O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO PROCESSO LEGISLATIVO Maurício José de Mendonça Júnior1 Resumo: Este artigo tem por objetivo a análise do controle de constitucionalidade no processo legislativo, denominado pela doutrina de “controle prévio de constitucionalidade”, salientando suas peculiaridades e sua importância. Através do método dedutivo, com escopo e pesquisa bibliográfica e jurisprudencial, evidencia-se a importância da verificação da compatibilidade de projetos de lei com a Constituição, evitando-se assim, que atos normativos flagrantemente inconstitucionais sejam promulgados e publicados, produzindo indevidamente efeitos no ordenamento jurídico brasileiro, além de abarrotar o judiciário, em especial o Supremo Tribunal Federal. Palavras-chave: Controle de Constitucionalidade. Processo Legislativo. Controle pelo Poder Legislativo. Controle pelo Poder Executivo. Controle pelo Poder Judiciario. THE JUDICIAL REVIEW IN THE LEGISLATIVE PROCESS Abstract: This article it has for objective at analyzing the constitutional control in the legislative process, called the doctrine of “prior control of constitutionality”, pointing out its peculiarities and its importance. Through deductive method, with scope and bibliographical research and case law, it is proven the importance of checking the compatibility of laws project with the Constitution, thus avoiding that blatantly unconstitutional legislative acts are promulgated and published, producing undue effects on spatial Brazilian’s law, beyond packed the judiciary, especially the Supreme Court Key-words: Judicial Review. Legislative Process. Control by the Legislature. Control by the Executive. Control by the Judiciary. 1. INTRODUÇÃO É imprescindível esclarecer, antes de adentrar no cerne deste trabalho, que é requisito para a possibilidade do controle de constitucionalidade a existência de uma Constituição 1 Advogado, inscrito na OAB/MG sob o n. 114.218, Professor do curso de Direito da Universidade Presidente Antônio Carlos – campus Araguari, graduado pela Universidade Federal de Uberlândia, pós graduado em Direito Público pela Universidade Gama Filho. rígida, pressupondo-se assim, um escalonamento normativo, no qual a Carta Magna ocupa o grau hierárquico máximo, sendo desta feita, norma de referência para validade de todo o sistema. Além disso, é necessária a atribuição de competência a um órgão para solução dos problemas de inconstitucionalidade, órgão este que variará de acordo com o sistema de controle adotado, conforme será explanado. Nesse diapasão, emerge o Princípio da Supremacia da Constituição, que implica na conclusão de que, a partir daquela devem ser interpretadas as leis, e não vice-versa. Outrossim, a supremacia da “Lei Maior” ocorre âmbito material (supremacia de conteúdo) e no âmbito formal (tendo em vista possuir a Constituição processo legislativo de alteração mais dificultoso quando comparado ao das leis, o que enseja a superioridade hierárquica e possibilita de fato o controle). Portanto, em razão de tais expedientes, a Constituição é o parâmetro para o controle de constitucionalidade, e a lei questionada, o objeto deste, eis que deve respeitar o diploma normativo que está no “ápice da pirâmide” do ordenamento jurídico brasileiro. Desta forma, todo ato normativo deve obediência à Carta Magna, sob pena de ser afastado do sistema por vício de constitucionalidade, e portanto, essa verificação de compatibilidade deve ocorrer mesmo antes da publicação da lei, ou seja, em momento prévio àquele em que a lei se torna obrigatória, evitando-se assim, que um diploma inconstitucional tenha ultimado seu processo legislativo e gere efeitos no ordenamento jurídico, tendo que ser supervenientemente afastado pelo Poder Judiciário, o que por óbvio, gera grandes transtornos. 2. CONSIDERAÇÕES ACERCA DO CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO BRASIL Necessário é o esclarecimento da maneira como se dá o Controle de Constitucionalidade no Brasil, ou seja, como é feita a verificação de conformidade de um diploma normativo com a Carta Magna, e mais, quais as formas de inconstitucionalidade se apresentam e quais as modalidades de Controle. Nesse sentido, reitere-se que a nossa Constituição é classificada como rígida, e assim, o processo de alteração de suas normas é mais dificultoso se comparado à técnica prevista para modificação das normas infraconstitucionais. 2 Não por outro motivo, é imprescindível que a Constituição tenha supremacia sobre as demais normas, supremacia esta tanto material (relativa ao conteúdo) quanto formal (que possibilita a hierarquização), sob pena de estar relegada aos patamares legais. Desta forma, justamente por existir essa diferenciação de escalas no Direito, é que se possibilita o Controle de Constitucionalidade, que elege a Carta Maior como parâmetro. Isto posto, toda e qualquer Lei deve guardar respeito à Constituição, sob pena de ser extirpada do ordenamento jurídico. 3. AS FORMAS DE INCONSTITUCIONALIDADE Cinco são os critérios utilizados para estabelecer as “formas de inconstitucionalidade”. Primeiramente, quanto ao tipo de conduta praticada pelos Poderes Públicos, quando a inconstitucionalidade poderá ser por ação ou por omissão2. A primeira tange a uma conduta comissiva do Poder Público, que afronta a Carta Maior. A segunda, implica no não atendimento de uma exigência, de um comando da Constituição Federal, que acaba por causar o que o Ministro do Supremo Tribunal Federal, Celso de Melo, forte no autor alemão Karl Loewenstein, tem chamado de “Síndrome da Erosão da Consciência Constitucional”3, que consiste num processo de desvalorização funcional da Constituição escrita, vez que, se a Carta Constitucional impõe dever ao Poder Público, e este o descumpre, gera-se uma desvalorização, um descrédito na Constituição. Nesse sentido, a omissão estipula tal fenômeno. Como segundo critério, é possível classificar a forma de inconstitucionalidade quanto à norma constitucional ofendida, isto é, como uma referência não ao objeto, mas ao parâmetro para o Controle de Constitucionalidade. Nesse diapasão, a inconstitucionalidade poderá ser material, que é aquela em que ocorre a violação de um Direito consagrado no texto constitucional, ou formal, quando a norma viola procedimento estabelecido na Constituição, a exemplo de um vício de iniciativa, na discussão, votação, aprovação, fases do processo legislativo. Por curiosidade, aponte-se que eventual vício de iniciativa do projeto de lei, conforme novo entendimento do Supremo Tribunal Federal, é insanável pela sanção do Presidente da República, restando superada a Súmula n. 05 daquele tribunal, que possuía texto contrário ao alvitre ora exposto. 2 CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito constitucional e Teoria da Constituição. 4ª ed. Coimbra: Almedina, 1998, p 980-984. 3 STF, MI/DF 708. Relator Min. Gilmar Mendes, Plenário, DJe 31.10.2008. 3 Em terceiro lugar e de forma bastante singela, a inconstitucionalidade pode também ser classificada quanto à extensão, oportunidade em que será total, se todo o dispositivo é incompatível com a Constituição, ou parcial, se a inconstitucionalidade é de uma palavra ou expressão dentro de uma frase. Classifica-se ainda a inconstitucionalidade quanto ao momento em que ocorre a Declaração do vício, a saber: originária ou supervenientemente. Neste caso, analisar-se-á o interregno em que surgiram o parâmetro do controle e o objeto do controle. Explique-se com um exemplo. Se o parâmetro, a “norma de referência” é a Constituição de 1998, e o objeto do Controle é uma Lei de 1990, incompatível com a Carta Magna, a inconstitucionalidade é originária, ou seja, desde a origem, vez que o objeto já “nasceu” inconstitucional. Em síntese, o objeto é posterior ao parâmetro. Já se a Lei foi confeccionada sob a égide de outra Constituição, isto é, o objeto é anterior ao parâmetro, o caso é de inconstitucionalidade superveniente. Caso concreto: Lei 5.250/67 (Lei de Imprensa), que foi editada quando vigorava a Constituição de 1967, e com o advento da nova Constituição, tornou-se incompatível com esta. Contudo, merece referência o fato de que a expressão “inconstitucionalidade superveniente”, no Brasil, não é utilizada. Em nosso país, o termo preferido pela Doutrina, e pelos Tribunais, conforme se nota no julgado que afastou a Lei de Imprensa do ordenamento jurídico4, é de “Não-Recepção”, havendo manuais de Direito Constitucional que sequer admitem a existência daquela denominação. A despeito disso, é uma expressão muito utilizada em vários países, sobretudo na Europa, a exemplo de Portugal, que consagra citado termo em sua Constituição5. Por último, a divisão de formas de inconstitucionalidade quanto ao prisma de apuração: inconstitucionalidade antecedente (também chamada de “Direta”, pois não há ato intermediário entre a Constituição e a norma que a ofende), conseqüente (quando a inconstitucionalidade de um ato normativo deriva de outra norma, esta sim inconstitucional, como no caso de um Decreto de um Governador de Estado, exarado para regulamentar os efeitos de uma lei inconstitucional – caso em que, o Decreto poderá também ser declarado inconstitucional através da técnica da “Inconstitucionalidade por Arrastamento” ou “por Atração” 6), e reflexa (quando Lei sob a qual se funda um Decreto é “constitucional”, mas este a contraria ou a exorbita, e assim, é ilegal. Se ilegal, inconstitucional de forma reflexa – 4 STF, ADPF 130. Relator Min. Ayres Britto, Decisão Monocrática Final, DJ 06.11.2009. Republicação 25.02.2010. 5 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª Ed. São Paulo: Método, 2010, p.225. 6 STF, ADI 3645/PR. Relatora Min. Ellen Gracie, Plenário, DJ 01.09.2006. 4 ou obliqua, pois a Constituição determina que os Decretos regulamentem a Lei, não podendo extrapolá-la ou exorbitá-la, conforme previsão do artigo 84, inciso IV: “Compete privativamente ao Presidente da República: IV – sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução”). 4. FORMAS DE CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE Aqui a divisão se dá com base na forma de Controle de Constitucionalidade, e não sob o prisma da modalidade de inconstitucionalidade. A princípio, o Controle de Constitucionalidade pode ser dividido em “Jurisdicional” ou “Político”, a depender da natureza do Órgão que irá exercer o Controle. Nessa linha, Controle de Constitucionalidade Jurisdicional é aquele feito por um Órgão do Judiciário. Nosso sistema é chamado de Jurisdicional, pois conquanto o Controle possa ser feito pelo Poder Legislativo ou pelo Executivo, como se aprofundará em tópicos específicos, a função principal para tanto é do Judiciário. Já a modalidade “Controle Político” é conceituada por exclusão, ou seja, é o controle que não é feito pelo Judiciário, mas por um Órgão que não tem natureza jurisdicional, como Legislativo ou o Executivo. Como exemplo, o “Conselho Constitucional na França” (“Conseil Constitutionnel”), que não é Órgão do Judiciário, e sim um Órgão de Cúpula, composto, dentre outros membros, por todos os ex Presidentes franceses (que podem inclusive escolher a matéria que irão votar)7. É um Conselho que faz um controle de político e está acima da jurisdição jurisdicional e da jurisdição administrativa. Em segundo lugar, o Controle pode ser fracionado em Preventivo ou Repressivo, e isso, em alusão ao momento de sua realização8. É uma classificação que muito interessa a este trabalho, focado no Controle Preventivo de Constitucionalidade, que ocorre no desenvolver do Processo Legislativo, e é exercido por qualquer dos três Poderes. O Controle Preventivo é aquele realizado antes da inconstitucionalidade ocorrer, ou seja, com vistas a impedir que um projeto de lei seja aprovado contrariando a 7 8 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª Ed. São Paulo: Método, 2010, p.229-230. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª Ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 714. 5 Constituição. Pode ser exercido tanto pelo Poder Legislativo, quanto pelos Poderes Judiciário e Executivo9, como se explanará no decorrer do trabalho. O Controle Repressivo, por sua vez, é exercido diante de uma violação concreta, e não mais de uma ameaça, ou seja, é realizado quando o ato impugnado já está em vigor. Também pode ser exercido pelos três Poderes, embora seja praticado comumente pelo Judiciário, através do Controle Difuso e do Controle Concentrado de Constitucionalidade10. Nesse ínterim, esclareça-se, quanto ao Controle Repressivo exercido pelo Poder Legislativo, que este ocorre nas hipóteses do artigo 49, inciso V da Constituição, que possibilita ao Congresso Nacional “sustar os atos normativos do Poder Executivo que exorbitem do poder regulamentar ou dos limites de delegação legislativa”, bem como do artigo 62, através do controle das Medidas Provisórias, vez que o Congresso Nacional poderá rejeitá-las por entendê-las inconstitucionais, conforme ensinamentos do professor Pedro Lenza: A segunda exceção à regra geral está prevista no artigo 62 da CF/88. Como veremos adiante, em caso de relevância e urgência, o Presidente da República poderá adotar medidas provisórias, com força de lei, devendo submetê-las de imediato ao Congresso Nacional (poder legislativo). Entendendo-a inconstitucional (vejam: as medidas provisórias tem força de lei), o Congresso Nacional estará realizando controle de constitucionalidade. Trata-se de exceção à regra geral haja vista que, nesta hipótese, o controle não é exercido pelo Judiciário (lembrem: o Brasil adotou o sistema de controle jurisdicional misto), mas sim pelo Legislativo11. Diga-se ainda que também o Tribunal de Contas, órgão auxiliar do Legislativo, pode, dentro da atividade de fiscalização, realizar controle de constitucionalidade, conforme enunciado da súmula n. 347 do Supremo Tribunal Federal: “O Tribunal de Contas, no exercício de suas atribuições, pode apreciar a constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público”. No que tange ao Poder Executivo e o Controle Repressivo, pode o chefe daquele negar cumprimento a uma lei que entenda ser inconstitucional. Contudo, alerta a doutrina12 que, para não ser caracterizado crime de responsabilidade, e para que não haja, por exemplo, possibilidade de intervenção federal no Estado, ou estadual no Município, o chefe do Executivo deverá motivar o seu ato e dar a ele publicidade. 9 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires Coelho; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 1055-1056. 10 BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 114. 11 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, cit, p.140. 6 Esclarecido isto, passe-se a um terceiro critério, que divide o Controle de Constitucionalidade em Difuso e Concentrado. Nessa linha, o diferenciador é o órgão do Poder Judiciário responsável pelo Controle13. Não importa, aqui, a ação ajuizada, e sim o órgão que realiza a verificação de constitucionalidade. Controle difuso é aquele exercido por qualquer órgão do Judiciário. É também denominado de controle “aberto”, pois não existe restrição com relação a qual órgão irá exercê-lo. É conhecido como “sistema norte-americano”, pois neste país é apontado seu surgimento, no conhecido caso “Marbury x Madison” 14. É importante lembrar que, no Brasil, em regra, essa modalidade de controle apenas gera efeitos “inter partes”, e não para todos, embora existam mecanismos constitucionais para correção desta distorção, a exemplo, em primeiro lugar, da possibilidade de Resolução do Senado Federal suspendendo a execução da Lei, conforme artigo 52, inciso X da Constituição: Art. 52. Compete privativamente ao Senado Federal: (...) X – suspender a execução, no todo ou em parte, de lei declarada inconstitucional por decisão definitiva do Supremo Tribunal Federal; Em segundo lugar, através da súmula vinculante (artigo 103-A da Constituição), com a qual o entendimento do Supremo Tribunal Federal vinculará os demais tribunais no julgamento de casos análogos: O Supremo Tribunal Federal poderá, de ofício ou por provocação, mediante decisão de dois terços dos seus membros, após reiteradas decisões sobre matéria constitucional, aprovar súmula que, a partir de sua publicação na imprensa oficial, terá efeito vinculante em relação aos demais órgãos do Poder Judiciário e à administração pública direta e indireta, nas esferas federal, estadual e municipal, bem como proceder à sua revisão ou cancelamento, na forma estabelecida em lei. Já o controle concentrado é aquele que se concentra em apenas um tribunal, aquele reservado a somente um órgão jurisdicional. No Brasil, se o parâmetro é a Constituição Federal, esse órgão será o Supremo Tribunal Federal. Se o parâmetro é a Constituição Estadual, será o Tribunal de Justiça do 12 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª Ed. São Paulo: Método, 2010, p.228. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 32ª. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 5051. 14 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008, p.144-145. 13 7 Estado. É um sistema conhecido como “europeu” ou “austríaco”, porque lá surgiu em 1920, com Hans Kelsen15. Em nosso país, é conhecido desde 1965, com a emenda constitucional n. 16/65, que introduziu tal modalidade na Constituição de 1946, repetida nos diplomas ulteriores. 5. NORMAS DE REFERÊNCIA PARA O CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO PR OCESSO LEGISLATIVO É imperioso o esclarecimento acerca de quais as normas constitucionais servem de parâmetro para o Controle Prévio de Constitucionalidade, ou, como expressado pelos tribunais pátrios, quais as “normas de referência” para o controle em questão. Nesse diapasão, clarifique-se que o Preâmbulo da Constituição não pode ser utilizado para Controle, como já decidiu nossa Corte Maior16, pois segundo referido Tribunal, não se trata de norma constitucional, mas de mera diretriz, singela orientação. Assim, serão normas de referência quaisquer dos artigos vigentes da Constituição, e mais, os dispositivos do ADCT – Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, e os Princípios Implícitos da Constituição (segundo entendimento doutrinário majoritário) 17. Além destes, a partir de 2004, em razão da emenda constitucional n. 45, também são normas-parâmetro os tratados internacionais de direitos humanos que forem aprovados na forma do artigo 5º, parágrafo 3º da Constituição, ou seja, em procedimento análogo ao adotado para aprovação de uma emenda à Constituição, a saber: “os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais”. Portanto, o Controle de Constitucionalidade Prévio, isto é, o controle realizado sobre projetos de lei, em sentido amplo, deve ser realizado em atenção a todas as normas expostas, e não somente com base na própria Constituição, ao que os Ministros do Supremo Tribunal Federal tem chamado de “Bloco de Constitucionalidade” 18. 6. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO PROCESSO LEGISLATIVO REALIZADO PELO PODER LEGISLATIVO 15 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª Ed. São Paulo: Método, 2010, p.231-232. STF, ADI 2076/AC. Relator Min. Carlos Velloso, Plenário, DJ 08.08.2003. 17 NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Método, 2010, p. 220. 18 STF, ADI 514/PI. Relator Min. Celso de Mello, Decisão Monocrática Final, DJ 24.03.2008. 16 8 Como já mencionado, o Controle Preventivo de Constitucionalidade é realizado antes da inconstitucionalidade ocorrer, ou seja, a verificação de compatibilidade com a Constituição ocorre ainda na tramitação do projeto de Lei. Nesse sentido, o Poder Legislativo realiza o tal controle através de Comissões prórpias para tanto, que analisam o projeto antes de ser votado, e dão Parecer pela sua constitucionalidade ou não. No Senado Federal, o controle será exercido pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, conforme artigo 101 de seu regimento interno, verbis: Art. 101. À Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania compete: I – opinar sobre a constitucionalidade, juridicidade e regimentalidade das matérias que lhe forem submetidas por deliberação do Plenário, por despacho da Presidência, por consulta de qualquer comissão, ou quando em virtude desses aspectos houver recurso de decisão terminativa de comissão para o Plenário; (...). Já na Câmara dos Deputados, o controle será realizado pela Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, nos termos do artigo 32, inciso IV, abaixo: Art. 32. São as seguintes as Comissões Permanentes e respectivos campos temáticos ou áreas de atividade: (...) IV – Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania: a) aspectos constitucional, legal, jurídico, regimental e de técnica legislativa de projetos, emendas ou substitutivos sujeitos à apreciação da Câmara ou de suas Comissões; b) admissibilidade de proposta de emenda à Constituição; c) assunto de natureza jurídica ou constitucional que lhe seja submetido, em consulta, pelo Presidente da Câmara, pelo Plenário ou por outra Comissão, ou em razão de recurso previsto neste Regimento; (...). Tais Comissões podem arquivar projetos de lei por entendê-los inconstitucionais. Nesse caso, debate interessante surge a respeito da vinculação ou não de tal decisão, ou seja, questiona-se se a declaração de inconstitucionalidade por parte da Comissão inviabiliza o prosseguimento do projeto de Lei. A resposta é encontrada no Regimento Interno de cada Casa. No Senado Federal, caso a Comissão opine pela inconstitucionalidade, a proposição será considerada rejeitada e será arquivada definitivamente, por despacho de seu Presidente. Contudo, na hipótese de não 9 unanimidade do Parecer, e desde que haja recurso de no mínimo 1/10 dos membros manifestando opinião favorável ao processamento do projeto, conforme artigo 254 daquele diploma, a tramitação prosseguirá, seguindo-se a discussão e a votação: Art. 254. Quando os projetos receberem pareceres contrários, quanto ao mérito, serão tidos como rejeitados e arquivados definitivamente, salvo recurso de um décimo dos membros do Senado no sentido de sua tramitação. Parágrafo único. A comunicação do arquivamento será feita pelo Presidente, em plenário, podendo o recurso ser apresentado no prazo de dois dias úteis contado da comunicação. Em diapasão semelhante, o Regimento Interno da Câmara dos Deputados, nos artigos 132 e seguintes, estabelece que o Parecer da competente Comissão será terminativo, existindo, no entanto, a previsibilidade de Recurso ao Plenário da Casa contra a deliberação: Art. 132. Apresentada e lida perante o Plenário, a proposição será objeto de decisão: I – do Presidente, nos casos do art. 114; II – da Mesa, nas hipóteses do art. 115; III – das Comissões, em se tratando de projeto de lei que dispensar a competência do Plenário, nos termos do art. 24, II; IV – do Plenário, nos demais casos. § 1o Antes da deliberação do Plenário, haverá manifestação das Comissões competentes para estudo da matéria, exceto quando se tratar de requerimento. § 2o Não se dispensará a competência do Plenário para discutir e votar, globalmente ou em parte, projeto de lei apreciado conclusivamente pelas Comissões se, no prazo de cinco sessões da publicação do respectivo anúncio no Diário da Câmara dos Deputados e no avulso da Ordem do Dia, houver recurso nesse sentido, de um décimo dos membros da Casa, apresentado em sessão e provido por decisão do Plenário da Câmara. De outro norte, caso referidas Comissões optem pela constitucionalidade do projeto normativo, o mesmo seguirá normalmente à discussão e votação, e em caso de aprovação será enviado ao Executivo, com vistas à sanção ou veto. Por fim, cite-se que o Controle Prévio de Constitucionalidade realizado pelo Poder Legislativo também pode ocorrer no Plenário das referidas Casas, durante as votações exaradas por cada parlamentar. 7. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO PROCESSO LEGISLATIVO REALIZADO PELO PODER EXECUTIVO 10 Também o Poder Executivo realiza Controle Preventivo de Constitucionalidade. Isto porque, tal Poder participa do processo de formação das leis através da sanção ou veto do chefe do Executivo, determinando via de regra, ainda, a promulgação e a publicação das leis. Nesse sentido, e tomando por base a esfera federal, quando um projeto de lei chega “às mãos” do Presidente da República, o mesmo pode vetá-lo por entendê-lo inconstitucional, e justamente aí que se dá a modalidade de controle ora em estudo. Tal possibilidade, nomeada pela Doutrina de “Veto Jurídico”, está expressa no artigo 66, parágrafo 1º da Constituição Federal, verbis: Art. 66. A Casa na qual tenha sido concluída a votação enviará o projeto de lei ao Presidente da República, que, aquiescendo, o sancionará. § 1o Se o Presidente da República considerar o projeto, no todo ou em parte, inconstitucional ou contrário ao interesse público, vetá-lo-á total ou parcialmente, no prazo de quinze dias úteis, contados da data do recebimento, e comunicará, dentro de quarenta e oito horas, ao Presidente do Senado Federal os motivos do veto. (...). Outrossim, e a titulo de complementação, o Presidente da República pode ainda vetar um projeto de lei por entendê-lo contrário ao interesse público, quando faz então uma análise política do projeto de Lei, e não jurídica. Tal veto, em contraposição ao “Veto Jurídico”, é denominado de “Veto Político”. 8. CONTROLE DE CONSTITUCIONALIDADE NO PROCESSO LEGISLATIVO REALIZADO PELO PODER JUDICIÁRIO O Poder Judiciário, embora seja em regra o responsável pela feitura do controle repressivo de constitucionalidade, difuso ou concentrado, como já exposto, exercerá excepcionalmente o Controle Preventivo de Constitucionalidade, e isso através de mandado de segurança impetrado por parlamentar, quando não for observado o devido processo legislativo constitucional. Nesse sentido, clarifique-se, não é um controle que tem por finalidade principal assegurar a supremacia da Constituição Federal, mas sim um direito subjetivo do parlamentar ao devido processo legislativo constitucional, direito este líquido e certo. Assim, o único legitimado a impetrar o remédio constitucional é o parlamentar, e mais do que isso, somente o parlamentar da Casa na qual o projeto está em tramitação. Esse o entendimento do Supremo Tribunal Federal. 11 Um exemplo desta possibilidade ocorreu quando da tramitação da proposta de emenda constitucional que tinha por objetivo a fixação de pena de morte para autores de crimes hediondos, e cuja tramitação foi afastada pela Corte Constitucional por ferir o artigo 60 da Constituição, parágrafo 4º: “Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: I – a forma federativa de Estado; II – o voto direto, secreto, universal e periódico; III – a separação dos poderes; IV – os direitos e garantias individuais.”. O Supremo Tribunal Federal, inclusive, tem vários julgados nesse sentido19, eis que, não pode haver no Congresso, proposta de emenda tendente a abolir cláusula pétrea, pois nessa hipótese a Constituição já estará sendo violada, e portanto o devido processo legislativo já estará sendo desobedecido, possibilitando ao parlamentar da Casa que ajuíze mandado de segurança para garantir seu direito líquido e certo ao devido processo legislativo constitucional. Por derradeiro, clarifique-se que esse tipo de controle se dá de modo incidental, isto é, pela via de exceção, no caso concreto, pois o que se protege em primeiro lugar não é a Constituição (como ocorre no controle abstrato ou por via principal), mas sim, repita-se, um direito subjetivo do parlamentar. Apenas incidentalmente é analisada a inconstitucionalidade. 9. CONSIDERAÇÕES FINAIS O presente trabalho procurou demonstrar como é feita e como é importante a verificação da constitucionalidade dos projetos de lei, ou seja, a confrontação com a Constituição ainda na tramitação dos atos normativos. Mais do que isso, procurou-se esclarecer, ao contrário do que se pensa comumente, que não só o Poder Legislativo realiza esse “Controle Prévio” de constitucionalidade, mas todos os Poderes, fortes na idéia de inter relação e controle mútuo entre os mesmos. Assim, o controle preventivo de constitucionalidade, como apresentado, é o realizado durante o processo legislativo de formação do ato normativo, isto é, durante as fases de iniciativa, discussão, votação, aprovação, sanção ou veto. Ressalte-se a importância da análise da compatibilidade de projetos de Lei com a Constituição, porquanto assim se evita que atos normativos inconstitucionais cheguem ao ponto de transformarem-se em Leis, gerando indevidamente, por conseguinte, efeitos nas relações jurídicas de terceiros, causando grande prejudicialidade, até que venham a ser afastados. 12 Além disso, um controle fragmentado da constitucionalidade possibilita um integração entre os Poderes, e mais, não abarrota a Corte Constitucional com inconstitucionalidade flagrantes, passiveis de serem apontadas e dirimidas já na tramitação do projeto. 10. REFERÊNCIAS BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 6ª ed. São Paulo: Malheiros, 1996. BULOS, Uadi Lammêgo. Curso de Direito Constitucional. 2ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 4ª. ed. Coimbra: Almedina, 1998. LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 12ª ed. São Paulo: Saraiva, 2008. MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009. MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 27ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 4ª ed. São Paulo: Método, 2010. SILVA, José Afonso da. Direito Constitucional Positivo. 32ª ed. São Paulo: Malheiros, 2009. http://www.stf.jus.br/portal/principal/principal.asp. Acesso em 10.11.2011. 19 STF, MS 20.257, MS 20.257, MS 21.754, MS 21.648, MS 22.183. 13