Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica Paulo Cesar Tavares Souza (Mestre) Curso de Matemática – Universidade Tuiuti do Paraná Volmir Eugênio Wilhelm (Doutor) Curso de Engenharia de Produção – Universidade Federal do Paraná Resumo A publicação do modelo CCR por Abraham Charnes, William Cooper e Edward Rhodes (CHARNES et al., 1978) é reconhecida como o nascimento dos modelos de Análise de Envoltória de Dados (Data Envelopment Analysis – DEA), que permite determinar a eficiência de uma unidade produtiva comparativamente às demais, considerando-se os múltiplos insumos utilizados e os múltiplos produtos gerados. Com o advento de novas tecnologias, tem-se observado uma profissionalização dada vez maior no setor produtivo. Neste contexto, o processo de gerenciamento da produção, com maiores informações possibilitam o crescimento da produção a partir de melhorias no processo produtivo baseadas no gerenciamento de informações. Neste trabalho, iniciamos com a apresentação dos conceitos básicos de Tecnologia de Produção, onde são destacados alguns axiomas e propriedades. Na seqüência, são apresentadas as medidas de eficiência técnica que deram sustentação matemática para os modelos DEA clássicos, seguida de uma apresentação estruturada destes modelos. Palavras-chave: Eficiência técnica; Produtividade; DEA. Abstract The release of the CCR model by Abraham Charnes, William Cooper and Edward Rhodes (CHARNES et al., 1978) is recognized as the birth of Data Envelopment Analysis (DEA), which allows us to determine productive unit efficiency compared to the others considering the multiple input used and the multiple generated output. Along with new technologies, one has observed a higher and higher professionalization in the production sector. In this context, the production managing process, with more information, makes production growth possible from production process enhancement based on information management. We start this work with the presentation of basic concepts of Production Technology, where some propositions and properties are highlighted. Afterwards the technical efficiency measurements which gave mathematical sustainability to the classical DEA models are presented, followed by a structured presentation of these models. Key words: Technical Efficiency; productiveness; DEA. Introdução A Análise Envoltória de Dados (DEA – sigla em inglês de Data Envelopment Analysis) é uma ferramenta não-paramétrica que avalia a eficiência técnica relativa de unidades produtivas, chamadas de Unidades tomadoras de decisão (DMU, da sigla em inglês Decision Making Units), comparando entidades que realizam tarefas similares e se diferenciam pela quantidade de recursos utilizados (inputs) e de bens produzidos (outputs). DEA é uma ferramenta adequada tanto para avaliar a eficiência relativa das DMUs quanto para o estabelecimento de metas para DMUs consideradas ineficientes. As DMUs são comparadas de acordo com o conceito de eficiência de Farrel (Forsund, 2002), que consiste na razão entre a soma ponderada dos outputs y e a soma ponderada dos inputs x de cada DMU. As variáveis de decisão são o vetor u, que representa os pesos relacionados aos outputs y, e o vetor v, que representa os pesos relacionados aos inputs x. Segundo Lins et all (2000), a história da Análise Envoltória de Dados começa com a dissertação para obtenção de grau de PhD de Edward Rhodes, sob a supervisão W. W. Cooper, publicada em 1978. Antes de apresentar as medidas de eficiência técnica, serão feitas algumas considerações a respeito de tecnologia de produção uma vez que os axiomas 124 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica e propriedades assumidas pela tecnologia definem o conjunto de possibilidades de produção e o formato da fronteira de produção em relação a qual a eficiência é avaliada. xj ou que xj pode gerar yj . Färe, Grosskopf e Lovel (1994) representam formalmente a tecnologia de três modos: Grafo de uma tecnologia: Tecnologia de Produção GR={(x,y); (x,y) A tecnologia define o conjunto de possibilidades de produção ou as relações viáveis entre insumos e produtos. É através da tecnologia que se expressa o conjunto de regras, métodos e fórmulas que permitem aos produtores determinar que combinação de insumos possa ser utilizada para a obtenção de certo nível de produto. Considerando a existência de n planos de produção (x (xjj,y, yj)j )∈ ℜs + m definindo duas matrizes: M = (xi j ), com i = 1,..., m e j = 1,..., n (1) S= (yr j ), com r = 1,..., s e j = 1,..., n (2) Onde xi j refere-se à quantidade do i-ésimo insumo da unidade j-ésima e yr j refere-se à quantidade do r-ésimo produto da j-ésima unidade de produção. A relação entre os vetores x e y é descrita pela tecnologia de produção adotada pela unidade de produção J, ou seja, pela tecnologia que permite obter yj a partir de , x e y são viáveis } (3) A expressão GR indica o conjunto de todos os planos de operação viáveis para os insumos e produtos considerados. Nesta representação, não há um foco específico em direção aos insumos ou aos produtos e nos dois casos os espaços são tratados simultaneamente. Conjunto das possibilidades de produção para o recurso x : P (x)={y ; (x , y) , x pode produzir y } (4) Esta representação é voltada ao espaço dos produtos focando as possibilidades de produção para o nível de insumos x. Conjunto de alternativas de consumo x que podem gerar y: L(y)={x ; (x , y) , y pode ser gerado por x} (5) Neste caso, a tecnologia é representada no espaço dos insumos, focando o conjunto das possibilidades Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm de consumo de insumos capazes de gerar o nível de produção y. Propriedades da Tecnologia As propriedades de tecnologia expressam as características do conjunto de possibilidades de produção que levam à configuração de diferentes Considerando uma dada tecnologia de produção, formatos para a fronteira empírica de produção voltada ao espaço dos produtos, a função P(x) tal e, portanto, a diferentes valores de eficiência para que: as unidades observadas. Estas propriedades estão associadas ao tipo de descarte permitido aos produtos P (x)= max {y : x L (y) y } (6) e insumos e ao tipo de retorno de escala exibido pela tecnologia. Deste modo, para diferentes combinações Neste caso, (6) indica a chamada função de de características de escala e descarte, temos diferentes produção ou fronteira de produção e expressa o nível tecnologias. Färe, Grosskopf e Lovel (1994) expressam máximo de produtos que pode ser alcançado por um as propriedades e descrevem as tecnologias bem dado conjunto de insumos. como as medidas de eficiência relativa de acordo com Nestas condições, Aguilar (1988) define um sistema o tipo de retorno e descarte assumido. Propõem, de axiomas para P(x), com destaque para: ainda, na ausência de melhores informações, o uso diferentes medidas para traçar o conjunto de m A0 ∃ yy ∈ ℜs ee ∃∃x y∈∈ℜℜms tal ) y = P (destas tal e ∃que que x ∈y ℜ y= =mP(x) tal P (xque x) possibilidades de produção e, com isto identificar e A PP(P(x) ⇔yyy===000∉∉PPP(x), (x(x),)∀, ∀xx≠≠0;00Isto significa explorar as propriedades exibidas pela tecnologia. x(x))===000⇔ Alguns Axiomas de Tecnologia 1 que para um dado conjunto de x > 0, existe pelo menos um produto y > 0. A2 P(x) é finito e limitado, para todo x. y0 ∉ P (x ) = 0 ⇔ yA∉ x y≠≠00 . ( xPP(x=0) =(x0)), ∀∀ 3= P A4 ∀x ∈ ℜ mm ,,,ll > ⇒ PPP(((ëë xx) x))> ≥≥111⇒ ≥≥ P(x). PP((xx)) Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Propriedades de escala As definições das propriedades do descarte e de escala são apresentadas segundo Färe, Grosskopf e Lovel (1994), na sequência e caracterizadas no enfoque voltado ao espaço dos produtos. 125 126 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica (i) Retornos Constantes de Escala (CRS): Uma tecnologia T apresenta retorno constante de escala se dada uma expansão/contração, em todos os insumos por um fator , a produção pode ser expandida/ contraída por este mesmo fator. (x , y) T P(x), então, ( y, x) yj P ( ( T, x) > 0, ou seja, se y >0 (7) (ii) Retornos não Crescentes de Escala (NIRS): Uma tecnologia apresenta retorno não crescente de escala se, ao multiplicarmos todos os insumos por um fator > 1 os produtos são multiplicados por um fator ´< . (iii) Retornos não Decrescentes de Escala (NDRS): Uma tecnologia apresenta retorno não decrescente de escala se, ao multiplicarmos todos os insumos por um fator > 1 os produtos são multiplicados por um fator ´> . (iv) Retornos Variáveis de Escala (VRS): Esta tecnologia é resultante da composição de tecnologias que expressam os retornos anteriores em segmentos diferentes da fronteira de produção. Propriedades quanto ao Descarte O descarte refere à propriedade de combinar os fatores de modo a alterar as proporções entre insumos ou entre produtos em um determinado conjunto de possibilidades de produção. Diz que se a decisão de descartar produtos ou insumos não implicar em custos tem-se uma tecnologia que apresenta forte descartabilidade, do contrário, diz-se que a tecnologia exibe descarte fraco. (i) Descarte Fraco: O conjunto P(x) exibe descarte fraco se uma redução qualquer de yr só for viável com uma redução de igual proporção em todos os demais produtos de r. Esta propriedade pode ser expressa como: Se yj P(x), então P(x), então y yj P( x), P( x), 0< >1 < 1; Se y (8) Este pressuposto raramente é assumido em mensurações empíricas de eficiência, aplicandose a situações onde há pouca possibilidade de substituição entre insumos ou onde a produção de um produto implica também a produção de outro em proporção aproximadamente fixa, como por exemplo, a geração de subprodutos. (ii) Descarte Forte: Diz-se que o conjunto de possibilidades de produção apresenta descarte forte se for possível livrar-se de parte dos produtos ou dos insumos. Esta propriedade pode ser expressa por: Se y P(x), então y´ P(x), y´ < y (9) Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. 127 Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm Com a definição dos axiomas da tecnologia, bem como suas propriedades, têm-se condições para estabelecer uma medida de eficiência técnica na produção. Medidas de eficiência técnica Segundo Toresan (1998), o conceito de função distância, como medida de eficiência técnica, foi proposto por Debreu (1951), Shephard (1953) e Malmquist (1953). Porém, Farrel (1957) estabeleceu uma medida empírica de eficiência relativa com base na função distância. Veja a figura: Figura 1: Função distância como medida de eficiência. Na figura 1, x 1 e x 2 representam os insumos necessários para produzir y, L(y) é a combinação de insumos viáveis para a produção de y. A Isoq L(y) Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. expressa a combinação linear de x1 e x2 necessária para produzir y. O ponto B representa um vetor de insumos observado a ser avaliado em relação a Isoq L(y). À distância D(y,x) é o inverso da razão AO/OB; que é a proporção pela qual os insumos podem ser reduzidos em B para alcançar o ponto eficiente da isoquanta em A. D(y,x)-1 é a medida de eficiência relativa definida por Farrel em relação à combinação de insumos em B para a produção de y. De modo formal, uma tecnologia de produção focada no aumento de produção possui a isoquanta: ), ∀x>≠1}0 Isoq P(x)={y P (x ) = 0 P⇔(x):y = 0y ∉ P(x) P (x se (10) Pertencem a isoquanta os planos de produção em que os produtos não podem ser ampliados em igual proporção com o mesmo vetor insumo. Um plano de produção é dito fracamente eficiente quando não é possível ampliar a produção de todos os produtos para um dado conjunto de insumos. Este subconjunto compõe o conjunto de unidades eficientes definido por Farrel (1957). O conjunto de eficiência fraco é definido por: x ) = y´> 0⇔ x ), ∀x ≠(11) 0 EFf P(x)={y P (P(x): y y =y´0 ∉ P P ((x)} O subconjunto de planos de produção fortemente eficientes é definido por: 128 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica (x ) =y´ 0>⇔y y =y´0 ∉ PP ((x)} x ), ∀x ≠ 0 EFf P(x)={y PP(x): (12) No caso descrito em (11), o conjunto EFf P(x) geralmente é chamado de Conjunto de Eficiência Fraco, enquanto que no caso descrito em (12), EFf P(x) é chamado apenas de Conjunto de Eficiência. Um plano de produção é dito fortemente eficiente se pertencer ao conjunto em que não é possível ampliar a produção de nenhum produto, dado o vetor de insumos. A eficiência forte corresponde ao conceito de eficiência técnica de Koopmans e define o subconjunto de unidades de eficiência não dominada. Observe que EFf P(x) Isoq P(x). Segundo Wilhelm (2000), a função distância de Shephard, definida como: Esta medida indica a taxa pela qual a produção poderia ser multiplicada para um dado nível de insumos. É obtida projetando-se radialmente o vetor de produtos sobre a fronteira. Veja a figura: Figura 2 – Expansão radial até a fronteira Observando a figura, tem-se que yA pode ser Do (x,y|prop. tecnologia=min{ : (y/ ) P(x)} (13) expandida radialmente mantendo-se constantes os insumos x. Além disso, yB e yC pertencem a Isoq Onde (13) apresenta uma representação funcional P(x). da tecnologia de produção. Do (x,y) < 1, logo: Isoq P(x)={v: Do (x , y)=1}. A medida de eficiência técnica Mensuração da Produtividade e da Eficiência Técnica de Debreu-Farrel, orientada à produção, é definida como: Pode-se encontrar na literatura três abordagens básicas para a mensuração multidimensional da DFo (x , y) = max{ ; y P(x)}, DFo (x , y) > 1 produtividade e da eficiência técnica: a construção de (14) índices de produtividade total dos fatores, a abordagem DFo (x , y) = 1/ Do (x,y); e por consequência, econométrica e a abordagem de programação linear. Isoq P(x)= y: DFo (x , y) = 1} Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm Esta abordagem de programação linear será objeto de estudo no presente trabalho. A abordagem de programação linear é concebida para cumprir dois objetivos principais: construir fronteiras de produção a partir de dados empíricos e computar uma medida de produtividade relacionandose dados de observação com as fronteiras de produção. A partir de pontos observados, que são combinações de insumos e produtos de um conjunto de unidades, estabelece como medida de eficiência à distância de um ponto à sua projeção na função fronteira. Esta função é chamada de função de produção eficiente e é usada como referência para comparar a eficiência, ou a ineficiência, das várias unidades em relação a esta fronteira. A fronteira de produção estimada consiste na combinação de atividades de uma ou mais unidades de produção extremas, que são unidades tecnicamente eficientes em relação a outras unidades observadas, formando uma envoltória linear por parte para as unidades de produção observadas da amostra. Färe, Grosskopf e Lovel (1994) fornecem uma apresentação técnica detalhada da abordagem de programação matemática para a análise da tecnologia de produção e formulação de medidas de eficiência. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Algumas das características que tornam a programação linear atrativa são: (i) Não requer dados sobre os preços para a construção da fronteira de produção empírica, bastando dados sobre as quantidades; (ii) A ineficiência técnica de unidades individuais se manifesta pela distância radial relativa à fronteira de produção (A fronteira de produção será, ou o conjunto de eficiência fraco ou o conjunto de eficiência forte); (iii) Por não ser paramétrica, é menos propensa a erros de especificação. O método mais conhecido da abordagem de programação linear é a Análise por Envoltória de Dados (Data Envelopment Analysis – DEA), desenvolvido por Charnes, Cooper e Rhodes (1978). DEA generaliza as medidas de Farrel (1957) e busca medir a eficiência produtiva de unidades de produção com múltiplos insumos e múltiplos produtos. A abordagem DEA consiste na resolução de problemas de programação linear com o objetivo de projetar os produtores ineficientes tecnicamente até o conjunto de eficiência forte ou o conjunto de eficiência fraco. Os tipos de retornos de escala, geralmente considerados, são os retornos constantes de escala, retornos não crescentes de escala e retornos variáveis de escala. 129 130 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica O conjunto produção considerando os três tipos mais comuns de retornos de escala são gerados por inequações lineares. Ou seja: PCRS(x) = {y: y ≤ λM, λN ≤ x, λ∈ℜ+n} Figura 3 – Retornos de Escala O índice da eficiência técnica pode então, ser mensurado considerando-se diferentes fronteiras de produção (conjunto de eficiência fraco e conjunto de eficiência) e diferentes retornos de escala (constantes - CRS, não crescentes - NIRS e variáveis - VRS). Além disso, o que difere um índice do outro é a orientação da projeção, que pode ser orientação insumo, orientação produto e orientação insumoproduto. A eficiência técnica orientação consumo é calculada em relação ao conjunto consumo L. A mensuração consiste na contração do vetor insumo (redução equiproporcional dos insumos) até a fronteira inferior de L. A eficiência técnica orientação produto consiste na expansão do vetor produto até a fronteira de P, enquanto que a medida orientação insumo-produto consiste na contração do vetor consumo e expansão do vetor produto. Esta contração e expansão ocorrem simultaneamente. (15) PNIRS(x) = {y: y ≤ λM, λN ≤ x, λ ≤ 1, λ∈ℜ+n} (16) PVRS(x) = {y: y ≤ λM, λN ≤ x, λ = 1, λ∈ℜ+n} (17) Os programas lineares utilizados para calcular os índices da eficiência técnica, orientação produto, para o j-ésimo plano de produção: EfcP CRS (x j ,y j ) = max{θ: θy j ≤ λM, λN ≤ x j , λ∈ℜ+n} (18) EfcPNIRS(xj,yj) = max{θ: θyj ≤ λM, λN ≤ xj, λ ≤ 1, λ∈ℜ+n} (19) EfcPVRS(xj,yj) = max{θ: θyj ≤ λM, λN ≤ xj, λ = 1, λ∈ℜ+n} (20) Aspectos gerais do DEA Criado para avaliar o desempenho de unidades de produção em que não são disponíveis informações de preços de mercado de insumos e produtos, chamadas genericamente de Unidades de Tomadas de Decisão Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm (Decision Making Units - DMUs), o método calcula uma medida máxima de desempenho para cada DMU relativa a todas as demais, com a restrição de que todas as DMUs se encontrem na fronteira externa ou abaixo dela. Toda DMU observada que se encontre abaixo da fronteira de produção tem seu grau de ineficiência medido em relação a uma combinação de DMUs com melhores práticas e que compõem a faceta de fronteira mais próxima. A análise DEA gera como resultado: (i) Caracterização de cada DMU por um escore único que resume a eficiência relativa; (ii) Para cada DMU são feitas projeções de melhorias sobre referências observadas, revelando aquela de melhor prática; (iii) A Análise por Envoltória de Dados se coloca como alternativa para as abordagens indiretas de especificação de modelos estatísticos abstratos que fazem inferências baseadas na análise de resíduos e dos coeficientes-parâmetros. - Uma superfície envoltória que identifica as DMUs eficientes e ineficientes; - Uma medida de eficiência métrica para cada DMU (à distância da fronteira, a fonte e o grau de ineficiência); - Uma projeção da DMU sobre a fronteira; - Um conjunto-referência (unidades específicas contra as quais uma DMU particular está sendo comparada). Na sequência, será feita uma abordagem aos modelos DEA clássicos. Devido à flexibilidade e à aplicabilidade na análise da eficiência em organizações não voltadas ao mercado, um grande número de aplicações de DEA em instituições públicas e privadas se seguiu à divulgação do modelo inicial de Charnes, Cooper e Rhodes (1978). O grande interesse pelo método deve-se a suas três características: Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. DEA – uma metodologia de avaliação da Eficiência Técnica A publicação do modelo DEA-CCR por Abraham Charnes, William Cooper e Edward Rhodes (CHARNES et al., 1978), modelo desenvolvido por baseados nos trabalhos de Debreu (1951) e Farrell (1957), é reconhecida como o nascimento dos modelos de Análise de Envoltória de Dados (Data Envelopment Analysis –DEA), que permite determinar a eficiência de uma unidade produtiva comparativamente às demais, considerando-se os múltiplos insumos utilizados e os múltiplos produtos gerados (Gomes, 2008). A Análise Envoltória de Dados (DEA – Data Envelopment Analysis) é uma ferramenta não-paramétrica 131 132 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica que avalia a eficiência de unidades tomadoras de decisão (DMU, sigla em inglês de Decision Making Units), comparando entidades que realizam tarefas similares e se diferenciam pela quantidade de recursos utilizados (inputs) e de bens produzidos (outputs). DEA é uma ferramenta adequada tanto para avaliar a eficiência relativa das DMUs quanto para o estabelecimento de metas para DMUs consideradas ineficientes. As DMUs são comparadas de acordo com o conceito de eficiência de Farrel, que consiste na razão entre a soma ponderada dos outputs y e a soma ponderada dos inputs x de cada DMU. As variáveis de decisão são o vetor u, que representa os pesos relacionados aos outputs y, e o vetor v, que representa os pesos relacionados aos inputs x. O conjunto de DMUs a ser avaliado deve ser homogêneo, isto é, deve ter em comum a utilização dos mesmos inputs e outputs, realizarem as mesmas tarefas, com os mesmos objetivos, trabalhar nas mesmas condições de mercado e ter autonomia na tomada de decisões (LINS, et al, 2000). A Análise Envoltória de Dados permite analisar a eficiência de unidades produtivas (DMUs) com múltiplos insumos (inputs) e múltiplos produtos (outputs) através da construção de uma fronteira de produção, também denominada de fronteira eficiente, linear por partes, de tal forma que as empresas que possuírem a melhor relação “produto/insumo” serão consideradas mais eficientes e estarão situadas sobre esta fronteira e, as menos eficientes estarão situadas numa região inferior à fronteira, conhecida como envelope (envoltória). A medida da eficiência de cada DMU é obtida através da divisão da soma ponderada dos insumos pela soma ponderada dos produtos, onde os pesos atribuídos às variáveis de entrada (Inputs) e de saída (Outputs) são calculados através de um problema de programação linear, que atribui às DMUs pesos que maximizem sua eficiência (GOMES, 2008). A Análise Envoltória de Dados pode ser considerada uma abordagem que mede excelência, uma vez que premia as DMU’s com as melhores práticas observadas. A classificação de uma unidade como eficiente ou ineficiente só depende do seu desempenho em transformar os inputs em outputs quando comparada com as outras unidades observadas (GONZALESARAYA, 2003). A equação seguinte mostra o índice de eficiência da k-ésima DMU, para o caso de múltiplos inputs e múltiplos outputs proposto por Farrell (1957). Nesta equação, uj e vi representam, respectivamente, os pesos de cada output j e de cada input i, yk representa a output j da unidade k e, xik indica o input i da unidade k. Esses pesos são normalmente arbitrados: Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. 133 Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm (21) Em sua versão original, o modelo descrito por Charnes, Cooper e Rhodes - 1978, orientado aos produtos, é apresentado como um problema de programação fracionária tipo: (22) insumos e produtos com a restrição de que, com os mesmos pesos, todas as DMUs, inclusive a DMU0, não apresentam esta relação maior que 1. O problema de programação fracionária acima possui infinitas soluções ótimas, sendo necessário fixar um valor constante para o denominador da função objetivo. Além disto, podem-se linearizar as restrições do problema, de modo a transformá-lo em um problema de programação linear (PPL). Charnes, Cooper e Rhodes linearizaram estas equações, transformando-o no PPL representado a seguir: (23) Onde ykj e xij são os produtos e insumos da j-ésima DMU, uk e vi representam os pesos (coeficientes de ponderação ou importância relativa de cada variável) a serem determinados pela solução do problema. Os pesos uk e vi obtidos são correspondentes a DMU atual. Este processo é repetido para cada uma das DMUs, obtendo-se diferentes valores para uk e vi. Este problema busca otimizar a relação insumo produto da DMU0, atribuindo livremente pesos aos Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Este problema é conhecido como o problema dos multiplicadores ou de razão de eficiência, em que transformam os produtos e insumos em medidas únicas chamadas produto virtual e insumo virtual. A medida de desempenho de cada DMU é otimizada através de J rodagens do programa, sendo uma para cada DMUj. Os conceitos de dualidade são fundamentais para a compreensão dos modelos DEA, fornecendo 134 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica interpretações complementares. Charnes, Cooper e Rhodes (1978) apresentam a formulação dual do PPL como o problema da envoltória. Este modelo é representado a seguir: (24) Em forma vetorial, este programa linear pode ser escrito sob a forma: EfcP CRS (x j ,y j ) = max{θ: θy j ≤ λM, λN ≤ x j , λ∈ℜ+n} (25) Esta formulação implica em: 0 < 1, se a expansão radial nos produtos for possível, enquanto que 0 = 1 é a condição necessária, mas não suficiente para que a DMU possa ser considerada tecnicamente eficiente no sentido de Pareto – Koopmans. Para a DMU avaliada, é o indicador de 0 eficiência, baseado na possibilidade de redução insumos para obter-se a eficiência máxima. Dentro desta ótica de orientação de insumos, temos um rendimento constante de escala. O modelo original DEA-CCR, bem como suas formulações lineares: Primal e Dual impõe como restrições à tecnologia que define a fronteira envoltória de produção: (i) Retorno constante de escala; (ii) Descarte forte de insumos e produtos; (iii) Convexidade no conjunto de combinações viáveis de insumos e produtos. Principais Modelos DEA Essencialmente, os modelos DEA procuram estabelecer quais subconjuntos de DMUs determinam partes de uma superfície envoltória, sendo que a forma geométrica desta superfície definida pelo modelo específico empregado. As diferentes formulações DEA diferem, fundamentalmente: quanto o tipo de orientação, esta será dada pela direção da projeção na fronteira, e quanto a suposições sobre o retorno de escala exibido, pela tecnologia de produção. Os modelos orientados são diferenciados, especificamente, em relação ao foco da medida de eficiência: ou voltado ao espaço dos produtos ou voltado ao espaço dos insumos. Isto implica que as projeções dos pontos observados sobre a fronteira são diferentes na orientação à produção comparada às projeções na orientação ao consumo Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. 135 Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm dos insumos. Logo, os escores de eficiência relativa não são os mesmos nos dois modelos. Veja na figura seguinte a projeção de pontos ineficientes na fronteira, segundo o modelo de orientação: Observe que o formato da superfície-envoltória difere segundo o tipo de retorno de escala exibido pela tecnologia. Tulkens (1993) assume os seguintes postulados: Todo plano de produção pertence ao conjunto de possibilidades de produção. Todo plano de produção não observado que é fracamente dominado em insumos e/ou produtos por qualquer plano de produção obser vado também pertence ao conjunto de possibilidades de produção. Na sequência, são apresentados os principais modelos DEA. a) Modelo DEA-CCR (CRS) O modelo CCR (Charnes, Cooper e Rhodes1978), pioneiro em DEA, pressupõe retornos constantes de escala e projeta os pontos através de uma expansão radial na fronteira de produção. Assume como pressuposto o seguinte postulado: “todo plano de produção não observado, que é combinação linear de planos de produção observados, também pertence ao conjunto de possibilidades de produção”. A figura seguinte apresenta a superfície-envoltória e for ma de projeção do CCR: O modelo DEA-CCR tem a seguinte formulação: - DEA- CCR - Orientado à produção - Primal Figura 4 – Projeção na fronteira DEA Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. (26) 136 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica Figura 5 – Modelo DEA CCR - DEA- CCR - Orientado à produção - Dual (27) assegure as condições Pareto-Koopmans. A infinitesimal não arquimediana ε é introduzida com o objetivo de tornar o modelo invariante em relação às unidades de medida das variáveis e garantir a precedência da maximização de na função objetivo. Deste modo, ε garante que uma DMU não seja classificada como eficiente se existirem folgas nos vetores insumo e produto, mesmo que não seja possível uma expansão de igual proporção nos produtos, que ocorre quando = 1. Os valores ótimos (que são os mesmos de ) produzem uma medida de eficiência que expressa a distância da DMUJ em relação à fronteira eficiente. Uma DMU é considerada eficiente no sentido de Pareto-Koopmans se as duas condições seguintes forem satisfeitas: (i) = 1; (ii) As variáveis de folga e de excesso são todas nulas. Onde o valor indica o grau de expansão radial possível em todos os produtos, dados o nível observado de insumos. O vetor identifica as DMUs referência que compõem a f r o n t e i r a d e projeção. As folgas s nos produtos e os excessos e nos insumos são variáveis de decisão no modelo e tem por objetivo garantir uma medida de eficiência que Associado a cada DMUJ ineficiente (XJ,YJ) está um ponto de comparação (X*,Y*) sobre a fronteira, expresso como combinação linear de DMUs. O valor de mede a distância de (XJ,YJ) ao ponto projetado (X*,Y*) sobre a fronteira e expressa a taxa de expansão necessária em todos os produtos para tornar a unidade eficiente. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm A mensuração da eficiência pode ser obtida em dois produção. A superfície envoltória e forma de estágios: no primeiro, obtém-se o valor de , otimizando projeção do modelo BCC-VRS estão representadas a expansão equiproporcional nos produtos e, no segundo na figura abaixo: estágio, busca-se uma movimentação sobre a fronteira identificando as folgas nos produtos e os excessos nos insumos, não sendo necessário, neste caso, a imposição de ε como limite para os multiplicadores. A formulação dual caracteriza a medida CCR em forma de razão e resolve o problema de programação fracionária proposto inicialmente por Charnes, Cooper e Rhodes em 1978. Os múltiplos insumos e múltiplos produtos são transformados, através dos pesos u e v, em medidas únicas chamadas insumo virtual e produto virtual. Figura 6 - Modelo DEA-BCC b) Modelo DEA-BCC (VRS) Para obter a formulação matemática do modelo BCC, deve-se incluir a restrição de convexidade na combinação Proposto por Banker, Charnes e Cooper (1984), de DMUs referência, ou seja, ∑ l ==11. o modelo BCC relaxa a imposição de tecnologia O modelo DEA-BCC tem a seguinte formulação: com retornos constantes de escala e admite que o conjunto de produção apresente retornos variáveis - DEA-BCC – Orientado à produção – Primal de escala. A tecnologia com retorno variável de escala assume o postulado de que todo plano de produção não observado que é uma combinação convexa dos planos de produção pertencentes ao (28) conjunto de possibilidades de produção também pertencem ao conjunto de possibilidades de Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. 137 138 Uma introdução aos modelos DEA de eficiência técnica - DEA-BCC – Orientado à produção – Dual (29) A restrição de convexidade admite retornos variáveis de escala, já que os hiperplanos não são restritos a passar pela origem como no modelo CCR. Observe que os valores ótimos das funções objetivos implicam sempre em BCC CCR e, por consequência que a eficiência em CCR < eficiência em BCC. Considerações Finais Outros modelos são encontrados na bibliografia, como extensão ou variações dos modelos CCR e BCC, chamados na literatura de Modelos DEA clássicos. Estes outros Modelos DEA surgiram como forma de adaptar-se a determinadas situações, tais como os Modelos FUZZY-DEA, que permite trabalhar com variáveis com dados imprecisos e as medidas DEA completas que permite uma avaliação baseada em uma redução nos níveis de consumo dos insumos, associados a um aumento níveis de produção. Tuiuti: Ciência e Cultura, n. 42, p. 121-139, Curitiba, 2009. Paulo Cesar Tavares Souza e Volmir Eugênio Wilhelm Referências BRITO, S. G. Medidas DEA completas. Dissertação de Mestrado, UFSC - SC, 2003. CHARNES, A. COOPER, W. W., RHODES, E. Measuring the efficiency of decision making units. European Journal of Operational Research, vol. 2, p. 429-444, 1978. FARE, R., GROSSKOPF, S. Production Frontiers. Cambridge University Press, Cambridge, Great Britain, 1994. FARRELL, M. J. The Measurement of Productive Efficiency of Production. Journal of the Royal Statistical Society, Series A, 120(III), 253–281, 1957. FORSUND, F. R. , SARAFOGLU, N. 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