Pró-Reitoria de Graduação Curso de Direito Trabalho de Conclusão de Curso A COMPETÊNCIA DO CONARE E A APLICAÇÃO DA LEI 9.474/97 Autora: Raíssa de Araújo Carvalho Orientadora: Profª M.Sc Ivonete A.Carvalho Lima Granjeiro Brasília - DF 2010 RAÍSSA DE ARAÚJO CARVALHO A COMPETÊNCIA DO CONARE E A APLICAÇÃO DA LEI 9.474/97 Monografia apresentada ao curso de graduação em Direito da Universidade Católica de Brasília, como requisito parcial para obtenção do Título de Bacharel em Direito. Orientadora: Ivonete Araújo Carvalho Lima Granjeiro Brasília 2010 Monografia de autoria de Raíssa de Araújo Carvalho, intitulada "A Competência do CONARE e a aplicação da Lei Nº 9.474/97", apresentada como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Direito da Universidade Católica de Brasília, em defendida e aprovada pela banca examinadora abaixo assinada: _______________________________________________ Presidente: Profª. M.Sc. Ivonete Araújo Carvalho Lima Granjeiro Orientadora Direito - UCB _______________________________________________ Prof. Direito - UCB _______________________________________________ Prof. Direito - UCB Brasília 2010 Dedico o presente trabalho a Deus, criador de toda a vida. Aos meus pais, Raimundo e Marly, pelo incentivo, companheirismo e imenso amor, sem eles o meu sonho não teria sido concretizado. Em especial a minha amiga Cecília Medeiros pelo confiança e carinho. Agradeço a professora Ivonete Granjeiro pelos conselhos e empenho para a elaboração desse trabalho. “Cada dia que amanhece assemelha-se a uma página em branco, na qual gravamos os nossos pensamentos, ações e atitudes. Na essência, cada dia é a preparação de nosso próprio amanhã." (Francisco Cândido Xavier) RESUMO CARVALHO, Raíssa de Araújo. A competência do CONARE e a aplicação da Lei nº 9.474/97. 2010. 69f. Direito - Universidade Católica de Brasília UCB. Brasília, 2010. A presente pesquisa tem como intuito discorrer acerca da situação dos refugiados políticos no Brasil e no mundo. De acordo com a Convenção das Nações Unidas, o refugiado é aquela pessoa que por temer perseguição devido a sua raça, cor, religião, visão política, nacionalidade ou por fazer parte de um determinado grupo social, busca abrigo e proteção em outros países com a pretensão de permanência definitiva. Nos dias de hoje, sabe-se que existem mais de 20 milhões de refugiados em todo o mundo, de acordo com a ACNUR- Alto Comissariado nas Nações Unidas. A história relata que existiram incontáveis exemplos de rejeição social, e de casos de perseguições. Fugindo das supostas conseqüências em virtude da escolha de suas próprias opiniões, os indivíduos buscavam abrigos, onde encontrariam uma chance de proteção e com a oportunidade de exercer a sua expressão, seja ela qual for. O tema dos refugiados está presente nos assuntos internacionais a um longo tempo. Com o fim da primeira guerra mundial, as demonstrações de solidariedade para com os desabrigados provenientes da guerra tornaram-se foco mundial. No ano de 1951, entrou em vigor a Convenção da ONU sobre o Estatuto dos Refugiados definindo as condições e tratamentos para os mesmos. O Brasil dentro do cenário Internacional foi considerado como o primeiro país a elaborar uma Lei Nacional de Refúgio, a Lei nº 9474/97. Tal Lei é avançada no sentido de determinar providências e compromissos para com o refugiado político. Com a promulgação desta lei, no ano de 1998 foi criado o Comitê Nacional para Refugiados (CONARE), vinculado ao Ministério da Justiça, no Brasil. Cabe ao CONARE a orientação e análise integral das solicitações para a obtenção do status de Refugiado Políticos no Brasil. Palavras-chave: Refugiados; Políticos; CONARE; Lei nº 9.474/97. ABSTRACT This research has the intention to talk about the political situation of refugees in Brazil and worldwide. According to the UN Convention, a refugee is a person who for fear of persecution because of race, color, religion, political views, nationality or for being part of a particular social group, seeking shelter and protection in other countries with claim to permanent residency. Nowadays, it is known that there are more than 20 million refugees worldwide, according to UNHCR, the UN High Commissioner. The story reports that there were countless examples of social rejection, and cases of persecution. Escaping from the alleged consequences because of choosing their own opinions, people sought shelter, where they would find a chance of protection and the opportunity to exercise their expression, whatever it is. The refugee issue is present in international affairs for a long time. With the end of the first world war, the demonstrations of solidarity with the homeless from the war became a global focus. In the year 1951, entered into force under the UN Convention on the Status of Refugees defines conditions and treatments for them. The Brazil in the International scenario was regarded as the first country to establish a National Refuge Law, Law No. 9474/97. This Act is advanced in order to determine measures and commitments to the political refugee. With the enactment of this law in 1998 created the National Committee for Refugees (CONARE) under the Ministry of Justice, Brazil. It is up to CONARE orientation and comprehensive analysis of requests for obtaining political refugee status in Brazil. Keywords: Refugees; Political; CONARE; Law 9.474/97. SUMÁRIO INTRODUÇÃO ............................................................................................................... 11 CAPÍTULO 1 – REFUGIADOS POLÍTICOS .................................................................. 14 1.1 CONCEITO .............................................................................................................. 14 1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA ......................................................................................... 17 1.3 LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL ............................................................................. 20 1.4 ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS-ACNUR ... 24 1.5 DIFERENÇAS ENTRE ASILO POLÍTICO E REFÚGIO .......................................... 28 1.6 PRINCÍPIO DO NON-REFOULEMENT ................................................................... 31 1.7 COMITÊ NACIONAL PARA REFUGIADOS-CONARE ............................................ 33 CAPÍTULO 2 - A LEI N. 9.7474/97 ................................................................................ 36 2.1 NOTA INTRODUTÓRIA ........................................................................................... 36 2.2 CARACTERÍSTICAS ................................................................................................ 36 CAPÍTULO 3 – EXEMPLOS DE CASOS DE REFUGIADOS NO MUNDO ................... 52 3.1 NOTA INTRODUTÓRIA ........................................................................................... 52 3.2 CASOS CONCRETOS ............................................................................................. 53 3.2.1 Primeiro Caso ...................................................................................................... 53 3.2.2 Segundo Caso ..................................................................................................... 60 3.2.3 Terceiro Caso ...................................................................................................... 62 CONCLUSÃO ................................................................................................................ 64 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 66 11 INTRODUÇÃO O assunto a ser abordado no presente trabalho, qual seja a competência do CONARE e a aplicação da lei nº 9.474/97, apresenta-se como o próprio título já diz, uma questão relacionada aos Direitos Humanos. A Declaração Universal dos Direitos do Homem em seu artigo XIV relata que: “Todo homem, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países.” Semelhante entendimento é o de Eva Demant1, que discorre sobre a idéia que os deslocamentos forçados por conflitos e perseguições, assim como a necessidade de buscar refúgio em outro país, são eventos que refletem perfeitamente essa cruel dicotomia com a qual todos nós convivemos. Por sorte, muitas pessoas compartilham a busca de solução que fortaleça a relação entre democracia, desenvolvimento e direitos humanos Refugiado é a pessoa que devido a fundados temores de perseguição por motivos de: raça, religião, nacionalidade, grupo social e opiniões políticas encontrem-se fora de seu país de nacionalidade, e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país. Nesse sentido, será tratado como objetivo geral do trabalho em questão, no desenrolar dos capítulos, primeiramente sobre a questão dos Refugiados Políticos. A abordagem tratará de discutir aspectos relacionados ao conceito, a evolução histórica, a legislação internacional e nacional, a competência do CONARE, a função do ACNUR e etc. Em seguida, ainda como objetivo geral, em caráter secundário, também será discorrido acerca da Lei 9.474/97, dos Refugiados Políticos instalados no Brasil e também exemplos de casos concretos. Desse modo, após a junção das abordagens dos capítulos pretéritos unindo os preceitos da definição de Refugiado Político, a função do CONARE, a Lei 9.474/97, e _____________ 1 DEMANT, Eva. Refúgio, Migrações e Cidadania. Caderno de Debates. 2007, p. 27. 12 os estudos de casos de refugiados políticos, obtém os objetivos específicos. Assim, teremos a facilidade de melhor compreensão do terceiro momento do trabalho, que seria o tema propriamente dito, ou seja, análise de casos concretos sobre refugiados políticos, dentre outros detalhes. Ainda em relação a análise de casos, a título de exemplo, um deles seria o caso Cesare Battisti, condenado à prisão perpétua na Itália, em virtude de quatro homicídios cometidos naquele país. Antes da imposição de tal pena, procurou abrigo em solo francês, onde obteve o status de refugiado. Sua condição foi cessada no ano de 2007, e o suposto refugiado pediu auxílio brasileiro vindo a se estabelecer no Brasil. Também no ano 2007, teve a sua prisão decretada. O governo italiano pediu a sua extradição para que o mesmo possa cumprir pena na Itália, em razão nos crimes cometidos e a sua pena já estabelecida. A escolha do tema ocorreu pela sua grande repercussão no âmbito do Direito Internacional Público e também nos Direitos humanos. Diante dos efeitos sociais provocados, a questão das perseguições a tais pessoas e o surgimento da proteção do Estado a tais indivíduos. Assim, com a finalidade ilustrativa, a abordagem do presente trabalho é a demonstração da situação do refúgio, tanto no âmbito internacional, como no nacional, as dificuldades, os direitos e a pretensão que um refugiado tem, quando a sua condição é aprovada. Nessa esteira para facilitar o entendimento do tema, o presente trabalho foi dividido em três capítulos. É certo que não se pretende, aqui, esgotar tal assunto, pois o mesmo ainda encontra-se bastante discutido em âmbito jurisprudencial. A metodologia utilizada foi o funcionalismo. Uma vez que o assunto em questão ocupa-se com a explicação dos fatos sociais. O conhecimento doutrinário em exame, oriundo da área de Direito Internacional Público, nos mostra a situação dos refugiados no Brasil e no mundo. O objeto de estudo, se dá mediante pesquisas doutrinárias e jurisprudências, relacionadas ao tema, explicando de maneira clara e objetiva os acontecimentos sociais em torno do refúgio no Brasil e na esfera mundial. 13 Será também utilizado o método indutivo, que se orienta a partir da observação rigorosa dos fatos particulares para se chegar a conclusões gerais, com intuito de demonstrar, uma situação verificada no âmbito do direito internacional público. 14 CAPÍTULO 1 – REFUGIADOS POLÍTICOS 1.1 CONCEITO Atinente aos refugiados políticos, em compreensão inicial, o discernimento de Renato Zerbini Ribeiro Leão é esclarecedor, senão, veja: Refugiado ou refugiada, de acordo com a Convenção de 1951 e seu Protocolo de 1967 da ONU, sobre a Condição de Refugiado, é aquela pessoa que fugiu de seu próprio país para escapar de perseguição, ou por temor a ser perseguida, por motivo de sua raça, religião, nacionalidade, por formar parte de um grupo social particular, ou por suas opiniões políticas. As pessoas refugiadas amparadas por este conceito, com fulcro nesses dois diplomas legais especializados da ONU sobre essa temática, são caracterizadas como “refugiados e refugiadas da convenção”. A partir da década de 1980, a experiência latino-americana na matéria, consubstanciada por meio da Declaração de Cartagena, agrega ao escopo das possibilidades de qualificação como refugiado ou refugiada a possibilidade de que as pessoas o sejam pelo fato de seu país de origem experimentar situação de “grave e generalizada 2 violação de direitos humanos. A legislação brasileira deixou clara a sua contribuição para a definição de refugiado político, de acordo com a referida lei 9.474/97, nestes termos: Art. 1º - Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que: I-Devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país, II- não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve a sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função de circunstâncias descritas no inciso anterior; III- devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país. José Roberto Sagrado da Hora3 compartilhando do mesmo entendimento diz que: O termo refugiado é freqüentemente utilizado pela imprensa, políticos e público em geral para designar uma pessoa que foi obrigada a deixar o seu local de residência e pouca distinção se faz entre as pessoas que tiveram de deixar o _____________ 2 3 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. Refúgio, Migrações e Cidadania. Caderno de Debates 4. 2009, p. 40. HORA, José Roberto Sagrado da. A Polícia Federal e a proteção internacional dos Refugiados. 2007. p.40. 15 seu país por motivos econômicos ou por fundado medo de perseguição. Faz jus esclarecer que aquelas pessoas que deixaram o seu país em virtude de situação financeira não deverá ser considerada como refugiado. A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 10 de setembro de 1948, demonstra em seu artigo 14, in verbis: Art. 14- Toda pessoa em caso de perseguição tem o direito de buscar asilo e desfrutá-lo em outro país. Aduz Márcio Pereira Pinto Garcia4, no livro o Direito Internacional dos Refugiados: uma perspectiva brasileira: Falo do drama daquelas pessoas que chegaram ao Brasil fugindo da perseguição em seu lugar de origem por motivos de raça, religião, nacionalidade, por pertencer a certo grupo social ou expressa determinada opinião política. Enquadrado em algum sítio da definição, reconhece-se (ato declaratório) no perseguido a condição de refugiado: é o que diz o direito internacional dos refugiados e o direito brasileiro. Aqui, o legislador foi além ao incorporar à definição a violação grave e generalizada de direitos humanos. Inspirou-se sem dúvida, na Declaração de Cartagena de 1984. Trata-se do inciso III do artigo 1º da Lei 9.474/97 (Estatuto do Refugiado). O diploma, vale destacar, é dos mais adiantados. Estudo de direito comparado dará notícia de seu avanço. Lei possível, ela representa o compromisso do povo brasileiro com o tema dos refugiados. Em entrevista ao Jornal Carta Forense, Márcia Nina Bernardes, conceitua o Refugiado Político como sendo: Os elementos essenciais para a caracterização do refugiado são, portanto, o fundado temor, a perseguição e a extraterritorialidade. Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), órgão que monitora a implementação da Convenção de 51 pelos diferentes Estados, em seu "Manual de procedimentos e critérios a aplicar para determinar a condição de refugiado" de 1979, dá orientações para a aferição de cada um desses elementos. O conceito de fundado temor, considerado chave para definição, combina um elemento subjetivo, relativo ao estado de espírito do requerente de refúgio, com um elemento objetivo, que pressupõe da autoridade estatal algum conhecimento da situação do país de origem do requerente. Diante da dificuldade de aferição do elemento subjetivo, que varia de uma pessoa para outra, passou-se a presumi-lo pela simples circunstância do indivíduo solicitar refúgio, e a atribuir maior relevância ao elemento objetivo. Importante ressaltar que é suficiente o "fundado receio de perseguição", não sendo necessária a 5 perseguição em si, para a determinação do status de refugiado . _____________ 4 5 GARCIA, Márcio Pereira Pinto. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 150. BERNARDES, Márcia Nina. Entrevista. Jornal Carta Forense. Edição de terça-feira, 4 de maio de 2010. Disponível em: <http://www.cartaforense.com.br/Materia.aspx?id=5551>. Acesso em jul. 2010. 16 A Convenção de 1951 ou o Protocolo de 1967, sobre a condição de refugiado, relata que é considerada como aquela pessoa que fugiu de seu país de origem, para evadir de um temor de perseguição por motivos de raça, cor, religião, nacionalidade, por fazer parte de grupos sociais e também sobre sua visão política. Esclarece ainda a Convenção que a acomodação de tais pessoas, é garantida no país em que venha a se estabelecer, como: a ter uma moradia, a um trabalho remunerado, a residência, educação, assistência social, dentre outros. É de extrema importância ressaltar o princípio “non-refoulement”, que defende a impossibilidade do retorno forçado para o país de origem, do qual o refugiado sofreu graves perseguições. Sobre o principio do “non-refoulement”, nos ensina Flávia Piovesan6 Dentre os direitos protegidos, merece destaque o direito do refugiado de não ser devolvido, que não constitui um princípio basilar do sistema de proteção de refugiados. À luz do principio da não-devolução, ninguém pode ser o brigado a retornar a um país em que a sua vida e liberdade estejam ameaçadas. Esse direito é consagrado no artigo 33 da Convenção de 1951, quando afirma que “nenhum dos Estados contratantes expulsará ou repelirá um refugiado, seja de que maneira for, para as fronteiras dos territórios onde a sua vida ou a sua liberdade sejam ameaçadas em virtude de raça, religião, nacionalidade, filiação em certo grupo social ou opiniões políticas, O princípio do non-refoulement é, assim, um principio geral tanto no Direito dos refugiados como no Direito dos Direitos Humanos, devendo ser reconhecido como um principio jus congens. O autor Paulo Borba Casella7 realiza a conceituação de refugiado: “O critério crucial para conceituar um refugiado, em face da Convenção de 1951 ou do Protocolo de 1967, é a existência de fundado medo de perseguição em virtude de motivos étnicos, religiosos, ou políticos. O conceito legal abrange todos aqueles que estão ameaçados de sanções por lutarem para proteger seus direitos humanos, muito embora não se aplique a qualquer um que possa ser qualificado como transgressor político (que pode, contudo, ser amparado por outras regras de direito internacional). A problemática da situação dos refugiados nos obriga a buscar noções provenientes do direito, da filosofia e da ciência política, e impor-nos a uma reflexão sobre os instrumentos que poderiam prevenir a negação aos homens do “direito a ter direitos”. Hoje, no Brasil, existem cerca de quatro mil refugiados de mais de quarenta _____________ 6 7 PIOSEVAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro, Renovar, 2001, p. 49. CASELLA, Paulo Borba. Refugiados: conceito e extensão. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 17. 17 nacionalidades diferentes. Essencialmente o buscador do asilo é um ser humano que foge da violência para exercer a sua liberdade de expressão. Concluindo o raciocínio ora apresentado para a individualização de um refugiado, são decisivos para a caracterização: o medo de perseguição e a emigração, que é o ato espontâneo de deixar o local onde reside para se estabelecer em outro país. Cabe ressaltar que sem tais características determinada pessoa não deve pode ser considerada como refugiado. 1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA Desde antigamente, a nossa humanidade encontrava sérias dificuldades no que tange ao deslocamento de pessoas. As razões predominavam por motivos políticos e também religiosos. Assim, a história nos relata que a partir desta problemática da convivência social, os indivíduos buscavam abrigos em outros povoados. E foi na Grécia Antiga e na Roma que ocasionou o fenômeno do refúgio ou asilo. A receptividade grega estava ligada a cultura que, desejava mostrar ao mundo todo ser uma civilização com idéias diferentes. Segundo o autor José H. Fischel de Andrade8: A história das gentes narra incontáveis exemplos de rejeição social, perseguição e busca de abrigo creditados aos mais diversos motivos. Ao fugir das conseqüências de um crime cometido, de qualquer discriminação imposta ou da ira de um governante, buscava o individuo a proteção que lhe faltaria caso optasse por permanecer onde outrora se encontrava. Para o autor Hugo Grotius9,sobre a questão do refúgio, explica que o século XVII foi de fundamental importância para o desenvolvimento da instituição do asilo; nessa época as pessoas expulsas de seus lares tinham o direito de adquirir residência permanente em outro país, submetendo-se ao governo que lá detivesse a autoridade. _____________ 8 9 ANDRADE, José H. Fischel. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 101. GROTIUS, Hugo. O Direito Internacional Público. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 306. 18 Ponto crucial, que não deve passar despercebido, seria a questão dos acontecimentos no período do século X a XIII, nos anos 950-1250. A Europa foi nomeada como uma sociedade perseguidora e cruel, onde causava isolamento, repressão e o exílio, para a extinção dos judeus, hereges, leprosos. A discriminação e a busca a estas pessoas era a mando dos príncipes e prelados. Em meados séculos XIII, XIV e XV a situação não foi diferente. Os judeus foram expulsos da França, Espanha, Inglaterra e Portugal, sendo obrigados a se dispersarem pelo mundo a fora em busca de amparo. Estima-se que no final do século XV, houve um fluxo de cerca de 300.000 moradores judeus rumo a Itália, Turquia e países baixos. O instituto jurídico do refúgio nasceu dos acontecimentos advindos do cenário das guerras mundiais. A idéia principal que se tinha era de oferecer proteção as pessoas atingidas pelo grande sofrimento de terror humano. A partir disso verificaramse as causas dos fluxos migratórios, onde uma vasta massa de seres humanos buscava amparo e proteção em outros territórios. José H. Fischel de Andrade10 esclarece: Antes da primeira Guerra Mundial, os problemas existentes ainda não tinham proporcionado a criação do Direito Internacional dos Refugiados, as soluções se davam ou pela concessão de asilo, ou pelo procedimento de extradição, conjugado com o Direito Penal Internacional. De qualquer modo, uma mobilização internacional nunca se fizera necessária: sempre houvera espaços físicos e intelectuais a serem preenchidos e, a grosso modo, os Estados viam com bons olhos uma adição de elementos, economicamente bem situados e com disposição de trabalho, à sua população. Não obstante o panorama, estava em curso de mudança.Tanto que os imigrantes, que antes eram bemvindos pelos Estados sem que sofressem nenhuma discriminação, passaram a ser em sua maioria desencorajados. O refúgio é indicado por meio de três fases distintas. A primeira fase, ocasionada entre os anos de 1921 a 1938, oferecia abrigos de forma material e legal. Tal fato acontecia justamente pela diversa necessidade que o mundo tinha de abrigar os atingidos pelas guerras. Já na segunda fase já existia uma análise sucinta para que acontecesse a obtenção da condição de refugiado, período originado entre 1938 a 1952. E por fim o terceiro momento que se inicia no ano de 1952 até os dias atuais. _____________ 10 ANDRADE, José H. Fischel de. Breve reconstituição histórica da tradição que culminou na proteção internacional dos refugiados. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 104. 19 Sobre o assunto, Guilherme Assis de Almeida11, faz um breve relato histórico, envolvendo o Brasil na esfera Internacional, considerando grandes acontecimentos relacionados ao refúgio: 15 de Julho de 1952: Brasil assina a Convenção sobre o Estatuto do Refugiado de 1951. 28 de Janeiro de 1961: Decreto 50.215 promulga a Convenção sobre o Estatuto do Refugiado de 1951, no ordenamento jurídico brasileiro. É feita uma “reserva geográfica”, ou seja, o Brasil só aceita refugiados vindos do Continente Europeu. 08 de Agosto de 1972: 70.946 promulga o Protocolo de 1967, que passa a integrar o ordenamento jurídico brasileiro. 1977: Primeira missão do ACNUR, no Brasil (esta missão instala-se na cidade do Rio de Janeiro). Nesta época, em plena Ditadura Militar, a atividade do ACNUR limita-se a reassentar, em um terceiro país de asilo, buscadores de asilo vindos de países da América do Sul:Chile, Argentina,Uruguai e Paraguai. 1979-80: 150 vietnamitas são acolhidos. Não lhes é concedido o estatuto de refugiado (por causa da reserva geográfica), mas um estatuto migratório alternativo lhes é dado. 1982: Presença do ACNUR enquanto Organização Internacional é oficialmente reconhecida pelo Governo Brasileiro. 1986: Brasil acolhe 50 famílias Bahai’s aproximadamente 20 pessoas, perseguidas no Irã, por razões religiosas. Por não poderem receber o estatuto de refugiado ( em razão da reserva geográfica), são reconhecidos como asilados. 1989: Escritório do ACNUR é transferido para Brasília. No final deste ano (1989), levanta-se a clausula de reserva geográfica. 1992-1994: Brasil acolhe cerca de 1.200 angolanos que são obrigados a deixar seu país logo após o final das eleições. Apesar de não serem re refugiados, de acordo com a definição de 1951, o Governo Brasileiro concede-lhes o estatuto de refugiado aplicando a Declaração de Cartagena que prevê a concessão do estatuto de refugiado devido “à grave e generalizada violação de direitos humanos”. 1996: Projeto de Lei estabelece a incorporação da Convenção de 1951 ao Direito Brasileiro é sancionada e promulgada pelo Presidente da República. 1997: A Lei 9.474/97 que implementa a Convenção sobre o Estatuto do Refugiado de 1951 ao Direito Brasileiro é sancionada e promulgada pelo Presidente da Republica. 1998: Na festa comemorativa dos Direitos Humanos toma posse a Coordenadoria do CONARE ( Comitê Nacional para Refugiados) que tinha como Presidente a Dra. Sandra Valle( secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça). O CONARE é o órgão do Governo brasileiro, responsável pela elegibilidade dos “casos individuais”, bem como da elaboração das políticas públicas para os refugiados. O CONARE é formado por representantes o Ministério da Justiça e Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Educação, do Ministério do Trabalho, Ministério da Saúde, Departamento da Policia Federal, Organização não-governamental ligada a temática dos Refugiados (Cáritas Brasileira) e o Alto Comissariado das Nações Unidas (ACNUR), como membro convidado, mas sem voto. _____________ 11 ALMEIDA, Guilherme Assis de. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 156-158. 20 O século XX é destinado pela preocupação mundial a cerca dos refugiados. No ano de 1951, foi criado o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR), é um órgão subsidiário a Assembléia Geral da ONU, com o objetivo de ajudar todos os refugiados do mundo todo. As organizações criadas vislumbravam a definição do estatuto dos refugiados, que de modo particular contribuíram para o desenvolvimento da proteção a tais pessoas. Com o entendimento das perspectivas históricas, hoje podemos ter uma visão dos fatos que acarretaram a origem dos refugiados do mundo inteiro. 1.3 LEGISLAÇÃO INTERNACIONAL A origem da legislação Internacional a cerca da situação dos refugiados, se expandiu em razão da primeira guerra mundial, motivo pelo qual a comunidade internacional deu inicio a sua mobilização na busca da proteção aos refugiados, com a criação da Liga das Nações, órgão de institucionalização para a proteção dos refugiados. Criada no ano de 1920, com a finalidade de mobilização da paz, cooperação, e a segurança internacional. Segundo o entendimento de Luciano Pestana Barbosa12, sobre o referido assunto: A convenção da Liga das Nações ainda estabelecia sanções econômicas e militares a serem impostas pela comunidade internacional aos Estados que violassem suas obrigações, o que representou uma redefinição do conceito de soberania estatal absoluta, e, embora ela tivesse preocupado com a proteção de outros grupos hostilizados no mundo, como por exemplo, os indigentes estrangeiros, é preciso dizer que sobretudo, por meio dela que a comunidade internacional iniciou o enfrentamento do problema mundial representado pelos refugiados. De fato, a necessidade da criação de uma instituição de proteção aos refugiados era exigida, principalmente ao iniciarem-se os trabalhos, foram verificadas as _____________ 12 BARBOSA, Luciano Pestana. A Polícia Federal e a proteção Internacional dos refugiados. Brasília: 2007, p. 14. 21 dificuldades que os refugiados traziam consigo como o abandono do país de origem por motivos de perseguição e o fator de não possuir uma nacionalidade, ocasionando assim o não reconhecimento por nenhum país, tornando o que chamamos de indigentes ou indocumentados. Este fato impedia que fossem recebidos ou repatriados por outros países, porque não tinham origem nacional legal. José Fischel de Andrade 13 aduz tal entendimento: Deparou-se a Liga com vários fluxos de refugiados durante a sua existência: russos, armênios, assírios, assírio-caldeus, turcos, alemães, etc. Para solucionar os problemas que surgiam num contexto europeu marcado pela discórdia e ressentimento, promoveu a Liga das Nações, o estabelecimento de distintos “organismos internacionais” que, com competências especificas, ocupavam-se de assistir e auxiliar os refugiados. Paralelamente, concluíam-se “tratados internacionais”- de acordos, ajustes, convenções- que objetivavam precisamente definir o “termo” refugiado, assim como estabelecer qual seria seu estatuto jurídico. Então, com o surgimento dessa necessidade de criação de outros órgãos compromissados com a problemática dos refugiados que, no ano de 1951, foi aprovada a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados, que já em seu artigo 1º estabelece: Art. 1º Definição do termo “refugiado” Para fins da presente Convenção, o termo "refugiado" se aplicará a qualquer pessoa: (...) 2) Que, em conseqüência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, encontra-se fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade encontra-se fora do país no qual tinha sua residência habitual em conseqüência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele. (...) B. 1) Para os fins da presente Convenção, as palavras "acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951", do art. 1º, seção A, poderão ser compreendidos no sentido de a) "acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 na Europa"; ou b) "acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 na Europa ou alhures"; Neste esteio, explicita Flávia Piovesan14, que: _____________ 13 14 ANDRADE, José H. Fischel. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 99. PIOSEVAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 32. 22 A convenção de 1951 estabeleceu uma limitação temporal e geográfica, uma vez que a condição de refugiado se restringia aos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 no continente Europeu. Isto significa que os refugiados somente eram assim reconhecidos se o fossem em decorrência de episódios ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951. Embora aplicável a milhares de pessoas- já que até a década de 50 a maioria dos refugiados era européiatal definição mostrou inoperante com o decorrer do tempo. A de se perceber que a definição da Convenção de 1951, foi conceituada com algumas restrições, com os acontecimentos anteriores e posteriores a guerra. Pensando assim, com a finalidade de ampliar a definição de refugiados, que no ano de 1967 foi criado um protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados: PROTOCOLO DE 1967 RELATIVO AO ESTATUTO DOS REFUGIADOS* Os Estados Partes no presente Protocolo, Considerando que a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados assinada em Genebra, em 28 de julho de 1951 (daqui em diante referida como a Convenção), só se aplica às pessoas que se tornaram refugiados em decorrência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951, Considerando que, desde que a Convenção foi adotada, surgiram novas categorias de refugiados e que os refugiados em causa podem não cair no âmbito da Convenção, Considerando que é desejável que todos os refugiados abrangidos na definição da Convenção, independentemente do prazo de 1 de Janeiro de 1951, possam gozar de igual estatuto. A definição de refugiado foi estendida a outras categorias, e tanto de acordo com a Convenção de 1951 e o Protocolo de 1967, refugiado é aquele sofre fundado temor de perseguição, por motivos de raça, religião, nacionalidade, participação em determinado grupo social ou opiniões políticas. Ainda sob o entendimento de Flávia Piovesan “(...) a definição ampliada e a definição clássica de refugiados não devem ser consideradas como excludentes e incompatíveis, mas, pelo contrario, complementares. O conceito de refugiado, tal como é definido na Convenção e no Protocolo, apresenta uma base jurídica apropriada para a proteção universal dos refugiados. Contudo, isso não impede a aplicação de um conceito de refugiado mais extenso, a ser considerado como um instrumento técnico efetivo para facilitar a sua aplicação ampla e humanitária em situações de fluxos 15 maciços de refugiados.” _____________ 15 PIOSEVAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 32. 23 Portanto com o intuito de coadunar com os aspectos aqui apresentados em relação a legislação Internacional, faz-se mister a declaração da autora Eva Demant:16 Em 1951, após três anos de discussões e negociações no âmbito da comunidade internacional, entrou em vigor a Convenção da ONU sobre o Estatuto dos Refugiados, que definiu a condição de refugiado, estabeleceu o principio da não devolução (ou non-refoulement) e determinou padrões mínimos para o tratamento de refugiados, incluindo seus direitos básicos e seus deveres para com o país que os recebe. (A mesma convenção, que posteriormente foi aprimorada por seu Protocolo Relacionado ao Estatuto de 1967), requeria de seus Estados signatários o compromisso de cooperar e fazer valer os princípios determinados. Não obstante, em 1984, foi desenvolvida a Declaração de Cartagena, com o objetivo de proteger os refugiados da América Central. Este documento demonstrava as diferenças dos refugiados da Europa e da África, dos que vivam na África Latina, adaptando a definição à região. A declaração de Cartagena estendeu o conceito da Convenção de 1951 e apontou idéias inovadoras quanto ao reassentamento de refugiados na América, atendendo aos aspectos locais regionais: As pessoas que tenham fugido de seus países porque a sua vida, segurança ou liberdade tenham sido ameaçadas pela violência generalizada, a agressão estrangeira, os conflitos internos, a violação maciça dos direitos humanos ou outras circunstâncias que tenham perturbado gravemente a ordem pública. Outros instrumentos legais foram sendo construídos no âmbito da proteção dos refugiados, sendo percebido o âmbito da necessidade, em relação do estabelecimento de mecanismos de direitos a serem usufruídos pelos refugiados. Na America Latina, países responderam positivamente a este desafio. Eva Demant esclarece tal assunto: “(...) A região entre os anos 60 e 80 experimentou governos militares, regimes ditatoriais e conflitos civis, possui, hoje, legislação abrangente que promove vários procedimentos de refúgio. Diferentes países têm buscado fortalecer seu marco legal e sua capacidade de processar solicitações de refúgio, como também melhorar sua habilidade em identificar refugiados entre fluxos 17 migratórios, garantindo o acesso aos procedimentos de asilo.” E para finalizar, certos entendimentos, em relação a proteção Internacional dos Refugiados, o Brasil se transformou em um dos países que possui uma das legislações _____________ 16 17 DEMANT, Eva. Refúgio, Migrações e Cidadania. Caderno de Debates 4. Estado: Editora, 2009, p. 29. DEMANT, Eva. Refúgio, Migrações e Cidadania. Caderno de Debates 4. Estado: Editora, 2009, p. 29. 24 mais inovadoras e atualizadas do mundo, quanto aos refugiados. Tal Lei, a 9.474/97, adota um conceito amplo, inspirado na Declaração Cartagena. Com o resultado da lei foi criado no ano de 1998, um Comitê Nacional para Refugiados (CONARE) com o intuito de coordenar, verificar o processo da condição de refugiado e dar assistência jurídica aos mesmos. Por fim, resta consignado o entendimento que existe uma Legislação Internacional com a finalidade de efetuar as garantias voltadas a proteção dos refugiados no Brasil e no mundo. 1.4 ALTO COMISSARIADO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA REFUGIADOS-ACNUR Em Dezembro de 1950 foi criado o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados- ACNUR, por meio da Resolução nº 428 da Assembléia das Nações Unidas, com objetivos primordiais de providenciar a proteção internacional e de buscar soluções a problemática dos refugiados. Logo em seu artigo terceiro, dispõe que o ACNUR, deverá trabalhar de maneira apolítica, humanitária e socialmente. José Roberto Sagrado da Hora,18 relata as funções do ACNUR Ao ACNUR foram designadas as funções primordiais de providenciar a proteção Internacional e buscar soluções permanentes para o problema dos refugiados, desenvolvendo um trabalho profundamente humanitário e cujo inicio das atividades deu-se em 1º de janeiro de 1951, um mandato inicial de três anos, sendo nomeado como encarregado o Dr. Gerrit Goedhart. A missão do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados explica que a sua finalidade é a redução das situações de deslocamento forçado, encorajando os países e outras instituições a criar condições condizentes com a proteção dos direitos humanos e com a resolução pacífica de conflitos. Perseguindo esse objetivo, o ACNUR procura ativamente a consolidação da reintegração dos refugiados que _____________ 18 HORA, José Roberto Sagrado da. A Polícia Federal e a proteção Internacional dos refugiados. Brasília: Editora, 2007, p. 18. 25 regressam aos seus países de origem, procurando prevenir a recorrência de situações que gerem novos refúgios19. O artigo 1º do Estatuto do ACNUR dispõe, in verbis: Art. 1º. O Alto-Comissariado das Nações Unidas para Refugiados, atuando sob a autoridade da Assembléia Geral, assumirá a função de proporcionar proteção internacional aos refugiados que reúnam as condições previstas no presente Estatuto, e de buscar soluções permanentes para o problema dos refugiados, ajudando aos governos e, dependendo da aprovação dos governos interessados, às organizações privadas a facilitar a repatriação voluntaria de tais refugiados, ou a sua absorção nas novas comunidades nacionais. O Estatuto do ACNUR enfatiza o caráter humanitário e estritamente apolítico do seu trabalho, e tem como definição a competência da agência representar e apoiar a qualquer pessoa que encontrar-se fora de seu país de origem e não pode (ou não quer) regressar ao mesmo "por causa de fundados temores de perseguição devido à sua raça, religião, nacionalidade, associação a determinado grupo social ou opinião política”. Definições mais aprofundadas ao termo refugiado passaram a considerar quem teve que deixar seu país devido a conflitos armados, violência generalizada e violação massiva dos direitos humanos. Nesse sentindo, ressalta Fridtjof Nansen20, que: O ACNUR iniciou o seu trabalho logo após a Segunda Guerra Mundial, mas os esforços concertados ao nível internacional para assistência aos refugiados começaram a desenvolver-se no período entre guerras. Os violentos conflitos e tumultos políticos entre 1919 e 1939 desenraizaram mais de cinco milhões de pessoas só na Europa, nomeadamente russos, gregos, turcos, armênios, judeus e republicanos espanhóis. Atualmente, estima-se que mais de 30 milhões de pessoas estão sob o mandato do ACNUR, entre solicitantes de refúgio, refugiados, apátrias, deslocados internos e repatriados. Estas populações estão distribuídas em todos os continentes. O orçamento atual da agência é de US$ 1,13 bilhão por ano. Diferentemente das demais agências da ONU, o ACNUR se mantém por meio de contribuições voluntárias de países doadores. Sendo assim, a agência precisa desenvolver grandes campanhas de captação de recursos. Os fundos indispensáveis para a sobrevivência de milhões de pessoas são _____________ 19 20 ACNUR. Disponível em< http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/a-missao-do-acnur/>. Acesso em 25 mai. de 2010. NANSEN, Fritjof. A situação dos refugiados no mundo, Cinqüenta anos de acção humanitária. ACNUR. Estado: Editora, ano, p. 15. 26 buscados junto à comunidade internacional, ao setor privado e a doadores particulares em todo o mundo. No Brasil, o ACNUR atua em cooperação com o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), ligado ao Ministério da Justiça. Além da proteção física e legal, os refugiados, no país têm direito à documentação e aos benefícios das políticas públicas de educação, saúde e habitação, entre outras. Para garantir a assistência humanitária e a integração dessa população, o ACNUR também trabalha com diversas ONGs no país. 21 Cabe destacar que o ACNUR, não ajuda somente os refugiados, como também os repatriados, deslocados e requerentes de refúgio e apátridas. Busca apoiar os Estados, no sentido de criação efetiva para a proteção dos direitos humanos e especificar soluções conflitantes em torno dos refugiados. O Comitê Executivo do ACNUR (atualmente com 72 Estados Membros) estabelece orientações não vinculativas que podem ser úteis a este respeito. Em algumas situações, o ACNUR pode reconhecer o status de refugiado. Isso acontece em países que não são signatários de quaisquer instrumentos internacionais relativos a refugiados, quando autoridades nacionais pedem ao ACNUR para assumir essa função ou nos casos em que a determinação do status pelo ACNUR é indispensável para garantir proteção e assistência22. No Brasil, há atualmente 4.239 refugiados reconhecidos pelo governo (2009), provenientes de 75 países diferentes. As mulheres constituem o 30% dessa população. A maioria dos refugiados está concentrada nos grandes centros urbanos do país. O Brasil é internacionalmente reconhecido como um país acolhedor. Mas aqui também o refugiado encontra dificuldades para se integrar à sociedade brasileira. Os primeiros obstáculos são a língua e a cultura. Os principais problemas são comuns aos brasileiros: dificuldade em conseguir emprego, acesso à educação superior e aos serviços públicos de saúde e moradia, por exemplo. O escritório do ACNUR no Brasil localiza-se em Brasília. A agência atua em cooperação com o Comitê Nacional para os Refugiados (CONARE), ligado ao Ministério da Justiça. Além disso, para garantir a _____________ 21 22 ACNUR. Disponível em< http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/a-missao-do-acnur/>. Acesso em 25 mai. de 2010. ACNUR. Disponível em: <http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/perguntas-erespostas/?L=type=100?tx_acnurgooglecs_pi1[gcs_q]=costa>. Acesso em 25 mai. 2010. 27 assistência humanitária e a integração dos refugiados, o ACNUR atua também em parceria com diversas organizações não-governamentais (ONGs) em todo o país. São elas a Associação Antônio Vieira (ASAV), a Cáritas Brasileira, a Cáritas Arquidiocesana do Rio de Janeiro, a Cáritas Arquidiocesana de São Paulo, o Centro de Direitos Humanos e Memória Popular (CDHMP) e o Instituto Migrações e Direitos Humanos (IMDH).23 Nos dias atuais, o Presidente do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados é António Guiterres, eleito no ano de 2005. Ex- primeiro Ministro de Portugal, António, foi eleito pela maioria absoluta da Assembléia Geral da ONU, para cumprir mandato de cinco anos. Na sua direção, ganhou duas vezes ao prêmio Nobel da Paz. Para finalizar, tais esclarecimentos referentes ao ACNUR podem adentrar em o seu principal propósito que é assegurar os direitos e bem estar de refugiados, como objetivo final da busca de soluções duradouras que os permitam reconstruírem suas vidas com paz e dignidade. Neste sentido, o ACNUR pode ajudar oferecendo três soluções para os refugiados: repatriação voluntária, integração local e reassentamento em um terceiro país, em situações nas quais seja impossível para um refugiado voltar ao seu país de origem ou permanecer no país de refúgio. Todos os anos, ao redor do mundo, o ACNUR ajuda refugiados a alcançar uma destas soluções. Contudo, para milhões de refugiados e um número ainda maior de pessoas deslocadas em seu próprio país, estas soluções não são uma realidade tangível. O ACNUR tem procurado dar visibilidade a estas situações de refúgio prolongado numa tentativa de buscar soluções adequadas.Em muitos casos, a ausência de soluções de longo prazo agrava problemas relacionados à proteção.24 _____________ 23 24 ACNUR. Disponível em< http://www.acnur.org/t3/portugues/informacao-geral/a-missao-do-acnur/>. Acesso em 25 mai. de 2010. ACNUR. Disponível em:< http://www.acnur.org/t3/portugues/a-quem-ajudamos/solucoesduradouras/>. Acesso em 25 mai. 2010. 28 1.5 DIFERENÇAS ENTRE ASILO POLÍTICO E REFÚGIO Ao adentrar nesta discussão, se faz necessária a explicação da diferença entre asilo político e o refúgio político, para melhor entendimento do assunto em questão. Ao contrário do refúgio, o asilo pode ser territorial, quando o Estado se disponibiliza a proteção, acolhendo a pessoa em seu território nacional. Discorrendo sobre o assunto, a Convenção sobre asilo Diplomático, de março de 1954 nos fala: Art. 5º. O asilo só poderá ser concedido em casos de urgência e pelo tempo estritamente indispensável para que o asilado deixe o país com garantias concedidas pelo Governo do Estado territorial, a fim de não correrem perigo de vida, sua liberdade ou integridade pessoal, ou para que de outra maneira o asilado seja posto em segurança. Art. 6º. Entende-se por casos de urgência, entre outros, aqueles que o individuo é perseguido por pessoas ou multidões que não possam ser contidas pelas autoridades, ou pelas próprias autoridades, bem como quando se encontre em perigo de ser privado de sua vida ou de sua liberdade por motivos de perseguição política e não possa, sem risco, pôr-se em outro modo de segurança. Em outras palavras, compartilhando do mesmo entendimento, Alexandre de Moraes assim define o asilo político: Asilo Político no acolhimento de estrangeiro por parte de um Estado que não o seu, em virtude de perseguição por ele sofrida e praticada ou por seu próprio país ou, ainda por terceiro. As causas motivadoras dessa perseguição, ensejadora de concessão do asilo, em regra, são: dissidência política, livre manifestação de pensamento ou, ainda, crimes relacionados com a segurança 25 do Estado, que não configurem delitos no direito penal comum. O autor Luciano Pestana Barbosa26 assinala duas principais diferenças e semelhanças relacionadas ao asilo e ao refúgio: -O asilo representa um instituto convencionado regionalmente, estabelecido entre países latino-americanos, enquanto que o Refúgio é um instituto convencionado mundialmente; -O asilo pode ser concedido no próprio país de origem do peticionário. Para a concessão do Refúgio, é condição essencial que a pessoa encontre-se fora de seu país de origem; _____________ 25 26 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18 ed. São Paulo: Atlas, p. 72. BARBOSA, Luciano Pestana. A Polícia Federal e a proteção Internacional dos refugiados. Brasília: Editora: 200, p. 30. 29 - A concessão do Asilo representa o exercício de um ato soberano próprio dos Estados, possuindo caráter constitutivo, enquanto que a resolução que concede Refúgio a um peticionário possui um caráter propriamente declaratório; -As convenções de Asilo não prevêem nenhum organismo encarregado de seu cumprimento ou supervisão, nem o Estado recebe- em geral- assistência mediante programas da ACNUR; - Apesar de o Asilo possuir previsão legal em diversas convenções regionais interamericanas, não possui uma definição tão clara quanto à estabelecida para o Refúgio, através do disposto pela Convenção de 1951; - O asilo é um instituto que nasceu como proteção frente a uma perseguição atual e presente, contra uma pessoa(nos termos da Convenção sobre Asilo Territorial de Caracas de 1954), enquanto que para o Refúgio é suficiente o “ fundado temor de perseguição”; -As causas que motivam a concessão de Asilo são mais limitada que as que dão lugar ao Refúgio, pois a qualificação da delinqüência política pertence ao Estado que concede o Asilo; -Também constitui uma diferença importante a que consiste em que, ao decidir um Estado se concede ou não Asilo, não lhes interessa se o perseguido tenha atuado contra as finalidades e princípios da ONU, o que, no caso do Refúgio, seria uma causa de exclusão. Dessa maneira, existe a possibilidade também de se verificar importantes semelhanças ter o Asilo e Refúgio, ainda de acordo com o autor Luciano Barbosa Pestana, que assim esclarece: -estão relacionados com a proteção da pessoa humana sujeita à perseguição e coincidem em seu caráter humanitário; -não excluem possibilidade de extradição -não se sujeitam a reciprocidade. O asilo político recebe previsão na Constituição Federal Brasileira de 1988, sem seu artigo 4º: Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: I - independência nacional; II - prevalência dos direitos humanos; III - autodeterminação dos povos; IV - não-intervenção; V - igualdade entre os Estados; VI - defesa da paz; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo; IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político (grifo meu) Ainda sobre a diferença entre asilo político e refugio, Guilherme Assis de Almeida, nos fala: O asilo é gênero que possui duas espécies: o asilo político e o estatuto do refugiado. Uma diferença essencial entre asilo político e o estatuto do refugiado refere-se ao âmbito de sua aplicação. O asilo político é um instituto jurídico da 30 America Latina, enquanto o Estatuto do Refugiado faz parte do Direito Internacional. Flávia Piosevan27 define o instituto do asilo: O instituto do asilo na acepção latino-americana encontra seu fundamento contemporâneo no artigo 22 da Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, que dispõe: “Toda pessoa tem o direito de buscar e receber asilo em território estrangeiro, em caso de perseguição por delitos políticos ou comuns conexos com delitos políticos, de acordo com a legislação de cada Estado e com as Convenções internacionais.” Como acima mencionado o asilo é na acepção regional latino americana e o refúgio é recepcionado de maneira global. Mesmo que sejam institutos diferentes, buscam ambos tem mesma finalidade que a proteção da pessoa humana. Ainda nas palavras de Flávia Piosevan28, sobre a diferença entre asilo e refúgio: Ao tecer diferenças entre o asilo e o refúgio, vislumbra-se inicialmente que o refúgio é um instituto jurídico internacional, tendo alcance universal e o asilo é um instituto jurídico regional, tendo alcance na região da America Latina. O refúgio, como já examinado, é medida essencialmente humanitária, enquanto asilo é medida essencialmente política. O refúgio abarca motivos religiosos, raciais, de nacionalidades, de grupo social e de opiniões políticas, enquanto 29 que o asilo abarca apenas os crimes de natureza política Finalizando os presentes esclarecimentos, existem algumas diferenças entre a instituição do asilo e do refúgio, como acima demonstrados. Evidencia-se, portanto que embora assemelhados, tratam fundamentalmente a proteção da pessoa humana. Tal fator é inconfundível. _____________ 27 28 29 PIOSEVAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 55. PIOSEVAN, Flávia. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2004, p. 57. SILVA, José Afonso da. Curso de Direito constitucional positivo. 33.ed. Ed. São Paulo: Malheiros, 2010. “O asilo político é o recebimento de ingresso de indivíduo, para evitar punição ou perseguição no seu país de origem por delito de natureza política e ideológica. Cabe ao Estado a classificação da natureza do delito e dos motivos de perseguição. É razoável que assim o seja, porque a tendência do Estado do asilado é a de negar a natureza política do delito imputado e dos motivos da perseguição, para considerá-lo como crime comum”. 31 1.6 PRINCÍPIO DO NON-REFOULEMENT Com as sábias palavras de José Francisco Sieber Luz Filho (2001, p. 179) é esclarecedor, senão vejamos: Compreende-se como princípio de non-refoulement um princípio de direito internacional dos refugiados, segundo o qual o solicitante de refúgio não poderá ser encaminhado a um país onde o mesmo possa sofrer, ou já sofre, uma perseguição ameaçadora ou violadora de seus direitos fundamentais. Sobre o assunto, o artigo 33 da Convenção de Genebra de 1951 do Estatuto dos Refugiados, nos fala: Artigo 33- Proibição de expulsão ou de rechaço: (1) Nenhum dos Estados Contratantes expulsará ou rechaçará, de maneira alguma, um refugiado para as fronteiras dos territórios em que a sua vida ou a sua liberdade seja ameaçada em virtude da sua raça, da sua religião, da sua nacionalidade, do grupo social a que pertence ou das suas opiniões políticas. Para melhor entendimento, o termo non-refoulement é de origem francesa. No direito Internacional o termo refoulement, significa ato jurídico em que um Estado devolve um indivíduo que se encontra na jurisdição de outro Estado. É uma repulsa de um Estado em referência a um refugiado em seu território. Querendo ou não é a rejeição do Estado em relação ao refugiado instalado em seu território. É proibida a aplicação do refoulement ao solicitante de refúgio. Logo, é de caráter das autoridades imigratórias que avaliem as condições do refugiado, e do país de origem do mesmo, para que eventuais problemas em torno da temática possam vir a ocorrer. Ainda nas sábias palavras de José Francisco Sieber Luz Filho30: O princípio de non-refoulement aplica-se, portanto, diante da solicitação do reconhecimento da condição jurídica de refugiado expressa pelo indivíduo estrangeiro. É o momento da entrada do estrangeiro no território nacional, de maneira que a rejeição do mesmo, ainda que não esteja em território nacional, mas na fronteira ou em territórios internacionais, implica na violação do _____________ 30 LUZ FILHO, José Francisco Sieber. O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 181. 32 princípio. Isso posto, imagine-se uma aeronave que, contendo passageiros refugiados encontra-se em espaço aéreo internacional, ou espaço aéreo nacional estrangeiro, e solicita permissão de pouso em aeroporto brasileiro; se manifestada esta a intenção de solicitar refugio, a negativa da solicitação de pouso em território nacional implica na violação do principio de nonrefoulement. O mesmo ocorre com embarcações. Tal princípio consiste na proteção internacional, que garante que nenhum indivíduo será levado ao país onde sofre a perseguição, país que originou a condição de refugiado, ou qualquer outro risco presente que se trate do princípio do nonrefoulement. Assim, o Estado está obrigado a proteção Internacional nos termos dos instrumentos jurídicos vigentes, a execução de tal comprometimento funda-se na garantia do non-refoulement. A Lei brasileira 9.474/97, sobre o assunto, nos mostra a sua função de proteção internacional. Podemos verificar, no § 1º do artigo 7º, da Lei 9.474/97: Artigo.7º- O estrangeiro que chegar ao território nacional poderá expressar sua vontade de solicitar reconhecimento como refugiado a qualquer autoridade migratória que se encontre na fronteira, a qual lhe proporcionará as informações necessárias quanto ao procedimento cabível. §1º- Em hipótese alguma será efetuada sua deportação para fronteira de território em que sua vida ou liberdade esteja ameaçada, em virtude de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política. (grifo meu) José Francisco Sieber Luz filho, nos relata:31 Logo o benefício previsto no § 2º do artigo 7º diz respeito à proibição de deportação, isto é, do refoulement. Entretanto, limitar expressão do refugiado que traduz sua vontade em ter sua condição oficialmente reconhecida é atentar contra o direito individual previsto no texto na Constituição da Republica, igualmente, ferir os tratados internacionais de direitos humanos incorporados na ordem jurídica brasileira. Por tal motivo, a autoridade migratória que colocar em prática o refoulement através da aplicação do § 2º di artigo 7º da Lei 9.474/97 o deverá fazer com fundamentação concreta e objetiva,não há que se falar aqui em discricionariedade do poder público,mas sim em ato administrativo subordinado ao preceito da Lei 9.474/97, regulamentadora do exercício da proteção internacional do refugiado Vale dizer que tal princípio não poderá ser invocado nos casos em que o indivíduo represente perigo à segurança nacional. Trata-se, portanto de uma série de _____________ 31 LUZ FILHO, José Francisco Sieber.O direito de asilo e a proteção internacional. In: ARAÚJO, Nádia de Almeida. O Direito Internacional dos Refugiados: Uma perspectiva brasileira. Rio de Janeiro: Renovar, 2001, p. 182. 33 limitações do princípio do non-refoulement, a qual deve ser interpretada de acordo com a Lei 9.747/97, para assim garantir a proteção internacional contra qualquer ameaça a vida, a segurança e a liberdade do refugiado. 1.7 COMITÊ NACIONAL PARA REFUGIADOS-CONARE O CONARE é um órgão de deliberação coletiva, no âmbito do Ministério da Justiça. Integram-no, além da sociedade civil e do ACNUR, cinco Ministérios e o Departamento de Policia Federal. Não há dúvidas de que o Comitê executa um intenso trabalho, dotado de um conteúdo humanitário irretocável, em prol dos refugiados e das refugiadas acolhidas no Brasil. O Direito Brasileiro, além de internalizar os instrumentos nacionais, instituiu a Lei nº 9.474/97 que acolhe a definição ampliada de refugiados. Com a promulgação de tal lei foi criado o CONARE (Comitê Nacional para os refugiados) que contribui na proteção dos estrangeiros perseguidos ou abandonados por seu País de origem. A competência do CONARE, esta relacionada em analisar as solicitações de refúgio em primeira instância. Cabe ao Órgão, declarar a condição de refugiado, e também a decisão em relação a cessação ou perda dessa condição. Além dos poderes de julgamento, a Coordenação das ações relacionadas à proteção, à assistência, e ao apoio jurídico aos refugiados. E, finalmente, a orientação e aprovação das instruções normativas relacionadas ao texto da Lei dos Refugiados Para o início do processo de requerimento de refúgio, são necessários apenas dois documentos. O trâmite não é burocrático. Precisa-se do termo de declaração do solicitante, no qual conste a sua intenção de refugiar-se no Brasil, lavrado pela autoridade migratória, artigo 9º, cujo modelo foi instituído pelo CONARE n. 01, e o questionário elaborado pelos Cáritas. Os documentos acima mencionados devem ser enviados juntos, ao CONARE, quais seja o termo de declarações do solicitante, lavrado pela autoridade migratória, e o questionário assinado pelo próprio solicitante. O processo de reconhecimento da 34 condição de refugiado não tem grandes exigências burocráticas, ao contrário, uma vez instruídas, é decidido em uma única reunião plenária. De acordo com a Lei 9.474/97, em seu art. 12, nos mostra as atribuições relativas ao CONARE: Art. 12. Compete ao CONARE, em Consonância com a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e com as demais fontes de direito internacional dos refugiados: analisar o pedido e declarar o reconhecimento, em primeira instância, da condição de refugiado; decidir a cessação, em primeira instância, ex officio ou mediante requerimento das autoridades competentes, da condição de refugiado; I-determinar a perda, em primeira instância, da condição de refugiado; II-orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da proteção, assistência e apoio jurídico as refugiados; III-aprovar instruções normativas esclarecedoras à execução desta Lei. O CONARE é o organismo público responsável em receber as solicitações de refúgio no Brasil, e determinar se os solicitantes reúnem as condições necessárias para serem reconhecidos como refugiados. Além disso, cabe ao CONARE a promoção e coordenação de políticas e ações necessárias para uma eficiente proteção e assistência aos refugiados, além do apoio legal. Aprova, ainda, os programas e orçamentos anuais do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), quando direcionados ao Brasil. É um órgão de deliberação coletiva formado por sete membros que representam os ministérios da Justiça, Relações Exteriores, Trabalho, Saúde, Educação e Esporte, o Departamento de Polícia Federal e uma organização não governamental, dedicada à atividade de assistência e proteção aos refugiados no Brasil. O ACNUR é membro convidado com direito à voz, mas sem direito a voto.32 Outorga às pessoas que reconhece como refugiados, documentação que lhes permite residir legalmente no país, trabalhar e a ter acesso aos serviços públicos, tal qual como a saúde, educação, e outros. Dados relativos a coordenação-geral do CONARE, assevera que outorgou o status de refugiado, até setembro de 2009, a 4.183 pessoas.33 _____________ 32 33 WIKIPEDIA. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Comit%C3%AA_Nacional_para_os_ Refugiados>. Acesso em 30 mai. 2010. CONARE. Dados da Coordenação de acordo com o caderno de Debates 4. 2009. p.8. 35 Dessa forma, o CONARE, tem a contribuição de várias entidades, inclusive não governamentais, de órgãos públicos nacionais e internacionais, como as Embaixadas, por exemplo, mas é preciso ter em mente que, a favor do solicitante, há a presunção de que suas informações sejam verdadeiras, já que em favor dele, milita a presunção de veracidade. 36 CAPÍTULO 2 - A LEI N. 9.7474/97 2.1 NOTA INTRODUTÓRIA A Lei 9.474/97 foi sancionada pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso em 22 de Julho de 1997. “A data de sua vigência, de acordo com seu artigo 49, é a de 23 de julho de 1997. Neste dia, a Lei foi publicada na Seção I, às páginas 15822-15824, do Diário Oficial da União de número 139. Esta Lei compreende oito títulos, dezessete capítulos, três seções e 49 artigos. O primeiro título trata dos aspectos caracterizadores do refúgio, vale dizer, do conceito, da extensão, da exclusão e da condição jurídica do refugiado e da refugiada. O segundo título trata do ingresso no território nacional e do pedido de refúgio. O terceiro título trata do CONARE. O quarto título trata do processo de refúgio, ou seja, do procedimento, da autorização da residência provisória, da instrução e do relatório, da decisão, da comunicação, do registro e do recurso. O quinto título abrange os efeitos status de refugiado sobre a extradição e a expulsão, enquanto que o sexto trata da cessação e da perda da condição de refugiado ou de refugiada. O sétimo título trata das soluções duráveis, como é o caso da repatriação, da integração local e do reassentamento. Finalmente, o oitavo título apresenta as disposições finais.”34 2.2 CARACTERÍSTICAS Logo no artigo 1º da Lei 9.474/97, como característica fundamental, está claramente definido o conceito de refugiado, senão veja: _____________ 34 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 25 37 Artigo 1º - Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que: I - devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país; II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior; III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país. A lei brasileira 9.474/97 é moderna, justamente porque logo em seu primeiro artigo contempla as definições da ONU, em seus incisos I e II, e a contribuição latinoamericana, e no inciso III a conceituação de refugiado. Atualmente, no Brasil, a importância de tal lei, é extrema uma vez que a mesma é que tem amparado os casos de refugiados que chegam ao país. Tal lei ainda contempla os conceitos do Direito Internacional dos Refugiados, assim como motivadora tripartite Governo, Sociedade Civil e ACNUR. Assim, podemos verificar o entendimento de Renato Zerbini Ribeiro Leão:35 À luz das reiteradas manifestações sobre o campo conceitual do refúgio, consideradas pelo CONARE, é fundamental destacar que a determinação do status de refugiado está intimamente vinculada a dois elementos presentes na definição incorporada no inciso I: o elemento subjetivo e pessoal do temor de perseguição, e o elemento objetivo que do fundamento a este temor, ou seja, fatos que permitem avaliar a possibilidade da perseguição ao solicitante realmente ocorrer. Ambos os elementos são levados em consideração pelo CONARE na análise de casos específicos, e a caracterização do fundado temor de perseguição se faz presente em varias de suas decisões. O artigo 2º da referida Lei fala: Art.2º. Os efeitos da condição dos refugiados serão extensivos ao cônjuge, aos ascendentes e descendentes, assim como aos demais membros do grupo familiar que do refugiado dependerem economicamente, desde que se encontrem em território nacional. Os princípios consagrados neste artigo dão a alternativa para que os refugiados que se encontrem no Brasil, possam ter a oportunidade de manter o seu grupo familiar de forma unida, desde que se encontre em território nacional. Tal artigo nasceu por meio da Resolução Normativa nº 4, do CONARE, em 1º de dezembro de 1998. Assim, o referido artigo é considerado uma extensão ao conceito de refugiado, possibilitando assim, a chance de manter a sua família reunida. _____________ 35 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 26/27. 38 O artigo 3º explicita que: Artigo 3º - Não se beneficiarão da condição de refugiado os indivíduos que: I - já desfrutem de proteção ou assistência por parte de organismo ou instituição das Nações Unidas que não o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados – ACNUR; II - sejam residentes no território nacional e tenham direitos e obrigações relacionados com a condição de nacional brasileiro; III - tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas; IV - sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas Assim, no artigo terceiro da referida lei, é demonstrado a impossibilidade de não haver benefício para o refugiado. Renato Zerbini Ribeiro Leão, nos fala claramente, sobre o assunto, senão vejamos: A Lei 9.474/97 prevê, em seu artigo 3º, inciso II que, “não se beneficiarão da condição de refugiado indivíduos que (II) tenham cometido crime (...) contra a humanidade.” Entende-se também como este último, crime envolvendo tratamento desumano à população civil em contexto de ataque, generalizado ou sistemático. Incluindo homicídio, tortura, violência sexual e perseguição, entre outros. A responsabilidade individual para crimes desse gênero decorre não somente da participação física do indivíduo, mas também do conhecimento de 36 que sua ação ou omissão facilitara a conduta criminosa coletiva. Neste sentindo Celso D. Albuquerque Mello37, aduz: Crime de guerra- Os crimes de guerra são aqueles “praticados durante os conflitos armados e que violam as normas de conduta dos beligerantes pelo Direito Internacional.” Os crimes contra a paz e humanidade- Entende-se por crime contra a paz “a direção, a preparação e o desencadeamento ou prosseguimento de uma guerra de agressão ou de uma guerra de violação dos tratados, garantias ou acordos internacionais ou a participação num plano concertado ou num conluio para a execução de qualquer um dos precedentes.” Já nos crimes contra a humanidade seriam: “ assassinato, exterminação, redução à escravidão, deportação e qualquer outro ato desumano cometido contra populações civis, antes e durante a guerra; ou então, perseguições por motivos políticos, raciais ou religiosos, quando esses atos ou perseguições, quer tenham ou não constituído uma violação do direito interno dos países onde foram perpetrados, tenham sido cometidos em conseqüência de qualquer crime que entre na competência do Tribunal ou uma ligação com o crime. _____________ 36 37 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 52. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direitos humanos e conflitos Armados. Rio de Janeiro: Renovar, 1997. p.421. 39 O artigo, ora em questão nos mostra as possibilidades da não concessão para a condição de refugiado. Observadas as regras claramente previstas nos artigos, a pessoa não poderá ser contemplada com o beneficio de refugiado. Já o capítulo II da Lei, nos mostra a da condição jurídica de refugiado, claramente vista nos artigos 4º ao 6º: CAPÍTULO II Da Condição Jurídica de Refugiado Artigo 4º - O reconhecimento da condição de refugiado, nos termos das definições anteriores, sujeitará seu beneficiário ao preceituado nesta Lei, sem prejuízo do disposto em instrumentos internacionais de que o Governo brasileiro seja parte, ratifique ou venha a aderir. Artigo 5º - O refugiado gozará de direitos e estará sujeito aos deveres dos estrangeiros no Brasil, ao disposto nesta Lei, na Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951 e no Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967, cabendo-lhe a obrigação de acatar as leis, regulamentos e providências destinados à manutenção da ordem pública. Artigo 6º - O refugiado terá direito, nos termos da Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, a cédula de identidade comprobatória de sua condição jurídica, carteira de trabalho e documento Para melhor entendimento dos artigos 4º, 5º e 6º, Renato Zerbini Ribeiro Leão38, explica: O disposto nos três artigos constantes deste capítulo II, título I desta Lei, confere ao refugiado e a refugiada reconhecidos pelo CONARE os direitos e deveres constantes não só na Lei 9.474/97, como também aqueles positivados nos tratados internacionais dos quais o Brasil é Estado Parte. Cabe menção especial ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e ao Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 do âmbito das Nações Unidas, assim como à Convenção Americana sobre Direitos Humanos ou Pacto de San José da Costa Rica. Trata-se, sem dúvida, de um claro sinal da Lei em prol da convergência das três vertentes da proteção internacional da pessoa humana. Não há dúvida de que seu corpo normativo está construído a partir da visão convergente destes três ramos de proteção internacional. Ainda na órbita da mesma Lei, em seu título II, já nos fala do ingresso no Território Nacional, para posteriormente ser feito o pedido de refúgio: Artigo 7º - O estrangeiro que chegar ao território nacional poderá expressar sua vontade de solicitar reconhecimento como refugiado a qualquer autoridade migratória que se encontre na fronteira, a qual lhe proporcionará as informações necessárias quanto ao procedimento cabível. § 1º - Em hipótese alguma será efetuada sua deportação para fronteira de território em que sua vida ou liberdade esteja ameaçada, em virtude de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opinião política. _____________ 38 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 55/56. 40 § 2º - O benefício previsto neste artigo não poderá ser invocado por refugiado considerado perigoso para a segurança do Brasil. Artigo 8º - O ingresso irregular no território nacional não constitui impedimento para o estrangeiro solicitar refúgio às autoridades competentes. Artigo 9º - A autoridade a quem for apresentada a solicitação deverá ouvir o interessado e preparar termo de declaração, que deverá conter as circunstâncias relativas à entrada no Brasil e às razões que o fizeram deixar o país de origem. Artigo 10 - A solicitação, apresentada nas condições previstas nos artigos anteriores, suspenderá qualquer procedimento administrativo ou criminal pela entrada irregular, instaurado contra o peticionário e pessoas de seu grupo familiar que o acompanhem. § 1º - Se a condição de refugiado for reconhecida, o procedimento será arquivado, desde que demonstrado que a infração correspondente foi determinada pelos mesmos fatos que justificaram o dito reconhecimento. § 2º - Para efeito do disposto no parágrafo anterior, a solicitação de refúgio e a decisão sobre a mesma deverão ser comunicadas à Polícia Federal, que as transmitirá ao órgão onde tramitar o procedimento administrativo ou criminal. O princípio de ingresso irregular no território brasileiro não constitui proibição para a solicitação de refúgio. Outra questão de suprema importância, ainda em referência ao artigo sétimo, se diz em relação ao §1º, que ressalta que o estrangeiro não será mandado para seu país de origem ou para qualquer outro lugar em que sua liberdade possa se encontrar ameaçada. Para a permanência no Brasil, se faz necessário o desejo de solicitação de refúgio para as autoridades competentes, que deverão ouvir o interessado e dar-lhe um termo de declaração, que deverá conter as razões que o fizeram abandonar o seu país. Quando a condição de refúgio, for atendida, e se posteriormente for verificado que os fatos que levaram a causa de ingresso em território nacional justificam algum procedimento administrativo ou criminal, efetuado pelo refugiado, tal processo será arquivado, desde que a Policia Federal comunique ao órgão ao que tramite o procedimento administrativo ou criminal. A título de exemplo, da situação acima mencionada, faz jus, o sábio comentário do ilustre autor Renato Zerbini Ribeiro Leão39: São muitos os casos que demonstram que o CONARE assimilou esta norma em suas decisões. O caso de um solicitante angolano ilustra bem esta situação. O caso relata que o mesmo “vivia na província de Cabinda-Angola. Em razão de seu pai ter integrado a da FLEC- Frente de Libertação do Enclave de Cabinda- o solicitante cresceu assistindo o apoio da população em prol da independência de Cabinda no período colonial, que cresceu após a _____________ 39 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 56/57. 41 independência de Angola. Em 1983, o movimento fundou seu braço armado, a Fac- Forças Armadas de Cabinda e passou a se chamar FLEC-FAC. Com o falecimento de seu pai em 2000, de causas naturais, o solicitante passou a fazer parte do movimento, reunindo-se com membros da FLEC, fazendo propaganda por meio da distribuição de panfletos. Na época teriam ocorrido desaparecimentos forçados e detenções arbitrárias. O solicitante foi perseguido por opiniões políticas, chagando a ser baleado quando tentou fugir da polícia. Após alguns meses hospitalizado, obteve um passaporte falso e decidiu fugir para o Brasil. Aqui chegando foi preso por uso indevido de documentos falsos. Do presídio, encaminhou um pedido de refugio à Càritas de São Paulo, que, por sua vez, oficiou a Coordenação do Comitê e a Policia Federal. O solicitante foi entrevistado no próprio presídio. Portanto, restou demonstrado que o acesso ao procedimento de determinação do status de refugiado pode ultrapassar os requisitos formais. Igualmente, o CONARE aplicou o disposto no artigo 8º da Lei que dispõe sobre a possibilidade de acessar os procedimentos de refú gio, mesmo que o solicitante tenha ingressado no País de forma irregular. A solicitação de reconhecimento de refugiado foi atendida. O título III da referida Lei, dentro dos artigos 11 aos 16, nos esclarece sobre a importância e o papel, que exerce o CONARE- Comitê Internacional para Refugiados. Entretanto, vale lembrar que as decisões do CONARE interferem diretamente na vida de pessoas. A Lei 9.474/97 é firmada de princípios jurídicos de ampla defesa e do juízo justo, prevê também que poderá haver a possibilidade de recurso, caso a solicitação de refúgio possa vir a ser indeferida. As decisões acatadas pelo CONARE são desempenhadas com precisão, em busca de informações que fundamentam as solicitações feitas pelos refugiados. No Título IV, está explicitado as fases de processo para reconhecimento do refúgio no Brasil, estes claramente visíveis nos artigos 17 ao 20, assim disponíveis: Artigo 17 - O estrangeiro deverá apresentar-se à autoridade competente e externar vontade de solicitar o reconhecimento da condição de refugiado. Artigo 18 - A autoridade competente notificará o solicitante para prestar declarações, ato que marcará a data de abertura dos procedimentos. Parágrafo único - A autoridade competente informará o Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados – ACNUR sobre a existência do processo de solicitação de refúgio e facultará a esse organismo a possibilidade de oferecer sugestões que facilitem seu andamento. Artigo 19 - Além das declarações, prestadas se necessário com ajuda de intérprete, deverá o estrangeiro preencher a solicitação de reconhecimento como refugiado, a qual deverá conter identificação completa, qualificação profissional, grau de escolaridade do solicitante e membros do seu grupo familiar, bem como relato das circunstâncias e fatos que fundamentem o pedido de refúgio, indicando os elementos de prova pertinentes. Artigo 20 - O registro de declaração e a supervisão do preenchimento da solicitação do refúgio devem ser efetuados por funcionários qualificados e em condições que garantam o sigilo das informações. 42 Na concepção de Luciano Pestana Barbosa40, sobre os artigos supracitados, este nos relata: O registro deve ser apresentado nas condições estabelecidas pelos artigos iniciais do Título II da Lei 9.474/97, bem como deve haver manifestação de vontade, de cunho personalíssimo, não podendo o processo de refúgio ser iniciado de ofício. Depois de recebido, o pedido será encaminhado ao CONARE, para análise e decisão fundamentada, seja positiva ou negativa. (No primeiro caso, decidindose pelo reconhecimento, será expedida a declaração de reconhecimento decisão declaratória), a qual produzirá efeito retroativo e permitirá o seu registro no Departamento de Polícia Federal e conseqüente expedição da sua cédula de Identidade de Estrangeiro. No segundo caso, ou seja, de não reconhecimento, caberá recurso ao Ministro de Estado da Justiça, esgotando-se a instância administrativa. Entretanto, face ao preceito constitucional previsto no inciso XXXv, art. 5º, de que a “lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça de direito”, o solicitante, poderá ingressar com a medida judicial cabível, que poderá ser um Mandado de Segurança, habeas corpus, ou ação declaratória. O capítulo II, no título IV, prevê sobre a autorização de residência provisória, que será efetuada depois de recebida a solicitação de refúgio, onde será emitida ao solicitante e ao seu grupo familiar, uma autorização para permanência em território brasileiro até que se verifique a decisão final do processo de estadia permanente ou não. Dentro ainda das prerrogativas do Capítulo III, ainda do Título IV, é falado sobre a instrução e o relatório, que deverá ser enviado pela autoridade competente ao Comitê Nacional para Refugiados- CONARE, estes relatórios são provenientes dos processos relativos a solicitação de refúgio, assunto posteriormente discutido na pauta da próxima reunião do colegiado. Os artigos 26 aos 28 apresentam sobre a decisão de permanência do refugiado, da comunicação ao solicitante e a elaboração do seu registro, que o caracteriza a decisão de reconhecimento da condição de refugiado, assim observemos: Artigo 26 - A decisão pelo reconhecimento da condição de refugiado será considerada ato declaratório e deverá estar devidamente fundamentada. Artigo 27 - Proferida a decisão, o CONARE notificará o solicitante e o Departamento de Polícia Federal, para as medidas administrativas cabíveis. Artigo 28 - No caso de decisão positiva, o refugiado será registrado junto ao Departamento de Polícia Federal, devendo assinar termo de responsabilidade e solicitar cédula de identidade pertinente. _____________ 40 BARBOSA, Luciano Pestana. A polícia Federal e a Proteção Internacional dos Refugiados. Brasília: 2007, p.47. 43 De fato, conforme bem esclarecidos, os artigos acima, nos faz referência sobre a possibilidade de permanência e os conseqüentes atos, que a autoridade competente irá adotar em relação aos refugiados e as medidas administrativas cabíveis, para que a estadia permanente se faça nas formas dos trâmites legais. O Capítulo V, da supracitada Lei, nos mostra casos de possibilidades de recursos, em situações que houve decisões negativas, para a permanência em território brasileiro e para a condição de refúgio, assim vejamos: Do Recurso Artigo 29 - No caso de decisão negativa, esta deverá ser fundamentada na notificação ao solicitante, cabendo direito de recurso ao Ministro de Estado da Justiça, no prazo de quinze dias, contados do recebimento da notificação. Artigo 30 - Durante a avaliação do recurso, será permitido ao solicitante de refúgio e aos seus familiares permanecer no território nacional, sendo observado o disposto nos §§ 1º e 2º do artigo 21 desta Lei. Artigo 31 - A decisão do Ministro de Estado da Justiça não será passível de recurso, devendo ser notificada ao CONARE, para ciência do solicitante, e ao Departamento de Polícia Federal, para as providências devidas. Artigo 32 - No caso de recusa definitiva de refúgio, ficará o solicitante sujeito à legislação de estrangeiros, não devendo ocorrer sua transferência para o seu país de nacionalidade ou de residência habitual, enquanto permanecerem as circunstâncias que põem em risco sua vida, integridade física e liberdade, salvo nas situações determinadas nos incisos III e IV do artigo 3º desta Lei. Novamente, o ilustrado autor Renato Zernibi Ribeiro Leão41, nos mostra comentários em relação ao recurso, que é uma possibilidade de verificação da existência da condição do refugiado, assim vejamos: De fato, no caso de um solicitante colombiano e a esposa, ”que alegavam sofrer perseguição por parte de paramilitares, devido ao fato de uma vez terem na condição de médicos, prestado a guerrilheiros das FARC”,a decisão foi revertida em grau de recurso, em razão de que somente nesta etapa processual lograram apresentar documentos capazes de ilustrar a perseguição alegada para sustentar seus fundados temores de perseguição, consubstanciado-lhes a credibilidade não constatada inicialmente. Já no caso de um solicitante iraquiano, “ a decisão do CONARE foi pelo indeferimento do pedido de refúgio em razão de não ter sido demonstrado, à época, fundado temor de perseguição. Entretanto, em grau de recurso, o solicitante demonstrou que a situação do Iraque, em momento posterior ao da decisão inicial, caracterizava-se por uma grave e generalizada violação de direitos humanos, o que induzia a temer por sua integridade. O ministro de Estado da Justiça, ante avalanche de informações acerca da realidade iraquiana do momento, acolheu a argumentação do solicitante e modificou a decisão do CONARE. _____________ 41 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 61/62. 44 Para que se verifiquem as possibilidades de aceitação do recurso se faz necessário, que o refugiado demonstre fundado temor de perseguição e mostre também que a sua integridade encontra-se em risco. Analisando os fatos que cercam o solicitante, a autoridade competente poderá reanalisar a situação, deferindo a permanência do refugiado em território brasileiro. O título V, da ilustrada lei, logo em seu capítulo I, dos artigos 33 aos 35, nos relata sobre a situação da extradição e expulsão do refugiado político, quais sejam: TÍTULO V Dos Efeitos do Estatuto de Refugiados Sobre a Extradição e a Expulsão CAPÍTULO I Da Extradição Artigo 33 - O reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio. Artigo 34 - A solicitação de refúgio suspenderá, até decisão definitiva, qualquer processo de extradição pendente, em fase administrativa ou judicial, baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio. Artigo 35 - Para efeito do cumprimento do disposto nos artigos 33 e 34 desta Lei, a solicitação de como refugiado será comunicada ao órgão onde tramitar o processo da extradição. Ainda em relação ao Título V, da citada Lei, esta, alvo de grandes debates discursivos no que se refere ao assunto do refúgio, por parte do Supremo Tribunal Federal-STF, Renato Zerbini Ribeiro Leão, nos fala: “...No inicio deste século, este Título que trata dos efeitos do Estatuto de Refugiados sobre a Extradição e a Expulsão, em seu capítulo I, teve seu artigo 33, o reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentam a concessão de refugio e seu artigo 34. A solicitação de refúgio suspenderá, até a decisão definitiva, qualquer processo de extradição pendente, em fase administrativa ou judicial, baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio questionada no âmbito daquela Corte. No Brasil, os casos de extradição são regulados à luz da Constituição Federal e, por isso, são apreciados pelo Supremo Tribunal Federal. Cabe ressaltar que os princípios da Lei 9.474/97 buscavam a proteção internacional da pessoa, enquanto a extradição era um instituto de cooperação judiciária entre os Estados. Assim, foi decidido que o refúgio deveria ter prevalência e as disposições dos artigos 33 e 34 eram constitucionais, sendo que, no tocante ao último, a suspensão do processo de extradição, diante da solicitação de 45 refúgio, poderia ocorrer inclusive nos pedidos de extradição já deferidos e não efetivados administrativamente.” 42 Para melhor visualização do assunto em debate, trouxemos o caso de um cidadão libanês43: Nele o CONARE ao indeferir a solicitação de reconhecimento do status de refugiado, assinalou o fato de que o pedido de refúgio não deve ser utilizado como instrumento para provocar a extinção do processo de extradição. Neste caso, “ a solicitação de extradição era formulada pelo Paraguai, que acusava o solicitante de crimes de evasão de divisas, de associação criminal e de apologia ao crime. O solicitante alegava que era um “troféu da guerra anti-terror” porque, em realidade, os EUA pressionavam o governo paraguaio a entregá-lo pelo fato de lhe terem imputado a prática de atividade de subvenção a grupos terroristas na fronteira compartilhada entre Argentina, Paraguaia e Brasil. O Supremo Tribunal Federal decidiu favoravelmente à extradição, excluindo o pedido, entre outros, a apologia ao crime. O CONARE, neste caso, considerou tratar-se o Paraguai de um Estado Democrático de Direito. Desta maneira, o solicitante teria garantido, ante próprias instituições paraguaias, os preceitos de ampla defesa. Assim sendo, não havia fundamentos capazes de sustentar o fundado temor de perseguição,e, em conseqüência, o solicitante teve o seu pedido indeferido e a extradição efetivada. O capítulo II do Título V trata da expulsão, assim previsto nos artigos 36 e 37 da Lei 9.474/97: Da Expulsão Artigo 36 - Não será expulso do território nacional o refugiado que esteja regularmente registrado, salvo por motivos de segurança nacional ou de ordem pública. Artigo 37 - A expulsão de refugiado do território nacional não resultará em sua retirada para país onde sua vida, liberdade ou integridade física possam estar em risco, e apenas será efetivada quando da certeza de sua admissão em país onde não haja riscos de perseguição. Tais artigos são inspirados nos parágrafos 1º e 2º, do artigo 33 da Convenção de 1951 da ONU sobre os Refugiados. Assim sendo, o artigo 37 prevê a consagração do principio do “non-refoulement”, ou seja, da “não devolução” pela Lei 9.474/97. Este princípio trata da não devolução do refugiado ou da refugiada para o país de origem, onde a sua vida e integridade encontrava-se em eminente risco. Renato Ribeiro Zerbini Leão44, nos fala: _____________ 42 43 44 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 67. CONARE. Ministério da Justiça. Processo Ministério da Justiça: 08280.00092/2003-91, p.154. LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 107. 46 Portanto, pelo seu caráter vital, ele é pedra angular da proteção internacional do refugiado e, por isso, está consagrado no § 1º do artigo 33 da Convenção de 1951. O Brasil, além dos diplomas legais já mencionados, está obrigado a respeitar este princípio conforme o disposto no artigo 22.8 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos. Cumpre ainda esclarecer que à luz do entendimento do CONARE, em relação ao referido capítulo, o fato de que seu campo de tratamento é o da expulsão e não o da deportação. Assim sendo, esta norma garante o direito à vida do refugiado ou da refugiada em qualquer circunstância. A ilustrada Lei, também fala da cessação e da perda da condição de refugiado, logo visualizada no artigo 38, que assim dispõe: Da Cessação da Condição de Refugiado Artigo 38 - Cessará a condição de refugiado nas hipóteses em que o estrangeiro: I - voltar a valer-se da proteção do país de que é nacional; II - recuperar voluntariamente a nacionalidade outrora perdida; III - adquirir nova nacionalidade e gozar da proteção do país cuja nacionalidade adquiriu; IV - estabelecer-se novamente, de maneira voluntária, nos país que abandonou ou fora do qual permaneceu por medo de ser perseguido; V - não puder mais continuar a recusar a proteção do país de que é nacional por terem deixado de existir as circunstâncias em conseqüência das quais foi reconhecido como refugiado; VI - sendo apátrida, estiver em condições de voltar ao país no qual tinha sua residência habitual, uma vez que tenham deixado de existir as circunstâncias em conseqüência das quais foi reconhecido como refugiado. As hipóteses normativas previstas para a declaração da cessação da condição de refugiado e de refugiada no Brasil estão disponíveis no artigo 38 desta Lei. Assim, é claramente previsto que nos quatro primeiros incisos a questão que envolve a voluntariedade do refugiado em buscar a proteção do país do qual é nacional ou que o que tenha abandonado, assim como está presente nos aspectos relativos à aquisição e à recuperação da nacionalidade. Assim, no que tange ao aspecto do inciso V, embasada na transitoriedade do instituto do refúgio, o Brasil deixa de aplicar a reapatriação forçada, consagrando apenas a voluntária. Também, no capítulo II, é relata da perda da condição de refugiado, expressamente previsto no artigo 39 da supracitada Lei: A Perda da Condição de Refugiado Artigo 39 - Implicará perda da condição de refugiado: 47 I - a renúncia; II - a prova da falsidade dos fundamentos invocados para o reconhecimento da condição de refugiado ou a existência de fatos que, se fossem conhecidos quando do reconhecimento, teriam ensejado uma decisão negativa; III - o exercício de atividades contrárias à segurança nacional ou à ordem pública; IV - a saída do território nacional sem prévia autorização do Governo brasileiro. Parágrafo único - Os refugiados que perderem essa condição com fundamento nos incisos I e IV deste artigo serão enquadrados no regime geral de permanência de estrangeiros no território nacional, e os que a perderem com fundamento nos incisos II e III estarão sujeitos às medidas compulsórias previstas na Lei n. 6.815, de 19 de agosto de 1980. Declarar a perda da condição de refugiado e de refugiada é uma difícil decisão a ser tomada pelo Comitê, pois está se retirando destas pessoas a condição de refugiado que lhes outorga proteção internacional. Assim, o CONARE busca cerca-se de todos os elementos, fáticos e teóricos, capazes de lhe permitir uma decisão justa. Renato Ribeiro Zerbini Leão opina sobre o assunto: Os casos decididos pelo CONARE com relação à perda do instituto do refúgio são caracterizados pela irrefutabilidade dos fatos que fundamentam esta decisão. Por exemplo, no caso de um refugiado cidadão etíope. O Comitê decidiu pela perda de seu status de refugiado após comprovar “ o seu desejo manifesto em não mais receber a proteção do Governo Brasileiro.” A decisão teve como mote circunstancial o fato do então refugiado abandonar o Brasil rumo ao Canadá sem autorização do Comitê, conforme preceitua a Resolução º 5/99. Assim, com fulcro no inciso IV deste artigo 39, o Comitê decretou a perda da sua condição de refugiado amparado pela Lei 9.474/97. A renúncia da condição de refugiado expressa pelo interessado também enseja na perda do seu status, à luz do disposto no inciso I do referido artigo. O inciso III também prevê a perda da condição de refugiado devido ao exercício de atividades contrárias a segurança nacional ou a ordem pública. As possibilidades que podem ser elencadas com fulcro inquestionáveis. Por exemplo, o enquadramento neste inciso, aliado as disposições do inciso IV, fundamentou que a perda da condição de um refugiado liberiano, que foi declarada “após a ciência por parte do Comitê de uma sentença judicial brasileira, transitada em julgado, que o condenou por crimes de tráfico e uso indevido de drogas, assim como a sua saída do território sem a devida autorização. 45 _____________ 45 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. Estado: Editora, 2007, p. 68/69. 48 Cabe esclarecer que os artigos 40 e 41, nos falam sobre a autoridade competente no caso de recurso, quando existe a perda da condição de refugiado, assim estabelecido: Da Autoridade Competente e do Recurso Artigo 40 - Compete ao CONARE decidir em primeira instância sobre cessação ou perda da condição de refugiado, cabendo, dessa decisão, recurso ao Ministro de Estado da Justiça, no prazo de quinze dias, contados do recebimento da notificação. § 1º - A notificação conterá breve relato dos fatos e fundamentos que ensejaram a decisão e cientificará o refugiado do prazo para interposição do recurso. § 2º - Não sendo localizado o estrangeiro para a notificação prevista neste artigo, a decisão será publicada no Diário Oficial da União, para fins de contagem do prazo de interposição de recurso. Artigo 41 - A decisão do Ministro de Estado da Justiça é irrecorrível e deverá ser notificada ao CONARE, que a informará ao estrangeiro e ao Departamento de Polícia Federal, para as providências cabíveis. Compete ao CONARE, decisão nos casos de perda da condição de refugiado. É papel primordial do órgão, analisar minuciosamente, se o refugiado em questão pode continuar ou não com a proteção do Estado brasileiro. Em caso de indeferimento por parte do Comitê, cabe ao Ministro de Estado de Justiça decidir sobre a situação do refugiado. Caso haja também indeferimento por parte do Ministro, não caberá recurso algum, e será informado ao Departamento de Policia Federal, para que tome as providências exigidas sobre o caso. O titulo VII, da referida Lei, nos relata sobre as situações de repatriação do refugiado, vejamos: TÍTULO VII Das Soluções Duráveis CAPÍTULO I Da Repatriação Artigo 42 - A repatriação de refugiados aos seus países de origem deve ser caracterizada pelo caráter voluntário do retorno, salvo nos casos em que não possam recusar a proteção do país de que são nacionais, por não mais subsistirem as circunstâncias que determinaram o refúgio. Como claramente observado no artigo 42, existem duas possibilidades de reapatriação. Uma delas é a vontade voluntária, por parte do refugiado de ser reconhecido como nacional de seu país de origem. E a outra possibilidade, que não é voluntária, diz respeito às situações em que não existe o reconhecimento da condição de refugiado por parte do país em que o mesmo, procurou proteção. 49 Renato Zerbini Ribeiro Leão46, diz: O artigo 42 é claro ao caracterizar a reapatriação como uma solução durável. Um exemplo se encontra no caso de uma família afegã, que teve a perda da condição de refugiados de seus membros declarada, em razão de sua renúncia àquela condição por terem voluntariamente decidido retornar ao seu país de origem. Observemos a seguir, os artigos 43 e 44 da Lei 9.474/97, que esclarece sobre a Integração local: Da Integração Local Artigo 43 - No exercício de seus direitos e deveres, a condição atípica dos refugiados deverá ser considerada quando da necessidade da apresentação de documentos emitidos por seus países de origem ou por suas representações diplomáticas e consulares. Artigo 44 - O reconhecimento de certificados e diplomas, os requisitos para a obtenção da condição de residente e o ingresso em instituições acadêmicas de todos os níveis deverão ser facilitados, levando-se em consideração a situação desfavorável vivenciada pelos refugiados. A integração local dos refugiados faz parte da proteção internacional, no seu sentido mais amplo. É muito importante possibilitar aos refugiados o acesso a políticas públicas de saúde, educação, trabalho e outras que lhes permitam a prática da cidadania. Os artigos 43 e 44 da Lei enfocam importantes aspectos de integração, que facilitam aos refugiados o reconhecimento de seus documentos, inclusive no que diz respeito à vida profissional. De acordo com o Instituto de Migrações e Direitos (IMDH) 47,no Brasil existem Redes de Proteção que investem na implementação de políticas públicas existentes, somando-se aos esforços e articulações, incorporando várias instituições, entes, personalidades, organizações sociais, universidades, que se unem na luta pela defesa do refúgio, migrações contemporâneas, na promoção de políticas públicas e ações solidárias de proteção. De acordo com Carneiro Rocha48: Durante todo o processo de inserção dos refugiados na sociedade brasileira, são desenvolvidos programas para o acompanhamento, para que estes adquiram condições de se integrar de uma forma concreta e estruturada. Os _____________ 46 47 48 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 70. INSTITUTO de Migrações e Direitos Humanos. Ministério da Justiça. 2007, p.2. CARNEIRO. W. P Rocha; MATEUS, Janaína. Reflexões sobre a questão racial e o refúgio no Sistema Brasileiro. In: RODRIGUES, Viviane. Direitos humanos e refugiados. 2006, p. 28. 50 programas são direcionados a que, num período de curto prazo, os refugiados consigam adquirir sua auto-suficiência econômica e criar condições materiais e psicológicas para estabelecer uma nova vida e realidade. Assim, temos também a oportunidade de verificar a situação do reassentamento, previstos nos artigos 45 e 46 da Lei dos refugiados brasileira: Do Reassentamento Artigo 45 - O reassentamento de refugiados em outros países deve ser caracterizado, sempre que possível, pelo caráter voluntário. Artigo 46 - O reassentamento de refugiados no Brasil se efetuará de forma planificada e com a participação coordenada dos órgãos estatais e, quando possível, de organizações não-governamentais, identificando áreas de cooperação e de determinação de responsabilidades. Verifica-se conforme acima mencionado, a possibilidade de em outros países, os refugiados exercerem de forma voluntaria o reassentamento em outros países. E no Brasil observa-se que o reassentamento depende da participação coordenada dos órgãos estatais e de apoio das organizações nãogovernamentais. E para finalizar os esclarecimentos da referida Lei 9.474/97, iremos relatar os artigos 47,78 e 49, que assim estabelecem: Das Disposições Finais Artigo 47 - Os processos de reconhecimento da condição de refugiado sério gratuitos e terão caráter urgente. Artigo 48 - Os preceitos desta Lei deverão ser interpretados em harmonia com a Declaração Universal dos Direitos do Homem de 1948, com a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e com todo dispositivo pertinente de instrumento internacional de proteção de direitos humanos com o qual o Governo brasileiro estiver comprometido. Artigo 49 - Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Renato Zerbini Ribeiro Leão esclarece sobre os mencionados artigos que: O artigo 48 do Título VIII explicita a disposição afirmativa da Lei 9.474/97 em alcançar a convergência entre três vertentes da proteção internacional da pessoa humana. A menção cristalina deste artigo “ a Declaração Universal de Direitos do Homem de 1948, a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, ao Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e todo o dispositivo pertinente de instrumento internacional de proteção de direitos humanos com o qual o Governo Brasileiro estiver comprometido” confirma a disposição deste diploma entre o direito humanitário, os direitos humanos e o direito dos refugiados. Finalizando tais entendimentos a Lei 9.474/97 incorpora definitivamente o ordenamento jurídico brasileiro a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, como Tratados Internacionais de Direitos Humanos. Tal Lei é vista como um verdadeiro marco na trajetória do comprometimento brasileiro com a temática dos refugiados. Esta trajetória iniciou-se em 1952, com o reconhecimento da Convenção sobre o Estatuto do 51 Refugiado de 1951, e culmina com a promulgação desta Lei 9.747/97, tão necessária à situação dos refugiados que chegam ao Brasil em busca de proteção. 52 CAPÍTULO 3 – EXEMPLOS DE CASOS DE REFUGIADOS NO MUNDO 3.1 NOTA INTRODUTÓRIA O terceiro capítulo, em questão fala sobre exemplos de situações de refúgio no âmbito mundial. O primeiro deles faz referência ao caso Cesare Battisti, que nos dias 09 e 10 de setembro de 2009, o Pleno do Supremo Tribunal Federal iniciou o julgamento conjunto do Pedido de Extradição nº 1085, formulado em 04/05/2007 pelo Governo da Itália, contra Cesare Battisti, e do Mandado de Segurança nº 27875, também impetrado pela República da Itália, contra ato do Ministro da Justiça brasileiro. Após pedidos de vistas, o julgamento foi concluído em 18 de novembro de 2009. Battisti está preso no Brasil desde 18 de março de 2007, em virtude do mencionado processo de extradição, decorrente de sua condenação à prisão perpétua em dois processos criminais na Itália, pela prática de quatro homicídios cometidos no final da década de 1970. Porém, o caso teve maior repercussão na imprensa nacional e italiana a partir de janeiro de 2008, quando o Ministro da Justiça brasileiro concedeu o status de refugiado político a Battisti, em pedido formulado por este ao Comitê Nacional para Refugiados (órgão colegiado vinculado ao Ministério da Justiça, que analisa pedidos de reconhecimento da condição de refugiado, bem como declara a perda desse status, entre outras atribuições). Inicialmente, o CONARE negou (por 3x2 votos) o pedido de Battisti, porém, após recurso decidido pelo Ministro da Justiça (na condição de presidente do órgão), foi declarado o status de refugiado, principalmente sob o embasamento de temor fundado de perseguição por motivo de opinião política (um dos fundamentos para a concessão de refúgio, previsto no art. 1º, I, da Lei nº 9.474/97). 53 Isso implicou na discussão sobre a possibilidade – ou não – de sua extradição para a Itália, e a competência para a prática desse ato.49 O segundo caso, em comento, seria sobre a situação de três paraguaios, que em janeiro de 2002, policiais e agentes do Estado do Paraguai seqüestraram e torturaram militantes e dirigentes políticos do Partido Pátria Livre, no Paraguai. Os agentes públicos do Paraguai retomaram com esta operação as práticas de Terrorismo de Estado praticadas pela ditadura Stroessner. Apesar de documentado, com fartas provas contra os policiais e seus mandantes, a Justiça Paraguaia nada fez apesar do flagrante envolvimento de autoridades, ministros e chefes de polícia. Três dos torturados estão refugiados no Brasil, reconhecidos com status de refugiados pelo Comitê Nacional para os Refugiados - CONARE. 50 E o terceiro caso, faz referência a um sobrinho de um ex-ministro de segurança de um país da África Ocidental. O fato de o solicitante ser originário de um país constituído sobre as bases de um Estado Democrático de Direito não é impedimento para a solicitação da condição de refúgio em território brasileiro. 3.2 CASOS CONCRETOS 3.2.1 Primeiro Caso No dia 09 de setembro de 2009, o Supremo Tribunal Federal, iniciou o julgamento da situação de Cesare Battisti. O mesmo foi integrante de um grupo que intitulava-se Proletários Armados para o Comunismo (PAC). Na Itália, Cesare Battisti foi _____________ 49 50 CARDOSO, Oscar Valente. Extradição X Refúgio: o caso Cesare Battisti. Disponível em: <http://www. http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=14487>. Acesso em 27 set. 2010. REVISTA KOEYÚ LATINOAMERICANO. Disponível em: <http://www.direitos.org.br/index. php?option=com_content&task=view&id=1799&Itemid=1>. Acesso em 27 set. 2010. 54 condenado à pena de prisão perpétua, em razão de seu envolvimento, em quatro homicídios, ocorridos na década de 70 naquele país europeu. O ex-integrante do grupo armado foi julgado e condenado pelo judiciário italiano. Antes, porém, de cumprir a pena que lhe foi imposta, Cesare Battisti procurou refúgio em solo francês, onde lá viveu sob a condição de refugiado, concedido pelo Governo Miterrand. Essa situação foi revogada pelo Governo de Jacques Chirac, levando o escritor italiano a vir para o Brasil, onde foi preso em 2007. A pretensão do governo italiano é a de ter recolhido à prisão uma pessoa que cometeu quatro homicídios, e que já foi julgada pelos tribunais italianos. O povo da Itália quer apenas que um condenado cumpra a pena que lhe foi legitimamente imposta, pelo Poder Judiciário Italiano. Para tanto, o governo italiano solicitou ao governo brasileiro a extradição do condenado. A extradição nada mais é do que a entrega do indivíduo, que está no território do Estado solicitado, para responder a processo penal ou cumprir pena no Estado solicitante. 51 O julgamento sobre a extradição de Cesare Battisti, de nº 1.085 República Italiana, teve inicio no dia 09 de setembro de 2009, pelo Supremo Tribunal Federal, compondo a Presidência, o ministro, Gilmar Mendes e presentes a sessão os senhores Ministros Marco Aurélio, Ellen Gracie, Cezar Peluso, Carlos Britto, Joaquim Barbosa, Ricardo Lewandowski, Eros Grau e Cármen Lúcia, cabendo transcrever o extrato da ata da extradição nº 1.085, do dia 09/09/2009: Decisão: Preliminarmente, o Tribunal homologou o pedido de desistência do recurso de agravo regimental na Extradição nº 1.085 e indeferiu o pedido de sustentação oral em dobre, tendo em vista o julgamento conjunto. Votou o Presidente. Em seguida, o Tribunal rejeitou a questão de ordem suscitada pela senhora Ministra Carmen Lucia no sentido de julgar o Mandado de Segurança nº 27.875 antes do pedido de extradição, vencidos a suscitante e os senhores Ministros Eros Grau, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio. O Tribunal, por maioria, julgou prejudicado o pedido de mandado de segurança, por reconhecer nos autos de extradição a ilegalidade do ato de concessão do status de refugiado concedido pelo Ministro de Estado da Justiça ao extraditando, vencidos os Senhores Ministros Carmen Lucia, Eros Grau, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio. Votou o Presidente. Em seguida, após o voto do Senhor Ministro Cezar Peluso (Relator), deferindo o pedido de Extradição nº 1.85, no que foi acompanhado pelos Senhores Ministros Ricardo Lewandowski,Carlos Britto e _____________ 51 ZULO, Felipe Nicolau Ramos. O CASO CESARE BATTISTI. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/ doutrina/texto.asp?id=12356>. Acesso em: 29 Set.2010. 55 Ellen Gracie, os votos dos senhores Ministros Eros Grau e Carmen Lucia, julgando extinto o pedido de extradição em função da concessão de refugio pelo Ministro de Estado da Justiça, e o voto do senhor Ministro Joaquim Barbosa, pela prejudicialidade do pedido, pediu vista dos autos o Senhor Marco Aurélio. Falara m pelo requerente e impetrante, o Dr. Antonio Nabor Bulhões, pelo impretado, e a Dra. Fabíola Souza Araujo representando a AdvocaciaGeral da União, pelo extraditando e litisconsorte passivo, o Dr. Luís Roberto Barroso e, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos. Ausente, por haver declarado suspeição do julgamento da Extradição nº 1.085, o Senhor Ministro Celso de Mello. Presidência do Senhor Gilmar 52 Mendes. Plenário 09.09.2009 No dia 12 de Novembro de 2009, dando continuidade ao julgamento de extradição do Italiano Cesare Battisti, o Ministro Marco Aurélio, se manifestou, com o seu voto vista, indeferindo o pedido de extradição, no qual vejamos: (...) É de ressaltar que o ato do Ministro de Estado da Justiça, reconhecendo a condição de refugiado ao extraditando, foi praticado depois da apresentação do pedido de extradição. Então, o advogado do Governo da Itália impetrou com o mandado de segurança- a referida autoridade brasileira como coatora - para atacar o refúgio formalizado. Em outras palavras, o pedido de invalidação do refúgio não poderia estar compreendido no pleito de extradição porque, sob o ângulo temporal, o objeto surgiu após o inicio da tramitação deste processo. Presente a utilidade e, mais do que isso, a necessidade, deu-se a impetração, porquanto, consoante a Lei nº 9.474/97, a condição de refugiado é obstáculo à seqüência Dio pedido de extradição: “ O reconhecimento da condição de refugiado obstará o seguimento de qualquer pedido de extradição baseado nos fatos que fundamentaram a concessão de refúgio” – artigo 33. Vale dizer que não coabitam o mesmo teto o reconhecimento da condição de refugiado e o processo de extradição, o que dirá da possibilidade de acolher-se o pedido 53 formulado por ultimo. (...) Antes, reafirmo a crença de só poder emitir entendimento no tocante ao desvio de finalidade, pois não cabe a revisão linear para tratar, como fez o Ministro de Estado da Justiça, aspectos relativos a política internacional envolvidos na espécie. Mesmo assim, nesta quadra vivenciada no Brasil, de sobressaltos e solavancos, de flexibilidade da ordem jurídica- constitucional, de abandono a princípios, a parâmetros, de inversão de valores, porque compelido pela toga e já agora ante a postura da maioria devotar de forma ampla, com ressalva perene de entendimento pessoal, examino, em profundidade, o ato praticado, como procederam os que já votaram na matéria, acompanhando o Relator. Repito: não estou aqui a adentrar no campo da apostasia, a desertar de uma opinião que tenho como correta, a abandonar a fé jurídica quando, no julgamento da Extradição nº 1.008/Colômbia, verificado recentemente, em 21 de março de 2007, em aparte, consignei: Para mim, o refúgio é um fato jurídico que não pode ser colocado em segundo plano por esta Corte no Julgamento da extradição, tendo em conta a previsão do artigo 33 da Lei nº 9.474/97. Não cabe ao Supremo perquirir o acerto ou desacerto do ato do Executivo que haja implicado o reconhecimento do status _____________ 52 53 STF. Supremo Tribunal Federal. Extradição 1.085/ República Italiana. Brasília: 2009, p. 322. STF. Supremo Tribunal Federal. Extradição 1.085/ República Italiana. Brasília: 2009, p. 331-409. 56 de refugiado. É um fato a ser constatado, a ser provado no processo. Até que reste fulminado pelo juízo competente, deve repercutir no cenário próprio revelado pelo processo de extradição. Não posso examinar, porquanto relegaria o mencionado artigo 33 à inocuidade, se se dá, ou não, na espécie, o envolvimento de crime político. Basta o texto constitucional para obstaculizar a extradição. Caso contrario, não haveria razão para o preceito do artigo 33 em comento. (...) Também não cabe assentar o pedido de extradição ou o reconhecimento da condição de refugiado como impeditivos da continuidade do prazo prescricional, no que, datando de 6 de junho de 1977, o homicídio de Antonio Santoro; 16 de fevereiro de 1979, os homicídios de Pierluigi e Lino Sabbadin; e 19 de abril de 1979, o homicídio de Andrea Campagna, respectivamente, vieram à balha em dia e mês e ano anteriores à passagem dois vinte anos contados da decisão condenatória. A prescrição penal é vista a partir de regras disciplinadoras, de cunho instrumental e material. Então, volte-se á garantia constitucional de não haver crime sem lei que o defina nem pena sem cominação legal, tomando-a com largueza, com a completude próprias. Envolve a prescrição porque, incidindo para efeito de persecução penal, faz desaparecer a consideração da figura delituosa cuja glosa é prevista. Diante dos fatos, ora esclarecidos pelo Ministro Marco Aurélio, faz-se necessário a apresentação do Extrato da Ata, demonstrando a decisão acerca do assunto, do dia 11/12/11/2009: Decisão: O Tribunal rejeitou as questões de ordem suscitadas pelo Senhor Ministro Marco Aurélio da necessidade de quorum constitucional e da conclusão do julgamento sobre a prejudicialidade do mandado de segurança. O Tribunal rejeitou a questão de ordem suscitada pelo Advogado do Extraditando, no sentido da aplicação do art. 146 do Regimento Interno, e reconheceu a necessidade do voto do Presidente, tendo em vista a matéria constitucional. Após o voto do senhor Ministro Marco Aurélio. Indeferindo o pedido de 54 extradição, o julgamento foi suspenso. Cabe transcrever, de igual forma, o voto do Ministro Gilmar Mendes, bem como a exposição dos fatos e circunstâncias que o levaram a proferir o seu voto, deferindo a extradição de Cesare Battisti: (...) A ministra Carmen Lucia e os Ministros Eros Grau e Joaquim Barbosa- apesar de o Tribunal, anteriormente, por maioria, já ter declarado ilegal o ato do Ministro de Estado da Justiça, mediante o qual se concedeu refugio ao extraditando julgaram extinto o pedido de extradição, tendo em vista não vislumbraram qualquer mácula no ato formalizado pelo Ministro de Estado da Justiça, com fundamento na Lei nº 9.474/97. Consignaram que fosse determinada a expedição de alvará de soltura, por considerar que Cesare Battisti estaria preso ilegalmente, uma vez que foi reconhecida a respectiva condição de refugiado. (...) _____________ 54 STF. Supremo Tribunal Federal. Extradição 1.085/ República Italiana. Brasília: 2009, p. 411. 57 A esse respeito, é válido considerar, antes de tudo, que o texto constitucional é explicito ao asseverar a competência originaria deste STF para a apreciação de “extradição solicitada por Estado Estrangeiro” ( CF, art. 102, I, g), bem como ao vedar a extradição de estrangeiro por “ crime político ou de opinião” ( CF, art. 5º, LII). Ademais, o inciso VII, c/c §§ 2º e 3º, do art. 77 da Lei n º 6.815/1980 ( Estatuto do Estrangeiro) estabelece que: “ Art. 777. Não se concederá a extradição quando: VII- o fato constituir crime político; § 2º- Caberá, exclusivamente, ao Supremo Tribunal Federal, a apreciação do caráter da infração. § 3º O Supremo Tribunal Federal poderá deixar de considerar crimes políticos os atentados contra chefes de Estado ou quaisquer autoridades, bem assim os atos de anarquismo, terrorismo, sabotagem, seqüestro de pessoas, ou que importarem propaganda de guerra ou de processos violentos para subverter a ordem política ou social.” Em conformidade com os arts. 77 e 78 da Lei nº 6.815/1980 ( Estatuto do Estrangeiro), não será concedida a extradição quando: o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil; a lei brasileira impuser ao crime a pena de prisão igual ou inferior a um ano; o extraditando estiver respondendo a processo pelo qual já foi condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido; estiver extinta a punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva; o fato constituir crime político, o extraditando tiver de responder, no Estado requerente, perante Tribunal ou Juízo de Exceção; o crime não for cometido no território do Estado requerente, perante Tribunal ou Juízo de Exceção; (...) Na hipótese dos autos, como já referido, a lei definiu expressamente aos possíveis motivos de refúgio, não deixando a ocorrência, o que conduz à possibilidade do controle sobre a legalidade do refugio, a partir da avaliação da sua efetiva ocorrência e da validade dos motivos apontados pela autoridade administrativa. É o que passo a fazer. (...) Entendo descabida, com a devida vênia, a invocação da garantia constitucional que veda a retroação da lei nova prejudicial ao réu como fator de afastamento da causa impeditiva da concessão de refúgio estampada no referido inc. III do art. 3º da Lei nº. 9.474/97 (...) Ora, a própria Convenção de 1951 já previa sua inaplicabilidade a pessoas que houvessem cometido crimes graves, não seria razoável impedir a aplicação do rol de delitos hediondos, instituídos a partir da Lei nº 8.072/90, apenas porque praticado o crime antes da vigência desta, uma vez que, na essência, a conduta era, e continua sendo, grave. (...) Absolutamente carentes, portanto, de lastro jurídico e fatio as razões que levaram o Ministro da Justiça a conceder refúgio político a Cesare Battisti. Desvinculando-se da analise técnica realizada pelo CONARE, sua Excelência desbordou dos lindes da competência que lhe assistia, dando aos fatos coloração absolutamente imaginaria, para a qual convergiu lamentável componente de ideologização de direitos humanos. Reconhecida a ilegalidade do ato de concessão do refúgio, resta, agora, a análise do pleito de extradição propriamente dito. Cabe analisar se, do ponto de vista formal e material, o pedido de extradição comporta deferimento. (...) Dessa forma, presentes os requisitos legitimadores do pedido, o meu voto é no sentido de deferir o pedido de extradição de CESARE BATTISTI, para que o 58 nacional italiano possa cumprir a pena privativa de liberdade que lhe foi imposta no Estado requerente. Ressalto, entretanto, diante da imposição de prisão perpetua ao extraditando, que o presente pedido é deferido sob a condição de que o Estado requerente assuma, formalmente, o compromisso de comutar a pena de prisão perpetua em privativa de liberdade máxima de 30 anos, consoante a iterativa jurisprudência desta Corte. 55 É como voto. No dia 18 de Novembro de 2009, foram retomadas as considerações em relação ao julgamento de Cesare Battisti, cabendo novamente a descrição do extrato da Ata, datado de 18/112009, no qual dispõe: Decisão: Prosseguindo no julgamento, reajustou o voto proferido anteriormente o Senhor Ministro Marco Aurélio, sobre a prescrição executória da pena, para acompanhar o Relator. Em seguida, o Tribunal, por maioria, deferiu o pedido de extradição, vencidos a Senhora Ministra Cármen Lúcia e os senhores Ministros Eros Grau, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio. Por maioria, o Tribunal assentou o caráter discricionário do ato do Presidente da Republica de execução da extradição, vencidos os senhores Ministros Relator, Ricardo Lewandowski, Ellen Gracie e o Presidente, Ministro Gilmar Mendes. Ausentes, por haverem declarado suspeição na Extradição nº 1.085, os senhores Ministros Celso de Mello e Dias Toffoli. 56 Plenário, 18.11.2009. Finalizando tais entendimentos, cabe transcrever o Acórdão, em que é reconhecida a situação de Cesare Battisti como extraditado, devendo este retornar ao seu país de origem, e cumprir a pena imposta pela Itália, porém, cabe também ao Presidente do Brasil, decidir sobre a sua extradição, emitindo também a sua decisão final, assim vejamos: 8. EXTRADIÇÃO. Passiva. Executória. Deferimento do pedido. Execução. Entrega do extraditando ao Estado requerente. Submissão absoluta ou discricionariedade do Presidente da República quanto à eficácia do acórdão do Supremo Tribunal Federal. Não reconhecimento. Obrigação apenas de agir nos termos do Tratado celebrado com o Estado requerente. Resultado proclamado à vista de quatro votos que declaravam obrigatória a entrega do extraditando e de um voto que se limitava a exigir observância do Tratado. Quatro votos vencidos que davam pelo caráter discricionário do ato do Presidente da República. Decretada a extradição pelo Supremo Tribunal Federal, deve o Presidente da República, observar os termos do Tratado celebrado com o 57 Estado requerente, quanto à entrega do extraditando . _____________ 55 56 57 STF. Supremo Tribunal Federal. Extradição 1.085/ República Italiana. Brasília: 2009, p. 415-519. STF. Supremo Tribunal Federal. Extradição 1.085/ República Italiana. Brasília: 2009, p. 633. STF. Supremo Tribunal Federal. Acordão Sobre Battisti. disponível em <http://www.conjur.com.br /2010-abr-16 /acordao-julgamento-extradicao-cesare-battisti-publicado> Acesso em: 4 de out. 2010. 59 Sobre o assunto em tela, a imprensa esclareceu a situação de Cesare, no jornal online R7, em notícia publicada no dia 10 de Abril de 2010: Durante o julgamento em Novembro, os ministros decidiram que, com a autorização do Supremo para a extradição caberia ao Presidente se extraditaria ou não o italiano. Mas, o Acórdão deve trazer um dos pontos discutidos no julgamento, de que apesar de caber a Lula a decisão, o presidente precisa obedecer ao Tratado de Extradição existente entre o Brasil e a Itália O tratado não permite a extradição, por exemplo, em casos de perseguição política. Mas Lula terá que escolher outro argumento, caso opte por não extraditar Battisti, já que o Supremo entendeu que não há perseguição política no caso do ex-ativista. De qualquer forma, a extradição do ex-militante poderá ser adiada pelo fato de a Justiça do Rio de Janeiro o ter condenado a dois anos de prisão por uso de passaporte falso. Habitualmente, ele cumpriria pena no Brasil antes de qualquer 58 decisão sobre o seu envio de volta à Itália Recentemente, também saiu um noticiário no Jornal Correio Brasilienze, datado de 13 de setembro de 2009, comentando sobre o caso Battisti: O relator da Extradição nº 1.085- República Italiana, ministro Cezar Peluso, levando naturalmente, em consideração a soberania do Estado italiano (o requerente) bem como o regime de contenciosidade limitada (que caracteriza o exame de pedidos de extradição) examinou, minuciosamente, os fatos descritos no documento que instrui o pedido referente aos homicídios praticados por CESARE BATTISTI contra ANTONIO SANTORO, LINO SABBADIN, PEIRLUIGI TORREGIANI E ANDREA CAMPAGNA, dos quais destacou trechos que, em apertada síntese, ver-se-ão a seguir. (...) A iniciativa mais importante, seja na escolha do objetivo, seja na fase de preparação do atentado, foi assumida pelo próprio Battisti, que controlou por um período os movimentos e hábitos da vitima. Ademais foi o próprio Battisti que cometeu materialmente o homicídio, disparando cinco tiros contra o policial, enquanto uma segunda pessoa esperava no referido Fiat 127, roubado e utilizado na fuga, repita-se. Diante dos fatos, conclui o ministro Peluso: “ Como se vê, a natureza dos delitos pelos os quais o extraditando foi condenado, marcados sobremaneira pela absoluta motivação política, intensa premeditação, extrema violência e grave intimidação social, não se afeiçoa de modo algum ao modelo conceptual de delito político que impede a extradição de súditos estrangeiros(...)” E, cita precedentes expressos nas Extradições nº 493, rel. min. Sepúlveda, Pertence; nº 694, rel. min. Sydney Sanches; nº 794, rel. min, Mauricio Correa, e nº 994, rel. min. Marco Aurélio, a abonarem suas conclusões. Diante dos esclarecimentos acima citados, Cesare Battisti, ainda se encontra preso no Rio de Janeiro, por ter sido condenado a pena de 2 (dois) anos, pelo uso de _____________ 58 OLIVEIRA, Adriana. Jornal R7. disponível em <http://noticias.r7.com/brasil/noticias/stf-publicadecisao-de-extraditar-cesare-battisti-e-palavra-final-cabe-a-lula-20100416.html> Acesso em: 04 Out. 2010. 60 passaporte falso. De tal maneira, segundo a decisão do Supremo Tribunal Federal, o extraditando deverá aguardar pronunciamento do Presidente da República, para o deferimento definitivo da sua volta a Itália. 3.2.2 Segundo Caso O segundo caso em questão faz referência a situação de três paraguaios acusados de seqüestro e ligações com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia ( FARC). Juan Arrom, Anuncio Martí e Victor Colmán, estariam comandando, do Paraná, o Exército do Povo Paraguaio (EPP), grupo caçado pelo governo do esquerdista Fernando Lugo, que o acusa de inúmeros crimes cometidos a partir de 2001. Após a prisão e com argumento de que teriam sofrido tortura para confessar os crimes, os paraguaios receberam refugio político do Brasil, concedido pelo Comitê Nacional para os refugiados (CONARE). O Paraguai alega ter provas contundentes da ligação dos três com as Farcs e novas evidências que relacionam o grupo ao seqüestro da esposa de um rico empresário em 2002 e quer que o Brasil reconsidere a concessão de refugio. O Ministério das relações Exteriores do Paraguai enviou um novo documento ao CONARE solicitando a extradição. No documento, os paraguaios sustentam ter evidencias materiais, como a troca de emails entre chefes das Farcs e membros do Partido Pátria Livre (PPL), braço político do EPP, dirigido por Arrom e criado em 2002, sob inspiração ideológica de extrema esquerda. Hoje o PPL praticamente se desintegrou depois de muitos dos membros migraram para o EPP, segundo a imprensa Paraguaia. Mesmo após o refugio no Brasil, o trio continuaria dando ordens para o EPP agir no Paraguai. Enquanto o impasse com o Brasil não chega ao fim, as investigações sobre o paradeiro dos demais membros prosseguem no Paraguai. No ultimo sábado, a Policia 61 Nacional prendeu Alcio Alcides Soria Riveiros, apontando como suposto colaborador logístico do EPP. Ele foi detido em uma rua do distrito de Horqueta, departamento de Concépcion, no momento que iria a um campo de futebol. Desde que iniciou sua cruzada com os guerrilheiros, a polícia paraguaia capturou nove pessoas. Todas são consideradas integrantes da logística do grupo, colaborando com veículos, telefones e alimentação59. A última notícia em relação aos três paraguaios deu-se em Abril de 2010, por meio do Jornal Estadão, O Governo do Paraguai levara uma queixa foral a ONU contra a decisão do Brasil de dar status de refugiado para três paraguaios, no que é a primeira disputa bilateral entre os dois países a chegas às instâncias internacionais. O Brasil já enfrentou o questionamento da Itália em relação à situação de Cesare Battisti, acusado terrorista em Roma. Segundo Autoridades de Assunção, os refugiados já teriam sido condenados por seqüestro e crimes no país e o Brasil estaria violando as Convenções de Genebra sobre Refugiados ao concedes o beneficio e a proteção aos três paraguaios. Na próxima semana, diplomatas paraguaios se reunirão em Genebra com o Alto Comissariado de Refugiados da ONU para pedir que a entidade intervenha no caso e pressione o Brasil para que reveja o caso. A reunião ocorrera na segunda-feira, confirmou Raul Martinez, diplomata da Missão do Paraguai perante a ONU, ao Estado. A assessoria de Imprensa da ONU também confirmou a reunião para falar sobre o tema e indicou que o governo brasileiro não havia sido convidado. (...) O governo Paraguaio alega que os três refugiados teriam se reagrupado no Brasil e formado o Exército do Povo Paraguaio, coordenado à distancia seqüestros e assassinatos. Um dos seqüestros atribuídos ao grupo teria sido registrado em outubro de 2009. No dia 17 de janeiro, a vitima foi liberada mediante o pagamento de US$ 550 mil. Para o Paraguai, essas pessoas não estão sendo perseguidas politicamente. Seriam apenas criminosos. Entre os seqüestros organizados pelo grupo esta, ainda o da esposa de um empresário, Maria Bordón, que ficou 64 dias em cativeiro. No dia 5 de fevereiro de 2010, Assunção pediu oficialmente que o status de refugiado dos paraguaios seja revisto. No comunicado à ONU, os paraguaios alertam que “ existem motivos para o cancelamento ou a não renovação imediata do status de refugiado de Arrom, Marti e Colman, argumentando que existem fatos demonstrados com documentos que testemunham que os mesmos não estão em condições de ter tal proteção jurídica, conforme o direito 60 internacional.” Conforme acima explicado, o Brasil até a data de hoje, não se manifestou sobre o caso dos Paraguaios, e conforme o noticiário do Jornal da globo, o G1, o _____________ 59 60 SIMÃO, José. Jornal Gazeta do Povo. < www.gazetadopovo.com.br/mundo/conteudo.phtml?id +976352>. Acesso em: 04 Out. 2010. CHADE, Jamil. Jornal Estadão. Disponível em < www.estadao.com.br/noticias/nacional,paraguailevara-a-onu-queixa-formal-contra-o-Brasil,541266,0.htm> Acesso em: 06 Out. 2010 62 Ministério da Justiça, ira reavaliar a condição de refugiados, concedidos aos três paraguaios, conforme notícia datada de 30 de abril de 2010: O Ministério da Justiça emitiu nota nesta sexta-feira (30) na qual admite a realização de uma reunião do Comitê Nacional para os Refugiados (Conare) para reavaliar o refúgio concedido, em 2003, a três paraguaios supostamente integrantes de um grupo de guerrilha que atua na fronteira entre o Brasil e o Paraguai. A reunião deve ocorrer no final de maio - o ministério não sabe precisar a data. O anúncio da reunião surge horas depois das declarações do porta-voz da Presidência da República, Marcelo Baumbach. Mais cedo, ele disse que o governo brasileiro não enxergava razão para revogar o refúgio concedido aos três paraguaios. “O presidente se reuniu com o ministro da Justiça [Luís Paulo Barreto] e o ministro informou que o refúgio teve como base uma decisão técnica e unânime do Conare. Até o momento, o governo considera que não há 61 razão para reverter o refúgio”, afirmou o porta-voz. 3.2.3 Terceiro Caso Cabe também, como meio de exemplificação, trazer em comento a situação de um rapaz, que é sobrinho do ex-ministro de Segurança de um país da África Ocidental. O ilustre autor Renato Zerbini Ribeiro Leão, traz a colação, do seguinte caso em comento, portanto vejamos: O solicitante é sobrinho de um ex-ministro de Segurança de um país da África Ocidental. Como tinha ficado órfão ainda criança, foi adotado pelo tio, que o criou com seus filhos como se assim o fosse. O tio pertencia ao partido do governo, tendo sido seu fundador e presidente. Era, ademais, respeitado intelectual, educado em universidades da Europa. O tio era possuidor de grande popularidade, o que agravava as rivalidades políticas no âmbito das coalizações partidárias entre os atores que dividiam o poder. Em um determinado momento, uma grave crise irrompeu nos meios políticos e uma acusação recaiu sobre o tio, então Ministro de Segurança: este tramava um golpe contra o Estado a partir de se tores da polícia e das forças armadas, sobre os quais exercia poder e influência. Ao ser decretada a ordem de prisão contra o seu tio, este imediatamente saiu do país, renunciando ao seu cargo de Ministro. Foi para a Europa e, posteriormente, para os Estados Unidos. O solicitante permaneceu no país, pois cursava universidade e também não estava envolvido na política. No entanto, foi informado que setores do Governo planejavam prendê-lo para força o retorno do tio ao país. O solicitante abandonou sua casa, escondendo-se com aliados de seu tio. Soube efetivamente que soldados do Governo o teriam procurado. E virtude desse fato, decidiu abandonar o país dirigindo-se ao Marrocos e posteriormente ao _____________ 61 BONIN, Robson. Jornal da Globo. Disponível em < http://g1.globo.com/politica/noticia/2010/04/ ministerio-da-justica-vai-reavaliar-refugio-concedido-paraguaios.html> Acesso em 06 Out.2010. 63 Brasil. Não houve golpe militar ou conflito armado durante o período em que o solicitante alega ter sofrido perseguição. No entanto, informações de seu país de origem confirmaram que o tio (pai adotivo do solicitante) exerceu o cargo de Ministro num período de graves lutas internas entre os partidos que compartilhavam o poder, conferindo, portanto, credibilidade ao relato do solicitante, pois as suas informações correspondiam a realidade de seu país 62 naquele período. O CONARE entendeu que, na situação exemplificada, devido ao perfil do solicitante, formas de perseguição seletiva poderiam atingí-lo, sem que necessariamente afetasse amplos setores da população. O fato de pertencer ao círculo de poder poderia gerar formas de perseguição quase não notórias, para os cidadãos comuns, porem, claramente violatórias aos direitos humanos. Assim, o CONARE, constatou a existência de uma perseguição individualizada, por parte do Estado, e com base das referências e credibilidade do solicitante, deferiu o seu pedido de reconhecimento da condição de refugiado. _____________ 62 LEÃO, Renato Zerbini Ribeiro. O reconhecimento dos refugiados pelo Brasil. Decisões Comentadas do CONARE. 2007, p. 33. 64 CONCLUSÃO Ao fim deste trabalho, cabe observar a notória compreensão dos aspectos intrínsecos que dizem respeito à questão dos refugiados políticos no âmbito nacional, como no internacional. No decorrer do presente trabalho, tratou-se sobre a competência do CONARE e a aplicação da Lei nº 9.474/97, que consiste na abordagem por meio do órgão responsável pela verificação da condição de refugiado, bem como os direitos e deveres que cabem ser observados e cumpridos pelos mesmos, quando conseguem a garantia da solicitação do status de refúgio. Esta lei contribui para a proteção dos estrangeiros perseguidos ou abandonados por seu País de origem. De tal forma, percebe-se a importância, do Direito dos Refugiados Políticos, no que tange a uma análise exigente da sua condição, para que ocorra tal reconhecimento, possibilitando assim, a eficácia no ordenamento e segurança nacional e a proteção para com o mesmo. Foi abordado no presente trabalho, as situações vividas pelos refugiados, como a proteção de leis Internacionais, a função do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados- ACNUR, cujo principal objetivo é salvaguardar os direitos e o bemestar dos refugiados e refugiadas, assegurando a possibilidade de buscar o refúgio e receber o mesmo em outro país, com a opção de retornar voluntariamente ao seu país, como também integrar-se à sociedade local ou de ser reassentado em outra localidade. Além disso, urge ressaltar que a importância da proteção internacional é um dos mais sérios compromissos assumidos por Estados soberanos na busca da garantia e operacionalização dos direitos humanos e liberdades fundamentais. Ainda à mostra no presente trabalho, três casos referentes aos refugiados políticos no Brasil, sendo um deles, de grande repercussão no âmbito jurisprudencial, a situação do italiano Cesare Battisti, condenado a prisão perpétua na Itália, e julgado recentemente pelo Supremo Tribunal Federal a extradição, devendo cumprir pena em seu país de origem, no caso a Itália, desde que a sua situação também possa ser revisada e julgada pelo Presidente do Brasil. 65 Fica a oportunidade de aprendizado, de maneira mais aprofundada, sobre a situação dos refugiados, onde se tem o discernimento de doutrinadores, sejam em obras, artigos publicados, bem como o entendimento do CONARE, para as solicitações de refúgio, como também do Supremo Tribunal Federal, na análise das questões relacionadas à extradição. 66 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ACNUR. Disponível em: <http://www.acnur.org/t3/portugues/informacaogeral/perguntas-e-respostas/?L=type=100?tx_acnurgooglecs_pi1[gcs_q]=costa>. Acesso em 25 mai. 2010. 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