setor 1506
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15060612-SP
Aula 21
Modernismo em Portugal: Fernando Pessoa
SINOPSE
• 1915. Marco inicial do Modernismo lusitano: publicação da revista Orpheu. Daí deriva o
vocábulo “orfismo”, com o significado de movimento modernista português.
• “Sensacionismo”, “paulismo” e “interseccionismo” são nomes que designam correntes do
movimento.
• Polêmica contra o saudosismo de Teixeira de Pascoaes, que predominava na literatura
portuguesa do início do século XX.
• Introdução de ideias e práticas artísticas das vanguardas, especialmente do Futurismo:
verso livre, coloquialismo, prosaísmo, paródia e demais noções associadas à ideia de
modernidade.
• Autores e obras de destaque:
Fernando Pessoa (1888-1935): Obra completa.
Mário de Sá-Carneiro (1890-1930): Dispersão, 1914; A confissão de Lúcio, 1914; Céu
em fogo, 1915.
Almada Negreiros (1893-1970): Nome de guerra, 1938.
segunda geração
terceira geração
•1927: Revista Presença
•Autor e obra destacados:
 José Régio (1901-1969): Poemas de Deus e do Diabo, 1925
• 1940: Neorrealismo
• Autor e obra destacados:
Alves Redol (1911-1969): Gaibéus, 1940
FERNANDO Antônio Nogueira PESSOA
(Lisboa, 1888 – 1935)
MULTIPLICIDADE
Fernando Pessoa é considerado não apenas o maior poeta
do século XX em Portugal, mas também um grande escritor europeu. Tendo sido educado na África do Sul, acumulou enorme
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cultura literária em português e em inglês. Ao lado de Mário de
Sá-Carneiro e Almada Negreiros, introduziu as ideias e as formas
modernistas em Portugal, quando, em 1915, participou do grupo
responsável pela revista Orpheu, que teve apenas três números.
O maior índice do talento artístico de Pessoa consiste na
criação dos heterônimos (outros eus), poetas imaginários, aos
quais o escritor atribuía entidade física, biografia e um conjunto
de obras. São personagens de uma criação inconclusa. As obras
supostamente assinadas por essas figuras, o autor as publicava
em revistas de vanguarda ou as guardava em um baú à espera de divulgação. No final, ele pensava em reunir esses textos
em um volume que se chamaria Ficções do Interlúdio. Como
era desorganizado e como morreu aos quarenta e sete anos,
esse livro não foi editado senão após a morte do autor, mas
sem a mesma coesão imaginada por Fernando Pessoa. À criação
dos heterônimos dá-se o nome de heteronímia, que se explica como aplicação máxima da imaginação à poesia. Além dos
heterônimos, há a obra poética assinada pelo próprio Pessoa,
conhecida como poesia ortônima. O poeta confundia imaginação com fingimento artístico, como se percebe na célebre
quadra de “Autopsicografia”, assinada por Pessoa Ele Mesmo:
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O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.
Fernando Pessoa ele mesmo (ortônimo) possui também
versos modernistas, mas sua feição mais característica é a manutenção de formas e temas típicos da fase pré-modernista,
associada ao Simbolismo e à lírica tradicional portuguesa.
Os principais heterônimos pessoanos são: Alberto Caeiro,
Ricardo Reis e Álvaro de Campos. Todos esses poetas possuem
características distintas, embora pertençam ao mesmo projeto
literário de criação de vozes distintas que pudessem representar
a diversidade da psicologia moderna e da vida contemporânea.
Para sugerir essa diversidade, cada poeta imaginado simboliza um aspecto distinto da tradição poética do Ocidente.
Vejam-se os poetas e suas propriedades:
Exemplo:
Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
Poder ir na vida triunfante como um automóvel últimomodelo!
Exercícios
1. Leia o fragmento do poema 14 de O Guardador de Rebanhos, de Alberto Caeiro, e assinale a alternativa errada
sobre ele:
Não me importo com as rimas. Raras vezes
Há duas árvores iguais, uma ao lado da outra.
Penso e escrevo como as flores têm cor
Mas com menos perfeição no meu modo de exprimir-me
Porque me falta a simplicidade divina
De ser todo só o meu exterior.
a)Metalinguagem, pois o assunto central do poema é a
própria poesia.
b)Sua doutrina tanto pode ser moderna quanto primitiva,
pois o verso livre se explica pela natureza.
c) Projeto de poesia espontânea, cuja estrutura deve ser
tão natural quanto o perfume nas flores.
d)A perfeição é impossível por causa do espírito, que afasta o poeta da materialidade natural das coisas.
e)Ao equiparar-se à simplicidade das flores, o poeta pretende justificar a naturalidade da rima.
Ricardo Reis
Poeta antigo, racional e clássico. Sua formação representa
a sensibilidade e a inteligência pré-cristã. Acredita nos deuses e
no destino. Recusa o sentimentalismo e ama as operações lógicas do espírito. Como sua formação é basicamente clássica e a
poesia greco-latina não conhecia a rima, Ricardo Reis não incorpora esse dispositivo formal inventado na Idade Média. Todavia,
seus versos são metrificados. Incorpora noções da filosofia epicurista (Epicuro) e estoica (Zenon). Imita o estilo concentrado
e denso das odes do poeta romano Horácio. Sua produção é
conhecida como Odes de Ricardo Reis.
Exemplo:
Tanto quanto vivemos, vive a hora
Em que vivemos, igualmente morta
Quando passa conosco,
Que passamos com ela.
Texto para a questão 2
1
Bocas roxas de vinho,
Testas brancas sob rosas,
Nus, brancos antebraços
Deixados sobre a mesa:
5 Tal seja, Lídia, o quadro
Em que fiquemos, mudos,
Eternamente inscritos
Na consciência dos deuses.
Antes isto que a vida
10Como os homens a vivem,
Cheia da negra poeira
Que erguem das estradas.
Só os deuses socorrem
Com seu exemplo aqueles
15Que nada mais pretendem
Que ir no rio das coisas.
Alberto Caeiro
Poeta de versos livres e ideias rústicas, intencionalmente
primitivas. Julga que o homem só atinge a felicidade por meio
dos sentidos e do convívio intenso com a natureza. Poemas
simples, com imagens concretas e delicadas. O seu primitivismo
radicalmente ateu lembra certas premissas do Cubismo, que
valoriza o aspecto essencial e básico da experiência. Por isso,
Caeiro considera-se um pastor sem ovelhas. Obras: O Guardador de Rebanhos, Pastor Amoroso e Poemas Inconjuntos.
Exemplo:
O que penso eu do mundo?
Sei lá o que penso do mundo!
Se eu adoecesse pensaria nisso.
Álvaro de Campos
Poeta futurista de versos e ideias urbanas e modernas. Sua
feição mais característica é o verso livre, em estilo torrencial
e impetuoso. Enumeração de palavras e sensações. Revoltado
e irreverente, ama a máquina e os grandes centros urbanos.
Às vezes é reflexivo e apresenta críticas à sociedade industrial.
Euforia pelo moderno e pessimismo existencialista. Obra: “Ode
Marítima”, “Ode Triunfal” e “Tabacaria”, entre outros.
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(Ricardo Reis, Poesia, Lisboa, Assírio & Alvim, 2000)
2. Que traços da poética de Ricardo Reis estão presentes no
poema?
O poema evidencia alguns traços bastante representativos da poética de Ricardo Reis, tais como:
• a defesa de uma filosofia estoico-epicurista, postuladora de tranquilidade e de ataraxia (completa ausência
de perturbações ou inquietações da mente), do gozo
moderado do prazer, tendo como monte o carpe diem;
Reis evita o sofrimento que decorre do excesso das
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emoções, contentando-se em fruir o instante,
gozando assim a margem de felicidade possível
(cf. versos 1-8);
• a recusa da dor inerente à luta do homem contra
as limitações próprias da condição humana e terrena (cf. versos 9-12) e a aceitação do caráter
inexorável do tempo (cf. verso 16);
• a concepção dos deuses como um Ideal do humano, apontando o caminho da elevação e da harmonia estética e moral (cf. versos 13-16).
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol, que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
O mais que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças
Nem consta que tivesse biblioteca.
(Fernando Pessoa ele mesmo. Cancioneiro.)
3. Nas primeiras estrofes, o eu lírico faz uma crítica aos livros
e à literatura, de modo geral. Essa crítica envolve a poesia?
Justifique sua resposta.
Não, porque o próprio eu lírico faz, na quarta estrofe, uma ressalva: “Grande é a poesia, a bondade e
as danças...”. Diante da natureza, considera a literatura ornato inútil (“O sol doira / Sem literatura.”).
Mas a poesia, sendo natural, terá razão de ser e de
existir.
Texto para a questão 3
Liberdade
Ai que prazer
Não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
E não o fazer!
Ler é maçada,
Estudar é nada.
O sol doira
Sem literatura.
O rio corre, bem ou mal,
Sem edição original.
E a brisa, essa,
de tão naturalmente matinal,
Como tem tempo não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto é melhor, quando há bruma,
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
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ORIENTAÇÃO DE ESTUDO
Caderno de Exercícios — Unidade III
Tarefa Mínima
• Faça os exercícios 2 a 20, série 12.
Tarefa Complementar
• Faça os exercícios 24 a 40, série 12.
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Aula 22
Semana de 22: Painel do Modernismo brasileiro 1o tempo
SINOPSE
Semana da Arte Moderna: Teatro Municipal de São Paulo, fevereiro de 1922;
Participação: Villa-Lobos, Guiomar Novaes (música); Manuel Bandeira, Oswald de Andrade,
Mário de Andrade, Menotti Del Picchia, Ronald de Carvalho, Plínio Salgado, Graça Aranha
(literatura); Victor Brecheret, Haarberg (escultura); Anita Malfatti, Di Cavalcanti (pintura).
Significado: foi o grito do Ipiranga da arte brasileira. As vaias se manifestaram, quando
Mário leu páginas de A escrava que não é Isaura, quando Villa-Lobos entrou de chinelas no
palco (e guarda-chuva). Mas esse novo grito não era contra os portugueses: era contra certos
brasileiros, representantes da “pedantocracia bacharelesca”, acadêmica.
MODERNISMO NO BRASIL 1o TEMPO (1922-1930)
Fase heroica: “ver com os olhos livres”; destruição dos velhos tabus da inteligência nacional; construção de uma nova lin-
guagem.
Traços distintivos
 Liberdade e nacionalismo no exercício da crítica e nas propostas criativas;
 Renovação das propostas culturais e políticas;
 Adeus ao constrangimento ou vergonha de sermos brasileiros: independência mental;
 Literatura alegre e vital; instauração de uma sensibilidade
mais próxima da realidade nacional;
 Incorporação simpática dos novos meios: rádio, jornal,
cinema, plurilinguismo, telefone, vociferação permanente
das ruas, amor à máquina e à velocidade, nova psicologia
amorosa e feminina, a intervenção psicanalítica, o folclore
saindo do fundo do poço, etc.
 Proliferação de revistas antenadas com o novo ideário:
Klaxon, Estética, A Revista, Terra Roxa e outras terras, Verde, Festa, Antropofagia;
 Divergências internas: estéticas e ideológicas.
Contexto
• Absorção dos “ismos” europeus: Cubismo, Futurismo, Dadaísmo;
• Influência cultural dos imigrantes;
• Alta do café;
• Centenário da independência política;
• Primeiras transmissões radiofônicas;
• Moderno imaginário urbano: máquinas, bondes, avenidas,
arranha-céus, automóveis;
• Fundação do Partido Comunista;
• Revolta dos 18 do Forte de Copacabana, agitações tenentistas, Coluna Prestes;
• Implantação das primeiras linhas aéreas regulares;
• Revolução de 1930: fim da República velha.
Exercícios
Texto para a questão 1
Bruta sacudidela nas artes nacionais! Lembremos agora a revolução naturalista, recordemos a transição parnasiana: é indiscutível
que jamais reviravolta de arte movimentou e apaixonou e enlouqueceu mais a monotonia brasileira que o chamado futurismo. Encheu-te de tintas, vulcões de lama, saraivada de calúnias. Muito riso e pouco siso. De ambas as partes. (…) Maluquice, imprevidência
é o que foi. Disparatada, sem norma, contraproducente. Confusão e caos em que as orientações opostas, em vez de covizinharem,
libertas umas das outras, se confundiam numa barafunda de estardalhaço. Oh! Semana sem juízo. Desorganizada, prematura. (…) A
Semana de Arte Moderna não representa nenhum triunfo, como também não quer dizer nenhuma derrota. Foi uma demonstração
que não foi. Realizou-se. Cada um seguiu para seu lado, depois. Precipitada. Divertida. Inútil. A fantasia dos acasos fez dela uma data
que, creio, não poderá mais ser esquecida na história das artes nacionais. Eis a famosa Semana.
(Mário de Andrade, revista América Brasileira, abril de 1924)
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1. “Não se constrói arranha-céu sobre castelo moçárabe.
Derruba-se primeiro a mole pesadíssima dos preconceitos,
que já foram verdades, para elevar depois outras verdades.” Comente esta afirmação, feita também por Mário de
Andrade e associe-a ao texto anterior.
Mário de Andrade considera que a Semana de 22 foi
um movimento de ruptura com modelos e formas artísticas do século XIX. Da destruição das concepções conservadoras surgiu uma nova linguagem, sem
ritmo predeterminado, sem métrica preestabelecida,
fundamentando-se no princípio de liberdade.
Texto para a questão 4
Poema tirado de uma notícia de jornal
João Gostoso era carregador de feira livre e morava no
morro da Babilônia num barracão sem número.
Uma noite ele chegou no bar Vinte de Novembro
Bebeu
Cantou
Dançou
Depois se atirou na Lagoa Rodrigo de Freitas e morreu
afogado.
(Manuel Bandeira, Libertinagem.)
4. (FUVEST) Relacione o título do poema à corrente estética
da qual o texto participa.
Uma característica do primeiro tempo do Modernismo
brasileiro evidente no título é o prosaísmo: ele anuncia que o poema não tratará de um acontecimento
grandioso ou sublime, mas de um fato tirado do cotidiano, muito parecido com o que se lê diariamente
nos jornais. A alusão a um poema (linguagem literária) feito a partir de uma notícia de jornal (linguagem não literária) sugere ainda o desinteresse em
seguir padrões clássicos de composição, a fim de favorecer a criação de uma nova linguagem artística.
Texto para a questão 2
relicário
No baile da Corte
Foi o Conde d’Eu
quem disse pra Dona Benvinda
Que farinha de Suruí
Pinga de Parati
Fumo de Baependi
É comê bebê pitá e caí
(Oswald de Andrade, Poesia Pau-brasil.)
2. Qual vertente do Modernismo brasileiro é representada no
poema acima?
Trata-se do poema-piada: é curto, e após fingir que
vai dizer coisa importante, surpreende-nos negativamente. Mas que não deixa de ter graça.
Texto para o exercício 3
erro de português
Quando o português chegou
Debaixo de uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de Sol
O índio tinha despido
O português.
(Oswald de Andrade. Poesias reunidas.
Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978)
ORIENTAÇÃO DE ESTUDO
Caderno de Exercícios — Unidade III
Tarefa Mínima
• Faça os exercícios 1 e 2, série 13.
Tarefa Complementar
• Faça os exercícios 8, 9 e 12, série 13.
3. (ENEM) O primitivismo observável no poema anterior, de
Oswald de Andrade, caracteriza de forma marcante
a)o regionalismo do Nordeste.
b)o concretismo paulista.
c) a poesia Pau-Brasil.
d)o simbolismo pré-modernista.
e)o tropicalismo baiano.
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Aulas 23 e 24
O MODERNISMO NO BRASIL — 1o TEMPO: MÁRIO DE ANDRADE, OSWALD DE ANDRADE E MANUEL
BANDEIRA
SINOPSE
MANUEL BANDEIRA
MÁRIO DE ANDRADE
• Estrela da vida inteira (1966): formoso conjunto de 10
livros → contato com as etapas mais significativas da
evolução poética brasileira do século XX. Didaticamente,
pode ser dividida em três fases:
• 1a fase — Preparação para o Modernismo: Cinza das horas (1917), Carnaval (1919) e Ritmo dissoluto (1924) →
traços pós-simbolistas de acentuada melancolia, associados à ruptura com a poética tradicional.
• 2a fase — Modernismo pleno: Libertinagem (1930) e Estrela da manhã (1936) → registro das marcas mais fortes
de modernidade: versilibrismo, simplicidade de imagens,
resgate poético do cotidiano, disposição inovadora das
palavras, poemas-piada, tom prosaico, toques surrealistas, pinceladas humorísticas, autoironia. Amplificação dos
três núcleos temáticos de sua poesia: reminiscências da
infância, convivência com a morte e erotismo.
• 3a fase — Pós-modernismo: da Lira dos cinquent’anos
(1940) a Estrela da tarde (1963) → virtuosismo refinado:
restauração dos metros tradicionais a versos de sintonia com
o Concretismo; permanência de sugestões autobiográficas.
• Líder dos modernistas de 1922: intensa atividade doutrinária e cultural → “descarrilhar o trem normal e costumeiro do passadismo mental”.
• Pauliceia desvairada (1922): sátira à obsessão de posse burguesa e à incompetência dos administradores públicos. A poesia incorpora o coloquial, os “barbarismos universais” etc.
• Clã do jabuti (1927): descoberta do Brasil → poesia ligada ao folclore: toada, coco, moda, samba, rondó.
• Amar, verbo intransitivo (1927): romance freudiano →
Fräulein é contratada para dar “lições de amor” ao jovem
Carlos de Sousa Costa. Obra desenvolvida a partir dos
processos psicanalíticos mais frequentes.
• Macunaíma (1928): perfil multifacetado do latino-americano → colagem de lendas amazônicas + imagens do cotidiano urbano e rural. Eixo do romance: a busca do muiraquitã
pelo “herói sem nenhum caráter”, que viaja por todo o país
a fim de recuperar o talismã, em poder do gigante Wenceslau Pietro Pietra. Rapsódia literária → anatomia carnavalesca e primitiva da formação e da história do país.
OSWALD DE ANDRADE
• Guerrilheiro cultural → demolição, por meio da sátira e
do deboche. “Monogamia sucessiva” → vários casamentos. “Vira-latas do Modernismo” → anarquismo político:
PRP (década de 1920) e PCB (de 1930 em diante).
• Memórias sentimentais de João Miramar (1924): primeiro
romance moderno brasileiro; obra caleidoscópica em 163
flashes cinematográficos, que relata a trajetória típica de
um brasileiro rico nas primeiras décadas do século XX:
turismo globe-trotter → casamento burguês → amante
→ desquite → vida literária → apertos financeiros.
• Pau-Brasil: manifesto e poesia (1924–25) → ver com
olhos livres (valorização do Brasil pós-cabralino); recriação de textos jesuíticos e cronísticos da época colonial.
Poesia Pau-Brasil: imediata, simplória, desconcertante,
selvagem, curta e grossa, integrando signos verbais e visuais; a redescoberta do país, por meio de anedotas e
caçoadas poéticas.
• Antropofagia: manifesto (1928) → “Tupy, or not tupy,
that is the question”: valorização do Brasil pré-cabralino;
recuperação de nosso lado selvagem e instintivo; devoração inteligente da cultura estrangeira.
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MÁRIO Raul DE Morais ANDRADE
(São Paulo, 1893-1945)
Mário de Andrade
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“EU SOU TREZENTOS, TREZENTOS E CINCOENTA”
Mário de Andrade é considerado o mais abrangente trabalhador intelectual brasileiro da 1a metade do séc. XX. Lúcido
e instigante, desenvolveu uma reflexão crítica moderna e provocativa sobre os mais variados temas. Mergulhou fundo nas
raízes culturais mais representativas do país, procurando revelá-las por meio da compreensão dos mais autênticos valores
populares. Mário injetava em tudo que fazia um senso de problemático brasileirismo, daí sua investida no folclore. Sempre
de holofotes acesos na direção do povo, desentulhou o espírito
nacional de uma montanha de preconceitos arcaicos.
Firmemente disposto a experimentar processos de expressão para chegar a uma língua “brasileira”, pesquisou sempre
fórmulas novas, que o levaram a forjar regras pessoais de gramática. Chegou até a anunciar um livro — Gramatiquinha da
fala brasileira —, em que estabeleceria sua proposta de renovação da língua “brasileira”. Deixava de acentuar certas palavras
(“ninguem, tambem, Belem”), outras ele acentuava (“porém,
rúim”), grafava certos termos a partir do registro oral (“milhor, siquer, ólio”), formas de virgular e pontuar que definem
no conjunto uma individualidade de estilo inconfundível.
O TOM DELIRANTE: PAULICEIA DESVAIRADA (1922)
Para Mário de Andrade a arte devia “botar por terra as formas gastas de sociedade”. Pauliceia Desvairada (1922) assume
a forma da pedagogia e do combate, com ”versos de sofrimento e de revolta“ que registram paisagens frias, opressoras da
cidade. Também apresenta uma estética moderna, onde terá
importância o verso harmônico, em que aproxima a poesia da
música, desenvolvendo a teoria da “polifonia poética” que se
consubstancia na invenção do verso harmônico (= superposição
de palavras soltas: “A cainçalha… A Bolsa… As jogatinas…”),
em oposição ao verso melódico tradicional. Pede a mudança de
costumes para a esperada redenção da cidade e uma audiência
nova, mais humana, mais desarmada.
resca (“malandra”), Mário de Andrade delineia o perfil multifacetado do latino-americano por meio de uma colagem de lendas
amazônicas e de imagens do cotidiano urbano e rural do país. O
eixo da obra é a busca da muiraquitã pelo “herói sem nenhum
caráter”, que viaja Brasil afora a fim de recuperar este talismã,
em posse do gigante Wenceslau Pietro Pietra.
Macunaíma, juntamente com Memórias Sentimentais de João
Miramar (1924) e Serafim Ponte Grande (1933), de Oswald de
Andrade, foram obras revolucionárias, pois desafiaram o sistema
cultural vigente, propondo, por meio de uma nova organização da
linguagem literária, o lançamento de outras informações culturais
diferentes em tudo das posições mantidas por uma sociedade dominada pelo reacionarismo e o atraso cultural generalizado.
O tom bem humorado e a inventividade narrativa e linguística fazem de Macunaíma uma das obras modernistas brasileiras mais afinadas com a literatura de vanguarda no mundo na
sua época. Nesse romance encontram-se Dadaísmo, Futurismo,
Expressionismo e Surrealismo, aplicados a um vasto conhecimento das raízes da cultura brasileira. A obra é fruto de anos de
pesquisa das lendas e mitos indígenas e folclóricos que o autor
reúne utilizando a linguagem popular e oral de várias regiões
do Brasil. Trata-se, por isso mesmo, de uma rapsódia. Importante notar que, além de relatar inúmeros mitos recolhidos em
diversas fontes populares, Mário de Andrade também inventa,
de maneira irônica, vários mitos da modernidade. Apresenta,
entre outros, os mitos da criação do futebol, do truco, do gesto
da “banana” ou do termo “Vá tomar banho!” Além da imensa
pesquisa, há, em Macunaíma, muita invenção.
José OSWALD DE Sousa ANDRADE
(São Paulo 1890-1954)
O TOM ACABOCLADO: CLÃ DO JABUTI (1927)
Resulta da “viagem de descoberta do Brasil” que ele realizou por Minas Gerais, durante a Quaresma e a Semana Santa
de 1924. Aqui ele mais se aproxima do folclore: a toada, o coco,
a moda, o samba, o rondó vão dando suporte e substância aos
poemas. Embora haja uma pequena insistência no verso livre
alongado e dolente, para exprimir as emoções caboclo-nacionalistas, o que predomina é o verso mais curto, mais acautelado
contra os derramamentos.
O ROMANCE FREUDIANO: AMAR, VERBO
INTRANSITIVO (1927)
Romance desenvolvido a partir dos processos psicanalíticos
freudianos mais típicos: recalque, sublimação, regressão, fixação e
os demais desvios provocados pela maior ou menor aproximação
da libido. Mário narra a estória de uma governanta alemã, Fräulein,
contratada para dar “lições de amor” ao jovem Carlos de Sousa
Costa.
O ROMANCE-RAPSÓDIA: MACUNAÍMA (1928)
Macunaíma, o herói sem nenhum caráter, é uma das obras
pilares da cultura brasileira. Numa narrativa fantástica e picaKAPA-6 850450612
Retrato de Oswald, por Tarsila do Amaral.
UM ROMANCE CALEIDOSCÓPICO: MEMÓRIAS
SENTIMENTAIS DE JOÃO MIRAMAR (1924)
É o primeiro romance modernista brasileiro, uma espécie
de “diário de bordo”, com capítulos curtíssimos, telegráficos,
cubofuturistas. São 163 flashes mostrando a vida de um ricaço
brasileiro contada por ele mesmo, de maneira que o sentimental e o confidencial apareçam como forças líricas: a infância de
malandrim → a viagem para a Europa → o casamento de interesse → amantes fortuitas → desquite por traição recíproca →
vida e vaidades literárias → aperturas financeiras etc. Esse é um
romance até certo ponto “interdisciplinar”, pois transplanta o ci-
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ANGLO VESTIBULARES
nema e a pintura para a literatura; explora sempre os planos descontínuos (como os fotogramas do cinema). Oswald achava que
Miramar é o típico burguesão em sua vida estéril e sem nexo.
RUPTURA RADICAL COM AS TRADIÇÕES:
POESIA PAU-BRASIL (1925)
A obra de Oswald renega parte de toda a história brasileira,
para dar ênfase apenas àquela parte espontânea, elementar e
primitiva, que ele nomeava Pau-Brasil. Por isso ele procura nossas raízes ainda não de todo ceifadas pela racionalidade europeia.
Há um retorno à infância primordial, à vida livre, a um cântico
utópico ao matriarcado, à nudez (de todo tipo), ao prosaísmo das
ruas, dos namoros, tudo direto, como quer a realidade, e tudo
sem a máscara sentimental. Oswald se rebela contra “a sensatez
hipócrita”, valoriza o natural aqui e agora, e o retorno a nossa
identidade antropológica, farrista e paradisíaca.
“Ver o Brasil com olhos livres” era buscar nossa riqueza nativa, bugrina, cabralina, negra. Em poemas-pílula, ele combina
a frase quinhentista (das crônicas coloniais) com a fala popular
brasileira. Oswald proclamava essa mistura como “de exportação”, poesia nossa, não imitada do estrangeiro.
O TEATRO MODERNISTA: O REI DA VELA (1937)
Também no teatro Oswald foi pioneiro: O rei da vela, encenada só em 1967, inicia nossa dramaturgia moderna, numa linha
ideológica muito próxima da do romance Serafim Ponte Grande
(1933). Essa mudança, acontecida depois da crise de 1929 (que
levara Oswald à bancarrota), fez com que ele assumisse anarquicamente posições de esquerda. Desesperado com as dívidas,
Oswald vai-se pendurar nos agiotas de São Paulo, os todo-poderosos “reis da vela”, que retrata na peça. Usurários como Abelardo I e II ligam-se aos decadentes cafeicultores e aos representantes do capitalismo internacional, para explorar o desespero
dos endividados. Simbolicamente, a personagem que alegoriza a
classe média traz a corda ao pescoço: é o devedor crônico.
MANUEL Carneiro De Souza BANDEIRA Filho
(Recife, 1886 – Rio, 1968)
MANIFESTO ANTROPÓFAGO (1928)
Oswald propõe uma devoração da cultura europeia sedimentada nos brasileiros. Tal devoração se inspirava numa metáfora selvagem: assim como os índios não devoravam seus inimigos para matar a fome, mas para incorporar o valor destes
a si mesmos, também a Antropofagia questionaria os europeís­
mos, para experimentá-los em cruzamentos novos e em nova
produção cultural, que passaria então a ser nossa. A tese da
antropofagia completa o Manifesto Pau-Brasil. Fragmentos:
***
Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil tinha
descoberto a felicidade.
***
Contra o índio de tocheiro. O índio filho de Maria, afilhado
de Catarina de Médicis e genro de D. Antônio de Mariz.
***
A alegria é a prova dos nove.
***
No matriarcado de Pindorama.
(Oswald de Andrade, Manifesto Antropófago)
O ANARQUISMO EM FÚRIA: SERAFIM PONTE
GRANDE (1933)
Serafim encarna o mito do herói latino-americano individual que, a bordo da nave El Durazno, parte em busca da libertação e da utopia. Para redescobrir a nossa realidade e redefinir
o comportamento histórico do brasileiro, Oswald cria em Serafim uma personagem outsider, um irrecuperável marginal. Com
sarcasmo e irreverência, Serafim parodia os atos de bravura
individual, virando-os pelo avesso. Por ser só dele, o sonho de
Serafim acaba frustrando-se: depois de aprender a dura realidade da vida, é expelido do sistema.
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Manuel Bandeira
O MODERNISTA NEORROMÂNTICO
Reunida em Estrela da vida inteira (1966), a obra poética
de Manuel Bandeira contém, como traços fundamentais, o romantismo, a simplicidade, os retratos da vivência e do vivido,
os ritualismos infindáveis da memória e, por fim, a morte como
fim de si mesmo e de todas as coisas amadas.
Bandeira, do começo ao fim, mostrou sempre um romantismo, não de escola ou de época, mas de vocação e de sensibilidade. Isso não lhe impediu ser modernista. E a renovação que ele
trouxe não foi a do alarde ou a do grito de guerra. Manuel Bandeira é o modernista das circunstâncias simples, elementares.
Bandeira é o poeta da precisão sentimental, e se isso é romântico (pelo lado sentimental), será modernista pelo lado da
frase precisa, já que os românticos gostavam da ornamentação,
da emoção torrencial, que o poeta rejeita.
São os momentos, a solidão pensativa — aquilo que se eterniza: “Vão demolir esta casa / Mas meu quarto vai ficar, / Não como
forma imperfeita / Neste mundo de aparências: / Vai ficar na
eternidade, / Com seus livros, com seus quadros, / Intacto, suspenso no ar!” (“Última canção do beco”, Lira dos cinquent’anos).
107
ANGLO VESTIBULARES
O território cativo dos afetos não o abandonou jamais, e
teve nomes variados. Um deles foi Recife, mágico e pessoal: “A
vida não me chegava pelas páginas da história jornais nem pelos
livros / Vinha da boca do povo na língua errada do povo / Língua
certa do povo / Porque ele é que fala gostoso o português do
Brasil !” (“Evocação do Recife”, Libertinagem). O mesmo na
propaganda de rua: “As três mulheres do sabonete Araxá me
invocam, me bouleversam, me hipnotizam. / Oh, as três mulheres do sabonete Araxá às quatro horas da tarde! / O meu reino
pelas três mulheres do sabonete Araxá!” (“Balada das três mulheres do sabonete Araxá”, Estrela da Manhã)
ECOS DO PARNASO-SIMBOLISMO:
A CINZA DAS HORAS (1917)
Obra publicada após a volta de Clavadel, na Suíça, aonde
o poeta fora a tratamento de saúde, às vésperas da I Grande
Guerra. Esse é um livro de iniciante, mas com o ouvido cativo
pelos últimos ecos do Simbolismo e, sobretudo, pelo olhar longínquo e admirativo dos românticos: “A sombra imensa, a noite
infinita enche o vale…(…) um carneiro bale. / Ouvem-se pios
funerais…” (“Paisagem noturna”). Há dois belos sonetos neoparnasianos, um dedicado a Camões, outro a Antonio Nobre. Eis
alguns ecos de Alphonsus de Guimarães (que reaparecerão mais
tarde, bem mais purificados): “Muda e sem trégua / Galopa a
névoa, galopa a névoa. (…) Aquele corvo, o voo torvo, / O meu
destino aquele corvo! (“Ruço”). A rima, associada sempre a quadros de sentimentalismo, mostra-se codificada, previsível.
A EXPLOSÃO DO VERSO LIVRE:
O RITMO DISSOLUTO (1924)
A palavra “dissoluto” sugere depravação, descontrole, perda moral da consciência e, sobretudo, errância dos desejos.
Isso, no plano temático do livro, coincide com o memorialismo
infantil e sua cultura recifense, folclórica. Nesta obra, Bandeira
elege o uso generalizado do verso livre. Reponta também aí o
ardor amoroso que será um dos grandes temas do poeta.
A FASCINAÇÃO DO OLHAR:
ESTRELA DA MANHÃ (1936)
O que chamamos estrela da manhã é o mesmo que Vésper
ou estrela da tarde: trata-se do planeta Vênus, que, a olho nu,
nos dá a impressão de ser estrela. De qualquer forma, o título é
perfeito, porque os poemas aí trabalham com o olhar masculino
que incide sobre a mulher aqui e agora, mas que já incidiu ali e
outrora, e que, idealizado, repõe a consolação viva da memória. A
inspiração é mais pura e abstrata: Lira dos cinquent’anos
(1944)
Bandeira não fez poesia só para se exprimir, para falar de seu
destino ou do destino dos amigos. Enfim, não foi apenas um poeta
existencial. Ele também gostava das várias linguagens poéticas e
dos vários estilos de época. Exprimir algo de nós, nossa linguagem
sempre exprime. Mesmo escrevendo no estilo medieval das cantigas (“Cossante”, “Cantar de amor”) ou nos sonetos (“Sonetos
ingleses”, I e II) ou falando de Mozart (“Mozart no céu”) ou se
exercitando (“Rondó do capitão”) ou mesmo plagiando Augusto
Frederico Schmidt (“Soneto plagiado”) etc. A par destes vários
exercícios de virtuosismo e finura, o que se percebe neste livro
é um aprofundamento bastante sofisticado dos temas da solidão
sob a batuta do aprimoramento musical da poesia.
A POESIA OUTONAL: ESTRELA DA TARDE (1958)
Neste livro os assuntos são vários, de maneira que nele não
se explicita um eixo temático bem claro. Mas é um livro em que
a religiosidade se mostra mais frequente que nos anteriores.
Uma religiosidade beata, católica, mas sensível, inteligente. Esta
religiosidade se sublima nos temas de piedade (“Acalanto para
as mães que perderam o seu menino”, “Ovalle”, “A anunciação”,
“Sonho branco”, “Soneto sonhado” “A sua santidade Paulo VI”
etc.). Há também retratos (“Maísa”, “Cantadores do Nordeste”,
“Carlos Drummond de Andrade”) e há até mesmo uns ensaios
bem logrados de poesia concretista.
Preparação para a Morte
A vida é um milagre.
Cada flor,
Com sua forma, sua cor, seu aroma,
Cada flor é um milagre.
Cada pássaro,
Com sua plumagem, seu voo, seu canto,
Cada pássaro é um milagre.
O espaço, infinito,
O espaço é um milagre.
O tempo, infinito,
O tempo é um milagre.
A memória é um milagre.
A consciência é um milagre.
Tudo é milagre.
Tudo, menos a morte.
— Bendita a morte, que é o fim de todos os milagres.
A MATURIDADE DA POESIA MODERNA:
LIBERTINAGEM (1930)
Este é o livro mais concreto da poesia brasileira. Concreto no
sentido de conter não apenas as coisas em sua realidade palpável,
mas também a visão que o poeta terá sobre elas. Em outros termos, o mental e o sensível se enlaçam de maneira natural nesse
livro. Desde o primeiro poema (“Não sei dançar”), Libertinagem
tem parentesco com Carnaval (1918): “Uns tomam éter, outros
cocaína, / Eu já tomei tristeza, hoje tomo alegria.”
Mas em Libertinagem o carnavalesco é um eco, uma vivência
dissolvida, algo que a alma incorporou nos pormenores: “Bembelelém / Viva Belém! / Nortista gostosa / Eu te quero bem…” (“Belém do Pará”). Ou como no carro-chefe “Poética”: “Quero antes
o lirismo dos loucos / O lirismo dos bêbedos / O lirismo difícil e
pungente dos bêbedos / O lirismo dos clowns de Shakespeare.”
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(Manuel Bandeira, Estrela da tarde)
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Exercícios
Texto para a questão 1
O Poeta Come Amendoim
a Carlos Drummond de Andrade
(1924)
Noites pesadas de cheiros e calores amontoados...
Foi o Sol que por todo o sítio imenso do Brasil
Andou marcando de moreno os brasileiros.
Estou pensando nos tempos de antes de eu nascer...
A noite era pra descansar. As gargalhadas brancas dos mulatos...
Silêncio! O Imperador medita os seus versinhos.
Os Caramurus conspiram na sombra das mangueiras ovais.
Só o murmurejo dos cr’m-deus-padres irmanava os homens de meu país...
Duma feita os canhamboras perceberam que não tinham mais escravos,
Por causa disso muita virgem do rosário se perdeu...
Porém o desastre verdadeiro foi embonecar esta República temporã.
A gente inda não sabia se governar...
Progredir, progredimos um tiquinho.
Que o progresso também é uma fatalidade...
Será o que Nosso Senhor quiser...
Estou com desejos de desastres...
Com desejos do Amazonas e dos ventos muriçocas
Se encostando na canjerana dos batentes...
Tenho desejos de violas e solidões sem sentido
Tenho desejos de gemer e de morrer.
Brasil...
Mastigado na gostosura quente do amendoim...
Falado numa língua curumim
De palavras incertas num remeleixo melado melancólico...
Saem lentas frescas trituradas pelos meus dentes bons...
Molham meus beiços que dão beijos alastrados
E depois semitoam sem malícia as rezas bem nascidas…
Brasil amado não porque seja minha pátria,
Pátria é acaso de migrações e do pão nosso onde Deus der...
Brasil que eu amo porque é o ritmo do meu braço aventuroso,
O gosto dos meus descansos,
O balanço das minhas cantigas amores e danças.
Brasil que eu sou porque é a minha expressão muito engraçada,
Porque é o meu sentimento pachorrento,
Porque é o meu jeito de ganhar dinheiro, de comer e de dormir.
(Mário de Andrade, Clã do Jabuti)
1. O projeto literário de Mário de Andrade sempre se guiou pelo nacionalismo. Destaque do poema anterior expressões que carregam um acentuado traço de brasilidade.
“Canhamboras”, “tiquinho”, “muriçocas”, “canjerana”, “curumim”.
(FUVEST) Texto para a questão 2
III. Ci, mãe do mato
O herói vivia sossegado. Passava os dias marupiara1 na rede matando formigas taioca2, chupitando golinhos estalados de pajuari3 e quando agarrava cantando acompanhado pelos sons gotejantes do cotcho 4, os matos reboavam com doçura adormecendo
as cobras os carrapatos os mosquitos as formigas e os deuses ruins.
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ANGLO VESTIBULARES
De noite Ci chegava rescendendo resina de pau, sangrando
das brigas e trepava na rede que ela mesmo tecera com fios do
cabelo. Os dois brincavam e depois ficavam rindo um pro outro.
Ficavam rindo longo tempo, bem juntos. Ci aromava tanto
que Macunaíma tinha tonteiras de moleza.
— Puxa! como você cheira, benzinho!
que ele murmuriava gozado. E escancarava as narinas mais.
Vinha uma tonteira tão macota5 que o sono principiava pingando das pálpebras dele. Porém a Mãe do Mato inda não estava
satisfeita não e com um jeito de rede que enlaçava os dois convidava o companheiro pra mais brinquedo. Morto de soneira,
infernizado, Macunaíma brincava pra não desmentir a fama só,
porém quando Ci queria rir com ele de satisfação:
— Ai! que preguiça!...
que o herói suspirava enfarado. E dando as costas pra ela
adormecia bem. Mas Ci queria brincar inda mais... Convidava
convidava... O herói ferrado no sono. Então a Mãe do Mato pegava na txara6 e cotucava o companheiro. Macunaíma se acordava dando grandes gargalhadas estorcegando de cócegas.
— Faz isso não, oferecida!
— Faço!
— Deixa a gente dormir, seu bem...
— Vamos brincar.
— Ai! que preguiça!...
E brincavam mais outra vez.
(in: ANDRADE, Mário de. Macunaíma — o herói sem nenhum
caráter. 4a. ed. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1965. pp. 22-23.)
Notas: 1. pessoa feliz na caça e na pesca, nos amores e nos negócios; 2. formiga avermelhada; 3. bebida excitante usada pelos índios; 4. viola rústica feita
de madeira de farã (árvore que nasce nas margens dos rios), cujo encordoamento é de tripa de macaco; 5. grande, enorme, mais importante; 6. flecha
sem penas, de três ou mais pontas, semelhando garfo ou ancinho.
2. a)Referindo-se a suas intenções ao escrever o livro Macunaíma, Mário de Andrade afirmou: “Um dos meus interesses foi desrespeitar lendariamente a geografia e a
fauna e flora geográficas”. No livro, esse “interesse” é
alcançado? Justifique brevemente.
Sim. Mário de Andrade, de acordo com sua proposta de
nacionalismo crítico, evita o regionalismo para conceber o
Brasil de modo unitário por meio do processo de “desgeograficação”, em que são misturadas a fauna, a flora, lendas e contos populares, bem como registros típicos da
linguagem de várias regiões do país. Como exemplos:
Macunaíma encontra o pássaro tuiuiú, típico do pantanal
mato-grossense, no sul do país; a lendária árvore Volomã
é deslocada do Amazonas para o Rio de Janeiro; Macunaíma, figura mítica da região de Roraima, migra para São
Paulo, para recuperar a muiraquitã, e percorre todo o
país; quando o herói sem nenhum caráter sente saudade
de sua terra natal, às margens do rio Uraricoera, vale-se
do vocábulo “querência”, que é um regionalismo gaúcho.
b)Sobre a personagem Macunaíma, Mário de Andrade afirmou: “É fácil de provar que estabeleci bem dentro de
todo o livro que Macunaíma é uma contradição de si
mesmo”. A afirmação sublinhada se justifica? Explique
sucintamente.
Sim. “Macunaíma é uma contradição de si mesmo”, como
afirmou Mário de Andrade, pois é uma personagem
marcada por características opostas: é herói e antiherói, corajoso e covarde, empreendedor e preguiçoso,
ingênuo e malicioso, sensual e contemplativo.
Texto para a questão 3
66. Botafogo etc.
Beiramarávamos em auto pelo espelho de aluguel arborizado
das avenidas marinhas sem sol.
Losangos tênues de ouro bandeiranacionalizavam o verde dos
montes interiores.
No outro lado azul da baía a Serra dos Órgãos serrava.
Barcos. E o passado voltava na brisa de baforadas gostosas.
Rolah ia vinha derrapava entrava em túneis.
Copacabana era um veludo arrepiado na luminosa noite varada
pelas frestas da cidade.
(Oswald de Andrade, Memórias sentimentais de João Miramar)
3. Pode-se afirmar que esse episódio-fragmento:
a)retrata a lua de mel de Miramar e Mlle. Rolah em Botafogo, valorizando o elemento visual da cena.
b)apresenta um feixe de imagens inadequado ao processo
caleidoscópico e cinematográfico, assumido pelo romance.
c) descreve as sensações do passeio sem fazer alusões, telegrafismos ou fracionar a realidade.
d)mostra flashes cinematográficos do passeio, revelando,
por completo, a paisagem, os objetos e os amantes.
e)evidencia o caráter imagístico-visual, por meio de um
enfoque metonímico e geometrizante da realidade.
Texto para a questão 4
pronominais
Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido
Mas o bom negro e o bom branco
Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
(Oswald de Andrade, Poesias Reunidas)
4. Neste poema, nota-se a veemência e a irreverência com
que Oswald de Andrade trata a gramática. Qual a alteração
fundamental que o Modernismo trouxe para a linguagem
literária?
O Modernismo libertou a literatura do código escrito
e de norma gramatical rígida. Introduziu a linguagem neológica, criativa, oral.
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Texto para a questão 5
O Último Poema
Assim eu quereria o meu último poema
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais
límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.
(Manuel Bandeira, Libertinagem)
5. Libertinagem, de Manuel Bandeira, é uma das obras mais
importantes da Literatura Brasileira. Nela, evidencia-se a
ideia básica do Modernismo: a liberdade. Assim sendo,
a)indique os temas que nesta obra caracterizam a liberdade de conteúdo;
Os temas de Libertinagem são um grito de liberdade em relação à poesia dominante no período
anterior, o Parnasianismo e o Simbolismo. Os principais índices de tal libertação são:
— Incorporação do cotidiano urbano: o dia a dia do
Texto para a questão 6
Poema só para Jaime Ovalle
Quando hoje acordei, ainda fazia escuro1
(Embora a manhã já estivesse avançada).
Chovia.
Chovia uma triste chuva de resignação.
Como contraste e consolo2 ao calor tempestuoso da noite.
Então me levantei,
Bebi o café que eu mesmo preparei,
Depois me deitei novamente, acendi um cigarro e fiquei pensando...
— Humildemente pensando na vida e nas mulheres que amei.3
(Manuel Bandeira, Belo, Belo)
Notas: 1. O poeta promove um jogo de relações interpolares, por meio de antíteses; 2. A palavra contraste aproxima coisas diferentes: a escuridão da manhã
e o calor da noite. Já consolo traduz o sentimento de perda: a manhã está
irremediavelmente escura como a noite; 3. Com humildade e ternura, o poeta
evoca o amor das mulheres como compensação para a angústia da solidão.
6. Sem poder olhar o mundo com lentes coloridas, uma vez
que sua vida era uma constante encruzilhada com a morte,
o poeta se resigna. Qual o verso que sugere mais intensamente a sensação de resignação e solidão?
“Humildemente pensando na vida e nas mulheres que
amei”
homem simples do Rio de Janeiro e da criança de
rua do Recife (“Poema tirado de uma notícia de
jornal”, “Tragédia brasileira”, “Profundamente”);
— Aproveitamento estilizado do folclore: imagens
da vida popular do Recife, com cores, casos e
falas regionais (“Evocação do Recife”, “Lenda
brasileira”);
—Confessionalismo: mitificação neorromântica de lances
autobiográficos, como a doença (tuberculose) e a morte
(“Pneumotórax”);
—Evasão: culto da liberdade em si, manifesta na fusão
surrealista de tempos, planos e formas(“Vou me embora pra Pasárgada”).
ORIENTAÇÃO DE ESTUDO
Caderno de Exercícios — Unidade III
Tarefa Mínima
b)valendo-se do trecho acima, explique como se dá a liberdade da forma.
A liberdade formal do texto em questão observa-se
quanto:
—à métrica: adoção do verso livre, isto é, sem medida prévia;
—à sintaxe: simples e direta, dominada pela repetição do mesmo esquema frasal (paralelismo);
—ao vocabulário: extraído do uso diário, da linguagem
coloquial.
AULA 23
• Faça os exercícios 3 a 7, série 13.
AULA 24
• Faça os exercícios 11, 13 a 20, série 13.
Tarefa Complementar
AULA 23
• Faça os exercícios 21 a 30, série 13.
AULA 24
• Faça os exercícios 31 a 40, série 13.
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