UNIVERSIDADE DE MARÍLIA - UNIMAR
GLAUCO MOLINA
CONTRATOS TELEMÁTICOS: REGULAMENTAÇÃO E REFLEXOS
ECONÔMICOS COM BASE NO DIREITO DO CONSUMIDOR
MARÍLIA
2008
GLAUCO MOLINA
CONTRATOS TELEMÁTICOS: REGULAMENTAÇÃO E REFLEXOS
ECONÔMICOS COM BASE NO DIREITO DO CONSUMIDOR
Dissertação apresentada
ao Programa
de Mestrado em Direito da Universidade
de Marília, como exigência parcial para a
obtenção do grau de Mestre em Direito,
sob a orientação da Profª. Drª. Soraya
Regina Gasparetto Lunardi.
MARÍLIA
2008
Autor: GLAUCO MOLINA
Título: CONTRATOS TELEMÁTICOS: REGULAMENTAÇÃO
ECONÔMICOS COM BASE NO DIREITO DO CONSUMIDOR
E
REFLEXOS
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado em Direito da Universidade de Marília,
área de concentração Empreendimentos Econômicos, Desenvolvimento e Mudança Social,
sob a orientação da Professora Doutora Soraya Regina Gasparetto Lunardi.
Aprovado pela Banca Examinadora em 08 de Agosto de 2008.
_____________________________________________
Professora Doutora Soraya Regina Gasparetto Lunardi
Orientadora
___________________________________________
Professora Doutora Maria de Fátima Ribeiro
Examinadora
__________________________________________
Professora Doutora Eliana Franco Neme
Examinadora
Àquelas que para mim representam a
verdadeira essência do amor, minhas filhas
Rebeca e Bárbara.
À Elaine, mais que esposa, sinônimo de
amor verdadeiro.
A meus velhos e bons pais, que a mim
renderam, no âmago de seus seres, a
essência do amor.
Todo e qualquer agradecimento aqui
rendido há de ser considerado etéreo, eis
que nada, absolutamente nada, durante esta
caminhada foi privado da Comunhão
Divina.
Colegas vindos de Estados longínquos e as
conseqüentes idas e voltas todas bem
sucedidas.
Perfis tão diferentes em cada um de nós,
contudo, a bem da verdade, não obstante a
distância e as dificuldades, não víamos a
hora de chegar o dia da aula de mestrado
em Marília.
Eméritos Professores, dois anjos na pele de
secretárias (Andréa e Regina) e a ocorrência
de amizade verdadeira e incondicional entre
os alunos; essa, a receita de um curso de
mestrado especial.
A todos esses seres e, em especial, meus
companheiros de viagem, Fernando e José
Vicente, não só agradeço profundamente,
como também rendo as mais sinceras
homenagens.
"As tecnologias de informação e de
negócios estão se tornando inevitavelmente
uma coisa só. Não creio que alguém possa
falar sobre um sem falar sobre o outro. A
Internet auxiliará a obter 'livre fricção do
capitalismo' ao colocar comprador e
vendedor em contato direto e providenciar
mais informação para ambos sobre cada
um."
Bill Gates
CONTRATOS TELEMÁTICOS: REGULAMENTAÇÃO E REFLEXOS
ECONÔMICOS COM BASE NO DIREITO DO CONSUMIDOR
Resumo
O desenvolvimento da tecnologia introduziu profundas mudanças nos costumes e hábitos da
sociedade do final do Século passado. Especialmente as tecnologias da informação,
consideradas o grande motor da hodierna sociedade, serviram de base às mudanças mais
relevantes. Tais transformações alcançaram as práticas comerciais obrigando o legislador a
adaptar o ordenamento jurídico à nova realidade social que se originou a partir da introdução
dos avanços tecnológicos na vida cotidiana do homem. O Contrato Telemático, objeto deste
estudo, é fruto do uso dessas novas tecnologias e pode ser entendido como o pacto realizado
através do uso combinado do computador e dos meios de telecomunicação, especificamente
da Internet. A Internet entrou na vida das pessoas de forma definitiva e, por certo, os tratos
comerciais telemáticos ainda estão no limiar de seu desenvolvimento, porém,
indiscutivelmente, serão presença na rotina diária da sociedade, que hoje vive a chamada Era
da Informação, dado especialmente a celeridade que representam. A celeridade, a facilidade e
outras vantagens neles ínsitas, contudo, não justificam a insegurança que ainda paira nas
relações jurídicas entabuladas tendo como suporte o meio virtual. Assim é afirmado, tendo em
vista que não existe na nova legislação substantiva pátria nenhum artigo que trate
especificamente desse tipo de contratação. Ao que parece, inexistem, da mesma forma,
premissas legais que definam como se dá a formação do consentimento nos Contratos
Eletrônicos, uma vez que ela é on-line, o que caracteriza a desumanização do Contrato.
Aspectos jurídicos clássicos, a legislação existente no Brasil e até mesmo advinda de outros
países, bem como o próprio Código de Defesa do Consumidor, serão objeto da pesquisa, no
intuito de serem analisadas para verificar suas aplicações às lides que surgirem envolvendo
relação contratual telemática. Desta forma, o presente trabalho se propõe a buscar dados que
demonstrem qual a importância de se discutir possível criação de legislação específica,
harmonizando, destarte, as relações de consumo finalizadas por meio de contratação
eletrônica, a partir dos Princípios da Boa-Fé Objetiva, da Função Social do Contrato e de seus
Princípios Clássicos, orientando-se no sentido de proteção ao vulnerável e hipossuficiente, de
forma a evitar maiores prejuízos ao consumidor.
Palavras-chave: Contrato, contrato telemático, comércio eletrônico, internet, consumidor.
TELEMATICS CONTRACTS: ECONOMIC REGULATION AND
REFLECTIONS BASED ON CONSUMER RIGHTS
Abstract
The development of the technology introduced deep changes in the customs and habits of the
society of the end of last century. Especially the technologies of the information, considered
the great motor of the current society, they served as base to the most relevant changes. Such
transformations reached the commercial practices and such circumstance forces the legislator
to adapt the juridical order to the new social reality that arose starting from the introduction of
the technological progress in the common citizen's daily life. The Telematics Contracts, object
of this study, is fruit of the use of those new technologies, and it can be understood as the pact
accomplished through the combined use of the computer and of the telecommunication
means, specifically of the Internet. The Internet entered in the people's in a definitive way life
and, for right, the treatments telematics commercial are still crawled, however, indisputably,
they will be presence in the daily routine of the society, that today lives the call was of the
Information, especially given the velocity that they act. The velocity, the easiness and other
advantages in them inserted, however, they don't justify the insecurity that still hovers in the
begun juridical relationships tends as support the virtual way. It is affirmed like this, tends in
view that doesn't at least exist in the new legislation substantive homeland a line that treats of
that recruiting type. To the that seems, they inexist, in the same way, legal premises that
define as feels the formation of the consent in the electronic contracts, once she is on-line,
what characterizes the dehumanization of the contract. Classic juridical aspects, the existent
legislation in Brazil and even come of other countries, as well as the own Code of Defense of
the Consumer, they will be object of the research, in the intention of they be analyzed to
verify their application to you participate in them that appear involving relationship telematic
contractual. This way, the present work if it proposed to look for data that demonstrate which
the importance of discussing possible creation of specific legislation, harmonizing, like this,
the consumption relationships concluded through electronic recruiting, starting from the
beginnings of the good-faith it aims at, of the social function of the contract and of their
classic beginnings, being guided in the protection sense to the vulnerable and wanting, in way
to avoid larger damages to the consumer.
Keywords: Contract, telematic contract, electronic trade, internet, consuming
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 10
1
-
HISTÓRICO:
CONTRATO
CLÁSSICO,
INTERNET
E
CONTRATO
TELEMÁTICO
1.1 CONTRATO CLÁSSICO .............................................................................................. 16
1.2 INTERNET..................................................................................................................... 22
1.3 CONTRATO TELEMÁTICO – HISTÓRICO .............................................................. 26
2 - CONCEITOS: DOCUMENTO, DOCUMENTO ELETRÔNICO, DOCUMENTO
TELEMÁTICO, COMÉRCIO ELETRÔNICO E COMÉRCIO TELEMÁTICO
2.1 DOCUMENTO............................................................................................................... 30
2.2 DOCUMENTO ELETRÔNICO..................................................................................... 31
2.3 DOCUMENTO TELEMÁTICO .................................................................................... 33
2.4 O COMÉRCIO ELETRÔNICO E COMÉRCIO TELEMÁTICO ................................. 34
3 - LEGISLAÇÃO ALIENÍGENA, PRODUÇÃO LEGISLATIVA PÁTRIA E O
CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
3.1 LEGISLAÇÃO ALIENÍGENA: ALEMANHA, PORTUGAL, FRANÇA, ITÁLIA,
CUBA, COLÔMBIA E ARGENTINA ................................................................................ 37
3.2 LEI MODELO UNICITRAL E OS PROJETOS DE LEI BRASILEIROS ................... 47
3.3 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR ............................................................... 51
3.3.1 Consumidor – conceito................................................................................................ 51
3.3.2 Fornecedor – conceito ................................................................................................. 54
3.3.3 Relação de consumo – conceito .................................................................................. 56
4 - APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS AOS CONTRATOS
TELEMÁTICOS
4.1 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS CLÁSSICOS............................................................... 59
4.1.1 Autonomia da vontade, consensualismo e força obrigatória....................................... 59
4.2 BOA-FÉ.......................................................................................................................... 62
4.3 FUNÇÃO SOCIAL ........................................................................................................ 64
5 - ASPECTOS JURÍDICOS DO CONTRATO TELEMÁTICO
5.1 VALIDADE DOS DOCUMENTOS ELETRÔNICOS E TEMÁTICOS ...................... 67
5.2 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS NO COMÉRCIO TELEMÁTICO ............... 71
5.3 REQUISITOS DE VALIDADE..................................................................................... 82
5.4 FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO DO CONTRATO TELEMÁTICO .............. 83
5.5 LOCAL EM QUE SE FORMA O CONTRATO TELEMÁTICO ................................ 84
5.6 FORO COMPETENTE .................................................................................................. 87
5.7 A OFERTA..................................................................................................................... 90
5.8 PROTEÇÃO CONTRATUAL....................................................................................... 92
5.9 MEIOS DE PROVA....................................................................................................... 94
CONCLUSÕES..................................................................................................................104
REFERÊNCIAS ................................................................................................................104
ANEXO...............................................................................................................................107
Projeto de Lei nº 4.906/01 .................................................................................................107
10
INTRODUÇÃO
O acelerado desenvolvimento da tecnologia introduziu mudanças nos costumes e
hábitos no contexto privado e público do homem do final do Século XX. A economia, as
relações humanas, a cultura e a política se vêem tocadas pelas denominadas novas tecnologias
da informação, que são, hodiernamente, o grande motor da nossa sociedade. Esta
circunstância obriga o legislador a adaptar o ordenamento jurídico à nova realidade social que
a introdução dos avanços tecnológicos originou na vida cotidiana do homem comum.
A Internet, exemplo primário desses avanços é presença constante na vida
humana, uma vez que nela encontra-se de tudo: pesquisas, notícias, informações, diversão,
entretenimento, contatos, contratos, dentre tantas utilidades e até mesmo inutilidades.
O Contrato Telemático nasce exatamente dessa evolução vivenciada pelo homem
comum e pode ser entendido como o pacto realizado através do uso combinado do
computador e meios de telecomunicação.
Estatísticas oficiais mostram a crescente opção do homem comum em aderir a tais
ajustes, de forma quase que insipiente.
Dúvidas não restam que tal tipo de ajuste veio para facilitar a vida do ser humano
que contrata sem deixar a segurança de sua casa ou até mesmo de seu local de trabalho,
contudo, a maneira pela qual vem sendo utilizado, sem regras, necessita, ao menos, de
observação criteriosa por parte dos operadores jurídicos.
Esse tipo de pacto por vezes ocasiona prejuízos irreparáveis ao consumidor, que
em razão da lacuna da lei ou até mesmo de sua hipossuficiência, vê-se terminantemente
lesado, quer seja em seu patrimônio, como mesmo na esfera dos danos morais.
O surgimento do Contrato Telemático e seu uso quase que indiscriminado está
trazendo a debate questões fundamentais de relacionamento social, pois não raro esses ajustes
11
afetarem direitos individuais de caráter fundamental sobre os quais a sociedade deve se
pronunciar.
O Direito Comparado demonstra a preocupação dos legisladores em adequar
normas comerciais ao abundante mercantilismo eletrônico existente em seus países.
Na Argentina, por exemplo, ocorreram acirradas discussões sobre o tema, tendo,
inclusive sido cogitada a possibilidade de aprovação de um Código de Comércio Eletrônico,
onde restariam tratadas as peculiaridades dos Contratos Telemáticos, respeitados, obviamente,
os pontos convergentes que eventualmente pudessem existir entre as regras do comércio
eletrônico e o Direito das Obrigações.
A legislação pátria vigente, por outro lado, não está apta a apresentar soluções
adequadas para os incontáveis problemas que surgem pelo advento deste tipo de tecnologia.
Analisando a novel legislação substantiva civil, vê-se claramente não existir sequer um artigo
regulando contratos como os do tipo estudado, nem mesmo na legislação esparsa.
O próprio Código de Defesa do Consumidor apesar de tratar de várias situações,
não se manifestou expressamente a respeito dos Contratos Telemáticos.
No Brasil, é de domínio público o fato de que bilhões de reais1 são movimentados
anualmente pela Internet, via contratação telemática, havendo uma enorme viabilidade de
expansão para o uso deste tipo de Contrato.
Sem medo de errar, é possível afirmar que o país apresenta um dos maiores
contingentes de internautas do mundo e um considerável número de usuários em potencial,
contratando diariamente os mais diversos tipos de compras e produtos eletrônicos.
Segundo pesquisa global divulgada pela consultora ComScore Networks2 o Brasil
tem quase 15 milhões de pessoas com acesso a Internet, número que deixa o país como o 11º
do mundo em quantidade de usuários da rede.
1
E-commerce cresce 76% e alcança R$ 4,4 bilhões em 2006, afirma e-bit. No ano que acaba de se encerrrar, o
faturamento do setor de comércio eletrônico foi de 4,4 bilhões de reais, o que representa um crescimento de
76%, segundo a e-bit, empresa de pesquisa e marketing online. O número foi 100 milhões de reais acima do
esperado para o período pela companhia em relação a 2005, já que a previsão era de 4,3 bilhões de reais, 72%
acima dos 2,5 bilhões de 2005. Apesar de o montante ser alto, a empresa afirma que não estão inclusos nos
números as vendas de passagens aéreas, automóveis e leilão virtual. Disponível em: <http://ce.desenvolvimento.
gov.br/>. Acesso em: 03.jan.2008.
2
Disponível em:<http://tecnologia.terra.com.br/interna/0,,OI1454741-EI4802,00.html>. Acesso em 03.jan.2008.
12
Também é sabido que ataques clandestinos aos dados de uma empresa ou
corporação, lançados pelos chamados crackers3, implicam em sérios danos a um extenso
número de indivíduos. Esses mesmos crackers, investidos fraudulentamente na qualidade de
empresários telemáticos, intermediam vendas simuladas, causando prejuízos irreparáveis aos
consumidores.
Além de não existir no Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor uma
linha sequer tratando desse tipo de contratação em específico, não existem, da mesma forma,
premissas legais que definam como se dá a formação do consentimento nos Contratos
Eletrônicos, uma vez que ela é on-line, à distância, o que caracteriza o que é possível
denominar de desumanização do Contrato.
Diariamente se verificam notícias dando conta de que diversas modalidades de
fraudes e engodos via Internet são acintosamente utilizados por pessoas e empresas de má-fé.
De igual forma, por óbvio, milhares de pessoas de boa-fé são levadas a contratar com aludidos
meliantes e se vêem lesadas irremediavelmente.
No Brasil, como já dito acima, há tímida discussão legislativa a respeito do
assunto e na seara jurídica, quando muito, pouco se discute. É certo que alguns Tribunais já se
manifestaram sobre casos de contratação telemática, contudo as decisões são amparadas de
forma analógica nos dispositivos do Código Civil e no Código de Defesa do Consumidor,
haja vista que em aludidas codificações, como dito, o tema tratado é matéria alienígena.
Na esfera legislativa muito pouco se produziu ao se comparar com o avanço desse
tipo de negociação no mundo mercantil hodierno.
3
Até hoje existe confusão entre os termos hackers e crackers. “Hacker Programador Extraordinário -termo
usado originalmente no MIT na década de 50 para conceituar pessoas interessadas pela então iniciante era da
informática. Essa definição diz que um hacker é um pessoa que consegue hackear, verbo inglês to hack. Define
que hack é o ato de alterar alguma coisa que já está pronta ou em desenvolvimento, deixando-a melhor. Nesse
sentido, os hackers seriam as pessoas que criaram a Internet, que criaram o Windows, o Linux e os especialistas
em segurança das grandes empresas. Com o passar dos anos, esses primeiros hackers passaram a utilizar o verbo
hack para conceituar não somente as pessoas ligadas a informática, mas sim os especialistas em diversas áreas. O
Hacker How-To, de Eric S. Raymond, define isso da seguinte forma: “Existem pessoas que aplicam a atitude
hacker à outras coisas, como eletrônica ou música — na verdade, você pode achá-la nos mais altos níveis
intelectuais de qualquer ciência ou arte. Os hackers de software reconhecem esse espírito aparentado em outros
lugares e podem chamá-los de hacker também — e alguns dizem que a natureza hacker é de fato independente
do meio particular no qual o hacker trabalha.” Hacker Criminoso - depois do invento da Internet, a mídia
passou a usar o termo hacker para conceituar ladrões de banco via Internet, ladrões de cartão de crédito —
infratores das leis no mundo digital. Os hackers que desenvolveram o termo original se sentiram ofendidos por
esta definição e por isso criaram o termo cracker para conceituar estes criminosos. Algumas pessoas definem a
diferença entre hacker e cracker dizendo que hacker invade apenas para olhar, enquanto o cracker invade para
destruir. Essa definição é principalmente comum em “sites hacker”, freqüentados por script kiddies.” Disponível
em: <http://linhadefensiva.uol.com.br/informativos/definicoes/hacker/> Acesso em: 03.jan.2008.
13
É certo que existem alguns projetos de lei em tramitação, porém, ao se acessar a
própria página do Comitê Executivo de Comércio Eletrônico4 e do próprio Congresso
Nacional, praticamente não se encontra um novo projeto de lei e até mesmo legislação com
menos idade do que a própria idade do citado Comitê.
A asserção contida no parágrafo anterior, infelizmente, mostra que a criação de
propostas legislativas sobre o assunto esgota-se no nascedouro do Comitê Executivo de
Comércio Eletrônico.
Alguns países, como já dito, já tomaram posição a respeito do assunto com
criação de legislação específica ou, quando não, vêm promovendo grandes debates tentando
disciplinar o tema.
Outrossim, nesse passo, interessante notar que o objeto deste estudo, o Contrato
em si, é um dos institutos jurídicos mais antigos que a sociedade tem notícia, uma vez que
vencidos os anos de barbárie, o homem passou a fazer uso do Contrato no escopo de circular
riquezas e pacificar interesses.
A evolução como se sabe é inata ao ser humano; por conseqüência seus atos e
criações também tendem a se desenvolver. Certo é que a história registra involuções, todavia,
quanto aos contratos, a curva de sua evolução ainda está registrando posição de ascendência.
O homem passou da simples pactuação verbal, cuja época e local de surgimento não há autor
sério que arrisque palpite, à contratação telemática.
Veja-se, pois que um dos mais antigos institutos jurídicos, senão o mais antigo,
ganhou nova roupagem e suas entranhas restaram impregnadas de modernidade, de
tecnologia, do que há de mais atual em sistemas de informação.
4
O Comitê Executivo de Comércio Eletrônico foi criado pela Portaria Interministerial 42/2000 pelos Ministérios
do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, da Ciência e Tecnologia e do Planejamento, Orçamento e
Gestão. Fazem parte do Comitê os Ministérios da Fazenda, das Relações Exteriores, e das Comunicações, além
da Anatel. Representam o setor privado as confederações da Indústria (CNI), do Comércio (CNC) e dos
Transportes (CNT), a Federação de Bancos (FEBRABAN), e as Associações de Software (ABES e ASSESPRO)
e de provedores (ABRANET). O Comitê conta ainda com um representante da comunidade científica (UFRJ).
Integram, ainda, o Comitê as confederações da Agricultura (CNA), dos dirigentes lojistas (CNDL), dos
exportadores (AEB) e a sociedade BRISA. O Comitê é, essencialmente, uma interface entre os setores público e
privado e visa melhor compreender e acelerar o desenvolvimento do comércio eletrônico no Brasil. O Comitê é
formado por seis subcomitês temáticos aos quais, sob a liderança do setor privado, cabe formular e trazer à
discussão as contribuições das entidades representadas para discussão no Comitê. Dessas discussões resultam
projetos e recomendações que, levadas aos órgãos competentes, resultam em aperfeiçoamento de normas e da
legislação, na adoção de padrões técnicos, etc., além de manifestar-se sobre as proposições do público em geral.
Disponível em: <http://ce.mdic.gov.br>. Acessado em 03.jan.2008.
14
Isso realmente prova que o Direito é dinâmico e o Contrato perene. Com a
chegada das novas tecnologias o Contrato tratou de se adaptar a essa nova realidade, porém
sem pacificidade no que pertine a sua Validade, Natureza Jurídica e aplicabilidade.
A sociedade hodierna considerada como sendo formada de pura informação,
obrigou o mercado a lançar mão desse tipo de contratação. A informação que está ao alcance
de todos viaja na velocidade da luz, pois basta um simples clique no mouse para se conectar
com o mundo inteiro.
O instrumento que possibilita esse prodígio é a Internet, que aliada a um
computador propicia ao usuário as mais variadas situações, inclusive contratar. Instigante
pensar que a Internet não faz parte do mundo físico, não é tangível, é formada apenas por
bites e bytes5, onde os dados trafegam de um ponto a outro do globo terrestre em questão de
segundos e apesar de todos esses avanços tecnológicos, com constante aperfeiçoamento dos
sistemas de segurança, o espaço virtual ou ciberespaço não é seguro.
Segurança plena também não existe ao se firmar um Contrato Eletrônico ou
Telemático, posto existir algumas questões polêmicas, sendo as mais relevantes: a falta de
assinatura de próprio punho dos contratantes; a identidade das partes, onde poderá haver
ocorrência de falsidade ideológica, contratação com incapazes etc; e, a integridade do
conteúdo do Contrato com possibilidade de ser ele alterado unilateralmente.
Dúvidas não restam de que o acesso à tecnologia está cada vez mais próximo de
todas as classes sociais, uma vez que seus custos vêm sendo barateados dia-após-dia e tal fato
fará, num futuro próximo, com que todos dependam das contratações eletrônicas.
Não obstante, o Poder Legislativo deixa de praticar atividade visando coibir as
atuais desassisadas ocorrências no ciberespaço6 e é certo que o próprio Direito não
5
Os computadores "entendem" impulsos elétricos, positivos ou negativos, que são representados por 1 e 0,
respectivamente. A cada impulso elétrico, damos o nome de Bit (BInary digiT). Um conjunto de 8 bits reunidos
como uma única unidade forma um Byte. Para os computadores, representar 256 números binários é suficiente.
Por isso, os bytes possuem 8 bits. Basta fazer os cálculos. Como um bit representa dois valores (1 ou 0) e um
byte representa 8 bits, basta fazer 2 (do bit) elevado a 8 (do byte) que é igual a 256. Os bytes representam todas
as letras (maiúsculas e minúsculas), sinais de pontuação, acentos, sinais especiais e até sinais que não podemos
ver, mas que servem para comandar o computador e que podem, inclusive, serem enviados pelo teclado ou por
outro dispositivo de entrada de dados e instruções. Disponível em : <http://www.infowester.com/bit.php>.
Acesso em: 03.jan.2008.
6
A expansão da Internet facilitou a comunicação entre as pessoas e suscitou o aparecimento de um espaço novo
a que se convencionou chamar espaço virtual ou ciberespaço, que compreende o conjunto de sites,
computadores, pessoas, programas e recursos que formam a Internet. (LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos.
Contratos eletrônicos – validade jurídica dos contratos via internet. São Paulo: Atlas, 2007, p.10.)
15
acompanhou o acelerado desenvolvimento da tecnologia, todavia, por óbvio esta já faz parte
do mundo dos operadores jurídicos e estes, ao que parece não se aperceberam disso.
Daí a importância de se discutir possível criação de legislação específica,
harmonizando, destarte, as relações de consumo finalizadas por meio de contratação
eletrônica, a partir dos princípios da boa-fé objetiva, da transparência, da informação,
orientando-se no sentido de proteção ao vulnerável e hipossuficiente, de forma a evitar
maiores prejuízos ao consumidor.
Entre outras asserções pertinentes, é possível ainda inquirir se não está na hora de
brotar legislação específica que trate deste tipo de assunto; se não é chegada a hora de se
debruçar em acirrado estudo e propor, a exemplo de outros países, a criação do que num
primeiro momento poderia ser nominado como Código de Comércio Telemático.
Pois bem as principais premissas do estudo presente estão lançadas. Adiante será
analisado separadamente o instituto do Contrato em si e o chamado Contrato Telemático, a
Internet, a legislação atual, o Código de Defesa do Consumidor e um pouco de Legislação
Comparada.
16
1 - HISTÓRICO: CONTRATO CLÁSSICO, INTERNET E CONTRATO
TELEMÁTICO
1.1 CONTRATO CLÁSSICO
Como dito alhures o Contrato é um dos institutos jurídicos mais antigos que a
humanidade tem conhecimento. A família, por ordem de aparecimento, possivelmente ocupa
o pódio de antiguidade, contudo, o Contrato além de ser milenar, representa a figura jurídica
mais importante de todo o Direito Civil, uma vez que se constitui na força motriz das
engrenagens socioeconômicas do mundo.7
Por notório, nos primórdios da civilização terrena não existia o Direito
Obrigacional. Eram vividas as eras de barbárie. Reinavam absolutas a hostilidade e a
desconfiança entre clãs e grupos distintos, cujas desavenças eram solucionadas
invariavelmente pela força.
Mesmo entre membros de um clã ou grupo, frequentemente imperava a força bruta
e por não existir nenhum tipo de Direito Individual, inexistia, igualmente, qualquer tipo de
relação jurídico-obrigacional.
Caio Mario da Silva Pereira diz que a idéia de obrigação possivelmente surgiu com
caráter coletivo, onde eventual estabelecimento de comércio, por certo muito rudimentar, com
grupo de pessoas distinto, fazia fomentar entre o clã uma idéia obrigacional, de onde surgia a
hipótese de sanção em caso de descumprimento por parte do grupo infrator, que culminava,
inclusive, na convocação de todos à guerra.
“Especialmente este sentido punitivo que sancionava a fé contratual é
importante assinalar-se, porque mais tarde, quando se individualiza o nexo
obrigacional, e se personaliza, e pouco a pouco se alarga à prática da
estipulação sem a marca coletividade, sobrevive a punição do infrator,
dirigida ao seu próprio corpo. Mas não existe um momento, à feição de um
divisor de águas cronologicamente considerado, em que tenha ocorrido a
7
GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil – Contratos, IV vol.
Saraiva: São Paulo, 2.ed., 2006, p.1.
17
individualização da obrigação. Ao revés, as duas forma de obrigar
coexistiram por largo tempo, e só paulatinamente ganhou prestígio a
obrigação individual, ao mesmo tempo em que perdia terreno a obrigação
coletiva.”8
O berço das leis escritas, a antiga Mesopotâmia, é onde são encontradas as
primeiras linhas sobre contratos.
Considerado um dos mais antigos de que se tem notícias, o Código de Ur-Nammu,
datado de cerca de 2040 a.C., advém da Suméria onde estão descritos costumes antigos
transformados em leis e penas pecuniárias para delitos diversos, ao invés de penas talianas.
Foi encontrado em 1952, pelo assiriólogo e professor da Universidade da Pensilvânia, Samuel
Noah Kromer, nas ruínas de templos da época do rei Ur-Nammu, na região da Sul da
Mesopotâmia, onde hodiernamente fica o Iraque. Nele é possível identificar dispositivos
diversos que adotavam o princípio da reparabilidade dos atualmente chamados danos morais.9
O Código de Eshnunna, datado de cerca de 1930 a.C., trazia aproximadamente 60
artigos, sendo uma mistura entre Direito Penal e Civil, que futuramente seria a base do
Código de Hamurabi.10
O Código de Hamurabi é um dos mais antigos conjuntos de leis já encontrados, e
um dos exemplos mais bem preservados deste tipo de documento da antiga Mesopotâmia.
Segundo os cálculos, estima-se que tenha sido elaborado por Hamurabi por volta de 1700 a.C.
Nele também estavam contidos dispositivos semelhantes ao Código de Eshnunna,
regulamentando alguns contratos específicos, a execução destes contratos, as taxas de juros
cobradas, bem como o preço de determinados serviços. O §268 do Código de Hamurabi
prescrevia que: se um homem alugou um boi para semear o grão, seu aluguel será de 2 sutu de
cevada, o que correspondia a 20 litros de cevada. Noutro parágrafo está disciplinada a taxa
máxima de juros, assim especificada: se o empréstimo foi de cevada, os juros serão de 33%
8
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil – Teoria geral das obrigações, II. Vol. Rio de
Janeiro: Forense, 20.ed., 2005, p.8-9.
9
UR-NAMMU. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Código_de_UrNammu>, acesso em: 19.fev.2008.
10
ESHNUNNA. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Eshnunna>,
acesso em 19.fev.2008.
18
(1/3 do bem emprestado). Se o empréstimo foi de prata, a taxa máxima será de 20%.11
Vê-se, de logo, que a idéia de um Direito das Obrigações rudimentar existe desde
que a humanidade se reuniu em grupos e fixou as primeiras comunidades. Não há autor sério
que arrisque palpite de quando surgiu o Contrato, entretanto, como não poderia deixar de ser,
Roma Antiga é a fonte de muitos conceitos dos principais institutos jurídicos e é de lá que se
buscam os conceitos primordiais do Contrato.
Obrigação e Débito, na época dos Césares, não se confundiam. Na existência de
um contrato especial conhecido como nexum surgia a obligatio, que ocorria quando o devedor
não realizava o pagamento da forma estipulada. Nesses casos “havia uma sujeição pessoal,
penhorando-se a liberdade do devedor a fim de garantir o pagamento de seu débito. Nas
convenções que não tinham as características de contratos, como os pactos, e em certos
contratos em que não ocorria o nexum, criava-se um débito, sem que houvesse obligatio, pois
inexistia a ameaça de constrangimento pessoal do devedor.”12
No caso de uma obrigação regularmente pactuada (nexum) e imcumprida
(obligatio), onde a liberdade do devedor era a garantia do pagamento, havia mais uma figura,
conhecida como obligatus, que era aquele que, com sua própria pessoa, também garantia o
pagamento da dívida, o que hodiernamente conhecemos como fiador.
Apenas a título de curiosidade, no Direito Romano, em casos de inadimplemento a
execução era tratada como manus injectio, onde o credor poderia vender o devedor como
escravo ou utilizar diretamente sua força de trabalho. Com o advento da Lex Poetelia a
execução pelo inadimplemento perdeu o caráter de pessoalidade e o que era excutido eram os
bens do devedor e não mais a sua pessoa.13
Caio Mário da Silva Pereira diz que estas idéias eram naturalmente concebidas
pelos romanos, tanto isso é verdade que chegavam ao cúmulo de – nas palavras do autor –
“impor ao devedor um macabro concurso creditório”14, onde levando-se o inadimplente além
do Tibre, sua vida era ceifada e seu corpo dividido entre os credores, consoante estabelecido
na Tabula III: “Tertis nundinis partis secanto; si plus minusve secuerunt se fraude esto.”
11
CÓDIGO DE HAMURABI. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: < http://pt.wikipedia.org/wiki/
Código_de_hamurabi>, acesso em: 19.fev.2008.
12
WALD, Arnold. Obrigações e contratos, 2.vol., Revista dos Tribunais: São Paulo, 10.ed., 1992, p.19.
13
WALD, Arnold. Op. cit., p.19.
14
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Op. cit., p.10.
19
No Direito Romano Clássico concorriam três fenômenos que serviam para
identificar as obrigações: Convenção, Contrato e Pacto. O Contrato e o Pacto eram espécies e
a Convenção o gênero. Os Contratos possuíam proteção judicial amparada pelo ius civile e o
credor podia reclamar via actio, sua execução. Já o Pacto, por outro lado, era um acordo não
previsto em lei que não exigia forma especial, nem era protegido pela actio. No Direito
Romano Clássico, os pretores, começaram a proteger os Pactos mais freqüentes, alçando-os a
categoria de Contratos, o que fez culminar numa nova espécie contratual – os contratus solo
consensu – que envolviam venda, locação, mandato e sociedade, informais, onde bastava a
emissão de vontade.15
Ulpiano foi o primeiro romano a conceituar o Contrato, cuja definição apesar de
concisa, se coadunava com o direito da época; “est pactio duorum pluriumve in idem placitum
consensus”: Contrato é o mútuo consenso de duas ou mais pessoas sobre o mesmo objeto.16
O inadimplemento, na Idade média, também ensejava a prisão e até mesmo a
escravidão, isso por influência do Direito Germânico. Era o senhor do feudo quem elaborava
e aplicava o Direito Feudal e usualmente existia um “contrato” entre aquele e o vassalo, que
recebia uma porção de terras para cultivo mediante o pagamento de uma parcela da produção.
Destarte o “contrato” firmado entre o senhor feudal e o vassalo era simbólico e aperfeiçoavase mediante a entrega de mercadorias produzidas pelo feudatário.
Avançando no tempo e já sob a égide do Direito Canônico, a vontade das partes se
elevou como fonte do Direito Contratual, onde o Contrato passou a ser também uma questão
religiosa. Daí a prática de se inserir nos contratos trechos que revelam temor e respeito a
Deus, como se vê até nos dias atuais, especialmente nas primeiras linhas das escrituras
imobiliárias, onde é comum elas se iniciarem fazendo alusão a data do “ano de Nosso Senhor
Jesus Cristo.”
“Aos poucos, em razão do desenvolvimento do direito canônico, a vontade
foi sobrelevada como fonte do direito contratual. A palavra empenhada fazia
lei. O contrato não era somente uma questão jurídica, mas religiosa. Assim,
a boa-fé era essencial e o povo temia o perjúrio, condenado pela Igreja. Daí
15
NAVES, Bruno Torquato de Oliveira. Notas sobre a função do contrato na história. Disponível em:<
www.lex.com.br/noticias/artigos/default.asp?artigo_id=1012999&dou=1>. Acesso em: 19.fev.2008.
16
MONTEIRO, Washington de Barros. Curso de direito civil – Direito das obrigações, 2. vol. Saraiva: São
Paulo, 34.ed., 2003, p.4.
20
a freqüência da utilização de juramentos em nome de Deus na formação
contratual.”17
Ainda avançando a passos largos, do Direito Feudal às primeiras codificações,
tem-se que a primeira grande codificação moderna foi o Código de Napoleão, promulgado em
1789, sob o ardor da Revolução Francesa, onde o Contrato foi tratado como sendo mero
instrumento para aquisição de propriedade, representando, na realidade, tão somente uma
garantia para os burgueses e para a classe proprietária.
Aos poucos sua definição e alcance foram evoluindo até atingir o conceito
clássico, de lavra de Orlando Gomes, entendendo que Contrato é negócio jurídico bilateral, ou
plurilateral, que sujeita as partes à observância de conduta idônea à satisfação dos interesses
que regularam.18
Jussara Ferreira e Maria de Almeida, sobre a concepção clássica da teoria
contratual asseveram que:
“No apogeu do individualismo, a teoria dos contratos adquiriu seus
contornos, atendendo ao imperativo exigido pela ordem econômica da época,
a qual requeria expediente hábil e seguro a propulsionar a circulação de
riquezas.
[...]. De fato, erigiu-se este instituto como o mais importante
instrumento de
circulação de riquezas, verdadeira mola propulsora do
incipiente capitalismo do século XIX.” 19
Autores tantos permeiam os mais diversos conceitos, todavia, todos trilham o
mesmo caminho. Contratos, assim, são negócios jurídicos bilaterais ou plurilaterais que
decorrem do acordo de mais de uma vontade e para seu aperfeiçoamento, é necessária a
conjunção da vontade das partes. Feito da vontade das partes, ele se aperfeiçoa quando as
partes entram em um acordo, onde devem se conduzir de determinado modo, uma em face da
17
CASTRO, Flávia Lages de. História do direito: geral e Brasil. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003. p.124.
GOMES, Orlando. Contratos. Forense: Rio de Janeiro, 25.ed., 2002, p.10.
19
FERREIRA, Jussara Suzi Assis Borges Nasser; ALMEIDA, Maria Christina de. A teoria contratual e as
relações de consumo na perspectiva civil-constitucional. In: Revista Argumentum de Direito da Universidade
de Marília – Unimar, v.3, 2003, p. 35-35.
18
21
outra, combinando seus interesses, constituindo, modificando ou extinguindo obrigações. 20
Aqui importante abrir um parêntese para asseverar que a definição acima
representa a visão clássica do Contrato. Hodiernamente, consagrados autores pátrios se
renderam a idéia de que a autonomia da vontade foi mitigada pela valorização do homem
como sendo o elemento nuclear do Contrato, “(...) tendo sempre como bússola o superior
princípio da dignidade da pessoa humana, limitador da livre iniciativa e da liberdade
econômica, juntamente com outros dogmas de natureza constitucional.”21
Voltando à visão clássica, o Contrato, quando firmado, cria um vínculo
obrigacional entre as partes e este vínculo pode ser desfeito pela vontade destas ou por
ocorrências supervenientes. A quebra deste vínculo por qualquer uma das partes, salvo nas
hipóteses legais, torna-a inadimplente, sujeita a reparação das perdas e danos, conforme
determina o Art. 389 do Código Civil.22
Silvio Rodrigues ao discorrer sobre a obrigatoriedade do cumprimento do
Contrato, assevera que ela traz segurança jurídica para as relações humanas:
“Aquele que, por livre manifestação da vontade, promete dar, fazer ou não
fazer qualquer coisa, cria uma expectativa no meio social, que a ordem
jurídica deve garantir. O propósito de se obrigar, envolvendo uma
espontânea restrição da liberdade individual, provoca conseqüências que
afetam o equilíbrio da sociedade. Por conseguinte, a ordenação jurídica, na
defesa da harmonia das relações inter-humanas, cria elementos compulsórios
do adimplemento.”23
Seria possível, em razão da grande quantidade de obras existentes, discorrer sobe o
Contrato por mais inúmeras laudas, mas não é esse o propósito deste trabalho.
Apenas para finalizar este capítulo, é possível asseverar que não representa sandice
alguma, afirmar que o instrumento base da matéria ora estudada, salvo melhor juízo, jamais
perecerá, pois é quase impossível visualizar a sociedade sem tão relevante instituto, prova
20
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil das obrigações – Teoria geral da obrigações. 3.vol. Saraiva:
São Paulo, 16.ed., 2002, p.23.
21
GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil – Contratos. 4.vol.
Saraiva: São Paulo, 2.ed., 2006, p.5.
22
“Art. 389. Não cumprida a obrigação, reponde o devedor por perdas e danos, mais juros e atualização
monetária segundo índices oficiais regularmente estabelecidos, e honorários de advogado.”
23
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: os contratos e das declarações unilaterais da vontade. 29. ed. São
Paulo: Saraiva, 2003. v. 3, p.12.
22
maior disso é a capacidade que o Contrato possui de se transformar e adaptar-se aos novos
tempos. Sempre amparado, por óbvio, pela letra da lei que, como no caso do presente estudo,
deve também evoluir e ser recriada no escopo precípuo de satisfazer os conclames do homem.
1.2 INTERNET
O termo Internet, para a grande maioria das pessoas está associado ao futuro,
progresso e a nova era da informação, porém, através desta pesquisa, foi possível descobrir
que ela já é uma senhora que quase chegou a meia-idade, como mais adiante se verá.
Pesquisar sobre a origem da Internet, especialmente via estudo realizado pela
própria rede, acaba por se encontrar, invariavelmente, vários registros fazendo alusão a um
texto inserido na página <http://www.isoc.org/internet/history/brief.shtml>, intitulado “A
Brief History of the Internet”, de autoria de Barry M. Leiner, Vinton G. Cerf, David D. Clark,
Robert E. Kahn, Leonard Kleinrock, Daniel C. Lynch, Jon Postel, Larry G. Roberts e Stephen
Wolff.
Ao ser traduzido para a língua portuguesa, “Uma Breve história da Internet”,
revela que seus autores participaram ativamente da criação da Internet e as primeiras
interações sociais ocorridas através da rede foram memorandos escritos por J.C.R. Licklider
do Massachussets Institute of Technology - MIT, em agosto de 1962, discutindo o conceito da
"Rede Galáxica”.
O grande passo para viabilizar as redes de computadores foi utilizar
pacotes ao invés de circuitos, o que possibilitou a conversa entre as máquinas. Em 1965, a
conexão de um computador TX-2 em Massachussets com um Q-32 na California com uma
linha discada de baixa velocidade, criou o primeiro computador de rede do mundo. Ante o
sucesso dessa experiência, em 1969, surgiu a ARPANET – Advanced Research Projects
Agency, órgão da Rede do Departamento de Defesa dos EUA, responsável pela interligação
de laboratórios de pesquisa e tecnologia. À medida que a rede computadores crescia, foi
necessário um sistema de mensuração, que foi preparado pelo pessoal do Centro de
Mensuração de Rede da UCLA -University of California at Los Angeles, que acabou sendo
escolhido para ser o primeiro “nó” (ponta) da ARPANET. Outras universidades que
colaboraram para a ampliação daquela nova tecnologia foram os segundos e terceiros “nós”: a
UC Santa Barbara e a Universidade de Utah, que incorporaram a rede projetos de aplicações
visuais. Mais computadores foram rapidamente adicionados a ARPANET nos anos seguintes
23
e os grupos de trabalho desenvolveram um protocolo servidor a servidor funcionalmente
completo e outros softwares de rede. De 1971 a 1972, os usuários da rede finalmente puderam
começar a desenvolver as suas aplicações. Em 1972 foi o ano que o correio eletrônico foi
introduzido. Também em 1972, foi organizada uma grande e bem sucedida demonstração
sobre a ARPANET na Conferência Internacional de Comunicação entre Computadores
(ICCC), considerada a primeira demonstração pública da tecnologia de rede para o público. 24
Passados aproximados dez anos a NationalScience Foundation, também dos EUA,
utilizando a tecnologia acima descrita, expandiu o funcionamento dos métodos de
comunicação, criando uma grande rede de computadores entre institutos de pesquisas,
agências governamentais e universidades, culminando por dar vida a hoje conhecida rede
mundial de computadores. 25
A Internet, hodiernamente, se mostra como um sistema mundial de comunicação,
que se efetiva por meio de computadores interligados, onde se faz possível a consulta e
transmissão de dados - imagens, textos, sons, software - entre pessoas físicas e jurídicas, de
ponto-a-ponto em qualquer lugar que esteja interligado no planeta.
Gustavo Testa Corrêa ao conceituar a Internet a entende como uma Rede Global
de Computadores que possibilita intercâmbio de informações de forma rápida e eficiente sem
limitações de fronteiras, fatos que culminaram na criação de novos mecanismos de
relacionamento. 26
Interessante a proposição de Testa Corrêa no sentido de que a Internet criou novos
mecanismos de relacionamento e serviu para mudar até mesmos alguns costumes no final do
Século XX. Para corroborar tal assertiva basta relembrar que as pessoas que se encontravam
distantes entre si, se comunicavam normalmente através de missivas e, quando possível, por
meio do telefone. Nos dias atuais as pessoas esquecem de verificar a caixa de correio
instalada defronte a residência, todavia, vêem quase que de hora em hora a caixa de correio
eletrônico.
A própria comunicação entre as pessoas feita por telefone, está sendo mitigada por
24
A.I.S.A. - Aprenda a Internet Sozinho Agora. Disponível em:<http://www.aisa.com.br/historia.html>.
Acesso em: 08.jan.2008.
25
LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos Leal. Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via
internet. São Paulo: Atlas, 2007, p.13.
26
CORRÊA, Gustavo Testa. Aspectos jurídicos da internet. São Paulo: Saraiva, 2000, p.8.
24
poderosa ferramenta de comunicação em tempo real via Internet, desenvolvida por empresa
gigante do ramo. Muitas vezes, pessoas que trabalham na mesma empresa, lado a lado, se
convidam ao café por meio de mensagens eletrônicas, se esquecendo que até mesmo um sinal
gestual seria o bastante para o entendimento e conseqüente aceitação do convite.
Entre tantas outras situações, não é errado afirmar, portanto, que a Internet é um
divisor de águas no que pertine aos relacionamentos humanos. Certo é também asseverar que
ela é o marco de uma nova era que surgiu para a humanidade em face do desenvolvimento
vertiginoso da tecnologia, ou seja, a Era da Informação. 27
Testa Corrêa, acertadamente, esclarece que para o Direito será um desafio hercúleo
“(...) a compreensão e o acompanhamento dessas inovações, garantindo assim a pacificação
social, o desenvolvimento sustentável dessas novas relações e, acima de tudo, a manutenção
do próprio Estado Democrático de Direito.”28
Fato relevante que corrobora o desenvolvimento e a expansão da Internet é a queda
vertiginosa de preço dos computadores e softwares, aliada ainda ao aumento da velocidade de
tráfego de dados alcançada graças a melhoria dos serviços de telefonia.
Somam-se a isso o aparecimento de provedores de acesso a Internet gratuitos e
programas sociais perpetrados por alguns Estados da federação, já denominados
nacionalmente de Programas de Inclusão Digital.
Inclusão Digital ou Infoinclusão é a democratização do acesso as tecnologias da
informação, permitindo a inserção de todos na sociedade da informação. Um incluído
27
O texto que segue é apócrifo e foi recebido via e-mail. Ele bem demonstra o que é viver na Era ou na
Sociedade da Informação, e é aqui inserido apenas à título de ilustração: “VC SABE QUE ESTÁ A ERA DA
INFORMAÇÃO.... QUANDO: 1. Você envia e-mail ou msn para conversar com a pessoa que trabalha na mesa
ao lado da sua. 2. Você usa o celular na garagem de casa para pedir a alguém que o ajude a desembarcar as
compras. 3. Esquecendo seu celular em casa, coisa que você não tinha há 10 anos, fica apavorado e volta para
buscá-lo. 4. Você levanta pela manhã e quase que liga o computador antes de tomar o café. 5. Você conhece o
significado de naum, tbm, qdo, xau, msm, dps ... 6. Você não sabe o valor da postagem de uma carta comum;
7. A maioria das piadas que você conhece, recebeu por e-mail (e ainda por cima ri sozinho); 8. Você fala o
nome da firma onde trabalha quando atende ao telefone em sua própria casa (ou até mesmo o celular); Você
digita o “'0” para telefonar de sua casa; 10. Você vai ao trabalho quando o dia ainda está clareando, volta
para casa quando já escureceu de novo; 11. Quando seu computador pára de funcionar, parece que foi seu
coração que parou, 11. Você está lendo esta lista e está concordando com a cabeça e sorrindo. 12. Você está
concordando tão interessado na leitura que nem reparou que a lista não tem o número 9. 13. Você retornou a
lista para verificar se é verdade que falta o número 9 e nem viu que tem dois números 11. 14. E agora você está
rindo consigo mesmo... 15. Você já está pensando para quem você vai enviar esta mensagem. 16. Provavelmente
agora você vai clicar no botão 'Encaminhar'... é a vida...fazer o quê... foi o que eu fiz também... Feliz vivência
na Era da Informação.”
28
CORRÊA, Gustavo Testa. Op. cit., p.3.
25
digitalmente não é aquele que apenas utiliza essa nova linguagem, que é o mundo digital, para
trocar e-mails, mas aquele que usufrui desse suporte para melhorar suas condições de vida,
pois ela serve para simplificar a rotina diária do homem, maximizando o tempo e as suas
potencialidades. 29
À propósito, o próprio governo federal deu início à inclusão digital ao editar o
Decreto de 29.10.2003, que tem por finalidade coordenar, articular o planejamento e a
implementação de projetos e ações, entre outros, sobre: Implementação do Software Livre e a
Inclusão Digital.
Como destaque, é possível citar os seguintes programas: Computador para Todos;
Observatório Nacional de Inclusão Digital; Programa Estação Digital; Projeto Computadores
para Inclusão; Proinfo- Programa Nacional de Informática na Educação, etc.
Dúvidas não restam, pois que o alcance da Internet irá vencer todas as previsões
mais otimistas e atingirá o país todo, mesmo na mais remota região, posto que a tecnologia
atual possibilita o acesso remoto, sem fio.
A bem da verdade até mesmo a energia elétrica se torna dispensável ao se utilizar
computadores alimentados por bateria recarregável, posto que estas, por sua vez, voltam a
carga máxima se conectadas a um gerador. Tal tecnologia já está sendo utilizada por centenas
de fazendas que ainda não contam com rede de energia elétrica.
Tais facilidades além propiciar melhoria e celeridade na rotina diária das pessoas,
serviram para alavancar o comércio telemático, sendo certo que estatísticas mostram o
vertiginoso crescimento desse setor da economia.
Somente no primeiro trimestre de 2007, as compras pela Internet atingiram a cifra
de R$ 4,4 bilhões, resultado que representou crescimento de 57% em relação ao mesmo
período de 2006. Tal constatação advém do Índice de Varejo On Line (VOL), via estudo
divulgado pela E-Consulting e pela Câmara Brasileira de Comércio Eletrônico (camarae.net).30
Todas as compras acima citadas foram formalizadas pelo chamado Contrato
29
INCLUSÃO DIGITAL. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/
Inclusão_digital>. Acesso em: 25.fev.2008.
30
Gastos com bens de consumo, turismo e automóveis pela Internet somaram R$ 4,4 bilhões no 1º trimestre.
Disponível em:< http://www.camara-e.net/interna.asp?tipo=1&valor=4114>. Acesso em: 25.fev.2008.
26
Telemático, e este, tem enorme relevância no mundo dos operadores jurídicos, pois é
extremamente complexo e ainda não está estruturado normativa, jurisprudencial e
doutrinariamente, como se verá nos itens e capítulos seguintes.
1.3. CONTRATO TELEMÁTICO - HISTÓRICO
Antes de dar início ao presente tópico, cabe aqui a abertura de uma discussão sobre
a adoção do termo “telemático” em detrimento de outros. Ao tratar do assunto, Eurípedes
Brito Cunha Junior31, afirma ser correto denominar os contratos objeto deste estudo de
Contratos Eletrônicos, em razão de serem eles celebrados ou executados através de meios
eletrônicos. Afirma ainda que “eletrônica é a forma de celebração ou execução contratual, e
não o objeto em si, que pode também ser eletrônico. Mas este não define necessariamente a
forma, integrando, ao contrário, seu conteúdo.”
O autor está equivocado, como adiante se verá.
Como contraponto à sua própria opinião, o autor acima referido, traz os seguintes
termos: “Contratos Informáticos”, “Contratos Virtuais” e “Contratos Artificiais-Cibernéticos”,
asseverando que nenhum deles se presta a nominar àquilo que chama de Contrato
“Eletrônico”.
Nesse ínterim há que se concordar com Cunha Junior, pois realmente esses últimos
tipos de contratos citados não se relacionam com os Telemáticos. Informáticos são aqueles
contratos que têm por objeto bens ou serviços de informática, celebrados por qualquer que
seja o meio, informático (Internet, Intranet, EDI, teleatendimento, etc) ou não. Eis que
apresentam em seu escopo, fim último objeto da estipulação contratual, bem ou serviço de
informática.32
Virtual, como conceituado pelo próprio Cunha Junior aparenta representar aquilo
que não é real e os Contratos Telemáticos, ao contrário, devem pressupor, por óbvio, pactos
sérios, reais, verdadeiros. Dúvidas não restam de que em razão do Comércio Telemático se
31
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Os contratos eletrônicos e o novo código civil. Revista CEJ do Conselho
da Justiça Federal. Brasília. n.19, p.62-77, out.-dez. 2002.
32
COLARES, Rodrigo Guimarães. Contratos Eletrônicos e Informáticos: Alguns Aspectos Relevantes.
Disponível em: < http://www.infodireito.com.br/infodir/index.php ?option=com_ content&task= view&id=18&
Itemid=1>, Acesso em: 28.Fev.2008.
27
expandir vertiginosamente na sociedade moderna, ele deve impor confiabilidade, para que não
haja descrédito e subseqüente desuso.
Igualmente no que pertine aos denominados por uns como Contratos ArtificiaisCibernéticos, que querem também fazer representar aquilo que não é real, devem ser
rechaçados posto que tal conceituação não interessa ao mundo jurídico, uma vez que os
Contratos Telemáticos são aqueles que representam a oferta e aceite de gente séria e
comprometida com o respeito que a atividade mercantil merece.
Além de tais assertivas há também de ser analisado o significado da palavra
Eletrônica. Pois bem, Eletrônica, consoante definição do dicionário, é a parte da física
dedicada ao estudo do comportamento de circuitos elétricos que contenham válvulas,
semicondutores, transdutores etc, ou à fabricação de tais circuitos. 33
Antonio Houaiss, por sua vez, define o termo em questão como sendo o estudo das
propriedades e aplicações de dispositivos que dependem do movimento de elétrons em
semicondutores, gases ou no vácuo.34
Ora, a definição da palavra eletrônica trazida por dois grandes dicionários da
língua portuguesa, deixa claro que, a bem da verdade, o termo foi e está sendo utilizado
erroneamente nas mais diversas situações, especialmente quando ao se referir aos contratos
aqui estudados.
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira, por sua vez, ao conceituar telemática a
entende como a ciência que trata da manipulação e utilização da informação através do uso
combinado de computador e meios de telecomunicação. 35
Houaiss encontra três sentidos para a palavra telemática: “1.) conjunto de serviços
informáticos fornecidos através de uma rede de telecomunicações; 2.) ciência que trata da
transmissão, a longa distância, de informação computadorizada; e, 3.) esse tipo de
33
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Eletrônico – Século XXI. Lexikom
informática. São Paulo: Nova Fronteira, versão 3.0, 1999.
34
HOUAISS, Antonio. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,
versão 2.0, 2007.
35
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Eletrônico – Século XXI. Lexikom
informática. São Paulo: Nova Fronteira, versão 3.0, 1999.
28
transmissão.”36
Ante as próprias definições de cada palavra encontradas nos dicionários
pesquisados, vê-se que em razão do Contrato ora estudado se efetivar exatamente pelo uso
combinado do computador e dos meios de telecomunicações, não haveria razão para impingirlhe outra nominação senão esta: Contrato Telemático.
Pois bem, vencido o assunto acima, interessante notar que ao se iniciar uma frase
ou um discurso com a palavra “antigamente”, de imediato vem a mente do leitor ou do
espectador imagens de um passado remoto.
No caso do presente estudo, ao contrário do ora asseverado, quando tal palavra é
utilizada, o lapso temporal referido não ultrapassa a casa de algumas décadas.
Isto posto, “antigamente” a manifestação da vontade dos indivíduos se limitava ao
alcance da visualização e do contato entre as partes contratantes, porém, com o advento e
aperfeiçoamento dos meios de comunicação, ela passou a atingir pessoas viventes nos mais
diversos e distintos locais do planeta.
Certo é que o Direito Contratual “moderno” já previa a possibilidade estabelecer
liame contratual entre pessoas que nunca se viram. O Art. 1.08637, do Código Civil de 1916,
já tratava de contratos por correspondência epistolar ou telegráfica. Esse artigo foi
praticamente repetido no Código em vigor, pelo disposto no Art. 434. 38
Há de se reparar que no Código em vigor está patente a possibilidade de
contratação entre ausentes, sendo certo que no revogado, o fato de se referir a contratação
epistolar ou telegráfica, também representava a manifestação da vontade entre ausentes.
Na segunda década do Século XX, quando da promulgação do Código de 1916, o
telefone já era reconhecido como meio hábil a contratação, pois o inciso I do Art. 1.801,
considerava como presente a pessoa que contratava via telefone: “Art. 1.081. Deixa de ser
36
HOUAISS, Antonio. Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva,
versão 2.0, 2007
37
BRASIL. Código Civil de 1916. “Art. 1.086 - Os contratos por correspondência epistolar, ou telegráfica,
tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida, exceto: I - no caso do artigo antecedente; II - se o
proponente se houver comprometido a esperar resposta; III - se ela não chegar no prazo convencionado.”
38
BRASIL. Código Civil em vigor. “Art. 434 - Os contratos entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a
aceitação é expedida, exceto: I - no caso do artigo antecedente; II - se o proponente se houver comprometido a
esperar resposta; III - se ela não chegar no prazo convencionado.
29
obrigatória a proposta: I – se, feita sem prazo a uma pessoa presente, não foi imediatamente
aceita. Considera-se também presente a pessoa que contrata por meio de telefone.”
Pertinente notar que o Código Civil revogado já considerava o contrato firmado
por telefone, como Pacto celebrado entre presentes, mesmo não estando as partes fisicamente
frente a frente, manifestando contudo, suas vontades de imediato.
O telefone pois, foi o instrumento que serviu para embasar a desnecessidade de os
contratantes estarem frente a frente, uma vez que possível a emissão de suas vontades
simultaneamente e, com isso, se aperfeiçoar o Contrato.
Hoje existe comunicação sem a presença de cabos telefônicos, todavia, a criação
da rede mundial de computadores não teria ocorrido não fosse a existência das linhas
telefônicas físicas.
Assim, a tímida e despretensiosa rede de computadores que começou como
experimento limitado a algumas universidades norte-americanas, servindo, no início, apenas
para trocar “pacotes de dados” alcançou importante atividade inata do ser humano: o
comércio.
O comércio, no início, se dava por troca direta de produtos de valor reconhecido
como diferente pelos dois negociantes, onde cada um valoriza mais o seu produto.
Hodiernamente é raro fazer-se troca direta, pois os comerciantes modernos
costumam negociar com o uso de um meio de troca indireta, o dinheiro. A invenção do
dinheiro e subsequentemente do crédito, papel-moeda e dinheiro não-físico, contribuiu
grandemente para a simplificação e promoção do desenvolvimento do comércio.39
Um degrau acima do conceito contido no parágrafo anterior é que se encontra o
Contrato Telemático, pois pode ele ser visto como a mais moderna forma de comerciar,
porém, como já dito retro e como se verá mais adiante, ainda lhe faltam conceituações e
características normatizadas básicas.
39
COMÉRCIO. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Comércio>.
Acesso em: 17.fev.2008.
30
2 - CONCEITOS: DOCUMENTO, DOCUMENTO ELETRÔNICO, DOCUMENTO
TELEMÁTICO, COMÉRCIO ELETRÔNICO E COMÉRCIO TELEMÁTICO.
VALIDADE DE SEUS DOCUMENTOS.
2.1 DOCUMENTO
Na sociedade existe ainda a cultura do uso papel para exteriorizar documentos
físicos, como por exemplo, o próprio instrumento do Contrato. A substituição do papel pelo
meio virtual, a princípio parece não oferecer maiores problemas jurídicos, uma vez que no
caso dos contratos, o Código Civil admite outras formas além daquelas previstas em seu
corpo.
Para melhor compreensão deste estudo, é importante conhecer o significado da
palavra documento, que na sua forma tradicional é algo exteriorizado e materializado.
Aurélio Buarque de Holanda Ferreira o conceitua como: “[Do lat. documentu < lat.
docere, 'ensinar', 'mostrar'.] S. m. 1. Qualquer base de conhecimento, fixada materialmente e
disposta de maneira que se possa utilizar para consulta, estudo, prova, etc. 2. Escritura
destinada a comprovar um fato; declaração escrita, revestida de forma padronizada, sobre
fato(s) ou acontecimento(s) de natureza jurídica. 3. Restr. Qualquer registro gráfico. 4. Ant.
Recomendação; preceito. 5. Inform. Qualquer arquivo com dados gerados por um aplicativo
(2), ger. aquele criado em processador de textos.”40
Documento (do latim documentum, derivado de docere “ensinar, demonstrar”) é
qualquer meio, sobretudo gráfico, que comprove a existência de um fato, a exatidão ou a
verdade de uma afirmação etc. No meio jurídico, documentos são freqüentemente sinônimos
de atos, cartas ou escritos que carregam um valor probatório.41
Segundo Flúvio Cardinelle Oliveira Garcia, citando Chiovenda, documento é "toda
representação material destinada a reproduzir determinada manifestação do pensamento,
40
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário Aurélio Eletrônico - Século XXI. Versão 3.0,
Lexikom informática. São Paulo: Nova Fronteira, versão 3.0, 1999.
41
DOCUMENTO. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Documento>.
Acesso em: 17.fev.2008
31
como uma voz fixada duradouramente."42
É, pois, um meio de representar algum fato. Tal pode ser considerado uma
concepção clássica ou comum de documento, onde se fala de algo palpável, como por
exemplo, os documentos de papel.
2.2 DOCUMENTO ELETRÔNICO
Apesar da quase totalidade dos autores pátrios consultados e até mesmo o Direito
Comparado, bem como a própria mídia tratar o assunto como Comércio Eletrônico,
Documento Eletrônico e Contrato Eletrônico, aqui, ousa-se disso discordar dado,
especialmente, o quanto asseverado no item “1.3”, onde restou esclarecido o porquê deste
estudo nominar o assunto como sendo “Telemático”. Assim, a fim de que não paire dúvidas
quanto a posição ora sustentada, fica ratificado nesse momento o entendimento anterior.
Documento Eletrônico, todavia, existe, porém nada tem a ver com o Comércio e os
Contratos Telemáticos. Documento Eletrônico na concepção mais pura pode ser representado
por um trabalho gerado no processador de texto mais usado no mundo (Word da Microsoft) e
gravado num arquivo, onde a extensão que o identifica, criada, a propósito, pelo próprio
programa de computador, é alguma coisa ponto “doc”, p.ex.: contratos telemáticos.doc.
“Doc” pressupõe Documento, documento esse, sem sombra de dúvidas, Eletrônico ou
Informático, mas não Telemático.
Como não poderia deixar de ser, é notório que o ser humano é um ser material por
natureza, tendo apenas a espiritualidade como elemento imaterial, sendo certo, pois, que
necessita de algum tipo de representação física para sentir-se dono, proprietário, garantido.
Emocionalmente o homem, quando entabula um negócio, para se sentir seguro tem
a necessidade de obter um documento por escrito, uma prova material, palpável, entretanto,
tal não representa a segurança almejada, pois o armazenamento de dados, imagens e textos em
discos rígidos e drives externos, como por exemplo num pen-drive, é muito mais seguro que
arquivá-los em papel, desde que o processo de gravação seja feito adequadamente.
42
GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos. Jus Navigandi,
Teresina, ano 8, n. 264, 28 mar. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4992>.
Acesso em: 28 jan. 2008.
32
Renato Blum ao discorrer sobre o assunto vaticina que o grande problema do
Documento Eletrônico é a sua validação, “in verbis”:
“Com o crescimento mundial da internet e dos negócios via computador,
crescem também as dúvidas e problemas de aplicação comercial desta nova
tecnologia. Uma das grandes questões na história da humanidade sempre foi
a busca pela certeza da autenticidade de documentos e até mesmo de
pessoas. Se tal já ocorria com papéis e pessoas ao alcance de nossas mãos e
olhos, o que dizer agora que temos como parceiros em negócios apenas
nomes e uma tela de computador? Além da certeza íntima da confiabilidade
de nossos interlocutores e parceiros, precisamos, ainda, de uma certeza
jurídica, não só de sua idoneidade, como também de todos os documentos
que nos são apresentados como sendo de determinada autoria e
veracidade.”43
Os documentos eletrônicos realmente são passíveis de adulteração sem deixar
qualquer tipo de vestígio físico, posto que planilhas, imagens e textos, uma vez armazenados
em um disco rígido e até mesmo num drive portátil são facilmente editados pelos próprios
programas de computador que os produziram ou outros mais que permitam a edição, byte por
byte.
Um exemplo simples de tal afirmação é o fato de que a hora, data e nome de um
arquivo são facilmente adulterados ou, quando não, a modificação de tais dados é
automaticamente realizada em razão da própria rotina do programa de computador.
Renato Blum cita ainda na obra referenciada dois precedentes jurisprudenciais
norte-americanos que confirmam a fragilidade do meio. No primeiro caso, um estudante
universitário chegou até ser preso, pois acusado de enviar mensagens difamatórias, porém
demonstrou judicialmente que tanto a origem como o conteúdo de qualquer mensagem
eletrônica44 pode ser desnaturada facilmente. O caso derradeiro - St. Clair x Johnny’s Oyster –
personal injury – fundamentado tão somente em registros eletrônicos advindos da Guarda
Costeira, onde acabou por se decidir que as provas apresentadas (registros eletrônicos) não
43
BLUM, Renato M. S. Opice. Direito eletrônico: a Internet e os tribunais. São Paulo: Edipro, 2001, p.43-44.
Nota do autor: em razão do sustentado neste trabalho, fica claro o entendimento de que, inclusive o correio
eletrônico e, consequentemente, a transmissão de suas mensagens, deveriam ser denominados como telemáticos
e não eletrônicos.
44
33
eram suficientemente substanciais. 45
Realmente a falta de segurança que propicia o documento eletrônico representa
seu calcanhar de Aquiles, sendo, portanto, fundamental se erijam esforços jurídicos máximos,
visando sua validação, em duas premissas cruciais: autoria e proteção contra modificações
posteriores, como se verá mais adiante.
2.3 DOCUMENTO TELEMÁTICO
Enquanto mantido em sua forma digital, armazenado no próprio computador, num
disco rígido, em um pen-drive, CD-Rom, ou DVD, o documento deve ser compreendido
como eletrônico, mas, se transmitido de um ponto a outro por meio da rede de
telecomunicações, ele se transforma em documento telemático.
O documento telemático, portanto, pressupõe a interatividade existente entre um
computador, que processando um grupo de dados, representativos de planilhas, gráficos,
imagens, textos etc, interligado por meio da Internet, a um ou mais computadores, onde estes
últimos, recebendo aquele grupo de dados originário, até então intangível e etéreo, o
transformam em informação inteligível aos olhos do ser humano.
Destarte, toda informação disponibilizada por meio da rede mundial de
computadores é um documento telemático. Seja ele para servir como oferta de um produto na
vitrine de uma loja telemática, uma notícia publicada num sítio ou simplesmente como uma
piada transmitida através do e-mail, sendo desnecessária qualquer ginástica de raciocínio para
entendê-lo como tal.
Igualmente ao documento eletrônico, é imprescindível dar a ele características de
segurança e validade, quando utilizado em relações comerciais, pois, nos dias atuais se
contrata utilizando a telemática quase que insipientemente, e o que é pior, sem segurança
alguma, como dito alhures.
Certo é que os Documentos e Contratos Telemáticos são utilizados, na grande
maioria das vezes para compra de bens móveis de pequeno valor, tais como CD, DVD, livros
e outros bens de consumo, inclusive de serviços ligados ao turismo.
45
BLUM, Renato M. S. Opice. Op. cit., p.46.
34
Chegará, porém, o dia em que transações imobiliárias e até mesmo, quem sabe,
compra e fusões de grandes empresas, e outras transações vultosas ocorrerão pelo meio
telemático, dado especialmente, a celeridade que este processo representa, e tempo, na
sociedade da informação, como se sabe, é valiosíssimo.
Não é insano imaginar a existência de um Cartório Telemático de Notas, Títulos e
Documentos, onde escrituras serão lavradas e “assinadas” digitalmente, dispensando-se até,
quiçá, o Cartório de Registro de Imóveis, pois, alcançada a devida segurança dos documentos
telemáticos, o simples ato da outorga da escritura bastaria para aquisição do domínio, em
razão da provável existência de um único banco de dados imobiliário nacional.
Todas essas lucubrações não passarão de mera utopia, caso o sistema de
transmissão de dados via Internet não venha a ter a segurança que exigem os negócios
jurídicos, onde imprescindível restar patente num documento eletrônico ou telemático, como
asseverado por Renato Blum, citando Miguel Pupo Correia46, que o autor deste: a.) revele de
forma inequívoca sua identidade pessoal; b.) manifeste sua vontade de gerar o documento e
emitir as declarações de vontade ou conhecimento deles constantes ou ainda, aderir ao seu
conteúdo; e, c.) na medida do possível, procure preservar a integridade do documento, isto é,
a sua inalterabilidade, máxime quando é objeto de comunicação com outra pessoa.
2.4 O COMÉRCIO ELETRÔNICO E COMÉRCIO TELEMÁTICO
O comércio eletrônico é anterior a Internet. O comércio eletrônico é toda
mercancia que inclui meios eletrônicos para sua realização, excluindo-se a utilização
conjugada da informática e dos meios de telecomunicações, no caso, especialmente da
Internet. Não é nenhuma novidade e como exemplo é possível citar o telemarketing feito por
meio do telefone.
Patrícia Peck também entende que é pouco apropriado conceituar o comércio via
Internet como comércio eletrônico, uma vez que tal terminologia é mais abrangente, pois
inclui meios eletrônicos como um todo, todavia, tão somente por caráter didático, prefere
46
BLUM, Renato M. S. Opice. Op. cit., p.48.
35
assim conceituá-lo.47
No presente estudo, todavia, o que é entendido pela grande maioria dos autores
como sendo comércio eletrônico, aqui é tratado como comércio telemático, onde a Internet
possui papel fundamental para sua concretização.
O Comércio telemático é uma nova forma de mercadejar, é uma nova modalidade
de negócio e, principalmente, o modo mais vertiginoso de expansão de uma atividade nos
últimos tempos.
Os dados estatísticos chegam a ser assustadores, não só pelos números
apresentados, como também devido ao surgimento de novas modalidades de negócios, como
por exemplo o m-commerce48 e o t-commerce.49
Nesses casos, como também no e-commerce, não raro o fato de até o produto
adquirido deixar de ser físico e passar também a ser virtual, pois um consumidor pode, por
exemplo, comprar um software pela Internet e a entrega do produto ser feita através de um
download. Neste caso, não se usou sequer o meio físico.
O que o operador jurídico deve buscar, como já dito, é garantir a segurança
dessas novas formas de relações comerciais, especialmente, através da adoção da assinatura
digital e possibilitar a identificação insofismável dos participantes da relação.
Segundo Patricia PecK “é importante compreender que o comércio eletrônico
tem participantes virtuais, não limitados pela territorialidade, que fazem uma transação
eletrônica entre si. Existe também uma documentação digital, que vale como manifestação de
vontade.”50
Até o pagamento pode se dar de forma virtual, como a transferência bancária
47
PECK, Patrícia. Direito digital. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 89.
O termo "m-commerce" vem do inglês "mobile commerce", ou seja, utilizando-se de uma tradução livre,
"comércio móvel". Trata-se da realização de negócios (comércio), utilizando dispositivos móveis, por exemplo,
um telefone celular, um PDA, um Smartphone, quando em movimento. Disponível em: <http://br.answers.
yahoo.com/question/index?qid=20070818124603AAZ35qF>. Acesso em 20.mar.2008.
49
É o comércio eletrônico televisivo, baseado na TV digital interativa. A TV digital não é apenas uma imagem
mais nítida ou a possibilidade de se acessar milhares de canais. Seu grande potencial é a interatividade, é
permitir que o espectador “fale” com a TV. A idéia é explorar este canal de comunicação, permitindo a
comercialização de qualquer produto, desde sapatilhas até um pacote de turismo, ao simples apertar de um botão
do controle remoto. Disponível em:< http://www.timaster.com.br/revista/artigos/main_artigo.asp?codigo=427>.
Acesso em: 20.mar.2008.
50
PECK, Patricia. Direito Digital. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 93.
48
36
feita pelo computador. É importante destacar que o fato da transação ser virtual não muda o
direito, que é o mesmo do mundo físico.
Como se vê, a questão máxima em se tratando de comércio telemático e até mesmo
eletrônico, é a garantia da segurança dos contratantes e certificação de suas identificações.
Todo o resto, ao que parece, é uma questão de contratos entre as partes e de aplicação do
Código de Defesa do Consumidor e Civil.
Derradeiramente, importante esclarecer que o crescimento tanto do Comércio
Telemático como do Eletrônico, acaba por demandar mais insumos, estimulando de forma
direta, portanto, o crescimento e a especialização de inúmeros setores como os serviços de
entrega, embalagem, produção de papel, transportes e afins.
Destarte é insofismável a necessidade de agilizar a efetividade e a segurança nos
tratos telemáticos, pois estes acabam por alcançar também a mercancia tradicional,
extrapolando os limites da Rede Mundial de Computadores.
37
3 - LEGISLAÇÃO ALIENÍGENA, PRODUÇÃO LEGISLATIVA PÁTRIA E
O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR
3.1 LEGISLAÇÃO ALIENÍGENA: ALEMANHA, PORTUGAL, FRANÇA,
ITÁLIA, CUBA, COLÔMBIA E ARGENTINA
O cenário legislativo pátrio ainda não contemplou o homem com nenhuma norma
específica sobre os tratos telemáticos. Não obstante, o brasileiro compra quase que
compulsivamente pela Internet, e segundo Dailton Felipine, em 2008, as compras via
telemática feitas pelos brasileiros, representarão mais que a metade de todo o mercado
telemático da América Latina, não deixando dúvidas de que é promissor e representa o futuro
das relações mercantis.51
Ao se falar em legislação específica, muitos países seguem a Lei Modelo
UNCITRAL, criada em 1996 pela United Nations Comission in International Trade Law Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional, que, como o próprio
nome já denuncia, serve como modelo para os países dela fazerem uso, seja enxertando parte
dela nas leis do país ou se utilizando de todos os seus termos na criação de lei especial.
Por óbvio que os países com o legislativo mais sério e atuante, cumprindo
efetivamente o papel que lhes incumbe, já se ativaram na edição de leis visando regulamentar
esse novo tipo de comércio, como será visto adiante:
a.) Alemanha: na Europa, segundo De Lucca, a Alemanha foi o primeiro país a
editar legislação buscando disciplinar as assinaturas digitais, através da chamada
Informations-und Kommunikationsdienste-Gesetz, de 1º de agosto de 1997, conhecida pela
abreviatura luKDG. Referida lei contém 11 artigos, onde em seu Art. 3º, composto por
dezesseis parágrafos, há disposição sobre todos os aspectos jurídicos relacionados com a
51
FELIPINE, Dailton. O desempenho do e-commerce em 2007. A chave para se entender a grande e contínua
expansão do e-commerce é o aumento no número de consumidores. Foram nada menos que 2,5 milhões de
pessoas que aderiram às compras on-line em 2007, ou seja, entre cada nascer do sol ocorrido em 2007, 6.849
pessoas aderiram às compras pelo computador. Para 2008, prevê-se a repetição desse número, o que nos levaria à
casa dos 12 milhões de e-consumidores até o final do ano. É comprador para deixar qualquer lojista com água na
boca! Para se ter uma idéia, isso representa mais do que a metade de todo o mercado da América Latina.
Disponível em: < http://www.e-commerce.org.br/Artigos/Comercio_eletronico_2007.htm>. Acesso em:
20.mar.2008.
38
assinatura digital.52
Os demais artigos tratam das condições econômicas para aplicação da informação
e dos serviços de comunicação, da proteção dos dados pessoais usados na aquisição de teleserviços, delitos informáticos e, no mais, cuidaram de proceder as necessárias alterações na
ordenação jurídica já existente.
Aspecto que se faz notar é que a luKDG, lei européia pioneira que visou
disciplinar as assinaturas digitais, tem somente mais de uma década de vida. Apesar da
existência de legislação, é ela ainda extremamente novel, representando, contudo, experiência
ainda não vivida em terras tupiniquins.
b.) Portugal: seguindo a Alemanha foi o segundo país europeu a conceituar o
enquadramento legal da assinatura e dos certificados digitais, por meio do Decreto-Lei nº
290-D/99 de 2 de agosto de 1999.
Aludida norma reconhece o valor jurídico dos documentos eletrônicos e das
assinaturas digitais e designa ao Instituto das Tecnologias da Informação do Ministério da
Justiça, o controle da atividade de certificação, onde também foi prevista a criação de um
órgão consultivo, o Conselho Técnico de Credenciação.
No mesmo ano, em 18 de setembro, foi promulgado o Decreto-Lei nº 375/99 e De
Lucca afirma que os dois decretos representam avançada matéria em comércio telemático,
isso porque Portugal antevia a “idéia de que o advento da Internet e suas implicações na vida
das pessoas e na atuação dos diversos agentes econômicos iriam determinar uma tomada de
posição no tocante às relações globais.” 53
Além de tal fato a norma lusitana, acertadamente, tem caráter de provisoriedade
em razão da inegável velocidade da evolução tecnológica. Assim é asseverado tendo em vista
o que consta em trecho de seu preâmbulo: “A evolução tecnológica, que nessa matéria é
constante, determinará a médio prazo a revisão, adaptação e aprofundamento do regime
estabelecido no presente diploma.”
52
DE LUCCA, Newton. SIMÃO FILHO, Adalberto et al. Direito & Internet: aspectos jurídicos relevantes.
São Paulo: Edipro, 2000, p.71.
53
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.83.
39
Portugal ainda se mostrou arrojado uma vez definiu um sistema público de
credenciação, porém inteiramente privado quanto a certificação.
Destarte, os órgãos credenciadores são aqueles que exercerão atividade
certificadora, sendo certo que eles deverão preencher os requisitos necessários e serem
devidamente habilitados pelo Poder Público.
Atividade certificadora, por sua vez é o ato de criar ou fornecer meios para a
criação das chaves, emissão de certificados de assinatura e outros serviços relativos a
assinaturas digitais.
O Decreto-Lei nº 290-D/99 é composto de 41 artigos e ao que parece é muito
equilibrado e superior a todos os projetos de lei que tramitam no Congresso Nacional
Brasileiro, pois além de tratar das assinaturas e certificados digitais, fornece ainda noções de
documento e assinatura eletrônica, chave privada e pública, autoridade credenciadora,
certificado de assinatura, validação cronológica (declaração da entidade certificadora que
atesta a hora e a data de criação, expedição ou recepção de um documento eletrônico), e,
finalmente, de endereço eletrônico. 54
Hodiernamente em Portugal, os Contratos Telemáticos estão regulados pelo Art. 9º
da Diretiva 2000/31/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, que foi transposta para a
ordem jurídica interna daquele País sob a forma do Decreto Lei 7/2004, in verbis:
“Os Estados-Membros assegurarão que os seus sistemas legais permitam a
celebração de contratos por meios electrónicos. Os Estados-Membros
assegurarão, nomeadamente, que o regime jurídico aplicável ao processo
contratual não crie obstáculos à utilização de contratos celebrados por meios
electrónicos, nem tenha por resultado a privação de efeitos legais ou de
validade desses contratos, pelo facto de serem celebrados por meios
electrónicos”
Vê-se, pois que a legislação lusitana não só os admite como os prevê
expressamente, vaticinando, inclusive, a não criação de obstáculos à sua utilização.
54
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.87.
40
c.) França: apesar de ter reconhecidamente caráter vanguardista quanto aos
avanços tecnológicos, no que pertine à Internet é ela retrógrada, pois somente no final de 1998
um grupo de pesquisa, conhecido como Lê GIP Justice encaminhou anteprojeto que tratava da
adaptação do direito da prova as novas tecnologias de informação, cujo texto, cuidava,
fundamentalmente, da assinatura eletrônica.55
Aludido projeto culminou por ser aprovado pela Assembléia Nacional em 29 de
Fevereiro de 2000, não sofrendo alterações nem cortes severos, acabando mesmo por regular
mais conflitos probatórios eventualmente surgidos quando do uso de documentação e
Comércio Telemático.
A aprovação do projeto em questão deu origem a modificações no Código Civil
Francês, especificamente em seus artigos 1316 e 1317, onde foram lapidados os 1316-156 e
1316-357, que tratam, respectivamente, da força probante e da validade probatória do
documento telemático.
Já o Art. 1316-2, cuidou de deixar claro que o Juiz resolverá os conflitos de prova,
independentemente de qual seja o seu suporte, seja ele papel ou eletrônico. Esse último
entendimento se encontra esposado em uma alínea acrescida no Art. 1317.
Liza Bastos Duarte, citando Paiva, assevera que a alteração do Código Civil
Francês reconhece o valor probatório de um documento telemático, todavia, hão se ser
observadas três condições fundamentais: 1.) a identificação do autor do documento; 2.) a
garantia da integridade na geração do documento; e, 3.) a garantia da integridade na
conservação do documento a fim de que se confira validade ou eficácia probatória aos
documentos confeccionados no meio virtual ou através de correio eletrônico.58
A derradeira modificação do Código Civil Francês, também no capítulo que trata
das provas, disciplinou o ato da assinatura, imprescindível ao aperfeiçoamento do negócio
55
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.80-81.
Art. 1316-1. L écrit sous forme életronique est admis en preuve au même titre que l’écrit sur support papier,
sous réserve que puisse être dûment identifiée la personne dont il émane et quíl soit établi et conservé dans des
conditions de nature à garantir l´intégrité. (O escrito em forma eletrônica está admitido como prova com igual
força que o escrito em suporte de papel, salvo reserva de que pode ser devidamente identificada a pessoa de
emana e que seja gerado e conservado em condições que permitam garantir sua integridade).
57
Art. 1316-3. Lécrit sur support électronique a la même force probante que l’écrit sur support papier. (O escrito
em suporte eletrônico tem a mesma probante que o escrito de papel).
58
DUARTE, Liza Bastos. Desafios do Direito. Análise da aceitação do e-mail como prova judicial.
Disponível em:< http://conjur.estadao.com.br//static/text/45406,1>. Acesso em 31.mar.2008.
56
41
jurídico, e assim leciona:
“Art. 1316-4. A assinatura necessária ao aperfeiçoamento de um ato jurídico
identifica aquele que a apõe. Ela manifesta o consentimento das partes
quanto às obrigações decorrentes de tal ato. Quando ele for aposta por um
oficial público conferirá autenticidade do ato.
Quando tratar-se de assinatura eletrônica, deverá ela emanar de um
procedimento confiável de identificação, garantindo o seu vínculo com o ato
ao qual ela se refere. A confiabilidade de tal procedimento é presumida, até
prova em contrário, quando a assinatura eletrônica for criada, a identidade
do signatário assegurada e a integridade do ato garantida, nas condições
fixadas por decreto do Conselho de Estado.”
Data vênia a situação retratada pelo artigo em comento mais parece aquela
usualmente vivenciada pelos cidadãos pátrios quando da necessidade de promulgação de lei
complementar para regular um determinado assunto, ou seja, apesar da previsão legal, este
ainda não é pleno, pois necessita de norma para complementar, explicar ou adicionar algo,
cumprindo, portanto, o quanto preceituado pelo inciso II, do Art. 59, da Constituição Federal.
Destarte, a França, ao que parece, regulou a assinatura eletrônica, porém como se vê do
dispositivo supracitado, o assunto ainda depende de Decreto advindo do Conselho de Estado.
d.)Itália: não difere muito da situação francesa. Novamente De Lucca, assevera
que na Itália existe um Decreto da Presidência da República, de nº 513, de 10 de novembro de
1997, que dispõe sobre: as definições; o documento informático (lá assim denominado); os
requisitos do documento informático; a eficácia probatória do documento informático;
assinatura digital; entre outros.59
Acrescenta, na seqüência, aludido autor que outros decretos mais foram
promulgados visando disciplinar parte do assunto. Em especial cita decreto advindo do
Presidente do Conselho de Ministros, de 08 de fevereiro de 1999, que determinou o conteúdo
das chamadas regras técnicas, que são especificações de natureza técnica, incluídas quaisquer
59
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.81-82.
42
disposições legais que lhe sejam aplicáveis. Deixa claro, todavia, que o Decreto Presidencial
de 10 de novembro de 1997, teve relevante importância, pois serviu como paradigma para
muitas outras legislações que foram criadas na Europa.
Bereta e Parisi, por outro lado, asseveram que atualmente a Itália encontra
fundamento normativo para embasar a regulação do Contrato Telemático, no Título XIV do
Tratado CE, intitulado Protezione dei Consumatori.
“Oggi, il fondamento normativo sul quale basare la regolamentazione del
fenomeno è contenuto nel titolo XIV del Trattato CE60, intitolato Protezione
del consumatore, allart. 153: è infatti principalmente da questa prospettiva
che lordinamento comunitario si occupa del contratto elettronico, prendendo
in considerazione le esigenze inerenti la protezione dei consumatori nella
definizione e nell attuazione delle politiche e delle attività comunitarie. La
finalità della suddetta disposizione non è solo quella di assicurare un elevato
livello di protezione del consumatore, ma consiste proprio nella promozione
degli interessi del consumatore.” 61
Como se vê, a Itália, em se tratando de Comércio e Contratos Telemáticos, elege
as normas já existentes de defesa do consumidor, insculpidas no Tratado CE, e resta claro que
as atividades da comunidade primam pela realização de políticas que tenham por finalidade
não somente assegurar um nível elevado de proteção do consumidor, mas realmente a
promoção de seus interesses.
60
TITOLO XIV - PROTEZIONE DEI CONSUMATORI. - Articolo 153 (ex articolo 129 A). 1.Al fine di
promuovere gli interessi dei consumatori ed assicurare un livello elevato di protezione dei consumatori, la
Comunità contribuisce a tutelare la salute, la sicurezza e gliinteressi economici dei consumatori nonché a
promuovere il loro diritto all'informazione, all'educazione e all'organizzazione per la salvaguardia dei propri
interessi. 2. Nella definizione e nell'attuazione di altre politiche o attività comunitarie sono prese in
considerazione le esigenze inerenti alla protezione dei consumatori. 3.La Comunità contribuisce al
conseguimento degli obiettivi di cui al paragrafo 1 mediante: a) misure adottate a norma dell'articolo 95 nel
quadro della realizzazione del mercato interno, b) misure di sostegno, di integrazione e di controllo della politica
svolta dagli Stati membri. 4. Il Consiglio, deliberando secondo la procedura di cui all'articolo 251 e previa
consultaÜ zione del Comitato economico e sociale, adotta le misure di cui al paragrafo 3, lettera b). 5. Le misure
adottate a norma del paragrafo 4 non impediscono ai singoli Stati membri di mantenere o di introdurre misure di
protezione più rigorose. Tali misure devono essere compatibili con il presente trattato. Esse sono notificate alla
Commissione.
61
BERRETTA, Maria; PARISI, Nicoletta. Il regime giuridico di internet: i conttrati elettronici. Disponível
em <http://www.diritto.it/osservatori/telejus/berretta-parisi_contratti_elettronici.pdf>. Acesso em 31.mar.2008.
43
e.) Cuba: mesmo quando Fidel detinha o poder na Ilha, as expectativas que se
vislumbravam e o forte movimento de modernização da infra-estrutura, obrigaram o Estado a
traçar estratégia nacional com o objetivo de potencializar e regular o comércio telemático,
criando em 22 de janeiro de 1999, a Comissão Nacional para o Comércio Eletrônico.
Aludida comissão tinha como objetivos principais propor para o governo qual a
política e quais as recomendações que servissem para impulsionar o desenvolvimento do
comércio eletrônico, criando condições propícias para sua extensão por toda a Ilha.
Lisette Fernandéz, deixa claro que após a criação de tal comissão, vários projetos
de Decreto-Lei foram elaborados, onde no derradeiro, “Normas Gerais para a prática do
Comércio Eletrônico”, se fez constar algumas obrigações há mais daquelas constantes na
legislação comum sobre negócios jurídicos.
“Así pues, se han elaborado varios proyectos de Decreto-Ley sobre comercio
electrónico. La última versión del Proyecto cubano de Decreto-Ley sobre
“Normas generales para la práctica del Comercio Electrónico” remite, en
todo lo que constituye contratación, al ordenamiento tradicional, al
reconocer que éste se aplicará a las prácticas de comercio electrónico, y
establece algunas obligaciones para el emisor u oferente de bienes y
servicios, además de las establecidas en la legislación común, por demás
expone qué constituye un mensaje de datos, su transmisión y recepción.”
62
A autora narrada afirma ainda que nos contratos realizados por meios telemáticos,
o que muda é o meio, o suporte, com especificidades que o próprio trato contratual aconselha
realizar. Prossegue o artigo em comento com definições que no momento presente aqui não se
encaixam, todavia, de antemão, foi possível verificar que os problemas levantados se
equiparam aos por nós vivenciados.
Já que neste capítulo a intenção foi trazer ao conhecimento do leitor legislação
comparada, Cuba, como será visto mais adiante, enfrenta o mesmo problema que o Brasil,
pois a atividade legislativa, não passa de mera conjectura, atravancada em um ou em vários
Projetos de Lei, salvo raríssimas exceções legislativas que acabaram por regular pequena
62
FERNÁNDEZ, Lisette Hernández. Incidencia de las tecnologías en la contratación: Marco legal en Cuba.
Revista de Derecho, Universidad del norte, nº 25, 2006, p.340, 2006. Disponível em: <http://ciruelo.uninorte.
edu.co/cpdf/derecho/25/10_Incidencia%20de%20las%20tecnologias.Revista%20de%20Derecho%20N%2025.pd
f >. Acesso em 31.mar.2008.
44
parte da necessidade reclamada por tão vultoso assunto.
f.) Colômbia: os legisladores colombianos lançaram precedente sobre o tema em
apreço, já no ano de 1995, por meio do Decreto nº 2.150, todavia, tal norma tratou mais sobre
a desburocratização dos trâmites nas entidades estatais, onde o texto legal mais disciplinou a
utilização pela Administração Pública de sistemas de arquivo e transmissão eletrônica de
dados.
Em 1999, foi promulgada a Lei nº 527, denominada Ley de Comercio Eletrônico
em Colômbia, de 18 de agosto de 1999, que dispôs sobre o acesso e o uso das mensagens de
dados, do comércio eletrônico, das firmas digitais e das entidades de certificação, entre outras
disposições.
De Lucca assevera que nos países Latino-Americanos se observou a mesma
característica, no sentido de que às iniciativas de regulação das transações telemáticas, no
início, sempre foram editadas no âmbito restrito da Administração Pública, fato, que também
ocorreu na Colômbia, como dito acima e na Argentina, como se verá adiante. Citando
Mauricio Carjaval Córdoba, De Lucca esclarece que não obstante o caráter amplo do título da
lei, deixa ela muito a desejar, uma vez que longe de representar efetiva e integral disciplina do
Comércio e Contratos Telemáticos.
“Acerca das limitações desse texto legal, põe em destaque o referido autor
que, não obstante o título da lei, estaria ela muito distante de representar uma
disciplina integral dos assuntos jurídicos relacionados com o tema do
comércio eletrônico. (...) As lacunas estariam, principalmente, no que se
refere às normas sobre: a propriedade industrial e nomes de domínio; a
proteção dos direitos de autor; os delitos informáticos; a tributação das
operações praticadas pela Internet; os problemas de lei e de jurisdição
aplicáveis; o regime de telecomunicações e Internet, e ainda, sobre a
proteção do consumidor.”
63
Como bem apontado por De Lucca, também na Colômbia, apesar de existir
legislação que tentou regular o assunto sob estudo, esta é limitada, todavia, mesmo ante sua
incipiência, há que ser considerada como um avanço, pois tratou de disciplinar a criação de
63
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.74.
45
entidades certificadoras, órgãos esses legalmente autorizados a engendrar as assinaturas
digitais, passo básico para a substituição do Século do Papel pelo Século da Informação.
g.) Argentina: ante a quantidade de resoluções, leis e decretos produzidos, como se
verá logo a seguir, aparenta estar à frente de todos os países latino-americanos.
Através do Decreto nº 427/98, de 16 de abril de 1998, editado pelo Poder
Executivo, a Argentina deu início ao programa de uso das assinaturas digitais no âmbito da
administração pública, para atos internos que não produzam efeitos jurídicos individuais de
forma direta. Além do Decreto citado, é possível listar as seguintes manifestações legislativas:
1.) Sobre assinatura digital: Resolução nº 194/98, de 04 de Dezembro de 1998,
aprova os padrões aplicáveis para a "Infra-estrutura de Assinatura Digital para o setor público
Nacional"; Resolução nº 212/98, aprova as políticas de certificação de assinatura setor público
digital; Lei nº 25.506, de 14 de novembro de 2001, aprova e regulamenta a Assinatura Digital;
Decreto nº 2628/2002, de 20 de dezembro de 2002, regulamenta a Lei 25.506; Decreto nº
283/2003, de 17 de fevereiro de 2003, autoriza com caráter transitório o Escritório Nacional
de Tecnologias de Computador prover certificados digitais para o uso deles na Administração
Pública Nacional; Decreto nº 1028/2003, de 10 de novembro de2003, dissolve a Entidade
Administradora de Assinatura Digital criada pela Ordenação Nº 2628/2002, passando essas
funções ao Escritório Nacional de Tecnologias de Informação do Subsecretário da
Administração Pública; Decreto nº 724/2006, de 13 de junho de 2006, modificando a Lei nº
25.506, derrogando um artigo (Art. 30), acrescendo-se incisos em outros dois artigos (Art. 34
e 38); e, Decisão Administrativa nº 6/2007, de 12 de fevereiro de 2007, estabelece o marco
normativo da assinatura digital aplicável ao ordenamento jurídico e revoga licenças dos
certificadores que solicitarem;
2.) Sobre domínio na Internet e Provedores de Serviços: Resolução nº 2226/2000,
de 29 de agosto de 2000, advinda do Ministério de Relações Externas, Comércio Internacional
e Culto, que aprova novas regras para a inscrição de nomes de domínio na Internet; Lei nº
25.690, de 03 de janeiro de 2003, trata das obrigações dos provedores de Serviço de Internet
de oferecer software de proteção que impede acesso a lugares específicos; e, Lei nº 25.873, de
09 de janeiro de 2004, que obriga os prestadores de serviços de telecomunicações a disporem
de recursos humanos e tecnológicos, com o fito de serem observadas suas transmissões e o
46
tráfego de informações entre usuários e clientes, de forma remota, caso requisitadas pelo
Poder Judiciário ou Pelo Ministério Público;
3.) Outras normas vinculadas: Resolução N° 412/99, advinda do Ministério de
Economia e Trabalho e Serviços Públicos, de 09 de abril de 1999, aprova as recomendações
formuladas pelo Grupo de Trabalho em Comércio Eletrônico do Ministério da Economia;
Decreto nº 252/2000, de 22 de março de 2000, que institui a criação do Programa Nacional
para a Sociedade da Informação; e, outras mais que visaram regular aspectos específicos
relacionados com as transações telemáticas.
As inúmeras produções legislativas acima delineadas bem demonstram que nossos
hermanos, quanto a produção, andaram a passos largos, entretanto, e à exemplo dos demais
países até aqui estudados, o assunto da Assinatura Digital foi aquele que mais se mostrou
regulado, bastando para ratificar essa última asserção, uma rápida análise nos termos das leis
e resoluções.
A Lei nº 25.506, conhecida como Ley de Firma Digital trouxe ainda em suas
linhas importantes avanços nos tratos telemáticos, especialmente por buscar amparar a
principal deficiência dessa nova modalidade de negócios jurídicos, que é a insegurança
propiciada pela Internet.
Interessante anotar ainda que aludida norma, em seu Art. 4º, exclui matéria e
situações de sua abrangência:
“ARTICULO 4º - Exclusiones. Las disposiciones de esta ley no son
aplicables:
a) A las disposiciones por causa de muerte;
b) A los actos jurídicos del derecho de familia;
c) A los actos personalísimos en general;
d) A los actos que deban ser instrumentados bajo exigencias o formalidades
incompatibles con la utilización de la firma digital, ya sea como
consecuencia de disposiciones legales o acuerdo de partes.”
Disposições em razão de morte, atos jurídicos inerentes ao Direito de Família,
atos personalíssimos e atos que se mostrem incompatíveis com a utilização da assinatura
digital ou tenham como conseqüência disposições legais ou acordo de vontades, não podem
ser assinados digitalmente.
47
Ouro fato ainda a apontar é que a Lei nº 25.506 definiu dois tipos de assinaturas a
serem exaradas em suporte virtual. Uma foi denominada Digital e a outra Eletrônica. Aquela
está prevista no Art. 2º e esta no Art. 5º. Diz a lei in verbis:
“ARTICULO 2º — Firma Digital. Se entiende por firma digital al resultado
de aplicar a un documento digital un procedimiento matemático que requiere
información de exclusivo conocimiento del firmante, encontrándose ésta
bajo su absoluto control. La firma digital debe ser susceptible de verificación
por terceras partes, tal que dicha verificación simultáneamente permita
identificar al firmante y detectar cualquier alteración del documento digital
posterior a su firma.”
“ARTICULO 5º — Firma electrónica. Se entiende por firma electrónica al
conjunto de datos electrónicos integrados, ligados o asociados de manera
lógica a otros datos electrónicos, utilizado por el signatario como su medio
de identificación, que carezca de alguno de los requisitos legales para ser
considerada firma digital. En caso de ser desconocida la firma electrónica
corresponde a quien la invoca acreditar su validez.”
Nota-se que a firma eletrônica mais se assemelha às chamadas chaves públicas,
enquanto que a denominada firma digital mais parece a equiparação da assinatura que há de
ser aposta em um documento digital, num eventual cartório digital.
A Argentina pelo que se vê dos textos legais ora colacionados, está realmente à
frente da maioria dos países latino-americanos e está muito mais preparada para o mercado
telemático que o Brasil, que segundo dados oficiais e mesmo sem legislação específica, é
responsável por mais de 50% (cinqüenta por cento) das transações telemáticas de toda
América Latina.64
3.2 A LEI MODELO UNCITRAL E OS PROJETOS DE LEI BRASILEIROS
Sem medo de errar, ao se buscar qualquer informação sobre legislação telemática,
em qualquer canto do mundo, se encontram referências sobre a Lei Modelo UNCITRAL,
criada em 1996 pela United Nations Comission in International Trade Law - Comissão das
64
E-commerce: mais popular, mais confiável. Info Exame. Disponível em : <http://www.ebitempresa.com.br/
sala_imprensa/html/clip.asp?cod_noticia=1870&pi=1>. Acesso em 02.abril.2008.
48
Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional. Aludida comissão contou com a
participação de juristas do mundo todo, bem como de um grupo técnico específico para
garantir a longevidade e a adequação da norma, visando, como já asseverado em linhas
passadas, servir como orientação para países que desejassem eliminar obstáculos para a
criação de um marco jurídico para desenvolvimento mais seguro das negociações
telemáticas.65
Vários são os países que utilizam seu modelo, incorporando-a sob a forma de lei
especial ou integrando-a em legislação já existente, como por exemplo o Canadá e os Estados
Unidos da América.
O Brasil, como já insistentemente afirmado não possui legislação que regule
especificamente o assunto, todavia, a edição da Medida Provisória de nº 2.200-2, de
24.08.2001, acabou por instituir o sistema de Chaves Públicas, denominado ICP-Brasil, que
servirá para certificar as chamadas assinaturas digitais.
Aqui importante abrir um parêntese para esclarecer que por força do Art. 2º, da
Emenda Constitucional nº 32, de 11.09.2001, a Medida Provisória que instituiu o ICP-Brasil,
ainda se encontra vigor, posto que, consoante disciplinado pelo dispositivo em questão, as
medidas provisórias editadas em data anterior à da publicação da Emenda Constitucional
continuam em vigor até que medida provisória ulterior as revogue explicitamente ou até
deliberação definitiva do Congresso Nacional.
Existem, é verdade, alguns Projetos de Lei em tramitação pelo Congresso e a
grande maioria deles são baseados na Lei Modelo UNCITRAL. A Comissão de Informática
da OAB, por exemplo, apresentou anteprojeto de lei em meados de 2000, ao então Deputado
Michel Temer, que pretendia, entre outro tópicos, dar mais segurança tanto para o consumidor
quanto para o empresário que utilizem o comércio telemático. O projeto também tem por base
Lei Modelo da UNCITRAL e se divide em duas partes, onde a primeira trata do comércio
eletrônico de forma global e a derradeira, do comércio eletrônico e da assinatura digital.
Além do anteprojeto de autoria da OAB-SP, pelo Congresso Nacional tramitam os
seguintes Projetos de Lei: nº 4.102/93, de autoria do Senador Maurício Corrêa, regulando a
garantia constitucional da inviolabilidade de dados e definindo os crimes praticados por
computador; nº 1.070/95, de autoria do Deputado Ildemar Kussler, regulando os crimes
65
MATTE, Maurício. Internet: comércio eletrônico. São Paulo: LTr, 2001, p.66-67.
49
advindos da divulgação de material pornográfico por meio de computadores; nº 234/96, de
autoria do Senador Júlio Campos, que define os crimes contra a inviolabilidade de
comunicação de dados de computador; nº 1.713/96, de autoria do Deputado Cássio Cunha
Lima, dispondo sobre o acesso, a responsabilidade e os crimes cometidos nas redes integradas
de computadores; nº 2.644/96, de autoria do Deputado Jovair Arantes, disciplinando a
elaboração, o arquivamento e o uso dos documentos eletrônicos; nº 3.173/97, de autoria do
Senador Sebastião Rocha, dispondo sobre documentos produzidos e arquivados em meios
eletrônicos; nº 3.483/97, de autoria da Deputada Célia Mendes, disciplinado e regulando a
exposição em rede de computadores de cenas de sexo que envolvam menores de idade; nº
84/99, de autoria do Deputado Luiz Piauhylino, que prevê sete tipos de crimes: dano a dado
ou programa de computador; acesso indevido ou não autorizado; alteração de senha ou
mecanismo de acesso a programa de computador ou dados; obtenção indevida ou não
autorizada de dado ou instrução de computador; violação de segredo armazenado em
computador ou meio de natureza magnética, óptica ou similar; criação, desenvolvimento ou
inserção em computador de dados ou programas com fins nocivos e, ainda, a veiculação de
pornografia através da rede mundial de computadores; nº 1.483/99, de autoria do Deputado
Dr. Hélio, que Institui a fatura eletrônica e a assinatura digital nas transações eletrônicas; nº
1.589/99, de autoria do Deputado Luciano Pizzatto, dispondo sobre comércio eletrônico, a
validade jurídica do documento eletrônico e a assinatura digital; e, o de nº 4.906/01, de
autoria do Senador Lúcio Alcântara, que seguindo modelo da UNCITRAL, dispõe sobre o
comércio eletrônico de uma forma geral. 66
Esse último Projeto de Lei, de autoria do Senador Lúcio Alcântara se apresenta
como aquele que mais se aproxima da necessidade legislativa pátria, e apenas a título de
conhecimento, sua íntegra se encontra acostada a este trabalho sob a forma de Anexo.
Vale lembrar que na apresentação do Substitutivo do citado projeto à Comissão
Especial, nos termos do Art. 202 do Regimento Interno da Câmara, encarregada de analisar a
admissibilidade e o mérito da matéria, várias personalidades e inúmeros representantes de
grandes empresas nacionais e multinacionais foram ouvidas através de audiências públicas,
tais como: representantes da OAB, da Receita Federal, do Comitê Gestor da Intenert, da IBM,
do Grupo Pão de Açúcar, entre outros.
Pode-se afirmar que o PL nº 4.906/01, ante as inúmeras audiências públicas e
66
Informações encontradas no sítio do Congresso Nacional: www.camara.gov.br.
50
internas, onde a sociedade brasileira fez-se ouvir, aliado ao fato de que, a exemplo do resto do
mundo, a Lei Modelo UNCITRAL restou observada, bem como porque houve discussão
sobre legislação alienígena comparada67, representa a produção legislativa pátria, em
construção, mais profícua e acertada, ora urgentemente reclamada pelos milhões de usuários
do comércio telemático.
Ainda são listados mais os seguintes Projetos de Lei: nº 7.093/2002¸ nº
3.213/2004, nº 717/2007 e nº 979/2007, e uma Proposta de Emenda Constitucional de nº
227/2008. Os Projetos de Lei ora citados, não apresentam assunto que possa ser considerado
relevante e de valia na busca de uma legislação telemática, nem mesmo a Proposta de Emenda
Constitucional, posto que trata ela de matéria tributária, inerente a chamada “Guerra Fiscal”
travada entre os Estados da Federação.
Pois bem, vê-se que em todo lugar do planeta há discussões sobre a necessidade
de se regular os tratos telemáticos, uns debatem e acabam produzindo leis com maior
celeridade, outros, a exemplo do Brasil, se conformam com o debate, chegando ao absurdo de
um Projeto de Lei relevante como o de autoria do então Senador Lúcio Alcântara estar na
ordem do dia para votação desde 27.09.2002, há quase seis anos, portanto.
Caso sirva como consolo ainda há que se olhar a situação com bons olhos:
primeiramente porque se apresenta como um projeto de lei moderno que prescindirá de
modificações prementes e, ao depois, segue orientação de grande valia trazida no bojo da Lei
Modelo UNCITRAL, que a é a internacionalização da legislação telemática, ou seja, a lei não
está sendo feita visando aplicação somente em solo pátrio, visando possíveis eventos que
envolvam legislação internacional.
Esse o sábio pensamento que permeia as mais modernas leis que tratam do
assunto, bem como a doutrina de vanguarda. Destarte, em razão do enfrentamento jurídico
extremo que o assunto pode tomar frente aos ordenamentos jurídicos mundiais, “seria
extremamente útil que, ao invés de regulamentações internas, que podem diferir de um país
para outro, (...) os países procurassem regulamentar a matéria através de regras internacionais,
referentes às contratações telemáticas, que fossem capazes de resolver de forma geral e
67
Vide Tabela Comparativa no Anexo.
51
harmônica os problemas de sua formação (momento e lugar) e de sua validade.” 68
3.4 CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR – CONCEITOS BÁSICOS
O Código de Defesa do Consumidor veio para corrigir o desequilíbrio que existe
entre fornecedor e consumidor, posto que antes dele não existia legislação específica que
protegesse esse último. Tem caráter indisponível, sendo nula qualquer cláusula que estabeleça
a sua inaplicabilidade quando se tratar de uma relação que envolva o consumidor.
O CDC é regido por alguns princípios, merecendo destaque os princípios da
boa-fé, do equilíbrio contratual e o da vulnerabilidade do consumidor. Em linhas gerais há
que se entender pelo primeiro princípio que as partes devem ser leais e honestas. O segundo
disciplina que todo Contrato ser deve ser equilibrado, e caso assim não se apresente, poderá
ser revisto e modificado. O derradeiro reconhece que o simples fato de a parte contratante se
encontrar na posição de consumidor, ela é mais fraca em relação ao fornecedor, seja por falta
de conhecimento técnico ou por existir um desequilíbrio econômico entre os contratantes.
Feitas tais ponderações, adiante serão analisadas as figuras do consumidor,
fornecedor e da própria relação de consumo, no escopo precípuo de que, demonstrados os
conceitos básicos das figuras que completam a cadeia de consumo, reste aclarada ou não a
aplicação da legislação consumerista aos tratos telemáticos.
3.4.1 Consumidor – conceito
O CDC tratou, em seu Art. 2º de conceituar que é o consumidor: “é toda pessoa
física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.”
Tem-se que o consumidor é pessoa natural ou jurídica que utiliza o produto ou
serviço para si ou para sua família, caso exista na relação negocial o intuito de adquirir
produto, bem ou serviço visando um lucro posterior, será a regra do Código Civil a ser
aplicada, uma vez que deixa de ocorrer a relação de consumo.
68
BASSO, Maristela. Contratos internacionais do comércio: negociação, conclusão, prática. 2.ed., Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 1998, p.103.
52
Ele goza de algumas proteções dadas por esta lei especial, entre elas, o direito
de liberdade de escolha, de ter informações claras e precisas do que está adquirindo, proteção
contra práticas cláusulas abusivas, de reparação plena dos danos sofridos e até da inversão do
ônus da prova dentro de um processo judicial.
O Art. 6º, VIII do CDC traz a possibilidade da inversão do ônus da prova e seu
deferimento no decorrer da instrução processual importa em ser reconhecido no consumidor
dois requisitos legais: a hipossuficiência e a verossimilhança.
Numa linguagem simplista, hipossuficiência se equipara à falta de conhecimento
técnico e a verossimilhança quer fazer crer que a alegação do consumidor demonstra ser
verdadeira. O consumidor deve demonstrar que houve um fato, um dano e o nexo de
causalidade entre o fato e o dano. Não se pode confundir hipossuficiência com
vulnerabilidade. Aquela é de ordem técnica, esta, de ordem técnica e econômica. Aquela é
precisa ser provada, afinal é requisito para a inversão do ônus da prova; esta é presumida,
sendo regra geral e absoluta.
Quanto a conceituação do termo consumidor, Cláudia Lima Marques69, para
definir o termo incrustado na lei assevera que há necessidade de interpretar a expressão
“destinatário final” contida no Art. 2º do CDC. Explica que há duas correntes: uma finalista e
outra maximalista. Os finalistas entendem por consumidor toda pessoa, física ou jurídica, tida
como destinatária fática e econômica do bem ou serviço; é o destinatário final econômico do
bem; é aquele que ao comprar o produto o leva para casa ou escritório profissional sem
intenções de revendê-lo; adquire para fins próprios ou de sua família.
A corrente maximalista, como o próprio nome denuncia, entende o CDC como o
regulamento oficial do mercado de consumo brasileiro e, portanto, não somente como normas
orientadas para proteção do consumidor não-profissional. O CDC, para os maximalistas,
“institui normas e princípios para todos os agentes de mercado, os quais podem assumir os
papéis ora de fornecedores, ora de consumidores.” 70
Filomeno, por sua vez, entende consumidor como “um dos partícipes das relações
de consumo, que nada mais são do que relações jurídicas por excelência, mas que devem ser
69
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 4.ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2002, p.253-254.
70
MARQUES, Cláudia Lima. Op. cit., p.254-255.
53
obtemperadas precisamente pela situação de manifesta inferioridade frente ao fornecedor de
bens e serviços.”71
Conlcui o autor que toda relação de consumo:
“1. envolve basicamente duas partes bem definidas: de um lado o adquirente
de um produto ou serviço (consumidor); de outro o fornecedor ou vendedor
de um serviço ou produto (produtor/forneceddor);
2. destina-se a satisfação de uma necessidade privada do consumidor;
3. o consumidor, não dispondo, por si só, de controle sobre a produção de
bens de consumo ou prestação de serviços que lhe são destinados, arrisca-se
a submeter-se ao poder e condições de produtores daqueles mesmos bens e
serviços.”72
Ao contrário de Claudia Lima, fica claro que Filomeno prefere adotar posição
mais simplista não se preocupando com as conceituações doutrinárias, muito bem explanadas,
aliás, nas obras de Claudia Lima Marques, entretanto, a definição por ele apontada é de fácil
compreensão, se estendendo inclusive à conceituação de relação de consumo.
Oscar Ivan Prux, por outro lado, trazendo escólios da mais abalizada doutrina
nacional e estrangeira, como por exemplo Toshio Mukai, Alberto e Rodrigo Bercovitz,
traçando inclusive panorama anterior a vigência do CDC, entende consumidor por quatro
espécies distintas: consumidores efetivos (caput do Art. 2º), potenciais (consoante Art. 29);
por equiparação ou bystanders (conforme Art. 17); e, os coletivamente considerados
(parágrafo único, do Art. 2º).
A definição da figura do consumidor, segundo o autor pode ser compreendida
como:
“(...) termo amplo, aplicável a vários tipos de pessoas. Porém, em um
esforço, podemos dizer que, basicamente, o conceito de consumidor,
encerra-se, para efeitos legais, no que é estabelecido na definição dada pelo
Código de Defesa do Consumidor, ligando-se, precipuamente, ao ato de
retirar a utilidade final do produto ou do serviço e, excluindo, todos aqueles
71
72
FILOMENO, José Geraldo Brito. Manual de Direitos do Consumidor. 9.ed. São Paulo: Atlas, 2007, p.23.
________, op. cit., p.23.
54
73
que os adquirem para insumo ou intermediação.”
Ante os ensinamentos ora esposados, no que pertine aos Contratos Telemáticos, o
Internauta contratante, representa de forma pura a figura do consumidor esposada no Art. 2º e
seu parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor.
3.4.2 Fornecedor - conceito
Visto, portanto, de forma sumária o conceito de consumidor, insta afirmar que o
CDC, da mesma forma que define o consumidor, traz ínsito em seu artigo 3º o conceito de
fornecedor: “é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como os entes despersonalizados, que desenvolvam atividades de produção, montagem,
criação, construção, transformação, importação, distribuição ou comercialização de produtos
ou prestação de serviços.”
Como se vê do próprio enunciado do artigo, buscou-se aqui, conceito mais amplo
possível, motivo pelo qual, fornecedor, será qualquer um que participou da cadeia de
fornecimento, desde o fabricante até o vendedor do destinatário final, tendo responsabilidade
objetiva e solidária com os demais fornecedores da cadeia de produção.
Filomeno, em obra em conjunto com vários autores, ao conceituar fornecedor traz
inicialmente definição de Plácido e Silva, asseverando que o termo deriva do francês founir,
founisser, que significa, em síntese, todo comerciante ou estabelecimento que abastece ou
fornece gêneros e ou mercadorias necessárias a quem as consome. Como se vê a definição por
si só também é bastante profusa e, em assim sendo, o autor acaba por iniciar o conceito
fornecedor com a palavra “qualquer”.
“(...) fornecedor é qualquer pessoa física, ou seja, qualquer um que, a título
singular, mediante desempenho de atividade mercantil ou civil e de forma
habitual, ofereça no mercado produtos ou serviços, e a jurídica, da mesma
forma, mas em associação mercantil ou civil e de forma habitual.” 74
73
PRUX, Oscar Ivan. Responsabilidade civil do profissional liberal no código de defesa do consumidor.
Belo Horizonte: Del Rey, 2007, p.109-113.
74
GRINOVER, Ada Pellegrini. et al. Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores
do anteprojeto. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2007, p.47.
55
Ora, dúvidas não restam que a generalização busca atingir o maior número de
pessoas dentro da cadeia de fornecimento, visando, com isso, a lei, proteger de modo eficaz e
adequado a relação negocial e, consequentemente, o consumidor, pouco importando seja o
fornecedor público, privado, nacional ou internacional.
Ampliando o conceito, Oscar Ivan Prux, aponta o Art. 12 do CDC, asseverando
que referido dispositivo completa a figura do fornecedor, pois ao atribuir responsabilidade
objetiva a quem atua como fabricante, produtor, construtor, importador, ou que tenha
apresentado, acondicionado, projetado, manipulado, formulado ou montado (produtos ou
serviços), expandiu o elenco de pessoas que são consideradas fornecedores. 75
Os tratos telemáticos estudados no presente trabalho, reclamam a presença da
figura tanto do consumidor como do fornecedor, sendo desnecessária qualquer ginástica de
raciocínio para compreender que a figura do fornecedor estampada no Art. 3º, do CDC,
também pode ser equiparada ao fornecedor de bens ou serviços “sem rosto”, eis que não raro
alguns fornecedores globais se tratarem de redes de distribuição sem sede fixa e o que é pior,
por vezes, se explicitam em empresas “de fachada”.
Um exemplo deste tipo de fornecedor seria a empresa hipoteticamente denominada
“MP5Shop”, cuja sede eletrônica se encontra no seguinte endereço: www.mp5shop.com. O
fato do endereço eletrônico não vir acrescido do complemento “.br” (ponto br), já denuncia
não ser empresa com sede (também eletrônica) registrada nos domínios brasileiros, ou seja,
sua homepage não está hospedada em nenhum provedor pátrio, entretanto é ela feita
totalmente em língua portuguesa e dirigida ao público brasileiro.
Infelizmente, é prática comum desses tipos de empresa e após a confirmação do
pagamento da encomenda, o envio de e-mail ao consumidor, esclarecendo que elas (as
empresas) são meras representantes do consumidor, servindo tão somente para intermediar a
importação do produto diretamente de outro país, normalmente da China, esclarecendo ainda
que o produto chegará nos correios do Brasil e para sua retirada será necessário o pagamento
de impostos de importação na soma de até 60% do valor pago.
Tal prática é abominável e fere vários preceitos da legislação consumerista e
dúvidas não restam de que a figura desse tipo de empresa se amolda com precisão à definição
de fornecedor insculpida no Art. 3º, do CDC.
75
PRUX, Oscar Ivan. Op. cit., p.113.
56
3.4.3 Relação de Consumo - conceito
Falou-se até aqui da figura do consumidor e do fornecedor, esclarecendo seus tipos
e conceitos atribuídos por doutrinadores de renome, há que se traçar agora conceituação de
Relação de Consumo, especialmente porque além de ser parte indissociável do cotidiano do
ser humano, é o elo de ligação entre o fornecedor e o consumidor, completando a cadeia de
fornecimento.
As relações de consumo são bilaterais, posto que de um lado se encontra o
fornecedor e do outro o consumidor. São também dinâmicas em razão da própria existência
humana, nascendo, crescendo e evoluindo, representando, portanto o momento histórico em
que se situam. A evolução ora retratada acabou por modificar as relações de consumo,
influindo na consciência generalizada da efetiva desproteção do consumidor, culminando
numa resposta legal protetiva. 76
Ato de Consumo é expressão mais restrita que Relação de Consumo, explica
Oscar Ivan Prux, porque o primeiro tem a ver com a fruição do bem, ao passo que o
derradeiro abarca o primeiro “como também todos atos adjacentes que ensejam ou contribuem
para a contratação, ainda que em nível potencial”, como a oferta e a publicidade, quando
compõem a relação contratual. Arremata o autor que Relação de Consumo se caracteriza:
“(...) sempre que a pessoa física ou jurídica, em caráter profissional e, precipuamente, com
intuito de ganho, forneça produtos ou serviços à pessoa física ou jurídica que seja destinatário
final dos mesmos.” 77
Ronaldo Alves de Andrade78, citando Cláudia Lima Marques, diz que em embora
o legislador brasileiro tenha sido sensato em adotar o critério da destinação final, salienta que
tal critério comporta exceções que advirão especialmente pela ação da jurisprudência,
asseverando que o melhor conceito de destinatário final é aquele professado pela doutrina
Francesa e Italiana. Cita, a seguir, trecho da obra de Cláudia Lima, onde deixa claro que, os
contratos entabulados entre fornecedor e o consumidor não-profissional, e entre fornecedor e
consumidor profissional que não vise lucro, estão submetidos a regra do Código, uma vez que
tais tipos de contratos não se relacionam com a atividade profissional, seja o consumidor
76
ALMEIDA, João Batista de. A proteção jurídica do consumidor. 4.ed. São Paulo: Saraiva, 2003, p.1-2.
PRUX, Oscar Ivan. Op. cit., p.119.
78
ANDRADE, Ronaldo Alves. Contrato Eletrônico no novo código civil e no código de defesa do
consumidor. Barueri: Manole, 2004, p.102.
77
57
pessoa física ou jurídica. Ronaldo A. Andrade, todavia, arremata o trecho da obra asseverando
que:
“Qualquer que seja o conceito de consumidor e de relação de consumo, o
importante é fixar que, existindo consumidor, a relação jurídica estará
juridicamente regulada pelo microssistema do Código de Defesa do
Consumidor, estando afastada a aplicação de qualquer outro diploma legal,
salvo subsidiariamente, quando a lei consumerista não tratar de forma
específica do tema.” 79
Aqui há de se abrir um parêntese para asseverar que as contratações telemáticas
não se encontram reguladas pelo Código de Defesa do Consumidor, entretanto, como vem
sendo percebido neste trabalho desnecessárias grandes digressões para assentir que os
Contratos Telemáticos que ajustarem prestação de serviços ou compra e venda de bens ou
produtos, serão formados, interpretados e executados segundo as normas do aludido
Microssistema.
Apesar de parecer óbvio, mas como não poderia deixar de ser aventado neste
estudo, na contratação telemática que encerre uma relação de consumo, nulas são todas as
cláusulas consideradas como abusivas nos exatos termos do Art. 51, do CDC, especialmente
por que sempre se tratará de venda a distância sem a presença física simultânea das partes
contratantes.
Abusividade da cláusula contratual, segundo Cláudia Lima Marques, “é o
desequilíbrio ou descompasso de direitos e obrigações entre as partes, (...) é a unilateralidade
excessiva, é a previsão que impede a realização total do objetivo contratual, (...) é a
autorização de atuação futura contrária à boa-fé, arbitrária ou lesionária aos interesses do
outro contratante (...).”80
Oscar Ivan Prux assevera que o escopo precípuo do CDC ao construir em
separado uma seção para as práticas abusivas, foi moralizar as ações do fornecedor desde o
nascedouro, fazendo com que as partes envolvidas na relação de consumo se apresentem
imbuídas de intenções legítimas, enaltecendo, desta forma, o fim social do Contrato que
79
80
_______, op. cit., p.102-103.
MARQUES, Cláudia Lima. Op. cit., p.148.
58
pretendem, conceituando-as a seguir, consoante abaixo transcrito:
“A prática abusiva – de enumeração praticamente impossível dado as suas
incontáveis formas de manifestação – é aquele modo de atuação consistente
em um comportamento que extrapola os limites da licitude que se espera do
fornecedor quando participa do mercado; aquele desvio de conduta que foge
ao considerado normal e correto por parte do fornecedor nas práticas
pertinentes a consecução do fornecimento.”81
Em razão da natural vulnerabilidade do consumidor frente ao fornecedor, o
legislador se preocupou em proteger aquele ante este, especialmente se o comportamento
desse extrapolar os limites da licitude.
Destarte, ao serem analisados os princípios da legislação consumerista, que nela
ínsitos estavam antes mesmo de migrarem da Constituição Federal para o Código Civil, vê-se
que o CDC além de ser o instrumento que deve ser eleito nas eventuais lides que envolvam
tratos telemáticos, pode ser considerado como verdadeiro redentor daqueles que se utilizam de
tal modalidade contratual, em razão, principalmente, de não haver regulação específica da
matéria.
Não houvesse a legislação consumerista o internauta consumidor, apesar da
existência do Código Civil, poderia enfrentar problemas insolúveis, posto que neste estudo já
restou aclarado que dentre os inúmeros celeumas dos Contratos Telemáticos, um dos que
merecem mais atenção é a insegurança que paira no ambiente virtual.
Nesse ínterim, o princípio da boa-fé contido no Código de Defesa do Consumidor
se apresenta como porto seguro para a mais nova classe de consumidores que contratam a
distância, especialmente devido ao fato que, nessa modalidade, não há qualquer contato físico
entre os dois pólos da relação contratual: o consumidor não vê o vendedor nem o produto,
tampouco o vendedor vê o consumidor no intuito de avaliar imediatamente sua identidade e
suas condições econômicas. A boa-fé, portanto, serve para sobrelevar a credibilidade, a
honestidade e a lealdade tanto do vendedor como do comprador, como será visto no capítulo
seguinte.
81
PRUX, Oscar Ivan. Op. cit., p.292.
59
4 - APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS CONTRATUAIS AOS CONTRATOS
TELEMÁTICOS
4.1 PRINCÍPIOS CONTRATUAIS CLÁSSICOS
Em trecho passado deste estudo foi pincelado assunto que tratava do vetusto
Princípio da Autonomia da Vontade, ainda sobrevivente na relação negocial como antes
asseverado, contudo hodiernamente mitigado.
Pode até parecer incoerente tratar de princípio milenar em tão moderno tipo de
contratação, mas, como a síntese da contratação telemática não pode escapar da incidência
desses princípios, há de ser feita visita rápida a autonomia da vontade, como também aos
demais princípios clássicos e aos da nova ordem contratual, princípios esses últimos
insculpidos na Constituição Federal que acabaram migrando para a legislação substantiva
civil.
4.1.1 Autonomia de vontade, consensualismo e força obrigatória
a.) Autonomia da Vontade: por esse princípio, qualquer pessoa capaz pode criar
relações pela manifestação de sua vontade, desde que se trate de objeto ilícito. As partes têm
liberdade para contratar ou não o que bem entender, observados os limites legais, uma vez que
a vontade individual não se sobrepõe a ordem pública. Ninguém é obrigado a contratar,
somente se liga contratualmente se assim desejar.
A ordem pública é constituída por um conjunto de interesses jurídicos e morais
que incumbe à sociedade conservar.82 A liberdade de contratar sofre limitações das normas de
ordem pública impostas pelo Estado, que busca impedir que as cláusulas contratuais sejam
injustas a alguma das partes.
Orlando Gomes entende que o conceito de Liberdade de Contratar manifesta-se
sob três aspectos: a) liberdade de contratar propriamente dita; b) liberdade de estipular o
Contrato; e, c) liberdade de determinar o conteúdo do Contrato.
82
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. Saraiva: São Paulo, 3.vol. p.16.
60
Quanto ao primeiro aspecto, Gomes explica que tal se reveste no poder de as
partes suscitarem os efeitos que pretendem sem que a lei imponha seus preceitos, ou seja, os
contratantes são livres para determinar o conteúdo do Contrato, nos limites imperativos legais.
A seguir, ainda sobre o assunto, tece considerações no sentido de que o Princípio da
Liberdade de Contratar fica mais claro à luz da distinção entre leis coativas e supletivas.
Sendo aquelas, normas que ordenam ou proíbem algum ato, ao passo que estas, suprem ou
completam a vontade do indivíduo.83 O segundo e o derradeiro aspecto não apresentam
maiores dificuldades para interpretação, e, ademais, parece estarem ínsitos no primeiro
aspecto.
Aqui cabe abrir um parêntese para asseverar que como dito alhures, bem como se
verá mais adiante, o princípio da autonomia da vontade nos dias atuais se encontra subvalorizado em razão do novo conceito de Contrato que está sendo esculpido pela mais novel e
atualizada doutrina.
b.) Consensualismo: A maioria dos negócios jurídicos bilaterais é consensual,
amigável, todavia alguns, por serem solenes, podem ter sua validade condicionada à
observância de certas formalidades legais. No mais, o singelo acordo de duas ou mais
vontades basta para gerar um Contrato válido.84
c.) Força obrigatória: O Contrato cria uma força vinculante entre as partes,
constituindo uma espécie de lei privada entre elas, pacta sunt servanda, que é protegido por
uma sanção legal, no caso, a execução do devedor inadimplente.
O Contrato faz lei entre as partes, a obrigatoriedade é base fundamental do Direito
Contratual, caso esta não existisse estaria instalado o caos. Tanto que a lei lança a disposição
do contratante diversos instrumentos jurídicos para obrigar a parte contrária ao cumprimento
da obrigação ou a indenização por perdas e danos.
Assim, aquilo que for contratado há que ser cumprido pela parte que se obrigou à
tanto. O ato negocial, norma jurídica por excelência, faz lei entre as partes e é inatingível,
salvo se os próprios contratantes distratarem o avençado voluntariamente ou haja ocorrência
de evento por força maior ou caso fortuito, consoante insculpido no Art. 393, parágrafo único
83
GOMES, Orlando. Contratos. Forense: Rio de Janeiro, 25.ed., 2002, p.23.
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil das obrigações – Teoria geral da obrigações, 3.vol. Saraiva:
São Paulo, 16.ed., 2002, p.40.
84
61
do Código Civil.85
A Limitação, Revisão ou até mesmo Rescisão do Contrato ainda se faz presente na
ocorrência de evento imprevisível que altere a base contratual, capaz de suscitar o uso da
Onerosidade Excessiva, instituto previsto nos artigos 478, 479 e 480, do mesmo codex. Como
será visto adiante a Força Obrigatória ou o Pacta Sunt Servanda também tiveram sua
aplicação mitigada em respeito ao novo elemento nuclear do contrato que é o ser humano.
d.) Novo conceito de Contrato em detrimento aos conceitos clássicos: o Contrato
no Direito Pátrio insculpido no Código Civil revogado era fruto de uma sociedade burguesa
onde predominava a proteção da propriedade, pois esta era inerente às castas sociais mais
abastadas. O elemento nuclear do Contrato era a prevalência do Dogma da Vontade e do
velho brocardo Pacta Sunt Servanda, pensamento contratual ancorado no Século XVIII.86
Não obstante o pensamento senil insculpido nas linhas do Código Civil de 1916,
mesmo enquanto ele vigia, por certo que em época posterior a promulgação da Constituição
Federal, a Doutrina e a Jurisprudência já vinham construindo caminhos no sentido de que o
Contrato não poderia somente ser considerado como meio de circulação de riquezas, mas sim,
especialmente, como forma de desenvolvimento social, posto que os pactos apesar de verem
seus pressupostos legais de validade atendidos e servirem como incentivo à livre iniciativa,
não podem afrontar, por exemplo, Leis Ambientais, Trabalhistas, Consumeristas, nem violar a
Livre Concorrência e as Leis de Mercado, em razão de seus evidentes nocivos efeitos sociais
e flagrante desrespeito a Ordem Constitucional vigente.
A Autonomia da Vontade e o Pacta Sunt Servanda, destarte, deixaram o núcleo do
Contrato e hoje se situam mais tangencialmente a ele, contudo, continuam a prevalecer. Por
óbvio que o aceitante ao exarar sua assinatura num contrato de massa, não pode negar que tal
ato representa uma declaração autônoma de vontade, porém nada impede que a parte
eventualmente prejudicada pela alteração da equação financeira que estabelece o equilíbrio
contratual, venha a promover revisão de suas cláusulas ou busque o adimplemento na forma
estabelecida pelo chamado Contrato Social.
Após o advento da Constituição Federal, iniciaram-se discussões no Brasil acerca
85
DINIZ, Maria Helena. Curso de direito civil das obrigações – Teoria geral das obrigações, 16.ed. Saraiva:
São Paulo, 3.vol., 2002, p.38.
86
NALIN, Paulo. Do contrato: conceito pós-moderno em busca de sua formulação na perspectiva civilconstitucional. Curitiba: Juruá, 2001, p.31-32.
62
do que é chamado por Nalin87, citando Perlingiere, de pensamento civil-constitucional ou
constitucionalização do direito civil, onde resta claro que a leitura do Direito Civil à luz da
Constituição não se trata de modismo e sim de fundamentada metodologia interpretativa da
normalística civil.
Foi possível perceber deste modo que princípios constitucionais de suma
importância haveriam de ser reescritos nas próprias linhas da legislação substantiva, tendo a
migração sido iniciada com o advento da Lei nº 8.078/90, o CDC. Princípios como a boa-fé e
a equidade nela foram previstos expressamente (inciso III, do Art. 4º; e, inciso IV, do Art.
51).
Além do CDC, a Lei nº 10.406/2002, que instituiu o Código Civil em vigor,
também trouxe para o mundo contratual, além dos princípios clássicos, princípios
anteriormente inscritos tão somente na constituição e no código de defesa do consumidor:
boa-fé, função social e equidade. Abaixo será feita análise da aplicação deles nos Contratos
Telemáticos.
4.2 BOA-FÉ
Venosa o entende como o “dever das partes de agir de forma correta antes, durante
e depois do contrato, isso porque, mesmo após o cumprimento de um contrato, podem sobrarlhes efeitos residuais”.88
Maria Helena Diniz, por sua vez, mais clara e objetiva entende que por tal
princípio o intérprete do Contrato deve ater-se mais à intenção do que ao sentido literal das
cláusulas contratuais. As partes ainda devem “agir com lealdade e confiança recíprocas,
auxiliando-se mutuamente na formação e execução do contrato”, em prol do interesse social e
da segurança das relações jurídicas. 89
O princípio em questão, como dito acima foi inserido no Código em vigor, e
87
NALIN, Paulo. Op. cit., p.29.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2.v., 2003, p.376.
89
DINIZ, Maria Helena. Op. cit., p.40.
88
63
encontra-se disposto nos dizeres do artigo 42290, com referência nos artigos 11391 e 18792.
Importante aqui diferenciar boa-fé subjetiva da objetiva. Na boa-fé subjetiva há
um estado de consciência ou aspecto psicológico que deve ser considerado, enquanto que na
boa-fé objetiva há exposta uma regra, um dever de agir.
Venosa, ao tratar da boa-fé objetiva distingue três funções claras no seu conceito
pelo ponto de vista do Código Civil: a primeira é a função interpretativa, disposta no Art. 113;
a segunda, é a função de controle dos limites do exercício de um direito, observado no Art.
187; e por fim, a função de integração do negócio jurídico, podendo ser visualizado no Art.
422. 93
O Contrato hodiernamente tem como valor fundamental o livre desenvolvimento
da pessoa humana, pois o velho modelo de contrato, que primava pela autonomia da vontade,
foi, aos poucos, como asseverado por Claudia Lima Marques, tocado pelos ventos da
despatrimonialização e da repersonalização em razão da ordem centrada na Constituição
Federal.94
Além dos princípios constitucionais, a própria legislação substantiva, como já dito
acima, por meio do Art. 422, positivou o princípio da boa-fé nos negócios jurídicos. Princípio
esse, ademais, que já havia sido inserido nas relações de consumo consoante o quanto
disposto no inciso IV, do Art. 51, do Código de Defesa do Consumidor.
Por força dos Princípios da Boa-Fé Objetiva e da Equidade, além da Função Social
do Contrato, como será visto mais adiante, é que a segurança jurídica no Direito Contratual
hodierno não está mais baseada nas formas relacionais, mas, fundamentalmente, na esfera da
justiça contratual fundada no equilíbrio econômico e na efetivação dos valores existenciais. 95
A concepção patrimonialista e individualista do Direito Civil, onde o acordo de
90
“Art. 422. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os
princípios de probidade e boa-fé.”
91
“Art. 113. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua
celebração.”
92
“Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os
limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.”
93
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 3.ed. São Paulo: Atlas, 2.v., 2003, p.379.
94
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 3.ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1998, p.349.
95
NALIM, Paulo. Do contrato: conceito pós-moderno em busca de sua formulação na perspectiva civilconstitucional. Curitiba: Juruá, 2001, p.94.
64
vontades livre e consciente era suficiente para garantir a validade dos contratos não mais
impera, sendo certo que em vários dispositivos do Código de 191696, a Boa-Fé era tomada em
uma concepção subjetiva, individualista, na forma de se estar agindo conforme a lei, sem a
intenção de prejudicar.
Nos dias atuais, “a boa-fé objetiva significa uma regra de conduta de acordo com
os ideais de honestidade e lealdade, isto é, as partes contratuais devem agir conforme um
modelo de conduta social, sempre respeitando a confiança e os interesses do outro.” 97
Como visto a boa-fé objetiva, hoje insculpida em dispositivo do Código Civil,
busca alcançar a realização da chamada justiça contratual, exigindo das partes envolvidas na
relação jurídica comportamento ético, leal, transparente, com o fito de preservar o justo
equilíbrio do Contrato e eventual correção de desequilíbrios supervenientes.
Os Contratos Telemáticos, como asseverado alhures, ainda não se encontram
regulamentados por lei em território pátrio, posto que representam nova forma de contratar.
Além de não se encontrarem regulados por lei, é notório que representam insegurança, dada a
vulnerabilidade do ciberespaço. Em razão dessas assertivas, além dos princípios
constitucionais e ainda àqueles fundamentais do Direito Contratual, o Princípio da Boa-Fé
Objetiva desponta como princípio vital do sistema, justamente porque, na falta de legislação
específica regulatória das contratações telemáticas, recobre-se de ampla condição de correção
de abusos e injustiças, garantindo a segurança nas relações jurídicas. 98
4.3 FUNÇÃO SOCIAL
Insculpida no Art.421 do Código Civil, que literalmente disciplina que a liberdade
de contratar será exercida em razão e nos limites da Função Social do Contrato, está contido
não um Princípio Fundamental do Contrato, mas o que Stolze e Pamplona chamam de
Princípio Social.99
Stolze e Pamplona na obra ora citada tratam do tema como sendo ele suficiente à
96
Arts. 221, 491, 510, 511, 514, 516, 550, 551, entre outros.
TEPEDINO, Gustavo (coord.). Problemas de direito civil-constitucional. Rio de Janeiro: Renovar, 2000,
p.22-23.
98
LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos. Op. cit. p.96-97.
99
STOLZE GAGLIANO, Pablo. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. 2.ed., atual. e
refor. São Paulo: Saraiva, 4.vol., 2006, p.43.
97
65
justificar uma mudança de mentalidade jurídica e ensinam, citando Nalin, que a Função
Social do Contrato manifesta-se em dois níveis: Intrínseco e Extrínseco.
No Plano Intrínseco, a socialização do Contrato deve buscar um tratamento idôneo
das partes, inclusive de sua real desigualdade de poderes contratuais. Com isso obrigações
esquecidas ao longo dos anos, ante a sublimação da autonomia da vontade, ressurgem
esplendorasamente, tais como os deveres de informação, confidencialidade, assistência,
lealdade etc, em respeito ao princípio constitucional maior: o da Dignidade da Pessoa
Humana. O Plano Extrínseco, por sua vez, explicita o Contrato em face da coletividade,
entendendo que ele não pode somente ser considerado como meio de circulação de riquezas,
mas, também, como de desenvolvimento social, e, caso não houvesse o Contrato instalar-se-ia
a estagnação da Economia e da Sociedade, remetendo a civilização humana a estágios menos
evoluídos. 100 Conceituam a Função Social como sendo:
“(...) antes de tudo, um princípio jurídico de conteúdo indeterminado, que se
compreende na medida em que lhe reconhecemos o precípuo efeito de impor
limites à liberdade de contratar, em prol do bem comum. E essa socialização
traduz, em nosso sentir, um importante marco na história do Direito, uma
vez que, com ela, abandonaríamos de vez o modelo clássico-individualista
típico do século XIX.”101
Os autores acrescentam ainda que tal pensamento não pretende aniquilar a
autonomia da vontade, mas sim temperá-la, vocacionando-a para o bem comum.
Arrematando o subtítulo, Stolze e Pamplona, trazem importante pensamento no sentido de
que, baseado na linha de raciocínio supra, que está amparada pelo sistema constitucional
pátrio e consagrada pelo Art. 421, do Código Civil, qualquer tentativa ulterior no sentido de
violar ou constranger esta tese configura-se como flagrante ato inconstitucional.102
Ao discorrer sobre Função Social do Contrato, a maioria dos autores trilha o mesmo
caminho de Stolze e Pamplona, enaltecendo o legislador por tê-la incluído na legislação civil,
asseverando ter sido tal inserção um grande passo para o ramo do Direito Civil.
100
STOLZE GAGLIANO, Pablo. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit., p.45-46
_______. Op. cit., p.49.
102
_______. Op. cit., p.49.
101
66
Nalin, por sua vez, em interessante proposição deixa claro que totalmente
desnecessária a atitude do legislador em inserir oficialmente o princípio da função social nas
relações contratuais, posto que o Contrato já se apresenta funcionalizado, por força
constitucional, desde outubro de 1988. O autor assevera que o “contrato deve ser sempre
interpretado de modo socialmente funcionalizado, não só em alguns segmentos contratuais
privados, mas ainda, naqueles que tratam da produção e do consumo, por meio do sistema
introduzido na Carta de 1988.” 103
Pois bem, trazendo a matéria para o campo de estudo deste trabalho, não há porque
elencar qualquer tentativa que se furte da análise dos tratos telemáticos sob a ótica da
funcionalização dos pactos. A bem da verdade, com o desenvolver do presente estudo, mais
ficou parecendo que as figuras contratuais estudadas, foram delineadas especialmente à
proteção do consumidor telemático, fato que renderá, inclusive um item na conclusão a
respeito desse pensar.
103
NALIN, Paulo. Op. cit. P.232-233.
67
5 - ASPECTOS JURÍDICOS DO CONTRATO TELEMÁTICO
5.1 VALIDADE DOS DOCUMENTOS ELETRÔNICOS E TELEMÁTICOS
Devido a fragilidade que representa o sistema de transmissão de dados via Internet,
onde em cada esquina virtual104, é possível encontrar um meliante, imprescindível dar
segurança a quem faz uso desses tipos de documentos, que, por notório, representa milhões de
pessoas em todo o mundo.
Renato Blum ao tratar do assunto revela que a assinatura digital é um grande passo
para validar tanto um documento eletrônico como um telemático:
“Questão de extrema relevância é a da validade do documento eletrônico. Basta
afirmar que uma simples mensagem enviada por e-mail dificilmente tem plena
validade jurídica, equiparando-se a prova oral. Isso porque, em tese, por meio de
recursos técnicos, é possível alterar documentos digitais sem deixar vestígios. Por
outro lado, através da técnica da certificação eletrônica, é possível garantir a
autenticidade e a veracidade de um documento eletrônico e, por sua conseqüência,
atribuir validade jurídica ao mesmo. A certificação eletrônica mais comum é aquela
por meio da utilização de chaves públicas (assinatura digital por criptografia
assimétrica) é, em síntese, uma codificação, garantida e atribuída por uma terceira
pessoa (certificador), representada por um certificado (software) que identifica a
origem e protege o documento de qualquer alteração sem vestígios. Por isso, aqueles
que dispõem da assinatura digital já podem efetuar troca de documentos e informações
104
O termo em questão não há de ser considerado como chulo ou até mesmo inexistente, porque muitos seres
reais já vivem e fazem negócios em um mundo literalmente virtual, como por exemplo o ambiente denominado
Second Life, que se trata de um sistema computacional voltado principalmente para o entretenimento e pode ser
encarado como um jogo, um mero simulador, um comércio virtual ou uma rede social, dependendo da forma
como é utilizado. O sistema possui um sistema de moeda próprio chamado Linden Dollar (também grafado como
L$), levando o mesmo nome da empresa mantenedora (Linden), que obviamente não tem valor algum direto no
"mundo real". Apesar de não ter valor real direto, os Linden Dollar podem ser convertidos para dólares
americanos (reais) e também é possível comprar Linden Dollar através do site por Paypal ou cartão de crédito
internacional, respeitando sempre os limites pré-estabelecidos pela administração do sistema. A moeda virtual
tem valor flutuante em relação ao dólar americano, ou seja, seu valor pode variar a qualquer momento. Em 25 de
maio de 2007 cada real (R$) estava valendo cerca de L$ 129,85, ou ainda cada Linden Dollar estava valendo
aprox. R$ 0,0077 (menos de um centavo de real). Exemplos de produtos reais anunciados nos classificados: um
terreno mediano L$ 5.000,00 ( R$ 38,50), uma textura de pele realista por L$ 3.500 (R$ 27,00), uma outra
textura de pele por L$ 700 (R$ 5,40), uma lambreta por L$ 300 (R$ 2,31) e assim por diante. Os preços variam
muito de vendedor para vendedor, pois cada um é livre para dar o preço que quiser às suas criações ou produtos
anunciados. É possível também encontrar muita coisa de graça (conhecida como freebies), porém muitas vezes
são de qualidade inferior. Disponível em: Wikipédia, a enciclopédia livre http://pt.wikipedia.org/wiki/
Second_Life. Acesso em: 21.abr.2008.
68
pela rede com a devida segurança física e jurídica.”105
Os documentos eletrônicos podem até ser admitidos como meio de prova, desde
que seja possível demonstrar sua autenticidade, daí a importância da assinatura digital. Deve
ser seguro também no sentido de se evitar modificações posteriores.
O Código de Processo Civil não cria maiores empecilhos para sua admissão como
meio de prova, observa-se o que determinam os artigos 131, 332 e 335:
“Art. 131. O juiz apreciará livremente a prova, atendendo aos fatos e
circunstâncias constantes dos autos, ainda que não alegados pelas partes;
mas deverá indicar, na sentença, os motivos que lhe formaram o
convencimento.”
Art. 332. Todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda
que não especificados neste Código, são hábeis para provar a verdade dos
fatos, em que se funda a ação ou a defesa.”
“Art. 335. Em falta de normas jurídicas particulares, o juiz aplicará as regras
de
experiência
comum
subministradas
pela
observação
do
que
ordinariamente acontece e ainda as regras da experiência técnica, ressalvado
quanto a esta, o exame pericial.”
Destes dispositivos vê-se que o juiz tem livre convencimento para valorar as
provas, fundamentando as razões do seu entendimento. Sendo o documento eletrônico
conseguido de forma legítima, não há maiores impedimentos, ficando demonstrada,
entretanto, a necessidade de a ele se atribuir segurança.
Por força da Lei nº 11.419, de 19 de dezembro de 2006, o próprio Poder Judiciário
foi obrigado a reconhecer a força que representa o avanço telemático, uma vez que a norma
em questão trata exatamente da informatização do processo judicial.
Nela está previsto, indistintamente, nos processos cíveis, penais e trabalhistas,
bem como nos juizados especiais, em qualquer grau de jurisdição, o uso de meio telemático106
na tramitação de processos judiciais, bem como na comunicação de atos e transmissão de
peças processuais.
105
BLUM, Renato M. S. Opice (coordenador) e outros. Direito Eletrônico: a internet e os tribunais. São
Paulo: Edipro, 2001, p. 36-37.
106
Nota do autor: o legislador tratou o assunto como meio eletrônico e não telemático.
69
O legislador, entretanto, entende como “meio eletrônico”, qualquer forma de
armazenamento ou tráfego de documentos e arquivos digitais, e, como “transmissão
eletrônica”, toda forma de comunicação a distância com a utilização de redes de comunicação,
dando preferência à rede mundial de computadores.
Prevê a lei ainda que o envio de petições, de recursos e a prática de atos
processuais através da telemática, serão admitidos mediante uso de assinatura digital, emitida
por Autoridade Certificadora obrigatória e previamente credenciada no Poder Judiciário via
cadastro único. Esse último dispositivo, aliás, acabou por servir de fundamento para a
propositura de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade pela OAB.107
Aludida lei trata ainda de mais assuntos, onde, inclusive acresceu e modificou os
seguintes dispositivos do Código de Processo Civil: parágrafo único do Art. 38; § 2º do Art.
154; parágrafo único do Art. 164; parágrafos 1º, 2º e 3º; do Art.169; § 3º do Art. 202; inciso
IV do Art. 221;
parágrafo único do Art. 237; incisos V, VI e § 1º, § 2º do Art. 365;
parágrafos 1º e 2º do Art. 399; parágrafos 1º e 2º do Art. 417; § 4º do Art. 457; e parágrafo
único do Art. 556.
Impressiona pensar que as modificações impingidas nos pilares da sociedade
antiga, demoravam Séculos para se concretizarem, como, por exemplo, a transformação dos
costumes, em especial, o domínio do credo pela igreja católica, que ao invés de Séculos,
perdurou por quase dois mil anos. Isso porque eram vividos anos onde a informação, além de
demorar muito para chegar ao destinatário, quando chegava, se apresentava costumeiramente,
deturpada.
Hoje, ao contrário, a informação é transmitida ao mundo todo num simples apertar
de tecla, pois a rede mundial de computadores é imbatível, podendo ser comparada a Hidra de
Lerna, onde, se uma cabeça era cortada, logo duas nasciam para substituí-la.
A internet realmente está propiciando verdadeira revolução nos costumes,
atingindo, como visto, inclusive o Poder Judiciário, sempre avesso a mudanças repentinas,
pois como se sabe, além de moroso e antiquado, é insuficiente em pessoal, equipamentos e
107
A Ordem dos Advogados do Brasil pretende propor Ação Direta de Inconstitucionalidade contra os artigos 2º,
4º e 5ª da Lei 11.419. “A entidade não é contra a modernização do processo ou a informatização”, alerta o
presidente em exercício Vladimir Rossi Lourenço. No entanto, ele entende que a OAB é a única entidade ou
órgão capacitado para credenciar advogados. O artigo 2º da lei prevê que o Poder Judiciário é que vai criar um
cadastro único para o credenciamento dos advogados, e não a OAB.”
70
atualização, chegando a beirar infelizmente as raias da venalidade.
Com o advento da Lei nº 11.419, tal pilar vetusto se vê obrigado a ceder às
inovações tecnológicas, entretanto, além de não se encontrar totalmente informatizado, herda
problema que ainda emperra os documentos telemáticos ou eletrônicos, que é a regularização
da chamada assinatura digital.
O problema da efetivação da assinatura digital, como no caso da lei citada, já
propiciou entrave entre a OAB – Ordem dos Advogados do Brasil e o Poder Judiciário,
desnecessária, portanto, qualquer ginástica de raciocínio para prever o que irá acontecer nas
relações comerciais.
Destarte, a fim de propiciar maior segurança é plenamente viável a adoção da
criptografia assimétrica108, que vem a ser um método de criptografia que utiliza um par de
chaves: uma chave pública e uma chave privada.
A chave pública é distribuída livremente para todos os correspondentes via e-mail
ou outras formas, enquanto a chave privada deve ser conhecida apenas pelo seu dono. Em um
algoritmo de criptografia assimétrica, uma mensagem cifrada com a chave pública pode
somente ser decifrada pela sua chave privada correspondente.
Do mesmo modo, uma mensagem cifrada com a chave privada pode somente ser
decifrada pela sua chave pública correspondente. Os algoritmos de chave pública podem ser
utilizados para autenticidade e confidencialidade. Para confidencialidade, a chave pública é
usada para cifrar mensagens, com isso apenas o dono da chave privada pode decifrá-la. Para
autenticidade, a chave privada é usada para cifrar mensagens, com isso garante-se que apenas
o dono da chave privada poderia ter cifrado a mensagem que foi decifrada com a chave
pública.
A criptografia representa, pois, o que se denomina Certificação Eletrônica, que
servirá para garantir a autenticidade e a veracidade de um documento telemático ou
eletrônico.
Nesse caminho a Medida Provisória nº 2.200-2, de 24.08.2001, instituiu a InfraEstrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-Brasil, por se tratar do meio mais correto para
108
CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA. Wikipédia, a enciclopédia livre. Disponível em:< http://pt.wikipedia.
org/ wiki/ Criptografia_de_chave_pública>. Acesso em 20.mar.2008.
71
juridicamente se validar, especialmente, o Contrato Telemático celebrado entre o consumidor
final e o fornecedor.
A ICP-Brasil é, na verdade, um conjunto de entidades, padrões técnicos e
regulamentos, elaborados para suportar um sistema criptográfico com base em certificados
digitais, visando a regulamentação das atividades de certificação digital no País, no escopo de
propiciar maior segurança nas transações eletrônicas. A ICP-Brasil, incentiva ainda a
utilização da Internet como meio para a realização de negócios.109
O assunto é altamente técnico, fugindo as raias da compreensão de um leigo,
porém os estudiosos do tema são uníssonos em afirmar que esse, atualmente, é o caminho
mais garantido para se obter a segurança almejada no mundo telemático.
5.2 CLASSIFICAÇÃO DOS CONTRATOS NO COMÉRCIO TELEMÁTICO
Não é matéria fácil, nem pacífica. Diversos autores digladiam quanto ao assunto,
especialmente em razão de não existir legislação específica que regule o tema.
Patricia Peck, no escopo de contribuir para a pacificação do assunto, sugere seja
adotado um glossário com os significado dos termos técnicos empregados no Contrato para
diminuir risco de má interpretação. 110
A mesma autora enumera outras peculiaridades que devem ser observadas:
“a) indicação clara das responsabilidades de todos os participantes da cadeia
de relações envolvida, principalmente porque a Internet privilegia as
relações em rede, com vários co-participantes, e especial atenção nos
direitos do consumidor final; b) estabelecer uma política de informação
clara; c) política de segurança e privacidade; d) cláusula de arbitragem; e)
territorialidade, estabelecendo os limites geográficos de ação de cada
envolvido; f) relação dos parceiros envolvidos no negócio; g) no caso de os
produtos
109
transacionados
envolverem
tecnologia,
estabelecer
as
ICP-Brasil. Infra-estrutura de chaves públicas brasileiras. Disponível em:< https://www.icpbrasil.gov.br/
apresentação> Acesso em 20.mar.2008.
110
PECK, Patricia. Direito Digital. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 149.
72
responsabilidades por upgrades e obsolescência”.
111
A autora em questão entende que em relação ao item “e”, nada impede a eleição
do foro competente para julgar eventual ação, asseverando ainda que neste caso, o melhor
foro a ser eleito é o da execução da sentença, obedecendo, por óbvio as regras do CDC.
Sheila Leal, por outro lado, assevera que tais contratos devem ser considerados
como contratos atípicos e de forma livre, não obstante poder o seu conteúdo estar disciplinado
em lei, como por exemplo, a compra e venda, locação, ou mesmo outro tipo de contrato
celebrado no meio telemático.112
A principal característica da contratação telemática é a ausência física dos
contratantes que fazem demonstrar sua vontade se utilizando da informática conjugada com a
Internet.
Apenas por amostragem são trazidas neste momento classificações quanto aos
termos técnicos em matéria que os Europeus denominam como Contratos à Distância,
extraídas da DIRECTIVA 97/7/CE, de 20 de Maio de 1997, advinda do Parlamento Europeu e
do Conselho da União Européia, sendo certo que tal diretiva visa regular a proteção dos
consumidores.
Por Contrato à Distância: entende-se qualquer Contrato relativo a bens ou
serviços, celebrado entre um fornecedor e um consumidor, que se integre num sistema de
venda ou prestação de serviços à distância organizado pelo fornecedor, que, para esse
Contrato, utilize exclusivamente uma ou mais técnicas de comunicação à distancia até a
celebração do Contrato, incluindo a própria celebração; por Consumidor: qualquer pessoa
singular que, nos contratos abrangidos pela presente diretiva, atue com fins que não
pertençam ao âmbito da sua atividade profissional; por Fornecedor: qualquer pessoa singular
ou coletiva que, nos contratos abrangidos pela presente diretiva, atue no âmbito da sua
atividade profissional; por Técnica de Comunicação à Distância: qualquer meio que, sem a
presença física e simultânea do fornecedor e do consumidor, possa ser utilizado tendo em
vista a celebração do Contrato entre as referidas partes; e, por Operador de Técnica de
111
PECK, Patricia. Op. cit., p.152-153.
LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos Leal. Contratos eletrônicos: validade jurídica dos contratos via
internet. São Paulo: Atlas, 2007, p.82.
112
73
Comunicação: qualquer pessoa singular ou coletiva, pública ou privada, cuja atividade
profissional consista em pôr a disposição dos fornecedores uma ou mais técnicas de
comunicação à distância.113
Aludida Diretiva, traz em seu Anexo I, o que classifica como Técnicas de
Comunicação à Distância: impresso sem endereço, impresso com endereço; carta
normalizada; publicidade impressa com nota de encomenda; catálogo, telefone com
intervenção humana; telefone sem intervenção humana (aparelho de chamada automática);
rádio; videofone; videotexto (micro computador, ecrã de televisão) com teclado ou ecrã táctil;
correio eletrônico; telefax (telecópia); e, televisão (telecompra, televenda).
Na Europa, como visto, a preocupação com o comércio à distância, além de
abranger as contratações telemáticas, envolve qualquer meio, que, sem a presença física e
simultânea do fornecedor e do consumidor possa ser utilizado para celebração do Contrato.
Possivelmente a diretiva foi editada no escopo precípuo de que os estadosmembros não tomassem posições divergentes quanto a proteção dos consumidores em matéria
de vendas à distância, isso porque tal poderia incidir de forma negativa na concorrência entre
as empresas que operam no mercado interno.
Sobre a contratação sem o contato físico, Sérgio Ricardo Marques Gonçalves,
deixa claro que a idéia de contratar à distância e sem o contato físico das partes não é nova,
porém a contratação telemática é diferente:
“A idéia da contratação eletrônica entre duas ou mais partes sem contato
físico não é nova, mas já existe há algum tempo, em especial nas transações
entre empresas (muitas vezes embasadas em contratos genéricos anteriores
que permitem subcontratos eletrônicos) e, ao invés de computadores
utilizava-se antes o telex ou o fax para fins semelhantes aos da Internet de
hoje, com a diferença de que estes deixavam um suporte físico em poder das
partes para embasar o pactuado e demonstrar como se transacionou. O
contrato eletrônico via Internet difere por usar dados codificados em
linguagem binária para atingir o mesmo objetivo e também por expandir este
tipo de contratação aos usuários comuns da rede, ou seja, os antigos
113
DIRECTIVA 97/7/CE. Disponível em:< http://www.mp.rs.gov.br/consumidor/legislacao/id773.htm>. Acesso
em: 22.mar.2008.
74
consumidores do varejo.”114
Ainda quanto a classificação dos Contratos Telemáticos, Eurípedes Brito Cunha
Junior, em texto compacto, porém sui generis entre tantos ouros pesquisados, apresenta
diversas formas de classificação dos contratos, por ele chamados de eletrônicos. Divide seu
pensamento em cinco formas distintas: 1) quanto ao grau de eletronização; 2) quanto à
natureza jurídica da relação tutelada; 3) quanto ao grau de interação homem/máquina; 4)
quanto à simultaneidade proposta/aceitação; e, 5) quanto à subforma. No que pertine à
primeira forma de classificação, ou seja, o grau de eletronização, Cunha Junior, a subdivide,
novamente em cinco tipos: 1) contratos executados eletronicamente; 2) contratos parcialmente
executados eletronicamente; 3) contratos integralmente executados eletronicamente; 4)
contratos celebrados por meios eletrônicos e executados fisicamente; e, 5) contratos firmados
e executados eletronicamente.115
O leitor pode até achar estranho tanta subdivisão, porém, como linhas atrás
afirmado, o texto é realmente sui generis, pois Cunha Junior se preocupou com as mais
variadas formas de contratação eletrônica e telemática, e, acertadamente, afirma que o grau,
do que chama de eletronização, classifica o Contrato.
Assevera o autor ainda que tal tipo de classificação ajuda a compreender melhor os
vários tipos de Contrato que já existem e virão a existir no chamado Mundo Virtual. Sobre o
assunto, arremata: “um contrato que necessitou do emprego de meios tecnológicos para que
pudesse se formar é um contrato mais eletrônico do que outro apenas executado por esses
meios. O primeiro é tecnológico na sua raiz, na sua formação.”116
Apenas para diferenciar os vários tipos de classificação que Cunha Junior
impingiu aos contratos, vale dizer que os “Contratos Executados Eletronicamente” são
aqueles apenas executados eletronicamente, mas celebrados em meio físico.
Quanto aos “Contratos Parcialmente Executados eletronicamente”, a celebração é
física e a execução pode se dar de forma eletrônica.
114
BLUM, Renato M. S. Opice (coordenador) e outros. Direito Eletrônico: a internet e os tribunais. São
Paulo: Edipro, 2001, p. 231.
115
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Os contratos eletrônicos e o novo código civil. Revista CEJ do
Conselho da Justiça Federal. Brasília. n.19, p.62-77, out.-dez. 2002.
116
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Op. cit., p.69.
75
Dúvidas não restam quando o Contrato pode ser celebrado fisicamente, e
integralmente executado eletronicamente, como é o caso dos contratos de cartão de crédito e
de manutenção de banco de dados.
Para este trabalho, mais interessa a proposição de Cunha Junior, quando explica
seu entender quanto aos “Contratos Celebrados por Meio Eletrônico e Executados
Fisicamente”. Diz o autor que aqui se fala de Contratos Eletrônicos Stricto Sensu, aqueles
inseridos no cenário mundial das novas tecnologias.
“Neles as manifestações de vontade dos contratantes – oferta e aceitação - se
dão por meio de transmissão eletrônica de dados, enquanto o registro das
respectivas transações ocorre em meio virtual. Essa espécie de contrato pode
ser considerada a mais eletrônica que as anteriores porque o contrato é
eletrônico desde a sua formação, em seu nascedouro. Para sua celebração
impõe-se o emprego de recursos tecnológicos, muito embora a execução se
dê de forma tradicional. A compra e venda de bens, duráveis ou não, por
intermédio de página eletrônicas da Internet, é o melhor e mais típico
exemplo da hipótese. (...) Nesses casos, a formação contratual se dá no
instante em que o aceitante, mediante um clique confirmatório, emite
inequívoca declaração receptícia da vontade de contratar, isso após
preencher um cadastro que o identifique individualmente e escolher os
produtos que pretende adquirir.”117
A próxima e derradeira classificação, “Contratos Firmados e Executados
Eletronicamente”, não apresenta maiores dificuldades para entendimento, pois a própria
denominação de seu tipo encerra sua conceituação.
São aqueles pactos realizados integralmente por meio da telemática, ou por outro
meio de transmissão de dados, não envolvendo a informática, como por exemplo, Contratos
entabulados através de redes de comunicação sem fio, não estando necessariamente presente a
figura de um computador. Como exemplo dessa última tecnologia citada, o telefone celular.
Pois bem, não obstante já ter sido aclarado neste trabalho, somente não é possível
concordar com Cunha Lima, quando ele generaliza todos os Contratos como sendo pactos
117
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Op. cit., p.70.
76
eletrônicos, especialmente quando cita que os contratos celebrados via Internet em conjunto
com a informática também são eletrônicos.
Na verdade, o uso da Telemática impõe sejam eles considerados como Contratos
Telemáticos, como dito alhures.
Dando continuidade ao pensamento de Cunha Junior, trata ele após tais
apontamentos da classificação dos Contratos quanto a natureza jurídica da relação tutelada.
Assevera que tal classificação se equipara a classificar o Contrato em relação ao direito
material envolvido ou quanto à qualidade das partes contratantes.
Numa crítica à doutrina que, segundo o autor, é afoita por recepcionar
estrangeirismos, cita que os Contratos Comerciais são denominados de B2B, B2C, B2G,
G2G, C2C.118 Mais adiante o autor diz ser de sua autoria as denominações seguintes: G2C,
B2G e G2G, todavia, como se denota da nota de rodapé abaixo, a única denominação não
encontrada no rol de definições é a G2C.
Independentemente das classificações alienígenas adotadas pela doutrina nacional
acima citadas, o que realmente importa é a divisão que cunha Junior faz com tais tipos de
Contrato, diz ele:
“(...) todas as transações – comerciais, consumeristas, civis e até de Direito
Público (administrativo) – bem como as comunicações eletrônicas em geral,
há de se denominar comércio eletrônico lato sensu o gênero que engloba
todas essas transações, quer de Direto público ou privado, em contraposição
à espécie comércio eletrônico strictu sensu, que versa somente sobre as
118
B2B - Negócio-a-negócio (business-to-business) - As transações comerciais realizam-se entre empresas,
geralmente em uma relação de fornecedor ou usuário de produtos, serviços e informação; B2C - Negócio-aconsumidor (business-to-consumer) - As transações realizam-se entre empresas e consumidores, envolvendo
estratégias de pagamento aceitas pelas partes. É a versão eletrônica da venda a varejo; G2G - Governo-aGoverno (government-to-government) - Iniciativas que visam a qualidade da integração entre os serviços
governamentais, envolvendo ações de reestruturação e modernização de processos e rotinas; B2G - Negócio-agoverno (business-to-government) - As empresas se relacionam com as administrações federais, estaduais ou
municipais dos governos. No Brasil existem o SIAFI (Sistema Integrado de Administração Financeira) ou
SIAFEM (para os estados e municípios) e o sistema de compras do Ministério da Administração; C2G Consumidor-a-governo (consumer-to-government) - O consumidor se relaciona com o Estado para obter
serviços, benefícios ou informações. Como exemplos, temos o acesso a andamento de processos (tribunais),
declaração do imposto de renda e consulta a multas de trânsito; C2C- Consumidor-a-consumidor (consumerto-consumer) - As transações são feitas entre consumidores finais, como nos leilões virtuais que permitem aos
consumidores a publicação e licitação de produtos; C2B - Consumidor-a-negócio (consumer-to-business) - As
transações são feitas entre consumidores e empresas, como por exemplo, passageiros que dão lances por
passagens aéreas, cabendo às empresas aceitar ou não. Disponível em;< http://www.contabeis.ufba.br/
materialprofessores/sonia/ Artigo%20CONVIBRA.pdf>. Acesso em 20.mar.2008.
77
relações B2B e B2C.”119 (grifei)
Discordando de Cunha Junior, mais uma vez quanto a generalização do termo
comércio eletrônico, resta patente que nem todas as transações acima citadas poderiam assim
ser denominadas.
Primeiramente, porque como já insistentemente dito, em sendo transação efetuada
por meio da informática conjugada com a Internet, é ela telemática, e não eletrônica.
Ao depois, Cunha Junior afirma que os contratos do tipo G2C, que representam
relações entre o Governo e o Particular, também devem ser considerados como “comércio”
eletrônico, como, por exemplo, a obtenção de uma certidão junto aos órgãos públicos via
Internet.
Ora se não houver onerosidade, nem mesmo escambo na obtenção de tal certidão,
como é o caso, por exemplo, da certidão negativa obtida via Internet no sítio da Receita
Federal, não há porque que se falar em comércio. A situação retratada mostra a ocorrência de
uma transação telemática, mas não comércio eletrônico, muito menos telemático.
Igualmente a Cunha Junior, diversos outros autores, como por exemplo, Sheila
Leal
120
, Silva Bruno121, José Antonio Milagre122, e até mesmo um ex-aluno desse curso de
mestrado, Rogério Montai de Lima123, citando César Viterbo Mato Santolim e Erica Brandini
Babagalo, classificam os Contratos Telemáticos em três categorias: Intersistêmicos,
Interpessoais e Interativos. Marcos Gomes da Silva Bruno124, citando Marisa Delapieve Rossi,
apresenta as seguintes definições:
“Contratações Intersistemáticas – Aquelas em que a contratação eletrônica
119
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Op. cit., p.71.
LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos. Op. cit., p.82-88.
121
BRUNO, Marcos Gomes da Silva. Contratos: aspectos jurídicos. Revista Meio Jurídico, São Paulo: Editora
Meio Jurídico, julho de 2001, ano IV, nº 46, p.66-68.
122
MILAGRE, José Antonio. Direito eletrônico – contatos eletrônicos ma era Second Life: o dilema da
formação do tempo. Revista Justilex, São Paulo: Editora Justilex, junho de 2007, ano VI, nº 66, p.43-45.
123
LIMA, Rogério Montai de. Peculiaridades dos contratos eletrônicos. UNOPAR Científica: ciências
jurídicas e empresariais, Londrina, março de 2004, v.5, p17-23.
124
BRUNO, Marcos Gomes da Silva. Aspectos jurídicos dos contratos eletrônicos. Jus Navigandi, Teresina,
ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com,.br/doutrina/texto.asp?id=2196>. Acesso em: 29
ago. 2006. apud Marisa Delapievi Rossi in “Aspectos Legais do Comércio Eletrônico – Contratos de Adesão”,
Anais do XIX Seminário de Propriedade Intelectual da ABPI, 1999, p. 105.
120
78
se estabelece entre sistemas aplicativos pré-programados, sem qualquer ação
humana, utilizando a Internet como ponto convergente de vontades préexistentes, estabelecidas em uma negociação prévia. Tal modalidade ocorre
predominantemente entre pessoas jurídicas, para relações comerciais de
atacado;
“Contratações interpessoais – Já tratada anteriormente neste trabalho, e pela
qual, previamente à contratação eletrônica, existe uma comunicação
eletrônica (através de correio eletrônico, ou salas de conversação, por
exemplo), para a formação da vontade e a instrumentalização do contrato,
que é celebrado tanto por pessoas físicas, quanto jurídicas. Diferentemente
da contratação intersistemática, não é uma simples forma de comunicação de
uma vontade pré-constituída, ou de execução de um contrato concluído
previamente;
Contratações Interativas – Esta talvez seja a mais usual forma de contratação
utilizada pelo comércio eletrônico de consumo, vez que resulta de uma
relação de comunicação estabelecida entre uma pessoa e um sistema
previamente programado. Trata-se de um típico exemplo de contratação à
distância, onde os serviços, produtos e informações são ofertados, em caráter
permanente, através do estabelecimento virtual (site), que é acessado pelo
usuário, que manifesta sua vontade ao efetuar a compra.”
Flúvio
Cardinelle Oliveira Garcia,
quando
discorre sobre contratações
intersistemáticas, assevera:
“(...) em que pese utilizar, num momento posterior, computadores
interligados em rede, foge do escopo deste trabalho, posto que as
declarações iniciais de vontade das partes são feitas de forma tradicional,
estabelecendo as regras gerais de funcionamento das ocorrências futuras
feitas mediante computador.” 125
125
GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos . Jus Navigandi,
Teresina, ano 8, n. 264, 28 mar. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4992>.
Acesso em:
28 jan. 2008.
79
Nesta modalidade, as partes convencionam anteriormente o modo com se operarão
as futuras contratações eletrônicas e não se desvincula totalmente do modo clássico de
contratação. As declarações de vontade envolvendo a proposta e o aceite são emitidas
anteriormente à contratação eletrônica.
Pereira Santos e Delapieve Rossi, melhor explicando o tipo de contratação acima,
asseveram que ela utiliza o EDI – Eletronic Data Interchange, que possibilita a comunicação
telemática entre as empresas, por meio de protocolos de dados:
“Uma operação comercial de EDI se estabelece quando, por exemplo, o
sistema de compras de uma empresa se comunica com o sistema de vendas
da empresa fornecedora, e, nesta comunicação, documentos eletrônicos de
pedido, com ou sem autorização de fornecimento e oferta são trocados entre
os respectivos sistemas. Para que isto se concretize, cada empresa envolvida
deve ter um conjunto de recursos específicos de hardware e software que lhe
permitam programar todos os seus sistemas aplicativos (de controle de
estoques, de compras, de expedição, de faturamento, de compras a pagar,
etc.) para estabelecer a comunicação eletrônica com os sistemas aplicativos
de seus fornecedores, clientes, bancos, seguradoras, transportadoras e outras
entidades com quem mantenha relações, devendo estas contar, também, com
seus respectivos sistemas aptos ao estabelecimento de comunicação dessa
natureza.”
126
Interessante notar nesses casos que os contratantes que utilizam o sistema EDI,
prévia e usualmente, disciplinam os direitos e obrigações de cada parte contratante, todavia,
após tal fase, não há mais manifestação da vontade humana, uma vez que os computadores,
telematicamente, operam sem a intervenção do homem.
No que pertine a contratação interpessoal, é certo que o computador tem
grande importância para instrumentar o negócio jurídico, porque é através dele que as partes
se interagem para a formação e a celebração do Contrato Telemático. Podendo ser
Simultâneos ou Não-Simultaneos.127
126
SANTOS, Manoel J. Pereira dos; ROSSI, Mariza Delapieve. Aspectos legais do comércio eletrônico:
contratos de adesão. Revista do direito do consumidor, São Paulo, nº 66, p.113, out./dez. 2000.
127
GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Op. cit., p.
80
Os Simultâneos são aqueles contratos firmados pelas partes que utilizam a Internet
para manifestar sua vontade em tempo real, como por exemplo, aquelas pessoas que utilizam
salas de conversação, os chamados chats, ou programas de conversação, como o Messenger
da Microsoft.
Os Não-Simultâneos são os Contratos Telemáticos firmados de forma que a
manifestação de vontade não se tem de imediato, existe um lapso de tempo para cada parte. A
emissão e o recebimento da manifestação de vontade não se dá de forma imediata, onde se
pode, inclusive, fazer analogia aos contratos firmados entre ausentes. São aqueles firmados,
por exemplo, via correio eletrônico.
As manifestações de vontade da proposta e o aceite, nos casos da Contratação
Telemática Interpessoal Simultânea é efetivamente formada no instante em que for
exteriorizado pela parte. No não-simultâneo, onde existe um lapso temporal, será efetivado
com o devido recebimento no seu computador e não no servidor de correio eletrônico.
Por fim, a modalidade de Contratação Interativa, é aquela em que de um lado
existe uma pessoa e do outro uma máquina pré-programada. É a forma mais comum de
Contratação Telemática ocorrida na Internet.
De regra, estes Contratos se apresentam como de adesão, ou seja, as cláusulas são
pré-estabelecidas por uma das partes. Para a efetivação de um negócio jurídico, a parte
interessada, por meio de um computador ligado à Internet, deverá acessar o sítio que está
disponibilizando em suas páginas eletrônicas, produtos e serviços; aquele aceitando as
condições que este oferece, deverá apenas fornecer as informações necessárias para a
concretização do negócio.
Nesta ultima modalidade a manifestação da vontade das partes, Erica Brandini
Barbagalo, citada por Flúvio Cardinelle Oliveira ensina:
“(...) de acordo com Erica Barbagalo, esta situação gera "um caso misto, no
qual, quanto ao proponente, por não saber ele si et quando haverá aceitação,
o contrato será considerado como entre ausentes. O aceitante, por sua vez,
tem ciência imediata da proposta quando a acessa, e, para este, o contrato
81
pode ser reputado entre presentes."
128
A mesma autora explica que o Contrato se dá como celebrado quando a proposta
for aceita e o aceite exteriorizado. Isso em sendo a proposta completa.
Caso a proposta não seja completa, e dependa de informações da parte que
acessa o web site fornecer, exemplo: a forma de pagamento. Aqui, a proposta será feita por
quem aceitou, há, segundo a autora supracitada, uma inversão de papéis entre o proponente e
o aceitante. Poderá ser considerado Contrato entre presentes ou entre ausentes, tudo
dependerá da capacidade do sistema do eletrônico de analisar e emitir o aceite.
Sheila Leal129, citando Luís Henrique Ventura, para melhor ilustrar os Contratos
Interativos, traz comentários sobre o chamado Clikwrap ou Contrato por Clique. Tem ele esse
nome, porque num simples clicar de mouse feito pelo consumidor, em lugar pré-determinado
na tela de seu computador, acaba por confirmar sua aceitação aos termos do Contrato. Para
que não paire dúvidas, servindo para demonstrar que o leitor tomou ciência dos termos e
condições do Contrato, na caixa em destaque objeto do ato de clicar, normalmente aparecem
os seguintes termos: aceito, concordo, Ok, ou outros semelhantes.
Esses tipos de contratos são considerados como Contratos de Adesão,
primeiramente porque suas cláusulas e condições são estabelecidas unilateralmente pelo
ofertante, e, ao depois, elas não podem ser modificadas, ou o contratante as aceita totalmente,
ou, igualmente, as recusa in totum, uma vez que ele tem somente essas duas opções: aceitar ou
recusar.
Dúvidas não restam também que tais tipos de contratos são equiparados aos
Contratos à Distância, posto que além do uso da Telemática, as partes não estão
simultaneamente presentes no momento de sua conclusão e, portanto, a eles se aplicam as
normas que disciplinam a contratação à distância, inclusive o Código de Defesa do
Consumidor.130
128
BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001. apud GARCIA, Flúvio
Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos . Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 264, 28
mar. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=4992>. Acesso em:
28 jan. 2007.
129
LEAL, Sheila do Rocio Cercal Santos. Op. cit. p.87.
130
_______. Op. cit. p.87
82
5.3 REQUISITOS DE VALIDADE
Por certo que os Contratos Telemáticos, como já dito, constituem uma nova
modalidade de acordo de vontades, porém apesar de representar novel figura no mundo
contratual, tal não lhes tira a imprescindibilidade de terem presentes todos os pressupostos de
validade exigidos nos contratos tradicionais.
Em sendo o Contrato um Negócio Jurídico, submete-se ao quanto disposto no Art.
104, do Código Civil, que preceitua que a validade do Negócio Jurídico requer agente capaz;
objeto lícito, possível, determinado ou determinável; e, forma prescrita ou não defesa em lei.
Rogério Montai,131 citando Ângela Bittencourt Brasil, assevera:
“Por terem, portanto, as características comuns dos contratos, os seus
requisitos subjetivos de validade são aqueles mesmos dos contratos. Já
conhecidos, eis que a presença de duas ou mais pessoas, a vontade
livremente manifestada e a capacidade civil para o ato devem estar presentes
para o ato se perfazer de forma válida.”
A doutrina subdivide os requisitos do negócio jurídico em Subjetivos, Objetivos e
Formais.
Requisitos Subjetivos são aqueles relativos aos sujeitos que celebram o Contrato.
Os contratantes devem estar no pleno gozo de sua capacidade civil, consoante disciplinado no
Art. 5º do Código Civil, ter aptidão específica para contratar e exarar seu consentimento.
São Objetivos os requisitos que dizem respeito ao objeto do contrato: objeto lícito,
não contrário à lei, à moral, aos princípios da ordem pública e aos bons costumes;
possibilidade física ou jurídica do objeto; determinação do objeto, que deve ser certo ou, ao
menos, determinável; e ser o objeto susceptível de valoração econômica.
Como a própria terminologia da palavra explicita, Requisitos Formais dizem
respeito à forma do contrato. Hodiernamente a regra é a liberdade das formas, onde a simples
declaração de vontade tem o condão de originar uma relação obrigacional entre as partes,
gerando efeitos jurídicos independentemente da forma de que seja revestida. Nos casos onde a
forma é da essência do Contrato, a lei assim o determinará. Não o fazendo, vigora o princípio
131
LIMA, Rogério Montai de. Peculiaridades dos contratos eletrônicos. UNOPAR Científica: ciências
jurídicas e empresariais, Londrina, março de 2004, v.5, p18.
83
da liberdade das formas, consoante disciplinado pelo Art. 107, do Código Civil.
Da leitura de citado dispositivo, desde logo, vê-se que os contratos telemáticos
prescindem de forma especial ou solene para terem sua validade confirmada, portanto, a
celebração do pacto telemático e a conseqüente declaração da vontade, são perfeitamente
válidas, pois realizados por meio de troca de informações telemáticas, forma essa não vedada
expressamente pela lei.
Rogério Montai ainda ao tecer comentários sobre o consentimento, deixa claro que
o que predomina é a convergência da vontade das partes para o negócio jurídico,
determinando o objeto do Contrato a ser cumprido. Esclarece ainda que não basta tão somente
a troca de informações, como retro citado, necessária ainda a síntese da vontade distinta dos
contratantes para que esta possa ser ajustada entre eles.132
5.4 FORMAÇÃO E APERFEIÇOAMENTO DO CONTRATO TELEMÁTICO
A legislação vigente trata especificamente de todos os momentos da relação
contratual, a saber: formação, aperfeiçoamento e execução. Numa rápida análise do quanto
preceituado pelo Art. 107, do Código Civil, se verifica a prevalência da ausência de
solenidade para a celebração dos contratos em geral, bastando o simples acordo de vontades.
Por óbvio, tal ausência também se estende aos Contratos Telemáticos.
A formação do Contrato se inicia com uma oferta, conceituada como declaração de
vontade unilateral, por si só já vinculatória, por meio da qual o proponente manifesta ao
oblato a sua intenção de contratar, expondo desde logo os termos em que dispõe a fazê-lo,
devendo a proposta, para ser válida, atender aos requisitos da determinação e da
obrigatoriedade. 133
Stolze e Pamplona134, deixam claro ainda que a proposta se reveste numa
declaração receptícia de vontade que, para valer e ter força vinculante deve ser séria e
concreta, sendo certo que meras conjecturas ou declarações jocosas não representam proposta
juridicamente válida e exigível. A proposta deve ainda ser analisada com extremo cuidado,
132
LIMA, Rogério Montai de. Op. cit., p.19.
CARVALHO, Ana Paula Gambogi. Contratos via internet. Belo Horizonte: Del Rey, 2001, p.64.
134
GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil – Contratos, IV vol.
Saraiva: São Paulo, 2.ed., 2006, p.86.
133
84
visando não ser confundida como simples oferta de negociações preliminares.
Os mesmos autores, citando Carlyle Popp, ao discorrerem sobre oferta de
negociações preliminares, vaticinam:
“É importante frisar, também, que muitos dos tratos negociais iniciam-se
com a realização de uma proposta, sendo que a chamada contraproposta – na
verdade nova proposta – instaura um procedimento negociatório. Esta
sistemática proposta-contraproposta, mediante adições, restrições ou
modificações, são negociações preliminares. Mais usual, contudo, é que o
início ocorra mediante um convite a negociar, ou invitation à pouparlers,
como diriam os franceses. A distinção concreta entre oferta firme
negociações preliminares não é facilmente perceptível, ainda que o
intérprete esteja atento aos fatos, mas é de grande relevância jurídica. Isto
porque, dependendo como elas se iniciam, os efeitos jurídicos sobretudo os
vinculatórios, serão diversos.”135
Como visto uma linha tênue separa a proposta das negociações preliminares,
todavia, a proposta de contratar obriga o proponente, que não pode voltar atrás, exceto nos
casos previstos na própria lei, Art. 428 do Código Civil, e ainda consoante o disposto na
legislação consumerista.
5.5 LOCAL EM QUE SE FORMA O CONTRATO TELEMÁTICO
Não há dúvidas quanto ao local da formação do Contrato Telemático na
modalidade intersistemática, uma vez que antes da contratação ocorrida pelos computadores,
existiu um Contrato prévio principal que fora firmado na forma tradicional.
Os Contratos Telemáticos Interpessoais e Interativos não gozam de mesma sorte,
necessitando de uma melhor análise.
Sobre esta questão, é interessante reproduzir o estudo do já citado Flúvio
Cardinelle Oliveira Garcia:
135
GAGLIANO, Pablo Stolze. PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Op. cit. 86-87.
85
“Nestas modalidades de contrato, a localização física do proponente, muitas
vezes, é uma tarefa bastante difícil e complexa, principalmente devido a dois
fatores: 1) os legisladores tupiniquins não previram o advento da
comunicação móvel, hoje tão comum e corriqueira em nosso meio; 2) a
identificação que o usuário tem na rede de computadores é lógica, referente
ao "endereço" de seu computador na rede, e não física; isto significa que
uma pessoa residente no Brasil, utilizando-se, por exemplo, de um provedor
de acesso norte-americano, terá uma identificação lógica proveniente dos
Estados Unidos da América, sendo indiferente o local físico onde
efetivamente esteja; mesmo que esteja em trânsito, num avião ou navio, por
exemplo, sua identificação lógica não se alterará, permanecendo a mesma
durante toda a conexão.”136
Para evitar aborrecimentos, Flúvio Cardinalle também sugere que as partes
devem eleger o foro competente para dirimir qualquer demanda futura ou indicar a origem
física da proposta.
Nem todas as pessoas são prudentes em fazer estes apontamentos no momento
de contratar, todavia, em se tratando de Contratos Telemáticos Interpessoais, deve-se então
fazer um rastreamento na rede mundial de computadores para descobrir a origem física da
mensagem.
Faz-se isso, por exemplo, buscando no servidor de e-mail da empresa provedora,
verifica-se o caminho percorrido pela proposta, e, observados os registros é possível chegar a
origem da mensagem. Nestes casos é fundamental a cooperação da empresa provedora.
Os Contratos Telemáticos interativos apresentam algumas situações distintas.
Nos caso do web site apresentar alguma referência com relação a localização do proponente,
não resta dúvida quanto ao local do vinculo de formação (a informação pode constar no corpo
da página, bem como em uma cláusula expressa no Contrato).
Outra situação ocorre quando o web site apresenta-se omisso quanto a esta
questão. Aqui, fazer o rastreamento da origem pode ser inútil, pois existem sites que se
136
GARCIA, Flúvio Cardinelle Oliveira. Da validade jurídica dos contratos eletrônicos . Jus Navigandi,
Teresina, ano 8, n. 264, 28 mar. 2004. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id =4992>.
Acesso em:
28 jan. 2007.
86
encontram hospedados em um local diferente daquele das suas instalações físicas (uma
empresa brasileira pode muito bem ter sua home page hospedada em um servidor
estrangeiro).
Quando for impossível o rastreamento preciso do local do proponente, Erica
Barbagalo137 entende que se deve presumir emitida a proposta no que ele chama de “domicílio
lógico do ofertante”, ou seja, o lugar indicado como de origem de sua identificação lógica na
rede de computadores.
Cunha Junior138, no que pertine ao local de formação do Contrato, dispensa toda a
busca citada nos parágrafos anteriores, asseverando, simplesmente, que reputa-se celebrado o
Contrato no lugar em que foi proposto, conforme disciplinado pelo Art. 435, do Código Civil.
“(...) quando celebrado entre ausentes, considerar-se-á formado no local
onde foi proposto. Quando se tratar de Direito interno, i.e., quando
proponente e aceitante residirem no Brasil, a norma aplicável é a nacional.
Contudo, em se tratando de Direito Internacional, obrigação resultante do
contrato reputa-se constituída no lugar em que residir o proponente, regendo
as obrigações a lei do país em que se constituírem, a teor do disposto no Art.
9º e § 2º da LICC.”
Érica Barbagalo139, por sua vez também apresenta entendimento diverso, pois
preceitua que há de se considerar formado o Contrato onde tem domicílio o destinatário da
oferta. Assim, se a proposta é feita no exterior, porém em língua portuguesa, o que possibilita
a contratação de determinado bem ou serviço, o Brasil há de ser considerado como local de
formação do Contrato.
Relevante são todas as discussões levantadas pelos doutrinadores pátrios, dadas
especialmente, as peculiaridades dos Contratos Telemáticos, porém, quanto ao local de
formação do Contrato, desnecessária qualquer ginástica de raciocínio para se verificar que ele
se dá exatamente conforme determina a lei, ou seja, no local onde tem domicílio o proponente
(Art. 435, CC), pouco importando onde estão seus servidores e até mesmo o país onde foi
registrado o domínio da homepage do comerciante.
137
BARBAGALO, Erica Brandini. Contratos eletrônicos. São Paulo: Saraiva, 2001, p.64.
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Op. cit., p.73.
139
BARBAGALO, Érica Brandini. Op. cit., p.75.
138
87
5.6 FORO COMPETENTE
Outra questão fundamental é saber qual será o foro competente para dirimir
eventuais lides surgidas em razão da contratação pela modalidade telemática.
No entender de Moacyr Amaral Santos140, “diz-se que um juiz é competente
quando, no âmbito de suas atribuições, tem poderes jurisdicionais sobre determinada causa”,
ou seja, a competência delimita a jurisdição.
Observados os limites legais, poderá o juiz, ter ou não jurisdição para conhecer
e julgar determinada ação.
Como já dito, não existe nenhuma norma processual específica que trate do
comércio telemático e, especialmente, do foro competente para dirimir eventuais problemas
surgidos. Quando o problema para fixação do foro existir e em se tratando de Direito Interno,
há que se observar a regra geral insculpida no Art. 94 do Código de Processo Civil, onde resta
disciplinado que o foro competente é o do domicílio do réu.
Poderá ser o for do domicílio do autor se incerto ou desconhecido o do domicílio
do réu, quando este não tiver domicílio nem residência no Brasil, consoante disciplinado nos
parágrafos 2º e 3º do Art. 94 do mesmo Código acima citado.
Versando a ação sobre direito real sobre bens imóveis, o foro será o da situação da
coisa, conforme se denota do Art. 95 do Código de Processo Civil.
Imagine-se, entretanto, a seguinte situação, uma pessoa adquire uma câmera digital
anunciada numa homepage hospedada em um servidor americano; onde poderá este
consumidor resolver eventual litígio? No Brasil ou nos Estados Unidos da América?
O Artigo 9º do Decreto-Lei 4.657/42 apresenta a seguinte redação:
“Art. 9º. Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em
que se constituírem.
§ 1.º Destinando-se a obrigação a ser executada no Brasil e dependendo de
forma essencial, será esta observada, admitidas as peculiaridades da lei
140
SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil. 23.ed. São Paulo: Saraiva, 1.vol.,
2004, p.198.
88
estrangeira quanto aos requisitos extrínsecos do ato.
§ 2.º A obrigação resultante do contrato reputa-se constituída no lugar em
que residir o proponente.”
O Artigo 9º da chamada Lei de Introdução ao Código Civil trata da eficácia da lei
no espaço, mais especificamente, quando uma norma estrangeira terá eficácia no ordenamento
jurídico brasileiro.
Ele dá eficácia a normas estrangeiras. Pelo supra observado, para as obrigações
contraídas no estrangeiro, será admitida a aplicação da norma estrangeira.
Maria Helena Diniz141, por este artigo, entende que o Contrato de Consumo
Internacional será regido pelo seu §2º. Da mesma opinião compactua Fábio Ulhoa Coelho142.
A autora levanta, ainda, a seguinte situação: se a relação de consumo se der entre
países do MERCOSUL, a lei a ser aplicada será a do destino dos bens, por força do item A.4
da ata n. 2/93 da X Reunião do Grupo Mercado Comum do Mercosul.
Daí, possível asseverar que os Contratos Telemáticos Internacionais reger-se-ão
pelas normas do Direito Estrangeiro.
Por sua vez, o Art. 88, inciso II do CPC determina que:
“Art. 88. É competente a autoridade judiciária brasileira quando:
(...)
II – no Brasil tiver de ser cumprida a obrigação;”
Este artigo mostra que a autoridade judiciária brasileira tem legitimidade para
julgar ações que envolvam os Contratos Telemáticos, inclusive os Internacionais quando no
Brasil terá de ser cumprida a obrigação.
Em se tratando de Direito do Consumidor, observe-se o que determina o Art.
93 do CDC:
“Art. 93. Ressalvada a competência da Justiça Federal, é competente para a
causa a justiça local:
141
DINIZ, Maria Helena. Direito civil brasileiro: teoria das obrigações contratuais e extracontratuais.
17.ed. São Paulo: Saraiva, v.3, 2002, p.679.
142
COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial: direito de empresa – contratos e recuperação de
empresas. São Paulo: Saraiva, v.3, 2005, p. 42-43
89
I – no foro do lugar onde ocorreu ou deva ocorrer o dano, quando de âmbito
local;
(...)”
Para Rizzato Nunes143, no Art. 93, inciso I do CDC, existe um equivoco, para
ele, houve por parte do legislador, o intuito de proteger a figura do consumidor, porém, a
regra geral determinada pela Lei, protege o consumidor apenas quando existir uma
coincidência com o local do dano e o seu domicílio, ou seja, somente se beneficiam os
consumidores com domicílio no local do evento.
O mesmo autor aponta uma solução. Basta que se faça uma interpretação
sistemática com a utilização do Art. 93, I, combinado com o Art. 101, I do mesmo Código.
Observa-se o que determina o Art. 101, I do CDC:
“Art. 101. Na ação de responsabilidade civil do fornecedor de produtos e
serviços, sem prejuízo do disposto no nos Capítulos I e II deste Título, serão
observadas as seguintes normas:
I – a ação pode ser proposta no domicílio do autor;
(...)”
Em se tratando de causa que envolva relação internacional de consumo, é possível
asseverar que os mandamentos do Código de Defesa do Consumidor são imperativos, onde o
foro do domicílio do consumidor, notadamente, deve ser tido como competente para dirimir
problemas advindos de tal relação.
Nessa linha de raciocínio, Cunha Junior 144, afirma que se uma empresa brasileira,
por meio de sua homepage, oferecendo artigos artesanais nacionais, tem como cliente em
potencial um consumidor residente na Espanha, que se interesse por “uma panela de barro” ou
por um “cesto de palha” e tal produto apresente defeito no fornecimento, a ação competente
para reclamar o vício apontado deverá ser proposta na Espanha in verbis: “(...) é o que se
depreende das normas retro citadas. O Contrato foi constituído sob a tutela da lei brasileira,
que privilegia o foro do domicílio do domicílio do consumidor. Em outras situações, mais
complexas, arremata Cunha Junior, é imprescindível “confrontar as normas dos ordenamentos
jurídicos possivelmente aplicáveis à relação contratual, caso a caso, para se definir o foro
143
NUNES, Rizzatto. Comentários ao Código de Defesa do Consumidor. São Paulo: Saraiva, 2005, p.767 e
ss.
144
CUNHA JUNIOR, Eurípedes Brito. Op. cit., p.74.
90
competente.”
Sobre o assunto vê-se com clareza solar que necessário esforço conjunto dos
operadores jurídicos e da própria sociedade para eventual aprovação de legislação mais
específica sobre o assunto, a fim de não existir brecha nos tratos que envolvam este novo tipo
de operação mercantil, todavia, como visto em alguns tópicos deste estudo, o ordenamento
jurídico pátrio não deixa desamparado aquele que resolve contratar por meio da telemática, se
bem que apresenta disparidades.
5.7 A OFERTA
A Oferta obriga o proponente, se o contrário não resultar de seu conteúdo, da
natureza do negócio ou das peculiaridades do caso. Esses, os dizeres contidos no Art. 427 do
Código Civil, que querem deixar claro que a norma civil deferiu às relações mercantis,
estabilidade e segurança jurídicas, uma vez que o proponente fica vinculado à proposta feita.
Desta forma, busca evitar a lesão das expectativas do aceitante, quando do momento da
aceitação e da aderência integral daquilo que antes fora proposto.
Bacelar afirma que “ao proponente é imposto ônus na hipótese de proceder a
revogação da oferta por certo lapso temporal, sujeitando-o in casu, à obrigação de indenizar o
oblato as eventuais perdas e danos causados.” 145
Veja-se pois que o Código Civil obriga o proponente que revoga a Oferta, a
indenizar o oblato e não ao cumprimento do teor de sua Oferta.
Tal posicionamento é diferente do quanto preceituado pelo Código de Defesa do
Consumidor, no que pertine a Oferta ao Público, uma vez que o Art. 30, da lei 8.078/90
vaticina que “toda informação ou publicidade, suficientemente precisa, veiculada por
qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços apresentados,
obriga o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integra o contrato que vier a ser
celebrado.”
O artigo ao esclarecer que qualquer forma ou meio de comunicação utilizado é
145
BACELAR, Hugo Leonardo Duque. A proteção contratual e os contratos eletrônicos. São Paulo:
Thomson, 2006, p. 62.
91
suficiente para obrigar o fornecedor, não deixa margem a dúvida alguma quanto a sua
aplicação nos Contratos Telemáticos.
Além de tal fato, há que se notar ainda que a legislação consumerista difere da
norma civil, posto que esta não obriga ao cumprimento da Oferta, ao passo que aquela é
taxativa quanto a esse fato. “Segundo esse dispositivo legal, quaisquer publicidades
veiculadas, incluindo-se nestas as realizadas por intermédio da rede mundial de
computadores, desde que apresente informações minudentemente precisas sobre as qualidades
do produto e seu preço, integra o contrato a ser celebrado, constituindo oferta contratual
obrigatória.” 146
Como item importante cabe aqui asseverar que a oferta necessita se apresentar
precisa, certa, determinada, posto que não é qualquer informação veiculada que obriga o
fornecedor. Ela precisa conter uma qualidade essencial que é a precisão, todavia, o Código
não exige precisão absoluta, ou seja, aquela que não deixa margem à duvidas, contenta-se
com uma precisão suficiente, com um mínimo de concisão.147
À ratificar e fortalecer o entendimento supra, vem o Art. 35 do Código de Defesa
do Consumidor, no sentido de compelir o fornecedor a cumprir o quanto ofertado.
Preceitua aludido dispositivo que caso o fornecedor de produtos ou serviços
recusar o cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá,
alternativamente e à sua escolha: I- exigir o cumprimento forçado da obrigação; II- aceitar
outro produto equivalente; e, III- rescindir o contrato, com direito à restituição da quantia
paga devidamente atualizada e, ainda, a perdas e danos.
Ante as ponderações supra é possível afirmar que a Oferta contida em uma loja
telemática, exposta em sua homepage, é uma oferta vinculatória, que ao contrário da teoria
contratual clássica, obriga o proponente a mantê-la caso aceita pelo consumidor, não podendo
destarte ser suprimida ao arbítrio do fornecedor.
146
BACELAR, Hugo Leonardo Duque. Op. cit., p.63.
GRINOVER, Ada Pelgrini, et al. Código brasileiro de defesa do consumidor. 9.ed. Rio de Janeiro: Forense
Universitária, 2007, p. 270.
147
92
5.8 PROTEÇÃO CONTRATUAL
Já foi asseverado neste trabalho que o Código Civil Brasileiro apesar de não trazer
qualquer dispositivo que sirva para regular as Contratações Telemáticas, não traz, igualmente,
qualquer tipo de proibição. Pois bem, apesar de não existir legislação específica que trate da
regulação do Comércio Telemático, o Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, em seus
artigos 2º e 3º, que tratam de conceituar as partes numa Relação de Consumo, não deixa
margem à dúvida - se bem que também de forma indireta - quanto sua aplicação nos
Contratos Telemáticos.
Dúvida alguma pode existir, posto que a conceituação de Consumidor e
Fornecedor permitiu que a doutrina estabelecesse um conceito lógico do que é uma Relação
de Consumo: é a relação jurídica entre fornecedor e consumidor envolvendo a aquisição pelo
último de qualquer produto ou serviço como destinatário final.
Claudia Lima Marques148, num parêntese, abre discussão sobre a definição de
Relação de Consumo adotada pela doutrina pátria, especificamente quanto ao termo
destinatário final no sentido de que tal termo pode ensejar oportunidade a interpretações
equivocadas, diz a autora:
“(...) o destinatário final é o Endverbraucher, o consumidor final, o que retira
o bem do mercado ao adquirir ou simplesmente utilizá-lo (destinatário final
fático), aquele que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final
econômico) e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois
ele não é o consumidor final, ele está transformando o bem, utilizando o bem
para oferecê-lo por sua vez ao seu cliente, seu consumidor.”
Minudentemente explicado o sentido de destinatário final, é forçoso reconhecer
que todo o sistema de proteção contratual insculpido nos dispositivos da legislação
consumerista se aplicam aos Contratos Telemáticos, uma vez que o Internauta bem representa
o chamado Destinatário Final. É ele a outra ponta da cadeia produtiva, que se utiliza da rede
mundial de computadores para adquirir, na grande maioria das vezes segundo os mais
recentes dados estatísticos, um DVD, CD-Rom, livro, equipamento eletrônico, é ele enfim,
que põe fim a cadeia produtiva.
148
MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor. 3.ed. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1999, p.150.
93
Importante asseverar ainda que por força do Art. 126 do Código de Processo Civil,
o Juiz, ante situações não previstas na legislação, não pode escusar-se à efetiva prestação
jurisdicional com fundamento em omissão da norma, como, por exemplo, no caso dos
Contratos Telemáticos.
Sobre o assunto Bacelar149, diz ser importante deixar claro que o processo
hermenêutico que conclui pela aplicação da proteção contratual disciplinada tanto pelo
Código Civil, como pelo Código de Defesa do Consumidor aos Contratos Telemáticos, não se
trata de analogia, mas sim da aplicação do instituto da interpretação extensiva. O autor cita
ainda Miguel Relae, in verbis:
“(...) podemos dizer que o pressuposto do processo analógico é a existência
reconhecida de uma lacuna na lei. Na interpretação extensiva, ao contrário,
parte-se da admissão de que a norma existe, sendo suscetível de ser aplicada
ao caso, desde que estendido o seu entendimento além do que usualmente se
faz. É a razão pela qual se diz que entre uma e outra há um grau a mais na
amplitude do processo integrativo.”
Bacelar, portanto, citando Reale, claramente quis com isso dizer que a aplicação
dos dispositivos de proteção aos contratos não se trata de analogia, pois os Contratos
Telemáticos são negócios jurídicos que possuem todas as características e requisitos dos
demais contratos, só destes se diferenciando quanto a emissão das vontades dos contratantes e
aposição das “assinaturas” posto que estas se dão de forma telemática. Assim, não há lacuna
na lei, motivo pelo qual não se trata de analogia e sim de interpretação extensiva.
Ao finalizar o subitem em questão, Bacelar afirma que o assunto dispensa maiores
reflexões jurídicas dado, especialmente a notoriedade atingida pela intervenção estatal nas
relações contratuais, não só nas de natureza consumerista como em todas de natureza civil, e,
portanto:
“(...) tem-se como pressuposto à celebração contratual lato sensu a
necessidade de atendimento às normas de proteção contratual, contidas nas
Leis nº 8.078 e 10.406, editadas com fins específicos e inquestionáveis de
equalização dos pólos contratantes, visando, acima de tudo, ao equilíbrio
149
BACELAR, Hugo Leonardo Duque. Op. cit., p.59.
94
econômico na vida social.” 150
Consoante já visto em linhas passadas, vencidas algumas questões de natureza
territorial, especialmente as relativas ao foro, no que pertine a proteção contratual dos Pactos
Telemáticos, mesmo não se encontrando eles regulados pela Legislação Pátria, há que
asseverar que eles se submetem aos dispositivos protetivos insculpidos tanto no Código de
Defesa do Consumidor quanto no Código Civil.
5.9 MEIOS DE PROVA
O Código Comercial revogado, em seu Art. 122, inciso IV, possuía previsão no
sentido de que os Contratos Comerciais poderiam restar provados via Correspondência
Epistolar, entre outros meios. Nesse caso o meio de prova é o bom e velho papel, que, como
se sabe, perante a sociedade representa aos olhos do contratante, fisicamente, a concretização
do negócio jurídico.
Em se tratando de Pactos Telemáticos, há que se perguntar qual seria esse meio de
prova, pois a representação física do negócio jurídico não existe, salvo impresso que poderá
ser gerado por cada um dos contratantes em momentos e locais distintos entre si.
Newton De Lucca ao tratar do assunto, inicia a discussão trazendo a debate o
quanto preceituado pelo Art. 332, do Código de Processo Civil, onde resta especificado que
“todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados
neste código, são hábeis para provar a verdade dos fatos, em que se funda a ação ou a defesa.
Em razão de tal dispositivo, assevera que no Direito Pátrio existem provas admissíveis e as
inadmissíveis, onde estas últimas se tratam daquelas obtidas por meios ilícitos.151
Lançada essa premissa, prossegue o autor afirmando que por se tratar de
contratação via Internet, o assunto ganha maior dificuldade, uma vez que a Constituição
Federal em Art. 5º, inciso XII, traz a inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas,
salvo se determinada por ordem judicial. Acrescenta ainda que a lei que regulamentou tal
inciso, foi a Lei nº 9.296, de 24 de julho de 1996, que buscou limitar a quebra do sigilo das
150
BACELAR, Hugo Leonardo Duque. Op. cit., p.62.
DE LUCCA, Newton; SIMÃO FILHO, Adalberto et al. Direito & Internet: aspectos jurídicos relevantes.
São Paulo: Edipro, 2000, p.62.
151
95
comunicações telefônicas para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.
Sobre o assunto, De Lucca, trouxe lição integral de Barbosa Moreira, que sustenta,
de início, que do confronto apontado é seguro tirar as seguintes conclusões:
“(...) a) não é ilícita, nem por conseguinte inadmissível, uma prova obtida
nos termos da ressalva constante na parte final do inciso XII;
b) a ressalva não abrange o segredo da correspondência, nem os das
comunicações telegráficas ou de dados, mas exclusivamente o das
comunicações telefônicas (verbis “no último caso”);
c) cinge-se a ressalva à esfera criminal, não alcança o processo civil.” 152
No que pertine a primeira inferência, Barbosa Moreira leciona que enquanto
perdurou o silêncio do legislador, que foi quebrado somente em julho de 1996, como acima
apontado, toda e qualquer violação do sigilo era inteiramente inconstitucional, motivo pelo
qual a prova obtida por tal meio, até aquela data era ilícita, inadmissível pois.
Para aclarar a sustentação acima, interessante transcrever o exemplo citado no
texto, “in verbis”:
“Merece alusão aqui um julgamento de grande repercussão, mesmo fora dos
meios jurídicos, realizado em 7.12.1994: o da ação penal nº 307, em que
foram réus, entre outros, o ex-Presidente Fernando Collor de Melo e Paulo
César Farias. A defesa deste argüira em preliminar a inadmissibilidade de
duas provas: a gravação de conversa telefônica, feita por uma das
testemunhas, sem o conhecimento dos outros interlocutores, entre eles Paulo
César; e os registros extraídos da memória do computador da empresa
Verax, objeto de apreensão no respectivo escritório. Embora com
divergências, foi a argüição acolhida em ambos os casos pelo STF. O relator,
Min. Ilmar Galvão, sustentou em seu voto que, inexistindo lei definidora das
hipóteses e da forma de interceptação, não seria possível a juiz algum,
mesmo que se houvesse requerido – o que não ocorrera – conceder
autorização para gravar subrepticiamente a conversa. Quanto aos registros
152
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.63.
96
do computador, tampouco assistiria à polícia o direito de apreender o
aparelho sem ordem judicial, nem o de extrair dele dados particulares da
empresa, ali armazenados.” 153
Barbosa Moreira apud De Lucca, ao tratar de sua segunda conclusão assevera que
o legislador tupiniquim tem manifestado vez por outra “estranho amor pelo paradoxo.” Óbvia
é sua colocação, uma vez que é dada ao Poder Judiciário a possibilidade de decretar a quebra
do sigilo telefônico, vez que pode autorizar a interceptação telefônica, e não pode, entretanto,
permitir a violação de uma carta ou de um telegrama. Destarte, “(...) se dois membros de uma
quadrilha conversam por telefone, existirá a possibilidade de escutar o que dizem; mas se um
envia ao outro uma folha de papel, não haverá meio lícito para descobrir o que nela foi
escrito.”154
Trata-se realmente de um paradoxo existente na legislação pátria. Trazendo a
circunstância ora levantada para o mundo dos Contratos Telemáticos, lembrando que eles se
realizam pelo uso conjugado da informática e dos meios de telecomunicações, é possível
asseverar, com fundamento no quanto disposto no Art. 5º, inciso XII, da Constituição, que os
dados de um computador, para servirem como meio de prova de um fato, especialmente se
tratando de causas cíveis, são inacessíveis.
Em assim sendo, é possível questionar se os produtos oriundos do computador
poderão ser considerados como documentos e servirem de prova do Contrato celebrado entre
as partes? De Lucca citando Moacyr Amaral, faz alusão ao já citado Art. 332 do CPC, como
também ao Art. 131 do mesmo Código, deixando claro que o julgador dentro da prova, deve
se mover livremente na busca da verdade, nela há de se apoiar para, livremente, formar
consciência a respeito da verdade pesquisada. 155
Nesse passo, mais adiante De Lucca traz a lume definição de documento
diretamente e indiretamente representativo. O primeiro modelo diz respeito aos documentos
que num simples ictus oculi apresentam seu efeito representativo, quanto ao segundo, diz in
verbis: “no que toca aos segundos, neles o efeito representativo dar-se-á somente após a
153
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.63.
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.63.
155
SANTOS, Moacyr Amaral. Primeiras linhas de direito processual civil.17.ed. São Paulo: Saraiva, 2.vol.,
p.368-387.
154
97
utilização de um outro objeto que seja capaz de permitir a sua “leitura”. Exemplos: fita
magnética, slides, película cinematográfica, videocassete, disquete, disco rígido etc.” 156
Arremata o texto citando legislação italiana, onde naquele país está disciplinado o
que lá é denominado como documento informático, inclusive seu arquivamento e transmissão.
Na Itália, o Art. 2º, do Decreto nº 513, de 10 de novembro de 1997, prescreve que “(...) o
documento informático por qualquer forma criado, o arquivamento sobre o suporte
informático e a transmissão com seus instrumentos telemáticos, são válidos e relevantes para
todos os efeitos legais se estiverem de conformidade com as disposições do presente
regulamento.”
Há que se reparar que De Lucca acaba por não responder literalmente sua própria
pergunta, feita no subitem ora estudado, todavia, das linhas transcritas vê-se que deverá o
Juiz, no caso concreto, apreciar a prova livremente no escopo precípuo de formar consciência
a respeito da verdade pesquisada, desde que o detentor do documento indiretamente
representativo, faça a cortesia de revelá-lo em juízo.
A palavra cortesia foi aqui utilizada levando em consideração a vedação insculpida
no Art. 5º, inciso XII, da Constituição Federal, que, como dito alhures, se aplica aos Contratos
Telemáticos.
Há, como visto especialmente neste capítulo, grandes celeumas a serem resolvidos,
possivelmente mediante construção jurisprudencial e quiçá aprovação de legislação mais
específica, todavia, como se verá da conclusão que se abrirá na página seguinte, o consumidor
não se encontra a mercê de sua própria sorte no que pertine à proteção da relação jurídica que
vier a estabelecer da forma telemática.
156
DE LUCCA, Newton. Op. cit., p.64.
98
CONCLUSÕES
A evolução como se sabe é inata ao ser humano; por conseqüência seus atos e
criações também tendem a se desenvolver. Certo é que a história registra involuções, todavia,
quanto aos Contratos, a curva de sua evolução ainda está registrando posição de ascendência,
pois o homem passou da simples pactuação verbal, cuja época e local de surgimento não há
autor sério que arrisque palpite, à contratação telemática.
Importante, também nesse momento, abrir novo parêntese, para ratificar
entendimento do quanto defendido durante todo o estudo presente, ou seja, a adoção do termo
telemático ao invés de eletrônico.
Como dito alhures, a esmagadora maioria dos doutrinadores pátrios e mesmo de
outros países nominam o Contrato objeto do presente estudo como sendo Eletrônico. É bem
plausível que a adoção deste termo tenha como causa os primórdios da Internet,
especialmente, as mensagens trocadas entre as pessoas por meio do computador, que foram
chamadas por seus criadores de mensagem eletrônica, advinda de um correio eletrônico,
sempre dirigida a um endereço eletrônico. Desde então, tudo que se relacionava com a
utilização de um computador ligado à rede de telecomunicações, acabou por receber a
terminação eletrônica ou eletrônico: Comércio Eletrônico, Documento Eletrônico, Transação
Eletrônica etc.
Os costumes, ao que tudo indica, prevaleceram no que tange ao assunto ora
estudado, e, hodiernamente, todos os países pesquisados, ao tratar dos Tratos Telemáticos, os
consideram como sendo Tratos Eletrônicos. Data vênia, ousando discordar das mais dignas
autoridades doutrinárias pesquisadas, o estudo em questão acabou por concluir que em se
tratando de transação efetuada tendo como suporte um computador interligado pelas redes de
telecomunicações via Internet, deve ela ser considerada como Telemática e não Eletrônica.
O significado da palavra Eletrônica constante nos dicionários da língua
portuguesa exprime que tal se trata de parte da física dedicada ao estudo do comportamento
de circuitos elétricos que contenham válvulas, semicondutores, transdutores etc, ou à
fabricação de tais circuitos. Ao passo que o mesmo dicionário, definindo o termo Telemático,
explica que tal é a ciência que trata da manipulação e utilização da informação através do uso
99
combinado de computador e meios de telecomunicações.157
A etimologia do termo Telemático bem demonstra que sua adoção não é
equivocada, ao contrário, se apresenta mais correta, pois o Contrato ora estudado é fruto
exatamente da utilização conjugada entre a informática e os meios de telecomunicações.
Não só a etimologia do termo justifica o entendimento esposado neste estudo,
como também a própria forma de apresentação do Contrato. Seu suporte é virtual, consistente
em bites e bytes, pacotes de dados, informações binárias etc., o que justifica sua transmissão
de um ponto ao outro do mundo em questão de milésimos de segundos, dependendo da
velocidade da conexão.
Estivesse o documento acondicionado dentro de um Pen-Drive, CD-Rom, DVD,
Disco Rígido etc., ainda “preso” dentro de um objeto manufaturado sobre a base de um
circuito eletrônico, aí sim ele haveria de ser entendido como um Documento Eletrônico.
O Documento Telemático, por outro lado, pressupõe a interatividade existente
entre um computador, que processando um grupo de dados, representativos de planilhas,
gráficos, imagens, textos etc., interligado por meio da Internet, a um ou mais computadores,
onde estes últimos, recebendo aquele grupo de dados originário, até então intangível e etéreo,
o transformam em informação inteligível aos olhos do ser humano.
É possível, desta forma, asseverar que toda informação disponibilizada por meio
da rede mundial de computadores é um documento telemático. Seja ele para servir como
oferta de um produto na vitrine de uma loja telemática, uma notícia publicada num sítio ou
simplesmente como uma piada transmitida através do e-mail.
Vencidas essas ponderações e ante a leitura acima se vê que o Contrato, um dos
mais antigos institutos jurídicos, senão o mais antigo, ganhou nova roupagem e suas entranhas
restaram impregnadas de modernidade, de tecnologia, do que há de mais atual em sistemas de
informação, provando que o Direito é dinâmico e o Contrato perene.
A sociedade moderna, hoje vivendo a chamada Era da Informação, acabou
adaptando o Contrato a essa nova realidade, porém sem pacificidade no que pertine a sua
validade, natureza jurídica e aplicabilidade.
157
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário Aurélio Eletrônico – Século XXI. Lexikom
informática. São Paulo: Nova Fronteira, versão 3.0, 1999
100
As mudanças, diferentemente do passado, ocorreram muito rapidamente e os
Contratos Telemáticos, em muitos países, mesmo no Brasil, começaram a existir sem
contrapartida legislativa.
Nesse estudo, se verificou que a produção legislativa pátria especificamente sobre
o assunto está estagnada desde a criação do Comitê Executivo de Comércio Eletrônico, órgão
encarregado de regular o setor. Nada ou pouco se fez desde àquela época.
Tramitam pelo Congresso Nacional alguns projetos de lei, dentre os quais se
destaca o Projeto de Lei desenvolvido pela Comissão Especial de Informática Jurídica da
OAB-SP e o Projeto de Lei de nº 4.906/01 de lavra do então Senador Lúcio Alcântara.
Ainda sobre a base legislativa, no Brasil, passo que pode ser considerado
importante foi a instalação do ICP-Brasil - Infra-estrutura de Chaves Públicas Brasileiras,
criada para dar maior segurança aos Tratos Telemáticos e incentivar a utilização da Internet
como meio para a realização de negócios, através da regularização e certificação das
Assinaturas Digitais.
A maior parte dos países aqui pesquisados já lançou mão de legislação buscando
regular os Tratos Telemáticos. Todos, inclusive o Brasil como já dito, regularam ao menos, a
chamada Assinatura Digital, que pode ser considerada como um marco relevante para garantir
segurança nesses tipos de contratações.
A United Nations Comission in International Trade Law (Comissão das Nações
Unidas para o Direito Comercial Internacional), antevendo o desenvolvimento vertiginoso do
comércio telemático, por meio de um grupo de juristas e especialistas no assunto, criou, em
1996, a denominada Lei Modelo UNCITRAL, que como o próprio nome já denuncia, serve
como modelo para os demais países fazerem uso, seja enxertando parte dela nas leis do
próprio país ou se utilizando de todos os seus termos na criação de legislação específica.
Interessante pensar que as Contratações Telemáticas já irrompem barreiras
limítrofes com muita facilidade. Daqui há pouquíssimo tempo, transporão, igualmente,
barreiras culturais e até mesmo entraves legais, pois assim é viver num mundo globalizado.
Destarte, quando os dirigentes das nações sancionarem as leis produzidas em seus
países visando regular a mercancia telemática, seria de muito bom alvitre pensá-las de forma a
atingir tratos mundiais e não somente adstritos às suas fronteiras.
101
Sem medo de errar esse novo tipo de contratação representará, muito em breve,
fatia significativa do Mercado Mundial, onde celeumas transnacionais serão comuns. Deste
modo, não é insensato imaginar, inclusive um Tribunal Internacional Especializado no
assunto.
Por certo que os Contratos Telemáticos, como já dito, constituem uma nova
modalidade de acordo de vontades, porém apesar de representar novel figura no mundo
contratual, tal não lhes tira a imprescindibilidade de terem presentes todos os pressupostos de
validade exigidos nos Contratos Tradicionais.
Como não poderia deixar de ser, importante ainda afirmar que sendo o Contrato
um negócio jurídico, submete-se ao quanto disposto no Art. 104, do Código Civil, onde resta
preceituado que a validade do negócio jurídico requer agente capaz; objeto lícito, possível,
determinado ou determinável; e, forma prescrita ou não defesa em lei.
Numa rápida análise do quanto preceituado pelo Art. 107, do Código Civil, se
verifica a prevalência da ausência de solenidade para a celebração dos contratos em geral,
bastando o simples acordo de vontades. Por óbvio, tal ausência também se estende aos
Contratos Telemáticos.
Assunto que ganha maior dificuldade são os meios de prova nas Contratações
Telemáticas, uma vez que além de seu suporte não ser físico, a Constituição Federal em Art.
5º, inciso XII, traz a inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, salvo se
determinada por ordem judicial. A lei que regulamentou tal inciso foi a Lei nº 9.296, de 24 de
julho de 1996, que buscou limitar a quebra do sigilo das comunicações telefônicas para fins
de investigação criminal ou instrução processual penal.
Forçoso reconhecer que enquanto perdurou o silêncio do legislador, quebrado
somente em julho de 1996, como acima apontado, toda e qualquer violação do sigilo
telefônico era inteiramente inconstitucional, motivo pelo qual a prova obtida por tal meio, até
aquela data era ilícita, inadmissível, pois.
Trazendo tal circunstância para o mundo dos Contratos Telemáticos, lembrando
que eles se realizam pelo uso conjugado da informática e dos meios de telecomunicações, é
possível asseverar, com fundamento no quanto disposto no Art. 5º, inciso XII, da
Constituição, que os dados de um computador, para servirem como meio de prova de um fato,
102
especialmente se tratando de causas cíveis, são inacessíveis.
Neste ponto, portanto, de extrema relevância a manifestação do legislador pátrio,
para, especialmente, criar definições legais acerca do Documento, Contrato e Comércio
Telemáticos, para que efetivamente se distingam da Comunicação Telefônica insculpida no
inciso XII, do Art. 5º da Constituição Federal, pois esta é inviolável, inacessível, fato que
certamente frustrará a requisição de dados residentes no Disco Rígido de um computador à
servirem como meio de prova, numa eventual lide que envolva Tratos Telemáticos.
Derradeiramente insta asseverar que desde o início este estudo denuncia a
inexistência de legislação que regule o assunto no Brasil, portanto, o constante no parágrafo
anterior, salvo melhor juízo, é proposição suficiente à criação de lei específica.
Por certo que a legislação ora reclamada, não visa o nascimento de um novo
Microssistema Jurídico, como equivocadamente defendido na Introdução do presente
trabalho, mas tão somente norma que discipline os tratos usuais no Comércio Telemático,
como por exemplo, a matéria constante nos projetos de lei de autoria, respectivamente, da
OAB e do Senador Lúcio Alcântara, retro citados.
Como dito nas linhas acima, erroneamente foi defendido no início deste estudo
possível criação de legislação, onde inclusive sugestão de nominação fora feita (Código de
Comércio Telemático), fato que, como dito alhures, até poderia denunciar a intenção de ver
surgir no cenário nacional um novo Microssistema Legal, todavia, no decorrer da
investigação, restou patente a desnecessidade da lucubração apontada.
Dúvidas não restam que será bem vinda norma que vise aclarar alguns pontos
considerados obscuros no mercado telemático, mas, a bem da verdade, tanto o Código Civil,
como principalmente o Código de Defesa do Consumidor, estão preparados para atender os
conclames advindos seja por parte dos consumidores como também dos fornecedores que
optarem por tal tipo de contratação.
Numa breve epígrafe é possível asseverar que o Brasil possui legislação avançada
ao ponto de enfrentar com maestria os iminentes problemas advindos dos tratos telemáticos,
todavia, por outro lado, também será muito bem vinda legislação que sirva para regular a
identidade das partes, a integridade do conteúdo do contrato e a falta de assinatura de próprio
punho dos contratantes, aproveitando, para tanto, a não menos importante Infra-estrutura de
103
Chaves Públicas Brasileiras, já instituída pela Medida Provisória 2.200-2, de 24 de agosto de
2001.
104
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107
ANEXO
PROJETO DE LEI Nº 4.906, DE 2001
(PLS Nº 672, DE 1999) (APENSADOS OS PROJETOS DE LEI Nº 1.483, DE 1999 E Nº
1.589, DE 1999)
Dispõe sobre o comércio eletrônico.
Autor: SENADO FEDERAL
Relator: Deputado Júlio Semeghini
O Congresso Nacional decreta:
TÍTULO I
DISPOSIÇÕES PRELIMINARES
Art. 1º Esta lei dispõe sobre a validade jurídica e o valor probante do documento
eletrônico e da assinatura digital, regula a certificação digital, institui normas para as
transações de comércio eletrônico e estabelece sanções administrativas e penais aplicáveis.
Art. 2º Para os efeitos desta lei, considera-se:
I – documento eletrônico: a informação gerada, enviada, recebida, armazenada ou
comunicada por meios eletrônicos, ópticos, opto-eletrônicos ou similares;
II – assinatura digital: resultado de um processamento eletrônico de dados, baseado em
sistema criptográfico assimétrico, que permite comprovar a autoria e integridade de um
documento eletrônico cifrado pelo autor com o uso da chave privada;
III – criptografia assimétrica: modalidade de cifragem que utiliza um par de chaves
distintas e interdependentes, denominadas chaves pública e privada, de modo que a
mensagem codificada por uma das chaves só possa ser decodificada com o uso da outra chave
do mesmo par;
IV – entidade certificadora: pessoa jurídica que esteja apta a expedir certificado digital
e oferecer ou facilitar serviços de registro e datação da transmissão e da recepção de
documentos eletrônicos;
V – certificado digital: documento eletrônico expedido por entidade certificadora que
atesta a titularidade de uma chave pública;
VI – autoridade credenciadora: órgão responsável pelo credenciamento voluntário de
entidades certificadoras.
108
Parágrafo único. O Poder Público determinará a aplicação das disposições constantes
desta lei para a assinatura digital a outros processos que satisfaçam os requisitos operacionais
e de segurança daquela.
TÍTULO II
DO DOCUMENTO ELETRÔNICO E DA ASSINATURA DIGITAL
Capítulo I
Dos efeitos jurídicos do documento eletrônico e da assinatura digital
Art. 3º Não serão negados efeitos jurídicos, validade e eficácia ao documento
eletrônico, pelo simples fato de apresentar-se em forma eletrônica.
§ 1º Considera-se original o documento eletrônico digitalmente assinado por seu autor.
§ 2º Considera-se cópia o documento eletrônico resultante da digitalização de
documento físico, bem como a materialização de documento eletrônico original em forma
impressa, microfilmada ou registrada em outra mídia que permita a sua leitura em caráter
permanente.
Art. 4º As declarações constantes de documento eletrônico original presumem-se
verdadeiras em relação ao signatário, desde que a assinatura digital:
I – seja única e exclusiva para o documento assinado;
II – seja passível de verificação pública;
III – seja gerada com chave privada pertencente ao signatário e mantida sob o seu
exclusivo controle;
IV – esteja ligada ao documento eletrônico de tal modo que se o conteúdo deste se
alterar, a assinatura digital estará invalidada;
V – não tenha sido gerada posteriormente à expiração, revogação ou suspensão das
chaves.
Art. 5º A titularidade da chave pública poderá ser provada por todos os meios de
direito, vedada a prova exclusivamente testemunhal.
Parágrafo único. Não será negado valor probante ao documento eletrônico e sua
assinatura digital, pelo simples fato de esta não se basear em chaves certificadas por uma
entidade certificadora credenciada.
Art. 6º Presume-se verdadeira, entre os signatários, a data do documento eletrônico,
109
sendo lícito, porém, a qualquer deles, provar o contrário por todos os meios de direito.
§ 1º Após expirada ou revogada a chave de algum dos signatários, compete à parte a
quem o documento beneficiar a prova de que a assinatura foi gerada anteriormente à
expiração ou revogação.
§ 2º Entre os signatários, para os fins do parágrafo anterior, ou em relação a terceiros,
considerar-se-á datado o documento particular na data:
I - em que foi registrado;
II - da sua apresentação em repartição pública ou em juízo;
III - do ato ou fato que estabeleça, de modo certo, a anterioridade da formação do
documento e respectivas assinaturas.
Art. 7º Aplicam-se ao documento eletrônico as demais disposições legais relativas à
prova documental que não colidam com as normas deste Título.
Capítulo II
Da falsidade dos documentos eletrônicos
Art. 8º O juiz apreciará livremente a fé que deva merecer o documento eletrônico,
quando demonstrado ser possível alterá-lo sem invalidar a assinatura, gerar uma assinatura
eletrônica idêntica à do titular da chave privada, derivar a chave privada a partir da chave
pública, ou pairar razoável dúvida sobre a segurança do sistema criptográfico utilizado para
gerar a assinatura.
Art. 9º Havendo impugnação do documento eletrônico, incumbe o ônus da prova:
I - à parte que produziu o documento, quanto à autenticidade da chave pública e
quanto à segurança do sistema criptográfico utilizado;
II - à parte contrária à que produziu o documento, quando alegar apropriação e uso da
chave privada por terceiro, ou revogação ou suspensão das chaves.
TÍTULO III
DOS CERTIFICADOS DIGITAIS
Capítulo I
Dos certificados digitais e seus efeitos
Art. 10 Os certificados digitais produzirão, entre o ente certificante e a pessoa
110
certificada, os efeitos jurídicos definidos no contrato por eles firmado.
Parágrafo único. Em relação a terceiros, a certificação produz os efeitos que o ente
certificante declarar à praça, se mais benéficos a aqueles.
Art. 11 Para fazer prova em relação ao titular indicado no certificado, é necessário
que, no ato de sua expedição:
I - o requerente seja pessoalmente identificado pela entidade certificadora;
II - o requerente reconheça ser o titular da chave privada, identificada com elementos
suficientes para sua individualização;
III - sejam arquivados registros físicos comprobatórios dos fatos previstos nos incisos
anteriores, assinados pelo requerente, a serem exibidos em juízo, quando necessário.
Art. 12 Os certificados digitais deverão conter pelo menos as seguintes informações:
I – identificação e assinatura digital da entidade certificadora;
II – identificação da chave pública a que o certificado se refere e do seu titular, caso o
certificado não seja diretamente apensado àquela;
III – data de emissão e prazo de validade;
IV – nome do titular e poder de representação de quem solicitou a certificação, no caso
do titular ser pessoa jurídica;
V – data de nascimento do titular, se pessoa física;
VI – elementos que permitam identificar o sistema de criptografia utilizado.
§ 1º Na falta de informação sobre o prazo de validade do certificado, este será de dois
anos, contados da data de emissão.
§ 2º A regulamentação desta lei poderá determinar a inclusão de informações
adicionais no certificado digital, em respeito a requisitos específicos conforme a finalidade do
certificado.
Art. 13 São obrigações do titular do certificado digital:
I – fornecer as informações solicitadas pela entidade certificadora, observado o inciso
VII do Art. 18;
II – manter sigilo e controle da chave privada;
III – solicitar a revogação dos certificados nos casos de quebra de confidencialidade
ou comprometimento da segurança de sua chave privada.
§ 1º O titular do certificado digital será civilmente responsável pela falsidade das
111
informações fornecidas à entidade certificadora, sem prejuízo das sanções penais aplicáveis,
bem como pelo descumprimento das obrigações previstas no caput deste artigo.
§ 2º Exclui-se a responsabilidade do titular do certificado, decorrente do inciso II do
caput deste artigo, quando o uso da assinatura digital lhe for imposto ou os meios a ele
fornecidos para a criação das chaves não ofereçam garantias de auditabilidade e controle do
risco.
Capítulo II
Da suspensão e revogação de certificados digitais.
Art. 14 A entidade certificadora suspenderá temporariamente o certificado digital:
I – a pedido por escrito do titular, devidamente identificado para o evento, ou de seu
representante legal;
II – quando existam fundadas razões para crer que:
a. o certificado foi emitido com base em informações errôneas ou falsas;
b. as informações nele contidas deixaram de ser condizentes com a realidade; ou
c. a confidencialidade da chave privada foi violada.
Parágrafo único. A suspensão do certificado digital com fundamento no inciso II deste
artigo será sempre motivada e comunicada prontamente ao titular, bem como imediatamente
inscrita no registro do certificado.
Art. 15 A entidade certificadora deverá revogar um certificado digital:
I - a pedido por escrito do titular, devidamente identificado para o evento, ou de seu
representante legal;
II – quando expirado seu prazo de validade;
III – de ofício ou por determinação do Poder Judiciário, caso se verifique que o
certificado foi expedido com base em informações falsas;
IV – de ofício, se comprovadas as razões que fundamentaram a suspensão prevista no
inciso II do Art. 14;
V – tratando-se de entidade certificadora credenciada, por determinação da autoridade
credenciadora, na forma do inciso IX do Art. 24 desta lei;
VI – se a entidade certificadora vier a encerrar suas atividades sem que seja sucedida
por outra entidade nos termos do § 1º do Art. 20 desta lei;
VII – por falecimento ou interdição do signatário, se pessoa física, ou no caso de
falência ou dissolução de sociedade, se pessoa jurídica.
112
TÍTULO IV
DAS ENTIDADES CERTIFICADORAS
Capítulo I
Dos princípios gerais
Art. 16 A atividade de certificação digital será regida pelos seguintes princípios:
I - liberdade de contratação, observadas as normas de defesa do consumidor;
II - preservação da privacidade do usuário;
III - dispensa de autorização prévia;
IV - direito do usuário a ser adequadamente informado sobre o funcionamento dos
sistemas criptográficos utilizados e os procedimentos técnicos necessários para armazenar e
utilizar com segurança a chave privada;
V - vedação ao depósito de chaves privadas pela entidade certificadora.
Art. 17 Poderão ser entidades certificadoras as pessoas jurídicas de direito público ou
privado, constituídas sob as leis brasileiras e com sede e foro no País.
Parágrafo único. O funcionamento de entidade certificadora independe do
credenciamento previsto no Art. 21 desta lei, sendo obrigatória apenas a comunicação, ao
Poder Público, do início das atividades.
Capítulo II
Dos deveres e responsabilidades das entidades certificadoras
Art. 18 As entidades certificadoras deverão:
I – emitir certificados conforme o solicitado ou acordado com o signatário da
assinatura digital;
II – implementar sistemas de segurança adequados à criação, emissão e arquivamento
de certificados digitais;
III – implementar sistemas de proteção adequados para impedir o uso indevido da
informação fornecida pelo requerente de certificado digital;
113
IV – operar sistema de suspensão e revogação de certificados, procedendo à imediata
publicação nas hipóteses previstas nesta lei;
V – tornar disponível, em tempo real e mediante acesso eletrônico remoto, lista de
certificados emitidos, suspensos e revogados;
VI – manter quadro técnico qualificado;
VII - solicitar do requerente de certificado digital somente as informações necessárias
para sua identificação e emissão do certificado;
VIII – manter confidencialidade sobre todas as informações obtidas do titular que não
constem do certificado;
IX – exercer as atividades de emissão, suspensão e revogação de certificados dentro
dos limites do território brasileiro.
§ 1º Os dados pessoais não serão usados para outra finalidade que não a de
certificação, salvo se consentido expressamente pelo requerente, por cláusula em destaque,
que não esteja vinculada à realização da certificação.
§ 2º A quebra da confidencialidade das informações de que trata o inciso VIII do caput
deste artigo, quando determinada pelo Poder Judiciário, respeitará os mesmos procedimentos
previstos em lei para a quebra do sigilo bancário.
Art. 19 A entidade certificadora é responsável civilmente pelos danos sofridos pelo
titular do certificado e por terceiros, decorrentes da falsidade dos certificados por ela emitidos
ou do descumprimento das obrigações previstas no Art. 18.
Art. 20 O registro de certificado expedido por uma entidade certificadora deve ser por
ela conservado até o término do prazo exigido pela lei que regular o negócio jurídico
associado ao certificado, não inferior, em qualquer caso, a vinte anos.
§ 1º No caso de pretender cessar voluntariamente a sua atividade ou tiver a falência
decretada por sentença transitado em julgado, a entidade certificadora deverá:
I – comunicar a intenção à autoridade credenciadora com antecipação mínima de três
meses;
II – comunicar aos titulares dos certificados por ela emitidos, com antecedência de
trinta dias, a revogação dos certificados ou a sua transferência a outra entidade certificadora.
§ 2º No caso de revogação dos certificados mencionados no inciso II do § 1º, emitidos
por entidade certificadora credenciada, a guarda da respectiva documentação será de
responsabilidade da autoridade credenciadora.
Capítulo III
114
Do credenciamento voluntário
Art. 21 Poderão ser credenciadas pela autoridade competente, mediante requerimento,
as entidades certificadoras que preencham os seguintes requisitos, conforme a regulamentação
desta lei:
I - capacitação técnica para prestar os serviços de certificação, nos termos definidos
nesta lei;
II – recursos de segurança física e lógica compatíveis com a atividade de certificação;
III - capacidade patrimonial adequada à atividade de certificação, ou manutenção de
contrato de seguro suficiente para cobertura dos danos eventualmente causados;
IV - integridade e independência no exercício da atividade de certificação;
V – garantia da qualidade das informações transmitidas aos requerentes, quanto ao uso
e procedimentos de segurança dos sistemas utilizados.
Art. 22 Às entidades certificadoras credenciadas será atribuído um sinal gráfico,
atestando que atendem aos requisitos previstos no Art. 21.
Parágrafo único. O credenciamento permitirá à entidade certificadora utilizar, com
exclusividade, o sinal previsto no caput deste artigo, bem como a designação de "entidade
certificadora credenciada".
Art. 23 O credenciamento será revogado, sem prejuízo de outras sanções aplicáveis na
forma desta lei, nos casos em que:
I – for obtido por meio de declaração falsa ou expediente ilícito;
II – deixar de se verificar algum dos requisitos previstos no Art. 21;
III – deixar a entidade certificadora de exercer suas atividades por período superior a
doze meses;
IV – ocorrerem irregularidades insanáveis na administração, organização ou no
exercício das atividades da entidade certificadora;
V – forem praticados atos ilícitos ou que coloquem em perigo a confiança do público
na certificação.
§ 1º A revogação compete à autoridade credenciadora, em decisão fundamentada,
devendo a entidade certificadora ser notificada no prazo de sete dias úteis.
§ 2º A autoridade credenciadora dará ampla publicidade à decisão.
Capítulo IV
115
Da autoridade credenciadora
Art. 24 O Poder Público designará autoridade credenciadora, a quem caberá:
I – apreciar pedido de credenciamento apresentado por entidade certificadora;
II - solicitar emendas ao pedido ou informações complementares e proceder,
diretamente ou por terceiros, às averiguações e inspeções necessárias à apreciação do pedido;
III – estabelecer condições adicionais desde que necessárias para assegurar o
cumprimento das disposições legais e regulamentares aplicáveis ao exercício da atividade de
certificação;
IV – expedir declaração de credenciamento, estabelecendo o seu prazo de validade;
V – conduzir auditorias periódicas para verificar se as condições do credenciamento se
preservam, na forma da regulamentação;
VI – manter e divulgar relação de entidades certificadoras credenciadas;
VII – divulgar amplamente a suspensão ou revogação de credenciamento;
VIII – aplicar sanções administrativas nas hipóteses previstas nesta lei;
IX – determinar a suspensão temporária ou a revogação de certificado digital emitido
por entidade certificadora por ela credenciada quando constatada irregularidade.
TÍTULO V
DO COMÉRCIO ELETRÔNICO
Capítulo I
Da contratação no âmbito do comércio eletrônico
Art. 25 A oferta de bens, serviços e informações não está sujeita a qualquer tipo de
autorização prévia pelo simples fato de ser realizada por meio eletrônico.
Art. 26 Sem prejuízo das disposições do Código Civil, a manifestação de vontade das
partes contratantes, nos contratos celebrados por meio eletrônico, dar-se-á no momento em
que:
I – o destinatário da oferta enviar documento eletrônico manifestando, de forma
inequívoca, a sua aceitação das condições ofertadas; e
II – o ofertante transmitir resposta eletrônica transcrevendo as informações enviadas
pelo destinatário e confirmando seu recebimento.
116
§ 1º A proposta de contrato por meio eletrônico obriga o proponente quando enviada
por ele próprio ou por sistema de informação por ele programado para operar
automaticamente.
§ 2º A manifestação de vontade a que se refere o caput deste artigo será processada
mediante troca de documentos eletrônicos, observado o disposto nos arts. 27 a 29 desta lei.
Art. 27 O documento eletrônico considera-se enviado pelo remetente e recebido pelo
destinatário se for transmitido para o endereço eletrônico definido por acordo das partes e
neste for recebido.
Art. 28 A expedição do documento eletrônico equivale:
I – à remessa por via postal registrada, se assinado de acordo com os requisitos desta
lei, por meio que assegure sua efetiva recepção; e
II - à remessa por via postal registrada e com aviso de recebimento, se a recepção for
comprovada por mensagem de confirmação dirigida ao remetente e por este recebida.
Art. 29 Para os fins do comércio eletrônico, a fatura, a duplicata e demais documentos
comerciais, quando emitidos eletronicamente, obedecerão ao disposto na legislação comercial
vigente.
Capítulo II
Da proteção e defesa do consumidor no âmbito do comércio eletrônico
Art. 30 Aplicam-se ao comércio eletrônico as normas de defesa e proteção do
consumidor vigentes no País, naquilo que não conflitar com esta Lei.
Art. 31 A oferta de bens, serviços ou informações por meio eletrônico deve ser
realizada em ambiente seguro, devidamente certificado, e deve conter claras e inequívocas
informações sobre:
I – nome ou razão social do ofertante;
II – número de inscrição do ofertante no respectivo cadastro geral do Ministério da
Fazenda e, em se tratando de serviço sujeito a regime de profissão regulamentada, o número
de inscrição no órgão fiscalizador ou regulamentador;
III – domicílio ou sede do ofertante;
IV – identificação e sede do provedor de serviços de armazenamento de dados;
V – número de telefone e endereço eletrônico para contato com o ofertante;
VI – tratamento e armazenamento, pelo ofertante, do contrato ou das informações
fornecidas pelo destinatário da oferta;
117
VII – instruções para arquivamento do contrato eletrônico pelo aceitante, bem como
para sua recuperação em caso de necessidade; e
VIII – sistemas de segurança empregados na operação.
Art. 32 Para o cumprimento dos procedimentos e prazos previstos na legislação de
proteção e defesa do consumidor, os adquirentes de bens, serviços e informações por meio
eletrônico poderão se utilizar da mesma via de comunicação adotada na contratação para
efetivar notificações e intimações extra-judiciais.
§ 1º Para os fins do disposto no caput deste artigo, os ofertantes deverão, no próprio
espaço que serviu para o oferecimento de bens, serviços e informações, colocar à disposição
dos consumidores área específica, de fácil identificação, que permita o armazenamento das
notificações ou intimações, com a respectiva data de envio, para eventual comprovação.
§ 2º O ofertante deverá transmitir uma resposta automática aos pedidos, mensagens,
notificações e intimações que lhe forem enviados eletronicamente, comprovando o
recebimento.
Capítulo III
Da solicitação e uso das informações privadas
Art. 33 O ofertante somente poderá solicitar do consumidor informações de caráter
privado necessárias à efetivação do negócio oferecido, devendo mantê-las em sigilo, salvo se
prévia e expressamente autorizado pelo respectivo titular a divulgá-las ou cedê-las.
§ 1º A autorização de que trata o caput deste artigo constará em destaque, não
podendo estar vinculada à aceitação do negócio.
§ 2º Sem prejuízo de sanção penal, responde por perdas e danos o ofertante que
solicitar, divulgar ou ceder informações em violação ao disposto neste artigo.
Capítulo IV
Das obrigações e responsabilidades dos provedores
Art. 34 Os provedores de acesso que assegurem a troca de documentos eletrônicos não
podem tomar conhecimento de seu conteúdo, nem duplicá-los por qualquer meio ou ceder a
terceiros qualquer informação, ainda que resumida ou por extrato, sobre a existência ou sobre
o conteúdo desses documentos, salvo por indicação expressa do seu remetente.
§ 1º Igual sigilo recai sobre as informações que não se destinem ao conhecimento
público armazenadas no provedor de serviços de armazenamento de dados.
§ 2º Somente mediante ordem do Poder Judiciário poderá o provedor dar acesso às
118
informações acima referidas, sendo que as mesmas deverão ser mantidas, pelo respectivo
juízo, em segredo de justiça.
Art. 35 O provedor que forneça serviços de conexão ou de transmissão de
informações, ao ofertante ou ao adquirente, não será responsável pelo conteúdo das
informações transmitidas.
Art. 36 O provedor que forneça ao ofertante serviço de armazenamento de arquivos e
sistemas necessários para operacionalizar a oferta eletrônica de bens, serviços ou informações
não será responsável pelo seu conteúdo, salvo, em ação regressiva do ofertante, se:
I – deixou de atualizar as informações objeto da oferta, tendo o ofertante tomado as
medidas adequadas para efetivar as atualizações, conforme instruções do próprio provedor; ou
II – deixou de arquivar as informações ou, tendo-as arquivado, foram elas destruídas
ou modificadas, tendo o ofertante tomado as medidas adequadas para seu arquivamento,
segundo parâmetros estabelecidos pelo provedor.
Art. 37 O provedor que forneça serviços de conexão ou de transmissão de
informações, ao ofertante ou ao adquirente, não será obrigado a vigiar ou fiscalizar o
conteúdo das informações transmitidas.
Art. 38 Responde civilmente por perdas e danos, e penalmente por co-autoria do delito
praticado, o provedor de serviço de armazenamento de arquivos que, tendo conhecimento
inequívoco de que a oferta de bens, serviços ou informações constitui crime ou contravenção
penal, deixar de promover sua imediata suspensão ou interrupção de acesso por destinatários,
competindo-lhe notificar, eletronicamente ou não, o ofertante, da medida adotada.
TÍTULO VI
DAS SANÇÕES ADMINISTRATIVAS
Art. 39 As infrações às normas estabelecidas nos Títulos II, III e IV desta lei,
independente das sanções de natureza penal e reparação de danos que causarem, sujeitam a
entidade infratora à penalidade de multa de dez mil reais a um milhão de reais cominada, no
caso de entidade credenciada, à suspensão de credenciamento ou à sua revogação.
§ 1º As sanções estabelecidas neste artigo serão aplicadas pela autoridade
credenciadora, considerando-se a gravidade da infração, vantagem auferida, capacidade
econômica, e eventual reincidência.
§ 2º A pena de suspensão poderá ser imposta por medida cautelar antecedente ou
incidente de procedimento administrativo.
Título VII
DAS SANÇÕES PENAIS
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Art. 40 A quebra de sigilo das informações de que trata o inciso VIIII do Art. 18 e os
arts. 33 e 34 desta lei constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a
quatro anos.
Art. 41 Equipara-se ao crime de falsificação de papéis públicos, sujeitando-se às penas
do Art. 293 do Código Penal, a falsificação, com fabricação ou alteração, de certificado
digital de ente público.
Parágrafo único. Incorre na mesma pena de crime de falsificação de papéis públicos
quem utilizar certificado digital público falsificado.
Art. 42 Equipara-se ao crime de falsificação de documento público, sujeitando-se às
penas previstas no Art. 297 do Código Penal, a falsificação, no todo ou em parte, de
documento eletrônico público, ou a alteração de documento eletrônico público verdadeiro.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se
do cargo, aplica-se o disposto no § 1º do Art. 297 do Código Penal.
Art. 43 Equipara-se ao crime de falsidade de documento particular, sujeitando-se às
penas do Art. 298 do Código Penal, a falsificação, no todo ou em parte, de certificado ou
documento eletrônico particular, ou alteração de certificado ou documento eletrônico
particular verdadeiro.
Art. 44 Equipara-se ao crime de falsidade ideológica, sujeitando-se às penas do Art.
299 do Código Penal, a omissão, em documento ou certificado eletrônico público ou
particular, de declaração que dele devia constar, ou a inserção ou fazer com que se efetue
inserção, de declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar
direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante.
Parágrafo único. Se o agente é funcionário público, e comete o crime prevalecendo-se
do cargo, aplica-se o disposto no parágrafo único do Art. 299 do Código Penal.
Art. 45 Equipara-se ao crime de supressão de documento, sujeitando-se às penas do
Art. 305 do Código Penal, a destruição, supressão ou ocultação, em benefício próprio ou de
outrem, de documento eletrônico público ou particular verdadeiro, de que não se poderia
dispor.
Art. 46 Equipara-se ao crime de extravio, sonegação ou inutilização de documento,
sujeitando-se às penas previstas no Art. 314 do Código Penal, o extravio de qualquer
documento eletrônico, de que se tem a guarda em razão do cargo, ou sua sonegação ou
inutilização, total ou parcial.
Título VIII
DAS DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 47 As certificações estrangeiras de assinaturas digitais terão o mesmo valor
jurídico das expedidas no País, desde que a entidade certificadora esteja sediada e seja
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devidamente reconhecida em país signatário de acordos internacionais relativos ao
reconhecimento jurídico daqueles certificados, dos quais seja parte o Brasil.
Art. 48 Para a solução de litígios de matérias objeto desta lei poderá ser empregado
sistema de arbitragem, obedecidos os parâmetros da Lei n° 9.037, de 23 de setembro de 1996,
dispensada a obrigação decretada no § 2° de seu Art. 4°, devendo, entretanto, efetivar-se
destacadamente a contratação eletrônica da cláusula compromissória.
Título IX
DISPOSIÇÕES FINAIS
Art. 49 O Poder Executivo regulamentará a presente lei no prazo de noventa dias.
Art. 50 Esta lei entra em vigor em cento e vinte dias, contados da data de sua
publicação.
Sala da Comissão, em 8 de agosto de 2001.
Deputado JULIO SEMEGHINI
Relator
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