MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE BOA VISTA (FAZENDA PÚBLICA). O MINISTÉRIO PÚBLICO VARA CÍVEL DA DO ESTADO DE RORAIMA, pelos Promotores de Justiça que esta subscrevem, vem à presença de Vossa Excelência para, com fundamento nos artigos 129, incisos II e III da Constituição da República; 87 da Constituição do Estado de Roraima; 25, inciso IV, alínea “a” da Lei 8.625/93; 5º caput da Lei 7.347/85; e 32, inciso V, alínea “c” 003/94 da Lei Complementar nº do Estado de Roraima, ajuizar a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA, COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DA TUTELA em face do ESTADO DE RORAIMA, com sede no Palácio Senador Hélio Campos, Praça do Centro Cívico, Centro, nesta capital; ALE – ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE RORAMA, com sede no Palácio Antônio Júlio Martins, Praça do Centro Cívico, Centro, nesta capital, pelas razões de fato e de direito a seguir articuladas: 1 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DOS FATOS Como introito da inicial ab initio impende destacar que por diversas Legislativa vezes recalcitrou em em anos consecutivos atender a requisições Assembleia ministeriais, relacionadas à obtenção da relação de todos os servidores daquela Casa Legislativa, assim como o fundamento legal de contratação dos servidores comissionados. Basta para tanto ver os expedientes de fls. 76, 79, 82, 85, 87 e 118 dos autos de ICP nº 007/2003, cuja tramitação se arrastou por nove anos, sem qualquer resposta da segunda demandada. Ainda que as contratações da Assembleia Legislativa sejam envoltas em indesmentido sigilo, os autos revelaram que em maio de 1996 aquela realizou regularmente seu último concurso público, que promoveu o preenchimento dos cargos pertencentes ao seu quadro permanente. Na ocasião do certame foram ofertadas 52 (cinquenta e duas) vagas para níveis superior, médio e básico, compreendendo as mais diversas Técnico, áreas, Assistente tais como Assessor Legislativo, Legislativo, Assistente Técnico e Assessor Auxiliar Operacional. O expediente Civil com Público Ministério cópia n° do Público do Procedimento 103/2001, Trabalho (MPT) Preparatório apontando de encaminhou Inquérito irregularidades no preenchimento dos cargos daquela Casa Legislativa. Com efeito, o MPT informou a existência de servidores admitidos sem concurso público desempenhando atividades típicas de 2 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA servidores efetivos, em prejuízo do regramento constitucional disposto no art. 37, II da CR/88. Cumpre fazer uma digressão para registrar que a Assembleia Legislativa do Estado de Roraima possui apenas 28 (vinte e oito) servidores efetivos, conforme umas das raras informações colhidas do próprio Poder Legislativo estadual em dezembro de 2001; ao passo que os servidores comissionados somam mais de 1025 (um mil e vinte e cinco), isso levando em consideração as informações colhidas no sítio eletrônico do Ministério Público Federal do ano de 2010, quando do envio de informações daquele Poder por conta das eleições gerais. Anote-se, ainda, que referidos servidores comissionados desempenham atividades estranhas àquelas de direção, chefia e assessoramento, como definido no artigo 37, V da Constituição. Em verdade, a Assembleia Legislativa subverteu a ordem constitucional quando alargou as hipóteses de exercício em cargo em comissão, a uma porque incluiu atividades de assistente, consultor técnico legislativo e assistente especial e demais outras atribuições de natureza comum e burocrática, sem qualquer correlação de confiança entre nomeante e nomeado; a duas porque as atribuições dos cargos em comissão criados não possuem sequer clara descrição específica de atividades. Ainda nesse sentido, é de se destacar a existência de número considerável de funções gratificadas, que ultrapassa a casa de quatrocentas funções atribuídas a servidores não efetivos, contrariando norma constitucional esculpida no art. 37, inciso IV. 3 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA Retratando bem esse quadro, a Resolução n° 048/2005 e a Lei Estadual n° 702/2009 elencam em seus anexos todos os cargos que compõe o Poder Legislativo, com respectivo quantitativo e remuneração. Salta aos olhos a lesão ao patrimônio público, na sua mais ampla acepção, assim como violação ao princípio do concurso público no acesso aos cargos públicos e, ainda, à moralidade administrativa. Desse modo, a sociedade roraimense, por intermédio da atuação do Ministério Público, comparece ao Poder Judiciário para ver recomposta a ordem constitucional violada. DA LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO O Ministério Público Estadual possui legitimidade ativa para ajuizar ação civil pública com o escopo de proteger o patrimônio público estadual e zelar pela observância do sistema de mérito na cumprimento acessibilidade dos aos dispositivos cargos e públicos, princípios assegurando o constitucionais - especialmente a moralidade administrativa - por parte dos Poderes Públicos, o que constitui inequívoco interesse difuso de toda a sociedade. De fato, a referida legitimidade ativa do Ministério Público é conferida de forma expressa pelo art. 129, III, da Constituição Federal e pelo art. 1°, inciso IV, da Lei n° 7.347/85 e art. 25, IV, “b”, da Lei n° 8.625/93. Além disso, a Administração Pública tem toda sua 4 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA atividade conformada pelo ordenamento constitucional, que a limita ao atendimento do interesse público, competindo concorrentemente (artigo 129, § 3º, da Constituição Federal) ao Ministério Público a exigência da correta adequação destas atividades às prescrições legais. Esta atividade ministerial concernente à fiscalização e ao combate à administrativos corrupção atinentes e ao ao desvio de patrimônio finalidade público é dos atos desenvolvida independente do autocontrole e do controle legislativo, nos termos do artigo 5º, inciso XXV, da Constituição Federal. Nesse sentido, o Pleno do Supremo Tribunal Federal, à unanimidade, Ministério pacificou Público a para questão a referente defesa do à legitimidade patrimônio público do e da moralidade administrativa quando do julgamento do RE 208.790/SP, verbis: “CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA PARA PROTEÇÃO DO PATRIMÔNIO PÚBLICO. ART. 129, III, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Legitimidade extraordinária conferida ao órgão pelo dispositivo constitucional em referência, hipótese em que age como substituto processual de toda a coletividade autêntico resto, não e, conseqüentemente, interesse impede difuso, a na defesa habilitação iniciativa do de que, próprio de ente público na defesa de seu patrimônio, caso em que o Ministério Público intervirá como fiscal da lei, pena de nulidade da ação (art. 17, § 4°, da Lei n° 8.429/92). Recurso não conhecido.” (RE 208790/SP, rel. Min. Ilmar Galvão, Pleno, unânime, DJU: 15.12.2000, p. 105) 5 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA Ademais, esse também vem sendo o entendimento do C. Superior Tribunal julgamento do de Resp Justiça, 401.964-RO, conforme Rel. Min. ficou Luiz assentado no Fux, 1ª Turma, sobre a visão julgado em 22/10/2002, Informativo n. 152. Hugo contemporânea Nigro dos Mazzilli direitos esclarece chamados meta individuais, ao argumentar sobre a legitimidade do Ministério Público: "Já temos defendido que a nota tônica da intervenção do Ministério Público consiste na indisponibilidade do interesse (p. 60).... Em suma, o objeto da atenção do Ministério Público se resume nesta tríade: a) ou zela para que não haja disposição alguma de um interesse que a lei considera indisponível; b) ou, nos casos em que a indisponibilidade é apenas relativa, zela para que a disposição daquele interesse seja feita conformemente com as exigências da lei; c) ou zela pela prevalência do bem comum, nos casos em que haja indisponibilidade do interesse, nem absoluto nem relativo, mas esteja presente o interesse, nem absoluto nem relativo, mas esteja presente o interesse da coletividade como um todo na solução do problema. (p. 65)... Em suma, já deixamos claro que, desde que haja alguma característica de indisponibilidade parcial ou absoluta de um interesse, ou desde que a defesa que qualquer interesse, disponível ou não, convenha à coletividade como um todo, aí será exigível a iniciativa ou intervenção do Ministério Público junto ao Poder Judiciário." (p. 151, in Regime Jurídico do Ministério Público, Editora Saraiva). A defesa da moralidade administrativa e do patrimônio público obviamente são interesses difusos, pois associada a todas as pessoas aspecto da sujeitas a moralidade, professor Manoel de um determinado Fernando governo. Rodrigues Oliveira Franco No Martins, Sobrinho, em particular citando o obra sobre o controle do patrimônio público acrescenta: "De um modo geral, a moralidade administrativa passou a constituir pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública. Não se trata, contudo, 6 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA da moral comum, mas sim da moral jurídica. E para qual prevalece a necessária distinção entre o bem e o mal, o honesto e o desonesto, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, o legal e o ilegal. Não obedecendo o ato administrativo somente à lei jurídica.’ O descumprimento dos deveres inerentes à moralidade administrativa, na maioria das vezes, não acarreta qualquer lesividade econômica ao patrimônio público. Todavia, agora positivado dentro da Constituição Federal, tal princípio indica que o agir da Administração não pode ser injusto ou desonesto, mesmo que legal... O patrimônio moral equivale, em linha de tutela jurisdicional, ao patrimônio público, tendo como características principais negativas e obtusas o desrespeito à honestidade, a incidência do agente público em desvio de poder, bem como, em alguns casos, a ausência de lesividade." (in Controle do Patrimônio Público, p. 59/61, ed. RT, 1ª edição, 2.000) Portanto, tem-se como inequívoca a legitimidade do Ministério Público para postular junto ao Poder Judiciário o cessamento da imoralidade no trato da coisa pública, em completa incongruência com as normas constitucionais que regem a espécie. DO CABIMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA A ação civil pública é plenamente cabível na questão em apreço, consoante disposição contida no art. 129, III da Constituição da República e do art. 1°, IV da Lei n° 7.347/85, haja vista que o alargamento da contratação de servidores para cargos em comissão, fora das hipóteses previstas no inciso V do art. 37, viola comentado dispositivo constitucional, bem como contraria, ainda, o interesse público e difuso de que o acesso aos cargos público ocorra através do sistema de mérito. Nesse sentido: 7 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA “PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI FEDERAL COMO SEU OBJETO PRINCIPAL E ÚNICO. INADMISSIBILIDADE. LEI ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO. POSSIBILIDADE DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CRIAÇÃO DE CARGO EM COMISSÃO. REQUISITOS. PROVA DAS SUAS ATRIBUIÇÕES... 2. A CRIAÇÃO DE CARGOS EM COMISSÃO, DE LIVRE NOMEAÇÃO E EXONERAÇÃO, SOMENTE É POSSÍVEL NAQUELAS HIPÓTESES EM QUE HÁ NECESSIDADE DE RELAÇÃO DE CONFIANÇA, COM O FITO DE IMPLEMENTAR DIRETRIZES POLÍTICAS, OU SEJA, PARA DESEMPENHAR FUNÇÕES DE DIREÇÃO, CHEFIA, OU ASSESSORAMENTO. (ART. 32, CAPUT, DA CE/89)...” (APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO Nº 70004926531, QUARTA CÂMARA CÍVEL, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RS, RELATOR: ARAKEN DE ASSIS, JULGADO EM 23/10/2002). Outrossim, constitucionalidade vale frisar incidental em que sede de o ação controle civil de pública encontra ressonância nos dispositivos supracitados, interpretados sistematicamente com os artigos 97 e 102, III, a, b, e c, da Constituição Supremo da Tribunal República, Federal e consoante do entendimento Superior Tribunal pacífico de do Justiça. (Precedentes do STF: Reclamação 600-0/190-SP, Tribunal Pleno, rel. Min. Néri da Silveira e RE 227159, rel. Min. Néri da Silveira, 2ª Turma, unânime, DJU: 17.05.2002, p. 73. Precedente do STJ: EREsp. 439.539-DF, rel. Min. Eliana Calmon, 1ª Seção, julgado em 6.10.2003 e RESP 419781-DF, rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJU: 19.12.2002). Diante do exposto, tem-se que é cabível como causa de pedir a declaração de inconstitucionalidade incidenter tantum de disposição da Resolução nº 048/05 – anexos - ou de qualquer outra que a tenha substituído e que mantenha referida inconstitucionalidade material, atinente aos cargos de assistente jurídico, consultor técnico legislativo, assistente especial, assessor especial, assessor parlamentar AP1 a AP13 em sede de ação civil pública, com o escopo de se obter provimento jurisdicional que afaste os servidores admitidos ao arrepio da regra do concurso público. 8 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA LEGITIMIDADE PASSIVA A legitimidade para figurar no polo passivo da presente ação é tanto do Estado de Roraima, quanto da Assembleia Legislativa, na qualidade de litisconsorte passiva necessária. É que, embora a Assembleia Legislativa não tenha personalidade jurídica, assiste-lhe, porém, capacidade processual (personalidade institucionais, judiciária) e para entre a defesa estas de suas certamente prerrogativas se encontra o disciplinamento de seus cargos. Neste sentido, é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme se colaciona dos seguintes precedentes: RECURSO ORDINÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. SERVIDOR PÚBLICO DE ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA. AÇÃO ORDINÁRIA PLEITEANDO ANULAÇÃO DO ATO DE CASSAÇÃO DE APOSENTADORIA.. CUMPRIMENTO DA DECISÃO (REINCLUSÃO DO SERVIDOR NA FOLHA DE PAGAMENTO). PRESIDENTE DO PODER LEGISLATIVO. PARA ESTAR EM LEGITIMAÇÃO JUÍZO. DO ÓRGÃO AUSÊNCIA. PÚBLICO OFENSA ÀS PRERROGATIVAS INSTITUCIONAIS DO ÓRGÃO PÚBLICO NÃO CARACTERIZADA. I- A Assembléia Legislativa, como órgão integrante do ente político Estado, não possui personalidade jurídica, mas apenas personalidade judiciária, o que significa que pode estar em juízo apenas para a defesa de suas prerrogativas institucionais, concernentes a sua organização e funcionamento; nos demais casos, deve ser representada em juízo pelo Estado, em cuja estrutura se insere . II - Assim, cabe à Assembléia Legislativa, por meio de seu Presidente, cumprir a determinação judicial 9 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA consistente em reincluir na sua folha de pagamento - que é administrada por ela própria - servidor que ela excluiu. Nesse caso, estará atuando apenas como órgão de uma estrutura maior que é o Estado. Recurso ordinário desprovido. DIREITO ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. SERVIDOR PÚBLICO. APOSENTADORIA. ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA CAPACIDADE RECURSAL. DO ESTADO INEXISTÊNCIA. DE SÃO PAULO. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO IMPROVIDO. 1. Doutrina e jurisprudência entendem que as Casas Legislativas – câmaras municipais e assembléias legislativas – têm apenas personalidade judiciária, e não jurídica. Assim, podem estar em juízo tãosomente na defesa institucionais. legitimidade Não para de suas têm, recorrer prerrogativas por ou conseguinte, apresentar contra- razões em ação envolvendo direitos estatutários de servidores. 2. Tratando-se ordinária comissão em no Legislativa a que hipótese o quadro do autor, de Estado dos autos ocupante servidores de São de de da Paulo, ação cargo em Assembléia pleiteia o reconhecimento de seu direito à aposentadoria, a legitimidade contra para acórdão que interpor julgou o recurso procedente em especial parte o pedido é da Fazenda Pública do Estado de São Paulo, tendo em vista que tal matéria extrapola a mera defesa das prerrogativas institucionais da Assembléia Legislativa, assim compreendidas aquelas eminentemente de natureza política. Precedentes do STJ. 3. Agravo regimental improvido. 10 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DA VIOLAÇÃO DA REGRA DO CONCURSO PÚBLICO - CR, 37, I e II. O serviço público brasileiro é desempenhado por pessoas que ocupam cargos criados por lei e, regra geral, conforme disposição albergada no artigo 37, II, da Constituição da República, após “aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos”. A livre nomeação criação e e provimento exoneração, de cargo constitui-se em comissionado, exceção à de regra geral, e somente são possíveis se a natureza das funções inerentes ao cargo reclamarem, a bem do serviço público e para seu regular exercício, inequívoca relação de confiança entre nomeante e nomeado. Conforme leciona Alexandre de Moraes: “Essa exceção constitucional exige que a lei determine expressamente quais as funções e os cargos de confiança que poderão ser providos por pessoas estranhas ao funcionalismo público e sem a necessidade do concurso público, pois a exigência constitucional de prévio concurso público não pode ser ludibriada pela criação arbitrária de funções de confiança e cargos em comissão para o exercício de funções que não pressuponham o vínculo de confiança que explica o regime de livre nomeação e exoneração que os caracteriza”. (MOARES, Alexandre de. Direito Constitucional Administrativo. São Paulo: Atlas. 2002. P. 157). (destaque dos autores) Pertinente, por igual, o ensinamento de Lúcia Valle Figueiredo: “O texto Constitucional, ao falar em cargos em comissão ‘declarado em lei de livre provimento e livre exoneração’, está a pressupor a necessidade administrativa de tais cargos. Por isso, é importante a questão da boa-fé, da lealdade e moralidade. [...] O cargo pode ser em comissão, quando sua vocação é para este efeito, ou seja, o elemento que vai se investir neste cargo deve gozar da mais absoluta confiança daquele com quem vai 11 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA trabalhar. Se assim é, não há possibilidade de qualquer cargo ser em comissão, mesmo que a lei assim diga ou considere. Isto seria passível, por hipótese, de uma impugnação judicial, em que o Judiciário poderia verificar, pelo controle amplo, que lhe é assegurado pelo Texto Constitucional, se aquele cargo é de molde a ser provido em comissão ou, de revés, é cargo que poderia ser pertencente ao quadro de cargos de carreira. [...] Se, ao contrário, tivermos uma profusão de cargos em comissão, que sejam ocupados não pelos méritos daqueles que vão oferecê-los, mas, sim, pelas ligações que possam ter como os detentores do poder (em qualquer Administração, seja no Executivo, Legislativo ou Judiciário), é preciso um cuidado muito grande para saber-se o limite do cargo em comissão”. (FIGUEIREDO, Lúcia Valle. Cargos em Comissão e Funções de Confiança. Revista de Direito Público, n. 99, jul-set 1991. São Paulo: Revista dos Tribunais, p. 23-25) De fato, não custa lembrar, evocando Caio Tácito: “A competência legislativa para criar cargos públicos visa ao interesse coletivo de eficiência e continuidade da administração. Sendo, em sua essência, uma faculdade discricionária, está, no entanto, vinculada à finalidade, que lhe é própria, não podendo ser exercida contra a conveniência geral da coletividade, com o propósito manifesto de favorecer determinado grupo político, ou tornar ingovernável o Estado, cuja administração passa, pelo voto popular, às mãos adversárias”. (TÁCITO, Caio. Anulação de Leis Inconstitucionais. Revista de Direito Administrativo, nº 59, jan-mar 1960. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, p. 347). Certamente para evitar atrevimentos legislativos dessa índole, o colendo Supremo Tribunal Federal, em manifestação do Ministro Octávio Gallotti, na Representação n. 1.282.4, advertiu: “(...) a criação de cargo em comissão, em moldes artificiais e não condizentes com as praxes de nosso ordenamento jurídico e administrativo, só pode ser encarada como inaceitável esvaziamento da exigência Constitucional do concurso, erigido em pressuposto 12 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA de acessibilidade aos cargos públicos. (STF. Representação n. 1.368, rel. Min. Moreira Alves, j. 21.5.1987. Revista de Direito Administrativo, nº 176, abr-jun 1989. Rio de Janeiro: Fundação Getúlio Vargas, p. 33)”. Com efeito, o Supremo Tribunal Federal tem interpretado que a exceção à regra do provimento de cargos por concurso público só se justifica concretamente com a demonstração – e a devida regulamentação por lei - de que as atribuições de determinados cargos sejam bem atendidas por meio do provimento em comissão, no qual se exige a relação de confiança entre a autoridade competente para efetuar a nomeação e o servidor nomeado (ADI 1.141, Rel. Min. Ellen Gracie, Pleno, DJ de 29.08.2003; ADI 2.427-MC, Rel. Min. Nelson Jobim, Pleno, DJ de 08.08.2003), pois a missão da políticas pessoa públicas investida ou no funcionar cargo consistirá como autêntica em longa implantar manus da autoridade. Na hipótese em comento, constata-se a existência de um número gratificadas concurso alarmante que público, são que de cargos atribuídos na verdade em a comissão uma gama representa e de uma de funções pessoas cortina sem para esconder cargos de natureza efetiva que exigem a realização de concurso público para o seu provimento. Pelos regulamentos dos referidos cargos verifica-se que as atividades desempenhadas são comuns e ordinárias, isto é, nenhum dos ocupantes dos cargos exercem chefia, comando, direção, assessoramento, nem precisam para a nomeação ou permanência no cargo gozar da confiança da autoridade nomeante. Assim, inquestionável que grande parte de ocupantes de cargos em comissão e funções de confiança presentes na 13 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA Assembleia Legislativa foram admitidos em frontal violação ao artigo 37, incisos I, II e IV da Constituição da República. DA VIOLAÇÃO AOS PRINCÍPIOS DA MORALIDADE, DA EFICIÊNCIA E DA RAZOABILIDADE - ARTIGO 37, CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. A nomeação dos mais de 1.000 (um mil) servidores para o exercício de cargos em comissão e de função de confiança, criados ao arrepio das regras constitucionais atinentes à matéria, conforme demonstrado acima, importou também, ao mesmo tempo, em evidente afronta ao princípio constitucional da moralidade, albergado expressamente no art. 37, caput, da Constituição, e ao princípio da razoabilidade. De fato, é imperioso que o Administrador Público guarde senso de proporcionalidade e justiça entre o ônus que impõe ao erário e, por consequência, à própria população, e os benefícios por ele gerados à coletividade. O patrimônio público, afinal, não pode suportar o gravame ético e financeiro de decisões cujo escopo predominante seja o atendimento partidários dos de compromissos governantes. Tanto pessoais estes ou de arroubos quanto os partidos políticos a que pertencem, incluídas as respectivas legiões de filiados e simpatizantes, existem para, no exercício do poder, servir indistintamente a toda a sociedade, com zelo e eficiência — e não para serem por ela servidos, utilizando-se abusivamente do dinheiro por ela recolhido em prol do erário, tal como aconteceu e vem acontecendo na hipótese, a partir da admissão de servidores sem o devido concurso público. 14 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA Lecionando sobre a moralidade administrativa, afirmou a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro: “... não é preciso penetrar na intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isto ocorre quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa-fé, ao trabalho, à ética das instituições. A moralidade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir; entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruídas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos cidadãos. Por isso mesmo, a imoralidade salta aos olhos quando a Administração Pública é pródiga em despesas legais, porém inúteis, como propaganda ou mordomia, quando a população precisa de assistência médica, alimentação, moradia, segurança, educação, isso sem falar no mínimo indispensável à existência digna. Não é preciso, para invalidar despesas desse tipo, entrar na difícil análise dos fins que inspiraram a autoridade; o ato em si, o seu objeto, o seu conteúdo, contraria a ética da instituição, afronta a norma de conduta aceita como legítima pela coletividade administrada. Na aferição da imoralidade administrativa, é essencial o princípio da razoabilidade. (DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade administrativa na Constituição de 1988. São Paulo: Atlas. 1991, p. 111) Alexandre de Moraes esclarece que o “princípio da razoabilidade pode ser definido como aquele que exige proporcionalidade, justiça, adequação entre os meios utilizados pelo Poder Público, no exercício de suas atividades — administrativas ou legislativas —, e os fins por ela almejados, levando-se em conta critérios racionais e coerentes”. (Ob. cit. p. 114). O mesmo autor, acerca do princípio da eficiência, informa ainda: Princípio da eficiência é aquele que impõe à Administração Pública direta e indireta e a seus agentes a persecução do bem comum, por meio do exercício de suas competências de forma imparcial, neutra, transparente, participativa, eficaz, sem burocracia, e sempre em busca da qualidade, 15 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA primando pela adoção de critérios legais e morais necessários para a melhor utilização possível dos recursos públicos, de maneira a evitar desperdícios e garantir maior rentabilidade social. (Ob. cit. p. 108) – Os grifos foram acrescentados. Referenciado transparência, é uma autor das comenta características também do que a princípio da eficiência, esclarecendo: “Essa transparência, no intuito de garantir maior eficiência à Administração Pública, deve ser observada na indicação, nomeação e manutenção de cargos e funções públicas, exigindo-se, portanto, a observância tão-somente de fatores objetivos como mérito funcional e competência, vislumbrando-se a eficiência da prestação de serviços e, conseqüentemente, afastando-se qualquer favorecimento ou discriminação.” (Ob. cit. p. 110). Adverte ainda o autor: “Lembremo-nos de que o princípio da eficiência, como norma constitucional, apresenta-se como o contexto necessário para todas as leis, atos normativos e condutas positivas ou omissivas do Poder Público, e serve de fonte para a declaração de inconstitucionalidade de qualquer manifestação da Administração contrária a sua plena e total aplicabilidade.” (Ob. cit. p.112) Assim sendo, facilmente se verifica o prejuízo da ética administrativa, da eficiência, da igualdade de oportunidades e do próprio erário, quando o Assembleia Legislativa do Estado de Roraima tenta contornar a observância do princípio da exigibilidade do concurso público como pressuposto de ingresso nos cargos da Administração Pública. A contratação de servidores do modo como vem sendo na Assembleia Legislativa vai de encontro ao princípio da impessoalidade e ao bom funcionamento do serviço público, vez que suprimido o sistema de mérito. 16 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA DO PEDIDO Ante o exposto, o Ministério Público requer o seguinte: a) o recebimento da petição inicial e a citação dos demandados para contestarem a ação no prazo legal, se quiserem, sob pena de revelia e confissão ficta quanto a matéria de fato; b) a condenação dos demandados para que seja determinado: 1) a nulidade da investidura de todos os servidores que estejam exercendo cargos em comissão que não sejam de chefia, direção e assessoramento (artigo 37, V da Constituição da República), notadamente a referente aos cargos de assistente jurídico, consultor técnico legislativo, assistente especial, assessor especial, assessor parlamentar AP1 a AP13, sob pena de incorrer em multa diária no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por servidor encontrado em situação irregular, em favor do fundo de que trata o art. 13 da Lei n° 7.347/85; 2) a nulidade das designações para o exercício de funções gratificadas que não sejam exercidas por servidores efetivos, isto é, aqueles submetidos a prévio concurso público; 3) a abstenção de admitir servidores a título de cargos em comissão da Assembleia Legislativa do Estado de Roraima, que não tenham atribuições de chefia, direção e assessoramento, sob pena de incorrer em multa diária no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), por servidor encontrado em situação irregular, em favor do fundo de que trata o art. 13 da Lei n° 7.347/85; 17 MINISTÉRIO PÚBLICO DE RORAIMA PROMOTORIA DE JUSTIÇA e) a produção de todos os meios de provas admitidos em direito, oportunidade na qual se requer seja requisitado da Assembleia Legislativa do Estado de Roraima que apresente relação atualizada de seus servidores comissionados, efetivos e de outros vínculos, com especificação das atividades desempenhadas, cópia dos atos de nomeação, e dos atos normativos que fundamentaram a contratação. f) a condenação dos réus ao pagamento dos ônus da sucumbência. Dá-se a causa, para fins do artigo 258 do CPC, o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) Boa Vista, 31 de agosto de 2012. João Xavier Paixão Promotor de Justiça Luiz Antônio Araújo de Souza Promotor de Justiça Isaias Montanari Junior Promotor de Justiça 18