UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
ESCOLA DE EDUCAÇÃO FÍSICA E ESPORTE
O EXERCÍCIO FÍSICO NO TRATAMENTO DO DIABETES
MELLITUS GESTACIONAL
Ana Rosa Debastiani
SÃO PAULO
2007
O EXERCÍCIO FÍSICO NO TRATAMENTO DO DIABETES
MELLITUS GESTACIONAL
ANA ROSA DEBASTIANI
Monografia apresentada à Escola de
Educação
Física
e
Esporte
da
Universidade de São Paulo, como
requisito parcial para obtenção do
grau de Bacharel em Educação Física.
ORIENTADOR: PROF. DR. LUZIMAR RAIMUNDO TEIXEIRA
i
SUMÁRIO
1. Introdução ..................................................................................................................... 1
2. Revisão Bibliográfica ..................................................................................................... 3
2.1. Diabetes Mellitus Gestacional ...................................................................... 5
2.1.1.
Diagnóstico do DMG e controle glicêmico ......................................... 7
2.2. Exercício Físico no Controle do DMG......................................................... 15
2.2.1.
Benefícios do Exercício Físico ......................................................... 15
2.2.2.
Prescrição de um Programa de Exercícios ...................................... 20
2.2.3.
Contra-Indicações e Riscos do Exercício Físico .............................. 24
2.3.
Recuperação do DMG ............................................................................ 29
3. Discussão.................................................................................................................... 31
4. Considerações Finais .................................................................................................. 35
5. Referências Bibliográficas ........................................................................................... 36
ii
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 – Fatores de Risco para DMG ............................................................................ 8
Tabela 2 – Exercícios Recomendáveis, Aceitáveis e Não-Aceitáveis ............................. 22
Tabela 3 – Recomendações ACOG ................................................................................ 26
iii
RESUMO
O EXERCÍCIO FÍSICO NO TRATAMENTO DO DIABETES
MELLITUS GESTACIONAL
Orientador: PROF. DR. LUZIMAR RAIMUNDO TEIXEIRA
Autor: ANA ROSA DEBASTIANI
O presente trabalho visa compreender a inter-relação entre a prática de exercícios
físicos e o tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional (DMG), importante doença que
se manifesta principalmente em gestantes anteriormente sedentárias. Para tanto foi feita
uma revisão bibliografia de autores que estudam o assunto, incluindo livros, artigos
científicos, monografias, dissertações, teses e variados trabalhos acadêmicos. Embora
haja poucos estudos que tratem da prescrição de um programa de exercícios físicos
para gestantes com DMG e que especifiquem recomendações referentes à freqüência,
duração e intensidade dos exercícios, houve uma concordância unânime entre os
autores sobre os benefícios dos exercícios físicos, principalmente aeróbios, no que se
refere ao controle glicêmico das gestantes e diminuição de complicações diversas.
Exercícios de fortalecimento muscular, de resistência e de flexibilidade também se
mostraram importantes no programa a ser prescrito.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
1
1. Introdução
O presente trabalho traz uma revisão da literatura referente à terapêutica do
Diabetes Mellitus Gestacional através do exercício físico. É importante ressaltar que
esta revisão bibliográfica está intimamente inserida no contexto da Educação Física,
posto que cada vez mais gestantes com um quadro diabético procuram a prática de
atividades físicas com a orientação de profissionais da área como meio de manter uma
gestação o mais saudável possível, tanto no âmbito biológico quanto no social (sócioafetivo).
O
Diabetes
Mellitus
Gestacional
(DMG)
é
uma
doença
que
atinge
aproximadamente 5% das gestantes. Ele é caracterizado por um quadro de
hiperglicemia, hiperinsulinemia e resistência periférica à insulina, ocorrido pela primeira
vez durante a gestação, podendo causar diversas complicações tanto para a mãe
(gestante) quanto para o feto, como morte intra-uterina, morbidades perinatais e risco de
diabetes futuro na mãe e na criança.
O exercício físico visa ao aumento da captura e utilização da glicose pelas células
através do aumento da sensibilidade à insulina nos tecidos periféricos e através de
transportadores GLUT4, que se direcionam para a membrana plasmática com o
estímulo do exercício. Esses mecanismos de captura e utilização de glicose promovem
um melhor controle glicêmico e, portanto, auxiliam no controle e tratamento do DMG.
Entretanto, é importante ressaltar que apenas o exercício físico isoladamente não é
suficiente para atingir esse objetivo. A dieta mostra-se de extrema importância para um
controle glicêmico ideal, fatores afetivos também podem influenciar na adesão ou não
de alguma estratégia de controle da doença e, muitas vezes, a insulinoterapia se faz
necessária. Assim sendo, é importante a presença de uma equipe multidisciplinar,
constituída por médicos especialistas em diabetes, educadores físicos, obstetras,
nutricionistas, fisioterapeutas, psicólogos, entre outros, para que a gestante diabética
obtenha um acompanhamento pautado em diferentes perspectivas e a possibilidade de
diferentes intervenções.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
2
Contudo, tornar-se-ia impossível um estudo que abordasse detalhadamente todos
esses aspectos e alternativas terapêuticas. Portanto, este trabalho focar-se-á nos
aspectos biológicos, mais especificamente fisiológicos, acerca dos efeitos do exercício
físico no controle do DMG, abordando os tópicos principais que dizem respeito a essa
alternativa terapêutica. Tendo como objetivo identificar os efeitos do exercício no
controle do DMG, assim como os tipos, intensidade e freqüência de exercícios físicos
mais utilizados para esse fim, este trabalho se constituirá numa revisão bibliográfica dos
principais autores que tratam do assunto, prioritariamente na perspectiva da Educação
Física.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
3
2. Revisão Bibliográfica
No que se refere às adaptações fisiológicas, a gravidez é conhecida por acarretar
diversos ajustes, inclusive endócrinos, a fim de criar um ambiente ideal para o feto em
desenvolvimento (ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999). Os níveis de estrógenos
se elevam, estimulando o crescimento do útero e dos seios, e os níveis de progesterona
também sobem, ajudando no espessamento das paredes uterinas e na inibição da
contração da musculatura lisa (miométrio inclusive) (HANLON & YMCA dos EUA, 1999).
Outra adaptação presente no estado gravídico é o aumento da glicemia, com o
intuito de proporcionar mais combustível (energia) para o desenvolvimento fetal. Essa
hiperglicemia é mais pronunciada no último trimestre da gestação, quando a demanda
fetal por energia se torna maior (CONNOLLY, 1994). Como conseqüência à
hiperglicemia,
existe
um
aumento
das
concentrações
de
insulina
(hormônio
hipoglicemiante secretado pelas células β do pâncreas) no plasma, porém sua ação se
vê diminuída durante a gestação, através do estado de resistência periférica à insulina
instalado no organismo materno, para garantir um transporte maior de glicose para o
feto (ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999). Segundo Ryan, O’Sullivan e Skyler
(1985), o estado de resistência à insulina pode ser caracterizado por uma alteração na
sensibilidade à insulina, na responsividade à insulina, ou em ambos. De acordo com
Catalano (1993) apud Hicks (200), a sensibilidade periférica à insulina durante o terceiro
trimestre de gestação diminui 50% em relação ao primeiro trimestre e a liberação
hepática basal de glicose é 30% mais alta, apesar dos altos níveis de insulinemia.
Devido a esse quadro, a gravidez vem sendo identificada como um estado insulinoresistente e diabetogênico (CONNOLLY, 1994). Autores sugerem que a sensibilidade à
insulina durante a gravidez é um quinto da observada na mulher não-grávida (ARTAL,
DRINKWATER & WISWELL, 1999). Para Ryan, O’Sullivan e Skyler (1985), durante a
gestação normal há uma diminuição na responsividade “máxima” da insulina e em
mulheres com DMG essa resistência à insulina é ainda maior.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
4
As mudanças hormonais durante a gravidez levam ao incremento da produção e
liberação de insulina pelo pâncreas, numa tentativa de manter a concentração de
glicose materna abaixo do normal e garantir assim o aporte energético para o feto
(VOLPATO et al., 2005). Porém, em algumas mulheres, o pâncreas não é capaz de
sustentar essa demanda aumentada de insulina e então desenvolve-se o diabetes
gestacional (GATLING, HILL & KIRBY, 1998).
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
5
2.1. Diabetes Mellitus Gestacional
O DMG é um estado diabetogênico diagnosticado durante a gestação, que se
caracteriza por uma hiperglicemia materna (mesmo na presença de hiperinsulinemia),
intolerância à glicose e resistência periférica à insulina. Ou seja, mesmo uma alta
produção de insulina pancreática não é suficiente para manter a euglicemia materna
devido ao processo de resistência periférica à insulina.
O DMG atinge cerca de 2% a 5% das gestantes, embora um estudo de Mello e
Prada (2003) indique incidência de até 12%, geralmente no segundo ou terceiro
trimestre da gravidez (24 a 34 semanas). Essa doença resulta de fatores que aumentam
a síntese de glicose ou a resistência periférica à insulina, tais como degradação
placentária da insulina, aumento do nível sérico de ácidos graxos, elevação de
glicocorticóides no plasma, elevação de estrogênios e progestogênios e crescente
produção placentária de hormônio lactogênico (REY, 2003).
Segundo estudo com ratas Wistar virgens e prenhes (LETURQUE et al., 1986), a
resistência à insulina parece resultar de uma queda na sensibilidade do fígado e tecidos
periféricos à insulina. Estes autores mediram a utilização de glicose pelo tecido
muscular, adiposo e cerebral de ratas virgens e prenhes (fase final da gestação) em
condições basais e durante estado euglicêmico-hiperinsulinêmico (400µU/ml), sendo
que a utilização fetal e placentária de glicose também foi medida nas ratas prenhes.
Para atingir o estado euglicêmi-hiperinsulinemico, foi injetada insulina exógena numa
taxa constante de 0,4U/kg/h pela veia safena das ratas e o sangue foi monitorado a
cada 5 minutos, sendo praticada a infusão de glicose exógena para se manter a
euglicemia.
Como resultados, enquanto a utilização fetal de glicose foi alta sem depender do
estado hiperinsulinêmico materno, a utilização placentária foi aumentada em 30%
durante a hiperinsulinemia materna. Em estado basal, a utilização materna de glicose
não foi alterada pela gravidez nos tecidos musculares estudados, nem no tecido adiposo
e cerebral. Já em estado hiperinsulinêmico, a utilização de glicose no tecido muscular e
adiposo das ratas prenhes foi 30-70% mais baixa comparada às ratas virgens. A
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
6
sensibilidade à insulina de todos os tecidos testados (com exceção do cérebro, o qual
não foi afetado nem pela gravidez, nem pelo estado hiperinsulinêmico) foi 50% mais
baixa nas ratas prenhes que nas ratas virgens, o que confirma o estado de resistência
periférica à insulina durante período tardio da gestação, embora os mecanismos pelos
quais essa resistência ocorre ainda permaneçam incertos (LETURQUE et al., 1986).
É importante ressaltar que o DMG é muito distinto do Diabetes pré-gestacional, que
se divide entre Diabetes Tipo 1, em que a paciente/gestante não é capaz de produzir
insulina e necessita a aplicação de insulina exógena, e o Diabetes Tipo 2, em que a
paciente/gestante produz insulina, mas é resistente a sua ação. O Diabetes Tipo 2 é o
mais parecido com o DMG, porém é um estado permanente de resistência à insulina,
enquanto que a maioria das mulheres com DMG volta à normalidade após o parto.
Contudo, de 30 a 60% das mulheres que desenvolvem o DMG progridem para um
quadro de Diabetes Mellitus Tipo 2 (não insulino-dependente) em 5 a 10 anos após o
término da gestação (BRINKMAN III, LIEB & NUWAYHID, 1987).
Segundo Brinkman III, Lieb e Nuwayhid (1987), fatores que contribuem para a
intolerância à glicose, principalmente na fase final da gestação, são a produção
insuficiente de insulina, juntamente com o aumento endógeno dos hormônios
tireoidianos (T3 e T4), GH, cortisol, estrogênio, progesterona e lactogênio placentário
(hPL), a degradação placentária de insulina e os anticorpos contra a insulina. Para Hicks
(2000), o hPL tem um papel muito importante no aumento da intolerância à glicose,
devido aos seus efeitos lipolíticos e anti-insulínicos.
Na presença do DMG, os ácidos graxos livres, as cetonas, a glicose, o lactato e os
aminoácidos estão aumentados no sangue materno (cetoacidose diabética). Todos,
exceto os ácidos graxos livres, estão elevados também no feto, sendo que este reage
com hiperinsulinemia e transforma esses substratos em gorduras e proteínas,
resultando na macrossomia típica observada em gestações diabéticas (ARTAL,
DRINKWATER & WISWELL, 1999). Anomalias congênitas como regressão caudal,
defeitos no desenvolvimento do tubo neural e problemas cardíacos e renais afetam 7 a
10% dos filhos de mulheres diabéticas (BLOOMGARDEN, 2003). Outros riscos para o
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
7
feto são abortos espontâneos e morte perinatal (BRINKMAN III, LIEB & NUWAYHID,
1987).
Embora a glicose seja transportada do organismo materno para o feto através de
difusão facilitada pela placenta, a insulina materna não atravessa a barreira placentária
(ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999). A hiperglicemia fetal, como já foi dito, pode
levar à macrossomia, pois o excesso de glicose é captado pelas células dos tecidos
fetais através da ação da insulina e transformado em gordura. Este estado
hiperglicêmico também promove a hiperplasia das células β do pâncreas fetal, devido a
exigência aumentada de produção e secreção insulínica (BRINKMAN III, LIEB &
NUWAYHID, 1987), causando a sua maturação precoce (ARTAL, DRINKWATER &
WISWELL, 1999). Segundo Mumtaz (2000), os bebês de gestantes com DMG têm risco
elevado de mortalidade perinatal, macrossomia, icterícia, policitemia, hipocalcemia e
distocia de ombro. A hipoglicemia neonatal transitória é mais comum na presença de
DMG, atingindo 50% dos bebês macrossômicos e 5 a 15% dos bebês nascidos com
peso controlado, porém com mães que desenvolveram DMG. (LANDON, 1996 apud
Mumtaz, 2000).
O excesso de atividade também pode levar o pâncreas materno à falência e, assim,
à interrupção de produção e secreção de insulina. Neste caso, é necessária a
insulinoterapia, ou seja, a infusão de insulina exógena no organismo materno.
2.1.1. Diagnóstico do DMG e controle glicêmico
O DMG deve ser detectado e controlado o quanto antes possível, a fim de se evitar
complicações materno-fetais, como a morte fetal, algumas morbidades perinatais (a
exemplo da hipoglicemia neonatal), risco de diabetes futuro na mãe e na criança, risco
aumentado de pré-eclâmpsia, que é o desenvolvimento de hipertensão com edema e/ou
proteinúria devido à gestação, e polidrâmnio, que é o excesso de líquido aminiótico,
caracterizado por volume ≥ 2000ml, sendo que o normal é 1000ml na 38ª semana e
300ml no feto a termo. Na gravidez polidrâmnica, constata-se forte redução na
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
8
concentração de lipídios no líquido amniótico (5 vezes menor), o que mostra haver um
distúrbio metabólico e não simples acúmulo de água. Malformações do concepto, como
anencefalia, atresia do esôfago ou do duodeno, hidrocefalia e espinha bífida estão
muitas vezes relacionadas com esse distúrbio (REY, 2003). Segundo Mumtaz (2000), a
gestante com DMG ainda está sob um risco aumentado de desenvolver hipertensão e
hiperlipidemia.
Para Veciana et al. (1995), a obesidade, idade da mãe superior a 35 anos,
glicosúria, histórico de diabetes em parentes de primeiro grau, natimorte ou aborto
anteriores são considerados os principais fatores de risco para o DMG. Já para Reichelt,
Oppermann e Schmidt (2002), os fatores de risco para o DMG são: idade materna
superior a 25 anos, obesidade ou ganho excessivo de peso na gravidez atual, deposição
central excessiva de gordura corporal, história familiar de diabetes em parentes de 1º
grau, baixa estatura (≤ 1,50m), crescimento fetal excessivo, polidrâmnio, hipertensão ou
pré-eclâmpsia na gravidez atual e antecedentes obstétricos de morte fetal ou neonatal,
de macrossomia ou de diabetes gestacional.
Naylor et al. (1997) propõem uma classificação entre os grupos de risco para o
DMG. Na tabela a seguir, são apresentadas as variáveis utilizadas em seu estudo e a
classificação de cada uma delas de acordo com o risco que oferecem para o
desenvolvimento do DMG:
Tabela 1 – Fatores de Risco para DMG
Fator de Risco
Idade ≤ 30 anos
Idade entre 31 e 34 anos
Idade ≥ 35 anos
IMC ≤ 22,0
IMC entre 22,1 e 25,0
IMC ≥ 25,1
Raça Branca
Raça Negra
Raça Asiática
Outras raças
Pontuação
0
1
2
0
2
3
0
0
5
2
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
9
São classificadas como grupo de baixo risco as mulheres com scores igual a 0 ou 1.
As mulheres com scores de 2 ou 3 são classificadas como de médio risco e as com
scores iguais ou superiores a 4 são classificadas como de alto risco.
Tradicionalmente, todas as gestantes são submetidas a um teste de tolerância à
glicose entre a 24ª e 28ª semana de gestação. O teste normalmente utilizado para
diagnosticar o DMG é o GST (Glucose Screening Test) – 1h – 50g, o qual pode ser
aplicado a qualquer hora do dia, sendo que a gestante não precisa estar em jejum. O
teste consiste na administração de 50g de glicose em solução via oral e medição da
concentração de glicose plasmática após 1 hora. O valor limite de glicemia é de
140mg/dL, sendo que se a gestante atingir ou ultrapassor esse valor, pode ser
diagnosticado o DMG (HICKS, 2000). Naylor et al. (1997) propõem ajustes nos valores
de referência para este teste. Segundo estes autores, para gestantes de baixo risco
(scores entre 0 e 1) o GST – 1h – 50g não precisa ser aplicado, por existir uma
probabilidade muito pequena de diagnóstico do DMG. Para gestantes de médio risco
(scores entre 2 e 3), o valor limite de glicemia após 1 hora do início do teste deve ser
mantido em 140mg/dL e para gestantes de alto risco (scores acima de 3) este valor
deve ser ajustado para 128 a 130mg/dL.
Coustan et al. (1989) apud Hicks (2000) constatou que 10% das mulheres
diagnosticadas com DMG através de um outro teste, o GTT – 3h – 100g, obtiveram
resultado negativo no GST – 1h – 50g sem os ajustes propostos por Naylor et al.,
obtendo resultados entre 130 e 139mg/dL. Portanto, para gestantes que apresentam
esses resultados limítrofes, é necessário um re-teste com o GTS – 1h – 50g após uma
semana ou a aplicação do teste GTT – 3h – 100g.
O GTT possui um procedimento muito parecido com o do GST, porém são
administradas 100g de glicose em solução via oral e a glicemia da gestante é medida
após 1, 2 e 3 horas. A gestante deve estar em jejum de 8 a 14 horas para se submeter a
esse teste e a glicemia limite para o jejum é de 95mg/dL. Os valores limites para 1, 2 e 3
horas são, respectivamente, 180mg/dL, 155mg/dL e 140mg/dL. O DMG é diagnosticado
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
10
se a gestante atingir ou ultrapassar pelo menos dois dos valores limites do teste
glicêmico (HICKS, 2000).
Segundo Reichelt, Oppermann e Schmidt (2002), a 2ª Reunião do Grupo de
Trabalho em Diabetes e Gravidez recomenda um rastreamento universal para o DMG
através da medição da glicemia de jejum, independente da presença de fatores de risco.
Se executado antes da 20ª semana de gestação, esse teste pode indicar uma diabetes
pré-gestacional, caso o resultado seja positivo (glicemia ≥ 85 ou 90mg/dL), ou a
necessidade de repetição do teste após a 20ª semana de gestação, caso o resultado
seja negativo.
No caso de rastreamento positivo, ou seja, resultado positivo no teste de glicemia
de jejum após a 20ª semana de gestação, é necessária a aplicação de um teste
diagnóstico, o qual pode ser uma repetição do teste de jejum (se o valor obtido no
primeiro teste de jejum for superior a 110mg/dL) ou o teste padronizado de 75g de
glicose em 2 horas (se o valor obtido no primeiro teste de jejum for inferior a 110mg/dL).
Para o teste de 75g – 2h, os valores limites são 110mg/dL em jejum e 140mg/dL após 2
horas. (REICHELT, OPPERMANN & SCHMIDT, 2002)
Diagnosticado o DMG, a gestante deve se submeter diariamente à medição da
glicemia (por meio do uso de um glicosímetro) antes do café da manhã (jejum) e 2 horas
após esta refeição. Os valores máximos aceitáveis para a medição da glicemia em jejum
é de 95mg/dL ou 105mg/dL. Para a medição 2 horas após o café da manhã, o valor
máximo aceitável é de 120mg/dL (Hicks, 2000). Segundo Langer et al. (1991) apud
Hicks (2000), essa pequena faixa entre os valores máximos de glicemia de jejum (95 a
105mg/dL) pode acarretar diferenças drásticas. Esses autores encontraram que a
incidência de bebês grandes para a idade gestacional (LGA – Large for Gestational Age)
é de 28% a 29% em mulheres com glicemia de jejum aceitável até 105mg/dL, enquanto
que a incidência de bebês LGA em mulheres com glicemia de jejum aceitável até
95mg/dL é de apenas 5%. Frente a esses dados, pode-se dizer que para um controle
glicêmico ideal, deve-se manter como parâmetro para glicemia de jejum o valor de
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
11
95mg/dL, afim de diminuir a probabilidade de bebês grandes para a idade gestacional
em gestantes com DMG.
O monitoramento e controle glicêmico é muito importante para o desenvolvimento
de uma gestação saudável. Segundo a American Diabetes Association (2004), valores
glicêmicos acima de 105mg/dL em jejum também podem estar associados com o
aumento do risco de morte intra-uterina.
Veciana et al. (1995) comparou o efeito do controle glicêmico através de
monitoramento pré e pós-prandial. O monitoramento glicêmico pré-prandial se constituía
na medição da glicemia em jejum, antes das refeições e à noite, próximo à hora da
gestante ir dormir. No monitoramento pós-prandial, eram medidas a glicemia de jejum
(antes do café da manhã) e uma hora após cada refeição do dia. Todas as gestantes
estavam submetidas à insulinoterapia e tinham sua dieta controlada, sem a presença de
exercícios físicos. O monitoramento da glicemia orientava os ajustes nas doses de
insulina a fim de manter a glicemia ideal para cada caso.
Esses autores encontraram diferenças significativas entre os dois grupos de
gestantes (grupo pré e grupo pós-prandial). Os bebês das gestantes do grupo pósprandial nasceram com menor peso e houve menos casos de bebês grandes para a
idade gestacional e macrossômicos. Neste grupo também houve menor ocorrência de
parto por cesárea e hipoglicemia neonatal, além de menor incidência de distocia de
ombro
(luxação
do
ombro
por
tração
na
hora
do
parto, devido a macrossomicidade do bebê e/ou demora no parto, ocasionando lesão no
plexo braquial) nos bebês nascidos por parto natural.
Além do monitoramento glicêmico e dieta, existe mais uma opção para controle da
glicemia materna. Quando a dieta apenas não é mais suficiente para um bom controle
glicêmico, passa-se a utilizar insulinoterapia como estratégia para se manter a
euglicemmia.
Levando-se em consideração os resultados do estudo de Veciana et al. (1995),
pode-se dizer que o monitoramento glicêmico pós-prandial (1 hora após cada refeição),
em combinação com o monitoramento da glicemia de jejum, é mais efetivo para
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
12
determinar a dosagem insulínica de gestantes sob insulinoterapia e assim promover um
melhor controle glicêmico. Uma questão ainda a ser esclarecida é se esse
monitoramento também pode ser aplicado a gestantes que controlam a glicemia através
da atividade física e não por insulinoterapia. Em caso afirmativo, devem-se confirmar os
valores limítrofes para o monitoramento glicêmico e quais as intervenções referentes à
atividade física (tipo, volume, intensidade e freqüência) que devem ser praticadas para
atingir os valores glicêmicos ideais. Para tal, são necessários mais estudos na área de
atividade física, gestação e DMG.
Sem entrar no mérito da atividade física, Crowther et al. (2005) comparou a
incidência de morbidades perinatais (morte, distocia de ombro, fratura e paralisia
nervosa) em filhos de mulheres que tratavam seu DMG com dieta, insulinoterapia e
monitoramento glicêmico (grupo intervenção) e aquelas que possuíam os cuidados
médicos rotineiros de gestantes normais (grupo controle). Como resultado, teve-se que
taxa de morbidades perinatais foi significantemente menor no grupo intervenção (1%)
comparado com o grupo controle (4%). A indução de parto foi maior no grupo
intervenção, embora a incidência de cesárea tenha sido similar nos dois grupos.
Conseqüentemente, os filhos de mulheres do grupo intervenção apresentaram menor
peso ao nascer e menor idade gestacional. A incidência de bebês grandes para a idade
gestacional (LGA) e de macrossomia foi significantemente menor no grupo intervenção
e menos gestantes desse grupo receberam o diagnóstico de pré-eclampsia durante o
período pré-natal comparado com o grupo controle. Também não ocorreu morte
perinatal no grupo intervenção, enquanto que houve três abortos e duas mortes
perinatais no grupo controle. Não houve diferença na incidência de distocia de ombro
entre o grupo intervenção e o grupo controle e nenhum dos bebês do grupo intervenção
sofreu fratura ou paralisia nervosa.
Além desses resultados, menos mulheres no grupo intervenção apresentaram um
score sugestivo de depressão através de questionários aplicados três meses após o
parto, embora o nível de ansiedade tenha sido similar nos dois grupos. Em resumo, este
estudo reafirma a necessidade do controle dietético, insulinoterapia e do monitoramento
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
13
glicêmico em mulheres com DMG, confirmando-se que o tratamento dessa doença
reduz a incidência de morbidades perinatais sérias e também melhora a qualidade de
vida materna no que diz respeito à sua saúde.
Mais uma alternativa para manter o controle glicêmico é o uso de hipoglicemiantes
(ou anti-hiperglicemiantes) orais. Essas drogas são mais baratas e de mais fácil
administração que a insulina, porém seu uso durante a gestação ainda é polêmico
devido à preocupação com possíveis anomalias congênitas, causadas pelo transpasse
dessas substâncias através da placenta, interferindo no metabolismo fetal.
Langer et al. (2000) afirma que já foi documentada a capacidade da primeirageração de sulfoniluréias (anti-hiperglicemiantes usados por gestantes diabéticas) de
transpassar a placenta causando hipoglicemia fetal. Como alternativa, administrava-se
metformina em seu lugar, porém esta não era tão eficiente em controlar a hiperglicemia
materna. Frente a esses dados, procurou-se mais uma opção, a qual seria o uso de
segunda-geração de sulfoniluréias, que também não transpassam a barreira placentária.
Em estudo de Langer et al. (2000) comparou-se o uso de insulina e de um
hipoglicemiante de segunda-geração de sulfoniluréia (glyburide). Como resultados, não
se observaram diferenças na incidência de bebês grandes para a idade gestacional,
macrossômicos, com complicações pulmonares, hipoglicemia ou anomalias fetais.
Corrêa & Gomes (2004) não encontraram nenhuma complicação relacionada ao
uso de antidiabetogênicos orais durante a gestação, porém afirmam a necessidade de
mais estudos que confirmem seus resultados. Os antidiabetogênicos em uso neste
estudo eram sulfoniluréias e/ou metformina e os autores não encontraram diferença
para o controle glicêmico entre essas drogas e a insulina. Referente às complicações
secundárias, os autores observaram a ocorrência de hipoglicemia, icterícia e policitemia
(aumento do número de hemácias no sangue circulante, com conseqüente aumento do
volume globular e viscosidade sangüínea) em proporções semelhantes àquelas
encontradas com o uso de insulina. Não houve ocorrência de hipoglicemia ou préeclâmpsia nas gestantes em uso da metformina, porém todos os filhos destas gestantes
foram macrossômicos.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
14
Silva et al. (2005) comparou a eficácia da glibenclamida e da arcabose com a
insulina no tratamento do DMG. A glibenclamida, sengundo observado em ensaio clínico
com mais de 400 gestantes com DMG, é um anti-hiperglicemiante que não cruza a
barreira placentária, não altera os níveis de insulina fetal e não está associada ao
aumento da mortalidade perinatal, apresentando resultados perinatais próximos aos da
insulina. A arcabose atrasa a digestão e distribuição dos carboidratos ingeridos,
resultando numa elevação menos acentuada da glicemia pós-prandial. No estudo de
Silva et al. (2005), o grupo controle utilizou insulina humana para manter o controle
gilcêmico,
enquanto
um
primeiro
grupo
experimental
utilizou
glibenclamida
(ambulatorialmente) e um segundo grupo utilizou arcabose antes das principais
refeições. Como resultado, observou-se a incidência de fetos grandes para idade
gestacional igual a 5,5%, 31,5% e 11,1% nos grupos tratados com insulina,
glibenclamida e arcabose, respectivamente. Houve macrossomia apenas no grupo
glibenclamida, no qual a incidência de hipoglicemia neonatal foi de 21% (quatro casos).
Nenhum óbito perinatal ou caso de tocotraumatismo foi observado em quaisquer dos
grupos. Houve necessidade de mudança da terapêutica para insulinoterapia em sete
pacientes que utilizaram arcabose (38,8%) e em três que utilizaram glibenclamida
(15,7%), o que demonstra uma menor efetividade da arcabose comparada à
glibenclamida para o controle glicêmico. Através deste estudo, observou-se que a
arcabose e a glibenclamida representam alternativas promissoras para a terapêutica do
DMG, embora sua eficiência ainda seja menor que a da insulina.
Frente a isso, coloca-se em questão se o exercício físico seria uma alternativa
viável para controlar a glicemia materna, podendo assim reduzir, ou até eliminar a
necessidade de insulinoterapia ou de hipoglicemiantes orais.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
15
2.2. Exercício Físico no Controle do DMG
Ao longo da história, acreditou-se que o exercício físico em nada auxiliaria na
saúde e bem estar da gestante. Pelo contrário, o exercício era tido como um fator de
risco, por expor a gestante a condições adversas como hipertermia e redirecionamento
do fluxo sangüíneo para a periferia do corpo, diminuindo o aporte de oxigênio para o feto
e aumentando as chances de complicações na gestação e aborto.
Hoje, porém, sabe-se que o exercício físico bem estruturado e orientado é de
extremo benefício para a gestação. Deve-se lembrar, primeiramente, que existem
diferentes razões que levam as gestantes a procurarem um programa de exercício físico,
entre elas a necessidade de companhia, a formação de novos laços sociais, a
participação de grupos sociais com mesmos interesses que os seus (outras gestantes) e
o alívio do estresse mental/emocional causado pela gestação (HARTMANN & BUNG,
1999).
2.2.1. Benefícios do Exercício Físico
Segundo revisão bibliográfica de Batista et al. (2003), o exercício físico durante a
gestação tem sido considerado benéfico por prevenir e reduzir lombalgias, fortalecer a
musculatura pélvica, diminuir a taxa de nascimentos por cesárea, melhorar a
flexibilidade e tolerância à dor (inclusive a dor do parto), além de elevar a auto-estima da
gestante.
Alguns dos benefícios adquiridos pelo exercício físico durante a gestação são
citados por Hartmann e Bung (1999): melhora no bem estar psicológico (aumento da
auto-confiança, satisfação, etc), manutenção do condicionamento físico, redução do
estresse cardio-vascular, prevenção do ganho de peso exagerado, prevenção de
tromboses e varizes, prevenção de dores nas costas e recuperação pós-parto mais
rápida. Segundo esses e outros autores, exercícios físicos dentro da água parecem ser
os mais indicados para gestantes devido à pressão hidrostática que favorece a
passagem do fluido extravascular para o espaço intravascular, aumentando a diurese e
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
16
a natriurese. Batista et al. (2003) também concluíram em seu estudo de revisão
bibliográfica que os exercícios em meio aquático são os mais indicados para as
gestantes.
Executados num nível de baixa intensidade, esses exercícios reduzem a retenção
de líquidos, diminuindo os edemas característicos da gestação. A água, numa
temperatura entre 28 e 30°C, funciona como um termo rregulador, prevenindo contra o
aumento exagerado da temperatura intra-uterina. Nos exercícios aquáticos, a freqüência
cardíaca, a pressão arterial e a capacidade vital da gestante é menor comparado com
exercícios em terra. Essas adaptações ocorrem principalmente nas atividades em que a
gestante está imersa até a altura do peito. Na natação, a gestante está com uma porção
menor do seu corpo em imersão, sendo menos afetada pelas forças hidrostáticas da
água. Contudo a natação é um exercício executado em posição horizontal, o que pode
provocar redistribuição de volume central moderada. Além da melhor termorregulação
oferecida pela água, o principal substrato energético utilizado pela gestante nas
atividades em meio aquático é a glicose, o que auxilia na diminuição da hiperglicemia
materna (HARTMANN & BUNG, 1999; ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999).
“A aeróbica na água é uma forma segura e benéfica de exercício na gravidez”
(ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999).
Segundo Mello e Prada (2003) o exercício físico, principalmente aeróbio, vem
sendo utilizado tanto para o tratamento quanto para a prevenção do DMG, pois aumenta
a tolerância à glicose e diminui a ascensão de insulina plasmática após a ingestão de
glicose. Juntamente com uma dieta apropriada, o exercício pode servir como uma
eficiente manobra terapêutica, posto que aumenta o metabolismo de carboidratos e a
sensibilidade à insulina, ajudando a manter a normoglicemia (ARTAL, 1996;
HARTMANN & BUNG, 1999).
Para Metzger & Coustan (1998) apud Hicks (2000), a gestante deve praticar
atividade física no mínimo em 3 sessões por semana, sendo a duração de pelo menos
15 minutos por sessão, com o intuito de manter um controle glicêmico favorável.
Segundo Hicks (2000), o controle glicêmico ideal (<120mg/dL 2 horas após refeição e
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
17
<95 ou 105mg/dL em jejum) é normalmente atingido nas primeiras duas semanas de
adesão a um programa de exercício físico juntamente com controle dietético. Hartmann
e Bung (1999) ainda afirmam que os exercícios aeróbios de intensidade leve à
moderada são as melhores opções para a gestante com DMG e que sessões de
treinamento continuas são melhores que as intermitentes.
Dye et al. (1997) encontraram, em seu estudo, que o exercício físico para
gestantes obesas mórbidas está relacionado com uma menor prevalência de DMG.
Mulheres com IMC≤33 não apresentaram diferenças significativas entre o grupo que se
exercitou e o grupo que não se exercitou. Entre as gestantes com IMC>33, a
porcentagem de presença de DMG foi de 10,1% nas que não se exercitaram e 5,7% nas
que se exercitaram, independente do número de sessões de atividades física ao longo
da semana.
Porém este estudo (DYE et al., 1997) considerou “exercício” qualquer tipo de
atividade física além das atividades diárias das gestantes, com duração mínima de 30
minutos. Esse “exercício” era reportado pela própria gestante e não importava, para a
pesquisa, qual o tipo de atividade praticada (aeróbica, resistência muscular, força
muscular, etc). Isso dificulta conclusões sobre qual tipo de exercício realmente oferece
benefício para gestantes com DMG ou previne o aparecimento desta doença, seja em
gestantes obesas ou não obesas.
Segundo Maganha et al. (2003), um estudo verificou que há melhora no controle
glicêmico após 3 semanas de dieta controlada na presença de um programa de
exercício físico com 3 sessões semanais de 20 minutos de duração. Autores citados
ainda por Maganha et al. (2003) afirmam que os parâmetros mais importantes a serem
avaliados durante o exercício, visando o bem-estar materno-fetal, são a freqüência
cardíaca materna, a pressão arterial materna, a temperatura e a dinâmica uterina
materna e a freqüência cardíaca fetal. Lokey et al. (1991 apud Mumtaz, 2000) afirma
que gestantes podem ser exercitar 3 vezes por semana, 40 minutos por sessão, sem
oferecer riscos para si mesma e para o feto.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
18
O exercício visa diminuir a intolerância à glicose através do condicionamento
cardiovascular (o qual gera o aumento da afinidade da insulina por seu receptor nos
tecidos), do aumento dos transportadores de glicose sensíveis à insulina no músculo, do
aumento do fluxo sangüíneo para tecidos sensíveis à insulina e da redução dos níveis
de ácidos graxos livres (MAGANHA et al, 2003). Segundo Martins (2000), o exercício
aumenta a sensibilidade à insulina em até 40%, porém esse efeito parece ser agudo e
perdido em 2 a 3 dias por inatividade física (ressalta-se que esses dados são referentes
a pessoas diabéticas e não gestantes). Ainda segundo esta autora, em diabéticos não
dependentes de insulina, o exercício moderado pode melhorar a hemoglobina glicosada
e a secreção de insulina sem que seja necessária a manutenção da massa corporal.
Hartmann e Bung (1999), baseados em um estudo de Bung (1991), concordam que
exercícios que envolvem grandes grupos musculares permitem uma melhor utilização
de glicose por aumentar a sensibilidade dos tecidos à insulina.
O músculo em exercício também utiliza glicose independentemente da insulina,
com o transporte direto através do transportador GLUT4, que, estimulado pelo exercício,
migra do citossol para a membrana plasmática para captar a glicose circulante.
Atualmente não são bem conhecidos os mecanismos envolvidos no aumento da
absorção de glicose pelo músculo ativo (durante o exercício), embora algumas
hipóteses têm sido propostas, como o aumento da perfusão do leito vascular, o aumento
do número de receptores com os quais a insulina interage, a atividade de outros fatores
humorais que não a insulina e o aumento da permeabilidade das membranas para com
a glicose (MARTINS, 2000).
Segundo Artal (1996), embora não tenham sido feitos estudos em gestantes sobre
o processo de transporte de glicose em células insulino-sensitivas, devido ao fato de o
DMG ser uma doença que envolve um estado de sensibilidade à insulina alterado, a
atividade física parece ser uma terapia logicamente eficiente, pois a contração muscular
estimula o transporte de glicose através de GLUT4 para dentro das células.
Jaconis (1999) e Hartmann e Bung (1999) alertam para a importância do
fortalecimento dos músculos abdominais e dorsais, com o intuito de, respectivamente,
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
19
facilitar a expulsão do feto e evitar dores lombares na gestante. Estes exercícios são
indicados para gestantes com ou sem o DMG. Com o fortalecimento da musculatura
abdominal e facilitação da expulsão do feto, o parto se torna mais rápido e menos
doloroso. Jaconis (2005) também recomenda a execução de exercícios respiratórios
para fortalecer o vínculo materno-fetal e facilitar o parto.
Em resumo, os principais benefícios orgânicos do exercício físico para as
gestantes, tanto as com DMG quanto as não diabéticas, são o aumento da captação de
glicose pelo músculo (GLUT4) e aumento da sensibilidade à insulina no tecido muscular
e adiposo; a redução do LDL colesterol e triglicérides no sangue, aumentando os níveis
de HDL, ou seja, diminuição do risco de aterosclerose; o aumento da força muscular e
conseqüente redução nas dores lombares muito comuns nas gestantes devido à lordose
ocasionada pela mudança no centro de gravidade com o crescimento do útero; a
melhora na tolerância à glicose; a diminuição da resistência periférica à insulina; a
diminuição da concentração de glicose no sangue durante e após o exercício; a melhora
no condicionamento cardiovascular através de exercícios aeróbios; e o maior controle
do peso corporal, prevenindo contra o ganho de peso exagerado (MARTINS, 2000;
DAVIDSON, 1998; HARTMANN & BUNG, 1999).
No âmbito sócio-afetivo, ou seja, no que diz respeito ao estado emocional da
gestante, pode-se dizer que os principais benefícios promovidos pelo exercício físico
são a melhora na disposição geral e sensação de bem-estar, a melhora na auto-imagem
e auto-confiança, a melhora no controle do estresse e a diminuição da depressão que
atinge grande parte das gestantes, principalmente no pós-parto (MARTINS, 2000;
DAVIDSON, 1998; HARTMANN & BUNG, 1999). Ainda para Hartmann e Bung (1999) o
exercício físico proporciona uma sensação de bem-estar, agilidade e capacidade física,
o que é importante não só no parto, mas também para preparar a gestante para a
função materna.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
20
2.2.2. Prescrição de um Programa de Exercícios
É importante lembrar que a escolha do programa de exercícios físicos deve levar
em consideração o interesse e idade da gestante, além de seu estado de saúde e
condicionamento físico. Deve-se ter especial atenção com as contra-indicações para a
execução de atividades físicas, por exemplo, doença cardíaca, pouco controle glicêmico,
retinopatia proliferativa, hipertensão não tratada e hipoglicemia (DAVIDSON, 1998).
Para uma eficiente prescrição de programa de exercícios físicos, é importante que o
profissional de Educação Física tenha bem claro o tipo, intensidade, duração e
freqüência do exercício que melhor se aplica ao caso da gestante com a qual trabalha.
Tipo
Segundo as recomendações do ACOG, é importante trabalhar tanto a capacidade
aeróbia quanto a resistência e flexibilidade muscular com todas as gestantes. Porém
existe uma grande diferença na escolha do programa de exercício para gestantes
anteriormente ativas ou sedentárias.
Muitos autores concordam que as mulheres que já se exercitavam anteriormente à
gestação deveriam continuar seu programa de exercício físico da maneira mais
confortável possível, mesmo que seja necessária uma diminuição na intensidade,
duração e/ou freqüência da atividade. Essas adaptações devem ser iniciadas
imediatamente no caso da gestante sentir náuseas, insônia e mal-estar geral
(HARTMANN & BUNG, 1999). Para Reichelt, Oppermann e Schmidt (2002), a atividade
física deve fazer parte da estratégia de tratamento do DMG, sendo que gestantes
anteriormente ativas devem manter suas atividades, evitando exercícios de alto impacto
ou que predisponham à perda de equilíbrio.
Mulheres anteriormente sedentárias, que é o caso da maioria das gestantes com
DMG, também podem se exercitar, porém em intensidades mais leves que as
anteriormente ativas. Gestantes anteriormente sedentárias estão sob maior risco de
sofrer lesões no tecido muscular e outros tecidos (ARTAL, 1990), portanto o profissional
de Educação Física que acompanhará esta gestante deve tomar as precauções
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
21
necessárias para que essas lesões não aconteçam, mantendo o exercício numa
intensidade ideal para a gestante com a qual trabalha. Reichelt, Oppermann e Schmidt
(2002) e Harris (2005) sugerem a caminhada como uma boa opção para controlar o
ganho de peso ocasionado pela gestação, a glicemia e os níveis de colesterol. Outras
atividades de leve intensidade e baixo impacto, que não ofereçam risco de queda,
hipertermia e demais contra-indicações também podem ser praticadas. Hartmann e
Bung (1999) também apóiam o início de um programa de exercícios para gestantes
anteriormente sedentárias.
O profissional de Educação Física que irá orientar a gestante durante seu
programa de exercícios deve atentar para a necessidade de uma boa hidratação e da
execução das atividades em ambientes não muito quentes, para que não haja o risco de
hipertermia, a qual pode ser extremamente prejudicial tanto para a mãe quanto para o
feto. A desidratação causada pelo exercício em ambiente quente pode ser um fator para
a precipitação de trabalho de parto. Uma opção seria os exercícios em meio aquático,
como já citado neste trabalho, a fim de manter um melhor controle térmico. Outra seria a
prática de atividades físicas em períodos matutinos, quando o clima é mais ameno,
utilizando roupas adequadas que permitam livre evaporação do suor e ingerindo água
antes, durante e após os exercícios (ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999). Um
sintoma a ser observado para identificar situação de hipertermia é o aumento da
freqüência cardíaca fetal. A temperatura do feto, em condições normais, é 0,5°C mais
alta que a da mãe, o que facilita a dissipação do calor metabólico fetal para o sistema
circulatório materno. Quando a temperatura materna sobe durante o exercício, o
gradiente térmico pode ser revertido dificultando a dissipação de calor pelo feto. Como
conseqüência, a circulação umbilical se eleva e essa demanda circulatória aumentada
leva à taquicardia fetal, um sintoma de sofrimento do feto (ARTAL, DRINKWATER &
WISWELL, 1999).
Embora haja pouca informação sobre programas de fortalecimento muscular
durante a gravidez, exercícios incluindo levantamento de pesos relativamente leves,
com múltiplas repetições, parecem ser seguros e eficazes para gestantes. Porém,
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
22
exercícios com contração isométrica, com cargas elevadas ou que favoreçam o
aumento da pressão arterial não são recomendados e podem oferecer sérios riscos. Já
o trabalho de flexibilidade necessita ser bastante individualizado, levando-se em
consideração o aumento da frouxidão ligamentar durante a gestação. Rotinas de
exercícios de alongamento leves a moderados parecem ser indicados para essa
população.
Segundo Hartmann e Bung (1999), os exercícios aeróbicos são os mais indicados
para qualquer gestante, principalmente aqueles que não envolvam levantamento de
pesos. Estes autores relatam que exercícios aquáticos, como natação, e exercícios
cíclicos, como o ciclismo, são as melhores opções para a gestante, por não colocá-las
em risco devido à sua frouxidão ligamentar. Eles ainda classificam alguns outros
exercícios em “recomendáveis”, “aceitáveis” e “não-aceitáveis”, como na seguinte tabela:
Tabela 2 – Exercícios Recomendáveis, Aceitáveis e Não-Aceitáveis
Exercícios
Recomendáveis
Natação
Caminhada
Ciclismo (bicicleta
estacionária)
Exercícios Aceitáveis
Aeróbica
Corrida
Natação com snorkel
Exercício em altitude superior a 2500m
Exercícios Não-Aceitáveis
Jogos com bolas
Levantamento de peso
Exercícios com risco de queda
Mergulho, entre outros
(HARTMANN & BUNG, 1999).
Intensidade
Exercícios moderados e até mesmo vigorosos, segundo Harris (2005), podem ser
executados se a gestante está condicionada e acostumada com essa intensidade e se
não houver nenhuma contra-indicação obstétrica, embora a maioria das mulheres
grávidas diminua voluntariamente a intensidade de seus exercícios devido às mudanças
fisiológicas de seu organismo. Segundo Harris (2005), mulheres anteriormente ativas
podem continuar a se exercitar em até 80% a 90% de sua freqüência cardíaca máxima e
70% a 85% de seu VO2máx. Porém, estes dados se referem a gestantes normais não
diabéticas. Talvez essa intensidade seja muito alta para gestantes com DMG,
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
23
principalmente devido ao risco de hipoglicemia. Para Hartmann e Bung (1999), não
existem ainda evidências científicas que suportem a prática de exercícios intensos e
prolongados, os quais levem a freqüências cardíacas superiores à 170 bpm. Exercícios
nessa intensidade podem ocasionar dores abdominais e sangramentos em atletas que
continuam seu treinamento vigoroso na gestação (HARTMANN & BUNG, 1999). Batista
et al. (2003) ainda afirmam em seu artigo de revisão que a prática excessiva tanto de
atividades físicas como ocupacionais, ou a alta intensidade de exercícios físicos pode
levar a partos prematuros ou mesmo abortos.
Segundo recomendações do ACOG (American College of Obstetricians and
Gynecologists), atividades aeróbias de intensidades próximas a 60% da FCmáx ou 50%
do VO2máx parecem ser apropriadas para gestantes anteriormente sedentárias,
enquanto intensidades próximas a 70% da FCmáx e 60% do VO2máx são mais
indicadas a gestantes anteriormente ativas que queiram manter seu condicionamento
cardiovascular (ARTAL, O’TOOLE & WHITE, 2003).
O ACOG ainda sugere que um melhor controle da intensidade do exercício pode
ser feito através do esforço percebido e não pelo controle da freqüência cardíaca, a qual
se torna muito variável em resposta ao exercício durante a gestação. Para exercícios
moderados, o score de esforço percebido deve estar entre 12 e 14 (“um tanto difícil”),
numa escala de 6 a 20.
Duração
Pouco se tem na literatura sobre a duração ideal dos exercícios físicos para
gestantes. O maior problema na prescrição do tempo das sessões de exercícios é o
risco de hipertemia. O ACOG alerta sobre a importância de se manter uma boa
termorregulação, principalmente em sessões de exercício superiores a 45 minutos.
Como alternativa para se evitar a hipertermia, se recomenda a divisão das sessões de
exercício em menores períodos, como por exemplo, mini sessões de 15 minutos de
duração.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
24
É importante alertar também sobre o risco de hipoglicemia nas sessões de
exercícios muito prolongados, principalmente se a intensidade do exercício for alta.
Para mulheres anteriormente sedentárias recomenda-se um tempo máximo de 30
minutos por dia de atividade física, ou seja, um aumento discreto no nível de atividade
da gestante, já que este não é um período ideal para grandes incrementos (ARTAL,
O’TOOLE & WHITE, 2003).
Freqüência
O ACOG não apresenta recomendações específicas quanto à freqüência das
sessões de exercícios físicos para gestantes. O que se sugere é a adoção da mesma
estratégia recomendada a mulheres não grávidas pelo ACSM: acumular 30 minutos de
exercício físico por dia, na maioria dos dias da semana.
2.2.3. Contra-Indicações e Riscos do Exercício Físico
Em contrapartida aos benefícios da atividade física, deve-se ressaltar que o
exercício pode oferecer riscos para o feto por redirecionar o fluxo sangüíneo para os
músculos e pele da mãe, diminuindo o aporte de oxigênio e nutrientes para o feto.
Também há o risco de hipertermia (principalmente em exercício fora da água),
intensificação das contrações uterinas e acidose respiratória fetal. Contudo, existem
evidências científicas de que o feto consegue suportar bem esses fatores estressores
por curtos períodos de tempo, sem que seu bem estar seja afetado (HARTMANN &
BUNG, 1999).
Além da hipertermia, também existe risco de hipóxia aguda, hipoglicemia aguda,
diminuição crônica do aporte de oxigênio e energia (nutrientes) levando à redução do
período de gestação, retardo do desenvolvimento fetal e subseqüente menor peso ao
nascer. Já os principais riscos para a gestante são as lesões músculo-esqueléticas, as
complicações cardio-vasculares, o parto prematuro, o aborto durante o primeiro
trimestre e a hipoglicemia aguda (HARTMANN & BUNG, 1999).
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
25
As contra-indicações para a prática de atividade física podem ser doenças
presentes junto com o DMG e riscos para a saúde tanto da mãe quanto do feto.
Doenças cardíacas, arritmias ou palpitações não explicadas podem ser um sinal de
alerta contra a prática de exercício físico, assim como algumas outras doenças, a
exemplo da tromboflebite, que se caracteriza por veias inflamadas com coágulos de
sangue e da embolia pulmonar recente, caracterizada por coágulo de sangue nos
pulmões. Sangramento vaginal ou ruptura de membranas, retardo do crescimento intrauterio, risco de parto prematuro, suspeita de sofrimento fetal (assinalado por uma
redução nos movimentos fetais), hipertensão não controlada, hiperglicemia acentuada,
hipoglicemia, anemia, doença tireoidiana, bronquite crônica, limitações ortopédicas,
obesidade excessiva ou peso corporal muito baixo, histórico de abortos, gestação
múltipla e pré-eclampsia também são fatores que levam à contra-indicação dos
exercícios físicos. (MARTINS, 2000; HANLON & YMCA dos EUA, 1999; DAVIDSON,
1998; ARTAL, 1996; ARTAL, 1990).
Artal (1990) afirma que gestantes sob o risco de parto prematuro não devem se
exercitar, pois o exercício aumenta a secreção de noradrenalina, a qual é responsável
por iniciar a irritabilidade do útero e assim ocasionar contrações precoces e um parto
prematuro. O parto prematuro pode ser muito complicado para bebês de gestantes com
DMG. Devido a hiperinsulinemia fetal, a produção de substância surfactante dos
pulmões do feto fica comprometida. O pulmão fetal ainda não está maduro até a 38ª
semana de gestação, sendo que um parto prematuro anterior a esse período leva à
necessidade de cuidados especiais com o feto, a exemplo da suplementação de
oxigênio, suporte ventilatório e possível reposição de substância surfactante. Neste caso,
segundo Hicks (2000), também é de extrema importância o acompanhamento de um
neonatologista.
É necessária muita atenção na escolha dos exercícios a serem aplicados à
gestante com DMG. Alguns exercícios contra-indicados, citados por Harris (2005), são
saltos, exercícios que envolvem mudanças rápidas de direção (devido ao risco de
lesões nas articulações, dado que no período de gestação os ligamentos ficam mais
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
26
frouxos e elásticos por causa das mudanças hormonais ocorridas neste período),
exercícios em altitudes elevadas, atividades que envolvam mudanças na pressão
atmosférica, esportes de contato como hockey, kickboxe, futebol, entre outros (devido
ao risco de choque mecânico na região abdominal), passeios a cavalo (devido ao risco
de queda) e exercícios na posição supinada (devido ao aumento da pressão intraabdominal e comprometimento do fluxo sangüíneo para o feto).
Jaconis (1999) também cita alguns exercícios que não devem ser executados
durante a gestação, mesmo nas gestações em que o DMG não está presente: mergulho,
nado borboleta, salto de trampolim, tênis, corrida, basquete, vôlei, motociclismo,
equitação e atletismo. Hartmann e Bung (1999) ainda citam que exercícios como
levantamento de pesos devem ser evitados por provocarem a Manobra de Valsalva.
Estes autores também alertam para o risco da prática de mergulho pela gestante, pois o
feto é submetido a condições hiperbáricas e pode sofrer embolia quando da
descompressão (volta da gestante à superfície).
Harris (2005), contrariando alguns autores, defende que as mulheres que
praticavam jogging e levantamento de pesos antes da gravidez devem continuar sua
prática, contanto que as devidas precauções sejam tomadas. Contudo, durante o
primeiro trimestre, se a gestante apresentar náusea, vômito ou pouco ganho de peso,
ela deve cessar a prática desses exercícios.
A seguir, estão as recomendações da ACOG (American College of Obstetricians
and Gynecologists), segundo Artal, Drinkwater e Wiswell (1999), para a prática de
atividades físicas por gestantes:
Tabela 3 – Recomendações ACOG
GRAVIDEZ E PÓS-PARTO
•
O exercício regular (pelo menos três vezes por semana) é preferível à atividade
intermitente. Atividades competitivas devem ser desencorajadas;
•
Exercício vigoroso não deve ser realizado em clima quente e úmido ou durante um
período de doenças febris;
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
•
Movimentos balísticos (movimentos bruscos e saltos) devem ser evitados. O exercício
deve ser feito em chão de madeira ou com carpete firme para reduzir o choque e fornecer
segurança para pisar;
•
Flexão ou extensão profundas das articulações devem ser evitadas devido à frouxidão do
tecido conjuntivo. Atividades que exigem movimentos de saltar e choques ou alterações
rápidas de direção devem ser evitadas devido à instabilidade articular;
•
O exercício vigoroso deve ser precedido por um período de 5 minutos de aquecimento
muscular. Isso pode ser conseguido andando lentamente ou em bicicleta ergométrica com
baixa resistência;
•
Exercício vigoroso deve ser seguido por um período de atividade gradualmente
declinante, incluindo alongamento estacionário suave. Como a frouxidão do tecido
conjuntivo aumenta o risco de lesão articular, os alongamentos não devem ser feitos até o
ponto de resistência máxima;
•
A freqüência cardíaca deve ser verificada em momentos de atividade máxima, As
freqüências máximas e os limites estabelecidos em consulta com o médico não devem ser
excedidos;
•
Deve-se tomar o cuidado de levantar-se gradualmente do chão para evitar hipotensão
ortostática. Alguma forma de atividade envolvendo as pernas deve ser mantida durante
em pequeno período;
•
Os líquidos devem ser ingeridos liberalmente antes e depois do exercício para evitar
desidratação. Se necessário, a atividade deve ser interrompida para repor líquidos;
•
Mulheres que levaram estilos de vida sedentários devem começar com atividade física de
muito baixa intensidade e aumentar os níveis de atividade gradualmente;
•
A atividade deve ser interrompida e consultado o médico se aparecerem sintomas
imprevistos.
APENAS GRAVIDEZ
•
A freqüência cardíaca materna não deve excede 140 bpm;
•
Atividades extenuantes não devem exceder 15 minutos de duração;
•
Nenhum exercício deve ser realizado em posição supina depois de completado o quarto
mês de gestação;
•
Exercícios que empreguem a manobra de Valsalva devem ser evitados;
•
A ingestão calórica deve ser adequada para atender não apenas às necessidades extras
27
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
28
de energia da gravidez, mas também às do exercício realizado;
•
A temperatura central materna não deve exceder 38°C.
(ARTAL, DRINKWATER & WISWELL, 1999)
Existem alguns sinais para os quais o profissional de Educação Física deve estar
atento quando orienta o programa de exercícios de uma gestante, principalmente aquela
que possui DMG. Estes sinais indicam a necessidade de cessar a prática de exercício e
de recorrer a uma orientação médica. Alguns dos principais sinais citados por Hanlon e
YMCA dos EUA (1999) são: sangramento vaginal, dor no abdômen ou no peito, perda
de líquido pela vagina, inchaço repentino nas mãos, face ou pés, dor de cabeça forte e
persistente, tonturas ou sensação de luzes piscando, redução perceptível dos
movimentos fetais, áreas avermelhadas e doloridas nas pernas, dor forte na área púbica
ou nos quadris, dor ou sensação de ardência ao urinar, fluido vaginal que provoca
irritação, temperatura oral acima de 38°C, náuseas ou vômitos persistentes, contrações
uterinas, palpitações no coração e sensação de falta de ar.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
2.3.
29
Recuperação do DMG
Normalmente, o DMG regride após o parto, sendo que o problema da intolerância à
glicose é resolvido alguns dias ou semanas após o nascimento do bebê. Os níveis de
cortisol, hPL e estrógeno caem e a demanda por insulina também diminui rapidamente
(HICKS, 2000).
Alguns autores citados por Hicks (2000) estimaram que a probabilidade da mulher
que teve DMG desenvolver Diabetes Mellitus Tipo 2 futuramente é de 30% a 50% e
segundo Brinkman, Lieb e Nuwayhid (1987) a probabilidade da mulher desenvolver
Diabetes Mellitus Tipo 2 em 5 a 10 anos após o parto é de 30% a 60%. Já o risco de um
segundo DMG é de 50% a 70% (HICKS, 2000). Portanto, seis semanas após o parto, a
mulher deve se submeter ao teste GTT – 2h – 75g, que consiste na ingestão de 75g de
glicose em solução via oral e medição da glicemia da paciente em jejum de 8 horas e
após 2 horas do início do teste. O Diabetes é diagnosticado no caso da glicemia de
jejum resultar em valor igual ou superior a 110mg/dL e a glicemia após 2 horas ser igual
ou superior a 140mg/dL. Se, no entanto, este teste resultar negativamente, sugere-se
repeti-lo a cada 3 anos para um melhor acompanhamento.
Por esse motivo é importante que a mulher continue com uma dieta saudável e um
programa de exercício físico, dado o alto risco de desenvolvimento de Diabetes
futuramente (HICKS, 2000). É necessária a observação dos níveis de glicemia dos
primeiros dias após o parto. Reichelt, Oppermann e Schmidt (2002) ainda recomendam
estimular o aleitamento materno e evitar a prescrição de dietas hipocalóricas durante o
período de amamentação. No caso de hiperglicemia nesse período, esses autores
recomendam o uso de insulinoterapia.
Também existe maior risco de desenvolvimento de obesidade, intolerância à
glicose e diabetes mellitus em filhos de mulheres que tiveram DMG (ADA, 2004; CDA,
2003; MUMTAZ, 2000; HICKS, 2000). A intolerância à glicose se dá, principalmente,
durante e após a puberdade dos filhos de gestantes que tiveram DMG, porém a
amamentação parece diminuir o risco de desenvolvimento dessa doença. A obesidade
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
30
também é uma doença que comumente atinge filhos de gestantes com DMG. (CDA,
2003).
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
31
3. Discussão
Um dos pontos a serem discutidos é como deve ser feito o diagnóstico do DMG.
Alguns autores defendem o rastreamento universal, enquanto que outros tentam traçar
fatores de risco para determinar a probabilidade da gestante desenvolver tal doença e
assim pré-selecionar aquelas que devem executar os testes para diagnóstico do DMG.
Dado que o primeiro teste diagnóstico é o GST (Glucose Screening Test) – 1h – 50g, o
qual pode ser aplicado a qualquer hora do dia, sendo que a gestante não precisa estar
em jejum, parece razoável um rastreamento universal, já que este teste é de simples
aplicação e total viabilidade. Além disso, ainda não se tem embasamento científico
suficiente para determinar com certeza e pontualidade os fatores de risco para o
desenvolvimento do DMG, embora alguns estudos já tenham sido conduzidos com esse
objetivo. Portanto um rastreamento universal se mostra como melhor opção, já que
aumenta as chances de se diagnosticar com rapidez um possível quadro de DMG.
Outro ponto importante a ser discutido é o seguinte: diagnosticado o DMG, quais
seriam os valores glicêmicos de referência e melhor estratégia de medição para
assegurar um bom monitoramento glicêmico?
Normalmente a medição glicêmica é feita quando a gestante está em jejum e 2
horas após o café da manhã. Segundos Hicks (2000), as concentrações glicêmicas
máximas aceitáveis em jejum vão de 95 mg/dL a 105 mg/dL, enquanto o valor pósprandial (2 horas após café da manhã) máximo aceitável é 120mg/dL. Porém existem
evidências de que uma glicemia de jejum próxima a 105 mg/dL já representa um score
muito alto, acarretando maior incidência de bebês grandes para a idade gestacional
(LGA – Large for Gestational Age) e maior risco de morte intra-uterina. Portanto o ideal
seria ter como parâmetro de controle a concentração glicêmica de 95 mg/dL para
glicemia de jejum, por se constituir um valor mais seguro.
Outra estratégia de monitoramento e controle glicêmico foi proposta por Veciana et
al. (1995), num estudo em que se comparou a eficiência do monitoramento glicêmico
pré e pós-pradial em gestantes submetidas a insulinoterapia e que não praticavam
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
32
exercícios físicos. Esses autores encontraram maior eficiência no monitoramento
glicêmico pós-prandial, no qual eram medidas a glicemia de jejum (antes do café da
manhã) e a glicemia 1 hora após cada refeição do dia. O grupo que se submeteu a essa
estratégia de monitoramento glicêmico apresentou menor incidência de bebês grandes
para a idade gestacional, parto por cesárea, hipoglicemia neonatal e distocia de ombro.
Frente a esses resultados, conclui-se que o monitoramento pós-prandial é preferível ao
monitoramento pré-prandial.
Outra forma de se controlar a glicemia durante o DMG, como foi exposto neste
trabalho, é a prática de exercícios físicos. Embora hoje já estejam claros e reconhecidos
os benefícios da atividade física durante a gestação, inclusive aquela com DMG, não se
têm parâmetros muito exatos para a prescrição de um programa de exercícios físicos.
Não há um consenso sobre tipo, intensidade e volume de exercícios físicos aplicáveis a
essa população. O que ocorre é uma certa concordância entre a maioria dos autores
sobre determinados tipos de exercícios e intensidade de execução dos mesmos. Não se
recomenda a prática de exercícios em elevadas altitudes, exercícios com pesos, jogos
com rápidos deslocamentos e mudanças de direção, corrida, mergulho ou atividades
que ofereçam risco de queda. O que se têm como recomendação geral é a prescrição
de exercícios aeróbios, para uma melhora no condicionamento cardio-respiratório da
gestante, e de exercícios de fortalecimento de músculos abdominais e dorsais,
intencionando uma melhora no trabalho de parto. Deve-se manter em mente também
que os exercícios aeróbios são os principais responsáveis pelo aumento da captura de
glicose sangüínea pelas células (tecido muscular) através de um mecanismo
independente da ação insulínica. Esse processo auxilia enormemente o controle
glicêmico da gestante e funciona como eficiente alternativa para prevenção/tratamento
do DMG.
A maioria dos autores revisados neste trabalho concorda quanto à prescrição de
exercícios em meio líquido para gestantes em geral, inclusive aquelas que apresentam o
DMG. Por reduzir edema e ajudar no controle térmico da gestante, a água se mostra
como uma alternativa interessando a ser trabalhada com essa população. Exercícios na
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
33
água também possuem menor impacto articular, o que é de grande valia para as
gestantes, já que seus ligamentos apresentam uma frouxidão característica. Natação,
hidroginástica ou atividades recreativas em imersão são atividades viáveis e devem ser
escolhidas respeitando-se as necessidades e preferências da cliente.
Também se deve atentar para a boa hidratação da gestante durante as sessões de
exercício físico, sendo que o professor de Educação Física deve estar sempre
preocupado em minimizar qualquer tipo de risco tanto para a gestante quanto para o
feto.
Pouca informação se tem acerca da freqüência, intensidade e duração das
sessões de exercício físico a serem prescritos às gestantes, principalmente aquelas
diabéticas. Quanto à intensidade, a maioria dos autores revisados concorda com a
prescrição de exercícios leves a moderados, nos quais a gestante mantenha sua
freqüência cardíaca abaixo dos 70% da sua FC máx, muito embora Harris (2005) alegue
que gestantes atletas possam se beneficiar de uma rotina de exercícios vigorosos sem
apresentar riscos tanto para sua saúde quanto a de seu feto. Contudo, este foi o único
autor revisado que defendeu a prática de exercícios vigorosos durante a gestação.
Entende-se como melhor opção, portanto, a prescrição de exercícios de leve
intensidade para gestante anteriormente sedentárias (que é o caso da maioria das
gestantes com DMG) e exercícios de intensidade moderada para gestantes
anteriormente ativas, promovendo-se assim os benefícios da atividade física sem expor
a gestante a riscos associados à alta intensidade da mesma (hipertermia e hipoglicemia,
por exemplo).
Quanto à duração e freqüência da atividade física para gestantes, se têm ainda
menos informações e pesquisas conclusivas. Como não existem recomendações
específicas sobre freqüência dos exercícios físicos para gestantes, o que se sugere é o
mesmo recomendado para mulheres não gestantes: acumular 30 minutos de atividade
física por dia, na maioria dos dias da semana. Já quanto à duração das sessões de
exercício, sugere-se o máximo de 30 minutos por dia de atividade física, podendo ser
divididos em mini sessões de mais curta duração. Para sessões mais longas (duração
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
34
igual ou superior a 45 minutos), deve-se prestar especial atenção à termorregulação da
gestante para evitar a hipertermia e complicações decorrentes. Essas recomendações,
porém, são apenas uma orientação bastante superficial para prescrição de um programa
de exercícios físicos, principalmente para gestantes com DMG, dado que se tem muito
poucas pesquisas sendo desenvolvidas e muito poucos dados coletados para se
embasar cientificamente parâmetros seguros para essa prescrição. Daí a extrema
importância e necessidade de mais pesquisas científicas com o intuito de melhor
conhecer as necessidades das gestantes e o impacto da atividade física no processo de
gestação e prevenção/controle do DMG.
Quanto ao tipo de exercício, a maioria dos autores parece concordar que a melhora
na sensibilidade dos tecido à insulina e a melhora na utilização de glicose pelos tecidos
de modo independente da ação insulínica se dá com a prática de exercícios aeróbios.
Porém, estes não são os únicos exercícios a serem trabalhados durante a gestação. É
de extrema importância que o programa de atividades físicas da gestante envolva,
também, exercícios de fortalecimento e resistência muscular, além do trabalho com a
flexibilidade. De um modo geral, vários autores concordam que exercícios que envolvam
contrações isométricas, aumento da pressão arterial, risco de queda, mudanças rápidas
de direção e mudanças na pressão do meio (por exemplo, mergulho) não são indicados
durante a gestação. Há uma certa discordância no que diz respeito aos exercícios com
levantamento de pesos livres e corrida. Já exercícios como natação, hidroginástica e
caminhada se mostram como os mais bem recomendados entre diversos autores.
Há, indubitavelmente, a necessidade de mais estudos sobre DMG e exercício físico
para que o profissional de Educação Física possa ter maior embasamento quando
estruturar um programa de exercícios para gestantes diabéticas. Uma das suposições
levantadas por Raul Artal, grande pesquisador nesta área, é se o exercício físico bem
estruturado seria capaz de controlar tão bem a glicemia no DMG de modo a substituir a
insulinoterapia. Muito ainda se tem a pesquisar nesta área, que se mostra um amplo
campo de estudo e trabalho.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
35
4. Considerações Finais
Inegavelmente o exercício auxilia no tratamento do DMG, por aumentar a utilização
de glicose pelo tecido muscular e aumentar a sensibilidade periférica à insulina.
Entretanto, os mecanismos pelos quais essas modificações ocorrem ainda não são bem
conhecidos, o que remete à necessidade de estudos mais aprofundados. A maioria dos
autores concorda que os exercícios mais indicados são os aeróbios, os quais
possibilitam um melhor condicionamento cardiovascular e aumentam a afinidade da
insulina por seu receptor nos tecidos musculares. Porém, exercícios de resistência
muscular e alongamento, sem que se atinja a extensibilidade máxima do músculo,
também são importantes.
Exercícios que envolvam qualquer tipo de risco para a gestante, como quedas,
lesões musculares, condições hiperbáricas e dificuldade no retorno venoso são contraindicados. A hipertermia também é um grave risco e deve ser controlada, não só na
gestante diabética, mas nas gestantes em geral. Exercícios em imersão com a
temperatura da água controlada são uma boa estratégia tanto para controlar a
temperatura materna quanto para diminuir edemas e retenção de líquidos.
É de extrema importância o trabalho do profissional de Educação Física para a
adequada prescrição do programa de exercícios com o intuito de prevenir e/ou controlar
o DMG, levando-se em consideração todas as particularidades bordadas ao longo deste
trabalho e ainda as características individuais da gestante.
O Exercício Físico no Tratamento do Diabetes Mellitus Gestacional
36
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