Gênero e Sexualidade em debate:
oportunidades e desafios para a psicologia
Lenise Santana Borges
Pontifícia Universidade Católica de Goiás
Localizando palavras – noções e conceitos
Gênero: o que é?
• É um conceito/categoria das ciências sociais,
elaborada no interior do pensamento feminista,
que diz respeito às diferenças socialmente
atribuídas ao feminino e ao masculino, cujas
marcas se inscrevem, sobretudo, nos corpos das
pessoas.
• As marcas de gênero se intersectam a outras
marcas - raciais, étnicas, de classe, de idade, de
orientação sexual, etc. – produzindo hierarquias,
ou seja, relações sociais assimétricas e desiguais
em termos de poder.
Gênero: de onde veio?
• Gênero foi criado no seio do pensamento
feminista para superar dificuldades do uso da
categoria “mulher”. Mas, compartilha vários
dos pressupostos da luta feminista em prol do
reconhecimento desse sujeito político
mulher/mulheres e da sua “opressão”
específica.
Para que serve?
• Gênero oferece a possibilidade de um outro
olhar sobre a realidade, permitindo ler como
as desigualdades afetam, de modos distintos,
homens e mulheres nas suas relações uns com
os outros: homens-homens; homensmulheres; mulheres-mulheres.
• Possibilita analisar como operam as
hierarquias e qual a centralidade que as
outras marcas assumem.
Marcas de diferença: Hierarquias
• Marcas de gênero, classe, raça, orientação
sexual, etc., não são equivalentes. Quando
hierarquizadas, as marcas de gênero tendem a
se fixar no pólo mais “fraco” da balança, por
ser a forma mais antiga e naturalizada de
distinção entre pessoas, coisas e fenômenos.
Na “balança” de gênero, o feminino e, por
consequência, as mulheres, ocupam as
posições mais vulneráveis.
Exemplo de dois extremos numa polarização
homem/mulher:
• Homem branco, adulto, classe média urbana,
escolarizado, com emprego fixo,
heterossexual, casado legalmente, pai,
católico.
• Mulher negra, pobre, adulta, analfabeta,
moradora da periferia da cidade, trabalho
informal não assalariado, mãe-solteira, sem
religião definida.
Combinando marcas (intersecções):
Quem está mais vulnerável?
• uma aluna “branca”, classe média,
declaradamente lésbica e “masculinizada”;
• um aluno “branco”, classe média, percebido
como gay;
• uma “negra”, pobre, percebida como
heterossexual, e mãe solteira;
• uma “índia”, pobre, e da zona rural;
Combinando marcas (intersecções):
Quem está mais vulnerável?
• uma “parda”, classe média baixa, gorda,
politicamente engajada nas religiões “africanas”
• um aluno “pardo”, classe média baixa, gay,
evangélico;
• um/a aluno/a travestido/a com identidade sexual
ambígua;
• uma aluna “branca”, pobre, declaradamente “garota
de programa”;
• um aluno “branco”, heterossexual e declaradamente
HIV positivo;
É importante lembrar que:
• Uma mulher pode ser discriminada em algum
momento por ser mulher, em outro isso pode
não importar tanto quanto o fato dela ser vista
como negra, ou pobre, ou idosa, ou lésbica, ou
portadora de HIV. Da mesma forma, isso pode
mudar segundo o contexto que tal classificação
for acionada. Modelos de gênero podem ser mais
gerais, mas não são iguais para todo mundo,
variam segundo as relações e o contexto que as
pessoas estejam.
É importante lembrar que:
• As diferenças são “evidências” arbitrariamente
impostas. Ser diferente é ser colocado em
relação ao que é socialmente definido como
dominante, normal, ajustado, etc. O que é ser
diferente muda historicamente. Por isso,
gênero é um conceito relacional e está
referido a contextos culturais particulares.
Mas...
• Todas as culturas conhecidas apresentam
sistemas de gênero específicos, resultando em
desigualdades aparentemente “universais”.
Por isso, algumas diferenças tendem a ser
consideradas “naturais”. No entanto, a noção
de gênero, tanto quanto a de sexo, são
construídas socialmente. Por isso, a fórmula
Sexo = natureza/ Gênero = cultura precisa ser
problematizada.
Exemplo de esquemas “universais”:
•
•
•
•
Feminino = passividade
Masculino = atividade
Decorrendo que:
Um menino mais “passivo” é percebido como
um menino “feminino”
• Uma menina mais “ativa” é percebida como
uma menina “masculina”
Matriz heterossexual
• Gênero permite analisar como opera a “matriz
heterossexual”, por meio de uma série de
coerências: feminilidade = mulher; masculinidade
= homem = desejo/atração/orientação
heterossexual = complementaridade (os
“opostos” se completam).
• Gênero, uma vez naturalizado, tende a coincidir
com sexo biológico ou “papéis sexuais”; cada
pessoa, definida pelo seu sexo, possui
determinadas funções a cumprir, dando origem a
“tipos sociológicos”:
“Tipos” sociológicos
• A “mãe cuidadora”. A maternidade também é uma
construção social, mas é tratada como função inscrita
na natureza que, se não realizada, torna a mulher
“anormal”.
• O “pai provedor”. Embora as mulheres trabalhem, a
relação de dependência com um homem provedor
permanece como um valor social.
• O “macho garanhão”. O desejo sexual “desenfreado”,
característico dos “verdadeiros” homens. Ou a mulher
“contida”, cujo desejo sexual é passível de controle.
• Etc...
Voltando à pergunta inicial: para que serve?
• Essas posições, uma vez naturalizadas, dão forma
às instituições e práticas sociais: família, ciência,
religião, política, escola, arte, etc.
• Gênero permite desconstruir regras rígidas e
aparentemente fixas em todos esses campos,
embora todas as mudanças sociais levem um
tempo considerável.
• Consiste numa ferramenta importante no mundo
da ação política e da intervenção social.
Interrogando sobre o lugar do gênero na
escola:
• A escola tende a reproduzir, reforçar, modificar ou
transgredir as normas sociais dominantes quanto ao
gênero (e também outras marcas)?
• Que efeitos de poder podemos mapear
cotidianamente nas relações dentro da escola?
• Como os livros didáticos tratam das relações sociais
marcadas por gênero? Como apresentam homens,
mulheres, crianças, adultos, negros, brancos, índios,
etc.? Que linguagens e imagens utiliza quando
focaliza o feminino ou que formas de feminilidade
privilegia ?
Interrogando sobre o lugar da escola:
• Quais estereótipos de gênero são mais comuns?
Exemplos: a professora “maternal”; a aluna dócil e
obediente; o aluno rebelde; a aluna sedutora; o
aluno malandro, etc.; o/a aluno/a inteligente?
• Quando organiza suas atividades, a escola separa os
alunos por sexo? Que tipo de
atividades/responsabilidades atribui a garotos e
garotas? Por que?
• Como a escola lida com as “verdades” científicas?
Vale ressaltar que:
• Pensar com “lentes de gênero” é aprender a
interrogar cotidianamente sobre os efeitos de
poder nas relações e práticas sociais diversas.
Sendo construções sociais e arbitrárias,
podem ser modificadas. Portanto, gênero é,
sobretudo, um conceito político, uma
ferramenta de transformação das relações
sociais.
Transformando o tema em pergunta:
• Quais as possibilidades e os limites do uso do
conceito de gênero no trabalho dos/as
psicólogos/as?
Fontes de inspiração:
• PINTO, Joana Plaza. Os gêneros do corpo. In:
GONÇALVES, Eliane (org.). Desigualdades de
gênero no Brasil: reflexões e experiências.
Goiânia: Grupo Transas do Corpo, 2004.
• PISCITELLI, Adriana. Re-criando a categoria
mulher? In: ALGRANTI, Leila Mezan (org.). A
prática feminista e o conceito de gênero.
Textos Didáticos (48). Campinas:
Unicamp/IFCH, 2002, pp. 7-42.
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aula 7- discussão acerca de gênero e sexualidade