Insper Instituto de Ensino e Pesquisa Programa de Mestrado Profissional em Economia João Augusto Campos Vasconcelos PODER DE PREVISÃO DA INFLAÇÃO FUTURA PELOS TÍTULOS PÚBLICOS BRASILEIROS São Paulo 2013 João Augusto Campos Vasconcelos Poder de previsão da inflação futura pelos títulos públicos brasileiros Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Insper, Instituto de Ensino e Pesquisa, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Finanças e Macroeconomia Aplicadas Orientador: Prof. Dr. Nuno Ricardo Martins Sobreira – Insper Co-orientador: Profa. Dra. Camila de Freitas Souza Campos - Insper São Paulo 2013 Vasconcelos, João Augusto Campos Poder de previsão da inflação futura pelos títulos públicos brasileiros. / João Augusto Campos Vasconcelos; orientador: Nuno Ricardo Martins Sobreira; co-orientadora: Camila de Freitas Souza Campos – São Paulo: Insper, 2013. 31 f. Dissertação (Mestrado – Programa de Mestrado Profissional em Economia. Área de concentração: Macroeconomia, Economia Monetária e Economia Financeira) – Insper Instituto de Ensino e Pesquisa. 1. Inflação implícita 2. Macroeconomia 3.Economia Monetária - Tese FOLHA DE APROVAÇÃO João Augusto Campos Vasconcelos Poder de previsão da inflação futura pelos títulos públicos brasileiros Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado Profissional em Economia do Insper Intituto de Ensino e Pesquisa, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Economia. Área de concentração: Macroeconomia, Economia Monetária e Economia Financeira Aprovado em dezembro/2013 Banca Examinadora Prof. Dr. Nuno Ricardo Martins Sobreira Instituição: Insper Assinatura: _________________________ Profa. Dra. Camila de Freitas Souza Campos Instituição: Insper Assinatura: _________________________ Prof. Dr. José Luiz Rossi Júnior Instituição: Insper Assinatura: _________________________ Prof. Dr. Hilton Hostalácio Notini Instituição: Itaú Unibanco Assinatura: _________________________ Aos meus pais, por toda a inspiração, motivação e exemplo, sem os quais isso não seria possível e nem faria sentido. RESUMO Vasconcelos, João Augusto Campos. Poder de previsão da inflação futura pelos títulos públicos brasileiros. 2013. 31 f. Dissertação (Mestrado) – Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2013. O estudo e poder de previsão da inflação futura é de suma importância para a implementação de políticas macroeconômicas, bem como para o bom funcionamento de uma sociedade e manutenção do bem-estar da população. Este trabalho avalia o poder de previsão do mercado para a inflação futura, dado pela inflação implícita nos títulos brasileiros, utilizando-se de dois métodos: Método de Svensson e Cash Flow Matching. Para a análise, comparam-se os dados com pesquisas de mercado do Banco Central do Brasil, do Relatório Focus, e com o IPCA acumulado para o período de um ano à frente da data de análise. O resultado obtido mostra que o método de Svensson possui um maior poder de previsão quando analisado pelo método da Raiz do Erro Quadrado Médio, para períodos de liquidez nas negociações dos ativos indexados à variação de preços. Outra conclusão mostrada está no fato de que a inflação implícita dada nos títulos da dívida brasileira - seja ela calculada por qualquer um dos métodos analisados ou pela pesquisa de mercado - tende a responder mais aos dados passados e já conhecidos do que a uma real expectativa dos participantes do mercado para a inflação futura. Palavras-chave: inflação implícita; Método de Svensson; Cash Flow Matching; previsão da inf;ação futura Código JEL: E31, G12 ABSTRACT Vasconcelos, João Augusto Campos. Predictive power of future inflation by the Brazilian government bonds. 2013. 31 f. Dissertation (Mastership) – Insper Instituto de Ensino e Pesquisa, São Paulo, 2013. The study of future inflation is of major importance for the implementation of macroeconomic policies and for the proper functioning of a society and the maintenance of the well-being of its population. This paper evaluates the predictive power of market participants in forecasting future inflation, given by the breakeven inflation rate in Brazilian government bonds. To do so, this thesis makes use of two methods: Svensson’s Method and cash flow matching. For the described analysis, we compare the estimated data with the Brazilian Central Bank’s market research, called Focus Report, and also with the realized IPCA during the studied period. The results show that the Svensson method has a greater predictive power when analyzed using the Root Mean Square Error method, during periods of greater liquidity of the bonds. Another conclusion shown relies on the fact that the breakeven rates tend to respond more to past data than to market participants’ expectation for future inflation. Keywords: breakeven inflation rate; Svensson Method; Cash Flow Matching; forecasting of future inflation JEL code: E31, G12 Lista de Gráficos Gráfico 2.1: Participação relativa dos Títulos no Estoque da DPMFi. Em destaque, a participação das NTN-Bs . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .15 Gráfico 2.2: Valor Financeiro Negociado no Ano no mercado secundário, em Bilhões de Reais. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .16 Gráfico 4.1: Mediana suavizada da expectativa do IPCA para os próximos 12 meses. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 Gráfico 5.1: Comparação temporal das séries: Svensson, Cash Flow, Focus e IPCA realizado 12 meses à frente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 Gráfico 5.2: Comparação temporal: Svensson, Cash Flow, Focus e IPCA realizado 12 meses anteriores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25 Gráfico 5.3: Janela móvel da Raiz do Erro Quadrado Médio das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 27 Gráfico 5.4: Janela móvel do viés das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29 Lista de Tabelas Tabela 5.1: Comparação das correlações de cada série com o IPCA realizado 12 meses à frente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .25 Tabela 5.2: Comparação das correlações de cada série com o IPCA realizado nos 12 meses anteriores. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .26 Tabela 5.3: Raiz do Erro Quadrado Médio das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .27 Tabela 5.4: Média do viés das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 28 Sumário 1. Introdução. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10 2. O mercado brasileiro de títulos indexados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 14 3. Metodologia. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 3.1. Metodologia de Svensson (1994). . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17 3.2. Metodologia de Cash Flow Matching . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19 3.3. Relatório Focus. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .20 4. Descrição dos Dados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 21 5. Resultados. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 23 6. Conclusão. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30 Referências. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31 10 1. Introdução A inflação é uma das principais variáveis econômicas de um país, seja ele desenvolvido ou emergente, sempre acompanhada pelas autoridades competentes e pela sociedade, de maneira geral. Os Bancos Centrais (BC) de diversas nações utilizam esse indicador de variação de preços para estabelecer as diretrizes de suas políticas macroeconômicas. Isso é igualmente válido para os países cujos BC adotam a meta de inflação – caso da Nova Zelândia em 1990, Canadá e Chile (1991), Reino Unido (1992) e Suécia (1993) do Brasil (1999)1 –, bem como por nações, como os Estados Unidos – cuja autoridade monetária, o Federal Reserve (FED), adota política dual de pleno emprego e estabilidade de preços, ou seja, inflação controlada. As sociedades, também, fazem o acompanhamento desse indicador, por ser fator decisivo para a manutenção (ou perda) do poder de compra, com impacto direto sobre o bem-estar das populações. O aumento descontrolado dos preços pode comprometer o modo de vida e trazer incertezas para o futuro. Países como o Brasil, que viveram em passado recente crises de hiperinflação, têm o controle da inflação usado não apenas como instrumento econômico, mas, principalmente, político. A obtenção das expectativas sobre a inflação futura é, portanto, ferramenta de grande valor tanto para o Banco Central como para instituições financeiras e a economia como um todo. A partir dessa informação, é possível avaliar qual a inflação esperada pelos participantes do mercado - dado este que acaba influenciando a própria formação da inflação futura - e analisar se o BC tem sido eficaz em seu trabalho de ancoragem das expectativas de preços. Os títulos indexados à inflação - caso da NTN-B ou NTN-C no Brasil - remuneram o investidor a uma taxa de juros fixada no momento da compra mais a variação de um determinado índice de preços. Nesse caso, o investidor estará sendo remunerado a juro real e terá seu capital protegido da desvalorização, em caso de inflação. Segundo a hipótese de Fisher, o spread entre a taxa de juros nominal e a taxa de juros real para um mesmo vencimento nos fornece uma boa estimativa da inflação esperada. A análise de um título indexado contra um título que pague juros pré-fixados nos permitiria ter, portanto, uma boa aproximação do que é esperado pelo 1 A partir de 1999, o Brasil passou a adotar sua política macroeconômica definida pelo tripé: câmbio flutuante, superávit primário (equilíbrio fiscal) e metas de inflação. 11 mercado para a marcação da inflação no período de vida dos ativos em questão e seria um dos métodos de cálculo da expectativa de inflação. O objetivo deste trabalho é estudar dois métodos de obtenção da chamada inflação implícita, ou break-even inflation rate (doravante BEIR), em inglês, embutida nos títulos do governo brasileiro que são emitidos pelo Tesouro Nacional. O valor desta BEIR representa, portanto, a expectativa dos participantes do mercado para a inflação futura. Para medir o seu poder de previsão, vamos comparar os valores obtidos por meio dos métodos estabelecidos com a inflação realizada durante o mesmo período. Além disso, iremos igualmente comparar o poder de previsão dos métodos em questão vis-à-vis as expectativas contemporâneas de mercado, divulgadas pelo Gerin2, em seu Relatório Focus. As duas metodologias adotadas na estimativa das expectativas inflacionárias são o método de Cash Flow Matching e a estimação pelo método de Svensson (1994). Para esse estudo foram escolhidas as NTN-Bs, títulos indexados ao IPCA3, devido à maior liquidez e negociação. A comparação dos resultados será feita através da análise da Raiz do Erro Quadrado Médio (REMQ) e do Viés dos resultados. Na mesma área de pesquisa do presente trabalho, podemos citar alguns estudos – tanto para o mercado brasileiro, como para outros países – que abordam o uso e importância da estimativa de inflações implícitas em títulos indexados. Primeiramente, devemos destacar o artigo de Val, Barbedo e Maia (2010), doravante denominado VBM, no qual os autores realizam a mesma metodologia descrita no presente trabalho para avaliar o poder de estimação dos métodos supracitados contra a pesquisa do Gerin e contra a taxa real de inflação. Em seu estudo, VBM concluem que as estimativas da metodologia se mostraram mais próximas da realidade que as da pesquisa Gerin, porém com a grande ressalva que esta análise é valida apenas nos anos de 2006, 2007 e 2008 (data final do banco de dados avaliado), quando os títulos 2 A Gerência-Executiva de Relacionamento com Investidores - Gerin foi criada em abril de 1999, como parte do arcabouço do regime monetário de metas para a inflação. Seu objetivo é aperfeiçoar a comunicação entre o Banco Central do Brasil e o setor privado, com foco sobre os investidores domésticos e externos. Fonte: http://www4.bcb.gov.br/pec/gci/port/sobregerin.asp 3 Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo, ou IPCA, é calculado pelo IBGE e reflete o custo de vida para famílias com renda mensal de 1 a 40 salários mínimos. É o índice oficial de inflação do governo. 12 indexados passaram a ter um pouco mais de liquidez no mercado brasileiro. Desse fato surge a motivação de avaliar se o contínuo aumento da liquidez nos anos recentes e o crescimento da importância dos títulos indexados à variação de preços – tanto em volume de negociação como em aumento do percentual da dívida pública em poder do mercado - geraram melhora no poder preditivo dos instrumentos de negociação do mercado. Além disso, uma maior base de dados disponíveis nos permite chegar a um resultado mais robusto e consistente. Diferentemente do trabalho citado, porém, não vamos considerar o prêmio de risco de inflação que alguns autores questionam, já que acreditamos não ser este o foco de interesse do atual estudo. Em outro artigo, Vicente e Guillen (2010) analisam se os títulos vinculados à variação dos preços contêm informação sobre a inflação futura. Para tanto, fazem uma regressão da inflação acumulada realizada no período de estudo contra a expectativa de inflação implícita destes títulos. Seus resultados apontam que a BEIR é informativa e é um estimador não-viesado para a inflação em horizontes de 3 e 6 meses. Na mesma linha, Caldeira e Furlani (2011) concluíram que as inflações implícitas trazem informação relevante a respeito da inflação futura, especialmente para a maturidade de três meses. Christensen, Dion e Reid (2004), por sua vez, fazem a mesma análise do poder preditivo das Break-Even Inflation Rates dos títulos canadenses em comparação às pesquisas de mercado. Em seu trabalho, os autores concluem que essa medida era, na média, maior e mais volátil do que as expectativas de pesquisas para o período de 1992 a 2003. Um destaque importante desse trabalho reside na apresentação da metodologia de Cash Flow Matching para a obtenção das inflações implícitas em títulos indexados, método este adotado nesta tese. Ainda na mesma linha, Sack (2000) calcula uma inflação implícita através dos TIPS4 contra um portfólio de STRIPS5 de mesma maturidade. Em sua conclusão, o autor também argumenta que os resultados possuem maior variação do que em um modelo mais simples ou então em uma pesquisa de mercado. Os resultados obtidos nesta tese mostram que nos períodos de maior liquidez do mercado de títulos indexados, como é o caso atual, o melhor estimador para a inflação futura é dado pelo 4 5 Treasury Inflation-Protected Securities, ou TIPS, são títulos americanos indexados à inflação. Também conhecido como zero-coupon bond, é um titulo norte-americano cujo principal e os pagamentos de cupons são vendidos separadamente. Usualmente é um negócio de balcão (over the counter – OTC). 13 método de Svensson. Outra conclusão obtida é que a pesquisa de mercado do Relatório Focus apresenta menor volatilidade que os métodos analisados. Tende, porém, na média, a subestimar mais os valores de IPCAs futuros. Por fim, análises feitas no trabalho levam a crer que a inflação implícita dada nos títulos da dívida brasileira e nas pesquisas de mercado tende a responder mais aos dados passados e já conhecidos do que a uma real expectativa dos participantes do mercado para a inflação futura. Uma sugestão para possível aprofundamento, feito na linha deste trabalho, seria analisar qual o impacto obtido nos resultados quando consideramos os diversos prêmios de risco ao se negociar um bond. Um ativo de renda-fixa possui diversos prêmios de risco embutidos em seu preço, entre eles: de inflação, liquidez, downgrade, reinvestimento, etc. Ou seja, considera-se no preço do ativo negociado um prêmio demandado pelo comprador por correr esses riscos ao carregar o título em sua carteira, ou pelo vendedor ao deixar de estar protegido desse risco, como seria o caso da inflação para o vendedor de uma NTN-B, por exemplo. Como acreditamos que o impacto dos prêmios de risco não é o escopo do atual trabalho, estes não são considerados em nosso modelo, porém ficam como sugestão para um futuro estudo. O presente trabalho é composto por esta introdução e por breve análise do mercado de títulos indexados brasileiros, seção que descreve a participação e importância desses títulos na Dívida Pública Federal. A seção de Metodologia descreve e explicita os métodos utilizados neste paper; na sequência, é feita a descrição da base de dados utilizados e, após, o detalhamento dos resultados obtidos por esse estudo. A última sessão conclui o trabalho, com os principais resultados obtidos. 14 2. O mercado brasileiro de títulos indexados O mercado brasileiro possui hoje apenas dois títulos indexados a variações de preços: a NTNB, indexada ao Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), e a NTN-C, indexada ao Índice Geral de Preços do Mercado (IGP-M). O foco deste trabalho se concentra nas NTN-Bs, já que o IPCA é a diretriz do sistema de metas de inflação adotado pelo BC desde 1999. Além disso, as NTN-Cs são papéis de baixa liquidez, dado que estes títulos já não são mais emitidos pelo Tesouro Nacional. A NTN-B é um título que paga cupom semestral, de 6% ao ano, que incide sobre o valor nominal atualizado, isto é, corrigido pela inflação. Seu valor é atualizado pela variação do IPCA do mês anterior da data de negociação. A partir da data em que este índice é conhecido até a próxima divulgação, utiliza-se uma estimativa do IPCA no período (ou seja, para o mês corrente). Temos, com isso, que seu preço possui uma defasagem de aproximadamente um mês da variação efetiva dos preços dada pelo índice. Vale pontuar que quanto maior for essa defasagem de tempo, mais risco o investidor do papel corre por não ter seu patrimônio completamente protegido pela inflação do período. Nos últimos anos, o Tesouro Nacional tem mostrado interesse em aumentar a participação das NTN-Bs no estoque de sua dívida, conforme escrito no PAF 20136: “O alongamento do prazo médio da DPF e a manutenção dos vencimentos de curto prazo em níveis prudentes, bem como a continuidade da substituição gradual dos títulos indexados à taxa Selic por prefixados e remunerados por índices de preços, permanecem como diretrizes básicas na estratégia de emissão para 2013”. Por serem os títulos mais longos e de maior duration, bem como os únicos títulos indexados a preço atualmente emitidos pelo Tesouro Nacional, as NTN-Bs tiveram o maior aumento na participação do estoque de dívida do governo. Isso pode ser visto pela análise da Dívida Pública Mobiliária Federal interna (DPMFi), presente nos Relatórios Mensais da Dívida Pública Federal7, mostrados no gráfico 2.1 a seguir: 6 Plano Anual de Financiamento – PAF, é um instrumento de planejamento, previsibilidade e transparência em torno da estratégia de financiamento da Dívida Pública Federal. 7 O Relatório Mensal da Dívida Pública Federal apresenta informações sobre emissões, resgates, estoque, perfil de vencimentos e custo médio, dentre outras, para a Dívida Pública Federal, nela incluídas as dívidas interna e externa 15 Gráfico 2.1: Participação relativa dos Títulos no Estoque da DPMFi. Em destaque, a participação das NTN-Bs. Fonte: Relatório da Dívida Pública Federal – STN Vemos que a participação da NTN-B aumentou de 3.10%, em dezembro de 2004, para 32.53% em setembro de 2013, passando a ser o título com maior participação no estoque da DPMFi. Cresceu significativamente também a liquidez desse papel no mercado secundário. Para essa análise, podemos utilizar o financeiro médio negociado diariamente, disponível no Relatório Mensal da Dívida Pública Federal, e calculamos uma aproximação para o volume anual de negociação no mercado secundário. O resultado pode ser visto no gráfico 2.2 abaixo: O volume negociado saltou de pouco mais de 400 bilhões de reais ao ano (2006 a 2009) para mais de 1.4 trilhões de reais em 20138. de responsabilidade do Tesouro Nacional em mercado. Além disso, o documento contém informações sobre o programa Tesouro Direto e realiza acompanhamento do Plano Anual de Financiamento. 8 Valores para 2013 referentes ao acumulado até setembro, data da última divulgação disponível do relatório. 16 Gráfico 2.2: Valor Financeiro Negociado no Ano no mercado secundário, em Bilhões de Reais.O ano de 2013 possui informações até setembro, data do ultimo relatório disponível. Fonte: Relatório da Dívida Pública Federal – STN Alguns fatores podem explicar esse aumento da relevância das NTN-Bs, tanto no estoque como na movimentação do papel. São esses, entre outros: a estratégia de alongamento da DPF, citada anteriormente; o aumento da participação de investidores estrangeiros no mercado nacional; o aumento do número de vencimento desses papéis, bem como do prazo de vencimento e duration dos mesmos; consolidação do cenário e políticas macroeconômicas mais críveis e estáveis, permitindo que investidores aplicassem seu dinheiro no país. A ampla melhora desse mercado, tanto em volume quanto em liquidez, nos dá indícios de que a estimação da expectativa de inflação utilizando estes títulos da dívida pode vir a ser uma boa proxy para a inflação futura realizada. 17 3. Metodologia Este trabalho usa duas metodologias principais para estimar a BEIR: Metodologia de Svensson e Cash Flow Matching, descritas a seguir. Além disso, consideramos a estimativa do relatório Focus como uma terceira alternativa para estimativa de inflação futura do mercado. 3.1. Metodologia de Svensson (1994) Como uma primeira estimação, vamos utilizar o método descrito por Svensson (1994) para a obtenção de curvas continuas de juros reais e juros nominais. Após esse cálculo, utilizamos a relação de Fisher para encontrarmos a inflação implícita para o período desejado, que no caso da análise em questão são 12 meses. O método de Svensson é uma abordagem paramétrica que define a taxa de juros spot zerocupom, denominada y(), para uma determinada maturidade. Para isso, parte-se da premissa básica que um título de renda fixa, numa data qualquer, é precificado pelo valor atual de todos os seus pagamentos futuros. Temos assim que: k Pt Fj,t b t (Tj ) t (1) j1 onde Pt é o preço (valor presente) do título na data de avaliação t, Fj,t é o j-ésimo pagamento (cupom ou principal) do título na data t, Tj é a maturidade de cada fluxo de caixa, k o numero total de pagamentos e t é o erro cometido pelo modelo, também na data t. A função desconto, bt(Tj) é definida pela equação a seguir: b t (Tj ) 1 1 y (T ) (2) Tj t j Finalmente, Svensson define a taxa spot para a maturidade através da seguinte relação: 1 e 1 y ( ) 1 2 1 1 e 1 3 e 1 1 1 e 2 4 e 2 2 (3) 18 aonde 1, 2 , 3 , 4 , 1 e 2 são constantes estimadas através da minimização da diferença dos preços dos títulos calculados pelo método descrito acima e os preços observados no mercado para a data em análise. Baseados num estudo da Anbima sobre a estrutura a termo das taxas de juros9, podemos fazer uma primeira interpretação dos fatores da equação de Svensson e concluir que 1 possui interpretação de nível (ou intercepto) - e teria valor de ordem de grandeza próxima do nível de taxa de juros atual - enquanto 2 representa a inclinação. O par 3 e 4 ditam as curvaturas e as constantes 1 e 2 caracterizam o seu respectivo decaimento no ajuste da interpolação. Para a análise da influência temporal dos fatores, podemos calcular os limites de tendendo a zero, dando sentido de “taxa instantânea”, e tendendo a infinito, dando sentido de longo prazo. Os limites são representados abaixo, e nos levam a concluir que no longo prazo a taxa de juros tende a 1, enquanto que no curto prazo, seria a soma de 1 com 2. lim y ( ) 1 2 0 lim y ( ) 1 (4) A equação (3) descrita acima é utilizada tanto para estimar a curva de juros nominal quanto a real. No caso da curva real, utilizou-se a precificação dos títulos das NTN-Bs10. Já para a curva nominal, assim como feito por VBM, escolheu-se a curva de DI futuros11 da BM&FBovespa, já que esta possui mais vencimentos e maior liquidez do que os títulos públicos pré-fixados. Além disso, os títulos pré-fixados são comumente negociados em pontos de ágio/deságio em relação à curva futura, o que acrescentaria um prêmio de demanda aos resultados, o que não é a intenção deste estudo abordar. 9 http://portal.anbima.com.br/informacoes-tecnicas/precos/ettj/Documents/est-termo_metodologia.pdf 10 Nota do Tesouro Nacional série B, NTN-B, é um título de rentabilidade indexada à variação do IPCA acrescida de uma taxa de juros definida no momento da compra. Este papel possui cupom (semestral) e pagamento do principal no vencimento. A rentabilidade não é conhecida no momento da compra, portanto é um título pós-fixado. 11 Contrato futuro da Taxa Média de Depósitos Interfinanceiros de Um Dia, conhecido como DI futuro, é um swap aonde um dos participantes recebe uma taxa pré-fixada e paga uma taxa pós-fixada. Seu ativo objeto é a taxa de juro efetiva até o vencimento do contrato, definida para esse efeito pela acumulação das taxas diárias de DI no período compreendido entre a data de negociação, inclusive, e o último dia de negociação do contrato, inclusive. 19 A partir das curvas reais e nominais obtidas, conseguimos calcular o valor da BEIR, para um período t, denotada por te , através da equação de Fisher, conforme segue: te (1 i t ) 1 1 rt (5) Aonde it é a taxa de juros nominal e rt é a taxa de juros real para o tempo t. Vale ressaltar que as variáveis it e rt são obtidas através da equação (3). 3.2. Metodologia de Cash Flow Matching A segunda metodologia utilizada para a obtenção da BEIR é baseada no método descrito por Christensen, Dion e Reid (2004) e por Sack (2000). Nesse método, interpolamos a curva nominal para obter as taxas spots de mesma maturidade de cada um dos fluxos de caixa de um título indexado previamente definido. Com isso, encontramos a inflação implícita para cada um dos pagamentos e chegamos a um valor final para a BEIR do período. Colocando de maneira diferente, resolvemos o problema iterativamente, para uma inflação constante, descontando os fluxos de caixa futuros por taxas obtidas de uma curva nominal spot zero-cupom. Vale notar que esse valor encontrado é um valor médio ponderado pelos pagamentos, e considerado constante para toda a vida do título indexado que estamos analisando. Apesar disso, o “percurso” da inflação durante a vida do bond é relevante, já que a inflação realizada irá mudar o valor dos diferentes cupons, e consequentemente mudar o preço do título. A seguir mostramos o passo a passo do modelo. Podemos considerar o preço Pt de um título qualquer de valor de face VF (fixo) e pagamento de cupons c é dado pela seguinte fórmula: N c VF VF Pt n (1 i N,t ) N n 1 (1 i n,t ) (6) A equação (6) nada mais é do que a mesma relação descrita em (1), porém com a diferenciação de cada tipo de pagamento em cupons e principal. Temos que os títulos indexados a um índice 20 de preços garantem, além dos juros estabelecidos no momento da compra, proteção para a inflação. Temos, portanto, que tanto os cupons quanto o pagamento do principal são corrigidos pela variação dos preços no período, conforme mostrado a seguir: N c VF ( P P ) VF ( P t n t t N Pt ) Pt n (1 i n,t ) (1 i N,t ) N n 1 Se chamarmos a variação de preços (7) ( Pt n Pt ) de (1 ne,t ) , sendo n,e t a taxa média de inflação esperada para o período n na data t, chegamos à seguinte precificação de um título indexado: N c VF (1 e ) n,t Pt n 1 (1 i n,t ) n e VF (1 N, t) (1 i N,t ) N (8) Dado que o preço do título é conhecido, já que é negociado em mercado secundário diariamente - assim como as taxas spots in,t - conseguimos inferir a taxa de inflação que está implícita no título indexado pela equação (8) descrita acima. Nesta modelagem, assim como justificado acima no método de Svensson, utilizou-se a curva de DI futuros da BM&FBovespa. Para encontrar as taxas nas datas exatas dos fluxos de caixa do título indexado, adotou-se o método de spline cúbico (cubic-spline)12, amplamente utilizado no mercado financeiro e no meio acadêmico. 3.2. Relatório Focus Como uma terceira alternativa para estimar o BEIR, utilizamos a expectativa do mercado para o IPCA dada pela série histórica do Relatório Focus, disponível no site do Banco Central. 12 Um spline é uma curva definida matematicamente por dois ou mais pontos de controle, e pela qual é possível inferir um ponto que se situe entre eles. No caso do spline cúbico, utilizam-se polinômios de terceiro grau na interpolação. 21 4. Descrição dos Dados Para a realização deste trabalho, foram utilizados dados históricos de preços de títulos da dívida brasileira, bem como de juros futuros, conforme citado anteriormente. Para estes últimos, foram considerados os preços de ajuste diário13, definidos pela BM&FBovespa. Já para os títulos de NTN-B, nos valemos dos preços de fechamento da ANBIMA14, diariamente divulgados em seu site. Para os valores de IPCA realizado, considerou-se o valor mensal divulgado pelo IBGE, no mês seguinte ao mês de referência. Esse dado é divulgado em percentual, e já representa a variação de preços oficial que é utilizada pelo governo. Ambos os preços dos títulos e a série histórica do IPCA foram obtidos através da ferramenta Bloomberg®. Conforme citado no item anterior, escolhemos o Relatório Focus, disponível no site do Banco Central, como terceira alternativa para a expectativa futura da inflação. Para tanto, utilizamos a mediana da série suavizada da expectativa da inflação acumulada para os próximos 12 meses, conforme pode ser vista no gráfico a seguir: Gráfico 4.1: Mediana suavizada da expectativa do IPCA para os próximos 12 meses Fonte: Banco Central do Brasil - https://www3.bcb.gov.br/expectativas/publico/consulta/serieestatisticas 13 Segundo o site da BM&FBovespa, o preço de ajuste é dado pelo preço médio dos negócios realizados com o papel no mercado futuro no período da tarde da data em questão. 14 Anbima - Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais – é um órgão autoregulador que representa as instituições que atuam no mercado de capitais brasileiro, com o objetivo de fortalecer o segmento, apoiar a evolução de um mercado de capitais capaz de financiar o desenvolvimento econômico e social do país e influenciar o mercado global. Para mais informações, acessar http://portal.anbima.com.br/Pages/home.aspx 22 Como os dados do IPCA são divulgados apenas uma vez por mês, considerou-se as datas de divulgação como os pontos base para a obtenção dos dados, isto é, utilizou-se dados mensais de preços, expectativas e IPCA realizado, coincidindo com a data de divulgação do Índice de preços. As séries históricas utilizadas vão de janeiro de 2004 até novembro de 2012. Limitou-se a data inicial a janeiro de 2004 devido à baixa liquidez dos títulos de NTN-B em períodos anteriores. Na verdade, mesmo para período de 2004 a 2006, a liquidez dos títulos indexados era muito baixa, e no caso em que havia dias sem negociação desses papéis, considerou-se a ultima informação de preço disponível como a corrente nesta data. Vale ressaltar que isso só foi necessário nos anos de 2004 e 2005. O limite superior, novembro de 2012, foi estabelecido por ser o último período com dados disponíveis para o IPCA realizado 12 meses à frente, já que a ultima divulgação de IPCA pelo IBGE era referente a outubro de 2013 – período em que esse trabalho estava em andamento. 23 5. Resultados Realizadas as estimações, procedemos com a avaliação da capacidade de cada uma das estimativas inflacionárias adotadas para prever a real variação futura de preços. Para isso, começamos avaliando o comportamento temporal das séries para o período estudado. Gráfico 5.1: Comparação temporal das séries: Svensson, Cash Flow, Focus e IPCA realizado 12 meses à frente. 14,0% 12,0% 10,0% 8,0% 6,0% 4,0% 2,0% 0,0% jan/04 jan/05 jan/06 Svensson jan/07 CashFlow jan/08 jan/09 jan/10 Focus jan/11 jan/12 IPCA Realizado Fonte: IBGE e Banco Central do Brasil Na análise do gráfico acima (5.1), percebemos, primeiramente, que a baixa liquidez dos títulos indexados no período de 2004 e 2005 fez com que ambas as séries dos métodos Svensson e Cash Flow tivessem um comportamento mais errático, com maior valor nominal e maior volatilidade do que registrado na pesquisa de mercado Focus e no IPCA realizado. Para os períodos seguintes, vemos que o comportamento de ambos os métodos e da pesquisa acabam convergindo para uma mesma tendência, apesar de, visualmente, a série de a pesquisa Focus continuar sendo menos volátil do que os métodos estudados. A questão da volatilidade dos métodos calculados ser maior que a pesquisa de mercado está descrita na literatura em Christensen, Dion e Reid (2004). Um bom estudo - baseado no gráfico acima e nos dados apresentados sobre os volumes existentes e negociados desses títulos em cada ano - é analisar em paralelo o período de 2006 em diante, quando a liquidez dos títulos indexados é maior. Tal constatação da falta de liquidez para os períodos anteriores a 2006 é embasada por estudos da literatura, e já havia também sido feita por VBM. 24 Em segundo lugar, fazendo uma comparação apenas nos métodos Svensson e Cash Flow, notamos que movimentos de alta nas expectativas tendem a ser mais bruscos quando avaliados pelo segundo método. Para isso, basta notar que nos 3 principais picos para o período de liquidez (jul/08, jan/11 e set/11) as expectativas dadas pela série Cash Flow tiveram movimentos maiores, mas que convergiram rapidamente nos períodos seguintes. Uma possível explicação para essa diferença está no fato de que a análise da expectativa de inflação para um ano, pelo método Cash Flow, utiliza basicamente os 2 primeiros títulos indexados da curva, e estes tendem a ser mais impactados em movimentos de alta nas expectativas, dadas as precificações e proteções (hedges) dos participantes de mercado para o curto prazo. Como o método Svensson utiliza todos os pontos da série para fazer uma interpolação, esse movimento mais brusco na parte curta da curva tende a ser suavizado. Por fim, a análise visual das séries indica que os três métodos avaliados sempre parecem estar defasados com relação ao IPCA realizado, ou seja, primeiro se identifica uma tendência de movimento (seja de alta ou baixa) nos preços reais para então termos esse reflexo nas expectativas. Isso seria, aparentemente, um argumento a favor da tese de que a variação nos preços correntes cria um viés nas expectativas futuras, ou seja, um alto IPCA hoje levaria a expectativa de altos IPCAs para o futuro. Uma maneira de testar essa hipótese é comparar, em um gráfico semelhante ao gráfico 5.1, os métodos analisados com o IPCA realizado dos 12 meses anteriores ao da data em questão, ou seja, o IPCA passado de um ano que é divulgado na data da análise. O resultado pode ser verificado no Gráfico 5.2. Pela análise visual da série temporal do gráfico 5.2, vemos uma certa tendência entre os dados das estimativas correntes com o IPCA passado. Conforme mencionado anteriormente, as estimativas parecem depender muito mais do movimento dos dados passados (ou atuais) da inflação do que da previsão para os valores futuros do IPCA. Nesse caso, as estimativas poderiam ser consideradas muito mais uma resposta aos dados anteriores do que efetivamente uma previsão do que estaria por acontecer no futuro. 25 Gráfico 5.2.: Comparação temporal: Svensson, Cash Flow, Focus e IPCA realizado 12 meses anteriores. 14,0% 12,0% 10,0% 8,0% 6,0% 4,0% 2,0% 0,0% jan/04 jan/05 jan/06 Svensson jan/07 jan/08 CashFlow jan/09 jan/10 Focus jan/11 jan/12 IPCA passado Fonte: IBGE e Banco Central do Brasil Para comparar os três métodos, realizamos as correlações de cada uma das séries com o IPCA ocorrido no período. Um resumo dos resultados é apresentado na tabela a seguir: Tabela 5.1: Comparação das correlações de cada série com o IPCA realizado 12 meses à frente,para os períodos de 2004-2012 e 2006-2012 Correlação com IPCA realizado – 12 meses à frente 2004-2012 2006-2012 Svensson 0,277 0,474 Cash Flow 0,514 0,379 Focus 0,374 0,235 Na tabela 5.1, vemos claramente que quando consideramos o período completo, o método Cash Flow apresenta maior correlação com os dados reais. Já, se excluirmos o período de baixa liquidez, temos que o método de Svensson possui uma correlação mais alta. Cabe aqui destacar dois pontos: primeiramente, em nenhum caso apresentado temos uma correlação muito alta e próxima de 1, sendo que a mais alta seria 0,51 para o Cash Flow na série completa. Segundo, a série Focus sempre possui correlação menor do que algum dos métodos - ou até mesmo ambos - para o período de maior liquidez. Fazendo o mesmo estudo da correlação dos métodos para o IPCA realizado nos 12 meses anteriores à data de estimação dos métodos, chegamos na seguinte tabela de correlações: 26 Tabela 5.2: Comparação das correlações de cada série com o IPCA realizado nos 12 meses anteriores, para os períodos de 2004-2012 e 2006-2012 Correlação com IPCA realizado – 12 meses anteriores 2004-2012 2006-2012 0,671 0,584 Svensson 0,620 0,658 Cash Flow 0,764 0,792 Focus Existem duas principais inferências dos resultados obtidos acima. Primeiro, quando comparamos a Tabela 5.1 com a Tabela 5.2, notamos que as 3 séries de estimativas estudadas possuem uma correlação maior com o IPCA histórico já conhecido na data de análise do que com o IPCA realizado 12 meses à frente. Esse dado, mais uma vez, corrobora com a tese levantada de que tanto a precificação dos títulos do mercado quanto a pesquisa Focus são uma melhor resposta para a variação de preços já decorrida do que para a estimativa futura. Em segundo lugar, podemos também concluir que independente da análise considerar o período de baixa liquidez ou não, a pesquisa Focus é sempre mais influenciada por dados passados, já que sua correlação é maior do que as outras estimativas em ambos os casos. Isso poderia ser um indício que, entre os 3 estimadores, a pesquisa seria o que tem menor poder de explicação futura. Em seguida, utilizamos dois métodos de comparação para as séries: a Raiz do Erro Quadrado Médio (REQM) e o cálculo do Viés dos dados. Inicialmente, calculamos a Raiz do Erro Quadrado Médio (REQM) de cada série, dada pela fórmula (9) a seguir: 1 𝑅𝐸𝑄𝑀 = √ ∑𝑛𝑡=1(𝑥̇ 𝑡 − 𝑦𝑡 )2 𝑛 (9) Sendo 𝑥𝑡̇ o t-ésimo ponto calculado pelo método em questão, e yt o ponto observado (IPCA realizado). Através da REQM podemos avaliar qual modelagem produz o menor erro nas estimativas para um determinado período. Podemos dizer então que esse método funciona como uma medida de precisão: a REQM sempre irá retornar um valor positivo, e o valor zero indicaria uma previsão perfeita. Uma crítica a esse método é a de que, ao elevar ao quadrado as diferenças da previsão e do observado, este daria um peso maior a dados mais discrepantes. 27 A tabela 5.3 (abaixo) nos dá os resultados do REQM de cada uma das séries de expectativas para cada um dos anos de estudo, bem como para os períodos acumulados. Nesse caso, mais uma vez, estamos analisando a série tanto no caso em que consideramos o período de baixa liquidez, nos anos de 2004 e 2005, quanto apenas no período de maior liquidez dos títulos. Tabela 5.3: Raiz do Erro Quadrado Médio das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente REQM Período jan/04 nov/12 jan/06 nov/12 Svensson CashFlow Focus 0,0210 0,0151 0,0125 0,0110 0,0117 0,0125 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 jan/12 nov/12 0,0229 0,0500 0,0069 0,0178 0,0097 0,0099 0,0131 0,0052 0,0080 0,0239 0,0222 0,0072 0,0180 0,0126 0,0077 0,0118 0,0116 0,0083 0,0149 0,0089 0,0087 0,0200 0,0116 0,0080 0,0175 0,0048 0,0082 A seguir, desenhamos o gráfico da janela móvel do REQM para cada uma das séries de estimativas avaliadas: Gráfico 5.3: Janela móvel da Raiz do Erro Quadrado Médio das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente. 0,40% 0,35% 0,30% 0,25% 0,20% 0,15% 0,10% 0,05% 0,00% jan/04 jan/05 jan/06 jan/07 Svensson jan/08 jan/09 jan/10 CashFlow jan/11 jan/12 jan/13 Focus Fonte: Banco Central do Brasil Pela análise dos dados mostrados na tabela e no gráfico acima vemos que, ao desconsiderar o período de menor liquidez, o método de Svensson se mostra o mais eficaz, já que retorna os menores valores de REQM para o período completo de 2006 a 2012. Mesmo quando analisamos ano a ano, este método se mostrou o mais eficaz, à exceção dos anos de 2009 e 2010. Quando consideramos também o período de baixa liquidez, temos que Svensson passaria a ser o pior método, sendo que essa diferença é quase que totalmente justificada pelo ano de 2005, conforme o viés explicado anteriormente do REQM para grandes discrepâncias. Nesse período completo, 28 o melhor método estimador seria a pesquisa Focus, segundo a análise do REQM. Também podemos notar que há, para todos os métodos, uma tendência de redução nos valores observados no decorrer dos anos, bem como uma convergência nos dados encontrados dos diferentes estimadores. Esses resultados se mostram em linha com a literatura. O fato do método de Svensson apresentar os melhores resultados para o período de maior liquidez está de acordo com o encontrado em VBM. Além disso, em seu estudo os autores também concluíram que se incluíssemos os dados dos anos de menor liquidez, a estimativa de mercado produziria um melhor resultado. A segunda avaliação feita, conforme citado anteriormente, é referente ao viés de cada série, dado pela seguinte relação: 1 𝑉𝑖é𝑠 = ∑𝑛𝑡=1(𝑥̇ 𝑡 − 𝑦𝑡 ) (10) 𝑛 Sendo 𝑥𝑡̇ o t-ésimo ponto calculado pelo método em questão, e yt o ponto observado (IPCA realizado). O viés nos ajuda a avaliar se o modelo em questão superestima, gerando um viés positivo, ou subestima, gerando um valor negativo, os valores reais. Abaixo temos o resultado do viés de cada uma das séries de expectativas para cada um dos anos de estudo, bem como para os períodos acumulados. Como feito anteriormente para o REQM, estamos analisando a série tanto no caso em que consideramos apenas o período de alta liquidez, quanto no caso em que incluímos também os anos de 2004 e 2005, referentes ao período de pouca negociação dos títulos indexados. Tabela 5.4: Média do viés das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente Viés Período jan/04 nov/12 jan/06 nov/12 Svensson CashFlow Focus 0,33% 0,27% -0,58% -0,53% -0,28% -0,69% 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 jan/12 nov/12 1,78% 4,63% 0,38% -1,62% 0,09% -0,83% -1,21% 0,29% -0,58% 2,13% 2,05% 0,45% -1,63% 0,36% -0,41% -0,89% 0,96% -0,66% -1,14% 0,70% 0,63% -1,82% -0,18% -0,60% -1,73% -0,05% -0,77% A seguir, desenhamos o gráfico da janela móvel do viés para cada uma das séries de estimativas avaliadas: 29 Gráfico 5.4: Janela móvel do viés das expectativas em relação ao IPCA ocorrido 12 meses à frente. 7,00% 6,00% 5,00% 4,00% 3,00% 2,00% 1,00% 0,00% -1,00% -2,00% -3,00% -4,00% jan/04 jan/05 jan/06 jan/07 Svensson jan/08 jan/09 jan/10 CashFlow jan/11 jan/12 jan/13 Focus Fonte: Banco Central do Brasil Vemos que a medida do Cash Flow é a que possui o menor viés médio comparado ao IPCA realizado nos 12 meses decorridos à frente - tanto no período completo, quando este método possui um viés positivo de 0,27%, quanto no período de maior liquidez, em que o Cash Flow possui um viés médio de -0,28%. Vale destacar também que os resultados das diferentes estimativas também tendem a convergir ao longo dos anos. Cabe ressaltar que a pesquisa Focus possui um viés consistentemente mais negativo do que os outros métodos, o que significa que ela tende a subestimar mais a inflação futura quando comparada ao método de Svensson ou Cash Flow. Esse resultado para o estudo do viés também está de acordo com o que encontramos na literatura, já que em VBM a estimativa do IPCA futuro dada pela pesquisa de mercado tendia a subestimar consistentemente o dado observado. 30 6. Conclusão O objetivo deste trabalho foi estudar o uso de métodos alternativos para a estimação da inflação futura no Brasil, utilizando-se a inflação implícita nos títulos da dívida brasileira. Para tanto, utilizamos a metodologia de Svensson (1994) e o estudo por Cash Flow matching, bem como o relatório Focus, divulgado pelo Banco Central do Brasil. Os resultados obtidos demonstraram que nos períodos de maior liquidez do mercado de títulos indexados, ou seja, de 2006 até hoje, o melhor estimador para a inflação futura é dado pelo método de Svensson. Os dados se mostraram diferentes quando analisados desde 2004, pois a liquidez dos títulos indexados em 2004 e 2005 era muito baixa. Porém, como a dinâmica do mercado de dívida brasileira mudou muito desde o começo da negociação das NTN-Bs e estas passaram a ter uma grande importância no estoque da dívida pública federal e na negociação do mercado secundário, faz sentido excluir da análise os primeiros anos, considerando que acabam por distorcer os dados e utilizar como verdadeiro o resultado a partir de 2006. Devemos destacar também que, apesar de a pesquisa de mercado do Relatório Focus apresentar menor volatilidade do que os métodos estimadores supracitados, esta tende a subestimar mais os valores de IPCAs futuros. Outro ponto importante a se notar, e que foi destacado neste trabalho, é que os valores dos estimadores estudados e da pesquisa de mercado tiveram uma maior correlação com a série de dados do IPCA dos 12 meses anteriores do que com o IPCA de 1 ano à frente. Esse resultado aponta indícios que a inflação implícita dada nos títulos da dívida brasileira - seja ela calculada por qualquer um dos métodos analisados ou pela pesquisa de mercado - tende a responder mais aos dados passados e já conhecidos do que a uma real expectativa dos participantes do mercado para a inflação futura. Mostra, portanto, que existe uma certa inércia na economia, e portanto a inflação passada influencia no impacto da expectativa futura. Como sugestão para os estudos futuros nessa área de discussão, levantamos a possibilidade da análise do impacto obtido nos resultados descritos acima quando consideramos os diversos prêmios de risco ao se negociar um bond, conforme citado anteriormente. 31 Referências CHRISTENSEN, Ian; DION, Frédéric; REID, Christopher. Real Returns, Inflation Expectations and the Break-Even Inflation Rate. Ottawa, 2004. Bank of Canada, Working Paper Series No. 2004-43. SACK, Brian. Deriving inflation expectations from nominal and inflation-indexed Treasury Yields. Washington, 2000. Board of Governors of the Federal Reserve System, Finance and Economics Discussion Series No. 2000-33 SVENSSON, Lars E. O. Estimating and Interpreting Foreward Interest Rates: Sweden 1992-1994. Sweden, 1994. NBER Working Papers 4871, National Bureau of Economic Research, Inc. VAL, Flávio F.; BARBEDO, Claudio H. S. ; MAIA, Marcelo V. Expectativas Inflacionárias e Inflação Implícita no Mercado Brasileiro. Brasília, 2010. Banco Central do Brasil, Working Paper Series, N. 225. VICENTE, José V.M.; GUILLEN, Osmani T.C. Do inflation-linked bonds contain information about future inflation? Brasília, 2010. Banco Central do Brasil, Working Paper Series, N. 214.