UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE MEDICINA DE RIBEIRÃO PRETO DEPARTAMENTO DE MEDICINA SOCIAL JULIANA LEMOS SILVA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E SAÚDE DOS TRABALHADORES: ESTUDO COM BANCÁRIOS DO MUNICÍPIO DE UBERABA - MG RIBEIRÃO PRETO 2009 JULIANA LEMOS SILVA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E SAÚDE DOS TRABALHADORES: ESTUDO COM BANCÁRIOS DO MUNICÍPIO DE UBERABA - MG Dissertação apresentada ao Departamento de Medicina Social da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – FMRP - USP para obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Saúde na Comunidade. Orientadora: Profa Dra Vera Lúcia Navarro RIBEIRÃO PRETO 2009 Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. FICHA CATALOGRÁFICA Silva, Juliana Lemos Organização do trabalho e saúde dos trabalhadores: estudo com bancários do município de Uberaba - MG. 170 p. : il. ; 30cm Dissertação (Mestrado) apresentada à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP - Área de concentração: Saúde na Comunidade. Orientadora: Navarro, Vera Lúcia. 1. Bancários. 2. Saúde do trabalhador. 3. Organização do trabalho. 4. Doenças Ocupacionais. 5. Reestruturação Produtiva. JULIANA LEMOS SILVA ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E SAÚDE DOS TRABALHADORES: ESTUDO COM BANCÁRIOS DO MUNICÍPIO DE UBERABA - MG. Dissertação apresentada à Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto/USP, junto ao Departamento de Medicina Social, para obtenção do título de Mestre. Área de concentração: Saúde na Comunidade. Aprovada em: 02/10/2009 Banca Examinadora Profa. Dra. Vera Lúcia Navarro Assinatura:_____________________ Instituição: Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto-USP Profa. Dra. Cláudia Mazzei Nogueira Assinatura: _____________________ Instituição: Universidade Federal de Santa Catarina-UFSC Profa. Dra. Leny Sato Instituição: Universidade de São Paulo-USP Assinatura: _____________________ Aos grandes amores da minha vida: aos meus pais, Iolete e Antônio, ao meu irmão, Thiago e à você, Fred. AGRADECIMENTOS Agradecer é reconhecer que, em vários momentos, eu precisei segurar em suas mãos. Ao Programa de Pós-graduação em Saúde na Comunidade – FMRP USP, por me acolher como parte desta grande instituição educacional. À CAPES, pelo fomento concedido em forma de bolsa de mestrado. À minha orientadora, Vera Lúcia Navarro, por me permitir aventurar ao seu lado na investigação sobre o mundo do trabalho. Às professoras, Cláudia Mazzei Nogueira e Leny Sato, pela sabedoria dos seus conselhos. Aos bancários, pela confiança ao me contarem seus segredos e acreditarem na minha capacidade em dar voz às suas angústias. Às pessoas especiais, que acompanharam cada passo para a concretização deste sonho. À minha família, por ser a razão de tudo que eu faço. Ao meu amor, Fred, por sonhar os meus sonhos como se fossem seus. Ao meu Pai, todo poderoso, por me abençoar com mais esta conquista. HOMENAGEM AOS BANCÁRIOS Abres a porta: respiras fundo; acendes as luzes e ligas-te ao mundo. Espreitas no siebel1 as ordens do dia, no workflow2 vais aos “banho-maria”... Consultas taxas, juntas-lhe o spread3, e aí logo vês como o negócio fede. Atendes mais um a quem deram cartão, pra depois o rasgar e deitar ao chão. Conferes-lhe os saldos da caderneta, mesmo que a aches coisa obsoleta. Mais umas coisas, algumas sem jeito... Mas é assim “o cliente satisfeito!” Esqueces o que de mau teve o dia, e apenas o bom reportas à chefia. Lá vem aperto, e depois, o incentivo? Pois... assim é o fluxo directivo! Já os alarmes tocam a preceito: o dos cofres, e o do peito. Vá! Sai rápido, urgente! (Zé Pedrosa)4 1 A Siebel Systems, responsável pelo fornecimento de soluções de relacionamento com o cliente, apresenta soluções em funcionalidades de CRM (Customer Relationship Management), BI (Business Intelligence) e CDI (Customer Data Integration), as quais podem ser desenvolvidas como licenças ou como serviço hospedado. Tal sistema permite a instituição gerenciar e coordenar todas as interações com o cliente: web, contact center, serviços de campo e de vendas, rede de revendas e canais de distribuição diretos e indiretos. 2 Workflow: novo tipo de servidor para os ambientes computacionais. Os servidores desse tipo trouxeram a possibilidade de controlar processos. O termo designa um conjunto de ações coordenadas tanto manuais como automáticas. Dentre os vários tipos de aplicações, há modelagem de processo de negócios, de aplicações cooperativas e de transações de bancos de dados. Após o advento do plano Real, as instituições financeiras foram obrigadas a rever suas estratégias, reorientando o foco de atuação para a venda de produtos de concessão de crédito/empréstimos. Para atingir esses objetivos, as instituições implantaram esses sistemas, visando agilizar a aprovação de crédito, melhorar e padronizar a forma do gerente de negócios, interagir, com seu cliente durante o processo de venda, permitir imediata consulta à imagem do dossiê de clientes e melhorar a qualidade da formalização das operações. 3 O termo em inglês, spread, pode ser traduzido como margem adicional, e é usado no mercado financeiro quando há a expectativa de um ativo de baixo valor ter um aumento em seu preço 4 Autor português. Homenagem aos bancários vencedora do Concurso Literário do Sindicato da CGD (Caixa Geral de Depósitos). RESUMO SILVA, Juliana Lemos. Organização do trabalho e saúde dos trabalhadores: estudo com bancários do município de Uberaba-MG, 2009, 170 p. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo/FMRP/USP, Departamento de Medicina Social. O setor bancário brasileiro passou por intenso processo de transformação nas últimas décadas e ocupou posição de liderança na incorporação de novas tecnologias e inovações organizacionais. A reestruturação produtiva observada no setor objetivou ajustá-lo às novas formas de acumulação capitalista: a intensa informatização do trabalho bancário e outras mudanças estruturais do setor afetaram não apenas a natureza dos produtos, mas também o próprio comportamento dos mercados, o que resultou em mudanças significativas nas condições de trabalho e, consequentemente, na saúde dos trabalhadores. Este estudo teve por objetivo investigar as condições de trabalho dos bancários de uma instituição privada em Uberaba, MG, Brasil, na tentativa de identificar em que medida as mudanças na organização do trabalho interferiram em sua saúde. A coleta de dados se deu através de entrevistas gravadas com onze bancários pertencentes a diferentes níveis hierárquicos, de ambos os sexos, e os critérios de inclusão adotados foram: a. que o entrevistado tivesse vínculo empregatício com a instituição quando da realização da pesquisa e, b. que metade dos entrevistados tivesse, no mínimo, dez anos de carreira na instituição. Os contatos com os trabalhadores foram mediados pelo sindicato da categoria. A reconstituição do processo de trabalho, na perspectiva dos bancários, denuncia que além de adoecimentos de ordem física, como as doenças ocupacionais diretamente relacionadas à intensificação do ritmo de trabalho, ocorreram também o aumento da incidência do sofrimento mental e a perda da identidade e da valorização profissional, em decorrência das novas exigências da profissão. A maioria dos entrevistados, independente de seu tempo de contratação, afirmou que o trabalho bancário perdeu seu status. Predominaram nos depoimentos sentimentos de frustração e insegurança em relação à carreira. Os dados revelaram também preocupação com a pressão psicológica sofrida, principalmente no que se refere ao cumprimento de metas. Expressões como desgaste mental, estresse, depressão, pressão psicológica, medo, incerteza e insegurança estiveram presentes na maioria dos depoimentos. Palavras-chaves: Bancários, Saúde do trabalhador, Organização do trabalho, Doenças Ocupacionais, Reestruturação Produtiva. ABSTRACT SILVA, Juliana Lemos. Organization of the work and the workers' health: study with bank employees of the municipal district of Uberaba-MG, 2009, 170 p. Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-graduação em Ciências Médicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo/FMRP/USP, Departamento de Medicina Social. The Brazilian banking sector passed for intense process of transformation in the last few decades and occupied position of leadership in the incorporation of new technologies and organizations innovations. The observed productive reorganization in the sector objectified to adjust it the new forms to it of capitalist accumulation: the intense computerization of the banking work and other structural changes of the sector had not only affected the nature of the products but also the proper behavior of the markets, what it resulted in significant changes in the work conditions and, consequently, in the health of the workers. This study it had for objective to investigate the conditions of work of the bank clerks of a private institution in Uberaba, MG, Brazil, in the attempt to identify where measured the changes in the organization of the work they had intervened with its health. The collection of data if gave through recorded interviews with ten pertaining bank clerks the different hierarchic levels, of both the sexes, and the adopted criteria of inclusion had been: a. that the interviewed one had employment bond with the institution when of the accomplishment of the research and, b. that half of the interviewed ones had, in the minimum, ten years of career in the institution. The contacts with the workers had been mediated by the union of the category. The reconstitution of the work process, in the perspective of the bank clerks, denounces that beyond illnesses of physical order, as the occupational illnesses directly related to the intensification of the work rhythm, had also occurred the increase of the incidence of the mental suffering and the loss of the identity and the professional valuation, in result of the new requirements of the profession. The majority of the interviewed ones, independent of its time of act of contract, affirmed that the banking work lost its status. Feelings of frustration and unreliability in relation to the career had predominated in the depositions. The data had also disclosed concern with the suffered psychological pressure, mainly as for the fulfillment of goals. Expressions as mental consuming, stress, depression, psychological pressure, fear, uncertainty and unreliability had been gifts in the majority of the depositions. Word-keys: Bank clerks, Worker´s health, Organization of work, Occupational illnesses, Productive reorganization. LISTA DE FIGURAS Figura 1- Sede dos Bancos do Brasil e Crédito Real de Minas - Uberaba (1916) .................. 73 Figura 2 - Banco Hypothecário no centro da cidade de Uberaba - MG .................................. 74 LISTA DE QUADROS Quadro 1 - Principais fusões e aquisições no período entre 1998 a 2009 .............................. 39 Quadro 2 - Perfil do Município de Uberaba-MG, Microregião: Uberaba. Setor: Serviços. Subsetor: Instituições de Crédito, Seguros e Capitalização. Período: Janeiro de 2003 a Fevereiro de 2008 .................................................................................................................... 77 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Instituições e Agências Bancárias da cidade de Uberaba-MG .............................. 75 LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS %: porcento AB: Automação Bancária ABERJ: Associação dos Bancos do Estado do Rio de Janeiro ATMs: Automatic Teller Machines BACEN: Banco Central do Brasil BASA: Banco da Amazônia S/A BB: Banco do Brasil BBS: Bulletin Board System5 BC: Banco Central BCB: Banco Central do Brasil BI: Business Intelligence BNB: Banco do Nordeste do Brasil S/A BNDE: Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico BNH: Banco Nacional da Habitação CACEX: Carteiras de Câmbio e Comércio Exterior CAMOB: Caixa de Mobilização Bancária CAPRE: Comissão de Coordenação das Atividades de Processamento Eletrônico CARED: Carteiras de Redesconto CAT: Comunicação de Acidente do Trabalho CBO: Classificação Brasileira de Ocupações CDI: Customer Data Integration CEF: Caixa Econômica Federal CEP: Comitê de Ética em Pesquisa CETIP: Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos CGD: Caixa Geral de Depósitos CLT: Consolidação das Leis do Trabalho CMN: Conselho Monetário Nacional CNB: Confederação Nacional dos Bancários COPOM: Comitê de Política Monetária Corbans: Correspondentes Bancários CPD: Centro de Processamento de Dados CRM: Customer Relationship Management CUT: Central Única dos Trabalhadores CVM: Comissão de Valores Mobiliários DI/CPI: Depósitos Interfinanceiros DIEESE: Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos DORT: Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho DOU: Diário Oficial da União EE: Equipamentos Eletrônicos F&As: Fusões e Aquisições FMI: Fundo Monetário Internacional GCF: Grandes Conglomerados Financeiros IAPB: Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários 5 O termo BBS: significa, em português, sistema de boletim por computadores. INSS: Instituto Nacional de Seguridade Social LER: Lesões por Esforços Repetitivos LTN: Letras do Tesouro Nacional MG: Minas Gerais MP: Medida Provisória N°: Número NTI: Novas Tecnologias de Informação ORTN: Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional PAEG: Plano de Ação Econômica do Governo PLR: Participação nos Lucros e Resultados PNI: Política Nacional de Informática PROER: Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional PROES: Programa de Incentivo para a Reestruturação do Sistema Financeiro Estatal R$: Real SAD: Sistema de Apoio à Decisão gerencial SEEBU: Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Uberaba e região SELIC: Sistema Especial de Liquidação e Custódia SFH: Sistema Financeiro da Habitação SFI: Sistema Financeiro Imobiliário SFN: Sistema Financeiro Nacional SIRC: Sistema Integrado Regional de Compensação SPB: Sistema de Pagamentos Brasileiro STR: Sistema de Transferência de Reservas SUMOC: Superintendência do Crédito e da Moeda SUSEP: Superintendência de Seguros Privados TED: Transferência Eletrônica Disponível TTFs: Terminais de Transferência de Fundos SUMÁRIO 1 APRESENTAÇÃO ............................................................................................................ 15 2 INTRODUÇÃO................................................................................................................... 16 2.1 MUDANÇAS NO CENÁRIO DO TRABALHO - Do taylorismo às novas formas de acumulação produtiva .............................................................................................................. 16 3 O TRABALHO NOS BANCOS ........................................................................................ 3.1 BREVE HISTÓRICO DO SETOR BANCÁRIO BRASILEIRO .................................... 3.2 A AUTOMAÇÃO BANCÁRIA ....................................................................................... 3.3 DISPERSÃO TERRITORIAL DAS AGÊNCIAS BANCÁRIAS ................................... 3.4 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA ............................................................................. 3.5 CARACTERÍSTICAS DO TRADICIONAL SAVOIR-FAIRE BANCÁRIO .................. 3.6 IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA NO EMPREGO BANCÁRIO . 3.7 TRABALHO E SAÚDE ................................................................................................... 25 25 32 36 38 43 47 61 4 UBERABA: UNIVERSO EMPÍRICO DA PESQUISA.................................................. 72 5 O PERCURSO METODOLÓGICO ................................................................................ 79 5.1 BANCÁRIOS: OS ATORES SOCIAIS ............................................................................85 6 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS - As condições de trabalho no banco e sua interferência na saúde dos bancários ............................................................................ 93 6.1 REDEFINIÇÃO DO PERFIL PROFISSIONAL: (DES)APROPRIAÇÃO DO OFÍCIO BANCÁRIO............................................................................................................................. 96 6.2 DESVALORIZAÇÃO DO CARGO DE CONFIANÇA .................................................. 98 6.3 CORPORIFICAÇÃO DE UMA CULTURA FORTE ................................................... 102 6.4 A SELEÇÃO DARWINISTA ........................................................................................ 106 6.5 CARREIRA FECHADA - LAPIDAÇÃO DA MATÉRIA-PRIMA............................... 108 6.6 FUTURO INDESEJADO DENTRO DO BANCO ........................................................ 111 6.7 SAÚDE MENTAL: PRINCIPAL PROBLEMA NA PERSPECTIVA DOS BANCÁRIOS .............................................................................................................................................. 114 6.8 A SAÚDE FRÁGIL DENTRO DE UMA INSTITUIÇÃO SÓLIDA ............................ 117 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................. 123 REFERÊNCIAS .................................................................................................................. 126 APÊNDICE A - Roteiro da entrevista .................................................................................. 140 APÊNDICE B - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido .......................................... 141 AXEXO A - Resolução 3.110 - Consolidação das Normas de Correspondente Bancário ......................................................................................................................................... ...... 142 AXEXO B - Medida Provisória n° 794, de 29 de dezembro de 1994 - DOU de 30/12/94 ................................................................................................................................... ............ 145 ANEXO C - Ordem de Serviço INSS/DSS N° 606, de 5 de agosto de 1998 ...................... 147 ANEXO D - Lei das Filas .................................................................................................... 166 ANEXO E - Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa ................................................... 168 1 APRESENTAÇÃO A minha preocupação e meu interesse pelas questões do trabalho sempre estiveram permeados em minha trajetória acadêmica. Desde a minha formação em fisioterapia me diferenciava da maioria, pois tinha meus olhos voltados para as disciplinas de ergonomia e saúde do trabalhador, e ignorava a forma tendenciosa que algumas disciplinas eram ministradas com enfoque luminoso nas questões técnicas e uma insignificante nota de rodapé voltada realmente para as condições de trabalho e as consequências na saúde dos trabalhadores. Após a graduação busquei uma formação mais direcionada na minha profissão. Nesse período passei pela experiência de desenvolver um trabalho preventivo com funcionários de uma grande universidade particular, até que me inscrevi em um curso de especialização em Saúde Coletiva e abri uma pequena janela para os meus primeiros passos no estudo direcionado aos trabalhadores. Terminei por desenvolver minha monografia de conclusão de curso com uma pesquisa de campo que objetivava investigar a atenção e a atuação de mais de quarenta indústrias dos distritos industriais da minha cidade nos aspectos relativos à saúde dos trabalhadores. Finalmente encontrei a porta de entrada para me aventurar de verdade nessa linha de pesquisa e comecei a desenvolver este trabalho, que surgiu de minha necessidade em tentar entender um dos setores que considero mais exposto às mudanças ocorridas no universo do trabalho. Basta assistir toda a repercussão mundial, através dos noticiários, das campanhas publicitárias e a mídia em geral, envolvendo grandes nomes de instituições bancárias. Nas intercorrências do cotidiano do trabalho, particularmente, expressas no setor financeiro, notícias que nos informam a todo instante que certa instituição faliu e foi incorporada por outra ainda maior; ou ainda que, um determinado banco registrou o maior lucro dos últimos anos, se tornaram correntes nos últimos tempos. Diante de tanta concorrência e fusão; mudanças tecnológicas e inovações organizacionais; manipulação do principal produto do capitalismo e de toda ostentação que o setor financeiro se enreda me pergunto: e aqueles responsáveis por movimentar todas essas grandes organizações? Os trabalhadores que compõem uma agência bancária. Eu precisava mais que conhecer, era necessário ouví-los. 15 2 INTRODUÇÃO 2.1 MUDANÇAS NO CENÁRIO DO TRABALHO - Do taylorismo às novas formas de acumulação produtiva Novos contornos definem o processo de produção e de trabalho pelo estabelecimento de uma nova ordem do capital decorrente da resposta do capitalismo frente à sua própria crise. O modelo dominante ao longo do século XX, conhecido pelo binômio taylorista-fordista, atravessa um momento de crise de produtividade secular, consequente ao “excesso constante de capacidade e de produção do setor manufatureiro internacional” (ANTUNES, 1999, p. 30). Em resposta a essa crise de superprodução o capital inicia um processo de reestruturação produtiva, que ocasiona mudanças que “não são tão profundas” assim, mas são contínuas na estrutura da produção. O taylorismo-fordismo passa a conviver ou mesmo ser superado por outros modelos de organização da produção e do trabalho, com destaque ao modelo japonês ou toyotismo que possui maior capacidade de propagação (ANTUNES, 1999, p. 49). É fato que o modelo taylorista-fordista está sendo progressivamente substituído pelo toyotismo, mas para entender essa nova organização na produção e no trabalho é preciso recuar no tempo para analisar as modificações históricas do processo de trabalho (GOUNET, 1999). Vários autores já produziram e reproduziram diversos estudos na busca por alargar a visão compreensiva acerca da administração capitalista que envolve o mundo do trabalho. O longo processo contínuo pelo aumento de produtividade e racionalização sofre transformações desde a adoção da estratégia de cooperação dos trabalhadores e da divisão do trabalho na manufatura tradicional até a superação pela implantação da maquinaria e o surgimento da indústria moderna (NETZ, 2005). A “antevisão” de Marx, assim descrita por Moraes Neto (2002), já anunciava em sua obra O Capital, a progressiva desqualificação que os trabalhadores sofreriam com o desenvolvimento do capital e o avanço tecnológico (MORAES NETO, 2002). Tal como Braverman, em seu livro Trabalho e Capital Monopolista (1977), também aponta os mesmos problemas gerados pela maximização do capitalismo (perda do controle e desqualificação) e denuncia que para destituir o controle dos trabalhadores, o capital se resguardaria do estratagema de quebra da espinha dorsal do trabalho, ou “unidade natural”, segundo própria 16 terminologia bravermaniana, desvinculando a concepção da execução (CASTRO; GUIMARÃES, 1991). É visível na análise construída por Marx (1988 apud PREVITALLI, et. al., 2008) acerca da cooperação, manufatura e da grande indústria, como o padrão de produção ditado pelo capitalismo, ao longo dos tempos, ajusta, segundo seu próprio interesse, as forças produtivas à sua lógica apoderando-se do “saber do trabalhador” (PREVITALLI, et. al., 2008). Nas palavras de Navarro e Padilha (2007), “o que varia, em diferentes momentos, são as formas disto se objetivar” (NAVARRO; PADILHA, 2007, p. 17). A cooperação é o primeiro momento, descrito por Marx (1974), como a forma de trabalho que: [...] emprega um número relativamente grande de trabalhadores; de forma que o processo de trabalho seja extenso, gerando uma quantidade relativamente grande de produtos. Um maior número de trabalhadores juntos ao mesmo tempo, no mesmo lugar, para produzir algum tipo de mercadoria sobre as ordens de um capitalista, constitui-se, tanto histórica quanto logicamente, no início do modo de produção capitalista (MARX, 1974, p. 363). Nesse momento o trabalhador ainda mantinha o controle sobre as suas próprias técnicas de produção, mas diferentemente do artesanato, já não lhe pertencia mais o produto final (MARX, 1988). Na descrição feita por Freyssenet (1984 apud HIRATA, 1989), nesse processo a autoridade do capital é responsável pela destinação, organização e produção enquanto que os trabalhadores ainda se preservam “completos” por deterem o conhecimento do processo do qual participam (HIRATA, 1989). À medida que se configura a perda do controle das mãos dos trabalhadores para a influência do capital, Marx (1980 apud CABRAL JÚNIOR, 2002) denuncia a intensificação do trabalho coletivo e aponta os primeiros indícios do distanciamento entre o trabalhador e o processo de trabalho (CABRAL JÚNIOR, 2002). Mas é preciso entender que essa organização do trabalho é mantida a mesma encontrada no artesanato e a cooperação ainda não provoca desqualificação. O primeiro passo nessa direção veio com a manufatura, segunda etapa da evolução das forças capitalistas de produção (MULLER, 2006). A divisão manufatureira do trabalho, assim denominada por Adam Smith em sua velha máxima6 ou a 6 “A velha máxima de Adam Smith (1723-1790), em sua clássica obra A Riqueza das Nações” (COSTANZI, 2007, p. 35). 17 divisão capitalista do trabalho, por Stephen Marglin7 (MORAES NETO, 2002), segundo os conceitos marxianos: [...] opõe-lhes (aos trabalhadores) as forças intelectuais do processo de produção, como propriedade de outrem e como poder que os domina. Esse processo de dominação começa com a cooperação simples em que o capitalista representa, diante do trabalhador isolado, a unidade e a vontade do trabalhador coletivo. Esse processo desenvolve-se na manufatura que mutila o trabalhador, reduzindo-o a uma fração de si mesmo, e completa-se na indústria moderna, que faz da ciência uma força independente do trabalho, recrutando-a para servir ao capital (MARX, 1975, p. 43). Dessa forma a manufatura se apropria de um grande número de trabalhadores que são separados de acordo com a decomposição do seu ofício em tarefas parceladas, dispostos em uma hierarquia que segrega os trabalhadores qualificados dos não-qualificados para a produção em série padronizada. O ritmo da produção já se assemelha a regularidade de uma máquina ao ser ditado pela própria dependência do “trabalho vivo” dividido (PREVITALLI, et. al., 2008). O efeito imediato em destaque é justamente o aceleramento da produção a partir da especialização, da simplificação dos movimentos por função e racionalização do tempo, considerado por Smith como o “ritmo de criação da riqueza” que ao seu entendimento está vinculado aos efeitos positivos da divisão manufatureira do trabalho sobre a “eficiência produtiva”, visão essa, segundo Moraes Neto (2002), criticada por Marglin, cuja contraposição não considera a divisão manufatureira advinda da manufatura e sim uma característica própria da divisão do trabalho ditada pelo capitalismo (MORAES NETO, 2002). Ainda assim, as funções parciais e especializadas desenvolvidas na manufatura não foram satisfatórias para o capital abstrair completamente os trabalhadores do seu próprio trabalho (CIPOLLA, 2003). A incorporação da máquina e o surgimento da Grande Indústria materializaram a aplicação tecnológica e a supressão das insubordinações que o capitalismo tanto almejava. O limite que continha a dominação do capital, sobre o controle da base técnica na manufatura, começa a ser transposto ao se tornar independente do “trabalho vivo”. E o maquinismo, dessa forma, colabora para a perda do conteúdo do trabalho por depreciar o conhecimento e as habilidades, garantias de valorização da força de trabalho, até então fora do campo de domínio do capitalismo (PREVITALLI, et. al., 2008). As máquinas, responsáveis por esse processo de evolução do capital, segundo Marx (1985 apud NETZ, 2005), 7 “Em 1974, Stephen Marglin publicou o artigo intitulado ‘What do bosses do? The origins and fuctions of hierarchy in capitalist production’” (MORAES NETO, 2002, p. 269). 18 [...] superam a atividade artesanal como princípio regulador da produção social. Assim, por um lado, é removido o motivo técnico da anexação do trabalhador a uma função parcial, por toda a vida. Por outro lado, caem as barreiras que o mesmo princípio impunha ao domínio do capital (NETZ, 2005, p. 4). Entretanto o momento determinante para o progresso do capitalismo foi o surgimento estratégico da administração científica, o taylorismo (CASTRO; GUIMARÃES, 1991). Através dos estudos de Frederick Winslow Taylor, sobre a gerência científica, o capital encontrou uma forma mais eficaz de controle do processo de trabalho (NETZ, 2007). Essa nova análise científica desenvolveu métodos e manuais otimizados, após experiências relativas ao tempo e movimento, economizando os gestos e aumentando a produtividade, restando aos trabalhadores apenas cumprirem tarefas já pré-designadas (MULLER, 2006). Para alguns autores a administração tayloriana não representou nenhuma grande inauguração da ciência do trabalho, segundo Vatin (2002 apud NETZ, 2007), Taylor apenas organizou sistematicamente os pensamentos industriais modernos que eclodiam na conjuntura histórica (NETZ, 2007). Também para Cipolla (2003) a administração científica apenas expressa o trabalho intensificado e regulado pelo ritmo da máquina, representando um princípio advindo desde a manufatura, e ainda conclui que “Taylor realiza com a obsessão de uma neurose o que o sistema tende a produzir por sua própria natureza” (CIPOLLA, 2003, p. 84). Ou seja, “ele deu uma filosofia e título a uma série desconexa de iniciativas e experiências” (URWICK; BRECH, 1949 apud BRAVERMAN, 1977, p. 85). Mas para outros autores, como Coriat e Lipietz8, não se pode subestimar tanto a teoria organizacional tayloriana, eles defendem o reconhecimento e a valorização de sua especificidade. Compartilhando dessa mesma opinião, o autor argentino Kliksberg (1975 apud URBÁEZ, 2005) considera Taylor como um marco para o conhecimento em administração de empresas, incomparável aos seus antecessores, sendo o primeiro a elaborar uma “concepción integral del trabajo humano en la industria” (URBÁEZ, 2005, p. 23). Os princípios da administração tayloriana para a organização racional do trabalho são fundamentados, basicamente, na separação da concepção e a execução, maior fragmentação possível do trabalho e maximização da eficácia do trabalho vivo evitando o desperdício do tempo mínimo (TAYLOR, 1976). Ao traçar um comparativo com outros estudos sobre teorias 8 Benjamin Coriat e Alain Lipietz, autores pertencentes à escola da regulação desenvolvida na França. A Escola Francesa da Regulação, ou Teoria da Regulação, se desenvolveu a partir da necessidade de interpretar a crise econômica vivida em meados de 70. O primeiro trabalho de destaque da Escola foi do autor Michael Aglietta, "Régulation et crises du capitalisme", 1976. 19 de organização, como por exemplo, a teoria de gestão de Charles Babbage9 e a teoria clássica de Henry Fayol10, Taylor se diferencia por não se preocupar em melhorar as condições de trabalho e sim, em propor uma solução aos problemas vividos pelas organizações (BRAVERMAN, 1977). A gerência científica apenas representa, nas palavras de Braverman (1977), “um empenho no sentido de aplicar os métodos da ciência aos problemas complexos e crescentes do controle do trabalho nas empresas capitalistas em crescente expansão” (BRAVERMAN, 1977, p. 82). Problemas esses que comprometiam o rendimento e a produtividade das instituições, cujas respectivas causas foram apontadas por Taylor como vadiagem ou “fazer cera”11 por parte dos trabalhadores; desconhecimento e despreparo dos gerentes e falta de técnicas eficazes na execução do trabalho (LAZAGNA, 2002). Fundamentalmente, a estratégia empresarial desse modelo é baseada no trabalhador conduzido pela máquina ou nas próprias palavras de Bell, (1973 apud SAUL, 2004) onde “as coisas conduzem os homens” (SAUL, 2004, p. 237). O capitalismo ainda encontrou um reforço maior para sua consolidação através da associação do modelo de organização de produção fundado por Taylor com a tecnologia e a prática oferecidas por Henry Ford, que apesar das suas respectivas particularidades ambos se completaram. O fordismo consegue efetivar a conexão das tarefas parceladas e controladas pelo taylorismo, ao criar a esteira rolante que integra continuamente todos os diferentes postos de trabalho (MERLO; LAPIS, 2007). O desenvolvimento dos conceitos de produção - e consumo - em massa, advindos dessa segunda concepção teórica, esteve diretamente vinculado à aplicação dos princípios da gerência científica (WOOD JR., 1992). Assim, segundo Cipolla (2003) “a esteira nada mais seria do que a mecanização do taylorismo” (CIPOLLA, 2003, p. 84). A aplicação da linha de montagem fordista alcançou resultados expressivos como aumento da produtividade, diminuição do tempo de produção, redução de custos e estoques, barateamento da mercadoria e incentivos salariais (MULLER, 2006). Um conjunto de vantagens que tem como realidade a intensificação do ritmo de trabalho, disciplina e controle rigoroso, sofrimento físico e psíquico ao qual os trabalhadores forem entregues (MERLO; LAPIS, 2007). 9 Charles Babbage (1791-1871), matemático inglês, criador da máquina da diferença e da máquina analítica (ancestrais da calculadora), elaborou um estudo comparativo entre as práticas administrativas. 10 Henry Fayol (1841-1925), engenheiro francês, criador da Teoria Clássica da Administração. 11 “O trabalhador vem ao serviço, no dia seguinte, e em vez de empregar todo o seu esforço para produzir a maior soma possível de trabalho, quase sempre procura fazer menos do que pode realmente e produz muito menos do que é capaz. (...) Trabalhar menos, e isto é, trabalhar deliberadamente devagar, de modo a evitar a realização de toda a tarefa diária, fazer cera (...) é o que está generalizado nas indústrias” (TAYLOR, 1970 apud BARROS, 1999, p. 78). 20 Esse complexo percurso do capital, desde o princípio até sua consolidação, sofreu profundas transições que compreenderam momentos opostos de crises e apogeus. Etapas históricas marcadas por transformações tecnológicas, no modo de produção e organização, no perfil e qualificação do trabalhador, nas formas de controle, na atuação dos sindicatos e na participação do Estado (GORENDER, 1997). Antunes (2007) faz referência a essas mudanças afirmando que “as lutas sociais, a crise estrutural do capitalismo, a superprodução, o envelhecimento do sistema taylorista/fordista, a tendência decrescente das taxas de acumulação, fizeram com que o capitalismo mudasse um pouco sua forma para que pudesse continuar sendo o capitalismo” (ANTUNES12, 2007). Em outras palavras, ou melhor, nas palavras de Gounet (1999), [...] o sistema capitalista em seu conjunto que está sendo atingido pela crise econômica. É o sistema em seu conjunto que se enreda em suas contradições profundas. Enquanto houver exploração, haverá crise. [...] o capitalismo cria, então, as condições objetivas para sua ruína (GOUNET, 1999, p. 10). Entretanto, mais uma vez o “sistema de metabolismo social do capital” se apresenta sem limites para repor o controle diante dessas adversidades contrárias a sua expansão (PERES, 2004). É nesse contexto acima apresentado que emergiram as respostas do capital a essa crise estrutural em busca de novos padrões de dominação, instaurando um intenso processo de reestruturação da produção e do trabalho, que se estende até os dias atuais (ANTUNES, 1999). Entre várias formas de acumulação de capital, o modelo japonês se destaca e o regime taylorista/fordista de acumulação enfrenta sua crise econômica através da propagação do toyotismo13, o qual em algumas situações supera o modelo tradicional e em outras, convivem juntos (GOUNET, 1999). A era da acumulação flexível, como nova forma de organização industrial e de relacionamento entre o capital e o trabalho, é responsável pela incorporação de novas tecnologias e inovações organizacionais, baseada na informática, robótica, microeletrônica e larga automação (BARROS, 1999). Características inovadoras de uma nova fase que emprega estratégias como o just in time, team work, kanban, eliminação do desperdício, terceirização e controle de qualidade total. Esse plano discursivo toyotista teve alta capacidade de propagação sendo amplamente adotado pelas empresas em todo o mundo (PERES, 2004). 12 Disponível em: http://www.boitempo.com/publicacoes_imprensa.php?isbn=85-7559-0839&veiculo=Caros%20amigos. 13 Ou também conhecido por “ohnismo”, em referência ao seu criador Taiichi Ohno, engenheiro da Toyota. 21 O domínio do capital passa a perceber que em vez de limitar a exploração apenas do suor e da força de trabalho física da “classe-que-vive-do-trabalho” poderia aumentar ainda mais o seu poder de lucratividade explorando também a imaginação e a inteligência dos mesmos (ANTUNES, 1999). O capital destrói o operário-massa, ou como própria expressão de Taylor, “gorila amestrado” e vende a ideologia do trabalhador polivalente, multifuncional, flexível, qualificado e participativo capaz de desempenhar um papel ativo no ambiente de trabalho (PERES, 2004). Esse novo paradigma técnico-produtivo mantém as mesmas formas objetivas de exploração do trabalho e ainda amplia outras formas subjetivas de exploração, combinando fortemente novos e velhos mecanismos de acumulação (NAVARRO; PADILHA, 2007). É visível a superficialidade da resposta dada à profunda crise estrutural, que manteve a continuidade do padrão anterior e não alterou os principais pilares que sustentam o modo capitalista (ANTUNES, 1999). Para Coriat, simplesmente o taylorismo de Taylor e o fordismo de Ford serviriam como embasamento para o novo modelo de produção capitalista, o toyotismo (GOUNET, 1999). O setor financeiro brasileiro esteve, nos últimos tempos, vivenciando esse intenso ajuste estrutural com a globalização do sistema financeiro, o acirramento da concorrência entre os bancos nacionais e internacionais, as mudanças institucionais, os planos econômicos particularmente o Cruzado e o Real - e, ainda, a redução dos índices inflacionários (DIEESE, 1997a). A reestruturação produtiva atinge o sistema financeiro objetivando promover o ajuste desse setor à nova forma de acumulação capitalista. Tal reorganização do sistema caracterizase, principalmente pela proliferação e descentralização das atividades financeiras, e criação de novos instrumentos e mercados (SEGNINI, 1997). Todos os setores da economia sofreram rearranjos organizacionais decorrentes da reestruturação produtiva intensificada principalmente nos anos de 1990. O setor financeiro, como parte do setor terciário, foi o primeiro a iniciar esse processo e vem destacando posição de liderança na incorporação de novas tecnologias e inovações organizacionais. A primeira fase da reestruturação, descrita por Filgueiras (2001), inicia-se após a experiência do Plano Cruzado em promover o controle da inflação afetando contrariamente o setor financeiro. Uma verdadeira recessão para os bancos que perderam as possibilidades de lucro no mercado favoráveis pelas altas taxas de inflação (FILGUEIRAS, 2001). Nesse período os bancos foram obrigados a adotarem estratégias de reestruturação, de racionalização das atividades administrativas e redução da mobilidade territorial, e em consequência, várias 22 agências bancárias foram levadas à falência desencadeando um movimento de demissão em massa, ficando conhecida como a “primeira onda recessiva” (PIRES, H. F., 1997). A edição desse plano representou o começo do processo de reestruturação no sentido “para dentro” (reorganização interna) das agências bancárias, considerada a primeira “experiência heterodoxa” de adequação da economia brasileira que alcançou a redução dos níveis de inflação do país, despertando nos bancos a necessidade de se adequarem para sobreviver nessa nova realidade econômica (DIEESE, 1997a). Entre todas essas mudanças estruturais a prioridade foi dada à implementação de estratégias que tornaram possível a redução dos custos operacionais dentro das agências (NETZ, 2005). As mudanças organizacionais na gestão do trabalho e as políticas neoliberais, durante o Plano Collor, foram responsáveis pelo surgimento da “segunda onda recessiva” do setor bancário, caracterizando a segunda reestruturação vivida pelos bancos (PIRES, H. F., 1997). A queda abrupta da inflação e a redução da liquidez do mercado intensificaram o processo de racionalização e o número de demissões. Destaque nesse período para a criação dos cartões magnéticos, desenvolvimento de atendimentos personalizados para clientes de renda mais alta e a implantação do caixa eletrônico para aqueles de renda média, como forma de segmentação da clientela. Além da continuidade do movimento de reestruturação administrativa, iniciada no plano anterior, que pode ser resumida em poucas palavras: flexibilização, terceirização e diminuição dos níveis hierárquicos (GOMES, 2001). A terceira fase veio com o Plano Real que intensificou o processo no sentido de privatização, concentração e desnacionalização do setor financeiro brasileiro. O acirramento da competição entre as instituições provocou vários casos de falência e a ampliação da racionalização. Os bancos adotaram algumas estratégias como a cobrança de uma maior diversidade de serviços e produtos, intensificação da terceirização e a exteriorização dos clientes das agências redefinindo tarefas e atividades bancárias tradicionais (FILGUEIRAS, 2001). Tendo como referência todas essas modificações nas condições e relações de trabalho, estabelecidas por esse novo contexto, optou-se por investigar o adoecimento dos bancários submetidos a um processo contínuo de redefinição de perfil, e até de extinção, enquanto categoria. Dessa forma, esta pesquisa, de caráter qualitativo, objetivou investigar as condições de trabalho dos bancários de uma instituição privada da cidade de Uberaba-MG, para identificar 23 em que medida as formas de organização do trabalho, as quais esses trabalhadores estão submetidos, interferem em sua saúde segundo seus próprios depoimentos. O estudo compreendeu dois momentos que se complementam entre si: o levantamento bibliográfico e a pesquisa de campo. O levantamento bibliográfico, concatenado com os objetivos da pesquisa, buscou abordar questões presentes na literatura referentes à reestruturação produtiva, o trabalho bancário e a saúde física e mental dos bancários, e o trabalho de campo foi desenvolvido para obter dados através de entrevistas gravadas com bancários da instituição em estudo. Este capítulo introdutório dedicou-se à descrição e caracterização das passagens sofridas no seio do processo produtivo, abordando as principais mudanças vividas no cenário do trabalho, desde o período do taylorismo-fordismo evoluindo até as novas formas de acumulação produtiva O capítulo seguinte, o terceiro, intitulado “O Trabalho nos bancos”, parte de um breve percurso histórico do sistema financeiro brasileiro e descreve as questões referentes ao processo de reestruturação produtiva, contextualizando-as historicamente, e as mudanças acarretadas junto aos bancários. A partir do resgate histórico do setor bancário, busca-se o entendimento das mudanças ocorridas com o advento da reestruturação. No Capítulo 4 é feita uma apresentação do desenvolvimento do setor bancário na cidade onde foi realizada a pesquisa. No quinto capítulo é apresentado o percurso metodológico e o perfil dos trabalhadores entrevistados. No Capítulo 6 é feita a apresentação e análise dos dados obtidos através das entrevistas dos bancários. A seguir são apresentadas as considerações finais do trabalho, referências e anexos. “[...] trata-se de manipular a mercadoria de maior valor simbólico no capitalismo, o dinheiro.” Herval Pina Ribeiro, 1999, p. 59. 24 3 O TRABALHO NOS BANCOS 3.1 BREVE HISTÓRICO DO SETOR BANCÁRIO BRASILEIRO Historicamente, o Banco do Brasil (BB)14 é a principal referência para a história do setor bancário nacional e está presente em quase todas as fases vividas por esse setor, atrelada muitas vezes com a própria história do setor financeiro brasileiro (HAJJ, 2005). O Sistema Financeiro Nacional (SFN) surgiu em 1808, com a criação do primeiro BB, propiciada pela chegada da família real no país. Nesse momento o rei de Portugal abriu os portos e estabeleceu acordos comerciais com a Europa e as outras colônias (BATHKE; PEREIRA, 2002). O primeiro BB, criado como uma instituição de caráter privado, iniciou suas atividades em 1809 e o retorno em 1821 de D. João VI e da corte a Portugal com os recursos depositados no BB gerou a primeira importante crise da instituição, sendo encerradas suas atividades em 1829 (OLIVEIRA, 2001). As principais operações, da primeira instituição (privada) do BB no Brasil, consistiam: no desconto mercantil de letras de câmbio, sacadas ou aceitas por negociantes de crédito nacionais ou estrangeiras; em atuação como comissionário, na percepção dos cômputos, que por conta de particulares, ou dos estabelecimentos públicos, arrecadar, ou adiantar, debaixo de seguras hipotecas; no depósito geral de toda e qualquer coisa de prata, ouro, diamantes, ou dinheiro, recebendo segundo o valor do depósito, ao tempo da entrada, o competente prêmio; na emissão de letras ou bilhetes pagáveis ao portador à vista, ou a um certo prazo de tempo, com a necessária cautela, para que jamais estas letras ou bilhetes deixem de ser pagos no ato da apresentação, sendo a menor quantia por que o banco poderá emitir uma letra ou bilhete, de trinta mil réis; na comissão dos saques, por conta dos particulares, ou do Real Erário, a fim de realizarem os fundos, que tenham em país estrangeiro, ou nacional, remoto; em receber toda a soma, que se lhes oferecer a juro da lei, pagável em certo prazo em bilhetes à vista, ou à ordem do portador ou mostrador; na comissão da venda dos gêneros privativos dos contratos e administrações reais, quais sejam os diamantes, pau-brasil, marfim e urzela; e no comércio das espécies de ouro e prata, que o banco possa fazer, sem que se intrometa em outro algum ramo de comércio ou de indústria estabelecidos, ou por estabelecer, que não esteja compreendido no detalhe das operações, que ficam referidas neste artigo (SIMONSEN, 1977, p. 411). No ano de 1831 nasceu, sem muito êxito, a Caixa Econômica na cidade do Rio de Janeiro e logo em seguida no ano de 1833 já surgia a segunda agência do BB, uma tentativa 14 Doravante denominado BB. 25 fracassada de reorganização em virtude das fraudes ocorridas durante o processo de extinção do primeiro BB (FREITAS, 2005). Em 1836, foi criado o Banco do Ceará, que também teve uma duração breve, fechando suas portas já em 1839. Em 1838 nasceu o Banco Comercial do Rio de Janeiro e sua ascensão estimulou a instalação de outros bancos privados, tais como o Banco do Maranhão, em 1846, o Banco do Pará, em 1847, o Banco Comercial de Pernambuco, em 1851 e o Banco Comercial do Pará, em 1853 (MARCON, 1996). Observando que a maioria dos primeiros bancos foi criada na região Nordeste do país, que na época apresentava destaque econômico (TOLEDO FILHO, 2006). A terceira agência do BB (privado) foi criada em 1851, por sugestão de Irineu Evangelista de Souza, o visconde de Mauá e dois anos mais tarde, em 1853, viria a se fundir com o Banco Comercial do Rio de Janeiro originando a quarta agência BB, sendo a primeira fusão bancária ocorrida na história brasileira. Essa nova consolidação se disseminou por vários outros Estados (FREITAS, 2005). O ano de 1863 foi marcado pela chegada dos primeiros bancos estrangeiros, o London & Brazilian Bank e o The Brazilian and Portuguese Bank, ambos sediados na cidade do Rio de Janeiro. No final da década de 1870 o país já contava com o total de dezessete bancos que intermediavam as atividades financeiras dos setores cafeeiro e de infra-estrutura (PRICEWATERHOUSECOOPERS, 2000). Em 1878, entre o total de bancos existentes no Brasil, seis se encontravam em São Paulo, seguindo uma tendência observada após a virada do século XX (FEBRABAN, 1994). Em 1888 havia no Brasil o total de sessenta e oito agências bancárias (COSTA NETO, 2004). E nesse mesmo ano a liberdade conquistada pelos escravos trouxe consequências para a economia rural, altos índices de inflação foram gerados, ao mesmo tempo em que, houve o incentivo para a primeira onda de industrialização. Esse processo iniciado em 1889 se estendeu até o ano de 1891, provocando uma nova onda inflacionária (FREITAS, 2005). A quinta agência BB surge, em 1906, a partir da fusão entre o BB de 1853 e o Banco da República do Brasil. O atual BB representa a continuidade do processo emergido em 1906 (FREITAS, 2005). Nesse mesmo período, os bancários começaram a se organizar, formando em 1907 a Sociedade Beneficente dos Funcionários da Caixa Econômica de São Paulo, a primeira organização de socorro mútuo, com o objetivo principal de determinar a distinção legal entre bancários e comerciários. Sua atividade durou até os anos de 1930, ao ser sufocada pela legislação corporativista (JUNCKES, 2008). 26 A Inspetoria Geral dos Bancos, em 1920, foi criada e o Decreto nº 14.728, de 16.03.21, veio com o intuito de aprovar o regulamento para fiscalizar os bancos e as casas bancárias (FREITAS, 2005). Nessa década foram também criados o Clube dos Bancários e o jornal “Vida Bancária” (FEBRABAN, 1994). Em 1921, a Câmara de Compensação de Cheques foi criada no Rio de Janeiro, sob a responsabilidade do Banco do Brasil e em 1932, surgiu a Câmara de Compensação de São Paulo (FREITAS, 2005). Em São Paulo, em 1923, já se somavam dezoito agências e 1.800 bancários, e nesse mesmo ano foi realizada uma reunião para aprovar os estatutos da Associação dos Funcionários de Bancos do Estado de São Paulo (a primeira do país) (FEBRABAN, 1994). A reforma bancária vivida em 1924 para organizar e fortalecer o sistema bancário acabou criando um órgão controlador conhecido como Inspetoria Geral de Bancos e instituindo o BB da função de banco emissor (OLIVEIRA, 2001). Na década de 1930 os bancários reivindicaram a aposentadoria compulsória aos 55 anos (ou 25 de serviço) e a caixa de aposentadoria única. Na época já circulava o boletim, “O Bancário”, que traz na matéria intitulada, “Órgão real de defesa da classe dos infelizes proletários de colarinho e gravata”, exigências referentes à participação nos lucros, jornada de trabalho de seis horas diárias e normatização da aposentadoria. Em 1932, ocorre a primeira grande greve da categoria no país, com a adesão dos bancários da filial e da matriz, a filial de Santos do Banco do Estado de São Paulo parou suas atividades com objetivo de estabelecer duas horas livres para almoço e o pagamento das horas extras noturnas. A batalha pela jornada de seis horas de trabalho foi ganha no ano de 1933, mas ainda há um descontentamento por não conseguir reduzir as 36 horas semanais para 32 horas, conforme a semana inglesa (FEBRABAN, 1994). Em 1934, nasceram as Caixas Econômicas Federais e em 1942, o Banco de Crédito da Borracha, que começou a desenvolver novas atividades e foi renomeado como Banco de Crédito da Amazônia. Logo depois se transformou no Banco da Amazônia S/A (BASA) e ganhou a nova função de agente financeiro da política do governo federal para o desenvolvimento da Amazônia legal - área correspondente a 59% do território nacional (FREITAS, 2005). Nesse mesmo ano acontece uma paralisação nacional protestando a intransigência do governo em negociar as reivindicações dos bancários. A greve objetiva alcançar a estabilidade empregatícia, a aposentadoria aos 30 anos de serviço ou nos 50 de idade e a criação de uma Caixa Única de Aposentadorias e Pensões dos Bancários. O efeito 27 imediato foi a aceitação do governo pela aposentadoria voluntária aos 30 anos de serviço ou aos 50 anos de idade e após dois meses, foi editado o Decreto Lei 54 que regulamenta o Instituto de Aposentadorias e Pensões dos Bancários (IAPB) dando o direito de pensão alimentícia à família, além da estabilidade após dois anos de trabalho, do auxílio-enfermidade e maternidade e da Carteira Predial, garantindo a oportunidade para adquirir ou construir a casa própria (FEBRABAN, 1994). O marco histórico no desenvolvimento do mercado e capital brasileiro pode ser apontado como a Conferência Monetária e Financeira das Nações Unidas e Associados, no ano de 1944 nos Estados Unidos. Através desse evento foram criadas as instituições financeiras internacionais - o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial - com a missão de orientar e supervisionar o sistema financeiro internacional no período do pósguerra e principalmente, fixar a paridade cambial entre o dólar norte-americano e o ouro (FREITAS, 2005). Apesar das recomendações da conferência de 1944, o BB continuou responsável pela adoção de ações e fiscalização das instituições financeiras no mercado brasileiro, perdendo apenas a sua função normativa que foi repassada à Superintendência do Crédito e da Moeda (SUMOC), criada em 1945, que na prática seria o esboço do futuro Banco Central (SANTOS, 2005). O encarregado da formulação de política monetária, SUMOC, não controlava a sua execução, o que era realizado na verdade pelo “Banco do Brasil através de suas Carteiras de Redesconto (CARED), de Câmbio e Comércio Exterior (CACEX); pela Caixa de Mobilização Bancária (CAMOB), uma instituição administrada pelo diretor da CARED; e da Caixa de Amortização, do Ministério da Fazenda”, responsável pela emissão de moeda, “mediante solicitação da CARED ou da CAMOB, após autorização da SUMOC” (BARBOSA, 1995, p. 2). Já a CAMOB tinha como finalidade auxiliar as instituições em crise de liquidez, decorrente de saques anormais dos depositantes e a CARED, além do redesconto bancário normal, também refinanciava determinadas atividades, em nome do governo. A CACEX atuava na implantação da política de comércio exterior, enquanto que a Carteira de Câmbio do Banco do Brasil na política de câmbio e administração das reservas internacionais do Brasil (BARBOSA, 1995). A primeira entidade (financeira) de crédito, financiamento e investimento foi fundada em 1946 (FREITAS, 2005). Outro ponto histórico de destaque é a criação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), em 1952 (SANTOS, 2005). O banco de fomento tem por objetivo financiar, a longo prazo, os projetos que contribuíam para o desenvolvimento 28 do país. O BNDE criou e implantou o Programa de Reaparelhamento Econômico com o objetivo de gerar infra-estrutura adequada ao desenvolvimento. “O Decreto-lei nº 1.940, de 26.05.82, transformou o BNDE em BNDES” (FREITAS15, 2005). Com o intuito de averiguar as consequências da seca de 1951, o então ministro Horácio Lafer viajou até o nordeste e, ao retornar, pediu ao presidente Getúlio Vargas que criasse o Banco do Nordeste do Brasil S/A (BNB), nasce assim em 1952 o BNB objetivando auxiliar o desenvolvimento da região castigada pelas secas (FREITAS, 2005). Até 1964, os bancos da época atuavam somente nas intermediações financeiras, em atividades regionais e descentralizadas através de sedes espalhadas por todo o país. As instituições financeiras dividiam-se basicamente em bancos privados, comerciais, BB e Tesouro Nacional, após esse ano o sistema financeiro brasileiro iniciou o processo no sentindo de concentração levando a encontrar as mesmas instituições em todo território brasileiro (BLASS, 1993). “A reforma bancária de 1964, através da lei nº 4595, de 31/12/1964, criou o Banco Central do Brasil (BCB), que começou a funcionar em abril de 1965. Essa reforma foi importante porque até aquele momento o Brasil não tinha um banco central” (BARBOSA, 1995, p. 5). Nesse mesmo ano nasceram o Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e o Banco Nacional da Habitação (BNH). A Reforma Bancária (Lei n. 4595, de 31. 12. 1964), a Reforma do Mercado de Capitais (Lei n. 4728, de 14.07.1965) e o Plano de Ação Econômica do Governo (1964/1966) criaram mecanismos legais de controle e fiscalização pelo Estado, das instituições públicas e privadas do sistema financeiro; entre outros, estabeleceram a formação de instituições financeiras especializadas na captação e aplicação de recursos a médio e longo prazo, institucionalizaram a correção monetária na remuneração de aplicações para incentivar a poupança (GRISCI; BESSI, 2004, p. 172). O BNH foi extinto e sucedido pela Caixa Econômica Federal (CEF) e o Conselho Monetário Nacional (CMN) foi criado assumindo a função normativa do SFH. Ainda no mesmo ano o SFN foi regulamentado e o BCB substituiu a SUMOC. Com essa nova lei de 1964 a Caixa de Amortização, a CARED, a CAMOB e a fiscalização bancária que funcionava no BB foram extintas, transferindo essas funções para o BCB, “inclusive a política cambial e a administração das reservas internacionais”. A Reforma Bancária, entretanto, não proibiu o BC de exercer atividades que não competem a um banco central, “como as de banco de fomento, subsidiar setores da economia ou regiões do país, e fiscalizar certas atividades como 15 Disponível em: http://www.newton.freitas.nom.br/artigos.asp?cod=165. 29 os consórcios de automóveis”. Além disso, a Reforma estabeleceu a “função de conceder autorização para funcionamento de instituições financeiras ao BCB, bem como exercer a fiscalização sobre essas instituições e aplicar as penalidades previstas” (BARBOSA, 1995, p. 2). A Reforma também significou apoio e incentivo, através do poder estatal, ao capital comercial e industrial com a finalidade de maximizar o capitalismo monopolista, favorecendo, assim, os trâmites financeiros, essenciais a tal empreendimento que desenvolvia, conforme o aumento do volume de capitais circulantes (BATISTA, 2006). Com a instituição do governo militar de 1964, desenvolveu se o Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) para planejar as ações governamentais até o ano de 1967 (SANTOS, 2005). Em 1966, nasceram os bancos de investimento e as companhias de seguro foram regulamentadas, instituindo o Conselho Nacional de Seguros Privados e a Superintendência de Seguros Privados (SUSEP) (SANTOS, 2005). No ano seguinte o CMN ofereceu facilidades às empresas na obtenção de recursos estrangeiros, facilitando a movimentação de capitais. “A Resolução nº 63, de 23.08.1967, do CMN, autorizou os bancos a captarem empréstimos externos destinados a repasse às empresas no país” (FREITAS16, 2005). Em 1969, surgiu o Sistema Integrado Regional de Compensação (SIRC), integralizando “as praças localizadas em uma mesma região”. Na década de 1970, surgiu a Compensação de Recebimentos. Em 1983, surgiu a Compensação Nacional, a qual interligou todo o País, e em 1988, a Compensação Eletrônica (FREITAS, 2005). No próximo ano nasce uma instituição financeira sob a forma de empresa pública, a Caixa Econômica Federal, e no mesmo ano foram criadas as Letras do Tesouro Nacional (LTN) melhorando o funcionamento do mercado aberto (SANTOS 2005). No ano de 1974 nasceram as sociedades de arrendamento mercantil e em 1976, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM), para regulamentar o mercado de valores mobiliário (FREITAS, 2005). O Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC), criado em 1979, passou a realizar, como o próprio nome indica, a liquidação e custódia financeira envolvendo títulos públicos como as LTN e as Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTN), garantindo maior segurança nas operações de mercado a partir da substituição do uso do cheque para a liquidação de operações (WIKIPÉDIA, 2008). 16 Disponível em: http://www.newton.freitas.nom.br/artigos.asp?cod=165. 30 “O CMN, alicerçado no artigo 4º, inciso IX, da Lei nº 4.595/64, liberou para o regime de mercado as taxas de juros praticadas pelas instituições financeiras, através da Resolução nº 1.064, de 05.12.85” (FREITAS, 2005). Em 1986, o Banco Central e as instituições financeiras criaram a Central de Custódia e de Liquidação Financeira de Títulos (CETIP), como meio para o fortalecimento do SFN e mudança do Sistema de Pagamentos Brasileiro (SANTOS, 2005). Atuando como um balcão organizado de ativos e derivados, a CETIP é responsável por administrar os ambientes de negociação e registro de valores mobiliários. Sua criação possibilitou o surgimento dos Depósitos Interfinanceiros (DI ou CDI) - item III da Resolução nº 1.102, de 28.02.86, do CMN (FREITAS, 2005). No ano de 1988, foram regulamentadas e liberadas as regras para o mercado bancário e também instituído, sob a autorização do CMN, o “Banco Múltiplo” com a finalidade de controlar a atuação conglomerada das instituições financeiras (JUNCKES, 2007). Com o estabelecimento da constituição de 1988 inicia a era da estabilidade na tentativa de estruturar o SFN instaurando o desenvolvimento e o equilíbrio do país, ao mesmo tempo que atende aos interesses da coletividade, e a estabilidade econômica, conquistada com o Plano Real (WIKIPÉDIA, 2008). Em 1996, ligado ao Banco Central do Brasil (Bacen), é fundado o Comitê de Política Monetária (COPOM), para estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa de juros. Um ano depois, nasceu o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI) (FREITAS, 2005). A Central de Risco de Crédito do Banco Central do Brasil começou a ser implantada em 1997. Dois anos depois o CMN determinou nove níveis de risco na tentativa d garantir segurança à concessão de créditos (FREITAS, 2005). A Cédula de Crédito Bancário foi criada em 1999, através da medida provisória nº 1.925, de 14.10.99. “Há muito tempo, o mercado financeiro necessitava de um título de crédito que espelhasse como realidade as relações jurídicas entre as instituições financeiras e seus clientes e que tornasse a formalização das diversas operações de crédito menos onerosa e complicada. A Cédula de Crédito Bancário é instrumento ágil, simples e padronizado e que pode abrigar a possibilidade de contratação de todas as espécies de operações de crédito, sejam elas de empréstimos, sejam de financiamentos ou de repasses” (FREITAS17, 2005). 17 Disponível em: http://www.newton.freitas.nom.br/artigos.asp?cod=165. 31 Com o objetivo de tornar o sistema de pagamento mais seguro e adequado para a realidade do país, o BC criou em 2002 o novo Sistema de Pagamentos Brasileiro (SPB) e para isso foi estruturado no mesmo ano o Sistema de Transferência de Reservas (STR) e a Transferência Eletrônica Disponível (TED) organizando as transferências de recursos entre reservas bancárias (TRICHES; BERTOLDI, 2006). Dessa forma o setor financeiro do Brasil busca acompanhar todas as mudanças no cenário financeiro mundial, através da adoção de medidas e transformações no sentido do crescimento dos bancos nacionais, da transnacionalização dos bancos promovida pela entrada dos bancos estrangeiros, da intermediação financeira desenvolvida pelos bancos privados nacionais e, principalmente, do crescimento da dívida externa (BATISTA, 2006). 3.2 A AUTOMAÇÃO BANCÁRIA O investimento tecnológico pelo sistema bancário brasileiro teve o seu início, ainda na Era Vargas, no impulso da modernização implantada pela industrialização brasileira, decorrente da substituição das importações, acreditadas pelo governo, na tentativa de vencer a crise interna e promover assim um crescimento do mercado interno (PIRES, H. F., 1995). Através da Reforma Bancária ocorrida no governo Castello Branco, mencionada anteriormente (pg. 29), foi criado o Banco Central e o CMN, sem destituir do BB suas funções de autoridade monetária, mantendo sua atuação como “agente financeiro do Tesouro Nacional, membro do CMN e agente regulador de mercado”. Para isso foi-lhe atribuído a administração da chamada “Conta de movimento”, por meio da qual recebia recursos oficiais para financiar atividades consideradas prioritárias pelo Governo (Lei Nº 4.595, 1964), que através de seus recursos de custo zero, oferecia ao BB certa flexibilidade para manipular o sistema bancário. Paralelamente, os bancos privados e mesmo os estaduais, com a reforma do sistema pela Lei n°. 4.595, iniciaram sua conglomeração, diversificando suas atividades e conquistando novos mercados. Caracterizando o início de um processo de fusões e incorporações que criou “poderosos conglomerados privados”, com grande capacidade de se ampliarem cada vez mais no mercado financeiro (OLIVEIRA, 2001, p. 3). Os conglomerados financeiros surgiram a partir da reunião de empresas voltadas a diversos setores, como, 32 indústria, agrícola ou até mesmo prestação de serviços, representadas pelas seguradoras, corretoras e financeiras (BLASS, 1993). Além disso, mediante as reformas financeiras de 1964 e 1965, seguindo o exemplo americano, constituíram um novo sistema baseado no surgimento de instituições especializadas. No mercado financeiro os bancos comerciais ficariam responsáveis pelas operações de crédito de curto prazo e captação de depósitos à vista, enquanto que, as instituições de investimento e desenvolvimento exerceriam as funções de empréstimos a longo prazo, mediante a “captação de depósitos a prazo e de recursos no exterior”. E as, popularmente, conhecidas como financeiras - sociedades de crédito, financiamento e investimento - operariam na parte do “crédito ao consumidor e em empréstimos pessoais”, através das letras de câmbio. As instituições do SFH se ocupariam do financiamento habitacional, baseado no retorno obtido com os depósitos de poupança e de letras imobiliárias. Entretanto, instituições financeiras diversificadas, mas pertencentes ao mesmo grupo, poderiam praticar operações em conjunto e até mesmo dividir a estrutura física, desde que apresentassem uma contabilidade discriminada de acordo com o que preconizava a legislação (PUGA, 1999, p. 415-416). Depois da reforma os bancos aumentaram o número e diversificaram suas atividades, como por exemplo, “receber tributos e contribuições da previdência social, fazer operações de cobrança, venda de seguros, administração de diferentes tipos de investimentos e oferecer linhas de crédito” (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 105-106). A automação bancária (AB) brasileira, dessa forma, teve seu início a partir de medidas realizadas nas reformas internas das agências bancárias, definição de limites pelo BC, entrada de bancos estrangeiros no país e grande desenvolvimento da informática, que estimularam o processo de crescimento e dispersão territorial das agências bancárias (PIRES, H. F., 1997). A primeira onda de automação dos bancos ficou conhecida, segundo Filgueiras (2001), como a “automação de retaguarda” do serviço bancário (FILGUEIRAS, 2001). O destaque, na década de 1960, para o impulso da AB é o surgimento dos computadores de grande porte (mainframes18), que desde o início foram utilizados como recurso pelos bancos nos Centros de Processamento de Dados (CPD) até o início dos anos de 1980 (NETZ, 2007). Assim, o primeiro passo nesse sentido ocorreu ainda no final da década de 1960, marcado pela utilização da tecnologia do CPD para atender o aumento significativo do 18 Computadores de grande porte desenvolvidos para processar grande volume de informações. O termo mainframe é referente ao gabinete principal que acomodava, nos primeiros exemplares, a unidade central de processamento. 33 volume de documentos a serem processados, gerados pelo grande número de operações realizadas pelos bancos (FILGUEIRAS, 2001). Esse aumento no volume de serviços prestados iniciou após a Reforma Bancária marcando o crescimento econômico e a diversificação dos serviços oferecidos pelos bancos (MERLO; BARBARINI, 2002). O fluxo de serviço realizado, anteriormente, dentro das agências se resumia no “recebimento pelo caixa mediante a autenticação do documento, no final do expediente os documentos eram somados pelo conferente, verificados pelo contador e remetidos para o CPD que executaria o processamento do movimento do dia” (NETZ, 2007, p. 2). Trabalho esse, antes realizado de forma manual, registrava toda movimentação bancária nos livros-caixas. Nessa época, a “figura do contador sobrepunha-se aos demais”, uma vez que ele detinha todo conhecimento sobre as operações (BLASS, 1993, p. 84). Momento importante para a AB, descrita por Pires (1997), cujas características centralizada e concentrada definem a gestão de trabalho taylorista resultante da grande regionalização territorial dos mercados financeiros, marcado pelo início da automação e ampliação nos níveis de atuação. O desempenho das instituições girava em torno das informações e decisões centralizadas nos CPDs restritos a poucos núcleos territoriais, como por exemplo, São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília e Belo Horizonte, que se comunicavam pela ampliação da rede de comunicação e via Telex, intensificando esse processo de concentração. A automação, nesse momento, se resume na criação dos CPDs e ampliação dos serviços do Telex. A expansão territorial dos fluxos financeiros é ainda considerada restrita, havendo apenas cinquenta localidades da época com cobertura dos serviços do Telex. A lucratividade das instituições e a geração de empregos eram consideradas altas, em contrapartida, a sindicalização era inexpressiva (PIRES, H. F., 1997). A disseminação da automação brasileira, e consequentemente da AB, se beneficiou das barreiras impostas, desde 1975 pela Comissão de Coordenação das Atividades de Processamento Eletrônico (CAPRE)19, às empresas estrangeiras produtoras de computadores e à importação de periféricos (PIRES, H. F., 1995). Os “Grandes Conglomerados Financeiros” (GCF) privados nacionais, motivados pela necessidade de prosseguir e prosperar com a AB através da evolução da tecnologia, também foram incentivados por essas limitações e investiram no desenvolvimento da informática no país. Destaca-se nesse contexto a empresa estatal Cobra, especializada na produção de minicomputadores. Em 1976, o grupo de acionistas representados pelos bancos privados: “Banco Bradesco, Banco Bamerindus, Banco 19 CAPRE, instituição criada em 1972 pela Seplan para desenvolver a política de informática e de automatização dos serviços públicos. 34 Itaú, Banco Nacional, Banco Econômico, Banco de Crédito Nacional, Bolsa de Valores do Rio de Janeiro e Bolsa de Valores de São Paulo”, juntamente com os bancos estaduais: “Caixa Econômica do Estado de São Paulo, Banco Auxiliar de São Paulo, Banco do Estado da Bahia, Banco do Estado de São Paulo e Banco Noroeste do Estado de São Paulo”, dominavam 39% das ações, enquanto que os bancos federais: “Caixa Econômica Federal, com 13%; Banco do Brasil, também 13%, e BNDE, com 12% das ações da Cobra” e ainda o restante se diluía nas mãos de outras instituições públicas, como o Serpro e a Digibrás, as quais participavam respectivamente com 13% e 5% das ações e os “antigos acionistas privados, a Ferranti e a Equipamentos Eletrônicos (E.E), participavam com apenas 4,5% e 0,5% das ações” (PIRES, H. F., 1995, p. 152). Mas essa divisão de ações não se manteve por muito tempo, no final da década de 1970, algumas instituições financeiras optaram por investir na criação de suas próprias empresas de informática, incentivadas pela experiência adquirida na Cobra, aumentando a concorrência entre as empresas do ramo. Pode se dizer que, a busca por tecnologia de AB foi a responsável pelo crescimento na produção dos minicomputadores da Cobra (PIRES, H. F., 1995). Assim, “o computador irrompe na vida organizacional brasileira como o seu principal signo de modernidade” (GRÜN20, 1986). De forma pontual, essa primeira fase do desenvolvimento vivido pelo sistema financeiro brasileiro é marcada, principalmente, pelo início da dispersão territorial, experimentada pelas instituições financeiras de varejo, e pelo impulso inflacionário estabelecido a partir do boom econômico, das reformas bancárias, políticas tributárias, poupança compulsória e do endividamento. A Política Nacional de Informática (PNI) aliada ao aumento dos níveis de inflação e ao aumento da circulação de ativos de papéis facilitaram o processo de dispersão territorial dos fluxos financeiros. O tipo de crescimento horizontal (economias de escala) foi adotado pelos bancos de varejo, que ainda contavam com poucas Novas Tecnologias de Informação (NTI), principalmente no estabelecimento da comunicação entre agências e bancos (PIRES, H. F., 2001). 20 Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_02/rbcs02_02.htm. 35 3.3 DISPERSÃO TERRITORIAL DAS AGÊNCIAS BANCÁRIAS O segundo momento, vivido pelos bancos, ocorre no sentido da dispersão territorial das agências. As informações e decisões continuaram sendo efetuadas pelos CPDs ou ainda “distribuídas em bancos de dados compartilhados regionalmente por minicomputadores, automatic teller machines (ATMs) e terminais de transferência de fundos (TTFs) interligados via telex, hipertexto e satélite” (PIRES, H. F., 1997, p. 3). O fluxo territorial financeiro transita da fase de concentração para a de conglomeração. As atividades predominantes na região das grandes metrópoles se dispersa para as cidades intermediárias e algumas empresas, mediante a adoção do ATMs, dos TTFs e do surgimento dos serviços do Remote Banking: Instantâneos, Eletrônicos, Interlig, Banco 24 Horas e Banco Um. Nesse período vigido pela gestão fordista, o movimento sindical se encontra fortalecido e as instituições desfrutam dos altos índices de produtividade e lucratividade (PIRES, H. F., 1997). Ainda em 1970 foi implantado um sistema de apoio à decisão gerencial (SAD), que tinha como finalidade auxiliar a administração e a gerência, promover a integração das unidades e concentração máxima do poder de decisão (BLASS, 1993). A estratégia de mercado priorizou a redução dos custos, aumento da produtividade e qualidade nas informações e serviços oferecidos e vendidos pelas agências para garantir a sobrevivência no mercado competitivo. A fase conhecida como “automação de vanguarda” destaca a implantação do sistema on line e a automação específica dos caixas, trazendo a execução das operações para os terminais locais. É a expansão da AB proporcionando maior velocidade no processamento das informações para atender as necessidades cada vez mais exigentes do mercado financeiro (FILGUEIRAS, 2001). O Remote Banking (banco virtual) proporcionou serviços como: [...] saques de dinheiro, depósitos fora do caixa dos bancos, entrega domiciliar de talões de cheques, pagamentos de contas fora do caixa dos bancos, débito automático em conta corrente de concessionárias de serviços públicos e outras empresas, transferências de crédito entre agências, remessa de numerário e troca de informações via home banking (PIRES, H. F., 1997, p. 9). As mais de quatro mil municipalidades com cobertura de atuação dos serviços bancários, no ano de 1985, expressam a força da dispersão do fluxo financeiro nesse momento (PIRES, H. F., 1995). E a nova versão dos conglomerados financeiros pode ser ilustrada pelos casos do Bradesco que, no ano de 1986, tinha participação em mais de cem empresas, 36 enquanto que o Itaú controlava vinte e cinco empresas não-financeiras e o banco Real possuía seis empresas na América Latina e África (BLASS, 1993). Muito, além disso, o Bradesco, maior instituição financeira da América Latina, através de uma aliança com a Sharp funda, em Curitiba no ano de 1978, a SID Informática S/A, principal responsável pela produção da automação bancária, comercial e tecnologia em minicomputação. No mesmo segmento, a Itautec Informática é criada pelo grupo Itaú, segundo maior da América Latina, em 1979 na capital paulista. E na cidade do Rio de Janeiro, foi fundada em 1980, a Conpart através da sociedade entre ex-diretores da Cobra, o expresidente do BNDE e o Grupo Tristão21. Mais tarde, no ano de 1983, o banco Itaú investe em mais uma grande empresa do segmento de automação e componentes, a Itaucom e em 1985, um grupo de ex-engenheiros da SID Informática constitui a Procomp, empresa que também se destacaria na produção maciça de inovações tecnológicas e AB (PIRES, H. F., 1997). A partir da década de 1960, diante dos altos índices inflacionários, os bancos começaram a se beneficiar através de um verdadeiro “negócio da china” de indexação nos instrumentos de crédito. O governo, ao mesmo tempo em que, “preservou os títulos indexados”, foi obrigado a praticar altas taxas de juros na tentativa de evitar o crescimento inflacionário e os obstáculos fiscais, os quais dificultavam o financiamento junto ao setor privado. Nesse sistema os bancos obtinham, através do livre acesso, sem custo algum, aos montantes de recursos, lucros incalculáveis. O mecanismo de "floating22" se revelou uma grande fonte de lucros para os bancos, dedicando a lucrar mais com a compra de títulos do governo e a arbitragem na manipulação de recursos externos e descartando, quase que por completo, suas ativas operações de créditos (PINTO, 2004). Contudo, a implantação de medidas políticas econômico-financeiras para conter o índice inflacionário desencadeou a primeira reestruturação produtiva ou “operacional” dos bancos. Perdendo assim, suas fontes facilitadas pelas altas taxas de inflação, a “ciranda financeira”, após a implantação do primeiro plano de estabilização da economia - Plano Cruzado. Um período marcado por aspectos complexos, como o corte dos custos operacionais e a adoção acelerada da informática, e consequências sérias para o setor que vão desde programas drásticos de enxugamento até o fechamento de instituições (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 106). A primeira onda recessiva bancária, vivida em 1986, gerou a 21 Grupo Tristão, fabricante de fitas magnéticas e formatadores, prestadora de serviços nas áreas de Consultoria e Engenharia de Sistemas. 22 O floating referia-se aos depósitos feitos pelos clientes que não caíam nas contas de imediato – e assim podiam ser aplicados pelos bancos nos mercados especulativos. 37 demissão de 10,93%, isso significa a eliminação de 110 mil bancários das agências (PIRES, H. F., 1997). Esse período também foi marcado por outro evento importante para o mercado financeiro, a reforma bancária de 1988, que possibilitou a criação de bancos múltiplos a partir da junção de carteiras, “como a comercial e de investimentos na mesma instituição” (WILWERT; TAFNER, 2008, p. 23). A evolução das organizações e do processo produtivo, decorrente das mudanças das tecnologias e do processo de trabalho, demonstra o peso da interferência das mudanças “ambientais” na determinação das tendências, decisões, responsabilidades e condições das instituições financeiras (OLIVEIRA, 2001). 3.4 REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA Do ponto de vista da automação bancária - AB, essa nova fase é considerada por Pires (1997) como “inovativa” e “desregulamentativa”, baseada na gestão “descentralizada e instantânea”. O direcionamento, traçado pelas políticas setoriais neoliberais, promoveu o desenvolvimento da “reestruturação territorial seletiva dos fluxos das operações financeiras, efetuada através da desintegração vertical, da diferenciação e da ampliação do escopo das atividades e pela reorganização” (PIRES, H. F., 1997, p. 3). Nessa fase flexível, a produtividade permaneceu em alta, mas a lucratividade mesmo alta se tornou, proporcionalmente, influenciada pelas taxas de juros e pela inflação, caracterizando a relação de dependência com os planos econômicos. Através do advento da tecnologia on line, as informações e as decisões começaram a ser processadas real time, difundidas em várias redes locais, todas conectadas pelos computadores, microcomputadores, telefones, faxs/modens, ATMs e TTFs, interligados via satélite (PIRES, H. F., 1995). O nível de atuação dos serviços bancários ultrapassou os muros das grandes metrópoles e avançou para as cidades de médio porte, empresas (office banking) e até mesmo as residências dos clientes, através do home banking. Mesmo com a limitação das municipalidades atendidas por esses serviços, a territorialização dos serviços permaneceu em alta, possibilitada pela cobertura dos clientes usuários de fax, modem e birôs de prestação de serviços pela internet, Bulletin Board System (BBS) (PIRES, H. F., 1997). É o processo de externalização dos 38 serviços e operações financeiras e a invasão bancária na vida dos clientes (FILGUEIRAS, 2001). A implantação das mudanças organizacionais pela redução abrupta da inflação e redução da liquidez da economia, durante o Plano Collor, provocou a segunda onda recessiva do setor bancário (PIRES, H. F., 1995). Em contraste aos altos valores de investimentos em tecnologia, como o gasto de US$ 2 bilhões e US$ 3 bilhões na compra de computadores e softwares nos anos de 1992 e 1993, sobressai a grande quantidade de demissões (NETZ, 2005), que no período de 1989 a 1990 somou mais 77 mil bancários demitidos (FILGUEIRAS, 2001). Outros números, que exprimem a grandeza de toda movimentação que o sistema financeiro se enreda, são os valores correspondentes aos negócios e transações realizados, principalmente, nos processos de fusões23 e aquisições24 (F&As) de instituições, as quais também representam uma alternativa de sustentabilidade e competitividade das instituições bancárias, sendo mais uma opção para o desenvolvimento e a sobrevivência no mercado reestruturado. O ritmo dessas operações, durante a década de 1990, foi marcado por situações contínuas e mudanças estruturais e por “movimentos conjunturais internos e ‘efeitoscontágio’ de ajustes em outras economias emergentes” (WILWERT; TAFNER, 2008, p. 22). As mudanças de orientação estratégica da economia nacional, mais especificamente as F&As, tiveram um aumento crescente no mercado livre a partir dos anos 90, como demonstra o quadro abaixo: Quadro 1: Principais Fusões e Aquisições no período entre 1998 a 2009. Instituição adquirida Instituição Data Valor do negócio compradora Banco América do Sul Sudameris Abr/98 Cerca de R$ 220 milhões BCR-Crédito Real do R.S. Bradesco Abr/98 Banco Real ABN Amro Bank Jul/98 Cerca de R$ 2,1 bilhões Bemge Itaú Set/98 R$ 583 milhões Banco Pontual BCN (Bradesco) Nov/98 Bandepe ABN Amro Bank Nov/98 R$182,9 milhões Baneb Bradesco Jun/99 R$ 260 milhões Credibanco Unibanco Fev/00 Meridional Santander Fev/00 Estimado em R$ 1,3 bilhão Boavista interatlântico Bradesco Abr/00 Entre R$ 900 milhões e R$ 950 milhões 23 Fusão: união de duas ou mais empresas que formam uma única empresa, geralmente sob controle administrativo da maior ou mais próspera. 24 Aquisição: compra de controle acionário de uma empresa por outra. 39 Banco Bandeirantes Banco CCF Unibanco HSBC Jul/00 Jul/00 Banco das Nações Banestado Banespa Banco Fininvest Banco Investcred Paraiban BEG Mercantil de SP BEA (Amazonas) Banco Cidade InterAmerican Express Ago/00 Out/00 Nov/00 Dez/00 Ago/01 Nov/01 Dez/01 Jan/02 Jan/02 Fev/02 Mai/02 BBA Creditanstalt Banco Fiat Banco BBV Brasil Banco Sudameris BCN (Bradesco) Itaú Santander Unibanco Unibanco ABN Amro Real Itaú Bradesco Bradesco Bradesco American Express Bank Itaú Itaú Bradesco ABN Amro Real Banco Sul América Lloyds TSB Banco AGF Banco Zogbi Creditec Financeira BEM (Maranhão) BNL do Brasil Financeira Credimatone Banco do Estado do Ceará BankBoston Rural HSBC Itaú Bradesco Unibanco Bradesco Unibanco HSBC Bradesco Itaú Mai/03 Out/03 Out/03 Nov/03 Nov/03 Fev/04 Jun/04 Nov/04 Dez/05 Mai/06 BMC Bradesco Jan/07 CACIQUE BGN Société Générale Fev/07 Cetelem Jul/07 (financeira francesa, pertencente ao Nov/02 Dez/02 Jan/03 Abr/03 Cerca de R$ 1 bilhão US$ 10,5 bilhões, o excontrolador francês CCF R$ 1,625 bilhão R$ 7,05 bilhões Cerca de R$ 480 milhões R$ 50,2 milhões R$ 665 milhões Cerca de R$ 1,37 bilhão R$ 182,9 milhões Cerca de R$ 366 milhões Cerca de R$ 3,3 bilhões Cerca de R$ 897 milhões Cerca de R$ 2.479 bilhões R$ 527 milhões à vista e R$ 1,663 bilhão em ações do ABN US$ 815 milhões R$ 243 milhões R$ 650 milhões R$ 47 milhões R$ 78 milhões R$ 120 milhões R$ 30 milhões R$ 700,00 milhões O pagamento ao Bank of America será feito com 68,52 milhões de ações preferenciais do Banco Itaú, avaliadas em R$ 4,5 bilhões (5,8% do capital). O pagamento ao BMC será feito mediante a entrega de ações do Bradesco, correspondentes a aproximadamente 0,94% de seu capital social, que será aumentado em R$ 800 milhões. R$ 324, 3 milhões R$ 130,8 milhões 40 ABN AMRO Unibanco Votorantim conglomerado BNP Paribas) Consórcio Out/07 formado entre o RBS, Fortis e Santander Itaú Nov/08 Banco do Brasil Jan/09 R$ 10.657,7 milhões R$ 15.225,4 milhões R$ 6.461,3 milhões Fonte: RiskBank - Sistema de Classificação de Risco Bancário, 2009. O desenvolvimento e a rápida propagação das inovações tecnológicas, absorvidas na AB, são apontados como modificadores diretos das formas e métodos de gestão do trabalho e dos fluxos financeiros no território brasileiro (PIRES, H. F., 1997). “A inovação não só é responsável pela sustentação da competitividade, como também pode-se atribuir a ela uma considerável parcela de responsabilidade” (CRUZ; GOMES, 1998, p. 2). As estratégias bancárias da época consistiram na criação dos cartões magnéticos, no desenvolvimento dos atendimentos personalizados voltados aos clientes de renda mais alta e na disponibilização e popularização dos caixas eletrônicos para a clientela de renda média. A eclosão da reestruturação administrativa foi no sentido de reduzir os níveis hierárquicos, marcar o início do processo de terceirização e adotar a flexibilização nas formas e relações de trabalho (FILGUEIRAS, 2001). Por último, através da adoção do Plano Real, as agências bancárias sofreram uma fase de ajuste inversa, sendo desta vez em direção “para fora” (entre empresas) (DIEESE, 1997a). Nesse novo cenário econômico, a reestruturação estratégica do setor ganhou novos contornos. Com a concorrência acirrada são consequências inevitáveis a falência das instituições de pequeno porte e fusões e incorporações de instituições, as privatizações, as associações e parcerias com grupos estrangeiros, a busca por novos mercados, a segmentação dos mesmos e de clientes e a criação desenfreada de produtos e serviços (DIEESE, 1997b). A partir de julho de 1994 as agências bancárias vivenciaram um processo de adaptação que compreendeu desde ajustes na sua estrutura “patrimonial” até processos de concentração no espaço dos bancos (PAULA, 1998). O controle dos níveis inflacionários provocou, para os bancos, a perda dos lucros inflacionários e a limitação das receitas de floating, mas ao mesmo tempo, possibilitou o benefício do aumento na demanda real por crédito, propiciadas pelas “políticas ativas de expansão dos empréstimos (operações de crédito)”, principalmente a curto prazo, praticadas pelas instituições financeiras (HAJJ, 2005, p. 30). Baixos índices de inflação que pôde ser 41 conquistado nesse plano econômico mediante a ampla abertura do mercado ao comércio exterior e, com isso, promover o aumento da integração do sistema financeiro nacional com o internacional provocando intensas modificações. As instituições estrangeiras antes do plano Real detinham apenas 6% do patrimônio líquido e após a implantação do mesmo, esse número aumentou para 20% no final de 1990, propiciando a essas instituições: participações e potencial elevado de “rivalidade doméstica”. Alterações significativas responsáveis pelo movimento no sentido de consolidação do setor bancário no país, redução do número de bancos e maior concentração financeira (WILWERT; TAFNER, 2008). O direcionamento do setor no sentido da privatização, desnacionalização e concentração marcou a concorrência do mercado financeiro acarretando a falência de inúmeras instituições de pequeno porte. As estratégias em destaque variam desde o aumento de serviços cobrados pelos bancos, ampliação do processo de terceirização até a expulsão dos clientes do ambiente das agências (FILGUEIRAS, 2001). Sucintamente, os principais efeitos desse plano, diretamente, sobre o sistema bancário brasileiro são as medidas adotadas para o processo de reestruturação e a estabilização e o fortalecimento do SFN (HAJJ, 2005). Desde a consolidação da moeda Real, o panorama do mercado financeiro brasileiro vem passando por processos de ajustes decorrentes da redução do número de bancos atuantes no mercado, em consequência dos diversos casos de bancos liquidados/privatizados por meio do Programa de Incentivo para a Reestruturação do Sistema Financeiro Estatal (PROES) ou que estão passando por transferência do controle acionário por meio de F&A, através do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (PROER). Mudanças, que marcam um cenário livremente competitivo, aguçadas pelo desenvolvimento tecnológico e ambiente regulatório (WILWERT; TAFNER, 2008). A nova estrutura, resultante de todo processo de transformação da atividade bancária, apresenta “bancos saneados, adequadamente capitalizados e assumindo menores riscos, o que os torna mais preparados para enfrentar e sobreviver aos efeitos de crises externas e internas” (MEIRELLES25, 2001). A concepção de estratégias mercadológicas, baseada na diversificação e sofisticação dos produtos e serviços, expansão da territorialidade, redução das funções sociais e custos operacionais, preferência pelas operações rápidas e de curto prazo, e os empréstimos de dinheiro, visa à maior obtenção de taxas de juros e de serviços caracterizando seu caráter comercial (RIBEIRO, 1999). 25 Disponível em: http://www.caringi.com.br/aberj/real.htm. 42 Todas as transformações apresentadas representam a necessidade de “respostas estratégicas”. Mas para que tudo isso ocorra, na prática, os bancos tiveram que se caracterizar conforme as exigências do mercado sofrendo alterações importantes em sua organização interna e externa, definição do layout das agências, intensificação tecnológica, adequação de outras funções, estabelecimento de horários distintos, novas divisões e relações de trabalho e seleção de um perfil bancário especificado (PETERNELLI; BARBOSA; PETERNELLI, 2004). 3.5 CARACTERÍSTICAS DO TRADICIONAL SAVOIR-FAIRE26 BANCÁRIO O tradicional trabalho bancário era definido como uma “técnica exercida, especialmente, sobre determinado objeto, o papel ou sucedâneo, mediante instrumentos com a finalidade de produzir operações e informações, enfim, serviços que têm valor de mercadoria”. Com origem na arte da escrita, mais intimamente ligada à área de contabilidade, se caracterizou por ser “um trabalho mental vertido no papel sob a forma de símbolos linguísticos, números ou outros modos de representação escrita” (RIBEIRO, 1999, p. 59). O trabalho bancário se resumia na atividade realizada dentro das agências bancárias. As operações compreendiam, basicamente, em contabilizar e receber os depósitos, além de recolher alguns tributos, pagamentos, descontos de títulos e executar empréstimos e aplicações financeiras (NETZ, 2007). Os bancos eram responsáveis, até a reforma de 1964, apenas pelas funções de “intermediação financeira” com uma “atuação regional e descentralizada”, com sedes dispersadas pelo território nacional (BLASS, 1993, p. 83). As operações bancárias eram efetuadas na forma de atividades especializadas, baseadas na organização interna polarizada e nas atividades comerciais de intermediação e de gestão financeira, com tendência a adotarem a organização taylorista. Os bancos tinham uma atuação limitada e bem específica oferecendo produtos e serviços (pagamentos, empréstimos ou investimentos) já pré-determinados, atendendo exclusivamente à sua parcela correspondente no mercado segmentado. Assim, os bancos eram obrigados a trabalharem de “forma complementar entre si”, apresentando no 26 Savoir-faire: significa, em francês, saber fazer, ou Know- how, em inglês. 43 mercado uma diversidade de “tipos” específicos de bancos: “comerciais, de depósitos, de investimentos e caixas econômicas” (LARANGEIRA, 1997, p. 111). A organização estrutural de uma agência era fragmentada nos setores de “conta corrente, desconto de títulos, cadastro e contabilidade” (BLASS, 1993, p. 84). Os escriturários se distribuíam na agência de modo que, um ocupava o balcão de atendimento, outro o controle de caixa, dois o desconto e mais dois a área de contabilidade. A função de caixa era apenas responsável por realizar as funções de receber e pagar, completamente alheios a rotina geral do banco. O caso do cheque a ser descontado, citado por Blass (1993), exemplifica a antiga forma de organização. O atendimento poderia demorar até uma hora: após o cliente se dirigir ao balcão de atendimento e trocar o cheque por uma senha, ele era destinado ao controle de caixa, responsável por anotar os dados, logo seguindo para a conferência da assinatura e por fim, para o setor de conta corrente, verificando o saldo. Assim que fosse liberado, o valor era pago pelo caixa ao cliente identificado através da senha (BLASS, 1993). Esse fato demonstra, na ausência do recurso tecnológico, a necessidade de vários funcionários na execução das conferências a fim de garantir “a eficiência e a correção dos registros” (NETZ, 2005, p. 3). O trabalho bancário era essencialmente burocrático e realizado por muitos funcionários que se dividiam na realização de registros, preenchimento de formulários e circulação de papéis. (NETZ, 2005). Todo esse processo de conferência era baseado na redundância de contabilização, que consistia em várias etapas de escrituração e conferência com circulação dos lançamentos por diversos departamentos e funcionários (NETZ, 2007). As tarefas bancárias exigiam caligrafia e redação, além dos conhecimentos contábeis. O contador detinha o controle das operações de entrada e saída de recursos da agência, e também controlava os outros funcionários, a ele subordinados - o subcontador, o chefe de expediente, os caixas e os escriturários, os contínuos e o pessoal de apoio. A figura do contador possuía o maior conhecimento sobre os procedimentos contábeis e as normas do banco (PENELLA, 2000, p. 55). “[caracterização do banco da época]... era completamente diferente. Na época, a começar por aí, eram os datilógrafos, hoje a gente não vê falar mais em datilógrafos. As contas correntes eram livros de dois metros de comprimento. Eu fui correntista, datilógrafo, caixa e depois eu fui promovido. Mas hoje está tudo diferente. Antigamente tinha muito mais funcionários dentro do banco, nós éramos 25. O trabalho era manual, tudo manual, o 44 bancário era bancário mesmo, não era vendedor. [atendimento] Tinha mais contato, você ia até o balcão, você dava uma ficha para ele e te chamavam no caixa e te atendiam, tinha muito mais contato, hoje eles nem conhecem a gente. Ontem fui ao banco e perguntei para gerente daqui: ‘você recebe esses documentos no caixa e comunica como?’, a gerente me respondeu: ‘não sei, é tudo por computador’. Então eu não entendo mais nada de banco, não sei de mais nada, acabou...” (Pedro, 92 anos, bancário aposentado27). A maioria dessas funções, executadas manualmente por vários funcionários, foi sendo substituída por máquinas, reduzindo o número de bancários ou até mesmo eliminando todos eles. Como demonstra o caso ilustrativo do cadastro de clientes correntistas que, antes da automação, era realizado por vários funcionários: um responsável pela coleta dos dados pessoais do cliente, outro por obter as informações sobre a idoneidade e ainda, outro destinado a fazer o primeiro depósito em conta corrente (ARAÚJO, 2005). “[...] quando eu entrei era tudo manual, [...] tudo naquela máquina de escrever antiga, durona, tudo tinha que ser batido. Até o talão de cheques tinha que bater na máquina, dez folhas, vinte folhas de talão para cada cliente. Tinha que ser manual, cada coisa tinha vários papéis, várias vias. Agora hoje é tudo no computador [...] eles arrumam uma máquina pra alguma coisa que substitui dois funcionários e eles vão reduzindo” (entrevistado 5). Lembrando que até 1986, os bancos atuavam com estratégias semelhantes, “como a expansão da rede de agência para a captação de depósitos, tanto em conta corrente como em conta poupança” (WILWERT; TAFNER, 2008, p. 23). As características estruturais de funcionamento baseavam na organização por agências, na qualificação adquirida pela experiência, no mercado interno de trabalho fechado, respeitando o sistema rígido de hierarquia, praticamente sem flexibilidade e o tempo de serviço era definido como critério de promoção (LARANGEIRA, 1997). O bancário era representado por funcionários de confiança, capazes na execução de seu trabalho e responsáveis ao lidar com os recursos dos clientes (NETZ, 2007). Nas palavras de Grün (1986), o antigo bancário possuía métier28, sendo “gerido e transmitido de forma autodidata” (GRÜN29, 1986). 27 Entrevista concedida à autora em 18 de março de 2008. Métier: palavra francesa utilizada para designar profissão, ofício. 29 Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_02/rbcs02_02.htm. 28 45 “[...] a gente usava telex para transmitir a compensação, a gente era realmente bancários no começo. Era muito diferente dos dias de hoje, do que eu faço hoje. Muito diferente no começo, eu era realmente bancária. A gente mexia com somar cheque, fechar e bater números. E hoje não, hoje a gente mexe realmente com vendas” (entrevistado 6). Os traços constitutivos dos bancários, nessa época, apontam para representantes de uma camada da pequena burguesia urbana, que reforçava a característica de “trabalhadores diferenciados” devido ao caráter não braçal do trabalho bancário, explícito em fins da década de 1950 e início da década de 1960. Geralmente, iniciavam sua carreira em posições mais subalternas, os pisos da profissão bancária, e até mesmo esses cargos eram considerados diferenciados uma vez que não permitiam o acesso comum a todos. O reconhecimento social, que comprovava, entre outros aspectos, a origem de boa família, obtido através da rede de relações sociais, pessoal e da própria família, era importante para conseguir a admissão e preencher os requisitos de fidelidade e confiança (GRÜN, 1986). Nas palavras de Romanelli (1978 apud PENELLA, 2000), nessa época “os atributos definidores do bom bancário encontravam-se fora da empresa, em certo grau de escolaridade e na familiaridade com regras formais de relações interpessoais, dependentes da posição de classe e da honradez...” (PENELLA, 2000, p. 55). O tradicional bancário (dos anos de 1970 e 1980), em sua grande maioria caixas e escriturários, era representando, geralmente, por jovens estudantes que desempenhavam funções rotineiras de baixa qualificação, apesar da sua alta escolaridade, não demonstravam pretensões de fazer carreira dentro do banco, justificando as altas taxas de rotatividade da época (turn over). Padrão diferente, como relata Larangeira (1997), ao apresentado nos anos de 1960, período em que o trabalho bancário era visto como um investimento para a carreira profissional (LARANGEIRA, 1997). O “costume do paletó e da gravata” surge dessa diferenciação do trabalho “limpo”. Acreditava-se na ascensão econômica e social garantida, mesmo para aqueles que vinham de outro nível social menos privilegiado, como os trabalhadores industriais, juntamente com a expansão do trabalho que não precisava sujar nem as mãos nem as roupas, ao contrário da classe operária. Para fazer parte do seleto trabalho bancário era necessário ser pertencente, preferencialmente, à classe média letrada e, obrigatoriamente, adquirir comportamentos e expectativas compatíveis aos depositantes e clientes das agências. (RIBEIRO, 1999). 46 “A qualificação profissional adquirida nas trajetórias distingue-se da qualificação operária por não representar uma capacidade diferenciada de realizar um trabalho específico” (GRÜN30, 1986). 3.6 OS IMPACTOS DA REESTRUTURAÇÃO PRODUTIVA NO EMPREGO BANCÁRIO As características do tradicional savoir-faire31 bancário começaram a sofrer alterações ainda em 1970, resultante da diversificação da natureza dos produtos vendidos e serviços oferecidos (interna e externamente à atividade bancária) e da nova forma de operacionalizar através de bancos múltiplos e redes de agências (LARANGEIRA, 1997). Com a implantação dos CPDs e a padronização contábil, o fluxo dentro de uma agência iniciava na “boca do caixa” com o recebimento mediante a autenticação do documento e finalizava nos serviços de retaguarda, após o expediente os bancários responsáveis por preparar esses documentos, os quais eram somados pelo conferente, verificados pelo contador e remetidos aos CPDs para serem executados, processavam a movimentação diária (NETZ, 2007). O CPD “reunia todos os documentos e papéis referentes às agências de uma determinada região”, sendo que no dia seguinte, antes mesmo do início das atividades, cada agência recebia suas listagens. Assim, esse sistema além de controlar, centralizava todas as informações de um número cada vez maior de agências de várias cidades e até de todo o conglomerado financeiro. Algumas instituições criaram o caixa executivo que tinha além das responsabilidades de pagar e receber cheques e valores, incorporava as funções dos escriturários, como a conferência de assinaturas, saldo registrado nas listas dos CPDs e registro dos lançamentos nas contas correntes (BLASS, 1993, p. 85). A próxima grande revolução foi a implementação, em 1980, dos sistemas on line, que trouxeram a possibilidade de interligação, real time, de dados entre centrais e agências. A busca pela automatização dos serviços administrativos estimulou a incrementação do sistema de telecomunicações e a aquisição de recursos avançados de informática (SCHMITZ; MAHL, 2000). É o surgimento dos “bancos eletrônicos”, assim denominados por Blass (1993), 30 Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_02/rbcs02_02.htm. Nessa nova conjuntura “o savoir-faire subdivide-se em uma série de módulos que correspondem a tarefas ou a funções diferentes”, as quais concretizam em saberes “saber-agir” e “saber-transformar” (HIRATA, 1994, p. 130). 31 47 alterando completamente a rotina dos caixas, que deixaram de conferir o saldo nas listas, uma vez que, os lançamentos se tornaram automáticos e diretos no próprio terminal interligado ao computador central. A atualização das contas passa a ser realizada simultaneamente à movimentação (real time) e todas as informações, anteriormente manuscritas, são transmitidas automaticamente (BLASS, 1993). Aquelas etapas de escrituração e conferência, consideradas como intermediárias, que demandavam a circulação de inúmeros papéis pelos departamentos, foram simplificadas em apenas lançamentos digitais (NETZ, 2007). Além disso, o caixa executivo, mencionado acima, torna-se o caixa on line, mudança essa que elimina as “funções de separar, ordenar e conferir documentos”, realizadas pelos escriturários, bem como os lançamentos, realizados pelos digitadores, de dados nos computadores (BLASS, 1993, p. 85). De tal forma que, a alimentação das informações passou a ser produzida pelos lançamentos on line dos caixas ou através da movimentação pelos clientes nos terminais de auto-atendimento (NETZ, 2007). O banco eletrônico passa a operar, em 1990, também com os terminais de transferência de fundos através do uso dos cartões magnéticos, incluindo o balcão de atendimento ou cash no interior das agências; as ATMs e os bancos 24 horas, que como o próprio nome sugere, funcionam além do expediente bancário (BLASS, 1993). Os caixas automatizados facilitaram o acesso aos usuários, a partir do momento em que não precisam mais apresentar qualquer documento para a movimentação de suas contas, apenas com a inserção do cartão magnético e do código no caixa poderiam executar as operações desejadas e os dados já são transferidos imediatamente para as centrais de processamento. As inovações atingiram tanto a esfera interna dos bancos, “em apoio às operações de cobrança, câmbio, empréstimos, seguros e poupança”, quanto externamente, ao racionalizar o atendimento aos clientes (SCHMITZ; MAHL, 2000, p. 75). Os caixas automáticos passam a efetuar as funções de saque em dinheiro, depósitos, pagamento de contas e consulta de saldos e extratos, enquanto que, os postos de vendas ou terminais de saques, distribuídos em pontos estratégicos, como grandes centros comerciais, substituem, gradativamente, os cheques como forma de pagamento nas compras, registrando automaticamente as operações e garantindo para os comerciantes a liquidez total. A partir desse momento as funções intermediárias de manuseio, digitação e microfilmagem de cheques são também eliminadas. Com a criação do sistema de conexões eletrônicas diretas, home banking, internet banking e office banking, amplamente difundidos e popularmente aceitos graças ao marketing, os clientes passam ter acesso às informações sobre saldos, débitos e créditos, transferências de fundos e alternativas 48 de investimento a qualquer hora do dia e local (BLASS, 1993). Caracterizando o movimento de expulsão dos usuários das agências (FILGUEIRAS, 2001), e a exteriorização do trabalho bancário para os próprios clientes, que passaram a embutir esse serviço durante os seus dias sem qualquer tipo de remuneração (NETZ, 2007), fenômeno descrito por Pires e Costa Filho (2001), como o “auto-serviço” (PIRES, P. J.; COSTA FILHO, 2001). O cliente assume, nessa nova configuração, vários papéis, ao mesmo tempo em que cumpri com as tarefas bancárias, atua como fontes de recursos (poupança, depósitos, transações) e ainda como tomador, nos casos de compra de produtos e serviços (BATISTA, 2008). A nova concepção na configuração espacial das agências segue a tendência de um novo layout, como ponto de negócios em espaços mais reduzidos, à medida que, as operações corriqueiras são transferidas para fora do ambiente das agências. Essa reorganização espacial demarca e sinaliza os espaços físicos no sentido de atender ao novo perfil operacional. Foi projetada, separadamente do corpo da agência, uma área bem delimitada (front lobby) reservada, exclusivamente, para o auto-atendimento, onde os próprios clientes realizam quase todas as suas transações financeiras, preferencialmente, sem qualquer ajuda dos bancários e sem a necessidade de adentrar no interior da agência, como uma forma de inibição aos clientes, segundo a opinião de Larangeira (1997). Na agência reestruturada a área central é a “estação de negócios”, local destinado às operações de captação e aplicação de recursos. E por fim, destina um ambiente residual para os atendimentos aos clientes, cujas necessidades não foram resolvidas no auto-atendimento, área essa que tende a se extinguir com o tempo (LARANGEIRA, 1997). Ocorreu assim, uma reorganização estrutural física em decorrência de uma reorganização operacional, constituída por um processo de deslocamento das atividades administrativas para as comerciais, desenvolvendo operações essencialmente especulativas e instituições meramente lucrativas (JINKINGS, 2004). Já na concepção organizacional, à medida que as instituições financeiras se aproximam do que elas denominam de High Performance Organizations, o seu processo de produção tende à expansão horizontal das funções ocupacionais com redução dos níveis hierárquicos verticalizados (LARANGEIRA, 1997). Cada vez mais as agências se assemelham a uma loja informatizada de venda de produtos e serviços financeiros (JINKINGS, 2004). O patrimônio humano dos bancos também passou por momentos de redefinição em seus “traços constitutivos” e se configura, nos dias atuais, como “bancário-vendedor”, altamente capacitado para atender integralmente aos seus clientes, atingindo a excelência e atuando de forma individualizada ao cumprir as metas impostas sobre vendas de títulos, 49 seguros, aplicações e demais produtos e serviços bancários (JINKINGS, 2004). A configuração da identidade bancária passa por três fases sucessivas, definidas por Grün (1986), a primeira etapa, representa o bancário dotado de métier, anteriormente abordada; o segundo e intermediário cenário é marcado pela tensão gerada entre os velhos bancários que resistiram, a mistura produzida pela justaposição do pessoal antigo já convertido e o novo grupo de competentes profissionais com titulações universitárias; e, por fim, o terceiro momento é caracterizado pela formação de dois novos grupos: de um lado, esses competentes funcionários com formação superior que se mantiveram e do outro lado, os modernos e ousados bancários comerciais e informatizados que se moldam às exigências do mercado de trabalho (GRÜN, 1986). Outro aspecto observado foi a necessidade fundamental, para o bancário, ser dotado de respostas cada vez mais rápidas para a sobrevivência dentro das corporações, movimento completamente contrário à postura dessa classe na época fordista, definindo mais uma característica própria da reestruturação do capital (SEGNINI, 1995). Se na fase anterior as tarefas eram pré-definidas pelo manual, agora a exigência é lidar com situações imprevistas e não prescritas (LARANGEIRA, 1997). A informação, nova ferramenta de trabalho do bancário, é manipulada para alcançar as metas de vendas, com um poderoso grau de persuasão e principalmente, produzir e reproduzir o dinheiro (RIBEIRO, 1999). Nesse novo modelo de gestão o bancário adquiriu maior funcionalidade, “qualificação” e polivalência para se tornar um “exímio vendedor” (SILVA, L. S.; PINHEIRO; SAKURAI, 2007). No ambiente interno da agência reestruturada “a informação precisa e rápida é uma mercadoria de valor muito alto” (SEGNINI32, 1995). “Então nós estamos no começo do século XXI, e a concepção bancária muda frequentemente e os bancos investem pesado em alta tecnologia para que os bancários todos sejam simplesmente um aplicador do dinheiro e um financiador disso tudo, com a rolagem principalmente da dívida pública para o Brasil, ou seja, o capitalismo tem isso” (presidente do SEEBU33). Com a chegada da automação nas agências bancárias, principalmente dos computadores, destaca-se o surgimento de novos profissionais, como os engenheiros, 32 Disponível em: http://www.cedes.unicamp.br/pesquisa/artigos/LILIANA/indice.html. Entrevista concedida à autora em 18 de março de 2008, pelo então Presidente, Sérgio Gomes, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 33 50 analistas de sistemas e programadores de computação, a redução do “trabalho vivo”, além da centralização de todo o trabalho de concepção na administração superior, que à distância detém o controle de toda a agência. Cabendo assim, aos gerentes, subgerentes, chefes e supervisores o controle apenas físico de seus funcionários, atribuído a perda do seu poder e autonomia para essa hierarquia superior. Outro empobrecimento do conteúdo de trabalho observado por Ribeiro (1999) é a função das secretárias, que tiveram suas falas pré-definidas por softwares que oferecem programas de textos e expressões desenvolvidos para cada tipo de situação e sua redação substituída por sistemas de sintaxe e pontuação, rebaixando-as para simples recepcionistas (RIBEIRO, 1999). Para a função de caixa a automação intensificou ainda mais sua atividade no sentido do aumento de produtividade, além de proporcionar um controle mais incisivo sobre seu trabalho, à medida que, as funções passaram a ser subordinadas ao sistema informatizado (SCHMITZ; MAHL, 2000). O rearranjo organizacional promove o crescimento do número de gerentes, em diferentes níveis, decorrente da redução do número de caixas, e o aumento dos cargos comissionados34, que possuem jornada de trabalho maior do que seis horas, estabelecida por métodos de gratificação (LARANGEIRA, 1997). Atualmente, segundo a Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), são reconhecidas treze ocupações bancárias e essas são definidas do seguinte modo, de acordo com o Ministério do Trabalho e Emprego (2008): Analista de produtos bancários (profissionais de administração econômicofinanceira): administram fundos e carteiras de investimentos em instituições financeiras. Desenvolvem, implantam e administram produtos e serviços bancários. Analisam operações de crédito e de cobrança e operacionalizam contratos de financiamento e/ou empréstimos. Controlam recursos para crédito obrigatório e gerenciam cobranças. Preparam e consolidam informações gerenciais e econômicofinanceiras. Relatam aos setores e clientes do banco, oralmente ou por escrito, a situação dos produtos e serviços bancários. Cargos: administrador de fundos e carteiras de investimento, analista de câmbio, analista de cobrança (instituições financeiras), analista de crédito (instituições financeiras), analista de crédito rural, analista de leasing, analista de produtos bancários e analista financeiro (instituições financeiras) - analista de planejamento financeiro. Chefe de serviços bancários (técnicos em operações e serviços bancários): processam operações de crédito, investimento e serviços bancários, obedecendo normas externas, emanadas de órgãos governamentais, e internas, da instituição que os empregam. Controlam as operações de concessão de crédito, investimento e serviços a pessoas físicas ou jurídicas, a fim de cumprir e fazer cumprir as normas e regras internas e de órgãos regulamentadores, tais como: Banco Central do Brasil e Secretaria da Receita Federal, entre outros. Atendem aos demais setores do banco, como seus clientes internos, e a órgãos governamentais, outros bancos e ao público em geral, como clientes externos, prestando-lhes informações sobre assuntos de sua 34 O comissionamento constitui no pagamento de um adicional para certas funções, desobrigando os bancos do pagamento de horas extras, diminuindo, assim, os gastos com remuneração de funcionários (PENELLA, 2000). 51 competência. Podem coordenar recursos humanos, sob sua responsabilidade e exercer o monitoramento de serviços prestados por terceiros. Cargos: técnico de operações e serviços bancários - câmbio, técnico de operações e serviços bancários crédito imobiliário, técnico de operações e serviços bancários - crédito rural, técnico de operações e serviços bancários - leasing, técnico de operações e serviços bancários - renda fixa e variável, tesoureiro de banco e chefe de serviços bancários. Conferente de serviços bancários/ Escriturários de serviços bancários (escriturários de serviços bancários): prestam atendimento a usuários de serviços bancários; realizam operações de caixa; fornecem documentos aos clientes e executam atividades de cobrança. Apoiam as atividades das agências e demais setores do banco; administram fluxo de malotes; compensam documentos e controlam documentação de arquivos. Estabelecem comunicação com os clientes, prestando-lhes informações sobre os serviços bancários. Cargos: atendente de agência, caixa de banco, compensador de banco, conferente de serviços bancários, escriturário de banco e operador de cobrança bancária. Diretor de produtos bancários (diretores de operações de serviços em instituição de intermediação financeira): dirigem as atividades de intermediação financeira, aprovando operações, participando dos comitês de decisão, definindo políticas e diretrizes e estabelecendo estratégias operacionais. Desenvolvem produtos e serviços; dirigem equipes; controlam o desenvolvimento das operações financeiras, assegurando que sejam realizadas dentro das normas ditadas pelos órgãos reguladores, como também pelas políticas de controle interno da instituição; comunicam-se oralmente e por escrito. Cargos: diretor comercial em operações de intermediação financeira - diretor adjunto comercial em operações de intermediação financeira, Diretor de plataforma em operações de intermediação financeira, Diretor regional em operações de intermediação financeira; diretor de produtos bancários; diretor de crédito rural; diretor de câmbio e comércio exterior; diretor de compliance; diretor de crédito (exceto crédito imobiliário); diretor de crédito imobiliário; diretor de leasing; diretor de mercado de capitais; diretor de recuperação de créditos em operações de intermediação financeira e diretor de riscos de mercado. Gerente de produtos bancários (gerentes de operações de serviços em instituição de intermediação financeira): comercializam produtos e serviços financeiros; implementam processos operacionais; planejam processos de operações bancárias; coordenam o desenvolvimento e a implantação de produtos, serviços e processos; gerenciam pessoas; traçam plano diretor para áreas de crédito, produtos e comercialização; administram recursos materiais, financeiros e serviços de terceiros; comunicam-se, oralmente e por escrito, divulgando e consolidando informações, normas e procedimentos, campanhas de vendas, interagindo com pessoas e conduzindo reuniões. Cargos: gerente de produtos bancários; gerente de agência; gerente de câmbio e comércio exterior - administrador de carteiras de câmbio e comércio exterior, gerente de administração de carteiras de câmbio e comércio exterior; gerente de crédito e cobrança - administrador de carteiras de crédito e cobrança, gerente de administração de carteiras de crédito e cobrança; gerente de crédito imobiliário - administrador de carteiras de crédito imobiliário, gerente de administração de carteira de crédito imobiliário; gerente de crédito rural e gerente de recuperação de crédito. Profissionais de comercialização e consultoria de serviços bancários: comercializam produtos e serviços financeiros e desenvolvem propostas de crédito. Gerenciam carteira de clientes e efetivam negócios. Prospectam clientes, exercem ações gerenciais e previnem operações ilegais. Interagem com áreas afins locais e internacionais. Cargos: gerente de captação (fundos e investimentos institucionais), gerente de clientes especiais (private), gerente de contas - pessoa física e jurídica, gerente de grandes contas (corporate) e operador de negócios. Técnico de operações e serviços bancários/câmbio/crédito imobiliário/crédito rural/leasing/renda fixa e variável: processam operações de crédito, investimento e serviços bancários, obedecendo normas externas, emanadas de órgãos governamentais, e internas, da instituição que os empregam. Controlam as operações de concessão de crédito, investimento e serviços a pessoas físicas ou jurídicas, a fim de cumprir e fazer cumprir as normas e regras internas e de órgãos regulamentadores, tais como: Banco Central do Brasil e Secretaria da Receita 52 Federal, entre outros. Atendem aos demais setores do banco, como seus clientes internos, e aos órgãos governamentais, outros bancos e ao público em geral, como clientes externos, prestando-lhes informações sobre assuntos de sua competência. Podem coordenar recursos humanos, sob sua responsabilidade e exercer o monitoramento de serviços prestados por terceiros. Cargos: técnico de operações e serviços bancários - câmbio, técnico de operações e serviços bancários - crédito imobiliário, técnico de operações e serviços bancários - crédito rural, técnico de operações e serviços bancários - leasing, técnico de operações e serviços bancários renda fixa e variável, tesoureiro de banco e chefe de serviços bancários” (BRASIL, 2008). A flexibilização funcional, no sentido da realização de várias tarefas ao mesmo tempo, foi largamente adotada em todas as funções bancárias, claramente ilustrada pelo caso do funcionário gerencial administrativo, que desempenha inúmeras tarefas na sua função e todas as atividades possuem conteúdo desvalorizado e considerado sem criatividade. Para Batista (2008), tais mudanças organizacionais acarretam não só a “flexibilização e precarização do trabalho, mas também a flexibilização da dimensão humana do trabalhador, principalmente sob a forma de organização da produção toyotista, quando a manipulação e o controle aparecem de forma velada, hoje disfarçada pela gestão do empowerment35” (BATISTA, 2008, p. 2), como demonstra o relato a seguir: “Eu como gerente administrativo sou responsável pelos caixas, operações que são feitas no banco, operações de créditos, análises de cadastro, essas operações que são liberadas são responsabilidades minha, até estar verificando, formalizando elas, pra ver se realmente as garantias são reais, consignadas, se tem no financiamento de veículos alienação credenciária, se está tudo correto. Então engloba tudo, tanto eu fico na parte pessoal de recursos humanos como na parte de formalização de contratos, admissão e demissão, funcionários contratados, terceirizados, vigilantes [...] a parte que é funcional, caixas de auto-atendimento, também, atendimento ao público, serviços de conveniência, tudo isso é minha responsabilidade... quer dizer dentro da agência, o lugar onde tem pessoas eu estou no cantinho ali dando um suporte ou então acompanhando” (entrevistado 3). 35 “O termo empowerment significa na língua inglesa, the process of giving somebody the power of act. Não há tradução exata em português, mas a partir de sua definição no campo da administração de empresas podemos defini-lo como “empoderar”. Na “evolução” da teoria americana de administração de empresas, o discurso do empowerment, ou a gestão pelo empowerment, nasceu para driblar os contratempos e contradições causados pelos métodos de gestão taylorista-fordistas. Associado às práticas de gerenciamento da qualidade e dos recursos humanos, o empowerment aparece como uma novidade cuja função seria resolver os problemas da administração clássica” (BATISTA, 2008, p. 1). “[...] a gestão do empowerment pretende estimular a criatividade através de discursos motivacionais sobre liderança e autonomia, que não só transmitem cada vez mais responsabilidade ao trabalhador, incitando uma competitividade desmedida (que influi negativamente na constituição do coletivo de trabalho), como também captura de maneira camuflada a subjetividade do trabalhador” (BATISTA, 2006). 53 O trabalho bancário reestruturado está convertendo a maioria dos seus trabalhadores em meros auxiliares de produção, cuja força de trabalho se apresenta pouco qualificada (RIBEIRO, 1999). Mas para alguns autores, como Netz (2005), na verdade não se deixou de exigir profissionais mais qualificados no processo de recrutamento, pelo contrário, a capacitação do trabalhador para ser polivalente (multi skill) é analisada e selecionada por quem contrata a mão-de-obra, assim, a exigência pelo conhecimento é sempre maior do que na verdade é necessário para o exercício de sua função. Ou seja, a alta escolaridade ainda continua sendo um requisito privilegiado para categoria, mesmo que o alto grau de qualificação seja para executar procedimentos cada vez mais simples (NETZ, 2005). De tal forma que, os “menos aptos” são desqualificados na busca da flexibilidade interna, seguindo a tendência de adaptação das qualificações dos bancários às novas tecnologias, o que torna a “formação permanente em uma seleção permanente” (CASTEL, 1998, p. 519), ou o que Batista (2008) refere como sendo “uma seleção entre os já ‘qualificados’” (BATISTA, 2008, p. 14). Na visão de Jinkings (2004) a nova configuração elimina os trabalhadores “menos qualificados”, ou melhor, “não adaptados aos princípios empresariais da qualidade total e excelência” nos atendimentos, e valorizam os bancários que apresentam habilidades gerenciais para vendas e facilidade em se adaptar às novas exigências do mercado financeiro (JINKINGS, 2004, p. 219). São os funcionários dispostos a corporificar a cultura organizacional36 imposta, que delineia o caráter e impacta no desempenho da organização vivido dentro dessa sociedade ocupacional que os bancos se tornaram (GUEDES, 2001). Para Fleury (1987), os aspectos ideológicos, inerentes na dimensão política nas organizações, não só camuflam as teias de relações sociais, como também fortalece a dominação e o controle para maximizar a exploração no trabalho (FLEURY, 1987). Na mesma temática Segnini (1999) denomina de “nova qualificação na ótica dos bancos” o perfil do vencedor capaz de se adequar à competitividade, tanto entre colegas na busca por um diferencial de desempenho, quanto para as atividades comerciais ao cumprir as metas de venda de produtos e serviços bancários. Essa nova qualificação se resumiria em: “ser capaz de se adaptar à intensificação do ritmo de trabalho e às demandas dos clientes”, 36 Cultura organizacional: “é o conjunto de pressupostos básicos que um grupo inventou, descobriu ou desenvolveu ao aprender como lidar com seus problemas de adaptação externa e de integração interna, e que funcionam suficientemente bem para serem considerados válidos e ensinados a novos membros como a forma correta de perceber, pensar e sentir, em relação a esses problemas” (SCHEIN, 1984 apud GUEDES, 2001). Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 54 “disposição para ser competitivo”, “ser amável”, “equilibrado”, “ser capaz de se adaptar às novas situações” e “ter comportamento social adequado” (SEGNINI, 1999, p. 198). Isso prova que, além dos impactos nas condições de trabalho, os rearranjos na economia mundial e as mudanças técnico-organizacionais também são responsáveis pela releitura dos conceitos: qualificação37, competência38 e formação profissional (GÓES; SOUZA, 2008). Para Braverman, após a ressemantização da qualificação e formação profissional, restou aos trabalhadores apenas “um conceito reinterpretado e dolorosamente inadequado de qualificação: uma habilidade específica, uma operação limitada e repetitiva, ‘a velocidade como qualificação’” (BRAVERMAN, 1977, p. 375). O processo no sentido da racionalização é baseado na maior segmentação das atividades bancárias, favorecendo as contratações flexíveis (LARANGEIRA, 1997). As novas políticas administrativas e gerenciais implantaram práticas mais flexíveis nas relações de trabalho. A diversificação das formas de contratação da força de trabalho possibilitou aos bancos ganhos de lucratividade, que puderam optar pelo processo de terceirização, ou ainda pelo contrato temporário, trabalhos parciais, e até mesmo, pela introdução dos call centers (ANTUNES, 2006). Ao terceirizar as atividades, as instituições se livram dos custos de remuneração e benefícios dos funcionários definidos legalmente e amparados pelos sindicatos da categoria. Primeiramente, esse processo iniciou pelas atividades tidas como não bancárias, como a “limpeza, segurança, manutenção de prédios, transporte de malotes, restaurantes”, e que, portanto, não agregavam valor ao trabalho bancário, mas, logo se estendeu às outras atividades, como por exemplo, a área de informática que engloba desde a digitação, programação até o cadastramento, e “as atividades de numerário, confecção, entrega de talões e compensação de cheques”. O processo de terceirização avança em todos os setores que se situam fora da área central das agências - a área de negociação - e geralmente, está associado à redução de custos com pessoal, principalmente nas atividades de baixa qualificação e “labor-intensive” (LARANGEIRA, 1997, p. 128). Antunes (2002) aponta ainda como consequências desse processo de reestruturação do trabalho, a desregulamentação dos direitos trabalhistas, a fragmentação da classe trabalhadora, a precarização e a terceirização do trabalho, o desemprego e a fragilização ou destruição do sindicalismo de classe (ANTUNES, 2002). Desde o princípio, a reestruturação provocou 37 Qualificação: “... tendo em vista adequá-lo às novas formas pelas quais [o capital] se organiza para obter maior e mais rápida valorização” (Manfredi,1998, apud GÓES; SOUZA, 2008, p. 130). 38 Competência: “... estoque de conhecimentos/habilidades, mas, sobretudo... capacidade de agir, intervir, decidir em situações nem sempre previstas ou previsíveis” (Manfredi, 1998, apud GÓES; SOUZA, 2008, p. 130). 55 eliminação de postos de trabalho. Inicialmente, as ondas de demissão ocorriam em consequência aos ajustes para compensar os impactos que os sucessivos planos de estabilização exerceram sobre as receitas inflacionárias dos bancos. Mas são vários os outros motivos responsáveis pela redução do número de bancários (DIEESE39, 1998). Uma das principais causas associadas ao desemprego é a automação, como facilitadora do aumento nos ganhos por produtividade e competição, eliminou a atuação direta do bancário em diversas atividades dentro do processo de trabalho (SCHMITZ; MAHL, 2000). “A concepção dos bancos mudou de acordo com o sistema. Até a ditadura militar, por exemplo, nós tínhamos o bancário como uma classe de elite, onde ele tinha estabilidade, ele tinha probabilidade de carreira. Depois de 1964 com a questão do fundo de garantia por tempo de serviço os bancos tiveram a autonomia de demitir as pessoas e o trabalho começou a sofrer grande precariedade em função das demissões, mas mesmo assim, havia um grande número de trabalhadores, porque além do serviço de trabalhar com o público, o bancário também fazia a movimentação financeira e a movimentação contábil. A década de 80 que é o grande divisor de responsabilidade e um pouco da falência da categoria bancária, ela vai de encontro com a informatização. A informatização começa a prestar serviço ao público e começa também fechar os balancetes, as normas internas do banco. Isso leva um acúmulo significativo de demissões, aonde o bancário ele é substituído pela máquina. Então houve um acúmulo de demissão muito grande na década de 80, mas ainda tinha um grande número de funcionários. Agora um grande problema que nós tivemos foi o governo do Collor para frente, com a implantação do sistema neoliberal, e o sistema neoliberal com a concepção do Estado mínimo bateu de frente com a questão dos bancos públicos, então o Banestado, o Bemge, o Credireal, o próprio Banco do Brasil sofreram vários tipos de mudanças, a Caixa Econômica Federal sofreu também vários tipos de mudanças. Numa concepção mercadológica da globalização, vários bancos foram fundidos, bancos pequenos não ficaram no mercado. No Brasil nós tínhamos quase um milhão de bancários, hoje nós estamos com 398 ou 390, nós perdemos 400 mil postos de trabalho em função desse processo neoliberal” (presidente do SEEBU40). 39 Disponível em: http://www.dieese.org.br/esp/bancario.zip. Entrevista concedida à autora em 18 de março de 2008, pelo então Presidente, Sérgio Gomes, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 40 56 As mudanças organizacionais, também apontadas como responsáveis pela demissão dos bancários, alterou o conteúdo das funções e as rotinas dentro das agências, dispensando as chefias intermediárias que executavam o controle e a supervisão, e estimulando novos grupos que assumissem novas tarefas e se responsabilizassem por sua execução (DIEESE, 1998). Através da terceirização, considerada uma nova forma de relação, algumas tarefas, originalmente desenvolvidas por bancários, foram transferidas para outras empresas especializadas. Os processos de F&As também provocaram redução do número de bancários, uma vez que, ao se unir a outra instituição, o banco elimina setores responsáveis por tarefas em comum, como serviços de contabilidade, recursos humanos, administração e marketing. E até o descumprimento da jornada de trabalho do bancário, através da realização de horasextras e o comissionamento de empregados, diminuíram o número efetivo de trabalhadores nos bancos (SCHMITZ; MAHL, 2000). Os dados levantados pelo Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (DIEESE, 1998), ilustram esse fato, em 1994, com a adoção do Plano Real desencadeou a intensificação dos cortes, eliminando 34 mil empregos nesse ano (-5%). A intensificação no ritmo das demissões seguiu nos próximos dois anos, atingindo até médias de 5.300 cortes por mês, totalizando nesse período, mais de 20% de bancários desempregados. No ano de 1997 as demissões sofreram redução (-7%), contabilizando, nos três anos e meio entre o início do Plano Real e o final de 1997, 183 mil empregos eliminados nos bancos (-28%) (DIEESE, 1998). O processo de terceirização adicionado as outras práticas de gestão que determinam a precarização: intensificação do trabalho, jornadas de trabalho mais longas, frequentes horas extras e salários relativamente inferiores determinam a real condição do trabalho bancário reestruturado (SEGNINI, 1999). Outra prática difundida é a “bancarização sem bancários”, mais uma estratégia de redução de custos ao baratear e transferir serviços que não são mais interessantes dentro das agências. Esse fenômeno denunciado por vários sindicatos da categoria se baseia na instituição dos correspondentes bancários (corbans) 41, trabalhadores de postos de atendimentos que podem atuar como bancários executando “pagamentos, recebimentos de contas diversas, recepção e encaminhamento de proposta de abertura de contas e depósitos, pedidos e análises de empréstimo e financiamento e cadastro, proposta de emissão de cartão de crédito, seguros e títulos de capitalização”. Os corbans, assim 41 Até 2005 já existiam mais de noventa mil pontos de corban espalhados pelo território nacional. Esse tipo de serviço surgiu em 1973 e desde então, já foram definidas seis resoluções que ampliaram o nível de atuação dos correspondentes bancários. A resolução 3.110 - Consolidação das Normas de Correspondente Bancário - altera e consolida as normas que dispõem sobre a contratação de correspondentes bancários no país (MOTTA; CORDEIRO, 2006) (ANEXO A). 57 denominados, surgem, estrategicamente, nas localidades “onde os bancos, por conveniência, não querem estar” (MOTTA; CORDEIRO, 2006, p. 5). A edificação de uma agência bancária pode custar até R$ 400 mil, já um posto de atendimento, aproximadamente, R$ 70 mil, enquanto que, os gastos com um corban não ultrapassa R$ 18 mil. Mais uma forma de precarização do trabalho que permite aos bancos economizarem com o pagamento de trabalhadores e com a manutenção das agências, oferecendo um atendimento precário a toda população. A parcela mais humilde, que apresenta determinada dificuldade de acesso a uma agência bancária, é empurrada a utilizar o atendimento precário dos corbans e os usuários, que pagam altas taxas de tarifas aos seus respectivos bancos, são obrigados a utilizarem o atendimento eletrônico - telefones, internet ou caixas eletrônicos. Na opinião de Motta e Cordeiro (2006), os corbans representam para as instituições financeiras “um modo barato de esvaziar agências de clientes e, no futuro, por que não de bancários?”, apontando já para a tendência de extinção daquela categoria de trabalhadores (MOTTA; CORDEIRO, 2006, p. 4). O poder organizacional se encontra permeado nos mecanismos que instituem a disciplina e o controle do trabalho através de programas de qualidade total, remuneração variável a partir da combinação de benefícios fixos e variáveis, estabelecimento de metas e premiação salarial42 por produtividade e criação de equipes e células de qualidade total (JINKINGS, 2004). As estratégias de dominação do trabalho adotam novos termos para nomear e se relacionar com os bancários, tornando-os “parceiros”, “sócios” e “colaboradores” de suas instituições (ANTUNES, 2006), ou ainda o mito da “grande família”, apontado por Grisci e Bessi (2004). Persistindo nessa política de gestão, os bancos reestruturados desenvolveram programas de controle de carreira praticados pela realização de treinamentos e cursos feitos fora do expediente de trabalho e até mesmo nos finais de semana (MERLO; BARBARINI, 2002). Programas que são oferecidos aos bancários com a “boa” intenção de colaborar para o “construir do seu próprio caminho de crescimento” (BATISTA, 2008, p. 12), delegando toda responsabilidade pela qualificação profissional dentro do banco aos próprios bancários, é o que Batista (2008) denomina de “gestão de carreira pelo próprio funcionário” (BATISTA, 2008, p. 13). Ao mesmo tempo livra a instituição de qualquer compromisso e 42 A edição e reedição da Medida Provisória (MP), que dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados das empresas, em dezembro de 1994, definem a fórmula para a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) (MP 794/94 - MP - Medida Provisória nº 794 de 29.12.1994, D.O.U. 12 dezembro de 1994). A última fórmula calcula “o valor do abono com o percentual correspondente a 60% do salário, mais a quantia de R$ 270,00, estabelecendo uma faixa de variação em que tal valor não será inferior a 5% ou superior a 15%, considerando o lucro líquido da empresa” (LARANGEIRA, 1997, p. 125). Respeitando a exigência dos empregadores de que o valor do abono não ultrapasse duas vezes o valor do salário do funcionário (LARANGEIRA, 1997) (ANEXO B). 58 culpa pelo sucesso ou fracasso de cada um, uma vez que o banco possibilitou todas as condições para reconhecer e valorizar as competências profissionais através dos programas de aperfeiçoamento (BATISTA, 2008). Até mesmo os processos de requalificação, que antes eram oferecidos pelos bancos, passaram a ser obrigação do bancário e exigidos como prérequisitos para conquistar promoções, almejar novas contratações e inclusive, manter o seu emprego (MERLO; BARBARINI, 2002). “[...] hoje em dia tem vários cursos que nós podemos fazer pelo próprio banco, que nos permite fazer em casa mesmo pela internet e nós somos bem preparados para estar adequando às mudanças... e sempre estar exigindo mais, em todos os aspectos tanto fisicamente como psicologicamente. No dia a dia você tem que estar atualizado para poder estar sabendo atender bem o cliente e com isso você tem que estar se desdobrando cada vez mais, tem o esforço da parte da gente que o banco exige de um lado e você tem que correr atrás pra poder dar conta de corresponder [...]” (entrevistado 11). Segundo dados da Associação dos Bancos do Estado do Rio de Janeiro (ABERJ), a indústria bancária, a primeira entre os setores da economia que mais investem em Novas Tecnologias de Informação (NTI), já conquistou o segundo lugar na adoção do e-learning43, perdendo apenas para a indústria de telecomunicações (LUCENA, 2002). O aperfeiçoamento técnico, geralmente, estabelecido por “metas de horas/curso por funcionário”, contabiliza também como pontos decisivos para participação nos lucros da instituição. Os cursos e treinamentos são disponibilizados via intranet, divididos em “cursos do mês” e são considerados como sinônimo do que há de mais moderno em gestão44 (BATISTA, 2008, p. 6). “Na verdade existem metas que são mensais, então há sim cobrança que vem dos diretores regionais, da matriz também, além do treinamento à distância, no caso a gente chama dos ‘treinets’, a gente faz na casa da gente mesmo via internet. Essa meta quando é passada a gente repassa para os nossos colaboradores, no caso minha equipe, e a gente tem que fazer valer, a gente não pode ficar atrás não” (entrevistado 3). 43 O termo e-learning foi criado pela combinação entre o ensino com auxílio da tecnologia e a educação a distância. Ambas modalidades convergiram para a educação on line e para o treinamento baseado em web, que ao final resultou no e-Learning. A interatividade é disponibilizada pelas redes de internet, intranet, e pelos ambientes de gestão, construindo um meio de comunicação (WIKIPÉDIA, 2008). 44 O termo gestão é utilizado para designar “o conjunto de práticas administrativas colocadas em execução pela direção de uma empresa para atingir os objetivos que ela se tenha fixado” (CHANLAT, 2000 apud GRISCI; BESSI, 2004, p. 166). 59 Em relação aos aspectos da divisão sexual do trabalho, observa-se, segundo Antunes (2006), uma feminização da categoria bancária, processo que caminha juntamente com o desenvolvimento da automação e flexibilização das relações e condições de trabalho. O que não implica numa “equalização da carreira e do salário entre homens e mulheres” nas agências (ANTUNES, 2006, p. 21). A partir de dados do Dieese (1997 apud ABREU; SORJ, 2002), observa-se o crescimento de 36% a 43% da participação feminina nos cargos bancários no período correspondente a 1986 e 1996 (ABREU; SORJ, 2002). As novas formas de acumulação flexível, para as mulheres, significaram formas precárias de trabalho, como contratos temporários, empregos por tempo parcial e/ou trabalho em domicílio (TEIXEIRA, 2006). Segundo as estatísticas de estudos recentes, as mulheres representam mais de 45% da categoria, nas seis principais regiões metropolitanas pesquisadas (São Paulo, Salvador, Recife, Belo Horizonte, Porto Alegre e Distrito Federal), constituindo um dos setores que mais emprega mulheres proporcionalmente (DIEESE, 2001). A partir da pesquisa de Segnini (2000), verifica-se que as mulheres, geralmente, ocupam os postos de trabalho mais afetados pelas novas formas de organização do trabalho e processos de informatização. Essas atividades atribuídas às mulheres são de baixa exigência de qualificação, ao mesmo tempo em que requerem elevado nível de atenção e responsabilidade, por exemplo, o cargo de escriturário, desenvolvido em tempo parcial e que executa funções de caixa de banco, digitação e separação de documentos (SEGNINI, 2000). Apesar do alto nível de escolaridade e competência profissional, as mulheres, comprovadamente, continuam ocupando cargos hierarquicamente menos importantes “relacionados a atividades simplificadas e repetitivas” (JINKINGS, 2004, p. 237). É inegável que no caso das mulheres bancárias a exploração se potencializa: além de frequentemente possuírem salários menores que os homens - mesmo quando ocupam os mesmos cargos e exercem a mesma função, elas ainda assumem uma dupla jornada de trabalho, ao adicionar as horas de trabalho doméstico (ARAÚJO, 2005). Diante da expansão capitalista na reconfiguração do trabalho bancário, a incorporação da tecnologia destituiu todo status do maior “cargo de confiança” ao transferir sua estrita relação de confiança com o seleto grupo de bancários para os modernos sistemas de processamento de dados (NETZ, 2007). Em decorrência dessas novas práticas políticas e de 60 gestão de pessoas45 as instituições são estruturadas em favor da substituição do trabalho vivo em demanda do trabalho imaterial46 (GRISCI; BESSI, 2004). Entretanto, além desses problemas apresentados de forma subsequente ao processo de reestruturação, os efeitos mais agravantes foram os impactos dessas mudanças na saúde dos trabalhadores dos bancos. Uma categoria profissional que vem se destacando pelo seu crescente adoecimento físico e mental. 3.7 TRABALHO E SAÚDE Na contraface dessa modernidade tecnológica, mesmo com seu discurso em defesa da automação como forma de facilitação da rotina e das tarefas, coexistem os trabalhos manuais e os movimentos repetitivos nos sistemas modernos informatizados (BLASS, 1993). Esse caráter de modernidade só mascara o “processo de sujeição, alienação e degradação do trabalhador bancário” (PENELLA, 2000, p. 104). Anterior ao início do processo da automação, o bancário sofria de outros tipos de acometimentos ocupacionais, sendo as doenças mais diagnosticadas na categoria a tuberculose e a psiconeurose bancária47, perfil de adoecimento definido pelas condições de trabalho na época (PENELLA, 2000). Segundo Canêdo (1978), em 1938, 23% dos bancários de São Paulo eram portadores de tuberculose. Noticiavam os jornais da época que “os afetados de tuberculose, é de crer, o devem, sobretudo às desfavoráveis circunstâncias em que trabalham quanto a sítios contaminadores, horários apertados, alimentação insuficiente” (CANEDO, 1978, p. 43 apud CAMPELLO, 2004, p. 33). Ao mesmo tempo em que a “psiconeurose bancária” foi diagnosticada, no ano de 1942, em 259 bancários do Rio de Janeiro, onde eram detectados quadros, segundo descrição da época, de afetação das “funções do cérebro, dando fraqueza, dificuldade de concentrar a atenção, dor de cabeça e irritabilidade. Surgem insônias e fobias de várias espécies [...]. O 45 A expressão gestão de pessoas significa “construção social baseada em uma visão particularizada de organização e de pessoa, variando no tempo e no espaço” (DAVEL; VERGARA, 2001 apud GRISCI; BESSI, 2004, p. 167). 46 Segundo Grisci e Bessi (2004), o trabalho imaterial “seria o que se extingue no momento de sua produção, agregando características pessoais do próprio trabalhador. Trata se de capacidades de mobilização, cooperação e criação que são dificilmente comandadas ou passíveis de controle externo ao trabalhador” (GRISCI; BESSI, 2004, p. 163). 47 Em 1933 foi aprovada a jornada de 6 horas para os bancários, argumentando-se com base na "psiconeurose bancária". 61 sintoma que domina é a angústia ou excesso de escrúpulo” (CANEDO, 1978, p. 43 apud VIEIRA NETO, 2004, p. 117). Mas de acordo com Brandão, Horta e Tomasi (2005), nas últimas décadas, a partir da incorporação de novas tecnologias e alterações nas relações de trabalho, surgiram novos fatores de riscos para a saúde do bancário, caracterizando um novo perfil de adoecimento dos trabalhadores dessas instituições. “A introdução da automação em larga escala com a crescente utilização dos microcomputadores em todos os setores produtivos têm ocasionado rotinas de trabalho altamente rápidas e repetitivas”. Mudanças, que ao mesmo tempo, provocam novas exigências físicas e mentais, modificam o mecanismo de desgaste e alteram as condições de saúde da categoria (BRANDÃO; HORTA; TOMASI, 2005, p. 296). De tal forma que, à medida que, o trabalho se torna, “a cada dia mais ágil acompanhando a velocidade dos computadores”, o bancário também é obrigado a se tornar um sujeito dotado “de respostas cada vez mais rápidas” (GRISCI; BESSI, 2004, p. 171). As transformações, na grande maioria das tarefas bancárias, trouxeram consequências importantes para a saúde dos bancários, principalmente os riscos organizacionais que propiciam o aumento de doenças, tais como as Lesões por Esforço Repetitivo/Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho (LER/DORT)48 e o estresse (SILVA. G. W.; MÁSCULO, 2002). As LER/DORT eram pouco conhecidas até meados da década de 1970, quando tiveram rápido crescimento nos ambientes laborais, atingindo a priori o setor de serviços. No início da década de 1980 essa doença começa a se propagar no Brasil, em especial entre digitadores empregados em bancos. Foi nesse período que registrou-se casos de LER/DORT atingindo bancários que trabalhavam como digitadores em um CPD de um determinado banco. Logo, novos casos foram sendo diagnosticados, em outros centros de processamento, escriturários, caixas de bancos, à medida que a automação avançava para a periferia das agências (RIBEIRO, 1997). Nessa década diante da constatação da maior incidência de casos de tenossinovite49 em digitadores, o sindicato da categoria lutou pelo “reconhecimento oficial das lesões como doenças profissionais”. “Em 1987, o Ministério da Previdência Social (portaria n°. 4.602), incluiu a tenossinovite entre as doenças profissionais, mas a relacionou apenas à função de digitador, excluindo as demais categorias profissionais” (PENELLA, 48 O conceito de LER/DORT, de acordo com a Ordem de Serviço 606-INSS (1998) que disciplina a nova Norma Técnica, refere “às lesões causadas por esforços repetitivos são patologias, manifestações ou síndromes patológicas que se instalam insidiosamente em determinados segmentos do corpo, em consequência do trabalho realizado de forma inadequada...” (ORDEM DE SERVIÇO 606-INSS, 1998) (ANEXO C). 49 Tenossinovite é a inflamação da membrana que recobre os tendões, dentro dos quais estes tendões se deslocam com a finalidade de proporcionar movimentos às articulações. É caracterizado por dor nas inserções tendinosas, com edema e comprometimento funcional variável. 62 2000, p. 98). Os esforços e ações coletivas continuaram, sob forma de “discussões e pressões sobre o Ministério do Trabalho”, com o objetivo de desenvolver ações que ocasionassem reais mudanças. Por esse motivo foi elaborada a Norma Regulamentadora 17, sob a portaria n° 3.751 do Ministério do Trabalho, obrigando a adoção de melhores condições de trabalho aos digitadores. Por outro lado, nenhuma atitude preventiva foi adotada, de tal forma que o crescimento dos números persistiu. Diante de tais dados, o Ministério do Trabalho e da Previdência Social, em 1991, publica a primeira norma sobre LER; no ano de 1992, a Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, através de norma técnica específica, reconhece essas lesões como doença do trabalho; um ano depois, o Instituto Nacional de Seguro Social (INSS) publica sua norma sobre as LER e em 1998, é publicada uma norma sugerindo uma nova nomenclatura, DORT - Doenças Osteomusculares Relacionadas ao Trabalho. A partir de então a doença passa a ser referida com a sigla LER/DORT (PENELLA, 2000, p. 99). Nos últimos quatro anos, segundo o levantamento da CNB (Confederação Nacional dos Bancários), da Central Única dos Trabalhadores (CUT), junto à Previdência Social, observa-se nas instituições financeiras que entre os bancários brasileiros a incidência de LER/DORT cresceu 64,8%. Em pelo menos sete principais instituições financeiras, as quais representam metade dos bancários brasileiros – aproximadamente 200 mil trabalhadores – a frequência dos casos dessas lesões aumentou de 1.552 no ano de 2000 para 2.558 em 2004 (NEHME, 2005). No período de 2000 a 2005, foram afastados 25.080 bancários com base nas informações do Ministério da Previdência Social. Mais do que qualquer outra categoria, a bancária registra o maior número de casos de LER/DORT. Por apresentarem, principalmente, maior facilidade de organização, significante nível de representatividade e poder, acesso aos serviços médicos e maior exposição às transformações organizacionais do trabalho, o setor financeiro é responsável pela ampliação e enfoque da discussão sobre as doenças ocupacionais, conquistando até hoje os maiores acordos coletivos relacionados à saúde do trabalhador (PENELLA, 2000). O novo esforço físico, segundo Ribeiro (1997), exigido pela automação, advém de outra natureza, juntamente ao fato das estruturas musculoesqueléticas, principalmente dos membros superiores, estarem sendo sobrecarregadas de diferentes formas, o esforço, mais especificamente das mãos e dedos, sendo mais leve e simples é passível de repetitividade e ritmo acelerado, concomitante à adoção de posturas e sobrecargas estáticas dos outros segmentos corporais. Durante a jornada do trabalho bancário, realmente o gasto calórico é mínimo, mas o uso excessivo de músculos e tendões provoca, ao longo do tempo, micro63 traumas cumulativos (RIBEIRO, 1997). No caso dos caixas bancários, a implantação de novos sistemas adicionou a atividade de digitar documentos no próprio guichê, motivo apontado, acrescido pelo aumento de pressão no trabalho, as ausências de pausas em dias de maior movimento e as frequentes jornadas de trabalho estendidas, pelo crescimento dos índices de LER/DORT entre esses profissionais (MERLO; BARBARINI, 2002). Ao passo que tal função, assume as atividades anteriormente executadas pelos CPDs, é rebaixada a digitador. Com a presença do computador o “volume de trabalho aumentou, uma vez que, o número de clientes atendidos é maior”. Além de tornar o trabalho do caixa ainda mais monótono e estático, sem necessidade de se deslocar e a impossibilidade de alternância de posturas, a partir do fácil acesso a todos os dados referentes aos clientes em seu próprio posto de trabalho. Além disso, há o fato de manipular documentos, dinheiros e números, que exige um nível de concentração e atenção que tem provocado tensões musculares e contrações estáticas, resultando em quadros de cansaço e algias, os quais, segundo Murofuse e Marziale (2001), também podem evoluir para um “quadro de inflamação nas estruturas musculoesqueléticas" (MUROFUSE; MARZIALE, 2001, p. 22). Exigências que se agravam ainda mais com o medo de errar e das consequências desse erro. Um dos entrevistados para esta pesquisa comenta essa questão da seguinte forma: “[...] é muito estressante entendeu? Qualquer coisa que você errar é dinheiro, porque o produto é dinheiro. Então você tem que estar atento o tempo inteiro, você vai digitar e tem que digitar correndo, você nem olha pra as teclas que você está digitando correndo e você não pode errar, você tem que está ligada em tudo isso, muito barulho que tira a sua concentração, muita gente conversando muito, você tendo que contar dinheiro, tendo que conferir aquilo. [...] Como eu te falei, o produto é dinheiro, então eu mexo com o dinheiro diretamente, então qualquer erro o banco não quer o prejuízo, o cliente também não quer e nem merece porque ele não tem culpa e o banco também não assume, então cai pra gente. Muitas vezes a pessoa [cliente] leva [dinheiro] e não te fala quanto que tem, justamente pra não, sei lá, acha que você pode ter errado também na conta, quando não te falam você tem que ter mais atenção. É um monte de coisa que você tem que fazer ao mesmo tempo, tem que contar, conferir, verificar se não tem dinheiro falso, se o valor bate, contar duas, três vezes, se você erra o cliente já te olha achando que você está roubando [...]”(entrevistado 5). 64 Além do tipo de trabalho, as condições de trabalho dos caixas são influenciadas diretamente pelas características “inadequadas do mobiliário e do equipamento; da organização do trabalho, da tensão sob a qual trabalham os caixas e o ritmo acelerado e ininterrupto que lhes é imposto na maior parte do tempo” (LIMA, 1998 apud MUROFUSE; MARZIALE, 2001, p. 22). “[responsabilidade de lidar com o dinheiro dos outros] é grande. Eu com 24 anos de banco na sexta-feira passada faltou mil reais no meu caixa e aí tem que pagar, o banco não quer nem saber, você tem uma semana para pagar. A sorte é que eu tenho um bom relacionamento lá dentro, apesar que tem muita gente que já nem trabalha lá mais, mas ainda tem alguns da minha época. Daí eles fizeram uma rifa, graças a Deus já vendi tudo, já paguei. Eu sou responsável se faltar,... se passar é do banco, mas se faltar é meu” (entrevistado 10). Como uma das funções consideradas mais tensas dentro das agências, o caixa também lida diariamente com riscos financeiros, que evoluem com o avanço da modernidade, o risco de recebimento de notas falsas, operações como a “entrega de talões de cheques sem provisão de fundos, realização de pagamentos sem conferência de assinaturas” e as filas abarrotadas de clientes sob a pressão da Lei das Filas50 (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 117). Problemas agravados pela “diminuição do quadro de funcionários e o não atendimento ao público como ele merece. [...] nós temos aí no banco sete ou oito guichês, mas somente com três ou quatro atendimentos (presidente do SEEBU). “[...] então você está ali no caixa além de você ter que cumprir a lei lá de 15 minutos e o pessoal já olhando torto para você porque está demorando, tem que oferecer cartão, oferecer outras coisas [...]” (entrevistado 8). A situação também é complicada para outras funções bancárias, tanto que as funções gerenciais não são mais tão cobiçadas pelos os níveis hierárquicos mais inferiores. “A pressão sobre o corpo gerencial é ainda maior do que a pressão para os caixas”, por exemplo. (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 118). 50 Lei das filas ou Lei Municipal 13.948 de 20 de janeiro de 2005 obriga as agências bancárias a atenderem os clientes em um tempo de fila inferior a 15 minutos. (ANEXO D) 65 “[...] por que os cargos de liderança, como os gerentes, sofrem mais pressão mesmo tendo um salário bom?... tem muitas coisas que vêm de cima pra baixo que ele [gerente] sabe que sua equipe vai sofrer, e um bom gerente, aquele líder que acredita na equipe, que acredita que é possível, ele sabe que algumas coisas que vêm de cima, que são ordens ‘cumpra’, vão trazer para sua equipe um sofrimento. Então ele [gerente] sofre em dois momentos, primeiro na hora que ele [gerente] recebe [a ordem] e ele não pode falar nada, quando fala ‘cumpra’ tem que cumprir e o segundo sofrimento, como é que a minha equipe vai reagir? Qual a imagem que eles vão manter de mim? [...] muitas vezes cumprem uma ordem contrariando os seus ideais, contrariando aquilo que sempre pregou para sua equipe. As metas não vêm de baixo pra cima, elas vêm de cima pra baixo, e o primeiro a sofrer é o gerente” (psicólogo do trabalho51). Além de trabalhar em um ritmo ainda mais acelerado do que a atividade de um caixa, o gerente se submete a fazer coisas com as quais não concorda, seria o que Merlo e Barbarini (2002) denominaram de “sofrimento ético”, situação comumente vivida pelos gerentes que são obrigados a traírem seus próprios princípios e valores para cumprirem prazos e alcançar metas (MERLO; BARBARINI, 2002). “[...] existem algumas pressões que eu [gerente] sofro, assim, às vezes eu tenho que repassar e acaba acarretando nas minhas atitudes, mas isso eu procuro fazer da melhor forma possível pra não constranger a minha equipe, porque eu preciso dela [equipe] eu não posso ter uma equipe que me odeia. Eu preciso ser rígido, rigoroso e ao mesmo tempo, eu preciso ser amigo deles porque eu necessito deles. Então a cobrança existe, eu tenho que cobrar, eu tenho que ser severo, mas eu procuro ser amigo” (entrevistado 3). O cotidiano de várias outras funções é permeado pelo sentimento de insegurança, relacionado, “sobretudo com as incertezas quanto ao futuro” (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 119). São as tarefas tidas como técnicas, caixa executivo, secretárias, arquivo, controle de pessoal, telefonia, que estão em processo de extinção à medida que o avanço tecnológico adentra as agências (RIBEIRO, 1999). Esses funcionários sofrem com o sentimento de desvalorização, o desprezo da empresa em relação à sua atividade e lidam com a redução do 51 Entrevista concedida à autora em 12 de março de 2008. 66 espaço oferecido para exercerem suas tarefas na nova organização de trabalho (MERLO; BARBARINI, 2002). “[...] é essa insegurança, de hoje está trabalhando e amanhã você às vezes está sem esse trabalho [...] as coisas acontecem assim instantaneamente, eu chamo o banco hoje de ‘Kinder Ovo’, porque todo dia tem uma surpresa diferente. Fica essa incerteza: hoje eu estou lá, amanhã eu não sei” (entrevistado 3). Todas essas situações complexas e muitas outras desencadeiam no bancário, de uma forma geral, “fadiga, sofrimento mental, estresse, desmotivação, medo de perder o emprego, insatisfação, angústia e depressão, anulam a sua capacidade de raciocínio, de criatividade, de flexibilização na realização das tarefas, e intercomunicação com os outros setores” (SILVA, G. W.; MÁSCULO, 2002, p. 2). O assédio moral52, outro problema agravado com as mudanças no contexto do trabalho, pode ser relacionado às condições de trabalho responsáveis pelo estresse, pressão por produção, gerenciamento do trabalho através de metas abusivas, entre outros aspectos (MACIEL; CAVALCANTE; MATOS, 2007). As relações autoritárias são práticas cruéis e abusivas dentro das agências: “Uma das gerentes que eu trabalhei, ela chegava não só para mim como para as outras [bancárias] que estavam lá [na agência] e gritava, berrava, batia mesmo na mesa: ‘vocês têm medo do cliente? Têm que sair, têm que vender’ gritava assim, parecendo uma esclerosada, eu falei gente: ‘será que eu vou ter que aguentar isso?’Acho que eu não preciso disso não [...]”(ex-bancária da instituição X53). Quadro esse que vem prevalecendo desde a introdução de mudanças nas políticas bancárias que transformaram o trabalho e o contexto do trabalho bancário. A questão do assédio moral e até consequências mais sérias, como a depressão e o suicídio, denunciam que o trabalhador bancário da atualidade é colocado frente a frente às novas formas 52 O termo assédio moral: também conhecido como violência moral ou psicoterrorismo no trabalho, ou ainda mobbing ou bullying, como é conhecido na Europa, é usado para designar a “ocorrência de atos repetitivos e duradouros que implicam em um desequilíbrio das relações de poder entre a vítima e o algoz e inclui um elemento de subjetividade por parte da vítima em termos de como ela percebe esses atos e seus efeitos” (MACIEL; CAVALCANTE; MATOS, 2007, p. 118). 53 Entrevista concedida à autora em 13 de março de 2008. 67 organizacionais favorecendo a emergência de várias formas de adoecimento mental (LIMA, 2006). “[...] eles [superiores] chamam a atenção perto de todo mundo. Eu não sei... nesse ponto [contrariar as regras do banco em defesa do que acredita] podem me dizer que eu sou boba pensei mais neles [nos clientes] do que em mim. Porque lá eles [superiores] falam muito: ‘antes o seu trabalho do que o cliente’. Mas eu não consigo, amanhã o banco me manda embora, eu vou encontrar com o senhor fulano [cliente] na rua e eu não vou ter cara. Eu não consigo, eu não consigo! Daí eu comecei a sofrer dos meus problemas emocionais, do meu estado de nervos [...] então é daí que a saúde da gente vai embora”(entrevistado 9). “O número de doenças mentais em todas as áreas do trabalho cresceu e o banco, sem medo de errar, está entre as instituições que mais cresceram. Hoje o alcoolismo aumentou muito, o uso de drogas aumentou muito entre as organizações, porque todo esse processo de competição faz com que as pessoas buscam alguma coisa lá fora para tentar suprir isso. Em torno de 8 a 10% dos trabalhadores brasileiros eles usam algum tipo de droga ou álcool e o bancário, especificamente, está dentro desse quadro.” (psicólogo do trabalho54). A gestão baseada na imposição de metas abusivas e políticas de premiações negativas, em que o bancário que não conseguiu cumprir suas metas é humilhado ao ver seu desempenho pessoal e profissional ser comparado aos de seus colegas, também caracterizam casos frequentes de assédio moral (BARRETO, 2007). “Tudo que você produz eles querem mais. As metas são impossíveis, abusivas. Me exigiam abrir treze contas jurídicas, sendo que na cidade a maior empresa que tinha era um mercadinho. Eles me entregavam uma lista com nomes de todos os aposentados para vender serviços, eu me sentia mal por ser obrigado à fazer aquilo. [...] Tem premiação através de viagens, mas nem compensa conseguir não. Como que você pode se sentir à vontade viajando com o seu chefe, com os supervisores já te cobrando metas para o próximo ano?”(entrevistado 2). 54 Entrevista concedida à autora em 12 de março de 2008. 68 O estímulo à prática da venda casada faz parte da incorporação do “vale-tudo”, desde o assédio moral até a venda casada55, e da postura desrespeitosa adotada pelos bancos com os bancários e com os próprios clientes (SINDICATO DOS BANCÁRIOS DE BRASÍLIA, 2008). Tal prática funciona conforme demonstra os relatos dos entrevistados: “acaba saindo muita venda errada, muita venda casada. Eu te cedo o empréstimo, mas você vai fazer isso comigo” (entrevistado 6). “A nossa função era atender os clientes, principalmente os clientes que precisavam de um aumento de cheque especial, de um empréstimo, aí esses clientes que já estavam precisando era o cliente ideal para a gente oferecer alguma coisa, porque os bancos trabalham assim: ‘já que o senhor precisa desse empréstimo o senhor vai ter que fazer isso, o senhor vai ter que adquirir esse produto com o banco, se não o banco não vai liberar [o empréstimo]’. Eu não gostava desse trabalho, no sentido assim, eu achava injusto, foi uma das coisas que eu não me identifiquei com o banco. Por quê? Se uma pessoa está precisando de um empréstimo ou de um aumento do cheque especial com certeza essa pessoa está apertada, está com dificuldades financeiras e eu obrigo essa pessoa a fazer um seguro? [...] tinha gente simples, [cliente] pobre que não tinha condição, já estava precisando, vamos supor, de R$ 500,00, custando a pagar, ia ter uma dificuldade para pagar e eu simplesmente ofereço mais outro produto” (ex-bancária da instituição X56). O clima, gerado a partir da pressão constante sobre os trabalhadores pelo cumprimento de metas, se torna insuportável. Diariamente, os gestores emitem notas classificando o desempenho pessoal de cada bancário. “O ranking de avaliação das capacidades tornou-se parte da rotina” (SINDICATO DOS BANCÁRIOS DE BRASÍLIA57, 2008). “[...] o trabalho é assim, essa loucura, gente cobrando, nosso regional todo dia liga pra saber o que você fez, quanto de crédito você deu, quanto de seguro você vendeu. [...] vem uma cartinha [classificatória]: insatisfatória, pouco satisfatória, e regional liga: olha esse 55 Venda casada: prática ilegal de acordo com o Código de defesa do consumidor, funciona de maneira em que o consumidor ao adquirir um produto leva conjuntamente outro, seja da mesma espécie ou não. Geralmente os bancos somente realizam um empréstimo se o cliente contratar um seguro, ou outros serviços do banco. 56 Entrevista concedida à autora em 13 de março de 2008. 57 Disponível em: http://www.bancariosdf.com.br/bancariosdf/index.php?option=com_content&task=view&id=3592&Itemid. 69 mês você não fechou o que aconteceu? Ele [regional] te liga pra você pegar a sua produção e você passa achando que arrasou e não arrasou nada...” (entrevistado 6). Os bancários estão subordinados a uma série de obrigações e até mesmo atos ilegais que denunciam a forma de administração do pessoal pelo “medo, ameaças e injúrias”. Sob o comando de chefias que manipulam esses sentimentos, o desgaste e o sofrimento desses trabalhadores intensificam (BARRETO, 2007, p. 17). “Aos fatores agressivos já identificados, vieram se somar outros, acarretando novos agravos à saúde física e mental do bancário ou reforçando aqueles já existentes” (LIMA, 2006, p. 59). Nas palavras de Dejours (1988), segundo Jacques (2006), o fenômeno, na linguagem corriqueira utilizada no universo laboral, se exprime em palavras como “guerra, sobrevivência, combate, luta” (DEJOURS, 1988 apud JACQUES, 2006, p. 154). “Eu ia para o banco parecendo que estava indo para a guerra, sem saber se ia sair vivo no fim do dia. Chegava a hora de ir trabalhar eu sentia tremedeira, palpitação... Pensa numa coisa ruim, ruim mesmo!” (entrevistado 2). Com relação à faixa etária da população bancária doente, Sznelwar e Massetti (2002) identificaram em seu estudo que a maioria dos trabalhadores estudados e que estavam doentes tinham entre 20 e 30 anos de idade, e muitos trabalhavam há pouco tempo, havendo até casos que manifestaram sofrimento com apenas seis meses de trabalho dentro das agências. Jovens bancários que estavam fazendo cursos de aprimoramento profissional e outros ainda concluindo curso superior, com a expectativa de encontrar uma oportunidade na sua profissão, mas já encarando a realidade do mercado de trabalho que não correspondia. Muitos ficaram doentes mais rapidamente ao se deparar com essa dificuldade em abandonar o emprego bancário, considerado temporário, para seguir sua profissão (SZNELWAR; MASSETTI, 2002). Jovens, que pelas próprias características advindas da faixa etária se expõem e se arriscam mais sem pensar nas consequências no futuro, perfil explorado cada vez mais pelos bancos. No auge de suas capacidades produtivas, com um longo caminho ainda para percorrer até a aposentadoria por tempo de serviço, onerando para o Estado e gerando sofrimentos individuais e familiares (CARVALHO, 2007). Uma questão social, levantada pelos próprios autores, acima citados, sobre até que ponto o trabalho considerado temporário não deixa 70 marcas na vida desses jovens trabalhadores em potencial produtivo, mas já acometidos pelo adoecimento do trabalho (SZNELWAR; MASSETTI, 2002). As marcas dessa nova realidade no trabalho bancário têm sido extremamente profundas para toda a categoria. Os bancários sofrem diretamente com toda a instabilidade vivida pelo sistema financeiro (ANTUNES, 2006). Ao mesmo tempo em que as agências bancárias se reestruturam, a precarização das condições de trabalho se dissemina. As novas tendências de organização do trabalho defendem a flexibilização das relações de trabalho através da contratação temporária ou parcial, subcontratações, terceirizações e condições desumanas de trabalho, as quais estão intimamente associadas à crescente presença de doenças físicas e mentais relacionadas ao trabalho (MERLO; LAPIS, 2007). Por trás da imagem de modernidade ostentada pelos bancos se esconde uma realidade sombria que denuncia a degradação das condições de saúde e trabalho bancário (PENELLA, 2000). Mais do que qualquer outra profissão, o trabalho bancário é a expressão nítida da “condição moderna do desgaste humano no processo de trabalho” (NETZ; MENDES, 2006, p. 26). Em Uberaba-MG a situação dos trabalhadores dos bancos não parece ser diferente. 71 4 UBERABA: UNIVERSO EMPÍRICO DA PESQUISA Esta pesquisa foi realizada com trabalhadores bancários de uma instituição privada da cidade de Uberaba58 - MG, situada na região do Triângulo Mineiro. Atualmente a cidade possui, aproximadamente, 292.377 habitantes e 39 agências bancárias, como demonstrado a seguir. A instituição X estudada apresenta grande representatividade, estando dentre os maiores, se não for o maior, banco na cidade. “O sistema bancário em Uberaba teve início nas últimas décadas do século XIX, a partir da dinamização comercial do município, Uberaba tinha um papel de entroncamento comercial entre a dinâmica economia cafeeira do Oeste Paulista e o Brasil Central (entendido na época como Triângulo Mineiro, Goiás e Mato Grosso - incluindo aí o do Sul). Uberaba era a porta de acesso entre essas duas realidades que tiveram uma relação econômica importante no período. O excedente dessa comercialização ficava em Uberaba. Foi um período tão dinâmico que chega a surgir em Uberaba ainda no século XIX, seus primeiros milionários” (assessor de comunicação do SEEBU59). Outro fato que também favoreceu a maior visibilidade do município e atraiu os empresários e outros ligados ao setor, foi o desenvolvimento da pecuária desde 1898, principalmente, através do expressivo investimento nas atividades de importação do gado zebu procedente da Índia (ARQUIVO PÚBLICO DE UBERABA, 2006). De tal forma que, “a história do setor financeiro de Uberaba é a história do setor financeiro nacional. Ela nasce nos sistemas de créditos de bancos particulares e posteriormente, os bancos públicos vieram para Uberaba - o Banco do Brasil, Caixa Econômica, Banespa e Banestado” (presidente do SEEBU60). O primeiro estabelecimento de crédito que funcionou na cidade de Uberaba foi o Banco Mineiro, popularmente conhecido como o “Banco do Casusa”, que veio à falência por duas vezes sob a direção do José Augusto 58 O povoado foi criado, em 1809, pelo sargento-mor Antônio Eustáquio da Silva e Oliveira. Em 1811 foi elevada a condição de freguesia com o nome de Santo Antônio e São Sebastião do Uberaba. Foi elevada a condição de cidade apenas em 1856, com o nome de Uberaba. É conhecida como a capital mundial do gado Zebu, espécie que foi introduzida por criadores da cidade no final do século XIX após a importação das primeiras matrizes da Índia. A atração de indústrias tem sido tentada pelas últimas administrações através da criação de três distritos industriais e estabelecimento de um pólo moveleiro, indústrias do setor de alimentação, calçados e química. 59 Entrevista concedida à autora em 03 de outubro de 2007, pelo então Assessor de Comunicação, Anízio Bragança Júnior, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 60 Entrevista concedida à autora em 18 de março de 2008, pelo então Presidente, Sérgio Gomes, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 72 de Paiva Teixeira, o Casusa. O seu operoso companheiro, o barão de Saramenha61, também fundou outros bancos na cidade, entre os quais o Banco Provincial de Minas Gerais. Em 1905 a cidade já tinha energia elétrica e por volta de 1912 havia mais de 36.000 habitantes uberabenses (MENDONÇA, 1974). Em 1909, inaugura-se a agência local do Banco de Crédito Real de Minas Gerais. Nesse período o município sofria mudanças econômicas e o principal motivo foi a transferência do comércio praticado na cidade para o interior do Mato Grosso. Com isso, Uberaba perde suas fontes de lucro extraídas da comercialização que mantinha com as praças de Bebedouro e Barretos. Entretanto com a navegação do Rio Grande, foi possível resolver os problemas relacionados ao transporte de cereais, tornando, assim, a agricultura e a agropecuária as principais fontes de renda da cidade (PONTES, 1969) Em 1916 a cidade, que possuía três agências bancárias, recebia a 15ª agência de toda a rede nacional do BB e a segunda de todo o estado de Minas Gerais, antes mesmo de outras cidades maiores, como São Paulo, Campinas e Belo Horizonte. Sua primeira sede foi instalada em um “palacete” ao lado do sobrado que residia o Crédito Real de Minas (ARQUIVO PÚBLICO DE UBERABA, 2006). Figura 1: Sede dos Bancos do Brasil e Crédito Real de Minas - Uberaba (1916). Fonte: Arquivo Público de Uberaba, 2008. 61 O coronel Carlos Gabriel de Andrade, o barão de Saramenha, era natural da cidade de Ouro Preto, e na sua trajetória foi vereador, presidente da câmara municipal e diretor da Caixa Econômica e do Monte Socorro. 73 Segundo Bastos (1997) a primeira instituição financeira realmente criada em Uberaba (e não uma agência filial) foi o Banco do Triângulo Mineiro (1936-1971) que foi incorporado pelo Banco Nacional do Triângulo Mineiro (1971) de Magalhães Pinto, ex-governador de Minas Gerais, e posteriormente foi adquirido em 1972 pelo Banco Nacional S/A (BASTOS, 1997). É “a globalização interna engolindo a iniciativa e as economias regionais” (JORNAL DE UBERABA62, 2008). A segunda agência do BB veio no ano de 1937, sediada em um moderno prédio de dois andares, distribuído de tal forma que, no térreo havia um enorme salão de entrada; no subterrâneo o caixa forte, construído em concreto armado e no andar superior uma confortável residência para o gerente da agência (ARQUIVO PÚBLICO DE UBERABA, 2006). “Os bancos foram sendo instalados no centro da cidade e tinha a classe alta como principal alvo de negociação. Caixa de depósitos, empréstimos, financiamentos, entre outros, eram e ainda são os principais serviços” (assessor de comunicação do SEEBU63). Figura 2: Banco Hyothecário no centro da cidade de Uberaba - MG. Fonte: Arquivo Público de Uberaba, 2008. 62 Disponível em: http://www.jornaldeuberaba.com.br/?MENU=Colunas&SUBMENU=cultura&CODIGO=3206. 63 Entrevista concedida à autora em 03 de outubro de 2007, pelo então Assessor de Comunicação, Anízio Bragança Júnior, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 74 Mesmo o banco sendo considerado um luxo para poucos e a grande maioria ainda guardar suas economias debaixo do colchão, Uberaba entusiasmou com a implantação e o desenvolvimento das agências bancárias da época. Se o início do desenvolvimento do setor na cidade foi motivado pela criação do gado zebu, mais tardiamente o ramo das grandes construções ganha força ao encontrar no BB facilidades através do crédito para o seu desenvolvimento (ARQUIVO PÚBLICO DE UBERABA, 2006). A inauguração64 da terceira agência central do Banco do Brasil, fundada em 1950, presenteou a cidade não somente com um novo prédio, mas também com o moderno aparelho de telex, que incluiria a cidade num nível avançado de comunicação com as outras agências do estado. O quarto e atual prédio central do BB (inaugurado em 1969) ficou largamente conhecido como o “palácio de vidro” e representou o grande crescimento da instituição na cidade e melhorias nas suas instalações e, consequentemente, melhor atendimento aos clientes (ARQUIVO PÚBLICO DE UBERABA, 2006). “Hoje eu o [setor financeiro da cidade] caracterizo pelos bancos públicos - Banco do Brasil e a Caixa - onde o Banco do Brasil atende o segmento agropecuário, a Caixa atende as questões financeiras e as questões habitacionais e os outros bancos são todos mercados, aplicação de dinheiro e aplicabilidade desse dinheiro em retorno para o cliente” (presidente do SEEBU65). A cidade sedia 18 instituições financeiras e, aproximadamente, 39 agências bancárias. Tabela 1: Instituições e Agências Bancárias da cidade de Uberaba-MG. Instituições Bancárias ABN AMRO Real S/A Banco Bandeirantes S/A Banco BMG – Conexão Empréstimos Financeiros Banco Bonsucesso S/A Banco Bradesco S/A Banco do Brasil S/A Banco Cacique S/A N° de agências 3 1 1 1 4 7 1 64 O convite para a inauguração da nova sede do BB foi estampado nos jornais da época: “O Banco do Brasil S.A. tem o grande prazer de convidar sua distinta clientela, as exmas. autoridades estaduais, municipais e federais e as classes produtoras desta região a abrilhantar, com a sua presença, amanhã, dia 18 de fevereiro, às 16 horas, a solenidade de inauguração do novo edifício de sua agência nesta cidade, à Avenida Leopoldino de Oliveira. Antecipadamente agradece e, ao ensejo, avisa que a partir do próximo dia 22 do corrente mês, passará a agência a funcionar em suas novas instalações, onde terá a satisfação de continuar servindo ao público em geral e particularmente aos dignos clientes que a distinguem com sua preferência. Uberaba, 17 de fevereiro de 1950 (ARQUIVO PÚBLICO DE UBERABA, 2006). 65 Entrevista concedida à autora em 18 de março de 2008, pelo então Presidente, Sérgio Gomes, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 75 Banco do Estado de São Paulo S/A Banespa Banco HSBC Bamerindus S/A Banco Itaú S/A Banco Real S/A Banco Sofisa S/A Banco Sudameris do Brasil S/A Caixa Econômica Federal CREDILEITE Cooperativa Crédito Rural Produtores de Leite Vale Rio Grande Ltda. PROCOMP Comércio e Serviços Ltda. Tecnologia Bancária S/A Unibanco União de Bancos Brasileiros S/A 2 1 3 2 1 2 5 2 1 1 1 “Ao longo dos anos, os bancos passaram a atrair a classe média (primeiro alta e depois média) para seus serviços. Nas últimas décadas, os bancos passaram a querer a classe média como usuária de serviços e tarifas, mas querem que os mesmos sejam feitos à distância ou de forma indireta por instituições terceirizadas (caixas eletrônicos, correspondentes bancários, lotéricas, entre outros) por ter menos custo. Do serviço 100% manual, que empregava até mais de dois milhares de bancários em Uberaba, os bancos hoje possuem um serviço quase 100% informatizado com cerca de 550 bancários trabalhando em Uberaba. O número de trabalhadores é insuficiente e causa uma grande sobrecarga de trabalho e inúmeros problemas sociais, trabalhistas e de saúde aos trabalhadores. Além dos bancários foi se arregimentando outros trabalhadores terceirizados para funções mascaradas como anexas às instituições bancárias. Estima-se que para cada bancário, há cerca de um terceirizado dentro das agências. Há ainda bancários não reconhecidos trabalhando em financeiras e cooperativas de crédito, cerca de mais 150 trabalhadores em Uberaba. Há ainda 200 aposentados com uma relação mais próxima do Sindicato dos Bancários” (assessor de comunicação do SEEBU66). “Existe hoje dentro dos bancos privados uma aversão a prestação de serviços e essa aversão a prestação de serviços terceiriza esses serviços, ou seja, as lotéricas, os atendimentos, são pessoas que são bancárias, que atendem o público, que mexem com numerário do dinheiro e ganham muito menos que o bancário. Então hoje os bancos de Uberaba trabalham nessa linha claramente, os bancos públicos com esse filão, embora dentro dos próprios bancos públicos tenha as questões que os bancos privados trabalham, mas com uma perspectiva principalmente dentro da política de trabalhar com o público, com 66 Entrevista concedida à autora em 03 de outubro de 2007, pelo então Assessor de Comunicação, Anízio Bragança Júnior, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 76 essa argumentação e os bancos privados, mercadologicamente, corta a aplicação. E uma coisa importante, a rentabilidade desses bancos, dizem que o Brasil cresceu, o investimento cresceu, mas a rentabilidade desses bancos privados vem muito da concessão de empréstimos às pessoas físicas, é um spread alto e ao mesmo tempo ele tem uma pequena debilidade no pagamento e a liquidez também é muito alta. Então o grande filão dos bancos hoje é o empréstimo às pessoas físicas” (presidente do SEEBU67). “O perfil da classe bancária de Uberaba é pontuada como classe média, são pessoas que tem uma perspectiva de crescimento, mas essa perspectiva de crescimento deixou de ser uma mão de obra rotatória e a perspectiva de crescimento dela está dentro das agências. Com relação a luta que nós desenvolvemos aqui no sindicato é extremamente prejudicial, porque faz com que o bancário assuma uma característica individualista, a própria estrutura administrativa dos bancos fazem que eles assumam essa postura e nas horas que nós temos que fazer um enfrentamento com os banqueiros, muito deles tomam a postura do banqueiro, do individualismo, e não na concepção do trabalhador. Ele tem a concepção do trabalhador mas o banco embute nele a questão do individualismo” (presidente do SEEBU). Segundo dados disponibilizados pelo Ministério do Trabalho (2008), o perfil do município de Uberaba (janeiro de 2003 a fevereiro de 2008) segue as tendências mundiais estabelecidas pela reestruturação produtiva vivida pelo setor. Observa-se que os postos de trabalho que mais sofreram cortes e fecharam com saldo negativo foram os caixas e os supervisores administrativos, em contra partida os escriturários, jovens que ingressam na carreira bancária, foram os mais admitidos nesse período (MINISTÉRIO DO TRABALHO, 2008). Quadro 2: Perfil do Município de Uberaba-MG, Microregião: Uberaba. Setor: Serviços. Subsetor: Instituições de Crédito, Seguros e Capitalização. Período: Janeiro de 2003 a Fevereiro de 2008. Classificação Brasileira de Ocupações 413210 Caixa de banco 413225 Escriturário de banco 411010 Assistente administrativo 253215 Gerente de contas pessoa física e jurídica 142305 Gerente comercial Sal. Médio Admitidos Demitidos Saldo (R$) 947,68 1.017,06 615,63 2.300,79 1.661,47 31 162 43 14 15 44 42 41 37 20 -13 120 2 -23 -5 67 Entrevista concedida à autora em 8 de maio de 2008, pelo então Presidente, Sérgio Gomes, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 77 141710 Gerente de agência 410105 Supervisor administrativo 412205 Contínuo 142115 Gerente financeiro 353235 Chefe de serviços bancários 142105 Gerente administrativo 142320 Gerente de vendas 413205 Atendente de agência 520110 Supervisor de vendas comercial 253205 Gerente de captação (fundos e investimentos institucionais) 421125 Operador de caixa 521115 Promotor de vendas 253210 Gerente de clientes especiais (private) 354705 Representante comercial autônomo 141720 Gerente de crédito e cobrança 351705 Analista de seguros (técnico) 351710 Analista de sinistros 351740 Técnico de seguros 413220 Conferente de serviços bancários 123105 Diretor administrativo 123115 Diretor financeiro 252505 Administrador de fundos e carteiras de investimento 252525 Analista de crédito (instituições financeiras) 253220 Gerente de grandes contas (corporate) 253305 Corretor de valores, ativos financeiros, mercadorias e derivativos 353230 Tesoureiro de banco 411040 Auxiliar de seguros 422125 Recepcionista de banco 141705 Gerente de produtos bancários 351715 Assistente comercial de seguros 2.611,40 1.414,00 371,95 3.250,00 1.733,40 1.956,00 775,21 548,08 5 4 19 4 5 0 4 29 12 16 16 10 9 9 7 7 7 7 -11 -12 9 -5 -4 -7 -3 22 5 830,57 7 5 2 443,33 358 1.449,75 3.001,00 613 600 - 9 6 0 4 1 2 0 0 0 1 0 4 4 3 3 2 2 2 2 2 1 1 5 2 -3 1 -1 0 -2 -2 -2 0 -1 - 0 1 -1 700 3.256,67 1 3 1 1 0 2 800 1 1 0 442 4.000,00 1.080,50 0 0 2 1 2 1 1 1 0 0 -1 -1 1 1 2 Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego, 2008. “Hoje na cidade a gente percebe claramente uma mudança de perfil, o bancário deixou de ser um entendedor de tudo, ele é um vendedor, então ele precisa de mais qualificação. Não existe muito mais a questão da rotatividade dentro dos bancos, porque o trabalhador é mais bem preparado em função do objetivo do banco, o banco não quer dele somente a questão da prestação de serviço, o banco quer dele a venda” (presidente do SEEBU68). 68 Entrevista concedida à autora em 8 de maio de 2008, pelo então Presidente, Sérgio Gomes, do Sindicato dos Bancários de Uberaba (SEEBU). 78 5 O PERCURSO METODOLÓGICO Uma pesquisa é sempre, de alguma forma, um relato de longa viagem empreendida por um sujeito cujo olhar vasculha lugares muitas vezes já visitados. Nada de absolutamente original, portanto, mas um modo diferente de olhar e pensar determinada realidade a partir de uma experiência e de uma apropriação do conhecimento que são, aí sim, bastante pessoais (DUARTE, 2002, p. 140). Esta pesquisa de caráter qualitativo objetivou investigar as condições de trabalho dos bancários de uma instituição privada da cidade de Uberaba - Minas Gerais (MG)69, para identificar em que medida as formas de organização do trabalho interferem na saúde daqueles trabalhadores. Para tanto, foram entrevistados onze bancários de ambos os sexos, sendo cinco mulheres e seis homens pertencentes a diferentes níveis hierárquicos e de diversas agências de uma determinada instituição bancária, presente na cidade de Uberaba-MG. A escolha daquela instituição se deu pelo fato da mesma ocupar posição de liderança quando comparada às outras instituições bancárias privadas do município. O nome da instituição estudada não será mencionado em nenhum momento do estudo em concordância aos critérios notificados pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP)70 do Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto em que o projeto foi submetido. O instrumento utilizado para a coleta de dados foi a entrevista semi-estruturada71, que possibilita o entrevistado discorrer sobre o tema sem condições prefixadas pelo pesquisador. Segundo Cecília Minayo, et. al. (1996), “a entrevista é o procedimento mais usual no trabalho de campo. Através dela, o pesquisador procura obter informes contidos na fala dos atores sociais” (MINAYO, et. al., 1996, p. 57). A pesquisa de campo foi precedida de um levantamento bibliográfico que rendeu subsídios fundamentais para compreender as condições e relações de trabalho e suas consequências na saúde dos trabalhadores bancários. Esse embasamento teórico possibilitou a pesquisadora adquirir domínio sobre a pesquisa e competência para a realização das entrevistas e principalmente, para formular as questões pertinentes ao roteiro de entrevista. O 69 A instituição bancária privada da cidade de Uberaba-MG é mencionada neste estudo como instituição X. Ver Anexo E. 71 “Entrevista semi-estruturada é aquela que parte de certos questionamentos básicos, apoiados em teorias e hipóteses, que interessam à pesquisa e que, em seguida, oferecem amplo campo de interrogativas, junto de novas hipóteses que vão surgindo à medida que recebem as respostas do informante. Desta maneira o informante, seguindo espontaneamente a linha de seu pensamento e de suas experiências dentro do foco principal colocado pelo investigador, começa a participar na elaboração do conteúdo da pesquisa” (TRIVIÑOS, 1987, p.1[6]). 70 79 roteiro de entrevista72, anteriormente elaborado com questões norteadoras, representa um instrumento sensivelmente flexível para orientar a condução da entrevista e foi periodicamente revisto para avaliar se não só as perguntas, mas inclusive se as respostas obtidas atendiam aos objetivos definidos na investigação. De acordo com Schraiber (1995), o modo de intervir produtivamente não tem regras preconcebidas, as entrevistas são únicas e a forma de lidar do pesquisador não vai se repetir de uma a outra entrevista. Sem antecipar os princípios que definem o norte da intervenção, a atualização do roteiro é produzida continuamente, “fundada na avaliação subjetiva das potencialidades do diálogo” (SCHRAIBER, 1995, p. 68). Conforme as perguntas vão sendo feitas repetidamente para diferentes entrevistados, em ocasiões variadas, e tem-se a possibilidade de escutar a própria voz nas gravações realizadas possibilita avaliar criticamente o próprio desempenho do pesquisador e gradativamente fazer os ajustes necessários (DUARTE, 2002). O início da pesquisa de campo foi datado em fevereiro de 2008 logo após o resultado da aprovação do CEP supracitado, em janeiro desse mesmo ano. A primeira entrevista, de caráter exploratório, teve como objetivo validar seu compromisso em alcançar as metas que levaram a formulação daquelas perguntas, ou seja, obter respostas condizentes com os objetivos traçados para cada determinada questão. Felizmente, o roteiro de entrevista respondeu a esses pré-requisitos logo na primeira tentativa, sendo essa já incluída no acervo de depoimentos a ser utilizado. Entretanto, pode-se dizer que aprender a realizar entrevistas é uma competência que se adquiri a partir da experiência. Por mais que se tenha definido, supostamente, aquilo que se deseja, certas habilidades só se estruturam a partir da reflexão da literatura e pela prática na exploração de campo (DUARTE, 2002). O número de trabalhadores a princípio não foi pré-determinado com exatidão, a quantidade numérica dependeu substancialmente da evolução da pesquisa, inclusive da qualidade dos dados coletados através das entrevistas, da capacidade de abrangência da compreensão, profundidade e da saturação ou reincidência das informações. Seguindo novamente os preceitos de Minayo (1993), o estudo qualitativo não está baseado na questão numérica para garantir sua representatividade, sendo o número ideal de sujeitos entrevistados aquele capaz de refletir a totalidade nas suas dimensões. 72 Ver Apêndice A. 80 [...] uma amostragem qualitativa: a) privilegia os sujeitos sociais que detêm os atributos que o investigador pretende conhecer; b) considera-os em número suficiente para permitir uma reincidência das informações, porém não despreza informações ímpares cujo potencial explicativo tem que ser levado em conta; c) entende que na homogeneidade fundamental relativa aos atributos, o conjunto de informantes possa ser diversificado para possibilitar a apreensão de semelhanças e diferenças; d) esforça-se para que a escolha do locus e do grupo de observação e informantes contenham o conjunto das experiências e expressões que se pretende objetivar com a pesquisa (Minayo, 1993:102). Os critérios determinantes para a inclusão dos sujeitos à pesquisa especificaram que os bancários deveriam possuir vínculo empregatício com a instituição X no momento da realização da pesquisa bem como metade dos entrevistados deveria apresentar mais de dez anos de carreira dentro dessa mesma instituição e a outra metade apresentar menos de dez anos de trabalho. Além de emitirem concordância em participar do estudo ao assinar o termo de consentimento livre e esclarecido73. É importante destacar ainda que foi preservado o anonimato de todos os bancários entrevistados, sendo a identificação dos mesmos feita através de siglas fictícias. O primeiro entrevistado foi escolhido de forma aleatória e o contato feito de forma direta pela pesquisadora através de uma ligação telefônica. Além do local para a realização das entrevistas, a forma de abordagem do entrevistado foi cuidadosamente estabelecida antes da realização do trabalho de campo, considerando que o caminho percorrido até o encontro com o entrevistado influencia diretamente na qualidade das informações. A partir do primeiro depoente adotou-se, na maioria das vezes, a técnica de indicações sucessivas de informantes, conhecida como “snow ball”, para o recrutamento dos demais bancários entrevistados. De acordo com Garcia (2007), a técnica conhecida como bola de neve (snow ball) está entre as técnicas mais utilizadas na metodologia qualitativa e pode ser caracterizada pela indicação sucessiva de entrevistas (GARCIA, 2007). Quando não se tornava possível a adoção de tal técnica, o sindicato auxiliava na busca por mais entrevistados. O encontro para a realização das entrevistas se deu no ambiente externo a agência bancária, no domicílio do próprio bancário. Segundo Duarte (2002), a entrevista transcorre mais calmamente quando realizada na residência do entrevistado (DUARTE, 2002). O ambiente doméstico e privado instiga a liberdade e espontaneidade para expressão das idéias e reduz o grau de inquietação relativa ao tempo. Essa opção também reserva certo cuidado em prevenir qualquer tipo de constrangimento do trabalhador bancário ao descrever sua vivência 73 Ver Apêndice B. 81 profissional frente a seus colegas de trabalho e inclusive próximo aos seus superiores, acreditando que fora dos domínios da instituição o entrevistado se sentiria mais a vontade ao relatar o seu cotidiano dentro de uma agência bancária. A maneira escolhida para o registro das entrevistas foi através da gravação74, sendo todas as entrevistas transcritas uma a uma imediatamente após a sua realização pelo próprio pesquisador, com a intenção de preservar toda a riqueza do material colhido, sem correr o risco de ver escapar algum detalhe das mãos, possibilitando o acompanhamento da evolução das entrevistas. A transcrição75, apesar de ser considerada um trabalho que despende muito tempo, é fundamental à medida que coloca o pesquisador novamente em contato com o entrevistado, permitindo refletir sobre os dados obtidos e de uma certa maneira, realizar uma seleção das informações relevantes. O uso do gravador, segundo Queiroz (1983 apud SCHRAIBER, 1995, p. 71), “representa uma ampliação do poder de registro” pela maior agilidade e praticidade da operação e pelo registro de voz. Dentre as funções que o gravador oferece, ele permite captar e armazenar por maior tempo sinais que representam elementos significativos para uma futura leitura e interpretação de cada depoimento (SCHRAIBER, 1995). A reconstituição do processo de trabalho do bancário e os principais problemas de saúde dele decorrentes foram construídos pelos próprios depoimentos dos bancários da instituição X. Apoiado por um embasamento teórico, decorrente do levantamento bibliográfico, para a obtenção de informações, a partir das quais, foi possível produzir a análise, fundar a interpretação e atingir a compreensão mais ampla do objeto delineado. À medida que o tema foi sendo aprofundado, através da busca por informações bibliográficas, foi possível conhecer melhor a sua natureza, o que possibilitou delinear os traços do estudo e definir novos direcionamentos a investigação. Dessa forma, além das entrevistas gravadas com os trabalhadores bancários optou-se, dentro das estratégias de investigação qualitativa, por outras fontes de dados que foram sendo integradas. Conversas informais e coleta de informações adicionais, com sujeitos ligados ao contexto investigado, foram também registradas através do processo de gravação. De acordo com Duarte (2002), “trata se de um material complementar à pesquisa e, embora não se constitua o foco central da análise, participa significativamente dessa” (DUARTE, 2002, p. 146). 74 As entrevistas realizadas com os trabalhadores bancários totalizaram um pouco mais de 3 horas de gravação. Transcrição: primeira etapa a desenvolver após a coleta de dados, representa a passagem oral para a linguagem escrita, de modo fidedigno ao conteúdo gravado. Todo o material transcrito foi impresso e encadernado para facilitar a sua utilização durante todo o desenvolvimento do estudo, uma vez que, é sempre necessário o retorno ao material coletado para esclarecer dúvidas, recolher documentos ou coletar novas informações. 75 82 Essa incorporação gradativa de novos sujeitos iniciou através da entrevista com o psicólogo da área do trabalho76 que resultou em uma fonte de informações relevantes acerca das doenças mentais e trabalho bancário. Lembrando que esse profissional acompanhou o decorrer do processo de pesquisa esclarecendo, sempre que possível, as questões no campo do desgaste mental dentro das instituições. Um contato também agregado ao estudo foi o do presidente do sindicato da categoria77 que, dentre outros aspectos, traçou o esboço do perfil dos bancários, caracterizou o setor financeiro da cidade, apontou os problemas enfrentados pela classe e as principais ações do sindicato frente às problemáticas. O sindicato dispunha de melhores recursos para fornecer informações mais precisas e atualizadas ao estudo. E, através de uma indicação do próprio sindicato contou-se com o acervo da história da cidade disponibilizado pelo Arquivo Público de Uberaba, onde boa parte da evolução do setor financeiro do local da pesquisa pode ser contada. Na busca por outras fontes de informação foi estabelecido contato com o bancário mais idoso78 da cidade de Uberaba-MG, que de uma maneira diferente, mas ao mesmo tempo especialmente importante, a coleta do seu depoimento suscitou toda a sua trajetória como bancário, possibilitando uma descrição rica em detalhes da agência bancária e seus serviços na sua época, enquanto parte dessa categoria. Um verdadeiro resgate dos acontecimentos passados fundamental para o entendimento de todo o contexto de modificações sofridas no interior do banco. Esse tipo de entrevista produz "... uma interpretação que é, em geral, uma ordenação original de coisas velhas, de pedaços de imagens, experiências, opiniões, etc., que a memória guardou” (CALDEIRA, 1984 apud SCHRAIBER, 1995, p. 66). Outro “informante” para o enriquecimento da investigação foi uma ex-bancária79 da instituição em estudo. A sua colaboração, de forma imparcial uma vez que não possui mais nenhum vínculo empregatício com a instituição, trouxe uma abordagem diferenciada com relação ao objeto de estudo. De forma clara e objetiva a entrevistada pôde relatar sua experiência profissional desde o processo admissional, sua evolução dentro da agência bancária findada com o seu pedido de demissão. 76 Doutor Nilo César Ayer, psicólogo responsável pelo setor de Recursos Humanos da Prefeitura de UberabaMG e docente titular do curso de Psicologia da Universidade de Uberaba. Entrevista concedida à autora em 12 de março de 2008. 77 Sr. Sérgio Gomes de Oliveira, presidente do Sindicato dos Empregados em Estabelecimentos Bancários de Uberaba e região (SEEBU). Entrevistas concedidas à autora em 18 de março e 08 de maio de 2008. 78 O bancário mais idoso da cidade de Uberaba-MG, Sr. Pedro Giani, com 92 anos de idade faz parte, hoje, da diretoria do Sindicato dos Bancários de Uberaba. Entrevista concedida à autora em 18 de março de 2008. 79 Ex-bancária da instituição privada em estudo da cidade de Uberaba-MG. Entrevista concedida à autora em 13 de março de 2008. 83 As adversidades experimentadas foram gradativamente surgindo ao longo da prática do trabalho de campo. Para Duarte (2002), os momentos compreendidos pelo contato entre pesquisador e sujeitos da pesquisa também integram o material de análise. O registro da maneira como são estabelecidos esses contatos, desde a recepção, o grau de disponibilidade, o ambiente, a postura e até os gestos do entrevistado, tudo constitui sinais, que muitas vezes não são exatamente os dados que estamos buscando, mas são elementos consideráveis na análise posterior do conteúdo do material (DUARTE, 2002). Logo no princípio da coleta de dados esbarrei na dificuldade em estabelecer contato com os bancários bem como agendar as entrevistas. A dificuldade ia de encontro ao tempo limitado desses trabalhadores agravado pelo fato das entrevistas serem necessariamente realizadas fora do seu ambiente de trabalho. Manter o diálogo entre informante e analista, onde é possível alcançar um ponto de intersecção para ambos foi a melhor estratégia para acertar essa saliência. A utilização do gravador, também descrita por Schraiber (1995), introduz pela simples presença do próprio aparelho, um "terceiro" elemento. Como se o entrevistado tivesse receio, ao tomar consciência da possibilidade de se tornar público através da reprodução da sua narrativa, representada pela incontestável prova da sua própria voz. O uso do aparelho provocou, em algumas ocasiões, a inibição na declaração do relato e até trouxe uma preocupação do entrevistado com o seu desempenho particular. Mas a presença desse "outro participante" na entrevista é apenas um pequeno problema, quando comparado às vantagens do uso da gravação como forma de registro, que pôde ser solucionado através do fortalecimento de uma relação baseada em confiança e segurança entre entrevistadoentrevistador (SCHRAIBER, 1995). A última situação suscitada, ao longo da coleta das entrevistas, foi observada juntamente aos bancários mais jovens e com menor tempo de trabalho. Eles apresentaram menor grau de disponibilidade para participar do estudo e maior resistência ao proferir seu depoimento. De forma que os relatos dos bancários mais jovens foram mais superficiais e escassos. Fato esse justificado por uma característica própria advinda de cidades do interior do país, como é este caso. A cidade de Uberaba não oferece grandes oportunidades de trabalho, apresenta um mercado de trabalho muito competitivo e por isso a dificuldade desses jovens bancários, que em sua maioria são recém formados ou até mesmo universitários, em expor suas condições de trabalho. Para esses jovens trabalhadores o trabalho bancário, apesar 84 das suas adversidades, ainda é considerado um “bom emprego”, dentro das circunstâncias vividas na cidade. Os pequenos detalhes observados nesses momentos informais de aproximação e relação são fundamentais para a construção da investigação. Segundo a visão de Schraiber (1995), situações como essas determinam o embasamento da relação entrevistadoentrevistador, construído por vínculos que expressam sentimentos de simpatia e confiança (SCHRAIBER, 1995). A transformação do narrador em objeto de pesquisa morto e paralisado retira qualquer possibilidade de serem criadas relações efetivamente capazes de dar conta de um trabalho de investigação dessa espécie. Além disso, essa postura não significa, para qualquer dos dois sujeitos, esforço negativo: ao contrário, expressa a cumplicidade do mútuo empenho para se produzir o relato e para se conservar, no tempo, o depoimento e a história (SCHRAIBER, 1995, p. 71). 5.1 BANCÁRIOS: OS ATORES SOCIAIS Entrevistado 1 C., sexo masculino, 45 anos de idade, separado, sem filhos e com segundo grau completo. Bancário há dez anos na instituição X, ocupando o cargo comissionado de corretor de seguros, com o salário aproximado de R$ 2.000,00 ao mês e uma jornada de trabalho que se estende das oito e meia da manhã até as cinco e meia da tarde. Antes de se tornar bancário, o entrevistado era comerciante, proprietário de uma lanchonete na cidade e sua carreira no banco iniciou através de uma indicação mediada pelo irmão bancário. Já foi transferido tanto para outras agências dentro da cidade quanto para agências de outras cidades. Na sua função o entrevistado é responsável por entrar em contato com os clientes, através de uma lista disponibilizada pelo seu gerente, agendando as visitas para oferecer serviços e conquistar novos clientes. No fechamento do dia ele relata detalhadamente aos seus superiores toda a sua jornada de trabalho, se justificando quando não cumpriu alguma meta e contabilizando a produtividade alcançada. Além disso, ele participa de duas reuniões semanais em sua própria agência e uma por mês na sucursal que fica na cidade vizinha. O entrevistado sempre leva trabalho para casa, pois considera todos do seu círculo social como possíveis clientes a serem levados para dentro de seu banco. Ele próprio se considera um vendedor 24 horas por dia. 85 Entrevistado 2 A.C., sexo masculino, 44 anos de idade, casado, sem filhos e formado em Administração. Antes de se tornar bancário era vendedor de bicicletas e, por acreditar no futuro certo dentro do banco, iniciou sua carreira em 1986 como escriturário da instituição X, cargo que ocupou por seis anos, e foi sendo promovido, primeiramente a caixa aonde permaneceu por quatro anos; posteriormente, a chefe de serviço também por quatro anos, chefe de expediente por dois anos e subgerente, por quatro anos. Há dois anos ocupa o cargo de gerente geral, recebendo o equivalente a R$ 5.000,00 mensais, com uma jornada de trabalho, que ele próprio não saberia definir, dez, onze horas por dia, e o horário de almoço de quinze minutos já deixou de ser praticado há muito tempo. Em 1998, foi transferido de Uberaba para Carneirinho - MG, onde permaneceu três anos e oito meses como chefe de serviço, depois foi novamente transferido para a Ituiutaba - MG permanecendo no mesmo cargo; foi para Araguari - MG com a promoção de subgerente e por fim, como gerente geral foi transferido para a cidade de Guarda-Mor - MG. A instituição X elevou o entrevistado a tal cargo com a missão de recuperar, financeiramente, essa agência que estava prestes a falir. Sob a pressão exercida no sentido de apresentar resultados, o entrevistado, recém chegado na cidade e na própria agência, foi obrigado a tomar algumas medidas drásticas, como execução de dívidas e cortes de financiamentos. Por se tratar de uma cidadezinha do interior, o “forasteiro”, além de suportar constantemente a cobrança da instituição para reverter uma situação fora do controle, passou a sofrer ameaças de morte advindas dos próprios clientes da agência. Com um perfil de funcionário, que todo banco deseja, homem correto, responsável e exigente nas suas ações, exposto a essas condições passou a se sentir mal. Há oito meses ele se encontra afastado pelo INSS, sob o tratamento medicamentoso, baseado em tranquilizantes, ansiolíticos e antidepressivos, orientado pelo psiquiatra, neurologista e psicólogo. Os diagnósticos afirmam que se trata de um adoecimento mental, mas ainda não há um consenso, alguns profissionais acreditam que seja um quadro de depressão grave, outros, estresse ou Síndrome do Pânico, e os mais recentes concluíram que se trata de mais um caso de Síndrome de Burnout80. Após vinte e dois anos de uma carreira com promessas de sucesso, o entrevistado se encontra completamente desnorteado carregando o peso do arrependimento e uma certeza: se ele retornar ao banco, sua demissão é garantida. 80 Doença psicológica caracterizada pela manifestação inconsciente do esgotamento emocional, através de um tipo de estresse ocupacional, durante o qual a pessoa consome-se física e emocionalmente. Esse esgotamento é decorrente de grandes esforços realizados no trabalho que fazem com que o profissional fique mais agressivo, irritado, desinteressado, desmotivado, frustrado, depressivo, angustiado e que se avalia negativamente. 86 Entrevistado 3 S., sexo masculino, 41 anos de idade, casado, dois filhos e possui curso superior em Administração. Antes de se tornar bancário o entrevistado trabalhava no ramo de despachantes. Em 1989 prestou um concurso e após dois anos de espera, foi convocado para trabalhar em um banco estatal que, há dez anos, foi incorporado pela instituição X. Após a incorporação o entrevistado foi rebaixado de analista de cadastro para escriturário da nova instituição, sendo transferido de cidade três vezes até chegar à cidade de Uberaba. Iniciou sua carreira bancária como escriturário, foi promovido a caixa, posteriormente, a chefe de expediente e há dois anos ocupa o cargo de gerente administrativo recebendo um salário de R$ 2.500,00. Sua jornada de trabalho é teoricamente de oito horas diárias, com uma hora variável de almoço e ainda permanece à disposição da agência nos finais de semana, em uma espécie de escala ou plantão, em caso de alguma ocorrência. As tarefas desempenhadas por ele vão desde a supervisão dos caixas e numerário, tesouraria, manutenção dos terminais de auto-atendimento, lançamentos contábeis da agência, dispositivos de segurança, contratação de funcionários temporários, supervisão do contrato e serviço das empresas terceirizadas (segurança e limpeza), bem como toda a parte estrutural do funcionamento (pagamento de contas de água e luz, compra de mantimentos, produtos de limpeza) e do aspecto visual da agência. Entrevistado 4 G., sexo masculino, 20 anos de idade, solteiro e não possui filhos. Graduando do curso de Direito, há um ano entrou na instituição X, sendo considerado como seu primeiro emprego, uma vez que, as suas outras experiências profissionais foram apenas estágios não remunerados. Através da indicação dos parentes, que também são bancários, ele prestou uma prova e após um ano foi chamado para ocupar o cargo de escriturário, trabalhando das dez da manhã até as quatro e quinze da tarde, com o horário de almoço de quinze minutos. Sua função dentro da agência é “fazer de tudo um pouco”, ele permanece no balcão de atendimento, auxilia os clientes nos caixas eletrônicos, realiza depósitos, abertura de contas e empréstimos, atua no auto-atendimento, organiza os arquivos e disponibiliza os panfletos do banco. Geralmente, o tempo de permanência nesse primeiro cargo dentro do banco é de um ano, sendo assim a sua promoção está próxima de ocorrer. O trabalho no banco, apesar de sobrecarregar e até atrapalhar o seu desempenho como estudante, representa para o 87 entrevistado sua independência financeira. Ele pretende seguir a carreira de advocacia, mas acredita que permanecerá no banco até finalizar seu curso universitário. Entrevistado 5 M., 40 anos de idade, sexo feminino, solteira, uma filha e possui o terceiro grau completo. Antes de ingressar no banco, teve dois anos apenas de experiência profissional em outra empresa que não se enquadra nesse setor. Entrou no banco, por intermédio de uma prova, há vintes anos, como escriturária; posteriormente, foi promovida a caixa, passando de caixa A, para B e permanece até hoje nesse mesmo cargo. No ano passado, ela tentou ser promovida, mas não suportou se colocar a disposição para ser mandada pra qualquer lugar e passar seus dias viajando, fora da cidade e longe da filha. Ao colocar na balança, percebeu que não compensava e optou por continuar na cidade e se manter no mesmo cargo. Sua carga horária é de seis horas diárias, com quinze minutos de intervalo, mas a entrevistada confessa que nunca permanece apenas esse tempo dentro da agência. Sua remuneração atual é de R$ 1.500,00. Após fechar o caixa, ela precisa conferir e “bater” os valores, e depois o trabalho continua na parte interna, para fechamento de reservas ou de cheques. Durante todos esses anos ela presenciou várias demissões e se recorda que quando começou tinha mais de trinta e cinco bancários na sua agência e hoje são apenas quinze funcionários. A entrevistada adoeceu e desenvolveu LER/DORT, sendo diagnosticada tendinite no punho, cotovelo e ombro. Relata que por medo e falta de conhecimento e informação não manifestou ao banco e nem recorreu a qualquer tipo de ajuda. Até que um dia ela não suportou mais essa condição e ficou afastada do seu cargo por seis meses e meio para a realização de tratamento. Ela conta como se sentiu deprimida nesse período de afastamento e o sofrimento diante do preconceito das pessoas da família e, principalmente, dos colegas de trabalho, que por se tratar de uma doença silenciosa, não acreditavam no seu adoecimento. Após esse período de afastamento, ela retornou ao trabalho e três meses depois ela teve uma reincidência e precisou se afastar novamente por mais três meses e meio. Após o novo tratamento a mesma relata que não teve mais nenhuma crise aguda, mas que ainda sente dores ao trabalhar. Na primeira ocorrência o banco não se prontificou a emitir a CAT (Comunicação de Acidente de Trabalho), e ela foi obrigada a recorrer ao sindicato da cidade de Uberaba, que tomou todas as providências cabíveis para garantir e resguardar todos os direitos da bancária. 88 Entrevistado 6 R., sexo feminino, 34 anos, casada, com dois filhos e possui curso superior completo em Matemática e Pedagogia. Após concluir o terceiro grau, começou a trabalhar no banco, com a intenção de financiar sua faculdade, mas durante esse percurso ela se casou, teve filhos e acabou por seguir a carreira no banco. Ela trabalhava na instituição X de outra cidade e por motivos pessoais pediu sua transferência para a cidade de Uberaba. Já faz dezesseis anos que ela é uma bancária da instituição e ocupa, atualmente, a gerência de pessoa física, recebendo um salário de R$ 2.800,00. Sua jornada diária é de oito horas, com um intervalo de uma hora para o almoço e, teoricamente, quinze minutos de pausa para o lanche. Como gerente de pessoa física ela é responsável por um determinado número de clientes, cuja renda é entre dois a quatro mil reais, aos quais ela dedica atenção especial objetivando rentabilizar a conta dos mesmos através de empréstimos, financiamentos e da venda de produtos e serviços. A sua principal meta é pagar vinte vezes o seu salário (bruto mais todos os seus benefícios) ao banco administrando as contas desse seleto grupo de clientes. Seu desempenho profissional é cobrado diariamente pela regional e avaliado através de cartas que ela recebe em escala classificatória: insatisfatório, pouco satisfatório e satisfatório. A entrevistada relata a falta de valorização do banco com os seus funcionários e demonstra claramente a sua insatisfação com o seu emprego. Para ela o trabalho representa apenas sua comodidade financeira e diante a sua vontade de sair do banco, ela já fez uma reserva financeira para investir em um negócio próprio. Entrevistado 7 L., sexo masculino, 19 anos de idade, solteiro, mas já mora com a sua companheira e ainda não tem filhos. Cursa o terceiro período de Direito noturno, ingressou na instituição X há oito meses por indicação de parentes que também tinham vínculo com o banco. É o seu primeiro emprego com carteira assinada, está no cargo de escriturário com o salário próximo do valor de R$ 1.000,00 e a carga horária de seis horas diárias, com um intervalo de quinze minutos para o almoço. Como escriturário o entrevistado circula na área de pré-atendimento instruindo os clientes e no balcão de atendimento. Apesar do pouco tempo de trabalho na instituição ele já relata a falta de reconhecimento do seu trabalho, mas pretende continuar até a conclusão do seu curso, porque acredita que, diante a sua pouca idade e experiência, não conseguiria outra oportunidade melhor de emprego. No seu caso específico ele sente certa discriminação e falta de credibilidade por parte, principalmente, dos seus superiores pelo fato 89 da sua idade e pelo seu ingresso ter sido facilitado pela indicação. O entrevistado confessa que ainda não conseguiu se adaptar às metas abusivas do banco e o ritmo acelerado dentro da agência. Já é bem definida para ele a decisão de não seguir carreira como bancário, a seu ver esse emprego representa apenas uma condição temporária. O seu trabalho de bancário hoje significa apenas sua independência financeira, em nenhum momento sentiu satisfação profissional dentro da instituição e acredita que caso venha a permanecer no banco, não se realizará completamente como profissional. Entrevistado 8 C., sexo masculino, 20 anos de idade, solteiro e não possui filhos. É graduando, no primeiro período, do curso de Agronegócio e já faz um ano e dez meses que se tornou bancário. Seguindo a influência do seu pai, que é gerente da instituição X de outra cidade, o entrevistado prestou a prova de seleção e por o intermédio de indicações foi convocado para iniciar o seu primeiro trabalho. Ingressou na instituição como escriturário e após sete meses de banco foi promovido à caixa, com o salário de R$ 1.400,00 mensais, trabalha das dez horas da manhã até as quatro horas da tarde. Além das funções desenvolvidas no caixa sob a pressão da lei das filas, o entrevistado também é obrigado a cumprir metas mensais, como por exemplo, abertura de novas contas, novos usuários de cartões de crédito e venda de títulos de capitalização. Entrevistado 9 L., sexo feminino, 38 anos de idade, casada e tem dois filhos. É formada em Administração de Empresas e aos 16 anos de idade iniciou sua carreira na instituição X, como garota vitrine. Depois foi sendo sucessivamente promovida, primeiramente, escriturária, logo depois caixa, posto onde permaneceu por treze anos e atualmente, ocupa o cargo de gerência de relacionamento de uma das agências dedicadas ao atendimento exclusivo a clientes de alta renda. Com o salário atual em torno de R$ 2.400,00, a entrevistada, com 22 anos de casa, trabalha oito horas diárias e possui uma hora e meia para o almoço. Mas ela esclarece que esse horário, destinado ao almoço, na maioria das vezes não é respeitado, principalmente, em dias de grande movimento nas agências. A entrevistada conta que no ano de 2003 ela estava trabalhando até as nove horas da noite, dentro da agência, até que se sentiu mal, sendo internada por 11 dias no hospital com o quadro de cefaléia intermitente. A partir desse episódio, ela passou a tomar vários medicamentos, sob orientação médica, para conseguir 90 dormir e aliviar as dores e tensões. Esse tratamento medicamentoso se estendeu por três anos seguidos, e por causarem efeitos prejudiciais à sua vida pessoal, ela tentou realizar, sem sucesso, a diminuição gradativa das dosagens. Logo no ano de 2006 começou a sofrer de complicações na coluna vertebral, apresentando protusão discal na cervical e três hérnias de disco lombar, além de manifestar tendinite bilateral e síndrome do túnel do carpo, precisando se afastar por dois meses do trabalho. No final do ano de 2007, a protusão discal na cervical passou a pinçar estruturas nervosas, comprometendo todo o seu lado direito, sendo novamente afastada por mais seis meses. Após esse período, o seu pedido foi deferido pelo INSS e a entrevistada se encontra hoje dependente de uma lista de medicamentos, sem condição financeira para prosseguir com o seu tratamento e em processo judicial para permanecer afastada ou conseguir sua aposentadoria. Sob a orientação do SEEBU, a entrevistada se mantém afastada da instituição X e em hipótese alguma ela deseja retomar a sua carreira como bancária. Entrevistado 10 V., sexo feminino, 42 anos de idade, casada com uma filha. Possui superior completo em Economia, o banco também foi o seu primeiro emprego. Ocupando o cargo de caixa, ela entrou no banco por indicação de um amigo que era cliente da instituição X. Hoje após 24 anos, ela permanece no mesmo cargo, ganhando um salário equivalente a R$ 1.500,00 e trabalhando seis horas diárias, com quinze minutos de intervalo na hora do almoço, mas afirma que o trabalho real extrapola essa jornada prescrita. Ela vivenciou o processo de automação de sua agência e, principalmente, a onda de demissões de seus colegas. Por fazer parte da diretoria do SEEBU, a instituição tem uma política que não permite a promoção de integrantes do sindicato e por isso, ela permanece no mesmo cargo mesmo após tantos anos de experiência. Com oito anos de sindicato, a entrevistada confessa que possui certa estabilidade quando comparada aos seus colegas, mas admite que, todas as vezes que o sindicato precisou dela ela foi sindicalista e não funcionária do banco. No ano passado, ela foi forçada a ser afastada por quatro meses decorrente de uma tendinite em ambos os braços e ela mesma reconhece que seu retorno ao trabalho foi tranquilo e possível devido a sua ligação com o sindicato. Após seu retorno ela ocupa a mesma função e confessa que sente dores ao trabalhar, mas que prefere ficar em silêncio a ser transferida para uma função sem sentido e utilidade. 91 Entrevistado 11 M., sexo feminino, 40 anos de idade, formada em Economia. O seu primeiro emprego foi na instituição X, e já faz 22 anos que ela trabalha para esse mesmo banco. Iniciou sua carreira como escriturária, foi promovida a caixa e hoje, ocupa o cargo de gerente de pessoa física. Oficialmente sua jornada de trabalho é de oito horas diárias, com uma hora de almoço e seu salário se aproxima de R$ 2.000,00. Em sua opinião, ela deixou de ser bancária há muito tempo e passou a desempenhar funções de uma simples vendedora. 92 6 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS DADOS - As condições de trabalho no banco e sua interferência na saúde dos bancários Pode-se dividir o processo de trabalho bancário no Brasil, objetivamente, em três etapas. A primeira que compreende até a década de 1960 onde de certa maneira, o trabalhador exercia o controle sobre a execução do seu trabalho. Em um segundo momento, que se estende até a década de 1980, há o predomínio do padrão taylorista-fordista, baseado em rotinas pré-definidas e programas de computadores, provocando, assim, uma desqualificação do bancário à medida que parte do conhecimento exigido, na fase anterior, deixa de ser necessário. Essa década referida é marcada pela difusão das novas tecnologias dos computadores no ambiente do trabalho bancário. Parte da atividade desses trabalhadores foi sendo transferida para os clientes e grande parte da informação se tornou disponível on line. A última etapa, a partir de 1990, se caracterizou, pelo aumento da automação, e consequentemente, uma acentuada redução e eliminação de postos de trabalho. Observa-se, portanto nessa fase uma abrangência na intensificação do trabalho, descumprimento “despretensioso” da jornada de trabalho, aviltamento salarial, caracterizando um quadro de agravamento da precarização do trabalho bancário. O “modo antigo de trabalhar”81, essencialmente burocrático e de confiança técnica, rico na oferta de cargos desejados e sinônimo de garantia de bons salários e carreira para a vida toda, contrasta com o “modo novo de trabalhar”, em processo de reformulação, reduzido a funções meramente técnicas. As mudanças implantadas no processo de trabalho bancário, com a adoção de novas tecnologias, com destaque à automação, foram acompanhadas por um ajuste estrutural que promoveu a flexibilização interna, reorganização funcional e precarização dos contratos e das tarefas bancárias. Uma modernização que, vai além dos objetivos econômicos, termina por se constituir por uma estratégia de sobrevivência empresarial adotada pelas instituições bancárias. As transformações em conjunto diversificaram os padrões organizacionais, redefiniram os papéis executados dentro das agências bancárias, a concepção que o bancário tinha sobre o seu próprio trabalho, a (re) caracterização dos comportamentos da categoria bancária e, a mudança no perfil de adoecimento físico e mental decorrente do trabalho. A partir das entrevistas realizadas com os bancários da instituição X, foi possível encontrar indícios reveladores desse processo e das condições de trabalho, bem como os 81 Expressões utilizadas por GRISCI (2002). 93 problemas de saúde decorrentes dos mesmos. Com base nos estudos relativos às mudanças e implicações no contexto de trabalho dos bancários, a análise dos dados obtidos, os quais corroboram com a tendência do setor financeiro do Brasil, permitiu destacar algumas evidências que são, a seguir, apresentadas e analisadas. Os depoimentos obtidos, referentes ao processo da reestruturação bancária, de cada um dos entrevistados apresentam componentes comuns a todos. O trabalho bancário sempre se diferenciou das demais atividades, o que lhe garantia no passado determinado status, por ser executado em ambientes laborais considerados agradáveis, modernos, limpos e, que de certa forma, não exigem força braçal, quando comparado às atividades fabris. Entretanto, o sentimento de realização é renegado também aos trabalhadores pertencentes a esse ambiente de trabalho “limpo”. Os bancários passam a experimentar o distanciamento a partir do momento em que não há mais envolvimento e identificação com a sua vida profissional. De acordo com Marx, à medida que o trabalhador se distancia do seu trabalho e perde o controle de todo o processo passa a sofrer com a condição de alienação (MARX, 1988). Merlo e Barbarini (2002) apontam a importância do reconhecimento e realização dos bancários na minimização do sofrimento advindo dos conflitos presentes na realidade organizacional. Sentimentos responsáveis pela construção da identidade ocupacional a partir da necessidade “de realizar coisas e de se auto-realizar” (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 108). Os depoimentos dos entrevistados mostram a atividade bancária distante de ser uma fonte de realização e construção de identidade ocupacional e se revelando como fonte geradora de sofrimentos e adoecimentos: “[significado do trabalho] Medo, desespero, falta de confiança. Antigamente eu tinha confiança em mim mesmo, eu fazia... eu resolvia. Hoje eu me sinto incapaz” (entrevistado 2). É notório como o significado do trabalho sofre também um processo de redefinição durante as constantes mutações do capitalismo. De formação moral e identificação profissional, o trabalho se limita hoje apenas a representar um instrumento com finalidade financeira, como confirma os relatos dos bancários: “[significado do trabalho] Comodidade... não é uma satisfação, não me sinto realizada, estou bem cansada desse negócio de todo dia ter que dar satisfação do que eu fiz e 94 do que eu não fiz pra alguém que fica lá em cima querendo só computar os seus números. Então hoje acho que só comodidade mesmo, de ter aquele [dinheiro] no fim do mês e conforto para as crianças [filhos]... Satisfação, no momento não tenho não” (entrevistado 6). “Minha independência financeira, não ter que pedir dinheiro para o meu pai, não ter que dar satisfação, poder ajudar, pagar minha faculdade” (entrevistado 4). “Minha independência financeira. É como eu falei trabalhar no banco é uma coisa que eu até gosto, mas me sentir realizado é trabalhar realmente na área que você estudou pra fazer perfeitamente aquilo, igual ser formado em algum curso e trabalhar justamente numa área dessas, prestar algum concurso, alguma coisa assim... Não vou me realizar algum dia no banco 100% não. [satisfação profissional] Não, não de forma alguma” (entrevistado 7). O esvaziamento da atividade profissional é expresso objetivamente por Camps (1993 apud RIBEIRO; LÉDA, 2004), “já não existe um trabalho que valha mais do que o outro: é mais válido o que paga melhor. Já não existem, portanto, profissões de maior prestígio, e sim profissões que abrem as portas para o dinheiro e o êxito” (RIBEIRO; LÉDA, 2004, p. 80). 95 6.1 REDEFINIÇÃO DO PERFIL PROFISSIONAL - (DES) APROPRIAÇÃO DO OFÍCIO BANCÁRIO Em decorrência das mudanças organizacionais no universo bancário a expropriação do saber foi uma das principais consequências apontadas não só pelas referências que tratam dessa temática, mas também pelos relatos dos entrevistados. Segundo Grün (1986), desde a implantação dos princípios tayloristas a atividade bancária vive um intenso processo de “desencantamento do antigo métier” (GRÜN82, 1986). Em seu trabalho, Blass (1989) também discute a expropriação do saber bancário ao traçar um comparativo entre os bancos do passado, representados pelo ofício que exigia inteligência e conhecimentos específicos de contabilidade e a tendência, marcada pela incorporação de máquinas automáticas e subtração dos conhecimentos, saberes e habilidades dos bancários, encarregados pela execução de novas tarefas empobrecidas (BLASS, 1989). O mundo do trabalho, enquanto “atividade humana”, na visão de Gravina e Rocha (2006), sofreu um processo de transposição das condições “rudimentares” até chegar à automação dos dias atuais. Nesse mesmo sentido a atividade bancária avançou rumo à automação ultrapassando as antigas características do trabalho essencialmente manual (GRAVINA; ROCHA, 2006). Situação continuamente relatada pelos entrevistados: “[...] a mudança que eu senti de quando eu entrei no banco, o bancário era o quê? Era um consultor de investimento, ele trabalhava mais na área voltada, assim, com aquela preocupação com o cliente. Hoje com a mudança de todo o mercado o bancário hoje ele nada mais é do que um vendedor de produto. E a informática que mudou tudo, a automação, que eles [banco] dão mais valor para esses tipos de coisa, para as máquinas no caso. E os gerentes estão mais voltados para a venda de produtos” (entrevistado 9). Esse conjunto de ajustes permitiu a racionalização do trabalho bancário, que de uma forma específica promoveu a redução dos custos destinados a força de trabalho e a otimização dos processos dentro das instituições. Como consequência houve a desvalorização de antigas funções de “retaguarda”, as quais foram extintas ou transferidas para o novo “bancário- 82 Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_02/rbcs02_02.htm. 96 vendedor” (BATISTA, 2008), juntamente ao movimento de diminuição dos postos de trabalho direcionados para os registros de dados e do contato nos atendimentos aos clientes: “[...] para tirar ele [cliente] de dentro da agência, hoje o banco é uma instituição assim, é um comércio, é venda... hoje o banco está mais interessado em vender os produtos do que propriamente fazer o trabalho para o cliente” (entrevistado 10). Seguindo a lógica mundial, as estratégias de gestão foram adotadas pelos bancos delegando aos novos bancários as atividades de consultoria financeira e comercialização de novos produtos e serviços, como os cartões de crédito, seguros, previdência privada e títulos de capitalização (GRAVINA; ROCHA, 2006). Passaram a valorizar os trabalhadores responsáveis pelo setor comercial, reconhecendo-os como qualificados e rotulando os bancários do setor administrativo como semi-qualificados (BATISTA, 2008). Essa nova qualificação do bancário também foi retratada nos depoimentos dos entrevistados: “Eu sou vendedora de dinheiro, eu vendo dinheiro, o bancário hoje em dia ele é vendedor de dinheiro, ele não é mais aquele que fica só lidando com o dinheiro... ele é vendedor de dinheiro, eu vendo dinheiro, produtos e serviços. O bancário hoje acabou, acho que não poderia chamar bancário, tinha que ser representante comercial do banco, não existe mais... a não ser lógico poucos que ainda trabalham no caixa, que é minoria, você vê no nosso quadro nós somos quinze pessoas e nós só temos quatro caixas. Minoria... fica todo mundo na área gerencial vendendo dinheiro” (entrevistado 6). A legitimização da exigência pelo novo trabalhador vem das novas exigências do novo contexto do processo de trabalho. O novo perfil requer um bancário não modelável às exigências do mercado, mas com a capacidade constante de se adaptar frente às mudanças (GOÉS; SOUZA, 2008). O modo de trabalhar de hoje requer um bancário com uma concepção mais generalista, detentor de habilidades para lidar com situações imprevistas, subjetivas e diversificadas, apto para manejar máquinas com rapidez e destreza nos movimentos corporais. Contexto que pode ser observado no relato abaixo: “Eu acho que hoje a pressão é muito maior, é como eu te falei hoje o banco é um comércio, então hoje um gerente fica desorientado, porque ele tem que bater metas, cada dia, 97 cada mês... hoje você vende vinte produtos deste mês, mês que vem o cara quer mais quarenta e aqui é muito pequeno para tanta competitividade, tem muitos bancos, a demanda vai aumentando, aumentando e não tem gente para poder comprar sempre os mesmos produtos. Aí o gerente vai ficando acuado é onde às vezes eles são mandados embora porque não estão produzindo, mas às vezes não é do gerente é porque as condições vão ficando difíceis” (entrevistado 10). Batista (2008) alerta para a extensão dos trabalhos rotineiros e automáticos à maioria dos níveis hierárquicos dentro do banco, não se restringindo apenas a função do caixa. Tais funções são consideradas pelo autor de “baixo teor intelectual, o que a aproxima da velha especialização taylorista-fordista e ‘semi-qualificada’” (BATISTA, 2008, p. 9). O antigo bancário, dotado de um saber de métier envolvido em toda amplitude e plenitude da atividade bancária, foi delegado ao exercício de tarefas rotineiras e funções sem significado e, especificamente, fragmentadas. 6.2 DESVALORIZAÇÃO DO CARGO DE CONFIANÇA Juntamente com o processo de desintegração do status social da profissão e a desestruturação não só de um antigo ofício, como também do próprio saber adquirido ao longo dos anos, o peso da desvalorização vem sendo carregado pelos bancários (MERLO; BARBARINI, 2002). Para Merlo e Barbarini (2002), a privação de sentido impressa nas normas instituídas pelas organizações reflete no trabalhador a incapacidade de realização e reconhecimento na execução de atos sem escolhas e na realização de atividades sem significado. “É difícil sentir-se reconhecido quando não se reconhece o seu sentido de responsabilidade” (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 109). Netz e Mendes (2006) apontam a perda da segurança e da qualificação no trabalho consequente à perda da qualificação dos antigos bancários e a relação descartável com os novos “facilmente substituíveis” (NETZ; MENDES, 2006). As relações de descaso frente aos sofrimentos dos bancários são frequentemente atribuídas ao comportamento burocrático que os superiores adotam como forma de defesa, por temerem pela imagem que sua agência representa em relação às demais agências da mesma 98 instituição, e impedem, muitas vezes, que os bancários sejam ouvidos e suas “lamentações” se tornem públicas. No repasse de obrigações e metas existe a figura do gerente, que se apresenta, nesse momento, como cargo de chefia, entretanto a partir do instante em que há a necessidade do bancário se reportar a alguém, o gerente se assume apenas como mais um funcionário do banco e se esquiva, atribuindo a responsabilidade à instituição. A ausência de uma figura física dentro das agências renega ao bancário qualquer sensação de proteção e amparo: “... porque não tem ninguém para te defender, tem que ser você sozinha” (entrevistado 9). As situações de constrangimento também obrigam a convivência dos sentimentos de desconfiança e marginalidade, expressos com indignação no depoimento de um dos bancários: “[...] gente eu tenho 22 anos de banco, eu não sou criança. São coisas horríveis, eles não levam em conta se eu estou lá esse tanto de tempo. A gente é tratada como se a gente tivesse entrado no banco ontem, infelizmente não levam em conta... com relação à segurança você tenta falar: ‘poxa, escuta você está falando para mim?’ Eu não poder entrar no almoxarifado, trancam a porta e põem [a chave] no bolso? Eu me sinto um nojo, me sinto horrível, horrível!!!” (entrevistado 9). A instituição X parece desconhecer ou fingi não conhecer os sentimentos e os dilemas dos seus próprios bancários. A falta de tratamento humano dentro das organizações foi analisada por Ribeiro (1997), ao apontar os indícios de desumanização nas relações de trabalho. Diante da postura de “trato e destrato” adotada pelos superiores em relação às suas necessidades, os trabalhadores não os responsabilizam pelo seu adoecimento, mas os culpam pela falta de interesse em solucionar os seus problemas de saúde (RIBEIRO, 1997). O relato do entrevistado demonstra o descaso com o qual o seu problema de saúde foi tratado dentro da instituição: “[...] numa segunda feira eu mandei [o atestado] para o meu administrativo e ele só me ligou comunicando que me deu falta quarta, quinta, sexta, sábado e domingo porque não sabia o que tinha acontecido comigo. Eu passei mal e fui para o hospital, mas ele não sabia o que tinha acontecido comigo, sendo que ele nem sequer se preocupou em ligar para mim, sabendo que o meu marido estava comigo no hospital. E eu já passei mal no banco, já 99 desmaiei duas, interou três vezes a última, até hoje meu gerente não me deu sequer um telefonema pra saber... e eu fiquei com o meu lado direito todo comprometido, todo parado e não me ligaram. É uma coisa muito esquisita! Muito esquisita! Você sente que enquanto você está batendo a meta você é excelente, no dia que você não bater a meta, aquilo que você bateu mês passado esquece. É infelizmente, é uma coisa muito triste de falar. Agora o que eles precisam comunicar comigo eles mandam telegrama. [...] E até hoje ninguém [do banco] me ligou... o que eles precisam comunicar comigo eles mandam telegrama. Só assim...” (entrevistado 9). Nos depoimentos abaixo, os entrevistados relatam os sentimentos de desvalorização e descontentamento diante do tratamento que recebem no banco: “... aí eu fui convidada para ser moça da instituição X, na época. Achava que era uma maravilha, na época realmente era uma maravilha. Era o sonho de todo mundo trabalhar no banco [...] O que eu te digo: ‘é uma dó’. Você trabalha numa instituição esse tempo todo e no final você sai dessa forma. Eu, pelo menos no meu pessoal, estou tranquila porque fui honesta comigo, com o banco e com os clientes em tudo que eu fiz. Graças a Deus! Isso é o que mais me alivia” (entrevistado 9). “[valorização] se você der rentabilidade pra ele, sim. Se não você está com os dias contados. Nós perdemos uma colega agora sexta feira, por desempenho que ele [banco] não estava satisfeito, sai mesmo não adianta... Até o momento em que você está dando lucro, a partir do momento que você não está dando lucro, você está dando só despesa... aí você está fora, você pode dar a sua vida, ficar sem almoçar, que isso ninguém vê...” (entrevistado 6). “Valor... não dão não, assim, enquanto eu estou servindo pra eles, satisfazendo as necessidades deles [banco], entendeu? Eles me mantêm ali, a hora que não tiver mais, eles me mandam embora e não vão importar se eu trabalhei passando mal, se eu trabalhei com enxaqueca, se eu fiquei sem almoço porque a fila estava grande, entendeu? Ou: ‘poxa tem 20 anos que ela está ali, trabalhou direitinho, vinha trabalhar doente mesmo, só não veio quando ela estava quase morrendo’” [ironiza] (entrevistado 5). 100 A desinformação, diante do silêncio da gerência e dos gestores, em relação à verdadeira dimensão dos problemas vividos dentro da instituição, prejudica e dificulta a percepção da realidade vivida ali sob os olhares de todos. As administrações fragmentadas são incapazes de reconhecer o adoecimento de seus trabalhadores e acabam caracterizando as situações de sofrimento humano como problemas de ordem administrativa. [...] há por parte de empresa uma ignorância real, sem dar à expressão qualquer sentido pejorativo, simples desconhecimento de diretores, gerentes e administradores, sobre o que estaria acontecendo com a saúde dos seus subordinados. Esse desconhecimento não se inscreve, de hábito, nos anais das empresas modernas que construíram, sabe-se, sistemas de controle e informações bastante eficazes, assentados na automação. Em termos organizacionais, nenhuma desinformação ou desconhecimento é inocente, mas parte de uma política (RIBEIRO, 1997, p. 89). O sofrimento, que transparece no depoimento do entrevistado, é atribuído por Merlo e Barbarini (2002), “à subestimação do fator humano por parte da administração da empresa” e está intimamente relacionado, segundo a perspectiva dos autores, com o espaço oferecido aos bancários para exercerem sua criatividade na transformação de seu próprio ambiente de trabalho (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 121): “Não, eu sei que não tem, isso [valorização] não tem, porque o banco é como se fosse uma coisa que não existe, o meu patrão é o banco, nessa hora é assim, é o banco, mas ‘o banco’... não tem uma relação de patrão empregado pessoal, tem o gerente que ele é tão empregado quanto eu também, aliás ele corre mais risco do que eu, do que qualquer outro funcionário, então quer dizer quanto mais você tem... você está lá em cima também você corre muito mais risco, porque às vezes ele pode perder o emprego por uma coisa errada que eu faço, eu sei que se é uma coisa errada eu vou dançar mas eles dançam junto comigo, então às vezes ele nem sabe o que aconteceu. Não é que ele não seja o meu patrão, ele é, mas ele é tão empregado quanto eu” (entrevistado 5). Na própria interpretação de Ribeiro (1997) “o beneplácito da desinformação lhes é concedido, mas não o da omissão” (RIBEIRO, 1997, p. 89). Sentimento de abandono expresso nas palavras de desabafo do entrevistado que se encontra afastado por motivos de saúde: “O banco nem liga para saber se morreu ou se está vivo” (entrevistado 2). 101 6.3 CORPORIFICAÇÃO DE UMA CULTURA FORTE O aculturamento83 dentro das grandes organizações tem sido alvo de preocupação e estudo por se tratar de um fenômeno que vem ganhando proporção conforme as relações de trabalho se tornam, determinantemente, mais complexas. Sem fugir dessa realidade os ambientes laborais dos bancos têm abusado no uso da ofensiva ideológica como ferramenta indispensável para alcançar as metas estabelecidas. Segundo Jinkings (2004), o controle das informações, o domínio da comunicação e a influência na tomada de decisões permeiam as relações de trabalho e corroboram para o envolvimento e a adesão dos trabalhadores à ideologia patronal e às estratégias mercadológicas das grandes instituições, “de tal modo que eles se representem como o próprio capital personificado” (JINKINGS, 2004, p. 240). No relato dos bancários entrevistados é possível identificar a força cultural que permeiam suas relações de trabalho: “É como o meu diretor sempre diz: ‘a gente não pode correr atrás, a gente tem que correr na frente.’ Mais que superar tudo que acontece lá dentro... todas essas mudanças que ocorrem, o que acontece no dia a dia, as surpresas, todo dia é um dia diferente, todo dia acontece uma coisa diferente, então se você desanimar, se você não vestir a camisa você não consegue ficar no emprego...” (entrevistado 3). Na análise cultural realizada por Silva; Nozaki e Puzone (2005), o primeiro aspecto que chama a atenção é a “fragilidade dos temores totalizantes” que confere sentido ao processo de influenciação no modo de pensar e de ser do trabalhador. As escolhas da empresa até então desconhecidas, mas rapidamente absorvidas ao “vestir a camisa”, anulam as escolhas de vida do próprio trabalhador (SILVA; NOZAKI; PUZONE, 2005, p. 368). É o fenômeno descrito por Grisci e Bessi (2004), como “desraízamento” ou “desterritorialização”, de tal forma que o bancário, ao ser selecionado para dar início à carreira bancária, adentra num mundo fechado mantido por uma cultura própria e não declarada que, frequentemente, não vai de encontro à história de vida pessoal e profissional que ele adquiriu e carrega até o 83 “Mecanismo de poder e de controle organizacional [...] é um processo que acaba por funcionar como um mecanismo de controle organizacional, informalmente aprovando ou proibindo comportamentos que dão significado, direção e mobilização para os seus membros (e isso ocorre antes mesmo do ingresso à organização)” (GUEDES, 2001). Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 102 momento de sua entrada no banco, nas palavras de Grisci e Bessi (2004), é a desconsideração dos “aspectos da vida do trabalhador enquanto ser integral” (GRISCI; BESSI, 2004, p. 167). O choque, entre o que o bancário realmente é e o que a empresa quer que ele seja, inicia à medida que os instrumentos ativos de manipulação coíbem as suas ações comportamentais, baseadas em crenças, valores e princípios, ou seja, o que Guedes (2001) descreveu como sendo a “desintegração dos padrões tradicionais de ordem social” 84. O impacto da cultura organizacional no ambiente empresarial também foi abordado por Antunes (2006), que reconhece as exigências por uma nova qualificação como mais uma forma de representação ideológica do que efetivamente capacitações técnicas ou funcionais no intuito de adequar os trabalhadores às exigências atuais do contexto produtivo (ANTUNES, 2006). “[...] da mesma forma que a empresa me proporciona hoje no mercado uma instituição forte, de qualquer forma também eu tenho que retribuir a empresa... e pra mim mesmo é ótimo, é excelente, é o que posso dizer pra você, quanto mais efetuar vendas, mais vou estar ganhando e vou estar ajudando também a empresa”(entrevistado 1). O estudo de Oliveira (2001) sobre as questões, ideológicas e éticas que envolvem as culturas corporativas, demonstra como se tornam cada vez mais uniformes e fortes sendo, frequentemente, manipuladas como mecanismos de dominação e controle sobre os trabalhadores. A organização, vista como uma cultura, representa um sistema compartilhado de regras, valores, crenças, idéias e padrões que indica o estilo e, principalmente, o caráter de gestão e planejamento na vida organizacional (OLIVEIRA, 2001). Situação claramente ilustrada pelo depoimento a seguir do jovem bancário estudante de Direito obrigado a assumir compromissos e adquirir posturas que fogem do padrão ético e legal: “Não concordo com muita coisa não, mas sou funcionário do banco e eu tenho que vestir a camisa do time, mesmo não concordando com muita coisa. Forçar vendas, questão de cobranças e, também, forçar vendas para clientes que muitas vezes está precisando de uma determinada coisa, aí tem que fazer outra pra estar conseguindo [...] não concordo, mas a gente tem que seguir a política (entrevistado 4)”. 84 Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 103 Para Sennett (2006 apud MACIEL, et. al., 2007), esse novo espaço social ou como Guedes (2001), denomina de sociedade ocupacional ou organizacional, representa o “novo capitalismo” instituído de pressupostos como o “individualismo, a incerteza e a falta de compromisso nas relações sociais”, identificados, na maioria das vezes, como casos de violência moral (MACIEL, et. al., 2007, p. 118). “Realmente [ritmo] é puxado, mas essa pressão sempre tem que existir, porque se você não for cobrado, você vai ficar ali, vamos dizer assim, estagnado, parado, então, existindo é uma forma de alerta para você estar buscando... e no meu caso que sou corretor, é sempre bem vindo, quanto mais efetuar vendas, eu sou comissionado, mais eu vou ganhar e a empresa, automaticamente, vai está ganhando também” (entrevistado 1). A criação das “culturas organizacionais” ou “realidades sociais”, ou ainda “sociedades ocupacionais”, denominações utilizadas por Guedes (2001)85, é mais uma estratégia mercadológica para possibilitar a sobrevivência das instituições diante das novas configurações e reconfigurações do mercado. A concentração das atividades comerciais indica a franca decadência das culturas administrativas e garante mais espaço para a atuação do “bancário-vendedor” (JINKINGS, 2004). A aplicação dos princípios e das diretrizes, que norteiam a sociedade ocupacional, permite a sobrevivência das instituições no processo de competição e o melhor desempenho organizacional na busca por excelência. A análise de Guedes (2001), sobre a cultura organizacional dentro das instituições bancárias, apontou a presença dos valores da administração científica clássica, com maior influência “do estilo administrativo burocrático de Max Weber”, conferindo sentido e significados como, “impessoalidade, profissionalismo, [...] aderência a procedimentos e promoção por mérito [...] (GUEDES86, 2001). Políticas positivas de aumento de salários, premiações por produção e participação nos lucros, mas que para Castelhano (2005), se a princípio soam como promessas de uma carreira ascendente, logo são cobradas “tudo isso a seu preço” (CASTELHANO, 2005, p. 15). “[...] tem a premiação também daqueles que conquistaram o objetivo, tem essa premiação. Isso é uma forma de motivação mais ainda, a pessoa busque novos caminhos, novas conquistas também... a premiação não é em dinheiro, seria em troféus, mesmo que seja 85 86 Dsiponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. Dsiponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 104 um objeto simples, mas de qualquer forma é valioso para aquela conquista que foi realizada” (entrevistado 1). Na visão de Penella (2000), o trabalho tem o poder irrestrito de influenciar as atitudes e os comportamentos, como também de construir a identidade de quem está em sua submissão. Os efeitos ultrapassam os ambientes internos das instituições e passam a influenciar o círculo de amizades e até mesmo os momentos familiares (PENELLA, 2000). É o que Grisci e Bessi (2004) caracterizaram como sendo a influência não só sob o modo de trabalhar, como também no modo de ser na reestruturação bancária (GRISCI; BESSI, 2004). No depoimento abaixo o entrevistado demonstra a extensão da filosofia, política e crença compartilhada pela instituição X em sua vida: “Levar o trabalho pra casa sempre tem... eu diria que seria todo dia levar ele pra casa, mas levando pra casa de repente tem uns amigos, uns colegas e, automaticamente, vai me perguntar como está seu trabalho? Eu vou está conversando... de repente essa pessoa não é cliente do banco, vou está conversando, já trago o cliente... enfim... é sempre bem vindo está levando, até mesmo pra algumas pessoas, pra minha família... de repente pergunta: ‘ah você trabalha com seguro?’ - ‘Ah eu trabalho com seguro’” (entrevistado 1). Com base nos depoimentos é possível destacar alguns dos elementos subjetivos que modelam a cultura da instituição X, fundamentada na “concentração do poder baseada na hierarquia e subordinação” (GUEDES, 2001)87. “é assim... manda quem pode, obedece quem tem juízo, então se ele [o banco] falar pra fazer, eu faço...” (entrevistado 5). 87 Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 105 6.4 “A SELEÇÃO DARWINISTA”88 Os comportamentos adquiridos, como capacidade de adaptação às determinações da organização e pela ‘boa vontade’, nas próprias palavras dos bancários, em assumir as variações das atividades bancárias, são imperativos à sobrevivência dos bancários dentro da agência. Para Fleury (1989), a integração dos novos bancários é realizada para que se adaptem aos novos “formatos e durações diversas, conforme a organização” (FLEURY, 1989, p. 7). De tal forma que os bancários não só são selecionados mediante suas capacidades técnicas, mas principalmente pelo seu comportamento desejado, determinando o processo de exclusão para os considerados inadequados (FLEURY, 1989). O ambiente organizacional da instituição X é marcado pela seleção natural onde os melhores se destacam para o sucesso e os mais fracos são inevitavelmente eliminados (OLIVEIRA, 2001). Guedes (2001) identifica essa realidade com a própria teoria da seleção natural proposta por Darwin (GUEDES, 2001). A forma de reconhecimento meritocrática adotada dentro da instituição é incorporada pelos bancários: “eu encaro como um lado assim positivo, porque surge alguns momentos que você tipo assim acomoda, então essa pressão, na minha opinião, é válida. É uma forma de você ir pra frente, e hoje o mercado está bastante competitivo” (entrevistado 1). Para Jacques (2006), o aprimoramento contínuo exigido pelas modernas gestões de pessoal também constitui um forte mecanismo de seleção dentro das organizações. Essa necessidade instiga a sensação constante de controle e é interpretada como a “vigilância para não perder o emprego, para ser o melhor, para enxergar na frente” (JACQUES, 2006, p. 154). Realidade descrita pelo bancário: “Na verdade é uma promoção, como você entra como escriturário e você, por exemplo, você tem uma ‘boa vontade’, você tem assim necessidade de crescer, você mostra seu serviço, que você tem potencial, você tem capacidade, entendeu? Você não vai ficar naquele ‘heim, heim, heim’... como eu falo só vai ficar naquele cargo por muito tempo, 88 Expressão baseada na definição de Guedes (2001) para a seleção com “tons darwinistas, em que os componentes, dedicados e trabalhadores ascenderão e os menos empenhados não terão os benefícios” (GUEDES, 2001). Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 106 estagnado, porque tem muita gente às vezes que chegou num estágio ali, e ficou ali porque para ele está muito bom, entendeu?... então as oportunidades foram surgindo, então elas vão surgindo, e as promoções vêm às vezes de ano em ano, às vezes dois anos, às vezes cinco anos, isso depende muito de pessoa pra pessoa, do tipo da pessoa” (entrevistado 3). Outro requisito determinante, apontado nos depoimentos dos entrevistados, para a manutenção do emprego na instituição X é a preparação para se enquadrar nas flexibilizações exigidas pelos novos postos de trabalho, denominada por Jacques (2006), de “captação subjetiva” característica advinda dos modelos organizacionais. O bancário deve apresentar disponibilidade indiscutível para executar diferentes tarefas, aceitar horários flexíveis e inclusive, sofrer mudanças geográficas em casos de transferência de agência (JACQUES, 2006). É o que consta nos depoimentos dos entrevistados a seguir: “Hoje eu não queria ter que sair de Uberaba e no banco, pra você crescer, você tem que sair, você tem que ir embora, você tem que se colocar a disposição pra ir pra qualquer lugar que te mandarem. E eu não queria ter que ir embora hoje, já tentei isso no ano passado, fiquei muito tempo viajando, ficava a semana inteira viajando... fora, assim distância de quinhentos quilômetros, seiscentos quilômetros... cem, duzentos, fazia quase a metade do estado de Minas Gerais. Só que daí me deu pânico, negócio de estrada, dirigindo sozinha... foi muito bom financeiramente, seria muito bom se eu tivesse levado adiante, mas na hora de pesar na balança eu achei que não compensava, eu passava o dia inteiro na estrada, semana inteira, sozinha, trabalhava até na sexta feira, dirigindo sozinha, em Minas Gerais que são as piores estradas, então[...]” (entrevistado 5). “[...] Então eu já vejo que uma hora que eles [banco] conseguirem alguém pra ficar no meu lugar eles me descartam, como eu não quero seguir, eu já deixei bem claro que eu não pretendo ficar sendo transferida de dois e dois anos, de três em três anos” (entrevistado 6). De acordo com os relatos pode-se perceber a presença de determinados rituais89 de socialização e dominação, que possuem a finalidade de inventar e manter a cultura 89 Segundo Fleury (1989) “o rito consiste em um conjunto planejado de atividades, relativamente elaborado, combinando várias formas de expressão cultural, as quais têm consequências práticas e expressivas”. Foram identificados, pelos autores Beyer e Harrison, seis ritos das organizações: ritos de passagem (introdução e 107 organizacional. Tais rituais, segundo Fleury (1989), tem o duplo papel de realizar a inclusão dos novos adequados ao grupo e ao mesmo tempo definir “o processo de exclusão dos demais” (FLEURY, 1989, p. 7). A instituição X se apresenta como uma complexa organização social, com padrões culturais específicos, que obriga seus funcionários a trabalharem em ambientes, descritos por Mazi (2000), diversificados, submetidos às mais variadas pressões e contingências, que se modificam no tempo e no espaço, reagem dentro de estratégias e comportamentos diferentes, atingindo resultados extremamente diversos (MAZI, 2000). 6.5 CARREIRA FECHADA - LAPIDAÇÃO DA “MATÉRIA-PRIMA”90 O crescente número de escriturários, jovens bancários em início de carreira, comprova a intenção da instituição X em recrutar pessoas que possam submeter-se à cultura institucionalizada, ou de acordo com Grün (1986), incorporar o “espírito da casa” e que apresentem, portanto uma menor resistência em serem socializadas e aculturadas dentro da organização. Os trabalhadores com perfis resistentes, que questionam as normas e os valores padronizados na nova forma organizacional, foram descritos por Penella (2000), como os perigosos “dissidentes” tão temidos e evitados pelas sociedades organizacionais (PENELLA, 2000). Segundo o estudo sobre cultura organizacional de Guedes (2001), as organizações possuem critérios definidos de recrutamento e seleção os quais preferencialmente admitem jovens que não tenham experiência prévia em outra instituição financeira. A formação da mão de obra é vista como uma “matéria prima a ser moldada e trabalhada tendo-se em vista valores, crenças e comportamentos da cultura organizacional” (GUEDES91, 2001). A instituição X se beneficia ainda das escassas possibilidades de emprego na cidade e consegue arrebanhar jovens para dentro de suas agências ofertando-lhes em média salários mais ‘elevados’ (quando comparados às outras atividades na cidade), treinamentos, carga horária de seis horas, qualificação e outros benefícios ilusórios, como a participação nos lucros da treinamento), ritos de degradação (demissões e substituições), ritos de confirmação (cursos de reciclagem), ritos de reprodução (ações de desenvolvimento organizacional), ritos para redução de conflito (trabalho em coletivo) e ritos de integração (festas e comemorações) (FLEURY, 1989, p. 5). 90 “O recurso humano é visto como "matéria prima" a ser moldada e trabalhada tendo-se em vista valores, crenças e comportamentos da cultura organizacional [...]” (GUEDES, 2001). Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 91 Disponível em: sites.uol.com.br/ritacguedes/pub001.htm. 108 empresa. Geralmente os escriturários são ainda estudantes acadêmicos que se submetem a um processo contínuo de educação direcionado para a sua completa internalização. O sistema de “carreira fechada” ensina aos jovens ingressantes a maneira certa de pensar, agir e perceber, ou o que Segnini (1988 apud FLEURY, 1989) denominou de “comportamento exemplar”, garantindo à instituição um funcionário dedicado, submisso e disciplinado. Nas palavras de Guedes (2001), o pensamento reproduzido ao longo do tempo faz com que os jovens acreditem que “... todo contínuo pode sonhar com a presidência desde que trabalhe com total dedicação e de acordo com o ideário organizacional” (GUEDES, 2001). O relato do bancário universitário ilustra o ingresso na instituição X: “Olha, eu e mais uma menina, ela entrou em janeiro e eu entrei em abril, ela já ganhou a promoção dela tem uns quatro meses, então a minha vai ser mais ou menos no mesmo tempo que o dela, menos de um ano pra ter a primeira promoção” (entrevistado 4). Esse mesmo depoimento declara outra tendência difundida na instituição X, que consiste no tempo mínimo que o escriturário espera para ser contemplado com promoções. Na escalada profissional dentro do banco além dos vários cargos há a criação de subdivisões reconhecidas por letras, como caixa A, caixa B e etc., que representam mais uma forma de motivação do que propriamente valorização, aumento de salários, autonomia na tomada de decisões ou ascensão hierárquica. Os bancários mais experientes assistem os mais jovens avançarem em um curto espaço de tempo, cargo a cargo numa exigência mínima de experiência e dedicação quando comparada ao caminho percorrido antigamente. Diante os olhares dos mais experientes os jovens perdem muito em conhecimento e prática nesse processo acelerado que se tornou a trajetória profissional. “Entrei como escriturário e estou como escriturário até hoje, vou para o caixa mês que vem. É mais uma promoção eu acho, não vou exercer muito a função do caixa, vou continuar onde eu estou na área comercial. É mais pelo tempo de banco para aprender o básico do caixa só” (entrevistado 4). “[...] quando eu entrei, para você ganhar uma função que eu tenho hoje, eu trabalhei treze anos no caixa, hoje uma pessoa não trabalha mais que dois anos no caixa, ela já ganha promoção. Então quando eu entrei era bem diferente, para você conseguir um cargo de 109 gerente de relacionamento seria o quê? Doze, dez anos. Hoje não, hoje tem funcionário lá que em dois, três anos ele já é gerente de contas. Então mudou muito isso, então é aí que às vezes o cliente perde com isso, entendeu? Com a experiência do funcionário, que é completamente diferente, não tem nem que ver. Então não que o atendimento mudou ao cliente, mas a experiência em atendê-lo com certeza deixa a desejar” (entrevistado 9). Ao contrário da lógica de se fazer “carreira fechada” delineada pelas organizações, há uma tendência, já descrita por Romanelli (1978) na década de 1970 e confirmada por Grün (1986) na década seguinte (1978 apud GRÜN, 1986), em que os novos bancários não consideram mais o banco como uma “instituição total, a qual ele adere para toda a vida”, é visto apenas como uma situação provisória e temporária para a concretização de outros projetos pessoais, como a conclusão do curso superior (GRÜN92, 1986). Esses novos agentes sem expectativas de permanência na atividade bancária, na visão de Merlo e Barbarini (2002), contribuem também para a “degradação do status da profissão” (MERLO; BARBARINI, 2002, p. 107). Nessa mesma linha Grün (1986) já atribuía ao preenchimento das vagas por esse novo perfil de bancários como “uma quebra importante na tradição do banco”. As organizações não reconhecem em sua tradicional equipe as qualidades requeridas pelas novas exigências do mercado buscando, assim fontes externas de matéria prima. Os jovens bancários inseridos em postos privilegiados possuem “alto potencial e formação universitária, mas sem conhecimentos de banco” (GRÜN, 1986). É o que carrega o depoimento do bancário que faz parte do antigo quadro de funcionários: “É uma coisa também que eu acho errada, porque depois dos 40 anos, você já não serve mais. E não é bem assim, eu acho que você até cria uma maturidade melhor. Eu vejo hoje os meus colegas lá de vinte anos, quer dizer a idade que eu tenho de trabalho eles têm de idade, e você vê que é avoado, não tem aquela coisa, maturidade [...] E hoje todo banco quer isso, ele quer a pessoa que está entrando na faculdade, ele nem quer a pessoa que está formando. E escolhe também, porque se você estiver fazendo [curso] que não for dentro da área dele [banco] não serve. Até o Direito não pode mais dentro da minha instituição não, porque depois você forma, vai embora e não vai fazer carreira dentro do banco” (entrevistada 10). 92 Disponível em: http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_02/rbcs02_02.htm. 110 A essência dessa nova trajetória profissional foi captada por Grün (1986), ao declarar que “estamos entrando numa fase em que a mobilidade ascensional passa a ser quimérica” (GRÜN, 1986). 6.6 FUTURO INDESEJADO DENTRO DO BANCO Devido aos ajustes promovidos pela automação bancária em resposta às exigências do mercado, o trabalho bancário sofreu um processo de descaracterização que tem desestimulado os bancários a se interessarem pela ascensão profissional dentro de uma agência. Segundo Merlo e Barbarini (2002), os pressupostos organizacionais rigidamente prescritos, norteados por regras desprovidas de sentido, corroboram para o desinvestimento em atividades que não oferecem ao trabalhador o desejo de realização e de ser reconhecido por ações sem significado (MERLO; BARBARINI, 2002). A continuidade na profissão significa, muitas vezes, a destruição de projetos pessoais e a desestruturação da própria vida, como é o caso do relato abaixo: “Eu não penso em voltar para o banco, continuar no trabalho no banco não... porque eu tenho dois filhos para eu criar e eu preciso ter saúde para eu cuidar dos meus filhos. Hoje eu acho que eles são mais importantes para mim. E continuar no banco não, vão me sugar [...] A vida da gente acaba. Acaba com a pessoa, a sua auto-estima vai lá embaixo [...] só de estar tomando esses ansiolíticos e antidepressivos que são muito fortes já atrapalha o meu dia a dia, porque eu teria que ter paciência e eu não tenho, a minha filha me chama para brincar com ela e eu não tenho paciência... eu não consigo ficar quieta com ela para brincar, para me divertir com ela. Eles [família] querem sair e eu não quero sair, a minha vontade é só ficar aqui dentro de casa, eu saio para buscar ela na escola, pra eu ir ao médico, pra eu ir ao advogado, mas eu detesto sair, eu não gosto... e eles [filhos] são crianças, eles querem sair. Faz dois anos que eu não vou ao clube com eles, eu não saio, eu não gosto. Então não compensa, eu falo para qualquer pessoa: não faz isso com a sua vida, é uma tristeza, porque eu tenho trinta e oito anos, nova, meu marido sofre muito com isso, porque ele sofre? Porque meu marido gosta de passear, ele gosta muito de passear, chega sexta feira ele quer passear e vai me dando tristeza. Porque ele quer sair e eu não vou, então eu falo para ele sair 111 sozinho, eu não vou, eu não vou, não vou mesmo [...] Não tem jeito de te falar. Destrói a gente por dentro. Porque você dá a vida, você trabalha com honestidade, trata os clientes com o maior amor... Daí depois no final das contas você se sente um lixo” (entrevistado 9). O depoimento revela como os bancários são consumidos pelo trabalho no banco, tornando claro que “o futuro da empresa não precisa deles, o que os coloca na situação de sujeitos descartáveis que experimentam o desamparo frente ao seu próprio futuro” (GRISCI, 2001, p. 83). É o que Verthein (1996) denominou de “uso e abuso do corpo útil”, de tal forma que as instituições caracterizam seu trabalhador como “objeto-descartável, a saúde como suporte do corpo-útil e a naturalização do uso e abuso do corpo no trabalho” (VERTHEIN, 1996, p. 80). A realidade nos bancos a partir do “desenvolvimento tecnológico a serviço do capital transforma grande parte da força de trabalho bancária em coisa descartável, tornada desnecessária ao processo avassalador de auto-valorização do capital” (JINKINGS, 1995, p. 101). Assim, nessa lógica exploratória quando o “corpo útil” fica doente, decorrente do próprio trabalho, ele se torna incompatível com o mundo do trabalho, sendo o corpo que outrora servia, agora desprezado. As consequências na vida social desses trabalhadores são marcas impostas pelo trabalho, encerrando precocemente uma vida produtiva e alterando a normalidade social. A desmotivação ‘por fazer carreira’ dentro da instituição X é agravada ainda por problemas enfrentados na rotina dos bancários. O aumento das exigências de qualificação, a pressão por cumprir metas, as inconstâncias gerando inseguranças, a sobrecarga de trabalho e muito além da degradação do status da profissão, a destituição do ‘saber fazer’, são elementos responsáveis pelo sofrimento no trabalho bancário. O desinteresse está presente nos trechos dos bancários entrevistados: “[trabalho no banco, seguir carreira] É tudo que eu não quero. Quando eu entrei, eu acreditei que se eu trabalhasse certinho, não teria erro, eu poderia ficar tranquilo, teria uma carreira” (entrevistado 2). “[seguir carreira?] De jeito nenhum, tanto que eles me propuseram transferência pra melhorar o cargo eu teria que ir pra Ituiutaba e eu não quis por conta das crianças e do meu marido [...] Porque a gente sabe que a partir do momento que talvez a coisa não balance pro 112 seu lado, você está fora, então não vale a pena de jeito nenhum. Eu tenho muita vontade de sair. Andei procurando alguma coisa para montar, só que fica aquele medo, aquele dinheirinho que você juntou você aplicar numa coisa que não dá certo... vou deixar de ter aquele o meu certo no fim do mês, aquele meu ticket, aquele meu plano de saúde... então me bate uma insegurança, mas a vontade de sair é imensa” (entrevistado 6). A recusa pelo retorno ao trabalho também ocorre por parte dos bancários afastados por motivos de saúde, por não se sentirem assegurados por meios legítimos que garantam a sua reeducação e readaptação profissional. Como aponta o estudo sobre o retorno dos bancários portadores de LER de Gravina e Rocha (2006), o retorno ao trabalho, após o período de afastamento, é resguardado pela Constituição Federal e deve proporcionar a volta do segurado ao mercado de trabalho (GRAVINA; ROCHA, 2006). Mas o descumprimento às leis e o desrespeito aos direitos dos trabalhadores é uma realidade experimentada pelos bancários da instituição X. A condenação à demissão instantânea pelos afastados é relatada no depoimento do entrevistado: “Eu não sei. Eu não sei como que vai ser esse processo [afastamento-retorno]. Eu sei que se for o caso de voltar, eles vão me demitir com certeza, não tenho dúvidas disso, eles vão me demitir. Aí depois eu não sei... eu não sei o que vai ser da minha vida [...] ele [sindicato] me disse: ‘você não volta porque se você voltar eles [o banco] vão te demitir’. E aconteceu isso com uma colega nossa...” (entrevistado 9). O trabalho no banco significou, para a maioria dos entrevistados, assumir, inconscientemente, várias perdas, como o comprometimento nas rotinas e nos relacionamentos familiares, falta de tempo para dedicarem a outras atividades que traziam prazer e reflexos negativos na vida pessoal. O sentimento de arrependimento assola, principalmente, os bancários que foram acometidos por alguma lesão decorrente do seu trabalho. Uma carreira de dedicação, sacrifícios e concessões, para no fim ter a sensação de ‘que tudo foi em vão’, como mostra o trecho a seguir: “Arrependo, eu poderia ter estudado outra coisa, ter hoje outra profissão. Duro que agora doente eu não consigo emprego nenhum. Hoje eu tiro meu extrato, meu saldo no caixa 113 eletrônico para não ter que entrar em uma agência. Só de passar na porta eu sinto mal” (entrevistado 2). As transformações experimentadas pelos bancários exprimem o caráter instável de tal profissão, evoluindo, de acordo com a descrição de Grisci (2001), “da idéia de linearidade/previsibilidade à idéia de rizoma/bifurcações, encontra-se, então, um sujeito a indicar uma trama complexa que envolve a passagem de regimes temporais das estabilidades e das certezas, para regimes temporais das instabilidades e das incertezas” (GRISCI, 2001, p. 87). A certeza do futuro longe dos bancos é a expectativa dos jovens bancários para viverem além dessas incertezas: “Não, fazer carreira no banco não quero não. Pretendo sair. Direito [curso superior] eu não sei se vou completar, mas eu pretendo pelo menos me formar, eu estou no terceiro período de Direito já, só que não tenho certeza se eu ainda quero isso, se eu quero isso realmente. Mas seguir carreira no banco eu não pretendo” (entrevistado 7). 6.7 SAÚDE MENTAL: PRINCIPAL PROBLEMA NA PERSPECTIVA DOS BANCÁRIOS Em quase todas as entrevistas, é possível notar que os depoimentos estão sempre carregados de um recente e preocupante sofrimento na rotina bancária. O adoecimento mental e todos os efeitos que ele provoca são eleitos pelos entrevistados como o principal problema hoje vivido pela categoria. Admitir que o trabalho seja responsável pelo adoecimento de trabalhadores ainda é causa de sérias polêmicas, a dificuldade aumenta ainda mais quando se trata do adoecimento mental. Mas já existem muitas evidências que dão conta da existência de formas de desgaste mental, afetando um grande contingente de trabalhadores pertencentes às mesmas categorias profissionais, empresas ou submetidos a condições semelhantes de trabalho. Os estudos de Lima (2006) confirmam efetivamente a presença de quadros favorecidos pelas condições de trabalho, como “quadros depressivos e de fadiga nervosa, síndrome do pânico, transtornos 114 relacionados ao alcoolismo, estados de estresse pós-traumático, transtornos orgânicos de personalidade, dentre outros” (LIMA, 2006, p. 63). Sato (2003), afirma que, além de oferecerem risco para o desenvolvimento dos distúrbios físicos, as condições de trabalho também muito provavelmente afetam a saúde mental dos trabalhadores (SATO, 2003). As estatísticas alertam e os números assustam: as doenças mentais são responsáveis por cinco das dez maiores causas de afastamento do trabalho (BRASIL, 2009) e os transtornos mentais e de comportamento já ocupam o terceiro lugar entre as causas de afastamento do trabalho (JACQUES, 2006). “Eu acho o desgaste mental, a cobrança que a gente tem, entendeu, de cumprir essas metas, isso na realidade é uma pressão que não é só o funcionário, o gerente sofre, o chefe de não sei o quê, o gerente de não sei o quê... o negócio [pressão] vem de cima e todo mundo tem a sua dose de pressão. Essa pressão, eu entendo que quanto mais ele [banco] quer, mais ele cobra... o pior que eu acho é a pressão e o estresse que a gente sofre lá [dentro do banco]... mas eu acho que é por causa da pressão (entrevistado 5).” À medida que a aplicação da tecnologia nas agências bancárias se torna cada vez mais avançada, sérios problemas no campo da saúde são acarretados no ambiente laboral. Segundo Gravina e Rocha (2006), tanto o processo de automação quanto as redefinições de perfil no modo de trabalhar bancário são responsáveis pelo processo de adoecimento dos seus trabalhadores. Face às mudanças, aumentam as queixas e reclamações em relação às tensões, estresses e pressões sofridas dentro das instituições (GRAVINA; ROCHA, 2006). Maciel, et. al. (2007) compartilham da mesma opinião quando descrevem a situação dos bancários da atualidade que vivem uma transformação que os colocam “frente a frente às novas formas de organização do trabalho” (MACIEL, et. al., 2007, p. 119). A submissão às jornadas de trabalho mais longas, cumprimento de metas abusivas, pressão por produção e controle incisivo sobre os tempos de trabalho corroboram para o estresse e o sofrimento mental (MACIEL, et. al., 2007). A grande maioria dos bancários fez menção ao fato da presença contínua de pressão sobre eles no ambiente de trabalho, o que, poderia repercutir em sua saúde mental, como mostra a repetição nos trechos dos relatos obtidos: 115 “[...] todo mundo que trabalha lá é meio louquinho, todo mundo é meio estressadinho. É o estresse, a cobrança que gera o estresse, a correria que gera o estresse, tudo que gera o estresse, acho que o pior problema hoje é o estresse” (entrevistado 6). “[...] o desgaste mental com certeza é muito grande, isso eu não sei explicar, qual é o motivo do desgaste mental, não sei se é por causa de cobranças, de chamada de atenção, pressão...” (entrevistado 7). “Cobrança, certeza... cobrança em cima de cobrança, eles te passam uma coisa, você cumpre, depois eles já vêm com mais coisa do que era antes, é cobrança em cima de cobrança, estressa muito [...]” (entrevistado 8). “São as metas e a pressão psicológica que afetam a gente psicologicamente. É o que mais afeta, com certeza” (entrevistado 9). “Eu acho que é a pressão das vendas, que é o principal problema, cumprir metas. E também essa coisa de serem poucos funcionários e mesmo com essa automação das coisas ainda tem muito trabalho e sobrecarrega quem trabalha na instituição” (entrevistado 10). A existência de sofrimentos mentais decorrentes do trabalho bancário é agravada pela convivência do sentimento de medo diante da imprevisibilidade e insegurança. Segundo Castelhano (2005), o medo está presente nas organizações e está relacionado, principalmente, ao fato de não conseguir manter o desempenho exigido pelas novas gestões, às demissões instantâneas e à falta de garantia dos direitos (CASTELHANO, 2005). A fragilidade dos bancários pode ser expressa por Jacques (2006), quando afirma que a “vivência do medo é sempre uma experiência subjetiva que diz respeito a um sujeito singular, com uma história de vida também singular” (JACQUES, 2006, p. 153). Como ilustra o depoimento abaixo, todos, inclusive os níveis hierárquicos mais elevados, são continuamente agredidos com as incertezas e inseguranças de se trabalhar na instituição X: “Olha eu acho que o principal problema hoje é o medo do bancário, talvez seja esse tipo de demissão instantânea, a incerteza do amanhã, você não ter um lugar pra você 116 trabalhar [...] o maior medo hoje talvez seja essa insegurança, de hoje está trabalhando e amanhã você às vezes está sem esse trabalho [...]” (entrevistado 3). Com os quadros de insatisfações e os estados de tristezas, a identidade do trabalhador é esvaziada. A partir da implantação de novas gestões embasadas na “visão mecanicista”, assim descrita por Silva e Másculo (2002) e na “caça aos clientes”, denominada por Blass (1993, p. 83), são exigidos dos bancários “ritmo de trabalho acelerado, trabalhos fragmentados sem pausas regulares, horas extras não remuneradas, rapidez no atendimento ao cliente, pressão hierárquica e instabilidade no emprego” (SILVA; MÁSCULO, 2002, p. 2). De acordo com Jacques e Amazarray (2006), “a identidade de trabalhador é ameaçada, os atributos de valor a ela associados se desfazem e a identidade psicológica tem dificuldade de se reconstruir a partir de outros parâmetros” (JACQUES, AMAZARRAY, 2006, p. 96). Realidade que propicia a interpretação mesmo de quem ainda tem muito pouco tempo de banco: “Essa parte de ter que fazer, ter que abrir contas, ter que vender, ser mandado embora, tudo isso pesa muito. Mas eu estou tranquilo, estou novo ainda, fico pensando no pessoal mais velho, gerente e tal, o cara está no final de carreira e daqui uns dias o banco tem que dispensar ele... Mas com relação a mim não, eu estou tranquilo, estou cursando a minha faculdade, se o banco me mandar embora amanhã, fazer o quê?” (entrevistado 4). 6.8 A SAÚDE FRÁGIL DENTRO DE UMA INSTITUIÇÃO SÓLIDA O adoecimento dos trabalhadores bancários não é exclusivo da sociedade contemporânea. Ribeiro (1997) reporta-se a esse fato ao mencionar as descrições de doenças que em 1.700 acometiam escriturários, feitas por Ramazzini. As LER/DORT, que acometem os bancários das modernas agências bancárias, muito se assemelham ao modo de adoecimento observado entre os escribas daquele tempo (RIBEIRO, 1997). “Quanto paradoxo!", exclamam Sznelwar e Massetti (2002), ao anunciarem o número crescente de afecções dentro dos ambientes laborais tidos como limpos. Os bancários, contrariamente aos operários e trabalhadores rurais, estão sujeitos a agentes prejudiciais a 117 saúde que não podem ser vistos ou palpados, mas que são apontados como os maiores responsáveis pelo alto índice de absenteísmo por motivos de saúde e incapacidades para o trabalho. Para os autores "não estamos mais face às doenças profissionais e ligadas ao trabalho clássicas, estamos sim, face às novas formas de sofrimento, para as quais as respostas conhecidas não tem eficácia" (SZNELWAR; MASSETTI, 2002, p. 155). A ocorrência de LER/DORT dentro da instituição X é destacada em um dos depoimentos obtidos nesta pesquisa: “Eu tive problema, na época era LER que chamava, me deu tendinite no punho, no cotovelo e no ombro. Então eu cheguei assim a ficar mal porque você não cuidava, não sabia o que quê era, vai deixando, a gente tinha medo também, vai deixando, vai empurrando com a barriga, vai fazendo de conta que não é nada, aí aquilo foi piorando, piorando, até que eu não tive mais condição porque realmente ficou feio. Aí eu fiquei parada uns seis meses e meio, fazendo fisioterapia... um monte de coisa. Aí voltei a trabalhar, não aguentei ficar mais tempo [afastada] também, porque vai indo você fica até meio deprimida, porque é uma coisa que não aparece, não é uma doença que todo mundo olha e vê que tem. Então tinha muito preconceito até pelos próprios colegas: ‘ah ela pode sair, ela pode andar, ela pode passear, ela pode viajar, só não pode trabalhar’ [...] então todo mundo lá trabalhando naquela loucura, acaba que fica todo mundo meio assim. Então eu voltei [...] eu fiquei seis meses e meio e voltei. Aí depois de três meses e meio, três meses que eu estava trabalhando eu tive que sair também, eu fui para trabalhar minha mão já tava inchada, meu braço ficou muito inchado, minha mão ficou roxa, aí eu cheguei era umas dez horas quando deu meio dia eu não consegui mais, porque não conseguia pegar nem na caneta para escrever. Aí eu saí para ir no pronto socorro e de lá não voltei, aí fiquei três meses e meio também afastada” (entrevistado 5). A invisibilidade, como relatada pelo entrevistado, é uma característica das LER/DORT e por isso se torna particularmente difícil de ser reconhecida, pelo próprio bancário como por terceiros - familiares, amigos e colegas de trabalho. Tais doenças, de acordo com Lima (1997), são configuradas de “ordem subjetiva, uma experiência absolutamente individual, imensurável, intocável e invisível” (LIMA, 1997 apud BORSOI; SANTOS; ACÁRIO, 2006, p. 3). E por conta dessa caracterização desencadeia outro aspecto abordado pelo entrevistado, o preconceito. A desconfiança e a falta de informações impedem a completa aceitação social 118 da condição do trabalhador doente. Por temer toda essa situação, Penella (2000) aponta a postura de negação e ocultação adotada pelo trabalhador ao apresentar os primeiros sintomas da doença (PENELLA, 2000). Através da incorporação tecnológica o trabalho certamente evoluiu, segundo a visão de Brandão, Horta e Tomasi (2005), no sentido de alcançar cada vez mais a produtividade, fortalecida pela automatização e especialização. Novo contexto que obriga o bancário a trabalhar sob inadequados movimentos, ditados por um ritmo acelerado e condições que frequentemente estão relacionados aos distúrbios musculoesqueléticos (BRANDÃO; HORTA; TOMASI, 2005). A presença preocupante de casos de doenças ocupacionais dentro das agências bancárias, como forma de revelação das mudanças constantes, as quais não trazem melhorias para esse setor (RIBEIRO, 1999), é ilustrada nos depoimentos dos bancários: “Ano passado fiquei afastada quatro meses, por causa de tendinite nos braços, bíceps, ombro. Caixa por vinte e quatro anos. Então, graças a Deus foi tudo bem, não tive problema... claro que eu acho que se eu não fosse do sindicato93, eles iam dar um jeitinho de me descartar. Porque uma vez afastada por essa doença não tem cura, é uma doença que vai estar sempre. E eu vou tentando trabalhar, igual eu falo... e o pior é que eu não consigo diminuir o meu ritmo, eu tento ser mais lenta, mas eu não consigo. Então tem dias que eu sofro dores, e eu sei que eu não vou conseguir chegar até o final, mas...” (entrevistado 10). “[...] em 2003 eu estava no caixa, pressão, eu saia de lá nove horas da noite, aí eu passei mal, fiquei internada onze dias com problema de dor de cabeça muito forte. Aí comecei a tomar remédios, porque eu não conseguia dormir, a tensão, dor na nuca, dor de cabeça, aí eu comecei a tomar os remédios: rivotril, captopril, miozan, relaxante muscular e um antidepressivo, fiquei três anos tomando esses medicamentos e fazendo esse tratamento. Estava atrapalhando a minha vida pessoal, principalmente o antidepressivo que atrapalha 93 A estabilidade do representante sindical está prevista no artigo 543 § 3.º da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho): Art. 543 - O empregado eleito para cargo de administração sindical ou representação profissional, inclusive junto a órgão de deliberação coletiva, não poderá ser impedido do exercício de suas funções, nem transferido para lugar ou mister que lhe dificulte ou torne impossível o desempenho das suas atribuições sindicais (BRASIL, Decreto-Lei n.º 229, de 28/02/67, DOU 28/02/67). § 3º - Fica vedada a dispensa do empregado sindicalizado ou associado, a partir do momento do registro de sua candidatura a cargo de direção ou representação de entidade sindical ou de associação profissional, até 1 (um) ano após o final do seu mandato, caso seja eleito inclusive como suplente, salvo se cometer falta grave devidamente apurada nos termos desta Consolidação (BRASIL, Lei n.º 7.543, de 02/10/86, DOU 03/10/86). 119 completamente... aí eu parei de tomar os remédios, só que de lá para cá eu não consegui mais, eu sou dependente completamente de ansiolítico e antidepressivo, eu não consigo ficar sem. Aí eu fiz o tratamento, voltei a trabalhar e depois em 2006 foi que começou o meu problema na coluna, eu tenho protusão discal na cervical, três hérnias de disco lombar, tendinite nos meus dois ombros... e síndrome do túnel do carpo do lado direito. Então de lá pra cá eu passei mal duas vezes no banco, eu senti o meu lado direito adormecer, minha boca formigar... tudo, daí meu marido me pegou no banco, liguei pro meu marido e o meu marido me levou pro hospital, fiz o tratamento, a ressonância e tudo. Aí ficou comprometido, a hérnia de disco cervical pinça o nervo que corresponde o meu lado direito. Em 2006 me deu a hérnia lombar, voltei a trabalhar e agora em novembro de 2007 foi o que deu o meu lado direito todo comprometido. Aí eu afastei [...]” (entrevistado 9). Ribeiro (1999), em seu estudo sobre a violência oculta na atividade bancária, revelou a dor física acrescida aos sentimentos de perda da capacidade e medo da incapacidade, também gerados pelas LER/DORT, fornece a base para o surgimento do sofrimento mental dentro dos bancos (RIBEIRO, 1999). Como demonstra o caso do bancário a seguir: “Já foi diagnosticado Síndrome do Pânico, estresse, depressão forte... mas eu não sei bem o quê eu tenho... Eu só quero ficar em casa deitado. Não posso ver um sofá que logo deito. Quando chego aos lugares eu fico assim, uma meia hora até eu poder me acalmar” (entrevistado 2). Há outra questão suscitada na abordagem das questões de saúde no trabalho bancário. Os trabalhadores, que conseguem retornar ao trabalho e manter seu emprego após um afastamento médico, são muitas vezes, subestimados e/ou desacreditados e esquecidos na execução de funções inespecíficas e sem valor. O retorno dos que foram acometidos por LER/DORT representa um problema para a instituição X, pois tais trabalhadores não podem ou podem com restrição executar tarefas repetitivas e monótonas, sendo que a maioria das funções bancárias se enquadra exatamente nessa descrição. Após o retorno ao afastamento por doença ocupacional, “o medo e a vergonha do bancário que pode permanecer na empresa é o de viver constantemente o que um trabalhador chamou de ‘síndrome do canto’, uma vivência que soma ao sentimento de inutilidade a experiência do isolamento... (BORSOI, SANTOS, ACÁRIO, 2006, p. 16). 120 “Lá no banco não tem outra função que eu possa fazer que não tenha que digitar, porque hoje tudo dentro do banco é tudo digitação. Então para eu mudar de setor não ia adiantar e para eu não ficar igual muita gente em muitos bancos, que ficam quando tem esse tipo de doença [LER/DORT], cria uma certa estabilidade por causa dela, deixam a pessoa ficar de lado. Então eu prefiro ficar na minha função e trabalhando devagarzinho, a ter que ser um peso dentro do banco” (entrevistado 10). Outra situação vivida dentro da instituição X é o caminho tortuoso da burocracia advindo das rotinas médicas e previdenciárias. Sofrimento agravado, segundo Jacques (2006), ao se tratar de doenças particularmente invisíveis, como as LER/DORT e as doenças mentais. A vida dos bancários acometidos passa a se restringir apenas a realização de exames, tratamentos e perícias médicas (JACQUES, 2006). O estudo de Penella (2000) revela que no enfrentamento dos empecilhos legais, para comprovar seu sofrimento, os bancários são submetidos às situações de humilhações e crueldades, “[...] é a burocracia que se deve vencer para ter garantido o acesso aos benefícios conquistados coletivamente” (PENELLA, 2000, p. 113), como mostra o depoimento do bancário em processo de afastamento por motivos de saúde: “Então o INSS me deferiu e eu pedi uma reconsideração novamente no INSS. Aí na perícia a perita ainda falou para mim de cara: ‘olha eu quero que você me entenda, porque aqui dentro eu cumpro uma lei. Infelizmente eu tenho que te deferir, procura os seus direitos’. Aí eu falei: ‘mas que lei é essa sua? Se tem uma lei para você também vai ter uma lei para me proteger’. Ela falou: ‘com certeza, mas, por favor, é uma lei que eu cumpro’. Infelizmente foi o que eu ouvi [...] Esse processo é muito dolorido. Esse processo também mexendo com o advogado, a gente passa muita humilhação, não com o advogado porque ele é muito... mas esse negócio com INSS, é muito humilhante. Com o pessoal do banco é muita humilhação se você precisa de um favor: ‘ah eu não posso, se você quiser ligar, liga você em São Paulo no RH. Ai você liga no RH, ai eles falam assim:’ escuta mas porque você está ligando? Isso é serviço deles lá’. Então eu não sei, isso é um desgaste. Você não sabe pra quem reclamar...” (entrevistado 9). O mercado capitalista quer comprar do trabalhador sua capacidade de trabalho em horas, com a condição de que ele esteja disposto a vender também sua capacidade técnica e 121 negociar sua saúde para a execução de atividades. Consequentemente, o trabalhador que possui qualquer comprometimento em sua saúde terá dificuldades em participar desse seleto mercado de trocas, afetando diretamente as suas condições de vida (PENELLA, 2000). No encerramento desta discussão evidencia-se que os dados obtidos nesta pesquisa corroboram com os resultados encontrados em outros trabalhos acerca da temática que, envolve as condições do trabalho bancário agravadas principalmente pela intensificação, desvalorização, instabilidade e redefinição do perfil profissional, culminando no adoecimento físico e mental desses trabalhadores. 122 CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa teve por objetivo conhecer as condições de trabalho de bancários empregados da instituição X no município de Uberaba, MG, na tentativa de determinar em que medida as mudanças na organização do trabalho adotadas a partir do processo de reestruturação produtiva interferiram ou continuam a interferir em sua saúde. No Brasil, o processo de trabalho nos bancos sofreu profundas mudanças com a adoção de sistemas automatizados e com a informatização. A essas tecnologias, largamente difundidas no setor a partir da década de 1980, se somaram as privatizações, a desnacionalização do setor, a terceirização e a adoção de novas formas de gestão da força de trabalho, mudanças que continuaram a ocorrer, de forma mais acelerada, na década seguinte. Do ponto de vista do capital essas mudanças, que integram o processo de reestruturação produtiva, resultaram em aumento da produtividade e lucratividade do setor. Por outro lado, do ponto de vista do trabalho, se verificou enorme redução de postos de trabalho, intensificação de seu ritmo, sobrecarga de tarefas, aumento do controle e pressão sobre os trabalhadores, o que repercutiu fortemente nas condições de trabalho e na saúde dos trabalhadores do setor: o pioneirismo da automatização e da informatização não tardou em cobrar seu preço – rapidamente o setor financeiro brasileiro tornou-se pioneiro também no registro de casos de LER/DORT, doença estreitamente relacionada à intensificação do trabalho. A grande redução dos postos de trabalho intensificou o volume de trabalho para os que continuaram nos bancos, assim como para os novos contratados. O aumento da pressão sobre os trabalhadores, expresso pela necessidade de cumprir metas cada vez mais difíceis e o recorrente desrespeito à jornada de trabalho agravaram a saúde física e mental dos bancários. A história da instituição X dá continuidade a história do setor financeiro nacional e suas tendências mercadológicas, e consequentemente, apresenta também o enfrentamento de todos os problemas que afetam os trabalhadores decorrentes dos novos rumos adotados. Os dados obtidos nas entrevistas provocam a reflexão acerca de questões já observadas na literatura pesquisada e que, portanto, se repetem no ambiente laboral do objeto de estudo, bem como revelam novas tendências a serem seguidas. Para compreender o impacto da reestruturação produtiva sobre o trabalho bancário fez-se necessária a comparação entre o ofício de antigamente e o “bancário vendedor” dos dias de hoje, de forma a permitir a constatação do empobrecimento das tarefas e da perda do 123 valor atribuído ao ofício bancário. Partindo desse pressuposto observou-se um declínio no investimento e formação profissional dentro do banco. A desmotivação é apontada nos depoimentos tanto dos jovens, recém contratados, quanto dos que já têm anos de experiência profissional. Para os bancários com maior tempo de exercício profissional, predominam em seus relatos, os sentimentos de arrependimento e frustração, por se dedicarem tanto tempo de suas vidas ao desempenho de suas atividades dentro do banco. A carreira bancária, considerada hoje de futuro incerto, não assegura aos bancários condições estáveis e os descartam, quase sempre, no final de suas vidas produtivas sem chances de retornarem ao mercado de trabalho. Considerando que as atividades bancárias possuem características específicas, os bancários demitidos se tornam ainda estigmatizados como profissionais, os “desbancarizados”94, apresentando maior dificuldade de recolocação em outras atividades profissionais. Com a reestruturação nos bancos ocorreu à redefinição de funções tradicionais e o aumento, em larga escala, do trabalho de estagiários, mudanças que também atingiram os trabalhadores entrevistados nesta pesquisa. A maioria dos entrevistados, tanto aqueles com vários anos de experiência profissional quanto os jovens recém contratados, afirmaram que o trabalho bancário perdeu seu status, e sofreu, conforme os relatos, uma redefinição de perfil: “hoje somos vendedores”, “o bancário nada mais é que vendedor de produtos”, “o banco está mais interessado em vender produtos que servir ao cliente”. Para muitos dos jovens bancários essa atividade profissional é encarada apenas como forma de ingresso no mercado de trabalho, a partir do qual tentam “alavancar” outros objetivos profissionais. No entanto, são esses jovens que vêm apresentando índice crescente de adoecimento por doenças ocupacionais nesse setor. De uma situação considerada temporária muitos se tornam “marcados” por toda a sua trajetória profissional. Outras questões relativas às condições de trabalho do bancário ficaram evidenciadas nesta pesquisa. O aculturamento, largamente implantado dentro das agências bancárias, é friamente manipulado para a minimização das resistências à adoção de práticas de gestão capitalista, sendo determinante para eficácia e sucesso dos programas implantados. Como estratégia mercadológica, na instituição X o intenso processo de institucionalização visa o comprometimento e a adesão incondicional de todos, atingidos em toda escala hierárquica, sem distinção. Incorporar uma filosofia que muitas vezes contradiz o que o bancário acredita, faz parte do processo natural de integração interna, conhecido como “vestir a camisa”. As 94 Expressão utilizada por COSTA (2001). 124 reais exigências se tornam claras nos depoimentos dos entrevistados, entretanto não são nem um pouco explícitas, ou talvez conscientes, para quem dedica a trabalhar horas por uma vida inteira sob pressão e estresse máximos. Os depoimentos revelaram o aumento da pressão e do controle sobre os trabalhadores, a maioria demonstrou-se preocupada com a pressão psicológica sofrida, principalmente no que se refere ao cumprimento de metas. Expressões como desgaste mental, estresse, depressão, pressão psicológica, medo, incerteza e insegurança estiveram presentes na maioria dos depoimentos. A questão das LER/DORT também foi por eles abordada. No que se refere ao significado atribuído ao trabalho, foi possível constatar a perda dos sentimentos de valorização e reconhecimento por meio da realização das tarefas bancárias. Para os bancários entrevistados o trabalho hoje representa o esvaziamento da identidade profissional e a perda do seu crescimento pessoal, sendo fonte de sofrimentos e descontentamentos que geram os atuais sofrimentos físicos e psíquicos. Apesar dos jovens bancários considerarem a sua atividade profissional como provisória observou-se que, como os bancários da década de 1960, esses trabalhadores estão permanecendo empregados por um tempo maior do que aquele que previam ao serem admitidos no banco. O que distingue esses jovens dos dias atuais dos tradicionais da década referida é a constituição de uma carreira profissional sem pretensão e vontade, mediante apenas a falta de melhores oportunidades de emprego e salário. Pode-se depreender, a partir dos dados obtidos nesta pesquisa que a introdução de novas tecnologias e inovações organizacionais foi apontada como responsável pela redefinição de postos, tarefas, maneiras de agir e de pensar dentro das agências e principalmente a desvalorização do profissional. Apesar de serem requisitos do novo perfil do trabalhador bancário: assumir tarefas diferenciadas, ter flexibilidade nos horários e maior responsabilidade, observa-se um empobrecimento do seu ofício. Monstruosos investimentos, aquisições e movimentações milionárias dos bancos, paradoxalmente, para tanta desvalorização das qualificações do seu patrimônio humano. Entretanto, não se pode deixar de ressaltar as questões relativas à saúde e ao adoecimento que estão imbricadas nesse contexto de mudanças. É através da compreensão, de como é a organização do trabalho e de como se dá a sua exploração, que é possível estabelecer as relações entre saúde e trabalho. E assim, na busca por compreender o processo de adoecimento físico e mental dos bancários foi fundamental apontar a reestruturação produtiva e todas as suas consequências no mundo do trabalho, de forma a determinar as novas implicações na saúde desses trabalhadores. 125 REFERÊNCIAS ABREU, Alice Rangel de Paiva; SORJ, Bila. O emprego feminino no setor bancário: inovações tecnológicas e práticas de estabilização. In: LAVINAS, LENA; LEON, F. (Orgs) Emprego feminino no Brasil: mudanças institucionais e novas inserções no mercado de trabalho. Santiago do Chile: Cepal/ECLAT, OIT. Séries Políticas Sociales, cap. III, v. 2, p. 59-79, set. 2002. ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: Ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo: Boitempo, 1999. 264 p. ________. Excurso sobre a centralidade do trabalho: a polêmica entre Luckács e Habermas. In: ANTUNES, Ricardo. 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Os avanços na área da saúde ocorrem através de estudos como este, por isso a sua participação é importante. O objetivo deste estudo é investigar as condições de trabalho dos bancários da cidade de Uberaba-MG, para conhecer em que medida as formas de organização e divisão do trabalho, tal como se encontram hoje, interferem na saúde dos trabalhadores e quais são suas principais queixas. E caso você participe, será necessária a sua disponibilidade para conceder uma entrevista gravada, a qual será realizada em seu próprio domicílio. Você poderá ter todas as informações que quiser e poderá não participar da pesquisa ou retirar seu consentimento a qualquer momento, sem nenhum prejuízo. Pela sua participação no estudo, você não receberá qualquer valor em dinheiro, mas terá a garantia de que todas as despesas necessárias para a realização da pesquisa não serão de sua responsabilidade. Seu nome não aparecerá em qualquer momento do estudo, pois você será identificado com um número e também não será identificado em nenhuma publicação que possa resultar deste estudo. Eu, ____________________________________________________, fui informado (a) dos objetivos da pesquisa acima de maneira clara e detalhada e compreendi para que serve o estudo e qual procedimento a que serei submetido. Eu entendi que sou livre para interromper minha participação a qualquer momento, sem justificar minha decisão e que isso não me afetará. Sei que meu nome não será divulgado, que não terei despesas e não receberei dinheiro por participar do estudo. Declaro que concordo em participar desse estudo. Recebi uma cópia deste termo de consentimento livre e esclarecido e me foi dada a oportunidade de ler e esclarecer as minhas dúvidas. Uberaba, ......../ ........./ ......... ______________________________ Assinatura do pesquisador responsável Contato: (34) 33137326 _______________________________ Assinatura do voluntário _________________________________ Assinatura do pesquisador orientador Contato: (16) 36306536 141 ANEXO A - Resolução 3.110 - Consolidação das Normas de Correspondente Bancário RESOLUÇÃO 3.110 Altera e consolida as normas que dispõem sobre a contratação de correspondentes no País. O BANCO CENTRAL DO BRASIL, na forma do art. 9º da Lei 4.595, de 31 de dezembro de 1964, torna público que o CONSELHO MONETÁRIO NACIONAL, em sessão realizada em 31 de julho de 2003, com base nos arts. 3º, inciso V, 4º, incisos VI e VIII, 17 e 18, § 1º, da referida Lei e 14 da Lei 4.728, de 14 de julho de 1965, RESOLVEU: Art. 1º Alterar e consolidar, nos termos desta resolução, as normas que dispõem sobre a contratação, por parte de bancos múltiplos, de bancos comerciais, da Caixa Econômica Federal, de bancos de investimento, de sociedades de crédito, financiamento e investimento, de sociedades de crédito imobiliário e de associações de poupança e empréstimo, de empresas, integrantes ou não do Sistema Financeiro Nacional, para o desempenho das funções de correspondente no País, com vistas à prestação dos seguintes serviços: I - recepção e encaminhamento de propostas de abertura de contas de depósitos à vista, a prazo e de poupança; II - recebimentos e pagamentos relativos a contas de depósitos à vista, a prazo e de poupança, bem como a aplicações e resgates em fundos de investimento; III - recebimentos, pagamentos e outras atividades decorrentes de convênios de prestação de serviços mantidos pelo contratante na forma da regulamentação em vigor; IV - execução ativa ou passiva de ordens de pagamento em nome do contratante; V - recepção e encaminhamento de pedidos de empréstimos e de financiamentos; VI - análise de crédito e cadastro; VII - execução de serviços de cobrança; VIII - recepção e encaminhamento de propostas de emissão de cartões de crédito; IX - outros serviços de controle, inclusive processamento de dados, das operações pactuadas; X - outras atividades, a critério do Banco Central do Brasil. § 1º A faculdade de que trata este artigo somente pode ser exercida no que se refere a serviços relacionados às atividades desenvolvidas pelas instituições referidas no caput, permitidas nos termos da legislação e regulamentação em vigor. § 2º A contratação de empresa para a prestação dos serviços referidos no caput, incisos I e II, depende de prévia autorização do Banco Central do Brasil, devendo, nos demais casos, ser objeto de comunicação àquela Autarquia. 142 § 3º As funções de correspondente podem ser desempenhadas por serviços notariais e de registro, de que trata a Lei 8.935, de 18 de novembro de 1994. Art. 2º É vedada à instituição financeira a contratação, para a prestação dos serviços referidos no art. 1º, incisos I e II, de empresa cuja atividade principal ou única seja a prestação de serviços de correspondente. Parágrafo único. A vedação de que trata este artigo aplica- se à hipótese de substabelecimento do contrato a terceiros, total ou parcialmente. Art. 3º Depende de prévia autorização do Banco Central do Brasil a contratação, por parte de instituição financeira, para a prestação de qualquer dos serviços referidos no art. 1º, de empresa que utilize o termo -banco- em sua denominação social ou no respectivo nome de fantasia. Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se à hipótese de substabelecimento do contrato a terceiros, total ou parcialmente. Art. 4º Os contratos referentes à prestação de serviços de correspondente nos termos desta resolução devem incluir cláusulas prevendo: I - a total responsabilidade da instituição financeira contratante sobre os serviços prestados pela empresa contratada, inclusive na hipótese de substabelecimento do contrato a terceiros, total ou parcialmente; II - o integral e irrestrito acesso do Banco Central do Brasil, por intermédio da instituição financeira contratante, a todas as informações, dados e documentos relativos à empresa contratada, ao terceiro substabelecido e aos serviços por esses prestados; III - que, na hipótese de substabelecimento do contrato a terceiros, total ou parcialmente, a empresa contratada deverá obter a prévia anuência da instituição financeira contratante; IV - a vedação, à empresa contratada, de: 1. efetuar adiantamento por conta de recursos a serem liberados pela instituição financeira contratante; 2. emitir, a seu favor, carnês ou títulos relativos às operações intermediadas; 3. cobrar, por iniciativa própria, qualquer tarifa relacionada com a prestação dos serviços a que se refere o contrato; 4. prestar qualquer tipo de garantia nas operações a que se refere o contrato; V - que os acertos financeiros entre a instituição financeira contratante e a empresa contratada devem ocorrer, no máximo, a cada dois dias úteis; VI - que, nos contratos de empréstimos e de financiamentos, a liberação de recursos deve ser efetuada mediante cheque nominativo, cruzado e intransferível, de emissão da instituição financeira contratante a favor do beneficiário ou da empresa comercial vendedora, ou crédito em conta de depósitos à vista do beneficiário ou da empresa comercial vendedora; 143 VII - a obrigatoriedade de divulgação, pela empresa contratada, em painel afixado em local visível ao público, de informação que explicite, de forma inequívoca, a sua condição de simples prestadora de serviços à instituição financeira contratante. § 1º Na hipótese de substabelecimento do contrato a terceiros, devem ser observadas as disposições do art. 1º, § 2º. § 2º Alternativamente ao esquema de pagamento previsto no inciso VI, a liberação de recursos poderá ser processada mediante cheque nominativo, cruzado e intransferível, de emissão da empresa contratada, atuando por conta e ordem da instituição financeira contratante, a favor do beneficiário ou da empresa comercial vendedora, desde que, diariamente, o valor total dos cheques emitidos seja idêntico ao dos recursos recebidos da instituição financeira contratante para tal fim. Art. 5º As empresas contratadas para a prestação de serviços de correspondente nos termos desta resolução estão sujeitas às penalidades previstas no art. 44, § 7º, da Lei 4.595, de 964, caso venham a praticar, por sua própria conta e ordem, operações privativas de instituição financeira. Art. 6º Fica o Banco Central do Brasil autorizado a baixar as normas e a adotar as medidas julgadas necessárias à execução do disposto nesta resolução. Art. 7º Esta resolução entra em vigor na data de sua publicação. Art. 8º Ficam revogados a Resolução 2.707, de 30 de março de 2000, e o art. 2º da Resolução 2.953, de 25 de abril de 2002, passando a base regulamentar e as citações à norma ora revogada, constantes de normativos editados pelo Banco Central do Brasil, a ter como referência esta resolução. Brasília, 31 de julho de 2003. Henrique de Campos Meirelles Presidente 144 ANEXO B - Medida Provisória Nº 794, de 29 de Dezembro de 1994 - DOU de 30/12/94 Dispõe sobre a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados das empresas e dá outras providências. O PRESIDENTE DA REPÚBLICA, no uso da atribuição que lhe confere o art. 62 da Constituição Federal, adota a seguinte Medida Provisória, com força de lei: Art. 1º Esta Medida Provisória regula a participação dos trabalhadores nos lucros ou resultados da empresa como instrumento de integração entre o capital e o trabalho e como incentivo à produtividade, nos termos do artigo 7º, inciso XI, da Constituição Federal. Art. 2º Toda empresa deverá convencionar com seus empregados, mediante negociação coletiva, a forma de participação destes em seus lucros ou resultados. Parágrafo único. Dos instrumentos decorrentes da negociação deverão constar regras claras e objetivas quanto à fixação dos direitos substantivos da participação e das regras adjetivas, inclusive mecanismos de aferição das informações pertinentes ao cumprimento do acordado, periodicidade da distribuição, período de vigência e prazos para revisão do acordo, podendo ser considerados, entre outros, os seguintes critérios e condições a) índices de produtividade, qualidade ou lucratividade da empresa; e b) programas de metas, resultados e prazos, pactuados previamente. Art. 3º A participação de que trata o artigo 2º não substitui ou complementa a remuneração devida a qualquer empregado, nem constitui base de incidência de qualquer encargo trabalhista ou previdenciário. § 1º Para efeito de apuração do lucro real, a pessoa jurídica poderá deduzir como despesa operacional as participações atribuídas aos empregados nos lucros ou resultados, nos termos da presente Medida Provisória, dentro do próprio exercício de sua constituição. § 2º É vedado o pagamento de qualquer antecipação ou distribuição de valores a título de participação nos lucros ou resultados da empresa em periodicidade inferior a um semestre. § 3º A periodicidade semestral mínima referida no parágrafo anterior poderá ser alterada pelo Poder Executivo, até 31 de dezembro de 1995, em função de eventuais impactos nas receitas tributárias ou previdenciárias. § 4º As participações de que trata este artigo serão tributadas na fonte, em separado dos demais rendimentos recebidos no mês, como antecipação do Imposto de Renda devido na declaração de rendimentos da pessoa física, competindo à pessoa jurídica a responsabilidade pela retenção e recolhimento do imposto. Art. 4º Caso a negociação visando à participação nos lucros ou resultados da empresa resulte em impasse, as partes poderão utilizar-se dos seguintes mecanismos de solução do litígio: I - mediação; e II - arbitragem de ofertas finais. § 1º Considera-se arbitragem de ofertas finais aquela em que o árbitro deve restringir-se a optar pela proposta apresentada, em caráter definitivo, por uma das partes. § 2º O mediador ou o árbitro será escolhido de comum acordo entre as partes. 145 § 3º Firmado o compromisso arbitral, não será admitida a desistência unilateral de qualquer das partes. § 4º O laudo arbitral terá força normativa, independentemente de homologação judicial. Art. 5º Esta Medida Provisória entra em vigor na data de sua publicação. Art. 6º Revogam-se as disposições em contrário. Brasília, 29 de dezembro de 1994; 173º da Independência e 106º da República. ITAMAR FRANCO Ciro Ferreira Gomes Marcelo Pimentel Sérgio Cutolo dos Santos Élcio Álvares 146 ANEXO C - Ordem de Serviço INSS/DSS nº 606, de 5 agosto de 1998. ASSUNTO: Aprova Norma Técnica sobre Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - DORT. FUNDAMENTAÇÃO LEGAL: Lei nº 8.213, de 24 de julho de 1991; Decreto nº 2.172, de 05 de março de 1997. O DIRETOR DO SEGURO SOCIAL, DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, no uso das atribuições que lhe confere o Artigo 175 inciso III e Artigo 182, inciso I do Regimento Interno aprovado pela Portaria MPS nº 458, de 24 de setembro de 1992, Considerando a publicação do Edital nº INSS/DSS/01, de 09/07/97, no DOU nº 131, de 11 de julho de 1997, seção 3, e os estudos coordenados pela Divisão de Perícia Médica, da Coordenação Geral de Serviços Previdenciários, desta Diretoria. RESOLVE: 1 - Aprovar a Norma Técnica sobre Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho DORT, constituída do volume anexo, que possui duas seções: a) SEÇÃO I - Atualização clínica dos Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - DORT. a.a) Bibliografia. b) SEÇÃO II - Norma Técnica de Avaliação da Incapacidade Laborativa. 2 - Esta Ordem de Serviço entra em vigor na data de sua publicação, revogada as disposições em contrário. RAMON EDUARDO BARROS BARRETO Diretor do Seguro Social MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA E ASSISTÊNCIA SOCIAL - MPAS INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL INSS DIRETORIA DO SEGURO SOCIAL COORDENAÇÃO GERAL DE SERVIÇOS PREVIDENCIÁRIOS DIVISÃO DE PERÍCIA MÉDICA DISTÚRBIOS OSTEOMUSCULARES RELACIONADOS AO TRABALHO - DORT NORMA TÉCNICA DE AVALIAÇÃO DE INCAPACIDADE PARA FINS DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS APRESENTAÇÃO A presente atualização da Norma Técnica sobre Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - DORT objetiva simplificar, uniformizar e adequar o trabalho do médico perito ao atual nível de conhecimento desta nosologia. A evolução da Medicina do Trabalho, da Medicina Assistencial e Preventiva, dos meios diagnósticos, bem como a nova realidade social, motivaram, sobre maneira, esta atualização, 147 tornando-a mais completa e eficaz. Este estudo resultou da iniciativa da Divisão de Perícias Médicas do INSS, que buscou parceria com profissionais de diversos segmentos da sociedade, num debate aberto, visando abordar todos os aspectos técnicos relevantes sobre o assunto, no período compreendido entre junho de 1996 e novembro de 1997, com a efetiva participação de representantes da Perícia Médicas, Reabilitação Profissional, do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS; Delegacia Regional do Trabalho em São Paulo - DRT/SP - MTb e Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho - Fundacentro/MTb; Centro de Referência de Saúde do Trabalhador; Confederação Nacional das Indústrias - CNI; Central Única dos Trabalhadores CUT e Universidade de Campinas - Unicamp. Constituímos, assim, um trabalho que certamente expressa um esforço coletivo na busca de soluções justas e técnicas. A metodologia utilizada teve como princípios fundamentais o trabalho em equipe e o interesse em transformar esta Norma num instrumento facilitador, que dê respostas seguras às questões médico-periciais. Ressaltamos que a proposta, resultante do trabalho elaborado em parceria, foi submetida à apreciação da Comissão Tripartite Paritária Permanente - CTPP, em maio de 1997, para análise e sugestões. Dessa concepção surgiram dois momentos que passaram a constituir os módulos do presente trabalho: Atualização Clínica da Doença Enfocada - Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - DORT (Seção I) e Norma Técnica de Avaliação da Incapacidade Laborativa em Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - DORT (Seção II). A Seção I resultou de um trabalho participativo entre vários segmentos da sociedade reunidos em São Paulo por iniciativa do Instituto Nacional do Seguro Social, quando discutiram os vários aspectos do problema, produzindo subsídios de alto valor técnico que resultaram em atualização de cada patologia com vistas à reciclagem e ao aperfeiçoamento clínico, com eminente caráter pedagógico. A Seção II constitui-se da Norma Técnica de Avaliação de Incapacidade propriamente dita, ou seja, refere-se aos procedimentos, metodologia e atribuições para fins de avaliação pericial e concessão de benefícios previdenciários por incapacidade, o que compreende as repercussões da doença na capacidade laborativa. Queremos ressaltar também que esta ação tem caráter dinâmico, deixando aberta a possibilidade de futuras revisões, uma vez que novos fatos e dados podem motivá-la. SEÇÃO I ATUALIZAÇÃO CLÍNICA DOS RELACIONADOS AO TRABALHO - DORT DISTÚRBIOS OSTEOMUSCULARES 1. INTRODUÇÃO Os Distúrbios do Sistema Osteomuscular Relacionados ao Trabalho têm-se constituído em grande problema da saúde pública em muitos dos países industrializados. A terminologia “Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho” tem sido preferida por alguns autores a outras, tais como Lesões por Traumas Cumulativos - LTC, Lesões por Esforços Repetitivos - LER, Doença Cervicobraquial Ocupacional - DCO e Síndrome de Sobrecarga Ocupacional - SSO, por evitar que na própria denominação já se apontem causas definidas (como por exemplo, “cumulativo” nas LTC e “repetitivo” nas LER) e os efeitos (como por exemplo, “lesões” nas LTC e LER). 148 Apesar da adoção de nova terminologia - DORT - para fins de atualização desta norma, o uso do termo LER nesta seção justifica-se, para se manter a referência bibliográfica. As LER representam um grupo heterogêneo de quadros clínicos, alguns deles bem definidos como tenossinovite, sinovite ou epicondilite e outros mais difusos. O estigma criado em torno da LER contribui para que o paciente tenha receio em recorrer à assistência médica, a não ser quando já se encontra com dificuldade de manter o ritmo de trabalho. Somado a esta situação, o paciente enfrenta o afastamento do trabalho, o que significa geralmente perda econômica e afastamento do círculo que lhe é habitual e no qual tem um papel definido socialmente. Encontrar um tratamento que seja adequado é mais um dos desafios que acaba enfrentando. Infelizmente, a grande maioria da rede de tratamento, pública ou privada, ainda está despreparada para receber esse paciente. O mercado, que obedece à lei da quantidade e não da qualidade, geralmente oferece profissionais não-qualificados, sem informações sobre a fisiopatologia da LER, usando aparelhagem ineficaz, e sem visão e prática interdisciplinares necessárias no caso. No Brasil há uma epidemia de queixas de LER. Estatísticas dos serviços de saúde públicos e privados, e em especial os de saúde do trabalhador, mostram que em todo o País as LER ocupam posição de destaque entre a demanda. Este fato e a incapacidade para o trabalho por tempo prolongado exigem da parte dos profissionais de segurança, saúde, ergonomia e produção, sindicatos e empresas seriedade na abordagem dos diversos aspectos envolvidos, tanto na ocorrência e agravamento do quadro, como na possibilidade de diagnóstico precoce, tratamento e reabilitação adequados. 2. CONCEITO Entendemos Lesões por Esforços Repetitivos - LER como uma “síndrome clínica”, caracterizada por dor crônica, acompanhada ou não por alterações objetivas e que se manifesta principalmente no pescoço, cintura escapular e/ou membros superiores em decorrência do trabalho. O termo LER é genérico, e o médico deve sempre procurar determinar o diagnóstico específico. Como se refere a diversas patologias distintas, torna-se difícil estabelecer o tempo necessário para uma lesão persistente passar a ser considerada como crônica. Além disso, até a mesma patologia pode se instalar e evoluir de forma diferente, dependendo dos fatores etiológicos. Com todas essas limitações, o que se pode dizer é que as lesões causadas por esforços repetitivos são patologias, manifestações ou síndromes patológicas que se instalam insidiosamente em determinados segmentos do corpo, em consequência de trabalho realizado de forma inadequada. Assim, o nexo é parte indissociável do diagnóstico que se fundamenta numa boa anamnese ocupacional e em relatórios de profissionais que conhecem a situação de trabalho, permitindo a correlação do quadro clínico com a atividade ocupacional efetivamente desempenhada pelo trabalhador, donde a proposta da nova terminologia Distúrbios Osteomusculares Relacionados ao Trabalho - DORT. 3. ASPECTOS EPIDEMIOLÓGICOS Com o advento da Revolução Industrial, quadros clínicos decorrentes de sobrecarga estática e dinâmica do sistema osteomuscular tornaram-se mais numerosos. No entanto, apenas a partir da segunda metade do século, esses quadros osteomusculares adquiriram expressão em número e relevância social, com a racionalização e inovação técnica na indústria, atingindo particularmente perfuradores de cartão. Esses autores explicam a disseminação da prevalência das LER pelo aumento da carga do trabalho contínuo resultante 149 do uso inadequado de sistemas de esteiras; aumento do trabalho manual que requer movimento dos dedos, bem como movimentos repetitivos dos membros superiores; inadequação dos mobiliários; controle estrito do trabalho pela gerência e diminuição de pausas e tempo livre. Entre outros países que viveram epidemias de LER estão a Inglaterra, os países escandinavos, os Estados Unidos e a Austrália. A ocorrência das LER em grande número de pessoas em diferentes países provocou uma mudança no conceito tradicional de que o trabalho pesado, envolvendo esforço físico, é mais desgastante que o trabalho leve, envolvendo esforço mental, com sobrecarga dos membros superiores e relativo gasto de energia. Há que se lembrar de que, ao contrário de previsões feitas na década de 80, a incidência de LER vem aumentando nos países industrializados, nos quais as características da organização do trabalho de forma geral privilegiam o paradigma da alta produtividade e qualidade do produto em detrimento da preservação do trabalhador, devido à inflexibilidade e alta intensidade de ritmo, grande quantidade e alta velocidade de movimentos repetitivos, falta de autocontrole sobre o modo e ritmo de trabalho, mobiliário e equipamentos ergonomicamente inadequados. As Lesões por Esforços Repetitivos no Brasil foram primeiramente descritas como tenossinovite ocupacional. Foram apresentados, no XII Congresso Nacional de Prevenção de Acidentes do Trabalho - 1973, casos de tenossinovite ocupacional em lavadeiras, limpadoras, engomadeiras, recomendando-se que fossem observadas pausas de trabalho daqueles que operam intensamente com as mãos. A partir de 1985, surgem publicações e debates sobre a associação entre tenossinovite e o trabalho de digitação, que resultaram na publicação da Portaria no 4.062, em 6 de agosto de 1987, pelo Ministério da Previdência e Assistência Social, reconhecendo a tenossinovite como doença do trabalho. Nesta época, as Comunicações de Acidentes do Trabalho - CAT’s de tenossinovite registradas no INSS concentravam-se na função de digitadores. Posteriormente, observou-se no Brasil o surgimento de casos em diferentes ocupações exercendo atividade de risco. Por exemplo, em 1991 o Núcleo de Saúde do Trabalhador INSS/SUS/MG registrou casos de Lesões por Esforços Repetitivos nas seguintes funções: digitador, controlador de qualidade, embalador, enfitadeiro, montador de chicote, montador de tubos de imagem, operador de máquinas, operador de terminais de computador, auxiliar de administração, auxiliar de contabilidade, operador de telex, datilógrafo, pedreiro, secretário, técnico administrativo, telefonista, auxiliar de cozinha e copeiro, eletricista, escriturário, operador de caixa, recepcionista, faxineiro, ajudante de laboratório, viradeiro e vulcanizador. 4. FATORES DE RISCO O desenvolvimento das Lesões por Esforços Repetitivos é multicausal, sendo importante analisar os fatores de risco envolvidos direta ou indiretamente. A expressão "fator de risco" designa, de maneira geral, os fatores do trabalho relacionados com as LER. Os fatores foram estabelecidos, na maior parte dos casos, por meio de observações empíricas e depois confirmados com estudos epidemiológicos. Os fatores de risco não são independentes. Na prática, há a interação destes fatores nos locais de trabalho. Na identificação dos fatores de risco, deve-se integrar as diversas informações. Sobre o plano conceitual, "os mecanismos de lesão dos casos de LER são considerados um acúmulo de influências que ultrapassam a capacidade de adaptação de um tecido, mesmo se o funcionamento fisiológico deste é mantido parcialmente". Na caracterização da exposição aos fatores de risco, alguns elementos são importantes, dentre outros: 150 a) a região anatômica exposta aos fatores de risco; b) a intensidade dos fatores de risco; c) a organização temporal da atividade (por exemplo: a duração do ciclo de trabalho, a distribuição das pausas ou a estrutura de horários); d) o tempo de exposição aos fatores de risco. Os grupos de fatores de risco das LER podem ser elencados como: a) o grau de adequação do posto de trabalho à zona de atenção e à visão A dimensão do posto de trabalho pode forçar os indivíduos a adotarem posturas ou métodos de trabalho que causam ou agravam as lesões osteomusculares; b) o frio, as vibrações e as pressões locais sobre os tecidos A pressão mecânica localizada é provocada pelo contato físico de cantos retos ou pontiagudos de um objeto ou ferramentas com tecidos moles do corpo e trajetos nervosos; c) as posturas inadequadas Em relação à postura existem três mecanismos que podem causar as LER: c.1) os limites da amplitude articular; c.2) a força da gravidade oferecendo uma carga suplementar sobre as articulações e músculos; c.3) as lesões mecânicas sobre os diferentes tecidos; d) a carga osteomuscular A carga osteomuscular pode ser entendida como a carga mecânica decorrente: d.1) de uma tensão (por exemplo, a tensão do bíceps); d.2) de uma pressão (por exemplo, a pressão sobre o canal do carpo); d.3) de uma fricção (por exemplo, a fricção de um tendão sobre a sua bainha); d.4) de uma irritação (por exemplo, a irritação de um nervo); Entre os fatores que influenciam a carga osteomuscular, encontramos: a força, a repetitividade, a duração da carga, o tipo de preensão, a postura do punho e o método de trabalho; e) a carga estática A carga estática está presente quando um membro é mantido numa posição que vai contra a gravidade. Nestes casos, a atividade muscular não pode se reverter a zero (“esforço estático”). Três aspectos servem para caracterizar a presença de posturas estáticas: a fixação postural observada, as tensões ligadas ao trabalho, sua organização e conteúdo; f) a invariabilidade da tarefa A invariabilidade da tarefa implica monotonia fisiológica e/ou psicológica. g) as exigências cognitivas As exigências cognitivas podem ter um papel no surgimento das LER, seja causando um aumento de tensão muscular, seja causando uma reação mais generalizada de estresse; h) os fatores organizacionais e psicossociais ligados ao trabalho Os fatores psicossociais do trabalho são as percepções subjetivas que o trabalhador tem dos fatores de organização do trabalho. Como exemplo de fatores psicossociais podemos citar: considerações relativas à carreira, à carga e ritmo de trabalho e ao ambiente social e técnico do trabalho. A “percepção“ psicológica que o indivíduo tem das exigências do trabalho é o resultado das características físicas da carga, da personalidade do indivíduo, das experiências anteriores e da situação social do trabalho. 5. ANAMNESE OCUPACIONAL 151 Para a caracterização de um quadro clínico como LER, é necessário definir o nexo por meio de: anamnese ocupacional, exame clínico, relatórios do médico responsável pela assistência ao paciente, do coordenador do PCMSO e, eventualmente, vistoria no posto de trabalho. Uma boa anamnese ocupacional deve incluir informações sobre: a) Ambiente e trabalho: percepção do segurado quanto à temperatura, ruído, poeiras, iluminamento; b) Equipamentos: qualidade dos equipamentos e ferramentas, manutenção dos mesmos, necessidade de emprego de força decorrente de equipamento impróprio, desvios posturais impostos pelo equipamento, necessidade de repetição da tarefa por falha do equipamento; c) Mobiliário: qualidade e manutenção, frequência de reposição, adaptação dos postos de trabalho à introdução de novos processos, desvios posturais impostos pelo mobiliário; d) Organização do trabalho: ritmo, pausas, hierarquia, horas-extras, estímulo à produção, rotatividade de mão-de-obra, composição de mão-de-obra quanto a sexo e idade, e relacionamento interpessoal. QUADRO - relação exemplificativa entre o trabalho e algumas patologias ALGUNS CAUSAS LESÕES EXEMPLOS DIAGNÓSTICOS OCUPACIONAIS DIFERENCIAIS Bursite do Compressão do Apoiar o Gota, traumatismos e artrite cotovelo cotovelo contra cotovelo em reumatóide (olecraniana) superfícies duras mesas Contratura Operar Compressão palmar Heredo-familiar de fáscia compressores associada a vibração (Contratura de Dupuytren) palmar pneumáticos Compressão palmar Diabetes, artrite reumatóide, Dedo em Apertar alicates e associada a realização mixedema, amiliodose e Gatilho tesouras de força tuberculose pulmonar. Movimentos com esforços estáticos e Apertar preensão prolongada de Doenças reumáticas e parafusos, jogar objetos, principalmente metabólicas, hanseníase, Epicondilites tênis, com o punho neuropatias periféricas, do Cotovelo desencapar fios, estabilizado em flexão traumas e forma T de tricotar, operar dorsal e nas hanseníase. motosserra pronossupinações com utilização de força. Epicondilite medial, Flexão extrema do Síndrome do Apoiar cotovelo sequela de fratura, bursite cotovelo com ombro Canal Cubital em mesa olecraniana forma T de abduzido. Vibrações. Hanseníase Cistos sinoviais, tumores do Síndrome do Compressão da borda nervo ulnar, tromboses da Canal de Carimbar ulnar do punho. artéria ulnar, trauma , artrite Guyon reumatóide e etc Síndrome do Compressão sobre o Fazer trabalho Cérvico-braquialgia, Desfiladeiro ombro, flexão lateral do manual sobre síndrome da costela Torácico pescoço, elevação do veículos, trocar cervical, síndrome da 152 braço. lâmpadas, pintar primeira costela, paredes, lavar metabólicas, Artrite vidraças, apoiar Reumatóide e Rotura do telefones entre o Supra-espinhoso ombro e a cabeça Síndrome do Carregar objetos Compressão da metade Interósseo pesados apoiados distal do antebraço. Anterior no antebraço Carregar pesos, Síndrome do praticar Esforço manual do Pronador musculação, Síndrome do túnel do carpo antebraço em pronação. Redondo apertar parafusos. Menopausas, tendinite da gravidez (particularmente se bilateral), artrite Movimentos repetitivos Digitar, fazer reumatóide, amiloidose, de flexão, mas também Síndrome do montagens diabetes, lipomas, extensão com o punho, Túnel do industriais, neurofibromas, principalmente se Carpo empacotar insuficiência renal, acompanhados por obesidade, lupus realização de força. eritematoso, condrocalcinose do punho, trauma Artropatias metabólicas e Manutenção do endócrinas, artrites, Tendinite da antebraço supinado e osteofitose da goteira Porção Longa fletido sobre o braço ou Carregar pesos bicipital, artrose acromiodo Bíceps do membro superior em clavicular e radiculopatias( abdução. C5-C6 ) Carregar pesos Tendinite do Elevação com abdução Bursite, traumatismo, sobre o ombro, Suprados ombros associada a artropatias diversas, jogar vôlei ou Espinhoso elevação de força. doenças metabólicas peteca Estabilização do polegar em pinça Doenças reumáticas, Tenossinovit seguida de rotação ou Torcer roupas, tendinite da gravidez e de desvio ulnar do carpo, apertar botão (particularmente bilateral), DeQuervain principalmente se com o polegar estilóidite do rádio acompanhado de realização de força. Fixação Artrite Reumatóide , Tenossinovite antigravitacional do Gonocócica, Osteoartrose e dos punho. Digitar, operar Distrofia Simpático extensores Movimentos repetitivos mouse Reflexa(Sindrome Ombrodos dedos de flexão e extensão Mão) dos dedos. Obs: Considerar a relevância quantitativa das causas na avaliação de cada caso. A presença de um ou mais dos fatores listados na coluna “Outras Causas e 153 Diagnóstico Diferencial” não impede, a priori, o estabelecimento do nexo. 6. DIAGNÓSTICO O diagnóstico da lesão ou doença subjacente às Lesões por Esforços Repetitivos deve ser individualizado a cada uma delas. Em geral é eminentemente clínico e muitas vezes difícil. São minoria os casos em que os exames complementares apóiam o diagnóstico clínico. A eventual constatação de fator individual predisponente, como, por exemplo, a presença de costela cervical em um caso de síndrome do desfiladeiro torácico não invalida sua caracterização como LER, desde que o nexo esteja bem estabelecido (trabalho com elevação de membros superiores, por exemplo), identificando, portanto, um caso de síndrome do desfiladeiro torácico ocupacional. Um dos elementos mais frequentes para sua caracterização é a dor. Esta em geral é insidiosa, de início remoto, sem data precisa de instalação. Algumas vezes o paciente relata que teve início após certo período de sobrecarga. Sua localização varia dependendo da estrutura comprometida, sendo, por vezes, pouco definida, sugerindo distúrbio neurológico central. Quando precisa, traduzindo comprometimento de um músculo, tendão ou nervo específico, a dor pode ser reproduzida por manobras no exame físico. A duração da dor tende a ser mais breve no início, surgindo ao fim do expediente e aliviando com o repouso noturno; com o tempo passa a ser mais duradoura, até tornar-se contínua nos casos graves. A ocorrência de parestesias (dormências) traduz a existência de compressão nervosa e pode indicar a necessidade de eletroneuromiografia para diagnóstico diferencial. A eletroneuromiografia traduz impulsos elétricos em ventres musculares, não sendo exame complementar (no caso das DORTs) que possa concluir, esclarecer ou indicar topografia do caso. Tem alto custo, é invasiva e sem resposta conclusiva adequada para o diagnóstico de DORT. O conhecimento anatômico das estruturas do pescoço e membros superiores permite identificar, via de regra com grande precisão, o local exato da compressão apenas com o exame clínico. É importante lembrar que nem sempre a compressão nervosa manifesta-se apenas com sintomas distais à compressão. O exame físico comparativo dos membros superiores deve levar em conta as diferenças por dominância. Deve ser mais apurado e com parâmetros objetivos para dar suporte ao diagnóstico, como por exemplo: pesquisa de sensibilidade, goniometria e pesquisa de força muscular (se possível, por dinamômetro). Pode evidenciar entumescimento de estruturas e hipertonias musculares; a hipertrofia muscular sem hipertonia geralmente não tem importância clínica. Podem-se palpar nodulações de tendões, diferenças de temperatura e umidade por distrofia simpático-reflexa, etc. As posturas antálgicas e o receio demonstrado pelo paciente mesmo durante o aperto de mãos devem ser valorizados. Sinais flogísticos francos ocorrem principalmente nas tenossinovites agudas. Muitas vezes o paciente relata sensação de edema, chegando mesmo a afirmar vigorosamente que o apresenta, sem que o médico seja capaz de vê-lo. Os quadros clínicos podem ser de etiologia compressiva, inflamatória ou desconhecida, e neste caso provavelmente são causadas por distúrbio neurológico de percepção da dor. Uma das hipóteses que talvez explique o comportamento evolutivo arrastado e a frequente distribuição vaga dos sintomas das LER é a teoria neurogênica de Quintner e Elvery (1991). Eles sustentam que, em decorrência do excesso de estímulos, os tecidos nervosos dos membros superiores tornam-se irritáveis, com o limiar de excitabilidade tão baixo, que enviam sinais mesmo na ausência de estímulos. Cohen e cols. (1992), um ano depois, deslocaram o fenômeno básico do membro para o corno posterior da medula, que, hiperestimulado, mantém a sensação dolorosa, ampliando-a 154 patologicamente, mesmo que o estímulo original seja tátil ou proprioceptivo. Esta hipótese, que tem sido aceita por publicações mais recentes, explicaria melhor também os sintomas motores, a disautonomia simpática e a projeção da dor para o membro contra lateral. Segundo trabalho recente da Universidade de Illinois, em cerca da metade dos casos de LER, os sintomas iniciais foram dor regional nos membros superiores e/ou pescoço, área dos trapézios e região cervical, propagando-se para outras regiões do corpo, incluindo a região lombar e os membros inferiores, após períodos de vários meses. Ainda segundo o autor, cerca de 25% têm história prévia de dor músculo-esquelética crônica, principalmente no pescoço e braços. Além de fatores amplificadores da dor, como ansiedade, estresse e depressão, fatores neuro-humorais, como aumento da substância P, diminuição da serotonina e da noradrenalina e disfunção do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal, podem estar presentes. 6.1. Neuropatias compressivas Das estruturas do membro superior, os nervos são as mais delicadas, e muitas vezes trafegam por áreas estreitas, tornando-se passíveis de compressões. Nas neuropatias são as parestesias e não a dor o elemento mais importante. Síndrome do desfiladeiro torácico: é a compressão do feixe vásculo-nervoso num estreito triângulo formado pelos músculos escaleno anterior e médio e a primeira costela. Na síndrome do desfiladeiro torácico, o quadro clínico superpõe características de compressão ulnar com outras de síndrome do túnel do carpo. Dor difusa e vaga no membro superior associada à parestesia na borda ulnar pode ser uma forma de síndrome do desfiladeiro torácico. Nestes casos, a eletroneuromiografia (ENMG) será normal. Devem-se pesquisar os potenciais evocados bilateralmente e comparálos. Ocupacionalmente ocorre em trabalhadores que mantêm os braços elevados por períodos prolongados ou que comprimem o ombro contra algum objeto, como, por exemplo, o uso prolongado e diário de telefone apoiado entre a orelha e o ombro. Síndrome do supinador: o músculo supinador hipertrofiado comprime o nervo interósseo posterior que passa dentro dele. A síndrome do supinador, que deve ser distinguida da epicondilite lateral, é a compressão do ramo motor do nervo radial no cotovelo. É causada por movimentos repetitivos de pronossupinação, como apertar parafusos e prática de musculação. Síndrome do pronador redondo: é a compressão do nervo mediano abaixo da prega do cotovelo, entre os dois ramos musculares do pronador redondo. É diferente da compressão do nervo mediano no punho. Na síndrome do pronador redondo. Além da área distal dos dedos, a região tenar também tem alterações de sensibilidade. Ocorre em tarefas que exigem pronossupinação vigorosa do antebraço. Síndrome do interósseo anterior: é a compressão do nervo na borda de origem dos músculos flexores superficiais dos dedos. A síndrome do interósseo anterior (ramo exclusivamente motor do nervo mediano), que é mais comum que a síndrome do pronador, acomete aqueles que carregam objetos pesados. A manobra que demonstra o diagnóstico é a flexão do terceiro dedo contra resistência (específico do nervo flexor superficial dos dedos) que produz dor no cotovelo. Há também deficit motor. Síndrome do túnel do carpo: é a compressão do nervo mediano ao nível do punho. Decorre da desproporção continente/conteúdo no túnel do carpo. Ocorre nas tarefas manuais repetitivas, principalmente se houver força ou desvio do carpo, quando os tendões 155 hipertrofiados ou edemaciados comprimem o nervo mediano. A eletroneuromiografia (ENMG), quando solicitada, deve ser feita em posições de hiperflexão/extensão, pois, quando realizada na posição anatômica, pode deixar de identificar esta patologia. É importante saber que a Síndrome do Túnel do Carpo - STC, principalmente quando bilateral, é comum nas grávidas e em situações não-ocupacionais. Lesão do nervo mediano na base da mão: é a consequência da compressão extrínseca do nervo, como, por exemplo, a causada pelo uso de ferramentas como chave-de-fenda de cabo curto; vibração e uso da base da mão, como, por exemplo, com o uso de martelo para grampear, carimbar, etc. Síndrome do canal cubital: É a compressão do nervo ulnar ao nível do túnel cubital. Quando o cotovelo é progressivamente fletido e o ombro abduzido, há um aumento da pressão intraneural estimulando os flexores que estreitam o túnel em aproximadamente 55%, achatando e alongando o nervo cubital em quase 5mm. Traumas agudos, processos degenerativos e infecciosos, anomalias musculares, tumores de partes moles, sequelas de fraturas, esforços de preensão e flexão, ferramentas inadequadas e vibrações são as causas predisponentes mais comuns. Mais uma vez, o diagnóstico é essencialmente clínico. Síndrome do canal de Guyon: é a compressão do nervo ulnar ao nível do chamado canal de Guyon no punho, causando distúrbio de sensibilidade no quarto e quinto dedos, bem como distúrbios motores na face palmar. Esta síndrome é cinco vezes menos frequente do que o comprometimento do nervo ulnar no canal cubital. A utilização excessiva da borda ulnar do punho, traumas, fraturas de ossos do carpo e do metacarpo, variações anatômicas, tumores de partes moles, comprometimento da artéria ulnar e cistos sinoviais são os elementos predisponentes mais comuns. Aparece com muita frequência nos carimbadores, escrivães e aramistas. Síndrome do interósseo posterior: é o comprometimento do ramo profundo do nervo radial, após sua bifurcação na extremidade proximal do antebraço, causados por sequelas de fraturas ou luxação do cotovelo, processos inflamatórios, tumores de partes moles, variações anatômicas e iatrogênicas, além de intoxicação por metais pesados, herpes zoster, sarcoidose e hanseníase. Podem estar presentes queixa de dor vaga no dorso do antebraço e diminuição da força muscular. É de evolução lenta, podendo levar meses para se instalar e não há alteração sensitiva associada. Caso se faça presente, deverá ser questionada compressão mais alta do nervo radial. 6.2. Tendinites e tenossinovites São as doenças inflamatórias que comprometem as bainhas tendíneas e os tendões, em decorrência das exigências do trabalho. Muitas delas são traumáticas, agudas, e, nestes casos, ocorrem acidentes típicos (ou acidentes tipo e/ou de trajeto) se forem relacionadas com o trabalho. Estudos do NUSAT, confirmando outros autores, sugerem que essas formas de LER predominam e são mais precoces nas atividades de grande repetitividade aliadas à exigência de força. Doença de De Quervain: é a inflamação da bainha comum dos tendões do abdutor longo e extensor curto do polegar no ponto onde eles passam juntos por uma única polia: o sulco ósseo do processo estilóide do rádio. Foi originalmente descrita em lavadeiras, mas 156 incide em todas as atividades em que haja fixação do polegar acompanhada de força, quer de torção, quer de desvio ulnar do carpo. Dedo em gatilho: a inflamação dos tendões flexores dos dedos pode produzir espessamentos e nódulos que dificultam o deslizamento dos mesmos em suas bainhas. Ao vencer abruptamente a resistência ao movimento de extensão, o dedo "salta", caracterizando o diagnóstico. Incide nas atividades em que há associação de força com compressão palmar por instrumentos como alicates, tesouras e gatilhos de bombas de gasolina. Epicondilite lateral: também conhecida como cotovelo de tenista (tennis elbow), é a inflamação da inserção dos músculos responsáveis pela extensão e supinação do antebraço. A doença é desencadeada pelos movimentos de extensão, como no "backhand" do tênis, e pronossupinação, como ao apertar parafusos. Epitrocleíte (epicondilite medial): é a inflamação dos músculos flexores do carpo na borda medial do cotovelo. É menos frequente que a epicondilite lateral. Pode ocorrer, por exemplo, em descascadores de fios elétricos, e está associada à flexão do punho. Tendinite biceptal: é a inflamação da bainha sinovial do tendão da porção longa do bíceps, no ponto em que ela muda de direção: no sulco biceptal. Ocorre mais frequentemente associada a outras lesões da bainha rotatória do ombro. Ocupacionalmente ocorre nas atividades em que o braço é mantido em elevação por longos períodos. Tendinite do supra-espinhoso: também conhecida como síndrome do impacto, é ocasionada pela compressão das fibras do supra-espinhoso pelo acrômio ao realizar a abdução do braço acima de 45º. Muito frequentemente é acompanhada de bursite subacromial, em decorrência do extravasamento de exsudato para o interior da bursa. São incidentes em adultos e podem não ser ocupacionais. O sedentarismo e a falta de estrutura muscular são fatores predisponentes. Tenossinovite dos extensores dos dedos e do carpo: são muito comuns em digitadores e operadores de mouse. Decorrem mais da contração estática desses músculos, para fim antigravitacional sobre o carpo e dedos, que da contração dinâmica para o movimento dos dedos. Tenossinovite dos flexores dos dedos e dos flexores do carpo: acometem os tendões da face ventral do antebraço e punho em decorrência de movimentos repetitivos de flexão dos dedos e da mão. Tendinite distal do bíceps: decorre de atividades que exigem movimentos de flexão do antebraço supinado sobre o braço. Tenossinovite do braquiorradial: decorre de atividades que exigem movimentos de flexão do antebraço pronado sobre o braço. 6.3. Outros Cistos sinoviais: são tumefações esféricas, geralmente únicas, macias, habitualmente indolores e flutuantes que ocorrem por degeneração mixóide do tecido sinovial periarticular ou peritendíneo. São comuns na face extensora do carpo, podendo ter o seu aparecimento favorecido por trabalhos manuais que exijam força. Nem sempre são ocupacionais e/ou incapacitantes. Distrofia simpático-reflexa: a distrofia simpático-reflexa tem como uma de suas características a dor de caráter difuso e em queimação. Pode ocorrer em diversas situações não-ocupacionais em que o ombro seja mantido em repouso prolongado, como após acidente vascular cerebral, infarto agudo do miocárdio, queimaduras, etc. O ombro congelado é uma forma de distrofia simpático-reflexa localizada no ombro. Síndrome miofascial e fibromialgia: em face da natureza polêmica da matéria, o presente tópico tem como objetivo apresentar as patologias envolvidas, recomendando-se 157 buscar maiores informações em publicações especializadas, enquanto não se dissipam as dúvidas entre as várias correntes existentes. Fibromialgia, fibrosite, reumatismo psicogênico, síndrome da fadiga crônica muito possivelmente representam formas diferentes de expressão clínica, dentro do espectro de uma síndrome, a fibromialgia. A fibromialgia é a doença reumatológica mais frequente. Ocorre em nove mulheres para cada homem, principalmente entre os 30 e 50 anos. Na fibromialgia há vários trigger points, que, entretanto, não provocam dor referida com tanta precisão quanto na síndrome miofascial. Caracteriza-se pela presença de pontos dolorosos específicos ou difusos; distúrbios do sono com fadiga e rigidez matinais; relação com mudanças do tempo e situações angustiantes; tendência à cronicidade. Atinge indivíduos de personalidade perfeccionista e deprimidos, em quem o sistema músculo-esquelético seria o “órgão de choque”. A síndrome da fadiga crônica caracteriza-se por fadiga intensa, associada a sintomas que sugerem processo infeccioso subjacente, como febrícula, odinofagia, mialgia, cefaléia, artralgias e dor à palpação de linfonodos axilares ou cervicais. As fibromialgias são predominantes em certos pacientes de LER, como os telefonistas. Nestes profissionais predominam as dores difusas, sem lesões específicas demonstráveis. O mecanismo fisiopatológico primário para a síndrome da fibromialgia envolve mecanismos centrais de distúrbios do sono, aumento dos níveis da substância P, diminuição das taxas de serotonina, bem como perturbação do eixo hipotálamo-hipofisário-adrenal. Assim, a dor pode ser causada por mecanismos de dor central aberrantes sem qualquer anormalidade em tecidos periféricos, embora fatores ou efeitos periféricos, tais como trauma ou falta de condicionamento físico, possam posteriormente ampliar a dor em tais casos. Moreira e Carvalho observaram algumas alterações comuns em 46 pacientes portadores de fibromialgia do ambulatório de reumatologia da UFMG: - preocupação excessiva; - perfeccionismo e exigência; - grande eficiência em suas atividades; - incapacidade de dizer não; - sentimento de extrema lealdade; - baixa auto-estima; - sentimentos exagerados de culpa. Em portadores de síndrome miofascial há uma produção significativamente aumentada de noradrenalina, comparada com controles normais. Outros estudos demonstram baixa concentração de serotonina sérica em fibromiálgicos, quando comparados a controles. Há evidências de que a noradrenalina e a serotonina exerçam funções sinérgicas na modulação da interpretação de um estímulo sensorial doloroso. O aumento da noradrenalina poderia representar uma ação compensadora em pacientes com baixos níveis de serotonina. A serotonina é um neurotransmissor que tem papel regulador do sono profundo (restaurador - fase IV) e na interpretação do estímulo sensorial doloroso. Na deficiência de serotonina, o resultado clínico é uma hiperalgia. Há também alterações comportamentais, da imunidade humoral e celular e aumento de níveis de glicocorticóides circulantes. Pode-se concluir que a fibromialgia é uma doença complexa que pode ter ou não um componente ocupacional importante. Cabe ao médico avaliar a existência do componente ocupacional.(*(*) Bursites: Podem ocorrer nas bursas olecranianas/pré-patelares como consequência de apoiar o cotovelo/joelho em superfícies duras durante o trabalho ou nas bursas subacromiais, geralmente em associação com as tendinites do supra-espinhoso. 158 Caimbra do escrivão: é uma doença neurológica, do grupo das distonias, que se manifesta com fortes contrações dos dedos e mãos que escrevem, obrigando a interrupção da atividade. Não é doença ocupacional, visto que a escrita em excesso não pode ser considerada causa da doença nem fator de seu agravamento. Contratura fibrosa do fáscia palmar: é caracterizada pelo espessamento, com contratura da fáscia palmar. Alguns autores usam como sinonímia contratura de Dupuytren, que tem caráter heredofamiliar e bilateral. 7. TRATAMENTO Sempre que possível, a identificação das estruturas anatômicas acometidas por ocasião do diagnóstico é importante no planejamento da conduta. Um dos principais determinantes no tratamento inadequado das LER deve-se à falha no diagnóstico das reais etiologias do quadro clínico, da avaliação da incapacidade e dos fatores que agravam o quadro doloroso. A maioria dos casos teria bom prognóstico, caso o diagnóstico fosse realizado precocemente, o tratamento iniciado de imediato e houvesse modificação do posto de trabalho/atividade e/ou função desde as fases iniciais da doença, evitando-se a cronificação. Durante o tratamento devem ser realizadas avaliações periódicas para eventual reorientação da conduta terapêutica. É indispensável estabelecer-se, desde o início, uma boa relação dos profissionais de saúde com o trabalhador, para que o desânimo e a desilusão não se instalem em ambos, uma vez que os efeitos do tratamento podem, nos casos mais graves, ser demorados. Os medicamentos analgésicos e antiinflamatórios são eficazes no combate à dor aguda e inflamação. Isoladamente, não são eficazes para combate da dor crônica. Neste caso, é necessário associação dos psicotrópicos (antidepressivos tricíclicos e fenotiazínicos), que proporcionam efeito analgésico e ansiolítico, estabilizam o humor e promovem alterações na simbologia da dor. Dos numerosos métodos terapêuticos, os meios físicos são os mais úteis para o tratamento da dor. Dentre eles, incluem-se: massoterapia, termoterapia (calor e frio), eletroterapia, cinesioterapia, administração transcutânea de agentes farmacológicos por iontoforese, bloqueio da cadeia simpática através de ultra-som, acupuntura e suas variantes. Em associação com esses métodos deve haver exercícios de relaxamento de estruturas tensas ou contraturas e, posteriormente, de métodos de fortalecimento muscular por exercícios isométricos ativos livres e de atividades programadas de terapia ocupacional. Essas atividades terapêuticas ajudam a reduzir o edema e a inflamação, melhoram as condições circulatórias, aceleram o processo cicatricial e relaxamento muscular, reduzem a dor e a incapacidade funcional e estimulam o sistema analgésico intrínseco, promovendo a liberação de neurotransmissores supressores da dor, como as endorfinas, encefalinas e monoaminas (noradrenalinas e serotonina) nas sinapses do sistema nervoso central. Além de acelerarem a melhora clínica, permitem que se proceda à redução da dose de medicação analgésica utilizada pelo paciente. Cumpre ressaltar que geralmente os meios físicos com finalidade analgésica, quando não associados aos procedimentos reabilitadores globais descritos acima, não proporcionam melhora expressiva da dor. O bloqueio da cadeia simpática com anestésicos locais ou outras formulações visam diminuir o desconforto e propiciar a possibilidade do emprego de medidas fisioterapêuticas como a cinesioterapia, para recuperação do trofismo e da amplitude articular da região afetada pela lesão. As imobilizações não devem ser por períodos prolongados, pois favorecem o surgimento de síndromes de imobilização caracterizadas pela atrofia e descalcificação dos 159 segmentos imobilizados, retrações músculo-tendíneas e ligamentares, limitações da amplitude articular e distrofia simpático-reflexa. É recomendado o uso de órteses de posicionamento, pois podem ser periodicamente removidas para adoção de medidas fisiátricas para manutenção de trofismo e da amplitude articular. As órteses podem ser constituídas de tecido de lona, neoprene ou tecido elástico em moldes pré-fabricados, material plástico termomoldável, que são confeccionadas sob medida para cada caso. A cirurgia, quando indicada, só deve ser feita por especialista habituado a tratar de pacientes portadores de LER e com o diagnóstico preciso firmado. A grande maioria dos casos tem indicação de tratamento clínico, e a indicação equivocada de cirurgia poderá prejudicar muito a evolução, agravando o caso e piorando o prognóstico e reabilitação para retorno ao trabalho. O especialista deve esclarecer sempre o paciente sobre as perspectivas positivas e negativas do procedimento, antes de realizá-lo. (*(*) Paul Cotton, v. 265 - JAMA, The Journal of the American Medical Association. April , 17, 91 pág. 1.922 (2) Contra-indicação de cirurgia nos casos de síndrome do túnel do carpo de origem ocupacional, devido a mau prognóstico detectado em 30% a 57% dos casos em follow-up médio de 5,5 anos. Apoio psicológico torna-se necessário, principalmente para aqueles pacientes que apresentam componente ansioso-depressivo. Os pacientes portadores de LER muitas vezes sentem-se pressionados para se recuperar em curto período de tempo, e isto acarreta insegurança quanto ao retorno às atividades prévias no trabalho e medo das consequências da doença, quanto a sua estabilidade no emprego e perspectivas futuras, pois a LER costuma ocorrer nos indivíduos na fase mais produtiva da vida. A abordagem dos aspectos psicossociais da LER e do sofrimento mental que cada paciente apresenta são muito úteis no processo reabilitacional. Atividades coletivas com os grupos de portadores de LER têm sido realizadas com bons resultados nos serviços públicos de saúde, permitindo a socialização da vivência da doença e da incapacidade, a discussão e reflexão sobre os temores e dúvidas do paciente em relação à doença e às dificuldades encontradas no estabelecimento do diagnóstico, tratamento e reabilitação. A formação de uma equipe multiprofissional, composta por médicos, enfermeiros, engenheiros, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicólogos e assistentes sociais, tornase de fundamental importância na instituição de tratamento com uma abordagem mais integral e uniforme. 8. PREVENÇÃO Um programa de prevenção das Lesões por Esforços Repetitivos em uma empresa inicia-se pela criteriosa identificação dos fatores de risco (descritos anteriormente) presentes na situação de trabalho. A cada situação corresponde um conjunto de medidas de controle específicas, evitando o surgimento e a progressão da doença. A Norma Regulamentadora 17, do Ministério do Trabalho, estabelece que compete ao empregador realizar a análise ergonômica do trabalho, para avaliar a adaptação das condições laborais às características psicofisiológicas do trabalhador. As medidas de controle a serem adotadas envolvem o dimensionamento adequado do posto de trabalho, os equipamentos e as ferramentas, as condições ambientais e a organização do trabalho. No dimensionamento do posto de trabalho, deve-se avaliar as exigências a que está submetido o trabalhador (visuais, articulares, circulatórias, antropométricas etc.) e as exigências que estão relacionadas com a tarefa, ao material e à organização da empresa. Por exemplo, deve-se adequar o mobiliário e os equipamentos de modo a reduzir a intensidade 160 dos esforços aplicados e corrigir posturas desfavoráveis, valorizando a alternância postural. “Das condições ambientais, sabe-se que o conforto térmico, visual e acústico favorecem a adoção de gestos de ação, observação e comunicação, garantindo o cumprimento da atividade com menor desgaste físico e mental, e maior eficiência e segurança para os trabalhadores”. Quanto à organização do trabalho, deve-se permitir que o trabalhador possa agir individual e coletivamente sobre o conteúdo do trabalho, a divisão das tarefas, a divisão dos homens e as relações que mantêm entre si. A divisão das tarefas vai do seu conteúdo ao modo operatório e ao que é prescrito pela organização do trabalho. A Norma Regulamentadora 17 estabelece que nas atividades que exijam sobrecarga muscular estática ou dinâmica do pescoço, ombros, dorso e membros superiores e inferiores, a partir da análise ergonômica do trabalho, deve ser observado o seguinte: a) todo sistema de avaliação de desempenho para efeito de remuneração e vantagens de qualquer espécie deve levar em consideração as repercussões sobre a saúde dos trabalhadores; b) devem ser incluídas pausas de descanso. O resultado do programa de prevenção depende da participação e compromisso dos diferentes profissionais da empresa: trabalhadores, supervisores, cipeiros, técnicos de serviço de segurança do trabalho, gerentes e diretores. 9. DA NOTIFICAÇÃO A notificação tem por objetivo o registro e a vigilância dos casos de DORT. Sendo confirmado o diagnóstico de DORT, deve ser emitida a Comunicação de Acidente do Trabalho - CAT, mesmo nos casos que não acarrete incapacidade laborativa para fins de registro e não necessariamente para o afastamento do trabalho. 10. DAS SUGESTÕES - RECOMENDAÇÕES Levando-se em consideração a complexidade e a importância do problema, seria desejável a abordagem do mesmo através de ações coletivas de todos os agentes envolvidos, desde o próprio segurado, a empresa, instituições e sindicatos, dentro de suas atribuições tais como: 1) Pela empresa, médico da empresa ou médico responsável pelo Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional - P.C.M.S.O. (Portaria 24, de dezembro de 1.994 do MTb) Considerando que são os responsáveis diretos pela saúde do trabalhador no aspecto preventivo, e as particularidades que envolvem o presente quadro clínico, requerendo uma pronta intervenção com a identificação do risco, às primeiras exposições e às primeiras manifestações sintomáticas: a) identificar as áreas de risco da empresa, com descrição detalhada dos postos de trabalho com as tarefas pertinentes a cada função, incluindo a descrição das ferramentas e ciclos do trabalho tomando por base o Código Brasileiro de Ocupações - CBO, informar os responsáveis e, conjuntamente, trabalhar nos aprimoramentos ergonômicos, lembrando do perfil epidemiológico da doença e, sobretudo, do disposto na NR 7(PCMSO), NR 9 (PPRA) e NR 17 (Ergonomia); b) acompanhar cuidadosamente os trabalhadores submetidos a excesso de solicitação 161 osteomioligamentar dos membros superiores, procurando minimizar ou eliminar tal condição; c) aos primeiros sintomas suspeitos, afastar o trabalhador da atividade até que se estabeleça o diagnóstico correto. Se a causa identificada for corrigida e o trabalhador tornar-se assintomático em menos de 15 dias, retorná-lo à função, mantendo-o sob observação e responsabilidade do coordenador de PCMSO.Se o diagnóstico for firmado e a causa for ocupacional emitir a CAT para fins de notificação. d) quando da emissão da CAT, o LEM deverá ser preenchido ou anexar relatório médico equivalente, detalhado, com os exames e laudos já realizados e informações sobre o processo de trabalho, justificando assim a relação entre o trabalho e a patologia e oferecendo ao perito informações úteis para a caracterização das DORT; e) a minimização e a solução do problema serão obtidas pela prática da ergonomia nos locais e postos de trabalho, que é responsabilidade da empresa; f) é necessário que nas funções e trabalhos em que haja solicitação osteomioligamentar, as pessoas sejam treinadas, recebendo ensinamentos sobre as técnicas corretas de execução das tarefas e alertando-as sobre as práticas erradas que estejam adotando; g) o médico do trabalho deverá manter atualizados os dados referentes às condições de saúde do empregado principalmente no que tange as doenças ocupacionais relacionadas ao excesso de solicitação osteomioligamentar. Tais procedimentos evitarão cronificação de qualquer quadro inicial, podendo levar, em futuro próximo, a uma diminuição substancial na incidência e prevalência de tal quadro clínico, comprovando uma ação profissional e ética dos agentes envolvidos e isentando-os de possíveis repercussões ao nível de responsabilidades legais. 2) Pela Delegacia Regional do Trabalho - DRT (D.O.U.) Considerando DORT como resultado do desajuste no sistema homem/trabalho, a atuação preventiva das DRT, identificando riscos, propondo soluções e aplicando penalizações, tem importância fundamental na abordagem interinstitucional da questão: a) coordenar a execução das atividades relacionadas com a segurança, higiene e medicina do trabalho e prevenção de acidentes nas áreas urbanas e rurais, em âmbito estadual; b) proporcionar as condições necessárias para os trabalhos de pesquisas regionais, na área de segurança e saúde do trabalho, nas empresas que mais contribuem com os índices de acidentes do trabalho; c) designar engenheiro ou médico do trabalho mediante solicitação do Serviço de Relações do Trabalho, para participar das negociações; d) programar as atividades de inspeção de segurança e saúde do trabalho; e) propor intercâmbio com os órgãos do poder público, entidades privadas, em nível estadual e municipal, objetivando a elaboração dos programas de segurança e saúde do trabalho; f) promover métodos capazes de integrar as ações de inspeção de segurança e saúde do trabalho, no âmbito estadual; g) permutar informações sobre métodos, técnicas e processos utilizados em matéria de higiene, segurança e saúde do trabalho; h) fornecer dados para a elaboração de normas urbana e rural, sobre higiene, segurança e medicina do trabalho; i) inspecionar o cumprimento das normas regulamentadoras de segurança do trabalho; j) orientar e supervisionar a alimentação do trabalhador, bem como levantar as condições de alimentação nos estabelecimentos; 162 l) realizar o cadastramento das empresas inspecionadas, com anotações das notificações, infrações e perícias, bem como, elaborar quadros estatísticos; m) acompanhar as atividades de inspeção de segurança e saúde do trabalho; n) analisar e registrar a documentação referentes as normas relativas à higiene, segurança e saúde do trabalho; o) colaborar nas Campanhas de Prevenção de Acidentes do Trabalho; p) propor medidas corretivas para as distorções identificadas na execução dos programas e ações; q) propor adequação dos procedimentos administrativos, segundo critérios de funcionalidade, simplificação e produtividade; r) cadastrar as CIPAs, SESMTs, caldeiras e cursos de treinamento referentes à higiene, à segurança e à saúde do trabalho. Com a adoção dessas medidas, a DRT estará colaborando efetivamente na melhoria das relações homem/trabalho. 3) Pelo segurado Considerando o segurado como centro de atenção em matéria da relação indivíduo/trabalho e principal interessado na prevenção dos riscos e na manutenção da saúde do trabalhador, este deverá: a) procurar imediata atenção médica ao sentir qualquer sintoma de anormalidade em sua saúde como, por exemplo, dor persistente no membro superior; b) cumprir o tratamento clínico prescrito e atender com presteza às solicitações do médico-assistente; c) sabendo do risco à sua atividade, evitar outras exposições concomitantes e horasextras, obedecendo às determinações emanadas de acordos coletivos e/ou dissídios, quanto ao seu limite de horário de trabalho e observar as normas de segurança da empresa, acatando as medidas de proteção; d) descrever com detalhes e precisão suas atividades na empresa e fora dela; e) acatar todas as determinações do INSS, para fins de benefícios previdenciários. O segurado deverá conscientizar de que a manutenção e a recuperação de sua saúde dependem de sua efetiva colaboração em todos os níveis de atenção à saúde do trabalhador. 4) Pelo INSS Considerando a necessidade de atender prontamente à concessão de benefício por incapacidade laborativa, quando justa, e à necessária preocupação com os aspectos preventivos, o INSS deverá: a) capacitar e conscientizar a perícia médica para o estabelecimento de critérios uniformes para reconhecimento de doenças ocupacionais e avaliação das incapacidades laborativas; b) agilizar as medidas necessárias para recuperação e/ou reabilitação profissional nos casos pertinentes, evitando a cronificação das lesões, com ônus desnecessários ao sistema securitário e seus segurados; c) reconhecer que um dos principais fatores contributivos para o aparecimento desses quadros é a inadequação do sistema e dos métodos de trabalho, podendo ser decorrentes do descumprimento das determinações contidas na NR-17, NR-9 e NR-7, e fazer gestões para reverter tal situação; d) desmistificar as DORT e orientar o segurado e a empresa quanto às suas responsabilidades decorrentes de benefícios indevidos, motivados por fatores extra doença 163 incapacitante, evitando direcionamento para doença incurável; e) evitar o ônus decorrente de diagnósticos imprecisos e mal conduzidos que levam à extensão do benefício acidentário para doenças que fogem à natureza desta questão; f) exigir o correto preenchimento das documentações encaminhadas para o INSS, especialmente o campo referente às informações médicas do LEM ou relatório médico circunstanciado; g) estabelecer gestões para corrigir distorções existentes no fluxo dos encaminhamentos de segurados para o sistema; h) garantir o direito a recurso dentro dos prazos legais estabelecidos; i) fiscalizar o cumprimento das medidas preventivas recomendadas; j) realizar as ações regressivas pertinentes. Com a adoção dessas medidas, o INSS estará contribuindo de forma efetiva à integração dos agentes e instituições envolvidos na saúde do trabalhador. 5) Pelo sindicato da categoria (Constituição Federal, CLT) É importante a presença atuante da representação sindical, em defesa de seus associados, no aprimoramento das relações capital trabalho, priorizando o bem-estar e a integridade do seu elemento mais nobre, o ser humano, através das melhorias nas condições de trabalho: a) ao sindicato cabe a defesa dos direitos e interesses coletivos e individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas; b) é assegurada a participação dos trabalhadores e empregadores nos colegiados dos órgãos públicos em que seus interesses profissionais ou previdenciários sejam objeto de discussão e deliberação. Atuando mais efetivamente nos aspectos voltados ao cumprimento de medidas preventivas pelas empresas na questão da saúde do trabalhados, o sindicato estará colaborando na mudança das relações homem x trabalho. 6) Pelo Sistema Único de Saúde (SUS) (Lei 8.080/90) Considerando a natureza e a importância dos aspectos de vigilância e controle em matéria de saúde no trabalho e o pronto atendimento nos casos acometidos pela doença, e em busca do restabelecimento, o mais breve possível, das condições de saúde do trabalhador: À Direção Nacional do Sistema de Saúde - SUS compete: - participar na formulação e na implementação de políticas: de controle das agressões ao meio ambiente; de saneamento básico; relativas às condições e ambientes do trabalho. - definir e ordenar os sistemas: de vigilância epidemiológica; vigilância sanitária; - participar das definições das normas e mecanismos de controle, com órgãos afins, de agravo sobre o meio ambiente ou dele decorrentes, que tenham repercussão na saúde humana; 164 - participar da definição de normas, critérios e padrões para o controle das condições e dos ambientes de trabalho e coordenar a política de saúde do trabalhador; - coordenar e participar na execução das ações de vigilância epidemiológica; - promover articulação com os órgãos educacionais e de fiscalização do exercício profissional, bem como com entidades representativas de formação de recursos humanos na área de saúde; - prestar cooperação técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios para o aperfeiçoamento de sua atuação institucional - promover a descentralização para as Unidades Federadas e para Municípios, de serviços e ações de saúde, respectivamente, de abrangência estadual e municipal; - acompanhar, controlar e avaliar as ações e os serviços de saúde, respeitadas as competências estaduais e municipais. - elaborar o Planejamento Estratégico Nacional no âmbito do SUS, em cooperação técnica com os Estados, Municípios e Distrito Federal. Contribuindo para uma assistência à saúde efetiva e eficaz. 165 ANEXO D: Lei das Filas Lei Municipal 13.948 de 20 de janeiro de 2005. Lei Municipal de São Paulo - Tempo de espera na fila Lei Municipal 13.948, de 20-01-2005: Agências Bancárias - estabelece horário, para atendimento digno e profissional a seus clientes. Dispõe sobre a obrigatoriedade das agências bancárias e demais estabelecimentos de crédito de colocar à disposição dos usuários pessoal suficiente no setor de caixas, para dar atendimento digno e profissional a seus clientes. JOSÉ SERRA, Prefeito do Município de São Paulo, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, faz saber que a Câmara Municipal, em sessão de 23 de dezembro de 2004, decretou e eu promulgo a seguinte lei: Art. 1º Ficam as agências bancárias e demais estabelecimentos de crédito do Município de São Paulo obrigados a colocar à disposição dos usuários pessoal suficiente no setor de caixas, para que o atendimento seja feito em prazo hábil, respeitada a dignidade e o tempo do usuário. Art. 2º Para os efeitos desta lei entende-se como tempo hábil para o atendimento o prazo de até: I - 15 (quinze) minutos em dias normais; II - 25 (vinte e cinco) minutos às vésperas e após os feriados prolongados; III - 30 (trinta) minutos nos dias de pagamento dos funcionários públicos municipais, estaduais e federais, não podendo ultrapassar esse prazo, em hipótese alguma. Parágrafo único. Os prazos estabelecidos neste artigo também se aplicam nos casos de atendimento de que trata a Lei nº 11.248, de 1º de outubro de 1992, modificada pela Lei nº 13.036, de 18 de julho de 2000. Art. 3º As agências bancárias e demais estabelecimentos de crédito têm o prazo de 120 (cento e vinte) dias para dar cumprimento ao disposto nesta lei, ou seja, para instalar relógio de ponto em suas dependências, para uso de seus clientes, registrando a hora de entrada do contribuinte e seu tempo de permanência nas filas. 166 Art. 4º O descumprimento das disposições contidas nesta lei acarretará ao infrator a imposição de multa no valor de R$ 564,00 (quinhentos e sessenta e quatro reais), dobrado em caso de reincidência. Parágrafo único. O valor da multa de que trata este artigo será atualizado, anualmente, pela variação do Índice de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, apurado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE, acumulada no exercício anterior, sendo que, no caso de extinção desse índice, será adotado outro índice criado por legislação federal e que reflita a perda do poder aquisitivo da moeda. Art. 5º As denúncias dos usuários, devidamente comprovadas, serão comunicadas aos órgãos competentes. Art. 6º As despesas decorrentes da execução desta lei serão suportadas por dotações orçamentárias próprias, suplementadas se necessário. Art. 7º Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação, revogadas as disposições em contrário. PREFEITURA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO, aos 20 de janeiro de 2005, 451º da fundação de São Paulo. JOSÉ SERRA, PREFEITO LUIZ ANTÔNIO GUIMARÃES MARREY, Secretário Municipal dos Negócios Jurídicos MAURO RICARDO MACHADO COSTA, Secretário Municipal de Finanças WALTER MEYER FELDMAN, Secretário Municipal de Coordenação das Subprefeituras Publicada na Secretaria do Governo Municipal, em 20 de janeiro de 2005. ALOYSIO NUNES FERREIRA FILHO, Secretário do Governo Municipal 167 ANEXO E: Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa 168 169 170