UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA E A POLÍTICA DE AÇÃO
AFIRMATIVA: UM ESTUDO COM OS CURSISTAS DE PEDAGOGIA
Júnia Luz de Souza1 - UnB/FE
Otília Maria A. N. A. Dantas2 - UnB/FE
Grupo de Trabalho - Diversidade e Inclusão
Agência Financiadora: CNPq/UnB/PIBIC-Ações Afirmativas
Resumo
O tema/problema deste estudo pauta-se em investigar o percurso formativo dos estudantes
contemplados pela Política de Ação Afirmativa e sistema de cotas da universidade de Brasília.
O interesse surgiu em estudar o engajamento dos cursistas de Pedagogia, bem como avaliar,
desde o lançamento desta política, as contribuições e possibilidades para a inserção social dos
envolvidos. A pesquisa apresenta como objetivo geral analisar as contribuições da Política de
Ações Afirmativas e sistema de cotas para a formação do pedagogo da UnB. A metodologia
empregada pautou-se no estudo bibliográfico dos fundamentos teóricos da política de Ações
Afirmativas. Para o tanto, foi utilizada a Análise de Discurso como técnica de pesquisa. Os
resultados apresentam que as Ações afirmativas são políticas focais que alocam recursos em
beneficio de pessoas pertencentes a grupos discriminados e vitimados pela exclusão
socioeconômica no passado ou no presente. Trata-se de medidas que tem como objetivo
combater discriminações étnicas, raciais, religiosas, de gênero ou de casta, aumentando a
participação de minorias no processo político, no acesso à educação, saúde, emprego, bens
materiais, redes de proteção social e/ou no reconhecimento cultural. As conclusões
provisórias apresentam que o curso de Pedagogia, desde 2004 tem absorvido um número
significativo de cotistas, seja pelo vestibular, pelo Sisu ou pelo PAS. Constata-se que o índice
de desistência é pequeno em relação ao volume de estudantes que permanecem no curso.
Sabe-se, também, que as mulheres são em maior número na entrada e permanência no curso.
Esperamos que este trabalho possibilite vislumbrar possibilidades de inserção social e
acadêmica dos pesquisados no sentido de oportunizar-lhes a autonomia, o exercício da
cidadania e a emancipação.
Palavras-chave: Ações Afirmativas. Inclusão. Políticas Públicas.
1 Graduanda em Pedagogia pela Universidade de Brasília. E-mail: [email protected]
2 Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte - Brasil. Professora Adjunta da
Faculdade de Educação da Universidade de Brasília (UnB). E-mail: [email protected].
ISSN 2176-1396
21228
Introdução
No capítulo que trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, a Constituição
Federal (BRASIL, 2012) em seu art. 5º diz que: Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem
distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no
País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”
Neste prisma, negros, amarelos, indígenas, brancos, enfim, todos são iguais e, reservar
cotas nas universidades para estes ou aqueles, significará a violação de imperativos
constitucionais.
A Universidade de Brasília realizou o primeiro vestibular com o sistema de cotas em
junho de 2004, foi pioneira na aplicação prática do sistema de cotas raciais, oportunizou assim
a igualdade de oportunidades para um grupo específicos considerados excluídos e
emancipados de seus direitos. Com a implementação observa-se que houve a tão almejada
inserção social e acadêmica no sentido de oportunizar lhes a autonomia, o exercício da
cidadania e a emancipação. Daí o interesse em investigar a implementação da política de ação
afirmativa e o sistema de cotas dos cursistas de Pedagogia, surgiu pelo aumento significante
da quantidade de negros estudantes que antes era minoria e hoje há centenas. Neste sentido
deseja-se saber sobre os cotistas egressos do Curso de Pedagogia da UnB e como são
inseridos no mercado de trabalho.
O interesse em investigar o percurso formativo dos estudantes contemplados pela
Política de Ação Afirmativa e sistema de cotas da universidade de Brasília surgiu pelo
interesse em estudar o engajamento desses cotistas, em especial dos cursistas de Pedagogia,
bem como avaliar, desde o lançamento desta política, as contribuições e possibilidades para a
inserção social dos envolvidos. Desse modo, o estudo teve como objetivo geral analisar as
contribuições da Política de Ações Afirmativas e sistema de cotas para a formação do
pedagogo da UnB.
Metodologia
Esta pesquisa, de natureza quali-quantitativa, se desenvolveu a partir da empiria,
coletando dados documentais e dos participantes desta Política no intuito de atender o
objetivo da pesquisa. Também foi realizada uma pesquisa bibliográfica no sentido de
apresentar e contextualizar esta política pública de educação. Para o tanto, utilizou-se da
Análise de Discurso como técnica de pesquisa.
21229
Os estudos iniciais nos levou a sistematização da análise do quantitativo coletado do
banco de dados do Curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Secretaria de
Administração - SAA/UnB (2015) referentes ao número de ingressantes cotistas raciais no
Curso de Pedagogia desde o seu lançamento na UnB durante os anos de 2004 a 2015. Os
sujeitos pesquisados: 258 alunos cotistas pela categoria negro, pardo e indígena.
Resultados
Ações afirmativas são políticas focais que alocam recursos em beneficio de pessoas
pertencentes a grupos discriminados e vitimados pela exclusão socioeconômica no passado ou
no presente. Trata-se de medidas que tem como objetivo combater discriminações étnicas,
raciais, religiosas, de gênero ou de casta, aumentando a participação de minorias no processo
político, no acesso à educação, saúde, emprego, bens materiais, redes de proteção social e/ou
no reconhecimento cultural.
O debate brasileiro sobre cotas (ou “reserva de vagas”) nas universidades públicas
atingiu seu ápice em 2012 quando o Supremo Tribunal Federal julgou favorável a cota racial
na UnB decidindo sobre sua constitucionalidade. Em Agosto, a presidente
sancionou a ei de otas ociais,
il a
ousse
, a ual deter ina ue at agosto de 2016 todas as
instituições de ensino federais deverão reservar no mínimo 50% das vagas para estudantes de
escolas públicas, pobres, negros, pardos ou índios e 50% será destinado à a pla concorr ncia.
Para Frias (2012, p. 153):
é preciso analisar empiricamente de maneira contínua e sob diversos aspectos se o
ensino superior promove realmente a mobilidade social e se as cotas são a maneira
mais eficiente de fazer com que os mais pobres cheguem, e se mantenham, na
universidade. Inclusive, a Lei 12.711 leva em consideração essa necessidade de
acompanhamento empírico de que as cotas funcionem apenas como uma medida
temporária de correção ao exigir que uma revisão dessa política seja feita em dez
anos.
Entre as medidas que podemos classificar como ações afirmativas, mencionamos:
incremento da contratação e promoção de membros de grupos discriminados no emprego e na
educação por via de metas, cotas, bônus ou fundos de estimulo; bolsa de estudo; empréstimos
e preferência em contratos públicos; determinação de metas ou cotas mínimas de participação
na mídia, na política e outros âmbitos; reparações financeiras; distribuição de terras e
habitação; medidas de proteção a estilos de vida ameaçados; e políticas de valorização
identitária.
21230
Sob essa rubrica podemos, portanto, incluir medidas que englobam tanto a promoção
de igualdade material e de direitos básicos de cidadania como também formas de valorização
étnica e cultural. Esses procedimentos podem ser de iniciativa e âmbito de aplicação pública
ou privada, e adotada de forma voluntária e descentralizada ou por determinação legal.
A ação afirmativa se diferencia das políticas puramente anti-discriminatórias por atuar
preventivamente em favor de indivíduos que potencialmente são discriminados, o que pode
ser entendido tanto como uma prevenção à discriminação quanto como uma reparação de
seus efeitos. Políticas puramente anti-discriminatórias, por outro lado, atuam apenas por meio
de repressão aos discriminadores ou de conscientização dos indivíduos que podem vir a
praticar atos discriminatórios.
O termo ação afirmativa chega ao Brasil carregado de uma diversidade de sentidos, o
que grande parte reflete os debates e experiências históricas dos países em que foram
desenvolvidas (BRASIL, 1996, 1997). A expressão tem origem nos Estados Unidos, local
ainda hoje importante referência no assunto. Nos anos 60, os norte-americanos viviam um
momento de reivindicações democráticas internas expressas principalmente no movimento
pelos direitos civis cuja bandeira central era a extensão da igualdade de oportunidades a todos.
No período, começam a serem eliminadas as leis segregacionistas vigentes no país, e o
movimento negro surge como uma das principais forças atuantes, com lideranças de projeção
nacional, apoiado por liberais e progressistas brancos, unidos numa ampla defesa de direitos
(CARNOY, 1995). É nesse contexto que se desenvolve a ideia de uma ação afirmativa,
exigindo que o Estado, para além de garantir leis antissegregacionistas, viesse também
assumir uma postura ativa para a melhoria das condições da população negra.
Além desses aspectos, a ação afirmativa também envolveu práticas que assumiram
desenhos diferentes. O mais conhecido é o sistema de cotas (CAPPELLIN, 1995) que consiste
em estabelecer um determinado número ou percentual a ser ocupado em área específica por
grupo(s) definido(s), o que pode ocorrer de maneira proporcional ou não, e mais ou menos
flexível. Existem ainda as taxas e metas, que seriam basicamente um parâmetro estabelecido
para a mensuração de progressos obtidos em relação aos objetivos propostos, e os
cronogramas, como etapas a serem observadas em um planejamento em médio prazo.
Estabelecidos esses pontos iniciais, podemos tratar das definições propriamente ditas do que
seria a ação afirmativa.
A Universidade de Brasília é pioneira na implementação da política de ação afirmativa
(CARVALHO; SEGATO, 2001), a chamada "Lei de Cotas" que reservava 20% dos cursos
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oferecidos pela instituição para os grupos específicos classificados por "raça" ou etnia, os
negros, pardos ou indígenas. Ações afirmativas. As cotas raciais são consideradas uma forma
de ação afirmativa, com o objetivo de reduzir ou mesmo extinguir o racismo histórico de
determinadas classes étnico/raciais.
Para Almeida (2007) a política de cotas raciais são medidas especiais e temporárias,
tomadas ou determinadas pelo estado, espontânea ou compulsoriamente, com o objetivo de
eliminar desigualdades historicamente acumuladas, garantindo a igualdade de oportunidades e
tratamento, bem como de compensar perdas provocadas pela discriminação e marginalização,
decorrentes de motivos raciais, étnicos, religiosos, de gênero e outros. Logo, as ações
afirmativas visam combater os efeitos acumulados em virtude das discriminações ocorridas
no passado.
Investigar esta temática é muito delicado e os dados um tanto difíceis de encontrar
diante do trato ético em relação a coleta de dados. No momento conseguimos realizar um
levantamento dos estudantes do Curso de Pedagogia que entraram n UnB pela Política de
Ação Afirmativa (Tabela 1).
Tabela 1. Distribuição de estudantes cotista da UnB entre 2004 a 2015 (Curso de Pedagogia)
Nº DE ESTUDANTES COTISTAS
Distribuição por Turno
Gênero
Forma de Ingresso
Desligados
Total
Fonte: SAA/UnB, 2015.
Diurno
Noturno
155
103
Feminino
Masculino
188
63
Vestibular
Sisu
PAS
250
6
2
Total
Feminino
Masculino
22
7
15
258
Conforme a entrada destes estudantes foi distribuída equilibradamente entre os turnos
diurno e noturno. O gênero feminino (188) supera o masculino (63) dos cursistas. Como se
percebe esta política de “cotas” avoreceu principal ente a entrada na Universidade de
Brasília pela via do vestibular (250), enquanto 8 aprovados via Sisu e PAS. Dos 100% (258)
dos estudantes cotistas ingressantes na UnB entre 2004 a 2015 8,4 % (22) foram, de algum
modo, desligados do curso, a maioria do gênero masculino. Ainda não se sabe as razões de tal
desistência e quantos concluíram o curso. Estes dados, sua inserção no mercado de trabalho
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como egressos do curso de pedagogia e sua participação acadêmica durante sua formação na
UnB serão nossos próximos aspectos a serem investigados.
Diante deste estudo, concluímos que a luta contra o racismo vem ocupando posição
proeminente no debate político contemporâneo. No que se refere à Educação Superior, há
desde posições que privilegiam a necessidade de melhoria da Educação Básica de modo a
oportunizar as condições de acesso, inclusive propostas focadas na implementação de cotas
raciais e sociais, o que foi inaugurado pela Universidade de Brasília.
Considerações Finais
Os estudos iniciais nos levaram a situar a política de ações afirmativas na
Universidade de Brasília e o pioneirismo desta universidade ao consolidar uma política de
tamanha importância para o povo brasileiro e sua história. Estes dados nos apontam para as
primeiras análises visando responder ao objetivo geral: analisar as contribuições da Política de
Ações Afirmativas e sistema de cotas para a formação do pedagogo da UnB.
No que se refere ao curso de Pedagogia, desde 2004 tem absorvido um número
significativo de cotistas, seja pelo vestibular, pelo Sisu ou pelo PAS. O importante que o
índice de desistência é pequeno em relação ao volume de estudantes que permanecem no
curso. Sabe-se, também, que as mulheres são em maior número na entrada e permanência no
curso.
A próxima etapa da pesquisa será entrevistar estes cursistas para saber sobre sua
entrada no mercado de trabalho e se atuam em sua própria profissão. Queremos saber,
também, se esta política contribuiu para sua inclusão social. Sabemos que se trata de uma
política de inclusão de grande relevância. Todavia, é fundamental que seus braços se
estendam para todos os âmbitos da sociedade garantindo acesso e permanência aos negros,
pardos e índios. E que o conceito expresso na Constituição Federal em que todos são iguais
perante a lei, não seja compreendido em seu sentido lato ou analógico, como queira, mas que
se perceba a complexidade do tema para se garantir a justiça social e a democracia.
Enfim, esperamos que este estudo nos ajude a elevar e valorizar esta política de
inclusão social, bem como os contemplados com esta política estimulando aqueles que ainda
poderão ser beneficiados a se encorajarem a luta por uma sociedade mais justa e democrática.
Desejamos, principalmente, dar voz aos cotistas em curso na Universidade de Brasília, seja
raciais, étnicos ou sociais acreditando que este trabalho possibilite vislumbrar possibilidades
de inserção social e acadêmica dos pesquisados no sentido de oportunizar-lhes a autonomia, o
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exercício da cidadania e a emancipação. Desejamos, finalmente que a UnB possa servir de
exemplo a todas as instituições educativas do Brasil e do exterior, demarcando a história da
sociedade contemporânea.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Marilise Miriam de Matos. Grupo Interministerial de Trabalho – GTI, 2007.
BRASIL. Programa Nacional de direitos humanos. Brasília, Ministério da Justiça, 1996.
______. Relatório da Comissão de constituição, justiça e cidadania do Senado. Brasília:
Senado Federal, 1997.
______. Constituição da República Federativa do Brasil. 35. ed. Brasília: Biblioteca digital
da Câmara dos Deputados, 2012.
CAPPELLIN, P. Ações afirmativas: uma estratégia para corrigir as desigualdades entre
homens e mulheres. In: CENTRO FEMINISTA DE ESTUDOS E ASSESSORIA.
Discriminação positiva, ação afirmativa: em busca da igualdade. Brasília: CFEMEA, 1995.
CARNOY, M. Faded dreams: the politics and economics of race in America. New York:
Cambridge University Press, 1995.
CARVALHO, J. J.; SEGATO, R. L. Uma proposta de cotas e ouvidoria para a
universidade de Brasília. Brasília: Manuscritos, 2001.
FRIAS, Lincoln. As cotas raciais e sociais em universidades públicas são injustas? Direito,
Estado e sociedade. n. 41, p. 130-156, jul/dez, 2012.
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