CENTRO UNIVERSITÁRIO FIEO
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO
EM PSICOLOGIA EDUCACIONAL
CAMINHOS E DESCAMINHOS DO
ADOLESCENTE DESVIANTE NO CONTEXTO
DAS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
Dissertação de Mestrado
CARLOS ANTONIO CENTOLANZA
OSASCO – SP
2008
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CARLOS ANTONIO CENTOLANZA
CAMINHOS E DESCAMINHOS DO
ADOLESCENTE DESVIANTE NO CONTEXTO
DAS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
Dissertação apresentada à Banca examinadora
da UNIFIEO – Centro Universitário FIEO,
para obtenção do título de Mestre em
Psicologia Educacional, tendo como área de
concentração Ensino e Aprendizagem, inserido
na linha de pesquisa Ensino e Aprendizagem
no Contexto Social e Político, sob a orientação
do Prof. Dr. João Clemente de Souza Neto.
CENTRO UNIVERSITÁRIO FIEO
OSASCO – SP
2008
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Catalogação da Publicação
Biblioteca do Centro Universitário FIEO
Autor: Carlos Antonio Centolanza
Título: Caminhos e Descaminhos
do Adolescente Desviante no Contexto
das Medidas Sócio-Educativas
143 páginas
Dissertação de Mestrado em Psicologia Educacional
Centro Universitário FIEO
Osasco – 2008
1. Psicologia – 2. Educação – 3 Sociologia. – 4. Psicopedagogia
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Título: Caminhos e Descaminhos do
Adolescente Desviante no Contexto das
Medidas Sócio-Educativas
Autor: Carlos Antonio Centolanza
Aprovado em: 08 de Abril de 2008
Nota: 10 (dez)
Banca examinadora:
Orientador: Professor Doutor João Clemente de Souza Neto
Professora Doutora: Márcia Siqueira de Andrade
Professor Doutor Geraldo Caliman
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Ao menor abandonado
Aos homens de boa vontade, que trabalham pelo menor.
Criança, que hoje chora nos braços do abandono,
Que não tem o calor do amor,
o teto de um lar regular,
mas o prenúncio da vida perdida,
sei que o seu caminho, sozinho,
continuará até o fim assim
e que nessa viagem sem belas paisagens,
por estradas frias, sombrias,
o desatino será certamente o seu destino.
Criança, que hoje chora nos braços do abandono,
sem ter dono, sem ter sono,
tranqüilo do infante, mas vive constante
sem ter abrigo, sem ter amigo,
completamente perdida na solidão,
sem que o olhar do seu irmão,
que passa indiferente, contente,
detenha-se sobre sua triste sorte
e procure ajudá-la a crescer, viver,
ressuscitá-la dessa vida, que é morte.
Criança, que hoje chora nos braços do abandono,
que não tem o regaço da mãe para o seu cansaço,
que não tem a presença do pai para secar seu lacrimejar,
e mesmo auxílio de alguém caridoso, despretensioso
para sentir a grande necessidade e de ter caridade
de olhar para o abandono da criança,
que não pode ser vista como esperança,
quando sua vida presente desmente
que possa ter um alegre amanhã.
Chore, criança abandonada, desesperada,
que, talvez, o seu grito de orfandade
desperte a nossa sociedade, pois já é tempo
de sensibilizar o coração do seu irmão,
fazê-lo sentir que foi justamente por não ouvir
o seu choro, que hoje os homens , em coro,
lamentam seus crimes , a sua agressividade,
e se julgam também culpados, por terem gerado,
com tanta indiferença , a sua nefasta presença,
de homem revoltado, delinqüente, afeito à maldade,
como fruto de nossa própria comunidade.
Paulo Lúcio Nogueira,
Marília, junho de 1977.
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DEDICATÓRIA
É por acreditar em uma força maior e universal, dedico esta obra ao espírito de
solidariedade e de amor ao próximo existente nos Homens de boa vontade representados aqui,
pelo Doutor João Clemente de Souza Neto orientador e amigo e pelo Senhor João Palma,
Secretário de Cultura, Comunicação, Lazer e Criança da Prefeitura Municipal de Barueri,
homens que cultivam em si o sentimento de esperança de um futuro menos injusto.
Aos meus pais, Francesco e Carmela. Aos meus irmãos, Michelli, Angelo, Rosa,
Maria, Giuseppe e Isabella, cada qual com sua colaboração na minha formação.
Ao meu filho Giovanni Palma Centolanza, ser especial com o qual fui presenteado.
À Maria Luisa Palma, amada companheira, por existir e por contribuir brilhantemente
com os seus valiosos conhecimentos para a execução e conclusão desta obra.
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AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador, que caminhou sempre ao meu lado,
Professor Doutor João
Clemente de Souza Neto, pelo incentivo, pela compreensão, pela confiança e perseverança no
transpor de todas as barreiras encontradas no caminho. Ao Centro Universitário FIEO por
meio de todo o corpo docente do Curso de Mestrado em Psicologia Educacional, pelos
conhecimentos adquiridos durante minha passagem. Aos Professores(as)
Doutores que
participaram da banca de defesa: Professora Doutora Márcia Siqueira de Andrade, Professor
Doutor Geraldo Caliman e Professora Doutora Maria Elisa Pires de Mattos Ferreira. A todos
os companheiros de luta que contribuíram com suas sugestões e pelo material adquirido
durante as brilhantes discussões em sala de aula.
Aos adolescentes, que cumprem medida Sócio-Educativa de Prestação de Serviços à
Comunidade, e, ao então Prefeito do Município de Barueri no ano de 2002.
Ao Senhor Gilberto Macedo Arantes pela oportunidade oferecida.
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SUMÁRIO
LISTA DE ILUSTRAÇÕES ...................................................................................................10
SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS NO TEXTO
RESUMO
........................................11
...........................................................................................................................12
ABSTRACT ...........................................................................................................................13
INTRODUÇÃO
...............................................................................................................14
1 – CONSTRUÇÃO DOS ASPECTOS HISTÓRICOS E TEÓRICOS DO ATENDIMENTO
SÓCIO-EDUCATIVO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NO BRASIL
1.1. – O Adolescer
.................21
...............................................................................................................29
1.2. – Vulnerabilidade e Adolescência
............................................................................31
1.3. – Desejos, Paixões, Frustrações e Agressividade
1.3.1. – O Furto
....................................................35
...................................................................................................35
1.3.1.1. – O furto como fenômeno de transição
........................................35
1.3.2. – Agressividade Benigna
............................................................................43
1.3.2.1. – Agressividade Maligna
............................................................................43
1.4. – A Pichação, ato anti-social ou desviante
................................................................44
1.5. – A Aprendizagem Humana no Caminho do Transfazer
.........................................46
1.6. – Agressividade ou Pedido de Socorro ............................................................................48
1.7. – O Sujeito, Autor de sua Própria História
................................................................51
2 – CENÁRIOS E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA ....................................................55
2.1. – Os Princípios e as Bases da Pesquisa
2.2. – O Cenário da Pesquisa
.................................................................57
........................................................................................59
2.3. – O Perfil do Adolescente de Barueri
............................................................................62
2.4. – Situando o Adolescente em Conflito com a Lei
....................................................63
2.5. – As Medidas Sócio-Educativas em Regime Aberto
....................................................65
2.6. – O Programa Sócio-Educativo ........................................................................................66
2.6.1. – A Sondagem ....................................................................................................66
2.6.2. – Questões Diretivas ........................................................................................67
2.6.3. – A Entrevista não Diretiva
............................................................................68
3 – O TRANSVIVER NO ESPAÇO SÓCIO-EDUCATIVO
3.1. – Aprender a Aprender a Transviver .................................................................................69
3.2. – Os Pilares da Educação presentes no Atendimento Sócio-educativo.............................72
3.2.1. – Aprender a Aprender na Ausência dos Referenciais Familiares .....................73
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3.2.2. – Aprender a Aprender a Conviver com seus Fantasmas ..................................78
3.2.3. – Aprender a Aprender a se Transformar............................................................82
3.2.4. – Aprender a Aprender a Conviver com o sentimento Simbólico de
abandono
...............................................................................................................88
3.3. – As Práticas Sócio-Educativas, Estratégias que Possibilitam a Passagem de Sujeito Ator
para Sujeito Autor.
................................................................................................................93
4 – TENTATIVA DE CONCLUSÃO
4.1. – Aprender implica em entender que ainda há muito a se aprender .............................99
7 – REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS CONSULTADAS
.......................................106
ANEXO l
............................................................................................................. 114
ANEXO 2
..............................................................................................................124
ANEXO 3
..............................................................................................................133
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LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Gráfico nº 01 – Evolução das internações no sistema Sócio-Educativo no Brasil, Pg. 08.
Gráfico nº 02 – Evolução das internações no sistema Sócio-Educativo no Brasil por região,
pg. 08.
Gráfico nº 03 – Quantidade de adolescentes infratores da zona Oeste de São Paulo, pg. 47.
Gráfico nº 04 – A evolução anual e as medidas sócio-educativas, pg. 48
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SIGLAS E ABREVIATURAS UTILIZADAS NO TEXTO
CMDCA – Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente
CONANDA – Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente
ECA – Estatuto da Criança e do Adolescente
EMEF – Escola Municipal de Ensino Fundamental
EMEI – Escola Municipal de Ensino Infantil
EMEIEF– Escola Municipal de Educação Infantil e Ensino Fundamental
FEBEM – Fundação Estadual para o Bem Estar do Menor
FIEB – Fundação Instituto de Educação de Barueri
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ITB – Instituto Tecnológico de Barueri
ONU – Organização das Nações Unidas
PNCFC – Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária
SAMEB – Serviço de Atendimento Médico de Barueri
SEADE – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
SINASE – Sistema Nacional de Atendimento Sócio-Educativo
UBS – Unidades Básicas de Saúde
UNESCO – Organização das Nações Unidas para a Educação
UNICEF – Fundo das Nações Unidas para a Infância
V.I.J.B. – Vara da Infância e Juventude de Barueri
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RESUMO
O presente trabalho, teve como objetivo compreender o fenômeno do adolescente em
conflito com a Lei dentro de uma prática Sócio-Educativa realizada junto ao programa de
atendimento Sócio-educativo, implantado na cidade de Barueri no período de 1997 a 2002.
Buscou identificar e entender, sob uma nova ótica, alguns dos possíveis fatores que poderiam
ter induzido os adolescentes em questão a entrar em conflito com a Lei. Observamos que, a
prática anti-social, no caso dos adolescentes, pode estar funcionando como um de pedido de
socorro. Acreditamos que a intervenção Sócio-Educativa atuou de forma a restabelecer e a
potencializar os adolescentes, auxiliando-os a encontrarem ferramentas que os ajudassem a
modificar as suas perspectivas de vida.
Partimos do pressuposto de que as práticas anti-sociais podem ser demonstrações do
déficit nas necessidades básicas cognitivas, afetivas, sociais, econômicas, entre outras, e, o
efeito que exercem no processo de construção do sujeito. Assim sendo, foi proposto e
colocado em prática um programa Sócio-educativo que procurou oferecer uma oportunidade
para que, esses déficits fossem compensados.
Nossa abordagem metodológica seguiu o modelo de pesquisa intervenção com
abordagem qualitativa, por permitir uma flexibilidade de análise dos dados, além de deixar
uma abertura a outras perspectivas, o que possibilita uma permanente reformulação de
modelos de apropriação empírica, tomando como base as idéias de teóricos que mais bem
explicam o fenômeno observado.
Os resultados a que chegamos nos permitem inferir que, os adolescentes participantes
do programa, encontraram uma maneira de re-significar a sua história de vida e aprenderam a
transviver, possibilitando a passagem de sujeitos atores para sujeitos autores.
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ABSTRACT
Such paperhad the aim at understandind the adolescent in conflict with the Law
fenomenon within a social and educacional practice made with the social and educacional
atendance. Inserted inde city of Barueri from 1997 to 2002. It was tried to identify and
understand, under a new view, some of the possible factors that could have led the adolescents
in reference tobe in conflict wit the Law. It was observed that the anti-social practice in the
case of the adolescents may be a means of help request. We belive de social-educacional
intervention has worked properly in a way of restablishingand potebncializing the
adolescents, making them find tools which help the change their perspective of life.
We have started from the standingpoint that the anti-social practices may be deficit
demonstration in the basic cognitive, afective, social, economic needs, among others, and the
efect that these needs reflect in the process of construction of the subject. Thus, it was
suggested and put into practice a social-educacional program which looked forward to
affering an opportunity for thesse deficits to be overcome.
Our methodological approach ha sfollowed a intervention pesquise with a qualitative
approuch , for allowing a data anaysis flexibility, it also shows an opening to other
perspectives that make a permanent reformulation of models af empirical appropriation
possible, having as a basis the theorie makers’ ideas who explain pretty well such observed
fenomenon.
The resuls we have reachad allow us to infere that that the tennagers, participants of
the program could think over their story of life and the learn to live meaningfully, becoming
from subject actors to subject authers.
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INTRODUÇÃO
________________________________________________________________
Este trabalho nasceu da necessidade de conhecer e de tentar entender, melhor, alguns
dos aspectos peculiares que envolvem a formação do sujeito adolescente em conflito com a
Lei. Esse é um problema que atinge todas as sociedades contemporâneas, e merece a atenção
de documentos produzidos pelas agências da ONU tais como UNICEF, UNESCO e os meios
de comunicação. É possível observar diariamente muitos casos de práticas agressivas e
violentas envolvendo adolescentes: individualmente ou por meio das gangues. As pesquisas e
noticiários demonstram a capacidade mobilizadora deles. As gangues tornaram-se espaços
alternativos que fortalecem e protegem esse adolescente que procura encontrar um lugar onde
ele possa construir uma identidade. Em todas as partes do mundo, percebe-se grande aumento
do número de gangues de todos os traços, tais como: pichadores; Skinheads, jovens que tem
o hábito de agredirem moralmente e fisicamente, às vezes até a morte, pessoas, cuja etnia ou
costumes não seja aceita pelo grupo. Acrescentam-se outras práticas violentas, como foi
recentemente noticiada nos EUA, onde adolescentes portando arma de fogo entram nas
escolas atirando em alunos e funcionários e depois se suicidam. Durkheim acena para a
questão indicando que nenhuma sociedade está isenta, “O crime não se observa apenas na
maior parte das sociedades desta ou daquela espécie, mas em todas as sociedades de todos os
tipos. Não há nenhuma onde não exista uma” (Durkheim, 1985:53).
Essa é uma realidade triste indicativa
do grau de degradação social pelo qual
passamos. No entanto, o mais preocupante é, o aumento dia-a-dia dos adolescentes vítimas da
violência, do abandono e dos maus tratos; Varas da Infância e Juventude apinhadas de
processos envolvendo adolescentes em conflito com a Lei; instituições encarregadas da
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aplicação de medidas Sócio-Educativas superlotadas e sem condições de atender a demanda.
São situações que refletem a aparente fragilidade do Estado, da Sociedade e da Família no
enfrentamento de tais situações.
Segundo dados da UNESCO, estima-se a existência no mundo, de cerca de 6 bilhões
de habitantes, onde, aproximadamente 720 milhões são adolescentes, o equivalente a 12% da
população mundial1, o que possibilita no futuro o aumento dos casos de desvios entre essa
população. No cenário mundial, o Brasil foi apontado pela UNESCO como o quinto país
mais populoso do mundo, ficando atrás da China, da Índia, dos Estados Unidos da América e
da Indonésia.
A população brasileira, segundo dados do IBGE, cresceu quase dez vezes só no século
XX. Saltou dos 17 milhões de habitantes registrados no início do século para os atuais 169
milhões – números apresentados no ano de 2000 – Dessa população, cerca de 12% são
adolescentes, equivalente a 21 milhões. São 83.576.015 homens e 86.223.155 mulheres. A
maior parte da população, cerca de 137.953.959 pessoas, moram em áreas urbanas, ou seja,
81% da população concentram-se junto aos grandes centros. Essas grandes concentrações
humanas acabam sofrendo conseqüência dos déficits sociais espelhados no problema de
suprimento do conjunto de necessidades básicas da pessoa humana, tais como: moradia,
trabalho, de saúde, educação e assistência social, índices de criminalidade, entre outros. No
entanto, o maior dos problemas apresentados é, o grande número de famílias pobres que
vivem às margens das cidades. São fatores importantes e preocupam cada vez mais as
autoridades, no entanto, é bom lembrar que a pobreza associada aos problemas de ordem
psicológica são os mais preocupantes de todos, principalmente, quando tratamos de observar
o quanto à ausência de recursos podem atingir e influenciar àqueles sujeitos que se encontram
em fase peculiar de desenvolvimento, no caso das crianças e adolescentes, foco do nosso
trabalho.
No campo teórico existem vários autores tais como Winnicott, Souza Neto, Caliman e
Silva que em seus estudos sobre adolescente enfatizam os prováveis motivos propulsores da
prática da violência e da agressividade, do consumismo, da formação das gangues e do
cometimento de crimes e das contravenções. Nossa preocupação em utilizar esses estudos é
de elabora um acervo que permita a compreensão das práticas “desviantes” dos adolescentes
como um possível “pedido de socorro” e, como, a compreensão dessas práticas pode ajudar os
1
Nenhuma instituição publicou ainda uma estimativa a respeito do número de adolescentes no mundo. Os
números apresentados são projeções realizadas em cima do número de adolescentes existentes no Brasil , que
atingem cerca de 12% do total da população.
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educadores e profissionais, a desencadear um processo de aprendizagem saudável na relação
entre os sujeitos envolvidos no espaço sócio-educativo. Acreditamos na possibilidade desses
espaços ajudarem na criação de sentidos que direcionam os envolvidos para o protagonismo e
para a construção de tecido social no cotidiano pautado na ética e na consciência social, onde,
eles não lutam apenas para a sua emancipação, mas também a dos seus semelhantes.
Tencionamos neste trabalho interagir, observar, analisar e sugerir possíveis medidas
para atenuar o problema do atendimento Sócio-Educativo de adolescentes infratores, bem
como, demonstrar a importância do espaço de escuta e de pontecialização das qualidades
positivas desses adolescentes. A partir dessa preocupação procuramos elencar algumas
questões tais como: Quais possíveis situações poderiam ter motivado os adolescentes a terem
um comportamento classificado como desviante ou anti-social até entrar em conflito com
Lei.? Tais atitudes agressivas e violentas estariam vinculadas a uma problemática dos
fenômenos transicionais? As medidas Sócio-Educativas podem contribuir para o jovem resignificar a sua história de vida, e dessa forma elaborar uma maneira saudável de convivência
humana? Como as práticas e as técnicas Sócio-educativas podem contribuir com o processo
de aprendizagem? As políticas públicas e as técnicas utilizadas na aplicação das medidas
Sócio-Educativas podem e contribuir na construção de um projeto de vida? Como as políticas
sociais municipalizadas podem contribuir para ajudar o sócio-educando a lidar com as
frustrações e ao mesmo tempo, fortalecer a família, vistos na perspectiva de atendimento em
rede preconizadas no ECA, SINASE e outros documentos?
A nossa questão de fundo é, tentar perceber o sentido das práticas anti-sociais ou
desviantes de adolescentes não só como uma oportunidade de aprendizado para esse mesmo
adolescente e sim, também, como um meio de comunicar desejos e sentimentos, necessidades
sufocadas, sensações de mal estar. É lógico que nem todas as necessidades e desejos devem
ser satisfeitos, entretanto, se faz necessário um aprendizado para lidar com essas situações.
Este trabalho circunscreveu-se num momento onde se dava a implementação de um
programa de atendimento Sócio-Educativo em regime aberto, administrado pela Secretaria de
Cultura do Município de Barueri no ano de 1997. Nesse processo emergiu a necessidade de
conhecer e entender melhor a situação dos adolescentes em conflito com a Lei que se
utilizavam desse programa, e, a partir daí, estruturá-lo para responder às exigências legais,
bem como as necessidades reais dos adolescentes e familiares.
No sentido de responder as nossas indagações procuramos resgatar no primeiro
capítulo, a situação histórica, e, alguns aspectos do ordenamento jurídico voltado ao
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atendimento Sócio-Educativo no Brasil desde o período colonial. Evidenciamos as
transformações desse atendimento salientando os aspectos principais que marcaram cada
período até chegarmos no momento em que surgiu o ECA, onde o adolescente deixou de ser
observado como réu e passou a ser observado, também, como vítima. Resgatamos alguns dos
aspectos peculiares que envolvem o processo de desenvolvimento dos adolescentes,
dialogando do ponto de vista teórico, se há relação entre os elementos de ordem
comportamental desviante com a falta de elementos necessários para o desenvolvimento e a
subsistência humana.
Na busca de complementar essa idéia, procuramos situar o adolescente dentro do
quadro de vulnerabilidade no qual, por falta de recursos: econômicos, sociais, afetivos,
cognitivos, entre outros, podem ter sido levados a um estado estressor, e conseqüentemente,
conduzidos às práticas agressivas e desviantes, que em nossa forma de abordagem tomam o
sentido de comunicar uma situação de mal estar. Dentro dessa perspectiva desviante,
abordamos a questão do furto e da pichação, abordados segundo a perspectiva de Winnicott:
funcionar como um fenômeno ou objeto de transição, decorrente de um estado de privação
que pode, também, desencadear práticas agressivas.
No segundo capítulo, apresentamos o nosso percurso metodológico, que diante da
possibilidade e da flexibilidade de adequação do modelo de apropriação empírica, lançamos
mão da pesquisa de intervenção com abordagem qualitativa, como metodologia a ser aplicada
no trabalho. Escolhemos a pesquisa de intervenção por acharmos que, em sua estrutura,
permite-se uma flexibilidade que cria uma interface entre pesquisador e objeto, no sentido de
renovar a produção de conhecimento referente ao atendimento sócio-educativo em regime
aberto. Utilizamo-nos de procedimentos próprios que nos permitissem um engajamento dentro
de processos de mudança social. Fizemos uso de um modelo de abordagem qualitativa por
permitir o uso de diversas referencias epistemológicas que, possibilita a reformulação de
modelos de apropriação empírica sobre as categorias que emergiram durante o processo, o
que fortaleceu a imagem dialética dessa pesquisa.
A nossa preocupação em fazer uma pesquisa de intervenção no programa Sócioeducativo no município de Barueri foi sempre calcada na crença de tentar identificar alguns
dos fatores que poderiam ter contribuído para os adolescentes conflitarem com a Lei, bem
como a de encontrar um meio para equacionar essa situação de forma curativa ou preventiva.
Assumimos a hipótese de que, o conflito com a lei, cometido por adolescentes, pode ser a
representação de uma forma de
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“pedido de socorro” em decorrência
momentânea
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incapacidade de responderem às suas necessidades de ordem emocional, social, cognitiva e
material. O adolescente fica, muitas vezes, perplexo diante de um conjunto de necessidades
que ele não consegue encaminhá-las e nem ter apoio, geralmente uma das saídas são as
práticas anti-sociais. A necessidade pode provocar no adolescente um grau de insatisfação em
que ele pode oscilar desde o envolvimento com produtos químicos ou agressividade a si e a
terceiros. Nesse contexto, observamos a importância de criar e oferecer espaços em
condições para atender ao conjunto de necessidades básicas de pessoa humana. Nosso
trabalho se justifica na medida em que nos preocupamos em observar o adolescente como o
cidadão do futuro capaz de: aprender com seus erros, de assumir o papel de autor de sua
própria história, assumir responsabilidade da construção pessoal da sua consciência e posição
social, de ser criativo no sentido de aprender a escolher as melhores saídas para suas
frustrações, em suma, ajudar um sujeito de direitos a, também, respeitar esses direitos.
Caracterizamos o cenário e o perfil dos adolescentes que moram na região onde
aconteceu à pesquisa; evidenciamos as principais características apresentadas pelo objeto de
pesquisa, bem como, dos sujeitos envolvidos; descrevemos: a maneira pela qual aconteceu o
primeiro contato do observador com o objeto e um perfil dos instrumentos de pesquisa que
foram utilizados para alcançar nossos objetivos.
No terceiro capítulo, apresentamos um relato do processo de transformação
apresentado pelos dos adolescentes em conflito com a Lei, que no decorrer do processo de
atendimento, propiciaram evidenciar a necessidade de oferecer no espaço Sócio-Educativo a
possibilidade de potencializar os elementos contidos nos quatro pilares da educação: aprender
a aprender, aprender a conviver, aprender a ser, e aprender a fazer. Dentro dessa concepção
descrevemos os estudos realizados com quatro adolescentes desviantes que foram
selecionados de acordo com a infração cometida, 2 casos de furto e 2 casos de pichação. No
caso da pichação, duas situações nos incomodavam: primeiro, o grande número de
ocorrências e o fato de necessitarmos conhecer melhor o porque dos jovens escolherem esse
tipo de prática como forma de manifestação; segundo, o furto chamou atenção pelo fato de
entendermos a sua prática como uma atitude anti-social grave, e de constar na guia de
encaminhamento um agravante que é a questão da agressão física contra outro. O primeiro
caso analisado, elucida ao aprender a lidar com a ausência de referencias familiares. O
segundo caso lida com a questão do aprender a conviver com os fantasmas da negligência
sofrida na infância. O terceiro caso observamos como podem surgir dificuldades de
socialização decorrente da falta de relacionamento com o pai, e onde elas podem conduzir. O
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quarto caso nos dá uma visão das conseqüências que o sentimento de abandono podem causar.
Vislumbramos a idéia de que os aspectos ligados à aprendizagem podem conduzir o sujeito no
caminho do transfazer. Isso pode ocorrer, no momento em que o adolescente desviante
consegue articular seu passado ao presente, por meio de um processo de fortalecimento das
relações sociais entre ele, a comunidade e o momento e espaço sócio-educativo. Transfazer,
nesse sentido, assume a condição de retirar dos momentos e situações difíceis, elementos
podem possibilitar a condição de autor de sua própria história. Dentro desse contexto,
procuramos descrever a importância do espaço Sócio-educativo no sentido de oferecer
dinâmicas que possam fortalecer o adolescente desviante, no processo de construção dos
elementos responsáveis pela estruturação e potencialização da capacidade criativa,
entendendo que, por meio da criatividade, ela possa encontrar saídas mais positivas para seus
problemas. Descrevemos ainda a estrutura e a organização dos procedimentos da técnica de
Sensibilização Sócio-Educativa, como uma estratégia para ajudar o sujeito ator a fazer a
passagem de sujeito ator para sujeito autor, evidenciando a necessidade
No quarto capítulo, buscamos elaborar algumas tentativas de conclusão e de
desdobramento de nossa pesquisa. Não tínhamos a intenção, em momento algum, apresentar
uma receita, e sim, evidenciarmos a importância do espaço Sócio-Educativo, como um espaço
de fala e de escuta, que induz e fortalece as relações sociais, propiciando ao sócio-educador e
ao sócio-educando, possibilidades de re-escreverem seus projetos de vida, pautados na
solidariedade, na autonomia e principalmente nos princípios éticos.
Encontramos em nosso caminho adolescentes que passaram pela avaliação técnica de
juristas, psicólogos e assistentes sociais, que, por questões limitantes do próprio sistema não
puderam ser ouvidos. E é nessa perspectiva que buscamos incrementar na aplicação das
medidas Sócio-Educativas as bases técnicas da filosofia, da psicopedagogia, da pedagogia
entre outras, o que permitiram uma ação inter e transdisciplinar possibilitando um novo modo
de pensar o desvio social de adolescentes. Esse trabalho fortalece a idéia de que os desvios
sociais podem atuar como um “pedido de socorro” a medida em que observa a importância
que a insuficiência de elementos subjetivos e objetivos exercem na formação do sujeito, que
sem saber porque, utiliza os desvios sociais para retratar a sua situação.
As práticas Sócio-Educativas possibilitaram a entrada em um território de “ninguém e
todos”(Fernandez 2001), onde se encontrou um caminho que conduziu adolescentes sem
perspectivas a transformarem-se em autores de sua própria biografia.
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No quinto capítulo, apresentamos as referencias teóricas utilizadas como base de
nossas pesquisas.
Finalizando nosso trabalho, apresentamos em anexo, cópias de documentos que
ajudaram e registraram o esforço para a concretização do programa.
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1 – CONSTRUÇÃO DOS ASPECTOS HISTÓRICOS E TEÓRICOS DO
ATENDIMENTO
SÓCIO-EDUCATIVO
DA
CRIANÇA
E
DO
ADOLESCENTE NO BRASIL
________________________________________________________________
Nossa intenção não é nos aprofundarmos nas questões históricas do atendimento
Sócio-Educativo oferecido às crianças e adolescentes no Brasil enquanto políticas públicas,
no entanto, tentamos elucidar com um breve relato, de como esses sujeitos de direitos foram
negligenciados no decorrer da história e como isso foi se transformando na medida em que a
política administrativa também se alterava.
Segundo Fortes (2008), no período do Brasil colônia, crianças e adolescentes órfãos,
abandonados e delinqüentes eram comumente tratados como mercadoria e mão de obra
escrava, e, recebiam as mesmas punições aplicadas aos adultos criminosos, isso decorria das
Ordenações do Reino de Portugal, cujas medidas legais impunham punições severas e até
bárbaras, como por exemplo o açoite. Com a transição administrativa de Colônia para
Império, o tratamento de crianças e adolescentes no Brasil tomou outro rumo. Surgiram
preocupações Legais de proteção às crianças e adolescentes pobres, abandonados, órfãos
inclusive os que praticavam delitos. O Código Criminal de 1830 que procurava através de
seus artigos 10º e 13º regulamentar o assunto. determinava providências e serviços
diferenciados de atendimento.
“Art.10º: Também não se julgarão criminosos - inciso primeiro: Os menores de
quatorze anos; Art. 13º. Se, se provar que os menores de quatorze anos, que tiverem
cometido crimes obraram com discernimento, deverão ser recolhidos às casas de
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correção, pelo tempo que ao juiz parecer, com tanto que o recolhimento não exceda
a idade de dezessete anos “. (Cód. Criminal de 1830 in Fortes 2008),
O atendimento ficou a cargo de ser realizado por Instituições de cunho religioso e
caritativo de base ideológica Cristã, como as Santas Casas de Misericórdia que, em convenio
com o Império, ampliaram e criaram alguns serviços, que se utilizavam, de confinamento e de
ensino religioso permanente como meio de correção, cujo objetivo era resguardar os costumes
sociais da época. Em 1854 aconteceu outro avanço na forma de visualizar os menores,
crianças pobres e órfãs foram separadas do convívio direto dos menores delinqüentes.
Em 1889, com a passagem de Império para República, a política de atendimento de
crianças e adolescentes também sofreu nova alteração. Em decorrência do crescimento das
cidades e do surgimento de alguns fenômenos sociais como a exclusão, o aumento da
pobreza, o uso de mão de obra infantil no trabalho e o grande número de menores sem escola
ajudaram, de modo significativo, no encurtamento distância entre os menores e as práticas
anti-sociais, o que levou a uma associação da carência social com a delinqüência.
A partir do decreto Lei nº 847, de 11/10/1890, que dispunha sobre as crianças que
“perturbam a ordem, a tranqüilidade e a segurança pública”, deu início a um movimento,
liderado por médicos higienistas, que visava estabelecer novos parâmetros no atendimento
dos menores, o que levou o Estado a entender esse fenômeno como problema de saúde
pública. Nesse momento surge um novo paradigma que defende a idéia de compreender a
criança e o adolescente como futuro da humanidade. O Código Penal altera a idade de
imputabilidade relativa de sete para nove anos, e, a partir desse momento às questões que
antes eram resolvidas na esfera assistencial religiosa passaram a ser observadas também pela
esfera jurídica e sanitária. A criança que antes era observada como um problema e uma
ameaça à ordem pública, passa a ser vista como uma responsabilidade social. No entanto, isso
não foi suficiente para sensibilizar os novos legisladores, a Lei 947/1902 que dispunha sobre
“menores viciosos”, menores acusados criminalmente e órfãos abandonados encontrados em
via pública, se assim considerados por um juízo, deveriam ser internados, sem distinção
alguma nas colônias correcionais, permanecendo lá até os 17 anos. Uma análise da trajetória
do menor2 na América Latina e, sobretudo, no Brasil, constata que as legislações sociais e os
códigos voltados a essa população, acabavam transformando a vítima em réu. O Código de
Menores de 1927, apesar de buscar proteger as crianças, acabou sendo mais punitivo do que
2
Considera-se àquele que possui idade inferior a 18 anos incompletos que, segundo A Lei Federal 8.069 de 1990, considerase criança para os efeitos da Lei, a pessoa até 12 anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre 12 e 18 anos de idade.
Nos casos expressos em Lei , aplica-se excepcionalmente o Estatuto às pessoas entre 18 e 21 anos de idade.
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educativo, instalando naquele momento a política da “doutrina de situação irregular”3
(Souza Neto, 2007: 56) que foi acintosamente evidenciada pelo código de 1979. Essa doutrina
reportou-se em outros códigos da América Latina, especialmente o da Argentina. O mesmo
aconteceu no Uruguai em 1927 que, serviu de base para as legislações menoristas do
continente Sul Americano, e do mundo. A concepção sustentadora da “doutrina da situação
irregular”, assentava-se sobre as seguintes bases conceituais: não se dirigia ao conjunto da
população infanto-juvenil, mas apenas aos menores em situação irregular, os carentes, os
abandonados, os inadaptados e os transgressores. Não se preocupava com os direitos humanos
da população infanto-juvenil em sua integridade, limitava-se a assegurar a proteção para os
carentes e abandonados e a vigilância para os inadaptados e infratores. Funcionava com base
no binômio, compaixão-repressão, e a justiça de menores chamava à sua esfera de decisão,
tanto os casos puramente sociais, como aqueles que envolviam conflito de natureza jurídica; o
conjunto de medidas aplicáveis pelo Juiz de Menores (advertência, liberdade assistida, semiliberdade e internação) era o mesmo para ambos os casos. A internação, por exemplo, podia
ser aplicada indistintamente a menores carentes e abandonados, inadaptados e infratores. A
inimputabilidade penal do menor de dezoito anos significava, na prática, a inexistência de
garantias processuais, quando lhe atribuía a autoria de infração penal.
Em 1979 com a publicação da Lei nº 6.697/1979, o novo Código de Menores
retrocedeu, no que concerne ao tratamento dos menores, pois, substitui a classificação de
“menor abandonado e delinqüente” por “sistema de descrição do estado sócio-econômicofamiliar” (Fortes, 2008) colocando o menor em situação pior do que a do adulto criminoso,
instituindo a prisão provisória para menor, a qual podia ser decretada sem a presença do
curador de menores. Esse retrocesso legal não poderia permanecer por muito tempo. Nesse
período o país passou por uma nova transição política, saímos do regime de ditadura militar
para um regime democrático inteiramente civil. Na década seguinte têm início um tempo de
possibilidades reais de reversão desse quadro, em 20 de novembro de 1989 foi aprovada com
unanimidade pela Assembléia Geral das Nações Unidas, a Convenção Internacional dos
Direitos da Criança. Como toda a ação gera uma reação, no Brasil, em 13 de julho de 1990 foi
decretado pela Lei Federal 8.069 o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), que
estabeleceu uma nova ordem social determinando as responsabilidades do Estado, da Família
3
A doutrina de situação irregular refere-se ao quadro de atitudes tomadas pelo poder judiciário com relação aos menores que
se encontravam privados de condições essenciais de subsistência, saúde e instrução obrigatória, carência social, abandono,
inaptidão para o convívio social, conflito com a lei, etc.
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e da Sociedade na atenção, na proteção e na garantia dos direitos que devem ser destinados à
crianças e aos adolescentes.
O Brasil foi o primeiro país da América Latina a proceder à adequação substantiva de
sua legislação à letra e ao espírito da Convenção Internacional dos Direitos da Criança, cuja
concepção sustentadora é a doutrina da proteção integral que assegura por Lei todas as
oportunidades e facilidades, facultando o desenvolvimento de suas capacidades e habilidades
físicas, mentais, morais, sociais e espiritual, em condições plenas de liberdade e de dignidade,
que são bases conceituais antagônicas àquelas da doutrina da “situação irregular”. Se
observarmos atentamente houve um grande avanço para a nossa sociedade, crianças e
adolescentes delinqüentes ou abandonados deixaram de ser vistos como objeto de vigilância
da autoridade pública e passaram a serem reconhecidos como sujeitos de direitos e pessoa em
fase peculiar de desenvolvimento.
O Estatuto da Criança e do Adolescente surge como um instrumento jurídico que
formaliza as diretrizes necessárias para se enfrentar problemáticas e ações que envolvem
crianças e adolescentes, tais como: escolarização, abandono, criminalidade, violência, entre
outras. Esse Estatuto ainda vai além, pois, os casos sociais como a pobreza e a inadaptação
escolar, passaram a serem resolvidos na esfera administrativa, mediante ao encaminhamento e
a vigilância dos Conselhos Tutelares, órgão reconhecido por Lei como encarregado de
receber, estudar, encaminhar e acompanhar a resolução dos casos em que estejam sendo
feridos os direitos à vida, à saúde, à educação, à cultura, à alimentação, à integridade física,
moral e psicológica e ao convívio familiar e social entre outros, elementos necessários para o
desenvolvimento das crianças e dos adolescentes. Somado a todas essas premissas, o ECA
propõe um tratamento especial para os jovens que, de alguma forma conflitaram com a lei
cometendo algum tipo de “crime”4 ou de “contravenção”5. Para o ECA esse tipo de prática
denomina-se ato infracional, forma pela qual as pessoas que elaboraram o documento
encontraram para preservar a imagem e dificultar a estigmatização do adolescente, deixando
de ser considerado como um criminoso e passando a ser tratado como autor de ato infracional.
Essa medida sutil, a princípio parece sem propósito, no entanto, para quem se encontra em
fase peculiar de desenvolvimento é de grande importância. Caliman percebe que o processo
de estigmatização,
4
Crime, segundo o Código de Processo penal pode ser considerado como uma ação grave cometida contra a pessoa ou contra
o patrimônio, exemplo: a mão armada, homicídio, etc. Onde de autor é punido na forma da Lei com privação da liberdade em
instituição penal.
5
Contravenção penal é um ato ilícito menos importante que o crime e que só acarreta ao autor a pena de multa ou prisão
simples, exemplo: dirigir sem habilitação.
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“...consegue criar estereótipos, pode facilmente ser advertido na vida quotidiana
quando nos referimos, por exemplo, aos alemães como nazistas, aos jovens que
freqüentam discotecas como ‘maconheiros’, aos ciganos como ‘ladrões’ e assim por
diante”.(Caliman, 2006: 144)
Nesse sentido, é bom frisar que a forma de tratamento diferenciado não vai impedir
que lhes sejam atribuídas punições. No entanto essa situação coloca a sociedade em prontidão
no sentido de se mobilizar, de forma inteligente, na elaboração de programas que visam
oferecer ambientes devidamente preparados para que o adolescente transgressor possa refletir
sobre a prática cometida em busca da remissão dos seus atos. Respeitando a condição peculiar
de pessoa em fase de desenvolvimento, está previsto no ECA, após avaliação do grau de
gravidade do ato infracional praticado, a aplicação medidas Sócio-educativas como meio de
atribuição de responsabilidade aos adolescentes que romperam as fronteiras da lei. Tal fato é
um avanço em nossa legislatura e insere o adolescente no âmbito de também manter a ordem
pública. As medidas Sócio-educativas, possuem cunho educativo, oferecem aos adolescentes
uma oportunidade de se redimirem com a sociedade sem perder a sua liberdade, podendo,
portanto, permanecer no convívio social e familiar enquanto são atendidos.
De acordo com o ECA, as medidas Sócio-Educativas estão assim determinadas: Artigo
112: I – advertência: onde o Juiz registra o fato e se for suficiente, adverte verbalmente o
adolescente infrator; II – obrigação de reparar dano se o jovem depredou algum bem público
ou privado, devendo reparar o estrago feito; III – prestação de serviços à comunidade, que de
acordo com a gravidade do ato é determinado ao adolescente que preste serviços gratuitos à
comunidade por um período, que não ultrapasse há seis meses e nem a carga horária de oito
horas semanais; IV – liberdade assistida: serve para aqueles adolescentes que cometeram atos
infracionais considerados mais graves que os anteriores, onde são acompanhados
mensalmente por uma equipe técnica, que observam seu comportamento social, educacional
por um período de seis meses; V – inserção em regime de semi-liberdade: esse tipo de medida
esta caracterizada pelo retorno do jovem à unidade onde está internado, após uma jornada
diária de atividades educativas e sociais; VI – internação em estabelecimento Educacional:
normalmente esse tipo de medida serve para aqueles jovens que cometeram infrações
gravíssimas, ou que se encontram em situação de risco social, como por exemplo, o abandono
familiar; VII – qualquer uma das previstas no art. 101, I a VI. As mais utilizadas são a
obrigação de reparar dano, prestação de serviços à comunidade, e, liberdade assistida.
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A partir da concepção estabelecida na Lei Federal 8.069, entendemos e defendemos
que a prestação de serviços à comunidade e a reparação de danos cometidos, devam ser
acompanhados pelas administrações municipais do local próximo onde aconteceram às
ocorrências. São situações oportunas em que se convoca as autoridades a se preocuparem com
suas políticas públicas, oferecendo a oportunidade de responder de forma participativa ao
dever atribuído pelo ECA no seu Art. 4.º6. Entendemos que se as políticas públicas forem
realizadas de modo adequado, servem como instrumento para os adolescentes enfrentarem as
conseqüências desses fenômenos que conduzem ao desvio social, além de agir como
facilitador da integração dos mesmos com resto do mundo, o que pode contribuir
significativamente para a diminuição da pobreza e da violência de que eles são vítimas. O
trabalho é árduo pois o número de crianças e adolescentes tem crescido muito nos paises em
fase de desenvolvimento econômico, como é o caso do Brasil. O senso realizado pelo IBGE
no ano de 2000, apontou que há 61 milhões de crianças e adolescentes no Brasil,
“Segundo sua faixa etária, 23,1% tinham de 0 a 6 anos, 27,2% tinham de 7 a 14 anos
e 10% tinham de 15 a 17 anos. Esta população mostra acentuadas diferenças
regionais, étnicas e sociais. Do total apresentado, 29 milhões são negras e pardas,
287 mil (0,5%) são indígenas;181 mil de origem asiática e 31 milhões são brancas.
Há maior concentração de crianças e adolescentes nas regiões mais pobres e nas
faixas populacionais com menor instrução e menor renda, sendo que 45% vivem em
famílias com renda per capita de até ½ salário mínimo. Entre as crianças e
adolescentes negras e indígenas, o percentual de pobreza é ainda maior,
respectivamente, 58% e 71%”. (IBGE in UNICEF 2003 – pg: 56 a 60)
Preocupado com esses dados, o Governo Federal apresentou simultaneamente em
2006 dois programas voltados ao atendimento de crianças e adolescentes, o Plano Nacional de
Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes a Convivência Familiar e
Comunitária e o SINASE7 , cujo objetivo principal pretende fomentar em todo o território
nacional programas de atendimento Sócio-Educativo de forma a reordenar o “Sistema
FEBEM”, que, no momento, por motivos que merecem ser melhor observados e analisados,
vem apresentando falhas, que acabam gerando: rebeliões e motins, violações de direitos dos
internos, superlotações das instituições de internação, baixa qualidade de atendimento com
6
ECA, Art. 4º. É dever da Família, da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público assegurar, com
prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e a convivência familiar e comunitária.
Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende: a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer
circunstâncias; b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública; c) destinação
privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e a juventude.
7
Sistema Nacional de Atendimento Sócio-Educativo implantado em 2006 .
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custos elevados, lentidão no re-ordenamento das instituições e principalmente, as pressões
sociais e demandas punitivas. Frisamos que dos itens acima citados, o que mais preocupa é o
aumento do número de internações avaliadas no período de 1996 a 2006. Segundo dados
levantados pela Subsecretaria de promoção dos Direito da Criança e do Adolescente do
Governo Federal, os números têm crescido a cada ano.
Gráfico 1 – Evolução das internações no sistema Sócio-Educativo no Brasil
15000
10000
5000
0
4245
8579
9555
1996
1999
13489
2002
14074
2004
2006
SINASE 2006
Gráfico 2 - Evolução das internações no sistema Sócio-Educativo no Brasil por região
Região /anos
1996
1999
2002
2006
%
crescimento
Norte
207
351
469
670
323%
Nordeste
413
920
1696
2089
506%
Centro-oeste
494
645
626
1040
210%
Sudeste
2403
5665
5460
8629
359%
Sul
728
998
1304
1646
226%
Total
4245
8579
9555
14074
325%
SINASE 2006
A pesquisa apresentada pelo SINASE, apontou que os Estados de São Paulo, Rio
Grande do Sul, Rio de Janeiro, Pernambuco e Distrito Federal apresentaram o maior número
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de internos, totalizando 74,6%. São Paulo é apontado pelo SINASE como campeão,
apresentando 7.069 internos, esse fenômeno pode estar ligado ao grande número de habitantes
que o Estado possui que gira em torno de 41.399.991, e, quase mais da metade se concentra
na Região Metropolitana, onde as diferenças sociais se apresentam mais intensamente e se
localizam do centro para a periferia. Esse fator também pode se aplicar aos outros Estados e
as grandes cidades que possuem uma alta densidade demográfica, ou seja, mais de cem mil
habitantes. Em números absolutos o Estado de São Paulo pode ser campeão, no entanto, em
porcentagem o Nordeste assume a liderança.
Esses números sinalizam o quanto esse problema pode se agravar. Em um espaço de
dez anos, dependendo da região, houve um aumento que variou de 200% a 500% no número
de ocorrências de atos infracionais, que considera apenas os casos registrados. Aproveitamos
para salientar que esses números indicam apenas os casos de internação referentes aos delitos
considerados como graves. Alertamos que existem ainda os adolescentes flagrados que
cumprem medidas Sócio-Educativas em regime aberto cujos números se aproximam a 46.000
casos registrados.
Os números apresentados reforçam a importância desse tipo de trabalho, pois, as
atuais circunstâncias exigem da sociedade uma resposta e uma adequação de políticas
públicas para o enfrentamento dessas questões. Os fatores de risco social, principalmente a
pobreza, são apontados como os grandes vilões, pois deles surgem os problemas ligados às
questões do não suprimento do “conjunto de necessidades e direitos fundamentais da pessoa
humana (Caliman, 2006:12) que afetam principalmente a crianças e adolescentes, gerando um
estado de frustração e de estresse, que pode conduzir a um quadro de "desvio social”8(Velho,
1985), cujo mecanismo se evidencia na prática da violência, sinalizando uma situação de malestar pessoal e social decorrente da carência social e psicológica. Caliman acredita que,
“ ...a frustração das necessidades básicas humanas tendem a provocar reações de
tipo transgressivo, desviante , delinqüencial: tal insatisfação tem poder de
influenciar estados de ânimos dos indivíduos, de modo que a resposta a tais
situações provém na forma de agressividade, violência, uso de drogas, pichações,
vandalismos, busca de proteção em gangues, estilos de vida capazes de provocar
sentimentos de perplexidade, embaraço, intolerância no senso comum. Tais
comportamentos divergentes, alternativos e que denominamos aqui desviantes,
cumprem, quase sempre, a função de comunicar um mal-estar vivido no dia a dia
8
Para Gilberto Velho, “Desvio Social” significa um comportamento ou uma qualidade (característica) da pessoa
social que, superando os limites da tolerância em relação à norma, consentidos em um determinado contesto
social espaço temporal, é objeto de sanção e/ou de estigmatização, que exprime a necessidade funcional do
sistema de controlar a mudança cultural segundo a lógica do poder dominante”.
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por quem se sente frustrado em suas necessidades fundamentais” (Caliman,
2006:12).
Para Merton, o comportamento desviante decorre ”em grau importante, de
discrepâncias socialmente modeladas entre aspirações pessoais culturalmente induzidas e
padrões diferenciais de acesso à estrutura de oportunidade , afim de realizar essas aspirações
pelos meios institucionais”(Merton, 1979:168), nesse sentido é possível observar o desvio
cometido pelo adolescente pode ser uma decorrência da falha da instituição pública no
gerenciamento dessas oportunidades negligenciadas.
A novidade oferecida pelo ECA é de compreender o adolescente como um sujeito em
desenvolvimento o que produz uma visão diferente das práticas anti-sociais e do desvio. O
problema do desvio passa a ser observado de forma a se perceber que, possivelmente em
alguma parte de sua vida, o adolescente teve seus direitos e necessidades fundamentais à vida
negligenciados, precisando nesse momento expor, compreender e resolver seu problema, pois
se nesse estágio da vida parece encontrar-se momentaneamente vulnerável. Essa situação
reforça a idéia de Caliman no sentido de trabalharmos também na prevenção procurando
diminuir a falta dos elementos necessários para uma vida humana menos injusta, pois, se
consideramos as estatísticas apresentadas, o número de adolescentes em conflito com a Lei
tem subido a cada dia. Por um lado trabalhamos as idéias de Caliman a respeito da construção
do sujeito, realçando a influencia que a negligencia das necessidades naturais implícitas para
um desenvolvimento equilibrado exercem no sentido de conduzir o sujeito ao desvio social.
Por outro lado, trabalhamos as idéias de Winnicott que nos mostra a questão do desvio social
como resultado de uma privação sócio-afetiva sofrida na infância.
No entanto, se faz necessário conhecer melhor suas peculiaridades dessa fase de
desenvolvimento humano, e, por esse meio tentar compreender o que pode ter levado alguns
desses adolescentes a tornarem-se desviantes.
1.1. O Adolescer
Causar incômodos, chamar a atenção, criar situações esquisitas, são peculiaridades
pertinentes à adolescência. A literatura clássica tem mostrado que essa fase do
desenvolvimento humano vem sendo observada desde há muito tempo. Shakespeare em
Winnicott, pode ser considerado como um exemplo histórico, em seu “Conto de inverno”,
propõe que, “...não existisse idade alguma entre os dezesseis e os vinte e três anos, ou que os
jovens dormissem todo esse tempo...”.(Winnicott, 1987:61), como se isso fosse a solução, no
entanto, não o é. Sabemos que viver bem a adolescência é tão importante quanto viver bem a
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infância ou, até mesmo, a idade adulta, está evidente que uma é decorrente da outra. Uma vida
saudável na infância, oferece grandes chances de se obter resultados positivos na
adolescência, e, na vida adulta.
Segundo Barone, a adolescência,
“... caracteriza-se por diversos episódios de desequilíbrio e de ruptura. A partir da
constituição psíquica do sujeito face às exigências colocadas a ela pela
complexidade de sua cultura, esse período tornar-se-á mais turbulento, constituindose como uma verdadeira fase de crise. O adolescente, permido pelo eclodir da
maturidade sexual e perplexo face ao desconhecido da vida adulta, deverá fazer uma
série de ajustes capazes de articular o passado ao devir.” (Barone, 1998:193).
Reconhecer e entender a adolescência como um período turbulento e inconstante, nos
leva a refletir sobre as possibilidades que o meio oferece e cobra simultaneamente do sujeito,
atitudes que centradas na não satisfação das necessidades básicas decorrentes da situação de
vulnerabilidade social, podem conduzi-lo ao desvio social. Dentro desse contexto
pluridimensional, por meio da observação de mudanças internas e externas, é que nos surge
uma grande oportunidade de conhecermos e entendermos, um pouco melhor alguns aspectos
pelos quais os adolescentes vão se desenvolvendo, para tentarmos entender algumas das
possíveis causas dos sentimentos de frustração dos adolescentes. No aspecto biológico
acontecem mudanças de desequilíbrio hormonal, aumento da força física e do apetite,
crescimento acelerado do corpo, amadurecimento sexual e hipercinesia9, provavelmente a
excitabilidade excessiva pode ser decorrente dos desequilíbrios hormonais o que nos acena a
necessidade de estar sempre em movimento e ritmo acelerado. Os componentes psicológicos
apontam para uma constante mudança antagônica de atitudes, tais como: a impaciência, a
agressividade, a impulsividade, o desinteresse para as coisas alheias, o mau-humor, a
depressão, entre outros. Quanto às questões Sócio-Culturais, os adolescentes assumem uma
luta permanente contra o que sente que é injusto e buscam a valorização e a afirmação pessoal
dentro dos grupos, a que se sentem pertencentes, dos quais absorvem os modelos culturais
como a fala, o tipo de vestuário, as atitudes – às vezes até rebeldes –, preferências relacionadas
à profissionalização, às atividades de lazer, à religião e à música, ao consumismo e, às vezes,
deixam de lado as relações familiares. Do ponto de vista afetivo, tornam-se mais sensíveis e se
entregam “de corpo e alma” aos sentimentos, independente de quais sejam: amor, ódio,
saudade, alegria, tristeza, solidão, o que podem estar diretamente relacionados com os
9
Hipercinesia: necessidade insaciável de estar sempre se movimentando.
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componentes psicológicos. Intelectualmente, nesse período surge o raciocínio hipotéticodedutivo, e, com isso, conseguem generalizar e compreender com mais rapidez as questões
abstratas, o que conduz segundo Piaget, ao desenvolvimento das capacidades de criticar,
filosofar, hipotetizar e conceituar. “...resumindo, exploram o mundo como podem, em busca de
encontrar um lugar e um papel para si na sociedade.” (Zaguri, 1997: 35).
Todas essas mudanças que direcionam o sujeito à busca de papeis definidos no meio
social que são parte do desenvolvimento das habilidades e das competências que envolvem a
formação do sujeitos adolescentes, ainda não garantem que eles estejam isentos de se
envolver em situações adversas. Eles ainda correm o risco de fundir-se com as práticas
perigosas que surgem com a modernidade, que segundo Guará, “Ser moderno é encontrar-se em um
ambiente que promete aventura, poder, alegria, crescimento, autotransformação das coisas ao redor – mas ao
mesmo tempo ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos, tudo o que somos.” (Bermam em Guará,
1997:61).
Podemos observar que a violência urbana, os exageros de liberdade, o medo, a falta de
referenciais positivos, os estímulos exagerados da mídia no sentido de despertar o desejo de
posse, podem ser consideradas como práticas perigosas da modernidade, que negligenciam a
consciência e as relações sociais estruturadas sobre as bases diferenciais existentes entre as
virtudes e as vicissitudes, o que pode conduzir os adolescentes de frustração. Temos um dever
enquanto sociedade. Mostrar que, como seres humanos adultos e pensantes, somos capazes
de, pelo menos, tentar entendê-los, que para Guará,
“Chamá-los de aborrescentes não é apenas uma adjetivação que os estigmatiza, más
é, sobretudo uma amostra da indisposição dos adultos de enfrentar-se com suas
dificuldades e ambivalências frente a uma nova dinâmica da realidade que exacerba
as inquietudes e indefinições tanto dos jovens como dos adultos responsáveis por
sua educação.” (Guará, 1997:61).
Por esse prisma, aparece à crença, “está em nossas mãos”, enquanto sociedade,
assumir a responsabilidade, não simplesmente por ações jurídicas, mas sim, por ações efetivas
que garantam aos adolescentes tudo aquilo que lhes é de direito e que, por ventura, estejam
sendo negligenciados.
1.2. Vulnerabilidade e Adolescência
Segundo o Censo demográfico de 2000 realizado pelo IBGE, no Brasil existem
atualmente 21 milhões de adolescentes na faixa de 12 a 18 anos, o que representa 15% da
população. Nesse mesmo Censo foi observado que 50% dessa população pertence ao
seguimento mais pobre, o que indica uma situação de desigualdade e de vulnerabilidade social.
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Podemos considerar vulnerabilidade todas àqueles fatores que,
“conduzem a uma situação estressora, podendo ser de diversas ordens, tais como: a)
Biológicos: prematuridade, desnutrição, baixo peso, lesões cerebrais, atraso no
desenvolvimento; b) Sociais: família desestruturada, minoria social, desemprego,
pobreza, dificuldade de acesso à saúde e educação, àquelas crianças com
desvantagens socioeconômicas cujas mães sejam também jovens, solteiras e pobres
ou que tenham vindo de famílias desorganizadas (riscos psicossociais); c)
Psicológicos: crianças e jovens que tenham pais com desordens afetivas,
esquizofrenia, desordens anti-sociais, hiperatividade, déficit de atenção e isolamento
(riscos genéticos) são potencialmente vulneráveis aos eventos estressores e são
consideradas crianças e jovens em risco para problemas de desenvolvimento.(
Haggerty e cols.(2000) afirmaram que existe uma relação entre eventos estressantes e
doença, porém essa relação ainda é difícil de ser identificada. O que se sabe é que,
alguns indivíduos são mais suscetíveis ou vulneráveis a esses eventos, quando
comparados a outros na mesma situação de risco, por apresentarem diferenciais
fisiológicos e psicológicos”. (Sapienza e Pedromônico, 2005 ).
Dentre os principais fatores que representam a vulnerabilidade social está a pobreza,
pois dela decorrem inúmeras situações que conduzem ao estado estressor. A medida em que o
sujeito não dispõe de condições adequadas e de para o seu desenvolvimento biopsicossocial, a
carência de elementos necessários para a construção de um sujeito de direitos pode conduzilo ao “desvio social”, refletindo em um estado real de vulnerabilidade.
Assim sendo, convém conhecer um pouco das características próprias da pobreza e
onde ela pode influenciar o sujeito.
“Segundo órgãos, como O Banco Mundial, a Organização Mundial da Saúde, a
União Européia, UNESCO, entre outros, a pobreza pode ser caracterizada pela falta
de bens e de serviços indispensáveis para uma vida saudável, tais como: a) Carência
material, ou, de bens e de serviços essenciais, como moradia, vestuário, alimentação
e cuidados com a saúde; b) Falta de recursos econômicos, ou de carência de
rendimentos: Segundo a União Européia, a pobreza relativa a falta de rendimentos
pode ser entendida em termos de distância econômica, relativamente a 60% do
rendimento mediano da sociedade; c) Carência Social ou exclusão social, ou seja, a
dependência e a incapacidade de participar ativamente na sociedade,isto inclui a
educação e a informação. As relações sociais são elementos chave para compreender
a pobreza, segundo algumas organizações internacionais, as quais consideram o
problema da pobreza para lá da economia; d) Carência energética ou motivacional:
Onde o sujeito não apresenta condições e níveis adequados nos seus estados de auto-
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estima e de espiritualidade, necessários, para a superação dos paradigmas e para
mudar o que não pode ser mudado”(Sapienza e Pedromônico, 2005)
Seguramente, podemos inferir que, a pobreza não resulta de uma única causa Segundo
Sapienza e Pedromônico (2005) ela decorre de um conjunto de fatores: a) Fatores políticoslegais: corrupção; inexistência ou mau funcionamento de um sistema democrático; fraca
igualdade de oportunidades; b) Fatores econômicos: exploração dos pobres pelos ricos;
sistema fiscal inadequado, representando um peso excessivo sobre a economia ou sendo
socialmente injusto; a própria pobreza, que prejudica o investimento e o desenvolvimento,
economia dependente de um único produto; c) Fatores sócio-culturais: reduzida instrução;
discriminação social relativamente ao gênero ou à raça; valores predominantes na sociedade;
exclusão social; crescimento muito rápido da população; d) Fatores naturais: desastres
naturais, climas ou relevos extremos; doenças epidêmicas; e) Problemas de Saúde: adição a
drogas ou álcool; doenças mentais; doenças da pobreza como a SIDA e a malária; deficiências
físicas; f) Fatores históricos: colonialismo; passado de autoritarismo político; g) Insegurança:
guerra; genocídio; crime.
Muitas das conseqüências da pobreza, podem também ser consideradas como causas
da mesma, criando assim “o ciclo da pobreza”: fome, baixa literacia, baixa esperança de vida,
baixa estima individual e coletiva, Alto nível de doenças psicológicas como depressão, taxas
elevadas criminalidade e prostituição, falta de oportunidades de emprego, carência de bens de
consumo essenciais como água potável, saneamento, moradia e serviços de saúde e baixo
rendimento escolar, maiores riscos de instabilidade política e de violência, principalmente a
doméstica, migração e Imigração em massa, discriminação social contra grupos vulneráveis,
tráfico de pessoas, adição a drogas e álcool. Das conseqüências apresentadas podemos
destacar várias causas da pobreza, e relacioná-las diretamente com a trajetória dos
adolescentes, mostrando o quanto elas podem estar influenciando na conduta e no
comportamento deles.
E, é nesse contexto que buscamos perceber que os adolescentes, sujeitos cujos direitos
foram devidamente reconhecidos Lei Federal, acabam se “educando” em ambientes e
situações que podem conduzir a um quadro de "desvio social” cujo mecanismo se evidencia
na prática da violência, sinalizando uma situação de mal-estar pessoal e social, possivelmente
gerado pela negligencia das necessidades elementares de pessoa humana. No entanto convém
citar que para alguns autores o “desvio social” nem sempre é avaliado como negativo, e, pode
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apresentar aspectos funcionais positivos que favorecem e estimulam a inovação da estrutura
social.
“De maneira mais articulada, podemos dizer que cada caso de desvio provoca uma
pronta, mesmo que transitória, coesão de grupo. Este é levado, por contraste a
intensificar a comunicação interna para redefinirmos seus objetivos, reexaminar a
extensão, a validade e os processos de legitimação das normas, redistribuir os
papéis, aprofundar os sentimentos de pertença e os processos de
identificação”.(Caliman, 2006:167)
Para Durkheim, o desvio pode assumir um caráter de fenômeno social, ao classificar o
crime,
“... entre os fenômenos de sociologia normal é não apenas dizer que ele é um
fenômeno inevitável ainda que lastimável, devido à incorrigível maldade dos
homens; é afirmar que ele é um fator da saúde pública, uma parte integrante de toda
sociedade sadia” (Durkheim, 1985:53)
Se há um fato cujo caráter patológico parece incontestável, é o desvio social, porém,
tanto Caliman como Durkheim, cada um a sua maneira, parecem perceber no desvio a
possibilidade uma situação que movimenta a sociedade. Caliman atenta para as questões que
envolvem a falta dos elementos sociais e econômicos necessários para o desenvolvimento do
sujeito, acenando para uma mobilização social que busque diminuir essa negligencia como
meio de prevenção. Por sua vez, Durkheim vê na prática desviante, uma forma de função
adaptativa social que identifica o fator de tolerância do grupo com relação ao tipo de desvio.
No entanto, Durkheim atenta para o fato de que se grupo apresentar intolerância ao desvio se
concentrando nas ações punitivas, os aspectos positivos se neutralizam e perdem a
oportunidade de se re-significar. Quando tratamos do adolescente em conflito com a Lei,
visualizamos justamente essa possibilidade de tentar aprender com eles mesmos e dar um
novo significado para as práticas delituosas.
Essa situação nos remete a observar a adolescência como uma fase propícia para
acontecimentos observados anteriormente por Caliman. Pode estar na
adolescência uma
oportunidade de transformação a medida em que o sujeito vai tomando um maior contato com
as subjetividades e as objetividades oferecidas pelo meio, de onde vai retirando os elementos
psicológicos, cognitivos, sociais, culturais, emocionais, afetivos, entre outros, necessários para
consolidar o seu caráter, e procurar, dentro de suas capacidades e habilidades, resolver seus
conflitos, suas necessidades interiores e exteriores. Possivelmente, pode estar no contato
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sócio-educativo o ponto de partida para uma viagem que poderá elucidar as possíveis causas
das suas frustrações, e, possivelmente, a possibilidade de construir uma interface do passado
com o presente no sentido de restabelecer um novo rumo para uma vida futura. Certamente
inferimos que pode ser o momento mais apropriado para o adolescente desviante ouvir e de ser
ouvido. Ouvir no sentido de interagir com novos conhecimentos e novas possibilidades. Ser
ouvido no sentido de conhecer-se e entender-se melhor, de tentar descobrir a fonte de suas
frustrações e de receber atendimento.
1.3. Desejos, Paixões , Frustrações e Agressividade
Causar perplexidade, embaraços, intolerância no senso comum, parecem ser
ferramentas que os adolescentes utilizam comumente no seu dia a dia, porém esses
mecanismos estão surgindo com um alto grau de agressividade e de “atitudes desviantes”,
onde retomamos Velho que propõe, um comportamento que procura superar limites de
tolerância relacionados com as normas, passando por um processo estigmatizado pelo sistema
social segundo a sua necessidade de controle e dominação, mostrando a presença de um
instinto destrutivo. O impulso destrutivo, foi um assunto discutido por estudiosos de diversas
áreas tais como: Freud, Fromm, Marcelli, Winnicott, Velho, Chauí, Caliman, Silva, Souza
Neto, Passetti, entre outros, cujas obras referenciarão nosso entendimento sobre as questões
que envolvem as manifestações agressivas e violentas de adolescentes. Como base,
seguiremos o enunciado de Winnicott entre outros, que visualizam o furto como um dos temas
centrais das tendências anti-sociais.
1.3.1 O Furto
Ao estudarmos o desvio social representado pela prática do furto, buscamos tentar
entender suas raízes, o que nos obrigou a sair do campo da jurisprudência que caracteriza bem
o furto no Artigo 155 do Código Penal Brasileiro “...subtrair, para si ou para outrem, coisa
alheia móvel, passando a ser enquadrado com furto qualificado ocorre destruição ou
rompimento de obstáculo à subtração da coisa; com abuso de confiança, ou mediante a
fraude, escalada ou destreza. A pena para esses casos pode variar de 1 a 8 anos de
reclusão”. Porém, o que nos interessa com este trabalho é observar o delito por meio de um
olhar sócio-educativo, pois seus autores são adolescentes.
1.3.1.1. O Furto como Fenômeno de Transição
Winnicott (1999), clareia que o furto está relacionado com o indivíduo desde a
infância, segundo o autor, “... a criança que furta um objeto não busca o objeto furtado, mas
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busca a mãe sobre a qual têm direitos.” (Winnicott, 1999: 131). Se a criança busca, no objeto
furtado, recuperar a ausência da mãe, poderia ser possível então que os adolescentes, ao
furtarem, também estejam em busca do vínculo positivo não estabelecido na infância. Um tipo
perda que poderia resultar num estado de frustração. Winnicott focaliza que da relação com o
objeto, os sentidos parecem buscar satisfação – chupar: o dedo ou cheirar um pedaço de
tecido, acariciar seu rosto com tecidos de textura suave e movimentos bucais ritmados – deles
surgem os fenômenos transicionais. Quando o sujeito sai do objeto macio e busca no objeto
sólido este passa a ser considerado como objeto transicional.
Para Winnicott ambos os casos elucidam uma necessidade simbólica de suprir por
meio do objeto transicional, a falta de uma relação afetiva com a mãe. Os fenômenos e os
objetos transicionais assumem um papel importante na saúde psíquica do sujeito, para
Winnicott,
“Seu destino é permitir que seja gradativamente descatexizado, de maneira que, com
o curso dos anos, se torne não tanto esquecido, mas relegado ao limbo. Com isso
quero dizer que, na saúde, o objeto transicional não ‘vai para dentro’; tampouco o
sentimento a seu respeito necessariamente sofre repressão. Não é esquecido e não é
pranteado. Perde o significado, e isso se deve ao fato de que os fenômenos
transicionais se tornaram difusos , se espalharam por todo território intermediário
entre a ‘realidade psíquica interna’ e o mundo externo, tal como percebido por duas
pessoas em comum, isto é por todo o campo cultural. Nesse ponto o tema se amplia
para o do brincar , da criatividade e apreciação artística, do sentimento religioso, do
sonhar, e também do fetichismo, do mentir e do furtar, a origem e a perda do
sentimento afetuoso, o vício em drogas, o talismã dos rituais obsessivos, etc.”
(Winnicott, 1975:19)
No sentido de entendermos melhor a questão dos fenômenos transicionais segundo
Winnicott, citaremos, por meio de um breve resumo, um de seus estudos de caso, mais
especificamente “o caso do cordão” que certamente nos auxiliará numa relação com os
estudos que faremos mais adiante.
Trata-se de um atendimento realizado com um menino de sete anos que pertencia a
uma família de cinco pessoas – Pai, Mãe, uma filha de dez anos, o menino de sete anos e uma
menina de quatro – que fora conduzido à clínica por apresentar, segundo os pais, desvios de
caráter. A primeira entrevista realizadas com os pais pode-se desenhar um quadro claro do
desenvolvimento da criança, no entanto, foi na entrevista com a criança que Winnicott
encontrou um fator de relevância que não fora citado pelos pais anteriormente. A mãe
apresentava um quadro depressivo, e, em decorrência disso, ficara hospitalizada por dois
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meses. Nessa época o menino encontrava-se com três ano e três meses de idade e foi à
primeira situação real de separação dele com a mãe. Quando a criança encontrava-se com
quatro anos e nove meses houve mais um período de dois meses de separação por conta de
internação em um hospital psiquiátrico. Nesse período ele fora cuidado pela irmã da mãe que
disse que mesmo ele apresentando aspectos muito bons era difícil lidar com ele. No decorrer
de seu desenvolvimento ele foi apresentando características curiosas, como assustar as
pessoas dizendo que ia cortar a irmã; mostrava uma compulsão de lamber pessoas e coisas;
fazia ruídos compulsivos com a garganta; recusava-se a evacuar e logo em seguida se sujava
todo. Para Winnicott esses sintomas eram sinais de ansiedade. Durante uma sessão onde foi
utilizado um jogo de rabiscos o menino demonstrou um grande interesse em associar seus
rabiscos e espécies de cordão. Ora ele dizia ser um laço, ora um chicote , ora um chicotinho,
etc. Perguntando aos pais a respeito dessa ligação com os cordões, disseram que ele ficou
obsedado com tudo que se relacionava com cordões. Diante disso,
“Agi, portanto, da seguinte maneira;: expliquei à mãe que o menino estava lidando
com um temor de separação, tentando negá-la através do uso de cordões, tal como,
através do uso do telefone, se negaria à separação de um amigo. Ela se mostrou
cética: disse-lhe, porém, que se viesse a encontrar algum sentido do que eu estava
dizendo, gostaria que debatesse o assunto com menino em alguma ocasião
conveniente, comunicando-lhe o que eu dissera e depois desenvolvendo o tema de
reparação de acordo com a reação dele” (Winnicott, 1975:33).
Segundo Winnicott, a mãe mesmo achando o discurso ridículo, tempos depois ela
aproveitou o momento e levantou assunto com a criança, e viu o quanto ele sentia necessidade
de falar a respeito de seu relacionamento com ela. Ambos resgataram todos os momentos de
separação que puderam ser lembrados. A mãe estava convencida com o discurso de
Winnicott. Após isso muitas outras situações desse tipo de converso foram repetidas. Uma
passagem também significativa foi feita pelo menino,
“... a respeito de seu sentimento de separação quanto a ela, e fez um comentário
muito significante de que achava que a separação mais importante fora a perda dela
por ele quando estivera gravemente deprimida; nba fora apenas o fato de ele se ter
afastado , disse, mas sua falta de contato com ele por causa da inteira preocupação
dela com os outros assuntos” (Winnicott, 1975: 34).
Segundo relatos posteriores feitos pela mãe, após as conversas ele cessava o contato
com os cordões, no entanto a cada processo de separação ele retornava ao sintoma. Além dos
cordões ele também se relacionava com outros objetos – ursinhos de pelúcia – que eram
tratados fielmente como filhos dedicando tempo e afeição a eles. Winnicott acena que,
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“Não é difícil adivinhar, portanto, que ele apresenta identificação materna baseada
em sua insegurança em relação à mãe, e que essa identificação poderia transformarse em homossexualismo. Da mesma maneira, a preocupação com cordões poderia
transforma-se em perversão” (Winnicott, 1975:35)
Esse caso teve início em 1955, e, Winnicott, buscando um desfecho no ano de 1969,
descobriu um rapaz adolescente que desenvolveu novos vícios, especialmente drogas,
abandonou os estudos desperdiçando seu tempo com o ócio e, cada vez que era colocado
longe da mãe ele procurava uma forma de voltar parta casa. Para Winnicott restou uma
pergunta:
“... um investigador que efetuasse um estudo desse caso de vício em drogas daria a
devida consideração à psicopatologia manifestada na área dos fenômenos
transicionais?” (Winnicott, 1975:37).
De acordo com esse breve esboço, identificamos algumas possibilidades de
utilizarmos a idéia dos fenômenos transicionais no sentido de iluminar nosso caminho.
Inferimos então que, o sentimento de perda sendo simbólico ou não, pode conduzir o sujeito
a um estado de mal-estar e de frustração, o que pode também levá-lo para o desvio social, seja
pelo ato de furtar, de cometer exageros ou pela drogadição, lançamos a idéia de que esses atos
pudem ser considerados como fenômenos e objetos transicionais. Nessa busca do objeto,
surge, envolta de sentimentos de perda e de frustração, um sentimento descontrolado de
satisfazer uma necessidade ou um desejo. Para Garcia Rosa o desejo imita,
“... uma idéia ou um pensamento; algo completamente distinto, portanto da
necessidade e da exigência. O desejo se dá ao nível da representação tendo como
correlato os fantasmas (fantasias), o que faz com que, contrariamente à pulsão
(trieb) – que tem de ser satisfeita -, o desejo tenha 75de ser realizado.” (Garcia Rosa,
1999: 83).
Assim sendo, tanto em Winnicott como em Garcia Rosa, o desejo e a vontade podem
surgir como forças representativas das necessidades frustradas ou não, que acompanham o
sujeito permanentemente desde o nascimento. São forças importantes para o avanço do sujeito
na vida futura. Chauí (1995) interpretando Espinosa, propõe que os seres humanos são seres
naturalmente passionais, porque sofrem ações de causas exteriores a si mesmos, deixando-se
conduzir e dominar por forças exteriores ao corpo e à alma. Ora, por natureza, todos vivemos
rodeados por outros seres mais fortes do que nós. Por isso, não podemos afirmar que os
sentimentos de desejo e das paixões são bons ou ruins. Chauí, propõe três estados pelos quais
se apresentam as paixões originais: Alegria, Tristeza e Desejo, os demais estados derivam
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destas. Assim, da Alegria nascem o amor e a devoção, a esperança e a segurança, o
contentamento, a misericórdia, e a glória; da Tristeza surgem o ódio, a inveja, o orgulho, o
arrependimento, a modéstia, o medo, o desespero, o pudor; do Desejo provêm à gratidão, a
cólera, a crueldade, a ambição, o temor, a ousadia, a luxúria, a avareza e a paixão. Para a
autora,
“Uma paixão triste é aquela que diminui a capacidade de ser e agir de nosso corpo e
alma: ao contrário, uma paixão alegre aumenta a capacidade de existir e agir de
nosso corpo e de nossa alma. No caso dos desejos podemos ter paixões tristes (como
crueldade, ambição e avareza) ou alegres (gratidão e ousadia). Então, o que é vício?
Submeter-se as paixões, deixando-se governar pelas causas externas. O que é
virtude? Ser causa interna de nossos sentimentos, atos e pensamentos. Ou seja,
passar da passividade à atividade. A virtude é, pois, passar da paixão a ação, tornarse causa ativa interna de nossa existência, atos e pensamentos. As paixões e desejos
alegres fortalecem e nos preparam para passar da passividade à atividade.” (Chauí,
1995: 348 e 349).
Podemos inferir que, no caso dos adolescentes em conflito com a Lei, a atitude antisocial, passa a assumir um significado de paixão triste, levando-se em conta o sentimento de
perda e de privação pelo qual eles podem estar passando, o que pode tê-lo conduzido a um
estado conflituoso a conseqüentemente a um estado de frustração e de baixa auto-estima.
Os conflitos humanos, geralmente estão circunscritos no paradoxo existente entre
virtudes e vicissitudes, ora caminhamos mais para os vícios ora mais para as virtudes. O limite
desse paradoxo é, quando o ser perde a sua capacidade de agir, fazendo escolhas que acabam
voltando-se contra si, ou, contra a comunidade, como é o caso dos adolescentes
transgressores, que às vezes, colocam em risco suas vidas e as vidas de outros, o que implica
numa atitude antiética.
Para Chauí, a filosofia tradicional constitui o racionalismo ético, atribuindo a razão
humana o lugar central na vida ética. Duas são as correntes principais dessa linha de
pensamento: a corrente intelectualista, que identifica a razão com inteligência, ou intelecto, e,
a corrente voluntarista que considera que na moral a razão identifica-se com a vontade.
Para os intelectualistas, a vida ética ou virtuosa está diretamente ligada ao
conhecimento, pois, é, por ignorância, que fazemos o mal e nos deixamos arrastar por
impulsos e paixões contrárias à virtude e ao bem. “A vida ética depende do desenvolvimento
da inteligência ou razão, sem a qual a vontade não poderá atuar”.(Chaui, 1995:350). Para os
voluntaristas, é a vontade que dá subsídios para a vida moral, ou ética, porque dela depende a
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ação da vontade de querer ou não, o que a inteligência ordena. “Se a vontade for boa seremos
virtuosos, se for má seremos viciosos.” (Chaui, 1995:351). Segundo Souza Neto,
“ O bem e o mal aparecem como variáveis do processo histórico , numa linha de
superação do maniqueísmo. Inerentes à existência humana, fazem parte da estrutura
do sujeito que dirige suas opções, freqüentemente guiado por um desejo mais forte
do que sua capacidade racional de conter as paixões. Vemos o Homem
shakesperiano – um protótipo, na acepção de Heler (1982:183) –
como a
materialização da objetividade e da subjetividade, capaz de vivenciar e aprender o
mundo sem se transformar num misantropo, pois conhece o bem
e o mal, é
responsável por suas decisões, o fado lhe pertence. Esta perspectiva permite
compreender o homem como sujeito de seu destino” (Souza Neto, 2001:68).
Há, portanto, concordância nas duas correntes, quanto à idéia de passionalidade da
própria natureza humana, dotada de apetite, desejos cegos, impulsos desenfreados e
desmedidos, cabendo à razão, tanto na visão intelectualista como na voluntarista, determinar
os limites e o controle para paixões e desejos. Egoísmo, agressividade, avareza, busca
ilimitada de prazeres corporais, sexualidade sem freios, mentira, hipocrisia, má fé, desejo de
posse, ambição desmedida, crueldade, medo, covardia, preguiça, ódio impulsos assassinos,
desprezo pela vida, são algumas das paixões que nos tornam imorais e deficitários, em uma
relação com o outro e com nós mesmos. É no momento em que perdemos o controle sobre
elas que nos tornamos viciosos. É nesse momento que os conceitos da ética se fazem
necessários, procurar entender a diferença entre o “eu quero..., eu posso..., eu devo...”10, antes
de agir.
Assim sendo, a ética apresenta-se como o trabalho de inteligência e/ou da vontade para
dominar e controlar essas paixões. Para Chauí,
“Desejo é paixão. Vontade, decisão. O desejo nasce da imaginação. A vontade se
articula à reflexão. O desejo não suporta o tempo, ou seja. desejar e querer a
satisfação imediata e o prazer imediato. À vontade, ao contrário, realiza-se no
tempo; o esforço e a ponderação trabalham com a relação entre meios e fins e
aceitam a demora da satisfação. Mas é o desejo que oferece à vontade os motivos
interiores e os fins exteriores da ação. À vontade cabe a educação moral do desejo.
Na concepção intelectualista, a inteligência orienta a vontade para que esta eduque o
desejo. Na concepção voluntarista, a vontade boa tem o poder de educar o desejo,
enquanto a vontade má submete-se a ele e pode, em muitos casos, pervertê-lo.”
(Chaui, 1995:352).
10
São verbos que, bem interpretados, podem conduzir o sujeito a uma atitude ética. Nota do autor.
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Sob esse prisma, isso pode significar que a consciência, o desejo e a vontade formam o
campo da vida ética. Consciência e desejo referem-se às nossas intenções e motivações.
Vontade, relaciona-se às nossas ações e finalidades. As primeiras dizem respeito à qualidade
da atitude interior ou dos sentimentos internos ao sujeito moral; a última refere-se à qualidade
da atitude externa, das condutas e dos comportamentos do sujeito moral.
Portanto, para o desviante o ato da reivindicação em relação ao objeto perdido, pode
estar funcionando como uma forma de manifestação decorrente do conflito entre a vontade
controlada e um desejo recalcado, que se arrasta como um fantasma e que pode, certamente,
ter sido adquirido na infância resultando em condutas furtivas. O fenômeno do furto foi
observado pela quase totalidade dos autores psicanalistas, em que os protagonistas possuíam
em sua história de vida as seguintes características: carência afetiva, abandono intrafamiliar
real ou simbólico, separação dos pais, extremo rigor ou renúncia educativa total. A partir
desse processo de aquisição dos elementos, que deveriam ter ocorrido na infância, não
acontece adequadamente, o sujeito perde a condição de solucionar problemas criativamente.
Assim, a ação delituosa poderá se desenrolar quando surgir uma nova oportunidade de se
recuperar o que foi perdido.
“E num momento de esperança, a criança alcança um objeto – e o rouba. É um ato
compulsivo, e a criança não sabe por que age assim. Muitas vezes, a criança se sente
louca por ter tido uma compulsão de fazer algo sem saber por que.”
(Winnicott,1989: 73).
Seria possível, segundo Winnicott,
projetarmos essas palavras para os casos de
transgressão em que adolescentes estão envolvidos. O fato de saberem que o que estavam
prestes a realizar era errado, segundo padrões sociais, e mesmo assim o fizeram. Certamente
nos remetemos novamente a Caliman, que acredita que os estados de frustração e de mal-estar
estão presentes na vida desses jovens, e que os delitos as tendências anti-sociais podem estar
surgindo como decorrência disso.
Winnicott (1989), desenvolveu um estudo sobre a tendência anti-social procedendo a
uma articulação com as duas áreas de experiência humana: o meio ambiente e a realidade
interna. Os distúrbios de conduta – e aí se pode incluir a pichação como forma de
manifestação agressiva e o furto – foram considerados, pelo autor, como manifestações
clínicas da tendência anti-social, tornando-se assim, imprescindível que tenhamos a distinção
feita por ele entre os dois tipos de privação que são a base da teoria desenvolvida sobre a
tendência anti-social:
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1) Deprivation: que é a perda do “bom objeto”, ou seja, é a perda do marco confiável
dentro do qual a vida instintiva e espontânea da criança se sente segura (estado no qual se teve
algo bom que foi perdido).
2) Privation: que é um estado no qual jamais se teve algo e que resulta em doença
mental ou no domínio de uma psicose. Assim, ele mostrou que a tendência anti-social se
articula em um ponto com as psicoses e em outro com as neuroses.
Estabeleceu
especialmente a experiência de privação com a impossibilidade de alcançar a posição
depressiva e um sentido de responsabilidade social dentro do indivíduo.
Para Winnicott, os atos anti-sociais dos delinqüentes e dos psicopatas mostram “sinais
de esperança” que,
“... orienta-se a recuperar o que se perdeu, ou que isto seja desenvolvido e que os
processos de maturação, que ficaram “congelados” quando da perda, sejam
liberados novamente.” (Winnicott, 1989: 5).
O conceito de privação envolve um tipo de fracasso ambiental na etapa de
dependência relativa. A privação, assim, refere-se a um ambiente insuficiente de vivências
necessárias. Quando bebê o sujeito já é capaz de perceber, devido à falta que sente de certas
estruturas de relacionamento, de afetividade entre outras, necessidades para seu o
desenvolvimento, a questão do desajuste ambiental, que nesse caso é a família.
Esta concepção deu uma nova ótica à compreensão que a teoria psicanalítica tinha, de
maneira geral sobre a delinqüência e a marginalidade, onde se atribuía à ansiedade ou à culpa
decorrentes da inevitável ambivalência psico-social, quer dizer,
“..., eram considerados como fruto do conflito surgido quando o ódio (e, portanto, o
desejo de destruir) se dirige contra uma pessoa amada e necessária. A idéia básica
era a de que, quando a culpa se acumula e não encontra saída na sublimação ou na
reparação, algo tem que ser feito, ou atuado (acted out), para que o indivíduo se
sinta culpado disto. Em outras palavras, a etiologia da delinqüência era vista,
principalmente, em termos da luta que se trava no mundo interior, ou psique, do
indivíduo.” (Winnicott, 1984: 87).
Pode ser então que, podemos encontrar por trás de um adolescente em conflito com a
Lei, famílias que não puderam oferecer condições adequadas para o desenvolvimento dos seus
filhos, agindo equivocadamente ora por excesso, ora por falta. Freud propõe a existência de
dois tipos de pais: “ a) aqueles que evitam frustrar os filhos, fazendo tudo o que pedem e b)
aqueles que não dão amor aos filhos criando uma situação de desamparo”,( Freud 930:180).
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Portanto, podemos inferir que, os adolescentes em conflito com a Lei, podem estar buscando
por meio de fenômenos transicionais retratados por meio das práticas anti-sociais e agressivas
e colocando-se em situação de risco pessoal e social, chamar a atenção para si como
representação da falta ou do excesso. Frisamos que existe a necessidade de tentarmos
identificar o quanto essa agressividade pode ser apresentar negativa ou positiva. Fromm
(1987), propõe duas classificações para a agressividade: a agressividade como função
defensiva, filogeneticamente programada, ou seja, benigna, e, a agressividade maligna.
1.3.2. Agressividade benigna
A agressão benigna tem como característica principal à não intencionalidade de causar
dano ao outro. Ela está dividida em duas categorias, a pseudo-agressão e a agressão defensiva.
Na pseudo-agressão encontramos os seguintes elementos que a caracterizam: agressão
acidental, onde o exemplo seria, uma pessoa ter sido atropelada por um automóvel que, por
defeito mecânico, levou o motorista a perder o controle, levando-o ao acidente; agressão
lúdica que pode estar sendo representada nos esportes de luta e de competição; agressão autoafirmativa que está presente na capacidade de objetividade e idealismo.
Portanto, a agressão defensiva ou benigna, tem como objetivo principal garantir a
preservação da vida, manifestando-se apenas quando o risco da sobrevivência for iminente.
Está associada aos aspectos que condicionam a liberdade, o narcisismo, a resistência, o
conformismo e o instrumentalismo. Se as condições de existência e sobrevivência forem
suficientes para todos do grupo, esse modelo de agressão deixa de se manifestar. O que
reforça a teoria de Caliman, que propõe que se as necessidades forem supridas de acordo, a
resposta às adversidades podem ocorrer de forma diferente e não por meio dos atos desviantes
e anti-sociais.
1.3.2.1. Agressividade maligna
A agressão maligna ou, biologicamente não adaptativa, não está vinculada diretamente
à sobrevivência fisiológica do homem, mas integra seu funcionamento mental. É uma força
poderosa que habita algumas culturas e algumas pessoas e está diretamente ligada às paixões
e aos sentimentos de orgulho, vaidade, egoísmo e a qualquer tipo vicissitude que se deriva dos
desequilíbrios emocionais específicos da humanidade. Esse tipo de agressividade agrega todo
e qualquer tipo de sentimento de ódio e de indiferença para com os outros e pode conduzir o
sujeito a cometer crimes considerados pela sociedade como mais graves, que é o caso do
homicídio, ou seja, tirar do outro o bem mais precioso que é a própria vida. Há de
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considerarmos que as práticas agressivas aqui observadas não se encaixam nos casos mais
graves, e necessitam de uma observação diferente. Se seguirmos o caminho do fenômeno
transicional defendido por Winnicott, e de sintoma de mal-estar social por Caliman, a
pichação pode estar funcionando como uma forma de comunicação.
1.4. – Pichação, ato anti-social ou desviante ?
Hoje, é impossível andar pelos centros urbanos de qualquer cidade ou país do mundo
sem notar os quadros de pichação, seja como forma de manifestação política, cultural ou de
revolta, ela está sempre presente.
No Brasil, do ponto de vista legal, a pichação é considerada como crime ambiental, e,
de acordo com a Lei Federal 9.605/98 no art. 65,
“pichar, grafitar ou por outro meio conspurcar edificação ou monumento urbano.
Pena de detenção, de 3 (três) meses a 1 (um) ano, e multa. Se o ato for realizado em
monumento ou coisa tombada em virtude de seu valor artístico, arqueológico ou
histórica, a pena é de 6 (seis) meses a 1 (um) ano de detenção e multa. A multa pode
ir de R$ 1 mil a R$ 50 mil, podendo dobrar se o bem for tombado. Cabe a Prefeitura
Municipal a fiscalização, por meio da Secretaria do Meio Ambiente. (Gomes
2001:761).
As Polícias Militar e Civil não dispõe de estatísticas sobre a detenção de pichadores. A
orientação é levar os infratores para os distritos Policiais, onde responderão a inquérito.
Na busca de um melhor entendimento sobre a pichação, sentimos novamente a
necessidade de sair do campo legal. Segundo Palma, em pesquisa realizada em Barueri, “...a
pichação manifesta uma rebeldia e reflete o jeito de ser e de se expressar de quem quer muito
ser ouvido” (Palma, 2003:)11. Já, para Procurador Geral do Estado José Geraldo Brito
Filomeno “os jovens se vingam da exclusão social agindo desta forma”.(Filomeno in Palma,
2003).
A “vingança” decorrente de um sentimento de exclusão não seria nenhum absurdo
se praticado na adolescência, e, podemos, associar essa situação como uma forma de
manifestação agressiva, mesmo que as conseqüências sejam apenas de ordem material.
Para Winnicott a agressividade, a mentira e o furto encontram-se no centro das
tendências anti-sociais. Assim sendo, podemos inferir que a pichação, também está ligada ao
sentimento de privação, levando-se em consideração a necessidade de ser ouvido, o pode
conduzir o sujeito a desenvolver um sentimento de frustração. Para Winnicott, a criança que
11
Pesquisadora Social que desenvolveu uma pesquisa com os pichadores da cidade de Barueri, que resultou em
uma Dissertação de Mestrado apresentada ao Centro Universitário FIEO.
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furta um objeto não está desejando o objeto roubado, mas a mãe, sobre quem ela se julga com
“direitos”. Tais “direitos” derivam do fato de que, sob o ponto de vista da criança – no
“espaço de ilusão” que, como veremos a seguir, representa a experiência onipotente que a
“mãe suficientemente boa” propicia ao bebê, o seio que ela oferece é percebido pelo bebê
como criado por ele, a mãe, desta forma, é criada pelo bebê. Segundo PaLma, três aspectos
básicos da concepção de “tendência anti-social” em Winnicott, onde ele
“1- relaciona a ‘tendência anti-social’ a uma falha ambiental precoce, principalmente
a uma falha na função materna; 2 - Distingue dois tipos de reação da criança a estas
falhas. a) Quando a privação ocorre depois de ter havido uma função materna
“suficientemente boa” e por um período de tempo suportável, a criança poderá
desenvolver a “tendência anti-social” deprivation. b) Se a privação privation, ou a
falha da função materna, ocorrer desde o início da vida, poderá se desenvolver uma
doença mental ou uma psicose, por exemplo; 3) Winnicott considera que a
“tendência anti-social” comporta um sentimento de esperança, o que dá uma
configuração clínica muito especial ao problema” (Winnicott em Palma, 2003).
Com base em nossas experiências, podemos inferir que a pichação pode se enquadrar
segundo Caliman como uma forma de agressão auto-afirmativa, por estar presente a
capacidade de idealismo. O idealismo se apresenta para esses jovens, como uma forma de
inclusão social. Existem diversos grupos de pichadores que se juntam de acordo com os ideais
individuais e, pelos quais, criam vínculos sociais tornando esses ideais coletivos. Para
Goffman,
“ Os vínculos que unem os indivíduos às entidades de diferentes tipos apresentam
propriedades comuns. A participação do indivíduo na entidade – uma ideologia,
uma nação, um ofício, uma pessoa ou mesmo uma conversa- terá alguns aspectos
gerais. Sentirá obrigações: algumas serão duras, pois incluem alternativas
obrigatórias, trabalho a ser realizado, serviço a ser cumprido, tempo ou dinheiro
gasto; outras serão m,ais suaves, pis exigem que sinta participação, identificação e
ligação emocional. Portanto a participação em uma entidade social impõe
‘compromisso’ e ‘adesão’”.(Goffman, 2005,147,148).
Portanto, podemos considerar que, para ser aceito pelo grupo como pichador, é
necessário que o sujeito cumpra algumas determinações idealizadas pelos outros integrantes,
que exigem do novo integrante a coragem de aplicar a sua marca em lugares cada vez mais
altos, em próprios públicos e em lugares onde a vigilância esteja presente, mesmo que isso o
leve a colocar-se em situação de risco pessoal. Goffman atenta ainda para a questão do
estigma e a força que este exerce sob um grupo de pessoas no sentido de conduzi-los ao
chamado “comportamento desviante” argumentando que
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“...pessoas estigmatizadas têm muito em comum entre si o que permite
classificá-las em conjunto para fins de análise. Foi feita, assim, uma
extração nos campos tradicionais dos problemas sociais, raça e relações
étnicas, desorganização social, criminologia, patologia social e desvio - uma
extração de algo que todos eles têm em comum. Essas características
usuais podem ser organizadas tendo como base alguns poucos supostos
sobre a natureza humana.”(Goffman, 1982:124)
O estigma para Goffman surge quando o sujeito, sem recursos internos seja por
imaturidade ou baixa auto-estima, aceita passivamente o estereotipo indicado pela sociedade,
passando agir conforme os adjetivos que lhe foram atribuídos. Essa falta de energia
transformadora que podem conduzir ao desvio. Na infância e na adolescência isso pode
ocorrer com freqüência, pois são sujeitos em pleno processo de desenvolvimento que
apresentam ainda fragilidades em vários aspectos de sua formação. Um exemplo disso está na
questão da convivência familiar, quando esta não oferece um campo adequado para o
estabelecimento das relações entre os membros do grupo, o adolescente procura um novo
grupo fora de casa. Esta situação está evidenciada na formação das gangues, que vêem nas
práticas desviantes uma forma de manifestação.
Essas práticas sinalizam que os adolescentes, principalmente àqueles em conflito com
a Lei, apresentam dificuldades de articulação de sua história de vida com o seu presente, e,
necessitam aprender a conhecer os caminhos para essa interface. Vemos na potencialização
dos processos interiores da aprendizagem uma maneira para essa realização.
1.5. – A Aprendizagem Humana no Caminho do Transfazer
Articular o passado ao devir não é uma tarefa fácil para àquele sujeito que, ainda na
conseguiu adequar apropriadamente os instrumentos de que dispõe para o desenvolvimento do
pensamento, da afetividade e da capacidade e da habilidade de relacionar-se com o meio, por
estarem ainda em fase de aprimoramento. Em nossa pesquisa, procuramos olhar o adolescente
desviante como um ser em processo de construção de seu conhecimento, que possui dentro de
si as mesmas capacidades e habilidades de pensar, de sentir, de desejar e de agir, capacidades
essas, possivelmente desestruturadas que, precisam de ajuda para poderem continuar a
construírem-se. As atividades Sócio-Educativas, se bem conduzidas, podem oferecer a esses
jovens a possibilidade de transfazerem suas vidas, a partir do momento em que eles se
assumam como seres em processo de construção, e, que se entendam capazes de uma
autotransformação. Para Souza Neto transviver está ligado “... à noção de sujeito e modo
como ele busca re-significar os acontecimentos individuais coletivos em vista de uma outra
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forma de viver”.(Souza Neto, 2001:67). O modo pelo qual se busca essa interação com o
meio implica em visualizar algumas estruturas que situam o sujeito no processo de
aprendizagem.
Silva (1998), apresenta três dimensões que constituem o sujeito: racional, relacional e
desiderativa. Quando falamos sobre a dimensão racional, verificamos que se trata do
desenvolvimento das habilidades básicas do raciocínio, por meio da ação do sujeito sobre o
meio e sobre os objetos. Portanto, podemos entender que a ação, “... é o ponto partida para a
construção do conhecimento, mas este não ocorre sem a estruturação do vivido, ou seja, sem
a formulação e enunciação de conceitos pelo sujeito"(Silva, 1998:33).
Supondo que o ser humano é dotado de racionalidade e que ela pode ser desenvolvida
desde a infância, que conceitos os jovens transgressores formularam a respeito de suas ações.
No caso dos adolescentes transgressores podemos perceber que o seu comportamento foi
conduzido pela ação vivida junto a outros jovens, pois eles reconheciam que o ato que
pretendiam cometer, e que acabaram cometendo, não estavam dentro dos padrões de aceitação
social e mesmo assim o fizeram. Conhecer o que é certo e o que é errado não garante que a
ação seja coibida ?
A dimensão relacional trata da ação inter-pessoal e intersubjetiva do sujeito. Ela é
“...constituinte no processo de construção do conhecimento na medida em que o ser
cognoscente também é determinado, também, pelas relações que estabelece com os outros
sujeitos.” (Silva, 1998:32).
Podemos inferir então que, por meio das ações que acontecem em um grupo, os
sujeitos integrantes desse, acabam por aceitar os julgamentos condicionados e elaborados em
conjunto, assumindo um caráter filosófico de classe, que por sua vez, pode transformar-se em
conceitos mesmo sendo enganosos e em desacordo com outros grupos pertencentes da mesma
sociedade. Um sujeito pode ser seduzido, por força de regras pré-estabelecidas, a cometer um
crime ou uma contravenção por influência dos membros de seu grupo, por acharem que tal
atitude é necessária para a sua inclusão e permanência dentro dessa comunidade. Podemos
ampliar essas relações, a medida em que observamos o resultado das ações do sujeito com os
objetos e vice-versa.
Souza Neto acena para o fato de as relações inter-pessoais são fonte de produção de
subjetividade onde “O sujeito se constrói por meio das relações dos homens entre si e com a
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natureza, concretiza-se na práxis, mesmo porque a dinâmica da subjetivação encontra eco na
objetivação”.(Souza Neto, 2001:21)
A dimensão desiderativa é elemento presente na ação que envolve a construção
individual do conhecimento, na medida em que o sujeito também é determinado por
componentes de ordem inconsciente derivados do impulso de desejar algo, e, atua juntamente
com as outras duas dimensões. O sujeito passa a estar à mercê de seu objeto, a medida em que
o objeto surge em situação de inacessibilidade. “O objeto de desejo é um objeto perdido, uma
falta, sempre presente, que faz com que o desejo procure se realizar através de uma série de
substitutos que, no entanto, mantêm essa falta.” (Silva, 1998:39).
Pode ser então que, o sujeito realize-se como um “sujeito aprendente”12 à medida que
haja uma articulação equilibrada entre as três dimensões, a desiderativa, a racional e a
relacional. Portanto, ao meu ver, estas três dimensões apresentam-se mais fragilizadas no
adolescente em conflito com a Lei. O sujeito pode aprender a agir, a sentir e a pensar, de
acordo com o vivido junto ao meio a que pertence. No entanto só a articulação das três
dimensões seriam insuficientes para o desenrolar do desenvolvimento mais global, Winnicott
ilumina para a questão ambiental quando propõe que
“...o meio ambiente facilitante e suficientemente bom, que, no início do crescimento
e desenvolvimento de cada indivíduo, constitui um ’sine qua non’. Há genes que
determinam padrões, e uma tendência herdada a crescer e alcançar a maturidade;
entretanto nada se realiza no crescimento emocional, sem que esteja em conjunção à
provisão ambiental, que tem de ser suficientemente boa” (Winnicott, 1975:188).
Pode ser então que, quando o meio ambiente não se apresentou suficientemente bom
para o sujeito, pode tê-lo levado a buscar, por meio dos fenômenos e dos objetos transicionais
uma certa compensação decorrente do sentimento e perda seja ele simbólico ou real, e, os
fenômenos dos “desvios sociais” e das práticas agressivas podem estar funcionando como uma
forma comunicação do sentimento de mal estar pelo qual estão passando.
1.6. Agressividade: revolta ou pedido de socorro?
Diante das circunstâncias apresentadas na seção anterior deste trabalho, inferimos que
a agressividade têm suas raízes ligadas com a ausência de “vínculos positivos”13. Pode ser
12
Aprendente para Alicia Fernandez é considerado como uma das partes necessárias para que ocorra a
aprendizagem. A outra é o ensinante.
13
Vínculos positivos têm um significado de coisa boa e necessária relacionada com as questões das virtudes. A
formação de juízos e de conceitos, só poderão ser consolidadas adequadamente segundo as regras que organizam
a sociedade, por meio do contato com o meio, que no caso dos adolescentes transgressores só seria possível com
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então que, essa ausência de vínculos positivos pode gerar no adolescente, estímulos que o leve
a praticar atitudes agressivas e destrutivas, que por sua vez, os levaram cometer os delitos.
Freud (1972) propõe que, o amor, decorrente dos vínculos positivos, aparece como
uma estrutura provisória, que tem função ambivalente numa relação. O sujeito, que não possui
referenciais positivos relacionados às regras sociais, os sentimentos de amor e de ódio perdem
a distinção, e as atitudes, nessa situação, passam a serem indiferentes. O ódio, assume a
posição principal e consuma-se através dos atos agressivos. Para Freud, o ódio
“... enquanto relação com objetos, é mais antigo que o amor. Provém do repúdio
primordial do ego narcisista ao mundo externo com seu extravasamento de
estímulos. Enquanto expressão da reação do desprazer evocado por objetos, sempre
permanece numa relação íntima com os instintos autopreservativos, de modo que os
instintos sexuais e os do ego possam prontamente desenvolver uma antítese que
repete a do amor e do ódio. Quando os instintos do ego dominam a função sexual,
como é o caso na fase da organização anal-sádica, eles transmitem as qualidades de
ódio também à finalidade instintual.” (Freud, 1915: 85).
Pode ser então que, a transgressão social funde-se com a agressão quando o objetivo
for de causar uma espécie de dor ao outro, ou ao grupo a que pertence, mediante uma ação
que descumpre uma lei. Porém, a análise da agressividade é extremamente delicada. Depende
sempre do ponto de vista de como é observada.
“Vê-se claramente a multiplicidade dos modelos teóricos: agressividade–conduta
objetivável, agressividade-estado tensional particular, agressividade autodefesa,
agressividade-destruição do objeto, agressividade –intencionalidade.” (Marcelli,
1998: 153).
Convém primeiramente lembrar que o instinto de agressividade está ligado aos
elementos de amor, ódio e medo. A busca inconsciente da punição possivelmente pode ter
sua relação quando, o instrumento utilizado para a aproximação do objeto desejado, que foi
perdido ou que não foi obtido na infância, surja com a transgressão, e que esse objeto que os
adolescentes procuram pode ser decorrente da falta de um contato mais afetivo e efetivo com
os pais.
Desse modo, o ato anti-social é observado no contexto de uma organização neurótica
evidente: a reivindicação de um afeto ou de uma autoridade envolvidas de um sentimento de
a família e com os grupos de jovens a que pertencem. Uma família que se omite ou que não tem os conceitos de
moral e de bons costumes bem definidos, que tipo de conhecimento e de entendimento passará para esses
adolescentes.
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culpa. Então, a ação transgressiva satisfaz, simultaneamente, a falta de vivências vinculares
afetivas e a necessidade de punição. Essa situação, se não for interrompida, servirá de porta
de entrada para a delinqüência. É por essa ótica que não podemos aceitar a medida sócioeducativa apenas como uma decisão jurídica, mas, devem interagir com à mesma, propostas
psicológicas, sociais e educativas.
Segundo Winnicott (1989), uma relação instável entre pai e mãe poderá provocar no
filho uma possível situação de perda do “objeto de desejo”14, gerando uma ansiedade que
permanecerá latente até que surja uma oportunidade de se resgatar o que foi perdido. Devido a
sua fragilidade, a adolescência torna-se uma fase propícia para o resgate daquilo que foi
perdido no passado, podendo tornar-se o desvio social uma forma de “objeto ou fenômeno
transicional”15. Nessa ótica, a prática anti-social funcionaria como um sinal de mal-estar,
necessitando da intervenção de pessoas amorosas e confiantes, que possam, como resposta
esse pedido de socorro, apresentar uma saída menos traumática.
Na busca dessa saída, temos que considerar que o adolescente em conflito com a Lei é
portador de sentimentos como qualquer outra pessoa. Além de possuir emoções pode,
também, estar sofrendo com elas sem saber exatamente porque. Quando o adolescente chega a
ponto de transgredir a Lei, é possível perceber que, a sua capacidade, de elaborar saídas para
os seus problemas está enfraquecida e a delinqüência aparece, isso nos indica uma
fragilização do seu potencial criativo. Acenamos para a questão da criatividade entendendo
que ela sempre se manifesta no sentido positivo, enquanto sua força antagônica atua no
sentido negativo apresentando-se nas práticas destrutivas. Portanto, acreditamos que
criatividade e destrutividade aparecem como situações distintas. Assim sendo, pode ser então
que, as transgressões sociais se apresentam como fruto de um potencial criativo enfraquecido,
onde como uma onda de propagação, afeta a comunidade a que pertence.
A característica social das transgressões faz-nos perceber quanto estamos todos
relacionados uns com os outros. O indivíduo é um ser naturalmente social. Nasce e vive em
sociedade e necessita dela para aprender e a sobreviver. Nessa relação, entre o eu e o não eu,
se constroem os valores de convivência social, tais como: disciplina, gratidão, religiosidade,
importantes elementos da construção do sujeito ético.
14
15
No caso de que trata esse trabalho, o objeto de desejo do transgressor está em torno da carência afetiva.
Objeto transicional funciona como um substituto do objeto desejado.
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1.7. O Sujeito Autor de sua própria História
A problemática da construção do “Ser” está sujeita às mais diferentes formas de
interferências. Objetivamente ou subjetivamente, elas acontecem de forma lógica ou ilógica
sem que possamos impedir. Dessa feita, aproveitamos a situação para tentarmos associar essa
idéia com a proposta da visão pessoal de lógica do adolescente apresentada por um outro
prisma. Segundo Piaget, “... passa a ser o que é lógico para ele, como se o lógico a seu ver
seja sempre certo e o ilógico sempre errado”. (Piaget,1997:148). Enxergamos, nesse ponto,
que o adolescente encontra-se confuso e momentaneamente incapaz de diferenciar entre o seu
mundo e o mundo “real”, o mundo em que ele gostaria de viver e o mundo o qual vive.
Mesmo possuindo a habilidade do raciocínio formal, os adolescentes são
freqüentemente envolvidos em crises de ideais, isso os torna críticos permanentes da realidade
social. Nesse contexto o conflito com a Lei pode surgir do embate emocional do ilógico com
o lógico, quer dizer, o lógico é que as transgressões agridem o outro, o ilógico implica numa
ação transgressiva sem saber ao certo do porque realizá-la.
A adolescência se mostra como um período repleto de transformações, onde sujeito se
enche de ideais que visam reformar a sociedade. São severamente críticos dela e de suas
instituições. Este tipo de comportamento, quase sempre, é visto pelo adulto como anti-social,
rebelde, irracional e ingrato. Piaget argumentou não ser sempre esse o caso. Na sua
perspectiva, os desejos do adolescente de reformar a sociedade são normais e podem ser
atribuídos às suas capacidades intelectuais de raciocinar sobre como as coisas deveriam ser
respectivas ao seu egocentrismo. É também um importante período de transição social e
cultural, pois,
“... quando a adolescência entra em rebelião contra a sociedade, quando ela se
extravia e mergulha na droga pesada, acredita-se que é apenas um mal da juventude;
não se percebe que a adolescência é o elo fraco da civilização, que, nela se
concentram os problemas, os males, as aspirações difusas e atomizadas. A busca
simultânea da autonomia e da comunidade, a necessidade de uma relação autêntica
com a natureza na qual os jovens reencontrariam sua própria natureza, a recusa da
vida adulterada dos adultos, revelam pelo avesso as carências que todos vivem.”
(Morin, 1989: 130).
Seria possível pensar o adolescente em conflito com a Lei como um integrante e
representante ativo de aspectos culturais de uma categoria, que está em busca de novas
possibilidades existenciais e de deixar marcada, de alguma forma, a sua presença e a do seu
grupo por meio ações ou signos próprios?
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“Pensando o militante desse ponto de vista, podemos dizer que ele cria um território
existencial através dos grupos aos quais pertence, formando discursos e signos. A
partir de sua inserção social, ele cria novos universos de referência que se constrói
na sua relação com o outro. Daí em diante emergem novos devires, ou seja, os
projetos pessoais e coletivos são constantemente re-significados, o que faz surgir
outras dimensões cotidianas deste mesmo projeto.” (Manfroi, 1997: 270).
Apesar de Manfroi pensar e refletir, sobre o militante político, podemos nos apropriar
de sua concepção para compreender o adolescente desviante uma vez que eles, de uma forma
ou de outra, criam um novo território existencial que pode dar condições para a formulação de
um novo projeto de vida, na medida em que busca inserção em grupos de pessoas de sua
própria idade e pensamento filosófico semelhante, o que acaba servindo como uma válvula de
escape para aqueles que, de alguma forma, não visualizaram na família o grupo ideal para
isso.
Percebemos, no decorrer da pesquisa, que essa inserção do adolescente no grupo
familiar é prejudicada pelo relacionamento turbulento com os pais. Pais extremamente
tolerantes ou extremamente rígidos contribuem para a formação de um caráter intolerante no
adolescente, o que pode impedir o enfrentamento de sua própria agressividade. O importante
nesse contexto é procurar identificar a qualidade vincular estabelecida pelo adolescente com a
família e com a comunidade desde a infância. As atitudes agressivas dos adolescentes em
conflito com a Lei podem estar relacionadas à forma de como ficaram impressas em suas
mentes essas primeiras vivências. Uma estrutura emocional bem constituída poderá levar a
criança e o adolescente a melhor suportar os percalços da vida.
Dessa forma, ao fazermos com que o adolescente entenda que seu modelo de conduta
origina-se de ações deliberadas por sua subjetividade, pode desencadear então o surgimento
de um sentimento de culpa que o levará a refletir e a buscar dentro de si a fonte de seus:
desejos, medos, alegrias, tristezas, prazeres e amor. Nesse processo, o amor pode tornar-se a
peça fundamental, pois dele tende a nascer os sentimentos de fraternidade, de compaixão, de
arrependimento, de perdão e, além de tudo, a tomada de consciência. Não entendamos o amor
como uma demonstração de fragilidade, e sim, de coragem e força. Dele é que parte o
movimento que nos desliga do aprisionamento dos desejos.
Porém, não podemos esquecer que o adolescente em conflito com a Lei é um sujeito
aprendente que vive da coexistência das três dimensões propostas por Silva agregada às
questões da potencialização da criatividade que necessitam permanentemente de elementos
para se manter e progredir.
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O processo Sócio-Educativo pode auxiliar o sujeito a mais bem captar esses
elementos. Suas práticas de compreensão dos distúrbios que afetam o processo, permanente e
irrestrito, da aprendizagem humana, podem contribuir dando-lhe uma nova visão de sujeito.
Na medida em que o adolescente é observado adequadamente como um ser em pleno
processo de construção, isso facilita a elaboração de estratégias e intervenções que podem
atenuar essa problemática do desvio social.
A partir do ano de 2006 nossa idéia de atendimento Sócio-Educativo ganhou força.
Como um resultado de um processo democrático realizado pela sociedade civil, órgãos
governamentais e não governamentais, apresentaram o Plano Nacional de Promoção, Proteção
e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. O
documento trás consigo o objetivo de romper com o paradigma utilizado no século passado,
onde o tratamento oferecido às crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade social
seguia a filosofia de “prender para proteger”, “punir e castigar para evitar o erro”.
“As crianças e os adolescentes têm direitos subjetivos à liberdade, à dignidade, à
integridade física, psíquica e moral, à educação, à saúde,à proteção no trabalho,à
assistência social, à cultura, ao desporto, à habitação, a um meio ambiente de
qualidade e outros direitos individuais indisponíveis, sociais, difusos e coletivos. E
conseqüentemente se postam, como credores desses direitos, diante do Estado e da
sociedade, devedores que devem garantir esses direitos. Não apenas como
atendimento de necessidades, desejos e interesses, mas como direitos humanos
indivisíveis, como os qualifica a normativa internacional – como direito a um
desenvolvimento humano, econômico e social. São pessoas que precisam de adultos,
de grupos e de instituições, responsáveis pela promoção e defesa de sua
participação, proteção, desenvolvimento, sobrevivência e, em especial, por seu
cuidado”. (Plano Nacional de Convivência Familiar e Comunitária 2006: 24)
O Programa de convivência familiar ganha força quando, nas palavras de Winnicott,
emerge a proposta de que o tratamento das tendências anti-sociais não está na terapia, e sim,
está no provimento de cuidados que o ambiente oferece, onde o sujeito tem a possibilidade de
redescobrir por si mesmo, se ele consegue ou não dominar seus impulsos a medida em que
recebe orientação dos sócio-educadores e vai interagindo com a família e com a comunidade,
que nesse momento precisam dar uma nova oportunidade a ele, oferecendo elementos para
que ele possa suprir a necessidades antes negligenciadas.
Nesse sentido, Fernandez faz uma grande contribuição propondo que o sujeito
aprendente consegue incluir novos elementos aos que possui, no sentido de uma
autoconstrução baseada na ética e na prática social saudável, e por esse meio ele conseguirá
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fazer a passagem de “sujeito ator” – que é aquele que, passivamente, segue os papéis que lhes
são oferecidos e cobrados pelo meio – para “sujeito autor”, que é “... aquele que elabora o
conhecimento, faz suas escolhas dentro das circunstâncias dadas, sabe apropriar-se dos
elementos à sua volta e dá um salto qualitativo, no sentido de comandar o seu destino, ou
seja, o sujeito comanda seu destino e luta pata não ser comandado pelas vicissitudes”.
(Fernandez, 2001:51,52)
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2 – CENÁRIOS E PROCEDIMENTOS DA PESQUISA
___________________________________________________________________________
Não só no Brasil, mas no mundo todo, se observarmos atentamente, perceberemos o
grau de degradação por que tem passado a nossa sociedade; isto se reflete na quantidade
expressiva de adolescentes vítimas da violência, do abandono e dos maus tratos; Varas da
Infância e Juventude apinhadas de processos envolvendo adolescentes em conflito com a Lei;
instituições encarregadas da aplicação de medidas Sócio-educativas superlotadas, além da
aparente fragilidade do Estado, da Sociedade e da Família no enfrentamento destas situações.
Tomamos como exemplo, os problemas apresentados na FEBEM (Fundação Estadual para o
Bem Estar do Menor de SP) no período de 1995 a 2002, onde os adolescentes que cumpriam
medidas Sócio-Educativas em regime de internação se rebelaram destruindo equipamentos,
seqüestrando funcionários, e até mesmo matando-se uns aos outros. Estava nítido que nesse
quadro apresentado, os serviços oferecidos pela instituição não conseguia prestar um
atendimento condizente.
E dentro desse contexto, podemos considerar que, os desvios comportamentais dos
adolescentes que, acabaram por entrar em conflito com a Lei, podem apresentar um grande
risco para eles mesmos e para a toda a sociedade, na medida em que não forem sendo
observados, atendidos e impedidos, dentro das possibilidades legais, de realizá-lo.
Frente a essa situação e com a necessidade de evitar o uso do aparelho público, no
caso a FEBEM, no intuito de atender adolescentes em conflito com a Lei, no ano de 1997, a
Vara da Infância e Juventude da Comarca de Barueri, representada pela Meritíssima Juíza Drª
Leonete Maria da Silva Carlos, o então Prefeito da Cidade de Barueri, o Sr. Gilberto Macedo
Arantes e o Assessor de Cultura, Lazer e Criança o Sr. João Palma e equipe técnica,
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propuseram-se a desenvolver um programa, cujo objetivo era oferecer um atendimento SócioEducativo mais adequado aos adolescentes em conflito com a Lei que moravam na Comarca.
Legalmente isso era possível, pois, a Lei Federal 8.069 de 199016, no artigo 112 oferecia os
parâmetros necessários para a aplicação das Medidas Sócio-Educativas. A prioridade do
programa era atender àqueles cuja penalidade pudesse ser aplicada em regime aberto, de
acordo com as circunstancias e a gravidade do delito cometido, e, o mais importante, manter o
adolescente no convívio familiar e comunitário.
Este trabalho traz em seu bojo, contribuições importantes quando se trata de conhecer
melhor o cenário que envolve os adolescentes em conflito com a Lei. Inicialmente para mim,
que atuo como um dos protagonistas dessa história, pois estava inserido como responsável
técnico e também como Sócio-educador dentro do processo de atendimento Sócio-educativo,
percebi em 1997, e, tenho percebido por meio de conversas com representantes de vários
seguimentos sociais, que hoje, no ano de 2008, persiste uma resistência desses segmentos da
sociedade e das administrações públicas, em observarem unilateralmente as práticas antisociais dos adolescentes como um ato de irresponsabilidade. De certa forma, isso impede a
efetivação de programas públicos mais adequados de atendimento aos adolescentes dessa
categoria. Participar de um processo de organização e renovação de conhecimento ora como
pesquisador da literatura clássica, ora como Sócio-Educador interagindo com os adolescentes
do programa, me traz uma grande satisfação e realização profissional.
Quando surge a oportunidade de agrupar os conhecimentos de diversas áreas no
sentido de compreender as questões que envolvem adolescentes em conflito com a Lei,
percebi a oportunidade de também contribuir para o mundo acadêmico, pois segundo Pires
Ferreira,
“Cabe a Universidade possibilitar aos estudiosos a ordenação dos conhecimentos
científicos e encontrar maneiras de aplicá-los a situações reais com
responsabilidade, o que exige uma relação contínua e profícua entre a Universidade
e as diversas comunidades, tanto em nível local quanto global.” (Pires Ferreira in
Souza Neto e Andrade 2007:155).
No geral, este trabalho se propõe a conhecer melhor o assunto e, ao mesmo tempo,
oferecer uma nova alternativa, nascida da interface teórica com a prática no sentido de lidar
com os adolescentes em conflito com a Lei, além de mostrar que atitudes delituosas não
16
Lei Federal 8.069 de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente
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precisam passar desapercebidas e que a Lei oferece e determina, que os adolescentes sejam
punidos adequadamente sem perder de vista os direitos que lhes são peculiares por se
encontrarem em fase de formação biopsicossocial. Nesse sentido, todos saem ganhando, o
autor por poder conhecer mais, o mundo acadêmico por poder orientar e organizar a produção
de conhecimento de forma adequada sob a luz dos processos metodológicos dando sua
contribuição social, a sociedade que poderá fazer uso das alternativas que surgem, e, quem
mais ganha com isso, ao meu ver, são os próprios adolescentes na medida em que seus
direitos sejam respeitados.
Objetivamos especificamente com esta pesquisa, procurar entender alguns dos
aspectos que podem determinar: 1- como funciona o processo que envolve os adolescentes em
conflito com a Lei na cidade de Barueri; 2 - por quais motivos os adolescentes poderiam estar
agindo de forma agressiva conflitando com as Leis?; 3 - Essas atitudes agressivas acontecem
por vontade consciente?; 4 - As medidas Sócio-Educativas, por si só, poderiam reconduzir
esses jovens para uma melhor convivência social saudável?; 5 - Como as práticas e as técnicas
de aplicação das medidas Sócio-educativas podem contribuir com a construção do sujeito?
Assumimos a Hipótese de que, os desvios sociais, cometidos pelos adolescentes,
podem estar representando uma forma de “pedido de socorro” em decorrência da não
satisfação do conjunto de necessidades fundamentais da pessoa humana.
Para realizarmos nosso trabalho, observaremos 04 casos envolvendo adolescentes, que
foram escolhidos pela peculiaridade dos seus delitos. Dois deles referem-se ao cometimento
de pichação e os outros 02 referem-se ao cometimento de furto. No caso da pichação, duas
situações nos incomodavam: primeira, o grande número de ocorrências e o fato de
necessitarmos conhecer melhor o porque dos jovens escolherem esse tipo de prática como
forma de manifestação; segundo, o furto chamou atenção pelo fato de entendermos a sua
prática como uma atitude anti-social grave, e de constar na guia de encaminhamento um
agravante que é a questão da agressão física contra outro.
2.1. Os Princípios e as Bases da Pesquisa
Entendemos que a metodologia nos oferece modelos que ajudam a identificar e
mostrar qual é a melhor direção a ser tomada para atingirmos a meta, que, nesse momento, é
renovar as possibilidades da produção do conhecimento a respeito do trabalho SócioEducativo em regime aberto de adolescentes desviantes. Formular um modelo metodológico
requer uma reflexão fundamental. Ao se propor estratégias, observações e entrevistas é
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necessário ter em mente a clareza de onde se quer chegar. Nossa proposta tende na direção da
investigação Sócio-Educativa. Por ser esse um campo novo, tenho nessa pesquisa como
objetivo, familiarizar-me com o objeto17 e conseguir uma nova compreensão deste. ?
Inferimos que a ação Sócio-educativa envolve simultaneamente relações diretas entre
sócio-educando e sócio-educador o que implica na aplicação de um modelo de pesquisa
intervenção. Essa modalidade de pesquisa permite que ocorra entre sujeito e objeto novas
descobertas na medida em que,
“...as pessoas falam de sofrimentos, esperanças, desilusões, empolgamentos, e na
relação buscam soluções. Nela, os sujeitos e objetos não estão
mortos, são
protagonistas, ambos se constroem...”(Souza Neto, 2006:77).
Buscamos utilizar procedimentos próprios que nos permitissem um engajamento “...
nos processos de alteração e de mutação social nos quais vivem ou sofrem as pessoas que
estão no centro da história...”(Lévy em Souza Neto, 2006:76). Utilizei o modelo de
abordagem qualitativa que pode “referir-se
a conjuntos de metodologias, envolvendo,
eventualmente, diversas referências epistemológicas.” (Severino 2007:119). Por não
apresentar um modelo prévio, a abordagem qualitativa dentro de uma pesquisa de intervenção
pressupõe uma constante reformulação de modelos, dependendo sempre dos objetivos a serem
pesquisados. Então o delineamento desta pesquisa pressupõe colocar nosso problema em
termos de verificação empírica. Pretendemos nos apoiar em referenciais teóricos já
estabelecidos e nos dados dos relatos dos sujeitos coletados nas entrevistas. Nosso caminho
será orientado pelo estudo de caso que segundo Chizzotti (1995) não se preocupa com a
verificação da regularidade mas sim com a análise dos significados que os indivíduos dão às
suas ações.
As categorias com as quais trabalhamos ganharam mais visibilidade durante a analise
do processo empírico. Isso para que não fiquemos vinculados a uma observação pontual da
realidade. Além disso, entendemos objeto não apenas como coisas e pessoas mas também
como idéias, fatos, ideologias, comportamentos, cultura e conteúdos transmitidos na
aprendizagem. Portanto, tanto sujeito quanto objeto atuam um sobre o outro. E é essa relação
dialética que caracteriza essa pesquisa.
São poucas as informações existentes que possam explicar, com clareza, os fatores que
podem gerar o fenômeno dos desvios sociais envolvendo adolescentes. Por ser o objeto de
17
O objeto focalizado em nosso trabalho é conhecer melhor o adolescente envolvido na da aplicação de medidas
Sócio-Educativas em regime aberto de adolescentes desviantes.
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estudo dessa pesquisa um fenômeno de ordem social, necessitamos aproximar-nos dele
através de uma técnica que permita observar, compreender e descrever o fenômeno tal qual
ele é, e que possibilita também que se façam alterações dos conceitos existentes, deixando
uma abertura para pesquisas posteriores.
Recorremos pois à pesquisa de campo, utilizando as técnicas de entrevista diretiva e
não diretiva, onde observaremos a histórica da vida dos sujeitos envolvidos. Para tal, fizemos
uso dos seguintes instrumentos:
a) Entrevistas: Diretivas, onde buscamos identificar os elementos de ordem
consciente, ligados a cultura, a situação sócio-econômica, a escolarização à família, etc.; Não
diretivas, que consiste em fazermos uma exploração dos elementos de ordem inconsciente dos
sujeitos (conforme modelo do anexo 1);
b) Observações: São informações obtidas através da observação do que aconteceu
durante o processo, por exemplo, mudanças de hábitos;
c) Diário de campo: instrumento utilizado para anotar as peculiaridades durante a
realização da pesquisa;
A partir dos resultados obtidos, por meio do cruzamento das informações, faremos
uma análise qualitativa dos dados, relacionando-as com a literatura pesquisada a fim de se
buscar esclarecimentos necessários para comprovar ou não a nossa hipótese.
2.2. Cenário da Pesquisa
Os dados para essa pesquisa foram coletados no Município de Barueri, com registros
que datam desde o início dos trabalhos no ano de 1997 que foram atualizados até 2007. As
informações foram fornecidas pelas: Secretaria de Comunicação, Secretaria de Cultura, de
Promoção Social, pela WEB por meio do Site disponibilizado pela Prefeitura.
Barueri, está situada na zona oeste da região metropolitana grande São Paulo.
“Historicamente consta que em 21/11 de 1560, o Padre José de Anchieta rezou a
primeira missa
no aldeamento indígena de Barueri, elevando-se em 1850
à
categoria de Povoado. No ano de 1875, foi inaugurado o primeiro trecho da
Estrada de Ferro Sorocabana, passando a ser chamada de Povoado da Estação,
transformando-se no centro de distribuição de cargas para o interior do estado de
São Paulo. Em 1918, elevou-se à categoria de Distrito da Paz, com subprefeito
indicado.” (Elias Silva, 1995:15).
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É bom ressaltar que Anchieta foi um dos primeiros educadores a enfrentar as questões
da criança no Brasil. Não obstante, utilizava a crença que era melhor separá-los da família.
Essa crença foi utilizada por muito tempo.
No dia 24 de dezembro de 1948, pelo Decreto Lei n.º 5285/48 do Governo do Estado
de São Paulo, Barueri é emancipada. No ano seguinte, no dia 26 de Março de 1949, instalouse o Governo Municipal e a primeira Câmara de vereadores.
A cidade de Barueri mantém divisa com Osasco, Carapicuíba, Jandira, Itapevi e
Santana do Parnaíba. Possui uma área de 64 km2 tendo como vias de acesso a Rodovia
Presidente Castelo Branco, Estrada dos Romeiros, Rodovia Raposo Tavares e o Corredor
Oeste.
Segundo o censo do ano de 2004 do IBGE, a população de Barueri, possui 252.748
mil habitantes, dos quais 85.548 mil encontram-se na faixa etária de 0 a 19 anos. Os
indicadores apontam um crescimento populacional de cerca de 4,08% ao ano, é uma das dez
maiores taxas de crescimento do Estado de São Paulo. Possui ainda uma população flutuante
de 170.000 mil pessoas, o que indica uma taxa de empregabilidade expressiva. Sua população
economicamente ativa atinge a cifra de 119.000 mil pessoas, 59% masculino 41% feminino..
A força de trabalho do Município estava composta por mais de 500 indústrias e cerca
de 4000 cadastramentos em diversas atividades comerciais. Os ramos de atividade estão assim
distribuídos: Indústria, Comércio, Construção Civil, Serviços de Utilidade Pública, Extração
Mineral, Administração Pública, Agropecuária, entre
outros. Ainda, segundo o IBGE,
existiam no Município mais de 70.302 residências com o n.º médio de 3,4 pessoas por família.
Possui um programa municipal de saúde,
realizado
pelo SAMEB (Serviço de
Assistência Médica de Barueri). Contando com uma rede de 16 Unidades Básicas de Saúde e
04 Prontos Socorros 24:00h, que realizam 40.000 consultas por mês; 01 posto de atendimento
de Saúde Mental que realiza mensalmente 7200 atendimentos; 01 Maternidade com 32 leitos
e capacidade para 400 partos ao mês; Laboratório de Análises Clínicas que realizava cerca de
16.000 exames por mês; Farmácia que distribui remédios gratuitamente. Realiza também
encaminhamentos para clínicas conveniadas, quando os serviços não estão disponíveis no
Município. Conta ainda com 1 Centro de atendimento fisioterapêutico, 1 Centro de orientação
sorológico, 1 Centro de reabilitação de drogaditos, 1 Centro de atendimento odontológico
Segundo o IBGE (2007) Barueri possui 48.315 alunos no ensino fundamental
divididos em escolas públicas – 44.661 – e escolas privadas – 3.654 – . Possui 86 escolas
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públicas entre creches, EMEIS, EMEFs e EMEIEFs; 01 Escola de Educação Especial; 02
Institutos Tecnológicos de Barueri (ITB); 01 Fundação Instituto de Educação de Barueri
(FIEB); Programa de ensino supletivo noturno; 2 escolas privadas de Ensino Superior. Possui,
um programa de Merenda Escolar com produtos enriquecidos e em natura que foi reconhecida
como a melhor merenda oferecida às crianças, no 16º Congresso Internacional de Nutrição
realizado no Canadá .
O programa de Assistência Social tinha como campo de ação, a proteção à família, à
maternidade, à infância, à adolescência e à velhice. Possui 02 postos de atendimento, os quais
contam com Plantão Social que auxilia na resolução de necessidades emergenciais; 01 Casa
da Criança com 20 vagas atendendo àquelas que se encontram em situação de pobreza e
risco, 01 abrigo com 28 vagas para o acolhimento de idosos; centro de convivência do idoso
(Grupo Vida); doação de equipamentos para pessoas portadoras de deficiência; convênio com
instituições para acolhimento provisório de adolescentes; programas de: distribuição de cestas
básicas, agasalhos e brinquedos, geração de renda e de semi-profissionalização, e do primeiro
enxoval para recém nascidos. A partir de 2003, a Secretaria de Ações Sociais passou a atender
o programa Sócio-Educativo em regime aberto, assistindo os Adolescentes em conflito com a
Lei que estão em liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade.
Possuía a Casa da Cidadania onde funcionam de modo integrado os Conselhos de
Assistência Social, Tutelar, Meio Ambiente, Dos Direitos da Criança e do Adolescente e
Educação. Isso para facilitar a constituição de uma rede de proteção à criança e ao
adolescente.
Na área esportiva, Barueri atendia cerca de 10.256 alunos, divididos em 17
modalidades esportivas. Sua rede de atendimento conta com 9 praças de esporte, 2 academias
de ginástica, 26 quadras esportivas, 14 ginásios poliesportivos, 1 estádio e um centro de
esportes aquáticos. Na área cultural, por meio da Secretaria de Cultura, Comunicação, Lazer e
Criança, são oferecidas para a população 14 oficinas culturais ligadas às áreas de: dança,
teatro, música e artes plásticas, que atendem mensalmente a 1618 pessoas de 04 a 17 anos; 11
unidades de Bibliotecas,
distribuídas pelos bairros do município, atendendo a mais de
300.000 pessoas por ano, que, além de suas atividades normais, desenvolvia programas de
lazer e cultura para todos, tais como: “Biblioférias”, lazer para crianças no período de férias
escolares; “Poemando”, apresentação de jovens artistas das oficinas de teatro que recitam
trechos de obras e poemas dos escritores brasileiros; “Hora do conto”, apresentação teatral de
contos infantis para crianças da região; em ação conjunta com as oficinas de artes, o projeto
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“ASAS” proporciona às pessoas reclusas na cadeia pública livros para o exercício da leitura e
cursos de desenho e pintura; um Centro de Apoio ao Desenvolvimento Educacional
(Brinquedoteca Municipal), que atende de 400 crianças diariamente, e, que possui uma
unidade volante que visita os bairros da cidade, levando recreação e gincanas educativas;
desenvolve junto aos adolescentes os programas de: Embelezamento Urbano – em que os expichadores do município são convidados a participar da recuperação e manutenção dos
equipamentos públicos recebendo um ônus pelos trabalhos –, e o “Papo móvel” – Um ônibus
equipado com material de recreação voltado para os adolescentes, que visita os bairros no
período noturno.
Essas políticas serviam como estratégias para ajudar, as crianças e os adolescentes, a
reordenar a forma de pensar, de sonhar e de confabular. No que se refere aos adolescentes,
apesar de todos esses programas, ainda há uma necessidade de investimento e de novos
programas para suprir a demanda e responder às mesmas.
2.3. O Perfil do Adolescente de Barueri
São chamados de inseguros, que pertencem mais ao o grupo do que a família, que
transam muito, que são promíscuos, que não pensam, não lêem, não estudam, não desejam
participar e nem contribuir socialmente, sendo voltados a um consumismo exagerado. O
Adolescente é muito criticado e pouco ouvido. Como será que o próprio adolescente se
percebe?. Hipóteses e mais hipóteses são levantadas, no entanto, como será que realmente o
adolescente, pensa e sente sobre o mundo a sua volta?. Vislumbramos que melhor maneira de
se responder isso, seria perguntando diretamente a eles, pois representam 1/3 da população da
cidade ou seja cerca de 85.000 mil jovens, o que lhes dá um grande poder de
representatividade. Com o objetivo de traçar um perfil da população adolescente, em 1999 a
Secretaria de Cultura, Comunicação, lazer e Criança, realizou uma pesquisa cujo objetivo era
traçar um perfil do jovem de Barueri. Essa pesquisa foi realizada com um universo de
cinqüenta adolescentes entre 14 e 18 anos de idade, que responderam um questionário de 84
perguntas que sondavam aspectos culturais, sociais, educacionais, econômicos, entre outros.
Dessa pesquisa foi possível encontrar os seguintes resultados:
“56% dos jovens entrevistados têm mais de três irmãos; 60% vivem
apenas com um dos pais; 74% deles não trabalham; 70% das famílias
vivem com uma renda mensal de até três salários mínimos; 72%
estudam na rede pública; 80% daqueles que estudam o fazem por
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acreditar na importância do estudo para a sua vida; 62% consideram
que o que aprendem na escola tem tudo a ver com o de que precisará
para a sua vida profissional; 54% deles já escolheram uma profissão;
quanto à ocupação do tempo livre: 1º lugar - esportes, 2º lugar –
bater papo com os amigos, 3º lugar – assistir à TV e ouvir música, 4º
lugar – desenhar e ir a igreja, 5º lugar – ler e ir a bares e
restaurantes, 6º lugar – ir ao cinema e teatro; quanto ao consumo de
drogas, 18% usam ou já tomaram contato com algum tipo de
entorpecente; cerca de 56% já tiveram contato com outros tipos de
substancias, tais como: álcool, anfetaminas
e solventes; dos
entrevistados, apenas 20% ainda não tinham tido a primeira
experiência sexual; dos entrevistados do sexo masculino, 64% usam
preservativo durante as relações sexuais. Das entrevistadas, apenas
37% usam preservativos”.(Núcleo de apoio técnico multidisciplinar
da Secretaria de Cultura do Município de Barueri, 1999).
Assumimos que, na elaboração do processo adolescente, coincidindo com o
surgimento da capacidade reprodutora, o psiquismo humano reestrutura-se. O jovem adquire e
desenvolve potencialidades e, simultaneamente, experimenta um complexo processo de
perdas – reais e imaginárias. Durante esse período, o processo de desenvolvimento está
vulnerável e suscetível às influências de pressões internas e externas; novos valores éticos e
morais estão sempre sendo incorporados à identidade que se forma, sendo a adolescência um
período que apresenta um grande potencial isso. Dessa forma podemos enxergar que o
potencial e a necessidade dos adolescentes de Barueri são iguais à de todos os adolescentes,
pois eles também carecem de atenção, orientação, proteção e preparação para conquistar seu
espaço na sociedade e adquirir a consciência social. Os resultados da pesquisa retratam
peculiaridades que evidenciam um quadro de carência afetiva, de falta de orientação e de uma
maior convivência familiar, elementos presentes no cotidiano dos adolescentes em conflito
com a Lei, e correm os mesmos riscos destes.
2.4. Situando o Adolescente em Conflito com a Lei
O SINASE apontou que, no Brasil, até o ano de 2006 cerca de 14.074 adolescentes
cumprem medidas Sócio-Educativas em regime de internação, e, cerca de 45.000 cumprem
medidas Sócio-educativas em regime aberto. Por sua vez, em São Paulo, segundo informações
fornecidas pela FEBEM – Atual Fundação Casa –, anualmente cerca de 4.000 adolescentes
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encontram-se cumprindo Medida Sócio-Educativa de privação de liberdade, enquanto que os
demais cumprem em regime aberto.
Para situarmos melhor, a importância da nossa pesquisa, podemos observar no quadro
comparativo nº 01, a relação diferencial entre os municípios da região grande oeste da cidade
de São Paulo, a qual Barueri está inserida, no período de maio de 1999 a junho de 2000, no
que tange a aplicação de medidas sócio-educativas. Os dados foram obtidos junto ao
FSEADE e a FEBEM do Estado de São Paulo.
Gráfico nº 03 – Quantidade de adolescentes infratores da zona Oeste de São Paulo
População
Nº de habitantes
Liberdade
De 10 a 19 anos
Assistida
Internação
Total
Proporções
Jov. X A. I.
Barueri
208.426
44.095 / 21%
105
28
133
0,30%
Carapicuíba
367.646
75.503 / 20,5%
83
26
109
0.14%
Osasco
672.548
128.777 / 19,14%
197
104
301
0,23%
385
158
543
Total
Fontes : SEADE e FEBEM São Paulo 1998.
Diante desses dados, pudemos perceber que, apesar do município de Barueri
apresentar um número menor de habitantes o percentual de adolescentes transgressores é o
maior da região. Segundo o SINASE, hoje só em regime fechado são atendidos, no Brasil,
39.578 adolescentes. A Região Sudeste apresenta o maior número, atendendo 22.022
adolescentes. Para responder a exigência dessa demanda, o Poder Público de Barueri,
atendendo um dispositivo do ECA, elaborou um programa de aplicação de medidas sócioeducativas de prestação de serviços à comunidade. O objetivo desse programa, não era,
meramente, atender um cumprimento de decisões judiciais, mas sobretudo, contribui para que
o adolescente possa elaborar um novo “projeto de vida”.
Do período de 1997 até outubro de 2000, em Barueri, foram acompanhados 158
adolescentes que realizaram reparação de danos, prestaram ou prestam serviços à
comunidade. Apresentamos no quadro 2, a evolução anual dos números referentes, aos
adolescentes transgressores, da comarca de Barueri, por sexo, por medida sócio-educativa e
por período de cumprimento da medida.
As infrações cometidas que mais aparecem, pela ordem foram as seguintes: furto,
agressão, pichação, dirigir sem habilitação, arrombamento, porte de ilegal de arma, roubo,
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danos ao bem público, deterioração de coisa alheia,
assalto/atentado ao pudor, lesões
corporais, porte e uso de entorpecentes. Conforme no quadro abaixo.
Figura nº 04. A evolução anual e as medidas sócio-educativas.
Medida
Local de
Ano 1997
Ano 1998
Ano 1999
Ano 2000
Total
aplicada
moradia
Sexo mas.
11
47
48
42
148
Sexo Fm.
02
04
01
03
10
Reparação de dano
02
08
05
00
15
3 dias
01
00
00
00
01
1 mês
00
03
00
00
03
2 meses
06
09
05
02
22
3 meses
01
24
36
35
96
06 meses
03
07
02
08
20
Prestação de S. a comunidade
12 meses
01
Barueri
129
Santana do Parnaíba
24
Osasco
01
Jandira
02
Carapicuíba
02
Transferidos p/ outros locais
05
Total
13
51
49
01
45
58
Fonte: Programa Sócio-educativo da Prefeitura Municipal de Barueri
A partir desses dados, escolhemos como foco de observação e de investigação
questões ligadas às práticas anti-sociais, entendendo que tais atitudes comportamentais são
percebidas, pelas teorias que estudam o comportamento humano, psicanálise e psicologia,
como o centro das tendências anti-sociais. Para nós, esses atos, podem ser considerados como
“pedidos de socorro”, formas de expressar, segundo Caliman, “uma situação de mal estar”.
2.5. As Medidas Sócio-Educativas em Regime Aberto
Em 1997, atuando como Diretor Técnico do Departamento responsável pelo
desenvolvimento de programas, voltados ao atendimento de crianças e adolescentes, recebi
alguns jovens enviados pela Vara da Infância e Juventude da Comarca de Barueri, os quais
necessitavam cumprir medida sócio-educativa de prestação de serviços à comunidade, por
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terem, de alguma forma, rompido as barreiras da lei. A medida sócio-educativa aplicada
consistia em cumprir, durante três meses 8h semanais de serviços gratuitos à comunidade. De
pronto, foram incluídos no programa de recreação proporcionado pelo município. Esse
programa acontecia em todos os finais de semana, mais precisamente aos Domingos à tarde.
Isso facilitou a todos, pois necessitávamos de ajuda com os equipamentos e as atividades e
nenhum deles seria prejudicado, no que diz respeito à escolarização e nem ao trabalho, se
fosse o caso.
Aproveitamos os referenciais oferecidos pelo ECA, e iniciamos a elaboração de um
programa mais abrangente que observasse de maneira diferente e especial esses jovens.
Nascia aí o programa que apresentaremos a seguir.
2.6. O Programa Sócio-Educativo
O programa Sócio-Educativo de adolescentes transgressores de Barueri tem como
objetivo geral garantir, adequadamente, o atendimento e o acompanhamento de adolescentes,
observando sua fase peculiar de desenvolvimento biopsicossocial.
Como objetivos específicos procuramos auxiliá-los a encontrar sua identidade pessoal
e social; a conhecer e a desenvolver conceitos éticos e morais de convivência social; a reequilibrar seus estados cognitivo e emocional; a dar suporte educacional, assistências:
jurídica, social, médica, e, profissionalizante, estendendo os serviços também às suas famílias.
Atualmente, o programa funciona junto ao serviço de Assistência Social de Barueri que,
recebe, entrevista e encaminha o jovem para o local onde prestará serviços à comunidade.
Contam com um corpo técnico multidisciplinar, que analisam cada caso e acompanham
individualmente os jovens, bem como suas famílias.
2.6.1. A Sondagem
Os jovens são encaminhados pelo Fórum, por meio de um formulário próprio, que nos
informava a duração da prestação de serviços, bem como o tipo de transgressão cometida e o
número do processo. Ao chegarem nas dependências da Secretaria de Cultura, ele e seu
responsável (pai, mãe ou tutor legal) passam por duas formas de entrevistas cujo objetivo é o
de conhecer melhor o adolescente e sua família. A primeira delas, diretiva, era aplicada em
ambos. A Segunda, não diretiva, era aplicada somente no adolescente durante as seções de
sensibilização Sócio-Educativas.
Para garantirmos que não houvesse interferência, o jovem era encaminhado para um
ambiente sossegado, onde podia responder as questões da maneira que quisessem. Enquanto
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isso, ao mesmo tempo, se explicava ao responsável que o acompanhava, o modo operacional
do programa, onde eram colhidas mais informações sobre o adolescente em questão.
Com relação ao adolescente, o primeiro procedimento, a entrevista diretiva, nos
proporcionava uma avaliação do grau de interatividade dele: com a família, com a escola,
com seus hábitos culturais e com mais alguns aspectos comportamentais e sócio-econômicos.
Já para os pais, as perguntas estavam direcionadas ao descobrimento do grau de interação e de
acompanhamento, por parte deles, da conduta diária do filho.
2.6.2. Questões Diretivas
•
Identidade pessoal: nome idade, endereço completo, sexo, local de nascimento;
apelido, se gosta ou não de ser chamado pelo apelido.
•
Situação escolar: se o sujeito estuda ou não; se não, por quê?; se sim, nome da
escola, horário, série, grau; se já ele repetente escolar, quantas vezes e em quais séries; se
possui dificuldade em alguma disciplina, e com qual disciplina se dá melhor; auto-avaliação,
se é um aluno: ótimo, bom, regular, ruim e por quê? Se os conteúdos passados na escola são
úteis para a sua vida futura, por quê?.
a) Dados de cultura e lazer: que locais costuma freqüentar; que atividades de lazer ele
costuma fazer; se ele gosta ou não de assistir à TV, quais os programas preferidos; se ele
gosta de ler e o que costuma ler; se ele gosta de música e qual é estilo preferido; se ele
pratica algum esporte, qual é o preferido.
b) Dados sócio-econômicos: nome, idade, profissão, grau de instrução e situação
conjugal dos pais; renda familiar; com qual deles mora, se forem separados; se possui
irmãos, quantos são; qual é a sua religião e a da família; qual o parente com quem ele
se dá melhor, por quê?.
c) Dados comportamentais: se o relacionamento com os professores e demais alunos era
bom, ou ruim e o por quê disso; se o relacionamento com os pais eram bons ou ruins e
o por quê; Como é tratado em casa pelos demais; como vê a vida conjugal dos pais; se
já fez uso de alguma substância química (crack, maconha, cocaína, cola, bebidas
alcoólicas entre outros) e o por quê; Se ainda usa tais substâncias ou já parou e o por
quê? Convivia com algum grupo de amigos, se ia a clubes, etc.; com que freqüência:
sempre, nunca às vezes? Desenvolvia algum tipo de sentimento ou de necessidade, do
tipo: tristeza, ficar em silêncio, necessidade de estar só, sentir-se só e abandonado,
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ansiedade, desânimo, raiva, vontade de agredir pessoas e coisas e vontade de fugir de
casa, por quê?
2.6.3. A Entrevista não Diretiva
As atividades não diretivas buscavam, na técnica projetiva, sua sustentação, como o
nome já o indica, e então, procuramos resgatar os conteúdos que estavam latentes. Tratava-se
do desvelamento das partes do sujeito, depositadas nos objetos, que aparecem como suporte
da identificação e de mecanismos e atuam diante de uma instrução que obriga o sujeito a
representar situações estereotipadas e carregadas emotivamente.
Para um melhor entendimento dos problemas que envolvem os adolescentes
desviantes, nos interessava especialmente, o exame dos conteúdos manifestos no processo,
relacionando-os com os sentimentos de medo, solidão abandono, alegria, tristeza entre outros,
associados às situações representadas. Entretanto, concentramos a atenção na eficácia e nas
limitações dos recursos cognitivos empregados
pelos adolescentes para organizar sua
descarga emotiva. Nesta perspectiva, registramos a peculiar modalidade com a qual a
inteligência trata o objeto, reconhece-o e o associa com sua experiência. A instrução das
atividades projetivas impõe, também ao avaliado uma situação que terá de resolver através de
uma construção, quer na representação, quer na fantasia; uma relacionada com a imagem, a
outra com a forma de assimilação simbólica, lúdica e verbalizada.
Para tal foram utilizadas as seguintes dinâmicas: como você define as coisas mais
importantes em uma família? Cite alguma coisa que acontece com freqüência dentro de casa;
Como você acha que aprende as coisas? Se você fosse um sonho, como seria? Se você fosse
uma paisagem, como seria; Se você fosse um personagem, quem seria; Se você fosse uma
música, qual seria; Se você fosse um animal, qual seria; Se você fosse um texto, como seria;
Escreva dez palavras e as associe livremente; Faça uma pergunta ao mundo, depois, dê a sua
resposta.
Buscamos nessa perspectiva agir junto aos adolescentes desviantes, de forma a ajudálos a perceber que suas práticas não refletiam apenas um sentimento de dor contra a
sociedade, e sim, que era também um reflexo de uma luta travada interiormente. Segundo
Souza Neto, “Assim como o sujeito não existe desvinculado do cotidiano ou das relações
sociais, da mesma forma podemos dizer que ele não existe sem vontades e desejos”(Souza
Neto, 2001:78).
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3 – O TRANSVIVER NO ESPAÇO SÓCIO-EDUCATIVO
“A medicina cura as doenças do corpo, a sabedoria livra a alma das paixões”
DEMÓCRITO
___________________________________________________________________________
3.1. Aprender a Aprender a Transviver
No decorrer de nossa dissertação, buscamos evidenciar, do ponto de vista teórico,
alguns dos elementos que estão presentes na história do sujeito envolvido no desvio social que
cumpre medida Sócio-Educativa de prestação de serviços à comunidade. Partimos do
pressuposto que, as medidas Sócio-Educativas podem ser entendidas como um espaço de
atuação transdisciplinar18, em que o sujeito tem a oportunidade de re-articular as dimensões
que envolvem seu modelo de convivência social, as emoções vividas a sós e em grupo e a
capacidade de sonhar, de aprender e de realizar. Por essa ótica, acreditamos que o adolescente
que pratica um desvio social, de uma forma ou de outra, pode ter estas dimensões
desarticuladas. Também podemos constatar que o espaço Sócio-Educativo oferecido pela
Prefeitura do Município de Barueri, é um espaço de circulação de conhecimento. Dentro desse
espaço se buscava entender o que podia ter acontecido anteriormente na vida desses jovens,
ouvindo de suas próprias bocas as cenas negativas que marcaram as suas vidas.
Assumimos a idéia de Aulagnier, afirmando que,
“...um dos trabalhos psíquicos importantes que o adolescente necessita fazer para
transitar pela adolescência é construir (se) um passado, algo que parece em
18
Segundo Morin, significa uma ação onde implica uma interface entre várias disciplinas, diferente do trabalho
paralelo interdisciplinar.
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princípio, paradoxal. Estamos acostumados a escutar que, os adultos digam aos
adolescentes – deve-se construir um futuro”.(Fernandez, 2001:68).
Acreditamos, então, que a partir do momento em que o sujeito dá início ao resgate de
sua história de vida, ele começa a transcrever sua história, assumindo uma posição de
navegador de sua própria vida, ou seja torna-se, segundo Fernandez (2001), um sujeito autor.
Podemos denominar o sujeito autor como aquele sujeito que é capaz de aprender a
“transviver19”, mesmo diante de situações adversas. Descobre formas e alternativas de lidar
com as situações do dia-a-dia buscando comandá-las e não ser comandado por elas. Os casos
que serão analisados a seguir, têm por objetivo, apresentar a maneira como cada indivíduo foi
re-significando a sua história e aprendendo a transviver.
No processo de atendimento dos adolescentes transgressores, que receberam a
aplicação da medida Sócio-Educativa de prestação de serviços à comunidade apareceram, em
alguns momentos, questões latentes e outras formas de manifestações. De uma forma ou de
outra, podemos inferir que, a transgressão expressa um “pedido de socorro”, o qual indica a
necessidade de ajuda ao transgressor, para que possa, dentro dessa complexidade, interagir
com a objetividade e a subjetividade.
A complexidade da construção do sujeito, do nascimento à morte, tem despertado um
interesse de estudo em várias áreas do conhecimento. Construir, elaborar e formar, são
conceitos que surgiram através dos tempos como respostas aos anseios dos diversos
estudiosos e pesquisadores. Certamente, esses conceitos têm um valor inestimável e sempre
convergem para os mesmos pontos: conhecer melhor o processo que envolve a satisfação das
necessidades, afim, de se garantir a sobrevivência e a satisfação dos desejos e das vontades.
Durante a história da humanidade, surgiram vários conceitos a respeito da construção
biopsicossocial do ser humano. Tomamos como um exemplo, o povo grego. Eles acreditavam
na dualidade corpo e espírito e que sua formação estava atrelada a elementos internos e
externos, sujeitados a uma conduta moral de relações em favorecimento da manutenção da
vida.
Na mitologia grega, descobrimos um caso típico de cumprimento de medida SócioEducativa. O caso de Heracles (Hércules), que foi condenado a prestar serviços à comunidade
19
“É aprender a retirar de si mesmo e do meio ambiente em que estão inseridos, os elementos necessários, para
continuar vivendo de forma saudável, ou seja, aprender a aprender a viver extraindo energias da própria
vida”.(Fernandez, 2001).
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por ter matado sua esposa e filhos, influenciado pela deusa Hera que por ele, era apaixonada
e sentia ciúmes. O Oráculo determinou que Heracles servisse por dez anos o Rei de Tirinto,
Eristeu, conhecido como “O Covarde”, que por sua vez ordenou que Hércules cumprisse dez
missões consideradas impossíveis. (Enciclopédia Larousse Cultural 1998:2947). Dessa
passagem mitológica, encontramos os indícios
presentes das pulsões de vida e morte
representadas respectivamente pelo amor e o ódio, importantes elementos e sempre presentes
na construção das relações humanas, e, de como outras pessoas podem nos influenciar ao
cometimento de erros.
Com esses elementos, o amor e o ódio, apresentam-se mais dois aspectos que
envolvem a formação das relações sociais e da personalidade do ser: as virtudes e as
vicissitudes, percebendo que, nas vicissitudes encontramos os aspectos que distinguem as
fraquezas humanas e nas virtudes apresentam-se às possibilidades de superação dos conflitos
e das fraquezas dos Homens. Assim sendo, podemos inferir que os conflitos podem se
manifestar com maior intensidade na adolescência, e, é também nesse período, que
encontramos o momento propicio para uma intervenção positiva afim de ajudá-lo a resolver
tais conflitos, além do que, favorece a inserção, em seu contexto, dos elementos que compõe
as virtudes.
Enxergamos no espaço sócio-educativo a possibilidade de criar um ambiente de
descontração, de relaxamento, de um relacionamento de confiança entre o sócio-educando e o
sócio-educador, na sentido de facilitar a busca do “Eu” pelo desviante. Winnicott propõe que,
para isso acontecer é necessário que a criatividade seja exercitada. Para Winnicott,
“É através da apercepção criativa, mais do que qualquer outra coisa, que o indivíduo
sente que a vida é digna de ser vivida. Em contraste, existe um relacionamento de
submissão com a realidade externa, onde o mundo em todos os seus pormenores é
reconhecido apenas como algo a que se ajuste ou a exija adaptação. A submissão
traz consigo um sentido de inutilidade e está associada à idéia de que nada importa e
de que não vale a pena viver a vida. Muitos indivíduos experimentam suficiente o
viver criativo para reconhecer, de maneira totalizante, a forma não criativa pela qual
estão vivendo, como se estivessem presos à criatividade de outrem, ou de uma
máquina” (Winnicott, 1975:95)
Pode ser então que, cometer delitos por conta de regras grupais ou por contingência
das próprias circunstâncias de vulnerabilidade, tal prática funcione como uma forma de viver
a criatividade de outrem. Winnicott acena que é “no brincar, e somente no brincar, que o
indivíduo, criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é
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somente sendo criativo que o indivíduo descobre seu Eu (self)” (Winnicott, 1975:80). E é
nessa perspectiva que acreditamos na possibilidade que a aplicação das medidas SócioEducativas oferecem quando seu espaço favoreça a manifestação criativa. Podemos entender
que, tanto as medidas sócio-educativas bem como os espaços sócio-educativos tornam-se
estratégias que oferecem condições para o sujeito re-significar a sua história e aprender: a
aprender, a fazer, a ser e a conviver, isto significa, aprender a transviver. Concebemos que
fazer um sujeito ator e fazer dele um ser aprendente, é mostrar para ele o caminho para
transviver “... do que se aprende, sustentar-se de seus frutos, nomear-se como identidade
pessoal na construção do próprio sonho, e universal em suas compartições com o sonho de
outros “. (Fernandez, 2001:51).
As medidas Sócio-Educativas só têm sentido quando, elas ajudam o sujeito a
transviver, isto é, sair de si, sem negar a sua história, apropriando-se da mesma, e, “criando
novos projetos que possam ajudá-lo como sujeito autor” (Souza Neto, 2001).
Portanto, talvez, possa afirmar que, o sujeito autor vive num processo contínuo de
constantes mudanças, por isso, acredito que o sujeito das políticas Sócio-Educativas é,
simultaneamente, aprendente e ensinante. Em decorrência de todo esse ambiente de discussão,
conceituei que isso ultrapassa as concepções mecanicistas e lineares de formação do sujeito.
A capacidade criativa e transformadora de lidar com fantasmas do passado surge com grande
força, e, leva o sujeito para além do que propõe Silva, que limita tridimensionalmente o ser
cognoscente. O território das medidas Sócio-Educativas, é o lócus que pode ajudar o
desviante a potencializar as suas virtudes e qualidades, independentemente das suas
vicissitudes.
Ë por esta ótica que, sócio-educadores, sendo eles: psicopedagogos, psicólogos,
professores, assistente sociais entre outros, tem condições de ocuparem esse espaço para
despertar no sujeito ator, o desejo de se transformar em um sujeito autor. Esta preocupação,
de subsidiar o desviante a fazer a passagem de sujeito ator para sujeito autor, deve ser uma
constante nos programas de medidas sócio-educativas. Salientamos que os nomes utilizados
são fictícios, a fim de preservar a identidade dos sujeitos, por serem adolescentes.
3.2. Os Pilares da Educação Presentes no Atendimento Sócio-educativo
Cabe aqui, agora, compreendermos como a prática Sócio-Educativa pode contribuir
para a re-significação da história dos sujeitos e depois para o seu transfazer.
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3.2.1. Aprender a Aprender na Ausência dos Referenciais Familiares
Analisaremos a história do jovem Cleber Juvino. O adolescente fora encaminhado
pela VIJB –Vara da Infância e Juventude de Barueri – para dar cumprimento de medida
Sócio-Educativa de prestação de serviços à comunidade. A guia de encaminhamento trazia
consigo as seguintes informações:
“Tem 16 anos de idade, nasceu e mora em Barueri. Está na 6ª série do ensino
fundamental, repetindo o ano três vezes, duas vezes a 4ª série e uma vez a Quinta
série. Não gosta de estudar e não tem idéia do porquê. Tem grandes dificuldades
com a disciplina de Matemática, achando Educação Física e Educação Artística as
mais fáceis. Julga-se um aluno regular, porque consegue completar algumas
atividades escolares e outras não, porém, acha que sem estudo não somos nada.
Nunca trabalhou e gostaria de exercer a profissão de mecânico de autos. Deve
cumprir 3 meses de prestação de serviços à comunidade por ter praticado furto.”
(Guia de encaminhamento do Fórum, 2000).
De antemão, pudemos perceber um quadro, aparentemente, de fracasso escolar, por
conta da repetência consecutiva e de falta de estímulo para o estudo. Salientamos que
qualquer desequilíbrio em uma das dimensões cognoscentes, pode afetar o bom andamento
das demais.
Assim sendo, percebemos a necessidade de aprofundarmos uma pouco mais em nossa
pesquisa, no intuito de tentar relacionar as situações declaradas pelo adolescente, ao que
possivelmente pode tê-lo influenciado ao desvio. Reafirmamos nossa proposta, de que
transgressão poderia estar funcionando como um “pedido de socorro”, o que desafiava nossa
sensibilidade para tentar compreender esse apelo.
Durante as entrevistas surgiu um fato que incomodava bastante o jovem Cleber, fato
esse ligado à violência física praticada pelo pai conta ele:
“... meu pai me bate muito, desce o couro legal, quando eu faço alguma coisa que
ele não gosta. Nada do que eu faço, ele gosta, tá tudo errado pra ele. Então eu fico
perdido, não entendo o que fazer.” (C.J.- diário de campo, 2000).
Na visão do adolescente, o pai nutria idéias equivocadas sobre a educação dos filhos.
Era uma prática cultural do pai utilizar a violência física como uma forma de educar. Toda
atitude, comum a qualquer adolescente, era recebida como um insulto, que resultava em
surras violentas sem nenhuma explicação. Segundo Cleber:
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“Moro com meus pais e mais um irmão. Me dou bem com eles por achá-los legais.
Só meu pai é muito bravo. Ele tem trinta e cinco anos, trabalha como motorista de
ônibus, estudou até a 6ª série. Não sei a idade da minha mãe, ela trabalha como
doméstica e mal sabe ler. Apanhei violentamente várias vezes dos meus pais.
Qualquer coisa que eu fizesse na rua, para eles eu estava errado e apanhava.” (C.J.
– diário de campo, 2000).
Tal relato nos possibilita visualizar os acontecimentos da seguinte maneira: as atitudes,
sempre, violenta dos pais, pode ter atrapalhado o desenvolvimento da capacidade de
discernimento do adolescente, gerando dificuldades em entender melhor o que era certo e
errado, além de reprimir a espontaneidade em inter-relacionar-se com os outros.
“... eu gosto de ficar calado, porque não tenho assunto. Prefiro ficar só e estou
sempre ansioso com medo da onda de violência. Também tenho muita preguiça.”
(C.J.- diário de campo, 2000).
Durante os encontros percebemos um adolescente: introspectivo, ansioso e sem
estímulo. Sua aparência era impecável: apresentava-se sempre bem asseado, cabelos cortados
e devidamente penteados. Isso chamou minha atenção, pois, essa não me parecia ser uma
aparência comum entre os adolescentes desviantes. “na maioria das vezes, os adolescentes
desviantes que participavam dos encontros, trajavam-se de maneira bem informal”(Nota do
autor, DC:2001). Notei ainda, uma rigidez postural de Cleber, seus movimentos eram
contidos e tímidos. Para ele, a convivência com o grupo de profissionais e adolescentes,
participantes do programa, foi inicialmente difícil. Com o passar do tempo, aprendeu a
conviver melhor com eles, e com o seu conflito. Todos ali tinham seus próprios conflitos, e a
medida em que os socializavam, iam juntos se ajudando. Cleber aos poucos conseguiu contar
o que realmente aconteceu:
“O Nico é quem fez o convite, falou pra gente sair e zoar por aí. Eu não queria ir,
nem meu primo, mas, eles começaram a dizer que nós éramos covardes, não tinham
coragem de sair com eles, além de covarde me chamaram de outras coisas. Eu não
quis ficar para trás, e depois eles ficam falando um monte de mim por aí. Depois
que fomos andar, nós encontramos um menino andando de bicicleta e o Nico falou
que esse menino tinha “folgado” com ele, e disse pra gente ir lá com ele e tomar a
bicicleta dele. Depois disso fomos parar na delegacia e depois no Fórum.” (C.J. –
diário de campo, 2000).
Nesse discurso encontramos uma indicação do desejo de pertença a um grupo, que não
era o familiar. Nesse grupo, também fazia parte seu primo, que estava junto no momento da
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prática delituosa. O medo a e vergonha de ser humilhado pelo grupo resultou na sua
participação no furto. Esse quadro reforça a questão das pressões externas terem mais força
sobre Cleber. Ele sabia que era errado, porém, sucumbiu à filosofia do grupo.
O fato de procurar atividades fora do lar, mesmo sem o conhecimento e a sem
permissão dos pais, pode ser um indicador forte um sentimento de rejeição. A rejeição é outro
fator que reforça a submissão aos ideais de um grupo que não é a família. Parece-me que, para
ele, pertencer a um grupo compensa a rejeição do lar. Essa rejeição pode ser simbólica, e, por
ser um jovem introspectivo apresenta dificuldade em resolver esse conflito, refletindo um
possível sentimento de castração. Tal situação, pode, tê-lo conduzido a desenvolver
problemas como a de sua sexualidade; um sinal disso, é o fino trato de sua aparência já
mencionada. As ações do grupo acabaram atuando para Cleber como um mecanismo de
compensação para esses conflitos..
Para Cleber, foi durante sua participação no programa Sócio-Educativo que teve a
oportunidade real de poder contar sua história e ser ouvido por alguém. Na Delegacia e no
Fórum só se preocuparam em qualificar seu ato e aplicar-lhe uma punição à transgressão
cometida. Em casa, em decorrência da prática Cleber mais uma vez foi agredido fisicamente
pelos pais.
Diferentemente dessas ações, no programa Sócio-Educativo tentamos desenvolver
mecanismos que favorecessem o re-significar da sua própria história e o aprender a transviver.
À medida que Cleber participava do programa, ele falava de seus conflitos e ao mesmo tempo
em que era ouvido, ouvia também as opiniões dos demais participantes, que também
socializavam seus problemas. Essa prática, permitia que ele se descobrisse e descobrisse o
outro. Aos poucos, Cleber tomava consciência de si mesmo, surgindo a oportunidade de se
transfazer.
Mesmo submetido a um tratamento rígido e violento pelos pais, Cleber ainda vê na
família a esperança de um dia as coisas mudarem, em suas palavras encontramos viva dentro
dele a crença na instituição da família.
“... eu me sinto bem quando todos nós estamos juntos dentro de casa. E eu acho
mais gostoso ainda, quando saímos todos juntos para fazer piquenique. Eu e meu
irmão ficamos nadando juntos. Minha mãe fica deitada na rede e meu pai assando o
churrasco.” (C.J. – Diário de campo, 2000).
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Carência afetiva, sentimento de abandono e de rejeição, e, violência domestica
decorrente de um relacionamento rígido e violento. Esses fatos nos demonstram um quadro de
negligência, resultando num sentimento de solidão e de perda, assuntos debatidos
anteriormente neste trabalho. Ficou claro, que a falta e a necessidade afetiva não foi
devidamente suprida.
Dessa forma, podemos inferir que, no momento em que um sujeito busca nas gangues
o apoio e o referencial para suas práticas sociais ou anti-sociais, ele pode estar querendo
suprir ou mostrar o estado de carência afetiva e de abandono em que se encontra. Nesse
estudo de caso, foi notória a relação traumática com o pai. Sabemos que o vínculo familiar
exerce influência na formação da subjetividade e conseqüentemente na criatividade.
Freud propõe, que a estrutura da psique humana depende da coexistência harmônica
dos seus três elementos, o Id, o Ego e o Super-Ego. No nosso caso, verificaremos a função do
Super-Ego, tendo em vista que, na história de vida do adolescente, foram registradas
situações de relacionamento traumático com o pai. Para Freud,
“ A constituição do superego é colocada em estreita relação com o pai. Já, antes de
qualquer relação objetual, o pequeno se identifica com o pai; e, por trás do ideal do
Ego, se oculta à primeira – e mais importante – identificação do indivíduo, a
identificação com o pai da pré-história pessoal. Trata-se, portanto, de uma
identificação primária; a qual é reforçada por uma identificação secundária, que é a
repercussão da fase edipiana.” (Fromm, 1982:167).
A fase edipiana, elucida uma relação inevitável, entre pai e filho, ao mostrar que é um
conjunto de desejos amorosos e hostis que a criança sente pelos pais. O sentimento de
rivalidade, entre pai e filho, parece favorecer a abertura de uma porta para os acontecimentos
relacionados com simbolismo de castração, esse elemento, relacionado com a castração, libera
à psique à absorção de outros elementos necessários para a estruturação do super ego. Por sua
vez, o Super-Ego orienta os desejos humanos e participa ativamente na estruturação da
personalidade. Daí, sua relação fundamental com a fase edipiana. Segundo Freud,
“... o apogeu do complexo de Édipo é vivido entre os três e os cinco anos, durante a
fase fálica; o seu declínio marca a entrada no período de latência. É revivido na
puberdade e é superado com maior ou menor êxito num tipo especial de escolha de
objeto. Para os psicanalistas, ele é o principal eixo de referência da psicopatologia;
para cada tipo patológico eles procuram determinar as formas particulares da sua
posição e da sua solução.” (Laplanche, 1998:77).
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Essa perspectiva, nos reforça, a importância e a influência da estrutura familiar na
construção da subjetividade do sujeito. O Super-Ego, sem os elementos que compõem a
subjetividade limitam as ações do sujeito, ele torna-se submisso aos outros dois componentes
da psique. Isso, nos dá um indicativo, de que o desvio cometido por Cleber, indica a
existência de problemas adquiridos na infância. A técnica de sensibilização Sócio-Educativa,
surgiu como uma possibilidade para que Cleber conseguisse resgatar, em si, questões ligadas
ao sentimento de abandono, de carência afetiva e de tratamento rígido recebidos. Os
elementos trabalhados na sensibilização procuraram a reconstrução do seu eu e, a partir da
participação do programa, permitiu a ele alterar a sua conduta.
Cleber passou a acreditar mais em si, abandonou a crença de que as situações
desagradáveis estavam limitadas somente a ele. Aprendeu que a dor pode ser uma
oportunidade de mudança e que o seu exemplo deve ser sempre positivo e gerador de
esperança. Passou a construir o seu conhecimento com leituras edificantes e companhias
agradáveis e, até mesmo, a sua aparência modificou-se, sua vestimenta deixou de ser tão
formal, passou a ser mais típica da adolescência.
Cleber foi capaz de estabelecer uma autocrítica em busca da autonomia e do
reconhecimento da importância ao respeito por si e pelos outros. Pude perceber um
estabelecimento de vínculo dele para com o restante do grupo e com os técnicos envolvidos
e, num segundo momento, por meio dos relatos da própria família, ele restabeleceu os laços
com os pais. Numa última conversa com Cleber, pedi que, simbolicamente, ele mandasse uma
mensagem para alguém de quem ele gostasse e assim ele o fez:
“Mãe, eu te amo muito, desculpa se eu te dei esse desgosto, espero nunca mais fazer
isso, nunca mais vou pela cabeça dos outros.” (C.J. – Diário de campo, 2000).
Até o momento Cleber não voltou a cometer delitos. Nas suas visitas ao programa, ele
nos relata que está mais tranqüilo e que evita sair com pessoas em quem ele não confia.
Pressupomos, então, que a Sensibilização Sócio-Educativa aplicada no programa,
ajudou-o a elevar sua auto-estima e potencializou seus conceitos éticos. Esse jovem conseguiu
desenvolver uma estratégia para enfrentar seus conflitos internos e externos. Nasceu em
Cleber uma capacidade de interação equilibrada nas suas dimensões cognoscentes e,
conseqüentemente, a capacidade de construção e de conquista, gradativa, da consciência
social.
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Apesar de Cleber tentar refazer o relacionamento com o pai, percebemos que até o
final da participação no programa, a figura do pai continuou ausente no seu discurso. O que
parece, é que Cleber buscou no grupo, um espaço de segurança, e este mesmo grupo,
incentivou-o a transgredir.
Inferimos, então, que a medida Sócio-Educativa nesse caso, subsidiou Cleber a lidar
com outros grupos e outras pessoas, para se tornar um sujeito autor. Entretanto, somente o
tempo dirá se ele conseguirá ou não se relacionar melhor com o pai.
Toda essa prática corrobora com Plano Nacional de Convivência Familiar e
Comunitária que estabelece o fortalecimento da Família. Todos neste caso, Cleber e a sua
Família, necessitam de ajuda. Toda à criança e todo adolescente em conflito com a Lei tem
uma família por traz necessitando de ajuda. Dentro de um contexto social, a família de Cleber
parece estar inserida dentro de quadro de vulnerabilidade, onde todos o membros correm o
risco de adernarem para um quadro de desvios decorrente das discrepâncias sociais a que
estão expostos.
3.2.2. - Aprender a Aprender a Conviver com Seus Fantasmas
Este caso evidencia os pressupostos da vida do adolescente João Sá.
Segundo o plantão social da V.I.J.B. o adolescente foi encaminhado ao programa
Sócio-Educativo a fim de dar cumprimento a 6 meses de prestação de serviços à comunidade
por ter praticado furto.
“Necessita cumprir seis meses de prestação de serviços à comunidade por ter
cometido um furto. Tem 15 anos de idade. Nasceu em Barueri e mora com a mãe e
mais e 5 irmãos, no mesmo bairro, há 9 anos. Gosta de morar lá por estar próximo
de parentes. Está na 5ª série do ensino fundamental repetiu três vezes a 4ª série, tem
dificuldades em português e inglês, gosta de Matemática. Julga-se um aluno regular,
porque conversa muito em sala de aula. Relaciona-se bem com alunos e professores,
pois eles o ajudam muito Acha que tudo o que aprende terá utilidade para a sua vida
futura. Ainda não está trabalhando e quer ser motorista de ônibus, porque acha
legal.” (Guia de encaminhamento do Fórum, 2000).
Nos primeiros dados apresentados, percebemos que o adolescente, devido a sua idade,
apresenta um atraso escolar decorrente de repetições sucessivas da série anterior. O fato de ele
se achar um aluno regular e de bom relacionamento com professores e colegas, seu
rendimento escolar e baixíssimo. Pressupomos que a prática do furto indicava uma situação
de mal estar. A pergunta era: o que atormentava João Sá?
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Num segundo encontro, não foi difícil perceber um adolescente tímido, reprimido e
com dificuldades de socializar-se com pessoas, ainda estranhas a ele. Não conseguia
expressar-se com clareza verbal, nem escrita e nem falada, tampouco conseguia decifrar o que
ele próprio escrevia, mesmo estando promovido para a 5ª série do ensino fundamental.
Com suas próprias palavras ele nos disse que vivia com a mãe e mais 5 cinco irmãos.
O pai tinha um relacionamento turbulento com a mãe, e, quando João tinha 7 anos de idade,
ainda criança, o pai foi preso. Ele nos deu o seguinte depoimento:
“Moro com a minha mãe e mais cinco irmãos. Ela tem trinta e cinco anos e trabalha
de diarista. Meu pai. Acho que tem quarenta e cinco anos de idade, está preso há
mais de oito anos. Me dou bem com meus irmãos. Já apanhei várias vezes da minha
mãe, por ela dizer que fiz coisas erradas. A minha família é evangélica da Igreja
Universal do Reino de Deus.” (J.S.- diário de campo, 2000).
Foi possível perceber no momento desse depoimento 2 elementos significativos que
podem ter conduzido a uma situação de transtorno e mal estar. O primeiro, está caracterizado
pelo quadro de “deprivation” sugerido por Winnicott, onde o sujeito possuía um objeto de
interesse, o pai, e, foi separado do mesmo. O segundo, é o relato de violência física praticada
pela mãe contra ele. Era fácil perceber durante as sessões de sensibilização, o sentimento de
perda com relação ao pai, e, a falta que isso lhe causava, quando o assunto vinha à tona.
Quando o assunto estava relacionado com as mães, a ansiedade tomava conta dele.
Foi no segundo encontro que tomamos conhecimento que ele pertencia ao mesmo
grupo que o primo, que também cumpria medida Sócio-Educativa junto com ele. Percebemos
que o adolescente começou a esboçar confiança na equipe de Sócio-educadores quando ele
expôs um quadro peculiar de sua vida. “já tomei bebida alcoólica e usei maconha uma vez,
sempre estava junto com os amigos e era incentivado por eles a fazer isso.” (J.S. – diário de
campo, 2000).
Em seguida lhe fiz outra pergunta. Por que ele se encontrava com esses amigos? Ele
me respondeu, “Faço isso quando fico triste e com raiva. Quando minha mãe me bate ou fica me
xingando.” (J. S. – diário de campo, 2000).). Perguntamos se ele já havia agredido alguém?
“nunca bati em ninguém, e, nunca senti essa vontade. Pelo contrário, gosto de fazer
amigos. Só que eu acho esquisito, quando eu quero alguma coisa e não consigo,
fico ansioso. Às vezes sinto medo das coisas, por causa da violência ” (J. S. – diário
de campo, 2000).
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No decorrer dos encontros, percebemos que João ia se sentindo mais seguro e mais
espontâneo, e que seu temperamento não parecia ser violento, ao contrário, era até amistoso.
Esses elementos reforçaram nossa teoria de sentimento de mal estar, e o quanto ele precisava
de ajuda.
No terceiro encontro, após adquirirmos mais confiança dos adolescentes, arriscamos a
perguntar para cada um deles, como os fatos tinham acontecido. Segundo João:
“Eu conheço o Nico20”, ele e os outros convidaram a gente para sair e fazer uma
zoada21, nós não queria ir mas eles começaram a chamar a gente de covarde e de
chamar de tudo quanto é nome, e aí resolvemos ir por que lá a gente tem respeito.
Quando chegamos perto da casa do Nico, ele encontrou um moleque de bicicleta e
disse que esse moleque tinha folgado com ele, e falou pra gente tomar a bicicleta
dele. O menino denunciou e fomos parar na delegacia e depois no Fórum com a
Juíza, aí mandaram a gente para cá (programa sócio-educativo).” (J.S.- diário de
campo, 2000).
Com esse relato, ficou claro que João estava dividindo sua vida. Uma parte dela estava
com o grupo e a outra em casa. As evidências indicam que João foi tratado severamente pela
mãe durante a infância. Sua capacidade física era inferior e submetia-se calado ao jugo
materno. A ausência do pai agravou a situação, e o jovem sofre até hoje com essas situações.
Foi em suas palavras que encontramos sinais desse sofrimento, que latente e silencioso até o
dia em que foi levado à delegacia, por ter praticado um delito. Muitos fantasmas incomodam
João, suas palavras denunciam um mundo de sofrimento:
“... eu queria que meu pai voltasse para casa o mais rápido possível e que minha
mãe parasse de ir na ‘casa do norte’22. Eu não pensava que ela bebia. Ela nunca
andou com companhia errada. Sabe, eu queria que ela não deixasse meu pai e que
nunca maltratasse a gente.” (J.S. – diário de campo).
Essas palavras emergem de um adolescente, que teve seus direitos negligenciados por
contingências da própria situação familiar, que teve como resultado: baixa auto-estima,
dificuldades de relacionamento intra e interpessoal interpessoal, afetivo e cognitivo.
Durante dinâmicas realizadas na técnica de sensibilização, percebemos que João sentia
vontade de viver um pouco mais num “mundo de fantasias”. Utilizando uma técnica de
20
Um dos integrantes do grupo ao qual ele faz parte.
Na gíria significa fazer uma bagunça e andar sem destino.
22
Denominação popular de um tipo de estabelecimento comercial onde se vendem comidas e bebidas típicas
nordestinas.
21
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associação livre, solicitamos para que escrevesse 10 palavras, as primeiras que surgissem na
mente. Em seguida perguntei, que se pudesse ser um personagem, quem ele seria e por quê?
Foram essas as dez palavras:
-
Bala
- coisa gostosa
-
Babalo
- chiclete
-
Bolibola
- chiclete
-
Peão
- rodar, brincar
-
Pipa
- soltar, brincar
-
Brola (bola)
- futebol
-
pecado
- não fazer
-
nadar
- brincar
-
pasaro (pássaro)
- caçar
-
motoista (motorista)
- ser um
O personagem foi, “... eu queria ser o ‘Jonni Bravo’. Porque ele consegue resolver
todas as coisas dele e dos outros.” (J.S. – diário de campo, 2000).
Esses exemplos evidenciam a interface do mundo de João com o mundo da fantasia.
Em plena adolescência, ele cultiva nas suas vontades e desejos, situações e objetos ligados à
infância. Ele ainda não se identificou com a sua real situação, não conseguiu definir a qual
grupo pertence, se ao da rua ou ao da família.
O motivo do fracasso escolar de João, possivelmente, está ligado a uma defasagem de
suas estruturas análogas. Essas estruturas mostram-se impermeáveis, dificultando seu
relacionamento com o conhecimento e conseqüentemente com o outro.
Todas esses elementos estavam latentes na vida de João. Ao participar das sessões de
sensibilização, ele encontrou um espaço para expor seus sentimentos e a partir daí pode tentar
reorganizar seu eu. “Nunca mais quero fazer isso. Me dei mal por seguir o embalo dos outros,
cheguei à conclusão que o furto lhe causou problemas, deixou-se influenciar pelos amigos e
viu que estava errado.” (J.S. –diário de campo, 2000).
Apesar de encerrar o cumprimento da medida Sócio-Educativa este adolescente
necessita de acompanhamento psicopedagógico, pois sabe ler e não sabe escrever. Sabendo-se
que a escrita é um importante meio de comunicação, analisamos que este jovem tem
problemas em estabelecer um contato com o mundo exterior. Possivelmente, essa dificuldade
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o tenha levado a utilizar-se de outros meios de comunicação, como o ato anti-social, segundo
a proposta de Winnicott. Sua criatividade, sua habilidade de lidar com as relações sociais, sua
carência afetiva, seu baixo rendimento escolar, seus medos, se mostram como resultado de um
conjunto de elementos negligenciados na infância.
A história de vida de João, nos deu uma visão de como a falta de elementos do
conjunto de necessidades fundamentais de pessoa humana, pôde contribuir negativamente no
processo de desenvolvimento de uma criança, evidenciada na adolescência. A ausência
paterna, a violência doméstica, o sentimento de abandono, a necessidade de cumprir regras de
um grupo que não era o familiar, impediam que ele assumisse o papel autor de sua história.
Seu desenvolvimento caminhou na direção de torná-lo um sujeito que não apresentava
discernimento claro na hora da escolha. Deixou-se influenciar pelo grupo, que poderia levá-lo
a reproduzir a mesma situação de seu objeto de desejo, seu pai. João precisa aprender a
conviver com os fantasmas de seu pai e de sua mãe.
Nos momentos em que ele conviveu com os outros adolescentes do programa SócioEducativo, João vivenciou um tempo de paz e de atenção.
“..Eu gosto de vir aqui. Eu posso falar. Eu ouço os outros moleques e os instrutores.
Eu até consigo dormir ouvindo as músicas que vocês tocam para nós. Eu queria que
isso acontecesse todo dia. Meus irmãos e minha mãe também precisam disso.” (J. S.
– diário de campo, 2000).
São palavras que indicam possibilidades de re-significação de uma vida, possivelmente,
sem projeção alguma. No entanto nada pode garantir o sucesso na vida de João. No entanto
ele recebeu no programa a oportunidade de se transfazer. Tomamos a liberdade de
encaminhá-lo para o programa Municipal de atendimento psicopedagógico. O sucesso de
João, só o tempo poderá nos mostrar.
Notamos que mais uma vez nos deparamos com uma família em situação de
vulnerabilidade. Nesse caso o problema parece ser mais grave, pois, o pai encontra-se preso e
a mãe teve que assumir sozinha a manutenção da família.
3.2.3. Aprender a Aprender a se Transformar
No terceiro caso analisaremos a história de José Cristóvão, adolescente que foi
encaminhado pela V.I.J.B. para cumprir medida Sócio-Educativa de prestação de serviços à
comunidade por ter pichado. A guia de encaminhamento do Fórum continha as seguintes
informações:
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“Tem 17 anos e nasceu no Município de Carapicuíba. Mora a treze anos em
Barueri, gosta do bairro onde mora, pois lá vivem também seus parentes. Está na 3ª
série do ensino médio, nunca repetiu de ano e gosta de estudar, não tem dificuldade
em nenhuma disciplina e tem facilidade em Matemática e História. Julga-se um
bom aluno, dá-se bem com os professores e companheiros de escola e acha que tudo
o que aprende lá será útil no futuro. Tem formação em Caldeiraria pela escola
profissionalizante do SENAI. Atualmente não está trabalhando e gostaria de seguir a
profissão de desenhista. Deve cumprir 3 meses de prestação de serviços à
comunidade, por cometer pichação.” (Diário de Campo, 2000).
Um adolescente profissionalizado, com ideais futuros, sem sinais de baixo rendimento
escolar e de bom relacionamento com familiares. Então, porque pichar?
Foi numa converso durante o segundo encontro que descobrimos um ponto fraco em
José Cristóvão, o relacionamento que não aconteceu dele com o pai..
“Do meu pai só sei a profissão, não sei a sua idade e nem a escolaridade. A minha
mãe é doméstica e tem quarenta anos de idade. Eles vivem separados há mais de
treze anos. Eu moro com minha mãe e mais três irmãos. Me dou bem com toda
minha família, principalmente com a minha mãe, porque ela me entende. Dos meus
parentes gosto mais do primo, pois ele é legal e amigo.” (J.C. - Diário de campo,
2000).
Foi esse depoimento que nos abriu um caminho para darmos início no processo de
ajuda de J. Cristóvão. Quando o assunto era o pai seu semblante mudava, dava lugar para a
tristeza, para a melancolia, para a mágoa, para a decepção e para o desencanto. O pai foi um
ausente na sua história de vida.
Na medida em que se davam os encontros percebemos que alguns preceitos religiosos
ajudavam o adolescente a abafar o “vulcão” interno, isso em decorrência da vida religiosa da
mãe. Algumas orientações religiosas podem ajudar as pessoas a se situarem diante de
conflitos que podem induzir ao uso de substancias químicas, e, de participarem de grupos
criminosos, além de, transferir para os seguidores elementos que levam ao caminho das
virtudes. Mas como José não é religioso praticante e ortodoxo, no decorrer de sua vida sempre
deslizou na prática das virtudes evangélicas. Segundo ele:
“nunca usei nenhum tipo de droga, durante
algum tempo consumi bebidas
alcoólicas mas abandonei por achar que não é uma boa opção. Faço parte de uma
gang conhecida no bairro e no município pelo nome de ‘psicoses’.” (J.C. –diário de
campo, 2000).
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É possível perceber nas palavras de J. Cristóvão que a gangue está constituída por um
bando de “maluquinhos”, onde um tenta ajudar o outro. Segundo ele mesmo só busca o grupo
quando está triste, angustiado ou quando deseja algo que não consegue alcançar. Para José o
grupo tornou-se um espaço de preenchimento e de pertencimento.
“...quando estou triste, perdido, ansioso e quero algo, logo saio à procura do grupo,
ou então, prefiro ficar só, porque sinto medo quando pressinto que algo de ruim
pode estar
para acontecer. Ao mesmo tempo de tudo isso, sou atacado pelo
desânimo. Isto quando não fico com raiva. Assim eu prefiro agredir os objetos e
pichar para não maltratar as pessoas. Às vezes, prefiro até nem sair de casa.” (J.C. Diário de campo, 2000).
Durante as seções de sensibilização, ao observarmos cuidadosamente o sentido da fala
de José Cristóvão, percebemos que ele vive em dois mundos: um da tensão e outro da busca.
Está sempre a procura de algo. Notamos que esse algo era o pai. Por que o pai? quando
perguntamos como ele define as coisas mais importantes em uma família, ele respondeu:
“Um filho necessita da ajuda do pai para resolver seus problemas. Ele pode contar
os fatos ocorridos para o pai. O pai entende a situação e o aconselha a fazer o que é
certo.” (J.C. – Diário de campo, 2000).
A necessidade de se relacionar com o pai e buscar, nele, as referencias para a vida
estava nítida. A gangue para J. Cristóvão, de certa maneira, serviu como referência. Como sua
experiência com figura paterna foi insuficiente, o grupo e a religião serviram para tentar suprir
essa necessidade. O seu “pedido de socorro” estava sendo o resultado da carência da
afetividade e da presença do pai. Perguntei a ele por quê havia cometido o ato infracional.
“Eu estava na rua com alguns amigos23 , quando um deles teve a idéia de irmos
deixar nossas marcas pelo município. Resolvemos que cada um deixaria uma marca
em lugar diferente. Fui pichar na coluna de sustentação da ponte nova e fui pego.
Lembro-me que estava triste por ver minha mãe só, trabalhando e sem saber onde
meu pai andava e o que sentia por nós.” (J.C. – Diário de campo, 2000).
Percebe-se no discurso que José encontrava-se atordoado com as marcas de sua
história. É um adolescente em pleno desenvolvimento, que já enfrenta a inconstância típica
dessa fase da vida, e ainda se apresenta com rupturas e adaptações socioculturais difíceis, o
que nos levou a crer que, a inconstância do comportamento pode conduzir os adolescentes a
23
Adolescentes pertencentes a um grupo de pichadores intitulados como “Psicose”
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passarem por profundos questionamentos e acúmulo de conflitos próprios dessa fase, e mais
difícil quando unidos aos conflitos não resolvidos da infância.
José Cristóvão seria o exemplo do adolescente típico, “normal”. Convive bem com
parentes, tem amigos. Possui formação profissional. Pensa em ingressar no mercado de
trabalho como desenhista. Porém, por ter cometido uma transgressão e a justiça tê-lo
condenado a uma medida Sócio-Educativa, foi possível para ele compreender a sua situação
de mal estar. Talvez, se isso não tivesse acontecido, sua práticas desviantes poderiam
desencadear outros desdobramentos em sua vida. Assim sendo, a medida Sócio-Educativa
tornou-se relevante para todos os envolvidos. O garoto trazia consigo as circunstâncias e os
fatos. A Juíza olhava para ele do ponto de vista da jurisprudência. O Assistente Social
também estava lá, mas olhava para o garoto do ponto de vista sócio-familiar. O professor
também se fazia presente e, olhava para ele do prisma do ensino. O Sócio-Educador, indo
além, atuou na perspectiva de ajudar o adolescente a re-significar e a transfazer a sua história.
Não é o feito que importa, e sim quais os significados que o sujeito dá para o fato e a partir
daí passar a re-escrever sua própria história.
Por não agredirem a integridade física das pessoas, é possível considerar que a
pichação pode se apresentar como uma forma de agressividade benigna tendo em vista
nenhuma pessoa, exceto o próprio autor, correr risco de vida, além do que, podem também
representar simbolicamente um estado de liberdade e de manifestação narcísica..
“Eu não queria ser reconhecido por ninguém, usava um código constituído de letras
que só quem é pichador sabe. Isto me dava força para pensar nas coisas erradas que
as pessoas praticavam contra mim. Não vejo erro nenhum em pichar. Se tenho
vontade, por quê não fazer?” (J.C. – Diário de campo, 2000).
Diante disso, é possível perceber que José não conseguiu estabelecer um vínculo
saudável com o seu não-eu. Voltava-se plenamente a si mesmo com sinais de narcisismo, isto
é, enxergava apenas a sua pessoa.
Mesmo sabendo que determinadas atitudes não eram saudáveis, esse jovem não
vivenciava essas regras e limites dentro de sua própria casa. Saía e voltava quando bem
entendesse. O não da mãe era insuficiente para inibir suas ações. A sua dificuldade em lidar,
com as regras e os limites, evidenciaram-se quando durante uma das dinâmicas aplicadas, ele
se via como um pássaro, justificando que:
“Um pássaro tem total liberdade, tem o direito de ir e vir sem se preocupar com
coisas negativas, só com aquilo que vier à cabeça.” (J.C. – Diário de campo, 2000).
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E como uma paisagem, seria um riacho:
“... seria cercado de pedras, por onde a água passa livre e todo mundo respeita essa
liberdade e a beleza.” (J.C. – Diário de campo, 2000).
Os exemplos reforçam a ausência de regras e limites, ou seja, “... é o amor pela
imagem de si mesmo.” (Laplanche, 1998:287).
O fato marcante na vida do adolescente foi à separação de seus pais quando ele tinha,
aproximadamente, 4 anos de idade. Na sua mente, o pai perdido na infância, seria a figura
capaz de ajudá-lo a resolver todos os seus conflitos. É quase certo que isso não seria verdade,
no entanto, esse adolescente experimentou na infância o que Winnicott chamou de
Deprivation, ou seja a perda do “bom objeto” do “objeto” necessário, do marco confiável
dentro do qual a vida instintiva e espontânea da criança se sente segura. Como já foi discutido
anteriormente, esse tipo de situação pode levar o sujeito a buscar no fenômeno transicional –
no nosso caso a pichação – algum acalento para o conflito.
Nossos estudos caminharam numa direção diferente àquela proposta pela
jurisprudência. Defendemos a idéia de Winnicott que diz que os atos anti-sociais (ou
infracionais para a justiça) podem mostrar sinais de esperança à medida que José Cristóvão
orienta-se para recuperar o que perdeu, ou que os processos de maturação que ficaram
“congelados” quando da perda, sejam liberados novamente.
Após esse estudo analítico de José, foi possível identificar um dos fatores que podem
tê-lo levado a sua desagregação da sua vida, foi a ausência paterna. Portanto, a experiência de
autoridade experimentada durante o processo de sensibilização, fez com que ele se tornasse
capaz de refazer a relação com o seu pai.
“Fiz aquilo que você falou. Fui até a casa de meu pai e conversei com ele. Eu estava
com medo. Mas depois vi que não era nada daquilo. Me senti aliviado, voltei para
casa mais feliz. Eu sabia que podia conversar com ele quando eu quisesse” (J.C. –
Diário de campo, 2000).
Parece que com essa atitude sua vida retomou o caminho certo.
Perguntado para ele sobre o que se modificou em sua vida, ele respondeu:
“Hoje sou capaz de enfrentar meu pai. De respeitar as coisas alheias e ter um
relacionamento tranqüilo com minha namorada. Espero não fazer o que meu pai fez,
abandonou a família. Hoje até entendo o que o levou a fazer isso, porém, continuo
não achando justo.” (J.C. – Diário de campo, 2000).
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De acordo com o depoimento, pressupomos que ele tenha encontrado aquilo que
procurava. Para José o programa de medidas Sócio-Educativas buscou oferecer a
possibilidade para que ele pudesse desenvolver forças para a reorganização do seu eu,
equilibrando as funções do id, do ego e do Super-Ego.
Ao passo que cada sessão de sensibilização Sócio-Educativa lhe apresentava
formalmente os elementos que constituem as virtudes e novas alternativas de relacionamento
intra e interpessoal, ele seguia os passos da construção da autonomia, no sentido de
desenvolver a capacidade de conduzir e tomar decisões por si próprio, levando em conta
regras, valores, perspectivas pessoais, suas e do outro. Do ponto de vista do juízo moral –
conceito usado na perspectiva proposta por Piaget – houve, por parte de José, a passagem da
fase denominada de heteronômia para a fase da moral autônoma, onde se privilegia a
maturidade que permite compreender que as regras existem, mas são possíveis de discussão e
de reformulação, desde que haja acordo entre os membros do grupo. Além disso notou que a
igualdade e a reciprocidade são componentes necessários da justiça. Tornou-se capaz de
coordenar seus pontos de vista e ações com os do outro. Percebeu que pichava por influência
da turma e não vê mais necessidade dessa prática. Em casa, mudou seu comportamento ao
assumir que é importante dar satisfação para sua mãe e irmãos, pois como filho mais velho,
ele agora passou a ser um exemplo.
É interessante registrar que, hoje, ele conversa com os irmãos, aconselhando-os que a
vida desregrada da rua não leva a nada. Percebemos uma nessa atitude uma vontade dele em
fortalecer o vínculo familiar. Também desenvolveu um sentimento de amizade pelos
funcionários do Núcleo e sempre que pode faz uma visita. Percebemos, sem dúvida, uma
reestruturação do ser humano. “O problema chave está na relação de nós com nosso próprio
egocentrismo.” (Morin,1995:131).
Durante o programa, José Cristóvão descobriu quem ele era realmente e o que o
atormentava, conseguiu elaborar estratégias que o ajudassem a resolver essas questões. Esse é
um novo José Cristóvão, transformado por si mesmo.
Essa situação de José, relaciona-se com a própria crise da adolescência, que é dupla,
“... metabolizar psiquicamente as mudanças do real do corpo e como responder de outro
lugar às exigências sociais.” (Barone, 1998:195).
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3.2.4. Aprender a Aprender a Conviver com o Sentimento Simbólico de Abandono
Otoniel Chaves também foi encaminhado pela V.I.J.B. a fim de dar cumprimento à
medida Sócio-Educativa de prestação de serviços à comunidade por ter pichado. A guia de
encaminhamento enviada pelo Fórum continha as seguintes informações:
“Tem 17 anos, nasceu em Itajubá MG, mora em Barueri há dois anos, gosta do local
onde habita, porque é lá que se encontram seus amigos. Está estudando e cursa a 6ª
série do ensino fundamental, não gosta de estudar porque sente preguiça. Deixou de
estudar por um longo período. Não tem dificuldades em nenhuma disciplina, tem
mais facilidades são as de Matemática, História e Geografia. Julga-se um bom
aluno, pois presta atenção e fica quieto. Têm bom relacionamento com professores e
colegas de escola e acha que tudo o que aprende será útil para o futuro. Atualmente,
trabalha como balconista, porém, não sabe ainda que profissão gostaria de exercer.
Deve cumprir 3 meses de prestação de serviços à comunidade por ter pichado.”
(Diário de Campo, 2000).
Duas situações nos chamaram a atenção: qual seria o motivo pelo qual ele se afastou
da escola, pois a idade escolar era incompatível?; O que pode tê-lo levado a sentir uma
exagerada preguiça?.
No primeiro encontro, foi possível perceber um adolescente tímido e com
dificuldades no relacionamento interpessoal. Não se expressava muito bem. Suas respostas
eram curtas e diretas. Acomodava-se no assento de forma retraída e não conseguia olhar
diretamente para os Sócio-Educadores. A primeira mão, nos pareceu um forte indicador de
déficit lúdico criativo, ou seja, baixo potencial de subjetivação e de reflexão. Segundo suas
palavras o distanciamento do ambiente escolar foi devido às mudanças constantes de
endereço. Isso pode tê-lo prejudicado. “Moramos em Barueri há apenas dois anos. Quando
eu começava a gostar da escola a gente mudava de endereço . Nunca dava para terminar o
ano.” (O.C. – diário de campo, 2000).
Durante as sessões que se seguiram, foi possível encontrar mais elementos que se
encaixavam aos anteriores. Surgiu então um sinal importante. Sua convivência com os pais
não parecia ser muito boa. Pairava em Otoniel uma sensação de mal-estar. Segundo ele, a mãe
mantinha com ele um relacionamento rígido e o pai se mantinha distante. Podemos inferir
que, com relação ao pai, parece ser um exemplo que podemos chamar
de “abandono
simbólico”. O tratamento rígido dado pela mãe, pode ter impedido o desenvolvimento da
capacidade de relacionar-se melhor, representado pelo desânimo e preguiça anteriormente
relatada.
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“Quando você deseja fazer algo e ao mesmo tempo isso é proibido, fico desanimado
e perco a vontade. Eu tenho preguiça de pensar. Minha mãe pega muito no meu pé
desde pequeno. Meu pai não conversa muito comigo, eu sei que ele gosta de mim,
mas eu queria que falasse mais comigo.” (O.C. – Diário de campo, 2000).
Estava nítido o quanto lhe fazia falta ter um bom relacionamento com os pais. De
onde pode ter surgido essa rigidez por parte da mãe?; Por quê será que Otoniel acha que o pai
o abandonou, se ao mesmo tempo ele reclama sua presença e diz que sabe que o pai o ama?.
No terceiro encontro, indagamos aos adolescentes quais eram as características das
famílias. Otoniel respondeu assim:
“Moro com a minha família, meus pais e mais oito irmãos. Meu pai tem cinqüenta e
nove anos e é autônomo, exerce a profissão de técnico em refrigeração. Minha mãe
é doméstica e tem 44 anos. Me dou bem com todos lá em casa. Gosto dos dois, mas
gosto mais da mãe,
por que ela me entende melhor, mesmo pegando demais no
meu pé, desde de pequeno ela não deixava eu sair muito de casa. Meu pai não tem
tempo pra mim, somos uma família grande, acho que ele não tem tempo nem para
meus irmão e nem para ele mesmo, trabalha muito. Já apanhei algumas vezes deles
por ter feito coisas erradas. Minha família é evangélica da Igreja Pentecostal Deus é
Amor. Eu não tenho ainda uma religião certa, essa religião pega muito no pé.” (O.
C. – diário de campo, 2000).
Segundo Otoniel, esteve exposto desde tenra idade a uma formação rígida proveniente
da cultura religiosa da família. Agregado a isso, encontramos uma fase edipiana mal
concluída. A ausência do vínculo afetivo com o pai, pode ter influenciado na desestruturação
do seu ego. O déficit lúdico criativo e a timidez, apresentados no contato inicial, indicam um
Super-Ego rígido e um id “sufocado”. Frente a essas questões, tudo nos leva a crer que a
dimensão relacional de Otoniel encontrava-se deficitária.
Mesmo com a rigidez de tratamento recebido desde a infância, e, um sentimento
simbólico de abandono por parte do pai, Otoniel desenvolveu um grande sentimento de amor
e respeito por sua família. Isso pode tê-lo ajudado a se defender das influências malignas do
dia-a-dia e o poupado de ocorrências mais graves.
“Eu adoro minha família, meus pais e irmãos, penso eu que sem ela eu não teria
uma vida linda como eu vivo. Inclusive minha mãe que me colocou no mundo em
1983, e me educou do jeito que ela achava que era certo.” (O.C.- diário de campo,
2000).
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Nessas palavras encontramos a esperança dentro dele e, mais uma dúvida. Foi
perguntado a Otoniel como era a vida dele e o que ele gostava de fazer.
“Minha vida é muito boa, desde quando eu nasci. É claro que eu gosto muito dela.
Eu faço bastante coisa boa, tipo andar de Skate, trabalhar, estudar e quando quero
me distrair vou pra pista andar de Skate. Também gosto de ir ao shopping com
alguns amigos e amigas.” (O.C. – diário de campo, 2000).
O discurso sinaliza à direção do ego-prazer, “... Termo utilizado por Freud com
referências a uma gênese da relação do sujeito com
mundo exterior e do acesso à
realidade.” (Laplanche, 1998:140), da satisfação pessoal. No caso de Otoniel, o Skate
assumiu a posição de objeto de satisfação ou melhor dizendo de transição. Sua timidez o
levou a escolher uma atividade praticada individualmente, que dificulta, até certo ponto, um
relacionamento interpessoal.
Perguntei então a Otoniel o que tinha acontecido para ele estar ali conosco. E o que ele
sentia naquele momento em que se deu a ocorrência.
“Meus amigos me convidaram para sair e dar um role e fomos parar em São Paulo.
Estávamos andando quando um deles tirou uma lata de tinta spray da bolsa e disse
que nós tínhamos que colocar a marca do grupo por aqui. Estávamos lá no Bairro da
Barra Funda. Vimos então uma construção que parecia estar abandonada. Entramos
e fomos pichar. Acho que alguém viu a gente e chamou a Polícia. Acabamos sendo
pegos por ela e fomos levados para a delegacia. Naquele dia, minha mãe tinha
brigado comigo, não queria deixar eu sair de casa para andar de Skate, mesmo assim
eu saí. Disse a ela que eu ia mesmo se ela não quisesse. Eu estava chateado e
desanimado, queria fazer alguma coisa pra sair daquele tédio, fazer alguma coisa de
que eu gostasse. Queria andar de Skate.” (O.C.- Diário de campo, 2000).
O depoimento reforça a teoria anterior. Na busca de estímulo, e de necessidade de
liberdade, Otoniel encontrou nas coisas externas a sua casa a substituição de que necessitava,
para fugir daquele estado emocional de tristeza por ter brigado com sua mãe. Simbolicamente
a “rua” e o grupo funcionaram como uma válvula de escape para a situação emocional em que
ele vivia. Necessitava de momentos de prazer e de estímulos diferentes. O grupo forneceu
subjetivamente aquilo de que precisava, um pouco de “adrenalina” como eles chamam. Dessa
forma ele agiu impulsivamente, cedeu ao grupo, atuando diferentemente daquela pessoa
submissa de dentro de casa. Essa submissão foi reforçada quando em uma das dinâmicas da
sensibilização Sócio-Educativa, a do animal, ele disse, “Eu seria um cachorro, porque é o
melhor amigo do homem.” (O.C. - diário de campo, 2000).
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A figura do cachorro, nesse caso, surge como uma forma declarada de submissão, pois
esse animal está à mercê de seu dono e faz tudo o que lhe foi ensinado de maneira resignada.
Dessa forma, a pichação acabou sendo o resultado, pois, segundo ele, foi fiel aos
companheiros e participou junto.
Para ele, o sentimento de pertencimento a um grupo sublimava a falta do pai. A atitude
perante os companheiros era importante, ela serve como uma forma de auto-afirmação para
Otoniel e de aceitação do grupo.
“Se eu não tivesse feito, seria chamado de maricas. Eu achava errado, mas não disse
nada pra nenhum deles, eu andava de skate com eles, fazia tudo com eles e não
queria ser chamado de medroso ou outra coisa qualquer.” (O.C. – diário de campo,
2000).
Essa situação me faz reportar a duas questões importantes: as peculiaridades relativas
à adolescência, e, ao de pertencimento a um grupo social. O sentimento de abandono e de
carência afetiva, e, as obrigações impostas pelo grupo, o impediram de tomar uma atitude
mais segura e madura. Atitude que sempre, fora, cobrada pela mãe.
Percebidas todas estas questões, começamos o trabalho de auxílio a Otoniel.
Percebemos um quadro de baixa auto-estima e a cada novo encontro apresentávamos, passo a
passo, elementos que pudessem se agregar ao conhecimento já existente, dessa forma
procurando ajudá-lo a ir complementando suas estruturas cognitivas, psíquicas e emocionais.
Com um rumo já definido, nosso papel agora era apresentar a Otoniel novas
possibilidades que pudessem auxiliá-lo a se transfazer. No decorrer desse processo
percebemos que Otoniel ia entendendo que seu pai não o havia abandonado de fato. Ele
percebeu que as atribuições e responsabilidades assumidas pelo pai no sentido de cuidar da
família, que é grande, o impediam de participar mais intensamente da sua vida e da vida de
seus irmãos. Entendeu que essa situação não estava limitada apenas a ele, Otoniel.
Deu-se início a um movimento antagônico em sua vida. A cada atividade realizada,
Otoniel, sem que percebesse, recebia elementos que geravam mudanças internas.
Inconscientemente, passou e escrever sua própria história. Ao reconhecer suas fragilidades,
conseguiu se fortalecer e rumou ao encontro de sua verdadeira identidade. Para ele, a família
passou a ser seu verdadeiro grupo. Ele encontrou seu o verdadeiro papel. Segundo Gonçalves
(1988), a família é responsável pelo desenvolvimento da identidade pessoal, atua como uma
matriz.
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“... hoje, para mim a coisa mais importante é a minha família, eu tenho prazer de
estar fazendo alguma coisa com eles, por exemplo: jantar ou almoçar todo mundo
junto.” (O.C. – diário de campo, 2000).
Nessas palavras, percebemos que ele buscou restabelecer o contato com a família. No
caso de Otoniel, poderia estar acontecendo o reencontro do objeto perdido, que possivelmente
fora substituído pela pichação.
Durante as atividades, reforçamos os conceitos diferentes entre as virtudes e as
vicissitudes: solidariedade e egoísmo; altruísmo e egocentrismo; responsabilidade e
negligência; respeito e desrespeito; tolerância e indiferença; paz e desavença; perdão e
vingança; amor e ódio, foram temas vastamente discutidos e conceituados.
Nos encontros seguintes, pude perceber que Otoniel fazia grandes progressos.
Participava com mais interesse das atividades e assimilava bem todos os conceitos
desenvolvidos nos encontros anteriores, a ponto de dar o seguinte depoimento quando lhe
perguntado, se pudesse ser um personagem quem ele seria:
“Seria Jesus Cristo, porque ele é Santo. Eu queria ser Santo e mudar o mundo para
melhor.” (O.C. – diário de campo, 2000).
No último encontro, solicitei a ele que enviasse simbolicamente uma mensagem para
alguém de quem ele mais gostasse:
“Mãe, eu te amo muito, sem você eu não seria o que sou hoje , me perdoa pelo que
eu fiz, eu não queria te magoar, espero nunca mais fazer isso.” (O. C. – diário de
campo, 2000).
Após todo esse processo, concluímos que os fatos marcantes da vida de Otoniel foram
o sentimento simbólico de abandono do pai e a rigidez excessiva aplicada pela mãe na sua
educação. Ele buscou nas atividades realizadas na rua o prazer não encontrado em casa. O
Skate passou a ser seu objeto de prazer e o grupo de pichadores a família que não pegava no
pé e o reconhecia como membro atuante.
Para Otoniel, o programa funcionou como um guia na sua re-estruturação. O
sentimento de castração a dificuldade de relacionamentos interpessoais foram diminuídas.
Desenvolveu-se nele a capacidade de autocrítica e equilibrou seu relacionamento com os pais.
Fez com que encontrasse sua verdadeira identidade, social e individual. Assumiu uma
capacidade franca e aberta de comunicação. Percebeu que, a possibilidade de refletir com
auxílio de alguém, dá a ele uma chance de resolver seus conflitos com segurança, diminuindo,
dessa forma, a distância existente entre ele, o ensinante e o conhecimento.
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Otoniel conseguiu agregar em suas estruturas psíquicas e cognitivas elementos que
lhe deram autonomia para conquistar sua liberdade, re-escrever sua história, respeitando
sempre os limites sociais. Tornou-se um sujeito capaz de sentir-se verdadeiramente um
cidadão.
3.3. – As Práticas Sócio-Educativas, Estratégias que Possibilitam a Passagem de Sujeito
Ator para Sujeito Autor.
“O bem é a afirmação da vida e o desenvolvimento das capacidades do Homem. A
virtude consiste em assumir-se a responsabilidade por sua própria existência. O
mal constitui a mutilação das capacidades do Homem; é no vício que reside à
irresponsabilidade perante si mesmo”. ERICH FROM
___________________________________________________________________________
Carência afetiva, abandono real ou imaginário, separação de pais, relacionamento
violento, “rigor e renúncia educativa”24 e baixa auto-estima foram alguns dos elementos
extraídos da história de vida dos 4 adolescentes observados durante o processo de
sensibilização Sócio-Educativa. Temos a consciência que, outros territórios também se fazem
presentes e tiveram influência na construção da subjetividade desses sujeitos, tais como: as
injustiças sociais, a corrupção político-administrativa divulgadas pelos meios de
comunicação, a ausência de paradigmas familiares e escolares, o desemprego, a ausência de
perspectivas profissionais e de realização pessoal entre outras. Essas questões, somadas aos
fenômenos verificados anteriormente, podem ter influenciado e levado esses sujeitos a
buscarem, nas gangues, um referencial de vida social e de apoio incondicional para as práticas
do dia-a-dia que, acabaram resultando em desvios.
Em dois dos casos analisados, foi possível perceber a ausência do pai. Isso, nos leva a
recordar os elementos existentes na passagem pelo complexo de Édipo. Salientamos que,
mediante a existência da figura paterna, ou, de uma figura que a represente e atue no processo
simbólico de castração, é que se dá continuidade da agregação de novos elementos para a
consolidação e a estruturação do Super-Ego, protagonista da formação do caráter.
Com exceção de José Cristóvão, os demais não obtiveram êxito na escolarização. A
ausência de estímulos para a aprendizagem – caracterizando-se como abandono educativo –
24
Rigor: quando os pais exigiam além das possibilidades. Renúncia: quando os pais deixaram de acompanhar a
vida educativa dos jovens. Ambas as situações acontecem, normalmente na infância, quando em fase de
escolarização.
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podem ter surgido mediante a uma situação acentuada de baixa auto-estima, provavelmente,
adquirida parte na infância, parte na adolescência.
Diante de tais circunstâncias, a técnica de Sensibilização Sócio-Educativa surgiu como
uma possibilidade de que cada jovem conseguisse resgatar, em si, questões ligadas a esses
elementos: o sentimento de abandono, a carência afetiva e o tratamento rígido recebidos até
então. Acreditamos sempre, na possibilidade da transformação do ato de transgredir em um
possível ato de transviver, dentro de uma sociedade, onde a violência está banalizada, ou, não
é reconhecida como um sintoma da patologia social, correndo-se o risco de que ela se
transforme num valor cultural válido a ser incorporado.
O trabalho proposto é fruto das ansiedades que vêm tomando conta de vários
segmentos da sociedade, que se encontra em face de inúmeras formas de manifestação de
violência, talvez como resultado da negligencia para com os adolescentes. Preocupado com
esse clima social dominante na realidade brasileira, e, em especial, na cidade de Barueri,
percebi que a interdisciplinaridade presente no programa Sócio-Educativo pode auxiliar numa
reflexão sobre possíveis atitudes preventivas. Tendo a consciência de que tais atitudes só
seriam possíveis se percepção a respeito da problemática estiver mais sensível, a ponto de
poder relacionar a historia de vida dos transgressores, com as peculiaridades da adolescência,
e desse confronto encontrar alguma saída.
Ao perceber que, na elaboração do processo adolescente, novos valores éticos e morais
apresentam reais possibilidades de serem incorporados à identidade que se forma,
aproveitamos e elaboramos as técnicas Sócio-Educativas dando início a um processo de
intervenção.
A sensibilização Sócio-Educativa, assumiu como objetivo, fazer com que os
adolescentes conseguissem re-significar sua vida, por meio de algumas atitudes que o levasse
a: equilibrar e estruturar os elementos que compõem a psique, o id o ego e o superego;
complementar os conhecimentos a respeito das regras que regem o convívio social;
desenvolver as aptidões ligadas às virtudes humanas calcadas na ética.
Para que isso ocorresse, foi necessário que o processo de diagnóstico pudesse observar
as capacidades e as habilidades dos adolescentes: de pensar, de como agir diante de algum
problema, de como se relacionar com outras pessoas e manifestar seus sentimentos, ao mesmo
tempo em que se dava o encontro do Sócio-Educador com o Sócio-Educando. Foi nesse
instante que colocamos a prova capacidade de observar e de criticar as ações. Foi necessário
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adaptar a função de sócio-educador para ensinante e de adolescente transgressor para
aprendente. Os papeis estão naturalmente definidos, onde o trabalho do ensinante é o de
facilitador, ajudando a dar novo significado para as vidas dos adolescentes. Acreditamos que
está
“...na relação ensinante/aprendente o psicopedagogo deverá , portanto, sair desse
campo transferencial, desviar seu olhar do paciente e deslocar o olhar deste de si
para colocá-lo em outro ponto, em outro objeto. E será neste terceiro objeto, o
conhecimento, que o paciente e psicopedagogo poderão se encontrar.” (Andrade,
1998:58).
O trabalho buscou caminhos para uma relação de confiança democrática e construtiva,
na qual o adolescente/aprendente, foi eixo principal do processo, por estar em franco
desenvolvimento e ser capaz de contribuir para uma “revolução” mais criativa das relações
psicossociais.
A proposta inicial consistiu, em fazer com que o adolescente transgressor, por meio
dos desenhos, das palavras (verbais e escritas), da preferência musical, da expressão corporal
e da comparação simbólica pessoal (auto-visão), manifestasse conteúdos conscientes e
inconscientes.
Dentro de um processo construtivo respeitando a história de vida de cada
participante/aprendente, as atividades permitiram que ocorresse a percepção e a
conscientização dos elementos morais (amor, perdão, humildade, compreensão, mansidão,
tolerância, serenidade, solidariedade, altruísmo, verdade, respeito, justiça, honestidade,
responsabilidade e esperança), onde, na relação ensinante e aprendente, proporcionava-se à
oportunidade da construção, da assimilação e da acomodação, dos conceitos e da formação de
juízo moral desses elementos. Observando a ótica de que, conceito é uma forma de
representação mental de um objeto, de um propósito, de uma idéia, de referência às coisas, e,
que juízo é, “... o ato da mente pelo qual ela afirma ou nega alguma coisa, unindo ou
separando dois conceitos por intermédio de uma ação” (Gil, 1994:149).Destacamos que,
raciocinar é encadear juízos, e formular juízos e encadear conceitos, que ao parecer da
proposta, raciocinar sobre as virtudes e as vicissitudes é imprescindível para a formação e
para a construção de um sujeito equilibrado e ético, ou seja, de um “cidadão”.
O programa de Sensibilização Sócio-Educativa, consistia de oito encontros, com
duração de 2h cada. Os encontros foram realizados semanalmente, em dias e horários
programados. Os grupos foram compostos por dez adolescentes, dos quais destacamos quatro.
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Em cada encontro, tínhamos o objetivo de atender as necessidades iminentes, de
carência afetiva, de sentimento de abandono, de falta de perspectiva, de conhecimento pessoal
e de auxílio nas questões ligadas à aprendizagem. Para alcançarmos esses objetivos, fizemos
uso de algumas técnicas utilizadas pela psicopedagogia, tais como, desenhos, contato físico,
associação livre, verbalização, rodas de conversa, técnicas essas que possibilitaram um
resgate dessas questões, até então desconhecidas.
No primeiro encontro, os jovens juntamente com o psicopedagogo, foram
apresentados entre si, ressaltamos, que até aquele momento, todos ali presentes se
desconheciam. Esses jovens, receberam nesse primeiro contato, orientações a respeito da
importância de se respeitarem às regras e os regulamentos que envolvem o atendimento,
inferimos que tal atitude, atua como um elemento na estruturação do superego. Discutimos,
também, a visão legal de cada infração cometida e o tipo de pena que são aplicadas aos
adultos, no caso de cometimento do mesmo ato. Na seqüência, realizamos um trabalho de
socialização e de interação entre eles. Para que isso ocorresse, utilizamos as técnicas de toque
e de relaxamento. A primeira, consistiu em um massageamento da região mais tensa do corpo,
os ombros e parte da região dorsal, que foi realizado pelos próprios adolescentes, revezandose entre si na atividade, esse tipo de trabalho, estimula o contato físico direto entre sujeitos, e
auxilia, de certa forma, no estabelecimento de vínculos, facilitando o despertar da
afetividade. A segunda, consistiu em fazer com que os jovens deitassem, confortavelmente,
junto ao solo e ouvissem durante dez minutos, músicas cuja melodia e o ritmo induzissem à
calma e o descanso. Frisamos que ambas as técnicas, foram utilizadas durante todos os
encontros.
Nos encontros seguintes, agregamos outra técnica, a do desenho. Essa técnica de
desenhar, seguindo a idéia de um tema gerador, permitiu aos adolescentes, a expressão
consciente e inconsciente de seus sentimentos e objetivos pessoais, deu-lhes a oportunidades
de mostrarem os seus desejos e de que instrumentos intelectuais dispunham para alcançá-los.
Utilizamos os seguintes temas geradores: se você fosse um sonho, como seria e porque? se
você fosse um personagem, qual seria e porquê? se você fosse um animal, qual seria e
porquê? se você fosse um lugar, qual seria e porquê? se você fosse uma música, qual seria e
porquê? se você fosse um texto, como seria e porquê?
No segundo encontro, utilizamos o primeiro tema gerador: se você fosse um sonho,
como você seria e porquê? , foi realizado, por cada adolescente, uma representação através de
um desenho, seguida de uma apresentação que poderia ser verbalizada ou escrita, que se
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transformaram em um debate. Durante esses debates, induzimos à discussão e a formulação
de conceitos e de juízo sobre: solidariedade e egoísmo, altruísmo e egocentrismo. Esses
elementos se agregaram aos elementos apresentados no primeiro encontro. Nesse segundo
contato, observei que os juízos e os conceitos que eles traziam consigo, começaram a se
transformar, pois encaravam a transgressão cometida como um erro, que precisava ser
reparado e não praticado novamente.
No terceiro encontro, o tema desenvolvido foi: se você fosse uma paisagem, como
seria e porquê? Trabalhamos sobre esse tema, os conceitos referentes à tolerância e a
indiferença, a compreensão e o descaso.
No quarto encontro, o tema gerador girou em torno de: se você fosse um personagem,
quem seria e porquê? Pedi, que cada adolescente fizesse uma pergunta ao mundo. Após todos
terem apresentado sua pergunta, solicitei que cada um elaborasse sua própria resposta.
Discutiram-se os conceitos relacionados com a verdade e a mentira, com a honestidade e a
desonestidade.
No quinto encontro, o tema utilizado foi: se você fosse um animal, qual seria e
porquê? Feita esta atividade, solicitei que cada adolescente, escrevesse ou falasse, 10
palavras, associando-as livremente. Os debates que se seguiram, giraram em torno da
humildade e da vaidade, da mansidão e do orgulho, da serenidade e da raiva.
No sexto encontro, o assunto tratado tinha como tema gerador: se você fosse um texto,
como seria e porquê? Os elementos debatidos foram à esperança e a descrença, o perdão e a
vingança. No sétimo encontro, o tema gerador foi: se eu fosse uma música, qual seria e
porquê? Nesse trabalho, os jovens trouxeram consigo a música preferida reproduzindo-as para
todos. Esse trabalho, proporcionou um debate que agregou, aos elementos anteriores, os
últimos elementos propostos, a paz e a desavença, o ódio e o amor. Para encerrarmos os
trabalhos, solicitei que cada um mandasse uma mensagem para uma pessoa que o incomodava
muito, e, uma mensagem para alguém de que eles gostassem muito.
Em todos os encontros, procurei desenvolver atividades que auxiliassem a elevar a
auto-estima dos adolescentes, apresentando novos elementos e de novas vivências, para que
pudessem alcançar esse estado de consciência, por exemplo: acreditar sempre que possuímos
qualidades latentes em nosso interior; entender que, o que parece ser uma situação de
sofrimento pode se tornar uma oportunidade de aprender; acreditar principalmente no seu
potencial criativo, para manter brilhando sua luz interior; procurar manter contato e
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comunicação, com pessoas e situações edificantes; aprender a valorizar o momento, estando
permanentemente atento; utilizar a forma mais adequada de observar as coisas, atentando
mesmo para aquelas, que nos parecem serem pequenas; não se tornar um lago, que espera as
coisas virem até ele, e sim, tornar-se um rio, que faz o seu próprio caminho; acostumar a
tomar suas próprias decisões, buscando as informações e tomando sempre a iniciativa;
aprender a não guardar mágoas e nem sentimentos.
Todos os elementos trabalhados na sensibilização Sócio-Educativa procuraram a
reconstrução do eu de cada adolescente, sem perder a esperança de que eles, a partir da
participação no programa, assumissem novas condutas de coexistência social e familiar.
Observei, que a cada encontro, os adolescentes iam se transfazendo. A auto-estima de
cada um ia se elevando, a ponto de, deixarem de achar que as situações, pelas quais passaram,
não estavam limitadas somente a eles. Deram início a uma transformação pessoal, deixando
de serem exemplos negativos, para serem vistos como exemplos positivos. Assumiram a
responsabilidade de re-significar suas vidas, construindo e escrevendo suas próprias histórias.
Os jovens em questão, foram capazes de encarar uma autocrítica, e, reconhecer a importância
do respeito aos limites pertencentes ao outro. Notei, que encontro após encontro, eles
fortaleciam o vínculo entre eles, perguntavam-se uns aos outros, de como tinha sido a semana
de cada um. Pelos relatos da própria família, conseguiram restabelecer os laços afetivos com
os familiares.
Auxiliá-los a elevar a auto-estima e devolver-lhes a capacidade de interação social,
potencializou-se a capacidade de absorver os conceitos éticos e, possivelmente, de conviver
com seus fantasmas internos e externos. Podemos inferir, em poucas palavras, que eles
aprenderam a transviver, tornaram-se sujeitos autores de sua própria história.
Convém citar que durante a implantação do programa de atendimento SócioEducativo, outros adolescentes que moravam na cidade receberam o mesmo atendimento.
Tratava-se da criação de uma Associação de Artistas de Rua, onde qualquer jovem poderia
ingressar e se beneficiar dos programas oferecidos. Um desses programas era realizado pelos
Sócio-Educadores que trabalhavam na Assessoria de Cultura, Lazer e Criança – Mantenedora
do programa Sócio-Educativo em regime aberto – utilizavam as técnicas de Sensibilização, no
intuito de ajudar esses futuros artistas a se inserirem na comunidade. Foram oferecidos cursos
de culinária, de garçons, de historia da arte, de técnicas de pintura, de cromoterapia entre
outros. Ressaltamos que muitos adolescentes que participaram do programa Sócio-Educativo
ingressaram nessa Associação e deram seguimento em suas vidas.
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4 – TENTATIVA DE CONCLUSÃO
________________________________________________________________
4.1. Aprender Implica em Entender que há muito a se Aprender
Este trabalho, não teve por objetivo apresentar conclusões definitivas, uma vez que as
relações humanas são inesgotáveis. Cada vez que o eu relaciona-se com o todo, ocorre uma
descoberta onde um exerce influência no outro, produzindo assim, uma certa subjetividade.
Ninguém pode afirmar, eu sou, eu basto em mim mesmo. Nós só nos conhecemos realmente
numa relação mais próxima com o outro e com a natureza.
Foi possível notar na elaboração desse trabalho, importantes transformações ocorridas
no atendimento social e educativo de crianças e adolescentes ao longo da história políticoadministrativa do Brasil. As Leis respectivas ao atendimento de crianças e adolescentes em
situação de abandono ou delinqüência sofriam modificações na medida em que o regime
político se alterava. De menor abandonado e delinqüente circunscritos num regime de
“doutrina de situação irregular”, eles foram reconhecidos como seres humanos em fase
peculiar de desenvolvimento, que necessitam prioritariamente de todos os tipos cuidados
possíveis como: educação, saúde, atendimento social, convivência familiar e comunitária,
entre outras, para poderem atingir a idade adulta de maneira mais saudável e menos injusta.
Todos esses elementos foram garantidos por meio da Lei Federal 8.069 de 1990 O
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA – que decorreu de uma vontade social e política.
Com essa medida estabeleceu-se uma nova ordem social relacionada a essas questões, onde,
Crianças e Adolescentes foram devidamente reconhecidos. Os adolescentes em conflito com a
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Lei também receberam tratamento diferenciado proposto pela Lei. Essas mudanças foram tão
marcantes que, atos negligentes como igualar o menor abandonado com o menor delinqüente,
que anteriormente eram praticados legalmente, hoje, na forma da Lei se pune os responsáveis.
No ano de 2006 essas mudanças foram complementadas, o Governo Federal produziu
dois documentos importantes que consolidam esse processo, o Plano Nacional de Promoção,
Proteção e Defesa dos Direitos de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e
Comunitária e o Sistema Nacional de Atendimento Sócio Educativo, cujos objetivos
procuram garantir a diminuição das distancias sociais e reorganizar o atendimento SócioEducativo de adolescentes desviantes. Foi possível notar que a partir da promulgação do
ECA, que a sociedade se movimentou no sentido de buscar alternativas que pudessem se
adequar às novas determinações. A adolescência passou a ser, melhor, observada e suas
peculiaridades foram evidenciadas a medida em que especialistas teciam suas teorias.
Procurávamos entender nesse trabalho, alguns dos aspectos que pudessem influenciar
adolescentes a conflitarem com a Lei, e decorrente dessa necessidade foi possível descobrir a
importância de conhecer as idéias de autores como: Winnicott, Calimam, Souza Neto,
Goffman, Chaui, Fernadez, Andrade, entre outros, a respeito da formação do sujeito. Cada
qual com a sua forma de interpretar o tema, contribuiu de maneira substanciosa com a
elaboração deste trabalho, que resultou em um programa singular de atendimento SócioEducativo no Município de Barueri.
Durante nossa pesquisa foi possível perceber a validade de idéias como as de
Winnicott, que sinalizam a importância que o vínculo familiar, principalmente da figura
materna, tem sobre as questões ligadas à delinqüência. A interrupção dos vínculos familiares
durante a infância pode exercer influência no sujeito – criança e adolescente – levando-o a
desviar-se socialmente. Assim sendo, foi possível observar e adequar nossas idéias, que
acenavam para um possível “pedido de socorro” dos adolescentes em conflito com Lei às de
Winnicott quando ele propõe, que o sentimento de abandono conduz a um estado que ele
identifica como fenômenos e objetos transicionais, que funcionam como uma forma do sujeito
de lidar com a situação de privação de vínculos interpessoais familiares. Foi possível, ainda,
relacionar os sentimentos de abandono, que pode ser simbólico, e o de mal estar, á prática de
desvios sociais.
Foi possível conceber a idéia de sentimento de mal estar e de privação estudada por
Caliman que as observa por um outro prisma. Caliman aborda a questão visualizando quanto
às necessidades, a falta ou privação, de elementos básicos necessários à pessoa humana, tais
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como: moradia, convivência familiar e comunitária sadias, escolarização, alimentação, saúde,
cultura, entre outros, podem também conduzir o sujeito a ser agressivo e a praticar delitos.
Outra idéia importante de Caliman está presente numa questão ligada a estigmatização, onde
adolescentes em situação de vulnerabilidade na procura de uma identidade social, podem
assumir os estereótipos e regras dos grupos aos quais se ligaram, talvez por falta de opção, e,
conseqüentemente, cometendo desvios. Caliman avança nas idéias Goffman, quando cita que,
os ideais coletivos podem vincular os indivíduos, o que resulta na formação de gangues.
Outro assunto abordado por Goffman que iluminou nosso trabalho, está relacionado a questão
da estigmatização. E dessa idéia pudemos conceber que as gangues são a representação de
grupos de pessoas que sofrerão algum tipo comum, entre eles, de adjetivação negativa. O
estigma para Goffman, surge quando o sujeito, sem recursos internos seja por imaturidade ou
baixa auto-estima, aceita passivamente o estereotipo indicado pela sociedade, passando agir
conforme os adjetivos que lhe foram atribuídos.
E foi possível construir em cima desses conceitos, a sensibilização Sócio-Educativa,
que surgiu como uma estratégia privilegiada, por poder fornecer subsídios aos sujeitos da
pesquisa a aprenderem a re-significar as suas histórias, e, aprenderem a transviver os fatos e
acontecimentos da própria vida, adquirindo uma experiência pautada na iniciativa, na
liberdade e no compromisso. Essa tríade, significa que, o sócio-educando pode desenvolver
suas potencialidades e não agir, apenas, como espectador ou receptor. Acreditamos que o
sujeito deve saber buscar e saber fazer suas opções, como parte de um processo de
crescimento. Este processo deve despertá-lo para o compromisso, com responsabilidade em
toda e qualquer ação. Nesse sentido, o jovem deve ser preparado para ser protagonista de sua
história e participante ativo da história daqueles que convivem com ele.
O pressupostos Legais e norteadores das medidas Sócio-Educativas são o de ajudar o
adolescente em conflito com a Lei a se transformar em um ser “autônomo, solidário e
competente”. (Costa, 1999:173). Mais do que, apenas identificar as possíveis causas que
podem ter levado um adolescente a conflitar com a Lei e dessa forma desenvolver uma
política de atendimento mais adequada, foi que, buscamos devolver a ele o que lhe é de
direito, à possibilidade de descobrir dentro de si, quem é, e porque é assim. E dentro de um
processo envolto de busca das perdas, de medos e de desejos e vontades, fazer com que ele
descubra um motivo para continuar acreditando na possibilidade de um futuro diferente. De
um futuro que dependerá da forma de como ele, o adolescente, lidará com seus conflitos.
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Parte-se da crença que, todo ser humano tem o direito de desenvolver e viver as suas
potencialidades.
O programa de medidas sócio-educativas foi um espaço singular para que tanto o
Sócio-Educador bem como o Sócio-Educando pudessem dar e encontrar sentido às suas
próprias existências, e, com isso, transfazerem, juntos, projetos de vida, pautados na ética.
Além de acreditar que, este programa foi uma estratégia, um meio, e, não um fim, para
facilitar a descoberta de si e do outro. A medida sócio-educativa, é um espaço que se propõe a
esta finalidade. Abrindo espaços para
“... o deslocamento da agressividade construtiva, para o questionamento e para o
contato com a autoria de pensamento, que não é outra coisa, senão, o contato com a
potência pensante e transformadora do mundo em si mesmo”. (Fernandez,
2001:179).
Percebemos de forma indireta que, as medidas Sócio-Educativas, escapam às questões
meramente jurídicas, pois, o sujeito está para além da legalidade e tenciona a caminhar para
uma auto-ética, em que, razão, desejo, subjetividade e cultura, interagem na busca de uma
vida melhor.
“ A noção do sujeito não é uma categoria que possa se compreender fora das
relações sociais e do modus faciendi do indivíduo, para evitar de se cair no
idealismo ou no empirismo, que acabariam por desvincular a inteireza entre a
objetividade e a subjetividade, ou por negar a capacidade de ação do sujeito perante
os acontecimentos”. (Souza neto, 2001:58).
Neste sentido, pudemos entender que a formação da auto-ética do sujeito autor
depende das relações sociais e subjetivas. A prática do sócio-educador se realiza no saber ser
ouvido e saber ouvir, colocando-se no lugar do outro sem decidir por ele. Este procedimento
oferece uma prática de crescimento,
amadurecimento e transformações, tanto do
ensinante/Sócio-Educador, sujeito facilitador, bem como, do aprendente/adolescente, sujeito
transgressor.
Pôde ser observado neste trabalho que o desvio social pode ser compreendido sim
como um “pedido de socorro”, uma forma do indivíduo comunicar-se com o outro a respeito
da vida não vivida, não acolhida, não aprendida, não respeitada. O sujeito, não é apenas um
produto do seu cotidiano, ele também constrói o seu espaço. O desvio social quando
equacionado e trabalhado, transforma-se em um instrumento que impulsiona o sujeito para um
auto-entendimento, uma autocrítica. Podemos afirmar que é essa a verdadeira passagem de
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sujeito ator para o sujeito autor. O contrário, conduz à barbárie, que desrespeita o outro e
desequilibra negativamente as relações sociais.
O cometimento dos desvios nos pareceu um “divisor de águas”. A partir desse
momento percebemos que o adolescente, ao receber novos conceitos e referenciais, passou a
tomar consciência da ação cometida, passando a refletir e a buscar novo direcionamento para
a sua vida. As estatísticas apresentadas pelo programa de atendimento indicaram que cerca de
90% dos jovens que participaram não reincidiram, ou seja, não voltaram a cometer novos
desvios.
Outra descoberta da pesquisa, é o papel fundamental da autoridade na construção do
sujeito, que pode ser percebido por meio da função da família principalmente da paterna. O
pai, ou a figura que o representa, alicerça e subsidia a formação e a estruturação das funções
reguladoras do caráter . Tomar consciência e construir o juízo moral daquilo que se pode, se
deve ou se quer fazer, ocupa um lugar importante na vida do sujeito autor que, tem como
necessidade, adaptar-se às questões que envolvem as inter-relações humanas. Quando o
sujeito que pratica o desvio pela ausência da autoridade e a descobre, pode vir a ser um sujeito
autor. Aprender é,
“... ir do saber a apropriar-se de uma informação dada a partir da construção de
conhecimentos; processo no qual intervêm inteligência e desejo. A Psicopedagogia
está, de algum modo, dirigindo seu olhar precisamente para a inter-relação entre
conhecer e saber”. (Fernandez, 2001: 55).
A autoridade é muito importante no processo de construção do conhecimento, pois, o
sujeito depende de aprender a reconhecer os limites para adquirir a autonomia.
Ao analisar a história de vida dos protagonistas desta pesquisa, percebemos que a
subjetividade não é dada, mas, construída a partir das apropriações feitas pelo sujeito das
diferentes fontes de subjetividade, para Souza Neto,
“A vivência do sujeito se faz na interação entre objetividade e subjetividade, de
acordo com a análise de ‘[...] a realidade interna e a realidade externa se compõem
na experiência de viver’. Nesta experiência encontra-se a possibilidade de
compreender a maturidade pessoal, quando o indivíduo consegue alcançar essa
interação e adquirir segurança em seu meio.”(Souza neto, 2001:79)
Eles procuraram nas gangues, a afirmação e os referenciais não encontrados dentro de
casa. Participar de grupos formados por adolescentes é, uma situação normal nessa fase de
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amadurecimento do sujeito, porém, o que se faz necessário, é que eles saibam escolher
discernir, sobre o que é, socialmente, correto ou não.
Ao terminar essa pesquisa sugere-se uma pesquisa mais abrangente sobre a influência
dos programas sociais que visam ajudar o sujeito à re-significar a sua história, e, caminhar na
direção da “ética da vida”25, daquela que busca a “vida boa” que segundo Heller (1996),
resumi-se em amar e ser amado, sentir-se produtivo e sentir-se livre. Ainda se faz necessário,
pesquisar como as pessoas se apropriam desses espaços emancipatórios. Quando os elementos
necessários são agregados às práticas Sócio-Educativas, ajudam a conduzir o sujeito à
valorização da auto auto-estima e a vivência ética, auxiliam o adolescente transgressor a resignificar e a transformar a transgressão em um transviver.
O comportamento desses jovens, foi analisado por juristas, psicólogos e assistentes
sociais, que estavam ligados à questão das instituições repressoras, o que limita as ações
seguintes. As medidas Sócio-Educativas ganharam novas perspectivas de atuação. As técnicas
retiradas das bases filosóficas da Psicopedagogia, da Psicologia, da Sociologia, da Pedagogia,
entre outras. Essa interação ora interdisciplinar ora transdisciplinar, possibilitou um novo
modo de observar e de pensar sobre as questões que envolvem adolescentes em conflito com a
Lei, ajudando tanto o agente Sócio-Educador como o Sócio-Educando desviante a delinear os
seus respectivos futuros.
Foi possível confirmar que as atitudes desviantes podem ser compreendidas como um
“pedido de socorro”, pois, um sujeito que possui elementos subjetivos e objetivos,
insuficientes para resolver os problemas, cuja procedência ele mesmo desconhece, acaba por
realizar ações que chamem a atenção do outro para si, sem saber, realmente que está
necessitando de ajuda. A prática Sócio-Educativa com todos as possibilidades e elementos
que agregou, adentrou em um território, como disse Fernandez (2001) de “ninguém e de
todos”, e conseguiu encontrar um caminho que conduziu quatro jovens, com perspectivas
futuras duvidosas, a transformarem-se de sujeitos atores para sujeitos autores.
Encontramo-nos em 2008, e já podemos dizer que avançamos nas questões sociais
quando que tratam do atendimento de adolescentes em conflito com a Lei. O SINASE –
Sistema Nacional de Atendimento Sócio-Educativo – e o Plano Nacional de Promoção,
25
“. Que se dirige ao indivíduo e, como conseqüência necessária desta formulação, ela se põe diante da
consciência e do sentido individual da responsabilidade com o postulado, de que se deve agir como se o destino
do mundo dependesse da ação do indivíduo ou de sua resignação”. (Heller, 1989:124).
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Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes a Convivência Familiar e
Comunitária, surgem como documentos de consolidação dos sentimentos de esperança e de
justiça social defendendo o sujeito de direitos.
Quando o assunto trata de relações humanas, principalmente de adolescentes, sujeitos
de direitos que estão em plena fase de consolidação de suas estruturas objetivas e subjetivas,
resgatamos a esperança algum dia alcançarmos a condição de uma sociedade menos injusta e
mais centrada no desenvolvimento de estratégias que fortaleçam um convívio social
equilibrado.
Esse trabalho agregou conhecimentos que, cada um a seu modo, caminham no sentido
da valorização e do respeito à vida humana em todos os seus aspectos, principalmente no
aspecto referente à importância da convivência social familiar na formação do tecido social a
que pertencemos. Dentro dessa perspectiva conseguimos atingir pontos importantes deste
trabalho, retratado no depoimento de um dos adolescentes que fizeram parte dessa obra,
quando ele diz que, a partir daquele momento, a coisa mais importante para ele era a própria
família. Essas palavras nos enchem de esperança e aumentam a vontade de dar continuidade
nessa linha de atuação. Seguramente podemos dizer que todos os esforços para ajudar
pessoas, principalmente crianças e adolescentes, são verdadeiramente uma maneira de
expressar respeito e amor ao próximo.
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5 – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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ANEXO 1 – O Programa Sócio-Educativo
1. Título
Programa Municipal de Atendimento e Acompanhamento Sócio Educativo de
Prestação de Serviços à Comunidade.
1.2. Objetivo geral do programa
Garantir adequadamente o atendimento e o acompanhamento de adolescentes em
processo sócio educativo, entendendo que são pessoas em fase peculiar de desenvolvimento
biopsicossocial buscando construir a sua trajetória pessoal na sociedade em que vivem.
1.3. Objetivos específicos
•
Auxiliá-los a encontrar sua identidade pessoal e social;
•
Conhecer e desenvolver conceitos éticos de convivência social;
•
Reequilibrar seus estados cognitivo e emocional;
•
Dar suporte educacional, cultural, legal, assistêncial e médico,
estendendo também os serviços à família;
•
Proporcionar atividades que garantam o convívio social e a integridade
•
Resgatar a auto-estima
moral;
1.4. O espaço físico
O programa desenvolvido pelo Núcleo Técnico Multidisciplinar conta com um
imóvel para o atendimento. O prédio possui 04 salas de atendimento e acompanhamento
técnico, 01 sala de entrevista individual, 01 secretaria, 01 sala de atividades coletivas e 01 sala
de espera. Participam do programa 08 unidades de prestação de serviços à comunidade: 06
unidades funcionam junto as Bibliotecas Municipais, localizadas em diferentes pontos do
município, facilitando o acesso para o adolescente, tendo em vista a proximidade de suas
moradias; 01 unidade junto ao CADE – O Centro de Apoio ao Desenvolvimento Educacional
(Brinquedoteca Municipal) – com sua Unidade Móvel de Recreação que, visita bairros do
município nos finais de semana ; 01 unidade junto a um dos departamentos da rede de saúde
municipal.
1.5. As rotinas técnicas
1.5.1. A chegada
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Os adolescentes são recebidos pelo Núcleo através de encaminhamentos feitos
pela Vara da Infância e Juventude do Fórum da Comarca de Barueri mediante a emissão de
uma guia constando: nome, ato infracional cometido, número do processo e o período pelo
qual deverá cumprir a medida.
1.5.2. O cadastramento
Visando conhecer melhor o sócio educando e sua família, adequá-lo ao melhor
local para o cumprimento da medida e dar suporte aos técnicos, o adolescente bem como seu
responsável passam por entrevistas diretivas e não diretivas. Na primeira, diretiva, o jovem
preenche um conjunto de formulários com: dados pessoais, endereço, vida escolar, vida
profissional, preferencias culturais e de lazer, dados sócio econômicos e análise básica
comportamental. Na Segunda, não diretiva, o responsável, responde um conjunto de perguntas
relacionadas ao comportamento e ao histórico familiar do adolescente e da família.
1.5.3. O encaminhamento
O responsável pelo adolescente assina um termo de ciência, recebendo um
impresso de encaminhamento e de controle com datas, horários, endereço do local onde serão
prestados os serviços, nome da pessoa responsável pelo acompanhamento e orientação e as
rotinas de trabalhos a que será submetido, levando em consideração certas individualidades
como por exemplo, restrições médicas.
1.5.4. O controle
Durante o período de prestação de serviços o Núcleo realiza Qinzenalmente junto
as unidades, supervisão técnica que avalia o comportamento e a freqüência de todos os sócio
educandos.
1.5.5. A avaliação dos trabalhos
•
Sobre o adolescente:
Ao término do período, cada unidade remete ao Núcleo um relatório
informando sobre freqüência, comportamento, desempenho e o relacionamento
com funcionários, usuários e outros adolescentes do programa.
•
Sobre o modelo do programa
O adolescente também faz uma avaliação sobre a sua estadia na
unidade, nos informando sobre: como foi a orientação recebida, dando sua opinião
a respeito dos trabalhos realizados no local específico;
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•
Da equipe
Semanalmente realiza-se uma reunião técnica onde se discute o
comportamento dos sócio educandos que por algum motivo quebraram as rotinas
comportamentais dentro das unidades. Uma vez por mês os supervisores das
unidades de prestação de serviços participam de uma reunião para atualização
técnica e desenvolvimento de novas propostas. Durante as reuniões são realizadas
leituras sobre os aspectos legais que dizem respeito aos trabalhos e de artigos
referentes a experiências realizadas com adolescentes.
1.5.6. A tomada de consciência
No decorrer do cumprimento da medida sócio educativa, os adolescentes passam
por uma atividade denominada “Sensibilização Psicossocial” (Técnica Psicopedagógica), que
tem como objetivo, trabalhar questões ligadas à cognição e emoção, atuando de forma a agir
sobre as ações inconscientes e conscientes dos envolvidos na atividade. A idéia e transferir
para os participantes (adolescentes) noções éticas de convívio social, auxiliando-os a
identificar questões ligadas aos limites intrapessoais e interpessoais. A atividade se dá por
intermédio de dinâmica de grupo, onde cada participante demonstra seus conceitos básicos de
convivência social através de representação simbólica dos vários aspectos pessoais que
envolvem seu processo de desenvolvimento, como o sonho de alcançar um objetivo, uma
música, um lugar, um personagem e um animal preferidos. A partir dessa técnica surge entre
eles a oportunidade da contribuir coletivamente para a construção de um modelo
comportamental socialmente adequado, discutindo questões ligadas a justiça, liberdade,
esperança, altruísmo, amor, solidariedade, paciência, perdão, etc. Além dessa atividade, os
adolescentes produzem um trabalho de pesquisa falando a respeito do ato infracional
cometido e das modificações interiores ocorridas consigo durante a permanência no
programa. Quando necessário, passa por uma observação comportamental feita por técnicos
nas áreas de Psicologia e Psicopedagogia e Pedagogia.
1.5.7. O encerramento
Assim que o adolescente cumpre o período determinado, é enviado à Vara da
Infância e Juventude um relatório informando onde prestou os serviços, quantos horas
trabalhou e o tipo de atividade executada.
1.6. As parcerias
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O programa conta hoje com os seguintes parceiros: Serviço de Assistência
Médica de Barueri (SAMEB), recebendo os jovens encaminhados pelo Núcleo Técnico
Multidisciplinar, que necessitam dos serviços de saúde, além de participarem do programa
com uma unidade de prestação de serviço a comunidade; Assessoria de Promoção Social,
atendendo as famílias dos adolescentes nos seus programas de enfrentamento da pobreza,
materialização e extensão dos direitos de cidadania, programa de capacitação e mobilização
comunitária, além de incluir aqueles jovens e suas famílias que estiverem interessados em
participar dos seus cursos semi-profissionalizantes; Assessoria de Cultura, Lazer e Criança,
recebendo os jovens, interessados e recomendados, nas suas oficinas de Arte Educação, além
de administrar as unidades das Bibliotecas, o CADE – Centro de Apoio ao Desenvolvimento
Educacional – e o Programa Sócio Educativo do Município; Associação dos Artistas de
Rua, incluindo os Sócio Educandos nos seus programas de embelezamento urbano e de semiprofissionalização; Serviço Integrado de Educação Fundamental do Município e Diretoria
Regional de Ensino do Estado, garantindo as vagas necessárias para a inclusão dos
adolescentes que estão fora da escola; Grupo Voluntário de Barueri, dando apoio aos jovens
e suas famílias com os serviços de acompanhamento jurídico, odontológico, psicológico e
pedagógico; Fórum da Comarca de Barueri através da Vara da Infância e Juventude e o seu
Plantão Social, prestando o apoio legal para a realização dos trabalhos.
1.7. Plano individual
Cada adolescente é avaliado individualmente, e se detectado algum tipo de
comportamento que possa prejudicar o cumprimento normal da medida é imediatamente
encaminhado aos técnicos (Psicólogos, Psicopedagogos) para a realização de trabalhos de
diagnóstico e de terapia antes de dar continuidade nas unidades.
1.8. Características das atividades desenvolvidas na prestação de serviços à comunidade
1.8. 1. Atividades desenvolvidas nas unidades de Bibliotecas
• Tombar livros;
• Encapar livros;
• Catalogar livros;
• Datilografar fichas de livros, revistas e gibis;
• Carimbar livros, revistas e gibis recebidos de doações;
• Colar bolsinho nos livros, revistas e gibis;
• Datilografar fichas de inscrição para sócios;
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• Recortar as reportagens das revistas e jornais importantes;
• Leitura dos jornais diariamente para hemeroteca;
• Leitura das revistas para xerocar assuntos importantes;
• Atendimento ao público;
• Ajudar as crianças nas pesquisas;
• Arrumar as estantes de livros, revistas e gibis;
• Colocar os arquivos em ordem numérica e alfabética;
• Cobrança da devolução de livros;
• Datilografar cartas de cobrança;
• Recebimento dos livros;
• Guardar livros, revistas e gibis;
• Guardar as pastas suspensas da hemeroteca;
• Participação na “Hora do conto” atividade voltada a levar a literatura para
crianças de EMEIS e Creches;
• Participação no “Poemando” programa voltado a levar literatura para
adolescentes;
• “Projeto Asas”, programa que leva arte e literatura para os detentos da Cadeia
Pública de Barueri;
• Videoteca, oferece curso de línguas para adultos, adolescentes e crianças;
• Recepção ( Guarda volumes e anotar saída de livros para tirar xerox).
1.8.2.
Atividades desenvolvidas pelo grupo de recreação do CADE
• Adequação dos materiais diversos nos veículos de transporte;
• Organização dos materiais de apoio pedagógico;
• Organização, montagem e desmontagem dos equipamentos de recreação;
• Auxiliar os monitores na orientação e acompanhamento dos usuários nas
atividades;
• Auxiliar os monitores na animação e organização de atividades (gincanas,
jogos e atividades adaptadas).
1.8.3. Atividades desenvolvidas junto ao SAMEB
• 10 horas de treinamento;
• entrevista com acompanhantes dos pacientes sintomáticos respiratórios;
• preencher questionários
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• oferecer material para exame;
• auxiliar a equipe na pré-consulta;
• auxiliar a organização logística dos dados.
1.9.
Programa específico de Sensibilização
1.9.1. Justificativa
O trabalho que ora propomos é fruto das ansiedades que vêm tomando conta de
vários segmentos de nossa sociedade, em face das inúmeras formas de manifestação de
violência da sociedade contra o adolescente e deste contra à sociedade à qual pertence.
Múltiplos são os fatores que intervêm neste processo intenso e dinâmico, no qual nem sempre
as ações vividas como violentas se dão de forma intencional e premeditada mas, percebemos
que a intensidade e a continuidade de certas ações acabam por adquirir um caráter violento
que deteriora a qualidade complexa das relações sociais.
Na elaboração do processo adolescente coincidindo com o surgimento da
capacidade reprodutora, o psiquismo humano reestrutura-se. O jovem adquire e desenvolve
potencialidades ao mesmo tempo que experimenta um complexo processo de perdas – reais e
imaginárias –. Novos valores éticos e morais serão incorporados à identidade que se forma,
tendo na adolescência a última chance para isso.
Durante o período de transição, o aparelho psíquico do adolescente é vulnerável e
suscetível às influências de pressões internas e externas, podendo ser de ordem racional,
relacional ou desiderativa.
Em uma sociedade onde a violência está banalizada, ou não é identificada como
um sintoma da patologia social, corre-se o risco de que ela se transforme num valor cultural
válido a ser incorporado. Geram-se na sociedade ainda que a violência física e moral se
transforme em um elemento de afirmação do jovem dentro desta cultura (relação de
pertencimento).
1.9.2. Objetivo geral
Preocupados com o clima social dominante na realidade brasileira e, em especial,
do município de Barueri, o grupo de acompanhamento técnico multidisciplinar se mobilizou
para promover uma reflexão e possíveis atitudes preventivas visando a que sejam alcançadas
melhores condições de saúde física e mental. Nossa ideologia é de que pertencemos a uma
mesma sociedade, ou a grupos sociais que interagem. Portanto somos todos agentes
modificadores e receptores das ações e das conseqüências construtivas violentas na sociedade
contemporânea.
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1.9.3. Objetivos específicos
Fazer com que o adolescente consiga redesenhar sua personalidade através das
seguintes ações:
• Equilibrar o funcionamento dos elementos que compõe a psique, o id o ego e o superego;
• Complementar os conhecimentos a respeito das regras que regem o convívio social;
• Desenvolver as aptidões ligadas as virtudes humanas, fortalecendo dessa forma as
relações sociais.
1.9.4. Método
O exame dos testes projetivos permitirá avaliar a capacidade do pensamento para
construir, no relato ou no desenho, uma organização suficientemente coerente e harmoniosa
para veicular e elaborar a emoção. Também permitirá avaliar a deterioração que se produz no
próprio pensamento quando a parte emotiva está descontrolada.
1.9.5. Metodologia
O trabalho
do bom educador é,
com certeza, auxiliar esses jovens que,
aparentemente, encontram-se sem rumo, a encontrá-lo.
Propomos, com esse trabalho, a busca de caminhos para uma relação democrática
e construtiva, na qual o adolescente é a peça chave neste processo, por estar em franco
desenvolvimento e ser capaz de contribuir para uma “revolução” mais criativa das relações
psicossociais.
A proposta inicial consiste em fazer com que o adolescente infrator, através dos
desenhos, das palavras (verbais e escritas), da preferência musical, da expressão corporal e da
comparação simbólica pessoal (auto visão), nos mostre: se existe um projeto particular de
vida, que referenciais regem o seu comportamento perante a sociedade, que tipo de
informações ele necessita para se reequilibrar, qual é o seu ritmo biopsicomotor, quais são as
possíveis situações bloqueadoras e impulsivas que o levaram a agir e cometer as transgressões
e qual o nível de conscientização a respeito das questões morais.
E dentro de um processo pedagógico construtivo, respeitando a história de vida de
cada participante, as atividades permitem que ocorra a percepção e a conscientização dos
elementos morais (amor, perdão, humildade, compreensão, mansidão, tolerância, serenidade,
solidariedade, altruísmo, verdade, respeito, justiça, honestidade, responsabilidade e
esperança), onde cada participante ajuda os outros a reconstruírem e, até mesmo, a
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construírem tais conceitos, que ao parecer da proposta, são imprescindíveis para a formação
e a construção do sujeito equilibrado e ético, “do cidadão”.
Cada período de sensibilização é composto por seis ou mais encontros, com
duração de 02:00h. Os encontros serão realizados semanalmente em dias e horários
programados. Cada grupo poderá ter até 10 adolescentes.
1.9.6. Conteúdos
As técnicas projetivas proporcionam ao técnico o conhecimento necessário para
uma compreensão das dimensões desiderativas, racionais e relacionais dos participantes.
Para tal serão utilizados as seguintes dinâmicas projetivas:
• Se eu fosse um sonho;
• Se eu fosse uma paisagem;
• Se eu fosse um personagem;
• Se eu fosse uma música;
• Se eu fosse um animal;
• Se eu fosse um texto;
• Dez palavras;
• Uma pergunta ao mundo; Dê a sua resposta
As dinâmicas grupais possibilitam a vivência prática das estruturas emocionais,
para tal utilizaremos as seguintes:
• Dê sua mensagem para alguém;
• Trabalho de toque;
• Massagem;
• Som, movimento e consciência corporal;
• Transporte de um por quatro integrantes;
• Relaxamento dois a dois;
• Alongamento fácil;
• Psicodrama;
1.9.7. Recursos
1.9.7.1. Humanos
• 01 técnico (psicopedagogo clínico ou psicólogo com especialização em dinâmica de
grupo).
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• 01 auxiliar com formação superior (preferência na área da educação).
• Poderão participar outras pessoas como auxiliares, desde que possuam os conhecimentos
necessários.
1.9.7.2. Físicos
• Uma sala com pelo menos 30 metros quadrados iluminada e ventilada;
• Banheiro com sabonete, papel higiênico e papel toalha;
1.9.7.3. Materiais
• 20 cadeiras universitárias;
• 01 lousa branca com pincéis atômicos em 4 cores e um apagador;
• 01 aparelho de som com Tape Deck e CD player;
• 50 folhas de cartolina de cor clara (branco, amarelo, azul claro);
• 10 caixas de lápis de cor;
• 10 conjuntos de canetas coloridas hidrocor;
• 02 pacotes de papel sulfite;
• 15 canetas esferográficas azuis;
• 15 lápis preto nº 2;
• 05 apontadores de lápis;
• 15 borrachas para apagar conjugadas (para caneta e lápis);
• 01 Aparelho Televisor colorido 20” (polegadas);
• 01 vídeo cassete;
• fitas de vídeo devidamente escolhidas;
• 01 grampeador;
• 01 caderno universitário de 200 folhas com capa dura;
• fichas de relatórios e de acompanhamento (vide anexo)
• 15 réguas plásticas de 30 centímetros;
• 01 pacote com 100 bexigas tamanho médio;
• 10 vendas pretas para os olhos;
1.9.8. Avaliação
O técnico fará uma leitura individual das três dimensões que estão sendo
trabalhadas com os adolescentes participantes.
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A cada sessão, o técnico, emitirá um relatório individual que será anexado
prontuário do adolescente em questão. As avaliações realizadas pelo técnico responsável
servirão como suporte para o próximo encontro.
Cada participante fará em sua casa uma avaliação pessoal das atividades
desenvolvidas naquele dia, entregando no próximo encontro.
No final, cada adolescente levará consigo a produção realizada. Esse ritual servirá
como instrumento de Vinculação desse jovem consigo mesmo, com sua família e com a
sociedade.
1.9.9. Cronograma
Data
Horário
1ª semana
15:00 às
Atividade
- No primeiro encontro serão discutidas as regras de como
funcionarão as sessões de sensibilização
17:00 horas
- Aplicação do “teste da família”
2ª semana
3ª semana
4ª semana
5ª semana
6ª semana
7ª semana
15:00 às
-
Aplicação do “ teste do par educativo”
17:00 horas
-
Exercícios de aquecimento
-
Dinâmica “se eu fosse um sonho”
15:00 às
-
Aplicação do “teste da família cinética”
17:00 horas
-
Alongamento e relaxamento
-
Dinâmica “Se eu fosse uma paisagem”
15:00 às
-
trabalho de toque
17:00 horas
-
Dinâmica “Se eu fosse um personagem”
-
Uma pergunta para o mundo, dê a sua resposta.
15:00 às
-
Massagem
17:00 horas
-
Dinâmica “se eu fosse um animal, qual eu seria”
-
Escreva dez palavras
15:00 às
-
Som, movimento e consciência corporal
17:00 horas
-
Dinâmica “se eu fosse um texto, como seria”
-
Trabalho em conjunto
15:00 às
-
Dê sua mensagem à alguém
17:00 horas
-
Dinâmica “se eu fosse uma música, como eu seria”
-
Encerramento
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ANEXO 2. – O modelo de entrevistas diretivas e não diretivas, utilizadas com os
adolescentes envolvidos na pesquisa
José Cristovão
Questões diretivas
Foi encaminhado pelo fórum ao programa por ter cometido o ato infracional de
pichação. Tem 17 anos e nasceu no Município de Carapicuíba. Mora a treze anos em Barueri,
gosta do bairro onde mora, pois lá vivem também seus parentes. Está na 3ª série do ensino
médio, nunca repetiu de ano e gosta de estudar, não tem dificuldade em nenhuma disciplina e
tem facilidade em matemática e história. Se julga um bom aluno, se dá bem com os
professores e companheiros de escola e acha que tudo o que aprende lá será útil no futuro.
Tem formação em Caldeiraria pela escola profissionalizante do SENAI, atualmente não está
trabalhando e gostaria de seguir a profissão de desenhista.
Do pai só sabe a profissão, não tem idéia nem da idade e nem da escolaridade. A
mãe é doméstica e tem quarenta anos de idade. Seu pais vivem separados a mais de dez anos.
José Cristóvão mora com a mãe e mais três irmãos. Em sua opinião se dá bem com todos os
familiares, principalmente com a mãe, “porque ela me entende...” . Dos parentes ele gosta
mais do primo, pis o acha legal e amigo.
Sua religião e a da família é evangélica, porém ele não é praticante. Segundo ele
nunca usou nenhum tipo de droga, durante algum tempo consumiu bebidas alcoólicas mas
abandonou por achar que não é uma boa opção. Pertence a uma gang conhecida no seu bairro
e no município pelo nome de “psicoses”.
Quando está triste, sente vontade de ficar só; as vezes sente solidão; sente muita
ansiedade quando deseja algo; sente medo 0quando pressente que algo ruim vai acontecer; as
vezes é atacado pelo desânimo. Quando não é ouvido fica com raiva. Nunca agrediu pessoas;
e nunca sentiu vontade de sair de casa.
Obs. Não apresentou nenhum problema para elaborar e responder as perguntas.
O que aconteceu
“Eu estava na rua com alguns amigos , quando um deles teve a idéia
de irmos deixar nossas marcas pelo município. Resolvemos que cada
um deixaria uma marca em lugar diferente. Fui pichar na coluna de
sustentação da ponte nova e fui pego”.
Questões não diretivas
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Durante os encontros semanais, onde se realizaram as entrevistas, José Cristóvão nos
apresentou sem maiores problemas as questões que mais o incomodavam.
(P) Como você define as coisas mais importantes em uma família?
(R) Um filho necessita de ajuda do pai para resolver seus problemas, ele pode contar os
fatos ocorridos para o pai. O pai entende a situação e o aconselha a fazer o que é
certo.
(P) Como você poderia demonstrar o que acontece com freqüência dentro de sua casa?
(R) Minha mãe fazendo comida, eu e meus dois irmãos assistindo televisão e meu outro
irmão no quarto.
(P) Como você acha que se aprende as coisas?
(R) Aprendo as coisas sempre com alguém, e acho que também sei ensinar meus
colegas a tomarem iniciativa de serviço e companheirismo.
(P) Você tem um sonho a alcançar?
(R) Eu gostaria de ser desenhista, e poder trabalhar e ajudar a família.
(P) Se você fosse um animal, qual seria?
(R) Eu queria ser um pássaro, porque ele tem total liberdade, tem o direito de ir e vir
sem se preocupar com coisas negativas, só com aquilo que vier a cabeça.
(P) Se você fosse um lugar, como seria?
(R) Eu seria um riacho, cercado de pedras, por onde a água passa livre
e todo mundo respeita essa liberdade e beleza.
(P) Se você pudesse escolher ser um personagem, quem seria?
(R) Eu seria Shakespeare. Porque esse personagem reflete as coisas
como elas são
e a sua maior arma e triunfo é o coração, pois a arte vem até ele e ele apenas a
traduz e passa para nós a emoção.
(P) O que mais te incomoda hoje em dia ?
(R) A violência, um fenômeno que está se alastrando nas mais recentes cidades
brasileiras, põe em risco todos os que estão em sua volta; destruição, negligência,
mortes, revoltas, medo, raiva e esperança tudo isso fazem parte deste fenômeno,
seu nome “violência”. Cada dia ou cada hora que se passa é um pedaço a mais de
terra ou de pessoas que é dominada. O que alimenta este fenômeno é a ignorância
humana e a falta de perspectiva que cada indivíduo tem pelo outro. Hoje em dia a
maioria dos jovens são revoltados por causa dos problemas e obstáculos que eles
passaram, passam ou encontram pela frente. Esses problemas são gerados por causa
da falta de emprego, pela repugnância do governo e pelo abandono ou perda dos
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pais. O que se deve fazer para acabar com essa praga que tanto nos traz prejuízos e
destrói vidas de pessoas?. A esperança de um dia melhorar fica dentro de cada
pessoa e famílias e cada mãe e pai. A pergunta de cada mãe e pai sempre ficará:
quando isso acabará meu Deus?
(P) Escolha em seu vocabulário e escreva dez palavras associando-as livremente.
(R) Amor, sentimento forte. Ódio, mágoa. Sentimento, pensar em algo bom. Amizade,
ser companheiro fiel. Receio, ter dúvidas e medo. Alegria, horas boas. Tristeza,
perder algo. Ânimo, ter disponibilidade. Iniciativa, vontade de alguma coisa.
Preconceito, vaidade.
(P) Mande uma mensagem para alguém que você tenha algum problema.
(R) Para meu irmão mais velho. Po! cara, vê se vai olhar a sua vida e deixe que olhe a
minha. Deixe-me viver, viva a sua vida.
(P)
Mande agora uma mensagem para alguém que você gosta.
(R) Para minha mãe. Mãe eu te amo muito, me desculpe estou melhorando.
Otoniel Chaves
Questões diretivas
Histórico
Foi encaminhado pelo fórum ao programa por ter cometido o ato infracional de
pichação. Tem 17 anos, nasceu em Itajubá MG, mora em Barueri a dois anos, gosta do local
onde habita porque é lá que se encontram seus amigos. Está estudando e cursa a 6ª série do
ensino fundamental, não gosta de estudar porque sente preguiça. Deixou de estudar por um
longo período. Não tem dificuldades em nenhuma disciplina, as que tem mais facilidades são
as de matemática, história e geografia. Julga-se um bom aluno, pois presta atenção e fica
quieto. Se dá bem com professores e colegas de escola e acha que tudo o que aprende será útil
para o futuro. Atualmente trabalha como balconista, porém, não sabe ainda que profissão
gostaria de exercer.
Mora com a família, os pais e mais oito irmãos. O pai tem cinqüenta e nove anos e
é autônomo exercendo a profissão de técnico em refrigeração. A mãe é doméstica e tem 44
anos. Segundo Otoniel, se dá bem com todos os familiares, mas gosta mais da mãe por
entendê-lo melhor. Já apanhou algumas vezes dos pais por ter feito alguma arte. A família é
evangélica da Igreja pentecostal deus é amor, ele não tem religião ainda definida.
Nunca usou nenhum tipo de droga ou bebida alcoólica. Dificilmente sente tristeza,
solidão, medo ou ansiedade, raiva ou vontade de agredir as coisas ou pessoas. Sente , as
vezes, falta de ânimo.
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Obs.: não teve nenhum problema para elaborar as respostas
Como aconteceu:
“Meus amigos me convidaram para sair e dar um role, fomos parar em
São Paulo. Estávamos colocando nossas marcas em uma construção lá
na Barra Funda, fomos pegos pela Polícia e levados para a delegacia”.
Questões não diretivas
Durante os encontros semanais, Otoniel Charles nos apresentou sem maiores problemas
as questões que mais o incomodavam.
(P) Como você define as coisas mais importantes em uma família?
(R) Todos fazendo as mesmas coisas juntos
(P) Como você poderia dizer o que acontece uma coisa que acontece com freqüência
dentro de sua casa?
(R) Todo mundo almoçando junto.
(P) Como você acha que aprende as coisas?
(R) Eu gosto de aprender sozinho, as vezes eu busco ajuda quando não consigo resolver
(P) Você tem um sonho a alcançar?
(R) Meu sonho é um dia eu poder ir trabalhar de carro, e olhar o movimento, as crianças
brincando na praça e outras coisas.
(P) Se você fosse um animal, qual seria?
(R) Eu seria um cachorro, porque é o melhor amigo do homem.
(P) Se você fosse um lugar, como seria?
(R) Eu seria uma praça que teria uma pista com um monte de aparelhos para se usar
com Skate.
(P) Se você pudesse escolher ser um personagem, quem seria?
(R) seria Jesus Cristo, porque ele é santo; eu queria ser santo e mudar o mundo para
melhor.
(P) O que mais te incomoda hoje?
(R) Eu tenho preguiça de pensar, e minha mãe pega muito no meu pé, desde pequeno.
Meu pai não conversa muito comigo, eu sei que ele gosta de mim, mas eu queria
que falasse mais comigo.
(P) Fale um pouco de sua vida?
(R) Minha vida é muito boa, desde quando eu nasci. É claro que eu gosto muito dela. Eu
faço bastante coisas boas, tipo andar de Skate, trabalhar, estudo e quando quero me
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distrair vou prá pista andar de Skate. Também gosto de ir ao shopping com meus
amigos e amigas.
Eu adoro minha família, meus pais e irmãos, penso eu que sem ela eu não teria uma
vida linda como eu vivo. Inclusive minha mãe que me colocou no mundo em 1983,
e me educou do jeito que ela achava que era certo.
(P) Mande uma mensagem para alguém que você tenha algum problema.
(R) E para um cara que mora na minha rua. Po! Cara vê se me deixa em paz, para de
fazer minha caveira.
(P) Agora mande uma mensagem para alguém que você gosta?
(R) Para minha mãe. Mãe eu te amo muito, sem você eu não seria o eu sou hoje.
João Sá
Questões diretivas
Histórico
Foi encaminhado pelo Fórum ao programa sócio-educativo por ter cometido o ato
infracional de furto. Tem quinze anos de idade, nasceu em Barueri e mora nesse mesmo bairro
a nove anos. Gosta de morar lá por estar próximo do parentes.
Está na 5ª série do ensino fundamental repetiu três vezes a 4ª série, tem
dificuldades em português e inglês, gosta de matemática. Se julga um aluno regular, porque
conversa muito em sala de aula. Se dá bem com alunos e professores, pois eles o ajudam
muito. Acha que tudo o que aprende terá utilidade para a sua vida futura. Ainda não está
trabalhando e quer ser motorista de ônibus porque acha legal.
Mora com a mãe que tem trinta e cinco anos e trabalha de diarista e mais cinco
irmãos. O pai tem quarenta e cinco anos e está preso a mais de cinco. Se dá bem com os pais e
irmãos. Apanhou algumas vezes por fazer coisas erradas. A família é evangélica da Igreja
Universal do Reino de Deus.
Já usou maconha uma vez, afirma que foi incentivado pelos amigos a fazer isso.
Fica triste e com raiva quando mexem com a namorada ou algum parente. Gosta de fazer
amigos, e quando deseja algo e não consegue se sente ansioso. As vezes sente medo por causa
da violência. Nunca sentiu vontade de agredir pessoas e nem de fugir de casa.
Obs.: É um garoto tímido, apresenta dificuldades em comunicar-se com outras
pessoas e em elaborar as respostas. Necessitou permanentemente de auxílio para a
compreensão e interpretação das perguntas.
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O que aconteceu:
“Eu conheço o Nico, ele e os outros convidaram a gente para sair e
fazer uma zoada, nos na queria ir mas eles começaram a chamar a
gente de covarde e de chamar de tudo quanto é nome, e aí resolvemos ir.
Quando chegamos perto da casa do Nico, ele encontrou um moleque de
bicicleta e disse que esse moleque tinha folgado com ele, e falou prá
gente tomar a bicicleta dele. O menino denunciou e fomos para na
delegacia e depois no Fórum com a Juíza”.
Questões não diretivas
Durante os encontros semanais, João Sá apresentou-se como um jovem
introvertido, e, sempre tentando fugir das respostas, porém, com alguma insistência,
respondeu aos questionamentos.
(P) Como você define as coisas mais importantes em uma família?
(R) Ficarem todos juntos dentro de casa.
(P) Como você poderia dizer o que acontece com freqüência dentro de sua casa?
(R) Todo mundo assistindo televisão junto.
(P) Como você acha que aprende as coisas?
(R) Quando alguém me ensina.
(P) Você tem um sonho a alcançar?
(R) Meu sonho é aprender a nadar e ser um professor.
(P) Se você fosse um animal, qual seria?
(R) Eu seria um gato, porque é esperto.
(P) Se você fosse um lugar, como seria?
(R) Eu seria uma lagoa cheia de árvores, para todo mundo poder usar para se divertir.
(P) Se você pudesse escolher ser um personagem, quem seria?
(R) Eu seria Jonny Bravo, porque ele ajuda todo mundo a resolver as coisas.
(P) O que mais te incomoda hoje?
(R) Eu queria que meu pai voltasse para casa o mais rápido possível e que minha mãe
parasse de ir na “casa do norte”. Eu não pensava que ela bebia. Ela nunca andou
com companhia errada. Sabe, eu queria que ela não deixa-se meu pai e que nunca
maltratasse a gente.
(P) Fale um pouco de sua vida?
(R) Minha vida não é muito boa, desde quando eu nasci. Minha mãe me bate muito e
me xinga. Eu até gosto de ir na escola, só que eu não consigo aprender direito.
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Gosto dos meus irmãos e sinto falta do meu pai. Acho que ele logo vai voltar para
casa.
(P) Escreva dez palavras e faça uma associação delas com o que lhe vier a primeiro a
cabeça?
Bala = coisa gostosa, Babalo = chiclete, Bolibola = chiclete, Peão =
rodar,brincar, Pipa= soltar, brincar, Brola (bola) = jogar futebol, pecado = não
fazer, nadar = brincar, pásaro
(pássaro)= caçar, motoista (motorista) = ser um
(P) Mande uma mensagem para alguém que você tenha algum problema.
(R) Para o Nico. Pô! Cara vê se me deixa em paz, não quero ir mais no seu embalo.
(P) Agora mande uma mensagem para alguém que você gosta?
(R) Mãe, eu gosto muito de você, prometo que nunca mais vou nos embalos dos outros
Cleber Juvino
Questões diretivas
Histórico
Foi encaminhado pelo fórum ao programa por ter cometido o ato infracional de
Furto. Tem dezesseis anos de idade, nasceu e mora em Barueri. Gosta do local onde mora,
pois lá existe uma quadra esportiva e pode utilizá-la. Tem o apelido de “berne” e não gosta de
ser chamado como tal. Está na 6ª série do ensino fundamental, repetiu de ano três vezes, duas
vezes a 4ª série e uma vez a Quinta série. Não gosta de estudar e não tem idéia de porque.
Tem grandes dificuldades com a disciplina de matemática, achando educação física e
educação artística as mais fáceis. Se julga um aluno regular, porque consegue completar
alguma atividades escolares e outras não, porém, acha que sem estudo não somos nada. Nunca
trabalhou e gostaria de exercer a profissão de mecânico de autos.
Mora com os pais e mais um irmão, se dá bem com eles por achá-los legais. O pai
tem trinta e cinco anos, trabalha como motorista de ônibus, estudou até a Sexta série. Não
sabe a idade da mãe, ela trabalha como doméstica e é semi-analfabeta. Apanhou
violentamente varias vezes dos pais, segundo ele o motivo era por ter arrumado briga na rua,
ou sair e demorar para voltar. Dos parentes gosta mais de um dos primos que é mais velho que
ele.
Fez por algum tempo o uso de bebidas alcoólicas, hoje não usa mais. Fica triste
quando falta o que fazer. As vezes fica calado por falta de assunto. Gosta as vezes de ficar só
e está sempre ansioso. As vezes sente medo por causa da onda de violência. As vezes sente
preguiça de fazer as coisas. Nunca sentiu raiva e nem vontade de agredir as pessoas. Nunca
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sentiu vontade de fugir de casa. A família é evangélica da Universal do Reino de Deus, ele
não vai com freqüência aos encontros.
Obs.:
apresentou
grandes
dificuldades
de
interpretar
as
perguntas
e
consequentemente de responder.
O que aconteceu
“O Nico é quem fez o convite, falou prá gente sair e zoar por aí. Eu
não queria ir, nem meu primo, más, eles começaram a dizer que nós
éramos covardes, não tinham coragem de sair com eles, além de
covarde me chamaram de outras coisas. Eu não quis ficar para trás,
e depois eles ficam falando um monte de mim por aí. Depois que
fomos andar, nós encontramos um menino andando de bicicleta e o
Nico falou que esse menino tinha “folgado” com ele, e disse prá
gente ir lá com ele e tomar a bicicleta dele. Depois disso fomos parar
na delegacia e depois no Fórum”.
Questões não diretivas
Durante os encontros semanais, Cleber Juvino deixou que os problemas que o
incomodavam viessem à tona.
(P) Como você define as coisas mais importantes em uma família?
(R) Estar todos juntos dentro de casa.
(P) Você poderia a falar respeito de alguma atividade feita em família?
(R) Quando saímos todos juntos para fazer piquenique, eu e meu irmão ficamos
nadando juntos, minha mãe, fica deitada na rede e meu pai assando o churrasco.
(P) Como você acha que aprende as coisas?
(R) eu aprendo as coisas sozinho.
(P) Você tem um sonho a alcançar?
(R) Eu queria ser bonito como uma árvore, e servir para amarrar corda de balanço para
as pessoas.
(P) Se você fosse um animal, qual seria?
(R) Eu seria uma baleia, porque a baleia é bonita e faz parte da natureza
(P) Se você fosse um lugar, como seria?
(R) Seria um lugar cheio de árvores para gerar uma atmosfera pura.
(P) Se você pudesse escolher ser um personagem, quem seria
(R) Gostaria de ser um professor de natação para ensinar os outros a nadar.
(P) O que mais te incomoda hoje?
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(R) meu pai me bate muito, desse o couro legal, quando eu faço alguma coisa que ele
não gosta.
(P) Dite para mim dez palavras, associando-as livremente.
(R) Boca, beijo; bonito, simpático; linda, atraente; bola, esporte; SK8, Skate; paciência,
calma; relógio, tempo; carro transporte; camiseta, roupa; moto, trabalho.
(P) Mande uma mensagem para alguém que você tenha algum problema.
(R) Para meu tio. Vê se me respeita mais, eu não sou mais criança.
(P) Mande agora uma mensagem para alguém que você gosta.
(R) Mãe, eu te amo muito, desculpa se eu te dei esse desgosto, espero nunca mais fazer
isso, nunca mais vou pela cabeça dos outros.
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ANEXO 3 –
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Carlos Antonio Centolanza