FÉ E POLÍTICA
COMPROMISSO COM
A VIDA
Pe. Marcelo Moreira Santiago
Coordenador Arquidiocesano de Pastoral
ESCOLA
ARQUIDIOCESANA
DE FÉ E POLÍTICA
DOM LUCIANO
“Serviço e profecia nas lutas do povo,
luz e inspiração em nossa caminhada
como Movimento Fé e Política e
militância cristã na construção do
Reino e transformação da sociedade”
Deus da vida e Senhor da história,
Pai de todos nós,
em vosso filho Jesus Cristo,
já venceste o pecado, a escravidão e a morte.
Queremos fazer da política,
direito e dever da cidadania,
um serviço à vida e libertação integral de todos.
Concedei-nos construir um Brasil novo,
na vivência fraterna, no respeito às diferenças,
sem exclusão e sem privilégios,
onde se abracem a justiça e a paz.
Que os valores do vosso reino orientem sempre mais
as decisões e a ação política em nosso país.
Ajude-nos a intercessão de Maria, nossa mãe Aparecida,
das santas e santos companheiros da caminhada.
Vosso filho, Jesus Cristo, Caminho, Verdade e Vida,
nos iluminem na construção
de uma sociedade justa e solidária.
Amém.
 “A
dimensão sóciotransformadora é parte
integrante da ação evangelizadora da Igreja.
Uma das formas mais eficientes de concretizá-la
se encontra na atuação organizada e sistemática
das pastorais sociais.
 Além disso, sem deixar o que é específico de sua
missão, a Igreja abre-se às várias parcerias com
pessoas, grupos, organizações e movimentos a
fim de colaborar na construção de uma
sociedade justa, fraterna e solidária”
Dom Geraldo Lyrio Rocha,
Arcebispo de Mariana


É importante que a Igreja forme pessoas em
níveis de decisão. A opção pelos pobres exige
uma pastoral voltada aos construtores da
sociedade, sem esquecer que os pobres e
marginalizados são também “sujeitos de
mudança e de transformação de sua situação”
Todos os fiéis são impulsionados pelo Espírito a
participar da vida política, pois a vida cristã não
se expressa somente nas virtudes pessoais, mas
também nas virtudes sociais e políticas

Os leigos, devidamente
presentes
verdadeiros
na
formados, devem estar
vida
pública,
atuando
sujeitos
eclesiais
e
como
competentes
interlocutores entre a Igreja e a sociedade. Por
outro lado, a participação política, motivada pela
fé, pode assumir diferentes formas, desde o
interesse pelos problemas sociais, a participação
em conselhos de direito, até a filiação a partidos
e a aceitação de cargos eletivos
(DGAE n. 86; DAp nn. 501, 394, 508, 497,
507)
O
ser humano realiza-se como pessoa na
convivência interpessoal. Esta convivência
é uma convivência política
 Todos
fazemos política
◦ A pessoa humana é, por natureza, um ser político
◦ Tudo o que fazemos ou deixamos de fazer é uma
atitude política
◦ Da política depende a vida dos cidadãos
 Não
se interessar pela política é não se
interessar pela felicidade pessoal e pelo bemestar da sociedade
 Não há nada que seja do ser humano que seja
estranho à Igreja (Paulo VI)
“As alegrias e as esperanças, as tristezas e as
angústias dos homens de hoje, sobretudo dos
pobres e de todos os que sofrem, são também as
alegrias e as esperanças, as tristezas e as
angústias
dos discípulos de Cristo”
(Gaudium et Spes, n.1 – Concílio Vaticano II)



O pior analfabeto é o analfabeto político. Ele não ouve,
não fala, não participa dos acontecimentos políticos. Ele
não sabe que o custo de vida, o preço do feijão, do peixe,
da farinha, do aluguel, do sapato e do remédio depende
das decisões políticas
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o
peito dizendo que odeia a política
Não sabe que de sua ignorância nasce a prostituta, o
menor abandonado, o assaltante e o pior de todos os
bandidos que é o político vigarista, pilantra, o corrupto e
o explorador das empresas nacionais e multinacionais
(Bertold Brecht, 1898-1956)

A fé cristã não despreza a atividade política, pelo
contrário, a valoriza e a tem em alta estima:
◦ A Igreja sente como seu dever e direito estar presente neste
campo da realidade: porque o cristianismo deve evangelizar
a totalidade da existência humana, inclusive a dimensão
política (...). Esta necessidade provém do mais íntimo da fé
cristã: do domínio de Cristo que se estende a toda a vida”
(Puebla 513 a 516)
◦ Desafio: “cristianizar” os políticos e “politizar” os cristãos
 Enquanto
expressão religiosa, a fé é uma opção
de vida que tende a englobar, na abertura ao
transcendente, toda a existência e inspirar os
atos da pessoa humana
É
um modo de ser e de atuar que se apresenta
com duas mediações principais:
◦ A mediação propriamente religiosa, pela qual a fé
aparece como culto, oração...
◦ A mediação ética, pela qual a fé aparece como práxis
(prática), como vida concreta
 Quando
se fala na fé como práxis, se entende a
fé como compromisso social, como “caridade
política”
É
toda atividade que influencia no
processo social. É organização da
“pólis” = cidade, sociedade
 Temos dois níveis de política:
◦ Como participação na vida social, no nível da
“sociedade civil” (corresponsabilidade)
◦ Como luta pelo poder do Estado, seja para
conquistá-lo (partidos, movimentos...), seja para
exercê-lo (governo). Esse é o nível da “sociedade
política”

Êxodo/Juízes/Deuteronômio
◦ Revela Deus como o Deus dos oprimidos que
quer a sua libertação concreta
◦ A libertação divina na história é por um lado
“libertação de” (do Egito = escravidão) e, por
outro, “libertação para” (terra prometida/nova
sociedade)

Profetas
◦ Anunciam
Deus como o Deus da justiça e
denunciam uma “religião separada da vida” (Am
5,21-27; Is 58; 0s 6; Mq 6,5-8; Jr 7; Zc 7; ...)
◦ Preanunciam um mundo novo, onde reinará a
justiça; mais ainda, o próprio Deus (Is11; 60; 65;
Jr 31; Ab 21; Zc 8 e 9; ...)
◦ A “mensagem política” dos profetas parte sempre
da “mensagem religiosa” mais ampla: A aliança
de Deus com seu povo, expressa nas Tábuas da
Lei (Decálogo)
 Jesus
anuncia o Reino como “revolução
absoluta”: a “libertação plena” para o mundo
 Esse
Reino inclui:
◦ Uma dimensão pessoal – fé e conversão
◦ Uma dimensão final – ressurreição e vida eterna
◦ Uma dimensão social – libertação das doenças, da
fome, etc (Lc 4,1ss; 6,20-26; Mt 25,41s; ...)
Quanto
à pratica, Jesus:
◦ Liberta o povo dos males concretos (sinais ou
milagres/ Lc 7,21-23)
◦ Toma a defesa dos pequenos contra os
grandes (Lc 13,10-17)
◦ É crucificado em consequência do seu
compromisso
libertador
em
favor
dos
“perdidos” deste mundo –exigência da vontade
do Pai (Mc 15,10; Jo 11,4)
A
dimensão política da mensagem, vida e
morte de Jesus é apenas uma dimensão
implicada em sua missão profética e salvífica
maior
 Ele
age em vista do Reino e para a salvação do
gênero humano
 Por
outro lado, trata-se de uma dimensão
integrante altamente significativa para nós
hoje
Podem
ser formuladas através de três afirmações
dialeticamente concatenadas:
Jesus
esteve dentro das realidades sociais
Jesus
não teve uma atuação “técnica” e
especificamente “política”;
A atuação e a mensagem de Jesus tiveram e têm
uma incidência real nas questões sociais
precisamente porque superam um esquema
“técnico” e se situam no horizonte da esperança
escatológica.
Jesus
não adotou uma atitude de “fuga do
mundo”.
Jesus não foi um revolucionário social, nem um
“reformador” de estruturas sociais, econômicas ou
políticas. O objetivo primordial de Jesus em todas
as suas manifestações é de ordem estritamente
moral e religiosa.
Também não quis, de modo algum, separar do
mundo os seus discípulos ou incitá-los a se
constituírem em comunidades fechadas, mas serem
“sal da terra e luz do mundo”.
 Ensinamento:
o compromisso social do cristão
não é certamente o coração do Cristianismo, por
isso não deve ser absolutizado, mas está
intimamente ligado ao “núcleo” da fé cristã, isto
é:
◦ À verdade da fé de que “Cristo é o Senhor” (1 Cor 12,3) e deve
sê-lo também no espaço político (Puebla 516 e 552)
◦ Ao preceito da caridade (Mt 22,34-40) que vê na política uma
“forma exigente” (Paulo VI – Octogésima Adveniens 46) e
necessária para a consolidação da sociedade justa e fraterna,
em vista do Reino de Deus (Puebla 327: “Amor estrutural”)
A Bíblia revela a vocação integral
do ser humano, mostrando que
esta implica uma
responsabilidade “política” a ser
vivida de acordo com o Plano de
Deus
 Fé
e política, em nível existencial, não são
duas coisas ou grandezas lado a lado:
◦ A política é antes uma dimensão interna à fé: uma
dimensão constitutiva. É a própria fé, enquanto
realizada no social (práxis histórica)
A
fé inclui a política, mas também a supera
◦ O perigo é reduzir a fé à política (tentação dos
engajados) ou reduzi-la à vida privada (tentação da
burguesia)
A
encarnação da fé na política não é direta
◦ O Evangelho, por exemplo, não diz diretamente
quanto deve ser o salário, ou em que partido votar,
menos ainda diz como resolver problemas. O
Evangelho dá orientações para discernir o “agir”
◦ Para que o evangelho atue, enquanto iluminação,
na política concreta, são necessárias as mediações,
tanto em nível teórico quanto prático, como as
teologias, as escolas de formação política, os
grupos pastorais, os movimentos populares e de
militância cristã na sociedade, os partidos, os
conselhos, as ONGs...
 Sem
mediações a fé permanece abstrata ou fazse cega, ingênua, acrítica
“A Igreja, à luz da fé, contribui para promover os
valores que devem inspirar a política, interpretando
as aspirações dos povos, especialmente os anseios
daqueles que a sociedade tende a marginalizar. E
o faz mediante seu testemunho, doutrina e sua
multiforme ação pastoral”
(Puebla 522)
À luz da fé, existe uma relação
intrínseca que não pode ser
dissociada entre a vida e a fé,
promoção humana e missão
religiosa, uma consciência éticocristã de defesa da vida, da
dignidade da pessoa e do bemcomum
ENQUANTO REPRESENTADA PELA
HIERARQUIA
 Apolitismo
◦ Considera que é impossível uma missão assim, de uma
Igreja envolvida no mundo político, porque a Igreja é
apolítica
◦ Na verdade, é preciso que se tenha clareza de que a Igreja é
apartidária, não apolítica
 Clericalismo
◦ É a reivindicação do poder temporal, a partir da hierarquia
(governo eclesiástico)
◦ Na verdade, é preciso que se tenha clareza de que a
competência da Igreja no campo político é mais ética que
técnica
 Aliança
com o Estado
◦ Poderes atrelados, a modo de se confundirem:
temporal e espiritual, como foi no período da
cristandade, na idade média
◦ Na verdade, a Igreja, em razão de sua finalidade e
competência, de modo nenhum se confunde com a
comunidade política ou com algum sistema
político, ela é sinal e salvaguarda, por excelência,
do caráter transcendente da pessoa humana
É
precisamente pastoral ou evangelizadora.
Ela supõe:
a) evangelizar o “político” (função profética)
◦ Educar
as
consciências,
denunciando
profeticamente
orientando-as,
as
injustiças,
anunciando uma sociedade nova
◦ Preparar militantes políticos e acompanhá-los
pastoralmente
◦ Com seus ritos e liturgia, celebrar o Deus da
vida que quer que todos tenham vida e vida
em plenitude, alimentando suas esperanças e
lutas, encarnando a fé na história, em vista do
Reino definitivo
c) Solidarizar-se com as lutas justas do povo
oprimido, através de apoio público e presença
física (função régia)
 Concretamente:
◦ Salvar a vida contra a fome e a violência estabelecida
◦ Proteger os indefesos contra os violadores dos
direitos elementares
◦ Animar os oprimidos frente às mortes frequentes e os
dramas sociais
◦ Juntar o povo disperso, para que se organize
◦ Alimentar a esperança no futuro contra a opressão
duradoura
Enquanto representada pelos cristãos, membros do Povo de Deus
 Enquanto
cidadãos,
os
cristãos
devem
entrar, com plenos direitos, na política
direta
◦ Para sua ação política concreta, o cristão não
recebe ordens da fé ou da Igreja institucional,
nada de “política cristã”, enquanto dividendos
para
a
Igreja,
mas
política
inspirada
na
mensagem cristã, em favor do bem comum e da
justiça social
PRINCIPAIS CRITÉRIOS DE ORIENTAÇÃO
POLÍTICA, À LUZ DO EVANGELHO
 Perspectiva
de libertação: optar por partidos que
busquem a transformação social e a criação de uma
nova sociedade
 Opção
pelos pobres: optar por organizações que
assumem realmente a causa dos pobres
 Métodos participativos: entrar em movimentos que dão
espaço ao povo, que adotam processos “de baixo para
cima” e preferem métodos não-violentos
 Respeito à liberdade de consciência e religião: frente a
tais critérios, nem todas as organizações de luta se
equivalem para o cristão, mas existe sempre um
legítimo pluralismo político ( GS 43,3)
1. Apoio: voto, simpatia e filiação
 2. Ação direta: militância e liderança

◦ No nível de apoio, deve continuar, de modo permanente, a
pastoral de conscientização política do povo em geral
◦ No nível da ação direta, há necessidade de uma pastoral
específica que ajude a formar os militantes cristãos para a
competência política e para uma espiritualidade adequada
(João Paulo II aos Bispos do Brasil - 9.4.86)
◦ Exigência para os militantes continuarem enraizados em sua
base eclesial e popular e para terem eficácia política maior e
mais qualificada
A
preocupação da Igreja no Brasil com
problemas de ordem sócio-econômica
e política não é de hoje:
◦ Na década de trinta, esforços para promover a
participação dos cristãos na vida política
◦ Na década de sessenta, apoio “às reformas de
base”
◦ Nos anos oitenta, emendas populares na
constituição (1988)
 Nos anos noventa aos nossos dias, luta
contra a corrupção e empenho nas políticas
públicas.
 “Bandeiras”, entre outras assumidas:
a) Erradicação da fome (redistribuição de renda e
políticas de geração de renda, política agrícola)
b) Respeito pelos direitos
saúde, moradia e segurança)
humanos
(educação,
d) Defesa da vida e de sua dignidade, em todos os
seus estágios e condições
e) Desenvolvimento sustentável (qualidade de vida à
população e respeito à ecologia)
f) Mobilização contra a corrupção político-eleitoral,
como a lei 9840 e a da “Ficha limpa”
1) - Diz o Concílio Vaticano II: “O divórcio
entre fé e vida é um dos mais graves erros
do nosso tempo” (GS 43,1)
◦ Quais são as raízes desse divórcio? O que ele traz?
Como superar esse divórcio?
2) - Muita gente do povo acha a política
uma “coisa suja”
◦ De onde vem essa idéia? Como ajudar o povo a
superá-la?
3) - Qual a contribuição da Fé para a Política
e da Política para a Fé?
4) - Discutir a posição dos cristãos (ministros
consagrados e leigos) frente a política,
entendida de modo amplo como também a
política partidária:
◦ Como é esta posição? Como deve ser ? O que
fazer para atingir seus objetivos e metas?
“A nossa luta é no campo e na
cidade pra construir uma nova
sociedade“
Votos de muitos frutos à Escola Arquidiocesana
de Fé e Política Dom Luciano Mendes de
Almeida, grande passo para tornar nossas
comunidades mais comprometidas à luz da fé
com a vida e a cidadania em conformidade com
as prioridades do PAE.
Pe. Marcelo Moreira Santiago

CNBB, Igreja, comunhão e missão, doc. 40, Paulinas 1988 nn
184-227

BEOZZO, O (org.) Fé
e Política (Clodovis Boff) in Curso de
verão – Ano 1 (Coleção Teologia Popular, Paulinas 1988, pg.
141-14



LIBÂNIO, J. B., Fé e Política, Loyola, 1985
CNBB, CF – 1996: Fraternidade e Política: Justiça e Paz se
abraçarão, Salesiana Dom Bosco, 1996
ARQUIDIOCESE DE MARIANA, Fé e Política – uma proposta de
formação, dom Viçoso, 2006

CELAM, Documentos de Medellin, Puebla, Santo Domingo e
Aparecida
Download

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