemente, a ordem, por intermédio de sua Sexta Câmara, com os seguintes fundamentos (fls. 38/39): «Sem ferir a fundo o mérito da questão o cotejo da prova colhida no inquérito policial com a que se produziu em Juízo revela diferença qualitativa na última, que inova por precisar e esclarecer a participação do paciente nos fatos denunciados. Se essa participação, nos limites do primitivo inquérito policial, apresentava nebulosas ou até mesmo omissões que recomendariam o non liquet requerido e aceito, a verdade é que, em Juizo, sobre a mesma base testemunhal, essa prova divergiu quantitativa e qualitativamente da anterior, no tocante ao paciente, fato que se realça pela só observação de o depoimento judicial da testemunha Quitéria Maria da Conceição ,suprir omissão que se lhe atribuiu na polícia com apontar o paciente a socar a vitima por trás. Ante o exposto, denegam a ordem por não se vislumbrar nenhum constrangimento ilegal que sofra o paciente pelo processo contra ele instaurado». Recorre, ordinariamente, Roberto Correia Ribeiro, reiterando que nenhum elemento probatório novo houve a justificar o aditamento da denúncio em exame (fls. 41/45). A douta Procuradoria-Geral da República opina no sentido do desprovimento do recurso. E o relatório. O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Roberto Correia Ribeiro, policial, militar, residente em Piracaia, SP, teve impetrado, em seu favor, habeas corpus, com o objetivo de obter a exclusão da ação penal, que lhe é movida, juntamente com Edson Martins dos Santos, na 2? Vara Criminal da comarca de Guarulhos, em razão de lesões sofridas por Luiz Gonzaga Correia de Oliveira, a 8.4.1977. Alega-se que, concluído o inquérito policial, o M.P., a 5.8.1980, denunciou, apenas, Edson Martins dos Santos, pelo evento aludido, requerendo o arquivamento do procedimento criminal, quanto ao paciente, o que foi deferido pelo Dr. Juiz. Sucede, porém, que, a 16.3.1981, foi a denúncia aditado, para incluir-se, na ação penal, o impetrante, como co-autor das lesões corporais sofridas por Luiz Gonzaga Correia de Oliveira, embora não se houvesse colhido outra prova, «a não ser a repetição daquilo que já fora dito no inquérito policial, não considerado o bastante pelo Dr. Promotor Público», «que, assim, pediu o arquivamento referido.» Sustenta que o aditamento da denúncia, recebido pelo magistrado, tendo-o como incurso no art. 129, caput, do Código Penal; violou o art. .18, do CPP, o contrapondo-se ao que dispõe a Súmula n? 524, pois não servem, no caso, à denúncia posterior, repetidos argumentos, onde a vitima e sua sogra apenas renovaram anteriores acusações ao paciente, quando as demais testemunhas, ouvidas naVOTO da disseram contra dito policial, «quer na fase policial, quer na insO Sr. Ministro Néri da Silveira trutória». (Relator): O fundamento do pedido O Tribunal de Alçada Criminal do de habeas corpus foi inexistência de Estado de São Paulo, perante o qual novas provas a autorizarem o desarfoi impetrado o habeas corpus, dene- quivamento do inquérito policial, de 166 R.T.J. — 100 referência ao paciente, imputandose-lhe, em co-autoria, o delito de lesões corporais, em face da agressão sofrida por Luiz Gonzaga Correia de Oliveira, a 8.4.1977. Considerou a decisão recorrida, para indeferir o writ, que o cotejo das declarações da testemunha Quiteria Maria da Conceição, sogra da vítima, no inquérito policiai (fls. 14) e em Juízo -( fls. 22v) constituia o elemento de prova suficiente a autorizar o aditamento à denúncia, como ocorrido, envolvendo o ora paciente. Analisou a matéria a douta Procuradoria-Geral da República, às Xis. 55, nestes termos: «Se, perante a autoridade policial, a declarante afirmou que o recorrente investiu também contra a vítima, embora não soubesse precisar a forma de agressão, é certo que, em Juizo, suas declarações ofereceram prova nova, ao afirmar, de forma categórica, que o recorrente «agredindo traiçoeiramente por detrás (sic)» a vítima, «deu-lhe um murro, que fez com que Luiz Gonzaga caísse». O acórdão considerou que a prova, em Juizo, precisou e esclareceu a participação do paciente nos fatos denunciados, o que restara nebuloso no inquérito policial, divergindo, assim, quantitativa e qualitativamente, da anterior, no que concerne ao paciente. Em realidade, o art. 18, do C.P.P., estabelece que, depois de ordenado o arquivamento do inquérito pela autoridade judiciária, por falta de base para a denúncia, a autoridade policial poderá proceder as novas pesquisas, se de outras provas tiver notícias. Na espécie, os aspectos probatórios novos incriminadores do paciente surgiram, na instrução criminal, não sendo, pois, de invocar-se, na in casu, o art. 18, para afastar o aditamento da denúncia, como pretende a inicial. O aditamento da denimcia, de outra parte, podia ocorrer, ao longo da instrução, com apoio no art. 569, do CPP, surgindo, como pareceu ao órgão do M.P., prova nova a indicar a participação do paciente no evento delituoso. Se essa prova procede, ou não, será matéria a decidir-se na sentença. Não pode, entretanto, o paciente opor-se à apuração de sua responsabilidade, em Juizo, incluído como coréu, na ação penal com asseguração de ampla defesa. Quanto aos fatos, a vitima, Luiz Gonzaga Correia de Oliveira, em Juizo, ao depor, esclareceu (fls. 21v.): «O declarante tem certeza que seu rosto foi golpeado pelo indivíduo chamado Roberto, que é integrante da Policia Militar. O acusado Edson estava em companhia do supra mencionado Roberto, mas o declarante não notou se o acusado também o agrediu. O declarante tem a impressão que Roberto não foi indiciado como autor da agressão, por ser integrante da Polícia Militar». Quitaria Maria da Conceição, sogra da vítima, em Juízo (fls. 22v.), declarou: «Que nesse instante também interveio a rua um policial militar conhecido na rua por «Roberto». Que mencionado Militar agredindo traiçoeiramente por detrás a Luiz ~zaga, deu-lhe um murro, que fez com que Luiz Gonzaga caísse. Que depois deste murro, Luiz Gonzaga levantou-se ensangüentado. Que depois disso todos correram. Que aí sua filha prestou socorro ao marido Luiz Gonzaga». No aditamento à denúncia, o órgão do M.P. assim descreveu a conduta do paciente (fls. 29): «Segundo se apurou no procedimento processual sumário, através da fase instrutória acusatória, o indiciado Roberto Correia Ribeiro, agrediu traiçoeiramente a vítima R.T.J. — 100 167 desferindo-lhe um murro, que fez Do exposto, nego provimento ao com que a vitima caísse ao chão. recurso. Consta ainda que o indiciado Roberto, golpeou a vitima no rosto. EXTRATO DA ATA Face ao exposto, denuncio a V. Exa. Roberto Correia Ribeiro, co59.424 — SP — Rel.: Min. Némo incurso nas penas do artigo 129 ri RHC. da Silveira. Recte.: Roberto Corcaput do C. Penal, c.c. art. 25 do reia Ribeiro (Adv.: Paulo Francismesmo Códex, o requeiro que após co). Recdo.: Tribunal de Alçada Crirecebida esta, se façam as devidas minal do Estado de São Paulo. anotações e que seja instaurado o Decisão: Negaram provimento ao procedimento penal, com a citação e o interrogatório do indiciado, recurso. Decisão Unanime. prosseguindo-se até final sentenPresidência do Senhor Ministro ça». Cunha Peixoto. Presentes à Sessão Não há, assim, ver falta de justa os Senhores Ministros Soares Mufioz, causa para a acusação ao paciente, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e que já foi interrogado, a 8.9.1981, Néri da Silveira. Subprocuradortendo, dessa maneira, oportunidade Geral da Rebúlica o Dr. Mauro Leite de também se defender, juntamente Soares. Brasília, 10 de novembro de 1981. — com o co-réu Edson Martins dos Santos, na forma de direito, no curso do António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. processo. RECURSO DE HABEAS CORPUS N? 59.520 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra. Recorrentes: Elena Laura de Medeiros e outra — Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. A recusa de salvo conduto a prostitutas para a prática de trottolt, não constitui negação de direito constitucionalmente assegurado. No ordenamento jurídico vigente, que coíbe certos atos contra a moral e os bons costumes, não pode o habeas corpus erigir-se em *alvará» para a prática da prostituição ostensiva. Precedente: RHC 58.179 — O — SP, RTJ 96/1.075. RHC improvido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em negar provimento ao recurso de habeas corpus. Brasília, 11 de dezembro de 1981.— Djaci Falcão, Presidente.— Cordeiro Guerra, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O v. acórdão recorrido é do seguinte teor: 168 R.T.J. — loo «Em nova sentença, proferkla por exemplo, se locomove na via em virtude de anulação do procespública sem o objetivo de angariar so pelo acórdão de fis. 86/88, foi fregueses. concedida em favor das pacientes, No julgamento do recurso de ora recorridas, a reclamada ordem habeas corpus, acima referido, a de habeas corpus, com o respectiColenda Segunda Turma do Eg. vo salvo conduto, tendo o MM. Juiz Supremo Tribunal Federal conrecorrido de oficio ( fls. 112/113). cluiu que: Pelo não provimento do recurso «a recusa de salvo conduto a é o parecer da douta Procuradoriaprostitutas para a prática do Geral da Justiça. trottoir não constitui negação de direito constitucionalmente asseguMantida, porém, não pode ser a rado.» decisão recorrida, pois não se há de permitir a expedição de salvo e que o trottoir configura: conduto para o fim do trottoir, ain«ato contrário aos bons costuda que discreto, sem maiores esmes, ofensivo da moralidade públicândalos na via pública. ca e fonte de constrangimento para No julgamento do Recurso de transeuntes e residentes.» Habeas Corpus n? 58.179, de São Isto posto: Paulo, o eminente Ministro Acórdam, em sessão da ~ara Cordeiro Guerra aduziu que: Especial do Tribunal de Justiça de «O trottoir é uma atividade ofenSão Paulo, por maioria de votos, siva à moral pública que pode ser dar provimento ao recurso, para reprimida pela Polícia, dentro dos cassar a ordem concedida. seus poderes naturais de mantenedora da ordem pública, na preserCustas na forma da lei. vação dos bons costumes. Não é O julgamento teve a participação necessário que a Polícia aguarde dos Desembargadores Batalha de que a prostituta, no trottoir, imporCamargo, com voto vencido, e tune alguém de modo ofensivo ao Halo Galli, com voto vencedor. pudor ou mesmo pratique um atentado ao pudor público, para que enSão Paulo, 29 de julho de 1981 — tão atue. Basta que a prostituta, Henrique Machado, Presidente e pela sua atitude, revele o propósito Relator.» (fls. 128/129). da prática da contravenção ou do Fundamentou seu voto o ilustre crime, porque a conduta da prostituta no trottoir já é um fato indica- Desembargador Italo Galli nestes tivo dessa intenção. Assim, não me termos: parece possível que se obrigue a «Trata-se, inegavelmente, de autoridade policial a aguardar a habeas corpus preventivo, para a consumação do ilícito penal para livre prática do trottolr. Como tal então agir.» foi considerado na inicial, In Aliás, a policia desempenha funverbis: «E pacífico o entendimento ção também preventiva, não apejurisprudencial de que a lei não punas repressiva, além de que não é ne o troittoir, item 6, f. 4; bem coo habeas corpus a via própria para mo pela sentença, que concedeu o que a prostituta possa praticar o salvo conduto: «é sabido que o trottoir. E claro que essa mesma trottoir, em si mesmo, não configura infração penal, desde que o via excepcional não lhe pode ser necomportamento da prostituta não gada, fora dessa hipótese, quando, R.T.J. — 100 169 ofenda os bons costumes e a morae não uma injustiça, tem por finalilidade pública, e se exercido de dade defender uma existência moforma discreta e sem escândalo,» ral,» na expressão de Tradelemf. 113. burg (Revista dos Tribunais 543/308; Revista de Jurisprudência Em abono de tal entendimento, do Tribunal de Justiça de São invoca o impetrante jurisprudência Paulo 65-308). já superada por recente julgado do Pretório Excelso, em que a quesOra, admitir a prática do tão foi colocada em seus devidos trottoir, em que está insita a imotermos (RHC n? 58.179-0 — SP). ralidade do comportamento — porCom efeito, conforme encareceu que, de outro modo não seria esse aresto, está insita, na prática trottoir, conforme judiciosamente do trottoir a ofensa aos bons costuobservou o Ministro Decio Miranda mes e à moralidade pública, envolseria agasalhar a imoralidade que vendo, nesta simples designação «o a lel tem o dever de proteger, pois, reconhecimento da malícia contuem última análise, o direito sanciomeliosa da atitude,» pois, «do conna os preceitos morais indispensátrário não seria qualificada como veis á convivência dos indivíduos trottoir.» na sociedade. «Este — prossegue o voto do MiNèsse sentido, recente acórdão nistro Dedo Miranda — além da da Eg. Terceira Câmara Criminal malícia e da provocação, configura deste Tribunal, relatado pelo emiafronta a outras pessoas que na nente Desembargador Andrade via pública se encontrem e guarJunqueira, que salientou a incondem posição de moralidade e resgruência de condicionar a proibipeito aos costumes.» cão da prática do trottoir à ressalE arremata: va de ofenderem as meretrizes o pudor público, uma vez que o «Sr. Presidente, não me parece trottoir já é ofensivo às normas soque o caso seja de concessão de ciais: habeas corpus, porque, a ser admitido o habeas corpus preventivo, «Battre le trottoir — acrescenta estaríamos reconhecendo que a o aresto — exploiter le trottoir — prática é perfeitamente normal, ensinam os mestres — nada mais é não é anti-social, e que com ela se do que chercher des clientes sur le têm de conformar as demais pestrottoir, en parlant des femmes de soas de moralidade normal que mauvaise vie. Telle actrice, que fit transitam pelas vias públicas. O courir tout Paris, est redulte a faire habeas corpus preventivo seria cotrottoir. (Revista de Jurisprudênmo que uma carteira profissional, cia do Tribunal de Justiça do Estaem lugar da que o Ministério do do de São Paulo 68-355).» ( fls. 130Trabalho não outorga.» 132). No mesmo diapasão, afinaram Dissentiu o ilustre 'Desembargador os votos dos Ministros Moreira Alves, Cordeiro Guerra e Djaci Batalha de Camargo desse modo: Falcão. «Neguei provimento ao recurso Esse acórdão confirmou decisão oficial, único interposto. da Primeira Câmara Criminal deste Tribunal, em que ficou acentuaPunível há de ser o trottoir esdo o fundamento teleológico do dicandaloso e que atente contra a reito: «todo direito enquanto direito moralidade pública. 170 R.T.J. — 100 Teria sido este o trottoir que as pacientes vinham praticando? A conclusão negativa está na própria conduta da autoridade policial, que, conduzindo, reiteradamente, as pacientes à prisão, dois ou três dias depois, as põem em liberdade — sem qualquer providência de ordem legal a justificar a detenção. A ilegalidade maior, conseqüentemente, não está no pretendido trottoir praticado pelas pacientes, mas na prisão arbitrária feita pela autoridade — arbitrária porque desvestida de qualquer forma legal, sem qualquer conseqüência legal, a se repetir ilegalmente em prática habitual, senão suspeita, pelo menos condenável. Se a policia, levando as pacientes à prisão, iniciasse o processo de vadiagem ou de atentado ao pudor — tudo bem, de pleno acordo com os excelentes votos vencedores, firmes na boa teoria. Condenar, porém, o trottoir por si mesmo e fazer vistas grossas à forma ilegal e arbitrária como reprimido, não constitui, a meu ver, data venha, solução legal ou outra qualquer que ponha a termo o indesejável espetáculo. O fato, porém, é que o indigitado trottoir permite a autoridades policiais de baixo escalão praticar, continuadamente, arbitrariedade muito maior, a consubstanciar não apenas conduta ilegal de autoridade pública, maS a reiteração de delito previsto em lei. Concedido que fosse, em termos, o habeas corpus, estaria a autoridade policial compelida, ao prender as pacientes, a cumprir o dever de oficio de iniciar o procedimento penal próprio. Não concedida tout court a ordem, outorgou-se à Policia carta branca para continuar a agir como vem agindo, de forma ilegal, sem proveito algum à moralidade pública e, talvez, com proveito indevido que prisões ilegais e solturas imotivadas podem proporcionar a autoridades que agem ao arrepio da lei — senhores do arbítrio de prender e soltar seu alvedrio. Em suma: a autoridade coatora não atribuiu às pacientes a prática de qualquer crime, já que, a respeito, providência alguma, de ordem legal, foi tomada. Não concedida a ordem, a situação permanecerá a mesma: nem o trottoir deixará de existir, nem a Polícia de cometer a arbitrariedade da prisão sem forma legal. A concessão da ordem, pelo menos, haveria de compelir a autoridade policial de proceder de acordo com a lei, efetivando a prisão das pacientes que, na prática do trottoir, estivessem a infringir algum dispositivo penal ou contravencional. Esta, a meu ver, a realidade da situação e a razão pela qual neguei provimento ao recurso.» ( fls. 133135). Insurgem-se as recorrentes sustentando que prostituição não é crime, que fazer trattolr não é crime, e que todos são iguais perante a lei, invocando voto do eminente Ministro Clovis Ramalhete. A douta Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral, Professor Francisco de Assis Toledo, assim opina: 01 — De novo chega-se ao Excelso Pretório — com o pedido de concessão de habeas corpus para a prática do trottoir. R.T.J. - 100 Quer-se a reforma do acórdão do Eg. Tribunal de Justiça de São Paulo que, invocando precedente do Supremo Tribunal, cassou ordem concedida pelo Juiz de primeira instância. 2 — Já emitimos parecer em caso anterior (RHC. 58.938 — SP) que se aplica por inteiro ao presente (xerox anexa). 3 — Reportando-nos, pois, ás razões desse parecer, somos pelo improvimento.» (HC 58.938 — SP). «Em favor de Susana Rogéria Batista e outra, impetra-se habeas corpus preventivo, com o declarado objetivo de se permitir às pacientes a prática do trottoir, sem que venham a ser importunadas pela Policia. 2 — A ordem foi denegada em acórdão de que extraímos o seguinte tópico essencial: Não se nega a possibilidade da ocorrência de abusos por parte de policiais mal selecionados para a função, inclusive com o intuito de explorar infelizes moças que se dedicam à prostituição. Isso teria acontecido em épocas passadas e, com tal escândalo que a jurisprudência se inclinou, na impossibilidade de outros meios para coibir a corrupção e a violência, a conceder, quase como norma geral, habeas corpos preventivo, em casos semelhantes. Este aspecto foi apreciado no habeas corpus 4.149 — 3 — SP, em acórdão que se fa-z integrante deste. A situação, entretanto, parece diferente, acreditando-se que os objetivos das autoridades policiais, dentro do âmbito de sua finalidade é evitar abusos e excessos. 171 Se houver excesso na ação policial, nada impede a intervenção dos órgãos superiores da própria policia, para não acobertar maus policiais e dos próprios órgãos judiciais, preservando-se entretanto do risco de transformar-se, embora movidos pelas melhores intenções, em instrumento de advocacia especializada na proteção da prostituição ambulante.» (fls. 81-82). 3 — Dai o recurso no qual se reiteram as alegações da inicial. 4 — Somos pelo improvimento. No ordenamento jurídico vigente, que coíbe certos atos contra a moral e os bons costumes, não pode o Poder Judiciário conceder verdadeiro «alvará» para a prática ostensiva da prostituição. 5 — E certo que, hoje em dia, certas publicações perlodicas e a própria televisão incumbem-se de levar a dúvida ao espirito daqueles que ainda acreditam na possibilidade de sobrevivência de uma ética social, de feitio tradicional. Não obstante sem pretender apresentarmo-nos qual paladino quixotesco de uma cultura em decadência embora correndo esse risco — pensamos que as normas legais, sempre que possível, devem ser interpretadas de modo a não estabelecer conflito com o aquilo que desde Bentham e Jellinek, convencionou chamar de «o mínimo ético.» 6 — Saliente-se, por derradeiro, que, se negado o salvo conduto pretendido, nada obstará às pacientes de recorrerem ao remédio do babeas corpus, na hipótese de virem a sofrer, de fato, alguma ilícita coação por parte das autoridades policiais, o que, segundo se informa, ainda não ocorreu. 172 R.T.J. — 100 O parecer, repita-se, é pelo improvimento.» (FtHC 58.938 — SP) (fls. 151/155). 2 o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra (Relator): Não é nova a espécie em debate. Esta Turma no Ri-1Ç 58.179, SP, assim decidiu, em ementa da lavra do eminente Ministro Dedo Miranda: «Constitucional. Poder de policia. A recusa de salvo conduto a prostitutas para a prática de trottoir não constitui negação de direito constitucionalmente assegurado. Configuração de ato contrário aos bons costumes, ofensivo da moralidade pública e fonte de constrangimento para transeuntes e residentes.» (RTJ 96/1.067). Dei, na oportunidade, de improviso longo voto (RTJ 96/1.075 a 1.076) a que, data venia, me reporto. Não obstante o valioso dissenso trazido à colação pelas recorrentes, mantenho o entendimento de que «no ordenamento jurídico vigente, que coíbe certos atos contra a moral e os bons costumes, não pode o habeas corpus erigir-se em «alvará» para a prática da prostituição ostensiva.» De fato, a prostituição é o comércio sexual da mulher com fim de lucro e sem que ela escolha o parceiro do prazer, na definição do professor Arturo Santoro, da Universidade de Pisa, que relembra ser ela estigmatizada no livro dos Profetas e no Pentateuco. Não é, pois, uma atividade romântica, digna de estimulo e facilitação: «A prostituição, além de constituir um fato de patente imoralidade e fonte de degradante corrupção, constitui sob diversos aspectos um perigo para a sociedade.» diz o mesmo autor que ressalta: «Amplas são as ligações do meretrício com a criminalidade, e «lo stato nom puó chiudere gli occhl dinanzi alia realtà dei tristo fenomeno, anche perche, come si é accennato, esso é fomite e causa dl gravi nocumenti sociali. E quindi, praticamente inammissibili un sistema legislativo de plena liberta, 11 quali lascerebbe la prostituzione sottoposta esclusivamente alie comuni dispozioni valevolt per ogni forma de atività.» Digesto Italiano, (Novissimo Prostituzione). Dal o regime regulamentar da prostituição adotado em todos os povos cultos, pela Grã-Bretanha, nas cidades portuárias, em 1964; na Itália, em 1871; na França, desde o século XVI, e, finalmente, na União Soviética, que por um ukas de 4.5.1961, prevê medidas de ingerência social em relação àqueles que, furtando-se ao trabalho, se dedicam a vida anti-social e parasitária na qual se incluem as mulheres que exercitam a prostituição, segundo refere Tomaso Napolitano (II Nuovo Codice Penale Sovietico Milano, 1963, pág. 366). O trottoir, como salienta o ilustre — Desembargador lido Galli, «nada mais é que procurar clientes nas calçadas», e como disse, é uma atividade ofensiva à moral pública que pode ser reprimida pela Polícia, dentro de seus poderes normais de mantenedora da ordem pública, na preservação dos bons costumes. Não é necessário que a Polícia aguarde que a prostituta, no trottoir, importune alguém de modo ofensivo ao pudor ou mesmo pratique um atentado ao pudor público, para que então atue. Basta que a prostituta, pela sua atitude, revele o propósito da prática da contravenção ou do crime, para que seja, obstada em sua intenção manifestada pela própria conduta. R.T.J. — 100 173 Assim, estou em que não é incons- do.: Tribunal de Justiça do Estado titucional evitar que os direitos Indi- de São Paulo. viduais sejam utilizados em contráDecisão: Negado provimento. Unârio à sua própria finalidade que é a nime. de assegurar a tranqüilidade de todos os cidadãos. Presidência do Senhor Ministro Por esses motivos, nego provimen- Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, to ao recurso. Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da EXTRATO DA ATA RHC. 59.520 — SP — Rel.: Min. República, Dr. Mauro Leite Soares. Cordeiro Guerra. Rectes.: Elena Brasília, 11 de dezembro de 1981 — Laura de Medeiros e outra (Adv.: Hélio Francisco Marques, SecretáFrancisco Lobo da Costa Ruiz). Rec- rio. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 63.769 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrente: União Federal — Recorrido: Carlos Octávio Michelet de Oliveira. Militar. Anistia prevista no Decreto legislativo n? 18, de 1961. Reversão ao serviço ativo. Procedência, nas instâncias ordinárias, da ação. Demanda, porém, sem objeto, diante da decisão proferida no mandado de segurança. Recurso extraordinário da União, por isso, conhecido e provido, julgando-se improcedente a ação ordinária. ACORDA° ajuizou ação de mandado de seguranca, apontando como autoridade Vistos, relatados e discutidos estes coatora o então Ministro da Guerra. autos, acordam os Ministros da Se- Paralelamente, no ano de 1963, mês gunda Turma do Supremo Tribunal de janeiro, agora com apoio também Federal, na conformidade com a ata no Decreto-lei n? 8.159, de 3-11-45, de julgamentos e notas taquigráfi- que dispôs sobre o aproveitamento cas, em conhecer do recurso e no serviço ativo do Exército de ofiprovê-lo nos termos do voto do Mi- ciais subalternos da reserva convonistro Relator, unanimemente. cados e de praças, ajuizou ação ordiBrasília, 7 de outubro de 1980 — nária. Em ambos os feitos, o autor, Djac.1 Falcão — Presidente — Leitão oficial da reserva da 2? classe, que fora convocado por ocasião da 2! de Abreu — Relator. guerra mundial, pretendia, em suma, reverter ao serviço ativo. RELATORIO Ao julgar o pedido de segurança, o O Sr. Ministro Leitão de Abreu — Tribunal Federal de Recursos o inCom fundamento no Decreto legisla- deferiu, sob o fundamento de inconstivo n? 18, de 1961, que concedeu a- titucionalidade do art. 1?, letra e, do nistia, Carlos Octávio Michelet de Oli- Dlg n? 18-61. Entretanto, o Supremo veira, no ano de 1962, mês de agosto, Tribunal, apreciando recurso ordlná. 179 R.T — 100 tras situações, inclusive atrasados. rio, de que foi relator o Min. HahneA ação se prejudicaria se o mandamann Guimarães, reconheceu a inconstitucionalidade do texto em caudo fosse negado, ou pelo menos, para aqueles que sustentam que, sa e determinou se julgasse o pedido nos termos em que fora postulado. em matéria de direito, sua decisão faz coisa julgada. Acompanho o voVoltando os autos à origem, a seguto do Sr. Relator» (f. 146, do RE rança foi concedida, à unanimidade de votos. Frisou o Ministro Henrique 69.229). D'Avlla, relator: O acórdão, de 17-11-64, ficou assim «Face ao pronunciamento do ementado: Egrégio Supremo Tribunal Fede«Decreto legislativo n? 18. Anisral, não nos resta senão deferir o tia relativamente a faltas verificapedido. das no Curso de Oficiais da Reserva. Constitucionandade do consig«Reputado, como o foi, constitunado nas letras c e e do referido cional, o disposto nas letras c e e decreto» (f. 151 do RE 69.229). do Decreto Legislativo n? 18-61, e não havendo residualmente qualPor decreto presidencial de 6-7-65, quer outra matéria a considerar a publicado um dia após, o ex-1? Teesta altura, a solução que se impõe nente R2 da Arma de Cavalaria — é o deferimento do writ, para que o Carlos Octávio de Oliveira impetrante, ou' retorne ao serviço foi reformado, Michelet em cumprimento de ativo do Exército, ou passe à inati- sentença judicial (f. 14 dos documenvidade com as vantagens a que fi- tos por linha). zer jus, nos precisos termos do art. 1?, § 2?, do aludido Decreto LegisAcontece, porém, que, por sentenlativo n? 18» (f. 142 do RE 69.229). ça de 10-5-63, o juiz julgou procedente a ação ordinária, determinando a Outros Ministros motivaram o seu do autor ao serviço ativo do voto, reportando-se, ao acompanha- reversão Exército. os recursos — rem o voto do relator, à decisão des- o oficial e Apreciando o voluntário —, o Tribunal te Tribunal. Eis o voto do Ministro Federal de Recursos, em acórdão de Oscar Saraiva: 30-11-66 — posterior ao proferido na «Também, Sr. Presidente, é este ação de mandado de segurança, bem o meu voto. Ia fazer apenas uma como ao seu cumprimento — deciobservação breve, que é do Direito diu, nos termos do voto do Min. Escanônico: Roma locuta est causa dras Gueiros, relator: finita. Não temos mais o que argu«A despeito de todas as alegamentar. O Supremo Tribunal Fedeções trazidas aos autos pela União ral repeliu a argüição de inconstiFederal, desde a Contestação até tucionalidade e esse era o único aràs suas razões de apelação, gumento. Por outro lado, não creio verifica-se que estava certo o Dr. que a ação ordinária, que veio exJuiz a quo não só quando rejeitou a temporânea, prejudique o mandaargüição preliminar de prescrição, do de segurança; ao contrário, o da ação, mas também no tocante mandado é que prejudicaria a ação ao mérito do pedido, conforme é ordinária, e não teria efeito algum fácil de demonstrar. se o Supremo Tribunal mantivesse a nossa decisão; apenas, ela veio «No tocante à preliminar de ex abundancia — não em prejuízo prescrição, já a matéria tornou-se pacífica nos tribunais, inclusive o — porque é concorrente. Na ação ordinária o autor pode pleitear ounosso e o Supremo Tribunal Fede- R.T.J. - 100 ral. Está na Revista Forense, vol. 178, fls. 157, Ementa, de decisão deste Tribunal, assim concebida: Prescrição — Não atinge o fundo do direito, mas tão-somente os efeitos patrimoniais, vencidos nos cinco anos anteriores.» «E a respeitável sentença apelada bem apreciou esse aspecto, ao afirmar: «Por outro lado, é evidente que a prescrição qüinqüenal não atinge aos direitos pessoais daqueles que tenham algo a reclamar do Estado. Este entendimento constitui hoje matéria pacífica dos Tribunais, alcançando a prescrição, nos casos de servidores do Estado, civis ou militares, apenas as vantagens ou prestações que, vencidas periodicamente, tiverem tido tal vencimento anterior ao qüinqüênio que precedeu a propositura da ação. Rejeito, portanto, a preliminar de prescrição nos termos amplos em que foi formulada, para só admitila no tocante ás prestações antecedentes ao qüinqüênio referido.» (V. fls. 75 dos autos). «Quanto ao mérito, igualmente andou acertada a sentença apelada, proferida em 10-05-63, quando admitiu em benefício do autor a anistia de que trata o Decreto Legislativo n? 18, de 15-12-61, cuja constitucionalidade foi declarada, em favor do mesmo autor, em recurso seu, de mandado de segurança, Alagado pelo Supremo Tribunal Federal, do qual foi Relator o eminente Ministro Hahnemann Guimarães, conforme se vê da publicação inserta no D. da Justiça de 11-81964, junto pelo autor com sua petição de fls. 100-104. Nessa decisão determinou-se ao Tribunal Federal de Recursos que julgasse o pedido nos termos do art. 1?, letras c e e do Decreto Legislativo n? 18, de 15- 175 12-1961, considerando-o, nessa parte, constitucional.» A decisão foi unânime. «Verifica-se, assim, que a douta sentença apelada estava inteiramente certa, ao aplicar em favor do autor, ora apelado, o Decreto Legislativo n? 18. «Acontece que, já agora, segundo se lê do D Oficial de 7-7-1965, parte II, pág. 6351, que o apelado fez juntar, por linha, a estes autos, com sua petição de fls., foi ele reformado, por ato do Sr. Presidente da República de 6-7-65, em cumprimento a decisão judicial proferida por este Tribunal no Mandado de Segurança já antes referido, com a aplicação da anistia prevista no Decreto Legislativo n? 18, «com direito aos proventos a que fizer jus, a partir da vigência do referido Decreto Legislativo, observados os artigos 137, 139 e 140 da Lei n? 4.328, de 30 de abril de 1964.» «Observe-se que na petição do apelado, junta por linha, declara ele que «abre mão de receber os atrasados, mesmo porque o Exmo. Sr. Presidente da República, no ato de sua reforma, mandou que lhe fossem pagos os atrasados a partir de 1961.» «Com estas considerações, entendo que se deve negar provimento aos recursos de «oficio» e à apelação da União Federal, em parte, isto é, para que prevaleça a sentença apelada exceto naquilo em que não discorde do agora pretendido pelo autor quanto aos atrasados, eis que declarou expressamente, no documento junto por linha a estes autos, que aceita o recebimento de atrasados apenas *a partir de 1961», conforme ficou previsto no ato presidencial de sua reforma. No mais, prevalecerá a sentença, dado que o objetivo primor- 176 R.T.J. — 100 dial do autor na demanda baseouse nos arta 1?, letra b, e 10?, letra b, do Decreto lei n? 8.159, de 1945.» (fls. 111 a 113 do RE 63.769). Na ação de segurança, a União entrou com recurso extraordinário, com amparo na alínea a do permissivo constitucional, recurso que subiu porque provido o agravo, Ag. n? 43.407, em apenso. O recurso tomou, nesta Corte, o n? RE 69.229. Na ação ordinária, a União também entrou com recurso extraordinário, com apoio nas alíneas a e d, que foi admitido. O recurso recebeu, nesta Corte, o n? RE 63.769. A Procuradoria-Geral da República, opinando quanto a ambos os recursos, pede que: «a E. Segunda Turma conheça dos recursos e lhes dê provimento, no mérito, para cassar a segurança e, por via de conseqüência, Julgar prescrita ou improcedente a ação ordinária, condenando o autor, ora recorrido, nas custas e em honorários de advogado, de acordo com o art. 64 do Código de Processo Civil, com a nova redação dada pela Lei n? 4.632, de 18 de maio de 1965.» (fls. 182). Impedido o Min. Antonio Neder, os autos passaram ao Min. Bilac Pinto, e, depois, em face da aposentadoria deste, ao Min. Decio Miranda, que também se deu por impedido. E o relatório dos dois recursos extraordinários. teve presente o Subprocurador-Geral da República; b) ofensa ao Decreto Legislativo ti? 18-61, e ao art. 141, ã 24, da Constituição de 1946. Os fundamentos do recurso foram repelidos pelo despacho do então Presidente do Tribunal a quo, Ministro Godoy Ilha, que assim remata a sua decisão: «O apelo excepcional é nitidamente descabido, pois a recorrente reedita matéria vencida, Já que o Egrégio Supremo Tribunal Federal no recurso interposto pelo ora recorrido da primitiva decisão proferida por este Tribunal que lhe negou a aplicação do mencionado Decreto Legislativo n? 18, por considerá-lo, em parte, inconstitucional, repeliu a argüição, e, provendo o recurso, determinou fosse apreciado o mérito do pedido (acórdão de (ls. 136, no Recurso em Mandado de Segurança n? 12.539). VOTO «E o Julgado, ora impugnado, limitou-se a considerar o impetrante enquadrado no benefício da anistia, eis que, 1? Tenente da Reserva da 2? Classe da Arma de Cavalaria, convocado para o serviço ativo e cursando o 2? ano da Escola Militar, para a permanência definitiva nas fileiras, fora dispensado do serviço por ter trancado a sua matrícula pelas faltas às aulas em que incorreu, aliás por motivos de saúde, extensivos que lhes são os incisos c e e do art. 1? do Decreto Legislativo, como o reconheceu a egrégia suprema instância. O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator) — No recurso extraordinário, que tomou o n? 69.229, recurso Interposto contra decisão proferida no Julgamento do mandado de segurança, a União, estribada unicamente na alínea a, alega: a) nulidade do Julgamento, visto que, por ocasião do Julgamento dos recursos, não es- «O acórdão recorrido, aplicando o invocado diploma legislativo, condicionou a reversão do impetrante ao pronunciamento favorável da autoridade militar, assegurado o direito à reforma em caso negativo, tudo como dispõem os parágrafos 1? e 2? do art. 2? do decreto de anistia. R.T.J. — 100 «A preliminar de nulidade do julgamento, por não estar a ele presente o titular da SubprocuradoriaGeral da República, não tem qualquer fomento de direito. Além de não se tratar de questão prequestionada, cuida-se, na espécie, de mera repetição do julgamento, salientando-se que já havia o representante da União falado nos autos, com o longo parecer de fls. 43-48. «A presença do órgão do Ministério Público Federal nos julgamentos dos Tribunais em que servem não é obrigatória e, na generalidade dos casos, são ausentes e, quando presentes, só excepcionalmente fazem a sustentação oral dos seus pareceres O que é indispensável é a sua audiência e o Tribunal jamais decidiu sem a prévia manifestação da Subprocuradoria-Geral da República.» (fls. 159-160). Procedem os fundamentos do despacho que negou seguimento ao recurso. No tocante à preliminar, além do que se afirma no aludido despacho, trata-se de questão não ventilada no acórdão recorrido, incidindo, pois, as Súmulas 282 e 356. Quanto ao mérito, a questão, que lhe diz respeito, já se encontrava, na verdade superada, diante do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal no RMS ri? 12.539, que se encontra às fls. 125135. Não conheço, assim, do RE n? 69.229. Quanto ao recurso extraordinário, a que se após, nesta Corte, o n? RE 63.769, a União Federal ao deduzi-lo, argumentou: «Como se depreende da inicial, da contestação e das demais peças dos autos, inclusive do documento junto por linha, o A., sendo Oficial da Reserva de 2? classe (isto é, não remunerada) do Exército, foi 177 convocado por ocasião da 2? guerra mundial, sendo depois matriculado no Curso de Oficiais da Reserva como condição para permanência na, ativa, nos termos do Decreto-lei n? 8.159, de 1945. já que não participara da FEB (fls. 36-40). «Desligado desse curso, por falta de freqüência ( fls. 37), retornou, como corolário, à situação de oficial da reserva da 2? classe. «Decorridos mais de quinze anos, ajuizou, contra esse ato, duas ações: uma de mandado de segurança, pleiteando a anistia do Decreto Legislativo n? 18-61, para aquelas faltas que motivaram sua exclusão do Curso; e a ação ordinária de que aqui se trata, pretendendo a anulação do ato pelo qual foi devolvido à reserva, por considerá-lo contrário ao citado Decreto-lei 8.159, de 1945. «Com o pedido de Anistia, afinal julgado procedente e já até executado pela Administração (v. doc. junto por linha), conseguiu o A., nos exatos termos do Decreto Legislativo 18-61, sua reforma no posto de 1? Tenente. «Com a ação ordinária, afinal julgada procedente na lt instância e agora confirmada pelo acórdão recorrido, pediu: «... seja o Autor revertido ao servi° ativo... e seja incluído no Q.O.A., seja o mesmo tempo condenada a Ré aos reparos dos Danos Materiais e Morais... (Inicial, fls. 9; os grifos são do A.). «Ora, cremos não ser necessário maior esforço para se ver que essas pretensões se repelem, por contradição gritante, tanto no campo do direito como no plano da lógica das coisas. 178 R.T.J. - 100 ção e não apenas as prestações pa«Com efeito, se não há falta (em trimoniais vencidas há mais de sentido criminal ou disciplinar), cinco anos da propositura da decomo pode haver anistia? manda.» «Inversamente, se há anistia, como decidiu esse E. Tribunal no «No mesmo sentido, este outro, mandado de segurança, já estando proferido no Rec. Ext. n? 59.122, In o A. no gozo dela, é porque houve DJ de 17-11-66, pág. 4.003: faltas. Como, pois, tachar de «ilegal», «injusto», e outros apelidos o «Prescrição. Quando é um direiato que as puniu, e contra o qual to reconhecido, sobre o qual não se vem esta ação? questiona, ai, são as prestações que vão prescrevendo, mas, se o «E tem mais. Como poderá o A. direito às prestações decorre do diestar reformado por força do reito à anulação do ato, é claro Mandado de Segurança e, agora, que, prescrita a ação em relação a por força do acórdão recorrido, ser este, não é possível julgar prescrirevertido.., e incluído no Q.O.A. e tas apenas as prestações, porque ficar na ativa? prescreveu a ação para reconheci«Vê-se que o v. acórdão recorrimento do direito, do qual decorredo, ao tomar por um de seus funria o direito às prestações. Do condamentos, o fato de ter o A. obtido trário, seria admitir o efeito sem a o vnit, não atentou para essa concausa. Recurso extraordinário, cotradição e decidiu contra a coisa nhecido, mas não provido.» julgada. «Houve, assim, negativa de apli«Mas se isto não bastasse, é incação ou vigência aos arts. 223, 877 discutível que a presente ação e 878 do CPC, 1? do Decreto n? ordinária estava mesmo prescrita. 20.910-32 e 150, 3?, da ConstituiCuida ela de anular um ato baixação. Estando, por outro lado, dedo em 1947, para restabelecer uma monstrado o dissídio, espera a situação jurídica que ele extinguiu. União Federal que V. Exa. haja E caso do art. 1? do Decreto númepor bem admitir o presente recurro 20.910-32, que cuida da prescriso, como de direito.» (fls. 119-122). ção de todo e qualquer direito, e, não do art. 3?, referente a simples O Ministro Godoy Ilha determinou prestações, como entendeu o acór- o processamento do recurso, por este dão. despacho: «Diz a ementa de recente acór«2 de acolher-se o recurso. A dão proferido, em 30-7-64, pela ação estava, realmente, prescrita, Egrégia 1! Turma da mais alta ajuizada que foi quinze anos após o corte, ao julgar o Rec. Ext. n? ato que o desligou do Curso de Ofi55.201, e publicado na integra no ciais da Reserva, por falta de freDJ de 22-10-64, pág. 834: qüência regular (fls. 37). Assim, a toda a evidência, o direito à ação «Prescrição qüinqüenal contra a para nulificar o ato estava prescriFazenda Pública. Em matéria de to, não vingando a assertiva do equiparação funcional, o lapso prescricional começa a fluir da daacórdão de que a prescrição não ta do ato ou fato que origina a preatinge o fundo de direito, mas tãotensão básica, e a prescrição, uma só os efeitos patrimoniais, ou mevez consumada, atinge o direito de lhor, sobre as prestações acessóobter judicialmente tal equipararias. R.T.J. — ipo «Vingou, em algum tempo, o entendimento de que, tratando-se de prestação de trato sucessivo, a prescrição só alcança as prestações vencidas no qüinqüênio anterior, deixando Integro o fundo do direito, afirmação menos jurídica, ainda que proclamada em alguns julgados. 179 mérito, sendo, então, concedida a segurança, nos termos do mencionado Decreto Legislativo n? 18, sendo o recorrido reformado por Decreto publicado no Diário Oficial, de 7 de julho de 1965, como se vê do apenso. apreciasse o «O que o recorrido pleiteou na ação foi a sua reversão ao, serviço ativo, agora já impossível pelo ato que o reformou.» (fls. 128-129). «A regra contida no art. 167 do Código Civil é a de que, com o principal, prescrevem os direitos acessórios, desde que a prescrição Tendo em conta, como observa o atinge o fundo do direito, o próprio despacho presidencial supratranscriconteúdo da causa, como observa to, que a ação ordinária, a que se reCarvalho Santos. fere o recurso, perdeu o objeto, diante da decisão proferida no mandado «O entendimento sustentado pelo de segurança, decisão que, além de acórdão está superado na jurispru- ter transitado em julgado, já foi dência hoje remansada do Egrégio cumprida pela União, conheço do Tribunal ad quem, como consagra aludido recurso — o de n? 63.769 — e a Súmula 443; «A prescrição das lhe dou provimento, para julgar imprestações acessórias só não ocor- procedente a aludida ação, invertire quando não tiver sido negado o dos os õnus da sucumbência. próprio direito reclamado ou a situação jurídica de que ele resulEXTRATO DA ATA ta.» o Decreto Legislativo n? 18-61 teve o efeito de interromper a prescrição, como sustentou o recorrido. RE 63.769 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: União Federal Recdo.: Carlos Octávio Michelet de Oliveira (Adv.: Antão Araújo da Silva). «Todavia, a ação já não tinha mais objeto. Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro Relator. Unânime. Impedido o Senhor Ministro Décio Miranda. «E nem «O recorrido, concomitantemente, postulou a concessão da anistia daquele diploma legislativo. NegaPresidência do Senhor Ministro da pela autoridade administrativa, com assento em parecer do então Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Consultor da República, denegou- Senhores Ministros Leitão de Abreu, lhe este Tribunal a segurança, por Cordeiro Guerra, Moreira Alves e entender inaplicável o citado De- Decio Miranda. Subprocuradorcreto, mas o Egrégio Supremo Geral da República, o Dr. Mauro Tribunal Federal proveu-lhe em Leite Soares. parte o recurso, para considerar constitucional o disposto nas letras Brasília, 7 de outubro de 1980 — c e e do art. 1? e, em conseqüência, Hélio Francisco Marques — Secretádeterminar que o Tribunal a quo, rio. 180 R.T.J. — 100 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 74.011 — MG (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder. Recorrente: Tarcides Pereira Fernandes — Recorrido: Espólio de Cândido Ribeiro. Decreto n? 24.150 de 1934, art. 31. Ação revisória do aluguel. Caso em que o acórdão impugnado por meio de recurso extraordinário considerou certa peculiaridade para julgar que o novo aluguel deve ser pago a partir da citação. Inadmissibilidade, na espécie, de confronto com o verbete 180 da Súmula para caracterizar a divergência pretoriana. 2. Recurso extraordinário que, fundado em discordância jurisprudencial, não é conhecido. ACORDA° Vistos e relatados estes autos de Recurso Extraordinário n? 74.011, do Estado de Minas Gerais, em que é recorrente Tarcides Pereira Fernandes e recorrido o Espólio de Cândido Ribeiro, decide o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas juntas. Brasília, 05 de maio de 1981 — Antonio Neder, Presidente e Relator. 2? Apelante, que é o Espólio do locador, pleiteou aumento do aluguei fixado na sentença. Eg. Tribunal de Alçada mineiro negou provimento aos dois recursos, e o fez acompanhando o voto do Relator, assim deduzido na f. 95: «Considero incensurável a r. decisão de fls. 60 a 63 dos autos, e, por isso mesmo, nego provimento às apelações registradas às folhas 66 e 70 do processo, para confirmar, por todos os seus termos e jurídicos fundamentos, a referida RELATÓRIO decisão. Sr. Ministro Antonio Neder (Re«Bem lançada a sentença, desalator): 1. Na Comarca de Belo Horifia ela, no seu desate, qualquer rezonte, MG, Cândido Ribeiro ajuizou forma, ou qualquer modificação, contra Tarcides Pereira Fernandes tendo o seu ilustre prolatar feito a a ação revisória de aluguel prevista sustentação da mesma no bom dino art. 31, do Decreto n? 24.150, de reito e de acordo com as provas e 1934. a lei reguladora do assunto. Vê-se Julgou-a procedente o juiz de prique o 2? (segundo) recorrente, apemeiro grau, que fixou o dia da citalou pelo sentido de conseguir «um ção para começo de vigência do nopouco mais» no ajuste do valor lovo aluguel. caticio, mas o seu pedido inicial foi A sentença que assim julgou o cadeclarado procedente, no principal, so, cada uma das partes interpôs reinclusive na fixação da data de curso de apelação. início de solicitação revisional. Já o 1? (primeiro) apelante ingressou 1? Apelante, que é o locatário, com a sua insurreição à sentença pediu que o novo aluguel tenha inicio recorrida, na intenção de obter a a partir do laudo, como previsto no reforma, na parte do inicio do paverbete 180 da Súmula desta Corte. R.T.J. — 100 gamento do valor revisional, que reclama deva ser a data da perícia, e não a da citação inicial. E suplica a improcedência da ação «nos termos em que foi proposta» (fls. 68), com a condenação do autor nas cominações legais. Examinados os recursos , vê-se que os apelantes, usaram do direito de apelar, como um meio de «alcançar um pouco» mais do que conseguiram obter nos autos. Porém, essa insatisfação não convence e, por isso, entendo bem lançada a sentença apelada e incensurável no seu desate, pelo que eu a confirmo, por seus próprios e jurídicos fundamentos.» II — Pelo recurso extraordinário que ajuizou nas fls. 98 a 99, sustenta locatário Tarcides Pereira Fernandes que o acórdão local diverge da jurisprudência que o STF resu-, miu no verbete 180 da Súmula, redigido nestes termos: «Na ação revisional do art. 31 do D. 24.150, de 20.4.34, o aluguel arbitrado vigora a partir do laudo pericial.» O recurso foi impugnado, fls. 101 a 105, admitido, f. 107, razoado, fls. 109 110, e contra-arrazoado, fls. 112 a 119, tudo nestes termos: ... (lê). III — E o relatório. VOTO Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. A sentença julgou que o novo aluguel deve ser pago a partir da citação, f. 62. acórdão confirmou a sentença pelos fundamentos em que ela se baseou, f. 95, isto é, confirmou que o novo aluguel deve ser pago a partir da citação. Recorrente sustenta que, julgando assim o pormenor, o acórdão local se acha em divergência com o verbete 180 da Súmula, que registra o entendimento de que o novo alu- 181 guel deve ser pago a partir do laudo pericial. Sucede, porém, que o Supremo vem adotando, em vários julgamentos, a orientação que abranda a rigidez do citado verbete. E o que se verifica nos acórdãos preferidos nestes casos: RE 71.578, RE 72.093, RE 63.385, RE 42.318, RE 62 624 RE 69.064, todos publicados na Revista Trimestral de Jurisprudência. Por conseguinte, ao confirmar a sentença, o acórdão impugnado se harmoniza, quanto ao assunto, com a citada jurisprudência da Corte. Ocorre, ainda, que, na espécie, o juiz ressaltou uma peculiaridade, qual seja a de que a perícia foi realizada muito tempo depois, f. 63. Trata-se de fundamento decisório que tem o apoio da eqüidade. Considerando tal peculiaridade, não se tem como fazer a comparação do acórdão local com o verbete 180 da Súmula. II — Não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA RE 74.011 — MG — Rel.: Min. Antonio Neder. Recte.: Tarcides Pereira Fernandes (Advs.: Humberto Anastásia e outros). Recdo.: Cândido Ribeiro (Espólio de) Advs.: Severo José Lopes da Silva e outros). Decisão: Não se conheceu do recurso, votação uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mufioz e Rafael Mayer. Ausente, justificadamente o Ministro Clovis Ramalhete. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 5 de maio de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. R.T.J. — 100 182 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 74.506 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrente: Jockey Club São Vicente — Recorrido: Município de São Vicente. Imposto sobre serviços. Sociedade turfística. Movimento geral de apostas. Ilegitimidade na incidência do tributo, pois legítima apenas a cobrança sobre os ingressos vendidos aos freqüentadores. Precedente: RE 74.849. Recurso extraordinário conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer do recurso e provê-lo parcialmente, nos termos do voto do Ministro Relator, por maioria de votos. Brasília, 31 de outubro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente — Leitão de Abreu, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: O acórdão recorrido assim expõe o caso: «O Jockey Club de São Vicente impetrou mandado de segurança para eximir-se do pagamento do imposto sobre serviços de qualquer natureza, que a Prefeitura Municipal está lhe exigindo através dos avisos de fls. 153/157 da Diretoria de Serviços Jurídicos, com base na Lei •n? 1.321, de 3.2.1967, regulamentada pelo Decreto n? 1.386, do mesmo ano, sendo o tributo reclamado na base de 10% sobre o percentual de 31? que o impetrante retira do movimento geral de apostas. Alegou que a pretensão da Fazenda Municipal é ilegal por inúmeras razões, a saber: por impos- sibilidade econômico-financeira, dada a pesada carga que o tributo representa para o orçamento já deficitário do impetrante; que não se trata de serviço municipal o tributado, mas de serviço federal, dado que a atividade turfistica importou em verdadeira derrogação da lei penal e somente pode ser exercida mediante autorização federal, daí se seguindo que não é lícito ao Município instituir imposto sobre serviços da União, conforme determina a Carta Magna; que por se tratar de serviço federal a União já instituiu tributos sobre a poule que tendo a chamada «lei do turfe» (Lel n? 4.096, de 18-7-62) disposto que para todos os efeitos a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas, isto significa que a fiscalização municipal só pode se restringir ao espetáculo ou à diversão pública, nunca às apostas, que à União cabe fiscalizar, daí se seguindo que o Município só poderia tributar o ingresso no hipódromo; não a poule. Aduziu ainda que a venda de poules ou as apostas em hipódromo não consta da lista de serviços apresentada pelo decreto-lei n? 406, de 31-12-68, nem do Decreto-lei n? 834-69 e que não sendo uma «empresa» no sentido Jurídico do termo, mas uma sociedade civil de fins não lucrativos, falta esse requisito para a integração do fato gerador, que requer a R.T.J. — 100 prestação de serviços por empresa ou profissional autônomo. Tratando-se de caso de não incidência, prossegue, a exigência fiscal consubstanciada nos mencionados avisos importa em ilegalidade e para justificar a renovação do writ aduziu que a decisão denegatória anterior não lhe apreciou o mérito, fundada apenas na decadência do pedido, agora afastada pela remessa de novos avisos da impetrada, exigindo o pagamento do imposto em questão. A segurança foi concedida em primeira instância por haver entendido o MM. Juiz que as apostas sobre corridas de cavalos não se confundiam com a diversão pública, segundo a «Lei do turfe», ainda não modificada. E não estando incluídas em qualquer dos 66 itens da nova lista de serviços instituída pelo Decreto-lei n? 834/69, sobre as mesmas não pode incidir o tributo. Como razão de decidir considerou também o magistrado que o impetrante não é empresa e não visa finalidades lucrativas na prestação de serviços, inexistindo portanto elementos subjetivos do fato gerador do tributo em causa» (fls. 345/347). Na parte decisória, reza o aresto: É preciso registrar inicialmente que ao contrário do alegado o impetrante não é órgão do Governo Federal, mas apenas desenvolve uma atividade regulada por lei federal. E como já decidiu o Egrégio Tribunal de Justiça, em sessão plenária, estando sujeita essa atividade ao poder de polícia estadual e municipal, «no desempenho de serviços públicos que lhes são afetos pode ser tributada pelas três unidades da Federação» (cfr. «Revista dos Tribunais», 300/326. Idem: rev. citada, vol. 330/648, Tribunal de Alçada). 183 E precisamente por isso que a chamada «lei do turfe» (Lei n? 4.096, de 18.7.1962) dispõe no parágrafo 2? do artigo 7?, que «a fiscalização federal será limitada às atribuições especificas da alçada da União, ressalvado ao Município o direito de fiscalizar a observáncia de sua própria legislação, no âmbito de sua competência constitucional.» Depois de editado o Decreto-leir n? 717, de 30.7.1969, que dispõe sobre a cota de previdência devida pelas entidades turfisticas, velb o decreto-lei n? 1.129, de 13.10.1970, regulamentado pelo Decreto n? 67.644, de 23.11.1970, dispondo sobre o conceito de renda liquida para fins da incidência daquela cota de previdência. Assim é que ao dispor sobre os tributos dedutiveis para a apuração da renda liquida o citado decreto federal menciona as obrigações de qualquer natureza, "federal, estadual e muncipal que incidem ou venham a incidir sobre os hipódromos, suas dependências e serviços...», numa demonstração de que, ao contrário do alegado, a par dos tributos federais e encargos previdenciários os hipódromos estão sujeitos à tributação municipal em razão dos serviços prestados Embora se trate de legislação posterior ao ato impugnado não se pode deixar de aceitá-la pelo menos como normas de interpretação a respeito do assunto. Não foi por outra razão, aliás, que a Egrégia Sexta Câmara deste Tribunal ao julgar recurso interposto em executivo fiscal movido contra o impetrante deixou expresso que «a atividade da executada depende de licença federal pois que objetiva autorização para realizar e aceitar apostas em corridas 184 R.T.J. — 100 de cavalo, mas pelas reuniões que faz, no município, está ela sujeita às tributações devidas por divertimentos e jogos. Assim, não se confundem a licença federal e o imposto cobrado» (fls. 297). Sustentou o impetrante, ainda com apoio na Lei n? 4.096/62 (((lei do turfe»), que segundo estabelece o seu artigo 7?, parágrafo 2?, já citado, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas, «para todos os efeitos», pretendendo com isso extrair a ilação de que sendo a exploração de apostas derrogação da lei penal, só a União poderia tributar essa atividade, como vem fazendo. Assim sendo restaria ao município fiscalizar e cobrar impostos sobre a diversão pública, fazendo-os incidir unicamente sobre o preço dos ingressos, e não sobre as «poules». Se as considerações expendidas anteriormente não bastassem para repelir o argumento, é importante ressaltar, neste passo, que a distinção feita pela citada lei acerca de apostas e diversões públicas não pode alcançar efeitos fiscais, segundo proibição contida no artigo 109 do Código Tributário Nacional, In verbis: «os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do 'alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários». Dai se pode deduzir que as atividades turfísticas, no respeitante aos serviços prestados aos freqüentadores de hipódromos podem ser tributadas também pelos municípios, no âmbito de sua competência, não havendo na Constituição vigente ou em qualquer lei que constitua fonte de Direito Tributário limitação alguma. Se assim é, deve-se convir que sendo o Imposto sobre serviços ins- tituído pelo município, cabe-lhe traçar os contornos da tipicidade fiscal, desde que não contrarie as disposições gerais da Constituição e das leis fiscais. Estas disposições estabelecem que a essência do fato gerador do referido imposto está contida nestas duas regras: a) deve ser uma atividade praticada por empresa ou profissional autónomo; b) deve ser uma atividade que represente serviço constante da lista geral. Ora, tanto o decreto-lei ri? 406, de 31 de dezembro de 1968, como o de n? 834, de 8 de setembro de 1969, incluíram na lista de serviços tributáveis, no item reservado às diversões públicas, «bilhares, boliches e outros jogos permitidos,» encontrando-se as apostas em corridas de cavalo subsumidas nesses jogos permitidos, como o próprio impetrante se empenhou em demonstrar com a alusão que fez à derrogação da lei penal, em face da lei do turfe, permitindo as apostas nos hipódromos. Tem-se, resumindo, que sendo as apostas em hipódromos jogo permitido, autorizado, pelos serviços que são prestados aos apostadores estão as entidades turfisticas sujeitas ao pagamento do imposto municipal respectivo, sendo licito aos municípios dispor a respeito das bases de cálculo, que na espécie «é o preço do serviço» ( artigo 9? do Decreto-lei n? 406). Da mesma forma a lei municipal que instituiu o tributo em questão (Lei n? 1.321, de 14.2.1967) podia, para efeitos fiscais somente, equiparar os hipódromos às empresas de diversões (artigo 7?), buscando com isso caracterizar o elemento subjetivo do fato gerador. Muito se discutiu o propósito do conceito de empresa nestes autos, R.T.J. com o objetivo de demonstrar que não sendo o Jockey Club de São Vicente uma empresa civil ou comercial, não está sujeito ao imposto sobre serviços, que necessariamente pressupõe no fato gerador uma atividade praticada por empresa ou profissional autônomo. Para tanto vieram para os autos eruditas citações sobre esse conceito, assinalando-se que o impetrante é uma sociedade civil de fins não lucrativos, como seus próprios atos constitutivos indicam, não percebendo seus dirigentes qualquer remuneração e destinando-se suas rendas ao aprimoramento do puro sangue de carreira no pais e a obras de benemerência. Entretanto já se observou que em matéria fiscal os institutos, conceitos e formas de direito privado não podem ser utilizados para definição dos efeitos tributários (artigo 109 do C.T.N. citado), o mesmo sucedendo com o Direito do Trabalho, por exemplo, no qual a expressão «empresa» tem significado diverso, confundindo-se com o simples empregador, ainda que individual. E por isso que segundo a lição de Ruy Barbosa Nogueira, «ao desejar tributar determinados eventos da vida, o legislador tributário constata que já estão eles disciplinados pelo Direito Privado, mas verifica que a configuração jurídica que lhe dá o Direito Privado não se coaduna integralmente com os objetivos da tributação. Dai introduz certas modificações para os fins tributários» (cfr. «Da Interpretação e da Aplicação das Leis Tributárias», São Paulo, 1965, pág. 58). Reconhecendo-se embora que a natureza do contribuinte é também elemento do fato gerador, não se pode deixar de reconhecer igual- 100 185 mente, com apoio em trabalho de autoria do Prof. Nlldo Serpa Cruz, publicado na «Revista de Direito Público» (vol. 11, pág. 182/4), que «muitas vezes, entidades sem finalidade lucrativa, para desonerar seus membros componentes ou a fim de angariar fundos para a realização de obras ou empreendimentos de vulto, ou mesmo por uma questão de sobrevivência, lançam mãos de atividades lucrativas, equiparando-se ás empresas e, esses serviços, que prestam a terceiros, a pessoas estranhas ao seu quadro associativo, a nosso ver, entram na faixa de incidência e devem ser tributados.» Admitindo-se caracterizado o fato gerador do imposto sobre serviços de qualquer natureza no caso, diante das considerações feitas, cumpre registrar que em relação à base de cálculo do tributo o decreto n? 1.386, que regulamentou a Lei n? 1.321/67, não contém qualquer excesso dispondo que a cobrança far-se-á na base de 10% sobre o preço das poules (artigo 37), uma vez que reside precisamente nas poules o preço dos serviços que o impetrante vem prestando aos apostadores. Objetou a ilustrada Procuradoria-Geral da Justiça, que o citado decreto exorbitou da função regulamentar porque o jogo não se enquadra na hipótese em que a lei prevê a porcentagem fixada, não se podendo confundir o «serviço» com o «jogo» em si (fls. 328). Data venta a objeção apontada extravasou dos limites que a postulação inicial traçou e sobre a qual versaram as informações do impetrado, inclusive as considerações e fundamentos da sentença recorrida. Trata-se de argüição serôdia, e improcedente também, uma vez que não indicou a douta Procuradoria limite algum que teria sido ultrapassado na base de cálculo em foco, devendo-se registrar, aliás, que o imposto vem sendo exigido em bases inferiores às estabelecidas pelo decreto tido como exorbitante. E o que informou a Diretoria da Receita de São Vicente à fls. 175, notando-se por essa informação que o imposto sobre serviços de qualquer natureza tem sido cobrado do Jockey Club vicentino na base de 10% calculados sobre os 31% que essa entidade retira do movimento geral de apostas. Afastadas todas as impugnações levantadas contra o ato acoimado de ilegal, resta considerar que a alegada «impossibilidade económico-financeira» do impetrante no atinente ao pagamento dos impostos em referência constitui matéria da alta indagação e não pode por isso ser apreciada neste processo, que não pode depender de comprovação de matéria de fato, não preconstituída. Concluindo tem-se que a cobrança do imposto comentado não revela ilegalidade alguma, ou abuso de poder a ser coartada por mandado de segurança. Nestes termos os recursos de ofício e voluntário são providos, denegando-se a segurança requerida e cassando-se a que foi concedida, pagas as custas pelo impetrante» (fls. 350/356). Houve recurso extraordinário, a que o nobre Presidente do Colendo Tribunal a quo, deu seguimento, com este despacho: «Inconformado, o impetrante pede recurso extraordinário com fundamento no artigo 119, III, letra a, da Constituição Federal sustentando, com as razões que informaram a sentença de primeira instância que houve, no julgado denegatório do Writ, incursão de veto a lel federal. E argumenta: o fato gerador de diversões públicas é o espetáculo público em si mesmo (daí admitir imposto sobre o ingresso no hipódromo) e não a atividade do empresário; ora, a emissão e venda de poules é a atividade fundamental do impetrante, através da qual, em realizando uma atividade meio, atinge as finalidades que lhe são determinadas pela lel federal 4.096/62 (Lei do Turfe); e se esta diz que «Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversões públicas se consideram atividades distintas» (art. 7?, 2?), não se encontrando nos decretos leis federais 406/68 e 834/69, que instituíram a lista de serviços sobre os quais o município pode tributar, nenhuma referência a poules ou apostas em hipódromos, forçoso será concluir que não é lícito o tributo requestado, mormente de entidade, como a recorrente, que não é empresa e se cria ex vi lege (art. 2), inciso 1?, item 3?, letra a da lei federal 4.096/62) como sociedade sem fins lucrativos. Numa consideração singela do problema parece que a proclamação da incidência do imposto resultou de uma interpretação razoável da lel questionada (4.096/62, iterativamente focalizada no r. aresto recorrido, bem como das normas de contato com o tema — decretos leis n?s 406/68 e 834/69), o que vedaria o apelo extremo Súmula 400. Todavia, a questão é, a meu ver, de maior profundidade, justificando um reexame pelo Colendo Supremo Tribunal Federal. A atividade dos Jockey Clubs no pais tem um estatuto peculiar; a licença para apostas é empreitada R.T.J. — 100 excepcional e dependente de prévia licença ministerial, timbrando a lei federal 4.096/62, ao limitar a área da fiscalização federal e conceder «ao município o direito de fiscalizar a observância de sua própria legislação, no âmbito da sua competência constitucional», em enfatizar que — «Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas» (art. 7?, § 2?). E a separação obedece a um esquema coerente, pois a União cobra uma taxa das entidades que explorem apostas sobre competições hípicas (art. 8?), de forma que a intervenção do município nas apostas, que não se confundem com o «espetáculo ou diversão pública» leva á persuação de que há, realmente indevida tributação municipal, não obstante o esforço de argumentação esposado, no r. acórdão recorrido. A matéria ainda sub Judice, portanto, envolve, sem dúvida, hipótese que encontra vestibular pertinência processual para o interposto recurso extraordinário. De outro turno, a questão de não ser o impetrante empresa no sentido das normas tributárias pertinentes, oferece também relevância, desde que não parece de todo procedente a distinção ensaida no acórdão para impor a obrigação fiscal. Por isso, fica o recurso interposto ás fls. 358 deferido para que se permita a sua tramitação procedimental até o acesso ao Egrégio Supremo Tribunal Federal» (fls. 373/375). A douta Procuradoria-Geral da Repúbica é pelo não conhecimento do recurso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator): No julgamento do RE n? 74.849, em que as partes são as mes- 187 mas e mesmas as questões sobre as quais versa o presente recurso, o eminente Ministro Decio Miranda, na qualidade de relator, assim votou: «Fundado o recurso na letra a, todavia o recorrente não chega a indicar precisamente a que disposição legal teria negado vigência o acórdão recorrido.» Afirma, é certo, que «o venerando acórdão de fls. 114/115 vulnerou dispositivos da Carta Magna e de leis federais que, terminantemente, Impedem à Prefeitura Municipal de São Vicente tributar a emissão e venda de palies que o recorrente coloca Junto ao público apostador, a titulo de imposto de serviços de qualquer natureza, considerando que tal fato constitui fato gerador de diversões públicas.» Quais dispositivos da Carta Magna e de leis federais? Não consegue dizê-lo de modo direto e incisivo o recorrente. Acompanhemos, porém, seu raciocínio. Começa por afirmar que «o fato gerador de diversões públicas é a venda do ingresso nos portões, que o eventual apostador paga para entrar no hipódromo.» E lembra que o legislador federal, no art. 7?, § 2?, da Lei n? 4.096, de 18.7.62, deixou escrito o seguinte: § 2?. A fiscalização federal será limitada às atribuições específicas da alçada da União, ressalvado ao Município o direito de fiscalizar a observância de sua própria legisla= çào, no âmbito de sua competência constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas.» 188 R.T.J. — 100 Segue-se, dai, que tributado o ingresso ao espetáculo, o bilhete de entrada, seja impossível tributar a exploração de apostas? Pareçe que não. O mínimo, que se pode tirar do dispositivo, para efeito tributário, é que a tributação de uma das fontes da economia do estabelecimento não impede a da outra. Ou, talvez, que uma e outra fonte devem ser tributadas diferentemente, segundo sua própria natureza. Ora, pelo que se vê dos autos, o Município deu tratamente consentâneo, sob o ponto de vista tributário, a uma e outra espécie. Tributou o bilhete de ingresso pelo seu valor. E tributou a poule, não pelo seu valor, do qual a maior parte volta para os freqüentadores que hajam apostado com acerto mas pelo valor residual deixado no estabelecimento. Ou seja, o Município cobra o imposto, na taxa legal de 10% sobre 31% do valor das apostas, percentual que remanesce com a entidade, depois de pagos os prêmios e as apostas vitoriosas. Inviável, pois, concluir que, admitindo a cobrança do ISS sobre o resultado liquido das apostas, esteja o legislador municipal negando vigência ao dispositivo legal que manda distinguir ingressos no prado e participação nas apostas. Alega, por outro lado, o recorrente, que nos Decretos-leis n? 406, de 31-12.1968, e n? 834, de 8.9.69, o legislador federal de modo algum contemplou as atividades turfisticas. Num e noutro desses diplomas federais, alusivos ao Imposto sobre Serviços, consta a alínea referente a «bilhares, boliches e outros jogos permitidos.» Na Lista de Serviços do Decretolei n? 406: «X — serviços de diversões públicas: bilhares, boliches e outros jogos permitidos, exceto o fornecimento, no recinto, de bebidas, alimentos e outras mercadorias, que fica sujeito ao Imposto de circulação da mercadorias; Na lista de Serviços do Decretolei n? 834: «28 — Diversões públicas bilhares, boliches e outros jogos permitidos; Por outro lado, nada prova em favor da exclusão das apostas turísticas o fato de haver a Lista de Serviços contemplado expressamente a «distribuição e venda de bilhetes de loteria.» Constituirá uma explicitação cautelar, da qual não se pode deduzir que a venda de participação nas apostas de corridas de cavalos, por não explicitada, deixa de compreender-se na rubrica genérica, concernente a «outros jogos permitidos. » Por último, mostra-se inaceitável o argumento de que as sociedades autorizadas á prática de apostas em corridas de cavalos não se enquadram no conceito de «empresa» para o efeito de sujeição à obrigação tributária do Imposto sobre Serviços (art. 71 do código Tributário Nacional; art. 8?, caput, do Decreto-lei n? 406, de 31.12.68). No voto que proferi, com acolhimento desta Turma, no RE 87.890, referente a Imposto sobre Serviços pretendido pelo Município de São R.T.J. - 100 Paulo ao Jockey Clube daquela Capital sobre o preço de estacionamento de veículos em sua sede, afastei a legitimidade da cobrança, por se tratar de serviço prestado sem intuito económico, já que restrito aos sócios da entidade. Nas apostas, ao contrário, em cuja participação não é levada em conta a qualidade de sócio da entidade, o intuito econômico é visível. 2 uma fonte de rendimento, não necessariamente relacionada á conveniência pessoal dos sócios, mas, ao contrário, derivada, em regra, da afluência de pessoas estranhas ao convívio associativo. Quando admite a participação, nas apostas, de estranhos á sociedade, o Jockey Clube atua como empresa, e, assim, não se afasta do campo de incidência do Imposto sobre Serviços. No acórdão que assim decide, nenhuma negativa de vigência de lei federal, multo menos as apontadas pelo recurso extraordinário ora examinado, do qual não conheço.» Depois de pedir vista dos autos, o Senhor Ministro Cordeiro Guerra, em voto divergente, conheceu do recurso e lhe deu parcial provimento, deduzindo, nestes termos, a sua opinião «Solicitei vista dos autos para melhor exame da legislação pertinente às sociedades turfisticas e para conferir os ônus tributários que comportam. Não tenho dúvida em aceitar que as sociedades turfisticas se enquadram, num sentido amplo tributário — no conceito de empresa, e que, conseqüentemente, se subsumem ao imposto de serviços especificado na lista de serviços anexa ao Dec-lei 406, de 1966, na redação do art. 3?, VII, do Dec-lei n? 834, de 3 de setembro de 1969, a saber: 189 «28 — Diversões públicas: c) bilhares, boliches e outros jogos permitidos;» Mas, distingo nos espetáculos surfísticos a diversão, que é o ingresso no hipódromo, do joga ou a aposta. Há diversão quando se paga o ingresso e se assiste ao espetáculo. Há jogo, quando se participa da aposta, isto é, quando o freqüentador compra a poule. No primeiro caso, a venda de ingressos, incide o imposto sobre serviços, no segundo caso, participação no jogo, pelo turfista, não incide o tributo, muito menos como pretende o recorrido em 10% sobre o provento líquido de 31% da sociedade mantenedora do hipódromo. E, isto porque, como esclarece Bernardo Ribeiro de Morais: «Conforme se verifica, a diversão pública alcançaria pelo ISS é aquela que representa a venda (circulação) do bem material (direito de adentrar no local onde se realiza a diversão). Ao direito tributário interessa apenas a atividade que tem por objeto recrear ou divertir o público, com acesso ao local através de pagamento.» Carlos de Alvarenga Sentardes considera elemento indispensável para a configuração da diversão pública e para efeitos tributários «a cobrança de entrada ou pagamento do ingresso ou do direito a participar de divertimento.» A hipótese de incidência tributária não é encontrada na simples realização do divertimento, mas na venda do direito de ingresso ao locai onde tal divertimento é realiza- do. Quando qualquer interessado se dirige à bilheteria e adquire um «bilhete de ingresso,» estará ele 190 R.T.J. - 100 adquirindo o direito de entrar (ingressar no local). A empresa de diversões públicas vende ao interessado este direito. Eis ai a hipótese de incidência do ISS, para o caso de diversões públicas. E acrescenta com autoridade: «Fatos posteriores ao da ocorrência do fato imponível (venda do direito de ingresso no local da diversão pública) não ficam nas cogitações do Fisco. O poder tributante não irá verificar se o interessado na diversão divertiu-se ou não Não irá ver se o interessado dormiu ou apreciou todo espetáculo. O que é fato essencial para a tributação é a venda do ingresso, isto é, a venda do direito de ingresso no local da diversão pública (Doutrina e Prática do Imposto sobre Serviços — RT 1975— p. 292/293).» No caso, é o ingresso no hipódromo mediante bilhete pago. Ao pretender cobrar da empresa, não o serviço, não é a produção de diversão, mas uma participação no produto das apostas, a Municipalidade incursiona na esfera de competência federal, pois à União compete instituir imposto sobre renda de produtos de qualquer natureza — art. 21, IV da CF, ou ainda no campo de incidência das contribuições previstas no § 2? do art. 21 da DV, criada com a finalidade de intervir no domínio econômico, de atender ao interesse de categorias profissionais e para atender diretamente a parte da União no custeio dos encargos da previdência social. Ora, com essa finalidade, a Lei 4.096, de 18 de julho de 1962 excluiu da incidência penal as apostas em corridas de cavalo, para promover a criação eqüina e estimular os criadores nacionais, isto é, uma finalidade econômica, disciplinando os prêmios, e a participação neles dos criadores e proprietários e sujeitando as sociedades mantenedoras dos hipódromos à fiscalização federal, dispondo expressamente: «art. 7° § 2? A fiscalização federal será limitada às atribuições específicas da alçada da União, ressalvado ao Município o direito de fiscalizar a observância de sua própria legislação, no âmbito de sua competência constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas» (dispositivo dado como violado na petição de recurso extraordinário). E, no art. 8?, a União sujeita as entidades turfisticas ao pagamento de uma taxa equivalente a 10% do valor dos prêmios atribuídos aos proprietários dos animais classificados em todos os páreos das reuniões de cada mês. Essas taxas são cobradas em benefício da Comissão Coordenadora da Criação do Cavalo Nacional, que a aplica na execução da política do governo no particular. Sobre a renda líquida das apostas incide a contribuição de previdência social, desde a Lel n? 3.807, de 26 de agosto de 1960 — art. 74, e § 1?, alterado pelo Dec-lei 1.129, de 13 de outubro de 1973, regulamentado pelo Decreto 67.646, de 23 de novembro de 1970, no qual se lê: art. 8? Considera-se renda líquida auferida pela entidade turfística o saldo da importância por ela retirada das apostas, depois de feitas as seguintes deduções: a) o valor dos prêmios pagos aos proprietários, criadores e profissionais; R.T.J. — 100 o valor dos tributos a serem recolhidos.» O Decreto-lei n? 717, de 30 de julho de 1969, deu nova redação ao Dec-lei 204, de 27 de fevereiro de 1967, art. 4?, e estabeleceu o critério de cobrança da contribuição da Previdência Social, sobre a renda liquida auferida pelas entidades turfisticas em cada reunião hípica — art. 2? — que altera o art. 74 da Lel 3.807, de 26 de agosto de 1960 — e na letra b se dispõe que a entidade pagará 5% sobre a renda liquida até NCrt-150.000,00; 10% de NCrt-150.000,00 a 250.000,00 e 30% acima de NCr$-250.000,00. Em conseqüência, tenho por legitima a cobrança do ISS, sobre os ingressos vendidos aos freqüentadores dos hipódromos, porém, como ilegítima a pretensão do município de tributar — a renda das apostas ou proventos das sociedades mantenedoras de hipódromos, por ser tal da competência tributária da União. Pelo exposto, conheço do recurso e lhe dou provimento, em parte, para excluir a pretensão do autor de haver 10% sobre a renda liquida da sociedade mantenedora do Jóquei Clube de S. Vicente. E o meu voto, data venia, do eminente relator.» Solicitando, também, vista dos autos, terminei por acompanhar o voto do Ministro Cordeiro Guerra, dizendo: «Peço vênia ao eminente Relator, Ministro Dedo Miranda, para acompanhar o voto dissidente, emitido pelo Ministro Cordeiro Guerra, cuja opinião coincide, ponto por ponto, com aquela a que cheguei, depois de minucioso exame da questão. Diante disso, conheço do recurso e lhe dou provi- mento, em parte, para limitar a incidência do ISS ao preço dos bilhetes de ingresso no hipódromo.» Subscrevendo, agora, novamente, as razões em que se estribou o Ministro Cordeiro Guerra para a conclusão a que chegou, conheço do presente recurso e lhe dou provimento, em parte, para limitar a incidência do ISS ao preço dos bilhetes de ingresso no hipódromo. VOTO O Sr. Ministro Dedo Miranda: Sr. Presidente, com a vênia devida ao eminente relator, mantenho, sobre a espécie, o voto que proferi no RE 74.849, a dizer: «Fundado o recurso na letra a, todavia o recorrente não chega a indicar precisamente a que disposição legal teria negado vigência o acórdão recorrido. Afirma, é certo, que «o venerando acórdão de fls. 114/115 vulnerou dispositivos da Carta Magna e de leis federais que, terminantemente, impedem à Prefeitura Municipal de São Vicente tributar a emissão e venda de poules que o recorrente coloca junto ao público apostador, a titulo de imposto de serviços de qualquer natureza, considerando que tal fato constitui fato gerador de diversões públicas.» Quais dispositivos da Carta Magna e de leis federais? Não consegue dizê-lo de modo direto e incisivo o recorrente Acompanhemos, porém seu raciocínio. Começa por afirmar que «o fato gerador de diversões públicas é a venda do ingresso nos portões, que o eventual apostador paga para entrar no hipódromo.» 192 R.T.J. — 100 E lembra que o legislador federal, no art. 7?, § 2?, da Lei ri? 4.096, de 18.7.62, deixou escrito o seguinte: a§ 2?. A fiscalização federal será limitada às atribuições específicas da alçada da União, ressalvado ao Município o direito de fiscalizar a observância de sua própria legislação, no âmbito de sua competência constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão pública se consideram atividades distintas.» Segue-se, daí, que tributado o ingresso ao espetáculo, o bilhete de entrada, seja impossível tributar a exploração de apostas? Parece que não. O mínimo, que se pode tirar do dispositivo, para efeito tributário, é que a tributação de uma das fontes da economia do estabelecimento não impede a da outra. Ou, talvez, que uma e outra fonte devem ser tributadas diferentemente, segundo sua própria natureza. Ora, pelo que se vê dos autos, o Município deu tratamento consentâneo, sob o ponto de vista tributário, a uma e outra espécie. Tributou o bilhete de ingresso pelo ingresso nos portões, que o eventual apostador paga para entrar no hipódromo.» E lembra que o legislador federal, no art. 7?, § 2?, da Lel n? 4.096, de 18.7.62, deixou escrito o seguinte: 2?. A fiscalização federal será limitada às atribuições específicas da alçada da União, ressalvado ao Município o direito de fiscalizar a observância de sua própria legislação, no âmbito de sua competência constitucional. Para todos os efeitos, a exploração de apostas e o espetáculo ou diversão Pública se consideram atividades distintas.» Segue-se, daí, que tributado o ingresso ao espetáculo, o bilhete de entrada, seja impossível tributar a exploração de apostas? Parece que não. O mínimo, que se pode tirar do dispositivo, para efeito tributário, é que a tributação de uma das fontes da economia do estabelecimento não impede a da outra. Ou, talvez, que uma e outra fonte devem ser tributadas diferentemente, segundo sua própria natureza. Ora, pelo que se vê dos autos, o Município deu tratamento consentâneo, sob o ponto de vista tributário, a uma e outra espécie. Tributou o bilhete de ingresso pelo seu valor. E tributou a poule, não pelo seu valor, do qual a maior parte volta para os freqüentadores que hajam apostado com acerto, mas pelo valor residual deixado no estabelecimento. Ou seja, o Município cobra o imposto, na taxa legal de 10%, sobre 31% do valor das apostas, percentual que remanesce com a entidade, depois de pagos os prêmios e as apostas vitoriosas. Inviável, pois, concluir que, admitindo a cobrança do ISS sobre o resultado líquido das apostas, esteja o legislador municipal negando vigência ao dispositivo legal que manda distinguir ingresso no prado e participação nas apostas. Alega, por outro lado, o recorrente, que nos Decretos-leis n? 406, de 31.12.1968, e n? 834, de 8.9.69, o legislador federal de modo algum contemplou as atividades turfisticas. R.T.J. — 100 Num e noutro desses diplomas federais, alusivos ao Imposto sobre Serviços, consta a alínea referente a «bilhares, boliches e outros jogos permitidos.» Na Lista de Serviços do Decretolei n? 406: «X — serviços de diversões públicas: bilhares, boliches e outros jogos permitidos, exceto o fornecimento, no recinto, de bebidas, alimentos e outras mercadorias, que fica sujeito ao imposto de circulação de mercadorias; Na lista de Serviços do Decretolei n? 834: «28 — Diversões públicas. bilhares, boliches e outros jogos permitidos: Por outro lado, nada prova em favor da exclusão das aPostas turfístkas o fato de haver a Lista de Serviços contemplado expressamente a «distribuição e venda de bilhetes de loteria». Constituirá uma explicitação cautelar, da qual não se pode deduzir que a venda de participação nas apostas de corridas de cavalos, por não explicitada, deixa de compreender-se na rubrica genérica, concernente a «outros jogos permitidos.» Por último, mostra-se inaceitável o argumento de que as sociedades autorizadas à prática de apostas em corridas de cavalos não se enquadram no conceito de «empresa» para o efeito de sujeição à obrigação tributária do Imposto sobre Serviços (art. 71 do Código Tributário Nacional; art. g?, caput, do Decreto-lei n? 406, de 31.12.68). 193 No voto que proferi, como acolhimento desta Turma, no RE 87.090, referente a Imposto sobre Serviços pretendido pelo Município de São Paulo ao Jockey Clube daquela Capital sobre O preço de estacionamento de veículos em sua sede, afastei a legitimidade da cobrança, por se tratar de serviço prestado sem intuito económico, já que restrito aos sócios da entidade. Nas apostas, ao contrário, em cuja participação não é levada em conta a qualidade de Sócio da entidade, o intuito económico é visível. E uma tente de rendimento, não necessariamente relacionada à conveniência ~Soai dos sócios, mas, ao contrário, derivada, em regra, da afluência de pessoas estranhas ao convívio associativo. Quando admite a participação, nas apostas, de estranhos à sociedade, o Jockey Club atua come empresa, e, assim, não se afasta do campo de incidência do Imposto sobre Serviços. No acórdão que assim decide, nenhuma negativa de vigência de lei federal; muito menos as apontadas pelo recurso extraordinário ora examinado, dó qual não conheCo.» o meu voto. EXTRATO DA ATA RE. 74.506 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Jockey Club São Vicente (Adv.: Domingos Pacifi -coNet).Rda:PrfiuMncipal de São Vicente (Adv.: Reynaldo P. Ayrosa). Decisão: Conhecido e provido parcialmente nos termos do voto do Relator, vencido o Ministro Decio Miranda. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes á Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e 194 R.T.J. — 100 Decio Miranda. Subprocurador- Brasília, 31 de outubro de 1980 — Geral da República, Dr. Mauro Leite Hélio Francisco Marques, Secretario. Soares. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 77.604 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder. Recorrente: Malek Cury — Comercial, Importadora e Exportadora Limitada — Recorrida: União Federal. O fato gerador do imposto de Importação é a entrada, no território nacional, da mercadoria importada. Discussão a respeito de o importador haver adquirido o direito de pagar tal imposto mediante aplicação de alíquota mais favorável. Improcedência do argumento. Divergência pretoriana que não se acha demonstrada. Recurso extraordinário a que o STF nega conhecimento. Acta:ai/to II. Ao referido acórdão interpôs recurso extraordinário a vencida, MaVistos e relatados estes autos de lek Cury — Comercial, Importadora Recurso Extraordinário n? 77.604, do e Exportadora Ltda., que se baseou Estado de São Paulo, em que é re- no art. 119, III, a) e d), da Constituicorrente Malek Cury — Comercial, ção. Importadora e Exportadora LimitaQuanto ao primeiro fundamento, da e recorrida a União Federal, de- alega o acórdão impugnado concide o Supremo Tribunal Federal por trariouque o art. 3?, da Constituisua Primeira Turma, unanimemen- ção, no ponto 153, referente à garantia do te, não conhecer do recurso, de acor- direito adquirido. do com as notas juntas. No tocante ao segundo fundamenBrasília, 19 de maio de 1981 — Antonio Neder — Presidente e Rela- to, sustenta que o mencionado acórdão contém divergência com o do tor. RE n? 62.248, copiado nas fls. 92-97. RELATÓRIO O recurso não foi admitido, mas o O Sr. Ministro Antonio Neder (Re- provimento de agravo fê-lo subir a lator) — I. A matéria julgada pelo esta Corte para melhor exame do caacórdão recorrido acha-se resumida so. com exatidão na sua ementa, f. 85: As partes razoaram-no e a eg. Pro«Imposto de Importação. O fato curadoria-Geral da República emitiu gerador é a entrada da mercadoria o seguinte parecer, fls. 119 a 119: estrangeira no território nacional. «1 — Nada temos a acrescentar, Nova alíquota do Decreto-lei n? data venta, aos pronunciamentos 398, de 30-12-68, aplicada a mercada douta 9! Subprocuradoria-Geral doria que não se provou oportunada República (fls. 100 e 113), os mente, tenha sido entregue nos arquais demonstram o não cabimenmazéns do porto de origem antes to do presente recurso extraordináda data de publicação daquele Decreto-lei.» rio. R.T.J. — 100 «2 — Cabível, que fosse, o recurso extraordinário a questão se apresenta inteiramente desfavorável à ora recorrente, conforme se vê dos precedentes Jurisprudenciais: «Importação de mercadoria. Data do câmbio é aquela do despacho aduaneiro. Entendimento do art. 165 da Nova Consolidação das Leis da Alfândega e do art. 60, da Lei n? 3.244, de 1957» (Rec. Extr. n? 52.191, in DJ de 31-5-68 — pág. 1.987); Os direitos a cobrar são os vigentes na época do desembaraço em território nacional, para despacho» (Rec. Extr. n? 55.474, «Rev Trim. de Jur.» — vol. 37 — pág. 101 -- Rel. Min. Aliomar Baleeiro). «3 — Com efeito, nenhuma dúvida existe sobre ser devido o imposto de importação calculado com base na aliquota vigente à data da entrada da mercadoria no Pais, vez que, conforme definido no art. E', do Dec-lei n? 37-66, o imposto de importação incidente sobre mercadoria estrangeira »... tem como fato gerador sua entrada no território nacional.» No mesmo sentido dispõe a Lei n? 5.172-66 (Código. Tributário Nacional) artigo 19, verbis: «O imposto de competência da União, sobre importação de produtos estrangeiros tem como fato gerador a entrada destes no território nacional.» 4 — Somos, pelo exposto, pelo não conhecimento do presente recurso extraordinário.» III — E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator) — I. A fundamentação do 195 acórdão recorrido é a que se lê neste voto do seu Relator no TFR, f. 83: *Segundo o art. 1? do Decreto-lei n? 37, de 18-11-66 o imposto de importação tem como fato gerador a entrada da mercadoria estrangeira no território nacional. a() Decreto-lei n? 398, citado, no art. 4? garantiu o despacho aduaneiro pela aliquota anterior nã mercadoria embarcada até a data de sua publicação.» *Na inicial, a firma impetrante admitiu que a mercadoria «foi embarcaria alguns dias após a entrada em vigor» Decreto-lei 398. «O atestado, Juntado ao fãto de provar fato equivalente ao embarque — a entrega da mercadoria nos armazéns do porto de origem — só veio agora aos autos, com o recurso, desvalorizado pela ausência de contraditório oportuno a seu respeito. «Por isso, mantenho a sentença, não podendo dar valor ao atestado sobre o qual a autoridade apontada como coatora não teve ocasião de se manifestar. «Nego provimento ao recurso.» Pelo que se contém na transcrita fundamentação, bem se vê que o acórdão impugnado, não contraria o princípio constitucional do direito adquirido, nem diverge do acórdãopadrão, pois este Julgou o caso na consideração de certa peculiaridade, como se vê de sua ementa, f. 92: «Importação. Acórdão que, à vista de circunstâncias peculiares do caso, dá como caracterizado o direito adquirido da impetrante de proceder ao desembaraço da mercadoria segundo a lei vigente ã data da emissão da licença e cobertura cambial conseqüente. Recurso extraordinário não conhecido.» II — Não conheço do recurso, é o meu voto. R.T.J. — 100 196 Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão RE 77.604 — Si' — Rel.: Min. Anto- os Senhores Ministros Cunha Peixonio Neder. Recte.: Malek Cury — Co- to, Soares Mulloz, Rafael Mayer e mercial, Importadora e Exportadora Clovis Ramalhete. SubprocuradorLtda. (Advs.: Rubens de Barros Bri- Geral da República, o Dr. Francisco solla e outros), Recda.: União Fede- de Assis Toledo. ral. Brasília, 19 de maio de 1981 — Decisão: Não se conheceu do re- Antônio Carlos de Azevedo Braga — curso. Votação uniforme. Secretário. EXTRATO DA ATA AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 79.866 (AgRg) — SE' (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Soares Mufioz. Agravante: Sérgio Sérvulo da Cunha — Agravado: Banco Itaú S/A. A apresentação de contas, extrajudicialmente, não impede que sejam exigidas em juízo, se não houve acertamento amigável a respeito daquelas. Agravo regimental desprovido. ACORDA0 Vistos. Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, à unanimidade de votos na conformidade das notas taquigráficas, negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 19 de agosto de 1980 — Thompson Flores, Presidente — Soares Mulloz, Relator, RELATÓRIO O Sr. Ministro Soares Mufloz: Eis o teor do despacho impugnado no presente agravo regimental: «Nego seguimento ao agravo de instrumento, mantendo o despacho denegatório do recurso extraordinário, por seus fundamentos, verbis: «Quanto à letra d do permissivo constitucional, além do recorrente não cumprir o disposto no art. 305 do RISTF, já que não indicou repositório de jurisprudência e nem juntou cópia autenticada dos julgados apresentados como contatentes, tal decisão é desta Corte, não servindo para fundamentar o recurso Súmula 369, quanto à letra a, não se percebe em que teria o r. julgado recorrido vulnerado o ãrt. 3? do Código de Processo Civil. Já na sentença de primeiro grau, confirmada nessa parte, colocavase que «várias tentativas de acertamento de contas foram realizadas, todas sem êxito. É que o que se infere da prova literal que acompanha a resistência. Não havendo o acertamento amigável e, não sendo aceita a prestação feita em caráter extrajudicial, necessário se faz a prestação judicial de contas que deve ser elaborada em conformidade com os requisitos legais» (fls. 226). A Turma Julgadora aduz que, «realmente, a demonstração do interesse para agir ficou feita pelos autores, que, insatisfeitos com a forma e a exposição das contas apresentadas em caráter particular, querem a prestação segundo o que preceitua a lei, com o pronunciamento judicial sobre elas» (fls. 256). Tenho, aliás, como evidente que, se não satisfazem as contas extra judicialmente R.T.J. — 100 prestadas por quem está obrigado a fazê-lo, poderá a outra parte reclamar a prestação judicial. Houve, portanto, interpretação razoável à lei, o que obsta o recurso extremo Súmula n? 400.. Finalmente, quanto ao art. 508 do Código de Processo Civil, o recorrente não apresentou qualquer argüição de intempestividade do recurso adesivo dos autores, quer nas contrarazões de fls. 246/247 e quer por via de embargos declaratórios. A falta de prequestionamento veda o recurso Súmulas 282 e 356» (fls. 43 a 44) (fls. 80). No agravo regimental o recorrente alega, em síntese, que é errônea a tese firmada pelo despacho impugnado, consoante a qual se não satisfazem as contas prestadas extrajudicialmente, poderá a outra parte reclamá-las judicialmente, pois, se as contas já foram prestadas em caráter particular, sem qualquer ressalva, objeção ou pedido de esclarecimento por parte do destinatário, não tem este ação para exigi-las em juizo. E o relatório. 197 dão, não abonam a versão apresentada no agravo, visto que consta do acórdão que, «realmente, a demonstração do interesse «para agir ficou feita pelos autores, que, insatisfeitos com a forma e a exposição das contas apresentadas em caráter particular, querem a prestação segundo o que preceitua a lei, com o pronunciamento judicial sobre elas» (fls. 35). Ante o exposto, nego provimento ao agravo regimental. EXTRATO DA ATA Ag. 79.866 — (AgRg) — SP — Rel.: Min. Soares Muitoz. Age.: Sérgio Servido da Cunha (Adv.: Sérgio Roberto Alonso). Agdo.: Banco Baú S.A (Advs.: Sebastião Silveira Dutra e outros). Decisão: Negaram provimento ao Agravo Regimental. Decisão: unânime. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mudez e Rafael Mayer. Ausente, Justiricadanierne, o Sr. Ministro Xavier de Albuquerque. Subprocurador-Gerai da República, Dr. Francisco de Assis Toledo. VOTO Brasília, 19 de agosto de 1980, — O Sr. Ministro Soares Mufloz (Re- Antônio Carlos de Azevedo Braga, lator 1: Os fatos, discutidos no acór- Secretário. RECURSO. EXTRAORDINÁRIO N? 82.493 — RJ (Primeira Turma) Relator O Sr. Ministro Antonio Neder. Recorrente: Estado do Rio de Janeiro — Recorrida: Mama Augusta Ferreira Cardoso Ponce de Leão. Enfiteuse. E matéria de Direito Civil, da competência legisititiva da União. O Estado-membro não pode legislar sobre o assunto. Inconstituclonalidade manifesta de normas locais editadas sobre o referido instituto. Precedentes do S upremo Tribunal. 3. Recurso extraordinário a que a Corte nega conhecimento. — 100 198 ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos de Recurso Extraordinário n? 82.493, do Estado do Rio de Janeiro, em que é recorrente o referido Estado e recorrida Maria Augusta Ferreira Cardoso Ponce de Leão, decide o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas juntas. Brasília, 05 de mato de 1981 — Antonio Neder, Presidente e Relator. RELATÓRIO «1 — Cuida-se de resgate de aforamento, matéria de direito civil, sobre a qual o Estado-recorrente legislou, indevidamente, na pretensão de atualizar o valor da «pensão anual». «O caso é idêntico ao de que tratou o RE 81.930, relatado, no Pleno, pelo eminente Ministro Thompson Flores, com a decisão de seu não conhecimento (Sessão de 29-9-75). «2 — Dispensamo-nos, pois, de maior consideração sobre também não ser conhecido o presente recurso.» IV - E o relatório. Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O acórdão impugnado neste VOTO recurso extraordinário foi proferido pelo eg. Tribunal de Justiça do Rio O Sr. Ministro Antonio Neder. (Rede Janeiro, e se acha redigido com lator): I. O acórdão impugnado não ventilou as matérias das normas que esta ementa, 1. 68: Estado recorrente considera ofen«Enfiteuse. Resgate de afora- didas. mento de bem estadual. InconstituNão as questionou em seu brevíssicionalidade do Dec.-lei n? 317/970. mo texto. • «Procede-se ao resgate do aforaSe o referido acórdão não discutiu mento de bem estadual mediante as mencionadas normas, a óbvia aplicação da lei federal, mormente conclusão é a de que não as contrase o decreto-lei estadual, em que riou. se funda a exigência da autoridade Incide, pois, no caso, a jurispruadministrativa, já foi declarado in- dência que o STF resumiu nos verbeconstitucional.» tes 282 e 356 da Súmula. II — A esse acórdão interpôs reComo quer que seja, o acórdão imcurso extraordinário o Estado venci- pugnado se harmoniza com a jurisdo, que se fundou no art. 119, III, a), prudência desta Corte sobre o tema. da Constituição. Com efeito, ao julgar o RE 81.930, Plenário do Supremo Tribunal firAlegou que o referido acórdão con- mou o entendimento de que o trariou os artigos 13 e 116 da Consti- Estado-membro não tem competêntuição e vulnerou os artigos 66 e 67 cia para legislar sobre o instituto da do Código Civil. enfiteuse, ainda que o imóvel enfirecurso foi admitido, f. 78, ra- têutico seja um bem público, porque zoado, fls. 81 a 84, e contra- se trata de matéria pertinente ao diarrazoado, fls. 87 a 90, tudo nestes reito civil, da competência legislativa da União, como se lê no art. 8?, termos: ... (lê). XVII, b), da Carta Política, e, por isIII — A eg. Procuradoria-Geral da so, julgou Inconstitucionais as norRepública emitiu o seguinte parecer, mas que o Estado do Rio de Janeiro f. 109: editou sobre o assunto. 199 R.T.J. —100 E o que se lê na ementa do acórdão acima referido (RTJ, 77/323): «Enfiteuse. Bens do Estado. Resgate. «Regula-se pelo art. 693 do C. Civ. (Redação da Lei 5.827/72). «Nem supletivamente pode o Estado legislar a respeito do instituto, tanto mais diferentemente do C. Civil. «Inconstitucionalidade dos arts. 13 do Dec.-lei Complementar 3/69, e 17 do Dec.-lei 317/70, do extinto Estado da Guanabara. «II — Recurso extraordinário não conhecido.» Noutros acórdãos foi o tema julgado no mesmo sentido: RE 80.342 (RTJ, 76/605), RE 83.874 (RTJ, 76/665), RE 84.509 (RTJ, 80/228), RE 84.974 (RTJ, 81/913), RE 86.600 (RTJ, 82/315). II — Voto pelo não-conhecimento do recurso. EXTRATO DA ATA RE-82.493 — RJ — Rel.: Min. Antonio Neder. Recte.: Estado do Rio de Janeiro (Adv.: Sebastião Luiz de Andrade Figueira). Ftecda.: Maria Augusta Ferreira Cardoso Ponce de Leão (Adv.: Luiz Alfredo .de Moraes). Decisão: Não se conheceu do recurso. Votação uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Muãoz, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 05 de maio de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 82.983 — (AgRg) — PE (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Agravante: Estado de Pernambuco — Agravado: Cotonificio Moreno S/A. Recurso Extraordinário, requisitos. — Se os Embargos de Declaração provocaram o exame de outras questões de direito entre as quais não se incluem estas, que vieram a ser agitadas em Recurso Extraordinário, elas por LM não se entendem como decididas em última Instância na causa em apreço (Constituição Federal, art. 119. III): não cabe Recurso Extraordinário que as encaminhe ao Supremo Tribunal Federal. — Agravo Regimental a que não se dá provimento. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na Conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráfi- cas, por unanimidade, de votos, ne- gar provimento ao agravo. Brasília, 14 de agosto de 1981 Cunha Peixoto — Presidente Clovis Ramalhete — Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro ClOvis Ramalhete — 1 — A questão do acórdão versa o seguinte: 200 R.T.J. — 100 Cotonificio Moreno S/A, Sociedade estabelecida na cidade do Moreno, neste Estado, promoveu, perante o Juízo da Vara Privativa dos Feitos da Fazenda Estadual, uma Ação ordinária contra o Estado de Pernambuco, o Departamento de Agua e Energia (DAE) e a Companhia de Eletricidade de Pernambuco (CELPE). 2 — Com a ação, visou, o autor, a execução e cumprimento, pelos réus, de cláusulas de contrato de Promessa de Troca firmado entre as partes, especialmente para que: a) o Estado de Pernambuco proceda à avaliação e á autorização dos bens objeto do contrato: b) faça a entrega, ao autor do número de ações da CELPE correspondente ao valor dos bens, devidamente atualizado: c) e em relação a CELPE, lhe fosse reduzida a tarifa de energia fornecida ao autor. 3. A ação foi julgada improcedente, na primeira instância, sentença que foi reformada, em parte, pela Egrégia Primeira Câmara Cível, fixando-se o valor, em ações da Companhia de Eletricidade do Estado de Pernambuco (CELPE) a ser pago ao autor, com juros e correção monetária, além dos honorários advocaticlos.» 2 — O Estado requereu Recurso Extraordinário fundado na letra A do art. 119. III, da Constituição, dando por negada a vigência do art. 1.061 e 906 do Código Civil, que foi indeferido por despacho fundamentado. 3 — Tirado o Agravo de Instrumento, pelo Estado, contra o indeferimento do seu Recurso Extraordinário, neguei seguimento pelos mesmos fundamentos do despacho, que, examinados os autos, correspondia ao caso. O fundamento consistiu em que a questão de direito da regra do art. 1.061 do Código Civil bem como a do 960 não foi versada no acórdão recorrido. Houve sim, Embargos de Declaração opostos pelo Estado mas versando ponto omisso diverso das questões que veio a agitar no Recurso Extraordinário. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Clovis Ramalhete (Relatar) — 1 — E de ser negado seguimento ao Recurso Extraordinário, se as questões de direito contidas nos arts. 1.061 e 960 do Código Civil não foram versadas no acórdão recorrido nem objeto de Embargos de Declaração que forçassem a apreciação delas. 2 — O caso versa promessa de troca, objeto de Escritura Pública, o Cotonificio tendo cedido uso e posse dhe bens referidos no contrato e prometido a transferência da propriedade dos mesmos quando recebesse ações de certa S/A, a ser constituída. 3 — E manifesto que não se tratou no caso de perdas e danos por descumprimento de obrigações em dinheiro, e pois, não ensejaria a aplicação do art. 1.061 do Código Civil. 4 — Mas, no juízo de admissibilidade do Recurso Extraordinário, fica-se no requisito do prequestionamento, que não houve, e na verificação de que o acórdão decidiu fazendo mera interpretação de contrato. 5— A vista de que sou do entendimento de manter o despacho com que indeferi o Agravo de Instrumento, que teve estes fundamentos, rejeito o presente Agravo Regimental. E o voto. EXTRATO DA ATA Ag. 82.983 — (AgRg) — PE — Rel.: Min. Clovis Ramalhete. Agte.: Estado de Pernambuco. (Advs.: Joaquim Correia de Carvalho Júnior e R.T.J. — 100 José Guilherme Vllella). Agdo.: Cotonifício Moreno S/A. (Adv.: Walter Mala Santiago). Decisão: Negaram provimento ao Agravo Regimental. Decisão unânime. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão 201 os Senhores Ministros Soares Mufioz, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Francisco de Asssis Toledo. Brasília, 14 de agosto de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga — Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 83.351 (AgRg) — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra. Agravantes: Albert Alcouloumbre e outros — Agravado: Estado do Rio de Janeiro. Desapropriação. Direitos pessoa s« por ela não atingidos. Inocor~eia de ofensa ao art. 153, f 22, da CF. AgRg improvido, — art. 308, VI do RI. ACOltDA0 Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 18 de setembro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro Guerra, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O recurso extraordinário foi indeferido pelo seguinte despacho: «Indefiro o recurso, salvo quanto à argüição de relevância da questão federal, cuja apreciação é da competência privativa do Excelso Pretórios Nesse sentido, forme-se o necessário instrumento. A Egrégia Oitava Câmara Civel, ao confirmar a sentença de primeiro grau ( fls. 620-32), sintetizou seu entendimento na seguinte ementa: «Ação ordinária, por parte dos adquirentes de cadeiras cativas a serem construídas em autódromo, contra o Estado do Rio de Janeiro, poder expropriante de lotes, onde as mesmas iriam ser construídas: improcedência. A decisão exeqüenda (Embargos Infringentes), fixando a legitimidade passiva do Estado para ser acionado, não impede o reconhecimento da improcedência da ação. Afirmações ali contidas em votos não fazem coisa julgada (Inciso Ido art. 469 do CPC), pois constituem os meros obiter dictum do direito angio-americano. «Bem destacou a sentença apelada, ora unanimemente mantida, que na ação de-desapropriação foi fixada indenização abrangente dos lotes de terreno e das benfeitorias então existentes: um barracão de madeira e uma pista mal conservada, sendo que as mencionadas cadeiras perpétuas jamais existiram. Em tais condi- 202 R.T.J. — 100 ções sobreveio a concordata da firma construtora e proprietária dos ditos lotes, posteriormente desapropriados. Ausência de prévia publicidade de contratos particulares por ela firmados com os AA. Legem habemus regendo a matéria, o art. 31 da Lei de Desapropriações (I11. n? 3.365, de 216-41 ), no sentido de que: «Ficam subrogádos no preço quaisquer ônus que recaiam sobre o bem expropriado». Inconformados com esse decisório, que se acha a fls. 680-5, os autores interpuseram o recurso extraordinário de fls. 687-95, invocando a alínea a do permissivo constitucional. Incidindo, na hipótese, o vedativo previsto no art. 308, VI, do RI do STF, os recorrentes procuraram contorná-lo, alegando ofensa a dispositivo da Constituição e argüindo a relevância da questão federal, esta última de apreciação privativa do Excelso Pretório. Inexiste a apontada infringência do art. 153, 22, da Constituição, eis que nada mais fez a Egrégia Câmara que dar ao aludido texto razoável interpretação à luz das provas produzidas — (Súmula 400 e 279). Rio de Janeiro, 19-8-1980 — Des. Antonio Marins Peixoto, 2? VicePresidente. (fls. 41-43). A argüição de relevância intentada foi rejeitada. Neguei seguimento ao recurso pelo seguinte despacho: «O recurso extraordinário foi indeferido com fundamento no art. 308, VI, do RI — fls. 41-43. Rejeitada a Argüição de Relevância 9.742 — verifico, por igual, que o V. Acórdão impugnado não negou vigência ao art. 153, 22 da CF, pois se limitou a reconhecer que não poderia ser indenizado o que não chegou a existir, e que o contrato existente entre os agravantes e expropriada era inoponível ao exPropriante, e, em conseqüência, aplicável à espécie, o art. 31 da Lei das Desapropriações. Inocorrentes as exceções regimentais, nego seguimento ao recurso. Acrescento, que o V. Acórdão impugnado, bem fundamentado, também mereceria confirmação por força das Súmulas 279, 454 e 400. Brasília, 198-1981» (fls. 140 e v). Contra esse despacho insurgem-se, na forma regimental, .os agravantes, sustentando negativa de vigência do art. 153, 22 da CF, pois aos direitos dos agravantes são valores patrimoniais à parte, não tendo qualquer vinculaçâo real com a propriedade expropriada, embora hajam sido levados de roldão com ela», e que inaplicável à espécie é o art. 31 da Lei das Desapropriações. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra (Relator): Realmente, os direitos dos agravantes eram pessoais contra a expropriada. Não se materializou, não chegou a constituir bem, ou objeto da desapropriação, que só atingiu a propriedade da expropriada. Assim, se a expropriada não cumpriu o contrato com os agravantes, por isso deve responder, eventualmente, não o expropriante. Portanto, não só houve violação do art. 153, 22 da CF, como bem invocado foi o art. 31 da Lei das Desapropriações. Nego provimento ao agravo regimental. É o meu voto. R.T.J. — 100 EXTRATO DA ATA Ag.83.351 — (AgRg) — RJ — Rei.: Min. Cordeiro Guerra. Agtes.: Albert Alcouloumbre e outros (Advs.: Márcio Luiz Malta, Alcino Guedes da Silva e outro). Agdo.: Estado do Rio de Janeiro. (Adv.: Francisco S. Moniz de Aragão). Decisão: Negado provimento ao Agravo Regimental. Unânime. 203 Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 18 de setembro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 83.353 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrentes: João Agripino Mala Sobrinho e outros — Recorrido: Instituto do Açúcar e do Alcool. Intervenção no domínio econômico. Instituto do Açúcar e do Alcool. Fornecedores de cana. Pagamento quinzenal. Não cabe quando instituído regime de comercialização da safra mediante retenção dos estoques (RE 83.328). Recurso extraordinário não conhecido. ACOFIDA0 Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso. Brasília, 07 de agosto de 1981. — Djaci Falcão, Presidente — Leitão de Abreu, Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: Trago à apreciação da Turma, para julgamento conjunto, os RR.EE n?s 83.328 e 83.353, primeiro concernente ao AMS 67.376, o segundo ao AMS67.548, ambos julgados pelo Tribunal Federal de Recursos, e atinentes à aplicação da Resolução n? 2.034, de 1969, do Instituto do Açúcar e do Álcool. Perante a Segunda Turma do Tribunal Federal de Recursos, o Ministro Decio Miranda, relatando o AMS 67.376, assim apresentou o caso: «A Usina Santo Antônio S.A. — Açúcar e Alcool, fls. 2, logo seguida de numerosas outras empresas açucareiras do Estado de São Paulo, fls. 69, impetraram o presente mandado de segurança, ajuizado em 26-1-70, para livrar-se dos efeitos da Resolução n° 2 034, de 6-1269, do Conselho Deliberativo do Instituto do Açúcar e do Álcool na parte em que, modificando a sistemática anteriormente estabelecida para a mesma safra regulou o pagamento aos fornecedores de cana, o qual, segundo aquela Resolução, passaria a ser efetuado no período de 1? de julho a 31 de dezembro como adiantamento mensal do preçobase e no período de 1? de janeiro a 31 de março de 1970 como saldo desse preço. 204 R.T.J. — 100 No reduzir para três meses o período dessa segunda fase dos pagamentos, reside a principal inconformidade das impetrantes. (Ler fls. 2-19). Em informações, o Delegado Regional do Instituto refutou a pretensão, alegando: a) incompetência do Juízo, por caber a impetração na sede da autarquia; b) inidoneidade da medida, por estar em causa a discrição própria dos atos administrativos, e não a sua legalidade; c) no mérito, a Improcedência do pedido, visto que o IAA considerou o verdadeiro sentido da lei, que é o estabelecimento da proporção da participação do fornecedor nos ônus da retenção em razão do volume do fornecimento feito, e não em razão do tempo de comercialização da safra total, resultante de canas dos fornecedores e de canas próprias das usinas. (Ler fls. 174-175). Em petição de 23-2-70, apresentaram-se nos autos Domingos José Aldrovandi e numerosos outros fornecedores de canas do Estado de São Paulo, como litisconsortes da autoridade impetrado, apoiando as razões desta. (Ler fls. 200-220). Ao mesmo tempo, em 24-2-70, a douta Subprocuradoria-Geral da República requereu ao Presidente do Tribunal a suspensão da medida liminar concedida às usinas impetrantes, mas o pedido foi indeferido, esclarecendo todavia o respectivo despacho que os pagamentos aos fornecedores continuariam sendo feitos na conformidade do Ato n? 24, de 8-7-69, anterior á Resolução 2.034 incriminado. (Fls. 51 dos autos em apenso). Simultaneamente, os mesmos fornecedores, desta vez encabeçados por João Agripino Mata Sobrinho e outros, por petição apresentada em Juízo a 27-2-70, impe- traram mandado de segurança contra a mesma Resolução número 2.034, de 06-12-69, objetivando a sua desconstituição para o efeito de se forrarem a qualquer disciplina no pagamento das canas fornecidas, cujos entregas deveriam ser pagas quinzenalmente, compreendendo os fornecimentos feitos na quinzena anterior, como dispunha o art. 3? da Lei o? 4.071, de 15-6-62. Após suscitado conflito de jurisdição entre os dois Juízes que processavam, respectivamente, o presente mandado de segurança e o que a que acabo de aludir, ficou o segundo mandado, o dos fornecedores, submetido à decisão do mesmo Dr. Juiz Federal da eit Vara, dando-se por prejudicado o conflito que se suscitara (CJ 337). Este segundo mandado de segurança constitui hoje o AMS 67.548, a mim distribuído, neste Tribunal, por dependência com o de que ora me ocupo. Após outras manifestações de que se ocupa o 3? volume destes autos, veio a sentença, do Juiz Federal Dr. José Américo de Souza. Após admitir os litisconsortes passivos, repeliu a sentença o pedido de revogação da medida liminar, sustentou a competência do Juízo, visto que as sanções decorrentes do ato administrativo impugnado seriam aplicadas pelo Delegado Regional da autarquia no Estado, refutou a alegação de inidoneldade da medida, porque a discussão girava sobre a legalidade do ato, e, por fim, no mérito, concedeu a segurança, para declarar ilegal a Resolução número 2.034, de 6-11-69, do IAA, na parte em que alterou o esquema de pagamento das canas instituído pelo Ato n? 24, de 8-7-69, e, como conseqüência, declarou sem efeito os atos de coação já praticados can- R.T.J. — 100 tra os impetrantes que ficariam livres das cominações impostas com base na aludida Resolução. Considerou a sentença, no mérito: A atividade agro-açucareira, sob intervenção estatal absoluta, em regime de economia dirigida, está subordinada ao Instituto do Açúcar e do Alcool (I.A.A.), autarquia federal, especificadamente criada para disciplinar o setor, desde a produção da matéria prima (plantio da cana e trato da lavoura, corte e beneficiamento) até à fabricação, comércio, distribuição, consumo e exportação do produto acabado. Cabe-lhe ainda, disciplinar as relações entre usineiros e fornecedores de cana, e entre estes e seus trabalhadores rurais, quanto ao tempo, modo e forma de pagamento da cana, sempre dentro dos limites legais. Houve época em que a autarquia Controlava a produção, atraves dos planos de safra, mas não diSpunha de instrumento legal para disciplinar a comercialização do produto acabado. De sorte que, o produtor tinha a faculdade de vender o seu produto de acordo com as suas conveniências econômicas ou financeiras. Então, quando havia escassez do açúcar, o usineiro podia retê-lo em seus armazéns para forçar a alta dos preços; e quando havia excesso, lançava-o no mercado a qualquer preço , arrazando a economia setorial, com todos os reflexos danosos sobre a comunidade interessada. Para evitar situação dessa ordem que, aliás, ocorreu em 1965, com a crise que pós em risco todo o sistema agro-açucareiro no Estado de São Paulo, o IAA preparou o projeto do qual resultou a Lei n? 4.870, de 1-12-1965, pre- 205 vendo medidas de recuperação do setor, entre elas o recalque da produção, retardamento do inicio da safra, maior elasticidade de financiamento e o estabelecimento de cotas mensais de comerciaI lz ação. Nos termos do art. 51 e 3) 1? dessa lei, a faculdade de adotar o plano de comercialização e de modifica-to foi delegada à autarquia nos seguintes termos: «art. 51. A fim de disciplinar o ritmo do escoamento da produção e complementar as medidas de estabilização do preço do acúcar no mercado interno, poderá o IAA estabelecer cotas mensais de comercialização de açúcar, a serem atribuídas às cooperativas de produtores e às usinas não cooperadas, onde as houver.» n/ 1? — As cotas mensais de comercialização de açúcar poderão ser reduzidas ou ampliadas, de acordo com a posição estatística e o comportamento dos mercados.» Como se nota, a adoção do plano de comercialização é uma faculdade delegada ao IAA quando houver necessidade de estabilizar os preços de mercado e disciplinar o escoamento da safra. Desde que posto em prática o sistema, o produtor perderá a liberdade de vender o seu produto quando quiser, ou ã medida em que o fabrica, como se fazia antes da vigência da Lei n? 4.870/65. Ficará sujeito à liberação de cotas de mercado e à retenção dos estoques com todas as implicações decorrentes das despesas de armazenagem, juros e pagamento de canas. Para acudir a essa situação, o IAA fica obrigado a proporcionar 206 R.T.J. — 100 os meios necessários, junto às autoridades monetárias, a fim de que os fabricantes possam obter os recursos financeiros com os quais possam, também, suportar o Ônus da retenção. Entretanto, esse financiamento, geralmente na base de 60% do preço de parte do estoque, não é suficiente para cobrir o custo de todo o estoque retido. Então, a lei oferece o caminho para a solução desse aspecto do problema, mandando convocar os fornecedores para tomarem parte no ônus da retenção, nos termos do § 5?, do mesmo artigo 51, que assim dispõe: «§ 5? — Os fornecedores de cana participarão da retenção dos estoques conseqüentes de fixação das cotas mensais de comercialização e receberão, sob a forma de adiantamento, por tonelada de cana, parcela proporcional aos fornecimentos realizados e ao financiamento que for deferido.» De sorte que, estabelecida a retenção dos estoques conseqüente de fixação das cotas mensais de comercialização, a participação do fornecedor é efetiva, material e obrigatória, no sentido de esperar o pagamento da cana, em escala progressiva, até à liquidação total dos estoques. Não é um concurso facultativo porque o § 5? emprega o termo participarão no sentido imperativo. Sendo efetiva, a participação do fornecedor na retenção do estoque durará enquanto este existir, porque a lei não limita o concurso material do fornecedor no tempo. Enquanto restar um saco de açúcar, o fornecedor participará do ônus da retenção. Se esta for determinada por cotas mensais, enquanto não for liberada a última, o fornecedor também não se liberta do Ônus decorrente de sua participação que consiste em esperar a total liquidação dos estoques. É como se entende a primeira parte da norma legal transcrita, assim redigida: Os fornecedores participarão da retenção dos estoques conseqüentes da fixação das cotas mensais de comercialização. A segunda parte do g 5? indica o Ônus da participação, dispondo que os fornecedores receberão, sob a forma de adiantamento, por tonelada de cana, parcela proporcional aos fornecimentos realizados e ao financiamento que for deferido. Aqui a participação efetiva e material na conjugação de esforços para o suporte da retenção é uma decorrência da primeira parte do mesmo § 5?. O recebimento do preço da cana, por parte do fornecedor, está ligado à liberação da cota mensal correspondente. Tanto assim que, ele não recebe, por saldo, o preço da cana fornecida, tomando-se por base o preço oficial da tonelada. Não. Ele recebe, como adiantamento, parcela proporcional ao fornecimento realizado e ao financiamento que o produtor obteve. A circunstância de a lel estabelecer o adiantamento, ao invés de pagamento, não foi á toa. Este não se confunde com aquele. Pagamento extingue a obrigação. Consiste na entrega definitiva da prestação devida para saldar a obrigação. O pagamento quita a divida. Ao passo que, adiantamento significa ir adiante, entregar uma parcela da obrigação antes da sua exigibilidade integral. De forma que o fornecedor, recebendo uma parte do preço, adiantadamente, não pode R.T.J. — 100 207 pretender a antecipação total da obrigação, ou seja, o pagamento do saldo do preço, seja qual for a superveniência dos fatos que possam influir na pretensão, salvo o estado de insolvência. O fornecedor também espera essa liberação para receber uma parcela de adiantamento do preço da cana contribuída em proporção, para o contingente fabricado. Não importa, por exemplo, que fabricante de açúcar disponha de recursos próprios ou obtenha financiamento suficiente para antecipar o pagamento da cana. A isso não está obrigado porque ninguém pode ser coagido a antecipar o cumprimento da prestação antes do vencimento do prazo marcado na lei ou no contrato. Se o fizer, como já fizeram vários usineiros, será por mera liberalidade ou por conveniência própria. A lei não pode ser casuística, via de regra, principalmente quando disciplina setor económico, propiciando a intervenção do Estado nas suas relações. A Lei n? 4.870/65 é uma delas que resultou de violenta crise que pôs em risco todo o sistema agroaçucareiro no Estado de São Paulo. Foi preciso tomar medidas para evitar desordens económico-financeiras conseqüentes da liberdade de comércio do produto acabado. Entre elas, controle do mercado, através de liberação de cotas mensais, com a finalidade de estabilizar o Preço do açúcar. Para isso, usineiro e fornecedor suportam o ônus da retenção, de modo geral, sem distinguir situações discriminatórias para favorecer a uns e prejudicar a outros. As regras de incidência obrigatória quanto aos encargos atribuídos a usineiros e fornecedores, no que diz respeito a retenção dos estoques, são as mesmas quanto à espera. O produtor espera liberar cota para vendê-la. O prazo estabelecido para o ano-safra 69/70, foi de 12 (doze) meses para a liquidação do estoque em cotas mensais. Essa espera atinge o fornecedor, igualmente, porque ele, participando da retenção sem limite de tempo, terá que aguardar a liberação de todas as cotas de mercado. Como o estoque é liberado mês a mês, em cotas preestabelecidas, o fornecedor recebe também, de mês a mês, não o preço da cana, mas uma parcela por conta, um adiantamento que será levado à conta final de liquidação do preço. Esse raciocínio é fácil de confirmar, verificando-se o art. 16 e seus ff 1?, 2? e 3?, da Resolução n? 2.028 (fls. 51/52). Dispõe a cabeça do artigo 16, que os fornecedores participarão da retenção dos estoques, na forma do 1$ 5?, art. 51 da Lel n? 4.870/65. O g 1? preceitua que os fornecedores não participarão das despesas de retenção e comercialização do açúcar. O 2? prevê a regulamentação do sistema de pagamento de canas, com base no mesmo f 5? art. 51, Lei n? 4.870/65. O 3? estabelece que os fornecedores participarão dos eventuais aumentos verificados nos estoques. Vale dizer que, aos forneçedores, não estando obrigados às despesas mas participando dos eventuais aumentos verificados nos estoques, a única forma de participação efetiva e material na retenção é a espera da liqui- — 100 dação do preço das canas até à liquidação do estoque de açúcar. Se não fosse assim, a sua participação seria nenhuma. Absurdo evidente que o raciocínio repugna. Dentro desse espirito, o IAA passou a fixar as cotas mensais de comercialização do açúcar, em cada ano-safra, a partir da vigência da Lei n? 4.870, de 1-121965, estabelecendo simultaneamente o esquema de pagamento das canas de fornecedores, de modo a que o último pagamento coincidisse com a liberação da última cota de mercado. Em relação à safra 68/69, o esquema foi assim deliberado pelo próprio Presidente do IAA quando, dirimindo divergência entre usineiros e fornecedores, proferiu o despacho de fls. 34/36, manifestando que o critério adotado «se ajusta ao espírito e ao sentido da norma regulamentar» (fls. 36). Seguindo a mesma orientação, o Presidente do IAA baixou o Ato n? 24, em 8-7-1969 (fls. 21), estabelecendo para o Estado de São Paulo, na safra 1969/1970, as cotas de comercialização em dois períodos, sendo o primeiro, de cinco meses, compreendido entre 1? de julho a 30 de novembro de 1969; e o segundo, de sete meses, estendendo-se dei? de dezembro de 1969 até 30 de junho de 1970 (art. 2?). No mesmo Ato n? 24 ficou estabelecido que, na forma do art. 16 da Resolução n? 2.028, de 27-61969; e o do § 5? do art. 51 da Lei n? 4.870, de 1-12-1965, o pagamento das canas fornecidas às usinas do Estado de São Paulo, na safra 69/70, é feito em duas parcelas, sendo uma, como adiantamento do preço-base, no período de 1? de julho a 31 de dezembro de 1969, e outra, por saldo desse preço, nos meses compreendidos no período de 1? de janeiro a 30 de junho de 1970 (art. 7?— fls. 22). Em plena vigência o esquema de comercialização de açúcar e pagamento das canas, em relação à safra 69/70, cujo primeiro período foi totalmente cumprido, velo a Resolução n? 2.034, de 6-1169, estabelecendo que o pagamento das canas seria feito em duas parcelas, sendo uma, como adiantamento do preço-bage, no período de 1? de julho a 31 de dezembro; e outra, por saldo desse preço, nos meses compreendidos de 1? de janeiro a 31 de março de 1970. Além disso, dispôs sobre a revisão dos cálculos para os fins de reajustamento da parcela de adiantamento do preço-base, correspondente ao primeiro período (arts. 2? e 6?— fls. 40 e 41). Do confronto entre a Resolução n? 2.034 e o Ato n? 24, observa-se que ambos os atos se reportam ao art. 16, da Resolução n? 2.028/69, e ao § 5?, art. 51 da Lei n? 4.870/65, como fundamento da participação dos fornecedores de cana na retenção dos estoques de açúcar. E, ambos os atos mantém o plano de comercialização em doze cotas mensais referentes à mesma safra 69/70. Apenas foi modificado o esquema de pagamento das canas em ambos os períodos. Quanto ao primeiro, já vencido e pago, pelo reajustamento da parcela de adiantamento. Quanto ao segundo, pelo seu encurtamento para três meses (janeiro a março de 1970). Explicando a alteração introduzida, no particular referente ao pagamento das canas, o «Fluxograma» de fis. 43 e os «esclarecimentos» de fls. 44, anexos à Resolução n? 2.034/69, indicam que o volume de açúcar a ser comercializado, no período de janeiro a R.T.J. — 100 junho de 1970, é de 15.085.715 sacos, cuja cota mensal é de 2.514.285 sacos. Considerando que, na industrialização do açúcar, as canas de fornecedores foram utilizadas na proporção de 45% do total esmagado, a mesma proporção deve ser destacada do produto acabado, equivalente a 6.788.571 sacos de açúcar que teriam sido usinados com canas exclusivas dos fornecedores. Nessas condições, a fração do estoque que teria sido fabricada com canas somente dos fornecedores poderia ser liberada em três meses, isto é, de janeiro a março de 1970. O resto é açúcar que teria sido usinado com canas próprias dos fabricantes, na proporção de 55%. Entretanto, o ,raclocinio constante do Fluxograma é absolutamente divorciado da realidade porque não é possível rotular o produto acabado com essa ou aquela cana. O estoque de açúcar é um contingente industrializado com canas de usineiros e canas de fornecedores. Se a proporção de 45% corresponde a canas dos fornecedores, essa mesma proporção há de estar contida em todo o estoque, saco por saco, até o fim da comercialização. Se o escoamento das cotas mensais está programado para doze meses sucessivos, em dois períodos, de julho a novembro de 1969 e de dezembro de 1969 a 30 de junho de 1970, os fornecedores participam da retenção dos estoques durante o mesmo tempo, até à liberação da última cota. Foi justamente isso que o art. 7?, do Ato n? 24 (fls. 21) deixou assentado, criando o ónus da retenção para os fornecedores durante o mesmo prazo estipulado para os produtores, em face do 209 sistema de escoamento duodecimal de comercialização previsto no art. 2?, do mesmo Ato n? 24, o que está conforme a lei. Mas, a Resolução n? 2.034/69 (fls. 40), adotando o mesmo sistema duodecimal de escoamento das cotas de comercialização, previsto no Ato n? 24 (fls. 21), restringiu, no entanto, o prazo do segundo período, dentro do qual o saldo do preço das canas deveria ser pago. Aquela associação de esforços prevista no { 5?, artigo 51, Lel n? 4.870/65, para disciplinar a retenção dos estoques, em benefício da estabilização de preços dp mercado interno, foi totalmente desprezada. Se as cotas de comercialização estabelecidos na forma da cabeça do art. 51 da Lei n? 4.870/65, acarretam como conseqüência, a retenção dos estoques; se os fornecedores, ainda como conseqüência, participam obrigatoriamente da retenção, eles só poderão receber integralmente todas as parcelas do preço, quando estiverem liberadas todas as cotas de mercado. E isso que dispõe o fk 5? do art. 51 da Lei n? 4.870/65. Dizendo que o fornecedor participa da retenção do estoque sem demarcar o limite da partipação, é evidente que ela é obrigatória até o fim da retenção. Aliás, esse ponto de vista tem o apoio integral do próprio PrOCurador-Geral do IAA., Dr. Holló Cavalcante Pina, que, a respeito do assunto em causa, emitiu o parecer de fls. 55/60. Analisando detidamente a matéria, o ilustrado jurista acentua que a participação dos fornecedores se estende ao pagamento que se procede sob a forma de adiantamento, Si parcela proporcional ao fornecimento realizado. O 210 R.T.J. — 100 exame do 5?, art. 51, já referido, não leva a outra conclusão que não a de subordinar a parcela não paga às contingências ditadas pela comercialização. Vale dizer que, a parcela não paga, estando subordinada às contingências ditadas pela comercialização, acarreta para o fornecedor a obrigação de esperar o escoamento das cotas de mercado para receber integralmente o preço da cana. É a opinião do Procurador-Geral do IAA. O que não é possível é estabelecer o prazo de seis meses para o escoamento do remanescente do estoque, no segundo período, e encurtar, para três meses, o prazo dentro do qual as canas deverão ser liquidadas. Além da discriminação ilegal, em face do 5?, art. 51, Lei n? 4.870/65, a distinção outorgada aos fornecedores pela Resolução n? 2.034, quanto ao pagamento das canas, é injurídica nessa altura da safra 69/70. Assim é porque, se o Ato n? 24, a folhas 21, estabeleceu um plano de escoamento da safra e o mesmo foi executado durante o primeiro período, esse plano não poderia mais ser alterado por motivo algum, até o fim da comercialização, salvo acordo geral das classes interessadas. O ato administrativo pode ser revogado pela própria administração, desde que não contrarie a lei e não ofenda situação jurídica subjetiva do particular. No caso, usineiros e fornecedores tinham um ato a observar e o observaram durante o primeiro período da safra O segundo período teria que percorrer o mesmo caminho previsto pelo mesmo ato porque, em face dele, todas as classes inte- ressadas Já tinham tomado posição, principalmente os usineiros, sobre os quais pesam os encargos financeiros. Os produtores já tinham a seu favor uma situação jurídica definitiva no sentido de pagar os fornecedores, de acordo com a liberação das cotas de mercado, nos termos do Ato n? 24. Já conheciam a sua obrigação de pagar as canas em prazo certo, ditado pela administração. Criou-se em favor deles, o direito ao prazo para pagar as canas. De sorte que, esse prazo não pode, unilateralmente, em caráter potestativo, ser encurtado. Dir-se-á que o IAA tem o poder discricionário de estabelecer cotas de mercado, de reduzi-las ou dilatá-las, de acordo com as necessidades de estabilização de preço, posição estatlstica e comportamento do mercado. E verdade que tem essa faculdade. Mas, desde que o sistema seja adotado, a retenção conseqüente acarreta ónus que os produtores e fornecedores deverão suportar obrigatoriamente, conjugando esforços, até o fim da comercialização. A cabeça do art. 51, Lei n? 4.870/65, autoriza o IAA a disciplinar o escoamento da safra, complementar medidas de estabilização de preço e estabelecer cotas mensais de comercialização. Mas, não obriga. Tudo depende da posição estatística e do comportamento do mercado. Se, porém, a autarquia resolve estabelecer cotas mensais de mercado, o 5? passa a atuar obrigatoriamente para exigir a participação do fornecedor de cana na retenção do estoque conseqüente. Participação efetiva e material no sentido de tomar parte, de cooperar para que alguma coisa se taça, segundo a Interpretação R.T.J. — 100 211 do Procurador-Geral do IAA, Dr. do órgão e destinada a aplicar exaHelio Cavalcante Pina ( fls. 58). tamente a lei que se declara vioE, na espécie, a participação lentada. (ler fls. 649-665). consiste em o fornecedor receber o preço oficial da cana, sob a forRecorreram, de sua vez, os forma de adiantamento, em parcela necedores de cana, já agora encaproporcional ao fornecimento beçados por João Agripino Mala realizado e ao financiamento deSobrinho, sustentando que devia ferido aos produtores. Mas, até ter sido proferida uma só sentença quando? Até ao escoamento das nos dois mandados de segurança, cotas de mercado; enquanto due, no mérito, sustentando que a rar a retenção, porque o 5? não verdadeira e legal solução é a do limita a sua incidência no tempo. pagamento das canas na quinzena Apenas diz que os fornecedores subseqüente, compreendendo os participarão da retenção dos esfornecimentos da anterior. (ler fls. toques. Vale dizer, participarão 669-679). até o fim da retenção. Falaram, por fim, os impetranNo entanto, a Resolução n? tes agravados, apoiando a senten2.034/69, alterando o esquema de ça, e aduzindo que a questão está pagamento das canas de fornecesuperada, sendo certo, por outro dores, quando o ano-safra já tilado, que o IAA retomou o procedinha percorrido o primeiro períomento normal adotado anteriordo, estabeleceu uma distinção mente ã impugnada Resolução n? que o jf 5?, art. 51, Lei n? 4.870/65, 2.034, tendo baixado, para a safra não permite. Reduziu o prazo da 1970/71, a Resolução n? 2.041, de 25participação na retenção dos es6-70, que consagra aquele proceditoques, em detrimento dos usineimento anterior. ( fls. 871-883). ros, quando a lei exige a associação de esforços de produtores e Nesta Instância, a douta fornecedores para suportarem o Subprocuradoria-Geral da Repúbliônus conseqüente daquela retenca após haver oficiado pela sujeição. Encurtou o prazo de seis ção dos dois agravos de mandados meses conferido aos usineiros pade segurança (este, de n? 67.376, e ra o pagamento das canas, quano outro, de n? 67.548) a um só relado esse prazo se erigira em direitor, no que foi atendida, opina, no to constituído e integrante do seu mérito, pela reforma da sentença, patrimônio. Estabeleceu revisão porque a questão envolve matéria dos cálculos para efeito de reade fato, e porque a proporção do justamento da parcela de adianpagamento aos fornecedores se faz tamento do preço-base corresem razão do adiantamento e finanpondente ao primeiro período, ciamento por tonelada de cana, naquando je havia se escoado no da tendo a ver com as vendas de tempo, fazendo incidir o ato reaçúcar feitas pelos usineiros. (fls. troativamente, ao arrepio do nos89-901).» (fls. 910/923). so sistema jurídico.» ( fls. 633641 ). Este o voto do eminente Relator, acolhido de modo unânime: u o Instituto do Açúcar e do ÁÁllcool, sustentando que a deci«Dispunha a Lel n? 4,071, de 15-6são foi preferida por Juiz incompe62, a propósito do pagamento de tente e declarou ilegal uma Resolucanas pelas usinas aos fornecedoção baixada dentro das atribuições res: 212 R.T.J. — 100 «Art. 3? O pagamento será feito quinzenalmente e compreenderá os fornecimentos de cada quinzena anterior, admitidas as seguintes deduções: Mais tarde, porém, a Lei n? 4.870, de 1-12-65, visando a disciplinar o escoamento da produção de açúcar mediante sua comercialização gradual, estabeleceu a possibilidade de retenção da safra e conseqüente retenção e liberação parcelada do preço devido aos fornecedores de cana. No ponto que interessa à controvérsia posta nestes autos, reza a última lei: «Art. 51. A fim de disciplinar o ritmo do escoamento da produção e complementar as medidas de estabilização do preço do açúcar no mercado interno, poderá o IAA estabelecer cotas mensais de comercialização de açúcar, a serem atribuídas às cooperativas de produtores e às usinas não cooperadas, onde as houver. 5?. Os fornecedores de cana participarão da retenção dos estoques conseqüentes de fixação das cotas mensais de comercialização e receberão, sob a forma de adiantamento, por tonelada de cana, parcela proporcional aos fornecimentos realizados e ao financiamento que for deferido.» yê-se, pois, que o antigo pagamento quinzenal desapareceu, ficando restrito àquelas safras em que o IAA não usar da faculdade de estabelecer cotas mensais de comercialização. Instituído o regime de contingenciamento, de escoamento gradual da safra, os fornecedores de cana participam das retenções do produto final e, conseqüentemente, do ônus da gradualização das vendas. Em que proporção? Não apenas na proporção óbvia, declarada na lei, dos fornecimentos feitos e do financiamento da safra. O financiamento, que as Usinas obtém para suportar a retenção dos estoques, para não vender o açúcar logo que produzido, não corresponde ao valor total da safra, mas apenas a certa parte do valor. Logo, não permite pagar aos fornecedores, de pronto, o valor total do que forneceram. Mas, ainda que a lei não mencionasse o financiamento (e pode ele ser dispensado pela Usina que com recursos próprios suporta a retenção) a disposição principal do parágrafo 5?, submetendo os fornecedores à participação na retenção dos estoques, torna claro que essa participação é por todo o tempo da retenção. Dispondo de modo a reduzir o tempo dessa participação dos fornecedores, deixando-a nos últimos meses somente a cargo das usinas, a Resolução impugnada se pós em flagrante desrespeito ao teor literal e ao espírito do mencionado parágrafo 5?. A sentença examinou com profundidade e lucidez os vários argumentos suscitados e deu ã controvérsia a solução claramente imposta pelo 5? do art. 51 da Lei n? 4.870, de 1-12-65. Confirmo-a, pelos seus próprios fundamentos, que adoto, seja quanto às preliminares, seja quanto ao mérito. Nego provimento aos recursos, voluntário e de ofício.» (fls. 923/5) R.T.J. — 100 Apresentados, pelos litisconsortes passivos, embargos de declaração, estes não foram conhecidos, por intempestivos (fls. 941/2 — RE 83.328) No que diz respeito ao mandado de segurança impetrado pelos fornecedores, mandamus que a sentença denegara (AMS 67.548 — RE 83.353), proferiu o Ministro Decio Miranda este voto, também acolhido sem voz discrepante: «Este mandado de segurança surgiu como uma espécie de retorsão ao mandado de segurança ajuizado pelas Usinas (AMS 67.376) Ambos visam à ilegalidade da Resolução n? 2.034, de 6-12-69, mas para resultados diferentes. Os usineiros para não sujeitar-se sozinhos aos ónus da retenção dos estoques, nos últimos três meses dela. Os fornecedores para não participar de forma alguma no ónus dessa retenção. Acabamos de mostrar, no voto proferido no AMS 67.376, que os usineiros tinham razão. Logo, prejudicada está a pretensão dos fornecedores, veiculada neste mandado que ora temos sob exame, a qual, de resto, esbarra na clara disposição do 5? do artigo 51 da Lei nt 4.870, de 1-12-65. A sentença, tanto das preliminares quanto no mérito, merece confirmação, pelos seus próprios fundamentos. Nego provimento ao recurso.» (fs. 234 — RE 83.353) Houve embargos de declaração, não conhecidos porque opostos a destempo. Da decisão proferida no mandado de segurança requerido pelas Usinas, AMS 67.376 (RE 83.328), recorreram, extraordinariamente, os Misconsertes passivos. Com apoio na 213 alínea d, sustentam que a questão em exame envolve matéria complexa, inapreciável, como tal, na ação de mandado de segurança; que houve invasão do judiciário na esfera administrativa, já que a decisão impugnada examinou o mérito do ato administrativo consubstanciado na Resolução número 2.034/69; que não foram citados outros litisconsortes passivos. Pela alínea a, alegam negativa de vigência ao artigo 2?, 3?, da Lel de Introdução, por entenderem aplicável a Lei n? 4.071, de 1962. Argúem ainda, ofensa ao artigo 7?, da Resolução nt 2.034/69. Com os mesmos fundamentos, os impetrantes — fornecedores recorreram, extraordinariamente, da decisão que lhes foi desfavorável no outro mandado de segurança, AMS 67.348 (RE 83.353). Inadmitidos os recursos, fi-los subir para melhor exame. No recurso relativo ao mandado de segurança requerido pelas Usinas (RE 83.328), a Procuradoria-Geral da República é pelo provimento do recurso, para cassar-se a segurança concedida. O parecer, quanto ao RE 83.353, é no entanto, pelo não conhecimento do recurso E o relatório de ambos os feitos. VOTO O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator): A Resolução n? 2.034, de 06-11-69, baixada pelo Conselho Deliberativo do Instituto do Açúcar e do Álcool, na qual se dispõe sobre o pagamento da cana fornecida às usinas do Estado de São Paulo durante a safra de 1969/70, deu margem a dois mandados de segurança, donde resultaram os presentes recursos extraordinários: o impetrado pelos usineiros, que não se conformaram com a redução do prazo de seis para três meses; e o impetrado pelos fornece- 214 R.T.J. — 100 dores, que vindicavam o pagamento sas censuras: a primeira, porque o da cana na forma da Lei n? 4.071, de acórdão impugnado limitou-se a examinar a Resolução n? 2.034/69, sob o 1962, isto é, quinzenalmente. ponto de vista da estrita legalidade, afastando a sua aplicação por confliNo RE 83.328, cuida-se do manda- tar com outras normas, que deviam do de segurança impetrado pelos ora prevalecer; a segunda porque, ao asrecorridos, Usina Santo Antônio S.A. sim proceder, o acórdão a Açúcar e Mcool e outros, contra o apreciar, sob cingiu-se o ponto de vista forDelegado Regional do Instituto do mal, o ato administrativo tachado de Açúcar e do Álcool do Estado de São ilegal, não havendo falar-se, conPaulo, mandado no qual intervieram seguinte, em invasão, peio por judiciácomo litisconsortes passivos João rio, de esfera privativa da adminisAg,ripino Mala Sobrinho e outros, ora tração; a terceira, porque, quando recorrentes. Argüiu-se, no mandado, outra razão não houvesse, cuida-se a ilegalidade da Resolução n? 2.034, matéria não ventilada no acórdão de 06-11-69, do Conselho Deliberativo de recorrido. do Instituto do Açúcar e do Álcool, pela qual se reduziu de seis para Descabe, também, o recurso pela três meses o pagamento do saldo do preço relativo ao fornecimento de alínea a, porque ao considerar inacana. Segundo o regime anterior, o sal- plicável à espécie o art. 3? da Lei n? do do preço, devido aos fornecedo- 4.071/62, onde se determina que o pares, devia satisfazer-se em seis me- gamento será feito quinzenalmente e ses, isto é, de 1? de janeiro á 31 de compreenderá os fornecimentos de julho. Pela Resolução n? 2.034, essa cada quinzena anterior, o acórdão prestação final passou a ser devida recorrido limitou-se a suscitar que no período de 1? de janeiro a 31 de essa norma não incidia em face de março de 1970. A sentença concedeu outras regras legais, aplicáveis à eso mandado, assegurando aos Impe- pécie, não se configurando, destarte, trantes, Usina Santo Antônio S.A. e a alegada ofensa ao 2?, do art. 2?, outros, a faculdade de prestar o sal- da Lei de Introdução ao Código Civil. do do preço dentro dos seis meses. «O que fizeram a sentença e o acórJulgando agravo, o Tribunal Federal dão que a confirmou» — afirma o de Recursos, pela sua Segunda Tur- despacho presidencial que negou sema, manteve a decisão de primeiro guimento ao recurso — «em última grau. Dessa decisão não recorreu o análise, ao considerar que a particiInstituto do Açúcar e do Álcool, pação dos fornecedores de canas nos fazendo-o, todavia, os litisconsortes ônus de retenção dos estoques de passivos, João Agripino Maia Sobri- açúcar deverá obrigatoriamente estender-se até ó fim da comercialinho e outros. zação do produto, foi interpretar disda Lei n? 4.870/65, de forma Argúem estes, pela alínea 0, como posições escorreita, E bastaria que fosestá no relatório, que o acórdão re- se razoávelaliás. essa interpretação, corrido entrou no exame de matéria vedar a estreita via recursalpara excomplexa, insuscetível de aprecia- traordinária 400» Súmula (f. 981). ção em mandado de segurança; que o aresto invadiu a esfera administraAnte o exposto, não conheço, prelitiva, porque pronunciou-se quanto ao mérito do ato administrativo con- minarmente, do RE — 83.328, porsubstanciado na Resolução n? quanto inconsistentes as razões pelas 2.034/69; que não foram citados ou- quais se increpa ao acórdão ter netros litisconsortes. Improcedem es- gado, indevidamente, aplicação à 215 R.T.J. — 100 Resolução n? 2.034/69. Concluiu o acórdão, como se viu, que, em vez dos três meses para o pagamento do saldo, prazo estatuído na aludida Resolução, esse prazo, de acordo com o sistema então vigente, era de seis meses. Ora, se ficou ai entendido, corretamente que prevalecia, para o pagamento do saldo, o prazo de seis meses, descabe, também, o RE 83.353, porquanto, aqui, os mesmos recorrentes, João Agripino Mala Sobrinho e outros, sustentam, sob fundamentos iguais aos defendidos no RE — 83.328, que, em vez do prazo de seis meses, para o pagamento do saldo relativo ao fornecimento de cana, esse pagamento devia fazer-se, quinzenalmente, segundo o artigo 3? da Lei n? 4.071, cuja incidência se havia afastado. Ora, assentado, no RE 83.328, que o prazo para o pagamento era de seis meses, não de três meses, conto se estabelecia na Resolução n? 2.034/69. esse entendimento, isto é, de que o dito prazo era de seis meses, prevalece quanto ao RE — 83.353, do qual, portanto, também nãO conheço. Em suma, não conheço dos recursos extraordinários 83.328 e 83.353. EXTRATO DA ATA RE 83.353 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Rectes.: João Agripino Mala Sobrinho e outros (Adv.: José Moura Rocha). Recdo.: Instituto do Açúcar e do Alcool (Adv.: Antonio Carlos Sigmaringa Seixas). Decisão: Não conhecido. Unânime. Impedido o Senhor Ministro Decio Miranda. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 07 de agosto de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.064 (AgRg) — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira. Agravante: Banco Bamerindus de Investimento S.A. — Agravados: Mauro Roberto Nava e sua mulher. Embargos de terceiro. Promitente comprador. Execução contra o promitente vendedor. Fraude ã execução não comprovada. Negativa de vigência dos arts. 592, III, e 593, II, ambos do Código de Processo Civil, que não se verifica, não cabendo, em recurso extraordinário, o simples reexame de provas (Súmula nt 279). Inaplicabilidade à espécie do art. 530, I, do Código Civil, o qual, de resto, não foi prequestionado no acórdão recorrido (Súmula nP 282). Agravo regimental a que se nega provimento. ACORDA° Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamentos e notas taquigráficas, à unanimidade, negar provimento ao Agravo Regimental. Brasília, 10 de novembro de 1981 — Cunha Peixoto, Presidente — Néri da Silveira, Relator. 216 R.T.J. — 100 RELATÓRIO O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Banco Bamerindus de Investimentos S/A agrava, regimentalmente, do seguinte despacho (fls. 44/45): «O Banco Bamerindus de Investimentos S.A. agrava do despacho do ilustre Presidente do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, que inadmitiu recurso extraordinário, interposto com apoio no art. 119, inciso III, letra a, da Constituição, contra aresto unânime, de 05.11:1980, da sua colenda Quinta Câmara Civil, alegando negativa de vigência dos arts. 530, do CCB, 592, III, e 593, II, ambos do CPC. 2. — O Banco recorrente moveu execução contra Carlos Vaz Macia e outro, sendo penhorado imóvel que Mauro Roberto Nava e sua mulher haviam prometido comprar aos executados. Nos embargos de terceiro interpostos pelo casal de Mauro Roberto Nava, questionou-se a ocorrência de fraude à execução. O acórdão recorrido extraordinariamente, ao dar provimento ao apelo dos embargantes e julgar procedentes os embargos de terceiro, após exame da prova dos autos, firmou: «Vale dizer, por ocasião do negócio imobiliário, cuja origem deita raízes no compromisso de compra e venda assinado em 18 de agosto de 1977, não corria contra o vendedor executado demanda capaz de reduzi-lo à insolvência, não se justificando a alegação de ocorrência de fraude à execução, na conceltuação do legislador processual (art. 9.593, inciso II, CPC), como sustentou, sem razão, o Banco embargado)S. Assentou o aresto, outrossim, com base no complexo probatório: «O valor da execução, objetivamente, não é de molde a justificar a conclusão de que o devedor está insolvente, ou será reduzido tal estado, o que mais fortalece a convicção contrária à definição judicial impugnada, por sinal traduzida em termos simplistas.» Noutro passo, ainda, assere o julgado da colenda Câmara: «Acresce notar que o embargado apenas invocou a ocorrência de fraude à execução, na defesa oposta, passando a cogitar da alegação de fraude contra credores por ocasião da audiência de instrução e julgamento. E sabido ipie os elementos da culpa mi da má-fé são indiferentes para a configuração da fraude à execução, que não cogita do «consilium fraudis», embora sejam essenciais na aferição da fraude• contra credores, cuja discussão se admite, é verdade, na esfera dos embargos de terceiro, mas a matéria não foi questionada a esse título. De qualquer modo, os elementos probatórios coligidos nos autos, sob esse aspecto, não autorizam outra conclusão» ( fls. 12/13). 3 — Está correto o despacho agravado, dessarte, ao afirmar inocorrer a alagada negativa de vigência dos arts. 592, III, e 593, II, ambos do CPC, em face dos termos do acórdão, não cabendo, em recurso extraordinário, o simples reexame das provas (Súmula n? 270). No que concerne à invocação do art. 530, I, do CCB, não houve efetivo prequestionamento no acórdão recorrido (Súmula n? 282). 4 — Do exposto, nego seguimento ao agravo». As fls. 47/48, insiste o agravante no sentido de haver ocorrido prequestionamento da matéria relativa ao art. 530 do Código Civil Brasilei- R.T.J. — 100 ro, considerando que o acórdão, na sua fundamentação, «teve necessidade de transpor-se à data da lavratura do instrumento da promessa». Dal, o agravante assevera que o acórdão recorrido «disse que a transferência do imóvel se perfaz pelo simples contrato, pouco importando não tenha sido registrado». Aduz: «E isto, sem dúvida, ofende o artigo 530 do Código Civil». Embora reconheça que o aresto não faz referência ao art. 530 do Código Civil Brasileiro, entende o agravante que tal fato não exclui o prequestionamento, «que reside em sede da discussão do tema, da matéria, do assunto, da essência do direito». E acrescenta que, «se o acórdão houvesse citado o art. 530, talvez não tivesse cometido a heresia de dizer que o imóvel se transferiu pelo simples contrato sem registro». E conclui: «6. E se já havia em andamento ação executiva aparelhada, ao tempo do registro da propalada promessa, o v acórdão violentou o artigo 593, item II, do CPC, sem sombra de dúvida, negando a ocorrência da fraude à execução». E o relatório. 217 alegação de ocorrência de fraude à execução, na conceituação do legislador processual (art. 593, inciso II, do CPC), como sustentou sem razão, o Banco embargado». Destacou, de outra parte, o despacho agravado que não cabe o recurso extraordinário a simples reexame de provas (Súmulas n? 279), tendo em conta as conclusões do aresto recorrido, acerca de não verificação de fraude à execução, no compromisso de compra e venda, então, celebrado pelo devedor, porque, à época, não corria contra ele demanda capaz de reduzi-lo à insolvência. Além disso, o acórdão baseou-se, também, na circunstância de o ora agravante apenas haver invocado a ocorrência de fraude à execução, na defesa oposta, passando a cogitar da alegação de fraude contra credores, por ocasião da audiência de instrução e julgamento, ressaltando o aresto que, «de qualquer modo, os elementos probatórios coligidos nos autos, sob esse aspecto, não autorizam outra conclusão». Do exposto, nego provimento ao agravo. EXTRATO DA ATA VOTO Ag. 84.064 — ( Aglig) — SP — Rel.: O Sr. Ministro Nazi da Silveira Min. Néri da Silveira. Agte.: Banco (Relator): Não tem razão o agravan- Bamerindus de Investimento SIA te. O Art. 530, do Código Civil Bra- (Adv.: Orlando Antonaglia). Agdos.: sileiro, não foi referido no acórdão,. Mauro Roberto Nava e sua mulher porque, em realidade, não tem apli- (Advs.: Orestes Bacchetti e outros). cação à hipótese de promessa de Decisão: Negaram provimento ao compra e venda de imóvel. Disso é Agravo Regimental. Decisão unânique cuidou o aresto recorrido, não me. havendo, assim, afirmado que a Presidência do Senhor Ministro transferência do imóvel se perfaz pelo simples contrato, pouco importan- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão do o registro. Dessa questão não co- os Senhores Ministros Soares Mtuloz, gitou o julgado, que se referiu ao Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e compromisso de compra e venda do Néri da Silveira. Subprocuradorimóvel, assinado a 18.8.1977, para ob- Geral da República o Dr. Mauro Leiservar que, a essa data, não corria te Soares. Brasília, 10 de novembro de 1981 — contra o executado, promitente vendedor, demanda capaz de reduzi-lo à António Carlos de Azevedo Braga, insolvência, «não se justificando a Secretário. 218 R.T.J. — 100 AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.274 (AgRg) — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Rafael Mayer. Agravante: Renato Pires Imobiliária e Construtora Ltda. — Agravada: Prefeitura Municipal da Estância Balnearia de Perulbe. Município. Competência. Construção (embargo). — E competente o Município para editar regulamentos administrativos que limitem o exercício das faculdades inerentes ao direito de propriedade, e usar das medidas tendentes à sua observação, inclusive o embargo de obra. Agravo regimental improvido. ACÓRDÃO dissídio invocado. Invocando os fundamentos de despacho impugnado, nego seguimento. Arquivese». Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, em conformidade com a Insiste a Agravante em que o desata de julgamentos e notas taquigrá- pacho lhe causa prejuízo, pois sofre ficas, à unanimidade, em negar pro- a iniquidade de ser a única incorvimento ao agravo. poradora brasileira que não consegue construir um hotel em condomínio Brasília, 10 de novembro de 1981 — (ou apart-hotel ou Rat-service), apeCunha Peixoto, Presidente — Rafael sar de cumprindo todas as exigênMayer, Relator. cias da legislação especifica, ter efetuado o registro da incorporação no cartório competente. Não existe, na RELATOR 10 verdade, desvirtuamento da finalidaO Sr. Ministro Rafael Mayer: As- de da construção, pois continua a ser sim está o despacho que negou pro- hotel, só que em condomínio. E o ato vimento ao agravo de instrumento municipal violou o direito de proprieinterposto da denegação do recurso dade do Agravante. extraordinário: Mantido o despacho, por seus fun«São insubsistentes as alegações damentos, vai o• agravo regimental a de ofensa à Constituição e demais julgamento da Egrégia Turma. dispositivos legais, nem mesmo raE o relatório. zoável a argüição de inconstitucionalidade do ato da administração municipal, como bem demonstra o VOTO douto despacho agravado. Verificado o desvirtuamento da finalidade da construção, tinha legitimidade a O Sr. Ministro Rafael Mayer: (Reautoridade para cancelar o respec- lator): Para demonstrar a inconsistivo alvará, já que irrecusável a tência da pretensão da Agravante. competência do Município de edi- invoco o douto voto vencedor, no tar normas edllícias e fazer acórdão recorrido, proferido pelo cumpri-las. Por outro lado, consi- ilustre Desembargador Batalha de dero, também, não comprovado o Camargo, in verbis: R.T.J. — 100 219 «A questão jurldica em que a gar administrativamente a obra, apelante, apegando-se a definições, cuja finalidade passou a ser outra pretende equiparar hotel em conda declarada como condição da domínio, com hotel tout court — aprovação. não esconde ter sido o alvará obtiSustentar por outro lado, que não do sob falsa declaração e objetivo. compete ao Município editar norA impetrante assumiu o expresso mas adiadas, relativas à construcompromisso de que a planta subção de edifícios, é sustentar o que, metida à aprovação da autoridade primacialmente, constitui a prómunicipal estava destinada á conspria razão de ser da autoridade trução de um hotel, proibida a venmunicipal. da de unidade autônomas, sob peTenho que se não feriu a direito na de cassação do alvará. liquido e certo da impetrante no A impetrante, por seu represenembargo administrativo da obra — tante legal, responsabilizou-se pela partindo, mesmo, exclusivamente, manutenção da finalidade prevista do fato de que o alvará foi obtido na planta, salvo ulterior decisão da mediante fraude, ou, pelo menos, Prefeitura Municipal, sob pena de com objetivo enganoso. cassação do alvará. A construção do edifício com a Como agiu, entretanto, a impedestinação agora relevada pela imtrante? petrante, havia de ser assegurado, no mínimo, o direito da autoridade Inscteveu no Registro de Imómunicipal de reexaminar a planta. veis a incorporação de um edifício destinado à venda de unidades autôA impetrante é que não competinomas e passou a anunciar a venria, no. caso, o direito liquido e cerda de cômodos em unidades autôto de faltar ao compromisso assunomas. mido». ociosa a dialética, inculcada Diante desse fato incontroverso, na Lei de Condomínios, no Código núcleo de toda a demanda, não haveCivil, e até na Constituição: a plan- ria mesmo como prosperar as invecta, simplesmente, não teria sido tivas do recurso extraordinário. O aprovada pela autoridade munici- exercício das faculdades inerentes pal se a destinação fosse para a ao direito de propriedade tem limivenda de quartos com banheiro co- - tes nos regulamentos administratimo unidades autônomas. vos, em cujo ãmbito se insere a norma descumprida pela Agravante. Não foi por outro motivo que se Competente Município para edita exigiu o expresso compromisso da la, nem fariaosentido a sua existênimpetrante. cia como norma legal não estivesse A impetrante é que fraudou, à dotada de coercibilidade e dos meios evidência, a administração munici- adequados ao desfazimento de sua pal; e a falsa intenção não se ocul- infringência. Por isso é legitimo o ta, agora, na alegação de não com- ato impugnado. petir à autoridade municipal emNego provimento ao recurso. bargar a obra. Se a obra, para inicio da construEXTRATO DA ATA ção, dependia de aprovação da planta e de alvará, é evidente que Ag 84.274 — (AgRg) — SP — Rel.: a mesma autoridade podia embar- Min. Rafael Mayer. Agte.: Renato R.T.J. — 100 Pires Imobiliária e Construtora Ltda. (Adv.: Tarcisio Augusto de Andrade). Agdo.: Prefeitura Municipal da Estância Balnearia de Partilhe (Adv.: Henrique de Brito Viana). Decisão: Negaram provimento ao Agravo Regimental. Decisão unânime. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Soares Mufloz, Rafael Mayer, Clóvis Ramalhete e Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 10 de novembro de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.699 (AgRg) — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Decio Miranda. Agravante: ASA — Agentes de Serviços Aeroviárlos Ltda. — Agravados: Juiz de Direito da 3? Vara dos Feitos da Fazenda do Estado de São Paulo e Viação Aérea São Paulo S/A — VASP. Processual Regimental. Ação popular. Suspensão liminar do ato impugnado. Mandado de segurança contra esta medida. A medida cautelar não deixa de estar excluída dos casos de cabimento do recurso extraordinário, pelo fato de ter sido concedida ou negada em ação popular, prevista na Constituição. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, negar provimento ao Agravo Regimental. Brasília, 10 de novembro de 1981 — 'Mei Falcão, Presidente — Decio Miranda, Relator. RELATOR 10 O Sr. Ministro Decio Miranda: Neguei seguimento ao agravo, com despacho em que se lê: «O acórdão recorrido não se atrita com o art. 153, 31, da Constituição, quando entende que a medida cautelar, pela sua finalidade preventiva, não está jungida à antecipada apreciação de mérito, ou mesmo ao deslinde de dúvida processual, quando a discussão de uma ou outra matéria poderia prejudicar os efeitos visados pela medida. Não se ultrapassou, no ponto focalizado, a interpretação do instituto, tendo em vista sua finalidade, sem elevar-se a matéria à questão constitucional levantada. Afastada esta, bem aplicou o despacho a restrição contida no art. 308, V, do Regimento Interno de 18-6-70, ainda em vigor para o caso (RISTF, art. 368, parágrafo único). Mantenho o despacho, por seus fundamentos.» (Fls. 170). R.T.J. — 100 Vem a ASA — Agentes de Serviços Aerovlários Ltda. com agravo regimental. Sustenta que a colisão com o parágrafo 31, do art. 153, da Constituição da República ocorre, na espécie, não em função das circunstâncias apontadas no despacho, atinentes às relações que podem existir entre a ação principal e a ação cautelar, mas quando, no julgamento de um mandado de segurança, a pretexto daquele relacionamento, se entendeu inviável a apuração de ilegalidade manifesta, consubstanciada, precisamente, no fato de ter sido admitida a processamento ação popular sem que se verificassem os pressupostos dessa tutela jurídico-processual especialissima. 221 VOTO O Sr. Ministro Decio Miranda (Relator): A douta petição de agravo regimental, pelas elocubrações que suscita, bem deixa à mostra o tema das dificuldades e perplexidades do mandado de segurança contra decisão judicial. No caso dos autos, porém, o tema se acha reduzido, em última análise, à invocação do parágrafo 31 do art. 153 da Constituição, a dizer que «qualquer cidadão será parte legitima para propor ação popular que vise a anular atos lesivos ao patrimônio de entidades públicas». A contrario sensu, raciocina a agravante, quando está em causa uma empresa que, como a seu ver acontece com a Vasp, não é entidade E discorre, longa e eruditamente, pública, e, por isso, não poderia ter no propósito de demonstrar a ilegali- secundado o pedido dos autores, a dade do ato cautelar produzido na ação popular não merecia andamenação popular, ilegalidade que se des- to. dobra em duas faces. Dá-se, porém, que, no recurso extraordinário, está em causa apenas Ilegal em si mesmo teria sido a a medida cautelar. medida cautelar, porque no plano da E esta, salvo invocação de ordem asseguração da pretensão da ação popular as ações cautelares são constitucional (que a ela especificainadmissíveis, só sendo possível mente não se aplica), ou de argüição concebe-las no plano da asseguração de relevância (que não foi apresenda prova, do que, na espécie, não se tada), está incluída no rol das ações e procedimentos de cuja decisão não trata. cabe recurso extraordinário (art. 308, V, do Regimento Interno vigente E ilegal, ainda, a medida, pelo óbi- até 30-11-80, aplicável a este caso). ce de não ser a Vasp pessoa jurídica de direito público, nem autarquia A medida cautelar tem mero nem sociedade de economia mista, status legal e nem por aplicar-se em caracterizando-se como sociedade processo que tenha por objeto instianónima, pessoa jurídica de direito tuto de direito adjetivo previsto na privado, de natureza comercial, in- Constituição transmuda-se em matésusceUvel de ter seus atos tutelados ria constitucional superadora do óbipela via excepcional da ação popu- ce regimental. lar, prevista no f 31, do art. 153, da Constituição da República. (Fls. 172Isto posto, nego provimento ao 18.3 ) agravo regimental. o relatório. o meu voto. 222 R.T.J. — 100 EXTRATO DA ATA Ag. 84.699— (AgRg) — SP — Rel.: Min. Dedo Miranda. Agte.: Asa — Agentes de Serviços Aeroviários Ltda. (Advs.: Celso Neves e outro). Agdos.: Juiz de Direito da 3? Vara dos Feitos da Fazenda do Estado de São Paulo, Viação Aérea São Paulo S.A. — Vasp (Advs.: Luiz Carlos Bettiol, José Sado Pereira Ramos e outros). Decisão: Negado provimento ao Agravo Regimental. Unánime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília 10 de novembro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 84.983 (Ag,Rg) — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Néri da Silveira. Agravante: Freios Gots Auto Partes S/A. — Agravada: União Federal. Agravo. Despacho do Presidente do Tribunal a quo dando pela Intempestividade do recurso extraordinário. Ao agravante incumbe providenciar o traslado das peças essenciais à compreensão da controvérsia. Súmula n? 288. Agravo regimental desprovido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamentos e notas taquigráficas, à unanimidade, negar provimento ao Agravo Regimental. Brasília, 10 de novembro de 1981 — Cunha Peixoto, Presidente — Néri da Silveira, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): Trata-se de agravo regimental interposto por Freios Gots Auto Partes S.A. do seguinte despacho, às fls. 38: «Vistos, publicado o acórdão recorrido a 16.4.1980, foram interpostos embargos de declaração, em 22 do mesmo mês, sendo recebidos, segundo o despacho agravado, a 6.8.1980. Há referência à interposição de novos embargos de declaração, no dia 12.8.1980, não conhecidos. O recurso extraordinário deu entrada no TER a 5.2.1981, consoante está anotado, às fls. 17. 2 — Sucede, entretanto, que não providenciou a agravante o traslado de peças essenciais à compreensão da controvérsia, nos termos postos no despacho que teve por intempestivo o apelo extremo. Não só não estão trasladados os acórdãos nos embargos de declaração, como não se tem elemento documental a identificar, sequer, a data da publicação do aresto nos embargos de declaração, por último, Interpostos. O despacho apenas afirma a data da interposição a 12.8.1980. Não há prova da data da publicação do acórdão que deles não teria conhecido, nem de seu inteiro teor, a possibilitar o exame do conteúdo da decisão, em lace R.T.J. — 100 também do que sustenta a agravante (fls. 1/3). 223 de novo, embargado a 12.8.1980, então não conhecido, o recurso O apelo extremo é de 5.2.1981. Quando ocorreu, entretanto, a publicação do 3 — Do exposto, nego seguimento acórdão dos segundos embargos de ao agravo (Súmula n? 288)». declaração? Como referi no despacho ora agravado, disso não há noticia nos autos, o que se faria misSustenta a agravante, às fls. 42/43, ter, o cômputo do tempo recurque não há falar em falta de peças sal, para por duas vezes suspenso. Certo essenciais à compreensão da contro- é que o recurso extraordinário sovérsia, no traslado, porque o despa- mente deu entrada na Corte a quo, a cho presidencial, ao dar pela intem- 5.2.1981. pestividade do recurso, entendeu que aos segundos embargos declaratóDessa maneira, não providenciou rios não têm o mérito de suspender o a agravante o traslado de peças esprazo para o recurso, por não terem senciais à compreensão da controsido conhecidos», não sendo esse o vérsia, em torno da intempestividaentendimento do Supremo Tribunal de do apelo. Sequer o inteiro teor do Federal, em abono do que refere o acórdão, que dos segundos embargos despacho no Ag. 75.493. de declaração não conheceu, compõe o traslado. Incide, dessarte, aqui, a E o relatório. Súmula n? 288. Nego assim, provimento ao agravo VOTO regimental. O Sr. Ministro Néri da Silveira (Relator): O agravo não traz eleEXTRATO DA ATA mentos novos, que possibilitem modificar o despacho, de fls. 38, ora imAg. 84.983 — (AgRg) — SP — Rel.: pugnado. Min. Néri da Silveira. Agte.: Freios Gots Auto Partes S.A. (Advs.: José Como nele se registrou, não há ele- Eduardo Rangel de Alckmin e oumento documental a identificar, se- tros, e Antonio Carlos de Almeida quer, a data da publicação do aresto Castro). Agdo.: União Federal. nos embargos de declaração, por último, interpostos. O despacho do Decisão: Negaram provimento ao ilustre Presidente do Colendo Tribu- Agravo Regimental. Decisão unâninal a quo afirma a data da interposi- me. ção desses segundos embargos declaratórios, como sendo 12.8.1980. Presidência do Senhor Ministro Não há, porém, prova da data da publicação do aresto que, deles, a se- Cunha Peixoto. Presentes à Sessão guir, não tomou conhecimento. Se, os Senhores Ministros Soares Mtuloz, pelo art. 538, do CPU, os embargos Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e de declaração supendem o prazo pa- Néri da Silveira. Subprocuradorra a interposição de outros recursos, Geral da República o Dr. Mauro Leina espécie, sucedeu que, publicado o te Soares. acórdão recorrido a 16.4.1980, interpuseram-se embargos de declaBrasília, 10 de novembro de 1981 — ração a 22 do mesmo mês. O aresto Antônio Carlos de Azevedo Braga, nestes embargos declaratórios foi, Secretário. 224 R.T.J. - 100 AGRAVO DE INSTRUMENTO N? 85.067 (AgRg) — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra. Agravante: Terraplanagem Globo S/C — Ltda. — Agravada: Companhia Docas do Estado de São Paulo, sucessora da Companhia Docas de Santos. — Taxa de armazenagem. Se o importador não usa da faculdade de liberar, mediante garantia, as mercadorias retidas em instalações portuárias alfandegadas, exclusivamente em virtude de litígio entre o Interessado e a autoridade fiscal responderá pela armazenagem e despesas de remoção, ainda que a decisão final do litígio lhe seja favorável. (Dl 517/69, art. 1? e 5?). AgRg improvido. ACORDAI) Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam• os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, ti unanimidade de votos, em negar provimento ao agravo regimental. Brasília, 09 de outubro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro Guerra, Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O v. acórdão impugnado está assim ementado: «Taxa de armazenagem. Importada a mercadoria sob o regime do Decreto-lei 517/69, não deve o importador ou interessado aguardar a solução do litígio fiscal, para só depois liberar os efeitos armazenados, sob pena de arcar com a responsabilidade do pagamento das taxas de armazenagem e remoção (arts. 1? e 5?). O Decreto-Lei 5/66, art. 28, de vigência anterior e atualmente revigorado pelo Decreto-lei 1.455/76 (art. 41), não beneficia os casos intercorrentes.» (f. 20). Indeferido foi o apelo extraordinário nestes termos: «Recorre extraordinariamente a impetrante sustentando amparo nas letras a e cl cio permissivo constitucional ao argumento de que o aresto recorrido negou vigência ao art. 29, inciso I, ff 1? e 2?, do Decreto-lei n? 5, de 1966, e divergiu do enunciado na Súmula 127 do STF. Entendo que razão desassiste à recorrente. Neste sentido adoto os fundamentos do voto condutor do acórdão ao proclamar: «... á época vigia o Decreto-lei n? 517/69, segundo o qual cabia ao interessado diligenciar a liberação da mercadoria retida em virtude de litígio com a autoridade fiscal, mediante a garantia da instância e antes da decisão final (art. 1?). Assim, não diligenciando, no sentido da lei, pouco importaria a sorte do litígio fiscal, mesmo que contrária à Fazenda, porque assim está dito no art. 5? da mesma lei, verbis: «Art. 5? Mesmo que a decisão final do litígio seja favorável ao interessado, este será responsável pelo pagamento da armazenagem R.T.J. — 100 225 e das despesas de remoção, se não houver providenciado a liberação da mercadoria, na forma estipulada no artigo 1?.» «O v acórdão impugnado está conforme à jurisprudência do STF — RE 77.436 — SP, 1! Turma, relator Ministro Rodrigues Alcitmln, 13.9.74, assim ementado: O critério diverso, anteriormente instituído pelo Decreto-lei n? 5/66, art. 29, e que atribula à União Federal o pagamento daquelas despesas, quando a questão fiscal fosse decidida em favor do interessado foi superado pela lei nova, o Decreto-lei 517/69, com vigência até a edição do Decreto-lei 1.455, de 7 de abril de 1976, expressamente o revogou, no seu art. 41, restabelecendo a partir daí o sistema anterior. «Taxa de armazenagem. Se o importador não usa a faculdade de liberar, mediante garantia, as mercadorias retidas em instalações portuárias alfandegadas exclusivamente em virtude de litígio entre o interessado e a autoridade fiscal, responderá pela armazenagem e despesas de remoção ainda que a decisão final do litígio lhe seja favorável (Dl 517/69, art. 1? e 5?). Não vejo como descaracterizarse, na hipótese, o litígio ou a questão fiscal surgida quanto à isenção da mercadoria importada, se a mesma foi. levada a uma composição final, dentro dos cânones de indiscutível conflito de interesse, que tanto poderiam ser resolvida em procedimento formal ou pela autocomposição.» Se a decisão impugnada não deixou de aplicar a regra incidente sobre a espécie, e o fez com conotação de razoabilidade, não há que falar em negativa de vigência (Súmula 400). Quanto à Súmula indicada para confronto (125) trata ela de tema diverso do discutido nos presentes autos (SúmUla 291). Do exposto, nego seguimento ao recurso. Publique-se. Brasília, 24 de novembro de 1980 — Ministro Jarbas Nobre, VicePresidente.» (fls. 28/30). Ao agravo neguei seguimento nestes termos: RE não conhecido.» Assim, bem aplicada a Súmula 400 pelo despacho agravado, nego seguimento ao recurso.» (f. 42t). Insurge-se a agravante na inaplicabilidade à espécie dos arts. 1? e 5? do Decreto-lei 517/69, pois não houve litígio, mas simples questão levantada pela Receita Federal. E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra (Relator): Realmente, na vigência do art. 10, n? 02, do Decreto-lei 8.439/45 nenhuma armazenagem era devida em caso de ser julgada improcedente a questão fiscal suscitada pela alfândega, Súmula 127, RE 76.836, São Paulo. Mas, como adverte o professor Roberto Rosas (Direito Sumular, 2! Edição, pág. 867): «O art. 5? do Decreto-lei 517/1969, altera em parte a Súmula.» Ora, na espécie, incidia o Decretolei 517/69 e assim, bem invocado foi o precedente do RE 77.436-SP. 226 — loo Por outro lado, questão e litígio são sinônimos, e negada a sinonimia, a questão encontraria o óbice da Súmula 279. de São Paulo, Sucessora da Companhia Docas de Santos (Advs.: Aicino Guedes da Silva e outros): Decisão: Negado provimento ao Agravo Regimental. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 09 de outubro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. Nego provimento ao agravo. EXTRATO DA ATA Ag. 85.067 — (AgRg) — SP —Rei: Min. Cordeiro Guerra. Agte.: Terraplanagem Globo S/C — Ltda. (Advs.: Paulo Seabra de Noronha e outro). Agda.: Companhia Docas do Estado EMBARGOS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 85.391 — RJ (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Embargante: Daisy Fernandes — Embargado: Luiz Carlos Segala de Menezes. — Concubinato — Sociedade de fato — Embargos de divergência. Dissídio não caracterizado nos termos do art. 305, c/c. art. 309, 1?, ambos do RISTF. Embargos de divergência não conhecidos. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em sessão plenária, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso de embargos de divergência. Brasília, 08 de novembro de 1979 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Cunha Peixoto, Relator. existência de sociedade de fato, capaz de, a seu termo, ensejar a partilha dos bens dos concubinos, salvo prova de que tenham sido conseguidos pelo esforço comum, seja em forma de capital, quer por melo de serviços prestados. No caso concreto, após examinar profundamente as provas coligadas, concluiu o Tribunal local que, a despeito da vida em comum more uxorio, não havia a concubina concorrido com seu esforço para a aquisição do bem imóvel questionado, RELATÓRIO pertencente unicamente ao amásio, sozinho, arcara com o pagaO Sr. Ministro Cunha Peixoto: O que, mento do preço. Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro firmou entendimento de que o A egrégia Segunda Turma deste concubinato não implica só por si a colendo Supremo Tribunal Federal R.T.J. — 100 conheceu do recurso extraordinário interposto, mas lhe negam!! provimento, em acórdão que porta a ementa seguinte: *Concubinato. Sociedade de fato. II — Para a existência da sociedade de fato não se faz bastante o concubinato, ainda que more uxorio. E mister comprovar que o patrimônio adquirido proveio do trabalho conjugado de ambos (Precedentes do S.T.F.). III — Ausente tal tipo de prova, é Inviável o reconhecimento social propugnado». Contra este decisório, insurge-se Dona Daisy Fernandes, sustentanto não se harmonizar a tese acolhida pelo venerando acórdão com a fixada em vários outros desta Suprema Corte, dentre os quais indicou os RREE. n?s 52.541, 37.491, 41.821, 52.217, 50.150, 70.271, 68.952, 65.243 e 43.903. As decisões confinantes, segundo a embargante, teriam firmado o entendimento de que basta o concubinato para, desde logo, haver a sociedade de fato entre os concubinos, capaz de obrigar à partilha do patrimônio, no caso de separação. A Procuradoria-Geral da República manifesta-se pelo não conhecimento dos embargos, em parecer do teor seguinte: «1 — Ao julgar o RE n? 85.391-0, proferiu a Egrégia Segunda Turma acórdão assim ementado: *Concubinato. Sociedade de fato. II — Para a existência da sociedade de fato não se faz bastante o concubinato, ainda que more uxorio. E mister comprovar que o patrimônio adquirido proveio do trabalho conjugado de ambos (precedentes do S.T.F.). 227 III — Ausente tal tipo de prova, é inviável o reconhecimento social propugnado. IV — Recurso conhecido pelo dissídio pretoriano, mas Improvido. Voto vencido» (fls. 392). 2 — Irresignada, Daisy Fernandes opôs embargos de divergência asserindo que a tese acolhida pelo r. acórdão embargado não se harmoniza com a fixada em vários outros desta Suprema Corte, dentre os quais indicou os RE n?s 52.541, 37.491, 41.821, 52.217, 50.150, 70.271, 68.952, 65.243 e 53.903. 3 — Os embargos foram impugnados ( fls. 416/9), e o impugnante pediu o seu não conhecimento ou, se conhecido, o seu improvimento. 4 — Parece-nos que o v. acórdão embargado não discrepa da orientação da Súmula n? 380 e amoldase à que fixou o Plenário deste Excelso Pretório a quando do julgamento do ERE n? 81.012 — RJ. 5 — Com efeito, o v. acórdão não conflito com aqueles que a embargante trouxe à colação no que se refere à possibilidade de partilha dos bens quando provada a formação do património pelo esforço comum. 6 — Se, pois, provada fosse a sociedade de fato e a formação do património pela colaboração de ambos, haveria de ser feita a partilha: como, porém, apreciando soberanamente as provas, decidiu o Colendo Tribunal de Justiça que tal sociedade não resultou provada, e que o patrimônio não foi formado pelo esforço comum, parecenos que o v. acórdão embargado não se atrito com os trazfdos à colação pela embargante, nem com a Súmula 380. 228 R.T.J. — 100 7 — Diante do exposto, evidenciada está a inexistência de divergência, razão por que opinamos no sentido de que não sejam conhecidos os embargos». E o relatório. A companheira ou concubina que prestou serviço por largos anos ao de cujus, ajudando-o no granjeio dos meios de subsistência e contribuindo para a formação de seu patrimônio, faz jus a uma remuneração, porque tais serviços não se presumem gratuitos». VOTO RE. n? 52.217: O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Re«Tendo vivido vários anos com o lator): 1 — Ao julgar o RE n? 85.391, amásio, já viúvo, com ele coabiproferiu a Egrégia Segunda Turma tando, ajudando-o no trabalho diáacórdão assim ementado: rio, tem direito a concubina de ser indenizada, se o companheiro, ao «Concubinato. Sociedade de fato. morrer, sem herdeiros necessários, nada lhe deixa». II — Para a existência da sociedade de fato não se faz basRE. ri? 70.271: tante o concubinato, ainda que «Companheira. Serviços doméstimore =orlo. 2 mister comprovar cos. Faz jus à remuneração por que o patrimônio adquirido proveio serviços domésticos ou outros lícido trabalho conjugado de ambos tos e de natureza econômica, a mu(Precedentes do S.T.F.). lher solteira que viveu sob o mesII — Ausente tal tipo de prova, é mo teto, durante anos com homem inviável o reconhecimento social solteiro, de quem engravidou, em propugnado». união livre e honesta». A embargante interpôs embargos O RE. n? 68.952, a' seu turno, de divergência, apontando como dis- assina-la: sidentes nove acórdãos, todos trazi«Concubinato. Já esta superada dos à colação através de suas emena divergência jurisprudencial sotas. Destes, seis mostram, à primeibre os efeitos do concubinato, ra leitura, que se amoldam ao deciquando há efetiva prestação de dido no acórdão embargado, pois serviços da companheira ao concuacentuam haver prestado a concubibinário ou sociedade de fato entre na serviços. Com efeito, no acórdão ambos. O Pleno e as Turmas do proferido no RE n? 37.491, está escriSupremo Tribunal Federal, em suto: cessivos e tranqüilos pronunciamentos, reconheceram direito, «São indenizáveis os serviços doem ambos os casos, à mulher que mésticos prestados pela compavive em união livre e estável com nheira concubina durante largos o homem, prestando-lhe serviços anos de vida em comum. rurais, domésticos ou econômicos». Tal entendimento filia-se à meComo se verifica, todos ressaltam lhor doutrina e ajusta-se com ade- a prestação de serviços por parte da quação à lei». concubina, elemento ausente no caso objeto do RE. n? 85.391, ora embarTambém o RE. n? 41.821: «Concubina. Serviços prestados gado. ao companheiro. Direito à remuneA ementa do acórdão proferido no ração. RE. n? 60.657, em que foi relator o R.T.J. — 100 eminente Ministro Adalício Nogueira, discrepa da decisão embargada. Acontece, porém, que a leitura de todo o voto do eminente Ministro Adiando Nogueira, que traduziu a decisão, mostra que também este se ajusta à tese do acórdão embargado. Com efeito, além do relator haver mencionado a Súmula n? 318, que também se refere ao «património adquirido com o esforço comum», declarou, expressamente, no voto: «A tese central deste é se a concubina deve ser indenizada pelo seu companheiro, em razão dos serviços que lhe prestou, durante muitos anos, compondo ambos uma verdadeira sociedade de fato». Por sua vez, o acórdão proferido no RE n? 52.541, na ementa trazido à colação, é vago e não diverge também da decisão embargada, verbis: «Concubina. Legitimidade de parte para pleitear alimentos por morte do amásio, que provia à sua manutenção e do qual tivera dois filhos ainda menores. O concubinato, embora à margem da família constituída, nasce de circunstâncias imperiosas da vivência social, e gera interesses que a moral não repele e só não se concilia como fato gerador de direito se, em suas conseqüências, entra em choque com situações jurídicas Já constituídas à sombra da lei». Por último, vem o RE. n? 43.903. Este, embora pareça divergir do acórdão embargado, não se presta ao confronto, já que foi trazido aos autos apenas pela sua ementa e sem possibilidade de ser conferido com a decisão embargado, uma vez que a embargante não indicou o repertório em que foi publicado e, por mais esforço que fizéssemos, não conseguimos localizá-lo. 229 Ora, adverte o art. 309, § 1?, combinado com o art. 305, ser dever do embargante apresentar os acórdãos divergentes por certidão ou cópia autenticada, ou mediante citação do repositório de jurisprudência oficial ou autorizado, com transcrição dos trechos que configurem o dissídio, mencionando as circunstâncias que identifiquem ou assemelhem os julgados confrontados. Relegando a advertência regimental, a embargante, sobre não ter mencionado o repositório de jurisprudência no qual se encontra inserida a decisão proferida no RE. n? 43.903, limitou-se a reproduzir uma passagem do voto do eminente Ministro Vilas Boas, onde estaria a divergência pretendida. Não satisfez ela, pois, os pressupostos regimentais, sendo imprestável ao fim pretendido. de notar que a própria embargente, posto tenha, no capítulo «Princípios dominantes do STF», declorado: dê em trecho do douto voto» (do eminente Ministro Vilas Boas), não o compila no Capítulo «Dissídio de Julgados», entre as decisões indicadas como divergentes do acórdão embargado. Assim, como assinala o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, «o V. acórdão não conflito com aqueles que o embargante trouxe à colação no que se refere à possibilidade de partilha dos bens quando provada a formação do patrimônio pelo esforço comum.» Acresce que o acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, integrado no voto do relator, eminente Ministro Thompson Flores, ressalta uma circunstância inexistente nas decisões apontadas como divergentes, pois, enquanto estas salientam a contribuição de serviços da 230 R.T.J. — 100 concubina, aquele assinala que ela auferia dos ganhos de seu amante com a manutenção de suas duas filhas. Diz o acórdão: «... a presunção que se tem é a de que a apelada, com suas agregadas, constltuia pesado ânus no orçamento do apelante; presumivelmente, custava bem caro ao apelante aquele concubinato». Por estes motivos, não conheço dos embargos. Dutra e outro). (Dec. Embda.: 2! Turma, em 05.12.1978). Decisão: Não se conheceu do recurso de embargos de divergência. Decisão unânime. Ausente, ocasionalmente, o Sr. Min. Antonio Neder. Presidência do Senhor Min. Xavier de Albuquerque. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Thompson Flores, Xavier de Albuquerque, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Mtuloz, Dedo Miranda e Rafael Mayer. AuEXTRATO DA ATA licenciado, o Sr. Ministro LeiERE: 85.391 — RJ — Rel.: Min. sente, tão de Abreu. Procurador-Geral da Cunha Peixoto. Embte.: Daisy Fer- República, Dr. Firmino Ferreira nandes. (Adv.: José Guilherme Ville- Paz. la). Embdo.: Luiz Carlos Segala de Brasília, 08 de novembro de 1979 — Menezes. (Advs.: Mauro Calderaro da Silva Travassos, Sérgio Gonzaga Alberto Veronese Aguiar, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 86.781 — BA (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Recorrente: Noêmia Martins do Sacramento Vencimento (Espólio de) — Recorrido: Maurício José Raynal. Inventário — Honorários advocatícios. Arbitramento judicial independentemente de citação dos herdeiros e sem audiência do Ministério Público, apesar da existência de menores interessados. Nulidade. Recurso Extraordinário conhecido e provido. ACORDA° RELATORIO O Sr. Ministro Cunha Peixoto — Vistos, relatados e discutidos estes Mauricio José Raynal, funcionou, autos, acordam os Ministros da Pri- em quase todo o processo, como admeira Turma do Supremo Tribunal vogado do inventário de Noêmia Federal, na conformidade da ata do Martins do Sacramento Vencimento, julgamento e das notas taquigráfi- e, revogado seu mandato, requereu cas, por unanimidade, de votos, em arbitramento de honorários, os quais conhecer e prover o recurso. foram fixados em 6% sobre o valor do monte, tomando-se por base o Brasília, 4 de dezembro de 1979 — preço da venda do terreno. Interposta apelação por parte do Thompson Flores — Presidente — espólio, o Tribunal de Justiça da BaCunha Peixoto — Relator. R.T.J. — 100 hia deu provimento parcial ao recurso para arbitrar os honorários em 4% sobre o valor da venda do terreno e mais 2% sobre o valor que coube a cada um dos herdeiros. Irresignados, os herdeiros de Noêmia Martins do Sacramento Vencimento interpuseram recurso extraordinário com fundamento na letra a do permissivo constitucional, alegando como violados os arts. 113, (1 2? e 275, II, letra m do Código de Processo Civil, que prevê o procedimento sumarissimo como meio hábil à cobrança dos honorários profissionais. Argumentam, ainda, que o Ministério Público não foi ouvido, havendo, portanto, violação dos arts. 82, I e 83, I do Código de Processo Civil, já que há menores no inventário, que não haviam outorgado procuração ao recorrido. A Procuradoria-Geral da República manifesta-se pelo conhecimento e provimento do recurso. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): — O Tribunal de Justiça da Bahla, sem dúvida, negou vigência aos dispositivos invocados pelos recorrentes, quando, sem forma e figura de juizo, arbitrou os honorários do advogado no inventário de Noémia Martins do Sacramento Vencimento. Demonstra-se lucidamente o parecer da Procuradoria-Geral da República, cuja fundamentação se me afigura irrepreensível. Ei-la: «Não pode, a nosso ver, prevalecer o arbitramento dos honorários advocaticlos, fixados pelo MM. Juiz singular, sem forma nem figura de juizo, em 6% sobre o valor do monte, percentual alterado pelo eg. Tribunal baiano, que o estipu- 231 lou em 4% sobre o valor da venda do terreno e mais 2% sobre o quinhão de cada herdeiro. (f. 155). Ocorre que, entre estes, existiam dois menores, conforme fazem prova inconcussa as certidões acostadas às fls. 53 e 54 dos autos, menores estes, entretanto, que não se fizeram representar por ocasião do arbitramento que o MM. Juiz mandou preceder de laudo pericial oficial, sem facultar aos incapazes a designação ao menos de assistentes técnicos. Ademais, não funcionou, ao ensejo de tal fixação, o representante do Ministério Público, como recomenda a lei, no art. 82 do CPC, que determina a intervenção do Pitrquet nas causas onde haja, como no caso, interesses de incapazes. Como não havia contrato escrito de honorários, não nos parece possível fossem estes arbitrados no processo de inventário, a não ser com anuência expressa de todos os interessados, o que na espécie não ocorreu. Impunha-se, a nosso ver, fossem eles postulados em ação própria, perante o Juizo competente, após regular citação das partes e a interveniência oportuna do Ministério Público. O que não se concebe, data venta, ,é que, a pretexto de abreviar o curso do processo, se omita o cumprimento de formalidades essenciais, pondo em risco os direitos impostergáveis de menores absolutamente incapazes. Nestas condições, o Ministério Público Federal, atento aos deveres do seu cargo, pede o provimento do recurso extraordinário, a fim 232 R.T.J. — 100 de que se casse o arbitramento dos honorários advocaticios feito nestes autos, ressalvado, evidentemente, ao interessado perseguir o seu direito pelas vias judiciais próprias.» EXTRATO DA ATA RE 86.781 — BA — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: Noêmia Martins do Sacramento Vencimento (espólio de). (Adv.: Marta Maria Mónaco Silva Meireles). Recdo.: Mauricio José Não há dúvida de que a falta de Raynal. (Adv.: em causa própria). Decisão: Conhecido e provido, deaudiência do Ministério Público, em processo no qual figuram menores, e cisão unânime. a ausência de citação dos herdeiros Presidência do Sr. Ministro Thomppara participarem do arbitramento, son Flores. Presentes à Sessão violam os dispositivos processuais os Senhores Ministros Xavier de invocados pelos recorrentes. Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mtuloz e Rafael Mayer. SubprocuraPor estes motivos, conheço do re- dor-Geral da República, o Dr. Francurso e lhe dou provimento para cisco de Assis Toledo. anular o arbitramento em questão, Brasília, 4 de dezembro de 1979 — nos termos do parecer da Procura- Antônio Carlos de Azevedo Braga — doria-Geral da República. Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 87.255 — RJ (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Recorrente: Banco Nacional Brasileiro de Investimentos S/A — Recorrido: Juizo de Direito da 17? Vara Civel. Falência — Arrecadação, pelo síndico, de bens apreendidos em benefício de credor da firma que velo a falir. Mandado de segurança objetivando tornar sem efeito a arrecadação. Meio processual impróprio, nos termos do art. 79 da lei de falências, que prevê expressamente a via de embargos de terceiro para o fim collmado pelo impetrante. Recurso extraordinário não conhecido. ACOFtak0 Vistos, relatados e discutidos estes autos acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade -da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso RELATÓRIO O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Banco Nacional Brasileiro de InveStimentos S/A, credor fiduciário da «Cia Metropolitana de Construções», obteve do Juizo da 4? Vara Civel a busca e apreensão das máquinas alienadas. Brasília, 05 de fevereiro de 1980 — Sobrevindo a falência da devedora Xavier de Albuquerque, Presidente . fiduciante, foi o processo referente à — Cunha Peixoto, Relator. busca e apreensão remetido ao Juízo 233 R.T.J. — 100 da Falência e, em seguida, arrecadar dos pelo síndico os bens que haviiiin sido apreendidos por ordem do Juiz do Cível. O credor, então, impetrou mandado de segurança, objetivando tornar sem efeito a arrecadação procedida pelo síndico e, conseqüentemente, reaver os referidos bens. O Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro denegou a segurança, eiti decisão do teor seguinte: a••• denego a medida. É matéria assentada na jurisprudência pátria a de que não se dará mandado de segurança de decisão judicial quando dela caiba recurso com efeito suspensivo. Neste sentido é a Súmula 267. «Não cabe Mandado de Segurança contra ato judicial passível de recurso ou correção». Por sua vez o art. 79 da Lel de Falências é expresso no assentar que: «Art. 79 — Aquele que sofrer turbação ou esbulho na sua posse ou direito, por efeito de arrecadação ou de seqüestro, poderá, se nió preferir usar do pedido de restituição, defender os seus bens por via de embargos de terceiTO». No caso dos autos, foram arrecados pelo Dr. Juiz da Falência, em poder do Impetrante, entregues que foram pelo Juízo original, as bens gravados com alienação fiduciária. Cabia, assim, ao impetrante, o remédio normal dos embargos de terceiro, que, malgrado não sejam um recurso, são instrumento legal específico, já que não quis usar da faculdade de pedir a restituição, inobstante tenha aceitado, o juízo falimentar, deixando de recorrer das decisões que, com base no art. 7? da Lel n? 7.661/45, determina- ram a remessa dos autos de busca e apreensão ao Dr. Juiz da Falência. Observe-se que a arrecadação foi feita quando os bens já se encontravam em poder do impetrante em virtude de simples mandados de busca e apreensão, sem julgamento final e antes mesmo de delimitada a angularidade procedimental — art. 264 do Cód. de Processo Civil. Os embargos seriam, assim, a maneira de corrigir o ato da arrecadação, comportando discussão ampla com cuidadoso exame da matéria entre as próprias partes, diretamente, o que inocorre no Mandado de Segurança, onde os interessados apenas intervêm, sem possibilidade de produção de provas em audiência e outras garantias processuais que, na falência, por sua complexidade, repercussão e interesses de outros credores, devem ser preservados». (fls. 218/219). Irresignada, a vencida inter" recurso extraordinário com fundamento na letra d do permissivo constitucional, alegando haver o Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro divergido da Súmula nt 267. A Procuradoria-Geral da República manifesta-se no sentido do não conhecimento do recurso. E o relatório.* VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): Não conheço do recurso extraordinário. A decisão recorrida não dissentiu da Súmula 267, que declara não caber mandado de segurança contra ato judicial passível de recurso ou correção. A decisão não teve apenas este fundamento. Ao contrário: o acórdão, na verdade, se referiu à men- 234 R.T.J. — 100 cionada Súmula, mas, em seguida, afirmou aplicar à espécie o art. 79 da Lei de Falências, que prevê, expressamente, a via de embargos de terceiro àquele que sofrer turbação ou esbulho na sua posse ou direito, em caso de arrecadação ou seqüestro de bens em processo falimentar. Ora, fixando a Lel de Falências o remédio próprio para o objetivo colimado pelo terceiro que se diz prejudicado com a arrecadação de bens pelo síndico, certamente não lhe cabe abandonar esta medida para optar pelo mandado de segurança. Não conheço do recurso. Brasileiro de Investimentos S/A (Adv.: Nelson Ribeiro Alves Filho). Recdo.: Juízo de Direito da 17! Vara Cível. Decisão: Não conhecido, unanimemente. EXTRATO DA ATA RE 87.255 — RJ — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Reate.: Banco Nacional Brasília, 5 de fevereiro de 1980 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. Presidência do Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, na ausência justificada do Sr. Ministro Thompson Flores — Presidente. Presentes á Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mufioz e Rafael Mayer. Subprocurador-Gerai da República, Dr. Francisco de Assis Toledo. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 88.960 — RJ (Tribunal Pleno) Relatar: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrentes: 1?) Maria Helena Barreto de Carvalho — 2?) Estado do Rio de Janeiro — Recorridos: Os mesmos. Desapropriação. 1 — Correção monetária. Incide sobre a parcela de 20% mantida em depósito. Recurso extraordinário do Estado não conhecido. 2 -- Juros moratórios e compensatórios. Incidem cumulativamente, sendo que estes á taxa de 12% ao ano. Precedente: RE n? 90.656, Pleno de 26-9-1980. 3 — Honorários de advogado. Para seu cálculo, incluem-se, na indenização, ambas as partes dos juros. Não cabe, porém, a elevação do seu percentual. Recurso extraordinário da desapropriada conhecido e parcialmente provido. ACORDAO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, reunidos em sessão plenária, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer do recurso da 1! Recorrente, e dar-lhe provimento nos termos do voto do Relator. Não conhecer do recurso do Estado do Rio de Janeiro, unanimemente. Brasília, 24 de setembro de 1980 — Antonio Neder, Presidente — Leitão de Abreu, Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: Em desapropriação, fixado o preço, a sentença ainda concedeu: a) correção monetária do saldo não levantado; b) juros compensatórios, 6% ao ano, a partir da data da imissão de posse até o efetivo pagamento; c) ju- — 100 ros moratórios, 6% ao ano, a partir do trânsito em julgado e sobre o saldo não levantado e devidamente corrigido; d) 5% de honorários sobre a diferença entre a oferta e a indenização, mas sem os juros (v. fs. 180/183 e fls. 190/191). O acórdão excluiu da condenação apenas os juros moratórios (fls. 243). Subiram os autos, com recurso extraordinário de ambas as partes. A Procuradoria-Geral da República, em parecer do Procurador Moacir Antonio Machado da Silva, assim se manifestou: *... Insurge-se o Estado contra a incidência de correção sobre o saldo de vinte por cento não levantado pelo expropriado, alegando ofensa ao art. 33 do Decreto-lei n? 3.365, de 1941, e divergência com julgados de outros Tribunais do Pais. «Por seu turno, pede a expropriada a inclusão de juros moreiarios, a elevação da taxa de juros compensatórios de 6% para 12% ao ano, a elevação do percentual de honorários de advogado e a inclusão dos juros na indenização, para efeito de cálculo da diferença sobre que haverá de incidir a mesma verba de honorários. Sustenta violação dos arts. 1.062, 1.064 e 1.536, 2?, do Código Civil, e 20 do Código de Processo Civil, além de divergência jurisprudencial (Ap. Cíveis 33.888 e 32.365, RE 69.798, RE 85.209 e RE n? 77.614, cujos cópias constam de fls. 252 a 289 dos autos). «Não merece prosperar o recurso do Estado, embora esteja demonstrada a divergência. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal é no sentido de que a atualização deve ser feita até à data do efetivo pagamento do preço, não podendo ser considerado como tal a retenção necessária de uma parcela da quantia depositada no inte- 235 resse do expropriante (RE 82.122, DJ de 22.10.76, p. 9.228; RE 73.564, RTJ 61/288, etc ) «Merece provimento parcial o recurso da expropriada. A jurisprudência dominante no Supremo Tribunal Federal é no sentido de que os juros compensatórios e os moratórios, porque resultantes de fundamentos distintos, podem incidir cumulativamente (RE 89.211, DJ de 11.10.78; RE 80.718, DJ de 31.12.76, p. 11.238). «Por igual, os honorários de advogado devem ser calculados sobre a diferença entre a oferta e a indenização, ambas corrigidas monetariamente. O conceito de indenização abrange não só o valor do bem expropriado, como também os juros e demais parcelas mandadas pagar (RE 79.855, RE 77.937 e RE 78.196, ai de 06.05.74, p. 2.896; RE 88.223, etc.). «Não cabe, porém, elevação do percentual para o cálculo dos mesmos honorários de advogado. O arbitramento dessa verba nas desapropriações tem regulamentação específica (Decreto-lei 3.365/41, art. 27, 1?), não se aplicando o art. 20 do Código de Processo Civil (RE 82.909, RTJ 76/659). «Quanto aos juros compensatórios, é certo que o Supremo Tribunal Federal tem, em alguns casos, elevado o percentual de seis para doze por cento. Parece-nos, porém, que a fixação da taxa de juros compensatórios é matéria ligada it maior ou menor rentabilidade do bem expropriado, existindo julgados em ambos os sentidos. E razoável, assim, a conclusão do acórdão, fixando-os em seis por cento. «Pelo conhecimento, mas pelo desprovimento do recurso do Estado e pelo conhecimento e provimento parcial do apelo da expro- 236 R.T.J. — 100 priada, para inclusão dos juros moratórios e para que ambas as parcelas de juros integrem a indenização, para efeito de cálculo dos honorários de advogado.» (fls. 329/330) Não procede todavia, como entende o parecer, a pretensão da recorrente no sentido de obter elevação do percentual dos honorários. Em resumo: não conheço do segundo recurso, que é do Estado do Rio de Janeiro; conheço, entretanto, do primeiro recurso, que é da desapropriada, e lhe dou parcial proviVOTO mento para: a) restabelecer a sentença quanto aos juros moratórios; O Sr. Ministro Leitão de Abreu b) determinar que se incluam ambas (Relator): Recorre o Estado- as partes dos juros na indenização, desapropriante contra a incidência para o cálculo dos honorários de adda correção monetária «sobre a par- vogado; e c) elevar a taxa dos juros te do preço depositado e não levanta- compensatórios para 12% ao ano. do». De acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal, a correção monetária, sobre essa parte do preEXTRATO DA ATA ço, é cabível, razão pela qual não conheço do recurso do Estado, segundo recorrente. RE 88.960 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Rectes.: 1?) Maria HeDas pretensões da expropriada, lena Barreto de Carvalho (Adv.: em número de quatro, o parecer Adolpho José Fernandes); 2?) Estafavorável ao conhecimento do recur- do do Rio de Janeiro (Adv.: Luiz so por ela interposto, manifesta-se Carlos de Azevedo Barros). Recdos.: pelo deferimento de duas: inclusão Os mesmos. na indenização dos juros moratórios e adição de ambas as parcelas de juDecisão: Conheceu-se do recurso ros — moratórios e compensatórios — á indenização, para que sobre elas da it Recorrente, e se lhe deu provirecaiam honorários. Ainda de acordo mento nos termos do voto do Relacom a orientação desta Corte, são tor. Não se conheceu do recurso do imputáveis na indenização juros mo- Estado do Rio de Janeiro. Decisão ratórios e compensatórios, aqueles a uniforme. partir do trânsito em julgado da sentença e estes a contar da imissão de Presidência do Senhor Ministro posse, ambos até o pagamento. co- - Antonio Neder. Presentes à Sessão mo os juros compensatórios, nesses os Senhores Ministros Djaci Falcão, termos, foram concedidos pela deci- Thompson Flores, de Albusão recorrida, porém não os morató- querque, Leitão de Xavier Abreu, Cordeiro rios, cumpre reformar o acórdão, Guerra, Moreira Alves, Cunha Peineste ponto, para reconhecer-se á xoto, Soares Muhoz, Decio Miranda desapropriada, consoante o critério e Rafael Mayer. Procurador-Geral já exposto, direito aos juros morató- da República, substituto, o Dr. Franrios. Assiste razão á expropriada, cisco de Assis Toledo. ainda, no concernente á elevação dos juros compensatórios de 6% para 12%, pois nesse sentido se firmou a Brasília, 24 de setembro de 1980 — jurisprudência do Supremo Tribunal. Alberto Veronese Aguiar, Secretário. E o relatório. R.T.J. — 100 237 RECURSO EXTRAORDINARIO N? 89.700 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Horácio Moreira Rega — Recorrido: Estado do Rio de Janeiro. Serventuário da Justiça. Tratando-se, como se trata de cumulação sucessiva de pedidos, o acolhimento de um depende, sem dúvida, do acolhimento do outro de conteúdo básico. Na espécie, transitou em julgado a decisão que declarou válida a aposentadoria do recorrente. Ainda que possível transpor o óbice da coisa julgada, tnocorre ofensa aos princípios do direito adquirido ou da isonomia. Recurso extraordinário não conhecido. ACORDA° Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, não conhecer do recurso. Brasília. 30 de setembro de 1980. — Djaci Falcão, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão: Diz o despacho que admitiu o recurso: «Com base na alínea a do permissivo, Horácio Moreira Rega interpôs recurso extraordinário (fis. 167/174) contra o acórdão de fls. 161/5, cuja ementa é a seguinte: «Escrevente juramentado que exercia, interinamente, em substituição ao respectivo titular, o cargo de Oficial do Registro de Distribuição, extinto pela Lei 11? 5.010/966, que organizou a Justiça Federal da 1! Instancia. Não faz jus à disponibilidade, nem ao aproveitamento em serventia equivalente não oficializada. Validade da sua aposentadoria voluntária estreme do alegado vicio de coação. Inaplicabilidade do principio da isonomia.» Alega o recorrente violação do artigo 100, único da Constituição, por lhe ter sido denegada a disponibilidade, de aplicação imperativa; transgressão do artigo 153, 3?, também da lel maior, pois o aresto lhe negou o direito adquirido ser investido em cargo equivalente, na forma do artigo 46, da Lel 89/64; violação do artigo 153, 1?, da Constituição, que consagra o principio da isonomia, pois o acórdão recorrido distinguiu entre situações que guardam entre si vínculos de identidade, repelindo a aplicação ao autor da citada lei 489, quando aos outros assemelhados foi aplicado esse diploma legal. A matéria, tal como foi exposta, unicamente de direito impondose a admissão do apelo em atendimento à recomendação do Supremo Tribunal Federal, constante do acórdão proferido no Agravo de Instrumento n? 34.028 e publicado na 'Revista Trimestral de Jurisprudência, volume 38, pg. 574, tendo em vista que aquela Corte ainda firmou jurisprudência em torno do tema. 238 R.T.J. — 100 São estas as razões que me levam a admitir o recurso pela alínea a. Prossiga-se. Rio de Janeiro, 4 de abril de 1978 — Des. Marcelo Santiago Costa, Presidente» (fls. 189 a 190). Com as razões de fls. 193 a 204 e contra-razões de fls. 207 a 210 subiu o processo a esta Corte. A Procuradoria-Geral da República emitiu o seguinte parecer• «1. — Escrevente juramentado que exercia, interinamente, o cargo de Oficial de Registro de Distribuição, em substituição ao respectivo titular, ajuizou ação contra o Estado do Rio de Janeiro, visando à decretação de nulidade do ato de sua aposentadoria e ao seu aproveitamento como titular em outra serventia ou à concessão de disponibilidade remunerada em relação a esse cargo. — Alegou o autor, em suma, que, extinto o cargo exercido em substituição, com a aposentadoria compulsória de seu titular (Lei n? 5.010, de 1966, art. 86, ji 1?), requereu seu aproveitamento em outra serventia, com base no art. 46 da Lei estadual n? 489, de 1964, mas sua pretensão foi indeferida ante à inexistência de vaga, de forma que, sem nenhuma remuneração desde 2.6.73, foi compelido a pedir aposentadoria. Acrescentou, por fim, que tinha direito à disponibilidade remunerada, por força do art. 100, parágrafo único, da Constituição Federal. — A decisão de primeiro grau declarou a nulidade do ato de aposentadoria e determinou o aproveitamento ou a colocação do autor em disponibilidade remunerada. O Eg. Tribunal de Justiça do Estado, porém, concluiu pela validade da aposentadoria voluntária, além de que o servidor não sendo titular do cargo extinto, não fazia jus à disponibilidade. — Funda-se o recurso extraordinário na letra a do permissivo constitucional, por ofensa aos artigos 100, parágrafo único, .e 153, 1?, da Carta Magna. Sustenta o recorrente que era funcionário estável nomeado em caráter efetivd desde 1940, razão por que, em face do que dispõe o art. 46 da Lei estadual n? 489, de 1964, tem direito de obter cargo equivalente em outra serventia ou ser posto em disponibilidade, tanto mais quando outros servidores, em idêntica situação, foram aproveitados. — Não merece prosperar o apelo. De inicio, como bem observa a Procuradoria-Geral do Estado, invocando lição de José Carlos Barbosa Moreira (O Novo..., 2! ed., v. 1, p. 26), trata-se de cumulação sucessiva de pedidos, em que o acolhimento da pretensão final — aproveitamento ou disponibilidade remunerada — depende da decretação de nulidade da aposentadoria. Ora, havendo o acórdão recorrido concluído pela validade do ato de inativação e dirigindo-se o recurso apenas contra a parte da decisão que indeferiu o pedido de aproveitamento ou disponibilidade, a questão da legitimidade da aposentadoria passou pelo crivo da coisa julgada, prejudicando a análise da questão jurídica suscitada no recurso. 6. — Ademais, inadmissível a alegação de vício no ato de aposentadoria. A extinção do Cartório se deu em 2 de junho e já em 9 de julho o recorrente requeria sua aposentadoria. Se seu direito ao aproveitamento decorria do art. 46 da Lei est. n? 489, de 1964, por que não pediu a disponibilidade remunera- R.T.J. — 100 da, em lugar da aposentadoria, em face do indeferimento por inexistência de vaga? — Acresce que o direito à disponibilidade só existe para o extitular do cargo extinto, não para aquele que o exerce em caráter interino. O recorrente tinha efetividade no cargo de Escrevente Juramentado e apenas exercia, em substituição, o cargo de Oficial do Registro de Distribuição. — Inadmissível a invocação do princípio da isonomia, que pressupõe a existência de direitos em face da lel. No caso, a nomeação de outros serventuários, como concluiu o acórdão, se fez ao arrepio da Lei n? 489, de 1964. — Por fim, abstraída a questão da validade da aposentadoria do recorrente, toda a matéria residual prende-se à interpretação do artigo 48 da Lei estadual n? 489, de 1964, que não autoriza a abertura da instância extraordinária (Súmula 280). — Pelo não conhecimento. Brasília, 20 de novembro de 1979. — Moacir Antonio Machado da Silva, Procurador da República Aprovo: Mauro Leite Soares, Subprocurador-Geral da República» (fls. 216 a 218) VOTO O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator): A decisão atacada pelo recorrente tem o seguinte teor: «Relatório Adio Ordinária intentada pelo primeiro apelante com duplo objetivo — anular o ato de sua aposentadoria voluntária e obter investidura em outro cargo equivalente e correspondente ao que ocupava, ou seja, uma serventia não oficializada, em caráter efetivo. 239 Exercia ele, interinamente, em substituição ao respectivo titular, o cargo de Oficial do 9? Ofício de Registro de Distribuição, para o qual foi nomeado a 15.6;1951, quando sobreveio a Lei n? 5.010, de 30.5.1966 (que organizou a Justiça Federal de I? instância), cujo art. 86 determinou a extinção dos cargos de distribuidores das extintas Varas da Fazenda Pública Federal no antigo Estado da Guanabara, à medida que se vagassem. Com a aposentadoria compulsória do seu titular, ocorrida em 2-6-1973, ficou extinto o cargo interinamente ocupado pelo autor. Antevendo essa extinção, requereu o autor seu aproveitamento ao Sr. Desembargador Corregedor da Justiça, com base no art. 46 da Lei n? 489/64, por contar mais de 25 anos de exercido como Oficial Interino do 9? Ofício de Registro de Distribuição, pretensão indeferida por despacho de 23.1.1973, ante a inexistência de vaga. Inconformado, renovou mais duas vezes sua pretensão a ser aproveitado em cargo equivalente ao que fora extinto, uma vez que, funcionário estadual a serviço das Varas da Fazenda Federal, nada recebia dos cofres estaduais. Aduz que em 4-71973, foi surpreendido com o indeferimento definitivo de seu requerimento, sob fundamento de que não fora atendido um dos requisitos legais e de ser transitória a aplicação do art. 46, da citada Lel n? 489/64. Ao desamparo ilegal e inconstitucional a que foi lançado, viu acrescer a pressão econômica, Pois deixou de receber qualquer remuneração desde 2-6-1973, pressão que se tornou psicologicamente avassaladora por estar ciente do propósito negativista da administração em relação à sua situação singular. 240 — 100 Premido por essas circunstâncias tão desfavoráveis foi obrigado a requerer a sua aposentadoria em 9-7-1073, concedida em 1974. Esse o resumo dos fatos referidos na inicial. A 1? postulação relativa á anulação da aposentadoria tem duplo fundamento — a coação moral e a ilegalidade ou inconstitucionalidade, que viciam o ato. A coação moral teria consistido, principalmente, na privação de qualquer remuneração durante seis meses, para o sustento próprio o da família, privação que teria se prolongado por mais tempo se tivesse demorado mais a requerer a sua aposentadoria. A ilegalidade e inconstitucionalidade resultariam da violação do art. 100, único, da Constituição Federal de 1969, segundo o qual, extinto o cargo, o funcionário estável ficará em disponibilidade remunerada, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço, preceito não observado pela administração pública, que se omitiu, não colocando o autor em disponibilidade; bem como do art. 76, letra j, da Constituição Estadual de 1970, do então Estado da Guanabara, e do art. 100, § 1?, do DL n? 100, de 8-8-1969 (Estatuto dos Funcionários da Guanabara) vigente á época do fato. A 2! pretensão, relativa à investidura em outro cargo equivalente correspondente ao que ocupava, ou seja, serventia não oficializada, vem fundada no art. 46, da citada Lei 489/64, segundo a qual, os serventuários com mais de 25 anos de serviço serão efetivados nos cargos, que estejam ocupando em substituição. Sustenta o autor que esse dispositivo não é de caráter transitório e sua exegese autoriza seu aproveitamento em outra serventia, como ocorreu com nove colegas seus em condições idênticas às suas, justificando-se, assim, a aplicação do principio da isonomia. A sentença de fls. 106/112 julgou procedente, em parte, a ação, para anular a aposentadoria do autor e determinar ao réu que, no caso de não o aproveitar em caráter interino, em cargo equivalente ao que ocupava, cartório desoficializado, a pó-lo em disponibilidade, com vencimentos proporcionais ao tempo de serviço e equivalentes ao aludido cargo, cuja base dos proventos não será inferior ao valor atual percebido como inativo. Apelou primeiro o autor com as razões de fls. 115/119, pretendendo a reforma parcial da sentença a fim de ser efetivado em outra serventia equivalente, invocando o citado art. 46, da Lei 489/64 e o princípio da isonomia. Apelou, também, o Estado do Rio de Janeiro com as razões de fls. 126/130, pleiteando a reforma da sentença na parte em que anulou a aposentadoria do autor. Aduz o Estado que a sentença para anular a aposentadoria do autor, considerou inconstitucional o § I?, do art. 86, da Lei Federal n? 5010/966, por entendê-lo conflitante com o único do art. 100, da Constituição Federal, donde surgir o problema de que o órgão julgador da apelação, a seguir a decisão recorrida, terá de sustar o julgamento e enviar o processo ao Tribunal Pleno, único órgão competente, no 2? grau de jurisdição, para declarar a inconstitucionalidade da lel. No mais, sustenta o caráter especial do regime de aposentadoria dos serventuários não oficializados, e a não caracterização da alegada coação. R.T.J. — 100 O Dr. Curador da Fazenda Pública, a fls. 145/146, a e Ilustre Dr. Procurador da Justiça, em seu parecer de fls. 149/152, manifestaram-se pelo desprovimento de ambos os recursos. Ao Exmo. Sr. Desembargador Revisor. Rio de Janeiro, 22 de julho de 1977. — Rubens Rodrigues Silva, (fls. 155 a 157). «Ementa: Escrevente juramentado que exercia interinamente, em substituição ao respectivo titular, o cargo de Oficial do Registro de Distribuição, extinto pela Lei n? 5.010/966, que organizou a Justiça Federal de 1! instância. Não faz jus à disponibilidade, nem ao aproveitamento em serventia equivalente não oficializada. Validade da sua aposentadoria voluntária estreme do alegado vício de coação. Inaplicabilidade do princípio da isonomia. Vistos, relatados e discutidos estes autos de apelação cível n? 4.419, sendo primeiro apelante Horácio Moreira Rega segundo, o Estado do Rio de Janeiro, e apelados, os mesmos: Acordam os Juizes da Quinta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, integrado neste o relatório de fls. 155/157, em indeferir o pedido do 1? apelante de conversão do julgamento em diligência e, rejeitada a alegação de inconstitucionalldade, em negar provimento à primeira apelação e dar provimento à segunda apelação, condenado o autor nas custas e honorários advocaticlos de 2% (dois por cento) sobre o valor dado à causa. 241 Indeferiu-se o pedido do 1? apelante no sentido de ser ouvida a parte contrária sobre os documentos juntos por linha, o que Importava na conversão do julgamento em diligência, porque os aludidos documentos têm o mesmo conteúdo e o mesmo sentido de outros já existentes nos autos, com os quais objetiva o primeiro apelante provar o aproveitamento de diversos serventuários em situação semelhante A sua. Quanto à questão suscitada pelo Estado, de se levar ao Tribunal Pleno a apreciação da inconstitucionalidade do art. 86 e seus parágrafos da Lei 5.010/966, entendeu a Câmara ser desnecessária tal medida para o julgamento do caso vertepte, tanto mais que a sentença recorrida não considerou, explicitamente, ser O citado dispositivo inconstitucional. No mérito, a sentença, como já ficou assinalado, anulou o ato de aposentadoria do autor, e determinou que o réu, caso não o aproveite, em caráter interino, num cartório desoficializado, ponha-o em disponibilidade remunerada. São três disposições distintas: uma, anulatória da aposentadoria, outra, relativa ao aproveitamento do autor em uma serventia de justiça, em caràter interino; e a Última, concessiva da disponibilidade remunerada, caso ocorra o aproveitamento em caráter interino. Entendeu a respeitável sentença, In verbis: sendo o autor funcionário estável, extinto o cargo que ocupava, embora Interinamente e não tendo sido aproveitado em outra da mesma natureza, teria que ser poste em disponibilidade remunerada, conforme o preceito do if único, do art. 100, da Constituição Federal. 242 R.T.J. — 100 Esse fundamento, data venta, não prima por sua correção jurídica. O ocupante de cargo extinto, para fazer jus à disponibilidade remunerada, tem que ser seu titular, e não substituto interino, embora essa interinidade possa ser exercida por um funcionário estável. Como esclarece Hely Lopes Meirefles, in verbis: A disponibilidade importa no afastamento temporário e compulsório do titular do cargo, e, por isso mesmo, não o pode prejudicar em qualquer direito decorrente da função' (Dir. Ad. Bras. — pg. 383 — 2! edição — 1966). No caso, o autor não era o titular do 9? Oficio de Reg. de Distribuição, mas substituto interino do respectivo titular. Assim, extinto o cargo com a aposentadoria compulsória do título, o substituto interino não tinha direito à disponibilidade, embora fosse escrevente juramentado estável. E certo que a estabilidade, como atributo pessoal do servidor público, acompanha-o em todas as suas nomeações de caráter efetivo; mas, naqueles de caráter interino ou em comissão, ela não influi para a permanência do servidor no cargo ou função, nem lhe confere a vantagem da disponibilidade no cargo extinto. Eis, no particular, o conceito do autorizado Hely Lopes Meirelles, in verbis: A estabilidade, sendo um atributo pessoal do servidor público, acompanho-o em todas as suas nomeações efetivas, para o serviço público» (ob. cit. pg. 374). Assim é porque a vinculação do funcionário interino ou comissionado ao cargo é transitória, instável, podendo ser rompido a qualquer tempo, a juizo exclusivo e discricionário da administração. A Súmula n? 24 encerra esse sentido ao dispor que o funcionário interino substituto é demissivel, mesmo antes de cessar a causa da substituição. Se podia o autor ser demitido antes mesmo da extinção do cargo, que vinha ocupando como substituto interino, não há como estenderlhe o benefício da disponibilidade, conferida exclusivamente ao titular efetivo do cargo. Professa o mesmo Hely Lopes Meirelles: Pela própria natureza de sua nomeação se vê que a investidura interina não confere ao nomeado qualquer direito á permanência no cargo ou função (ob. cit. pg. 376). desvalioso o argumento, a que se apega o autor, de que, a disposição do art. 86, da Lei 5.010 atinge apenas aos funcionários federais então lotados no 9? Ofício -do Cartório de Distribuição e não a ele, por não poder a legislação federal regular a situação dos funcionários estaduais. A Resolução n? 1, de 212-1970, do Tribunal de Justiça do antigo Estado da Guanabara, que aprovou o Código de Org. e Div. Judiciárias do Estado, Já dispunha, em seu art. 358, que a situação dos titulares dos 9? e 11? ofícios do Registro de Distribuição era regulada pelo art. 86 e seus parágrafos, da Lei 5.010, disposição reproduzida no art. 91, da Lei Estadual n? 2.085-A, de 5.9.72, que estabeleceu o regime jurídico dos serviços da Justiça. Assim, o regime dos servidores lotados naquelas serventias de distribuição foi adotado integralmente pela legislação estadual, antes de ocorrer a extinção de qualquer delas. Não se vislumbra, pois, nenhuma inconstitucionalidade ou ilegalidade no ato de aposentadoria do autor. R.T.J. — 100 Essa manifesta legalidade, de que se reveste o ato administrativo, torna-o senão imune, pelo menos de difícil contaminação pelos vícios da vontade, tanto mais que foi a pedido a aposentadoria. Queixa-se o autor de «um desamparo ilegal e inconstitucional», por parte da administração pública, quanto à sua situação funcional, agravado pela circunstância de ter ficado sem receber qualquer remuneração cerca de seis meses, circunstâncias que o coagiram a pedir a aposentadoria. Não se nega que a situação do autor devia ser das mais aflitivas vendo-se privado do cargo que ocupava interinamente, em conseqüência de sua extinção, para a qual, diga-se de passagem, não concorrera a administração estadual. Mas, do estado aflitivo, em que se encontrou o autor, ao reconhecimento da coação, que o teria levado a pedir aposentadoria, vai uma distância multo grande. De certo modo, se é que houve omissão da autoridade no solucionar a situação funcional do autor, adveio ela da impossibilidade jtuidica de atender a sua pretensão de ser aproveitado no cargo em vias de ser extinto, como velo de reconhecer a própria sentença recorrida, que lhe foi parcialmente favorável. Quanto ao período em que ficou sem remuneração, resultou da contingência, a que estão sujeitos os funcionários que, na atividade não recebem diretamente dos cofres estaduais, como ocorre com os servidores dos cartórios não oficializados. Essa situação se prolongou, não por culpa da administração pübli- 243 ca, mas porque o autor buscava uma vantagem juridicamente Inviável — o seu aproveitamento como titular de outra serventia. Ao denegar o segundo pedido do autor, o do aproveitamento em serventia não oficializada em caráter efetivo, por entender inaplicável à hipótese dos autos o art. 46, da Lei 489/64, a sentença decidiu de acordo com o entendimento manifestado pelo Tribunal de Justiça do antigo Estado da Guanabara, em dois casos semelhantes (Acórdão na Revista de Jurisprudência n? 23 — pág. 118). Não havia como aproveitar o autor em cargo que foi extinto, e não podia ele ser efetivado em outro equivalente, como decidiu acertadamente a sentença recorrida. Houve, é certo, nomeações de serventuários ao arrepio desse entendimento jurídico, ao que se apega o autor para invocar o princípio da isonomla; mas, como bem assinalou o saudoso relator do acórdão acima aludido, non exemplls sed legibus judicandum. Não cabe ao judiciário, abusando do princípio da bonomia, de aplicação muito restrita, estender a outros os favores concedidos pela administração pública e alguns privilegiados. Rio de Janeiro, 27 de outubro de 1977. Des. Ebert Chamotm, Presidente s/voto — Des. Rubem Rodrigues Silva, Relator.» (fls. 161 a 165). Tratando-se, como se trata de cumulação sucessiva de pedidos, o acolhimento de um depende sem dúvida, do acolhimento do outro, de conteúdo básico. No caso, o acórdão recorrido repeliu a existência de nulidade do ato de aposentadoria voluntária do ora recorrente. Acontece que o recurso ex- 244 R.T.J. — 100 traordinário não traz qualquer fundamento contrário à decisão, neste particular. Dirige-se, sim, contra a parte que indeferiu o pedido de aproveitamento ou disponibilidade do serventuário. Dessarte, transitou em julgado a decisão que declarou a validade da aposentadoria do recorrente. Ora, o segundo pedido depende necessariamente do primeiro, eis que não se pode falar em obrigatória disponibilidade ou aproveitamento de servidor que se encontra voluntária e regularmente aposentado. Descabe discutir eventual direito que somente seria viável se o recorrente fosse um servidor em atividade. A rigor, essa é a situação do presente recurso. Ainda que se pudesse transpor o óbice acima, inadmissível seria o recurso, pois, como resulta claro, jamais houve ofensa aos princípios do direito adquirido ou da isonomia. O recorrente era titular efetivo e estável do cargo de Escrevente Juramentado, e apenas exercia, em substituição, o cargo de Oficial de Registro de Distribuição. Em conseqüência, como bem decidiu o acórdão recorrido, não tinha direito à disponibilidade neste último cargo, extinto por força de lei, por não ser o seu titular, mas, tão-somente, substituto Interino. Dada essa situação funcional podia ser exonerado mesmo antes da extinção da aludida serventia. Se a administração aquinhoou outros serventuários, em situação semelhante, mas de modo ilegal, como sói acontecer neste «Brasil grande...», isso não justifica a invocação do elevado principio da isonomia (art. 153, 1?, da Constituição Federal). Ante o exposto e de acordo com o parecer da douta Procuradoria-Geral da República, não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA FtE 89.700 — RJ — Rei.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Horácio Moreira Rega (Adv.: José de Aguiar Dias). Recdo.: Estado do Rio de Janeiro (Adv.: Antonio Carlos Cavalcanti Mala). Decisão: Não conhecido. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Dedo Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 30 de setembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 90.913 — (EDc1) — MG (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Dedo Miranda. Embargante: Fausto Salomão Trezzi — Espólio de, Representado por sua inventariante Anna Elmira Scagliarini Salomão. — Embargado: CIPO — Comércio e Indústria Pedro Salomão Ltda. Processual Civil. Apuração de haveres. Embargos de declaração. Correção de valores. 1) Se a sentença deixou de conceder certa verba na apuração de haveres, e dela somente apelou a parte a quem essa disposição beneficiava, ao acórdão na apelação não era dado volver ao tema. 2) A correção monetária da Lei n? 6.899, de 8.4.81, se não cogitada na instância ordinária, é de consideração Inviável no superveniente recurso extraordinário. R.T.J. — 100 ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Segunda Turma, na conformidade da ata de julgamentos e das notas taqulgráficas, à unanimidade de votos, rejeitar os Embargos de Declaração. Brasília, 27 de outubro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Dedo Miranda, Relator. FtELATORIO O Sr. Ministro Dedo Miranda: Trata-se de embargos de declaração opostos pelo segundo recorrente, Espólio de Fausto Salomão Trezzi, ao acórdão desta Turma, de que foi rer lator o eminente Ministro Leitão de Abreu, na parte que a ementa assim compedia: «Apuração de haveres. (...) 3 — Correção de valores. Determinação, pelo acórdão, em embargos de declaração. Caso, entretanto, em que não houve, da parte interessada, recurso de apelação da sentença, que negara a correção. Impossibiliade da concessão em segundo grau.» (fils. 626). Expõe o ora embargante que o acórdão recorrido, do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, quisera dizer é que a apuração de haveres deveria ser feita pelo real valor; que o acórdão ora embargado, embora considerando justa essa solução, não a admitiu por não ter havido apelação do ora embargante, que ensejasse aquela determinação. Pondera, a seguir, que o Tribunal de Minas concedera a atualização de valores, não como penalidades, mas como decorrência inafastável da de- 245 preciação da moeda e da valorização dos bens imóveis constantes do acervo, os quais, se balanceados agora na base dos preços vigentes ao tempo do óbito do ez-sócio (junho de 1973), viriam a figurar por valores irrisórios, com grave prejuízo dos herdeiros e enriquecimento ilícito da firma: que, de qualquer sorte, concedendo avaliação atual, e não correção monetária, o acórdão na apelação não terá alterado o dispositivo da sentença que negou a incidência desta última, mas, ainda que o tivesse alterado, isso se justificava, porque o então embargante infringente ora embargante de declaração houvera apelado da sentença, por meio de recurso adesivo, este, porém, sonegado ao conhecimento do Tribunal de segunda instancia por um descuido do cartório da Comarca, que indevidamente o entranhou no bojo dos autos suplementares, e não nos autos principais, quando naqueles deveria ter juntado apenas a respectiva cópia. Acrescenta o embargante que, de qualquer forma, a atualização hoje se impõe, por uma circunstância capital: quando proferida a decisão ora embargada de declaração, já se achava em vigor a 'Lei n? 6.899, de 8.4.1981, que determina a aplicação de correção monetária sobre qualquer débito resultante de decisão judicial. (fls. 637 princ). Por fim, sustenta o embargante explicitaçâo do julgado na apelação feita pelo acórdão em embargos infringentes, era perfeitamente admissivel, e, mesmo que se tratasse de parcial alteração do julgado, não seria de censurar-se, ante a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal sobre o tema (FtREE 85.039. 73.192, 87.092, 75.170), entendimento hoje consagrado no art. 338 do Regimento Interno desta Corte. que a R.T.J. — 100 246 Conclui o embargante requerendo terem seu recurso adesivo, é provise requisitem os autores de apura- dência obviamente irrealizável, e até ção de haveres, existentes no Cartó- inócua, na instância extraordinária. rio da Primeira Vara da Comarca de Uberaba, para verificar-se que lá último, também não cabe, em se encontra a petição do recurso talPor instância, consideração do efeiadesivo, e, se considerada desneces- to que possa ater, na presente lide, a sária a diligência, sejam desde logo Lei n? 6.899, de 8.4.1981, que determirecebidos os presentes embargos de na a aplicação da correção declaração, nos termos do art. 338, ria nos débitos oriundos demonetádecisão tine, do Regimento Interno. (fls. 628- judicial, lei essa não cogitada no 639). acórdão local recorrido, a cujos termos unicamente se dirige o recurso extraordinário. o relatório. VOTO O Sr. Ministro Decio Miranda (Relator): Os embargados de declaração, como se viu do relatório que acabo de fazer, visam a afastar irresistivel raciocínio estampado no acórdão embargado: se a sentença de primeiro grau deixara de conceder a correção monetária, e dela somente apelou, por outros temas, a parte a quem a referida correção prejudicaria, não era dado à instância de apelação conceder atualização de valores, providência de efeito idêntico à da negada correção monetária. Não se negou a possibilidade da correção monetária, em caso que a poderia comportar, nem a atualização de valores dos imóveis componentes do acervo, o que, segundo o acórdão ora embargado, «seria Justo que (...) ocorresse», sendo todavia necessário, «para adotar-se essa solução, que a tivesse solicitado, mediante recurso ( ...) a parte a quem aproveitaria». ( fls. 623 medio). Isto posto, rejeito os embargos de declaração. E o meu voto. EXTRATO DA ATA RE 90.913 — (EDc1) — MG — Rel.: Min. Decio Miranda. Embtes.: Fausto Salomão Trezzi — Espólio de, representado por sua inventariante Anna Elmira Scagliarini Salomão (Advs.: Sebastião Oscar de Castro e outros). Embdo.: Cipo — Comércio e Indústria Pedro Salomão Ltda. (Advs.: Aristoteles Atheniense e outros). Decisão: Rejeitaram os Embargos de Declaração. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes á Sessão os Senhores Ministros Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Ausente, justificadamente, o Ministro Cordeiro Guerra. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 27 de outubro de 1981 — A requisição dos autos suplemen- Hélio Francisco Marques, Secretátares, que a ora embargante diz con- rio. R.T.J. — 100 247 RECURSO EXTRAORDINARIO N? 90.928 — (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Cunha Peixoto. Recorrentes: Luiz Severiano Ribeiro S.A. e outros — Recorrido: Instituto Nacional do Cinema. Instituto Nacional do Cinema — Venda de bobinas de ingressos. Não foram objeto de exame na decisão recorrida os arts. 19, I e 153, § 29 da Constituição Federal, não havendo, assim, o devido prequestionamento necessário ao conhecimento do apelo extremo. O acórdão trazido à colação como paradigma é do próprio Tribunal recorrido, o que o torna imprestável à comprovação do dissídio. Recurso extraordinário não conhecido. ACORDA° Vistos, relatados e discutidos estes autos acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, em não conhecer do recurso. Brasília, 09 de outubro de 1979 — Thompson Flores, Presidente — Cunha Peixoto, Relator. RELATOR 10 O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Luiz Severiano Ribeiro SÃ. e outros linpetram mandado de segurança contra o Conselho Deliberativo e o Secretário de Planejamento, ambos do Instituto Nacional do Cinema, para se absterem de exigir a aquisição de máquinas registradoras, venda compulsória de ingressos padronizados e de Impor sanções pela inobservância das referidas determinações. Alegam haver o primeiro coator baixado a Resolução INC ri? 94/74, tornando obrigatório o uso de máquinas registradoras, controladoras e de roletas para a venda de ingressos padronizados, a partir de 24 de junho do mesmo ano, estabelecida a obrigatoriedade de aquisição, por preço previamente estipulado, dos borderõs e bobinas desses ingressos; e ter o segundo baixado instruções reguladoras de responsabilidade dos exibiddres, no sistema mecanizado de venda de ingressos padronizados, através do Ofício Circular Sec. Planei. 001/74. Esses atos — acrescentam — extravasam da competência das autoridades apontadas como coatoras, em face do art. 35 do Dec.-lei n? 43/66, porque pretende o INC, além da utilização obrigatória das máquinas e do igual uso dos borderôs e ingressos, que as primeiras sejam fornecidas por firma da sua escolha e preço previamente fixado, e os segundos para pagamento á vista. Nas informações prestadas, o INC sustenta poder estabelecer a obrigatoriedade do borderb-padrão, emitir e vender, para aplicação compulsória pelas salas exibidoras nacionais, ingressos padronizados, ou obrigar o uso de máquinas registradoras, na conformidade do art. 35 do Dec.-lei n? 43/66 e de sua Regulamentação, baixada com o Decreto n? 62.005, de 29-12-1967. A segurança foi denegada em primeira e segunda instâncias, portando o acórdão recorrido a ementa seguinte: 248 R.T.J. — 100 «Ao baixar a Resolução n? 94, de 20 de março de 1974, tornando obrigatório o uso de «máquinas registradoras controladoras e de roletas» nos cinemas do Pais, o INC não desbordou de suas atribuições, nem ofendeu a qualquer principio legal ou a direito das empresas interessadas. De fato, a Resolução n? 94 nada tem a ver com Resolução n? 23, já examinada judicialmente, e, no seu próprio texto, não impõe privilégio de compra das máquinas adotadas a um só fornecedor, nem regula a remuneração pelo seu uso. Aliás, tais aparelhos são comprados pelo INC e cedidos gratuitamente às empresas. Quanto ao art. 12, há apenas disposição sobre o acréscimo de direitos autorais aos custos dos borderós e bobinas de ingressos padronizados. As bases de cálculo adotadas servem, é certo, ao estabelecimento do preço definitivo, mas não ofendem a direito dos distribuidores ou exibidores. Refletem-se afinal no público, podendo a escala admitida até constituir um estimulo à maior divulgação. Além disso, sob tal aspecto, a impet ração não disfarça o propósito de reexaminar, embora inadequadamente, matéria vencida. Merece, pois, confirmação a sentença denegatória do writ, cujos fundamentos desnudam a improcedência do pedido.» (fl. 133). Irresignadas, as vencidas interpuseram recurso extraordinário com fundamento nas letras a e d do permissivo constitucional, alegando haver a decisão recorrida violado os arts. 19, I e 153, 29 da Constituição, bem como dissídio jurisprudencial. A Procuradoria-Geral da República manifesta-se pelo não conhecimento do recurso. E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): 1 — Cuida-se na controvérsia sobre a legitimidade dos valores estabelecidos pela Recorrida na cobrança das bobinas de ingressos que fornece aos cinemas, para máquinas registradoras de utilização obrigatória. Sustentam os recorrentes que a exigência de preço supetior ao custo configuraria instituição de tributo sem que a lei o estabeleça, ofendendo-se, assim, os arts. 19, I e 29 da Constituição Federal, 153, bem como dissídio jurisprudencial. 2 — Como se verifica pela ementa do acórdão, transcrita no relatório e que espelha com fidelidade o decidido, a matéria compendiado no recurso extraordinário não foi objeto de decisão, razão por que inviável, nesta parte, o recurso extraordinário. 3 — Improcede, também, o apelo com fundamento na letra d, visto co-mo o acórdão apontado como paradigma é do próprio Tribunal Federal de Recursos 4 — Desta maneira, não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA RE 90.928 — RJ — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Rectes.: Luiz Severiano Ribeiro S.A. e outros (Advs.: Paulo César Gontijo e outros) Recdo.: Instituto Nacional do Cinema. Decisão: Não conhecido, decisão unánime. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Cunha Peixoto, Soares Mufloz e Rafael Mayer. Ausente justificadamente o Sr. Min. Xavier de Albuquerque. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 09 de outubro de 1979 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. R.T.J. — 100 249 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91.259 — SP (Tribunal Pleno) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Recorrente: Companhia Municipal de Transportes Coletivos — Recorrido: Luerezia Carrier! Colaciocco. Trabalhista, competência. — Complemento da pensão previdenetária da viúva de empregado, devido pelo empregador que o institua. — Competência da Justiça do Trabalho para as questões pertinentes. O ato unilateral do Empregador de instituir, como norma interna da empresa, um suplemento financeiro aos proventos da aposentadoria previdenciária aos seus empregados, exigível quando se aposentarem, e também à pensão previdenciária da viúva de empregado que venha a falecer, tem natureza de Regulamento de Empresa e com eficácia de norma estatutária, sendo exigível pelo sujeito ativo da obrigação patronal, — aposentado ou viúva, — quando presentes suas condições, e competente a Justiça do Trabalho para a causa. Compete às Juntas de Conciliação e Julgamento processar e decidir as controvérsias sobre o suplemento financeiro instituído pelo Empregador, ao provento de aposentado ou à pensão de viuvez, não obstante extinta a relação de emprego originária, pela aposentadoria ou pela morte. A Constituição da República, é certo que estabelece a competência da Justiça do Trabalho para dissidlos entre Empregado e Empregador; mas estende-a também a outras controvérsias oriundas da relação de emprego, desde que a lei disponha sobre essa competência extraordinária; e esta norma de lei, exigida para o caso de coMplemento a aposentados e viúvas, encontra-se na regra de competência das JCJ no art. 852, a, a? IV, que a estabelece para os «demais disaldlos» concernentes ao Contrato Individual de Trabalho, como é o caso destes suprimentos financeiros pelo Empregador, oriundos de norma estatutária da Empresa, com eficácia residual após extinta a relação de emprego. — Recurso não conhecido. ACÓRDÃO RELATÓRIO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, na conformidade da ata do Julgamento e das notas taquigráficas, por maioria de votos, não conhecer do recurso. O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O despacho que admitiu o apelo extremo está assim redigido: «Discute-se, neste processo, a competência da justiça do Trabalho para decidir litígio decorrente de norma regulamentar da recorrente e versante sobre complementacão de pensão. O recurso extraordinário é interposto com a afirmação de atentado Brasília, 10 de setembro de 1981 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Clovis Ramainete, Relator para o Acórdão. 250 R.T.J. — 100 A douta Procuradoria-Geral da ao artigo 142 da Constituição FedeRepública assim opina: ral. Tratatsé flagrantemente, de lide «Lucrezia Carrieri Colacicco, itasurgida de interpretação de cláusuliana, do lar, viúva de empregado la residual do contrato de trabalho. aposentado da Cia. Municipal de Decorre, dal, a competência desta Transportes Coletivos (CMTC), Justiça Especializada. moveu contra esta reclamação traO Supremo Tribunal Federal tem balhista em que postulou a compleresolvido, reiteradamente, caber à mentação de sua pensão com funJustiça do Trabalho a decisão dos damento em cláusula do contrato litígios sobre complementação de de trabalho que assegurava aos beaposentadoria, quando conseqüenneficiários do empregado falecido tes de cláusulas residuais do conperceber da empresa 80% do salátrato laborai. rio a que aquele fazia jus à data de seu falecimento, com os reajustaNão posso deixar de reconhecer, mentos posteriores por ocasião do todavia, que a Suprema Corte tem aumento geral dos salários. Requeordenado a subida dos apelos exreu ainda a complementação dos tremos, para melhor exame, quanproventos de seu falecido marido, do o debate sobre competência se referentemente aos últimos meses trava em pleitos pertinentes a penque precederam a sua morte, tudo sões, nos casos em que não existiu com base no contrato de trabalho vinculo de trabalho direto entre os já extinto. litigantes, ou seja, entre dependentes de antigos empregados e a ReFoi a ação julgada procedente de. em todos os graus da jurisdição Em vista disso, inócuo seria trabalhista que, por sua vez, repeliu trancar-se o apelo extremo por a argüição de sua incompetência simples convencimento pessoal, que, desde os albores da lide, vem sabendo-se que os autos acabarão sendo sustentada pela reclamada, subindo à apreciação do Pretório como agora o faz em grau de reExcelso. curso extraordinário (f. 291). Sendo assim, atento ao princípio Sustenta-se, em síntese, não hada economia processual, mas resver no caso litígio entre empregasalvando meu ponto de vista, addo e empregador, e mais: ainda mito o recurso. que oriunda da relação de trabaPublique-se e prossiga-se. lho, a controvérsia só poderia ser dirimida pela Justiça EspecializaBrasília, 02 de março de 1979 — da se existente lei ordinária lhe deMinistro Raymundo de Souza ferindo competência para tanto, o Moura, Vice-Presidente no que inocorre na hipótese em coexercício da Presidência». ( fls. mento. 296-297). Sustenta a recorrente, por seu ilusNão pode, contudo, prosperar a tre patrono, a competência da Justiirresignação derradeira, pois o te ça Comum, na consideração de que ma já foi enfrentado pelo Supremo foi violado o art. 142 da Constituição Tribunal, em sua composição pieFederal, porque nenhuma lei defere nária, tendo-se fixado, depois de à Justiça Especializada competência acesos debates, a orientação de ser para julgar o pedido de reajustapara o caso competente a Justiça mento de pensão à viúva dos empredo Trabalho, em acórdão de que gados da empresa. saiu vencedor o voto do eminente 251 R.T.J. - 100 Ministro Dedo Miranda no RE 89.546, cuja ementa ficou por S. Exa. assim redigida: «Trabalho. Pensão. Complementação. Atribuída pela autora à empresa a responsabilidade pela complementação, em virtude de cláusula do contrato de trabalho. Nesse caso, competente é a Justiça do Trabalho para a ação da beneficiária da pensão.» (RTJ 89-646). No julgamento deste precedente, o eminente Ministro Cunha Peixoto, depois de refutar a adequação dos mesmos julgados então lembrados e agora arrolados pela recorrente em suas razões (RR EE 89.201, 89.154, 89.199, 89.200 e 89.203), teve ocasião de afirmar, com propriedade, que a pensão agora postulada pela reclamante «não passa de um reflexo jurídico do contrato de trabalho, efeito residual da claúsula que deu embasamento à pretensão» (RTJ 89-648). Acrescentando ao aludido precedente o RE 90.120, in DJ de 14-1279, relator o Exmo. Sr. Ministro Decio Miranda, opina-se, em face da Jurisprudência assente, pelo não conhecimento do recurso extraordinário. Brasília, 23 de fevereiro de 1981 — Walter José de Medeiros, Procurador da República:» (fls. 304-305). E o relatório. ANTECIPAÇÃO AO VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: (Relator): Sr. Presidente, as brilhantes exposições feitas pelos eminentes Advogados, da tribuna, creio que me justificam de ter trazido este caso a julgamento, na forma regimental, pelo Plenário. Há acórdãos referentes à Companhia Municipal de Transportes Coletivos divergentes, e o último, de que fui Relator, o RE 91.759, dá razão à recorrente. Mas, no momento, peço a benevolência e a atenção do Egrégio Tribunal para ler o voto que trouxe escrito: (Lê). VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: (Relator): O v. acórdão recorrido afirmou a competência da Justiça do Trabalho para conhecer da reclamação de viúva de empregado visando à complementação de pensão e, ainda, complementação dos proventos de seu falecido marido referentes aos últimos meses que precederam a sua morte, tudo com base no contrato de trabalho já extinto. Sustenta a recorrente que não há, no caso, litígio entre o empregado e o empregador e, mais ainda, que embora oriunda de relação de trabalho, a controvérsia só poderia ser dirimida pela Justiça Trabalhista se existisse lei ordinária deferindo-lhe tal competência, pois o artigo 142 da Constituição Federal é expresso em condicionar a extensão da competência da Justiça Trabalhista« a outras controvérsias oriundas de relação de trabalho», a existência de Lei, que inexiste na espécie. A questão é realmente controvertida. Em relação às viúvas de empregados da FEPASA, tem-se decidido pela competência da Justiça Comum, na consideração de que o pedido tem base estatutária e de natureza previdenciária do beneficio concedido pela Lel Estadual n? 4.819-58 (RE 89.203 — SP — RTJ 88-682) relator Sr. Ministro Soares Mufloz contra o meu voto, I. 684, RE n? 89.201, SP, rel. Sr. Ministro Djacl Falcão, que indica os seguintes precedentes: RE 89.154, 89.199, 89.200, além do RE 89.203, já mencionado — RTJ 91-285, assim ementado: 252 R.T.J. — 100 «Reclamação de viúvas, postulando complementação de pensões em decorrência de cláusula de contrato de trabalho de seus falecidos maridos. Incompetência da Justiça do Trabalho. Precedentes do Supremo Tribunal Federal (RE 89.154, 89.199, 89.200 e 89.203). RE provido». No mesmo sentido o RE 89.199, relatado pelo Sr. Ministro Cunha Peixoto, RTJ 94-1.211. Na espécie, porém, invoca o ilustre Procurador' Walter José de Medeiros, o julgado no RE 89.546, SP, de que foi relator o Sr. Ministro Decio Miranda, assim ementado: «Trabalho. Pensão. Complementaçâo. Atribuída pela autora à empresa a responsabilidade pela complementação, em virtude de cláusula do contrato de trabalho. Nesse caso, competente é a Justiça do Trabalho para a ação da beneficiária da pensão. » RTJ 89646. Nesse julgamento, como relator, fiquei vencido, pois aplicava à espécie a norma implícita nos julgados referentes às pensionistas da FEPASA. O Sr. Ministro Decio Miranda, relator designado, chegou a sua conclusão por entender «que a Companhia Municipal de Transportes Coletivos resolveu, voluntariamente — embora em coincidência com uma lei estadual que assim dispunha para outra empresa do Estado, inseriu no contrato de trabalho de seus empregados uma cláusula segundo a qual se obriga a empresa a pagar aos empregados aposentados uma complementaçâo de aposentadoria, e aos beneficiários familiares de seus empregados uma complementação da pensão previdenciária. Trata-se, portanto, como salientou o eminente Ministro Moreira Alves, de aditamento voluntário ao contrato de trabalho. Sendo assim, inclui-se na competência da Justiça do Trabalho a demanda pelo respectivo pagamento.» (RTJ 89-647). O Sr. Ministro Soares Mufloz concordou com o voto do Sr. Ministro Decio Miranda, bem como os Srs. Ministros Moreira Alves, Thompson Flores, expressamente vencidos os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Antonio Neder e Djaci Falcão, que me acompanhavam. Creio que prevaleceu o entendimento expresso na síntese final do Sr. Ministro Moreira Alves: «Não há quem sustente que existe dissídio de trabalho entre aposentado e ex-empregador, porque o aposentado deixa de ser empregado. Esta Corte é que interpretou extensivamente o texto constitucional, e entendeu que, nesses casos, por ultra-atividade, de contrato de trabalho, se admita a competência da Justiça Trabalhista. E daí, extraio, também, esta conseqüência: todas as vantagens que eram dadas pelo contrato de trabalho, ao empregado, ainda que para beneficiar terceiro, devem ser examinadas pela Justiça Trabalhista, com base no art. 142 da Constituição Federal.» Entretanto, creio que procede o presente recurso extraordinário, pois a Constituição Federal é expressa: «Art. 142 — Compete à Justiça do Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores, e, mediante lel outras controvérsias oriundas de relação de trabalho.» R.T.J. — 100 Não há dúvida que se trata de uma controvérsia oriunda de relação de trabalho, mas lei nenhuma defere competência à Justiça do Trabalho Para Julgar a reclamação de viúvas contra a recorrente, em matéria previdenciária, ainda que decorrente do contrato de trabalho de seu falecido marido empregado da empresa. 253 mediante lel outras controvérsias oriundas de relação de Trabalho (o que é o caso dos autos). Ora, inexistindo lel que defira a competência à Justiça Trabalhista, Para julgar reivindicações de pensionistas, quaisquer que sejam, parece-me competente a Justiça Comum.» Não creio possível, por interpretaconformidade, tendo em visção extensiva, dar-se competência à taNessa a relevância do tema, art. 22, paJustiça de Trabalho, quando tal só único, b, 1? parte, submeto à Pode ocorrer mediante lei, e esta rágrafo douta consideração do Plenário, o inexiste na espécie. meu voto no sentido de conhecer do e lhe dar provimento para Observou, com acuidade, o Sr. Mi- recurso deferir à Justiça comum competênnistro Xavier de Albuquerque: cia para julgar a presente reclama*0 litígio não se fere entre em- ção. pregado e empregador, a lei podeEXTRATO DA ATA rá atribui-lo à Justiça do Trabalho. E o que diz a Constituição. Essa lel RE. 91.259 — SP — Rel.: Min. Cornão existe. Então a Justiça do Trabalho não é competente.» RTJ 89- deiro Guerra. Recte.: Companhia Municipal de Transportes Coletivos 659. (Adv.: Célio Silva). Recdo.: Lucrezia De fato, como bem observa o ilus- Carrieri Colaciocco. (Adv.: Sid H. tre patrono da recorrente, a solução Riedel de Figueiredo e Sérgio Roberconsagrada no RE 89.546, de São to Alonso, Ulisses Riedel de Resende Paulo, acima exposta, estaria certa e outros). • na vigência da Constituição Federal Decisão: Pediu vista o Ministro de 1946, que dispunha: Clovis Ramalhete, após o voto do Ministro Relator que conheceu e deu «Art. 123 — Compete à Justiça provimento ao recurso. Falaram : do Trabalho conciliar e julgar os pela Recte.: o Dr. Célio Silva, e, pela dissídios individuais e coletivos en- Ftecda.: o Dr. Sid H. Riedel de Fitre empregados e empregadores, e gueiredo. as demais controvérsias oriundas de relações de trabalho regidas pePresidência do Senhor Ministro la legislação especial». Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Entretanto, a Constituição de 1967, Falcão, Antonio Neder, Leitão de tanto na redação original como na Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alque foi introduzida pela EC 01-69, ves, Cunha Peixoto, Soares Muiloz, não seguiu as Constituições anterio- Dedo Miranda, Rafael Mayer e Clores e estabeleceu regra nova: vis Ramalhete. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira «Art. 142 — Compete à Justiça Paz. do Trabalho conciliar e julgar os Brasília, 22 de abril de 1981 — dissídios individuais e coletivos entre empregados e empregadores (o Alberto VeroneSe de Aguiar, Secreque não é o caso dos autos) e, tário. R.T.J. — 100 254 VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: O Recurso Extraordinário versa a questão de se saber da competência para decidir litígio, entre a Recorrente Cia. Municipal de Transportes Coletivos e a viúva de um seu empregado. Esta viúva é a recorrida. Ela pleiteia condenação da Recorrente, empregadora do seu falecido marido, ao pagamento de complementação da aposentadoria do antigo empregado, como se trabalhando até o dia da morte estivesse estado, e, ainda, a condenação a complementar sua pensão, nos termos dos Avisos 64 e 85 que foram expedidos pela empresa Recorrente para estipular estas condições regulamentares nas relações de emprego com seu pessoal. 2 — Não há controvérsia, ao menos trazida em Recurso Extraordinário, sobre a existência do vinculo obrigacional do mérito, seja quanto ao complemento da aposentadoria ou seja quanto ao da pensão da viúva, como devidos pela Recorrente. Estes créditos surgiram de ato unilateral da empregadora. Ganharam natureza de norma regulamentar. Como tal, incorporaram-se às condições da relação de emprego na Recorrente. 3 — E certo que a regra do art. 444 assegura, nas relações contratuais de trabalho, a livre estipulação das partes, no que não contravenha disposições tutelares do empregado ou contratos coletivos. Tal norma vem invocada nas razões da Recorrida. Não provém dela, no entanto, a exigibilidade dessa obrigação da Recorrente. Antes estará na qualidade de norma de Regulamento de Empresa, que possuem os Avisos 64 e 85, contendo tais estipulações unila- terais da parte empregadora. Tais condições agregam-se à relação de emprego, em definitivo. Não podem ser alteradas, devido à vedação de modificação unilateral das condições de trabalho e à nulidade das que, ajustadas, resultem em prejuízo direto ou indireto ao empregado (CTL, 468). 4 — Norma regulamentar da empresa e incorporada, como tal, ao contrato de trabalho, questiona-se neste Recurso Extraordinário a competência para dirimir dissídio nascido dela. 5 — A Recorrente assevera a ofensa à Constituição Federal, art. 142, pelo acórdão do Tribunal Superior do Trabalho, que aceitou a competência para a questão. As suas razões no Recurso Extraordinário advertem que a nova redação dada à norma constitucional do art. 142 afastou-se do que dispunha a Constituição Federal de 1946, art. 123. Se naquela Constituição, à Justiça do Trabalho incumbia julgar questões «entre empregados e empregadores e as demais controvérsias oriundas das relações de trabalho regidas pela legislação especial». — contudo agora é outra a norma, quando não mais acolhe quaisquer «controvérsias oriundas das relações de trabalho» — no entender da Recorrente. E observa que o art. 142 da Constituição Federal de 69 estabelece a exigência de lei, para levar a competência trabalhista até tais questões, nas quais não se defrontam as próprias partes originárias da relação de emprego. 6 — Em abono da tese, a Recorrente cita acórdão do plenário deste Supremo Tribunal Federal, no RE 89.201-0-SP, relator Ministro Diaci Falcão, em 16-03-69 com a ementa: R.T.J. — 100 «Reclamação de viúvas, postulando complementação de pensões, em decorrência de cláusula de contrato de trabalho de seus falecidos maridos — Incompetência da Justiça do Trabalho. Precedentes do STF (RE 89.154, 89.199, 89.200, 89.203). 7 — O eminente Ministro Cordeiro Guerra, relator deste Recurso Extraordinário, em sessão de 22-04-81, votou pelo conhecimento e provimento deste Recurso Extraordinário. Deferiu à Justiça comum, o julgamento da reclamação. S. Exa. invoca o art. 142 da Constituição Federal e a opinião do Ministro Xavier de Albuquerque, votando sobre a matéria o qual observou em questão idêntica: «O litígio não se fere entre empregado e empregador, a lei poderá atribuí-lo à Justiça do Trabalho. E o que diz a Constituição. Essa lei não existe, então a Justiça do Trabalho não é competente.» Pedi vista —Ese antes não trouxe esse voto, foi por deferência à solicitação de adiamentos, do ilustre advogado da Recorrente. 8 — Atentei a alteração havida na Constituição no trato da competência da Justiça do Trabalho. O art. 142 exige em questões nas quais não se confrontem empregado e empregador, que esteja em lei, a competência da Justiça do Trabalho para dirimir dissidlos que sejam no entanto oriundos da relação de emprego. 9 — Ao que me parece, o texto constitucional inspirou-se com delicada atenção ao que dispunha a legislação trabalhista, sobre competência. A Constituição podia, é óbvio, radicalmente, inovar na matéria. — O certo porém é que não o fez. A redação, que então deu ao art. 142, manteve a amplitude das com- 255 petências, que a legislação trabalhista já atribula, no art. 652, às juntas de conciliação e julgamento. A Consolidação nele já previa, com largueza posta em lei, — na lei que neste Recurso Extraordinário se exige, para a competência especial — que a competência da Justiça do Trabalho poderá ir além das questões travadas entre empregado e empregador, competência esta que ela disciplina em razão do lugar, nos arts. 650 e 651, e em razão da matéria, no art. 652. Neste porém, no art. 652, a CLT estende a competência da Justiça do Trabalho. Leva-a também a outros vínculos que não consistem em relação de emprego, — pois torna-a competente, no art. 652, III, para aquelas questões oriundas do serviço de autónomo, desde que esse empreiteiro seja operário ou artífice. Nestes casos, não se defrontam empregado e empregador, dada a eventualidade do trabalho. É questão de competência constante de lei, esta, do item III, art. 652 da CTL. A lei não fica aí, porém. No item IV, do art. 652 generalizadamente a CLT estabelece a competência das Juntas Trabalhistas para «os demais dissIdlos concernentes ao contrato individual de trabalho». Consta, portanto, de lei, como o exige a Constituição, a distensão da competência trabalhista, pira as chamadas «demais questões», que pertinem com o contrato individual de trabalho. E se estas questões fossem a relação processual em ação entre empregado e empregador, a lei não se haveria de referir a demais questões concernentes ao contrato individual de trabalho. Só o faz por prever dissIdlos pertinentes com relação de emprego, mas com outras partes, como o caso presente. — de lei. 256 R.T.J. — 100 Verifico que o ponto de referência Sou pois do entendimento, que a competência trabalhista para diri- na jurisprudência desta Corte, no tomir a questão de que trata este Re- cante á questão de competência sob curso Extraordinário, — (comple- exame, reside no julgamento pelo mentação de aposentadoria de em- Pleno, do RE 89.546, datado de 5-10prego, e complementação de pensão 1978, quando eu ainda não participaà viúva deste) — assenta em lel a va desta Casa. AI foram enunciadas debatidas todas as posições, vindo saber, no art. 652 n. IV da CLT, pois eminente Relator para o acórdão, a matéria versada é condição do contrato de trabalho estipulado no Ministro Dedo Miranda, à formulação da seguinte ementa: regulamento da empresa. Por conseguinte, não ocorre afron«Trabalho. Pensão. Complementa à Constituição, art. 142, pelo acórtação. Atribuída pela autora á emdão recorrido. presa a responsabilidade pela comNão conheço do recurso. plementação, em virtude de cláusula do contrato de trabalho. Nesse EXTRATO DA ATA caso, competente é a Justiça do Trabalho para a ação da beneficiáRE. 91.259 — SP — Rel.: Min. Corria da pensão.» deiro Guerra. Recte.: Companhia Foram vencidos os Ministros CorMunicipal de Transportes Coletivos. (Adv.: Célio Silva). Recdo.: Lucrezia deiro Guerra, Relator, Xavier de AlCarrieri Colaclocco. (Adv.: Sid H. buquerque, Antonio Neder e Djaci Riedel de Figueiredo, Sérgio Roberto Falcão. Alonso, Ulisses Riedel de Resende e No entanto, a posição não era outros). inaugural, pois na mesma assentaDecisão: Pediu vista o Ministro da, o eminente Ministro Thompson Rafael Mayer, após o voto do Minis- Flores se reporta a precedentes de tro Relator que conheceu do recurso igual entendimento, que conferi: Ag. e lhe deu provimento, e o voto do Mi- Inst. (AgRg) n? 61.886, julgado pelo nistro Clovis Ramalhete, não conhe- Pleno, em 05-12-1974, versando suplecendo do recurso. mentação do sistema previdenciário Presidência do Senhor Ministro através de cláusulas contratuais priXavier de Albuquerque. Presentes à vadas, reclamada pela viúva do emSessão os Senhores Ministros, Djaci pregado (RTJ — 76-754). Assim tamFalcão, Leitão de Abreu, Cordeiro bém, no julgado no RE 77.535, de 22Guerra, Moreira Alves, Cunha Pei- 5-74, pertinente a reclamação trabaxoto, Soares Mufioz, Dedo Miranda, lhista visando complementação de Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. aposentadoria ou pensão (RTJ — 73Procurador-Geral da República. Dr. 514). Firmino Ferreira Paz. Entretanto, a partir da referência Brasília, 10 de junho de 1981 — que destaquei, a jurisprudência se Jonas Célio Monteiro Coelho, Secre- tem cristalizado, no sentido de firtário. mar a competência da Justiça do Trabalho para o deslinde da relação VOTO (VISTA) juridico-previdenciária, de ordem privada', sob a forma de pensão, O Sr. Ministro Rafael Mayer: Pedi quando tenha fonte no contrato de vista para repassar os precedentes trabalho. E o que se vê, por exemdesta Corte, dados como conflitantes plo, do RE 90.120, Relator o eminenem relação ao ponto controvertido. te Ministro Decio Miranda, e RE R.T.J. — 100 257 91.257, Relator o eminente Ministro de trabalho. Tanto a aposentadoria Soares Mufroz, reiterativos da orien- como a pensão complementares, em tação, ambos da mesma data de 22- tais casos, seriam um *reflexo 11-1979. jurídico do contrato, efeito residual da cláusula que deu embasamento à Entretanto, como aliás demonstra- pretensão». Distinta é a hipótese em do no voto do eminente Relator, ou- que o benefício previdendário é de tra vertente da jurisprudência exclui ordem estatutária e não contratual, da competência da Justiça do Traba- sem que a prestação se origine de lho, deferindo-a à Justiça Comum, uma estipulação emergente de relaas espécies previdenciárias decor- ção jurídico-trabalhista. rentes de norma estatutária e não contratual, no que se dá conseqüênCom reverência à douta argumencia e coerência às proposições tação do eminente Relator, que não implícitas nos precedentes. desconhece essa constante da jurisprudência, senão que propõe, com Assim, o julgamento no RE 89.203, inteligência e brilho, o seu reexame, Relator a eminente Ministro Soares cuido permanecer conforme à orienMufloz (RTJ — 88-862), RE 89.199, tação que à razoabilidade acresce a Relator o eminente Ministro Cunha constância. Acompanho, portanto, o Peixoto (RTJ-94-1211) e RE 89.201, voto do eminente Ministro Clovis RaRelator o eminente Ministro Djaci malhete, não conhecendo do recurso. Falcão, que se reporta entre outros ao precedente supracitado, em que VOTO (PRELIMINAR) Relator o eminente Ministro Soares Mufloz (RTJ 285). Sr. Ministro Dedo Miranda: Sr. Presidente, na certeza de se tratar Este último julgado é que foi invo- de pensão instituída pela própria cado, pelo eminente Ministro Cordei- empresa, competente é a Justiça do ro Guerra, no julgamento do RE n? Trabalho. 91.759, no qual era a mesma a Recorrente do caso sub judice, e em De acordo com o eminente Minisque viúva de servidor postulava complemento de pensão, para dar tro Rafael Mayer, não conheço do pela incompetência da Justiça do recurso. Trabalho, e que obteve a adesão VOTO (PRELIMINAR) unânime do Plenário. Cuido, entretanto, que essa remissão a precedenSr. Ministro Soares Muiloz: Sr. tes que se põem na linha da compePresidente, acompanho o voto do tência da Justiça Comum para os casos de previdência de natureza esta- eminente Ministro Clovis Ramalhete tutária, esmaece a significação que com as especificações do eminente se pretende de se ter ai uma tomada Ministro Rafael Mayer. Não conheço de posição do Plenário ao arrepio de do recurso. entendimento consolidado. A constante da jurisprudência se VOTO (PRELIMINAR) faz, portanto, no sentido da competência da jurisdição especializada Sr. Ministro Moreira Alves: Sr. para as questões pertinentes à com- Presidente, já por diversas vezes teplementação de aposentadoria ou nho votado no mesmo sentido em pensões, ou quando emergentes de que se pronunciou o Sr. Ministro Clocláusulas estabelecidas no contrato vis Ramalhete. 258 R.T.J. — 100 Acompanho, pois, o voto de S. (Adv.: Célio Silva). Recdo.: Lucrezia Exa. e dos que o seguem, no sentido Carrier' Colaciocco. (Adv.: Sid H. de não conhecer do recurso. Riedel de Figueiredo, Sérgio Roberto Alonso, Ulisses Riedel de Resende e outros). VOTO (PRELIMINAR) Decisão: Não se conheceu do reO Sr. Ministro Xavier de Albuquer- curso, vencido o Relator. Votou o que (Presidente): Também sigo a ju- Presidente. risprudência estabelecida há vários Presidência do Senhor Ministro anos, ainda que contra meu voto. Xavier de Albuquerque. Presentes à Com ressalva do meu ponto de vis- Sessão os Senhores Ministros Djaci ta, peço licença ao eminente Relator Falcão, Cordeiro Guerra, Moreira para também não conhecer do recur- Alves, Cunha Peixoto, Soares Mufioz, so. Decio Miranda, Rafael Mayer e Néri da Silveira. Ausentes, justificadamente, os Ministros Clovis RamalheEXTRATO DA ATA • te e Firmino Paz. RE. 91.259 — SP — Rel.: Min. CorBrasília, 10 de setembro de 1981 — deiro Guerra. Recte.: Companhia Jonas Célio Monteiro Coelho, SecreMunicipal de Transportes Coletivos tário do Tribunal Pleno. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91.262 — GO (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Terezinha Ferreira Gouveia — Recorrido: Celestino Gouveia. Recurso de apelação. Intimação ao advogado das partes, pelo escrivão. Colhido o «ciente», se o escrivão aceita a data consignada pelo advogado, no momento em que apõe sua assinatura, não havendo qualquer impugnação, prevalece a data do «ciente» sobre a certificada pelo próprio escrivão (art. 239 do CPC). Recurso extraordinário conhecido, em virtude do dissídio jurisprudenclal, e provido. ACORDA° Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Ministro Relator. Brasília, 26 de setembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão: Adoto como relatório o despacho que admitiu o recurso: «Vistos, etc. Terezinha Ferreira Gouveia, irresignada com o acórdão unânime de fls. 124-5, da Segunda Câmara ave', nos autos da apelação eive' n? 11.330, da Comarca de Itapuranga, sendo 1° apelante a ora recorrente e 2? apelante Celestino Gou- R.T.J. — 100 veia e apelados os mesmos, recorre, extraordinariamente, para o Egrégio Supremo Tribunal Federal, com fundamento no art. 119, inc. III, letra d, da Constituição Federal. Houve impugnação. Versa a espécie sobre a ação de desquite (hoje separação judicial), julgada procedente no Juízo de primeiro grau, com o reconhecimento de culpabilidade de ambos os cônjuges. Estes interpuseram recursos apelatórios, que não foram conhecidos pelo v. aresto recorrido, assim ementado: EMENTA: Apelação. Intempestividade. E intempestivo o apelatório manifestado após o decurso de 30 dias da intimação do advogado da parte, atestada pelo serventuário oficiante no processo. Recursos apelatórios não conhecidos. Embora tenha indicado apenas a alínea d do permissivo constitucional a recorrente fundamenta o extraordinário na alegação de ocorrência de dissídio jurisprudencial e negativa de vigência do dispositivo da lei processual civil. Tendo em vista as reiteradas decisões do Excelso Pretório no sentido de que a errônea indicação ou omissão da alínea do preceito constitucional não impede o conhecimento do apelo extremo, passamos a examinar, na devida ordem, as questões propostas pela recorrente. Contra o fundamento da intempestividade do recurso apelatório, a recorrente sustenta que o escrivão exarou certidões de intimação dos apelantes, datando-as como se eles tivessem sito intimados da 259 sentença no dia 20 de maio de 1978, ao passo que, na realidade, só foram intimados no dia 05 de junho do mesmo ano, como se vê dos 'cientes' de seus patronos, no verso de fls. 80 dos autos. Quer dizer a recorrente que o patrono do segundo apelante não teria nenhum interesse de colaborar com o advogado da primeira apelante, no sentido de este recuperar o prazo perdido, como não o teria, também, o julgador de primeiro grau de colaborar com uma das partes em detrimento da outra, quando despachou recebendo os recursos de ambas as partes. Assim, como ponto central da argüição — contrariedade ao disposto no art. 239, parágrafo único, inciso III do Código de Processo Civil —, afirma a recorrente que o serventuário da justiça tinha o dever legal de exigir o ciente dos advogados de uma e outro dos apelantes, e, no caso de recusa, incluir na certidão, os nomes das pessoas que assistiram à recusa. A espécie dos autos tem semelhança com a que foi objeto do Recurso Extraordinário interposto nos autos da apelação cível n? 11.128, da Comarca de Rumblara, sendo recorrente João Quirino Borges e outros e recorridos Oswaldo Galdino de Oliveira e outros (despacho presidencial datado de 02-0279), em que, igualmente, entre a certidão do escrivão e a cota do ciente do advogado datada com data posterior, o Coleglado Julgador optou pela primeira, para efeito de contagem do prazo do recurso formulado. No caso presente, no mesmo sentido, o acórdão sob exame, a nosso ver, deu razoável interpretação à lei. 260 R.T.J. — 100 Reportamo-nos às razões expostas no mencionado despacho, por aplicáveis à espécie. Com efeito, a lei confere à declaração oficial do serventuário o caráter de autenticidade, revestindoa de fé pública, que só cede diante de cabal prova em contrário. Na hipótese dos autos, o advogado da ré não se recusou a apor a nota de ciente. Portanto, não era caso de se colher na certidão os nomes de testemunhas que assistiram ao ato. O processualista E. D. Moniz de Aragão, em Comentários ao Código de Processo Civil, Ed. Forense, II Vol., pág. 250, ao estudar o art. 239 e seu parágrafo único, concluiu que as regras do texto não se dirigem aos advogados, e sim, unicamente, às outras pessoas, após salientar: «1:caríssimas são as intimações procedidas pelos escrivães que não se dirijam aos advogados que comparecem ao cartório, e são geralmente conhecidos. Torna-se, assim, supérfluo exigir-lhes identidade, descrevê-los, oferecer-lhes contra-fé e convidá-los a apor a nota de ciente, providenciando testemunhas para o caso de recusa Também os oficiais de justiça, quando intimam advogados ficam dispensados de tais formalidades». Assim, com base em negativa de vigência à lei federal, não vemos viabilidade no apelo extremo. Quanto à divergência pretoriana, a recorrente traz à colação aresto publicado, na integra, no conhecido Repertório de Jurisprudência do Código de Processo Civil, de Edson Prata, Ed. Universo de Direito — 1977, 4? vol. págs. 1.246-125, e juntado a fls. destes autos, por fotocópia autenticada. Verifica-se tratar-se de acórdão de 16-06-76, do T.A. Civil do Tribu- nal de Justiça de Minas Gerais, na apelação civel n? 8.075, em caso que guarda identidade com o dos presentes autos, do qual apenas se distingue pelo fato de que, nestes, os recursos apelatórios de ambas as partes foram julgados intempestivos sob o mesmo fundamento, quando a intimação dos respectivos advogados se deu em idênticas circunstâncias e, possivelmente, na mesma data. O acórdão-padrão decidiu diferentemente, como se lê de seu contexto, do qual nos permitimos extrair os seguintes excertos: No caso presente, após lavrar sua certidão de intimação da sentença às partes, às fls. 59 v?, co-lheu o serventuário, os cientes dos respectivos advogados, ao pé da certidão. Pois bem: embora a certidão esteja datada de 12 de maio de 1975, o ciente do advogado dos vencedores do pleito está datado de 13 de maio, enquanto que o do advogado da vencida traz a data de 16 de maio. Ora, se se tratasse tão-somente da data lançada por quem perdeu a demanda, por dilatar o prazo recursai, a circunstância teria pouco relevo. Mas, no instante em que também o advogado do vitorioso corrige a data da certidão por via oblíqua, a presunção que militava em favor dela perdeu toda significação. Que interesse teria o patrono de quem ganhou o pleito em infirmar a data de sua intimação, se não sucumbiu sob nenhum aspecto? Aliás, essa circunstância não passara despercebida no voto do Eminente Juiz Ottogamiz de Oliveira, que lhe emprestou a devida significação. Não há dúvida que o ciente não é indispensável. Todavia, no instante em que o escrivão o colhe, e aceita R.T.J. — 100 a restrição, ela enfraqueceu definitivamente o valor probante da certidão. Temos, pois, como ocorrente a semelhança dos casos confrontais, sendo de ressaltar, porém, que na hipótese destes autos, após a certidão de sua intimação, datada de 20 de maio de 1978, um tanto à margem, o patrono do 2? apelante apôs ciente com a data de 05-06-78, e, seguidamente, após a certidão de intimação, também datada de 20 de maio de 1978, e à margem apôs seu ciente o advogado da 1! apelante com a data de 05-6-78; e que ambos se consideraram parcialmente vencidos, tanto que manifestaram o apelo, a final, julgado intempestivo. Damos como demonstrada a divergência de interpretação. Pelo exposto, com apoio na letra do permissivo constitucional, admitimos o recurso, no efeito devolutivo, e determinamos que se abra vista dos autos aos recorrentes e aos recorridos, sucessivamente, para, no prazo legal, apresentarem suas razões. Publique-se. Goiânia, 03 de maio de 1979 — Desembargador Paulo de Amorim, Presidente» (fls. 144 a 147). Com as razões de fls. 150 a 152 e contra-razões de fls. 156, subiu o processo a esta Corte, onde recebeu o seguinte parecer: «1 — Contrariamente ao decidido pelo acórdão de fls. 124 não nos parece que a questão da intempestividade dos recursos de apelação apresentados pelos desquitandos encontre solução na afirmação de que os atos dos serventuários da Justiça merecem fé pública e somente prova inconcussa pode destruí-los. Não se trata, no caso dos autos, de tal situação. E certo que em todas as certidões de fls. 261 80v. consta a data de 20-5-78. Também é certo que os patronos dos desquitandos colocaram seus respectivos cientes com a data de 5-678, ao lado das intimações. Na instância inicial não surgiu controvérsia a respeito da tempestividade dos recursos apresentados, nem por parte do Juiz, nem por parte do Escrivão, isto é, este poderia esclarecer se fosse o caso, que procedera à intimação na data constante do carimbo. Aliás, se desnecessário fosse o ciente das partes, certamente ele não contraria dos autos, é óbvio. Se constou o ciente, sem a impugnação do Escrivão, o que temos, então, é justamente o contrário do declarado pelo acórdão recorrido, isto é, o Escrivão atestou a data da intimação como sendo de 05-6-78. Portanto, não se trata de contradição entre atos de serventuário e atos de partes. 2 — Conforme se declarou no acórdão trazido ao dissídio do Tribunal de Alçada de Minas Gerais, verbis, não há dúvida que o ciente não é indispensável. Todavia, no instante em que o Escrivão o colhe, e aceita a restrição, ela enfraqueceu definitivamente o valor probante da certidão. 3 — Tratando-se de ação de desquite e comprovado o alegado dissídio, nos termos do despacho admissivo de fls. 144 do Des. Presidente Paulo Amorim, somos pelo conhecimento e provimento do recurso extraordinário a fim de determinado ser ao Tribunal a quo o examè do recurso de apelação apresentado pela ora recorrente, afastada a preliminar de intempestividade, conforme o direito. Brasília, 03 de setembro de 1980 Soares, Leite Mauro Subprocurador-Geral da República ( fls. 160 a 161). 262 R.T.J. - 100 VOTO O Sr. Ministro Djaci Falcão: O acórdão objeto do recurso tem o seguinte teor: «EMENTA: Apelação. Intempestividade. E intempestivo o apelatório manifestado após o decurso de 30 dias da intimação ao advogado da parte, atestada pelo serventuário oficiante no processo. Recursos apelatórios não conhecidos. E certo que os aludidos advogados lançaram cientes nos autos com data de 05 de junho de 1978. Tais ocorrências, no entanto, não podem destruir a fé pública que desfrutam os atos dos serventuários da justiça. Essa fé pública, somente poderá resultar desfeita através prova inconcussa em ordem a contraditá-la. Isso não aconteceu na hipótese em apreço. Sendo assim, acolhido o parecer ministerial, não conheço dos apelatórios porque, desenganadamente, ACORDÃO manifestados fora da atempação legal. Vistos, relatados e discutidos esPreliminarmente, é o que voto» tes autos de apelação cível n? (fls. 124). 11.330, da Comarca de Itapurunga, Não padece dúvida de que o enten1? apelante Terezinha Ferreira Gouveia, 2? apelante Celestino dimento sufragado no aresto recorrido destoa do que serviu de suporte Gouveia e apelados os mesmos. ao acórdão paradigma, do Egrégio Acorda o Tribunal de Justiça, Tribunal de Justiça de Minas Gerais, por sua segunda Câmara Cível à unanimidade, não conhecer dos re- in verbis: «No caso presente, após lavrar cursos apelatórios, nos termos do sua certidão de intimação da senvoto do Relator. tença às partes, às fls. 59v, colheu Custas, pelos apelantes. o serventuário os cientes dos resPresidência do Senhor Desempectivos advogados, ao pé da certibargador Leôncio Pinheiro de Ledão. Pois bem: embora a certidão mos Com o Relator votaram os seesteja datada de 12 de maio de nhores Desembargadores Mauro 1975, o ciente do advogado dos venCampos e Celso Fieury. cedores do pleito está datado de 13 Goiânia, 06 de fevereiro de 1979 de maio, enquanto que o do advo— Ilegível, Presidente — Ilegível, gado da parte vencida traz a data Relator» (fls. 125). de 16 de maio. Ora, se se tratasse tão-somente Voto da data lançada por quem perdeu a demanda, para dilatar o prazo Senhor Presidente, os advogados recursal, a circunstância teria poudas partes foram intimados da senco relevo. Mas, no instante em que tença proferida no primeiro grau também o advogado do vitorioso de jurisdição no dia 20 de maio de corrige a data de certidão, por via 1978, consoante atestam as certioblíqua, a presunção que militava dões exaradas pelo serventuário às em favor dela perdeu a significafls. 80v. dos presentes autos. Tamção. Que interesse teria o patrono bém o representante do Ministério de quem ganhou o pleito em infirPúblico foi intimado nessa mesmar a data de sua intimação, se ma data. Os recursos apelatórios, não sucumbira sob nenhum aspecporém, somente foram manifestato? dos, respectivamente, nos dias 19 e 20 de junho. R.T.J. — 100 Não ha dúvida que o ciente não é indispensável. Todavia, no instante em que o escrivão o colhe, e aceita a restrição, ela enfraqueceu definitivamente o valor probante da certidão» (fls. 129 a 130). Impõe-se, em conseqüência, o conhecimento do recurso Em caso de intimação, não há regra exigindo o «ciente» (art. 239 do C.P. Civil). Segundo pondera Hélio Tornaghl: «Seja como for uma coisa é certa: o execlitor da intimação deve pedir o ciente do intimado. Se esse o recusa, deve aquele incluir na certidão os nomes das pessoas que assistiram à recusa» (Comentários ao Cód. de Proc. Civil, Vol. II, pág. 212). No caso dos autos, não houve recusa na aposição do ciente. O problema envolve a data em que se deu a intimação. Não obstante datada de 20-5-1978 a certidão de intimação passada pelo escrivão, os «cientes» apostos pelos advogados das partes integrantes da causa, têm a data de 05-06-1978. Vale ponderar que, no juízo de origem, não houve qualquer dúvida à cerca da tempestividade do recurso, quer de parte do escrivão, seja por parte do juiz. 263 Ora, se colhido o «ciente» nos autos o escrivão aceitou a restrição quanto a data em que se deu a intimação, ai não há que se invocar a credibilidade decorrente da fé pública (art. 239 do C.P.C.). Ex posais, conheço do recurso e dou-lhe provimento, a fim de que, afastada a preliminar de intempestividade, prossiga a Egrégia Câmara Chiei no julgamento da apelação, como de direito. EXTRATO DA ATA RE. 91.262— GO — Rel.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Terezinha Ferreira Gouveia (Advs.: Armando Carneiro Vaz e Jucy Gaivão Costa). Recdo.: Celestino Gouveia (Advs.: Ilza Ferreira da Silva e outro). Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro-Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 26 de setembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.338 — MG (Primeira Turma) de. Relator: O Sr. Ministro Soares Mufioz. Recorrente: Estado de Minas Gerais — Recorrido: José Alípio de RezenEstabilidade. Art. 177, 2?, da Carta de 1967. Funcionário público federal licenciado para tratar de interesses particulares e no exercício de cargo público estadual, à data da promulgação da Constituição de 1967. Exoneração, a pedido, do primeiro cargo pouco depois. Soma dos dois tempos de serviço. Acumulação enquadrável na permissão prevista no art. 185 da Constituição de 1946. Acórdão que fez justiça sem afrontar os dispositivos constitucionais questionados, naquilo que têm de substancial. Recurso extraordinário não conhecido. 264 R.T.J. — 100 ACÓRDÃO vencidos dos Desembargadores Gonçalves de Rezende (julgamento da apelação), Jair Leonardo e LinVistos, coln Rocha (julgamento dos embarAcordam os Ministros do Supremo gos). São afrontas que autorizam o Tribunal Federal, em Primeira Turrecurso com amparo na alínea a, ma, por maioria de votos e na condo inciso III, do art. 119, da Constiformidade das notas taquigráficas, tuição Federal ora vigente. não conhecer do recurso. 8 — Na verdade, desde 1966, o Brasília, 11 de novembro de 1980 — Recorrido acumulava ilicitamente Thompson Flores, Presidente — o exercício de dois (2) cargos, porSoares Mufloz, Relator. quanto a Constituição de 1946, vigente à época, vedava expressaRELATORIO mente tal acumulação. 9 — A acumulação não remuneO Sr. Ministro Soares Mufloz: José rada só veio a ser admitida com o Alípio de Rezende, funcionário públiadvento da Constituição de 1967. co federal em licença para tratar de 10 — Portanto, não será razoável interesses particulares, passou, em aceitar-se que uma infringência de março de 1966, mediante contrato, a disposição constitucional possa serexercer as funções de professor do vir de base para o reconhecimento Ensino Médio no Instituto de Educado um direito. O que é proibido peção de Minas Gerais, em cujo la Constituição não pode gerar exercício se encontrava quando adefeito jurídico». (fls. 132). veio a Constituição de 1967. Pelo Presidente do Tribunal de Requereu ao Estado de Minas Gerais a declaração de sua estabilida- Justiça foi inadmitido o recurso, sob de, nos termos do art. 177, § 2?, da o fundamento de que: Constituição de 1967, nas funções de «O recurso é baldo de sustentaProfessor de Ensino Médio do Instição. tuto de Educação de Minas Gerais, «De ver-se, para quem tenha olhos acrescendo-se ao tempo em que exerceu essas funções o período ande ver, que o impetrante não afirterior de efetividade no serviço púma ter havido violação da Constituiblico da União. ção vigente; usa do subterfúgio de dizer que o acórdão desatendeu às Desatendido na via administratiexigências do § 2?, art. 177. Ora, o va, propôs ação ordinária contra o que se pode ter por certo é que o Estado e obteve êxito em grau de decisum cuidou de dar exato cumapelação, através de decisão tomada primento ao preceito constituciopor maioria de votos e mantida nos nal, o que fez com o exame da proembargos infringentes. va de satisfação dos requisitos exiO Estado Interpôs recurso extragidos (contagem de tempo de serordinário, pela letra a do permisviço público). O que leva a esta sivo constitucional, alegando que: proposição fundamental: para de«1 — O v. acórdão não só desaferir a pretensão posta em juízo, o tendeu às exigências contidas no § acórdão examinou a prova docu2?, do art. 177, da Carta de 1967, co-- mental produzida e afirmou estar mo ainda atribui eficácia jurídica ela de acordo com a exigência do a atos ofensivos ao art. 185, da texto constitucional. O que mostra Constituição de 1946, que os regia, escrúpulo e cuidado na aplicação como reconheceram os rr. votos nunca vulneração da lei maior. R.T.J. — 100 Depois, para se aferir se é certa ou errada a conclusão do acórdão, o Pretório Excelso deveria descer ao reexame de prova, matéria que não merece as honras do apelo extremo (Súmula 279).» (fls. 139 a 190). Determinei a subida do apelo derradeiro, para melhor exame, provendo o agravo de instrumento em apenso. A Procuradoria-Geral da República, em parecer elaborado pelo ilustre Procurador João Boabald de Oliveira Itapary, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso, verbis: «Trata-se de recurso extraordinário interposto pelo Estado de Minas Gerais contra o v acórdão de fls. 126-129. O apelo é tomado com fulcro nas disposições do artigo 119. III, a, da Constituição Federal, segundo o recorrente, o v. acórdão atacado teria vulnerado a regra do artigo 177, • 2?, da Constituição Federal de 1967. A vulneração decorreria da adição do tempo de serviço prestado à União Federal ao que fora prestado ao Estado-membro, a fim de que completados os cinco anos de serviço público, exigidos no mencionado dispositivo constitucional. Do exame dos autos, verifica-se que o voto vencedor, proferido pelo eminente Desembargador Melo Junior, destaca: «De inteira aplicação à espécie sob julgamento e julgado referido no voto • do Desembargador Gouthier de Vilhena, segundo o qual «o servidor contratado, como o Apelante, que à data da Constituição de 69 já havia completado cinco anos de serviço público mesmo que prestados a 265 entidades diversas de direito público interno, adquiriu o direito à estabilidade» (Revista Trimestral de Jurisprudência, Vol. 59, pág. 531). (fls. 128-9). Tem-se, pois, a impresssão de que o r. acórdão atacado estaria em consonância com orientação já fixada pela Augusta Corte. Ocorre, porém, que o RE 71.043 — Si' — referido no voto suso transcrito — não versou sobre estabilidade adquirida mediante adiÇãO: de tempos de serviço prestados a diferentes pessoas jurídicas de direito público. Assim, inviável é, data venta, que aquela mencionada decisão seja trazida à colação como precedente fixado pelo Pretório Excelso. Quanto à estabilidade conferida pelo artigo 177, 2?, da Constituição Federal de 1967, parece-nos indiscutível que o tempo de serviço exigido — cinco anos de exercício — deve ter sido prestado à mesma pessoa jurídica de direito público, à qual servia no dia 15 de março de 1967. Para Pontes de Miranda, são pressupostos do «... direito subjetivo resultante da incidência do art. 177, 2?: a) Haver cargo público, que não fosse de comissão, isto é, que pudesse estar provido definitivamente (não de funcionários vitalícios). b) Estar em exercício funcionário interino, vale dizer-se — pessoa que foi nomeada interinamente para exercê-lo (não, se nomeada ad interim, para cargo de comissão). c) Ter essa pessoa cinco anos de exercício, pelo menos, o que não é a mesma coisa que estar há cinco anos no exercício do cargo, «ininterruptamente». («Comentários à Constituição de 1967». Tomo VI, págs. 423/4). 266 R.T.J. — 100 Ora, se o próprio v. acórdão re- serviço público. Não exige que o corrido proclama que o autor da mencionado tempo seja no mesmo ação ordinária não se encontrava, cargo, nem proíbe sejam somados no cargo, com cinco anos de tempos de serviços prestados a entiexercício, tanto que, para comple- dades distintas (Pontes de Miranda, mentar esse tempo, adicionou tem- in Comentários, Tomo VI, pág. 424; po de serviço prestado a outra pes- RE 79.399, Rel.: Ministro Rodrigues soa jurídica de direito público, co- Alckimin, RE 71.284, rel.: Ministro mo ocupante de outro cargo, Aliomar Baleeiro). parece-nos inarredável que o v. A dificuldade está em que o recoracórdão atacado contrariou as disposições do artigo 177, 2?, da rido se exonerou do cargo público federal em 29.5.67 (fls. 10). Ocorre, no Constituição Federal de 1967. que ele deixara o seu Diante do exposto, opinamos no entanto, exercício, como já disse, em 1965, sentido de que seja conhecido e para tratar de interesprovido o recurso, para o fim de licenciando-se reformar a r. decisão recorrida e ses particulares. restabelecer a de primeira instânForam essas duas singularidades cia, que julgou improcedente a que levaram o acórdão recorrido a ação». (tis. 160 a 162). julgar procedente a ação, tal como se vê do voto vencedor proferido peE o relatório. lo ilustre Desembargador José Arthur, verbis: VOTO «a 24 de janeiro de 1967, data da promulgação da Carta Magna, o apelante era servidor do Estado, O Sr. Ministro Soares Muiloz (Reexercendo as funções de Professor lator ): Mandei que fosse processado Auxiliar de Ensino Médio, onde reo recurso extraordinário porque ele gia aulas extranumerárias e contacontém nuances que me suscitaram va mais de cinco anos de serviço fundadas dúvidas. público, se computado o tempo de Na data da promulgação da Carta serviço que anteriormente prestade 1967, o recorrido era funcionário ra à União. do Serviço Federal de Promoção Agropecuária em Minas Gerais, liNa realidade não estava ele acucenciado para tratar de interesses mulando cargos, pois, desde abril particulares, e, mediante contrato de 1965 esteve licenciado do servicom o Estado de Minas Gerais, exerço público federal — licença sem cia as funções de Professor Auxiliar remuneração — para lecionar no de Ensino Médio do Instituto de EduInstituto de Educação. Tenho que a cação de Minas Gerais. Seu tempo lei veda a acumulação remunerada de serviço público federal remontae que, in casu, não houve e nem va ao ano de 1952, e a licença já refeserviços paralelos eram prestados rida se iniciara a 19.5.65. O contrato à União e ao Estado. com o Estado de Minas Gerais, de seu turno, é de 1966. Estou em que correto é o pareA adição desses dois períodos é cer da douta Procuradoria-Geral possível. O art. 177, 2?, da Constida Justiça da lavra do eminente tuição de 1967 contenta-se que o serProcurador Marcos Elias, que acolho como fundamento do presente vidor, à data de sua promulgação, possuísse, pelo menos, cinco anos de voto». (fls. 108). R.T.J. — 100 acórdão, assim decidindo, não ofendeu o art. 177, 2?, da Constituição de 1967. De outro lado, a acumulação de um cargo em licença não remunerada com outro remunerado obrigaria o funcionário a optar por um deles ( art. 14 do Decreto n? 35.956, de 1954), e essa opção foi feita pelo recorrido, exonerando-se do serviço público federal. Ademais, a acumulação em referência era enquadrável na permissão prevista no art. 185 da Constituição de 1946, vigente à época. A decisão recorrida foi justa, sem afrontar os dispositivos constitucionais questionados, naquilo que têm de substancial. Ante o exposto, não conheço do recurso extraordinário. 267 VOTO Sr. Ministro Cunha Peixoto: Senhor Presidente, quanto ao problema da acumulação, data venta, do eminente Ministro Rafael Mayer, colocome de acordo com o eminente Ministro Soares Mufloz, principalmente porque não podemos examinar o problema em face de duas Constituições. que me leva a divergir de S. Exa., é o entendimento de ser o art. 177 um dispositivo de exceção, e, conseqüentemente, não se pode dar a um funcionário nova estabilidade. Ora, se ele era estável no Governo Federal, não poderia adquirir essa estabilidade por um dispositivo excepcional, somando, para nova estabilidade, o tempo de Serviço Federal ao tempo... VOTO Sr. Ministro Soares Mufloz (ReSr. Ministro Rafael Mayer: Sr. Mor): Poderia conseguir estabilidaPresidente, data venia do voto do de, mas ele só a requereu no serviço eminente Relator, tenho ponto de estadual, e não no federal. vista firmado e antigo quanto à O Sr. Ministro Cunha Peixoto: Mas abrangência da proibição de acumujá era funcionário antigo, tanto lar mesmo quando, em um dos car- ele tinha direito a licença para tragos acumulados, o funcionário se que tar de interesses particulares. Por ache em licença não remunerada. O este motivo, acho que ele não é fato de estar em licença não remu- abrangido pelo art. 177. nerada não lhe retira a titulariedade Assim, conheço do recurso e lhe de um cargo. Isso é o que a Constituição tem em mira, inclusive para evi- dou provimento. tar, no tempo mesmo em que se VOTO PRELIMINAR proibiu a acumulação, o empreguismo, os chamados «cabides», que Sr. Ministro Xavier de existiam naquela época. Desde Rui Albuquerque: Sr. Presidente, consiBarbosa se entende que não é preci- deradas as circunstâncias do caso, so que a acumulação seja, necessa- acompanho o eminente Relator, data riamente, remunerada — como, venta, dos colegas que disssentem. aliás, a Constituição de 46 mantinha recorrido, quando sobreveio a o qualificativo — para que essa proiConstituição de 1967, tinha quinze bição se configure. de serviço público federal, conPor isso, data venta, entendo que anos tados desde 1952. Aos primeiros cinestá ofendido o dispositivo constitu- co anos teria adquirido, na esfera fecional que proibia a acumulação, co- deral, a estabilidade, ainda que não mo ainda na Constituição vigente es- fosse concursado; se o fosse, tê-la-ia tá proibido. adquirido com dois anos. De sorte Conheço do recurso e lhe dou pro- que podia prescindir, folgadamente, vimento. do tempo federal que lhe assegurou 268 R.T.J. - 100 Todavia são elas, as peculiaridaa estabilidade ordinária, para usar o remanescente desse tempo federal e des, que me levam a admitir não ter adquiri-la, a estabilidade excepcio- havido desatenção ao disposto no nal, no âmbito estadual. Ademais, o art. 177, 2?, da Constituição de 1967. caso é muito caprichoso e admito Assim, com a vênia devida, tamque haja sido julgado, diante de suas bém não conheço do recurso. conotaçôes, pela Justiça local, conforme o direito. EXTRATO DA ATA Quanto à utilização de tempo de serviço prestado à entidade diversa, RE 91.338— MG — Rel.: MM Soatambém a admito e lembro, além dos precedentes já mencionados pelo res Muftoz. Recte.: Estado de Minas eminente Relator, o RE 86.205, que Gerais (Adv.: Newton N. Campos, relatei na Segunda Turma a 12 de Francisco Deiró Couto Borges e novembro de 1976, no mesmo senti- Wanderley Gregoriano de Castro). Recdo.: José Alipio de Rezende do. ( Adv.: Erasmo Barros de Figueiredo Assim, não conheço do recurso. Silva, Rafael Eugêncio de Azeredo Coutinho e outros). VOTO (PRELIMINAR) Decisão: Não conheceram do recurso, vencidos os Ministros Rafael O Sr. Ministro Thompson Flores: Mayer e Cunha Peixoto. Falou pelo (Presidente) — Peço vênia para Recte. o Dr. Francisco Deiró Couto acompanhar o voto do eminente Re- Borges lator. Presidência do Senhor Ministro Faço-o ante as peculiaridades re- Thompson Flores. Presentes á Sesveladas na espécie e salientadas nos são os Senhores Ministros Xavier de votos dos eminentes Ministros Rela- Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mtuloz e Rafael Mayer. Subprocurator e Xavier de Albuquerque. da República, Dr. FrancisNão fossem elas, as peculiaridades dor-Geral que dão à controvérsia colorido di- co de Assis Toledo. Brasília, 11 de novembro de 1980. verso, é possível que viesse a aderir aos votos que estão provendo o re- — Antônio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. curso. EMBARGOS NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91:405 (AgRg) — RJ (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder. Agravante: Fenix Comercial e Construtora Limitada. Embargos de divergência. É recurso que tem cabimento no caso do acórdão embargado e o acórdão-padrão versarem o mesmo tema jurídico em termos discordantes. Se os dois acórdãos julgaram a mesma questão federal em termos que se harmonizam, dito recurso não tem cabimento. Decisão liminar que negou seguimento aos referidos embargos. 3. Agravo regimental a que o STF nega provimento. R.T.J. — 100 ACORDAO Vistos e relatados estes autos de Agravo Regimental nos Embargos em Recurso Extraordinário n? 91.405-6, do Estado do Rio de Janeiro, em que é agravante Fenix Comercial e Construtora Limitada, decide o Supremo Tribunal Federal, em Sessão Plenária, unanimemente, negar provimento ao agravo regimental, de acordo com as notas juntas. Brasília, 06 de maio de 1981 — Xavier de Albuquerque, Presidente — Antonio Neder, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Antonio Neder, (Relator): I. Leio nas fls. 273 a 275 a decisão agravada: «Vistos, etc. «2 — O acórdão embargado acha-se redigido com esta ementa, f. 200: Mandado de Segurança. Litisconsórcio passivo necessário. Impossibilidade de prequestionamento, uma vez que os recorrentes só ingressaram nos autos depois de prolatado o acórdão, e o fizeram para Insurgir-se contra a ausência de sua citação como litisconsortes necessários. Ocorrência, no caso, de litisconsórcio, passivo necessário. Recursos extraordinários conhecidos e providos em parte». «Pelo que se lê na fundamentação desse acórdão, julgou a Eg. Segunda Turma que, na ação de segurança, deve citar-se o litisconsorte necessário, e considerando que, no caso, não foram citados os litisconsortes necessários, julgou, ainda, o referido acórdão, anular o acórdão local concessivo da segurança e ordenar sejam citados tais 269 1lUsconsortes para se prosseguir, como de direito, no procedimento da ação de segurança. o que se lê nos votos dos eminentes Ministros Moreira Alves, Leitão de Abreu e Djaci Falcão, votos esses que fundamentam o acórdão embargado, fls. 195 a 197. «Alega o 1? Embargante que, ao julgar a questão nos temos em que a julgou, o referido acórdão embargado se acha em divergência com o que o STF proferiu em sua Primeira Turma no RE 71.992, acórdão-padrão esse publicado na RTJ, 59/596 a 599, e copiado nos autos, fls. 205 e 206. «Doutro lado sustenta a 2! Embargante que o acórdão embargado contém divergência com o mesmo paradigma citado. «O 1? Embargante pretende que os embargos venham a ser conhecidos e recebidos para o fim de se negar conhecimento ao recurso extraordinário. «A 2! Embargante pretende que o recurso extraordinário da Predial K.S. Ltda. não seja conhecido, ou, se conhecido, que a ele não se dê provimento. « 3— O acórdão embargado questionou a matéria do art. 19, da Lei n? 1.533/51, em combinação com a do art. 47 do C. Pr. Civil, e julgou que o litisconsorte necessário deve ser citado em ação de segurança. «O acórdão-paradigma questionou a matéria do art. 19, da Lei n? 1.533/51, em combinação com o artigo 88 do C. Pr. Civil de 1939, e julgou que o litisconsorte necessário deve ser citado em ação de segurança. «Vê-se que os dois acórdãos, o embargado e o paradigma, questionaram a mesma tese jurídica e 270 R.T.J. — 100 a julgaram em termos que se harmonizam, e não em termos divergentes. «Portanto, não se tem como cogitar dos embargos opostos pelos dois Embargantes, visto que nenhuma discordância pode ser apontada entre os dois mencionados acórdãos. «Os embargos de divergência têm cabimento no caso em que o acórdão proferido por uma Turma do STF em recurso extraordinário ou em agravo de instrumento diverge de acórdão prolatado por outra Turma da Corte, ou por seu Plenário, na interpretação do mesmo direito federal. «E, pois, um recurso pelo qual o embargante questiona tão-só a divergência entre duas ou mais teses jurídicas fixadas na consideração da mesma norma federal. «No caso agora discutido, é certo que, o acórdão embargado julgou que se deve citar o litisconsorte necessário em ação de segurança, e é também certo que o acórdãoparadigma julgou que se deve citar o litisconsorte necessário em ação de segurança. «Não há, pois, divergência de teses jurídicas no caso, mas, isto sim, concordância de teses jurídicas, ou, melhor dizendo, a fixação, nos dois juglamentos, da mesma tese jurídico-federal. «4 — Pelas razões deduzidas, nego seguimento aos dois embargos (Reg. Int., art. 21, § 1?).n A sociedade agravante Fenix Comercial e Construtora Limitada sustenta, em seu agravo, que a divergência que alegou em seus embargos está demonstrada. E o que se lê nestas razões do seu agravo regimental, fls. 280 a 281: «9 — A divergência jurisprudenciai assinalada nos Embargos se, reconheça-se, não resulta evidente da simples comparação de ementas, apresenta-se contudo patente e clara ao se examinar o fundamento mesmo das decisões cotejadas. A mera circunstância de que, no acórdão recorrido, se chega exatamente ao resultado oposto àquele que a jurisprudência consagrada da Corte Suprema visou quando impôs a imprescindibilidade da cientificação de terceiros prejudicados em Mandado de Segurança, já é uma evidência de que a decisão embargadi contrasta com aquela jurisprudência. Pois, se o Supremo Tribunal Federal visou, afastando-se do caminho do rigor exclusivamente técnico, a salvaguardar a posição dos terceiros interessados em Mandado de Segurança, assegurando-lhes a possibilidade de defesa, como consagrar, tal qual se faz neste processo, situação em que quem se pôde defender obtém a anulação do feito, em detrimento de quem jamais teve possibilidade de defesa. «10 — A divergência jurisprudencial que enseja o cabimento dos embargos está, data venia, evidenciada também no item III (n?s 9 a 18) do Recurso indeferido. A eles se permite reportar a Agravante, respeitosamente. «11 — Senhor Ministro Relator: A Embargada, Predial K. S. Ltda., não visa, neste processo, a rigor, a uma decisão favorável que ela sabe impossível. Objetiva, única e exclusivamente, a persistência da demanda, e não a sua solução final. Este objetivo, malicioso e injurídico, contrasta certamente com todo o arcabouço ético que reveste a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que assegura, ao terceiro prejudicado, o direito de R.T.J. — 100 defesa em Mandado de Segurança. No presente processo, terceiros prejudicados são a ora Agravante e os demais adquirentes legítimos do bem cujo domínio é posto sob suspeita pela simples circunstância de se processar ainda o Mandado de Segurança. E com base nessa divergência essencial de objetivos, de fundamentos, de alcance e de significado entre os acórdãos apontados como divergentes na petição de Embargos e o decisório embargado, que se espera que Vossa Excelência, em juizo de retratação, ou o E. Plenário, provejam o Agravo, para que se prossiga na tramitação dos Embargos.» II — E o relatório. 271 to, uma vez que os recorrentes entraram na causa, como salientou o eminente Ministro Moreira Alves, somente depois de ter sido prolatado o acórdão recorrido. De maneira que afasto, nesse ponto, também, a exigência de prequestionamento. «Quanto ao mérito, como o eminente Ministro Moreira Alves, também anulo o acórdão, a fim de que sejam citados o arrematante e o leiloeiro.» Finalmente, o Sr. Ministro Djaci Falcão votou nestes termos, f. 197: «Peço vênia ao eminente Relator, para acompanhar o eminente Ministro Moreira Alves. «No que toca ao prequestionamento, não é de se exigir, na hipóVOTO tese, uma vez que os ora recorrentes não integravam a relação processual. O Sr. Ministro Antonio Neder (Re«Por outro lado, provejo o recurlator): I — Não é difícil demonstrar so com base no primeiro fundaa sem-razão da Agravante. mento, da existência de litisconsorUma rápida leitura dos dois acórtes necessários, não chamados a dãos, o embargado e paradigma, deintegrar a causa. monstra que um e outro versaram o «Via de conseqüência, dou provimesmo tema jurídico e o decidiram mento aos recursos, para anular o em termos que se harmonizam. acórdão recorrido.» A fundamentação decisória do Vê-se que, julgando a matéria de acórdão embargado é a que se acha inscrita nos votos dos nobres Minis- ser indispensável a citação do litistros Moreira Alves, Leitão de Abreu consorte necessário em ação de segurança, o acórdão embargado fixou e Djaci Falcão. o entendimento afirmativo. Disse o primeiro, f. 195: Pois bem, o acórdão-paradigma, «Por isso, Sr. Presidente, tam- copiado nas fls. 205 e 206, julgou que bém afasto a preliminar de pre- é indispensável citação do litisconquestionamento, e conheço do re- sorte necessárioana ação de segurancurso, para lhe dar provimento, a ça. fim de anular o acórdão recorrido, E o que se verifica na sua fundapara que sejam citados os ora recorrentes, como litisconsortes ne- mentação deduzida no voto do Sr. cessários, prosseguindo o feito co- Ministro Luiz Gallotti, f. 206: mo de direito.» «Conheço do recurso, em face do De seu lado, assim votou o Sr. Midissídio jurisprudencial. nistro Leitão de Abreu, f. 196: «E dou-lhe provimento, para de«Sr. Presidente, na hipótese, não cretar a nulidade argüida pela rese podia exigir o prequestionamencorrente. 272 R.T.J. — 100 «O art. 19 da L. 1.533, de 1951, manda aplicar ao processo do mandado de segurança os arts. 88 a 94 do C. Pr. Civil. «E o art. 88 do C. Pr. dispõe que, quando fundado o litisconsórcio, ativo ou passivo, na comunhão de interesses, não poderão as partes dispensá-lo. «No caso é patente a comunhão de interesses, pois a segurança, embora requerida contra o Prefeito, visava a anular a concessão feita à recorrente. «Impunha-se, assim, a citação da recorrrente como litisconsorte necessário.» A única diferença que se registra entre os dois acórdãos é irrelevante. Sim, porque o acórdão embargado Julgou o caso mediante questionamento do art. 19 da Lei n? 1.533/51 combinado com o art. 47 do C. Pr. Civil de 1973, e o acórdão-padrão questionou o art. 19 da Lei n? 1.533/51 combinado com os arts. 88 a 94 do C. Pr. Civil de 1939. • Não há, pois, nenhuma discordância entre os acórdãos confrontados. II — Nego provimento ao agravo regimental. EXTRATO DA ATA EFtE 91.405 (AgRg) — FtJ — Rel.: Min. Antonio Neder, Agte.: Fenix Comercial e Construtora Limitada. (Advs.: Pedro Paulo Cristófaro e João Carlos Muller Chaves). Agdo.: Sebastião Brigido de Lemos e outro. (Advs.: Silvio Goldgewicht e outro). Decisão: Negado provimento ao agravo regimental, unanimemente. Presidência do Senhor Ministro Xavier de Albuquerque. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Djaci Falcão, Antonio Neder, Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Cunha Peixoto, Soares Muhoz, Dedo Miranda, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. Procurador-Geral da República, Dr. Firmino Ferreira Paz. Brasília 06 de maio de 1981 — Jonas Célio Monteiro Coelho, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 91.408 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Firmino Paz. Recorrentes: Sandro Pantani e sua mulher — Recorrida: Empresa de Engenharia Ferroviária S/A — ENGEFER. A contestação, em processo Judicial de desapropriar, só podendo versar sobre vicio processual e impugnação do preço oferecido pelo expropriante, não constitui obstáculo Jurídico ao acto de desistência da ação proposta. Recurso extraordinário não conhecido. ACORDA° Vistos e relatados estes autos de Recurso Extraordinário n? 91.408-1, do Estado de São Paulo, em que são recorrentes Sandro Pantani e sua mulher e recorrida a Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer, decide o supremo Tribunal Federal, por sua Segunda -Turma, unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas Juntas. Brasília, 24 de novembro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Firmino Paz, Relator. R.T.J. — 100 RELATORIO O Sr. Ministro Firmino Faz (Belator) Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer, propôs ação de desapropriação a Sandro Pantani e sua mulher, que recaiu em terrenos e benfeitorias de propriedade dos réus, declarados de utilidade pública, necessários ao projeto final de engenharia do anel ferroviário de São Paulo. Em contestação, insurgiram-se os expropriados, contra o preço oferecido, e pleitearam justo preço (fls. 18/24). Após saneado o feito (fls. 114), requereu a expropriante a desistência da ação, «face aos elevados custos que seriam alcançados com a presente desapropriação, tendo em vista a atual conjuntura financeira por que atravessa o País» (fls. 121/123). 2 — O Dr. Juiz de Direito homologou a desistência formulada pela autora. Determinou, ainda, fossem pagas por ela as despesas decorrentes da expropriação (fls. 125v.). 3 — Apelaram ambas as partes (fls. 164/168 e 170/171). 4 — A Egrégia Terceira Câmara do Segundo Tribunal de Alçada Civil de São Paulo, por votação unânime, deu provimento, em parte, ao recurso da exproprlante, e julgou prejudicado o apelo dos apropriados, com a seguinte fundamentação (fls. 194/196), verbis: «1 — Homologada desistência em ação expropriatória, apelaram as partes. O expropriado inconformase com a desistência, alegando-a impossível na fase em que se encontrava o processo e à mingua da revogação do decreto expropriatório; irresigna-se, ainda, com a verba honorária, cuja elevação pleiteia. A expropriante, de seu lado, pretende a redução dos honorários 273 advocaticios e dos salários periciais. Processamento regular, vendo-se contra-razões. 2 — Incontroversa a possibilidade de desistência da desapropriação, sem audiência da parte Contrária, pelo menos até a efetivação do pagamento (Hely Lopes Meirelles, «Direito Administrativo Brasileiro», pág. 559; Seabra Fagundes, «Da desapropriação no Direito Brasileiro», pág. 282; F. Whitaker «Desapropriação», págs. 56/57). Inadmissível, portanto, o indeferimento do pedido de desistência, mesmo que não haja ocorrido a revogação do decreto expropriatório. 3 — A condenação em honorários, nas desapropriações, tem por base dar ao desapropriado a justa indenização, que não pode ser desfalcada do quantum a ser pago ao advogado (RTJ 76/659). Inaplicável, pois, às demandas dessa natureza, o art. 20 do C.P.C. Assim, se não vige o principio da sucumbência, o arbitramento deve basear-se em critério que traduza, numa expressão monetária correta, o valor do trabalho desenvolvido pelo advogado. Aplicável, em principio, a regra do art. 27, â 1?, da Lei de Desapropriações, que determina o estabelecimento num percentual sobre a diferença entre a oferta e.a indenização. Mas, na hipótese de desistência antes da sentença, o critério deve ser outro, pois ainda não há indenização fixada. No caso especial dos autos, o advogado da apelante ofereceu contestação e juntou documentos, mas sequer chegou a manifestar-se sobre o laudo, diante da desistência da expropriante. Vê-se, assim, que o trabalho não se revestiu de maior complexidade. 274 R.T.J. — 100 Sendo assim, os honorários advocaticios devem ser arbitrados em quantia fixa, ora estabelecida em Cri 60.000,00. Tal importância remunera, condignamente, o advogado, considerando-se que o processo não chegou à conclusão de sua primeira fase. Também são reduzidos os salários periciais, fixados os do perito do juízo em Cr$ 12.000,00 e o dos assistentes em Cri 8.000,00. 4 — Diante do exposto, fica provido em parte o apelo da expropriante, prejudicado o do expropriado.». 5 — Dai o recurso extraordinário interposto por Sandro Pantni e sua mulher (fls. 198/201), à base das alíneas a e d do permissivo constitucional. Atribuiu contrariedade ao disposto nos artigos 33, § 2?, e 15, § 1?, a; e d, do Decreto-lei 3.365, de 21 de junho de 1941, e artigo 267, § 4?, do Código de Processo Civil, e divergência jurisprudencial com arestos desta Corte: RE n? 73.594, in RTJ 63/510; e RE 81.095, in RTJ 77/5691». 6 — O despacho do ilustre Presidente, Juiz Agripino Vieira de Souza, inadmitiu o recurso (fls. 204/207), o qual teve processamento, todavia, ante o provimento do Ag 75.730-9, segundo autos em apenso. Razões, apenas, dos recorrentes, deduzidas a fls. 219/223. 7— Neste Colendo Supremo Tribunal Federal, pronunciou-se a douta Procuradoria-Geral da República (fls. 229/230), em parecer da lavra do ilustre Subprocurador-Geral da República Mauro Leite Soares, pelo não conhecimento do recurso ou pelo seu não provimento, nestes termos: — O acórdão impugnado manteve, em parte, decisão de primeira instância, f. 194/5, admitindo como válida a desistência formulada pela recorrida, em ação de desapropriação por ela intentada, antes da sentença final. 2 — Dal o recurso extraordinário dos expropriados, com apoio nas letras a e d, alegando negativa de vigência dos arts. 33, § 2?, e 15, § 1?, a e d, do Decreto-lei 3.365/41; art. 267, § 4?, do C.P.C., e divergência com julgados do Supremo Tribunal. 3 — Não procede, a nosso ver, o apelo por quaisquer dos fundamentos em que veio lastreado. Não cabe a invocação dos preceitos legais apontados como violados pelos recorrentes, que pretendem apenas tirar conclusões que levariam à construção de uma definida situação jurídica impeditiva da desistência. 4 — Ora, o Poder expropriante formalizou o necessário pedido de desistência, f. 121, tornando sem efeito a desapropriação objeto da presente ação. Não se pode conferir supremacia às pretensões privadas sobre o interesse público, desconhecendo-se que a expropriação é uma prerrogativa da Administração, podendo o Poder Público, em regra, revogar unilateralmente os atos por ele praticados, quando não convenha ao interesse público. Portanto, descabe a impugnação porque o acórdão recorrido se limitou à aplicação da lei de maneira correta ou, pelo menos, razoável, ao lado de os invocados dispositivos legais referidos na petição extraordinária não terem sido debatidos pelo Tribunal a quo, conforme afirmam os próprios recorrentes às f. 199, verbis «Tal alegação não foi considerada pela Eg. Câmara Julgadora, sequer a ela se referindo, donde a completa negativa de sua vigência». Além disso, para legitimar a solução adotada, é tranqüila a orientação do Supremo Tribunal nos RFtEE. 26.117, RTJ 5/57; 70.078, RTJ 56/806 e 73.048, RTJ 77/569. 5 — Finalmente, ao invés de divergir da jurisprudência indicada R.T.J. — 100 pelo recorrente, a decisão recorrida com ela se harmoniza. Senão, vejamos o entendimento do Supremo Tribunal no RE 73.594 — MG, Relator Ministro Thompson Flores, RTJ 63/510, trazido a confronto pelos próprios recorrentes, verbis: «Desapropriação. Desistência, antes de findo o processo. Viabilidade. Efeitos. II — E um direito da desapropriante desistir de sua pretensão antes de findo o processo com recebimento do preço. III — Se algumas obras realizou, com prejuízo do desapropriado, ressalvado fica o direito à reparação, em procedimento próprio. Recurso provido.» 6 — Isto posto, somos pelo não conhecimento ou, acaso conhecido, pelo não provimento do recurso extraordinário.» o relatório. VOTO Sr. Ministro Firmino Paz (Relator): Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer —, devidamente autorizada, propôs ação de desapropriar terrenos, acessões e benfeitorias a Sandro Pantani e sua mulher, por utilidade pública (Inicial, fls. 2/4). 2 — Declara-se, no apelo extremo, que o venerando acórdão recorrido ofendera, primeiro, o artigo 33, § 2?, do Decreto-lei n? 3.365, de 21 de junho de 1941 (Lei de Desapropriação), em que se declara que o expropriado, ainda que discorde do preço oferecido, poderá levantar até 80% do depósito feito. Essa, a tese que se contém no precitado dispositivo legal. Note-se. A leitura do venerando aresto extraordinariamente recorrido, não se vislumbra a adoção de tese contrária á enunciada na norma legal. O respeitável aresto recorrido, sequer, aludiu ao artigo 33 da Lei de Expropriar. 275 3 — Não se disse, outrossim, no acórdão recorrido, nada em contrariedade ao previsto no artigo 15, § 1?, a a d, da Lei de Expropriar, em que se prescreve sobre o cálculo do valor do prévio depósito, para efeito de imissão provisória na posse. Não há, portanto, violação ou, até, negação de vigência dessas normas federais. 4 — Enquanto ao previsto no artigo 267, § 9?, do Código de Processo Civil, não se disse, também, no aresto recorrido, que, decorrido o prazo para resposta, o autor poderia, sem o consentimento do réu, desistir da ação. Ficara assentado e declarado, no acórdão recorrido, ser, verbis: «Incontroversa a possibilidade de desistência da desapropriação, sem audiência da parte contrária, pelo menos até a efetivação do pagamento (Hely Lopes Meireiles, Direito Administrativo Brasileiro, pág. 559; Seabra Fagundes, Da Desapropriação no Direito Brasileiro, pág. 282; F. VVhitaker, Desapropriação, págs. 56/57)» (Acórdão, fls. 195). Esse, por sinal, o entendimento da doutrina. 5 — Demais disso, considere-se o que previsto fora no Decreto-lei n? 3.365, de 1941 (Lei de Desapropriar), verbis: «Art. 20. A contestação só poderá versar sobre vicio do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta.» Assim, pois, se o expropriado, ao contestar, atribui vício ao processo judicial, não está a se opor á desistência da ação de • expropriar, que, por si mesma, ineficaciza um ou todos os actos processuais já praticados. Há convergência de fins, entre desistir e argüir vício do processo judicial. 276 R.T.J. — 100 Por outro lado, impugnar o preço oferecido pelo expropriante é preferir não perder a propriedade da coisa desapropriada. Não é, portanto, logicamente, acto obstativo da delistência da ação. Diante disso, num e noutro caso, se não se cria situação jurídica incompatível com o acto de desistir da ação proposta, não há por que se invocar o previsto no artigo 267, g 4?, do Código de Processo Civil, que, por todo o exposto, não incide em tema de expropriação. 6 — Demais, disso, é exemplar da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, acórdão de que fora Relator o eminente Ministro Moreira Alves, de cuja ementa destaco, verbis: «No curso da ação de desapropriação, é cabível sua desistência pelo Poder Público, independentemente do assentimento do expropriado, ressalvada, porém, em favor deste, a via ordinária para o ressarcimento dos prejuizos acaso sofridos. Precedentes do STF. Recurso extraordinário conhecido e provido, para julgar-se extinto o processo» (Ac. de 18.4.1980. 2! Turma. RE 92.440. Minas Gerais). Esse entendimento tem, ainda, o apoio da melhor doutrina. 7 — Diante do exposto, não conheço do recurso. Assim, voto. VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: Sr. Presidente, acompanho o eminente Relator. Não discuto que o poder expropriante possa desistir da ação de expropriação. Mas pode o expropriado reaver os prejuízos que tiver sofrido com a renúncia à desapropriação por ação própria. EXTRATO DA ATA RE 91.408 — SP — Rel.: Min. Firmino Paz. Rectes.: Sandro Pantani e sua mulher (Advs.: Fendo Simão e outros). Recda.: Empresa de Engenharia Ferroviária S.A. — Engefer (Advs.: Alexandre Gaze e outros). Decisão: Não conhecido. Unânime. Presidência do Senhor. Djaci Falcão. Presentes àsão es os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Decio Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 24 de novembro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CRIMINAL N? 91.519 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Soares Mutloz. Recorrente: Ministério Público Estadual — Recorridos: Vicente Osório Giordano e Dimas Moro. Falso testemunho. Retratação: A retratação, em virtude da qual o fato deixa de ser punível, é a verificada, antes de proferida a sentença, no processo em que foram prestadas as falsas declarações e não a manifestada, posteriormente, no processo pelo delito de perjúrio; caso contrário, a punição deste fica ao alvedrio do respectivo réu, em hipótese de ação pública, indisponível tanto para a acusação quanto para a defesa. Recurso extraordinário conhecido e provido. R.T.J. — 100 ACORDA° Vistos. Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, à unanimidade de votos, e na conformidade das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Brasília, 21 de outubro de 1980. — 'rhompson Flores, Presidente. — Soares Muiloz, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Soares Muiloz: Vicente Osório Giordano e Dimas Moro, condenados pelo crime de falso testemunho, a dois anos de reclusão, obtiveram, em grau de apelação, o julgamento da extinção de suas punibilidades, sob o fundamento, acolhido pela maioria da Segunda Câmara Criminal do Tribunal de Justiça de São Paulo, de que a retratação prevista no § 3? do art. 342 do Código Penal não necessita verificar-se no processo em que foi prestado o falso testemunho, podendo dar-se no processo pelo delito de perjúrio. Dai o recurso extraordinário do Ministério Público Estadual, pela letras a e d do permissivo constitucional, alegando negativa de vigência do § 3? do art. 342, do Código Penal e divergência com os acórdãos indicados como paradigmas. O Recurso foi admitido em razão dos dois fundamentos pelo eminente 2? Vice-Presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo. A Procuradoria-Geral da República, em parecer da lavra do ilustre Prof. Francisco de Assis Toledo, opinou pelo conhecimento e provimento do recurso extraordinário, verbis: 277 «Vicente Osório Giordano e Dimas Noro foram denunciados por terem feito afirmações falsas, em depoimentos prestados, como testemunhas compromissadas, perante o Juiz criminal de Campinas. Condenados,no processo que se seguiu, a dois anos de reclusão, com sursis, pelo crime do art. 342, § 1? , do CP, ingressaram com recurso de apelação, provido, por maioria de votos, pelo E. Tribunal de Justiça de São Paulo. No acórdão, que concluiu pela absolvição dos acusados, considerou-se que a retratação, na ausência de uma precisa definição legal, pode ser feita, validamente, até a sentença a ser proferida no segundo processo, isto é, naquele em que se persegue a condenação do agente do falso testemunho. Considerou-se ainda, a circunstância de, no caso, não te•rem os depoimentos falsos, ao ver do acórdão, potencialidade para influir no desfecho do primeiro processo, onde foram prestados. Desse julgado, Interpôs o Ministério Público estadual recurso extraordinário, pelas letras a e d, regularmente admitido, no qual sustenta, com apoio na doutrina, que a regra do § 3? do art. 342 do CP não tem a extensão que lhe deu o tribunal a quo, visto que a expressão «antes da sentença», constante dessa norma, se refere indubitavelmente à sentença do primeiro processo, ou seja, daquele em que se produziu o falso testemunho, não á do segundo, conforme se decidiu. Pensamos, preliminarmente, que o dissídio jurisprudencial não está devidamente demonstrado. Os dois acórdãos citados, um do Tribunal de Alçada Criminal do mesmo Estado, outro do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, versaram hipó- 278 R.T.J. — 100 teses diversas da que foi decidida nestes autos, não se prestando, pois, para confronto. Não obstante, a negativa de vigência do § 3? do Art. 342, por se ter dado a esse preceito uma extensão que ele evidentemente não tem, parece-nos evidenciados. Com efeito; salienta a sentença de primeiro grau (fls. 126) que as retratações dos recorridos só ocorreram neste processo - o segundoquando já nenhuma influência poderiam ter no julgamento da causa em que foram produzidos os falsos testemunhos. Eram retratações inócuas. Por outro lado, afirma igualmente o ilustre juiz, de maneira irrespondível, que os depoimentos falsos, se não tivessem sido descobertos a tempo, pelo juiz do primeiro processo, teriam certamente levado a uma sentença diferente da proferida, diante da conhecida jurisprudência que não considera crime a emissão de cheque sem fundos, com o conhecimento do favorecido, para apresentação ao Banco em data futura (fls.128). Aplica-se, pois, como luva, ao caso a seguinte lição de Nelson Hungria, nos comentários que faz ao mencionado § 3? do art. 342, In verbis: «A retratação, como já se disse, deve preceder à sentença no processo em que foi o crime cometido. Se feita posteriormente, mesmo que a decisão ainda seja passível de recurso, só terá efeito atenuante (art. 47. IV, letra b). Trata-se de circunstância de caráter pessoal e, como tal, incomunicável (art. 26)» (Comentários, IX, pág. 489). Nem se diga, para invocação da Súmula 400, que se está diante de uma «interpretação razoável». A prevalecer a tese do acórdão recorrido, toda e qualquer testemunha poderá prestar depoimentos falsos, na certeza de que, se por isso vier a ser eventualmente denunciada em outro processo (só podera ser em outro processo), bastará retratar-se, neste último, para alcançar a impunidade. Esse entendimento não pode, data venia, ser razoável por instilar total descrédito sobre a já frágil prova testemunhal, como bem salienta, neste tópico, que adotamos, o voto vencido do eminente Desembargador Cunha Bueno. «O 3?, do art. 342 do Código Penal, dispondo que «o fato deixa de ser punível, se, antes da sentença, o agente se retrata ou declara a verdade», à evidência se refere ao processo onde foi prestado o falso testemunho, e não a ação penal dele resultante. A prevalecer o entendimento respeitável da Douta Maioria, e não haveria mais segurança alguma na prova testemunhal, sendo, até mesmo dispensável o compromisso. Se em decorrência do perjúrio sobreviesse processo criminal, bastaria que, antes de sentenciado esse feito, o autor do perjúrio crime esse que já produzira todos seus efeitos - se retratasse. Não foi esse o espírito que norteou o legislador. A retratação, segundo meu modesto entendimento, é admissivel apenas antes da sentença a ser proferida nos autos onde ocorreu o fato. 279 R.T.J. — 100 In casu o que ocorreu não foi uma retratação, porém uma confissão do crime.» (fls. 167/168). O parecer, em conclusão, é pelo conhecimento e provimento do recurso para o fim de restabelecer-se a sentença de primeiro grau.» (fls. 206/209). E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Soares Mtuloz (Relator): Adoto inteiramente os fundamentos do parecer A retratação válida é a manifestada, antes de proferida a sentença, no processo em que foram prestadas as falsas declarações. E o que dispõe o art. 342 § 3?, do Código Penal, consoante a interpretação de Nelson Hungria (Comentários ao Código Penal, 1958, v. IX, págs. 486/487), Magalhães Noronha (Direito Penal, ed. Saraiva, 4? vol., pág. 393), José Frederico Marques (Curso de Direito Penal, ed. Saraiva, vol. III, pág. 427), Bento de Faria (Código Penal Brasileiro, ed. Distribuidora Record, vol. VII, pág. 181), entre outros. O dispositivo em referência não comporta o entendimento que lhe deu o acórdão recorrido, porque ele importa em tornar a punição do falso testemunho ao alvedrio daquele que, como tal, foi denunciado em ação pública, indisponível tanto para a acusação quanto para a defesa. Outrossim, não configura fundamento suficiente em si a observação final do acórdão recorrido de que a circunstância de os ora recorridos estarem, presentes, ou não, ao ato da entrega dos cheques era irrelevante, não podendo, a não ser por rigorismo Kantiano, dar motivo ao movimento da máquina penal. E que esse argumento, se houvesse influído na decisão da causa, teria conduzido à absolvição dos réus, por não configurado o crime do art. 342 do Código Penal, e não, como ocorreu, à extinção do processo com fundamento no § 3?. Ademais, como bem acentua o parecer, as declarações falsas somente não influiram no desfecho do processo, onde foram prestadas, porque foram descobertas a tempo pelo Juiz do primeiro processo Se assim não houvesse ocorrido, elas teriam dado causa a absolvição da emitente dos cheques sem provisão de fundos, diante da conhecida Jurisprudência que não considera crime a emissão de cheques sem fundos, com o conhecimento do favorecido, ' para apresentação ao Banco em data futura (fls. 308). Ante o exposto, conheço do recurso pela letra a e lhe dou provimento, para restabelecer a sentença de primeiro grau. EXTRATO DA ATA FtECr.- 91.519 — SP — ReI.: Min. Soares Mufloz. Recte.: Ministério Público Estadual. Recdo.: Vicente Osório Glordano e Dimas Moro (Adv.: Ozeni Maria Moro). Decisão: Conhecido e provido, decisão unânime. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mufoz e Rafael Mayer. SubprocuradorGeral da República, Dr. José Resek. Brasília 21 de outubro de 1980. — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. R.T.J. — 100 280 RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.627 — RS (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Ana Maria Klein de Castro — Recorrida: Esther Vieira de Castro. Recurso extraordinário baseado unicamente na letra d, do Inc. III, do art. 119, da Constituição Federal. Não cabe ao Presidente do Tribunal, no despacho em que aprecia a sua admissão, aditar a fundamentação constitucional, fugindo á sistemática do próprio recurso. Precedente do S.T.F.. Dissídio jtuisprudencial inviável, consoante a Súmula 369. Recurso extraordinário não conhecido. ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos, e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, não conhecer do recurso Brasília, 26 de setembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente e Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Djaci Falcão: Decidiu, em apelação, o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul: «Relatório Esther Vieira de Castro ajuizou, nesta Capital, ação de anulação de casamento contra Ana Maria Klein, alegando o seguinte: diz que casou com Olmiro Deniz de Castro, em 11.7.36, não tendo ambos qualquer impedimento, na época, para o matrimônio, que foi objeto de trasladação. Falecendo o marido em 8-9-75, tomou a autora conhecimento de que ele havia contraído novas núpcias, em 27-12-50, com a requerida. Sustenta que sendo este casamento posterior ao seu e, estando, por isso, seu marido impedido de consociar-se nova- mente, aquele ato é nulo. Pleiteia, assim, sua decretação. Acrescenta, por fim, que de seu casamento com Olmiro, possui uma filha. Juntou os documentos de fls. 4/7. Citada, a requerida contestou. Sustenta que o casamento de Esther com Olmiro foi realizado em Rivera, Uruguai, não em presença de autoridades consulares brasileiras, e só foi objeto de trasladação em 17.5.76 (quarenta anos depois), em descumprimento, pois, ao disposto no art. 83 da. Lei 4.857/39. Assim, quando a contestante casouse, não havia nenhum impedimento, sendo, por isso, válido seu casamento. Esclarece que o primeiro casamento de Olmiro foi realizado fora das fronteiras brasileiras, numa tentativa de ludibriar o Regulamento Interno do Exército Nacional, que proíbe casamento de praça-de-pré, posto que ele ocupava na época. Não seria válida a assertiva da autora de que não havia impedimento para o seu casamento. Prossegue dizendo caracterizada a má-fé da autora que só depois da morte do pretenso marido, velo a reclamar e tentar legalizar direito que não tem, visando apenas usufruir vantagem financeira. Por outro lado, sustenta que sempre viveu na ignorância da existência de matrimônio anterior de seu marido. Em reconvenção pretende a R.T.J. — 100 anulação da averbação do casamento da autora com Olmiro, els que realizado quando, no Brasil, havia impedimentos (ele militar e ela menor de idade) e por não ter sido averbado no prazo legal . Além disso, não poderiam ter casado perante autoridade estrangeira quando não eram lá domiciliados. Nomeado, pronunciou-se o Curador ao Vínculo assim como o representante do Ministério Público. Saneado o feito, realizou-se a audiência de instrução e julgamento. A fls. 43/44, o Dr. Juiz a quo, proferiu sentença para julgar procedente a ação e improcedente a reconvenção, declarando nulo o casamento de Olmiro Deniz de Castro e Ana Maria Klein. Condenou a ré ao pagamento das custas e honorários advocaticos em trés salários mínimos. Recorreu de oficio ao Tribunal. Irresignada, apelou a ré. Preliminarmente, reporta-se às prefaciais argüidas na contestação. No mérito, propugna a improcedência da ação e a procedência da reconvenção. O recurso foi respondido pela apelada. Manifestaram-se o Dr. Curador e o representante do Ministério Público. Preparados, subiram os autos. Em 2? grau, o parecer do Dr. Procurador da Justiça é pelo provimento integral da apelação. É o relatório. A douta revisão. Porto Alegre, 7 de junho de 1978 — Paulo Boecicel Velloso, Relator» (fls. 73 a 74). «Casamento. Nulidade por bigamia. Casamento (o precedente) realizado no Uruguai, sendo 281 os cônjuges brasileiros e em presença da autoridade local, no ano de 1936. Código Civil, art. 204. Validade do ato, provado com certidão do Registro Civil. Registro Civil. Ausência de trasladação desse casamento no Registro Civil do domicílio brasileiro dos nubentes, o que só feito após o falecimento do cônjuge varão. A exigência de publicidade em território nacional provinha já da Lel 181, de 24 de janeiro de 1890, art. 47, { 1? e constou do Decreto 18.542 de 24 de dezembro de 1928, art. 8? vigente na época. Tal registro, porém, é feito apenas para a eficácia do casamento em território nacional, não lhe retirando a validade e existência. Assim, o segundo casamento, realizado no Brasil, entre o mesmo cônjuge varão e outra mulher, é nulo. Ele não ignorava já ser casado. A omissão da trasladação decorreu de culpa exclusiva do cônjuge varão, que com isso, não se haveria de beneficiar. O cônjuge mulher do segundo casamento, realizado no Brasil, declarado nulo nesta ação, eventualmente poderá pleitear em seu favor o reconhecimento da putatividade, resguardando-se os seus efeitos civis em favor dela e dos filhos até o dia da sentença anulatória. Código Civil, art. 221, único. Apelação Clvel — Terceira Câmara Civel — N? 30.293 — Porto Alegre.Exmo. Sr. Dr. Juiz de Direito da 5! Vara de Familia e Sucessões, Apresentante: Ana Maria Klein de Castro, Apelante; Esther Vieira de Castro, Apelada. 282 R.T.J. — 100 Acórdão Vistos, relatados e discutidos os autos, Acordam, em Terceira Câmara Civil, à unanimidade, negar provimento à apelação e confirmar a sentença em reexame, de conformidade com as notas taquigráficas Inclusas e que integram o presente acórdão. Custas, na forma da lei. Participou do julgamento, além dos signatários, o Exmo. Sr. Pio Flori de AzeveclO. Porto Alegre, 22 de junho de 1978 — Paulo Boeckel Venoso, Presidente e Relator — Ney da Gama Ahrends, Relator: Des. Paulo Boeckel Venoso, (Leu o relatório de fls. 73/74) Voto O Presidente Des. Paulo Boeckel Velloso, Relator — A autora apelada, Esther Vieira de Castro, tendo casado com Olmiro Deniz de Castro no ano de 1936 na cidade de Riverá, República Oriental do Uruguai, perante a autoridade local competente, ato esse trasladado para o Oficio da 1? Zona desta CaPitai em 27-5-76 (fls. 4), ajuizou esta ação de anulação de casamento contra Ana Maria Klein, por ter esta se casado com o mesmo Olmiro Deniz de Castro, a 27 de dezembro de 1950, nesta Capital, dizendo-se ele solteiro. Ele faleceu no ano de 1975. A ré contestou, sustentando ter sido legalmente casada com o falecido Olmiro perante as leis brasileiras, tanto que nunca houve o indispensável registro, na Comarca de Santana do Livramento, no prazo de três meses, do referido casa- mento celebrado no Uruguai (Decreto 4.857/39, art. 82) e só depois de falecido Olmiro é que a autora promoveu a trasladação do ato para um Ofcilo desta Capital. Em reconvenção, sustentou a nulidade do casamento da autora, porque estavam impossibilitados de casar no Brasil, sendo ela menor e ele militar, praça-de-pré; além disso, não ocorreu a averbação no Registro Civil, no prazo legal. A sentença recorrida partiu da consideração de que, à época do primeiro casamento não estavam em vigor o Decreto 4.857 e nem a (Nova) Lei de Introdução ao Código Civil e muito menos, a Lei 6.015. O Código Civil, em seu art. 204, dispondo sobre o casamento celebrado no estrangeiro não impunha requisitos formais para a convalidação do ato no Brasil, remetendo à lei estrangeira apenas no tocante à prova do casamento. Declarou a nulidade do segundo casamento e submeteu a espécie a reexame. Dai o recurso da ré e reconvinte. Não tem nehuma consistência o argumento de que, sendo menor a nubente ( tinha 18 anos), não seria válido o casamento realizado no Uruguai no ano de 1936. Seria necessário, antes de mais nada, demonstrar o teor da vigência do direito estrangeiro, em termos de comprovar a existência e gravidade do vicio inquinado, o o que não foi feito; pois tal casamento se prova de acordo com a lei do pais onde foi celebrado (art. 204 do C. Civil). Além de que, se a argüição tiver pertinência com a falta de consentimento do pai ou tutor (nem mesmo se demonstrou não ter havido), não seria a reconvinte a parte competente para tanto (Código Civil, art. 178, § 4?, II). Também sem qualquer relevo a alegação de ser Olmiro praça-de-pré, impedido de casar no Brasil. Tal impedimen- R.T.J. — 100 to, na verdade, jamais existiu na lei civil, tratando-se apenas de prescrição regulamentar, que, infringida, poderia acarretar-lhe determinadas sanções, mas sem reflexo algum na validade e eficácia do ato civil praticado. O Código Civil, em seu art. 204, contém regra de prova, relativamente ao casamento celebrado fora do Brasil, estabelecendo que ele se prova de acordo com a lei do país onde se celebrou. E em seu Parágrafo único prevê a hipótese de ter sido contraído o casamento perante agente consular (o que não é o caso dos autos). Em seu caput, pois, aplicou a regra locas legit actum, podendo a prova consistir em certidão do Registro Civil (como no presente caso), assim como por quaisquer outros modos admitidos no pais em que o casamento foi celebrado (J.M. de Carvalho Santos, Código Civil Interpretado, Comentários ao art. 204). No que concerne ao registro desse casamento no Brasil, a legislação respectiva é bastante antiga e contemporânea, de certo modo, à implantação do Registro Civil, conseqüência da secularização do instituto, uma das importantes conquistas republicanas. Assim, já a Lei n? 181, de 24-1-1890, em seu art. 47, 1? dispunha que se ambos ou um só dos contraentes é brasileiro (em casamento celebrado no estrangeiro) o casamento pode ser feito na forma usada no pais, onde foi celebrado; 4?. Os mesmos casamentos devem ser registrados no Brasil, á vista dos documentos de que trata o art. 11, três meses depois de celebrados ou Um mês depois que os cônjuges, ou ao menos um deles, voltar ao país. Assim, embora não vigorasse o Decreto n? 4.857 (que teve vigor de lei), nem a nova Lei de Introdução 283 ao Código Civil ou a recentissima Lei 6.015 (Registros Públicos), já existia norma legal e que, dizendo respeito apenas a uma formalidade registraria, não se poderia considerar revoltada com o advento do Código Civil, que nada dispôs em contrário, nem regulou a respeito (Código Civil, art. 1.807). Além disso, o Decreto 18.542, de 24-12-1928, Regulamento dos Registros Públicos, vigente na época do primeiro casamento, dispunha no art. 8? o seguinte: *0 casamento de brasileiros, feito no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou por cônsules brasileiros, deverá ser registrado quando um ou os dois cônjuges vierem ao Brasil, dentro do prazo de três meses, no Cartório do respetivo domicilio, e, em sua falta no 1° Oficio do Distrito Federalo. No seu ã único define que tal registro constará de um termo assinado pelo oficial e pelo cônjuge apresentante ou procurador especial, no qual se incluirá a transcrição do documento ou, quando for o caso, de sua tradução, devidamente autenticada*. Impõe-se determinar qual a finalidade e o alcance dessa norma, bem como as conseqüências do seu descumprimento, o que constitui o fulcro da demanda. Tal registro, sem dúvida, deve ser efetuado no interesse da publicidade do casamento, mesmo que não observado o prazo do art. 82 do T. I do Decreto 4.857-39 (ou da Legislação anterior), como bem decidiu a 6? Câmara Civel do Tribunal de Justiça de São Paulo, In Revista dos Tribunais 384/136. Examinando a questão da publicidade no Código Civil Brasileiro, Pontes de Miranda observa que esta se concretiza através da formalização registraria, distinguindo-se a celebração, que é ato jurídico do 289 R.T.J. — 100 casamento (Tratado de Direito Privado, $ 794)- aik data do registro é que estabelece a irradiação dos seus efeitos civis, de modo que, tendo havido duas celebrações, é eficaz a que primeiro se registrou». Mais adiante, faz considerações sobre o casamento de brasileiros feito no estrangeiro, perante as respectivas autoridades ou os cônsules brasileiros e que deve ser registrado quando um ou os dois cônjuges vierem ao Brasil, dentro do prazo de três meses, no cartório do respectivo domicílio e, em sua falta, no do 1? ofício do Distrito Federal, e observa que a regra do único do art. 82 do Decreto 4.857/39 («Esse registro constará de um termo assinado pelo oficial pelo cônjuge apresentante ou procurador especial, no qual se incluirá a transcrição do documento, ou, quando for o caso, da sua tradução devidamente autenticados») é apenas para a eficácia, pois, «a despeito da fixação de prazo, não se tira existência, ou validade» e «faz-se eficaz no Brasil totalmente, ainda que se registre depois dos três meses» (ob. cit., 794, n? 4). Ora, dentro dessa linha de raciocínio, tal casamento, o celebrado no Uruguai, não poderia ser considerado nulo por não ter sido registrado no devido tempo e nem mesmo se jamais houvesse sido registrado. No plano da existência e validade, ele sempre existiu e foi válido. A discussão só pode se circunscrever ao plano da eficácia. De outra banda, o segundo casamento, realizado no Brasil, por sem dúvida é nulo. Olmiro somente logrou contrai-to fraudando a presumível boa-fé do outro cônjuge e dos funcionários do Juízo de Casamentos, dizendo-se solteiro e desimpedido. Relativamente a ele, em nada importava fosse ainda o precedente casamento ineficaz no Brasil, por defeito de formalidade a que, por sinal, deu causa, omitindo-se na trasladação do ato para o registro local. Casado estava, validamente casado e não poderia tornar a casar. A apelante, assim, somente socorre o disposto no art. 221, único do Código Civil, na presunção de que estivesse de boa-fé ao celebrar o casamento, resguardando-se os seus efeitos civis em favor dela e dos filhos até o dia da sentença anulatória, pois ao que tudo leva a crer, relativamente a ela, ocorreu casamento putativo. Nessas condições, nego provimento ao recurso voluntário e confirmo a sentença recorrida. Dr. Pio Flori de Azevedo — Também confirmo a sentença, pelo fundamentos trazidos agora por V. Exa.. O impedimento para o novo casamento existia, diante da validade do anterior casamento do varão. Nessas condições, apenas pode resguardar-se a posição da ré, se tiver contraído o casamento de boa-fé, como V.Exa. ressaltou. Nego provimento à apelação, e, em reexame necessário, confirmo a conclusão da sentença. Des. Ney da Gama Ahrends — Acompanho o brilhante voto de S. Exa.,» (fls. 76 a 84). Irresignada, Ana Maria Klein de Castro interpôs recurso extraordinário com base no art. 119, inc. III. letra d, da Constituição Federal, invocando a apelação cível n? 24.004, de Quarai, julgada pela 4? Câmara Cível do Tribunal de Justiça dá Rio Grande do Sul (ver fls. 87 a 94). Após a manifestação do Ministério Público local pelo descabimento do recurso ( fls. 97 a 98), foi este admitido pelos Des. Jorge Ribas Santos, como se vê do seguinte despacho: R.T.J. — 100 «Vistos, etc 1. A ora recorrida, «Esther Vieira de Castro, tendo casado com 01miro Deniz de Castro no ano de 1936, na cidade de }tivera, República Oriental do Uruguai, perante autoridade local competente, ato esse traslado para o Oficio da le Zona desta Capital em 27-6-76 ( fls. 4), ajuizou esta ação de anulação de casamento contra Ana Maria Klein, por ter esta se casado com o mesmo Olmiro Deniz de Castro, a 27 de dezembro de 1950, nesta Capital, dizendo-se ele solteiro. Ele faleceu no ano de 1975» ( fls. 79). A ora recorrente, Ana Maria Klein, contestou a ação «sustentando ter sido legalmente casada com falecido Olmiro perante as leis brasileiras, tanto que nunca houve indispensável registro, na Comarca de Santana do Livramento, no prazo de três meses, do referido casamento celebrado no Uruguai (Decreto 4.857/39, art. 82), e, só depois de falecido Olmiro, é que a autora promoveu a trasladação do ato para um Oficio desta Capital» (fls. 79). Em reconvenção, Ana Maria pleiteou a «anulação do registro», de casamento, «junto ao Cartório de Registro Civil da 1! Zona de Porto Alegre» (fls. 18), argumentando, em suma. que Olmiro e Esther estavam impossibilitados de casar no Brasil, sendo ela menor e ele militar, praça-de-pré; além disso, não ocorreu a «averbação» no Registro Civil, no prazo legal. Diz que esse casamento inexiste. A sentença julgou procedente a ação e improcedente a reconvenção (fls. 43 e 44). Houve apelação, interposta pela ré, à qual a Egrégia Terceira Câmara Cível negou provimento. Esta a ementa do acórdão: 285 Casamento. Nulidade por bigamia. Casamento (o precedente) realizado no Uruguai, sendo os cônjuges brasileiros e em presença de autoridade local, no ano de 1936, Código Civil, art. 204. Validade do ato, provado com certidão do Registro Civil. Registro Civil. Ausência de trasladação desse casamento no Registro Civil do domicilio brasileiro dos nubentes, o que só feito após o falecimento do cônjuge varão. A exigência de publicidade em território nacional provinha já da lei de 24 de janeiro de 1890, art. 47, 1? e constou do Decreto 18.542, de 24-12-1928, art. 8? vigente na época. Tal registro, • porém, é feito apenas para a eficácia do casamento em território nacional, não lhe retirando a validade e existência. Assim, o segundo casamento, realizado no Brasil, entre o mesmo cônjuge varão e outra mulher, é nulo. Ele não ignorava já ser casado. A omissão de trasladação decorreu de culpa exclusiva do cônjuge varão, que com isso, não se haveria de beneficiar. O cônjuge mulher do segundo casamento, realizado no Brasil, declarado nulo nesta ação, eventualmente poderá pleitear em seu favor o reconhecimento da putatividade, resguardando-se os seus efeitos civis em favor dela e dos filhos até o dia da sentença anulatória. Código Civil, art. 221, único» ( fls. 76). Inconformada, Ana Maria Klein interpôs o presente recurso extraordinário, «com supedfineo no art. 119, III, d da Constituição Federal» (fls. 87). Preliminarmente, argüi sua ilegitimidade passiva, uma vez que a 286 R.T.J. — 100 ação deveria ser dirigida contra Olmiro, enquanto vivia. Tendo falecido, não havia mais casamento, extinto o vinculo matrimonial. Cita o art. 315, § único, do Código Civil. Critica o aresto recorrido, reproduzindo um acórdão da Egrégia Quarta Câmara Civel que, segundo a recorrente, esposara tese diversa. Argüi a decadência do direito de promover a «averbação» do casamento celebrado no estrangeiro, «perante autoridades locais, logo incompetentes, segundo a lei brasileira, 40 anos depois de realizado... pois, o prazo que a lei lhe dava era de três meses, e não de 40 anos (fls. 90). Repete, após, ter sido infringido o art. 315, § único, do Código Civil. Argumenta que a «averbação», no registro público, do casamento celebrado no exterior, não é mera formalidade registrária, como pretende o acórdão, acrescentando que esse «é até contraditório», quando *traz á colação lição do douto Pontes de Miranda, assim: A data do registro é que estabelece a irradiação dos seus efeitos civis, de modo que, tendo havido duas celebrações, é eficaz a que primeiro se registrou». Prossegue a recorrente: «Então, cabe uma pergunta: Qual foi o primeiro registro realizado no Brasil? Certamente em resposta, podemos afirmar, sem sombra de dúvida, que não foi o celebrado no Uruguai. Perante a Lei brasileira inexistia o matrimônio celebrado no estrangeiro, pela ausência de registro no prazo legal. Aqui, no Brasil, Olmiro era solteiro quando casou com a Recorrente; válido, portanto, seu casamento (fls. 91). Reporta-se, após, transcrevendoos, aos pronunciamentos do Dr. Curador ao Vínculo e dos órgãos do Ministério Público, de fls. respectivamente, 31, 33 e 71. O Parecer do Dr. ProcuradorGeral da Justiça é no sentido de não admissão do recurso (fls. 97 a 98). Suscita, o Parecer da Douta Procuradoria-Geral da Justiça, a preliminar de não cabimento deste recurso, nos termos do art. 308, VIII, do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, por não atingir o valor atribuído á causa a alçada regimental. Trata-se, porém, na espécie, de ação que visa à anulação de casamento, ação, portanto, de valor inestimável, como o são, em geral, as ações de estado. A não incidência, no caso daquela norma regimental, é recdnhecida pelo Supremo Tribunal, como se infere do voto do Eminente Ministro João Leitão de Abreu no RE n? 85-328-MG, in verbis: a regra do art. 308, VIII, do Regimento Interno aplica-se sempre que, não incindindo, para tornar inadmissível o recurso extraordinário, nenhuma das outras regras previstas nesse preceito regimental, se tratar de causa cujo valor não seja inestimável. Ora, na hipótese, nem se acha afastada a admissibilidade do recurso extraordinário pelo art. 308, IV, d, nem é inestimável o valor da causa, que, pelo contrário, possui declarado conteúdo econômico (RTJ, vol. 83, págs. 929 e 930). Resulta, claramente, do voto do Eminente Ministro, que a regra regimental, sobre a alçada, não alcança as causas de valor inestimável, como é a presente. Afasto, por isso, a preliminar ora apreciada. A recorrente, no preâmbulo da petição do recurso, fundou-o na le- R.T.J. — 100 tra d do permissivo constitucional, e, adiante, aponta acórdão da Egrégia Quarta Câmara Clvel deste Tribunal de Justiça, como paradigma. Aliás, esse acórdão é o único por ela mencionado. Sendo do mesmo Tribunal, não se presta para cotejo, conforme a Súmula 369. Além disso, o aresto trazido como paradigma não tratou da mesma espécie, pois, o casamento nele em foco, embora celebrado no estrangeiro, o fora em data bem mais próxima, pelo que as questões pertinentes foram julgadas às luz de outras normas, que não aquelas vigorantes em 1936. 4. Embora sem aludir, na petição do recurso ao permissivo constitucional da letra a, a recorrente, ao longo de sua argumentação, sustentou haver o aresto recorrido violado dispositivos legais, como consta do relatório. Impõese, por isso, apreciar tais alegações. A primeira, diz com a negativa de vigência do art- 315, único (hoje revogado pela Lel n? 6.515, de 26.12.77), do Código Civil, porque, dissolvida a sociedade conjugal, que nascera do casamento realizado no Brasil, pela morte do cônjuge varão, carecia a recorrida de ação para anulá-la. Registro, desde logo, que a matéria não foi ventilada no acórdão recorrido, de sorte que incide a Súmula 282. Alega, depois, que o acórdão recorrido negou vigência aos dispositivos legais que determinam o registro no Brasil, no prazo de três Ineses, a contar do regresso de um dos cônjuges, do casamento celebrado no estrangeiro, uma vez que admitiu registro feito cerca de 29 anos após. 287 O v. acórdão enfrentou esta questão, do prazo para o registro do casamento, à luz do disposto no art. 47, g 1?, da Lel n? 181, de 24-11890 e, também, porque vigente à época do que é discutido nesta ação, do Decreto n? 18.542, de 2412-1928, art. 8?. E entendeu que «Tal registro, sem dúvida, deve ser efetuado no interesse da publicidade do casamento, mesmo que não observado o prazo do art. 82... do Decreto 4.787/39 (ou da legislação anterior), como bem decidiu a 6! Câmara Civel do Tribunal de Justiça de São Paulo, in Revista dos Tribunais, 384/136» (fls. 82). Em outro aresto, do mesmo Tribunal, igual entendimento foi acolhido, como se vê deste trecho: «A finalidade do registro, que é a publicidade do ato, além de se tornar, no caso, um meio de prova e de conservação de documento estrangeiro que afeta a situação de brasileiro, envolve interesse de ordem pública bastante para evidenciar que o lapso de tempo estatuído em lei para a providência não é prazo de decadência ou de prescrição, mas, antes, forma de ativar a diligência das partes. O registro, dado o seu alcance social, far-se-á sempre, dentro ou fora daqueleS prazo, cuja inobservância só poderá acarretar a sanção pecuniária prevista no art. 55, da Lel de Registros Públicos». (R.T., vol. 279/278). O acórdão recorrido apóia-se, ademais, em Pontes de Miranda, que chancela o registro mesmo após o prazo de três meses (cf. fls. 83). Assim, a interpretação dada à norma legal pelo aresto recorrido, quanto à natureza do prazo nela fixado, é de ser tida, ao menos como razoável, invocando-se, em conseqüência, a Súmula 400. 288 R.T.J. — 100 Mas, afora o ponto relativo ao prazo para o registro do casamento de brasileiro celebrado no exterior, a recorrente aflora, ainda, a questão do efeito desse registro, argumentando que o v. acórdão 'é até contraditório', quando 'traz à colação lição do douto Pontes de Miranda, assim: A data do registro é que estabelece a irradiação dos seus efeitos civis, de modo que tenho havido duas celebrações, é eficaz a que primeira se 'registrou'. Aduz, então, que o primeiro registro feito no Brasil não foi o do casamento celebrado no Uruguai (fls. 91). Sustenta, ainda, através dos pareceres, que transcreve na petição do recurso, dos órgãos do Ministério Público, que o referido registro somente poderia gerar efeitos jurídicos caso traslado antes do casamento impugnado: efetivado 'a posteriori' é inteiramente ineficaz' ( fls. 93). O que o venerendo acórdão entendeu, em suma, foi que o registro de casamento no Brasil exigido nos dispositivos mencionados, tinha efeitos apenas no plano de eficácia não atingindo sua existência, nem sua validade. Por isso, disse: fosse ainda o precedente casamento ineficaz no Brasil', não importava a Olmiro, que 'casado estava, validamente casado e não poderia tornar a casar. Estou em que, assim decidindo, o v. aresto negou vigência aos dispositivos citados da legislação dos Registros Públicos. O Código Civil, ao dispor sobre o casamento celebrado no Brasil, distingue o ato da celebração e o ato do registro. No art. 194, disciplina aquela e, no artigo 195, reza: 'Do matrimônio, logo depois de ciebrado, se lavrará o assento no livro de registro'. Pontes de Miranda, no Tratado de Direito Privado, vol. 7, pág. 344, discorre sobre a função do Registro Civil para o casamento, apontando o 'erro' dos que entendem que o registro não é preciso para que ele exista. E. antes, dissera que a data do registro 'é que estabelece a irradiação dos seus efeitos civis', acrescentando: '... tendo havido duas celebrações, é eficaz a que primeiro se registrou'. (ob. cit., pág. 343). Chama a atenção para a Lei n? 1.110, reguladora do casamento religioso, quanto aos efeitos civis, frisando que nela 'mais patente ficou a função do registro civil: ... e a convocação de novo casamento, civil ou religioso, depois de outro que se não registrou, não importa nulidade, mas, tão-só, possível incidência da lei penal, se essa o estatuir' (ob. cit., pág. 343). As normas da legislação de Registros Públicos — art. 8?, do Decreto n? 18.542, de 24-12-1928, vigente ha Coca, repetida no art. 82, do Decreto n? 4.857/3% sobre o registro, no Brasil, do casamento, celebrado no exterior, sendo os cônjuges brasileiros insere-se, portanto, no sistema da publicidade do casamento adotado pelo Código Civil. Entretanto, o v. aresto, entendendo que o cônjuge varão, que se casara no Uruguai, mas cujo casamento não fora registrado, não podia casar-se civilmente aqui, retirou qualquer efeito à norma legal determinadora do registro. Em nível de despacho da admissão do apelo extremo, tenho por demonstrado a negativa de vigência do dispositivo em causa de lei federal, admitindo, nesse ponto, o recurso pela letra a, do art. 119, III da Constituição Federal. Vista às partes pelos prazos e para os fins legais» (fls. 99 a 108). R.T.J. — 100 Oferecidas as razões de fls. 113 a 115 e contra-razões de ris. 118 a 122, opinou a Procuradoria-Geral da Justiça pelo não conhecimento do recurso (fls. 124 a 128). Perante esta Corte foi oferecido o seguinte parecer: «1. Conforme bem salientou o Ministério Público local em seu pronunciamento, fls. 126, o recurso extraordinário foi interposto com apoio na letra d, somente, trazendo ao dissídio acórdão do mesmo Tribunal, encontrando, portanto, o obstáculo da Súmula 369. Sem dúvida, de acordo, ainda, com tal parecer, aplicável ao caso é o acórdão proferido no RE 81.905. Relator Ministro Rodrigues Alckmin; RTJ 79/962, no sentido • de, verbis, `não competir, aos Presidentes de Tribunais, postularem pelos litigantes. Assim, posto o recurso pela letra d descabido é que se pretenda que também seria ele admissivel pela letra a, fundamento que o recorrente não invocou. 2. — Somos, nos termos da Súmula 369, pelo não conhecimento do recurso extraordinário. Brasília, 02 de setembro de 1980 — Mauro Leite Soares, Subprocurador-Geral da República (fl. 132). VOTO O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator: Ficou esclarecido no relatório que o recurso extraordinário se baseou apenas na divergência jurisprudencial (letra d, do inc III, do art. 119, da Constituição Federal). Acontece que o único acórdão trazido à colação e do mesmo Tribunal de Justiça. A toda evidência não enseja a sua admissão, segundo a Súmula 369, in verbis: «Julgados do mesmo tribunal não servem para fundamentar o 289 recurso extraordinário por divergência jurisprudencial». E verdade que o ilustre Desembargador Vice-Presidente teve a iniciativa de admitir o recurso pela letra a do permissivo constitucional, apesar da recorrente haver invocado, tãosomente, a letra d. Conforme afirmou, com precisão, o admirável e saudoso Ministro Rodrigues Alckmin: «Interposto o recurso extraordinário com fundamento unicamente em uma das alíneas do permissivo constitucional, não toca ao Presidente do Tribunal, ao admiti-lo, aditar-lhe fundamentação em outra alínea» (RE 81.905, in RTJ 79/962). Ao recorrente é que cabe indicar um ou mais dos fundamentos constitucionais imprescindíveis ao cabimento do recurso (art. 304 do Regimento Interno do S.T.F.). Sem dúvida, no particular, o despacho fugiu à sistemática do recurso extraordinário. Diante do exposto, não conheço, preliminarmente, do recurso. EXTRATO DA ATA RE-91.627 — RS — Rel.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Ana Maria Klein de Castro (Advs.: José Claudino Alves de Oliveira e outros). Recda.: Esther Vieira de Castro (Adv.: Mário Kruse). Decisão: Não conhecido. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreirá Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 26 de setembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. R.T.J. — 100 290 RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.633 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS p/INPS — Recorrida: Tecelagem Fimetex Ltda Massa falida de, p/seu Síndico. Falência. Pedido de restituição de contribuições previdenciárias retidas e não recolhidas pelo empregador aos cofres da Previdência. Sua restituição pelo falido, eis que não se enquadra como crédito de natureza fiscal. Precedente do STF. Recurso extraordinário provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, em conhecer do recurso e darlhe provimento nos termos do voto do Ministro Relator. Brasília, 7 de outubro de 1980 — Djaci Falcão — Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão — Apreciando a interposição do recurso disse o Presidente Young da Costa Manso: «I — Trata-se de pedido de restituição de dinheiro, em falência previdenciárias), (contribuições que a sentença, confirmada em segunda instância, repeliu, sob fundamento de carência de ação (aresto unânime de fls. 25). 2 — O vencido não se conforma e interpõe recurso extraordinário (fls. 28), com base no art. 119, III, letras a e d, da Constituição argüindo relevância da questão federal. A Procuradoria-Geral da Justiça opinou pelo indeferimento (fls. 45). 3 — O valor da causa (Cri 22 047,27) não atinge o limite da alçada, que, na hipótese, é de Cr$ 110.640,00 (cem vezes o saláriomínimo de Cri 1.106,40, estabelecido no Dec. 79.610, de 28-4-77, quando se apresentou o pedido em Juízo — fls. 05), à vista da uniformidade, dos julgamentos das instâncias ordinárias (Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, art. 308, VIII). O recurso, pois, é inadmissível. 4 — Não me competindo, todavia, examinar a argüição de relevância (Regimento cit., art. 308, 3?), mando que se forme o respectivo instrumento» (fls. 48 a 49). O recurso veio a ser processado por força da Argüição de Relevância 4.253-5 (ver (ls. 67 a 71 e 77 a 78). Perante esta Corte a Procuradoria-Geral da República manifestou-se pelo provimento do recurso (fls. 82). VOTO O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator) — E o seguinte o acórdão recorrido: R.T.J. — 100 Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Ove! 268.707, da Comarca de Inaaiatuba, em que é apelante Instituto Nacional de Previdência Social, sendo apelada M. F de Tecelagem Fimetex Ltda.: Acordam, em 1? Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, por votação unânime, negar provimento ao recurso. O art. 157, da Lei 3.807, de 26-860, mantendo a tradição do direito anterior, assegurava ao INPS o direito à restituição das quantias descontadas dos salários dos empregados em favor da autarquia, nos processos falimentares, assim dispondo: São privilegiados nos processos de falência, concordata ou concurso de credores, os créditos das instituições de previdência social relativos às contribuições devidas pela empresa, cabendo às mesmas instituições, o direito à restituição de quaisquer importâncias arrecadadas pelas empresas, a titulo de cota de previdência. O dispositivo, em questão, todavia, foi alterado pelo art. 25, do Decreto-lei 66, de 21-11-66, passando a viger com a seguinte redação: Os créditos da previdência social relativos a contribuições e seus adicionais ou acréscimos de qualquer natureza, por ela arrecadados, inclusive a cota de previdência, a correção monetária e os juros de mora correspondentes, nos processos de falência, concordata e concurso de credores, estão sujeitos às disposições atinentes aos créditos da União, aos quais estão equiparados, seguindo-se a estes na ordem de prioridade (art. 157, da Lei 3.807, de 26-8-60, publicada em cumprimento ao art. 31, da Lei 5.890, de 8-6-73, através da Portaria 3.219, de 4-7-73, do Gabinete do Ministro do Trabalho e Previdência Social, In DOU de 12 de julho de 1973, Suplemento). 291 A equiparação aos créditos da União retirou, portanto, das instituições de previdência social a restituição, autêntico privilégio especial, nos processos falimentares. A questão, atualmente, se resolve pelos arts. 186 e 188 da Lei 5.172, de 25-10-66 (CTN), cabendo ao apelante prioridade para o recebimento dos seus créditos logo após os da União, situando-se, assim, em terceiro lugar na ordem geral, uma vez que aos da União, preferem os de natureza trabalhista (art. 186). Por conseguinte, à falta de amparo legal, desde o advento do Decreto-lei 66, de 12-11-66, aos créditos do Instituto Nacional de Previdência Social, não se aplica o direito à restituição, previsto no art. 76, da Lei de Falências. Ante o exposto, negam provimento ao apelo. São Paulo, 18 de abril de 1978 — Cardoso Rolim — Presidente com voto — Mendes Pereira — Relator» (fls. 25 a 26). Como se vê, trata-se de pedido de restituição formulado pelo então INPS, referentes a descontos procedidos pela falida de seus empregados e sócios, e não recolhidos ao órgão arrecadador competente. O recurso merece conhecimento, sobretudo diante da divergência com precedentes desta Corte. Assim, no RE 86.069, relatado pelo eminente Ministro Soares Mufioz, ficou assentado: «Falência — O falido exerce função de Coletoria referentemente às contribuições previdenciárias que incidem sobre os salários dos empregados. Legitimo é o pedido de reivindicação formulado pelo INPS. Recurso extraordinário co-nhecido e provido, para deferir a restituição requerida. 292 R.T.J. — 100 n Acórdão Vistos, etc. Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em 1! Turma, à unanimidade de votos e na conformidade das notas taquigráficas conhecer e dar provimento ao recurso. Brasília, 1? de setembro de 1978 — Antonio Neder — Presidente — Soares Muhoz — Relator. Relatório O Sr. Ministro Soares Munoz — O despacho do ilustre Presidente Mello Júnior, do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, expõe a espécie: «O Instituto Nacional de Previdência Social interpõe recurso extraordinário, com fundamento nas letras a e d do texto constitucional por negar o acórdão deste Tribunal vigência à Lei 3.807, de 26-8-60 com alterações posteriores e seu Regulamento, e quanto ao segundo fundamento por divergir da interpretação do STF consubstanciado na Súmula 417 e outras que aponta. Trata-se de acórdão que negou restituição de crédito de Previdência Social em processo de falência, ao fundamento de que inexiste texto legal que o autorize. Apenas o Regulamento, desbordando da lei, instituiu a restituição. Além do mais, não se provou recolhimento de parcelas dos empregados. Verifica-se, pois, que ao contrário de afrontar a Lei 3.807, de 28-6-60, o acórdão deu-lhe exato entendimento, impedindo uma extensão do Regulamento ao que dispõe a própria lei. E no que concerne ao fundamento da letra d, a matéria versada pelo acórdão é de prova, que não enseja o recurso extraordinário (Súmula 279). Assim, inadmito-o. Subiu, no entanto, o apelo derradeiro, para melhor exame, pelo provimento do agravo de instrumento em apenso. Em parecer da Dra. Cecília de Cerqueira Leite Zarur, manifestouse a 2! Subprocuradoria-Geral da República pelo conhecimento e provimento do recurso extraordinário, sob o fundamento de que nas razões de fls. 48 logrou o recorrente provar negativa de vigência à Lel n? 2.807-60 (com alterações subseqüentes), ao seu regulamento, bem como a existência do dissídio alegado. É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Soares Muiloz (Relator) — O recurso se anima nas letras a e d do permissivo constitucional. Sustenta que o acórdão impugnado, recusando ao Instituto o direito à restituição das contribuições referentes aos empregados, que o empregador estava obrigado a descontar dos salários para esse fim, negou vigência. «... à Lei 3.807, de 16-8-60, com as alterações do Decreto-lei 86, de 22-11-66, e o seu Regulamento, Decreto 60.501, de 14-3-67, que revogou não aprovou como diz o malsinado parecer, o Decreto 48.958-A, de 19-6-60; aliás o mesmo parecer faz afirmações sem a mínima consistência de que não houve dinheiro arrecadado, que as contribuicões diziam respeito R.T.J. — 100 a período de estagnação e não produtividade da fábrica, sem sequer ter noção do que rezam os arts. 69 e 79 da Lei 3.807 sobre o sistema de custeio e arrecadação das contribuições, chegando mesmo a fazer confusão destas com a quota de previdência, a que alude a Lei 5.172, de 25-10-66, CTN, coisa completamente diversa. O pedido reivindicante teve o seu valor apurado por levantamentos fiscais oportunos, já inscritos como divida ativa e objetos de executivos fiscais, que foram suspensos pela decretação da falência. Nada têm que ver com o período de estagnação, tanto que a falida não impugnou o pedido concordando com seu valor, nem podia fazê-lo porque era legitimo, procurando apenas, quando foi interposto o agravo de petição, negar o direito de restituição... que decorre da natureza da contribuição imposta pela Constituição Federal, art. 165, item XVI e parágrafo único...» «... manda a Lei 3.807, em seu art. 157, que os créditos da previdência social relativos a contribuições e seus adicionais ou acréscimos de qualquer natureza por ela arrecadados, inclusive a cota de previdência, a correção monetária e os juros de mora correspondentes, nos processos de falência, concordata ou concurso de credores, estão sujeitos às disposições da União, aos quais são equiparados, seguindose a estes na ordem de prioridade.» O que é repetido no art. 188 do Regulamento, Decreto n? 60.501. «Os créditos da previdência social relativos a contribuições e 293 seus adicionais ou acréscimos de qualquer natureza por ela arrecadados, inclusive a cota de previdência, a correção monetária e os juros de mora, correspondentes, nos processos de falência, concordata ou concurso de credores, estão sujeitos às disposições atinentes aos créditos da União aos quais são equiparados, seguindo-se a estes na ordem de prioridade, cabendo, outrossim, à previdência social o direito de restituição, de quaisquer importâncias arrecadadas pelas empresas, tanto dos segurados, quanto, a título de cota de previdência do público. (art. 176, itens, I, II, IV, V e 1?).» E a Lei 3.807, em seu art. 79, item V, é expressa. «Os descontos das contribuições e os das consignações legalmente autorizadas sempre se presumirão feitos, oportuna e regularmente, pelas empresas a isso obrigadas, não lhes sendo licito alegar nenhuma omissão que hajam praticado, a fim de se eximirem ao devido recolhimento, ficando pessoal e diretamente responsáveis pelas importâncias que deixarem de receber ou que tiverem arrecadado em desacordo com a disposição desta Lei.» Basta portanto, atentar para tal dispositivo legal e não regulamentar, para verificar-se o engano ledo e cego do v. aresto, que se deixou empolgar pelo parecer que, data venta, não examinou, a questão detida e devidamente, adotando o sofisma, de que «a indústria não arrecadou parcelas para o INPS»... (fls. 34), o que a agravada não nega, cingindo-se em alegar «que os débitos previdenciários da falida foram objetos de composição com a Agravante, antes do decreto da falência...» (fls. 12) e sus- 294 R.T.J. - 100 tentar que «o regulamento não pode modificar a lei »... o que, por ser trivial, no caso não é verdadeiro. O confronto dos artigos transcritos integral e textualmente linhas atrás, mostra claramente que o regulamento tão só interpretou o direito pré-existente na lei da restituição, uma vez que o empregador, sendo obrigatoriamente o arrecadador das contribuições, mediante desconto da remuneração dos empregados ( art. 79, item I da Lei 3.807), transforma-se em mero depositário dessas quantias, enquanto não as recolhe aos cofres do INPS, não desaparecendo essa responsabilidade mesmo no caso de sua omissão, como dispõe a Lel ( item V).» Aceito a argumentação deduzida pelo recorrente, no sentido de que o art. 188 do Regulamento, Decreto 60.501 de 14-3-67, nada mais fez do que explicitar o que se contém, por força de compreensão, nos arts. 79 e 157 da lei 3.807, dos quais emana, para o empregador, a situação de simples depositário das contribuições concernentes aos salários de seus empregados. Aliás, esse entendimento consoa com o acórdão unânime desta 1! Turma, no RE 52.249, relator o eminente Ministro Luiz Gallotti, que acentuou: «O art. 9? do Decreto-lei 65, de 14-12-37, distingue nitidamente entre as quantias de que os Institutos são apenas credores privilegiados e os outros de que são reivindicantes, porquanto estas lhes pertencem, pois o empregador, no exercício de uma função de coletoria que a lei lhe confiou, as descontou dos salários de seus empregados, e, em vez de recolhê-las como devia, as reteve. Por outro lado, existe copiosa jurisprudência, inclusive do Supremo Tribunal, no sentido de que as contribuições do empregado, assim retida pelo patrão, é reivindicável da massa falida deste como bem do terceiro em poder de mero depositário. Nem há dizer, como objeta o acórdão recorrido, que não foi feita a discriminação das parcelas, pois, como bem observa o despacho de fls. 47 verso, sendo o quantum fixado em lei, aquela discriminação se obtém por simples cálculo aritmético. Acresce que são iguais a contribuição do empregador e a dos empregados.» Não foi esse aresto indicado pelo recorrente, circunstância que não me impede de referi-lo para demonstrar a negativa de vigência das leis invocadas no recurso Por igual, não aplicou ele os dispositivos legais questionados na presente trresignação, mas a objeção carece de relevo, em face da consideração de que, no ponto, não houve mudança de orientação quanto à nítida diferença entre as contribuições previdenciárlas que incidem sobre o empregador com aquelas que incidem sobre os salários dos empregados e em relação às quais a lei confia ao patrão as funções de coletoria. Sustenta ainda o recorrente que o acórdão recorrido deu à lei federal interpretação divergente da que lhe deram outros Tribunais do país. Indica, como decisões paradigmas, a Súmula 417, segundo a qual: «Pode ser objeto de restituição, na falência, dinheiro em poder do falido, recebido em nome de outrem, ou do qual, por lei ou con- R.T.J. — 100 trato, não tivesse a disponibilidade.» e os seguintes acórdãos: a) do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo: «Instituto de Aposentadoria — Contribuições dos empregados e do empregador — falta de recolhimento pelo comerciante falido — Direito de reivindicação quanto às primeiras e crédito privilegiado quanto às segundas — Aplicação do art. 9? do Decreto-lei 65, de 1937. ... Justa e legal a distinção entre as contribuições devidas pelos falidos aos Institutos e as devidas pelos empregados, que aos empregadores incumbe descontar e recolher aos membros Institutos. Destas últimas os empregadores são como que verdadeiros depositários. Essa naturalmente a razão pela qual o Decreto-lei 65, dispõe em seu art. 10: «São reputados privilegiados, nos processos de falência, concordata ou concurso de credores os créditos dos Institutos ou Caixas de Aposentadorias e Pensões, incluídos, como reivindicantes em relação às quantias recebidas pelos empregadores de seus empregados.» «Força a essa interpretação o próprio dispositivo do art. 102, da atual Lei de Falência que, contrariamente ao que sustenta o agravante, não revogou, nem mesmo implicitamente o preceito da lei trabalhista citada. Atente-se para o que dispõe o citado art. 102, I 3?, da Lei de Falências: 295 «Têm privilégio geral: I ... II — os créditos dos Institutos ou Caixas de Aposentadoria e Pensões pelas contribuições que o falido dever.» Referiu-se o inciso, explicitamente, às contribuições devidas pelo falido, ou sejam aquelas a que se refere à primeira parte do art. 10 da Lei 65, porque relativamente às contribuições recebidas pelo empregador de seus empregados, e é o caso dos autos, os Institutos serão incluídos como reivindicantes. Isto se afigura tão claro, lógico e de boa hermenêutica, que não se vê como justificarem-se as dúvidas do agravante. Igualmente improcedente é a alegação de que as importâncias reclamadas pelo agravado não foram arrecadadas pelo síndico, exigência que não está na lei, e nem poderia estar, pena de invalidar-se o preceito porque as contribuições são feitas em dinheiro, coisa fungivel, jamais se poderia individuá-las, distinguindo-as das outras acaso encontradas em poder do falido, e arrecadadas pelo representante da massa. Certa e rigorosamente jurídica foi, portanto, a decisão agravada que fica mantida.» b) do Tribunal da Guanabara: «As contribuições que os patrões descontam dos ordenados de seus empregados, para recolhê-las aos Institutos de Aposentadoria e Pensões, tem natureza de depósito. Os empregadores exercem, nesse caso, munus de depositário e, por essa razão, cabe às autarquias, as quais são filiados patrões e empregados, o pedido de restituição. (RT 172825, idem 168-136, 178-310, 201, pág. 336).» 296 R.T.J. — 100 Quanto a essa jurisprudência, cabe a observação que fiz relativamente ao acórdão desta Primeira Turma, relatado pelo eminente Ministro Luiz Gallotti, de que, embora tenha aplicado lei pretérita, é válida para o confronto, visto que se esteja nos mesmos princípios que informaram a Súmula 417. Ante o exposto, conheço do recurso extraordinário pelas letras a e d e lhe dou provimento, para deferir a restituição requerida.» (RTJ 89-206 a 209). No mesmo sentido a decisão tomada no RE 89.345, relatado pelo eminente Ministro Moreira Alves, perante esta Turma, e que ficou assim ementado: Finalmente, com idêntica diretriz se decidiu no RE 92.519, de que fui relator e, invocado no parecer da douta Procuradoria-Geral da República. Sem dúvida, em relação aos créditos referentes ás contribuições dos empregados, retidas e não recolhidas pelo empregador aos cofres da Previdência, impõe-se a sua restituição pelo falido. O empregador torna-se depositário das respectivas quantias, sujeitandose, conforme o caso, a responder pelo crime de apropriação indébita. Desse modo, não é possível o seu enquadramento como crédito de natureza fiscal «Concordata. Pedido de restituição de contribuições previdenciárias não recolhidas ao INPS pelo empregador. Honorários de advogado. Ante o exposto, conheço e provejo o recurso. A Súmula 417 «Pode ser objeto de restituição, em falência, dinheiro em poder do falido, recebido em nome de outrem, ou do qual por lei ou contrato, não tivesse ele disponibilidade» se aplica ás contribuições previdenciárias dos empregados arrecadadas pelo empregador, que, pela falta de recolhimento na época oportuna, fica sujeito às penas do crime de apropriação indébita. Mesmo em face do atual CPC, a expressão «despesas da reclamação», do art. 77, § 2?, da Lei de Falências, sem nenhuma ressalva, abrange honorários advocaticios, que são devidos em pedido de restituição ou em embargos de terceiros, regulados no Titulo V daquela lel. Precedentes do STF. Recurso extraordinário não conhecido.» (RTJ 93-363). RE 91.633 — SP — Rel.: Min. Djaci Falcão. Recte.: Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS p/INPS. (Adv.: Santo Battistuzzo). Recda.: Tecelagem Fimetex Ltda., massa falida, de p/seu Síndico. (Adv. Moacyr Pires). EXTRATO DA ATA Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 7 de outubro de 1980 — Hélio Francisco Marques — Secretário. R.T.J. — 100 297 RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.694 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrente: Rede Ferroviária Federal S/A — Recorrido: Francisca da Silva Teixeira. Responsabilidade civil extracontratual. Honorários de advogado. Incidência imediata da Lel n? 6.745, de 05.12.79, e aplicação do â 5?, por ela acrescentado ao art. 20 do CPC, quando a indenização decorre de responsabilidade extracontratual (ato ilícito contra a pessoa). Recurso extraordinário parcialmente conhecido, porém não provido. ACORDA0 dano moral, no valor de 10 salários mínimos, vencida a Juíza Áurea pimentel Pereira, que não concedia a verba do dano moral, e, dar provimento em parte à 2? Apelação, para determinar que os juros de mora se contem a partir da citação inicial, vencida a Juíza Relatora, que ainda reconhecia a prescrição canquenal». (fs. 53/54). Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer parcialmente do recurso mas negar-lhe provimento, unanimemente. Brasília, 03 de outubro de 1980 — Leitão de Abreu, Presidente e RelaPara manter a sentença quanto ao tor. reconhecimento da procedência da ação, frisou o acórdão: RELATORIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: «A procedência da ação é indisPorque o seu marido foi atropelado cutível uma vez demonstrado, por um trem, falecendo em conseatravés da prova testemunhal coqüência do acidente, a recorrida lhida, que o acidente se deu em ajuizou ação para haver indenização passagem de pedestre onde inexisda Rede Ferroviária Federal S.A. tia sinal e onde a cancela existente Julgada, pela sentença, parcialmenno momento não funcionava (fs. te procedente a ação, assim o acór16). dão decidiu ambas as apelações interpostas: «Negligente, portanto, a Rede Ferroviária na observância do Re«... dar provimento à primeira gulamento de Segurança e Polícia apelação, para: elevar a pensão a das Estradas de Ferro (DL 2/3 do salário mínimo sobre o que a vítima efetivamente percebia (fl. 2.089/63), a obrigação de indenizar 8), concecida a atualização da pené indescutível, estando a responsabilidade em questão em tudo e por são ã época da execução; incluir o tudo assemelhada à culpa contra13? salário; elevar os honorários tual, como tal incompensável com advocatícios a 15%, observada a a eventual culpa da vítima». (fl. Súmula n? 1 deste Tribunal e conceder verba para indenização do 54). 298 R.T.J. - 100 Extraordinariamente recorreu a Rede, pelas letras a e d, e o seu recurso subiu porque acolhida, em parte, a argüição de relevância (fl. 88 e ARv. n? 4.196, em apenso). E o relatório. te a honorários advocaticios, conheço, parcialmente, do recurso e, nessa parte, de acordo, agora, com os precedentes desta Turma, lhe nego provimento. VOTO RE-91.694 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Rede Ferroviária Federal S.A. (Advs.: Oswaldo Campos e outros). Recda.: Francisca da Silva Teixeira (Advs.: Marco Aurélio Monteiro de Barros e outros). O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator): A argüição de relevância foi acolhida somente no que toca à questão concernente a honorários de advogados, de sorte que tão-só essa questão é agora suscetível de exame pelo Supremo Tribunal. EXTRATO DA ATA Decisão: Conhecido em parte, mas negado provimento. Unânime. AuEm 5 12 79 foi editada a Lei n? sente, ocasionalmente, o Senhor Mi6.745, que aos parágrafos do art. 20 nistro Djaci Falcão. Ausente, justifido Cód. de Proc. Civil acrescentou o o Senhor Ministro Morei§ 5?, onde se complementam as dis- cadamente, ra Alves. posições quanto a honorários advocatícios. Essa norma legal, segundo Presidência do Senhor Ministro entende esta Turma, é de incidência Leitão de Abreu. Presentes à Sessão imediata, porém o novo parágrafo só os Senhores Ministros Cordeiro se aplica nos casos de responsabili- Guerra e Decio Miranda. Ausente, dade extracontratual (ato ilícito con- ocasionalmente, o Senhor Ministro tra a pessoa) — RE's 92.259, 92.457, Djaci Falcão. Ausente, justificada92.934, etc. mente, o Senhor Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da ReNo caso vertente, cuida-se, exata- pública, o Dr. Mauro Leite Soares. mente, de indenização fundada em responsabilidade extracontratual. Brasília, 03 de outubro de 1980 — Diante disso, caracterizado o Hélio Francisco Marques, Secretádissídio quanto à questão concernen- rio. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 91.755 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Rafael Mayer. Recorrente: Centrais Elétricas de São Paulo S/A — CESP — Recorridos: Antonio Delgado Filho e outros. Competência. Empregado de sociedade de economia mista (CESP). Licença-prêmio. Lei estadual 4.819/58-SP. Justiça corhum. — Vantagem que não decorre de contrato de trabalho, porém, de beneficio legal do Estado, não podendo, por isso, inserir-se no contexto da relação empregaticia, única que suscitaria a competência especializada. Recurso Extraordinário conhecido e provido. R.T.J. — 100 ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos,acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata de julgamentos e notas taquigráficas, à unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Brasília, 22 de setembro de 1981. — Cunha Peixoto, Presidente. — Rafael Mayer, Relator. RELATORIO 299 nador com a Assembléia, não da empresa com os empregados, que adquiriram o direito à vantagem outorgada.» Interposto recurso extraordinário, em que são dados como violados os arts. 8?, VIII, b, 142, 153 ff 2? e 3? e 170 2? da CF, não foi admitido, mas, ao agravo, fi-lo subir para melhor exame. Nesta instância, a douta Procuradoria-Geral opina pelo não conhecimento. k o relatório. O Sr. Ministro Rafael Mayer: Em reclamação trabalhista intentada VOTO contra as Centrais Elétricas de São Paulo e contra o Estado de São PauO Sr. Ministro Rafael Mayer (Relo, os reclamantes pleitearam o recebimento, em pecúnia, de licença- lator): Em caso idêntico, julgado a prêmio de três meses a cada perío- 21.XI. 1979, o Pleno conheceu e deu do de cinco anos de exercido funcio- provimento por unanimidade ao renal, com fulcro na lei Estadual nt curso extraordinário para dar pela incompetência da Justiça do Traba4.819/58. lho para processar o feito, por não A JCJ excluiu do processo o Esta- ser ele de natureza trabalhista (RTJ do de São Paulo e julgou a reclama- - 96/857). ção procedente contra a Recorrente, Com efeito, conforme se salienta condenando-a ao pagamento pleiteado. Essa decisão foi reformada pelo nesse julgado, não se trata de uma TRT que julgou os reclamantes care- vantagem decorrente do contrato de cedores de ação. Recurso de revista trabalho, senão de benefício de orque dai se interpôs não foi conhecido dem legal do Estado que não veio a ser incorporada aos regulamentos da pela 2! Turma do TST. empresa, pelos canais competentes, Entretanto, em recurso de embar- e inserir-se, desse modo, no contexto gos, o Pleno do TST julgou proceden- das relações empregaticias. te a reclamação, nos termos da seguinte ementa: A autonomia privada que resguarda mesmo as empresas mistas, face «Embargos recebidos para jul- ao art. 170 2? da CF, resultou ofengar procedente a reclamação. A lei dida, pois somente pelos seus órgãos em questão estabeleceu um co- de manifestação de vontade, regumando, por ser o Estado majoritá- larmente exercitados, é que se poderio no capital da empresa. A norma ria assumir a obrigação contratual passou a ser auto-aplicável, para com os empregados. inserindo-se como cláusula no contrato de trabalho. O governador do Sem que a obrigação que se atriEstado desobedeceu à Assembléia, bui à Recorrente tenha sido posta deixando de cumprir o que a lei de- nesse plano, é impossível cuidar-se terminou. O problema é do gover- de uma relação juridico-trabalhista, 300 R.T.J. - 100 que somente ela suscitaria a competência especializada. Assim, com base no precedente, conheço e dou provimento para declarar a incompetência da Justiça do Trabalho. EXTRATO DA ATA RE. 91.755 — SP — Rel.: Min. Rafael Mayer. Recte.: Centrais Elétricas de São Paulo S/A — CESP (Advs.: Maria Cristina Paixão Cortes, Luiz Carlos Pujol e outros). Recdos.: Antonio Delgado Filho e outros (Advs.: Ulisses Riedel de Resende, Solange Vieira de Souza e outros). Decisão: Conhecido e provido Decisão unânime. Presidência do Senhor Ministro Cunha Peixoto. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Soares Muftoz, Rafael Mayer, Clovis Ramalhete e Néri da Silveira. SubprocuradorGeral da República o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 22 de setembro de 1981. — Antônio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.070 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Cordeiro Guerra. Recorrente: Alvaro Paupério Filho, s/mulher e outros — Recorridos: Júlio Paupério e sua mulher — Antônio Abel Plerre; sua mulher e outra — Juan Castro Conde e sua mulher. — A venda de ascendente a descendente sem o consentimento dos demais, e nula quer seja feita direta ou indiretamente, art. 1.132 do Código Civil. Não discrepa dessa orientação jurisprudencial, acórdão que, em base das provas dos autos e circunstâncias do processo, tem como inocorrente a fraus lege, porque real a alienação feita a uma pessoa Jurídica integrada pelo ascendente e descendentes, e legitima a retirada do ascendente da sociedade, pago e satisfeito dos seus haveres. Precedentes: RE 92.810 — 3 — MG. Dissídio jtuisprudencial não comprovado, Súmula 291. RE não conhecido, Súmula 279 e 400. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal na conformidade da ata de julgamento e das notas taquigráficas, à unanimidade de votos, em não conhecer do recurso. Brasília, 16 de outubro de 1981 — Djaci Falcão, Presidente — Cordeiro Guerra, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra, O acórdão recorrido é do seguinte teor: «Os autores, ora embargantes, com fundamento no art. 1.132 do Código Civil, moveram aos ora embargados a presente ação de nulidade cumulado com a de petição de herança, na qualidade de herdeiros necessários de Alvaro Pauperlo, pai, avô e sogro de ambas as R.T.J. - 100 301 partes, a fim de obter a devolução Não se contesta que a venda diao respectivo Espólio, para ultereta, de ascendente a descendente rior partilha na forma legal, dos sem o consentimento expresso dos dois imóveis, silos á Rua Castro demais descendentes, seja nula, Alves n?s 321 e 323, nesta Capital, conforme adverte Clóvis (Comenque o de cujus transferiu para a tários ao art. 1.132), independentesociedade «A. Paupério & Cia. mente, portanto, de prova da simuLtda.», constituída em 1942 por allação. A respeito, exaustivo é o esteração da firma individual «A. tudo do Desembargador Dimas de Paupério», com a inclusão de seus Almeida, na sua monografia «Venfilhos Júlio Paupério e Abel Suda de Ascendente a Descendente» plicy Paupério, pai de Antônio reproduzida a fls. 449/459. Abel Pierre Paupério, e da qual se Todavia, conforme acentua o retirou em 1951, vendendo-lhe sua mesmo Clóvis, não haverá o vicio quota-parte, os quais, ao dissovêcondenado por esse artigo (1.132) la, em 1956, dividiram entre si os quando o descendente comprar de imóveis em apreço sem anuência terceiro o que este adquiriu do asdos demais herdeiros, em qualcendente», uma vez demonstrada a quer dessas transações. legitimidade da venda. Em tal hipótese a anulação do ato dependeO Juiz, invocando o magistério de Clóvis Bevilacqua e Carvalho s rá de prova da simulação, como é intuitivo. Santos — que não consideram — nula a venda feita realmente por Na espécie em exame, exaustiascendente a terceiro e deste a um vamente demonstrou a sentença, descendente do seu vendedor — pelas circunstâncias envolventes a julgou Improcedente a ação por ausência de qualquer simulação. não vislumbrar simulação na transCom efeito, admitiram os autoferência feita por Alvaro Paupério res, por seu — ilustre procurador, dos dois imóveis em questão para que «as duas primeiras escrituras a sociedade, e na subseqüente vende compra e venda — do ascendenda a esta de sua quota-parte, que te comum para a Pessoa Jurídica afinal foi partilhada entre os dois — são inatacáveis», fls. 296. E no sócios remanescentes, envolvendo tocante à retirada de Alvaro Paupéaqueles dois prédios. rio da sociedade, recebendo o justo Inconformados, apelaram os aupreço de sua quota-parte — tores, mas a Egrégia Quinta CâCr$600.000,00 também não foi susmara Civil, integrada pelos emicetível de qualquer suspeita.» fls. nentes Desembargadores Afonso 489/491). André, Relator, Coelho de Paulo, O recurso extraordinário foi admiRevisor e Macedo Bittencourt, ne- tido pelo seguinte despacho: gou provimento ao recurso, contra « — Trata-se de ação , fundao voto do Revisor, que o provia, mentada no art. 1.132 do Código Cipara julgar procedente a demanda, vil, para invalidar a transferência tendo sido repelida a preliminar de de dominio sobre imóveis, que, por prescrição, contra o voto do Relaconseguinte, deverão ser levados tor. ao inventário do alienante para soInconformados, interpuseram os brepartilha entre os seus herdeiautores os presentes embargos, ros. com apoio no douto voto vencido, A Sentença repeliu a preliminar colimando a procedência da ação, de prescrição e julgou improcedenNão merece guarida o recurso. te o pedido, sendo confirmada em 302 R.T.J. — 100 apelação e embargos infrigentes cam o julgado, por simples ementa, assim resumido: (fls. 418 e 489). «A nulidade imposta pelo art. 2 — Não se conformando, os ven1.132 do Código Civil, as vendas cecidos interpõem recurso extraordilebradas por ascendentes a alguns nário ((is. 493), com embasamento no art. 119, III, Letra a e d, da descendentes, seus herdeiros potenciais, sem anuência dos demais, Constituição. é extensiva a cessão de quotas do Argumentam com a negativa capital de sociedade comercial, de vigência do mencionado disposiainda que os compradores dela já tivo do Código Civil, a respeito de sejam sócios.» (STF, 1, Turma, fraude à lei que acarreta a nulidaRE 76.054 — MG, rel. Min. Aliomar de do ato de alienação independenBaleeiro. DJU 28.9.73, pág 7 215 temente da prova da simulação, doc. fls. 73). que o julgado não aceitou, contraA douta Procuradoria-Geral da dando, igualmente, a jurisprudência da Suprema Corte (indicada a República, por seu ilustre Subprocurador-Geral, assim opina:(ls. 506/507). «1 — A instância ordinária, uniO apelo extremo sofreu impugnaforme e sucessivamente, f. 331, 418 ção ((ls. 509 e 517). e 489, quais sejam em sentença iniprocuradoria-Geral da Juscial, apelação e embargos infrintiça opina pelo deferimento. gentes, respectivamente, declarou 3 — Reportando-me a excelente a improcedência de ação ordináfundamentação de fls. 493/507, adria, fundada no art. 1.132 do Código mito o processamento do recurso Civil e visando a nulidade de venda pelas razões, expostas em síntese, de imóveis por ascendente a despelo douto Procurador Benedito cendente mediante interposta pesNestor Penteado ((Is. 518): soa, pois que, verbis, f. 490: «O elemento subjetivo enfatizado — «... conforme acentua o mesno acórdão já não encontra agasamo Clóvis, «não haverá o vicio conlho na jurisprudência do S.T.F., denado por esse artigo (1.132) que revogou a Súmula 152. A frauquando o descendente comprar de de demonstrável para a anulação terceiro o que este adquiriu do asdo ato jurídico não é reclamada cendente», uma vez demonstrada a onde o resultado objetivo confina legitimidade da venda. Em tal hicom o dispositivo (art. 1.132 e Súpótese, a anulação do ato dependemula 494). Se o pai alienou aos firá de prova da simulação, como é lhos sem o consentimento dos deintuitivo. mais, o desrespeito á norma é paNa espécie em exame, exaustitente, dispensável a prova de frauvamente demonstrou a sentença, de no emprego de interposta pespelas circunstâncias envolventes, a soa.» ausência de qualquer simulação. São Paulo, 29 de dezembro de Com efeito, admitiram os auto1978 — Young da Costa Manso, res, por seu ilustre procurador, Vice-Presidente do Tribunal de que «as duas primeiras escrituras Justiça, no impedimento ocasional de compra e venda — do ascendendo Presidente.» ((is. 522/524). te comum para a Pessoa Jurídica — são inatacáveis», fls. 296, e no Sustentam os recorrentes que houve negativa de vigência do art. 1.132 tocante à retirada de Alvaro Paudo Código Civil, pois é nula a venda pério da sociedade, recebendo o feita por interposta pessoa, e invojusto preço de sua quota-parte — R.T.J. — 100 Cr$600.000,00 — também não foi suscetível de qualquer suspeita». 2 — Alegam os recorrentes, com apoio nas letras a e d, que a pretendida nulidade independe da prova de simulação em face do art. 1.132 do Código Civil, incidente sendo com a simples presença do terceiro. 3 — Ora, a jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal não abona tal tese e ainda recentemente, no RE 92.810, Ftelator Ministro Cordeiro Guerra, sessão de 21.8.81, a Egrégia Segunda Turma a unanimidade, acentuou que é necessária a comprovação da simulação do ato translativo através de interposta pessoa. 4 — Reportando-nos aos fundamentos do acórdão referido, somos pelo não conhecimento ou, acaso conhecido, pelo não provimento do recurso extraordinário. Brasília, 25 de setembro de 1981 — Mauro Leite Soares, Subprocurador-Geral da República.» (fls. 569/570). É o relatório. VOTO O Sr. Ministro Cordeiro Guerra (Relator): O v. acórdão recorrido, frente ao exame dos fatos e circunstâncias da causa, reconheceu que as vendas dos imóveis feitas à pessoa jurídica foram reais e inatacáveis, vendas essas; para integralizar os aumentos de capital, da sociedade, realizados em 1945 e 1949, já constituída a sociedade em 1942. Em 1951, o pai se retirou da sociedade cedendo suas quotas aos filhos, mediante pagamento do valor das mexias. Concluiu que, em face dessas circunstâncias não houve fraude ao mandamento do art. 1.132 do Código Civil, ou seja, simulação destinada a 303 prejudicar a igualdade das legitimas. O acórdão trazido à colação por simples ementa, e sem que sejam especificadas as circunstâncias táticas do julgado, não confina com o acórdão recorrido, pois, a cessão de quotas foi feita sem fraude, como foi assinalado: Diz o acórdão com acerto. «...Não se contesta que a venda direta, de ascendente a descendente, sem o consentimento expresso dos demais descendentes, seja nula, conforme adverte Clóvis (Comentários ao art. 1.132), independentemente, portanto, de prova da simulação. A respeito, exaustivo é o estudo do Desembargador Dimas de Almeida, na sua monografia «Venda de Ascendente a Descendente», reproduzida a fls. 449/459). Todavia, conforme acentua o mesmo Clóvis, «não haverá o vício condenado por esse artigo (1.132) quando o descendente compra de terceiro o que este adquiriu do ascendente», uma vez demonstrada a legitimidade da venda. Em tal hipótese, a anulação do ato dependerá de prova da simulação, como é intuitivo. Na espécie em exame, exaustivamente demonstrou a sentença, pelas circunstâncias envolventes, a ausência de qualquer simulação. Com efeito, admitiram os autores, por seu ilustre procurador, que «as duas primeiras escrituras de compra e venda — do ascendente co-mum para a Pessoa Jurídica — são inatacáveis», fls. 296. E no tocante à retirada de Alvaro Paupério da sociedade, recebendo o justo preço de sua quota-parte — Cr$600.000,00 — também não foi suscetível de qualquer suspeita.» (fls. 490/491). Realmente, assim julgou esta Turma no RE 92.810-3 — Minas Gerais, em acórdão por mim relatado, e re- 304 R.T.J. — 100 ferido no parecer do ProcuradorGeral da República: «A venda de ascendente a descendente, sem o consentimento dos demais, é nula quer seja feita direta ou indiretamente, art 1 132 do CC. Não discrepa dessa orientação jurisprudencial, acórdão, que, em face das provas dos autos e circunstâncias do processo, tem como inocorrente a fraus legis, porque, real a venda a terceiro feita pelo ascendente. Não é vedado aos descendentes readquirir patrimônio familiar alienado validamente a terceiros, se não ocorre fraude ao mandamento do art. n? 1.132 do Código Civil. RE não conhecido. Súmula 279, 291, 282, 356 e 400.» De fato, reconhecida a realidade dos aumentos do capital 'social e da retirada do sócio-quotista, com o pagamento dos seus haveres- pelo real valor, não se pode ter como violado o art. 1.132 do código Civil. Afastado o dissídio jurisprudencial, por força da Súmula 291, não conheço do recurso com base nas Súmulas 279 e 400. É o meu voto. EXTRATO DA ATA RE. 92.070 — SP — Rel.: Min. Cordeiro Guerra. Ftectes.: Alvaro Paupério Filho, s/mulher e outros (Advs.: Antônio de Arruda Sampaio e outros). Recdos.: Júlio Paupério e sua mulher. (Advs.: Ivanildo Anacleto Porto e outros). Antônio Abel Pierre, sua mulher e outra (Advs.: Waldo Ferraz Costa Júnior e outros). Juan Castro Conde e sua mulher (Advs.: Marcelo Guimarães da Rocha e Silva e outro). Decisão: Não conhecido. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra, Moreira Alves, Dedo Miranda e Firmino Paz. Subprocurador-Geral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 16 de outubro de 1981 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.200 — SP (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Clovis Ramalhete. Recorrente: LIGHT — Serviços de Eletricidade S/A — Recorrido: Estado de São Paulo. Tributário e Processual. — Não fundamenta Recurso Extraordinário a mera transcrição de ementa de acórdão, sem demonstrar a adequação do precedente de jurisprudência ao caso decidido mas recorrido. Recurso que se não conhece pela letra d do art. 119, III, da C.F. Repetição de indébito tributário. Juros de mora, pela Fazenda Pública. Devem ser contados como determinado no Código Civil, pois assim o estabelece a Lei 4.414/64, autorizada pelo { 1? do art. 161 do Código Tributário Nacional («Se a lei não dispuser de outro modo»...) Recurso não conhecido. R.T.J. — 100 ACORDA0 305 VOTO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos não conhecer do recurso. Brasília, 05 de junho de 1981 — Antonio Neder, Presidente — Clovis Ramalhete, Relator. O Sr. Ministro Clovis Ramalhete (Relator): Não conheço do Recurso. Pela leão d, é certo que a Companhia Recorrente invoca por paradigma, o RE 88.516-SP, cuja ementa transcreve; mas nem demonstra a adequação desse precedente, ao caso, nem cita o repertório de jurisprudência, em que o colheu (Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, art. 322). Pela letra a, porque não houve recusa de vigência do art. RELATOR 161, Si 1? do CTN. Esta norma ressalva a eficácia de outras leis que disO Sr. Ministro Clovis Ramalhete: ponham em contrário: «Se a lei não Ação de repetição de indébito de re- dispuser de modo diverso», adverte colhimento do imposto de transmis- o art. 161, ora está em vigência, no são inter vivos de imóveis adquiri- entanto, a Lel 4.414-64, não revogados, proposta pela Recorrente, Light da, que regula o pagamento de Juros — Serviços de Eletricidade S.A., moratórios pela Fazenda Pública, e contra a Fazenda Estadual de São estabelece (art. 1?) que serão eles Paulo. calculados «na forma do direito civil». 2 — A 4! Câmara Cível, ao julgar procedente a ação, determinou, no 2 — Não conheço do recurso entanto, que os juros moratórios seÉ o meu voto. jam pagos sobre 6% ao ano. EXTRATO DA ATA 3 — Recurso Extraordinário da Empresa apelada, com fundamento RE. 92.200 — SP — Rel.: Min. Clonas letras a e d, — por negativa de vigência do 1? do art. 161 c.c. o art. vis Ramalhete. Recte.: Light — Ser167 do Código Tributário Nacional, e viços de Eletricidade S.A (Advs.: por divergência com os acórdãos Renato Ribeiro e outros). Recdo.: Estado de São Paulo (Adv.: Eugênio dos RREE n?s. 85.791 e 82.851. Semi). Despacho deferindo seguimento do recurso (fls. 2.119). — Parecer da Decisão: Não se conheceu do redouta Procuradoria-Geral da Repú- curso. Votação uniforme. blica (fls. 2.137), que constata o dissídio mas pretende seja negado Presidência do Senhor Ministro provimento, com base no decidido no Antonio Neder. Presentes à Sessão RE 82.219 — SP, Primeira Turma, os Senhores Ministros Cunha PeixoRelator Ministro Rodrigues Alckmin, to, Soares Mulloz, Rafael Mayer e que entendeu que os juros de mora Clovis Ramalhete. Subprocuradorem repetição tributária e sobre Geral da República, o Dr. Francisco quantia restituída pela Fazenda, de Assis Toledo. contam-se como determina a Lei 4.414-64, que os faz reger pelo Código Brasília 05 de junho de 1981 — Civil. António Carlos de Azevedo Braga, É o relatório. Secretário. 306 R.T.J. - 100 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.327 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrente: Estado de São Paulo — Recorrido: Jordelino Olímpio de Paulo. Serventuário da Justiça. Extinção do cartório de que era titular e aproveitamento com base na legislação local. A proibição de nomeação não abrange o caso de aproveitamento. Inocorrência de ofensa ao disposto No (i 2? do art. 206 da Constituição Federal. Recurso extraordinário não conhecido. ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, em não conhecer do recurso, unanimemente. Brasília, 21 de outubro de 1980 — Leitão de Abreu, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: Este o teor da decisão recorrida: «Acordam, em Terceira Câmara Civil do Tribunal de Justiça de São Paulo, por votação unânime conceder a segurança. «Jordelino Olímpio de Paula impetra a concessão de mandado de segurança contra o ato do Exmo. Sr. Secretário da Justiça, que lhe negou pedido de nomeação para o cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil e Anexos do Município de Três Fronteiras, em caráter definitivo. «Alega o impetrante que era titular do cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil e Anexos do Distrito de Aparecida do Bonito, da Comarca de Santa Fé do Sul, quando esta serventia foi extinta pela Resolução n? 2, estabelecida pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo em 15 de dezembro de 1976, e que começou a vigorar em 1? de janeiro de 1977. Passando à situação de servidor em disponibilidade não remunerada, dirigiuse o postulante da segurança à autoridade impetrada e pediu-lhe a nomeação, por remoção, para o Cartório do 2? Ofício e Anexos de Santa Fé do Sul, mas não obteve êxito em sua pretensão, indeferida por ato de 2 de junho de 1977, em virtude de não ter sido indicado o fundamento legal do pedido e por estarem vedadas as nomeações definitivas para serventias não oficializadas. Diante disto, o impetrante solicitou do impetrado a sua nomeação, em caráter provisório, para o Cartório de Registro Civil e Anexos de Três Fronteiras, de Igual natureza e classe do cartório extinto, deixando de ser atendido, PU falta de amparo legal, através de ato datado de 16 de agosto de 1977. Inconformado, voltou à carga o impetrante, pleiteando agora a sua remoção para o Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Município de Três Fronteiras, em caráter definitivo, fundado em que a serventia, de que era titular, foi extinta antes de promulgada a Emenda Constitucional n? 7, de 13 de abril de 1977, mas, ainda desta vez, sua solicita- R.T.J. — 100 ção foi desatendida pelo impetrado, através de ato praticado em 30 de novembro de 1977. Verberando este pronunciamento, por considera-10 lesivo ao seu direito liquido e certo de desempenhar as funções do cargo de Escrivão, de que está impedido de exercer há mais de um ano, o postulante do writ propugna pela concessão de segurança, a fim de que lhe seja deferida a nomeação para o cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil e Anexos do Município de Três Fronteiras. Entende o impetrante, que a proibição constitucional diz respeito à nomeação de novos serventuários, mas não daqueles que já eram escrivães e calas serventias foram extintas antes do advento da Emenda Constitucional n? 7/77, até porque o que esta torna defesa são as nomeações em caráter definitivo para as serventias e não as remoções de quem, como o impetrante, já era escrivão e que, por isso, tem o direito adquirido de ser aproveitado no cargo, que ora pleiteava. «Denegada a suspensão liminar do ato censurado, vieram para os autos as informações enviadas pela ilustre autoridade impetrada, em que esta preliminarmente, qualifica de inepta a inicial, seja porque desacompanhada dos documentos, que deveriam instruí-la, seja porque não especifica o ato, de que teria sobrevindo a lesão ao direito invocado pelo impetrante. A seguir, ferindo a questão de fundo, o impetrado defende o ato impugnado, justificando-o á luz do art. 206, 2?; da Constituição da República, acrescentado pela Emenda Constitucional n? 7, de 13 de abril de 1977, pelo qual 'Fica vedada, até a entrada em vigor da lei complementar a que alude o parágrafo anterior, qualquer nomeação em 307 caráter efetivo, para as serventias não remuneradas pelos cofres públicos'. Sustenta, então, a autoridade impetrada, que o preceito proibitivo estende-se a todas as formas e modalidades, de que se revista o provimento em caráter efetivo de serventias vagas, pois, com este propósito o preceito da Lei Maior foi promulgado, mantendo, assim, 'as serventias vagas desvinculadas de qualquer titularidade irremediável' para não aumentar as dificuldades inerentes à implantação do regime de oficialização dos cartórios, que será disciplinada através de lei complementar a ser editada. Nega, outrossim, a invocação de direito adquirido como suporte à impetração, baseando-se o impetrado em que essa argüição não é suscetível de opor-se á incidência e aplicação de preceitos da Carta Magna. «Considerando correta a posição assumida pela autoridade impetrada, pronunciou-se a douta Procuradoria-Geral da Justiça pela denegação da segurança. «2 o relatório. «1 — A prejudicial articulada pelo impetrado não procede. Primeiro, porque os documentos fundamentais à impetração, comprovando a realidade dos fatos nela descritos, estão presentes nos autos, exibidos, em fls. 8, o titulo de nomeação do impetrante para o cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Distrito de Aparecida do Bonito (1? classe), em fls. 8 verso e 9, certidões de compromissos prestados pelo impetrante e sua posse no cargo, seguindo-se, em fls. 10, comunicação à Corregedoria Permanente da entrega dos livros e acervo da serventia extinta e, em fls. 11, o termo de recebimento respectivo, Segundo, porque o ato contra o qual se insurge o postulante do writ se acha perfeitamente identificado na impetração, 308 R.T.J. — 100 pela qual é atacado, especificamente, o indeferimento, em 30 de novembro de 1.977, da solicitação dirigida ao impetrado, para que removesse o impetrante para o Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Município de Três Fronteiras, em caráter definitivo. «2. — Passando-se ao mérito da causa, verifica-se que as posições assumidas pelo impetrante e impetrado, em torno da questão debatida, estão suficientemente bem delineadas a ensejar, pois, adequado tratamento com vistas à sua solução. «Enquanto o subscritor da impetração sustenta que o preceito constitucional do art. 206, g 2? Introduzido na Carta Magna Pela Emenda Constitucional n? 7, de 13 de abril de 1977, proíbe, exclusivamente, a nomeação de novos serventuários, mas não a nomeação dos antigos, já investidos na condição de titulares de serventia, que veio a ser extinta antes de promulgada aquela Emenda, o impetrado, por seu turno, assevera que a sobredita proibição abrange qualquer tipo de provimento em caráter efetivo, seja ele decorrente de nomeação, remoção ou promoção, posto que, em matéria cartorária, o vocábulo 'nomeação', aplicado no texto constitucional, não tem o sentido estrito, que lhe atribuem os Estatutos dos Funcionários Públicos do Estado. «Bem de ver-se, no entanto, que razão nenhuma assiste à autoridade impetrada. «Com o estabelecer o principio da gradual oficialização das serventias extrajudiciais, cuidou o mandamento constitucional de proibir, desde logo, as nomeações originárias ou de primeira investidura, em caráter efetivo, para as serventias não remuneradas pelos cofres públicos, a fim de não serem criados maiores embaraços no processamento da implantação do novo regime. «Objetivou-se com a proibição constitucional, evitar a nomeação de novos serventuários, mas não impedir nomeação derivadas daqueles titulares de serventias, que já ostentavam essa posição antes de promulgada a Emenda Constitucional n? 7/77. «Tanto isso é certo que no caput do art. 206, da Lei Maior, ficou expressamente ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios ou nomeados em caráter efetivo. «No caso do impetrante, especificamente, que já era titular de serventia, e que se achava em disponibilidade, por ter sido extinto o cartório, quando sobreveio a Emenda n? 7/77, seu aproveitamento noutra serventia não irá agravar as dificuldades inerantes à transformação para o novo sistema, porque ele já integrava os quadros de servidores cartorários, quando veio de ser instituído o novo regime. «Vale, pois, dizer-se, que, com vistas à reforma programada, a ocupação pelo impetrante de uma serventia não acarretará, em substância, nenhuma dificuldade a mais, dentre as que já existem, para ser cumprida a oficialização, que se desenvolverá progressivamente, na medida em que forem se vagando os cargos dos titulares de cartórios. «Nesse sentido, por sinal, em hipótese semelhante, já se pronunciou este Egrégio Tribunal no julgamento do Mandado de Segurança número 260.416, em sessão da St Câmara Civil, figurando como Relator o eminente Desembargador Dias Filho. R.T.J. — 100 «3 — Em tais condições fica concedida a segurança, para que, na forma da legislação vigente, cumpridas as formalidades legais, a autoridade impetrada expeça título, nomeando o impetrante, em caráter efetivo, para assumir as funções do cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Município de Três Fronteiras.» (fls. 36/40). A Fazenda do Estado de São Paulo interpôs recurso extraordinário contra esse acórdão, com fundamento na alínea a, do art. 119, III, da Constituição Federal alegando negativa de vigência do § 2? do art. 206, dessa Carta Política. O Vice-Presidente do Tribunal a quo, o nobre Desembargador Adriano Marrey, admitiu o recurso com este despacho: «Segundo consta, o Serventuário Jordelino Olímpio de Paula requereu ao Sr.. Secretário da Justiça, do Estado, sua nomeação para o cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil de Pessoas Naturais e Anexos, do município de Três Fronteiras, neste Estado, porquanto, a antiga e idêntica serventia, de que fora titular, no distrito de Aparecida do Bonito, município de Santa Rita D'Oeste, havia sido extinta pela Resolução Judiciária n? 2, de 1976, art. 95, letra a. «Indeferida a pretensão, impeirou ele mandado de segurança, o qual lhe foi concedido, pelo resp. acórdão a fls. 36 e seguintes. a... para que, na forma da legislação vigente, cumpridas ai formalidades legais, a autoridade impetrada expeça titulo, nomeando o impetrante, em caráter efetivo, para assumir as funções do cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Município de Três Fronteiras (textual, do resp acórdão, fls. 40). 309 «Contra esse resp. aresto é que interpõe a Fazenda do Estado o presente recurso extraordinário, com fundamento no art. 119, III, letra a da Constituição Federal, a dizer que, com a decisão proferida, verificou-se a vulneração do preceito constitucional contido no art. 206, § 2? da Lei Magna, com a redação da Emenda Constitucional n? 7/77. «Conforme se diz, oficializou esse dispositivo as serventias do foro judicial e extrajudicial sendo norma de eficária plena e de aplicabilidade imediata, ao vedar `... até a entrada em vigor da lei complementar a que alude o parágrafo anterior, qualquer nomeação em caráter efetivo para as serventias não remuneradas pelo cofres públicos'. Entende a recorrente que `...a expressão nomeação é evidente, foi utilizada no sentido genérico de provimento para as serventias não remuneradas pelos cofres públicos, conforme se verifica da meus legis consubstanciada na Mensagem n? 347/76, encaminhada ao Congresso Nacional em 16 de novembro de 1976, pelo Exmo. Senhor Presidente da República mensagem essa que acompanhou o projeto de emenda constitucional e que resultou na edição do. art. 206 e §§ da Constituição Federal...' ( textual, fls. 48). «O recurso foi impugnado, a fls. 52 e seguintes. E a d. ProcuradoriaGeral da Justiça foi de parecer que se defira o seguimento do presente recurso (fls. 56/57). «Ao meu ver, desmereceria seguimento ao apelo excepcional em apreço. A vedação constitucional do art. 206, § 2? (redação da EC 7/77), de qualquer nomeação em caráter efetivo, para as serventias não remuneradas pelos cofres pú- 310 R.T.J. - 100 blicos até a entrada em vigor da lei complementar prevista em seu § 1?, afigura-se-me inaplicável à situação de Jordelino Olímpio de Paula. «Este é serventuário efetivo, de serventia extinta pela Resolução Judiciária n? 2/76, em data anterior à da vigência do preceito constitucional discutido. «Claro é que não poderiam esse, e outros serventuários nas mesmas condições, permanecer em disponibilidade não remunerada, por tempo indefinido. «Dal o pedido de aproveitamento em serventia da mesma classe da que ficara extinta, sendo a pretensão acolhida pelo v. acórdão, por fundamentos que bem demonstram não se haver infringido o texto constitucional, dado que não se tratava de provimento originário, nem de primeira nomeação, mas, de ato equivalente à mera remoção. «Conforme se diz no v. acórdão, '...objetivou-se com a proibição constitucional, evitar a nomeação de novos serventuários, mas não impedir nomeação derivadas daqueles titulares de serventias, que já ostentavam essa posição antes de promulgada a Emenda Constitucional n? 7/77. «Tanto isso é certo que no caput do artigo 206, da Lel Maior, ficou expressamente ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios ou nomeados em caráter efetivo. «No caso de impetrante, especificamente, que já era titular de serventia, e que se achava em disponibilidade, por ter sido extinto o cartório, quando sobreveio a Emenda n? 7/77, seu aproveitamento noutra serventia não irá agravar as dificuldades inerentes transformação para o novo siste- ma, porque ele já integrava os quadros de servidores cartorários, quando veio de ser instituído o novo regime (textual, fls. 39/40). «Não se irá, com isto, 'aumentar as dificuldades inerentes à transformação das serventias não oficializadas', em outras oficializadas, único motivo pelo qual se proibem novas nomeações, em caráter efetivo. «O ora recorrido já era serventuário efetivo e por concurso — e não se está criando cargo para ele. «Pondera, todavia, o ilustre Ministério Público desta instância seja conveniente a subida do recurso, para conhecimento do Egrégio Supremo Tribunal Federal, porquanto, ali já se encontra, pendendo de julgamento, outro recurso extraordinário, em caso idêntico. «Em vista disso, e tão-somente por tal circunstância, permito-me deferir o processamento do presente recurso, pois, segundo o meu entendimento, é de todo improcedente a argumentação do resp. parecer a fls. 56/57. «O serventuário Jordelino Olímpio de Paula foi provido, por concurso, no cargo de Escrivão do Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos do Distrito de Aparecida do Bonito (1t classe), no município de Santa Rita D'Oeste, comarca de Santa Fé do Sul, conforme o título em cópia a fls. 8. «E não esta sendo investido, por força do resp. acórdão recorrido, em serventia oficializada, mas, noutra não oficializada, e de categoria idêntica à daquela de que fora titular, agora extinta. Não se trata, portanto, de nomeação para tal serventia, senão, em verdade, de ato equivalente à sua remoção, da serventia extinta, R.T.J. — 100 para essa, que se acha vaga. Inexiste, segundo penso, razão para a incidência do preceito constitucional questionado. «Em suma, defiro o processamento do recurso extraordinário de fls. 45 e seguintes. » (fls. 74/130). E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Leitão de Abreu, (Relator): A Procuradoria-Geral da República pronúncia-se pelo não conhecimento do recurso. Diz o parecer, que é de lavra do procurador Moacir Antonio Machado da Silva. «Parece-nos que a palavra nomeação, contida no art. 206, § 2?, da Constituição Federal, não abrange a hipótese de aproveitamento. A expressão em si, no rigor técnico, já comporta uma acepção estrita, equivalente à primeira investidura em cargo público. «Nesse sentido, a expressão não abrange os casos de provimento derivado, como observa Hely Lopes Meirelles: O provimento, pode ser originário ou inicial, e derivado. Provimento inicial é o que se faz através de nomeação, que pressupõe a inexistência de vinculação entre a situação funcional anterior do nomeado e o preenchimento do cargo. E, logo adiante, completa o autor: Já o provimento derivado, que se faz por transferência, promoção, acesso, reintegração, readmissão, aproveitamento, ou reversão, é sempre uma alteração na situação funcional do provido. «E positivamente razoável a conclusão no sentido de que o provimento mediante aproveitamento não se insere na vedação constitucional. Essa forma de provimento, aliás, em nada afeta a ratio legis do preceito, como bem ressaltou o acórdão, nestes termos: 311 «Como estabelecer o principio da gradual oficialização das serventias extrajudiciais, cuidou o mandamento constitucional de proibir, desde Jogo, as nomeações originárias ou de primeira investidura, em caráter efetivo para as serventias não remuneradas pelos cofres públicos, a fim de não serem criados maiores embaraços no processamento da implantação do novo regime.» «Ademais, a extinção de serventia não oficializada corresponde a uma disponibilidade sem vencimentos, figura estranha à Constituição Federal. O aproveitamento, em conseqüência, é direito inerente à extinção, tanto mais em face do art. 206, caput, da Carta Magna, que ressalvou a situação dos titulares vitalícios então existentes, co- mo é o caso do recorrido. «Não houve, portanto, ofensa ao art. 206, § 2? da Constituição. Em caso rigorosamente idêntico (RE 92.350, DJ de 13.06.80, p. 4.463), Helator o Exmo. Sr. Ministro Thompson Flores, decidiu a Egrégia Primeira Turma no mesmo sentido, Trazendo o acórdão a seguinte ementa: «Serventuário da Justiça no gozo de vitaliciedade. Extinção do seu cartório. Aproveitamento com base na legislação local, estão, imperaste. Concessão via mandado de segurança. Exegese do art. 206, § 2?, da Constituição. «II. Recurso extraordinário que se não conhece; eis que o acórdão recorrido não contrariou o art. 206, § 2? da Carta Maior, o qual obstou o provimento, apenas, para as nomeações que não compreendem o aproveltamento.n (fls. 123/124). Não existe, no caso, a meu ver, a pretendida ofensa ao *2? do art. 206, da Constituição Federal. Ao oficializar 312 R.T.J. - 100 as serventias do foro judicial e extrajudicial, mediante remuneração de seus servidores exclusivamente pelos cofres públicos, o art. 206, caput, ressaltou a situação dos que então eram seus titulares, vitalícios ou nomeados em caráter efetivo. Ao invés de impor a imediata oficialização de todas as serventias do foro judicial e extrajudicial, essa regra constitucional, transitoriamente, após à margem da oficialização as serventias que tivessem ocupantes vitalícios ou nomeados em caráter efetivo. Logo, se garantiu o direito de continuarem nos seus cargos, sob o regime da não oficialização, aos titulares vitalícios e efetivos de tais serventias, nada impede que titulares efetivos e vitalícios dos ofícios de justiça, cujos cargos tenham sido extintos, possam, mediante aproveitamento, ser providos em tais cargos. Não se cuida, em tal caso, de nomeação para cargos dessa natureza, mas de provimento, por outra forma, ou seja, mediante aproveitamento, de serventuário posto em disponibilidade, em razão da extinção do cargo, que ocupava. Como não vejo, na eipecie, a alegada ofensa ao § 2?, do art. 206, da Constituição Federal não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA RE.92.327 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Estado de São Paulo (Adv.: Sérgio João França). Recdo.: Jordelino Olímpio de Paulo (Adv.: Elba Montovanelli): Decisão: Adiado o julgamento por haver pedido vista o Ministro Cordeiro Guerra, depois dos votos do Relator e do Ministro Decio Miranda que não conheciam do recurso. Ausente, ocasionalmente, o Senhor Ministro Djaci Falcão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira Alves. Presidência do Senhor Ministro Leitão de Abreu. Presentes a Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra e Decio Miranda. Ausente, Ocasionalmente, o Senhor Ministro Djaci Falcão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 03 de outubro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: O eminente relator não vê, na alegada ofensa ao § 2? do art. 206 da Constituição Federal, e, em conseqüência, não conhece do recurso. Em caso idêntico — RE. n? 92.350 — DJ de 13.6.80, pág. 4.463 — sendo relator o eminente Ministro Thompson Flores, assim decidiu a Egrégia Turma. «Serventuário da Justiça no gozo da vitaliciedade. Extinção do seu cartório. Aproveitamento com base na legislação local, então, imperente. Concessão via mandado de segurança. Exegese do art. 206, § 2?, da Constituição. II — Recurso Extraordinário que se não conhece, eis que o acórdão recorrido não contrariou o art. 206, § 2?, da Carta Maior, o qual obstou o provimento, apenas, para as nomeações que não compreendem o aproveitamento.» ( fls. 123/124). Nessa conformidade, não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA RE 92.327 — SP — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Recte.: Estado de São Paulo (Adv.: Sérgio João França). Recdo.: Jordelino Olímpio de Paulo ( Adv.: Elba Montovane111). R.T.J. - 100 Decisão: Não conhecido. Unânime. Não participaram do julgamento os Senhores Ministros Djaci Falcão e Moreira Alves por não terem assistido ao Relatório. Presidência do Senhor Ministro ssão os Djaci Falcão. Presentes à Se Senhores Ministros Leitão de Abreu, 313 Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 21 de outubro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.605 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves. Recorrente: Itaú Seguradora S/A — Recorrido: Walter de Oliveira. Recurso. Se a questão objeto do recurso extraordinário só foi apreciada pelo acórdão recorrido (inadequação de recurso), aplica-se a parte final do inciso VIII do artigo 308 do Regimento Interno desta Corte, caindo o limite da alçada para 50 vezes o valor do maior saláriomínimo vigente no pais quando do ajuizamento da ação. Se o despacho saneador não pês termo ao processo, com julgamento do mérito, ou sem ele, mas considerou insubsistente a preliminar de prescrição, contra ele, nessa parte, cabia a interposição — como se fez — de agravo de instrumento, e não — como decidiu o acórdão recorrido — de apelação. Aplicação dos artigos 162, i 1?, e 513 do C.P.C. — Ademais, no caso, seria admissivel, em qualquer hipótese (e isso porque não se poderia pretender a existência de erro grosseiro) a conversão do recurso, como tem sido admitido por esta Corte mesmo em face do atual Código de Processo Civil (RE 91.157, RTJ 90/1.106). Recurso extraordinário conhecido e provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Brasília, 07 de novembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente — Moreira Alves, Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Moreira Alves: É este o teor do acórdão recorrido (fls. 99/95): «Cuida-se de agravo de instrumento interposto contra sentença certificada a fls. 22 que julgou não ocorrer a prescrição alegada pela ré-seguradora. Movida ação para haver o prêmio referente ao contrato de seguro de acidentes em grupo, por invalidez permanente, a seguradora 314 R.T.J. — 100 arguiu, na contestação, a ocorrência da prescrição (art. 178, § 6?, II, do Cód. Civil). Funda-se no laudo pericial que declara que o autor sofreu acidente em 12-6-72. E, pois, insubsistente a afirmação da sentença de que «a incapacidade que legitimará o A. pleitear o seguro ainda está por ser apurada». «Tendo fluido o prazo prescricional, sem qualquer interrupção, impõese o reconhecimento da prescrição, com o conseqüente decreto da improcedência da ação». O recurso foi respondido e preparado e a sentença mantida. art. 269. IV, do CPC dispõe: «Extingue-se o processo com julgamento do mérito quando o juiz pronunciar a decadência ou a prescrição». art. 162, § 1?, do CPC define a sentença:«é o ato pelo qual o juiz põe termo ao processo, decidindo ou não o mérito da causa». o art. 513 do CPC estabelece que cabe apelação da sentença. Em conseqüência, a sentença de fls. 22, pronunciando-se sobre a prescrição, declarando não ocorrer a mesma, é apelável. O agravo de instrumento é recurso inadequado para impugnar sentença, cabendo apenas para atacar decisão interlocutória, prevista no art. 162, § 2?, do CPC (cf. art. 522 do CPC). Reduzindo o elenco de recursos, o Código vigente não incluiu, em suas normas, disposição semelhante ao art. 810 do CPC/39 que permitia o recebimento de um recurso por outro. Acordam, em Segunda Câmara do Primeiro Tribunal de Alçada Civil, por votação unânime, não conhecer do agravo de instrumento, por ser inadequado. Custas na forma da lei». Interposto recurso extraordinário, foi ele admitido pelo seguinte despacho (fls. 70/71): «Em ação ordinária, movida para haver prêmio referente a contrato de seguro de acidentes em grupo por invalidez permanente, contestou a seguradora, argüindo a ocorrência de prescrição. O r. despacho saneador de fls: 22 afastou aquela preliminar, concluindo In verbis «a incapacidade que legitimará o A. pleitear o seguro ainda está por ser apurada». Contra essa decisão agravou de instrumento a ré e a Egrégia Segunda Câmara, por votação unânime, não conheceu do pedido, sustentando ser tal decisão atacavel somente por meio de apelação. Irresignada, recorre extraordinariamente a vencida, com fundamento nas alíneas a e d do permissivo constitucional, sob alegação de negativa de vigência aos artigos 162, § 1?, posto que a decisão impugnada não pôs termo ao processo e 269, IV, 513 e 522 do Código de Processo Civil. Não teria aplicado ainda, o v. aresto o principio da fungibilidade. Argúi também relevância da questão federal nos termos do artigo 308 do Regimento Interno do Colendo Supremo Tribunal Federal. Acusa ainda o v. acórdão recorrido de divergir de outro que junta por xerocópia a fls. 54. Houve impugnação a fls. 65/68. A questão, pelo seu alcance e conseqüências, merece apreciação pela Colendh Suprema Corte de Justiça. Defiro, portanto, o recurso. R.T.J. — 100 315 Por outro lado, dispõe o artigo 413 do mesmo código: «Art. 513. Da sentença caberá apelação ( arts. 267 a 269)». Portanto, pelo sistema do Código atual, para que haja sentença é mister que se trate de ato do juiz que ponha termo ao processo com ou sem julgamento do mérito. 2 o relatório. Se se tratar de ato decisório que VOTO não ponha termo ao processo, ainda O Sr. Ministro Moreira Alves (Re- que decida sobre parte do mérito, lator): 1— No caso, não há o óbice do enquadrar-se-á ele entre as decisões inciso VIII do artigo 308 do Regimen- interlocutórias, certo como é que o to Interno, porquanto a questão pro- Código de Processo Civil atual tocessual em causa — inadequação do mou a expressão decisão interrecurso — só foi decidida por uma locutória em sentido muito amplo, instância, razão por que se aplica pois, como acentua PONTES DE analogicamente a parte final desse MIRANDA (Comentários ao Código dispositivo, que reduz a alçada a 50 de Processo Civil, VII, pág. 186), ao vezes o maior salário-mínimo vigen- comentar o artigo 513: te no pais na data de seu ajuizamen«Se a decisão não põe fim ao proto, ou seja, Cri 55.320,00, inferior ao cesso, com ou sem julgamento do valor atribuído à causa (Cr$ mérito, é interlocutória ( cf. art. 60.000,00). 162, § 2?). 2 — Ultrapassada essa preliminar, Em vez de definitividade, há inconheço do recurso e lhe dou proviterlocutoriedade». mento, para que retornem os autos do Tribunal de origem, a fim de que No caso, a decisão atacada foi o este, afastada a preliminar de não despacho que, declarando saneado o conhecimento por inadequação do processo, decidiu pela insubsistência agravo de instrumento, prossiga no da preliminar de prescrição. Por julgamento como entender de direi- conseguinte, não pôs esse despacho to. termo ao processo, não ocorrendo, pois, qualquer das hipóteses previsReza o artigo 162, §§ 1? e 2?, do Có- tas nos artigos 267 e 269 do C.P.C, a digo de Processo Civil: que se reporta o artigo 513 do mesmo Código. E, em assim sendo, «Art. 162. Os atos do juiz consis- cabível seria — como, aliás, foi o retirão em sentença, decisões interlo- curso interposto — o agravo de inscutórias e despachos. trumento. Sentença é o ato pelo qual o O acórdão recorrido violou, porjuiz põe termo ao processo, deci- tanto, os artigos 162, § 1?, e 513 do dindo ou não o mérito da causa. Código de Processo Civil. Decisão interlocutória é o Observo, finalmente, que, ainda ato pelo qual o juiz, no curso do quando assim não fosse, o presente processo resolve questão incidente. recurso deveria ser conhecido pelo dissídio de jurisprudência — que foi Manifeste-se o recorrente, se tem ainda interesse na formação do instrumento para a argüição de relevância. Int.» Houve argüição de relevância da questão federal, que foi rejeitada. 316 R.T.J. — 100 demonstrado — no tocante à possibilidade (que o acórdão recorrido negou) de conversão de um recurso em outro. E, nesse caso, a ele seria dado provimento, uma vez que esta Corte tem admitido a conversão de recurso, desde que não haja erro grosseiro, o que, na hipótese, evidentemente não ocorreria. Assim julgou a Primeira Turma, ao apreciar o RE 91.157, relator o Sr. Ministro Xavier de Albuquerque, tendo o acórdão a seguinte ementa: «Recurso. O princípio da fungibilidade subsiste no sistema do Código de Processo Civil de 1973, a despeito de não haver este reproduzido norma semelhante à do art. 810 do estatuto processual de 1939. Recurso extraordinário conhecido e provido» (RTJ 90/1.106 e segs. ) . E, em seu voto, acentuou o Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: «Assim também decidiu a Segunda Turma, embora tal entendimen- to não pudesse ser aproveitado para a conclusão do julgado, no RE 86.179, apontado como dissidente» (ibidem, fls. 1.108). EXTRATO DA ATA RE 92.605 — SP — Rel.: Min. Moreira Alves. Recte.: Itaú Seguradora S/A (Advs.: Sebastião Silveira Dutra e outros). Recdo.. Walter de Oliveira (Adv • Erasto Pinheiro Wiezel). Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro Relatar. unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes á Sessão os senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Dedo Miranda. SubprocuradorGeral da República, Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 07 de novembro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.876 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrentes: José Maria da Silva Pimenta e Maria Vieira Pimenta (Espólios de) — Recorridos: José Veríssimo Santos Baldez e outros. Promessa de compra e venda. Figurando, na promessa, somente o marido, desnecessária, para a constituição em mora, da notificação da mulher, bem como não inscrita a promessa no registro imobiliário, lnexlgível a interpelação a que se refere o art. I? do DL n? 745/69. Dissídio demonstrado em relação a ambas as teses. Recurso extraordinário conhecido e provido. ACÓRDÃO Brasília, 12 de dezembro de 1980. — Djaci Falcão, Presidente — Vistos, relatados e discutdos estes Leitão de Abreu, Relator. autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal RELATORIO Federal, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráfiO Sr. Ministro Leitão de Abreu — cas, em conhecer do recurso e lhe dar provimento, nos termos voto do Este o teor da sentença, que julgou procedente a ação: Ministro Relator, unanimemente. R.T.J. — 100 «Os espólios de José Maria da Silva Pimenta e Maria Vieira Pimenta aforaram a presente ação de rescisão de contrato de compra e venda com reintegração na posse contra José Veríssimo Santos Baldez, Vera Santos Baldez, Mauricio Santos Baldez, Veríssimo Costa Baldez, Galdino Luiz Santos Baldez, Luiz Carlos Santos Baldez e Sandra Rachel Santos Baldez. «Na inicial de fl. 2/4, alegam os AA., em síntese, que: que, os RR. adquiriram dos AA., através de escritura pública de promessa de compra e venda, os imóveis situados na Alameda São Boaventura n? 454 e 456, casas 1 e 2, desta cidade; que, o preço ajustado foi de Cri 150.000,00, recebendo no ato a quantia de Cri 30.000,00 e o saldo devedor de Cri 120.000,00 seria pago em 16 prestações mensais e sucessivas de Cri 5.000,00 (Cri 80.000,00), vencível a primeira em 06-10-73, mais 4 prestações trimestrais de Cri 10.000,00 (Cri 40.000,00), vencendo-se a primeira em 06-12-74; que, os RR pagaram três (3) prestações de Cri 5.000,00 e duas (2) de Cri 10.000,00; que, descumprindo os RR suas obrigações contratuals, foram devidamente interpelados, ficando, assim, constituídos em mora; e) que, ficou ajustado na cláusula 6? do contrato que o não pagamento de duas (2) prestações mensais e sucessivas autorizaria os vendedores a rescindir a presente promessa de compra e venda (fl. 8 v.); Pelo que, não atendendo á interpelação judicial, pediam a citação dos RR. para responderem aos termos da presente ação, cumulada 317 com reintegração na posse, sendo afinal, julgadas procedentes com as cominações de estilo. «Com a inicial, vieram os docs. de fl. 7-32. «Os RR. foram regularmente citados (fl. 38/42). «Em contestação, que fez acompanhar do doc. de fs. 47, alega o R. — José Veríssimo Santos Baldez, em linhas gerais, o seguinte: que, não foi interpelado como determina o DL 745/69: que, a sua interpelação foi ardilosamente feita por hora certa; C) que, os AA. se negavam ao recebimento das prestações; Pelo que requer a improcedência do pedido com as conseqüentes condenações. «Réplica às fls. 49/52. «Os demais RR. deixaram fluir em branco o prazo para a resposta. «Tratando-se de ação real imobiliária foram os cônjuges do RR., também, citados (fl. 69/73). E não acudiram á citação (fl. 74). «Este é o relatório. «Decido, tendo em vista o disposto no art. 330, I do CPC. «Todo contrato de efeito bilateral traz Insita a cláusula resolutiva expressa ou tácita. «Com efeito, por força dessa cláusula abre-se para o vendedor a seguinte alternativa: pedir o preço, ou considerar desfeita a venda. «A rigor, tal direito já competia ao vendedor, mesmo sem a lex comissoria expressa. Apenas através dessa cláusula, ficava o vendedor dispensado de obter sentença constitutiva de rescisão, posto que sua manifestação de vontade, nesse sentido, tem eficácia suficiente para romper a compra e venda. 318 R.T.J. — 100 «Ora, a promessa de compra e venda é expressa* deixando os outorgados de pagar nas épocas próprias duas (2) prestações mensais e consecutivas, podem os vendedores optar pela rescisão da presente promessa (cl. 6? — fi. 15 v.). «Ainda mais: «Revela a prova de fl. 53/54 que as notas promissórias representativas do saldo do preço foram encaminhadas a Banco desta praça, de acordo com a cl. 2? do contrato (fl. 15). E. junto ao Banco Itaú América S/A os títulos não foram pagos (fl. 55 e 56). «Interpelados, judicialmente (fl. 8/32), foram os RR. constituídos em mora. «Por outro lado, a contestação não teve eficácia suficiente para ilidir a pretensão dos AA., porque a interpelação (Dl 745/69) foi regularmente efetivada, conforme certificam os docs, de fs. 25, 26 e telegrama de f. 29; dispuseram os RR. de meios para se libertarem da obrigação e nem mesmo perante o Cartório de Protestos (fl. 56/57) se dispuseram a efetuar o pagamento devido. «Isto posto, e considerando o mais que dos autos consta, Julgo, com fundamento no art. 119 e 1.092 do Código Civil e demais dispositivos legais pertinentes e aplicáveis à espécie, procedente o presente pedido, para declarar anulada e sem efeito a escritura pública de 69-73, liv. 32, fs. 9v., passada em notas do Cartório da 4? Zona Judiciária desta Comarca de Niterói (RJ). «Condeno, ainda, os RR. no pagamento de custas e honorários advocatícios, que fixo em 20% sobre o valor da causa. «Expeça-se, incontinentemente, mandado de reintegração na posse dos imóveis situados na Alameda São Boaventura n? 454 e 456, casas 1 e 2, desta cidade, pelo que reintegro os AA.» (fs.92/94) Apelou José Veríssimo dos Santos Baldez, reeditando os argumentos da contestação, e o seu apelo foi provido, nos termos do seguinte voto do Relator: «Pretendem os Autores a rescisão da promessa de compra e venda que ajustaram com os réus porque estes deixaram de pagar as prestações avençadas. «Defende-se o Réu José Veríssimo Baldez, alegando que não foi regularmente notificado conforme determina o Decreto-lei 745, de 1969. «Realmente, a notificação foi feita com hora certa, no endereço dos demais Réus, quando era conhecido o do contestante que residia à rua Monnerat, 19, ap. 202, enquanto que a diligência impugnada foi completada na Alameda S. Boaventura n? 456, casa 2. «E verdade que o Oficial de Justiça certificou que procurou o Réu no Palácio Nilo Peçanha, onde o mesmo trabalhava e não o encontrou, assim como a Galdino Luiz Santos Baldez, achando que eles se ocultavam para fugir à notificação. Em razão disso, marcou com o pai dos Réus dia e hora para a diligência. «A notificação é, entretanto, irregular ressaltando-se que o telegrama foi enviado à Alameda São Boaventura, 456, casa 2. «Reputa-se, no entanto, como ineficaz a interpelação mesmo porque, na contestação, o Apelante a 319 R.T.J. - 100 impugnou, não se podendo dizer, por isso, que a citação para a ação teria o condão de substituir a notificação. «Além disso, as esposas dos Réus casados não foram incluídas na aludida interpelação. «Nessas condições, dá-se provimento ao recurso para julgar-se o Autor carecedor da ação proposta.» (fs. 131/132) Ficou vencido o Juiz Marques Morado, que anulava o processo a partir da notificação. Recorreram extraordinariamente os autores: pela alínea a, alegam que o acórdão recorrido negou vigência aos arts. 37 e parágrafo único, 227, 228, ff 1? e 2?, e 229 do Cód. de Proc. Civil, e 119 e seu parágrafo e 1.092 do Código Civil pela alínea d, apontam dissídio com arestos deste Tribunal, segundo os quais a citação para a causa supre a interpelação, ou a interpelação do marido dispensa a da mulher, se somente aquele figurou na promessa, ou, no caso de situação constituída anteriormente, não se aplica o Dl 745/69. O Juiz João Francisco admitiu o recurso pela alínea d, verbis: «No que se relaciona com a falta de mandato do Advogado que firmou a apelação de fs. 97/99, embora os Recorrentes hajam aflorado o assunto quando da réplica, não o reiteraram na, resposta de fs. 102/103, silenciando-se o acórdão recorrido a respeito. «Não há, pois, que falar-se em violação do artigo 37, 2?, do Cód. de Proc. Civil, capaz de ensejar o recurso extremo, porquanto prevalece o principio [tisno na Súmula — verbete 282. «Dos artigos 119, parágrafo único, e 1.092, do Código Civil, não adversoú o acórdão recorrido. «Quanto ao primeiro, a norma a observar é a do Decreto-lei 745/69 e, com o segundo, não tem pertinência o julgado. Inadmissível, portanto, o Recurso com fulcro na letra a. «Com pertinência à alínea d, o Aresto alinhado a fl. 144 e publicado na Revista Trimestral de Jurisprudência, vol. 73/948, em face do entendimento do acórdão recorrido, que proclamou necessária a interpelação, no caso, das esposas dos réus, prova o dissídio jurisprudencial.» (fl. 171) 6 o relatório. VOTO O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator) — Trata-se de ação de rescisão de promessa de compra e venda ajuizada pelos Espólios de José Maria da Silva e de Maria Vieira Pimenta contra os compromitentescompradores, ora recorrentes, ação cumulada com a de reintegração de posse. Consta do contrato que alguns dos promitentes compradores são casados, sem que, entretanto, suas mulheres houvessem participado desse negócio jurídico. Entendeu, contudo, o acórdão recorrido ser necessária a notificação delas, para a constituição em mora. Está em conflito a decisão local, nesse ponto, como argúem os recorrentes, com o acórdão desta Corte, publicado na RTJ 73/948. Cuida-se, por outro lado, de promessa de compra e venda não inscrita no registro imobiliário, nem dela consta obrigação de se proceder ao dito registro. Desse modo, ao dar pela carência da ação, o aresto impugnado destoa, também, dos padrões, onde se entende que a citação para a causa supre a interpelação. 320 R.T.J. — 100 Conheço, do recurso, pelo dissídio jurisprudencial, passando, pois, ao julgamento da causa. Firme é a jurisprudência do Supremo Tribunal no sentido de que, figurando somente o marido no compromisso de compra e venda, não há necessidade, para a constituição em mora, da notificação da mulher. Firmou-se, ainda, a orientação desta Corte no sentido de que não se achando inscrita a promessa no registro imobiliário, não se faz exigível a interpelação a que se refere o art. 1? do Dl n? 745/69. Nesse sentido, exemplificativamente, os RFtEE 89.459 e 89.699, o primeiro relatado pelo Ministro Moreira Alves e o segundo, pelo Ministro Djaci Falcão EXTRATO DA ATA RE 92.876 — RJ — Rel.: Min. Leitão de Abreu. Rectes.: José Maria da Silva Pimenta e Maria Vieira Pimenta (espólios de) (Advs.: José Danir Siqueira do Nascimento e Outro). Recdos.: José Veríssimo Santos Baldez e outros (Adv.: Fernando Ribeiro Capella). Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro Relator. Unânime. Falou, pelo Rede. Dr. A. C. SigmarInga Seixos. Falou, pelo Recdo.: Dr. Edmundo de Noronha. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Ante o exposto, dou provimento ao Decio Miranda. Subprocuradorrecurso para determinar que o Co- Geral da República, Dr. Mauro Leite lendo Tribunal a quo, afastada a ca- Soares. rência da ação, prossiga no julgaBrasília, 12 de dezembro de 1980 — mento da apelação, como for de di- Hélio Francisco Marques, Secretário. reito. RECURSO EXTFtAORDINARIO N? 92.878 — SP (Tribunal Pleno) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Violin Transportes Ltda — Recorridos: Panamericana de Seguros S/A e Instituto de Resseguros do Brasil. Ajuizada a ação no prazo fixado para o seu exercício, o retardamento na sua distribuição e na citação do réu, por obstáculo decorrente do mecanismo da justiça, jamais por inércia da autora, não justifica a acolhida da argüição de prescrição. Precedentes do S.T.F. Recurso extraordinário provido, para que, afastada a preliminar de prescrição, o Tribunal local prossiga no julgamento do recurso, como for de direito. ACORDA° provimento, nos termos do voto do Ministro Relator. Vistos, relatados e discutidos estes Brasília, 23 de setembro de 1980 — autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supre- •Djaci Falcão, Presidente e Relator. mo Tribunal Federal, à unanimidade RELATO RIO de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráO Sr. Ministro Djaci Falcão: Adoto ficas, conhecer do recurso e dar-lhe como relatório o despacho que admi- R.T.J. — 100 tiu o recurso, lançado nos seguintes termos: “Violin Transportes Ltda, na qualidade de segurada, moveu ação ordinária contra a seguradora, visando o recebimento de indenização por sinistro ocorrido com um dos veículos de sua frota, visto que a ré se recusava a efetuar o pagamento em razão de ter o prémio sido pago após a ocorrência. Em sua contestação a ré Panamericana de Seguros S/A, suscitou preliminar de prescrição da ação, por decorridos mais de ano entre a data do evento e a do despacho que determinou a citação. Em segundo grau, a E. Primeira Câmara Civil deu provimento a `agravo retido para acolher a prellMinar de prescrição da ação, condenada a autora nas custas e honorários advocaticios de 10% sobre o valor da causa'. Inconformada, a autora, após embargos de declaração rejeitados, interpôs extraordinários (CF119, III, a, d) alegando ofensa do julgado ao art. 263 do Código de Processo Civil e discrepância com a jurisprudência do Excelso Pretório (RTJ 45-66, 50-449, 52-23, 73-243, 78-631, 81-287 e 81-990). Houve impugnação. Ao reconhecer a prescrição disse o acórdão recorrido: `Dispõe o artigo 178, 6?, inciso II, do Código Civil que prescreve em um ano a ação do segurado contra o segurador e vice-versa, se o fato que a autoriza se verificar no pais; contado o prazo do dia em que o interessado tiver conhecimento do mesmo fato'. O fato que autoriza a presente ação, por sem dúvida, é o acidente ocorrido com o veiculo da autora, que, segundo ela, estaria 321 acobertado pela apólice de seguro. E, à falta de prova em contrário, é de se presumir que a autora tomou ciência do fato — o acidente — no dia em que o mesmo ocorreu. Pois bem. O sinistro teve lugar no dia 17 de outubro de 1976, de sorte que o prazo para o exercício do direito de ação encerrou-se em 17 de outubro de 1977. A autora distribuiu a inicial em 14 de outubro de 1977, mas só obteve o despacho determinador da citação no dia 18 seguinte. Ora , estabelece o artigo 219, Si 1?, do Código de Processo Civil, que verbis:' A prescrição considerar-se-á interrompida na data do despacho que ordenar a citação'. Por conseguinte, não é a distribuição da ação, como pretende a agravada, que interrompe a prescrição, mas apenas o despacho que determina a citação. Tanto assim que, mesmo após esse despacho, se a citação não se consuma, no prazo, para fato imputável ao autor, tem-se por não interrompida a prescrição (artigo 219, 4?). Em suma, pois, no presente caso, quando foi exarado no resto da inicial o despacho mandando citar a ré, já havia fluido o prazo prescricional de um ano' ( fls. 223-4). Impugnando-o alega a recorrente que, `a decisão recorrida confina com iterativa, uniforme e torrencial jurisprudência do Supremo Tribunal Federal que, sem discrepância, declara que a distribuição da ação tem o condão de interromper a prescrição, pois o credor não ficou inerte e fez, em tempo hábil, antes da consumação do prazo prescricional, o que lhe cumpria fazer. 322 R.T.J. — 100 Realmente, é do Código de ProA decisão recorrida, acolhendo a cesso Civil, que 'considera-se preliminar de decadência destoou, proposta a ação, tanto que a peti- sem dúvida, dos acórdãos trazidos a ção inicial seja despachada pelo confronto, dentre os quais figuram: juiz, ou simplesmente distri«Ajuizada a ação no prazo fixado buída, onde houver mais de uma para o seu exercício, o retardamenvara' (art. 263), e também que: to na sua distribuição e na citação do réu, por obstáculo decorrente do 'O processo começa por iniciamecanismo da Justiça, jamais por tiva da parte mas se desenvolve inércia da autora, não justifica a por impulso oficial' (art. 262)'. acolhida da argüição de decadência» (RE 63.770, relator o Senhor A citação, pelo artigo 219, caput, Ministro Djaci Falcão, in FtTJ 48interrrompe a prescrição na data 220, fls. 242 dos autos). do despacho que a ordenar (§ 1?). «Petição apresentada no último Mas, é mister considerar que os dia do prazo à distribuição neces§§ 2? e 3? prevêem prazo para a sária, embora despachada no dia promoção da citação e que somenseguinte. Prescrição que se consite quando não observados é que dera interrompida na data em que 'haver-se-á por não interrompida a apresentada a juízo a petição (1? prescrição' (§ 4?). Turma — un. — RTJ 73-243). A hipótese, quer pela letra a, «Apresentada, em juízo, a petiquer pela d, em face do teor dos ção inicial, antes de transcorrido o acórdãos paradigmas transcritos, tempo da prescrição, não importa autoriza o encaminhamento do que, por causa pertinente ao serviapelo extremo. ço judiciário, o despacho que ordenou a citação haja sido proferido Pelo exposto, defiro o recurso. depois de tal prazo, pois é sabido que a parte postulante não responSão Paulo, 31 de março de 1980 de pela demora da invencível buro— Gentil do Carmo Pinto, 3? Vicecracia forense» (1? Turma — un. Presidente do Tribunal de Justiça — RTJ 7&/631)» (fls. 243). em exercício» (fls. 260 a 264). E oportuno acrescentar que foi Oferecidas as razões de fls. 269 a essa jurisprudência em face 271 e contra-razões de fls. 273 a 276 e mantida do C.P.C. que passou a vigorar em 279 a 281, subiu o recurso a esta Cor- 1974 (RE 87.178, relatado pelo emite. nente Ministro Xavier de Albuquerque, in RTJ 81/990). No caso dos auVOTO tos a citação se deu nos dez dias seguintes à prolação do despacho do O Sr. Ministro Djaci Falcão (Rela- Juiz (§ 2? do art. 219 do CPC). Esse tor): Como se viu do relatório, o si- despacho é que foi retardado, mas nistro ocorreu a 17.10.1976. Portanto, sem culpa imputável a autora da o prazo para o exercício do direito ação. de ação haveria de expirar a Ante o exposto, conheço do recurso 17.10.1977. A 14.10.1977 a autora distribuiu a petição inicial Todavia, o e dou-lhe provimento, para que afasjuiz somente proferiu despacho orde- tada a prejudicial de prescrição, o nando a citação no dia 18.10.1977, Tribunal a quo prossiga no julgaoperando-se esta a 27.10.1977 (fls. 2 e mento do recurso, como entender de 33). direito. R.T.J. — 100 323 EXTRATO DA ATA Presidência do Senhor Ministro RE 92.878 — SP — Relator: Minis- Djaci Falcão. Presentes á Sessão os tro Djaci Falcão. Recte.: Violin Senhores Ministros Leitão de Abreu, Transportes Ltda. (Advs.: Jayme Moreira Alves e Decio Miranda. AuQueiroz Lopes e outros). Recdos.: sente, justificadamente, o Senhor Ministro Cordeiro Guerra. SubprocuPanamericana de Seguros S/A rador-Geral da República, o Dr. ( Advs.: Gilberto Lupo e outros) e Mauro Leite Soares. Instituto de Resseguros do Brasil (Advs.: Adolpho Martinelli e outros). Decisão: Conhecido e provido nos Brasília, 23 de setembro de 1980 — termos do voto do Ministro Relator. Hélio Francisco Marques, SecretáUnânime. rio. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.900 — PR (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — INCRA — Recorridos: Altino Reis Junqueira e outros. Ação reivindicatória, entre particulares, em torno de terras situadas na faixa de fronteira. Intervenção do INCRA. Competência da Justiça Federal de primeira instância, Seção do Estado do Paraná, para processar e julgar a causa (art. 125, inc. I, da C.F.). Recurso extraordinário provido. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Ministro Relator. Brasília, 14 de outubro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão: Cuida-se de recurso extraordinário que foi processado por força do agravo de instrumento sob n? 77.9787, processo em apenso. Lê-se no despacho do Presidente Ariel Ferreira do Amaral e Silva: «Da decisão que julgou improcedente exceção de incompetência absoluta suscitada pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — Incra (xerox de f. 17/18), agravou o vencido e ao recurso, regularmente processado nas jurisdições de primeiro e segundo graus, a Egrégia 4? Câmara do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná negou provimento, pelo v. Ac. n? 50/51 do feito, assim ementado, verbis «Ações possessórias entre particulares, relativas a imóveis localizados em faixa de fronteira». Irresignado, manifestou o agravante, tempestivamente, com apoio no artigo 119, III, letras a e d da Constituição Federal, o RE de f. 53/59, ao pressuposto de negativa 324 R.T.J. — 100 de vigência, pelo julgado recorrido, ao artigo 10, inciso I, da Lei n? 5.010, de 30-05-1966, de ofensa à Constituição, assim como de dlssenso interpretativo, que refere no item VII do procedimento recursório. Não houve impugnação do recorrido e do M.P (certidões de fl. 60 e 62), respectivamente. Improcede o RE. Com efeito e bem sustentado no aresto recorrido (fl. 50/51). Não se trata de exame do domínio, à luz de normas legais e constitucionais, ou, de titulação por parte de estado-membro. Os problemas e as conseqüências dessa ação dizem respeito, apenas, aos litigantes. A questão dominai é completamente independente; não interessa à causa. Tampouco, cabe discutir sobre a legitimidade do titulo expedido pelo Estado do Paraná. A respeito poderá a União valer-se das prerrogativas que lhe são inerentes. A decisão a ser proferida ficará restrita aos direitos e obrigações entre os litigantes, sem afetar as preocupações do agravante. Pelo exposto, acordam os Juizes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Paraná, por maioria, em negar provimento ao recurso. Custas ex vi legis. E a decisão que o acórdão recorrido manteve, bem esclarece, a seu turno, a hipótese da causa (fls. 17/18): Pretende o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — Incra, através seus patronos, pronunciamento judicial que acolhe a exceção de incompetência absoluta argüida e que os presentes autos sejam encaminhados à Justiça Federal em virtude da lide versar sobre porção de terras situada na faixa de fronteiras. No entanto, os exceptos comprovaram que a área em referência foi desmembrada legitimamente do patrimônio público, por titulo idôneo, sendo que o título de propriedade expedido pelo Estado do Paraná deu-se em 1? de outubro de 1920, tendo sido devidamente transcrito no Registro de Imóveis desta Comarca em 13 de março de 1946, ambas as datas, portanto, anteriores à vigência do Decreto-lei n? 9.760, de 5 de setembro de 1946, que em seu artigo 5? conceitua as terras devolutas na faixa de fronteira, excluindo expressamente, as particulares. Comentando tal artigo, assim ensina F.C. de Santiago Dantas Problemas de Direito Positivo fls. 121: «Por ai se vê que a União não considera devolutas, e por conseguinte não chama ao seu patrimônio, as terras situadas na faixa de fronteira, que se tenham incorporado ao domínio privado, em virtude de alienação, concessão ou reconhecimento por parte da União ou dos Estados». Julgo improcedente a exceção de incompetência absoluta argüida pelo Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — Incra. Custas e demais encargos ao final. Publique-se. Registre-se. Intime-se. R.T.J. — 100 Não há, como se vê, qualquer infração a normas de leis federais e da Constituição Federal, a que se apega o recorrente, nem o dissídio jurisprudencial intentado se reveste de necessária adequação à hipótese restrita dos autos. Em face do exposto, indefiro o RE pela dupla motivação constitucional» (fls. 63 a 64). Acrescento que, após as razões de fls. 74 a 79 e 83 a 86, subiu o processo a esta Corte, onde recebeu o seguinte parecer «Trata-se de recurso extraordinário Interposto de r. acórdão prolatado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, arrimado nas letras a e d do permissivo constitucional, sob alegação de negativa de vigência do disposto no art. 10, inciso I, da Lei n? 5.010, de 30-05-66, com ofensa do estatuído no • art. 125, I, da Lei Maior, bem assim de dissídio pretoriano. 2 — Indeferido na Egrégia Corte a quo, sobre o apelo, para melhor exame; mercê do r. despacho exarado as fls. 70 dos autos do agravo em apenso. 3 — O recorrente, citado para manifestar-se em ação reivindicatória ajuizada pelo 1? recorrido e sua mulher contra Angelo Capeletti e outros, argüiu a incompetência absoluta da Justiça comum estadual para conhecer do pedido, ao fundamento de girar a lide em torno de um trato de terras inserido na denominada 'faixa de fronteira', de domínio da União, a impor fosse o processo deslocado para a Justiça Federal, consoante prevê o art. 125, I, da Constituição vigente e dispõe o art. 10, I, da Lei nt 5.010, de 30-05-66. 4 — A invocada incompetência foi repelida pelas doutas instâncias ordinárias, que recusaram-se a ver 325 o interesse do recorrente, a primeira, por ter os autores da ação como titulares de domínio legítimo da área reivindicanda, em razão de título de propriedade idôneo expedido pelo Estado do Paraná á Companhia Estrada de Ferro São Paulo — Rio Grande, em 1? de outubro de 1920, e a segunda, por considerar restritos aos litigantes os problemas e as conseqüências da ação, aos quais seria alheio o recorrente. 5 — A espécie presente diz com pleito envolvendo uma área de 300 (trezentos) alqueires paulistas, equivalentes a 7.260.000 m2 (sete milhões e duzentos e sessenta mil metros quadrados), situada no Município de Foz do Iguaçu, distando de sua sede 25 (vinte e cinco) quilômetros e exibindo como uma de suas divisas o Rio Paraná (c. doc. copiado ás fls. 22), donde se conclui, in limine, encontrar-se o imóvel em foco dentro da chamada 'faixa de fronteira', na vetusta zona de dez léguas contíguas aos limites do território nacional com paises estrangeiros, fixada desde a Lei n? 601, de 18 de setembro de 1850, que dispunha sobre as terras devolutas no Império, e do regulamento que a mandou executar, o Decreto n? 1.318, de 30 de janeiro de 1854, onde dita zona foi reservada ao estabelecimento de colônias militares e outros fins (arts. 82 a 85). 6 — Esse Excelso Pretório, no pertinente ao espaço em tela, tendo por predominante e firme sua jurisprudência, editou a súmula 477, cujo enunciado põe a cavaleiro da mais mínima dúvida o domínio da União sobre as prefaladas terras localizadas na 'faixa de fronteira'. 7 — Do só aduzido resulta inconteste a imcompetência absoluta da Justiça comum estadual para 326 R.T.J. - 100 apreciar ação reivindicatória como a ora noticiada, envolvendo área integrante de 'faixa de fronteira, máxime tendo em conta a intervenção da autarquia federal, recorrente, que, no exercício seu legítimo mister, ingressou no feito visando a excluir os pretensos direitos das partes em litígio. 8 — Se para ação de manutenção de posse, entre particulares, a respeito da área encravada em 'faixa de fronteira', já definiu essa Suprema Corte a competência da Justiça Federal ao teor do v. acórdão proferido na Ação Cível Originária n? 95, do Paraná (In R. T. J. 52-620 a 627), curial será o mesmo reconhecer no tocante à ação reivindicatória aqui ventilada, fulcro primeiro do extraordinário apelo formulado. 9 — A ofensa ao ditame do art. 125, I, da Constituição, bem assim a negativa de vigência ao disposto no art. 10, I, da Lei n? 5.010, de 3005-66, revelam-se presentes, de forma inarredável, perpetradas, que o foram, pelo r. aresto recorrido. 10 — Isto posto, o parecer é pelo conhecimento e provimento do recurso, para o fim de, declarada a incompetência da douta Justiça a quo, e, ipso facto, a nulidade dos atos decisórios nela havidos, ser determinada a remessa dos autos principais à Justiça Federal da Seção Judiciária do Estado de origem, competente para processar e julgar a ação relvindicataria ajuizada por Altino Reis Junqueira e sua mulher contra Angelo Capeletti e outros. Brasília, 24 de setembro de 1980 — José Antonio Leal Chaves, Procurador da República. Aprovo: Mauro Leite Soares Subprocurador-Geral da República» (fls. 90 a 93). VOTO O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relator): Consoante observa, com acerto, o parecer do Dr. José Antonio Leal Chaves: «Se para ação de manutenção de posse, entre particulares, a respeito da área encravada em 'faixa de fronteira', já definiu essa Suprema Corte a competência da Justiça Federal, ao teor do v. acórdão proferido na Ação Civel Originária n? 95, do Paraná (in RTJ 52-620 a 627), curial será o mesmo reconhecer no tocante à ação reivindicatória aqui ventilada, fulcro primeiro do extraordinário apelo formulado (fls. 92). Aliás, esclareço que fui o relatar da decisão proferida na mencionada ação. Ante o disposto no art. 125, Inc. I, da Constituição Federal e de acordo com o parecer, conheço e dou provimento ao recurso, para, declarando a incompetência da Justiça estadual e a nulidade dos atos decisórios, determinar a remessa dos autos da ação à Justiça Federal, Seção do Estado do Paraná a quem compete processar e julgar a causa. EXTRATO DA ATA RE 92.900 — PR — Rel. Min. Djaci Falcão. Recte.: Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — Incra (Advs.: Geraldo Castellano Biscaia e outros). Recdos.: Altino Reis Junqueira e outros (Adv • Salazar Barreiras). Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro Relatar. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão Presentes à Sessão os Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e R.T.J. — 100 327 Decio Miranda. SubprocuradorBrasília, 14 de outubro de 1980 — Geral da República, o Dr. Mauro Hélio Francisco Marques, Secretário. Leite Soares. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.914 — SP (Segunda Turma) Relatar: O Sr. Ministro Djaci Falcão. Recorrente: Ademar Trentini — Recorrido: Instituto Nacional de Previdência Social — INPS. Duplo grau de jurisdição. As decisões contra autarquias não ficam sujeitas ao duplo grau de jurisdição, a menos que lei especial disponha em contrário. Inteligência do art. 475, Inc. II, do C. P. Civil. Precedentes do Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário provido, com restabelecimento da decisão de primeiro grau. ACÓRDÃO Vistos relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros componentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade de votos e na conformidade da ata do julgamento e das notas taquigráficas conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Ministro Relator. Brasília, 26 de agosto de 1980. — Djaci Falcão, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Djaci Falcão: Trata-se de recurso extrhordinário, processado por força da Argüição de Relevância n? 6.008-8 (proc. em apenso), contra a seguinte decisão: «Vistos, relatados e discutidos Apelaçãoautos de estes Sumarissimo n? 93.893, da comarca de São Bernardo do Campo, em que é recorrente o Juizo de Oficio, sendo apelante Instituto de Administração Financeira da Previdência e Assistência Social — IAPAS (INPS) e apelado Ademar Trentini: Acordam, em Quinta Câmara do Segundo Tribunal de Alçada Civil, por votação unânime, adotado o relatório de fls. 78, não conhecer do recurso voluntário e dar provimento ao de oficio. Do recurso do IAPAS não tomam conhecimento pelas razões expostas no parecer da Procuradoria da Justiça. Mas dão provimento ao recurso de ofício. O autor era ajudante de fábrica de parafusos. Não se queixou das condições excepcionais do trabalho, mas tão-só de acidente ocorrido em 26 de fevereiro de 1971, quando ao erguer uma barra de ferro sentiu um estalido na coluna. Foi encaminhado ao INPS, onde recebeu tratamento, mas a alta foi dada embora não tenha ficado completamente curado. Tem espondiloartrose lombar. E moléstia de caráter degenerativo. O resultado da radiografia diz: «espondilose lombar» «anomalia transicional». 328 R.T.J. — 100 Não há afirmação de lesão na coVOTO luna causada pelo acidente. Por isso mesmo, o perito, que deixou de O Sr. Ministro Djaci Falcão (Relafazer vistoria no local de trabalho, tor): Como se viu da leitura do acór«pois trata-se de acidente-típico, dão recorrido, foi admitido o duplo perfeitamente caracterizado (At. grau de jurisdição por se tratar de número 4.035-71)», acabou por rela- autarquia, julgando-se improcedente cionar o mal com o trabalho diário a ação. Entende o recorrente que do autor, que «desempenhava fun- descabe a remessa ex officio, na cações que exigiam dispêndio de es- so de sentença contra autarquia, forço fisico,com repetidos movi- consoante o disposto no art. 475 do mentos de nexo-extensão do tron- Código de Processo Civil. co, e foi vítima de um acidente, com lesão direta da coluna». ( fls. O Recurso merece provimento. Na 39). qualidade de relatar do RE 90.424 tive oportunidade de afirmar, interMas tanto o exame físico como a pretando o art. 475, Inc. II, do CPC, radiografia foram realizados entre que as decisões contra autarquias 14 de outubro a 18 de novembro de não estão sujeitas a duplo grau de 1977, porque o autor não se interes- jurisdição, a menos que lei especial sou pelo processo e demorou para venha a dispor em contrário. A recomparecer para os exames. Logi- gra do citado inciso refere-se, de camente, decorridos mais de 6 anos modo expresso, às entidades de die meio da data do acidente, não po- reito público União, Estado-Membro deria o perito a ele ligar a molésMunicípio. E não se deve perder tia. Aliás, classifica o autor na le- de vista, que o princípio do duplo tra c da Portaria n? 2/68, sem grau de jurisdição, dado a seu caráter excepcional, em relação a outro mínima fundamentação (fls. 39). princípio — o da igualdade das parA conclusão é que o autor rece- tes no plano processual, há de merebeu o tratamento devido, teve alta cer interpretação strictu sensu. e o que apresenta agora não é relacionado com o acidente. Finalmente, na linha desse entendimento merecem invocação os sepelo exposto, dão provimento ao guintes julgados: RR.EE . 87.216, rerecurso de ofício para julgar latado pelo eminente Min. Soares• improcedente a ação, reconhecido Muniu', 87.723, relatado pelo emiao autor os benefícios da assistên- nente MM. Cordeiro Guerra e 91.529, cia judiciária gratuita. de que foi 'relato': o nobre Min. Rafael Mayer. Participaram do julgamento os Juízes Costa Carvalho e Silveira Ante o exposto, conheço e provejo Netto. presente recurso para, cassando o São Paulo, 19 de setembro de acórdão recorrido, restabelecer a de1979. — Edgard de Souza. Presi- cisão de primeiro grau. dente e Relator» (fls. 80 a 81.v). EXTRATO DA ATA Acrescento que, oferecidas as razões de fls. 99 a 102 e 120, manifestou-se o Ministério Público RE 92.914— SP — Rel.: MM Mac( pelo improvimento do recurso (fls. Falcão. Ftecte • Ademar Trentini 121 a 124). (Advs.: João Paulo 1V1affel e outros). R.T.J. — 100 Recdo.: Instituto Nacional de Previdência Social — INPS (Adv.: Iraci S. Pereira). Decisão: Conhecido e provido nos termos do voto do Ministro Relator. Unânime. Presidência do Senhor Ministro Djaci Falcão. Presentes à Sessão os 329 Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e Decio Miranda. SubprocuradorGeral da República,o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 26 de agosto de 1980. — Hélio Francisco Marques, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO CRIMINAL N? 92.916 — PR (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder. Recorrente: Ministério Público Estadual, no interesse de Angélica Avila Capela — Recorrido: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná. Suspensão condicional da pena. Suas condições. Caso em que se proibiu o beneficiário de freqüentar, auxiliar ou desenvolver cultos religiosos que forem celebrados em residências ou em locais que não sejam especificamente destinados ao culto. Trata-se de condição que é contrária ao principio inscrito no 5?, do art. 153, da Constituição, sobre a liberdade religiosa. A Justiça deve estimular no criminoso, notadamente o primário e recuperável, a prática da religião, por causa do seu conteúdo pedagógico, nada importando o local. Suspensão condicional da pena. Caso em que se impõe á beneficiária, a obrigação de pessoalmente carregar, para o edifício da Cadeia Pública do local, umas tantas latas d'água. g obrigação que não se harmoniza com a finalidade que a doutrina confere ao sursls, visto que, por ser humilhante, pode humilhar e indignar a beneficiária. Recurso extraordinário do Ministério Público local interposto ao acórdão que aprovou as descritas condições. Seu provimento para cancelar, no caso, uma obrigação e outra. ACORDA() Vistos e relatados estes autos de Recurso Extraordinário n? 92.916, do Estado do Paraná, em que é recorrente o Ministério Público Estadual, no interesse de Angélica Avila Capela e recorrido o Tribunal de Alçada do referido Estado, decide o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, unanimemente, conhecer do recurso para lhe dar provimento, de acordo com as notas juntas. Brasília. 19 de maio de 1981 — Antonio Neder, Presidente e Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. O Ministério Público Federal expõe e aprecia o caso no seguinte parecer do nobre SubprocuradorGeral da República, Dr. Francisco de Assis Toledo, fls. 90 a 93: — Angélica Avila Capela foi condenada a sete meses de detenção por crime de maus tratos em seus próprios filhos menores. Aplicou-lhe, ainda, a sentença a pena acessória de incapacidade temporária para o exercício do pátrio poder e, ao conceder a suspen- — 100 330 são condicional da pena, estabeleceu as seguintes condições: «1 — Não ficar mais de uma semana por mês sem trabalhar; 2 — Não se embriagar; 3 — Não freqüentar, nem auxiliar ou desenvolver cultos feitos em residências ou locais não destinados especificamente a esse fim; 4 — Apresentar-se uma vez cada dois meses a este juízo; 5 — Não se dedicar ao meretrício; 6 — Carregar, para a Cadeia Pública local seis latas de água um domingo em cada mês, trazendo água da mesma mina de onde seus filhos a carregavam» (fls. 38). «2— Houve apelação da ré na qual se fala sobre as condições humilhantes do sursis, e se pede a absolvição por Insuficiência de prova (fls. 46/47). «3 — Improvido o recurso, conparecer favorável da tra Procuradoria-Geral da Justiça (fls. 59), houve embargos de declaração do Ministério Público para corrigir omissão quanto às condições do sursis, reputadas humilhantes. «Rejeitados esses embargos, vem o apelo extremo com apoio nas letras a e d do permissivo constitucional, admitido pela letra a por ter sido invocada negativa de vigência de preceito constitucional (art. 153, § 5?, da Constituição). «4 — Afastado, assim, o obstáculo do art. 308 do Regimento Interno (redação anterior a 30-11-80, examinemos o pedido). «5 — Parece-nos, preliminarmente, que o Ministério Público, como custos legis tem legitimidade para recorrer em favor do réu, sobretudo quando, como no caso se trata de pessoa pobre, defendida pela Assistência Judiciária. «Assim decidiu o Excelso Pretório em acórdão que leva a seguinte ementa: Ementa: Ministério Público. Recurso em favor do réu. Tem o Ministério Público interesse para recorrer (CPP, artigo 577, parágrafo único), em favor do réu, de sentença penal condenatória. Aplicação dos princípios contidos nos artigos 257, 385 e 654 do CPP e no artigo 247 do Regimento Interno do STF. Recurso extraordinário conhecido, pela letra d, e provido» (RECr 86.088-RJ, Rel.: Min. Rilac Pinto, DJ de 1212-77, pág. 9.037). «Por outro lado, a matéria prequestionada nos embargos, para cumprimento dos requisitos exigidos pelas Súmulas 282 e 356, espelha de modo evidente um caso de malferimento do preceito do art. 153, § 5?, da Carta Magna, visto como, ao fixar as condições do sursis, não se deteve o juiz perante a liberdade de culto da condenada, vedando-lhe a freqüência ou a participação em «cultos feitos em residências ou locais não destinados especificamenté a esse fim». «6— As demais condições do sursis encontram amparo, a nosso ver, nos §§ 1? e 3? do art. 698 do CPP, parecendo-nos que a de n? 6 (obrigação de levar seis latas d'água, uma vez por mês à cadeia pública), embora inusitada, equivale a uma forma de prestação de serviço à comunidade, que nada tem de humilhante em confronto com a situação social e a personalidade da condenada. R.T.J. — 100 «7 — Diante do exposto, somos pelo conhecimento e provimento parcial do recurso para cancelarse apenas a condição de n? 3 do sursis em exame». II — é o relatório 331 garante a liberdade religiosa, direito que abrange o do exercício de cultos, desde, é claro, que não sejam ofensivos da ordem pública e dos bons costumes. A estranha imposição agora discutida é proibitiva, inclusive, de a beVOTO neficiária do sursis freqüentar cultos O Sr. Ministro Antonio Neder (Re- religiosos que se realizem em casas lator ): I. Esclareço que incide no residenciais. presente caso a regra do art. 308, I, Trata-se de algo aberrante, pois a do Regimento Interno desta Corte (o Justiça, para corrigir o criminoso, de 1970 com a redação da Emenda n. notadamente o criminoso primário e 3/75). recuperável, deve animar ou estimuEsclareço, também, que a Ar- lar nele a prática da religião, por güição de Relevância n? 7.440-2, do causa do seu conteúdo pedagógico, Paraná, foi rejeitada na sessão de qualquer que seja o local do culto re18-02-81. ligioso, pois este pode realizar-se nuigreja, numa outra casa e até Por conseguinte, deve a Turma ma praça pública (missa campal, julgar, nesta oportunidade, tão- em somente a matéria constitucional por exemplo). discutida no recurso extraordinário, O sempre lembrado mestre Pontes tal como dispõe o caput da supraci- de Miranda foi previdente ao escretada norma do Regimento Interno do ver este aviso: Compreendem-se na STF. liberdade de culto a de orar e a de os atos próprios das maniEssa matéria é a que diz respeito praticar festações exteriores em casa ou em com a ofensa, pelo acórdão local, da público (Com. à Const. de 1967, V, p. garantia constante do § 5?, do art. 121, n? 3). 153, da Constituição. Note-se que o direito garantido na Na verdade, o acórdão proferido discutida regra não pode ser desfeito nos embargos declaratórios; fls. 66 a nem sequer pelo Poder Legislativo. 67, expressa que, ao confirmar a Como se pode que o Judisentença, o acórdão prolatado no ciário imponhapermitir limitação esse diapelo ratificou as condições do sursis reito quando é certo que,ano caso impostas na sentença, fis.38. não se trata de contrariedade à orPortanto, as condições do sursis, dem pública, nem aos bons costuinclusive a que diz respeito com a mes? restrição à liberdade religiosa, foII — Registro que merece reparo ram prequestionadas. também a condição de n? 6, f. 38, seja a que impõe à beneficiária Estou em que, ao proibir que a be- qual sursis a obrigação de pessoalmenneficiária do sursis freqüente, auxi- do carregar, para o edifício da Calie ou desenvolva cultos em residên- te deia Pública local, umas tantas latas cias ou locais não destinados especi- dágua. ficamente a esse fim, na verdade a sentença de primeiro grau, aprovada Essa obrigação não se harmoniza pelo acórdão recorrido, contrariou o com a finalidade que a doutrina conprincípio inscrito no § 5?, art. 153, da fere ao sursis, visto que, por ser huConstituição, visto que essa norma milhante, pode revoltar e indignar a 332 R.T.J. — 100 beneficiária, que, ao invés de refrear seus impulsos ou tendências criminais, poderá exarcebá-los ao ser compelida a cumprir obrigação de tal natureza em público. E, na verdade, uma pena que a lei não prevê. Por ser instituto de politica criminal concebido para estimular a beneficiária a conduzir-se, no futuro, de acordo com a lei e as normas de moralidade, suas condições devem ser fixadas com certa cautela para que não produzam resultado negativo. Disse com acerto o exímio professor Stoos que o sursis repousa na idéia de que o autor, com a suspensão da pena, deixará presumivelmente de praticar outros crimes (apud Costa e Silva, Cód. Pen., I, 1943, p. 322). No caso presente, as duas condições agora discutidas poderão conduzir a beneficiária, não a deixar o crime, e, sim, a continuar nele. III — Conheço do recurso e lhe dou provimento para o fim de excluir, das condições relacionadas na f. 38, as de números 3 e 6, por serem claramente inadequadas ao salutar objetivo perseguido pelo sursis. deixar de fazer, senão em virtude de lei. Não havendo lei, é inconstitucional o item 6, dessa estranha sentença de sursis, que impõe à Ré a obrigação de transportar latas d'água à cadeia pública. Além de inconstitucional essa condição de sursis apresenta-se com a natureza de uma pena, mas sursis é a suspensão da pena de prisão, a qual é de lei, e não pode ser substituída por outra, no regime vigente. Dou provimento ao recurso. EXTRATO DA ATA RECr. 92.916 — PR — Rel.: Min. Antonio Neder. Recte: Ministério Público Estadual no interesse de Angélica Avila Capela. Recdo: Tribunal de Alçada do Estado do Paraná. Decisão: Conheceu-se do recurso e a ele se deu provimento. Votação uniforme. Falou pelo Ministério Público Federal o Dr. Francisco de Assis Toledo, Subprocurador-Geral da República. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Muftoz, Rafael Mayer e Clovis Ramalhete. SubprocuradorVOTO Geral da República, o Dr. Francisco O Senhor Ministro Clovis Rama- de Assis Toledo. lhete: Senhor Presidente, estou de Brasília 19 de maio de 1981 — acordo com V Exa., ainda mais por- Antônio Carlos de Azevedo Braga, que ninguém é obrigado a fazer ou Secretário. • RECURSO EXTRAORDINARIO N? 92.936 — RJ (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Leitão de Abreu. Recorrentes: Niomar Moniz Sodré e outra — Recorridos: Estado do Rio de Janeiro e outro. Enfiteuse. Resgate. Imutabilidade do foro estabelecido no ato constitutivo. Cláusula contratual estabelecendo, porém, valor diferente para o resgate. Afronta aos arts. 678 e 693 do Código Civil. Recurso extraordinário conhecido e provido. R.T.J. — 100 ACORDAO Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade com a ata de julgamentos e notas taquigráficas, em conhecer do recurso e provê-lo nos termos do voto do Ministro Relator, unanimemente. Brasília, 03 de outubro de 1980 — Leitão de Abreu, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Leitão de Abreu: O Procurador Moacir Antonio Machado da Silva assim expõe e examina o caso: «Em ação ordinária proposta contra a Municipalidade do Rio de Janeiro, pleitearam os recorrentes a restituição parcial do pagamento efetivado por ocasião do resgate do aforamento de terrenos diversos, relativo ao reajustamento do valor e ao número de foros, sob o fundamento de que esses acréscimos resultavam de lei do Estado declarada inconstitucional. «Obtiveram êxito em primeira Instância, mas o v. acórdão de fls., admitindo o excesso relativo ao número de foros (Cód. Civil, art. 693), negou a devolução da importância correspondente à elevação de seu valor, entendendo que a concordância dos adquirentes, na carta de trespasse do aforamento, constituía novação, admitida pelo Código Civil, que transformara em letra morta a enfiteuse anterior. «Recorrem as autoras, pelas letras a e d do permissivo constitucional, sustentando violação dos arts. 678 e 693 do Código Civil e divergência com julgados que teriam considerado inalterável o foro, mesmo por acordo. 333 «Merece, a nosso ver, prosperar recurso. O contrato de enfiteuse é disciplinado no Código Civil, inserindo-se a matéria, portanto, na competência legislativa exclusiva da União (Constituição, art. 8?, XVII, b). Sob esse fundamento, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade do art. 13 do Decreto-lei Complementar n? 317, de 1970, do extinto Estado da Guanabara, que previa atualização do foro fixado nos contratos de enfiteuse.» «Dispõe o art. 678, parte final, do Código Civil, que o foro ou pensão deve ser certo e invariável. Esta determinação do quantum pressupõe necessariamente sua fixação no contrato (Carvalho Santos, Cód. Civil Bras. Interpretado, 1963, 11! ed., v. 10, p. 44), ou seja, no ato constitutivo da enfiteuse. Trata-se de disposição imperativa, restrita da liberdade de contratar, de modo que as partes estão impedidas de pactuar de modo diverso, sob pena de invalidade. «Ora, dizendo a lei civil que o foro é certo e invariável e não tendo contrato de enfiteuse limitação no tempo (Cód. Civil, art. 679), torna-se evidente que o consenso das partes em sentido contrário, em qualquer época, é nulo, porque importa em burla àquela disposição imperativa. «Dessa forma, a estipulação de valor para o foro, diverso do previsto no ato constitutivo da enfiteuse, por ocasião do resgate, implica em violação dos arts. 678 e 693 do Cód. Civil.» «Está, por igual, demonstrada a divergência com decisão do eg. Tribunal de Alçada da Guanabara ( fls. 202/3), que considerou nula cláusula contratual estabelecendo forma de pagamento do resgate diferente da prevista no Código Civil. 334 B.T.J. — leo Os demais julgados são do mesmo Tribunal Súmula 369, sendo que o proferido no RE 80.342 refere-se à legislação local que prevê atualização do foro, não de alteração decorrente de acordo. Pelo conhecimento e provimento.» (fls. 247/249). 2 o relatório. VOTO O Sr. Ministro Leitão de Abreu (Relator): Foram declarados inconstitucionais, por decisão do Supremo Tribunal, o art. 13 do Decreto-lei Complementar n? 3/69, e 17, do Decreto-lei n? 317/70, ambos expedidos pelo extinto Estado da Guanabara. Possuiam esses artigos o seguinte teor: em parte, pagos com base no foro atualizado. Quanto a essa parte, pretendem as recorrentes restituição do indébito, uma vez que a exigência se estribara em preceitos legais, cuja inconstitucionalidade foi declarada pela Suprema Corte. De acordo com a jurisprudência desta Corte e nos termos do parecer da ProcuradoriaGeral da República, que se ajusta a essa orientação, conheço do recurso e lhe dou provimento para reformar, em parte, o acórdão recorido,a fim de determinar que a quantia relativa à repetição do indébito, relativa aos dez foros anuais pagos a mais, seja calculada sobre a diferença entre os foros anuais cobrados com atualização e os foros que aos recorridos era lícito arrecadar com base no princípio da invariabilidade do foro (Cód. Civil, art. 678). «Art. 13. O valor mínimo do foro EXTRATO DA ATA já estabelecido será atualizado de acordo com a regulamentação a RE 92.936 — TU — Rel.: Min. Leiser baixada pelo Poder Executitão de Abreu. Rectes.: Niomar Moniz vo.» Sodré e outra (Advs.: Frederico José «Art. 17. Em cada transmissão do Leite Gueiros e outros). Recdos.: Esdomínio útil, inter vivos ou causa tado do Rio de Janeiro e outro (Adv.: rnortis, será atualizado o foro a ser João José Assad). pago pelo novo foreiro. Decisão: Conhecido e provido nos Parágrafo 1? — O foro atualizado termos do voto do Ministro Relator. será calculado em 0,6% (seis déci- Unânime. Ausente, ocasionalmente, mos por cento) do valor do o Senhor Ministro Djaci Falcão. Audomínio pleno do terreno arbitrado sente, justificadamente, o Senhor pelo Departamento do Patrimônio. Ministro Moreira Alves. Parágrafo 2? — O foro atualizado sera devido a partir do ano em que for transcrito o imóvel em nome do novo foreiro no Registro Geral de Imóveis, nas Transmissões inter vivos, e a partir do ano da expedição do foro de partilha, nas transmissões causa monis». No caso, houve transmissão do domínio útil, monis causa. Exigiu o Estado, contudo, para remissão dos aforamentos, fossem os foros anuais, Presidência do Senhor Ministro Leitão de Abreu. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Cordeiro Guerra e Decio Miranda. Ausente, ocasionalmente, o Senhor Ministro Djaci Falcão. Ausente, justificadamente, o Senhor Ministro Moreira Alves. Subprocurador-Geral da República, o Dr. Mauro Leite Soares. Brasília, 03 de outubro de 1980 — Hélio Francisco Marques, Secretário. R.T.J. — 100 335 RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 92.940 — PR (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves. Recorrente: João Miguel Caram — Recorrido: Luiz Dias Bastos. Negócio jurídico tido como simulado para fraudar lei de ordem pública. Pacto comissório. Prova. Inexistência, em face das circunstâncias da causa, de negativa de vigência dos dispositivos do Código Civil e do Código de Processo Civil invocados no recurso extraordinário. Dissídio de jurisprudência não demonstrado. Recurso extraordinário não conhecido. ACORDA() Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taqulgráficas, por unanimidade de votos, não conhecer do recurso. Brasília, 07 de novembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente — Moreira Alves, Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Moreira Alves: este o teor do acórdão recorrido ( fls. 162/166): «Acordam os Juizes da Segunda Câmara Civel do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, adotada a exposição de fls. e sem discrepância, negar provimento ao recurso para confirmar, em todos os seus termos, a respeitável e jurídica decisão do primeiro grau, que bem apreciou a espécie debatida. Os autos guardam chamada ação de prestação de contas, promovida pelo Apelante contra o Apelado, na condição de co-proprietário de um imóvel rural, em face de alienação de produtos colhidos sem entrega da parte correspondente ao primeiro. Na peça defensiva, o Apelado negou qualquer direito ao Apelante, denunciando que a primitiva promessa de venda ou cessão de direitos que entre ambos havia sido celebrada encobria empréstimo com cláusula comissária, vale dizer com a garantia da metade do imóvel, mas que mesmo empréstimo fora quitado, conforme documentos. O MM. Juiz acolheu a contestação e, inobstante asseverasse a inexistência de prova escrita do contrato de mútuo, considerou-o comprovado por depoimentos orais e canhotos de cheques, alusivos à sua quitação, invocando o artigo 404, I, do estatuto processual, a respeito, para reconhecer e proclamar a existênéia de simulaçãõ, que ensejava a nulidade do ,ato jurídico e, pois, a carência da lide, com extinção processual tudo consoante artigos 765, 145, V e 146 parágro único do Código Civil, combinado com o artigo 267, VI, do Código de Processo Civil. O apelo endereçado á este Areópago, evidentemente, persegue a reforma de tal sentença, reiterando argumentos aduzidos no curso do processo. Mas, não enseja prosperar. 336 O ilustre Juiz a quo, com acuidade, bem examinou o contido no bojo dos autos e seu decisório, muito bem fundamentado e pleno de elementos extraídos do conjunto probatório, só enseja plena e cabal confirmação. Na verdade, a Escritura Pública de Cessão de Transferência de Direito de Compromisso de Compra e Venda, celebrada entre as partes (fls. 14/16) mascara verdadeiro negócio de mútuo, configurando pacto comissório. Basta perfunctório exame dos autos para se chegar a tal conclusão. Nosso De Plácido e Silva ('/ocabulário Jurídico, Forense vol. III, pág. 1.109) ensina: «No sentido técnico-jurídico, comissório, do latim commissorius, de commitere, quer significar comissão ou atribuição conferida a alguém para que possa, por iniciativa sua, fazer alguma coisa. E o poder conferido a outrem para que proceda, conforme está estipulado ou convencionado. Nesta razão, em sentido geral, pacto comissório (Pacttun commissoritun) entende toda convenção inserta num contrato bilateral, em virtude da qual se atribui o poder ou direito a uma das partes, para que proceda unilateralmente, em certas circunstâncias, quando a outra parte não cumpre as obrigações assumidas ou a seu cargo.» De seu turno, Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de Direito Civil, Forense, vol. IV, n. 348) lembra que a cláusula comissória «consiste em pactuar, no ato constitutivo da garantia real, a faculdade de apropriar-se o credor do seu objeto em caso de não cumprida a obrigação,» afirmando que «é uma técnica opressiva do economica- — 160 mente mais fraco» e «proibida a cláusula hi continenti (no próprio instrumento), como também ex intervalo (em apartado)». Ora, o magistrado considerou que a Cessão de Direitos «se • deu em razão das dificuldades enfrentadas pelo réu para saldar tuna prestação de Cr$ 200.000,00 alusiva aquisição da fazenda, como deixou claro a própria testemunha do autor, Anésia Cavalcanti Lopes»; que «o autor é «useiro e veleiro» em realizar negócios fiduciários como o dos autos,» segundo relato da testemunha Dr. Diaoli Lopes Busse, advogado e professor universitário, e cuja idoneidade está a salvo de qualquer suspeita»; que «o autor nunca se interessou pela fazenda, embora se declara sócio deste 1971, e lá somente esteve em 1971 ou 1972, e assim mesmo a passeio, conforme depôs a testemunha Manoel da Silva»; que, «o autor não negou o recebimento dos cheques cujos canhotos foram anexados à contestação os quais o réu insiste em afirmar que lhe foram entregues em pagamento de empréstimo» (fls. 133/134). Demais disso, o julgador apontou o depoimento de Edmo Elidi° de Medeiros, que ouvira do Apelante e do Apelado a assertiva de que parte do imóvel fora transferido ao primeiro em garantia de empréstimo e, ainda, do próprio Dr. Diaoll Lopes Busse, renomado causídico de Londrina, como importantíssimos para o completo esclarecimento da causa, concluindo, verbis: «Na verdade, a « cessão de direito» (fls. 14/16) é simulada, e foi celebrada «para encobrir um empréstimo garantido com metade da propriedade que o réu havia adquirido sozinho. E esse empréstieno, conquanto não existia prova escrita de sua ocorrência, ficou suficientemente demonstrado pela pro- R.T.J. — 100 va testemunhal já referida, e, também, pelos canhotos de cheques que foram anexados á contestação, alusivos à sua quitação. E negócios realizados nessas circunstâncias, são nulos, porque burlam a norma cogente estatuida no art. 765 do C. Civil segundo reiterados pronunciamentos de nossos tribunais...» (fls. 135). De sorte que, bem apreciado tudo que contém o caderno processual, não há elementos que propiciem a reforma de tão jurídica sentença. Nem mesmo a circunstância do Apelado haver participado, com o Apelante, da Escritura Pública de Compra e Venda outorga Mn 19 de julho de 1972 (seis meses apôs a da Cessão de Direitos) pela antiga proprietária do imóvel, pode ser invocadas em beneficio do Apelante, pois tal ocorreu quando ainda não se achava quitada a divida, garantida com malsinada cláusula. Por derradeiro, não há de se alegar a inércia do Apelado em pról do Apelante, dado o relacionamento e confiança que existia entre ambos, robustecidos com o fató do último ter sido padrinho de casamehto de uma filha do primeiro (115. 40 in fine) e nem se invocar a necessidade de qualquer interpelação judicial «que ponha o pactuante inadimplente em mora, a fim de que 5e cumpra a condição,» o que mesmo De Plácido e Silva entende necessário, data venial, sem qualquer respaldo em principio legal. Pelo exposto e adotando, integralmente os fundamentos do decisório impugnado, o Colegiado nega provimento ao recurso.» Interposto recurso extraordinário, foi ele admitido pelo seguinte despacho (fls. 263/265): 337 «João Miguel Caram propôs contra Luiz Dias Bastos ação de prestação de contas porque, tendo ambos adquirido em comum um imóvel rural e efetuado, também em conjunto, empréstimos destinados ao Custeio de seu cultivo, teria ele direito à meação dos resultados agrícolas, o que nunca recebeu. A ação foi julgada improcedente, sem apreciação do mérito, pela sentença de fls. 128/136, confirmada pelo acórdão nt 18.549, ora Impugnado. Assim decidiu a primeira instância (fls. 135), porque a prova testemunhal comprovada que «... a «cessão de direitos» (fls. 14/16) é simulada e foi « celebrada», para encobrir um empréstimo garantido com metade da propriedade que o réu havia adquirido sozinho. E negócio realizados nessas circunstâncias são nulos, porque burlam a norma cogente estatuida no art. 765 do C. Civil, segundo reiterados pronunciamentos de nossos Tribunais (Rev. Tribs. 503/74, 482/61, 468/75).» A decisão de segundo grau (fls. 162), ao confirmar a sentença, fez constar de sua ementa: «De conseqüência, encobrindo, negócio jurídico celebrado entre Apelante e Apelado, verdadeiro pacto comissório, tal como reconhecido na decisão de primeiro grau, a ação não poderia vingar.» E incluiu em seu corpo: *De sorte que, bem apreciado tudo que contém o caderno processual, não há elementos que propiciem a reforma de tão jurídica sentença. Nem mesmo a circunstância do Apelado haver participado, com Apelante, da Escritura Pública 338 R.T.J. — 100 de Compra e Venda outorgada e) a de que o negócio jurídico em 19 de julho de 1972 (seis meera anulável e, portando, sujeito à retificação, o que ocorreu com a ses após a da cessão de direitos) efetivação da escritura pública de pela antiga proprietária do imóvel), pode ser invocada em becompra e venda em cumprimento ao ato anterior (artigos 147-11, 148 nefício do Apelante, pois tal ocorreu quando ainda não se achava e 151 do Código Civil). quitada a dívida, garantida com O dissídio pretoriano suscitado malsinada cláusula. pelo recorrente restou demonstrado, principalmente no que tange Inconformado, o recorrente inaos julgados prolatadoS pelo Pretóterpôs tempestivo recurso extraorrio Excelso (RE n? 82.447 , publidinário, fundamentado nas letras a cado na R. T. J. 82/869, e RE n? e d do inciso III do artigo 119 da 85.156-9, publicado no D.J.U. de Constituição Federal, invocando 10.09.79, página 6.679). violação dos artigos 103, 104, 141, 148, 151, 178 (b, V, § 9?), 765 e 1.126 Pelos motivos acima expostos, do Código Civil e 402 e 404 (I) do admito o apelo extremo. Código de Processo Civil, mais dissídio pretoriano, e argüindo, inQuanto à argüição de relevância clusive, relevância da questão feda questão federal, proceda-se de deral. acordo com o que determina a legislação vigente. As teses propugnadas no recurso extraordinário e parecer que o Publique-se e prossiga-se.» acompanha (fls. 169/199 e 219/254) 2 o relatório. parecem-me eivadas de juridicidade. Entre elas destacam-se: VOTO a de que a nulidade atinge a O Sr. Ministro Moreira Alves (Recláusula instituidora do pacto co- lator): 1 — No caso, quanto ao pacto missório e não o negócio jurídico comissório, não se configura o que a contém, sendo requisito es- dissídio de jurisprudência, vez sencial a existência da cláusula que o acórdão recorrido, uma ou (artigo 756 do Código Civil), o que mal, entendeu que o negóciobem jurídico inocorre nos autos: entre as partes era simulado, pora de que o artigo 765 do Códi- quanto dissimulava mútuo com gago Civil incide somente nas hipóte- rantia subordinada a pacto comissóses por ele mencionadas (penhor, rio, ao passo que os acórdãos trazidos a confronto dizem respeito a neanticrese e hipoteca): gócios qualificados com fiduciários, c) a de que a simulação não pode que não se confundem com os simuser alegada pelos contraentes em lados, e aos quais. não se aplica o litígio de um contra o outro, ou pacto comissório. contra terceiros (artigo 104 do CóA diversidade de qualificações digo Civil); jurídicas e elas, na hipótese, são red)a de que a alegação do recorri- levantes — afasta a alegada diverdo, que argüiu em sua defesa a gência. simulação do negócio recorrido, esObservo, ademais, que, no caso taria prescrita desde 17/03/75 (artigo 178, letra d do inciso V do § sob julgamento, não há o elemento obrigacional expresso (pacto de re9?); R.T.J. — 100 339 transmissão da coisa) que é indis- cia, porquanto, o primeiro dos acórpensável para a caracterização do dãos trazidos a confronto ( fls. 190) negócio fiduciário. não trata, nos trechos transcritos, desse aspecto da questão, e o segun2 — Por outro lado, no tocante à do (fls. 190) é citado por meio de recircunstância de a simulação não po- positório que não atende ás exigênder ser alegada pelas partes que ce- cias do artigo 305 do Regimento Inlebram o negócio Jurídico, sustentou terno desta Corte. a sentença de primeiro grau (confir3 — Quanto à pretendida ofensa ao mada por seus fundamentos pelo artigo 756 do Código Civil, ela não se acórdão recorrido) que, na espécie, verifica, pOrquanto o acórdão recora simulação encobria ato nulo (vio- rido entendeu que o débito dissimulação do artigo 765 do Código Civil, o lado estava quitado considerou nuqual é principio de ordem pública), lo, apenas, o pacto ecomissório que razão por que não se aplicavam os também Julgou dissimulado, em face preceitos dos artigos 103 e 104 do Có- da prova produzida nos autos. digo Civil. 4 — No que diz respeito ao artigo Esse entendimento é sustentado 141 do Código Civil, foi ele afastado por autores do porte de Serpa Lopes pelo acórdão recorrido pela existên(Curso de Direito Civil, I, n? 301,pág. cia de canhotos de cheques anexados 451) que acentua: (o que não é prova testemunhal, mas indiciária). Essa circunstância afas«Conseqüentemente, toda vez ta igualmente, a negativa de vigênque a simulação atue como um cia do disposto no artigo 404, I, do meio fraudatório à lei, visando a C.P.C. E, no concernente, ao artigo vulneração de uma norma cogente, 402, I, do mesmo C.P.C., não foi ele deve desaparecer para dar lugar à examinado pela sentença de primeipreponderância da fraude à lei, pe- ro grau, nem pelo acórdão recorrido, la violação da norma de ordem pú- não tendo sido, também, interpostos blica. Por outro lado, quando não embargos de declaração, motivo por ocorrer essa hipótese, quando o ato que lhe falta o indispensável predissimulado não atender contra questionamento Súmula 282 e 356. uma norma de ordem pública, de- Ademais, é de notar-se que não se vem preponderar os princípios ine- trata, exclusivamente, de canhotos rentes à simulação.» de cheques, pois, com relação a um há fotocópia de cheque nomiE isso ocorre porque, segundo ain- deles, nativo em favor do recorrido, com o da Serpa Lopes (Idem, ibidem): devido carimbo de liquidação, o que «Apresenta-se, então, um ato ei- serve de recibo de pagamento. vado de nulidade absoluta, fraude 5 — Também não foram prequesà lei, negócio fiduciário contrário à tionados os artigos 148, 151, 178, f 9?, ordem pública, figuras que absor- V, b, e 1.126 do Código Civil Súmulas vem e dominam a da simulação, 282 e 356. Esses artigos, aliás, em faque não passa de um meio para ce da tese, adotada nas instâncias atingir um fim principal.» ordinárias, de simulação como melo fraude a lei de ordem pública, Tal interpretação não é, evidente- de não poderiam ser aplicados por inmente, desarrazoado, o que afasta a conciliáveis com ela. alegada negativa de vigência do artigo 104 do Código Civil. Ademais, 6 — Em face do exposto, não co-também nessa parte não está de- nheço, preliminarmente, do presente monstrado o dissídio de Jurisprudên- 'recurso. 340 R.T.J. — 100 outros e José Paulo Sepúlveda Pertence). O Sr. Ministro Cordeiro Guerra: Decisão: Não conhecido. Unãnlme. Sr. Presidente, também estou de Falou, pelo Recte.: O Dr. Potiguar acordo, porque resultou claro, dos Alvim Resende. Falou, pelo Recdo.: debates e do voto do eminente Rela- Dr. José Paulo Sepúlveda Pertence. tor, que, bem ou mal, as instâncias Presidência do Senhor Ministro ordinárias consideraram que o ato Djaci Falcão Presentes à Sessão os era simulado. Senhores Ministros Leitão de Abreu, Cordeiro Guerra, Moreira Alves e EXTRATO DA ATA Dedo Miranda. SubprocuradorRE 92.940 — PR — Rel.: Min. Mo- Geral da República, Dr. Mauro Leite reira Alves. Recte.: João Miguel Ca- Soares. ran (Advs.: Newton José de Sisti e Brasília, 07 de novembro de 1980 — outros) Recdo.: Luiz Dias Bastos Hélio Francisco Marques, Secretá( Advs.: Eduardo Rocha Virmond e rio. VOTO (PRELIMINAR) RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 93.002 — SP (Primeira Turma) Relator para o acórdão: O Sr. Ministro Soares Mulloz. Recorrente: União Federal — Recorrido: Bratonal S/A — Indústria e Comércio I.P.I. Maquinaria importada de pais signatário do GATT. Crédito. Inadmissibilidade. anteriormente pago, asseguraO direito de creditar-se pelo do ao comprador de maquinaria nacional, destinada ao ativo fixo do adquirente, constitui subsidio que a União concede à indústria nadonal, não se estendendo, por isso, à importação de produtos estrangeiros. Recurso extraordinário conhecido e provido. ACORDA() Vistos. Acordam os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, por maioria de votos, e na conformidade das notas taquigráficas, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Brasília, 23 de setembro de 1980 — Thompson Flores, Presidente — Soares Muiloz, Relator p/ o acórdão. RELATÓRIO O Sr. Ministro Cunha Peixoto: «BRATONAL S/A — Indústria e Comércio» impetrou, em 02 de dezem- bro de 1975, mandado de segurança contra ato do Delegado da Receita Federal de São Paulo, alegando: a) haver importado teares que especifica, e peças necessárias à sua atividade produtora, procedentes da República Federal Alemã e Estados Unidos, países participantes do GATT, de que é signatário o Brasil; b) esse Tratado afirma o principio segundo o qual os produtos originários de qualquer parte contratante devem obter tratamento fiscal não menos favorável que o concedido a produtos similares de origem nacional; c) que o Dec.-lei n? 1.136/70, em seu art. 36, permite aos estabelecimentos industriais adquirentes de R.T.J. — 100 391 to de se creditar no valor do imposto sobre Produtos Industrializados pago na importação de mercadorias originárias de pais signatário do GATT. Alega permitir o art. 36 do Decreto n? 70.612/72, que regulamentou o art. 26, f 2?, da Lel n? 4.502/64, na redação dada pelo art. 1? do Dec.-lei n? 1.136/70, aos estabelecimentos industriais adquirentes de máquinas nacionais destinadas a integrar seu ativo fixo, creditar-se da importância paga a título de IPI e, portanto, estando ela nas mesmas condições, já que importara, para o mesmo fim, produtos originários da Alemanha e Estados Unidos, e pagou o IPI por ocasião do desembaraço da mercadoria, tem direito também a creditar-se do tributo pago. Q Tribunal Federal de Recursos, atendeu-lhe a pretensão, em parte. 2 — Na verdade, o Acordo Geral de Tarifas — GATT — do qual Brasil, Alemanha e Estados Unidos são signatários, dispõe que os produtos originários de uma das partes contratántes gozarão, no território de outra, de tratamento não menos favorável ao dispensado ao similar nacional. Também é certo que o art. 36 do Decreto n? 70-612/72 permite aos estabelecimentos industriais adquirentes de máquina nacional destinada a seu ativo fixo creditar-se do imposto pago pelo seu vendedor. Diz este dispositivo: «Os estabelecimentos industriais poderão creditar-se do imposto relativo a máquinas, aparelhos e equipamentos, de produção nacional, inclusive quando adquiridos de VOTO comerciantes não contribuintes do imposto, destinados a sua instalação, ampliação ou modernização e O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Reque integrarem o seu ativo fixo, e lator): 1 — A impetrante, ora recorrelacionados nas instruções baixarida, objetiva, com o mandado de sedas pelo Ministro da Fazenda». gurança, o reconhecimento do direi- máquinas nacionais destinadas a integrar seu ativo fixo, creditarem-se da importância paga a titulo de IPI; d) pretende, assim, que às máquinas que importou, originárias daqueles países signatárlos,seja assegurado o mesmo tratamento. A segurança foi denegada em primeira instância, mas o Tribunal Federal de Recursos, em decisão datada de 28 de novembro de 1977, publicada em 07 de fevereiro de 1979, reformou a sentença de 1? grau, estando o acórdão assim ementado: «Importação. Equipamentos industriais procedentes de países signatários do GMT. Pretensão a creditar-se pelo valor a título de I.P.I., no seu desembaraço aduaneiro: Apelação parcialmente provida, para conceder, parte, a segurança, apenas, com relação às importações efetuadas após a entrada em vigor da Portaria GB-665, de 10.12.1974, mantida, porém a decisão denegatória quanto às anteriores ao citado ato administrativo». Irresignada, a União interpôs recurso extraordinário com fundamento nas letras a e d do permissivo constitucional, sustentando negativa de vigência do art. 36 do Dec. n? 70.612/72, que regulamentou a nova redação dada pelo art. 1? do Dec.-lei n? 1.136/70 ao art. 26, 2? da Lei n? 4.502, de 30.11.64, bem como dissídio jurisprudencial. O processo me foi distribuído em 22.08.1980. E o relatório. 342 R.T.J. — 100 De acordo com o código Tributário Nacional, o fato gerador do IPI é o desembaraço aduaneiro do produto, quando de procedência estrangeira, a sua saída do estabelecimento industrial ou do comerciante brasileiro que o forneça à indústria, ou arrematação em leilão, quando apreendido ou abandonado. Equivale, portanto, o pagamento do IPI sobre a mercadoria estrangeira, ao recolhimento do mesmo tributo pelo industrial sobre o produto que fabrica. Admitindo, no art. 36 do Regulamento, que o industrial comprador se credite no IPI, quando adquire determinadas máquinas destinadas a integrar o seu ativo fixo, a lei, na verdade, está concedendo uma isenção ao industrial alienante, pois é evidente que ele venderá a mercadoria pelo preço real, descontado o imposto. Ora, a finalidade da cláusula de nação mais favorecida é estabelecer e manter em todo tempo, entre os Países interessados, uma igualdade fundamental e sem discriminação. Nem se diga que se trata de um subsídio à indústria nacional, e que o próprio Tratado permite a concessão do incentivo, verbis: «As disposições deste artigo não Impedirão o pagamento de subsídios exclusivamente a produtos nacionais compreendidos os pagamentos a produtos nacionais com recursos provenientes da arrecadação dos impostos ou tributos internos aplicados de conformidade com os dispositivos deste Artigo e de subsídios concedidos sob a forma de compra de produtos nacionais pelos poderes públicos». O Tratado só permite a concessão de subsídio, e nunca isenção direta ou indireta; e a hipótese do art. 36 é típica de isenção. No caso, se o produto importado de país signatário do GATT não tiver tratamento idêntico ao previsto no art. 36 do Regulamento do IPI, resultará que o material ao que o mesmo se refere ficará mais onerado tributariamente que o nacional da mesma natureza e adquirido para o mesmo fim, contrariando, assim, o Tratado. Assim, o acórdão recorrido não se limitou a dar razoável interpretação ao art. 36 do Regulamento do IPI; Imprimiu-lhe, a nosso ver, sua verdadeira inteligência. 3 — Os acórdãos trazidos à colação não têm nenhuma semelhança com a hipótese dirimida pelo egrégio Tribunal Federal de Recursos, o que seria bastante para não se conhecer do recurso com fundamento na letra d. Acontece, ainda, que o recorrente não satisfez os requisitos do art. 305 do Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal, limitando-se a transcrever ementas de acórdãos que resolveram matéria inteiramente diversa da que é objeto da decisão recorrida. 4 — Por estes motivos, não conheço do recurso. EXTRATO DA ATA RE 93.002 — SP — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: União Federal. Recda.: BRATONAL S/A — Indústria e Comércio (Advs.: Joseval Sirqueira e outros). Decisão: Adiado o julgamento por haver pedido vista o Min. Soares Mufioz, após os votos dos Ministros Relator e Rafael Mayer, que não conheciam do recurso. Presidência do Senhor Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Xavier de Albuquerque, Cunha Peixoto, Soares Mayer. Mufloz e Rafael R.T.J. — 100 343 Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 09 de setembro de 1980 — Antônio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. cimento do industrial ou do comerciante brasileiro que os forneça à indústria, ou a arrematação em leilão, quando apreendido ou abandonado. VOTO (VISTA) O Sr. Ministro Soares Muãoz: Pedi vista para refletir sobre a espécie e apresento, agora, o processo em mesa, para que prossiga o julgamento. O acórdão recorrido arrima-se no voto vencedor proferido pelo eminente Ministro José Néry da Silveira, que obteve a adesão do eminente Ministro Armando Rollemberg. Ficou vencido o eminente Ministro José Dantas (fls. 138). Entretanto, os dois ilustres magistados responsáveis pela decisão, ora recorrida, apreciando outros recursos, que versaram a mesma tese, mudaram de orientação. O eminente Ministro Armando Rollemberg, na AMS n? 81.479, assim fundamentou seu atual posicionamento: «A questão é muito conhecida do Tribunal cujos integrantes não têm no propósito ponto de vista uniforme, o que se explica pelo fato de se tratar de interpretação de texto de acordo internacional não muito claro, em confronto com a legislação pátria. Essa dificuldade enfrentei pessoalmente, desde que, depois de me haver manifestado no sentido da tese defendida pela Impetrante, quando do julgamento do AMS 77.362, reexaminando depois a matéria, reconsiderei-me pelas razões que passo a expor. De acordo com o Código Tributário Nacional, o fato gerador do IPI é o desembaraço aduaneiro do produto quando de procedência estrangeira, a sua saída do estabele- Equivale, portanto, o pagamento do IPI sobre a mercadoria estrangeira ao recolhimento do mesmo tributo pelo industrial sobre o produto que fabrica, com o que, ao admitir, no art. 36, do RIP!, que os estabelecimentos industriais que adquiriram máquinas, aparelhos e equipamentos de produção nacional, destinados a sua instalação, ampliação ou modernização e que integram o seu ativo fixo, de acordo com relação constante de instrução do Ministro da Fazenda, P o -derãocitasmpel relativo, o legislador está provendo sobre hipótese diversa, pois a faculdade ai concedida decorre de haver sido pago, pelo produtor, o IPI do qual se creditará o adquirente do bem, quando, no caso do produto importado, tal pagamento não ocorreu. O que há na hipótese do art. 36 referido, como bem acentuaram as informações, é o subsidio por parte da União, por via do crédito do IPI arrecadado do produtor, ao adquirente da mercadoria nacional, subsidio previsto nos arts. III, 5 e XVI do. Acordo Geral de Tarifas e Comércio, ao disporem: *Se uma Parte Contratante concede ou mantém uma subvenção qualquer, inclusive qualquer forma de proteção das rendas ou sustentação dos preços que tenha diretamente ou indiretamente, por efeito elevar as exportações de que um produto qualquer do território da referida Parte Contratante ou de reduzir as importações no seu território, dárá conhecimento por escrito às Partes Contratantes, da importância e 344 R.T.J. — 100 da natureza dessa subvenção, dos resultados que possam ser esperados sobre as quantidades do ou dos produtos em questão por ela importados ou exportados e as circunstâncias que tornam a subvenção necessária. E, todos os casos em que fique estabelecido que uma tal subvenção causa ou ameaça causar um prejuizo sério aos interesses de outra Parte Contratante a Parte Contratante que a concedeu examinará, quando solicitada, com a ou com as Partes Contratantes interessadas ou com as Partes Contratantes, a possibilidade de limitar a subvenção». «Art. III. 5. As disposições deste Artigo não se aplicarão à compra pelos órgãos governamentais ou por sua conta de produtos destinados ao seu uso, e não à revenda ou ao uso na produção de mercadorias destinadas à venda. Também não impedirão o pagamento, somente a produtoras nacionais, dos subsídios previstos no Art. XVI, incluindo os subsídios provenientes de arrecadação de taxas e imposições interiores, e os subsídios efetuados através das compras de produtos nacionais pelos órgãos governamentais ou por sua conta». Essa permissão de subsídio se tornou mais clara com a aprovação de Protocolo modificando a Parte II e o artigo XXVI do Acordo Geral de Tarifas e Comércio, ratificado pelo Brasil por via do Decreto Legislativo 43, de 1950, que alterou o Art. III do Acordo referido, dando aos ns. 2 e 8 b a seguinte redação: «Art. II. 2. Os produtos do território de qualquer parte contratante, importados por outra parte contratante, não estão sujeitos, direta ou indiretamente, a impos- tos ou outros tributos internos de qualquer espécie, superiores aos que incidem, direta ou indiretamente, sobre produtos nacionais. Além disso, nenhuma parte contratante aplicará, de outro modo, impostos, ou outros encargos internos a produtos importados nacionais contrariamente às principais estabelecidas no parágrafo 1. 8 (b) — As disposições deste artigo não impedirão o pagamento de subsídios exclusivamente a produtores nacionais compreendidos os pagamentos a produtores nacionais com recursos provenientes da arrecadação dos impostos ou tributos internos aplicados de conformidade com os dispositivos deste Artigo e de subsídios concedidos sob a forma de compra de produtos nacionais pelos poderes públicos». A última disposição lida deixa claro que qualquer das partes contratantes poderá subsidiar os produtores nacionais com recursos provenientes da arrecadação dos impostos ou tributos internos, faculdade que foi utilizada pelo Brasil quando, no Dec.-lei n? 1.136, de 1970, previu o subsídio referido no art. 36 do RIPI, isto é, a possibilidade de os estabelecimentos industriais poderem creditar-se do imposto relativo a máquinas, aparelhos e equipamentos de produção nacional, relacionados em instruções baixadas pelo Ministro da Fazenda, quando se tratar de instalação, ampliação ou modernização de indústria que interesse ao desenvolvimento do País, subsídio que, como autorizado no Acordo Geral de Tarifas e Comércio, é feito por via de tributo arrecadado pela União, pois, ao se creditar do IPI pago pelo industrial bràsileiro fabricante de máquinas, aparelhos R.T.J. — 100 e equipamentos, o estabelecimento industrial adquirente realmente está recebendo o imposto pago pelo vendedor. A hipótese, assim, não tem similitude com a obrigação do pagamento do IPI pelo adquirente de produto estrangeiro importado, e seria mesmo de todo inconcebível que o Brasil, que se esforça para ingressar no grupo das nações desenvolvidas, fosse usar dinheiro público para subsidiar produtos estrangeiros, incentivando a sua aquisição pelos estabelecimentos industriais nacionais. Meu voto, assim, é dando provimento ao recurso para reformar a sentença, e cassar a segurança.' (fls. 144/146). Concordo com esse pronunciamento, pois a União, relativamente a máquinas, aparelhos e equipamentos, de produção nacional, adquiridos por estabelecimentos industriais para integrar o seu ativo fixo, autoriza (art. 36 do RIPI) a esses adquirentes a se creditarem do IPI, anteriormente pago, com o que, na verdade, lhes está fornecendo um incentivo. No caso de importação, a hipótese seria de não pagamento do IPI, que somente poderia ser autorizado mediante isenção. Aliás, o eminente. Ministro Cordeiro Guerra, no Atavo de Instrumento n? 78.440, prolatou o seguinte despacho: «Ao apreciar o despacho indeferltório do apelo extraordinário, assim se manifesta o Procurador-Geral da República: «Não merece reparos o despacho vestibular. A agravante não demonstrou o dissídio jurisprudencial, como o exige a Súmula 291, nem qualquer afronta ao art. 98 do CTN. Ao afirmar que os estímulos e Incentivos fiscais não se caracterizam como 345 isenção, o acórdão impugnado fez aplicação correta do GATT, que ressalvou a hipótese no I 5? do art. III e no art. XVIII. Assim, opinamos seja arquivado o Agravo». Realmente, já se manifestou a 2? Turma no mesmo sentido, em 25-480, sendo relator o eminente Ministro Moreira Alves: «Ementa: IPI. GATT. Leis n?s 313/48 e 4.138/62. Lei 4.502/64, art. 25, 4 2?, com a redação do art. 1?, Decreto 70.162/72, art. 36. Portaria 665/74 do Ministro da Fazenda. Aplicação da Súmula 400. Dissídio de jurisprudência não demonstrado. Agravo regimental a que se nega provimento» (DJ de 17-6-80, pág. 4.540)». Ante o exposto, conheço do recurso extraordinário, para, cassado o acórdão recorrido, restabelecer a sentença de primeiro grau, data venta do brilhante voto cio eminente Ministro Cunha Peixoto, ao qual aderiu o eminente Ministro Rafael Mayer. CONFIRMAÇÃO DE VOTO (Preliminar) O Sr. Ministro Cunha Peixoto (Relator): Senhor Presidente, neste recurso, de que sou Relatar, mantenho o meu voto, não conhecendo do recurso. A meu ver, o cerne da questão é saber se a dispensa de pagamento do tributo é subsidio ou é isenção, porque o que ocorre é que, indiretamente, o produtor da máquina deixa de pagar o tributo, uma vez que o comprador se credita do que não pagou. Então, o que acontece? Evidente, que o vendedor, nessa hora, deixou de cobrar-lhe o imposto; vendeu com a dedução do imposto. Subsidio seria, se a União fizesse o pagamento extra, tora do dinheiro que ele havia arrecadado, ou fornecesse dinheiro a preço baixo. Do contrário, seria fácil descumprir o tratado do GATT; bas- 346 — 100 teria que o produtor, quando tivesse — como no caso de São Paulo e não pagar o imposto — o ICM — fizesse o pagamento e recebesse de volta o imposto, através do comprador. De fato, tem ele isenção do tributo. Como o ilustre Advogado afirmou, da tribuna, o pagamento do IPI, na importação, se faz na chegada da mercadoria no porto brasileiro. Paga, neste momento, mas quer se creditar. Pagou, da mesma maneira que o fez o comprador do produto nacional. Este pagOt e, depois, lá adiante, se creditou. Aqui, também, ele pagou e imediatamente se creditou. O problema de dizer que há diferença entre um e outro é mero jogo de palavras, pois a situação é absolutamente idêntica. Se o GATT é prejudicial ao Brasil, isto não nos compete verificar. As autoridades que denunciem o Tratado. Mas, enquanto este estiver .em vigor, a meu ver, deve ser cumprido. Data venia, não há aí subsídio, mas verdadeira isenção. VOTO O Sr. Ministro Xavier de Albuquerque: Admito que seja possível — em termos matemáticos, como fez o nobre Advogado, ou no plano da contabilidade financeira, como parece haver feito o eminente Ministro Cunha Peixoto — sustentar a equivalência entre a desoneração tributária direta e ostensiva, sob a forma de isenção, e a desoneração oblíqua, que aqui se daria sob a forma de crédito do imposto pago por outrem, em relação aos produtos nacionais. Admito até que seja possível acusar os que distinguem uma coisa de outra, de fazer jogo de palavras: mas o fato é que o tratado GATT também contempla essa distinção, admitindo os subsídios e as subvenções, e não confundindo uma coisa e outra com o tratamento tributário benéfico que tome a forma de isenção, de redução de allquota, etc. Parece-me que está no espírito do acordo a permissão de hipóteses como estas, que estamos examinando, pelo que o acórdão do Tribunal Federal de Recursos, no caso de que é Relator o eminente Ministro Soares Mtuloz, não negou vigência ao dito acordo, e, conseqüentemente, não maltratou o art. 98 do código Tributário Nacional. Convenço-me, data venia do eminente Ministro Cunha Peixoto, de que a solução dada, no maior número de seus acórdãos, pelo Tribunal Federal de Recursos, interpreta corretamente o documento internacional e a lei brasileira, e, por isso, peço licença a S. Exa. para acompanhar o voto do eminente Ministro Soares Mufloz, conhecendo do recurso e lhe dando provimento. VOTO O Sr. Ministro Thompson Flores (Presidente): Peço vênia ao eminente Ministro Cunha Peixoto (Relator) para acompanhar o voto do eminente Ministro Soares Mtuloz. Creio que a distinção que acaba de fazer S. Exa. encontra amparo na lei. Não se trata de crédito, porém, de incentivo em favor do produtor nacional. Correta, pois, a orientação atual do Tribunal Federal de Recursos, superando a anterior, sob cuja égide foi julgada a espécie dos autos. Assim, conheço do recurso que é da União Federal e lhe dou provimento. E como voto. EXTRATO DA ATA RE 93.002 — SP — Rel.: Min. Cunha Peixoto. Recte.: União Federal. Recda.:BRATONAL S/A — Indústria R.T.J. — 100 e Comércio ( Advs.: Joseval Sirqueira e outros). Decisão: Conhecido e provido, vencidos os Ministros Relator e Rafael Mayer. Presidência do Sr. Ministro Thompson Flores. Presentes à Sessão os Srs. Ministros Xavier de Afim- 347 querque, Cunha .Peixoto e Soares Manos. Ausente, justificadamente, o Ministro Rafael Mayer. Subprocurador-Geral da República, Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 23 de setembro de 1980 — Antônio Carlos de Azevedo Braga, Secretário. RECURSO EXTRAORDINÁRIO N? 93.053 — MG (Primeira Turma) Relator: O Sr. Ministro Antonio Neder. Recorrente: Estado de Minas Gerais — Recorridos: Libergráfica Editora Ltda. e outras e Gráfica Itacolomi Ltda. Ao redigir o 1?, do art. 8?, do Decreto-Lei n? 406/68, teve o seu autor o capricho de salientar que é tributável pelo ISS o serviço que, incluído na lista, seja prestado com o fornecimento de mercadorias, e que, ao redigir o § 2?, do mesmo artigo, ele teve o cuidado visível de tributar pelo ICM o fornecimento de mercadorias com a prestação de serviços não especificados na lista (o 2? foi de novo redigido pelo DL. n? 834/89). A comparação dessas duas normas permite se vislumbre que o legislador fixou, para o assunto, o critério da utilidade preponderante: no f 1?, o serviço prepondera sobre a mercadoria e incide o ISS; no f 2?, a mercadoria prepondera sobre o serviço e incide o ICM. Composição gráfica. E prestação de serviço que abrange o fornecimento de mercadorias (papel, tinta, etc.), mercadorias que, todavia, não constituem, no caso, a utilidade preponderante. Incide nela o ISS e não o ICM. O i 1?, do art. 8?, do Decreto-Lei n? 406 de 1968, não é inconstitucional. Precedentes do STF sobre a matéria. 5. Recurso extraordinário do Fisco de Minas Gerais a que a Corte nega conhecimento. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes- autos de Recurso Extraordinário n? 93.053-1, do Estado de Minas Gerais, em que é recorrente o referido Estado e recorridos Libergráfica Editora Ltda. e outras e Gráfica Itacolomi Ltda., decide o Supremo Tribunal Federal, por sua Primeira Turma, unanimemente, não conhecer do recurso, de acordo com as notas juntas. Brasília, 19 de maio de 1981 — Antonio Neder, Presidente e Relator. RELATÓRIO O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I — Libergráfica Editora Limitada e outras Impetraram segurança ao eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais contra certo ato do Sr. Secretário das Finanças daquele Estado. 398 Alegaram: que prestam o serviço de composição gráfica previsto no n. 53 da Lista de Serviços referida no art. 8?, do Decreto-lei n? 406, de 1968, de novo redigido pelo art. 3?, VI, do Decreto-lei n?. 834, de 8.9.69; que, portanto, são contribuintes do Imposto Sobre Serviço; que, todavia, o Secretário da Fazenda de Minas Gerais exige que paguem, no caso ao Estado, o Imposto Sobre Circulação de Mercadorias. O eg. Tribunal de Justiça mineiro concedeu a segurança. Fundou-se em precedente desta Corte, o acórdão proferido no RE 84.387 (RTJ, 84/570 a 573). Destacou do texto desse acórdão este fundamento decisório, f. 186: (...) «nos casos de tipografias, posto que empreguem em seus serviços tinta, papel e ingredientes outros, ficam eles absorvidos com a impressão realizada; perdem o seu valor comercial, não são eles vendidos como bens corpóreos, merecendo, pois, ser tributado o serviço prestado, o qual, como é expresso em lel, afasta a incidência de outros». II — Ao acórdão que assim julgou a matéria, interpôs recurso extraordinário o Estado de Minas Gerais. Baseou-se no art. 119, III, a), da Constituição. Quanto ao primeiro fundamento, o Impugnante sustenta que o acórdão recorrido contrariou o art. 23, II, e seu § 6?, da Constituição, como também negou vigência ao § 2?, do art 8?, do Decreto-lei n? 406, de 31.12.68, e ao art. 46 do Código Tributário Nacional. No tocante ao segundo fundamento, afirma o Recorrente que o acórdão local diverge do que foi proferi-. do pelo eg. Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo na Apelação n? 252.387, copiado nas fls. 206 a 215. — 100 O recurso foi impugnado, fls. 217 a 220, mereceu parecer favorável do Ministério Público de Minas Gerais, fls. 222 a 223, foi admitido, fls. 231 a 233, razoado, fls. 235 a 244, contraarrazoado por uma litisconsorte, fls. 247 a 251, tudo nestes termos: ... (lê). III — A eg. Procuradoria-Geral da República emitiu sobre o caso este parecer da lavra do nobre Procurador Moacir Antonio Machado da Silva, fls. 258 a 259: «1. O eg. Tribunal de Justiça de Minas Gerais concedeu segurança a empresas gráficas estabelecidas em Belo Horizonte, concluindo que o ICM não incide sobre os serviços de composição gráfica contratados com clientes e consumidores finais. «2 — Recorre o Estado, sustentando ofensa aos arta. 23, II, e § 6?, da Constituição, 8?, § 2?, do Dec.-lei n? 406/68 e 46 do CTN, além de divergência com julgado do Primeiro Tribunal de Alçada Civil de São Paulo (fls. 206-15). «3 — Não merece prosperar o recurso. Além da decisão preferida no RE 84.387 (DJ de 10/9/76, p. 7.836), há outros precedentes do Supremo Tribunal Federal que firmaram orientação no sentido de que os serviços de composição gráfica ( feitura e impressão de notas fiscais, fichas; talões, cartões, etc.) estão exclusivamente sujeitos ao ISS (RE 92.927, DJ de 7/11/80; RE 92.762, DJ, de 19/9/80; RE 92.761, DJ de 7/11/80; RE 92.161, DJ de 18/4/80; RE 93.032, 111 de 3/10/80, etc.). «4 — Se a atividade se compreende no item 53 da Lista anexa ao Dec.-lei n? 834, de 1969, está sujeita unicamente ao ISS, por força do que dispõe o § 1? do art. 8? do Dec.-lei n? 406, de 1968. R.T.J. — 100 — De acordo com os precedentes, o parecer é pelo nãoconhecimento de recurso.» IV — E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Antonio Neder (Relator): I. A tese do Estado recorrente é a de que a composição gráfica exige aplicação de matéria primas (papel, tintas e outros ingredientes), e que, por isso, é produto industrializado que, circulando, está sujeito ao ICM. Na verdade, a composição gráfica é prestação de serviço que abrange aplicação de alguns produtos (papel, tinta, etc.). Sucede que o I?, do art. 8?, do Decreto-lei n? 406, de 31.12.68, expressa que o serviço incluído na lista referida no seu texto (de novo redigida pelo art. 3?, VII, do Decreto-lei nt 834 de 8.9.69) fica sujeito apenas ao Imposto previsto no mencionado art. 8?, o ISS, ainda que sua prestação envolva fornecimento de mercadorias. Vale dizer que o legislador afastou a tributação das mercadorias com que se presta qualquer serviço incluído na lista, e qtie o fez porque, na presta tão de tal serviço, o fornecimento de mercadorias não constitui o fato econômico preponderante. O legislador adotou o critério, que lhe foi indicado pela politica fiscal, de preponderância da utilidade fornecida pelo contribuinte, critério esse definido pelo Prof. Antonio Roberto Sampaio Daria nestes termos (Revista dos Tribunais, SP, volume 392, p. 53): «Ora, sendo de observação elementar o fato de que toda mercadoria fornecida pressupõe, em seu custo, fatores representados por 349 serviços e materiais, havendo o legislador constituinte instituído impostos diferençados incidentes sobre mercadorias e sobre serviços e não se permitindo a exigência de dois tributos diversos sobre o mesmo substractum econômico, é de se concluir que, implicitamente, foi adotado, entre nós, o critério da preponderância funcional da utilidade fornecida. Se, num dado fornecimento, a utilidade preponderantemente transferiria pelo fornecedor for o material, cabível será a cobrança do ICM. Se a utilidade preponderante for o serviço, competirá ao mtmicipio exigir o imposto correspondente. Tal critério parece repousar no bom senso, permitir uma repartição equitativa da matéria impositiva e assegurar o eficiente funcionamento da máquina arrecadadora, exonerando o contribuinte da obrigação de decompor o custo do bem fornecido em materiais, serviços e outros itens, para o que, na imensa maioria dos casos, ele não possui aparelhagem contábil adequada.» Não importa, pois, que, na prestação de qualquer serviço previsto na supracitada lista, o prestador aplique mercadoria, pois esta constitui sempre a utilidade que não prepondera na que é fornecida pelo contribuinte. Note-se que, ao formar a lista, o legislador teve o cuidado, que logo se percebe, de selecionar serviços em que o fornecimento de mercadorias constitui algo que não prepondera na utilidade final. Tanto que, ao redigir o I 1?, do art. 8?, do Decreto-lei n? 406/68, teve o seu autor o capricho de salientar que é tributável pelo ISS o serviço que, incluído na lista, seja prestado com o fornecimento de mercadorias, e que, ao redigir o 4 2?, do mesmo arti- 350 R.T.J. — 100 go, ele teve o cuidado visivel de tributar pelo ICM o fornecimento de mercadorias com a prestação de serviços não especificados na lista (o 2? foi de novo redigido pelo Dl. n? 834/69). A comparação dessas duas normas permite se vislumbre que o legislador fixou, para o assunto, o critério da utilidade preponderante: no 1?, o serviço prepondera sobre a mercadoria e incide o ISS; no 2?, a mercadoria prepondera sobre o serviço e incide o ICM. que foi prolatado no RE 84 387, este citado no acórdão impugnado, f. 186, para fundamentar a concessão da segurança. II — Não conheço do recurso, é o meu voto. VOTO (PRELIMINAR) O Sr. Ministro Clovis Ramalhete: Senhor Presidente, entendo que na obra gráfica encontra-se o fato gerador de imposto sobre serviço. Quando essa indústria repassa, com a obra impressa, tal como os formulários oficiais, ela repassa um bem inNão é certo, pois, que o acórdão corpore°, uma resultante de obra inimpugnado haja ofendido as normas telectual. O papel, a tinta, apenas federais a que se reporta, em seu re- dão suporte físico ã obra imaterial, e curso extraordinário, o Estado de esta é a atividade mercantil dessa indústria. 2 tal qual a música para a Minas Gerais. partitura, a música para o disco. O Sim, porque o critério da utilidade fonograma e o papel com música impreponderante não é incompatível pressa, ambos são o suporte físico de com as regras constitucionais e le- algo abstrato que fazem circular. A gais definidas pelo Recorrente como atividade mercantil do industrial gráfico não está na circulação do pavulneradas. pel e da tinta, ainda que indispensáA tese do Fisco mineiro tem assen- vel a ela. Está na exposição à venda to na literal aplicação dessas nor- da obra gráfica, obtida com papel e mas, e não, como deve ser, pelo con- tinta, mas que é, em si, outra coisa, siderar a finalidade perseguida por e é afinal o que se vende e o que se quem as elaborou na inspiração de compra. Não há, portanto, fato gerador de imposto de circulação de certa política tributária. mercadoria, mas imposto sobre serRegistro que a controvérsia não viço, na atividade mercantil da inmerece atenção especial do STF, dústria gráfica. Bem andou a norma porque a sua jurisprudência já se legal em dar-lhe esse tratamento trifirmou no adotar a mesma orienta- butário. — Acompanho V. Exa., não ção que foi seguida pelo acórdão re- conheço do recurso. corrido. EXTRATO DA ATA A eg. Procuradoria-Geral da República citou, no seu parecer que se RE 93.053 — MG — Rel.: Min. Anacha transcrito no relatório, os acór- tonio Neder. Recte.: Estado de Midãos proferidos nestes casos: RE nas Gerais (Advs.: Maurício Ferrei92.927, RE 92.762, RE 92.761, RE ra de Carvalho, João Procópio de 92.161, RE 93.032. Carvalho e outro). Recdos.: Libergráfica Editora Ltda. e outras (Advs.: Outros precedentes podem ser Sylvio Oliván Neto e outros). e Grálembrados, como sejam os acórdãos fica Itacolomi Ltda. (Advs.: J. Milproferidos netes outros casos: RE ton Henrique, Carlos Augusto Jun91.562, RE 91.757, RE 92.138, além do queira Henrique e outro). R.T.J. — 100 Decisão: Não se conheceu do recurso. Votação uniforme. Presidência do Senhor Ministro Antonio Neder. Presentes a Sessão os Senhores Ministros Cunha Peixoto, Soares Mutioz, Rafael Mayer e 351 Clovis Ramalhete, SubprocuradorGeral da República, o Dr. Francisco de Assis Toledo. Brasília, 1? de maio de 1981 — António Carlos de Azevedo Braga, Secretário. RECURSO EXTRAORDINARIO N? 93.108 — SP (Segunda Turma) Relator: O Sr. Ministro Moreira Alves. Recorrentes: Fibral S/A — Indústria, Comércio e Administração e outro — Recorrida: Prefeitura Municipal de São Paulo. Licença de construção. Indeferimento com base em critério da legislação municipal anterior que determinou, quanto a pedidos feitos anteriormente a ela, que fossem examinados à luz da legislação vigente quando de sua apresentação. Se a legislação local posterior determinou, como reconhece o acórdão recorrido, que os requerimentos de licença de construção fosse:ri apreciados à luz da legislação vigente ao tempo de sua apresentação, não pode a Administração Pública sobrepor o seu critério de avaliaçãO a esse respeito ao da própria lei. Essa circunstancia afasta o argumento a fortIorl com base na possibilidade de revogação de licença de construção, cuja obra não foi iniciada, sob o fundamento de conveniência ditada pelo interesse póMoo, pois, neste caso, essa conveniência não foi apreciada nem afastada pela lei vigente. Recurso extraordinário conhecido e provido. ACORDA0 Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os. Ministros da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal, na conformidade da ata do julgamento e das notas taqtrigráficas, por unanimidade de votos, conhecer do recurso e dar-lhe provimento. Brasília, 07 cie novembro de 1980 — Djaci Falcão, Presidente — Moreira Alves, Relator. RELATORIO O Sr. Ministro Moreira Alves — este o teor do acórdão recorrido (fls. 158/163): Acordam, em Segunda Camara Civil do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, por votação unânime, rejeitar as preliminares de impossibilidade jurídica do pedido, de Ilegitimidade de parte e de decadência e, no mérito, negar a segurança. Peter Muranyl Indústria e Comércio S/A, em dezembro de 1970, apresentou à Municipalidade de São Paulo projetos relativos à construção de um conjunto de vários edifícios. Os processos correspondentes, de número 17.483 e 17.535/70, acabaram indeferidos pela Coordenadoria Geral de Planejamento — 352 R.T.J. — 100 Cogep — conforme despachos publicados no Diário Oficial do Município, de 24 de outubro a 21 de novembro de 1975, sob o fundamento de que contrariavam o interesse público, estando em desconformidade com as normas estabelecidas na Lel n? 8.001/73, no Decreto n? 12.209/75 e na Instrução Normativa Gogep 1/75. Aduziram as informações, em preliminares, a impossibilidade jurídica do pedido, por reclamar a aprovação do projeto; e a ilegitimidade de parte, por haver a impetrante vendido o imóvel ao assistente faltando-lhe, assim, interesse de agir. Procuram, quanto ao mérito, sustentar a legalidade do ato. Inconformada, a interessada ofereceu recurso à Comissão de Edificações e Uso do Solo (Ceuso) sem, contudo, obter provimento, segundo publicação feita no Diário Oficial do Município de 30.9.77. A douta Procuradoria da Justiça opinou no sentido de que houve decadência do direito de impetrar segurança e de que a impetrante é realmente parte ilegítima. Quanto ao mérito bateu-se pela denegação. Essa decisão ensejou a interposição de dois recursos, desta feita ao Sr. Prefeito Municipal: um, protocolado a 28.11.77, sob n? 159.459, e outro, protocolado a 27 de dezembro de 1977, sob n? 167.563, ambos já subscritos pela impetrante. No primeiro recurso o chefe do Executivo possibilitou o enquadramento da área denominada «AS» na legislação atual, esclarecendo que a decisão relacionada com a outra parte do projeto, pertinente à área «CD», seria objeto de apreciação e decisão em separado. O segundo recurso foi indeferido, sob o fundamento de que «a construção continua contrariando as normas urbanísticas consubstanciadas nas Leis n?s 7.805/72 e 8.001/73, justificando assim o seu indeferimento, nos termos do Decreto n? 12.209/75» (DOM, de 17.1.79). Daí a presente segurança, na qual a impetrante e seu assistente sustentam a ilegalidade do ato, e pedem a entrega de uma das vias das plantas com a devida aprovação ou, pelo menos, que se assegure seu direito de ver os projetos examinados em consonância com a legislação vigente ao tempo da apresentação. Inexiste a alegada impossibilidade jurídica do pedido, uma vez que a pretensão da impetrante ficou bem especificada na inicial. Consiste em obter, desde logo, a aprovação do projeto ou que lhe seja assegurado o direito de vê-lo examinado segundo a legislação vigente ao tempo de sua apresentação. Ainda que, quanto à primeira alternativa, realmente não fosse adequada a via eleita, pois o mandado de segurança não transfere ao Judiciário as prerrogativas do Executivo, a segunda não contém defeito algum e encerra o fulcro da questão. Se o impetrado indeferiu em vigor, desde que se conclua pela inaplicabilidade desta, a solução seria a anulação do ato, com o conseqüente exame desses projetos segundo a legislação pertinente. Esse resultado é, em tese, juridicamente possível, faltando, assim, consistência à preliminar. Igualmente deve ser afastada a alegada ilegitimidade de parte. Os projetos foram originariamente apresentados por Peter Muranyi Indústria e Comércio S/A, pessoa jurídica da qual a impetrante Fibra S/A — indústria e Comércio e Administração é suces- R.T.J. — 100 sora. Aliás esta é que acompanhou a maior parte da trem l itcaÇão dos procedimentos administrativos, inclusive interpondo o recurso cujo indeferimento ensejou esta impetração. Pouco antes do ato impugnado a Fibral vendeu o imóvel a Peter Muranyi, transferindo-lhe todos os direitos, inclusive o de edificar, associando-se na realização do empreendimento, cabendo ao último os ónus da execução e àquela os resultados que virtualmente se verificarem. Dai a razão por que aparece a pessoa jurídica como impetrante e Peter Muranyi como assistente. A Municipalidade é estranha ao negócio jurídico celebrado entre a impetrante e seu assistente. Se subsiste para aquela o Interesse na aprovação do projeto, o único que poderia se opor é o atual proprietário. Este, entretanto, ao contrário, dá sua integral adesão, assistindo processualmente à impetrante Essa reunião de interesses legitima a impugnação. A raciocinar como se fez nas informações, qualquer alienação anterior à aprovação do projeto de construção tornaria prejudicado o pedido; e se posterior à concessão da licença impediria a edificação. Não se verificou, outrossim, a decadência do direito de impetrar segurança conforme argumenta a douta Procuradoria-Geral da Justiça. O ato impugnado, no caso, foi publicado no Diário Oficial do Município de 17 de janeiro do corrente ano, tendo sido ajuizado a impetração a 8 de maio. Reconhece-se ser pacífico o entendimento de que o pedido de reconsideração não suspende nem in- 353 terrompe, o prazo decadencial, o qual flui peremptoriamente a partir do ato lesivo. Sucede, porém, que pedido de reconsideração é o que é dirigido à própria autoridade que praticou o ato, e não à que lhe é imediatamente superior. Desse modo, quando a legislação municipal autoriza àquele que teve seu interesse desatendido pela autoridade subalterna a dirigir «pedido de reconsideração» ao Sr. Prefeito Municipal, não usou a expressão no sentido próprio, mas criou, na verdade, outra instância administrativa, isto é, mais um recurso, ainda que sem efeito suspensivo. Pode então o interessado, que não está obrigado a esgotar a via administrativa, desde logo reclamar ao Judiciário proteção correspondente ao direito violado, ou então, pedir reconsideração ao Prefeito, para depois, em caso de desatendimento, adotar aquela providência. Os projetos indeferidos pela digna autoridade impetrada foram apresentadas em dezembro de 1970, e consoante se infere do teor da própria decisão impugnada, está conforme a legislação vigente ao tempo em que foi protocolado. A Lei n? 7.805, de 1972, porém, modificou as condições de uso e ocupação do solo no local das edificações projetadas. Assegurou, contudo, no art. 30, que «os expedientes administrativos, ainda sem despacho decisório, protocolados anteriormente à data da publicação da lel, que não se enquadram nas disposições ora estatuídas, serão decididos de acordo com a legislação anterior». Posteriormente, a Lei n? 8.001, de 1973, repetiu literalmente a norma, no art. 48. 354 R.T.J. — 100 Em perfeita coerência, estatuiu o Decreto n? 11.106, de 1974, no art. 117: «os expedientes administrativos, ainda sem despacho decisório protocolados anteriormente à data da publicação da Lei n? 8.001, de 24.12.73 que não se enquadrem nas disposições estatuídas nessa lei serão decididos de acordo com a legislação anterior». O Código de Edificações do Município de São Paulo (Lei n? 8.260, de 20 de junho de 1975), seguindo a mesma linha de orientação, permitiu a opção pelo exame, em conformidade com a legislação anterior, «de pedidos protocolados e numerados na Prefeitura até a data da publicação desta Lei, ainda sem despacho decisório ou com interposição de recurso dentro dos prazos legais, referentes a licenciamentos de construções...» (art. 567, I). Não pode haver, portanto, a menor dúvida no sentido de que a legislação municipal tem assegurado, sistematicamente, o direito do proprietário em ver seu projeto de construção examinado em consonância com a norma vigente ao tempo em que foi protocolado. Sem embargo de tamanha clareza, o Decreto n? 12.209, de 9 de setembro de 1975, dispondo sobre pedidos de aprovação de plantas para construção ou edificação, estatuiu, no art. I?: «Os processos que contenham pedidos de aprovação de plantas para construção ou edificação, pendentes de decisão, serão apreciados à luz da legislação vigente.» A questão, porém, não se resolve apenas nesse plano. Sucede que o Colendo Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n? 85.002, rel. Min. Moreira Alves, reconheceu, por unanimidade de votos, que o direi- to de construir não é mais do que uma das faculdades jurídicas contidas no direito de propriedade, a qual só pode ser exercitada quando o Poder Público competente autoriza esse exercício, admitindo a revogação de licença para construção, ainda que deferida em conformidade com a legislação em vigor e que o motivo seja mera conveniência (fls. 101/116). O V Acórdão fez aplicação da Súmula n? 473, segundo a qual pode a administração revogar seus próprios atos, por motivos de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos. E ressaltou que direito adquirido só existe quando a obra já tiver sido iniciada. Ora, se o Poder Público pode revogar seus atos, por mera conveniência, «a fortiori ratione», pode deixar de conceder a autorização, em nome do interesse público, tal como se procedeu, no caso. Conforme decidiu este Egrégio Tribunal, na Apelação Cível n? 258.781, de São Paulo, «se a Administração pode, a todo tempo, fazer cessar as obras particulares licenciadas, que, por motivos supervenientes, possam prejudicar o interesse público, revogando o alvará concedido, não se vê motivo para impedila de não conceder licença, desde que esta não consulte o interesse público» (fls. 128). O que nessa hipótese se reserva ao particular consoante se infere das lições de Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro, pág. 171, 3? ed., RT, São Paulo, 1975) e Oswaldo Aranha Bandeira de Mello (Princípios Gerais de Direito Administrativo, vol. I, pág. 567, Forense, Rio de Janeiro, 1969) é o direito á reparação do dano. Podia, portanto, a autoridade impetrada, ainda que atendidos os R.T.J. — 100 pressupostos legais, indeferir a licença postulada pela interessada em nome da conveniência ditada pelo interesse público. Mas a Administração se sujeita ao dever de indenizar, uma vez verificados os pressupostos legais. Ante o exposto, repelidas as preliminares, denegam a segurança.» Interposto recurso extraordinário, foi ele admitido pelo seguinte despacho (fls. 215/219): rcI — Inconformada com ven. acórdão de fls. 158/163, que denegou Mandado de Segurança impetrado contra ato do Prefeito Muni- cipal de São Paulo, interpôs a recorrente o presente Recurso Extraordinário com fundamento no art. 119, inciso Hl, letras a e d, da Constituição Federal, alegando que ven. acórdão recorrido vuinerou art. 153, ff 2? e 3?, da Constituição Federal e art. 6? do Decreto-lei Federal n? 4.657/42, divergindo, ainda, de decisões proferidas pelo evitando Supremo Tribunal Federal (Recurso Extraordinário tf 88.4742). Sustenta a recorrente que tinha direito adquirido com o protocolamento dos projetos de construção aludidos nos autos, uma vez que estes estavam de acordo com a legislação então vigente, motivo pelo qual não poderia ser revogado esse direito por um simples decreto do Poder Executivo. II — O recurso foi impugnado pela Municipalidade de São Paulo, que se manifestou peio indeferimento, porquanto a decisão recorrida limitou-se à aplicação de leis municipais, não atingindo, em momento algum, qualquer disposição constitucional ou lel federal. III — O parecer da ProcuradoriaGeral da Justiça foi no sentido do indeferimento, porquanto inocor- 355 reu ofensa a direito adquirido da impetrante, uma vez que o Município não está obrigado a conceder alvará de construção, pleiteado em consonância com a lei anterior, quando, no ato da concessão do alvará, existe lei nova dispondo de outra forma. E o relatório. IV — Os projetos de construção, referidos na impetração e neste recurso, foram apresentados na Municipalidade em dezembro de 1970; estavam eles elaborados de acordo com a legislação municipal vigente naquela época. Em 1972, uma lei nova modificou as condições de uso e ocupação do solo no local das construções a serem levantadas, permitindo o art. 30 (lel n? 7.805) que os projetos ainda sem despacho decisório, protocolados anteriormente à lei nova, fossem decididos de acordo com a legislação anterior; isso mesmo foi repetido pelo art. 48 da Lei n? 8.001, de 1973. Contudo, o decreto n? 12.209, de 1975, estatuiu, em seu art. 1?, que tais projetos seriam apreciados, não á luz da legislação anterior, como determinaram tais leis, mas, sim, à luz da legislação vigente na época de sua apreciação pelo Município. Surge, então, a indagação formulada pelo acórdão recorrido e pelo parecer do representante do Ministério Público, sobre se a autoridade municipal está obrigada a expedir o alvará de construção ou se pode negá-lo, multo embora atenda às normas regulamentares da época em que foi elaborado e apresentado à Municipalidade. A resposta a esta indagação resolve o problema; o acórdão recorrido está fundamentado na tese es- 356 R.T.J. — 100 posada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal no acórdão prolatado no Recurso Extraordinário n? 85.002, de São Paulo, constante de fls. 101 e seguintes, da lavra do eminente Ministro Moreira Alves, e no qual, apreciando os mesmos dispositivos da legislação municipal, entendeu o Colendo Tribunal que havendo sido expedida a licença para a construção e tendo sido esta iniciada, a revogação da autorização ofendia o direito adquirido pela impetrante em prosseguir na construção; o eminente Relator sustentou a tese de que, se a construção não foi iniciada, a licença já concedida pode ser revogada, arcando a Municipalidade com a indenização porventura devida ao prejudicado. Mas, no Recurso Extraordinário n? 88.474, o Colendo Supremo Tribunal Federal para não conhecer do recurso, o eminente Relator Djaci Falcão entendeu, em hipótese idêntica à dos autos, que a decisão recorrida, que concedera mandado de segurança à impetrante para obter a expedição de alvará de construção, simplesmente dera razoável interpretação à legislação local, ao reconhecer direito adquirido da impetrante à obtenção de licença de acordo com a legislação municipal anterior, mandava observar pelos arts. 30 da Lei n? 7.805 de 1972 e art. 48 da Lei n? 8.001, de 1973. Face à indisfarçável divergência na conceituação do direito adquirido na espécie, bem como a divergência jurisprudencial, defiro o processamento do recurso. P. e L» E o relatório. VOTO O Sr. Ministro Moreira Alves (Relator) 1. Conheço do recurso, porque caracterizado o dissídio de jurisprudência com o RE 88.979, que, embora não conhecendo do recurso extraordinário então interposto (a questão era a mesma, e a segurança fora concedida), examinou o mérito do litígio. Passo, pois, a julgar a causa. Entendeu o acórdão recorrido que, não tendo sido iniciada a obra, apesar de a licença ter sido concedida, esta pode ser revogada por motivo de conveniência ditada pelo interesse público, uma vez que não há direito adquirido à autorização em que se consubstancia a licença de construção. E, com base nessa premissa — para a qual invoca o RE 85.002 de que fui relator —, argumenta, a fortiori, que, se o Estado pode revogar licença já concedida sem que a obra se haja iniciado, poderá também indeferir licença apenas requerida com base em vedações estabelecidas por lei nova, que, no entanto, com relação aos requerimentos de licença já apresentados antes dela, determinou fosse aplicado o regime da lei anterior. A premissa de que partiu o acórdão é, a meu ver, correta (não há direito adquirido à licença, se a obra não foi iniciada), mas não o é a conclusão fundada, equivocadamente, no argumento a fortiori. De fato, como salientei no voto que proferi no RE 85.002, o denominado direito de construir é simples faculdade jurídica — e não direito subjetivo —, faculdade essa que integra o conteúdo do direito subjetivo de propriedade, e que, para ser exercitada, depende de autorização (licença de construção) pelo Poder Público competente. A licença, portanto, é mera autorização para o exercido dessa faculdade jurídica, e, enquanto esta não for exercitada, com o inicio da construção, daquela não nasce direi- R.T.J. — 100 to subjetivo — até porque não há direito subjetivo ao exercício de uma faculdade que integra outro direito subjetivo (o de propriedade) —, pressuposto indispensável à existência de direito adquirido. Dai a razão pela qual a licença, como simples autorização que é para o exercício de uma faculdade jurídica, pode ser revogado por conveniência da Administração Pública, sem o obstáculo do direito adquirido (que é o óbice previsto na Súmula 473), embora se admita a reparação do dano sofrido pelo particular. E daí também a razão porque, no RE 85.002, não se admitiu a revogação de licença quando a obra já se iniciou, uma vez que esta circunstância modifica a situação, como acentuei naquele voto, verbis: «Iniciada, porém, que seja a obra autorizada, o problema muda de feição, porquanto, neste caso, há, inequivocamente, direito adquirido. Com efeito, tudo aquilo que acede ao solo passa, por via de regra, a ser objeto do direito de propriedade do proprietário deste. Há, pois, direito de propriedade sobre a construção, ainda que apenas iniciada. E esse direito não pode ser atingido por ato administrativo que, com base em legislação nova, vise a revogar a autorização em virtude da qual se praticaram os atos necessários a que ele surgisse. Essa revogação é obstada pela existência desse direito adquirido (o direito de propriedade sobre a construção). No caso, não há mais uma simples faculdade jurídica que pode ser exercitada porque o ato administrativo de autorização declarou a inexistência de qualquer restrição a esse exercício; existe, sim, um direito subjetivo — o direito de propriedade sobre