ADRIANA MARIA DIAS GODOY CARVALHEIRO O PODER COERCITIVO DO CONSELHO DE ÉTICA E DECORO PARLAMENTAR DA CÂMARA DOS DEPUTADOS Projeto de pesquisa apresentado ao Programa de Pós-Graduação do CEFOR, como parte das exigências do Curso de Especialização em Processo Legislativo. BRASÍLIA 2006 2 SUMÁRIO Identificação 3 Apresentação 3 Problema 5 Objetivos 7 Justificativa 8 Revisão da Literatura 8 Metodologia 11 Cronograma 12 Bibliografia 13 3 1. Identificação Título: O Poder Coercitivo do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara dos Deputados Autor: Adriana Maria Dias Godoy Carvalheiro Finalidade: Trabalho de conclusão do Curso de Especialização em Processo Legislativo. Instituição: Centro de Formação, Treinamento e Aperfeiçoamento da Câmara dos Deputados - CEFOR Data: 31. 07. 2006 Orientadora: Luciana Botelho 2. Apresentação Em 1987 ingressei, mediante concurso público, no quadro funcional da Câmara dos Deputados. Já por essa época, havia concluído a graduação, com Licenciatura em Geografia, o mesmo vindo a ocorrer, posteriormente, na área de Psicologia. O início de minhas atividades na Câmara dos Deputados deu-se na esfera administrativa, ou mais especificamente, na Coordenação de Apoio Parlamentar, órgão hoje denominado Departamento de Apoio Parlamentar DEAPA. Depois de alguns anos exercendo função essencialmente administrativa, fui convidada a atuar no Departamento de Comissões, com lotação na Comissão de Direitos Humanos – CDH – onde permaneci por 7 anos. O trabalho desenvolvido ao longo desse período resultou em boa experiência, servindo de estímulo à aquisição de conhecimentos mais 4 aprofundados em termos de Regimento Interno, assim como, na busca de melhores informações sobre o processo legislativo, sua dinâmica e especificidade. Por circunstâncias, voltei a trabalhar na área administrativa, desta feita no Centro de Documentação e Informação, embora mantido o interesse predominante na área legislativa. A lotação, posteriormente, em um órgão com as características do Conselho de Ética representou a oportunidade de um contato mais estreito com as peculiaridades do Regimento Interno da Casa, por força do trabalho executado, das consultas recebidas e do acompanhamento dos processos disciplinares. Na verdade, as novas responsabilidades foram assumidas num contexto de desafio constante: o Conselho de Ética, órgão de criação recente na Casa e ainda um tanto incipiente do ponte de vista institucional, passou a ter visibilidade inimaginável face aos episódios de corrupção que dominaram a cena nacional a partir de maio/junho de 2005. A proximidade com este universo, a necessidade e, ao mesmo tempo, o privilégio de acompanhar um dos momentos mais singulares da vida política nacional, a convivência com todas as dificuldades, incertezas, desafios e exigências que recaíram sobre o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar nesse período podem ser considerados os fatores determinantes da escolha do tema, bem como, do interesse em torno da ética parlamentar e dos mecanismos tendentes a garantir punição aos faltosos. 5 3. Problema Através da Resolução nº 25, de 2001, tomou forma, como órgão permanente da Câmara dos Deputados, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, instituição destinada a zelar pela observância dos princípios éticos e pela preservação da dignidade do mandato parlamentar na Câmara dos Deputados, incumbida, entre outras coisas, de instaurar o processo disciplinar e proceder a todos os atos necessários a sua instrução, nos casos de conduta tida como incompatível com o decoro. Sua missão institucional, sem dúvida nenhuma, é muito relevante, podendo mesmo se tornar decisiva para a restauração da imagem e da credibilidade da Câmara quando esta, constrangida, se vê obrigada a “cortar na própria carne”. Os processos disciplinares são, em geral, traumáticos e, algumas vezes, demorados. Iniciam-se com um pedido de investigação feito por partido político com representação no Congresso Nacional ou pela Mesa da Câmara dos Deputados. Há uma fase de instrução probatória, destinada ao esclarecimento dos fatos e à busca da verdade, envolvendo geralmente a oitiva dos deputados acusados e de testemunhas arroladas pelas partes ou pelo próprio Conselho, além de outros meios de prova eventualmente requeridas. Ao final é elaborado um parecer, do qual consta o relatório final e o voto do relator, contrário ou favorável à punição e, se esta referir-se à suspensão temporária ou perda definitiva do mandato, o Plenário da Casa, em votação secreta e por maioria absoluta, decidirá sobre o destino do deputado envolvido. Desde a sua criação há cinco anos, o Conselho de Ética e Decoro Parlamentar da Câmara recebeu 24 representações contra deputados. Deste total, 90%, ou seja, 22 representações concentraram-se no ano de 2005, ao ensejo do chamado “mensalão”, mega-escândalo de corrupção que, como se recorda, abriu devastadora crise moral no País, provocando uma onda de denuncismo e expondo a fragilidade de muitas de nossas instituições. 6 A súbita notoriedade do Conselho, provocada pelo acúmulo de muitos processos em tão curto espaço de tempo, acabou dando visibilidade, também, a algumas de suas deficiências, até certo ponto naturais em se tratando de um organismo recém-criado, pouco “testado” na prática, estando ainda por definir a exata dimensão de seus poderes e prerrogativas. Com regras de funcionamento pouco detalhadas, insuficientes para dar conta das crescentes exigências e diversificadas situações processuais que se apresentavam, o órgão, muitas vezes, esteve obrigado ao improviso das soluções possíveis, tomando por empréstimo procedimentos adotados por outros colegiados em situações análogas. Nem sempre, contudo, as soluções encontradas foram consideradas satisfatórias. Um dos problemas que nunca chegaram a ser contornados (apesar de repetidas vezes trazido à baila pelos membros durante as reuniões em que se discutiam os processos) foi o da falta de poder do Conselho para conduzir coercitivamente testemunhas que, embora relevantes para o esclarecimento dos fatos investigados, deixavam, simplesmente, de atender aos convites para depor. Muitas vezes são elas, as testemunhas, e seus depoimentos prestados sob o compromisso da verdade, os únicos elos entre a denúncia e a compreensão do fato; entre o que se alega e a realidade; entre a busca e a elucidação. Seria essa limitação compatível com a missão institucional do órgão, encarregado, como se afirmou inicialmente, de zelar pela preservação da dignidade do mandato parlamentar, instaurando os processos disciplinares em caso de acusação de conduta incompatível com o decoro e procedendo a todos os atos necessários à respectiva instrução probatória? Seria compatível tal limitação com a necessária autonomia do órgão para desempenhar com eficiência suas atribuições e responsabilidades? Em sendo fundamental para o estabelecimento da verdade dos fatos, a falta do depoimento de uma testemunha que não 7 atende ao chamamento do Conselho não inviabilizaria a adequada instrução do processo, comprometendo o resultado final dos trabalhos? Essas as questões que constituem o cerne da monografia que se pretende elaborar. 4. Objetivos 1. Identificar, nos processos instaurados e concluídos no âmbito do Conselho, eventuais prejuízos, possíveis reflexos na tramitação dos mesmos e, em especial, nos resultados finais alcançados pelo órgão, causados pela falta de poder do Conselho para conduzir coercitivamente a depor testemunhas arroladas; 2. Identificar os casos em que testemunhas convidadas deixaram de comparecer, e em quantos apresentaram justificativa; verificar quais os principais tipos de justificativa apresentada para o não-comparecimento; 3. Verificar se a eventual reiteração, por uma ou mais vezes, dos convites não-atendidos inicialmente produziu efeitos positivos no sentido de conduzir a testemunha ao processo; 4. Verificar se o Conselho empregou meios alternativos de prova para suprir o depoimento de testemunha faltosa, e que efeitos produziram no processo. 8 5. Justificativa No conturbado período em que a nação perplexa, indignada e desrespeitada conviveu, diariamente, com denúncias e detalhes escabrosos de um amplo, complexo e criminoso esquema de corrupção – talvez o maior da história republicana – as atenções da sociedade voltaram-se para o tipo de resposta que o Congresso Nacional daria ao país naquela conjuntura aflitiva. Naquela ocasião, ficou patente o grau de improviso nas sessões do Conselho de Ético, certamente em função de se tratar de um órgão ainda com um incipiente arcabouço institucional. Com efeito, as poucas normas existentes revelaram-se incapazes de atender à complexidade da demanda surgida de forma repentina, e as dificuldades para definir procedimentos a serem utilizados em situações específicas, inusitadas, complexas, demonstraram que as prerrogativas do Conselho precisam ser repensadas, redimensionadas, sob pena de, no limite, inviabilizar-se a consecução de seus trabalhos. A monografia a ser elaborada insere-se neste contexto de preocupação acerca do aperfeiçoamento institucional do Conselho de Ética e Decoro Parlamentar, em proveito de maior credibilidade e eficácia dele próprio. 7. Revisão da literatura A Constituição Federal em vigor, de 1988, dispõe em seu Art. 55, II: “Art. 55 – Perderá o mandato o Deputado ou Senador: ............................................................................................... II- cujo procedimento for declarado incompatível com o decoro parlamentar”. 9 O Regimento Interno da Câmara dos Deputados, em seu Artigo 244, esclarece que o deputado “que praticar ato contrário ao decoro parlamentar ou que afete a dignidade do mandato” estará sujeito a processo disciplinar – que, necessariamente, tramitará no Conselho de Ética da Casa – com a previsão da perda de mandato como pena máxima a ser aplicada. Ao abordar especificamente a questão do poder coercitivo do Conselho de Ética – que, neste trabalho, está atrelado à possibilidade de conduzir testemunhas para depor e, eventualmente, esclarecer, confirmar e oferecer elementos probatórios – fomos nos instruir acerca de conceitos muito próximos ao tema desenvolvido: ética e ética parlamentar; decoro e decoro parlamentar; representação popular; “coisa pública” e moralidade pública. Construímos nosso referencial teórico nas obras e no pensamento de Miguel Reale, Fábio Konder Comparato, Roberto Romano, Ivo Dantas e Maria Sylvia de Carvalho Franco, dentre outros. Sobre ‘decoro’, não resta dúvida de que o seu significado mais preciso está nos termos ‘decência’, ‘honra’ e respeito’. No âmbito do parlamento – afirma Pereira – assume o particular sentido de “[...] uma forma de comportamento do parlamentar que seja compatível com o mandato que lhe foi conferido”. É dito ainda, pelo mesmo autor, que o decoro parlamentar não representa um “dever de respeito e decência” apenas no recinto das Casas Legislativas: acompanha o parlamentar durante todo o mandato. (PEREIRA, 1994, p. 562) A instituição, a partir de 2001, de um Conselho de Ética e Decoro Parlamentar no interior da Câmara dos Deputados obedece à necessidade de ajustar o instrumento de apuração e punição pela prática de atos considerados indecorosos no exercício do mandato popular à lição extraída de pronunciamento da Suprema Corte: 1 “O processo de perda de mandato não é administrativo, nem judicial, mas político [...]”. (Min. Néri da Silveira – Relator – MS n° 21.360/92) No tocante à ética no meio político, no ambiente especialíssimo da administração pública, todos os textos que versam sobre o tema condenam o comportamento do político, do gestor dos bens públicos, do parlamentar, que entendem justificável a utilização da coisa pública para fins e interesses privados. A ética parlamentar vincula a consciência ética, individual, do detentor de mandato popular – e as atitudes adotadas com esta perspectiva – ao universo político, “cujas condutas devem ser regidas pelas exigentes normas de decoro parlamentar”. (ROMANO, 2006, p. 26) Ainda segundo Romano, a atuação “responsável, séria e independente” (p. 28) do Conselho de Ética ajudou a restaurar, em grande parte, os fundamentos éticos presentes no interior do parlamento brasileiro, após um período de desconstrução da moralidade pública. De acordo, ainda, com o consagrado filósofo, os pareceres, as análises, os relatórios produzidos ao ensejo de cada representação junto ao Conselho de Ética contribuíram para resgatar noções de dignidade e justiça no seio do Legislativo. O suporte teórico em que se apóia este trabalho monográfico aponta para a necessidade de fortalecimento do Conselho de Ética – daí a insistência em agregar-lhe o poder coercitivo – no pressuposto de que seu aprimoramento inibirá o autoritarismo de determinadas agremiações partidárias que se sentem no direito de distinguir entre a “moral delas” e a “moral dos outros”, provocando o que Roberto Romano define como “privatização da ética”. (ROMANO, 2006, p. 29) 1 8. Metodologia O procedimento metodológico a ser utilizado na elaboração da monografia consistirá, basicamente, de análise documental. Representa dizer que a preocupação fundamental deverá residir em exame dos documentos produzidos em nível de funcionamento do Conselho de Ética: relatórios, pareceres, atas de suas reuniões. A leitura desses documentos permite conhecer um pouco melhor a estrutura do órgão, seu funcionamento e deficiências, mas possibilita, também, entender que a ausência de prerrogativas amplas é capaz de resultar em prejuízo significativo para os trabalhos realizados e que, das atribuições por ora negadas ao Conselho, ganha contornos de relevância a impossibilidade de obrigar, com poder de polícia, que as testemunhas atendam ao chamamento para depor nos processos instaurados. Como método a ser seguido, identificar-se, numa fase inicial, a seleção de textos, artigos, documentos, que digam respeito à ética e decoro parlamentar, além de publicações e sites oficiais. A análise documental, levando-se em consideração o tema proposto, privilegiará a compreensão das limitações impostas ao Conselho, e também por meio desta análise tentar-se-á identificar se houve caminhados alternativos trilhados pelo colegiado para superar os problemas decorrentes dessas limitações. 1 8. CRONOGRAMA AGOSTO 1 2 3 X X X Levantamento 4 Bibliográfico Coleta de dados Análise dos resultados Elaboração das conclusões Encontros com o orientador (análise de SEMANAS SETEMBRO 1 2 3 4 X X X X X X X X X X OUTUBRO 1 2 3 X X X 4 X X X documentos, orientação e entrega de relatórios) Relatório parcial Relatório final 9. Bibliografia X X 1 BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Regimento Interno da Câmara dos Deputados. Consolidado até a Resolução n° 34/2005. Atualizado em abril de 2006. Centro de Documentação e Informação. Versão eletrônica disponível em http://www.camara.gov.br/legislaçao/regimentointerno. BRASIL. Brasília: Senado Federal. Constituição da República Federativa do Brasil – 1988. Consolidado até a Emenda Constitucional n° 52/2006. Versão eletrônica disponível em http://www.senado.gov.br/sf/legislaçao/regsf. BRASIL. Congresso. Câmara dos Deputados. Código de Ética e Decoro Parlamentar: aprovado pela Resolução n. 25, de 2001. Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação de Publicações, 2002. APEL. Karl-Otto. Estudos de moral moderna. Vozes: Petrópolis, 1994 DANTAS, Ivo. Imunidade e Decoro Parlamentar. In: Revista Jurídica Consulex. ano V. n. 116, 2001 JANKELEVITCH, Vladimir. O paradoxo da moral. Papirus: Campinas, 1991 MARINHO, Josaphat. Crise de ética. In: Revista Jurídica de Administração Municipal. ano V. n. 10. out. 2000 NALINI, José Renato. Ética geral e profissional. In: Revista dos Tribunais. São Paulo, 2004 1 NOGUEIRA, Rubem. Considerações acerca do Código de Ética e Decoro Parlamentar. In: Revista de Informação Legislativa. n. 118. abr/jun. 1993 PEREIRA, Wolgram Junqueira. Comentários à Constituição de 1988. LTr: São Paulo, 1994 ROMANO, Roberto. Ética da barbárie.* In: Primeira Leitura. ed. 48. fev. 2006 (22-33) - * entrevista TEIXEIRA, Carla Costa. A honra da política: decoro parlamentar e cassação de mandatos no Congresso Nacional. Relume Dumará: Rio de Janeiro, 1998 Decoro parlamentar: a legitimidade da esfera privada no mundo público. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. ano 11. n. 30, 1996 VÁSQUEZ, Sanchez Adolfo. Ética. 22 ed. Civilização Brasileira: Rio de Janeiro, 2002