ID: 53089636 JUVENTUDE 26-03-2014 Jovens europeus com maior dificuldade para deixar a casa dos pais Relatório ontem divulgado indica que 48% dos europeus com idades entre os 18 e os 29 anos não conseguem ser independentes. Um aumento que foi contrariado por Portugal Tiragem: 34630 Pág: 2 País: Portugal Cores: Preto e Branco Period.: Diária Área: 27,28 x 30,26 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 1 de 4 Samuel Silva E stão perto dos 30 anos, mas ainda vivem com os pais. Há mais jovens europeus sem capacidade para garantir a independência e 48% ainda vivem com a família, aponta um relatório internacional divulgado nesta terça-feira. Em Portugal, esse valor chega aos 55%, mostra o mesmo documento, que coloca também o país entre aqueles em que há mais jovens a viverem em carência extrema. Na maioria dos Estados-membros da União Europeia (UE), há mais jovens a viverem com os pais agora do que em 2007, ano a que se reportava a anterior publicação da European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions (Eurofound), que apresentou o estudo. Em cinco anos — os dados recolhidos dizem respeito a 2011 —, a percenta- gem de jovens (18-29 anos) a viverem com os pais cresceu de uma média de 44% para 48%, nos 28 países. Portugal está acima da média europeia e é um dos que apresentam valores mais altos (12.º). No entanto, os jovens portugueses pertencem a um grupo de 11 países em que se registou uma diminuição (59% para 55%), o que poderá estar relacionado com o aumento da emigração jovem. “É o que terá acontecido na Irlanda, que também foi afectada pela crise de forma particular, e pode ser parte da explicação” no caso português, afirma Anna Ludwinek, uma das autoras do estudo, em declarações ao PÚBLICO. O sociólogo da Universidade de Coimbra Elísio Estanque frisa que a tendência já se notava há alguns anos e atribui responsabilidades a um conjunto de “pontas soltas que vão contribuir para o mesmo efeito”. Por um lado, os jovens têm dificuldade em encontrar uma saída profis- ID: 53089636 26-03-2014 ADRIANO MIRANDA Tiragem: 34630 Pág: 3 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 27,41 x 13,81 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 2 de 4 Portugal é dos países onde os jovens menos confiam nas outras pessoas sional e há uma tendência para protelar a autonomia, e, mesmo os que conseguem trabalho, têm empregos precários e com poucas garantias de futuro. A isto junta-se a dificuldade de acesso a crédito, que impede a compra de casa, mesmo para os que teriam condições para fazê-lo. Por seu turno, uma investigadora da Universidade do Minho, especialista em questões de trabalho, Ana Paula Marques, relaciona estes resultados com outra tendência observada pelo mesmo relatório: um aumento do número de jovens expostos a situações de privação extrema. Vivendo em agregados familiares mais alargados, os jovens estão mais próximos de situações de desemprego, por exemplo. A especialista não tem dúvidas de que esta é uma realidade “decorrente do contexto da crise”. Manter a casa quente, comprar carne ou peixe ou comprar roupas novas são luxos para quase 40% dos jovens portugueses, segundo este relatório. Portugal é o quarto país da União Europeia onde a proporção de jovens que vivem em situações de carência extrema é mais alta, um valor bem acima da média europeia (22%). O indicador registou um crescimento de 17 pontos percentuais desde o último relatório. Em piores condições do que os jovens portugueses, só os de Hungria, Bulgária (50% passam por este tipo de dificuldades em ambos os países) e Chipre (40%). De resto, é entre os países do Sul que estão os maiores aumentos de situações graves de privação. Mas o aumento é generalizado a praticamente todos os países, com crescimentos muito significativos na Suécia (de 1% para 6% dos jovens nesta situação) e na Holanda (de 3% para 8%), por exemplo, aponta Anna Ludwinek. “O aumento das situações de carência extrema é um dos resultados mais preocupantes”, sublinha. O relatório publicado por esta agência da UE, criada em 1975, baseia-se em 45 mil entrevistas realizadas em 2011. Em Portugal, foram entrevistadas 1013 pessoas. Os jovens portugueses são dos mais desconfiados em relação às instituições, em particular o Governo. A confiança interpessoal também baixou e o país é hoje o sétimo da Europa em que os jovens menos confiam nas pessoas. Outro indicador em queda é o optimismo quanto ao futuro, que desceu de perto de 60 pontos (em 100) para baixo dos 40. Pior, só outro país sob intervenção externa de uma troika de credores, a Grécia. Para Anna Ludwinek, estes são dados que mostram que a Europa precisa de mudar o foco: “Não podemos centrar-nos no desemprego jovem, é preciso uma visão mais alargada, para levar em conta outros aspectos sociais com impacto na vida dos jovens”. 26-03-2014 JUVENTUDE País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 27,28 x 30,54 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 3 de 4 A situação social dos jovens na Europa Proporção de jovens que vivem com os pais 2011, em percentagem EU28 2011 35 15 8% Estónia -2% Diferença face a 2007 35 Dinamarca 5% Lituânia 18 Irlanda 42 -3% Holanda -6% Alemanha 33 -3% Reino Unido -4% 26 g Bélgica 6% 15% 64 Rep. Checa 7% Eslováquia 57 Lux. -12% 61 85 França 4% 24 Itália 55 Croácia 9% 79 Espanha 3% 36% Roménia -5% 15 65 2% g Bulgária Portugal Grécia -4% 85 Proporção de jovens que vivem em privação extrema, em % 2011 2007 Hungria 38 65 65 67 Portugal 37 20 36 36 35 Letónia Grécia 20 35 Lituânia Malta 34 20 Estónia Eslováquia 33 26 Polónia 22 Roménia Espanha R. Unido Alemanha 13 7 Eslovénia 21 18 19 15 13 4 Bélgica Holanda 3 6 2 16,4 15,7 14,3 13,8 8,6 8,3 7,6 21 25 Mulheres 18–24 anos 5,9 5,9 5,6 EU 28 4,1 5,5 2,9 2,9 2,8 2,8 2,0 Lux. Fin. Hol. Sué. Din. Port. Chi. Eslové. Rom. Gré. 5 mais 5 menos 90 89 83 81 80 52 45 44 39 26 6 1 Áustria 20,1 18,7 18,1 Homens 9 9 8 Itália 22,3 21,5 21,1 50 12 13 11 15 Croácia 22,8 22,4 Proporção de jovens que estão optimistas em relação ao futuro 2011, em % 16 5 Dinamarca 23,7 22,9 25–29 38 18 9 29,1 26,1 25,8 25,0 21 14 Rep. Checa França 30,1 29,1 22 12 Finlândia Mulheres 28 8 Irlanda Homens 6,3 30 29 33,7 32,6 31,0 31 34 Confiança no Governo 2011 33 21 46,4 44,4 36,1 53 58 40 22 -1% Espanha Grécia Croácia Eslováquia Lituânia Letónia Portugal Irlanda Itália Hungria Polónia Bulgária Roménia França Suécia Chipre Estónia UE 28 Reino Unido Finlândia Bélgica Rep. Checa Luxemb. Eslovénia Dinamarca Malta Alemanha Áustria Holanda Caracterização dos jovens que vivem com os pais Por idade e sexo, em % 2007 Chipre Luxemburgo 50 Chipre 6% 50 50 Bulgária Suécia 46 Malta 9% 2011 A na Pinheiro de Massamá, Sintra, tem 55 anos e está reformada por invalidez. Conquistou a sua autonomia financeira quando tinha 21. Mais cedo do que a filha e o filho. Ela, com 23 anos e ele com 27, estão desempregados e vivem com a mãe. Apesar de terem um elevado grau de formação — licenciatura e mestrado — não conseguem ser independentes. Ana Garcia Santos é mãe de quatro filhas, entre os 19 e os 24 anos e, ao contrário de Ana Pinheiro, tem razões para estar optimista. A filha mais velha continua a viver com a restante família por opção. “É licenciada em Economia e está a trabalhar como consultora, não tem tempo sequer para arrumar o quarto, quanto mais gerir uma família”, conta Ana Santos. Esta e outras situações são as duas faces de uma mesma moeda e, embora por razões diferentes, encaixam na perfeição no retrato tirado pela agência Eurofound no relatório ontem apresentado sobre a situação social dos jovens na Europa. Filipe Fernandes, quase nos 30 anos, está empregado como assessor da Câmara Municipal de Caminha, apesar de a sua formação superior ser em Arquitectura Paisagista. Ainda não conseguiu deixar a casa dos pais por duas razões: “Financeiramente ainda é complicado viver sozinho, continuo a precisar da ajuda dos meus pais. Por outro lado, ajudo-os a pagar as contas, por isso, eles também precisam de mim. É uma dependência de parte a parte.” Apesar disso está confiante, ou seja, em Portugal, faz parte de uma minoria, segundo os dados do estudo (ver infografia). Renata Gouveia Martins, 24 anos, de Lisboa, é licenciada em Direito. Diz-se satisfeita por ter conseguido arranjar trabalho na sua área, mas isso não lhe dá margem para deixar a casa dos pais. “É impossível. Trabalho em full time, mas só recebo 300 euros por mês.” Tal como a maioria, está pessimista e desconfia dos governos. “Não confio neles, são uns insensíveis, não têm noção na realidade.” Também tem dificuldade em lidar com promessas que não se cumprem no local de trabalho. “Entreguei a minha tese de mestrado o mês passado e nada mudou. Prometeramme uma coisa no início e depois não foi bem assim”, lamenta. Marta Mateus vive em Odivelas e, com 26 anos, trabalha em part time como educadora social. Os 530 euros que recebe por mês não chegam para uma vida autónoma. “A maior parte dos meus amigos ainda nem sequer conseguiu o primeiro emprego. Já me disseram para ir para fora, mas isso é muito triste. Quero trabalhar no meu país e contribuir para o meu Estado.” As expectativas goradas, o investimento sem retorno e a falta de oportunidades são razões que justificam, sem surpresa, os dados que apontam Portugal como o segundo país onde há mais jovens pessimistas em relação ao futuro. 9% 58 2007 Telma Alves -3% Áustria Eslovénia 6% Hungria 23 22% 46 55 34 Polónia 23 50 Letónia -3% 50 17% 49 Nem todos ficam em casa porque não podem sair. Há quem fique com a família por opção. E o que dizem pais sobre a (falta de) independência dos filhos? Taxa de desemprego jovem, em % Finlândia 2% Suécia +4% 48% Pessimistas com o futuro, desconfiados com o poder Pág: 4 2011 ID: 53089636 Tiragem: 34630 10 4 Fonte: Eurofound; Eurostat Din. 22 EU 28 total (2011) Sué. Hol. 5 mais Fin. Áus. Chi. Itá. Eslová. Port. Gré. 5 menos PÚBLICO ID: 53089636 26-03-2014 Tiragem: 34630 Pág: 1 País: Portugal Cores: Preto e Branco Period.: Diária Área: 19,00 x 7,86 cm² Âmbito: Informação Geral Corte: 4 de 4 Mais de metade dos jovens não consegue sair de casa dos pais Estudo revela que 55% dos jovens portugueses não têm meios para garantir a sua independência e que 40% vivem em carência extrema. Só os jovens gregos são mais pessimistas que os portugueses Destaque, 2 a 4