VI Congresso Latino-Americano de Nutrição Animal - SALA QUALIDADE DE ALIMENTO
23 a 26 de Setembro de 2014 – Estância de São Pedro, SP - Brasil
Realização: Colégio Brasileiro de Nutrição Animal – CBNA
PANORAMA DAS MICOTOXINAS
Carlos Augusto Mallmann1; Paulo Dilkin2; Adriano Olnei Mallmann3
Resumo
As micotoxinas são metabólitos tóxicos secundários produzidos por fungos filamentosos. Os
fungos crescem e proliferam-se bem em grãos quando em condições ideais de temperatura, umidade e
presença de oxigênio. Há inúmeros fatores que favorecem o crescimento fúngico e produção de
micotoxinas. A evidência da ocorrência das micotoxinas estão relatadas no Antigo Testamento, porém
receberam atenção especial na década de 1960 quando houve um surto de aflatoxicose na Europa. As
principais micotoxinas de ocorrência em grãos e subprodutos utilizados na nutrição animal no Brasil,
são as aflatoxinas, fumonisinas, zearalenona e deoxinivalenol. Outras micotoxinas, mesmo que
ocorram com menor frequência, quando contaminam os alimentos provocam importantes perdas
econômicas. Com a necessidade do aprimoramento constante da área de nutrição animal o controle e
gerenciamento das micotoxinas tem sido um desafio importante, pois por razões econômicas e de
saúde pública, as micotoxinas merecem cada vez mais atenção.
1. HISTÓRICO, PRODUÇÃO DE MICOTOXINAS E EFEITOS NOS ANIMAIS
As primeiras evidências da ocorrência de micotoxicoses estão relatadas no Antigo
Testamento, por ocasião das dez pragas do Egito, descritas nos livros do Êxodo e Jó, na passagem em
que Moisés tentava libertar os hebreus do domínio Faraônico. Há evidências da presença de
micotoxinas na peste que dizimou os rebanhos e induziu tumores e úlceras nos animais e no povo
Egípcio. Na evolução histórica da micotoxicologia, chama atenção o episódio chamado de “Fogo de
Santo Antônio” ocorrido na Idade Média. Este problema se concentrou mais precisamente entre os
séculos XI e XVI atingindo a população de diversos países da Europa, especialmente a francesa. A
enfermidade se caracterizou por surtos de gangrena na população que consumia cereais contaminados
por esclerotos do fungo Claviceps purpurea. A doença é decorrente das propriedades vasoconstritoras
da ergotamina, que dificulta a circulação periférica. Por outro lado, essa substância também apresenta
ação ocitócica e de estimulação do sistema nervoso central, seguida de depressão.
Nos séculos XIX e XX, ocorreu no Japão uma epidemia chamada doença do arroz amarelo,
que causou grande número de mortes por ocasião do consumo de arroz mofado. A doença foi atribuída
à citreoviridina, toxina cardiotóxica (beribéri cardíaco) produzida por fungos do gênero Penicillium.
A nefropatia dos Bálcãs, que atingiu vários países do leste europeu nos anos de 1957 e 1958,
foi decorrente da ingestão de alimentos contaminados por ocratoxina A, produzida por fungos como o
Aspergillus ochraceus e Penicillium viridicatum.
As micotoxinas começaram a receber maior importância científica a partir de 1960, quando as
aflatoxinas foram responsabilizadas pela mortalidade de mais de 100.000 perus no Reino Unido. Com
o avanço das pesquisas, ficou evidente que as mesmas possuem propriedades extremamente tóxicas a
todos os mamíferos. Desta forma, cada vez mais, as micotoxinas vêm recebendo espaço no cenário
1
Prof. Titular, Dr., coordenador do Laboratório de Análises Micotoxicológicas - LAMIC, Departamento de Medicina Veterinária
Preventiva - DMVP, Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. E-mail: [email protected].
2
Prof. Adjunto, Dr., pesquisador do LAMIC, DMVP, UFSM.
3
Médico Veterinário, MSc., doutorando do LAMIC, Programa de Pós Graduação em Medicina Veterinária, UFSM.
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mundial, algumas de maior importância, como as fumonisinas, foram descobertas em 1988, e são
responsáveis por diversas enfermidades em animais domésticos, como a leucoencefalomalácia em
equinos, e estão relacionadas a grande quantidade de surtos de câncer esofágico em humanos. Hoje
são descritas mais de 500 substâncias como micotoxinas e, com os modernos métodos de detecção, a
cada ano são catalogadas mais de 10 diferentes substâncias.
Constantemente, as micoxtoxinas são temas de pesquisas relacionadas à fisiologia, produção
de toxinas e desenvolvimento dos fungos produtores de micotoxinas. Nessa área, muito ampla e
complexa, sabe-se que os fungos toxigênicos crescem e se proliferam bem em cereais e grãos,
principalmente no amendoim, milho, trigo, cevada, sorgo e arroz, onde geralmente encontram um
substrato altamente nutritivo para o seu desenvolvimento. Os cereais e grãos, por sua vez, perdem
importantes parcelas das suas qualidades nutritivas, além de estarem contaminados com micotoxinas
que podem permanecer por longos períodos nos substratos, mesmo na ausência de fungos produtores.
O crescimento fúngico e a produção de micotoxinas em cereais podem ocorrer nas diversas
fases do desenvolvimento, maturação, colheita, transporte, processamento ou armazenamento dos
grãos. A dificuldade de colheita dos cereais no estágio correto de umidade e maturação pode ser mais
um ponto crítico no que tange à formação de micotoxinas. É natural que cereais colhidos com alta
umidade favoreçam o desenvolvimento fúngico antes da secagem, ou até no armazém, principalmente
quando não forem submetidos ao processo de secagem. Por outro lado, cereais na lavoura, após a
maturação fisiológica dos grãos, ficam sujeitos à alta umidade e ao ataque de pragas que propiciam
condições favoráveis ao desenvolvimento fúngico. O transporte de cereais com alta umidade por
longas distâncias ou por períodos prolongados favorece o desenvolvimento de fungos pela formação
de um microclima adequado para tal. Por isso, a redução da umidade dos cereais através da secagem é
de fundamental importância. A secagem por sua vez, quando mal executada pode, de várias maneiras,
contribuir para a proliferação fúngica nos grãos. No Brasil, devido as longas filas e o longo tempo de
espera dos caminhões transportadores de cereais na porta das unidades de secagem, frequentemente
são estabelecidos procedimentos para aceleração, com aumento da temperatura, que provoca danos
mecânicos e térmicos aos grãos, e a consequente diminuição de sua resistência intrínseca e extrínseca.
Além disso, uma série de deficiências no armazenamento como: cereais armazenados com alta
umidade; deficiência de ventilação e incidência de pragas, por exemplo, são fatores que
frequentemente beneficiam o desenvolvimento fúngico e a formação de micotoxinas. A compreensão
de uma série de fatores que podem levar à formação destes metabólitos tóxicos é de fundamental
importância para a intervenção no processo, visando diminuir a produção das micotoxinas.
A diversidade dos efeitos tóxicos devem-se às diferentes estruturas químicas das micotoxinas,
influenciados pelo fato de serem ingeridas por diferentes espécies animais, raça, sexo, idade, fatores
ambientais, condições nutricionais e presença de outras substâncias químicas (Tabela 1).
Tabela 1 - Principais micotoxinas, espécies mais afetadas e principais sinais clínicos e lesões.
Micotoxina
Espécies mais
afetadas
Aflatoxinas
Todas
Zearalenona
Suínos
Fumonisinas
Equinos e suínos
Tricotecenos
Monogástricos
Ocratoxina A
Suínos e homem
Principais sinais clínicos e lesões
Diminuição da imunidade, ganho de peso, desordens digestivas,
hepatopatias, anorexia, ataxia, tremores e morte.
Síndrome de hiperestrogenismo (vulvovaginite), splayleg em leitões
recém nascidos.
Leucoencefalomalácia equina. Edema pulmonar suíno.
Redução da ingestão de alimentos, desordens digestivas, ulcerações de
mucosas, vômitos e hemorragias viscerais.
Nefropatias.
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Apesar de uma série de variações, pode-se fazer uma estimativa da susceptibilidade às
micotoxicoses. Para tanto é necessário que seja quantificado o nível de contaminação do alimento,
associado ao tipo e à gravidade de doenças relacionadas ao consumo do mesmo. Desta forma, pode-se
dividir as micotoxicoses em agudas e crônicas. As manifestações agudas ocorrem quando os
indivíduos consomem doses moderadas a altas de micotoxinas. Podem aparecer sinais clínicos e um
quadro patológico específico, dependendo da micotoxina ingerida, da susceptibilidade da espécie, das
condições individuais do organismo e interação ou não com outros fatores. As lesões são dependentes
de cada micotoxina, porém as mais encontradas dizem respeito à hepatopatias, hemorragias, nefrites,
necrose das mucosas digestivas, alterações morfológicas em órgãos e morte. A micotoxicose crônica
ocorre quando existe um consumo de doses moderadas a baixas. Nestes casos, geralmente não
ocorrem as manifestações agudas de intoxicação, porém, é apresentado um quadro caracterizado pela
redução da eficiência reprodutiva, da conversão alimentar, da taxa de crescimento e do ganho de peso.
Este quadro somente é detectado com cuidados especiais ou através de um programa de
monitoramento de micotoxinas contidas na alimentação. Os sinais clínicos ainda podem ser
confundidos com outras doenças decorrentes da micotoxicose ou com deficiências nutricionais.
Existem ainda os efeitos causados principalmente pelas micotoxicoses crônicas, capazes de levar à
imunossupressão, deixando o indivíduo predisposto a outras doenças cujos patógenos facilmente se
estabelecem com a queda da resistência orgânica. Por outro lado, a inadequada resposta imunológica
às vacinações muitas vezes é decorrente da ingestão de micotoxinas.
2. PANORAMA DA OCORRÊNCIA DAS MICOTOXINAS NOS ÚLTIMOS ANOS
Para avaliar-se o real risco que as micotoxinas trazem para saúde humana e animal é
necessário que se observe duas características importantes: a positividade ou prevalência e a média de
contaminação das micotoxinas nos alimentos. A partir dessas duas variáveis, pode-se calcular o Risco
Micotoxinas (RM), índex utilizado no sistema de gerenciamento de micotoxinas que será apresentado
no próximo tópico.
Os resultados das avaliações laboratoriais realizadas nos últimos 10 anos pelo Laboratório de
Análises Micotoxicológicas (LAMIC) e Instituto de Soluções Analíticas, Microbiológicas e
Tecnológicas (SAMITEC), para as quatro principais micotoxinas de ocorrência no Brasil (aflatoxinas,
fumonisinas, zearalenona e deoxinivalenol), em amostras dos principais cereais e seus subprodutos
utilizados na nutrição animal (milho, trigo, arroz, sorgo, farelo de soja, farelo de trigo, farelo de arroz,
silagem e ração), disponíveis na Tabela 2, demonstram que:
As Aflatoxinas:
- Estiveram presentes em 41% das amostras, em especial de milho (47%) e ração (42%) com
alto RM;
- Amostras de farelo de soja, mesmo tendo uma positividade de 20%, tiveram um baixo RM,
pois sua contaminação média foi baixa;
- Amostras de silagem e sorgo, com positividade de 16 e 15% respectivamente, apresentaram
um moderado RM, e
- Demais amostras apresentaram baixo RM.
As Fumonisinas:
- Estiveram presentes em 73% das amostras, em especial de milho (81%) e ração (83%) com
alto Risco Micotoxinas.
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- Amostras de silagem, com positividade de 57%, apresentaram um moderado Risco
Micotoxinas.
- Demais amostras apresentaram baixo Risco Micotoxinas.
A Zearalenona:
- Estive presentes em 51% das amostras, em especial de farelo de arroz (71%), farelo de trigo
(63%) e silagem (59%), com alto RM;
- Amostras de ração, milho e trigo tiveram 57, 50 e 43% de positividade, respectivamente,
com moderado RM;
- Amostras de sorgo, com positividade de 34%, apresentaram um alto RM, e
- Demais amostras apresentaram baixo RM.
O Deoxinivalenol:
- Estive presentes em 39% das amostras, em especial de farelo de trigo (82%) e trigo (66%),
com alto RM;
- Amostras de ração e silagem tiveram 32 e 29% de positividade, respectivamente, com
moderado RM, e
- Demais amostras apresentaram baixo Risco Micotoxinas.
Outras micotoxinas, como ocratoxina A não apresentaram RM significativo, porém algumas
como toxina T-2, em associação com demais tricotecenos (toxina HT-2, diacetoxyscirpenol,
deoxinivalenol, 3-acetil-deoxinivalenol, 15-acetil-deoxinivalenol, fusarenon-X e nivalenol), causam a
Síndrome Multitricotecenos, que tem sido frequentemente associada com surtos de necrose de ponta
de língua, lesões orais cáusticas e ulcerativas de frangos, principalmente matrizes e poedeiras.
A contaminação por uma ou mais micotoxinas dependem de vários fatores, dentre eles o clima
tem forte influência. Em anos chuvosos, onde a colheita dos grãos é dificultada pelo excesso de
umidade, há maiores tendências de altas contaminações. A utilização do plantio direto proporciona o
aumento do inóculo fúngico, que concentra-se no solo e na palhada, protegido da radiação solar. A
monocultura também influencia a ocorrência de micotoxinas, pois não havendo rotação de culturas
não há quebra no ciclo de vida dos fungos, aumentando, assim, a pressão contaminante e consequente
aumento da produção de micotoxinas. A escolha de cultivares mais resistentes à contaminação por
micotoxinas é uma alternativa de alta viabilidade econômica e em breve será bonificada pela indústria
do setor de produção animal. A utilização de fungicidas é tema frequente de pesquisas, especialmente
com trigo, e reduz a contaminação por zearalenona e deoxinivalenol. Controle de pragas, na lavoura e
na armazenagem, é imprescindível para manter a sanidade dos grãos. Condições de armazenamento,
com grãos estocados com atividade de água (Aw) menor que 0,69, controle da temperatura e aeração
eficientes, garantem que não haja crescimento fúngico e produção de micotoxinas durante o período
de estocagem dos grãos.
Nos últimos 16 anos, pode-se observar uma leve diminuição no Risco Micotoxinas médio para
aflatoxinas, que são micotoxinas produzidas por fungos de armazenamento. Essa diminuição
provavelmente está associada à melhoria da armazenagem dos grãos no Brasil. De forma contrária,
pode-se perceber um leve aumento no Risco Micotoxinas médio das fumonisinas, zearalenona e
deoxinivalenol. Essas micotoxinas são produzidas por fungos de campo, que necessitam maior
umidade e presença de inócuo fúngico. A elevação do risco dessas micotoxinas tem sido associado
com a intensificação da produção de grãos, com a utilização do plantio direto, em muitos casos com
monocultura (Figura 1). A oscilação constante do Risco Micotoxinas médio, para cada micotoxina,
explica-se pelas diferentes situações climáticas de uma safra para outra. Nos últimos três anos, não
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houveram grandes problemas com micotoxinas, pois em geral no Brasil teve-se condições favoráveis
de clima para produção dos principais cereais utilizados na cadeia produtiva animal.
Figura 1 - Dados médios do Risco Micotoxinas (RM) para aflatoxinas totais (B1+B2+G1+G2),
fumonisinas (B1+B2), zearalenona e deoxinivalenol de amostras de milho, trigo, arroz,
sorgo, farelo de soja, farelo de trigo, farelo de arroz, silagem e ração analisadas pelo
LAMIC e Instituto SAMITEC nos últimos 16 anos. Linhas contínuas representam a
média e linhas pontilhadas representam a linha de tendência (potência).
Risco Micotoxinas médio (RM = média de contaminação em ppb * positividade em % * fator de amostragem).
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Tabela 2 - Contaminação média, contaminação média das amostras positivas, positividade e Risco Micotoxinas médio de amostras de cereais e seus
subprodutos, silagem e ração utilizados na nutrição animal, analisadas no LAMIC e Instituto SAMITEC nos últimos 10 anos.
Micotoxina
AFLA1
FUMO2
ZEA3
DON4
Média (ppb)
Média positivas (ppb)
Positividade (%)
RM4
Média (ppb)
Média positivas (ppb)
Positividade (%)
RM5
Média (ppb)
Média positivas (ppb)
Positividade (%)
RM6
Média (ppb)
Média positivas (ppb)
Positividade (%)
RM6
Milho
Trigo
Arroz
9,0
19,0
47
425
1.990
2.454
81
161
91
180
50
46
78
367
21
17
0,1
3,1
3
0
69
1.068
6
0
128
453
28
36
577
872
66
382
0,4
3,5
11
4
127
722
18
2
43
100
43
19
17
393
4
1
Sorgo
1,5
10,2
15
22
183
667
27
5
289
858
34
97
80
508
16
13
Farelo de
soja
0,3
1,4
20
6
144
1.223
12
2
9
50
19
2
30
436
7
2
Farelo de
trigo
0,3
4,1
8
3
207
1.152
18
4
146
230
63
92
736
896
82
605
Farelo de
arroz
0,5
4,3
11
5
76
569
13
1
187
265
71
132
68
560
12
8
Silagem
Ração
Média
1,6
10,3
16
25
753
1.334
57
43
127
215
59
75
127
446
29
36
8,6
20,5
42
361
1.466
1.765
83
122
77
133
57
44
114
356
32
37
7,7
18,9
41
312
1.590
2.173
73
116
93
182
51
48
250
647
39
97
1
AFLA: Aflatoxinas totais (B1+B2+G1+G2). 2FUMO: Fumonisinas (B1+B2). 3ZEA: Zearalenona. 4DON: Deoxinivalenol (vomitoxina). 4RM: Risco Micotoxinas médio (RM = média de contaminação em ppb *
positividade em % * fator de amostragem). 5RM/1000. 6RM/100.
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3. CONTROLE E GERENCIAMENTO DAS MICOTOXINAS
A nutrição, para a maioria das espécies, atingiu, nos últimos anos, níveis de cuidados que são
traduzidos nos excelentes resultados produtivos apresentados principalmente na avicultura e
suinocultura. Nutrição adequada, manejo apropriado, sanidade controlada e genética apurada fizeram
com que surgissem outros fatores com impacto na atividade outrora não observados. As micotoxinas
fazem parte destes novos desafios, sendo, portanto, fatores que recebem cada vez mais atenção, por
razões econômicas e de saúde pública.
A presença de micotoxinas em matérias-primas não é homogênea, estando na maioria das
vezes em menos de 0,001% dos grãos. Concentração de partes por bilhão (ppb) em uma matriz como o
milho representam o equivalente ao peso de 1 grão em uma massa total de aproximadamente 350
toneladas. Essas constatações, por si só, caracterizam um problema praticamente insolúvel no
diagnóstico preciso de micotoxinas. Portanto, os procedimentos usuais empregados no recebimento de
cereais e na indústria de processamento de rações levam uma determinação de micotoxinas com um
grau de incerteza significativo.
Como as decisões sobre o destino e medidas de controle das micotoxinas basear-se-ão em
resultados de análises, a amostragem representa o passo mais crítico do processo e deve ser tratada
com um grau de cuidado maior do que utilizado para, por exemplo, amostras destinadas a avaliações
de umidade. A seguir são descritos alguns pontos da colheita e recebimento dos grãos até o processo
de produção de alimentos em que a amostragem poderá ser efetuada.
3.1. Pontos de amostragem:
A coleta das amostras poderá ser realizada preferencialmente nos pontos seguintes:
1) Na colheita: a amostragem neste momento apresenta como vantagem a obtenção de uma
informação antecipada e que permite decisões quanto ao destino dos cereais. A necessidade de
metodologias analíticas de detecção ultrarrápidas inviabilizam sua utilização, com exceção dos
produtos com alto valor agregado, os quais na maioria das vezes não são as matérias-primas
utilizadas na alimentação animal.
2) Unidades de recebimento de grãos: o uso de caladores como o trado manual, em primeira instância,
é a forma mais utilizada para a amostragem na maioria das pequenas unidades. É fundamental que
se colete no mínimo 8 pontos para caminhões truck e 10 pontos para carretas, distribuídos
uniformemente na carga, totalizando um volume de amostra por lote em kg =
, que deve ser seguida em todos os processos descritos neste resumo. O
uso de caladores pneumáticos deve seguir as mesmas disposições. Ambos apresentam certas
limitações pela dificuldade de obter a massa recomendada pela fórmula, mas são os sistemas mais
utilizados. Todos esses aspectos relacionados à coleta das amostras, sempre devem ser levados em
consideração na interpretação dos resultados.
3) Plataformas de descarga: a coleta das amostras durante a descarga da matéria-prima tem como
vantagens a rapidez e principalmente uma melhor uniformidade, visto que a coleta ocorre
enquanto o material está em movimento. Como vários lotes do cereal são descarregados na mesma
moega, fica bastante difícil segregar adequadamente para a matéria-prima, caso haja alguma
contaminação. Normalmente, em períodos de safra, o grande número de cargas torna o processo
oneroso. No entanto, com uma sequência de amostras é possível obter-se a contaminação média do
material que comporá o silo.
4) Amostragem em unidades armazenadoras de grãos: pode-se realizar uma amostragem dos silos
com a utilização de sonda pneumática, através da qual são coletadas amostras de todo perfil do silo.
Atualmente pesquisas estão sendo desenvolvidas nesta área, pois amostragem nesse ponto fornece
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5)
6)
7)
8)
informações antecipadas, possibilitando melhor destinação da matéria-prima e ajuste da sua matriz
nutricional.
Transporte interno: a movimentação das matérias-primas dentro dos sistemas de processamento
(caracóis, redler e cintas transportadoras) promovem uma homogeneização do material, permitindo
a colheita de amostras que levam a uma avaliação mais precisa das micotoxinas. Amostrar os grãos
inteiros muitas vezes é mais fácil, porém a representatividade da amostra é incrementada quando os
grãos forem previamente moídos, pois a moagem faz com que um grão se fragmente em várias
partículas, que acabam se dispersando e tornando a matéria-prima mais homogênea. Caso não seja
possível a moagem prévia, recomenda-se que esta seja realizada na amostra global coletada, antes
da sua redução para um volume menor que será destinado ao laboratório de análise. O sistema mais
prático utilizado é conhecido popularmente como “furo na rosca”, o qual consiste em um orifício
localizado em um ângulo de 45° no caracol. Esse sistema permite que pequenas porções de
matéria-prima sejam colhidas durante o fluxo do material. Recomenda-se fazer o “furo na rosca” na
etapa de transporte, onde a mistura está mais homogênea, ou antes que ocorra etapas de
segregação. Com a coleta da amostra nesse processo dinâmico e respeitando-se a fórmula
anteriormente citada com a posterior moagem da amostra, (no caso de grãos inteiros) obtemos
amostras com uma maior representatividade.
Amostragem de rações: essa amostragem nos permite avaliar a real contaminação da ração
destinada ao consumo, pois os processos de mistura conferem uma boa dispersão das partículas
contaminadas, o que resulta em amostras com melhor representatividade. Assim, essa amostra é a
que se aproxima mais da realidade para avaliação do Risco Micotoxinas. A sua utilização implica
em dois fatores que devem ser criticamente avaliados. Somente os métodos analíticos que
empregam a cromatografia líquida (HPLC) tem precisão suficiente para subsidiar uma tomada de
decisões em um monitoramento de rações. Por outro lado, o resultado, na maioria das vezes,
somente será obtido quando os animais já estiverem consumindo a dieta.
Amostragem no ponto de consumo: para fins de monitoramento a colheita de amostras raramente é
utilizada nesse ponto. A produção de uma fábrica de rações é distribuída em inúmeras propriedades
resultando na inviabilidade de monitorar uma empresa desta forma. Recomenda-se o seu uso,
apenas em casos com suspeitas de conservação inadequada ou longos períodos de estocagem.
Amostragem com suspeita clínica: esse tipo de amostragem somente é realizada em casos de sinais
clínicos compatíveis com alguma micotoxina, como diagnóstico complementar ou na análise
forense. Essa última deverá ter alguns cuidados como: seguir um procedimento de amostragem,
estarem presentes as partes envolvidas com testemunhas, armazenar e enviar dentro das condições
ideais de conservação e utilizar um método de análise confiável como HPLC. A
amostragem/análise nesse ponto na maioria das vezes tona-se desnecessária, pois está diretamente
relacionada ao monitoramento frequente das matérias-primas.
3.2. Frequência de análises
Para a monitoria de micotoxinas a definição da frequência de análise tem o mesmo grau de
importância que a amostragem descrita anteriormente. É necessário que se efetuem análises
periódicas, considerando-se o volume de ração produzida, a heterogeneidade do material a ser
amostrado, a sensibilidade da espécie, a faixa etária e a frequência em que os lotes de ração são
produzidos. O RM pressupõe a construção de um histórico capaz de mostrar as tendências e pontos
críticos. Portanto deve ser estabelecido uma frequência de pelo menos uma amostra diária. As
amostras semanais (mínimo de cinco) serão utilizadas para estabelecer as médias de contaminação e
os percentuais de positividade que serão empregadas no cálculo do RM.
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3.3. Métodos de diagnóstico
As metodologias empregadas no monitoramento de micotoxinas são basicamente os kits
ELISA (Enzyme Linked Immuno Sorbent Assay) e o HPLC (High Performance Liquid
Chromatography). A cromatografia de camada delgada, muito utilizada no passado, hoje esta
praticamente abandonada para o monitoramento de rotina. Já aos Kits ELISA, tem como principal
vantagem a possibilidade de realização da análise in situ, o baixo custo operacional e a facilidade de
uso. No entanto, apenas resultados semi-quantitativos e restritos a matrizes simples como o milho são
possíveis, limitando a segurança na tomada de decisões críticas. Já os métodos cromatográficos, como
modernamente a cromatografia líquida acoplada a espectrometria de massas sequencial (LC-MS/MS),
fornecem um resultado seguro para a tomada de uma decisão. Evidentemente que para esse fim a
metodologia deve ser acreditada pelas normativas internacionais da ISO 17.025.
3.4. Aplicação das informações
A obtenção dos resultados seguindo-se os passos de amostragem e análise permitem a
formação de uma curva denominada “Risco Micotoxinas” (RM). O RM é um index para cada
micotoxina, gerado pela multiplicação da intensidade da contaminação (média das amostras semanais
em ppb), positividade (percentual de positividade da semana) e do fator de amostragem (que é
avaliado in loco e varia conforme o plano de amostragem adotado), seguindo a fórmula: RM = média
* % positivas * fator de amostragem. Esse index determina o nível de pressão micotoxicológica ao
qual todo o rebanho da empresa é submetido. O acompanhamento por um período não menor que 6
meses permite a observação das inflexões no RM que se alteram conforme a positividade e
contaminação média. Essas informações são utilizadas, por exemplo, para dar destino adequado ao
produto final, uso de aditivos antimicotoxinas (AAM), recall de produtos, descarte do fator
micotoxinas no diagnóstico dos problemas de desempenho, entre outros.
Na Figura 2 pode-se observar o exemplo de uma empresa que utiliza o Risco Micotoxinas
(aflatoxinas, fumonisinas e zearalenona) como parâmetro para tomada de decisão em utilizar ou não
um Aditivo Antimicotoxinas (AAM) comprovadamente eficiente (avaliação in vivo seguindo-se as
recomendações do Grupo de Trabalho do MAPA) para cada micotoxina na espécie animal específica
de criação. A decisão do limite do Risco Micotoxinas aceitável para utilizar ou não um ingrediente ou
um AAM varia conforme a realidade de cada empresa, com a espécie animal, fase de criação,
nutrição, genética, sanidade, manejo, etc.
Figura 2 - Risco Micotoxinas semanal de uma empresa, nos anos 2013 e 2014, para aflatoxinas
(B1+B2+G1+G2), fumonisinas (B1+B2) e zearalenona em amostras de milho. Dados
fornecidos pelo Instituto SAMITEC.
VI Congresso Latino-Americano de Nutrição Animal - SALA QUALIDADE DE ALIMENTO
23 a 26 de Setembro de 2014 – Estância de São Pedro, SP - Brasil
Realização: Colégio Brasileiro de Nutrição Animal – CBNA
4. CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES
A presença de micotoxinas nas dietas fornecidas aos animais pode determinar perdas
consideráveis no sistema de produção. O controle depende da implantação de políticas adequadas no
âmbito do manejo agrícola, dos sistemas de produção e armazenagem, raízes do problema. Pesquisas
nessas áreas estão em curso e resultarão em melhores resultados produtivos e econômicos na produção
animal, bem como, para a melhoria da sanidade dos alimentos destinados à alimentação humana.
A considerável presença das micotoxinas nos principais componentes da dieta, como as
aflatoxinas, fumonisinas, zearalenona e deoxinivalenol, que em média cada uma contamina
aproximadamente 50% dos grãos e subprodutos utilizados na nutrição animal, determina que se adote
um programa contínuo de monitoramentos das matérias-primas e rações destinadas ao consumo
animal. O monitoramento possibilita o gerenciamento do Risco Micotoxinas, que estabelece os
critérios técnicos para a tomada de decisões. A utilização de Aditivos Antimicotoxinas, em dietas
contaminadas é de importância estratégica, pois uma vez formada a toxina, processos de
descontaminação se tornam onerosos e inviáveis.
5. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
MALLMANN, C. A; DILKIN, P. Micotoxinas e Micotoxicoses em Suínos. Santa Maria: Sociedade
Vicente Pallotti, 2007. 238 p.
Demais trabalhos disponíveis em http://www.lamic.ufsm.br na seção artigos.
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PANORAMA DAS MICOTOXINAS Carlos Augusto - lamic