Uma Jornada de Martius e Spix: do Rio de Contas a São Félix
WJ Manso de Almeida
As publicações feitas pelos naturalistas do século XIX põem em relevo certo
entrosamento entre a ciência e a arte: a sofisticação na condução das
investigações, a beleza do objeto de estudo, o bom gosto das ilustrações
necessárias, a civilidade na consideração das diferentes opiniões. Eis, pois,
que as considerações científicas eram feitas em latim, numa linguagem
cuidada, para que pudesse continuar perfeitamente compreensível no futuro,
elegia-se o latim ou o grego clássico para a denominação das espécies, os
desenhos explicativos eram entregues a habilidosos profissionais, verdadeiros
artistas do gênero, enquanto os trabalhos eram revistos continuamente, em
função das mais recentes descobertas dos colegas. Conforme observou Lord
Kenneth Clark, antigo Slade Professor de Belas Artes da Universidade de
Oxford, a respeito do esmerado e rebuscado acabamento que se dava aos
instrumentos de astronomia, a ciência e a arte ainda andavam juntas, naqueles
tempos. A Flora Brasiliensis, cujo principal responsável é o renomado Carl F.
Ph. von Martius, parece constituir perfeito exemplo daquelas obras. Segundo
opiniões, trata-se, até hoje, do mais completo levantamento da flora do país, o
melhor guia para investigações e tira-teima para numerosas questões, entre
tantas outras qualidades que exibe, além de oferecer um conjunto primoroso de
pranchas ilustrativas de grande beleza. Pari passu, faz uso da língua latina,
não mais sujeita às alterações cotidianas e aos modismos que experimentam
os idiomas correntes, conferindo elegância e segurança na comunicação das
questões tratadas e das conclusões então propostas.
Na especialidade da botânica, tudo parece muito bonito. Afinal, o estudioso
dedica-se ao conhecimento das flores. Mas, para conhecer o perfume e a
beleza da flora, por muitíssimas vezes, esses cientistas incorreram em
situações por demais pedestres, até mesmo, de grandes sofrimentos, e
momentos de extrema gravidade, em que a morte esteve próxima. Na verdade,
nas suas excursões em território brasileiro ou em função dessas pesquisas de
campo, alguns estudiosos sucumbiram ou caíram irremediavelmente doentes.
Taunay, Langsdorf e Saint-Hilaire são nomes que lembram aquelas tristes e
lamentáveis ocorrências. Nos dias de hoje, cheios de comodidades, parece
difícil avaliar o que venha a ser caminhar ou cavalgar por milhares de
quilômetros, através de um país enorme e desconhecido, pouco povoado,
cujos habitantes, selvagens, com frequência, não falam outra língua senão a
sua própria, com todo o dinheiro necessário nos bolsos ou no alforje da
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montaria, as roupas de vestir reduzidas, racionalmente, ao mínimo, as quais
deveriam durar não se sabe quanto tempo, prescindindo, forçosamente, de
cuidados de higiene pessoal, não dispondo de medicamentos para os males,
por certo desconhecidos, que poderiam afligir o viajante, precisando reservar
os animais de carga para o material de pesquisa recolhido ao longo do
caminho, tudo devendo ser devidamente acondicionado para servir aos
estudos de laboratório de além-mar, depositando confiança num guia
contratado sabe-se lá onde, às vezes, carente de referências que o abonassem
de boa fé, enfim, talvez com muita dificuldade, se pudesse avaliar, atualmente,
as dimensões daquelas aventuras de outrora. Entre o beneplácito do rei
estrangeiro, acrescido das boas-vindas dadas pelo soberano brasileiro, e o
incerto retorno do explorador das matas, correria muito tempo, sem dúvida.
Caso tudo andassem bem, quantos anos? Não se sabia. Auguste de SaintHilaire, por exemplo, na sua viagem inaugural às Minas, gastou quase um ano
inteiro. Ao todo, a sua primeira estada no Brasil consumiu-lhe quatro anos.
Eram aventureiras, de fato, aquelas demoradas excursões. E, foram grandes,
destemidos aventureiros, aqueles naturalistas de antigamente.
No dia 17 de outubro de 1818, Carl von Martius e Johan von Spix partiam da
Vila de Rio de Contas, nos píncaros meridionais da Chapada Diamantina, para
cruzar o território do interior baiano até São Félix, nos fundos da Baia de Todos
os Santos, onde deságua o rio Paraguassu. A rota que para tanto escolheram
foi considerada temerária, até mesmo pelo guia e capataz que contrataram na
Vila. Conforme registrou Martius no seu diário de viagens, esse mesmo tropeiro
desaconselhara, vivamente, que os dois naturalistas tomassem tal caminho. E,
a propósito, esticou-lhes um longo cordão de desafios e percalços que
certamente iriam encontrar. Alertava-lhes, em particular, quanto ao trecho entre
o vale do Sincorá e o povoado de Maracás, vinte léguas adiante, onde a
estiagem reinante prometia rios secos e completa falta d’água para os homens
e os animais. Todavia, o desejo de conhecer a natureza daquelas paragens e o
entusiasmo científico não deixaram que esmorecessem na escolha feita.
O trajeto significava descer as escarpas a leste da Vila até o largo vale que se
espalha às margens do rio de Contas, transpor esse curso, galgar os
contrafortes e as escarpas ocidentais da serra do Sincorá, seguir no sentido
leste ao longo da sua chapada em declive, atravessar o rio Sincorá e, a partir
de daí, enfrentar o mais temível estirão da jornada, até Maracás. Entre a Vila
do Rio de Contas e o sopé da serra do Sincorá, os dois naturalistas e sua
comitiva esperavam contar com apoio na Casa de Telha, naqueles tempos,
uma fazenda de certo porte. Vencida a serra, novos suprimentos deveriam ser
encontrados num lugarejo pertencente à comarca de Sincorá, localizado num
planalto da serra. Depois disso, não se sabia dizer onde se abasteceriam
novamente, até chegar a Maracás. Contudo, antes de alcançar esse povoado,
fiavam encontrar água no rio Jacaré, o qual, o seu caminho, deveria cruzar. De
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Maracás para adiante, até São Félix, a jornada deveria ser menos difícil, pois
que iriam descendo do planalto interior para os terrenos mais baixos da costa
marítima, os quais eram, também, mais habitados.
Segundo Martius, fora com pesar que, ele e Spix, deixaram a aprazível
cidadezinha de Rio de Contas, aninhada no planalto da serra, com o seu clima
ameno de altitude e a sua gente hospitaleira, o solo e a vegetação fazendolhes lembrar do Tejuco, das Minas Gerais. Esse rico povoado de muita gente
instruída tinha uma população de tão somente novecentos habitantes, na
ocasião da visita daqueles naturalistas alemães. As suas lavras de ouro já se
esgotavam de vez. Nos dias de hoje, a Vila do Rio de Contas é um primor de
relíquia histórica, com as suas ruas bem cuidadas, o seu casario, quase todo
térreo e despretensioso, de fachadas bem pintadas, preservadas ou
recuperadas, a sua bonita igrejinha branca de uma só torre, devotada ao
Santíssimo Sacramento, o prédio de grande presença da sua antiga Câmara,
uma construção retangular de quatro águas, colunas e molduras das portas e
janelas em arenito, as suas duas amplas praças públicas bem calçadas, numa
das quais ainda se encontra o Teatro São Carlos, fundado em 1892. Ora, veja.
São Carlos! O nome do mais nobre teatro da Lisboa antiga. Parece que,
apenas a sua distância em relação aos grandes centros urbanos, impede o
maior afluxo de turistas à simpática cidadezinha da Chapada Diamantina.
A descida das escarpas a leste da Vila, assim como a subida daquelas do lado
ocidental da serra do Sincorá, não constitui tarefa fácil. Mesmo nos dias atuais,
não se trata de uma travessia a ser feita de carro, cujas estradas nem constam
dos mapas rodoviários baianos mais divulgados. Nessa primeiríssima etapa da
jornada, Martius e Spix pousaram na Casa de Telha, então uma vasta fazenda
de cultivo do algodão, onde, todavia, não puderam obter reforço de provisões
para a alimentação da tropa. Duas léguas adiante, tendo cruzado o rio de
Contas, estiveram na Fazenda do Seco, à qual parece corresponder o atual
povoado do Seco, de acesso ainda pouco facilitado, aliás. Vencendo o vale, a
comitiva inicia a subida de contrafortes íngremes e de escarpas, que Martius
identifica como sendo a serra das Lajes, para atingir uma chapada, que se
estende até os sopés das altas cristas de montanha do Sincorá. Aí
encontraram um pequeno povoado, cujo pároco veio dar-lhes as boas-vindas.
Novamente, nessas elevações, Martius encantou-se com o clima, a paisagem,
as formações rochosas e as espécies florais. Embora tenha indicado, apenas,
tratar-se de uma povoação da freguesia do Sincorá, uma recente visita ao local
aponta que aquela localidade corresponderia, muito provavelmente, à atual
cidade de Barra da Estiva. Conta, o naturalista, que aí tentaram, novamente,
obter reforço de provisões para a continuação da viagem. Foram infrutíferas,
porém, até as providências tomadas pelo vigário da paróquia, que se dispusera
a ajudá-los. Pela segunda vez, viam-se frustrados na busca de se abastecerem
de alimentos e forragem. Não lhes restava outra opção que seguir em frente,
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transpor as elevações da serra e descer os seus patamares do lado leste, no
sentido do vale do rio Sincorá. As suas preocupações aumentaram, quando,
naquele trecho de subidas, constataram que a maioria das suas mulas de
carga achava-se doente. Soltas à noite anterior para pastarem, ingeriram ervas
venenosas, que lhes deixaram arquejantes, exauridas das suas forças. A
fraqueza dos animais manifestava-se tanto mais nas rampas íngremes, quando
se arriavam ao chão, as suas cargas tendo de ser aliviadas e levadas nos
ombros até o dobrar do morro. Na descida para o vale do Sincorá, as
crescentes preocupações com o abastecimento de gêneros impediam aos
naturalistas a devida atenção à flora que pretendiam, com vagar, estudar na
região. Martius registra, com certa tristeza, o pouco tempo que pudera
despender na coleta das plantas encontradas ao longo do caminho, sem a
possibilidade de estudá-las adequadamente no seu habitat natural. Chegaram,
afinal, a uma chapada baixa, onde se situava uma fazenda denominada dos
Carrapatos, conforme anotações do diário do naturalista. Segundo Martius,
achavam-se, então, no umbral daquele mais temido trecho da jornada,
porquanto, numa distância de vinte léguas, não poderiam contar nem com
novas provisões para os muares nem com água, quer para os animais quer
para si próprios. A tropa doente e carente de forragem, a falta d’água que se
anunciava desde já, as vinte léguas a serem cumpridas e, para cumular o
desespero dos dois naturalistas, a constatação de que, da noite anterior para a
manhã daquele dia, o seu guia e capataz tinha desaparecido. Depois de
procurá-lo até altas horas da noite naqueles ermos, imaginando que algum
acidente tivesse ocorrido, Martius e Spix tiveram de se convencer de que o
tropeiro fugira, desistindo de enfrentar aquele trecho de viagem que a todos
metia medo.
O vale do alto curso do rio Sincorá mostra-se de notável declive, bastante
estreito e, o seu leito fluvial, entulhado de enormes pedras e grandes matacões
rolados, como que indicando um caudal volumoso e revolto nas cheias. Na
estação do estio, ou nas estiagens, o volume das suas águas é, nessas alturas,
muito reduzido: pouca água correndo através do pedrouço e sobre os curtos
patamares cheios de areias coloridas, conforme se pôde constatar numa
excursão em abril de 2012. Alguns quilômetros depois de atravessá-lo, chegase à pequena cidade de Triunfo do Sincorá, entrando-se numa região em que o
solo apresenta-se progressivamente mais seco, arenoso ou síltico, enquanto a
cobertura vegetal vai definindo-se, mais e mais claramente, como de caatinga.
Os arbustos de muitos ramos e pequenas folhas, fartos de espinhos,
entrelaçados entre si, passam, desse modo, a constituir os elementos
predominantes da formação regional e cerram os espaços e as passagens,
como nenhuma outra vegetação é capaz. Vistos à distância, os campos
mostram-se muito homogêneos e as suas grandes extensões desabitadas, ou
pouco habitadas, trazem ao viajante a sensação do ermo, do distanciamento,
da falta de amparo. De fato, nem vale a pena pensar num acidente qualquer
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nessas paragens, o isolamento em que se pensa achar-se parece suficiente
para aumentar o menor infortúnio imaginado. Tal como no caso de uma pessoa
que, buscando sobreviver, estivesse no meio de uma densa mata do litoral, ou
nos cumes interiores de uma grande serra, era realmente desesperadora a
situação de Martius e Spix, naquele portal do temerário.
À frente, estendia-se um vasto panorama de caatinga ressecada, a qual invadia
os caminhos, transformando-os em apertadas trilhas que, para a passagem
das mulas com as suas cargas volumosas, exigiam ser alargadas a golpes de
facão – conforme relata o naturalista, no seu diário. Visando garantir as suas
vidas em primeiro lugar, Martius e Spix decidiram abandonar parte das
coleções de espécimes de plantas, pedras e animais que, com tanto cuidado,
tinham conseguido formar, tudo escondendo numa grota que julgaram ser de
fácil identificação posteriormente, assim como entregar, à própria sorte, os
animais que se achavam por demais doentes ou exaustos para continuar
viagem. Mesmo assim aliviados, a água fazia-se escassa e a alimentação para
a tropa impossível de ser obtida junto às poucas e pobres roças, que
encontravam ao longo do percurso. Mais tarde, eles próprios enfraquecidos,
passaram a sentir os efeitos psicológicos e físicos dos tantos esforços
despendidos. Viajavam sob o sol forte e dormiam ao relento, experimentando
as grandes diferenças de temperatura entre o dia e a noite, tão comuns nos
planaltos interiores. Spix era acometido de fortes dores de cabeça, enquanto
Martius sofria inflamação de ouvido e febres constantes. Em um ponto pouco
determinado desse trajeto, foram alcançados e socorridos por um comerciante
de Caetité, que, conduzindo numerosa tropa, também seguia no sentido do
litoral. As anotações de Martius, quanto a esse episódio, não parecem muito
claras, senão quanto à preciosa ajuda que receberam daquele comerciante,
que lhes forneceu mantimentos, foragem e algumas mulas para substituir os
seus mais exauridos animais. Contudo, tal reforço não impediu que, mais
adiante, se renovassem as suas privações. A água continuava escassa por
toda parte. A um dia de viagem ainda distante de Maracás, os dois naturalistas
chegaram às margens do rio Jacaré. Mas, o rio estava seco. Era fins de
outubro (de 1818) e o seu leito arenoso estava exposto ao sol, sem vestígio de
uma só poça d’água. Esse rio, aliás, tem curso temporário e se achava
completamente seco na estiagem de abril de 2012, quando aí se esteve em
excursão. Desolados, prosseguiram, os naturalistas, para Maracás, aonde
chegaram no dia seguinte. O arraial encontrava-se praticamente abandonado,
porém. A maioria dos seus moradores achava-se nas suas fazendas e roças, e
o lugarejo revelou-se muito pobre e desprovido de tudo. A água para os
animais teve de ser recolhida nas poças que restavam nas cacimbas, enquanto
os homens tiveram de se contentar com aquela que puderam recolher das
folhas côncavas das bromélias, que exigia ser coada, várias vezes, em panos
de seda. No trecho seguinte, o terreno eleva-se paulatinamente, o viandante
galgando morros maiores e menores, até atingir o topo da serra de Maracás ou
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de Milagres. Do alto das escarpas dessa serra, descortina-se, no sentido norte,
uma amplíssima baixada, onde sobressaem inúmeros inselbergs. Martius e
Spix tinham superado as agruras da abominável travessia.
No sopé dessas escarpas, situa-se a pequena cidade de Milagres dos dias
atuais. Nas suas proximidades, cruzam-se duas importantes rodovias que
riscam, de leste a oeste e de norte a sul, o território baiano meridional. Martius
não menciona essa localidade nas suas anotações. Contudo, registra as
formações graníticas que se destacam sobre aquela baixada, a qual se espalha
até a Baia de Todos os Santos. De fato, esses inselbergs, ou morrostestemunho, exibem formas extravagantes ou inusitadas, não se deixando
passar despercebidos. Às vezes, isolados no terreno, às vezes, agrupados em
pequenos conjuntos, captam, facilmente, a atenção dos viajantes e dos
estudiosos da natureza.
Reconfortados, refeitos pela ação do clima dessa região de menor altitude,
aonde chegam os ventos úmidos do litoral, aqueles dois exploradores
animaram-se a retomar as suas investigações, indo conhecer os aldeamentos
dos índios cariris e sabujás. Os cariris achavam-se reunidos no povoado de
Pedra Branca, enquanto os sabujás tinham sido concentrados no povoado de
Caranguejo. Segundo Martius, apenas a língua os distinguia, entretanto. Essas
tribos, inicialmente apaziguadas e razoavelmente obedientes às autoridades
régias, teriam sido corrompidas nos seus costumes e comportamento social ao
serem empregadas, pelos próprios colonizadores, em lutas fratricidas.
Expediente que, também, foi usado na conquista das terras são-franciscanas,
no norte de Minas. Os registros históricos apontam ou sugerem que tais
aldeamentos teriam sido reposicionados por mais de uma vez, indicando,
ademais, que do antigo assentamento de Pedra Branca originou-se a atual
cidade de Santa Terezinha. Essa aglomeração urbana situa-se nos sopés de
uma elevada e grande crista de montanha, a qual se destaca, à distância, no
extremo de uma enorme chapada de baixa altitude, onde a caatinga arbustiva
constitui a cobertura vegetal típica.
Entre outros pontos do percurso feito a seguir, o naturalista alemão menciona
as localidades de Curralinho e Cruz das Almas, a qual é um centro urbano e
comercial de grande atividade, nos dias de hoje. Curralinho, por sua vez, é o
antigo nome da atual pequenina e ensolarada Castro Alves, berço natal do
mais famoso poeta baiano.
No dia quatro de novembro de 1818, Martius e Spix chegaram à demandada
São Félix. Venciam, portanto, dezessete dias de atribulações diversas,
angústias e incertezas e de frustração, pela perda de parte do material de
pesquisa coletado e pela impossibilidade de estudar, no seu habitat, tantas
espécies típicas daquelas regiões serranas.
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São Félix situa-se logo a jusante da barragem do Paraguassu (que fez
desaparecer a outrora grande cachoeira) e pouco distante da foz desse rio, que
deságua nos fundos da Baia de Todos os Santos. Duas igrejas dos tempos
coloniais e a bonita estação ferroviária, inaugurada em 1881, são atrações
arquitetônicas da histórica São Félix. À sua frente, na margem oposta, acha-se
a cidade de Cachoeira, denominada a heroica, por Dom Pedro I, dada a
bravura e o patriotismo do seu povo na resistência às forças portuguesas,
quando da proclamação da independência brasileira. Centro verdadeiramente
histórico e ativo, Cachoeira guarda belíssimos exemplos da arquitetura colonial
e do império. A igreja e convento do Carmo, datado de 1773, o edifício da
antiga Câmara e Cadeia, a Santa Casa e a igreja de Santa Bárbara, que data
de 1734, o Chafariz imperial de sete bocas, inaugurado em 1827, e a igreja
matriz de N. S. do Rosário, dedicada à padroeira da cidade e rica na sua
decoração interna, cuja irmandade responsável foi criada em 1674, ilustram
aquelas riquezas construídas no passado. Ao lado dessa igreja matriz, acha-se
a casa onde nasceu, em 1815, e faleceu, em 1880, Ana Néri, a enfermeira
valorosa e patrona da Cruz Vermelha do Brasil. Lembra-se, ainda, que, nessa
mesma cidade, veio alistar-se no exército brasileiro, disfarçada em roupas
masculinas, a brava Maria Quitéria, desejosa de lutar pela independência, ao
lado dos cachoeirenses heroicos de 1821-1822.
Nos arredores de Cachoeira, outra relíquia de significação: o antigo convento e
educandário dos jesuítas, no distrito municipal de Belém. O primitivo povoado
organizara-se em torno de uma imensa praça retangular, tendo-se, ainda hoje,
o edifício dos jesuítas posicionado bem no meio de uma das laterais maiores.
O convento, conforme de costume, assemelha-se a uma igreja, cuja construção
data de 1686, conforme registra o seu frontispício. A sua fachada exibe um
grande portal, ladeado de duas janelas no alto, um frontão triangular trabalhado
e uma só torre sineira lateral, típica das construções de caráter religioso do
século XVII, nos aglomerados urbanos mais próximos do litoral. Exibe,
ademais, na decoração da sua fachada, precioso exemplo da obra de laço, em
relevo e com acabamento em tinta dourada – o chamado rolwerk dos
holandeses, que desde cedo fora adotado pelos portugueses. E, mais. Dois
cachoeirenses, personagens ilustres da história luso-brasileira, estiveram
ligados a esse convento: o economista e diplomata da corte de Dom João V, o
senhor Alexandre (Lourenço) de Gusmão (1695-1753), e o seu irmão, o padre
jesuíta, inventor do balão ou máquina de voar denominada passarola, bem
como conselheiro daquela mesma corte portuguesa, Bartolomeu Lourenço de
Gusmão (1685-1724). Protetor desses dois irmãos, foi o padre e educador
jesuíta Alexandre de Gusmão, que no mesmo convento exerceu o seu
magistério e foi sepultado em 1724, tendo nascido em 1629.
De São Félix, Martius e Spix seguiram de barco para Maragogipe e Itaparica e,
daí, para São Salvador, onde se instalaram para uma temporada.
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Ilustrações
Serra de Vila Velha
A Vila do Rio de Contas, no planalto da serra
Antiga Câmara, Vila do Rio de Contas
A serra do Sincorá vista dos arrabaldes de Estiva
9
Grandes chapadas e extensas coberturas de caatinga
Inselbergs entre Milagres e Santa Teresinha
A cidade de São Félix vista do cais de Cachoeira
Igreja de N. S. do Rosário, Cachoeira
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Convento e Igreja do Carmo, Cachoeira
O Chafariz de 1827, Cachoeira
O Convento e Educandário Jesuíta de Belém, Cachoeira
Obra de laço da fachada do Convento
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Esboço de mapa de situação de lugares e acidentes geográficos, entre Vila do Rio de Contas e São Félix.
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