A SAÚDE NO BRASIL A PARTÍR DA DÉCADA DE 80: RETROSPECTIVA
HISTÓRICA E CONJUNTURA ATUAL
Nilvo Retka 1
Andréia Centenaro
Hiracílio Ivo Gregório Junior
Dra. Maria Lúcia Frizon Rizzotto
Resumo: A história da saúde Brasileira na década de 80 contribuiu com grandes
mudanças no Modelo Assistencial acompanhando a “reconquista” da democracia com
desdobramentos até a realidade atual. O fim do “milagre econômico”, o fracasso das
políticas sociais e o esgotamento da capacidade de repressão e desmobilização das
classes populares pelo estado impuseram o fim do absolutismo do Regime militar e uma
maior participação social nas diretrizes políticas. Isso permitiu a discussão com VIII
Conferência Nacional de Saúde e a construção de um novo arcabouço judiciário com a
promulgação da Constituição Federal de 1988 incorporando a saúde como “direito de
todos e dever do Estado”. Surge então o Sistema Único de Saúde – SUS, em
contraposição ao antigo Regime Assistencial de ônus Previdenciário com oferta de
serviços públicos por meio de investimentos na iniciativa privada. No plano políticoideológico as mudanças são resultado do embate entre o movimento reformista
(Movimento da Reforma Sanitária) e o movimento conservador (Movimento Neoliberal
Privatista). Com a construção política da SUS várias medidas têm sido adotadas no
sentido da sua consolidação e fortalecimento dos seus princípios enquanto modelo
hegemônico capaz de contemplar todas as necessidades de saúde dos cidadãos
brasileiros. São princípios fundamentais desse sistema a universalidade, gratuidade,
hierarquização e descentralização do poder decisório e participação social. O embate e
as discussões continuam e a nosso entendimento e participação desse processo
determina a construção da realidade.
Palavras chave: Saúde no Brasil; Saúde nos anos 80; Políticas de Saúde.
1
Acadêmico da 4a. Série do Curso de Enfermagem da Universidade Estadual do Oeste do Paraná –
UNIOESTE – Campus de Cascavel. Rua Borin, 395 – CEP 85803-180. E-mail: [email protected]
Introdução:
O início dos anos 80 no Brasil marca uma série de mudanças no panorama político e
social acompanhado de uma crise econômica. A população apresentava padrão de vida
precária sob grande desatenção do estado sobre investimentos em políticas sociais.
Apesar da tentativa de repressão de manifestações populares reprobatórias ao Regime
Militar diversos segmentos sociais descontentes se organizam exigindo maior atenção
do estado para os temas sociais. É nesse contexto que se organizam as assembléias
populares composta por trabalhadores operários, associação de bairro, classe médica,
desempregados, e outros, reunindo propostas variadas com interesses convergentes.
Pressionado, o Regime Militar dá sinais de exaustão dando início a abertura
democrática.
Com a estruturação do sistema previdenciário em 1966 a assistência à saúde aparece
como concessão do estado aos trabalhadores da economia formal concentrada na área
curativa com atendimento na área privada financiada e sustentada praticamente pelo
estado.
Com as eleições de 1986 e a promulgação da Constituição Federal, a saúde passa a
ocupar espaço importante nos temas sociais. O cenário político-ideológico é formado
pelos movimentos pró-reforma e conservadores. Entretanto várias das proposições
reformistas discutidas na VIII Conferência Nacional de Saúde rompendo com o modelo
curativo são incorporadas em lei e acabam por constituir o Sistema Único de Saúde –
SUS.
O SUS recebe o desafio de atender universalmente a todas as necessidades de saúde da
população com um número limitado de recursos. Vários são os avanços adquiridos, em
especial a área de Saúde Coletiva, compondo o cenário de disputa entre o sistema
público e a iniciativa privada.
Metodologia:
Este trabalho consiste num estudo exploratório resgatando uma síntese histórica da
saúde no Brasil desde a década de 80. Procurou-se salientar os principais movimentos
em prol da saúde que ocorreram, bem como os Programas Governamentais propostos,
os resultados obtidos e o contexto sócio-político das mudanças.
Desenvolvimento:
A situação sócio-econômica do Brasil na entrada dos anos 80 refletia a herança de um
modelo político ideológico pautado no controle e repressão, usando a desmobilização
como grande mecanismo para justificar sua permanência e sustentação no poder. Essa
norma estendia-se civilmente aos cidadãos como também institucionalmente na forma
verticalizada de subordinação direta ao poder executivo.
A administração do Estado pelos militares relegava a área social (e especialmente a
saúde) enquanto não prioritárias. A prova principal foi a constante redução de verbas ao
Ministério da Saúde e o reforço no orçamento de demais Ministérios ligado a questões
militares.
Esse período da história da saúde Brasileira se caracteriza por várias mudanças tanto de
ordem social quanto econômica, com algumas transformações no campo da saúde no
Brasil. O país passa por momentos de uma grande crise econômica, paralela a profundas
mudanças no modelo político vigente na época; a conquista da democracia após um
extenuante período de represálias. Para entendermos melhor esse período devemos fazer
um breve resgate na década anterior.
Com a abertura política a população descontente voltou a se mobilizar, e a reivindicar
maior atenção do estado para com as questões sociais, principalmente a Saúde. O
quadro apresentado era de imensa gravidade, segundo (BERTOLLI, 1996, p: 60):
Hospitais em precário estado de funcionamento, dificuldades de encontrar atendimento médico,
mortes sem socorro especializado: esta tem sido o quadro a que está submetida a população
brasileira. Como resultado da insuficiente expansão dos sistemas de saneamento e da ineficácia
da educação sanitária, o país é assolado por epidemias evitáveis, como os surtos de cólera e
dengue. E mantém-se alto os índices de pessoas atingidas por tuberculose, tracoma, doença de
chagas e doenças mentais, confirmando a permanência histórica do trágico estado de saúde
popular.
A crise econômica passa a ser permanente e grande descontrole inflacionário. Além da
recessão, some-se ainda a distribuição desigual de renda causando pobreza e miséria.
Ainda durante a ditadura foi estruturado o sistema previdenciário, o qual irá participar
por longos anos como fonte de recursos para a saúde. Em 1966 o governo cria o
Instituto Nacional de Aposentadorias e Pensões – INPS, subordinado ao Ministério do
trabalho. A organização desse sistema incorporou os vários órgãos previdenciários que
funcionavam anteriormente organizados por entidades de classes (marítimos, bancários,
ferroviários e outros) que funcionavam independentes e eram geridos com fundos
indepentes. O principal interesse governamental era compor um importante instrumento
político-eleitoral de relação direta com os trabalhadores no sentido de adquirir apoio
para a sustentação do novo regime.
A Previdência Social Brasileira nasce com uma perspectiva dualmente assistencialista:
pagamento de benefícios aos trabalhadores e financiar o pagamento da assistência
hospitalar. Ao Ministério da Saúde incumbe a função de organizar programas
Sanitaristas-campanhistas para o controle de epidemias.
Em virtude da precariedade de uma rede pública de atendimento à saúde de cobertura
nacional, a Previdência social passa a comprar serviços da iniciativa privada
fortalecendo sobremaneira esse setor. Nesse período houve a maior expansão até aquele
momento de empresas médico-hospitalares, companhias de seguro-saúde juntamente
com a indústria farmacêutica internacional. Por se tratar de um negócio extremamente
lucrativo, o Brasil passa a atrair investimentos externos e em pouco tempo companhias
Brasileiras de saúde tiveram que concorrer com grupos internacionais e muitas
acabaram por serem compradas. Os laboratórios farmacêuticos internacionais passaram
a controlar o preço e a qualidade dos medicamentos comercializados no país e os
hospitais passaram a importar equipamentos e artigos médico-hospitalares.
Em relação à cobertura a previdência social apresentava um caráter excludente,
restringindo sua cobertura a trabalhadores da economia formal assalariada e somente no
início da década de 70, por força de críticas ao sistema foram incorporados
trabalhadores rurais (FUNRURAL) autônomos e empregadas domésticas mediante
contribuição.
Administrativamente o governo procurou aprimorar o sistema previdenciário em 1974
criando o ministério da Previdência e assistência social – MPAS, desmembrado do
ministério do Trabalho. O novo ministério englobava vários subsistemas, sendo os
principais o Instituto Nacional de Previdência social – INPS; Instituto Nacional de
Assistência Médica da Previdência Social – INAMPS; empresa de processamento de
dados da Previdência Social – DATAPREV e outros, como a Central de Medicamentos
– CEME, que acabou por se tornar incapaz de competir com os laboratórios
farmacêuticos internacionais.
O objetivo de todas essas medidas era contornar uma crise séria que atravessava a
Previdência Social com grande insuficiência de recursos. Os gastos da Previdência
apresentavam-se proporcionalmente negativos sobre sua receita, que apesar de estendida
a cobertura teve aumentos inexpressivos na arrecadação.
Na saúde, os gastos apresentavam concentrados quase exclusivamente na área curativa
(a grande minadora de recursos) reforçando a política individualizada de atendimento
ficando a área preventiva relegada a iniciativas próprias de alguns poucos municípios.
Um outro principal problema era a organização do sistema de controle e destinação de
verbas, conforme Bertoli, 1996, p: 55: “Enquanto o governo reduzia ou atrasava os
recursos para a rede conveniada, hospitais e clínicas aumentavam as fraudes para
receber aquilo a que tinham direito e muito mais. Guias de internação falsificadas,
cirurgias desnecessárias e a prática de cesariana em vez de parto normal passaram a ser
mecanismos comuns de fraude”.
Em meio à crise previdenciária e a caótica situação de saúde, o regime ditatorial começa
a perder forças diante dos intensos movimentos populares organizados composto por
vários segmentos sociais descontentes. Consciente de seus direitos a sociedade começa
a se mobilizar fugindo ao controle do estado e identificando o regime com o fracasso
nas políticas sociais. Na década de 70 identificavam-se dois movimentos principais
político-ideológicos na saúde conforme Mendes, 1994, p: 34: “Do ponto de vista
político, emergem na arena sanitária novos sujeitos sociais portadores de interesses,
ideologias e visões de mundo diferente que vão conformando dois grandes projetos
político-sanitários alternativos: o contra hegemônico (a reforma sanitária) e o
hegemônico (projeto neoliberal), proposta conservadora de reciclagem do modelo
médico-assistencial privatista”.
Em 1980, o governo militar trabalha para superar a crise política e numa tentativa
conjunta dos ministérios da saúde e da previdência cria o PREV-SAÚDE – Programa
Nacional de Serviços Básicos de Saúde, visando organizar o setor público de saúde para
contrapor-se ao setor privado sustentado em mais de 80% pelo próprio estado. A
iniciativa propunha a criação de uma rede pública unificada de oferta de serviços,
regionalizada e hierarquizada, financiada e administrada pelo estado hegemônica sobre
a rede privada.
O programa PREV-SAÚDE, elaborado por um grupo técnico interministerial e apoiado
pela Organização Pan-Americana de Saúde – OPAS, refletia a VII Conferência
Nacional de Saúde, cujo tema principal era a implantação de uma rede básica de saúde.
Entretanto devido à falta de verbas previdenciária e após debate entre os movimentos de
saúde acabou somente como encaminhamento à Câmara dos Deputados.
No âmbito previdenciário surge um pacote aumentando a contribuição previdenciária e
criação do Conselho Consultivo de Administração da Saúde Previdenciária – CONASP,
como o desafio de racionalizar os gastos em saúde. A principal estratégia foi à
implantação das AIS – Ações Integradas de Saúde, em forma de convênios com
municípios chegando a cobrir acima de 80% da população Brasileira. Além da
racionalização dos recursos e o combate às fraudes caracterizava-se por uma série de
princípios, segundo (ANDRADE, et al, 2001, p: 36):
Os princípios que norteavam as AIS não eram diferentes do fracassado PREV-SAÚDE:
universalidade no atendimento; integralidade e equidade da atenção; regionalização e
hierarquização dos serviços; descentralização das ações e do poder decisório; democratização
através da participação da sociedade civil e do controle pelos usuários; planejamento e controle
efetivo pelo setor público sobre o conjunto do sistema, incluindo os setores filantrópico e
privado (AIS: uma estratégia..., 1998).
A destinação dos recursos compunha um fundo único com participação federal
(INAMPS), Secretarias Estaduais de Saúde e Secretarias Municipais. A exceção dos
investimentos, o gasto era calculado mediante procedimentos de assistência prestados.
Após avanços serem alcançados, na tentativa de consolidar as mudanças surge através
do decreto 94657/87 o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde – SUDS. Esse
projeto formaliza a participação do Ministério da Saúde como responsável pela
organização do sistema de saúde e não apenas programas.
O programa visava operacionalizar questões surgidas como a delimitação de funções e
responsabilidades pelas várias instâncias participativas de poder, conservando os
princípios já estabelecidos. O resultado foi um passo a mais rumo à descentralização,
com maior concentração de poder nas secretarias estaduais e municipais de saúde e
ensaio para desativação do INAMPS.
Com as eleições de 1986 avança o processo de abertura democrática e renova o
Congresso Nacional e a Presidência. Iniciam-se as discussões para a promulgação da
Constituição de 88 e a saúde ocupa espaço como temática central nas políticas sociais.
O cenário composto para a aprovação das propostas é misto entre integrantes do
Movimento Sanitário (progressistas) e neoliberais (conservadores) comprometidos com
o modelo privatista.
É nesse contexto que será incorporado a discussão sobre um sistema público de saúde
na Constituinte. Ainda em 86 realiza-se a VIII Conferência Nacional de Saúde – CNS,
reunindo mais de 4000 pessoas com intensa participação social ligada ao Movimento
Sanitário. O momento foi de discussão intensa e proposição de um modelo nacional
reformista para a saúde, que apesar de entraves e como ressalvas, acabou por incorporar
muitas de suas propostas na Constituição Federal de 88, após análise pela Comissão
Nacional de Reforma Sanitária da Assembléia Constituinte.
No plano ideológico rompe-se explicitamente com a concepção do processo saúdedoença e a visão curativista e medicalizante que fundamentava o modelo médicoassistencial-privatista.
Admite-se após longos anos, o caráter insuficiente de resolução dos problemas de saúde
apenas por meio de consultas médicas e assistência hospitalar. Torna-se reconhecido o
caráter social da doença e a responsabilidade do estado, conforme trecho inicial do
Tema I do Relatório da VIII CNS: “1-Em seu sentido mais abrangente, a saúde é
resultante das condições de alimentação, habitação, educação, renda, meio ambiente,
trabalho, transporte, emprego, lazer, liberdade, acesso e posse da terra e acesso a
serviços de saúde. 2- A saúde não é um conceito abstrato. É assim antes de tudo, o
resultado das formas de organização social da produção, as quais podem gerar grandes
desigualdades nos níveis de vida”.
Após garantia Constitucional da implantação de um Sistema de Saúde, é aprovada a lei
8080/90 que cria o Sistema Único de Saúde – SUS. Esta lei acabou sendo
complementada ao final do mesmo ano (devido a vetos do Presidente Fernando Collor)
pela lei 8124/90 sendo então garantida a participação popular no processo decisório. As
duas leis chamadas de “leis Orgânicas da Saúde” dispõem sobre os princípios e
diretrizes do novo sistema e especifica uma série de atribuições ligadas à saúde,
abrangendo fundamentalmente: ações de Vigilância Sanitária; de Vigilância
Epidemiológica; de Saúde do Trabalhador; Assistência Terapêutica Integral, inclusive
Farmacêutica; Ordenação de Recursos Humanos na Área, ações de vigilância
nutricional e outras.
Uma conquista importante dos movimentos sociais foi à inclusão de sua participação no
processo decisório. O sistema é gerido em esfera federal pelo Ministério da Saúde-MS,
estadual por meio da Secretaria Estadual de Saúde e a nível Municipal pelas secretarias
Municipais de saúde.
O financiamento do sistema passa a ser conjunto com destinação federal (mínimo 5%
do orçamento da união e atualmente atrelado ao PIB) 7% do orçamento estadual e 7%
dos recursos municipais.
Para a implantação da gestão descentralizada nos municípios a lei 8142/90 exige alguns
requisitos como: Conselho Municipal de Saúde, Fundo Próprio único para
movimentação financeira, destinação correta do percentual atribuído em lei, plano de
ações e Relatório destas, além de um Plano de Carreira, Cargos e Salários Para Recursos
Humanos.
Após a criação do SUS a proposta de descentralização é regulamenta em lei pela Norma
Operacional Básica do SUS – NOB 01/91, que foi editada como o objetivo de
estabelecer uma ordem legal para que isso ocorresse. Porém esta norma acabou ferindo
alguns princípios fundamentais do SUS quando redefinia a lógica de transferência de
Recursos, conforme ANDRADE et al : “Compete ao SUS prestar assistência às pessoas
por intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com realização
integrada de ações assistenciais e de atividades preventivas” (2001, p: 41).
Quanto mais serviços de saúde (quantidade de procedimentos) os estados e municípios
realizassem, maior era o recebimento de recursos. O gestor público é obrigado pela
NOB/91 a aplicar políticas de saúde curativas em detrimento das promocionais e
preventivas de saúde, já que a produção passou a forma de conseguir recursos,
principalmente no setor privado.
Grupos políticos e setores da sociedade fizeram uma forte oposição a esta lógica de
compra de serviços buscando por meio da IX Conferência Nacional de Saúde – IX CNS
em agosto de 1992 sendo redigido um documento chamado “Descentralização das ações
e Serviços de Saúde – a ousadia de cumprir e fazer cumprir a lei”, que mais tarde
organizou-se uma nova versão que deu origem a NOB/93 publicada em 20 de maio de
1993 pela portaria 545 do MS.
A NOB/93 estabeleceu um processo flexivo, gradual e negociado para assegurar
viabilidade política à execução das mudanças operacionais necessárias, criando
diferentes fases para a habilitação dos municípios, respeitando suas condições técnicooperacional (ANDRADE et al, 2001, p: 45).
Constituíram-se nas esferas Federal e Estadual Comissões intergestores, sendo estas as
Comissões Intergestores Tripartites – CIT e as Comissões Intergestores Bipartites –
CIB. Nelas os gestores se relacionam negociando, articulando, pactuando e se
integrando para promover a operacionalização da descentralização.
Foram criadas condições gestoras para os estados (condição de Gestão Parcial, condição
de Gestão Semiplena) e municípios (condição de Gestão Incipiente, condição de Gestão
Parcial e condição de Gestão Semiplena). Para a esfera Estadual essas condições não
passaram de mera formalidade já que não houve alteração em sua relação de
gestora/prestadora de serviço com a esfera federal. Mas para os municípios a única
condição que representou a descentralização com autonomia para a organização do
sistema de saúde foi a condição de gestão semiplena.
Porém apesar dos avanços da NOB/93 ainda 3/4 dos recursos federais ainda eram
destinados ao pagamento de serviços curativos e ligados à produção, como aos
prestadores privados. Isso obrigou a se pensar em uma nova forma de superar esse
quadro, sendo editada a NOB/96.
A NOB/96 tem como principal finalidade promover e consolidar o poder público
municipal como gestor local do sistema de saúde, fortalecendo desta forma a
municipalização da gestão dos recursos em acordo com os princípios fundamentais do
SUS. Deste modo o município deixa de ser um prestador de serviço responsável pela
produção de procedimentos de saúde (como no setor privado) e passa a ser uma
instância de governo responsável por definir políticas de saúde do município.
Outra mudança ocorrida por esta norma está na forma de repasses financeiros que além
de ter aumentado a massa de recursos instituiu a transferência automática do Fundo
Nacional de Saúde para o Fundo Estadual e Municipal de Saúde possibilitando maior
autonomia aos estados e municípios para a gestão descentralizada.
A norma trata ainda da elevação do vínculo do serviço de saúde com a família, com
incentivos destinados ao programas de assistência domiciliar como o Programa de
Saúde da Família – PSF; Programa de Agentes Comunitários de Saúde – PACS; e
outros.
A NOB/96 só foi implantada em Janeiro de 1998 devido a necessidade de aumentar os
recursos para manter as propostas; nesse sentido foi criada no ano de 1997 a
Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira – CPMF, que tinha por
finalidade melhorar o orçamento da saúde.
A totalidade dos recursos federais liberados é estimada através da soma de quatro
modalidades de fontes, sendo o Piso de Atenção Básica Fixo – PAB Fixo; Piso de
Atenção Básica Variável – PAB Variável; Fração Assistencial Especializada – FAE e a
Remuneração de Internações Hospitalares, baseada na Autorização de Internamento
Hospitalar – AIH.
Após a proposição de modelos de organização de recursos continuaram ocorrendo
problemas da ordem de gestão. Ocorre que os municípios são heterogêneo; alguns
apresentam incapacidade de organizar um sistema que garanta assistência completa em
todos os níveis sobrecarregando municípios pólo regionais.
Procurando solucionar esses problemas burocráticos foi sancionada A NOB/2001. O
objetivo é a organização regionalizada da assistência, fortalecimento da capacidade de
gestão do SUS e principalmente revisão de critérios de habilitação dos municípios
conforme definido pela norma anterior.
Entretanto esta norma propõe pontos conflitantes como a “recentralização” de recursos
de custeio de ações de alto custo/complexidade para o nível federal retirando do
controle municipal experiências bem-sucedidas.
Apesar da conquista social da implantação do SUS, vários empecilhos têm surgido para
a sua operacionalização. Diferente da realidade almejada, o sistema público tem
apresentado baixo grau de resolutividade e exigindo intensas mudanças na ordem
político-administrativa. Ademais, o resultado mostra o confronto presente entre o
interesse público e os setores lucrativos da saúde da iniciativa privada fortalecidos no
passado pelo próprio estado (década de 70).
O grande número de pessoas vivendo em condições de pobreza e excluídas socialmente
do acesso aos bens e serviços essenciais adquiridos por meio da compra tem contribuído
para que o sistema público assuma o desafio de assistir de maneira global a todos
indistintamente com qualidade frente ao sucateamento do sistema com insuficiente
número de verbas.
A constante redução de verbas e o grande avanço das políticas neoliberais como o
governo do Presidente Fernando Henrique Cardoso tem contribuído para que o sistema
público receba protestos acusando principalmente ineficiência na oferta e baixa
qualidade nos serviços.
Isso tem possibilitado o crescimento do setor privado e a migração de camadas sociais
com poder de consumo para a assistência privada. Apesar da concepção legal como
contribuição supletiva na garantia do direito constitucional da saúde, este setor tem
atraído um grande contingente social com uma imagem plantada de eficácia e
qualidade. No entanto deve-se ressaltar o surgimento de um grande número de
problemas na relação de consumo oferecida. Ainda assim o setor privado tem
desfrutado uma expansão de credibilidade perante a sociedade inversamente
proporcional ao setor público que atravessa uma grande crise.
Visando discutir esse cenário e propor medidas ocorreram as Conferências Nacionais de
Saúde, sendo a mais recente a 12a. Os temas giram em torno da construção de um novo
modelo de atenção à saúde baseado no fortalecimento do SUS e a denúncia do
abandono do setor público diante das políticas neoliberais.
Considerações Finais:
A atenção à saúde no Brasil acompanha o contexto de vida da população. Com a
redemocratização do país vários segmentos sociais organizados insatisfeitos com as
iniciativas governamentais pressionaram o estado a assumir papel ativo na busca da
melhoria das condições de saúde e a conquista enquanto direito gratuito de universal de
cidadania.
A organização do sistema atual de saúde é derivada no âmbito econômico do Sistema
Previdenciário (organizado em 66) e no plano político-ideológico do embate dos
movimentos progressista e neoliberal conservador.
Com a promulgação da Constituição Federal em 1988 a saúde passa a constituir “direito
de todos e dever do estado”. Para garantir esse direito o governo organiza Sistema único
de Saúde – SUS, com preceitos de Gratuidade, Universalidade e totalidade no
atendimento, regionalizado e descentralizado com participação social no processo
decisório.
Entretanto vários são os interesses envolvidos gerando constante conflito entre o
sistema público e a assistência privada baseada no lucro e com proveito da ineficiência e
precariedade do estado em organizar políticas sociais. A realidade mostra que várias
etapas de desenvolvimento social devem ser alcançadas para que os direitos adquiridos
sejam efetivados.
Bibliografia Consultada:
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_______. Ministério da Saúde: Norma Operacional Básica do Sistema de Saúde:
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MENDES, Eugênio Vilaça. Distrito Sanitário: O Processo Social de Mudanças das
Práticas Sanitárias do Sistema Único de Saúde. Hucitec Abrasco - Rio de Janeiro,
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www.datasus.gov.br/cns/cnshtml
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RETKA, Nilvo A SAÚDE NO BRASIL A PARTIR DA