ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO
ESCOLA MARECHAL CASTELLO BRANCO
Maj Inf LUIS ANTONIO DE ALMEIDA JUNIOR
A capacitação dos comandantes militares brasileiros
para a condução da análise das Considerações Civis
em operações no amplo aspectro
Rio de Janeiro
2015
Maj Inf LUIS ANTONIO DE ALMEIDA JUNIOR
A capacitação dos comandantes militares brasileiros para a condução da
análise das Considerações Civis em operações no amplo espectro
Trabalho
de
Conclusão
de
Curso
apresentado à Escola de Comando e
Estado-Maior do Exército, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Especialista em Ciências Militares.
Orientador: Ten Cel Inf André Vicente Scafutto de Menezes
Rio de Janeiro
2015
Maj Inf LUIS ANTONIO DE ALMEIDA JUNIOR
A capacitação dos comandantes militares brasileiros para a condução da
análise das Considerações Civis em operações no amplo espectro
Trabalho
de
Conclusão
de
Curso
apresentado à Escola de Comando e
Estado-Maior do Exército, como requisito
parcial para a obtenção do título de
Especialista em Ciências Militares.
Aprovado em ___ , de ___________ de 2015.
COMISSÃO AVALIADORA
__________________________________________________
André Vicente Scafutto de Menezes – Ten Cel Inf - Presidente
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
_______________________________________
Luciano Correia Simões – Ten Cel Inf – Membro
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
_________________________________________
Marco Antônio Muniz Leite – Ten Cel Inf – Membro
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
À Vanessa minha esposa e aos meus
filhos Matheus e Bernardo, pelo amor,
carinho e constante apoio em todos os
momentos.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, pelo dom da vida e por poder estar compartilhando desse
momento com todos aqueles que me querem bem.
Aos meus pais, Mara Benamor de Almeida e Luis Antonio de Almeida,
responsáveis pela minha educação e incentivo constante no trilhar de tão nobre
profissão. Minha eterna gratidão.
À
minha
esposa
Vanessa
pelo
seu amor incondicional,
paciência,
compreensão e companheirismo em todos os momentos de nossa vida em comum e
em especial durante a elaboração deste trabalho. Aos meus filhos Matheus e
Bernardo, pelo amor e carinho durante todos os anos de suas vidas e nesta fase em
que estive ausente na preparação deste trabalho.
Ao meu Orientador, o Tenente Coronel Inf André Vicente Scafutto de
Menezes, meus agradecimentos pela orientação sempre oportuna e sincera na
realização deste trabalho.
A todos aqueles que direta ou indiretamente colaboraram para que este
trabalho fosse concluído.
“O oficial de estado-maior é
um renovador e um criador. Deve
lutar contra o conservadorismo
tornando-se permeável a ideias
novas, a fim de que possa escapar à
cristalização, ao conformismo e à
rotina”. (Castello Branco)
RESUMO
As considerações civis são o mais recente fator de decisão adotado pelo
Exército Brasileiro. São traduzidas pela influência das instituições civis, das atitudes
e atividades das lideranças civis, da população, da opinião pública, do meio
ambiente, de infraestruturas construídas pelo homem, das agências civis, com
capacidade de influir e formar opiniões entre os nacionais ou internacionais, no
Espaço de Batalha. Sua importância se dá em razão do papel a ser desempenhado
pelos comandantes militares, os quais deverão planejar e empregar elementos para
obter informações pertinentes, atribuir responsabilidades aos subordinados para
atuarem sob as demandas das considerações civis, bem como serem incumbidos de
atuarem em situações nas quais o uso consciente e adequado de dados sobre a
área e a população local seja condição para a vitória. Cabe destacar que o palco
para as operações militares evoluiu. Sendo assim, o Exército Brasileiro adotou o
conceito de operações no amplo espectro, que compreende conflitos caracterizados
por serem limitados, não declarados, de duração incerta, convencionais ou não, com
a presença de atores estatais e não estatais, bem como com ameaças móveis e
mescladas aos não combatentes. Nesse contexto, a presente pesquisa se
desenvolveu tendo como objetivo verificar se os comandantes militares brasileiros
estão capacitados a conduzirem a análise das considerações civis em operações no
amplo espectro. Para alcançar o citado objetivo foi conduzida descrição das
operações no amplo espectro, da análise das considerações civis à luz do Exame de
Situação do Comandante Tático do Exército Brasileiro, bem como se verificou a
capacitação dos comandantes militares (oficiais para este trabalho) para análise das
considerações civis em operações no amplo espectro e, se verificou aspectos
doutrinários relacionados ao assunto junto à nações amigas. Como resultado, foram
apresentadas sugestões com o fito de aperfeiçoar aspectos da Doutrina Militar
Terrestre (DMT) brasileira, a fim de garantir o completo entendimento e a execução
da análise das considerações civis, por parte dos comandantes militares, em
operações no amplo espectro.
Palavras-chave:
considerações
comandantes militares, doutrina militar.
civis,
operações
no
amplo
espectro,
ABSTRACT
Civil considerations are the latest decision factor used by the Brazilian Army. It
is translated by the influence of civil institutions, attitudes and activities of the civilian
leadership, the population, the public, the environment, infrastructure built by man,
civil agencies, with capacity to influence and form opinions between national or
international, inside the battle space. Its importance is given due to the role to be
played by military commanders, who must plan and employ elements for relevant
information, assign responsibilities to subordinates to act under the demands of civil
considerations as well as be responsible for acting in situations where conscious and
appropriate use of data on the area and the local population is a condition for the
victory. It should be noted that the stage for military operations evolved. Thus, the
Brazilian Army adopted the concept of full spectrum operations comprising conflicts
characterized by being limited, undeclared, of uncertain duration, conventional or not,
with the presence of state and non-state actors, as well as mobile threats and
merged to non-combatants. In this context, the present study was developed aiming
to verify wether the Brazilian military commanders are trained to conduct the analysis
of civil considerations in full spectrum operations. To achieve the pointed objective
was conducted description of the full spectrum operations, description of analysis of
civil considerations under the perspective of the Brazilian Army Tactical Commander
Status Exam, verified the training of military commanders (officers in this case) in
order to analyze the civil considerations in full spectrum operations, as well as it
verified doctrinal issues related to the matter of this research by the friendly nations
of Brazil. As a result, suggestions have been made with the aim of improving aspects
of Brazilian Army doctrine in order to ensure complete understanding and to perform
the analysis of civil considerations, by the military commanders in full spectrum
operations.
Keywords: civil considerations, the broad spectrum operations, military
commanders, military doctrine.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AECOPE
Área, Estrutura, Capacidades, Organização, População e
Eventos
AMAN
Academia Militar das Agulhas Negras
CAEM
Curso de Altos Estudos Militares
CAO
Curso de Aperfeiçoamento de Oficiais
CCEM
Curso de Comando e Estado-Maior
C Dout Ex
Centro de Doutrina do Exército
CIMIC
Civil-Military Cooperation
Cmt
Comandante
COPD
Comprehensive Operations Planning Directive
DIH
Direito Internacional Humanitário
DMT
Doutrina Militar Terrestre
EB
Exército Brasileiro
ECEME
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército
EE
Estabelecimento de Ensino
EFD
Estado Final Desejado
EM
Estado-Maior
END
Estratégia Nacional de Defesa
EsAO
Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais
ET
Exercício no Terreno
EUA
Estados Unidos da América
FA
Forças Armadas
FTC
Força Terrestre Componente
F Ter
Força Terrestre
IPB
Inteligence Preparation of Battlefield
MCCC
Maneuvers Captains Career Course
ONA
Oficial de Nação Amiga
ONG
Organização (ões) Não-Governamental (is)
OPLAN
Operational Plan
OTAN
Organização do Tratado do Atlântico Norte
PITCI-C
Processo Integrado Terreno, Condições Meteorológicas,
Inimigo e Considerações Civis
PLADIS
Plano de Disciplinas
PND
Política Nacional de Defesa
QEMA
Quadro do Estado-Maior da Ativa
SRP
Sistema Remotamente Pilotado
U
Unidade
URSS
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO........................................................................................
11
2
AS OPERAÇÕES NO AMPLO ESPECTRO..........................................
20
2.1
CONCLUSÃO PARCIAL.........................................................................
24
3
AS CONSIDERAÇÕES CIVIS................................................................
25
3.1
CONCLUSÃO PARCIAL.........................................................................
30
4
A
CAPACITAÇÃO
BRASILEIROS
DOS
PARA
CONSIDERAÇÕES
A
CIVIS
COMANDANTES
CONDUÇÃO
EM
DA
MILITARES
ANÁLISE
OPERAÇÕES
NO
DAS
AMPLO
ESPECTRO............................................................................................. 31
4.1
ACADEMIA MILITAR DAS AGULHAS NEGRAS.................................... 31
4.1.1
O estudo das Considerações Civis na AMAN....................................
32
4.1.2
Conclusão parcial.................................................................................
34
4.2
ESCOLA DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS................................
34
4.2.1
O estudo das Considerações Civis na EsAO.....................................
35
4.2.2
Conclusão parcial.................................................................................
37
4.3
ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO..............
37
4.3.1
O estudo das Considerações Civis na ECEME..................................
38
4.3.2
Conclusão parcial.................................................................................
39
5
AS
CONSIDERAÇÕES
CIVIS
NOS
ESTADOS
UNIDOS
DA
AMÉRICA E NA ESPANHA, SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS DA
DOUTRINA BRASILEIRA......................................................................
40
5.1
AS CONSIDERAÇÕES CIVIS NOS EUA...............................................
40
5.2
AS CONSIDERAÇÕES CIVIS NA ESPANHA........................................
42
5.3
CONCLUSÕES PARCIAIS.....................................................................
45
6
CONCLUSÃO.........................................................................................
46
REFERÊNCIAS.......................................................................................
53
A447c
Almeida Junior, Luis Antonio de
A capacitação dos comandantes militares brasileiros para a condução da análise das
Considerações Civis em operações no amplo espectro. / Luis Antonio de Almeida Junior. 2015.
57 f.; il. : 30 cm.
Trabalho de Conclusão de Curso (Especialização). Escola de Comando e Estado Maior, Rio
de Janeiro, 2015.
Bibliografia: f. 53-57.
1. Considerações civis. 2. Operações no amplo espectro. 3. Comandantes militares. 4.
Doutrina militar - Exército Brasileiro. I. Título.
CDD 355.3
11
1 INTRODUÇÃO
O mundo contemporâneo e globalizado apresenta características ímpares,
tais como a velocidade, a amplitude e o acesso praticamente ilimitado às
informações e aos cohecimentos, a tendência à multilateralidade, a presença da
mídia, a importância da opinião pública, a assimetria entre os Estados, a presença
de conflitos diversos desenvolvidos em áreas urbanizadas e nos quais se observam
tendências não-convencionais, dentre outras. Essa “nova ordem” mundial se
consolidou com o término da Guerra Fria, legando cenário de incerteza e de elevada
volatilidade para a humanidade.
Segundo Magnoli (2004), o término da Guerra Fria, estado de tensão entre os
Estados Unidos da América (EUA) e a antiga União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS), no início da década de 1990, transformou profundamente as
relações internacionais.
Em relação ao novo cenário mundial, o supracitado autor destaca que os
desafios vividos são muito mais complexos e imprevisíveis. Assuntos como meio
ambiente, terrorismo, fome e energia, entre outros, passaram a fazer parte da
agenda global. (MAGNOLI, 2004).
O Brasil, atento a essa nova realidade, vem se conscientizando de que
necessita de Forças Armadas (FA) compatíveis com sua estatura geopolítica. Nesse
sentido, o País vem desenvolvendo esforços a fim de aumentar a expressão militar
de seu Poder Nacional por meio da elaboração de políticas e estratégias que
refletem na organização, no preparo e no emprego de seu braço armado.
Nesse contexto, em 2005, com a Política Nacional de Defesa (PND),
documento de mais alto nível que define, em linhas gerais, quais as metas a serem
atingidas visando a proteção contra ameaças externas, o Brasil deu novo passo em
direção a consolidação de sua Defesa (BRASIL, 2005). Mais tarde, em 2008, com a
Estratégia Nacional de Defesa (END), o País conheceu o caminho a ser percorrido
para que as metas traçadas pela PND fossem plenamente atingidas (BRASIL,
2008).
Como integrante das FA, o Exército Brasileiro (EB) prontamente adotou as
diretrizes emanadas pelos documentos citados e implementou as medidas
necessárias para que, de fato, o País pudesse contar com Força Terrestre (F Ter)
capacitada e à altura da dimensão e da projeção brasileira no cenário internacional.
12
Dentre as medidas adotadas pelo EB, destaca-se a reformulação de sua
doutrina, consubstanciada com a publicação da Diretriz para transformação da
Doutrina Militar Terrestre, aprovada pela Portaria nº 197 – EME, de 26 de setembro
de 2013, documento basilar e composto por novos conceitos, modificações e
implementações ensejadas pelo contexto militar moderno que exige um exército
apto a suplantar as demandas contemporâneas no que se refere ao seu emprego,
seja em território nacional, seja no exterior.
Esta Diretriz, no âmbito do Processo de Transformação do Exército, tem por
finalidade apresentar as Bases para a Transformação da Doutrina Militar
Terrestre (DMT) e destina-se a orientar a introdução de concepções e
conceitos doutrinários com vistas à incorporação, na Força Terrestre, das
capacidades e das competências necessárias ao seu emprego na Era do
Conhecimento (BRASIL, 2013).
Coerente com o que foi apresentado até o momento, ao analisar a conjuntura
mundial e com olhar crítico para a situação nacional, o EB sentiu a necessidade de
modificar seus conceitos operativos para enfrentar os desafios do século XXI. Para
tanto, dentre outras medidas, a F Ter brasileira resolveu inserir a análise das
considerações civis em seu consagrado processo de tomada de decisão militar, o
exame de situação do comandante tático, acarretando reflexos na forma de
planejamento e de atuação da tropa, em razão das demandas operativas
encontradas nas situações em que a Força foi e visualiza ser empregada.
Neste ano de 2014, o Exército Brasileiro, por meio de seu Centro de Doutrina
(C Dout Ex), lançou 11 (onze) novos manuais, sendo 03 (três) de fundamentos, 07
(sete) de concepções e 01 (um) de tática, os quais estão impactando de forma
contundente a Doutrina Militar Terrestre (DMT).
Após cerca de 10 (dez) anos sem nenhuma atualização doutrinária no EB, as
implementações supramencionadas são positivas e necessárias para a F Ter
brasileira no momento em que o mundo apresenta nova dinâmica com reflexos
diretos na forma de emprego do vetor militar.
Conceitos como as operações no amplo espectro permitem visualizar as
novas demandas que recaem sobre os militares, em especial sobre os comandantes
e decisores nos diversos níveis hierárquicos, suscitando novas capacidades das FA
e, particularmente, do Exército.
Além disso, há que se destacar a radical mudança do terreno nas atuais
operações militares. Com o constante aumento populacional, os espaços
13
geográficos estão sendo ocupados, tornando-se áreas humanizadas. Com raras
exceções, não se pode mais conceber área passível de conflito onde não haja
presença considerável do elemento humano.
Com base na assertiva acima, cabe ressaltar a importância do terreno
humano para as operações militares. Tal fator apresenta tamanha relevância na
atualidade que levou a doutrina militar a implementar novo fator de decisão
juntamente com os já consagrados ítens missão, inimigo, terreno, meios e tempo.
Este novo fator de decisão, qual seja, as considerações civis, busca despertar nos
comandantes e em seus subordinados a capacidade de obter dados que influenciam
de maneira primordial as operações militares. Os referidos conhecimentos são
obtidos por meio de levantamentos dos aspectos vitais e culturais de determinada
população, os quais poderão comprometer todo o esforço de guerra caso não sejam
observados com critério.
As considerações civis visam, em última instância, fornecer ao planejador e a
todos os elementos operativos de uma força, conhecimentos fundamentais e
necessários para que seja obtido o sucesso militar nas situações de emprego. Para
tanto, o apoio ou, ao menos, a não intervenção por parte da população presente na
área de operações são primordiais.
Cabe destacar o papel a ser desempenhado pelos comandantes militares nos
diversos níveis hierárquicos, os quais deverão planejar e empregar elementos para
obter informações pertinentes, atribuir responsabilidades aos subordinados para
atuarem sob as demandas das considerações civis, bem como serem incumbidos de
atuarem em situações nas quais o uso consciente e adequado de dados sobre a
área e a população local seja condição para a vitória.
Outro aspecto a ser observado e que suscitará o problema relevante da
presente pesquisa é a formação do comandante militar brasileiro. Ao abordar o
citado aspecto, focar-se-á no oficial de carreira da Força, tendo a Academia Militar
das Agulhas Negras (AMAN) como estabelecimento de ensino formador. Sendo
assim, para os fins desta pesquisa, o termo comandante militar está associado ao
oficial do EB.
Coerente com o parágrafo anterior, verifica-se no EB o processo de
aperfeiçoamento contínuo de seus homens. Para os oficiais de carreira, após sua
formação, é mandatório o aperfeiçoamento a ser realizado na Escola de
Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO).
14
Por fim, para os oficiais existem os Cursos de Altos Estudos Militares (CAEM),
os quais englobam o Curso de Comando e Estado-Maior (CCEM), realizado na
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Este visa habilitar o
oficial concludente ao exercício de cargos e funções de estado-maior de Grandes
Unidades (Brigadas) e de Grandes Comandos da F Ter e de outros órgãos de nível
equivalente, bem como ao comando de Organizações Militares da F Ter e no
desempenho de cargos e funções privativas de oficial-general combatente. Oportuno
ressaltar o caráter voluntário e o processo seletivo adotado para determinar os
oficiais que frequentarão o referido curso.
Considerando o cenário acima apresentado, surge a problemática da
pesquisa. Os comandantes militares brasileiros estão capacitados a conduzirem a
análise das considerações civis em operações no amplo espectro?
A fim de identificar e detalhar as ações a serem realizadas para dar resposta
ao problema de pesquisa mencionado, foram traçados o objetivo geral, que
descreve a finalidade principal da investigação de estudo, e os objetivos específicos,
que mostram o caminho lógico percorrido para solucionar o problema.
O objetivo geral foi verificar se os comandantes militares brasileiros estão
capacitados a conduzirem a análise das considerações civis em operações no amplo
espectro.
Os objetivos específicos elencados permitiram atingir o objetivo geral do
estudo, configurando-se o encadeamento lógico do raciocínio descritivo apresentado
ao longo do trabalho. Nesse sentido, as operações no amplo espectro, novo
conceito que define os conflitos contemporâneos, foi descrita, destacando as
principais características presentes na atualidade que impactam a Doutrina Militar
Terrestre brasileira. Além disso, foi apresentada a análise das considerações civis à
luz do Exame de Situação do Comandante Tático do Exército Brasileiro.
Outro objetivo específico foi verificar a existência, a amplitude, o alcance e a
adequabilidade da disseminação das considerações civis em operações no amplo
espectro, no âmbito da Força, tomando por base os currículos e planos de disciplina
das escolas de formação e de aperfeiçoamento de oficiais, bem como da Escola de
Comando e Estado-Maior do Exército. Ademais, foi verificada, ainda, a existência e
a amplitude do fator de decisão considerações civis em nações amigas,
particularmente nos Estados Unidos da América e Espanha, tomando por base
entrevistas, manuais e experiências do autor como oficial-aluno do Maneuvers
15
Captains Career Course (MCCC), curso de aperfeiçoamento de capitães equivalente
a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, realizado nos anos de 2008 e 2009, onde
o mesmo recebia instruções e praticava o Exame de Situação do Comandante
Tático do exército norte-americano.
Por fim, foram apresentadas sugestões e experiências com o fito de
aperfeiçoar aspectos da DMT do Brasil, a fim de garantir o completo entendimento e
a execução da análise das considerações civis em operações no amplo espectro.
Desta feita, surge como hipótese do presente trabalho: “Os comandantes
militares brasileiros não estão adequadamente capacitados a conduzirem a análise
das considerações civis em operações no amplo espectro.”
De acordo com o Manual para Elaboração de Projetos de Pesquisa da
ECEME, ME 21-259, as variáveis constituem-se em elementos centrais da
investigação e derivam da hipótese elaborada. Neste sentido, serão apresentadas a
variável dependente e as variáveis independentes.
Considerando o tema “A capacitação dos comandantes militares brasileiros
para a condução da análise das considerações civis em operações no amplo
espectro”, assim como a hipótese formulada anteriormente, tem-se como
circunstâncias passíveis de medição e que poderão influenciar a pesquisa a variável
independente que é a capacitação dos comandantes militares brasileiros; e a
variável dependente que é a condução da análise das considerações civis.
Tratando do tipo de pesquisa realizada, a mesma foi qualitativa quanto à
forma de abordagem e, no que se refere ao objetivo geral, exploratória e descritiva
(NEVES e DOMINGUES, 2007).
Exploratória já que buscou “proporcionar maior familiaridade com o problema,
com vistas a torná-lo mais explícito” (GIL, 2002). Além disso, ainda tendo como
referência Gil (2002), foi descritiva, pois procurou caracterizar a relação entre as
variáveis, conflitos atuais e considerações civis.
No que se refere aos procedimentos técnicos, foram utilizadas a pesquisa
bibliográfica e a pesquisa documental. De acordo com Gil (2002), a pesquisa
bibliográfica se dá com “base em material já elaborado, constituído principalmente
de livros e artigos científicos” (GIL, 2002). O mesmo autor descreve a pesquisa
documental como muito similar à bibliográfica, estabelecendo como diferença
essencial a natureza das fontes consultadas. A pesquisa documental se vale de
materiais ainda não tratados de forma analítica ou dos chamados documentos de
16
segunda mão que são aqueles que de alguma forma já foram analisados, tais como
relatórios, no caso em questão, referentes ao Exército Brasileiro.
A análise dos dados se deu de forma qualitativa, na qual os mesmos foram
reduzidos, categorizados, interpretados e expressos por meio de relatório coerente
com o tema proposto (GIL, 2002).
Segundo Minayo (2004), a pesquisa qualitativa trabalha com o universo de
significados, motivos, aspirações, crenças, valores e atitudes, o que corresponde a
um espaço mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não
podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis.
A pesquisa bibliográfica foi realizada por meio de consultas à biblioteca da
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército, à biblioteca da Escola de
Aperfeiçoamento de Oficiais, ao material didático e aos Manuais de Campanha do
Exército Brasileiro, do Exército norte-americano, do Exército espanhol, bem como da
Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Além disso, foram utilizadas
como fontes de dados artigos de revistas especializadas, bem como outros obtidos
na rede mundial de computadores.
Para a pesquisa bibliográfica, dando ênfase ao recorte analítico das teorias
sobre os conflitos atuais e suas características principais, especialmente daquelas
relacionadas ao terreno humano e seus reflexos para as operações militares, foram
seguidas as oito fases previstas no trabalho de Marconi e Lakatos (2003), quais
sejam, a escolha do tema, a elaboração do plano de trabalho, a identificação, a
localização, a compilação, o fichamento, a análise e a interpretação; e a redação.
Quanto à pesquisa documental, esta se valeu de relatórios e documentos
elaborados pelo Exército Brasileiro, particularmente por seu sistema de ensino,
tendo como vetores a Escola de Comando e Estado-Maior do Exército e a Escola de
Aperfeiçoamento de Oficiais.
Além disso, foram verificados os currículos escolares e os planos de
disciplinas dos estabelecimentos de ensino (EE) responsáveis pela formação e
aperfeiçoamento de oficiais e sargentos da F Ter, assim como da ECEME.
Cabe resaltar que a análise das considerações civis ainda é incipiente no
âmbito da Força, em que pese estar consubstanciado no Manual de Campanha EB
20-MC-10.211, Processo de Planejamento e Condução de Operações Terrestres.
Entretanto, parcela dos dados trabalhados na pesquisa não constam de publicações
oficiais da Força (Manuais de Campanha ou similares).
17
Sendo assim, quanto à pesquisa documental, em que pese as parte das
fontes utilizadas se tratarem de relatórios das escolas militares citadas, tornou-se
necessária a análise de seus dados (GIL, 2002).
O instrumento utilizado foi a ficha de coleta de dados que permitiu a
sistematização da coleta de dados em livros, documentos e outras fontes (NEVES e
DOMINGUES, 2007).
Conforme já dito, a análise dos dados se deu de forma qualitativa, na qual os
mesmos foram reduzidos, categorizados, interpretados e expressos por meio de
relatório coerente com o tema proposto (GIL, 2002).
De acordo com Gil (2002), no caso de documentos e relatórios, mesmo que
as fontes utilizadas apresentem dados, estes deverão ser interpretados e analisados
quanto ao seu conteúdo.
A supramencionada análise se deu em três fases, de acordo com Bardin (s.d.
apud GIL, 2002, p. 89). Pré-análise (fase em que são escolhidos os documentos,
são formuladas as hipóteses e é preparado o material para análise), exploração do
material (fase seguinte que envolve a escolha das unidades, a enumeração e a sua
classificação) e tratamento, inferência e interpretação dos dados (fase final em que
os dados serão analisados).
O método selecionado para este estudo apresentou limitações no que se
refere à pesquisa documental, uma vez que foram utilizados relatórios escolares e
pareceres sobre o assunto em tela.
Conforme destaca Gil (2002), a pesquisa documental é criticada em razão de
sua não-representatividade e de sua subjetividade. No entanto, tais óbices foram
contornados já que os dados inseridos neste contexto foram, em sua plenitude,
produtos de reuniões doutrinárias já chancelados pelas autoridade competentes.
Como já observado, não foram classificados como fontes bibliográficas por não
estarem plenamente consubstanciados em publicações como os Manuais de
Campanha.
No tocante ao tratamento dos dados, por se tratar de pesquisa qualitativa, a
limitação se deu pela utilização de somente uma técnica, qual seja, a análise de
conteúdo (GIL, 2002).
Ainda, em razão do aprofundamento da pesquisa, houve necessidade de
realizar entrevistas com Oficiais de Nações Amigas (ONA), particularmente os da
Espanha e dos Estados Unidos da América (EUA).
18
Ao término do trabalho, foram apresentadas conclusões a respeito da
capacitação dos comandantes militares brasileiros para conduzirem a análise das
considerações civis em operações no amplo espectro, de forma que possam servir
de guia para se (re)pensar a elaboração da doutrina, bem como a necessidade da
rápida e da ampla disseminação de tão importantes conceitos operativos no âmbito
da Força.
O presente estudo se justifica pela relevância e abrangência dos conflitos
armados da atualidade (operações no amplo espectro), os quais se desenvolvem em
um mundo globalizado no qual a população não mais tolera a solução armada como
resolução preferencial de crises.
Destarte, a capital importância do terreno humano para as operações
militares, aliada à presença e à percepção mundial da solidez do Direito
Internacional Humantário (DIH), não deixam espaço para cálculos e planejamentos
descuidados que possam resultar em perdas desnecessárias de não-combatentes,
bem como em danos colaterais. O foco é a otimização de processos e a eficiência
em combate, fatores de êxito que só poderão ser alcançados por meio de condução
de operações por militares preparados, instruídos e conhecedores profundos do
terreno humano.
Nesse contexto, a inserção do fator de decisão considerações civis no atual
Exame de Situação do Comandante Tático denota o quanto o Exército Brasileiro
busca, de forma incansável, o “Estado da Arte”, assim como se mantém fiel aos
ditames da política nacional, em especial no que se refere às determinações
constantes da Política Nacional de Defesa, operacionalizadas pela Estratégia
Nacional de Defesa.
É fundamental compreender que por se tratar de assunto recente e
desconhecido por grande parte dos militares da F Ter brasileira, o correto
entendimento, o levantamento preciso e o oportuno emprego das informações
obtidas por meio das considerações civis se torna condição basilar para que se
alcance sucesso em operações militares nos conflitos contemporâneos.
Coerente com o que foi destacado, também se faz necessária a ampla
divulgação do trabalho realizado, de forma simples e compreensível, em especial
para os escalões elementares da tropa, os quais, invariavelmente irão obter, fazer
uso e retroalimentar dados a respeito das considerações civis. Cabe destacar que os
19
oficiais e sargentos integrantes das escolas e dos corpos de tropa são os vetores
principais de disseminação de conhecimentos.
Por fim, cabe ressaltar a oportunidade do tema e do problema levantado para
a Força Terrestre, uma vez que suscitará novos estudos e o desenvolvimento de
táticas, técnicas e procedimentos que contribuirão com o aperfeiçoamento da
Doutrina Miltar Terrestre (DMT), especialmente neste momento em que o Exército
Brasileiro passa por um necessário Processo de Transformação.
20
2 AS OPERAÇÕES NO AMPLO ESPECTRO
Os conflitos da atualidade vêm se caracterizando por serem limitados, não
declarados, de duração incerta, convencionais ou não, com a presença de atores
estatais e não estatais, bem como com ameaças móveis e mescladas aos não
combatentes. Nesse contexto difuso, instável, incerto e complexo, surge a
necessidade de forças militares altamente flexíveis, com grande capacidade de
adaptação as diferentes situações, que sejam modulares, que possuam capacidade
elástica, que apresentem sustentabilidade, que sejam adestradas, que possuam
elevado discernimento e consciência situacional (BRASIL, 2014 b).
Coerente com o descrito acima, a observação dos conflitos recentes apontam
algumas características e tendências comuns, sendo as mais relevantes:
- um novo combatente individual, definido como um sistema, utilizando
instrumentos tecnológicos inovadores, atuando em rede com segurança,
com ênfase em uma melhor proteção individual, dotado de armamento com
letalidade seletiva e capacidade de atuar em operações continuadas;
- um ambiente no teatro de operações, redefinido por extensa rede de
sensores e de fluxo de dados seguros, centrada no comandante, que
proporcionam vantagens decisivas ao que melhor integrar, analisar, difundir
e utilizar com oportunidade a informação relevante;
- a presença de civis e da mídia no ambiente operacional, elevando as
“considerações civis” ao patamar de Fator da Decisão;
- a concepção de estruturas de combate com maior proteção coletiva, que
proporcionem maior velocidade e letalidade seletiva;
- a racionalização das estruturas operacionais (combate, apoio ao combate
e apoio logístico), por intermédio da centralização dos meios, privilegiando a
mobilidade;
- o incremento nas capacidades de atuar no espaço cibernético com
liberdade de ação, de usar Sistemas Remotamente Pilotados (SRP) e de
utilizar munições inteligentes; e
- a intensificação do emprego de operações especiais (BRASIL, 2014 a, p.73).
Diferentemente dos combates ocorridos no último século, em especial as
duas Grandes Guerras Mundiais, os conflitos atuais ensejaram adaptações nas
doutrinas de emprego das Forças Armadas de todo o mundo, inclusive nas FA
brasileiras.
Nesse contexto, o EB passou a adotar o conceito de “operações no amplo
espectro”, apresentado no Manual de Fundamentos EB20-MF 10.102, o qual
visualiza o emprego da F Ter para obtenção e manutenção de resultados decisivos
nas operações. Tal intuito se materializa por meio da combinação de operações
ofensivas, de operações defensivas, de operações de pacificação e de operações de
apoio a órgãos governamentais, de forma simultânea ou sucessiva, com foco na
21
prevenção de ameaças, no gerenciamento de crises e na solução de conflitos
armados, em situações de Guerra e de Não Guerra (BRASIL, 2014 b).
Ainda no que se refere as “operações no amplo espectro”, o General R1
Álvaro cita:
A mais moderna concepção de preparo de uma força armada preconiza
que, para fazer face aos conflitos do Sec XXI, esta deve estar em condições
de gerenciar, simultaneamente, tanto situações típicas de Guerra Irregular,
particularmente
relacionadas
às
Operações
de
Estabilidade,
Contrainsurreição e Contraterrorismo, quanto situações que demandem o
planejamento e a execução de Operações Ofensivas e Defensivas, típicas
do Combate Convencional. Esta concepção é internacionalmente
identificada, na atualidade, como “Operações no Amplo Espectro”
(PINHEIRO, 2012).
Além disso, o referido Manual de Fundamentos cita que as “operações no
amplo espectro” podem ser desenvolvidas em áreas geográficas lineares ou não, de
forma contígua ou não, buscando contemplar as diversas missões e tarefas que
envolvem o emprego de meios terrestres. Mais do que nunca, um acurado exame de
situação se faz necessário a fim de possibilitar o eficiente emprego das forças
militares para fazer frente aos diferentes cenários operativos (BRASIL, 2014 b).
Pode-se constatar que o ambiente operacional está modificado, amplo,
incerto e volátil, com profudos reflexos no modo de operar das forças militares.
O Manual de Fundamentos das Operações destaca as características do
atual ambiente operacional.
O Ambiente Operacional é caracterizado pela existência de três dimensões
– física, humana e informacional – cujos fatores a serem analisados
interagem entre si, formando o seu caráter único e indivisível. Sua
compreensão constitui uma condição fundamental para o êxito nas
operações militares (BRASIL, 2014 c, p. 2-2).
Alguns fatores presentes no referido ambiente afetam, de forma mais
contundente, os atuais conflitos. De acordo com Brasil (2014 b), são eles a
dimensão humana, o combate em áreas humanizadas, a importância das
informações, o caráter difuso das ameaças, o ambiente interagências, as novas
tecnologias e sua proliferação; e o espaço cibernético.
Para os objetivos propostos no presente trabalho destaca-se a relevância dos
fatores dimensão humana, combate em áreas humanizadas, importância das
informações, caráter difuso das ameaças e ambiente interagências.
Muito importante para a compreensão das modificações doutrinárias atuais e,
em especial para o entendimento da relevância da análise das considerações civis
22
para obtenção do sucesso em operações, é o destaque da dimensão humana
(atividades, ações, comportamentos e peculiaridades de indivíduos ou grupos
humanos) presente no campo de batalha. Sobre o abordado, destaca-se o contido
no Manual de Campanha Operações:
Novas capacidades têm sido requeridas na formulação de soluções aos
problemas militares. As operações militares realizadas no amplo espectro
dos conflitos, normalmente, desencadeadas em áreas humanizadas,
induzem à preponderância do terreno humano do Espaço de Batalha que,
de forma crescente, tem tido o seu protagonismo ressaltado (BRASIL, 2014
c, p. 3-14).
É sabido que a comunidade internacional contemporânea questiona com vigor
o emprego de forças militares para resolução de crises e conflitos, em razão das
inerentes perdas em vidas humanas e destruição de recursos de toda espécie.
Aspectos relacionados à dimensão humana têm suscitado modificações na
atuação do combatente e na forma de lidar com a população das áreas
conflagradas, com reflexos no armamento e equipamento empregados, na natureza
e no adestramento da tropa empregada (BRASIL, 2014 b).
Indo ao encontro do apresentado no parágrafo anterior, Pinheiro (2012)
destaca:
Cada vez mais, torna-se impositivo o domínio de conhecimentos específicos
sobre as culturas, percepções, valores, crenças e interesses, bem como os
seus reflexos nos processos de tomada de decisões de indivíduos e grupos.
Todo esse acervo deve ser avaliado em conformidade com a estrutura
social, língua, cultura, poder e exercício da autoridade, e os interesses vitais
da sociedade em questão. É o “Terreno Humano” (Human Terrain)
ganhando uma relevância que, não raro, sobrepuja a do terreno fisiográfico,
confirmando, de forma inequívoca, que a dimensão psicossocial é a
essência dos conflitos do Sec XXI (PINHEIRO, 2012).
Outra característica atual dos conflitos armados atuais é a preponderância de
sua ocorrência em espaços ocupados pelo homem. O EB20-MF 10.102 aponta o
atual predomínio dos combates em áreas humanizadas como aspecto relevante,
tornando o ambiente operacional congestionado.
A presença da população e de outros atores dificulta a identificação dos
contendores e aumenta a possibilidade de danos colaterais decorrentes das
operações militares. Isso não quer dizer que a letalidade de um exército
deva ser reduzida, mas que ela deve ser seletiva e efetiva (BRASIL, 2014 b,
p. 4-5).
Considerando o apresentado sobre os aspectos da dimensão humana e do
combate em áreas humanizadas, pode-se inferir que as “considerações civis”
tornam-se fator de decisão preponderante para a tomada de decisão em todos os
23
níveis (BRASIL, 2014 b). No que se refere a importância das informações, é mister
compreender o papel da informação sobre os atores presentes em um conflito.
O Manual de Fundamentos Doutrina Militar Terrestre elenca a mídia, os civis
não combatentes, os grupos e organizações presentes em áreas conflagradas, o
público de massa – nacional e internacional – e os dirigentes e líderes em todos os
níveis (BRASIL, 2014 b).
A atuação da mídia, a facilidade de acesso a novas tecnologias, a
socialização da Internet e o aparecimento das redes sociais disponibilizam,
a qualquer cidadão, informações que antes eram reservadas aos Estados.
Os diversos atores, estatais ou não, conduzem suas atividades com o
entendimento de que elas poderão ser gravadas e difundidas ao “público
global” instantaneamente. Assim, toda ação ou atividade militar pode ser
potencialmente “capturada” em imagens digitais, e – o mais importante –
essas imagens, em alguns casos, podem ser manipuladas por atores com
interesses contrários, cada qual buscando controlar a “narrativa”. Essa
visibilidade imposta pelas mídias sociais e tradicionais torna-se, portanto,
uma consideração fundamental para o emprego de forças de Defesa
(BRASIL, 2014 b, p. 4-5).
Nesse contexto, cabe destacar a importância da opinião pública para os
conflitos da atualidade, elevando-a ao patamar de objetivo estratégico a ser
alcançado. Tal assertiva encontra amparo em manuais da F Ter, como se observa
abaixo:
A opinião pública, aliadas a algumas capacidades requeridas no ambiente
operacional contemporâneo, tais como as Operações de Informação (Op
Info) e o espaço cibernético, que sempre foram consideradas,
especialmente nos níveis político e estratégico, passam a ser um objetivo a
ser conquistado, também nos níveis operacional e tático (BRASIL, 2014 c,
p. 3-14).
A Doutrina Militar Terrestre diz:
Em uma sociedade cada vez mais dependente da informação, a percepção
que a população tem da realidade é de suma importância. Controlar a
“narrativa” é não apenas comunicar bem, mas comunicar primeiro. Perder o
controle da narrativa pode levar a sérias restrições à liberdade de ação e
até mesmo impor a derrota no Espaço de Batalha (BRASIL, 2014 b, p. 4-6).
Nas últimas décadas, nos conflitos ocorridos em ambiente de incertezas,
passou a ser mais difícil a identificação do adversário dominante, regular ou não. “A
crescente proeminência de grupos transnacionais ou insurgentes, com ou sem apoio
político e material de países, ampliou o caráter difuso das ameaças a serem
enfrentadas com o emprego de forças de Defesa” (BRASIL, 2014 b).
Quanto ao aspecto operações interagências, Brasil (2014 b) esclarece:
Na Era do Conhecimento, tornou-se comum a inserção de novos atores no
Espaço de Batalha, inclusive de atores não estatais com elevado poder de
influenciar opiniões e defender interesses de seus patrocinadores. Neste,
são exemplos as organizações governamentais e não governamentais, as
24
agências supranacionais de organismos internacionais e as já mencionadas
mídias tradicionais e sociais. Muitos desses atores utilizam o denominado
“espaço humanitário”, parte indissociável das áreas conflagradas.
A ação coordenada entre as forças militares e esses atores na defesa de
interesses legítimos é a chave do sucesso. Portanto, pode-se depreender
que as operações militares da Era do Conhecimento têm como traço
comum o ambiente interagências, que pode interferir favoravelmente no seu
curso. Atuar nesse ambiente operacional exige efetivos militares com
mentalidade, linguagem e estruturas adequadas ao relacionamento com
essa diversidade de agências (BRASIL, 2014 b, p. 4-6).
2.1 CONCLUSÃO PARCIAL
Do exposto anteriormente, conclui-se, de forma parcial, que as operações no
amplo espectro suscitam novas capacidades dos combatentes, em especial de seus
comandantes táticos, os quais deverão estar preparados para lidar com as
diferentes ameaças encontradas no campo de batalha da atualidade.
25
3 AS CONSIDERAÇÕES CIVIS
O acrônimo MITeMeT-C refere-se aos fatores de decisão missão, inimigo,
terreno, meios, tempo e considerações civis, todos fundamentais para a condução
da análise da missão recebida, seja qual for, e planejamentos subsequentes.
Os cinco primeiros fatores supracitados não são novos e já estão arraigados
na cultura militar brasileira. Entretanto, a natureza dos conflitos atuais, conhecidos
como de “amplo espectro”, requer comandantes capazes de avaliar os impactos dos
fatores não-militares sobre as operações.
Somando-se ao descrito no parágrafo anterior, a complexidade, a importância
e o aumento da população mundial suscitaram a inclusão das considerações civis na
doutrina militar da F Ter brasileira.
A referida inclusão se deu no exame de situação do comandante tático,
processo de tomada de decisão militar consagrado e que vem, ao longo do tempo,
se atualizando a fim de fazer frente as demandas contemporâneas de planejamento.
O Manual de Campanha EB 20-MC-10.211, Processo de Planejamento e Condução
de Operações Terrestres, o define da seguinte forma:
O Exame de Situação do Comandante é um método de planejamento
interativo que proporciona ao tomador de decisão a compreensão da
situação, a missão e a formulação de solução para um problema militar,
desenvolvendo linhas de ação para a decisão do comandante e a produção
de planos ou ordens. Ele integra as atividades do comandante, EM,
comandos subordinados e de parceiros em ambiente interagências
(BRASIL, 2014 d, p. 5-1).
De acordo com o EB 20-MF-10.103, Operações, o Exame de Situação é a
metodologia concebida para a solução de um problema militar, em qualquer nível,
sustentada pelo estudo de aspectos relevantes que são organizados e orientados
por determinados fatores. A mesma publicação cita:
Assim, com vistas à obtenção de resultados nas operações militares, os
aspectos relevantes para o planejamento e condução das operações são
sistematizados cartesianamente por elementos que devem ser
considerados. As partes constitutivas dessa metodologia são os Fatores da
Decisão, isto é, elementos que prevalentemente orientarão o processo
decisório. Os principais Fatores da Decisão a considerar são: MISSÃO,
INIMIGO, TERRENO E CONDIÇÕES METEOROLÓGICAS, MEIOS,
TEMPO e CONSIDERAÇÕES CIVIS (BRASIL, 2014 c, p. 3-11).
Ao ler o conteúdo acima, percebe-se que o exame de situaçao do
comandante
tático
considerações civis.
foi
recentemente
potencializado
com
a
inserção
das
26
Sobre as considerações civis observa-se:
As considerações civis tornaram-se mandatórias como fator preponderante
da decisão, juntamente com a Missão, o Terreno e Condições
Meteorológicas, o Inimigo, os Meios e o Tempo (BRASIL, 2014 c, p. 3-14).
Para que se possa prosseguir nos objetivos do presente estudo, é mister
conhecer um dos conceitos que define considerações civis:
As considerações civis são, enfim, traduzidas pela influência das instituições
civis, das atitudes e atividades das lideranças civis, da população, da
opinião pública, do meio ambiente, de infraestruturas construídas pelo
homem, das agências civis, com capacidade de influir e formar opiniões
entre os nacionais ou internacionais, no Espaço de Batalha. (BRASIL, 2014
c, p. 3-15).
De acordo com Pinheiro (2012), o fator de decisão considerações civis deve
ser primorosamente considerado e estudado a fim de permitir que as forças militares
em campanha obtenham condições adequadas para o sucesso nos conflitos
contemporâneos.
Num ambiente operacional caracterizado pela presença de forças
irregulares, hostis e aliadas, dispersas em meio às comunidades da
população local, esta passa a ter uma relevância ímpar para a consecução
bem sucedida dos objetivos estratégicos, operacionais e táticos dos
comandos de diferentes níveis em presença (PINHEIRO, 2012).
Tomando como referência o artigo do General R1 Álvaro, pode-se observar
que a inserção das considerações civis no exame de situação do comandante tático
não é exclusividade da F Ter brasileira.
Na verdade, esse fato não se constitui numa novidade. Os Conflitos
Irregulares Assimétricos da época da Guerra Fria já possibilitavam essa
constatação. Entretanto, no contexto da atual “Guerra Global contra o
Terror”, em plena era da Tecnologia da Informação, esta importância
chegou a tal ponto, que em junho de 2007, o Exército dos EUA, por meio do
seu mais relevante Manual de Campanha, o FM 3-0, OPERATIONS,
acrescentou aos fatores tradicionais da decisão - Missão, Inimigo, Terreno,
Meios e Tempo - as “considerações civis” (Civil Considerations) (PINHEIRO,
2012).
Observando o apresentado pelo General R1 Álvaro, em seu artigo intitulado
“As considerações civis, o terreno humano e os conflitos do século XXI”, percebe-se
que o mais recente fator de decisão adotado pelo Exército Brasileiro deve ser
aplicado e profundamente difundido entre os militares, a fim de alcançar os
necessários níveis de consciência situacional por parte da tropa, assim como o
desenvolvimento e adoção de comportamentos a serem incorporados pelos
combatentes tendo em vista a complexidade e a especificidade do assunto.
27
A experiência tem demonstrado que o entendimento da cultura local, e o
conhecimento dos aspectos políticos, econômicos, psicossociais e
religiosos é crucial para o planejamento e a execução das operações. O
conhecimento sobre os grupos sociais em presença e seus interesses,
crenças, líderes e fatores motivadores de comportamentos grupais e
individuais tornou-se absolutamente imprescindível nos conflitos armados
atuais. E é fundamental estar consciente que a capacitação para conduzir a
pesquisa e a análise para a obtenção de informações confiáveis, válidas e
objetivas sobre esses controvertidos temas é altamente especializada no
ramo das ciências sociais (PINHEIRO, 2012).
O atendimento as demandas levantadas pela análise das considerações civis
se dá por ações efetivas por parte da tropa, tais como o respeito à cultura, aos
valores, aos costumes e tradições existentes e arraigados na população da área em
que se atua, a preocupação com a preservação da infraestrutura, dos bens e
propriedades, dos monumentos, dos templos e de outros símbolos de importância
social, cultural e religiosa no interior da área conflagrada, a busca incessante pela
conquista dos “corações e mentes” da população local, a necessidade da
manutenção da opinião pública favorável às ações bélicas desenvolvidas, dentre
outras.
As atuais campanhas do Afeganistão e do Iraque deixam evidente, de forma
incontestável, que a natureza das ações desenvolvidas em presença de
forças irregulares ocultas em meio à população local, exige comandantes,
em todos os escalões, capacitados a avaliar o impacto dos fatores não–
militares nas operações (PINHEIRO, 2012).
Oportuno destacar a importância das “considerações civis” para todos os
escalões, inclusive os mais baixos que deverão estar atentos e seguir fielmente as
recomendações e orientações emanadas dos escalões superiores, sob pena de
cometerem erros táticos que poderiam comprometer a vitória estratégica, com
repercussões negativas, inclusive, no nível político.
Nesse ponto, da leitura do artigo “Winning the peace – The requirement for
Full-Spectrum Operations”, de autoria do General Peter W. Chiarelli e do major
Patrick R. Michaelis, ambos do exército norte-americano, publicado na Military
Review (Jul-Aug 2005), na página 14, percebe-se que nas operações atuais um erro
cometido por qualquer integrante de determinada fração, por menor que seja sua
posição hierárquica, terá grave repercussão no contexto estratégico e, em especial,
na opinião pública da nação (CHIARELLI e MICHAELIS, 2005).
“Durante nossa primeira reunião com os anciãos, nós fomos informados que
houve uma operação da Força de Coalizão seis meses antes e que ao
chegarem à vila, eles confiscaram todos os fertilizantes existentes, além de
destruírem todo o estoque de sementes, com o objetivo de mitigar o uso
28
desse material na confecção de artefatos explosivos improvisados. O
resultado dessa ação foi que quando a estação de plantiochegou seis
meses depois, os fazendeiros locais não possuíam fertilizantes ou sementes
para semear suas lavouras” (MOREIRA, 2013).
Infere-se, desta forma, que deva ser dada especial atenção a abordagem das
considerações civis, inclusive, nos escalões mais baixos, sob pena de comprometer
o objetivo final do emprego da força militar que é a obtenção da paz.
Nesse sentido, torna-se oportuno reforçar tal consideração por meio de
trechos do Manual de Campanha Operações, do Exército Brasileiro:
A importância que as operações no nível tático têm recebido no “Espaço de
Batalha”, mesmo as empreendidas por frações elementares, deve-se à
imediata repercussão que essas ações podem produzir nas sociedades e,
consequentemente, na Expressão Política de um país (BRASIL, 2014 c, p.
3-14).
Ainda sobre a questão:
Acresce-se a isso a importância que as operações do nível tático ou mesmo
empreendidas por frações elementares têm recebido no Espaço de Batalha
contemporâneo, considerando a possibilidade de atos isolados, realizados
por pequenos grupos ou até mesmo por iniciativas individuais, repercutirem
imediatamente nos níveis estratégico e político.
Tal fato tem trazido reflexos na forma de empregar forças militares, pois há
um evidente achatamento dos níveis decisórios. Observa-se que o nível
político da guerra aproximou-se do nível tático. Sem atribuir a devida
relevância às considerações civis, corre-se o risco de o Estado Final
Desejado (EFD) não ser alcançado (BRASIL, 2014 c, p. 3-14).
Os aspectos área, estrutura, capacidades, organização, população e eventos
compõem o arcabouço das considerações civis. O Manual de Campanha EB 20-MC10.211, Processo de Planejamento e Condução de Operações Terrestres, em seu
anexo A, destaca os principais itens a serem identificados quando da análise dos
aspectos que compõem as Considerações Civis:
- Subitem “(a) Área”, abordando:
(1) Divisão político-administrativa.
(2) Áreas de alto valor econômico.
(3) Centros políticos de governo: sedes dos governos provincial, distrital e
municipal e suas vizinhanças; sedes dos departamentos/ministérios de mais
alto nível.
(4) Áreas culturalmente importantes: sítios históricos e arqueológicos; locais
considerados religiosamente sagrados.
(5) Enclaves étnicos, tribais, políticos, religiosos, criminosos ou outros.
(6) Rotas comerciais e de contrabando.
(7) Sítios possíveis de utilização como áreas temporárias para refugiados e
deslocados.
- Subitem “(b) Estrutura”, abordando:
(1) Postos de Comando das Forças de Segurança.
(2) Segurança Pública (Delegacias policiais; tribunais
penitenciárias; pontos de bloqueio e controle de estradas).
de
justiça;
29
(3) Mídia e Comunicação em Massa: (Torres de transmissão rádio/TV;
estações de rádio/TV; sedes de jornais e revistas; oficinas de impressão).
(4) Estradas e pontes.
(5) Portos e aeroportos de entrada.
(6) Represas.
(7) Estações e subestações de energia elétrica.
(8) Refinarias e outras instalações de produção de combustível.
(9) Reservatórios e usinas de água potável.
(10) Sistema de esgotos (subterrâneos).
(11) Hospitais e clínicas.
(12) Escolas e universidades.
(13) Igrejas e locais de culto religioso.
(14) Bancos e instituições financeiras.
(15) Mercados populares e centros comerciais.
- Subitem “(c) Capacidades” (as quais asseguram, sustentam e
implementam a qualidade de vida), abordando:
(1) Administração pública: burocracia, cortes de justiça, instalações
governamentais.
(2) Segurança Pública: polícia militar, fronteiras, polícia civil, órgãos de
inteligência.
(3) Serviços Emergenciais: corpo de bombeiros, serviços de ambulâncias.
(4) Saúde Pública: clínicas; hospitais, serviços veterinários.
(5) Alimentação e abastecimento.
(6) Água (Tratamento e abastecimento).
(7) Sistemas Sanitários (Recolhimento do lixo e esgotos).
- Subitem “(d) Organizações”, enumerando as seguintes organizações:
(1) Religiosas.
(2) Partidos políticos.
(3) Patrióticas.
(4) Sindicatos de Classe.
(5) Criminosas.
(6) Comunitárias.
(7) Multinacionais.
(8) Governamentais Internacionais.
(9) Não-Governamentais.
- Subitem “(e) População”, abordando:
(1) Sociedade.
(2) Estruturas sociais: grupos; redes; instituições; influência exercida;
normas sociais; cultura; identidade; formas culturais: narrativa; símbolos.
(3) Segurança Física:
- Segurança da população.
- Eficiência da polícia e do sistema judicial.
- A polícia é íntegra e não discriminatória
- Outros elemento que proporcionem segurança, que não a polícia.
(4) Recursos Econômicos.
(5) Participação Política:
- Classe política dominante.
- Discriminação étnica, religiosa ou qualquer outra.
- Existência de violação dos direitos humanos.
- Existência de alguma força de ocupação no país.
- Acesso da população aos serviços públicos essenciais (educação, saúde,
segurança, energia, etc.).
- Aspectos políticos, sociais ou outros que contribuam para um ambiente
revolucionário.
(6) Descontentamentos.
(7) Principal atividade econômica da área.
(8) Impacto das operações na economia local.
(9) Considerações civis complementares: Línguas e dialetos falados pela
população; comunicação não verbal (gestos e sinais); níveis de educação,
30
incluindo as taxas de alfabetização e disponibilidade de educação; meios de
comunicação e sua importância para a população; importância da
comunicação interpessoal, face a face, por telefone e e-mail; importância da
mídia de massa, tais como publicações impressas, radio, televisão ou
internet; história política nacional; eventos que conduziram à insurreição; a
disponibilidade de armas para a população em geral.
(10) Refugiados e deslocados.
- Subitem “(f). Eventos”, abordando:
(1) Feriados nacionais e religiosos.
(2) Colheitas agrícolas/estoques e ciclos de produção.
(3) Eleições.
(4) Distúrbios civis.
(5) Celebrações. (BRASIL, 2014 d, p. A-2).
Analisando os aspectos supracitados, os quais compõem as Considerações
Civis, verifica-se que o Manual de Campanha EB 20-MC-10.211, Processo de
Planejamento e Condução de Operações Terrestres, em seu anexo A, apresenta-os
de forma incipiente, cabendo estudo no sentido de verificar a pertinência da inclusão
de conceitos que definam e esclareçam o que se pretende identificar sobre os
aspectos componentes do método de estudo do citado fator de decisão.
3.1 CONCLUSÃO PARCIAL
Por fim, conclui-se parcialmente que as considerações civis são de capital
importância no contexto atual dos conflitos, suscitando militares capacitados para
conduzirem seu estudo de forma adequada, a fim de permitir que as forças em
campanha obtenham condições adequadas para o sucesso nos conflitos
contemporâneos. Tal entendimento já está disseminado no âmbito da Força
Terrestre, entretanto, pode-se constatar que a literatura atual é incipiente no sentido
de preparar os comandantes militares para as demandas em operações, tornandose necessária a verificação da forma utilizada para capacitá-los nas escolas de
formação e aperfeiçoamento do Exército Brasileiro. Além disso, como oportunidade
de melhoria, verifica-se a necessidade de incluir conceitos que definam e
contextualizem o leitor sobre os aspectos componentes do método de estudo do
citado fator de decisão, consubstanciado no supracitado anexo A do Manual de
Campanha EB 20-MC-10.211, Processo de Planejamento e Condução de
Operações Terrestres.
31
4 A CAPACITAÇÃO DOS COMANDANTES MILITARES BRASILEIROS PARA A
CONDUÇÃO DA ANÁLISE DAS CONSIDERAÇÕES CIVIS EM OPERAÇÕES NO
AMPLO ESPECTRO
Os comandantes militares deverão planejar e empregar elementos para obter
informações pertinentes, atribuir responsabilidades aos subordinados para atuarem
sob as demandas das considerações civis, bem como serem incumbidos de atuarem
em situações nas quais o uso consciente e adequado de dados sobre a área e a
população local seja condição para a vitória.
Nesse contexto, torna-se pertinente realizar concisa descrição do processo de
formação e aperfeiçoamento de oficiais
do Exército Brasileiro, os quais
consubstanciam a figura do comandante militar, sujeito do presente trabalho.
A carreira bélica de oficiais da Força Terrestre possui como estabelecimento
de ensino formador a Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Prosseguindo
na
carreira,
os
comandantes
militares
são
submetidos
a
processo
de
aperfeiçoamento contínuo. Para os oficiais de carreira, após sua formação, é
mandatória a realização do curso da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO).
Cabe destacar que existe, para os oficiais, o Curso de Altos Estudos Militares
(CAEM), o qual engloba o Curso de Comando e Estado-Maior (CCEM), realizado na
Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Oportuno ressaltar que
se trata de curso de aperfeiçoamento, de caráter voluntário, baseado em processo
seletivo adotado para determinar os oficiais que frequentarão o referido curso.
A seguir, serão apresentadas descrições sumárias dos cursos existentes para
oficiais do EB e, no prosseguimento, serão conduzidas análises pormenorizadas
sobre o conteúdo dos citados cursos, com o fito de identificar se os comandantes
militares brasileiros estão capacitados a conduzirem a análise das considerações
civis em operações no amplo espectro.
4.1 ACADEMIA MILITAR DAS AGULHAS NEGRAS
A Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN), localizada na cidade de
Resende, no estado do Rio de Janeiro (RJ), é o estabelecimento de ensino que
forma oficiais combatentes de carreira do Exército Brasileiro.
32
Ao longo dos quatro anos de formação, são realizadas atividades que se
fundamentam no desenvolvimento de atributos das áreas afetiva, cognitiva e
psicomotora necessários à profissão militar.
No 1º ano da Academia Militar, Curso Básico, ocorre a Formação Básica do
futuro oficial. Os objetivos são ajustar a personalidade do cadete aos princípios que
regem
a
vida
militar,
assegurar os
conhecimentos que
o
habilitem
ao
prosseguimento de sua formação de oficial, fortalecer o caráter militar, preparar o
combatente básico, obtendo reflexos na execução de técnicas e táticas individuais
de combate, obter capacitação física e desenvolver habilidades técnicas.
Nos 2º, 3º e 4º anos, a formação dos oficiais da AMAN é direcionada para as
sete especialidades do Exército Brasileiro, que constituem a linha de Ensino Militar
Bélico, divididas em Armas (Infantaria, Cavalaria, Artilharia, Engenharia e
Comunicações), Serviço de Intendência e Quadro de Material Bélico.
A qualificação do futuro oficial tem por objetivo principal a capacitação ao
exercício do comando de pequenas frações, pelotão e de subunidades de sua
respectiva Arma, Quadro ou Serviço. Ainda, consolidam-se o aperfeiçoamento das
técnicas individuais do combatente, o elevado padrão de ordem unida e o contínuo
desenvolvimento da capacidade física.
A qualificação e a intensificação das atividades militares têm por objetivo
principal a habilitação ao exercício de cargos e funções inerentes ao oficial
subalterno e ao capitão não aperfeiçoado, em condições de combate e em tempo de
paz.
Sua grade curricular inclui disciplinas ligadas às ciências militares, exatas e
humanas. Ao final do curso, o concludente é declarado Aspirante a Oficial e recebe
o diploma de Bacharel em Ciências Militares.
4.1.1 O estudo das Considerações Civis na AMAN
De todo o levantamento realizado, verificou-se que os Cadetes estão
recebendo instruções multidisciplinares que lhes dão arcabouço intelectual suficiente
para conduzirem a análise adequada das Considerações Civis no seu nível de
atuação, num contexto de operações no amplo espectro.
Além disso, os cursos da AMAN, possuem em seus currículos a adoção do
Estudo de Situação do Comandante, metodologia constante do Manual de
33
Campanha C 101-5, Estado-Maior e Ordens (2º Volume) 2ª Edição/2003, o que pode
ser constatado pela análise do Plano de Disciplinas (PLADIS) dos diferentes cursos
ministrados naquele EE, particularmente para os Cadetes das Armas (Infantaria e
Cavalaria).
Cabe ressaltar que as Normas de Comando empregadas como método para
planejamento no nível pelotão, bem como o Estudo de Situação do Comandante
aplicado no nível subunidade são enxutos. Apesar disso, não se distingue, de forma
significativa, do Método de Planejamento Detalhado do Exército, consubstanciado
no Exame de Situação do Comandante, recentemente reformulado e constante do
manual de campanha EB 20-MC-10.211, Processo de Planejamento e Condução
das Operações Terrestres.
Importante destacar a existência da Nota de Coordenação Doutrinária Nr
02/2012 elaborada pela Centro de Doutrina do Exército, em 20 de dezembro de
2012, a qual aborda as Considerações Civis no Estudo de Situação do Comandante.
O objetivo da citada nota de coordenação foi introduzir as Considerações Civis na
metodologia do Estudo de Situação do Comandante Tático, constante do Manual de
Campanha C 101-5, Estado-Maior e Ordens (2º Volume) 2ª Edição/2003, como mais
um fator da decisão.
No documento citado anteriormente, identifica-se a análise do fator de
decisão Considerações Civis em duas fases distintas do Estudo de Situação do
Comandante Tático, metodologia que, atualmente, é ensinada ao futuro oficial do
EB.
À luz da metodologia do Estudo de Situação do Comandante Tático, os Cmt
e seus EM, de todos os níveis de planejamento, inclusive o tático, desde a
FTC às frações elementares empregadas, devem analisar o terreno humano
e os aspectos psicossociais que envolvem o problema militar. Dessa forma,
a abordagem das Considerações Civis nesse Estudo de Situação deve
obedecer o que se segue:
- inicia-se no 1º Parágrafo do Estudo de Situação, quanto o Comandante
(Cmt) e seu Estado-Maior (EM) estão analisando a missão, uma vez que o
mesmo poderá influenciar a diretriz de planejamento emitida pelo Cmt
expedida ao final dessa etapa do processo. Nessa fase, apenas detalhes
relevantes e que realmente possam influenciar no cumprimento da missão
do escalão considerado devem ser levantados;
- no 2º parágrafo do Estudo de Situação do Comandante Tático (2.
SITUAÇÃO E LINHAS DE AÇÃO), fase em que o EM aprofunda o estudo
sobre todas as condicionantes que afetam as operações e que culmina com
a elaboração das linhas de ação, o assunto deve ser detalhado, levando-se
em conta todos os conhecimentos disponíveis e relevantes ao processo
(BRASIL, 2012,b).
34
Além disso, sendo o planejamento do comandante de pelotão e o do
comandante de subunidade voltados para a execução imediata, ambos realizam as
tarefas impostas e, raramente as deduzidas. Recebem e repassam ordens táticas de
forma direta, sem interpretações profundas e com superficial análise dos fatores da
decisão. Na verdade, nos citados escalões, seus comandantes devem ter a
capacidade de receber os insumos, no caso as informações e dados oriundos do
escalão superior e operacionalizá-los, focando naquilo que for útil e necessário para
o cumprimento das missões a eles atribuídas.
Somado ao que foi apresentado no parágrafo anterior, cabe ressaltar que os
comandantes nos níveis pelotão e subunidade tem suas ações delimitadas por
ordens claras e regras de engajamento que mitigam a reduzida maturidade de
ambos para lidarem com o terreno humano em operações. O pelotão e a
subunidade são os escalões que realizarão o esforço de busca de dados acerca das
considerações civis, bem como serão aqueles que irão interagir com o terreno
humano durante as operações.
4.1.2 Conclusão parcial
Do exposto acima, pode-se inferir que os oficiais egressos da AMAN já estão
sendo capacitados a condução da análise das Considerações Civis. O assunto é
apresentado de forma interdisciplinar e por meio dos blocos de operações Ofensivas
e Defensivas. É oportuno citar que os oficiais egressos da AMAN, em especial os de
Infantaria e de Cavalaria, estão capacitados a atuarem em operações no amplo
espectro, conforme consta do perfil profissiográfico dos concludentes.
4.2 ESCOLA DE APERFEIÇOAMENTO DE OFICIAIS
A Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO) foi criada pelo Decreto
Federal de número 13.451 de Janeiro de 1919 e fundada em 08 de Abril de 1920,
pelo então Ministro da Guerra Dr JOÃO PANDIÁ CALÓGERAS. Inicialmente a
Escola foi instalada no Quartel do extinto 1º Regimento de Artilharia Montada, hoje
1º Grupo de Artilharia de Campanha Autopropulsado - "Regimento Floriano". Após
04 anos de funcionamento, em sua sede provisória, a Escola foi transferida para o
35
atual aquartelamento, recebendo, naquele ano de 1924, cento e oitenta OficiaisAlunos.
A EsAO tem por missão aperfeiçoar capitães, capacitando-os para o comando
e chefia de unidades e habilitando-os para o exercício de funções de estado-maior
não-privativas do Quadro de Estado-Maior da Ativa (QEMA) do Exército. Além dos
oficiais do Exército Brasileiro, a EsAO também aperfeiçoa oficiais Fuzileiros Navais
da Marinha do Brasil e das nações amigas.
A EsAO se vale de exercícios conjuntos entre os cursos, reforçando sua
condição de escola de Armas combinadas, assim como do trabalho em grupo. Outra
metodologia empregada é a do exercício de simulação de combate, a qual permite a
realização de treinamentos com aplicação da doutrina.
A escola tem como meta instrumentar o oficial com as ferramentas
necessárias e adequadas para atuar em cenários estratégicos de conformação
difusa e acompanhar a rápida e contínua evolução da doutrina militar, por meio do
perfeito
entendimento
do
emprego
combinado
das
Armas.
O
Curso
de
Aperfeiçoamento de Oficiais (CAO) é realizado em dois anos, sendo o segundo
presencial, por todos os oficiais do Exército Brasileiro formados na AMAN, ao
atingirem o posto de Capitão. A EsAO é um estabelecimento de ensino pertencente
à Linha de Ensino Militar Bélico, grau superior e segundo ciclo (modalidade aperfeiçoamento).
Por fim, cumpre à EsAO atualizar e ampliar os conhecimentos dos oficiais
alunos , capacitando-os para o exercício do comando e chefia das unidades de suas
Armas, Quadro e Serviços e habilitando-os para o exercício das funções de EstadoMaior de unidade e demais funções de oficial superior não privativas do QEMA.
4.2.1 O estudo das Considerações Civis na EsAO
O curso da EsAO capacita o aluno para conduzir o Estudo de Situação do
Comandante no nível Unidade (U), método consagrado no Manual de Campanha C
101-5, Estado-Maior e Ordens (2º Volume) 2ª Edição/2003. Tal assertiva pode ser
constatada pela análise do Plano de Disciplinas (PLADIS) dos diferentes cursos
ministrados naquele Estabelecimento de Ensino (EE), particularmente para os
Capitães das Armas (Infantaria e Cavalaria).
36
Acompanhando a evolução doutrinária do EB, a partir deste ano de 2014, a
EsAO iniciou a capacitação de seus alunos tomando por base o novo Método de
Planejamento Detalhado do Exército, consubstanciado no Exame de Situação do
Comandante, recentemente reformulado e constante do manual de campanha EB
20-MC-10.211, Processo de Planejamento e Condução das Operações Terrestres.
O novo método não se distingue, de forma significativa, do Estudo de Situação do
Comandante, constante do C 101-5.
O manual supracitado apresenta o novo método como o processo sistemático
de planejamento detalhado de emprego dos elementos da F Ter que visa a dar uma
sequência lógica e ordenada aos diversos fatores que envolvem o processo
decisório nas operações no amplo espectro. Além disso, o método está alinhado
com o Processo de Planejamento Conjunto estabelecido pela Doutrina de
Operações Conjuntas do Ministério da Defesa, sendo referência para os
planejamentos nos escalões Força Terrestre Componente (FTC) até o nível unidade.
O Exame de Situação do Comandante é dividido em seis fases, sendo as
primeira e segunda fases relevantes para o estudo ora conduzido, pois nelas se
identifica a análise do fator de decisão Considerações Civis.
Na primeira fase do exame, que é a Análise da Missão e Considerações
Preliminares, as Considerações Civis são analisadas de forma sucinta, em que
apenas detalhes relevantes e que realmente possam influenciar no cumprimento da
missão do escalão considerado, condicionando-o ou restringindo-o, devem ser
levantados.
Já na segunda fase (Situação e sua Compreensão), as Considerações Civis
são analisadas de forma detalhada, abordando todas as condicionantes que afetam
as operações, levando-se em conta todos os conhecimentos disponíveis e
relevantes ao processo.
Do exposto acima, pode-se constatar que a EsAO aborda as Considerações
Civis em seu curso, particularmente para as Armas de Infantaria e Cavalaria. O
assunto é apresentado e praticado nos blocos de Garantia da Lei e da Ordem,
Defensiva e Ofensiva. Vale acrescentar que todos os temas constantes dos blocos
de ensino da EsAO já abordam as operações no amplo espectro.
Além das observações feitas acima, é necessário citar que as unidades do
Exército Brasileiro reúnem pessoal e meios que lhe permitem cumprir variadas
missões com maior amplitude e enquadrando os escalões subunidade e pelotão.
37
Outra característica típica do escalão unidade é a existência do Estado-Maior
constituído por seções responsáveis pelo planejamento e pela execução de suas
missões. Por fim, ressalta-se que apesar do assunto Considerações Civis estar
sendo estudado e praticado na EsAO, o mesmo não consta do PLADIS do citado
EE.
4.2.2 Conclusão parcial
Conclui-se, de forma parcial, que o oficial aperfeiçoado pela EsAO está
recebendo instruções que abarcam o assunto Considerações Civis. Sendo assim,
podemos inferir que o oficial do EB, após a conclusão do curso da EsAO, está
capacitado, como comandante militar, a conduzir a análise das Considerações Civis
em operações no amplo espectro.
4.3 ESCOLA DE COMANDO E ESTADO-MAIOR DO EXÉRCITO
O Decreto de 02 de outubro de 1905 criou a Escola de Estado-Maior,
inaugurando nova fase no EB, na qual passaram a ser ministrados regularmente aos
oficiais, ensinamentos estratégicos, táticos e logísticos indispensáveis ao preparo e
ao emprego da Força Terrestre, deixando para trás muitos dos pensamentos do
século anterior.
Com o término da 1ª Guerra Mundial em 1918, o governo brasileiro foi buscar,
na França, instrutores especializados em assuntos ligados à arte da guerra. Assim,
com a missão militar aqui instalada, a atualização profissional chegou aos oficiais da
Escola de Estado-Maior. Grandes méritos foram creditados à missão militar
francesa, que muito se empenhou na divulgação de novos processos de combate,
legando, inclusive, publicações sobre táticas das armas, serviços em campanha e
chefia militar. A permanência da missão se estendeu até 1940.
A participação do Brasil na 2ª Guerra Mundial gerou modificações profundas
na doutrina, nos currículos e nos métodos de ensino e de trabalho, além do próprio
ambiente da Escola de Estado-Maior. O retorno dos últimos três membros da missão
militar francesa e os acordos militares com os norte-americanos concorreram,
decisivamente, para que essas modificações acontecessem. Surgiu, a partir de
38
1940, uma nova etapa na trajetória da Escola, marcada pela sua instalação definitiva
no prédio da Praia Vermelha.
Atualmente, a Escola de Comado e Estado-Maior do Exército (ECEME)
oferece o Curso de Altos Estudos Militares (CAEM), o qual engloba o Curso de
Comando e Estado-Maior (CCEM) que tem a duração de dois anos. Este último visa
habilitar o oficial concludente ao exercício de cargos e funções de Estado-Maior de
Grandes Unidades (Brigadas) e de Grandes Comandos da F Ter e de outros órgãos
de nível equivalente, bem como ao comando de Brigadas e de Grandes Comandos
da F Ter e desempenho de cargos e funções privativas de oficial-general
combatente.
4.3.1 O estudo das Considerações Civis na ECEME
O curso da ECEME se pauta pelo fiel cumprimento dos métodos para solução
de problemas militares. Nesse particular, há o Método de Planejamento Detalhado
do Exército, consubstanciado no Exame de Situação do Comandante, recentemente
reformulado e constante do manual de campanha EB 20-MC-10.211, Processo de
Planejamento e Condução das Operações Terrestres.
De acordo com o citado manual, o novo método, inserido na doutrina militar
terrestre brasileira neste ano de 2014, é o processo sistemático de planejamento
detalhado de emprego dos elementos da F Ter que visa a dar uma sequência lógica
e ordenada aos diversos fatores que envolvem o processo decisório nas operações
no amplo espectro. Diz, ainda, que é o método alinhado com o Processo de
Planejamento Conjunto estabelecido pela Doutrina de Operações Conjuntas do
Ministério da Defesa, e que é referência para os planejamentos nos escalões Força
Terrestre Componente (FTC) até o nível unidade.
Analisando o Exame de Situação do Comandante, identifica-se a análise do
fator de decisão Considerações Civis em duas fases distintas. Na primeira fase do
exame, que é a Análise da Missão e Considerações Preliminares, as Considerações
Civis são analisadas de forma sucinta. Nessa fase, apenas detalhes relevantes e
que realmente possam influenciar no cumprimento da missão do escalão
considerado, condicionando-o ou restringindo-o, devem ser levantados. Já na
segunda fase (Situação e sua Compreensão), as Considerações Civis são
analisadas de forma detalhada, abordando todas as condicionantes que afetam as
39
operações, levando-se em conta todos os conhecimentos disponíveis e relevantes
ao processo.
Do exposto acima, pode-se inferir que a ECEME já aborda as Considerações
Civis em seu Curso de Comando e Estado-Maior, em particular durante o seu
primeiro ano. O assunto é apresentado no bloco de Assuntos Civis/ Considerações
Civis e, na sequência, praticado nos blocos de Garantia da Lei e da Ordem,
Defensiva e Ofensiva. É oportuno citar que todos os temas constantes dos blocos de
ensino da ECEME abordam as operações no amplo espectro, a fim de preparar seus
concludentes para as especificidades dos combates da atualidade.
No bloco de Assuntos Civis/Considerações Civis e, também no bloco de
Garantia da Lei e da Ordem, o aluno recebe insumos básicos sobre Considerações
Civis, identifica sua inserção como fator de decisão do Exame de Situação do
Comandante Tático e, ainda, pratica os ensinamentos adquiridos por meio de
exercícios.
Além disso, analisando o PLADIS do CCEM/1º e 2º ano, na atual Unidade
Didática IV (Assuntos Civis, Atividades de Cooperação Civil-Militar e atribuições
subsidiárias gerais e particulares), verifica-se que os assuntos Nr 1 e 2 tratam do
mesmo tema, qual seja, Assuntos Civis e que seus objetivos específicos são os
mesmos. Portanto, identifica-se a possibilidade de inserção das Considerações Civis
no PLADIS em questão, sem alterações significativas da carga horária total.
Ainda, ao longo do curso, em especial nos blocos de Defensiva e Ofensiva,
novamente o aluno é cobrado na análise das Considerações Civis durante os
diferentes temas de fundamento e de aplicação, tanto no escalão Brigada, quanto no
escalão Divisão de Exército. Além dos blocos ministrados em sala de aula, as
Considerações Civis são estudadas e praticadas durante os Exercícios no Terreno
(ET) de operações Defensivas e Ofensivas.
4.3.2 Conclusão parcial
Sendo assim, em que pese não estarem as Considerações Civis constando
do PLADIS do EE em tela, verifica-se que o mesmo é estudado e praticado por seus
alunos. Entretanto, o fato de as Considerações Civis não constarem do PLADIS
deve ser retificado pois há o risco de não se estabelecerem os objetivos específicos
a serem atingidos pelo concludente do curso, acarretando em formação deficiente.
40
5 AS CONSIDERAÇÕES CIVIS NOS ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA E NA
ESPANHA, SEMELHANÇAS E DIFERENÇAS DA DOUTRINA BRASILEIRA
Neste capítulo serão apresentadas as considerações civis, ou aquilo que se
entende por considerações civis, sob o paradigma das doutrinas dos Estados Unidos
da América (EUA) e da Espanha. A razão para seleção dos citados países é que o
primeiro exerce influência direta sobre a Doutrina Militar Terrestre (DMT) brasileira e
o segundo, por representar a doutrina da Organização do Tratado do Atlântico Norte
(OTAN), além de, também, influenciar o campo militar do País sul-americano.
5.1 AS CONSIDERAÇÕES CIVIS NOS EUA
De maneira geral, o entendimento e o que consta dos manuais de campanha
norte-americanos acerca do assunto é o que está consubstanciado nos novos
manuais do Exército Brasileiro. Ao se estudar as considerações civis nos novos
manuais anteriormente citados, percebe-se a presença da influência norteamericana em toda a gama de assuntos que permeiam as considerações civis.
Sendo assim, serão abordados a seguir, aspectos doutrinários julgados
importantes e que poderão elucidar ou, até mesmo, contribuir com a doutrina
brasileira. Todas as observações a frente se baseiam em entrevista com oficial
daquela nação amiga, cursando o CCEM no ano de 2014, leituras e estudos de
manuais militares dos EUA, artigos referenciados e apresentações realizadas
durante o Maneuvers Captains Career Course (MCCC), curso de aperfeiçoamento
de capitães equivalente a Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais, realizado nos anos
de 2008 e 2009, no qual o autor recebia instruções e praticava o Exame de Situação
do Comandante Tático do exército norte-americano, o qual já havia incorporado
aspectos doutrinários como as operações no amplo espectro e as considerações
civis como fator de decisão.
No tocante as operações no amplo espectro, os militares norte-americanos
consideram que a face da guerra está mudando e apontam a dificuldade em
determinar onde está o inimigo (o aspecto assimétrico sem definição clara de uma
"frente de batalha"); O avanço tecnológico que traz meios e métodos outrora
disponíveis apenas para as superpotências e que agora são comuns no mundo todo;
41
Armas e táticas que evoluíram com base na tecnologia disponível e com custos
reduzidos, além do uso de dispositivos explosivos improvisados.
Outro fator preponderante nos conflitos contemporâneos tem sido a influência
da opinião pública nacional e internacional nos conflitos armados. Como exemplos,
tem-se o Vietnã, emblemático para os EUA e a Chechênia para os russos.
Além dos fatores supracitados, deve-se considerar a mídia e a velocidade do
fluxo de informações, as quais costumavam levar meses para alcançar o público em
geral agora estão quase que instantaneamente disponíveis em praticamente todo o
mundo, demandando preocupações por parte da tropa no que se refere à segurança
da informação – o "inimigo" está sempre ouvindo e procurando pistas e dicas para
ajudar a sua causa.
Nesse contexto atual, para os EUA, assim como para o Brasil, a análise das
considerações civis se dá em qualquer tipo de operação, sendo mais frequente e
mais relevante nas operações contra-insurgência. Sendo assim, o planejamento no
nível tático em operações de contra-insurgência requer uma análise muito maior de
considerações civis do que em operações convencionais.
As Considerações civis, geralmente, enfocam o impacto imediato de civis nas
operações em andamento. No entanto, elas também incluem questões diplomáticas,
questões relacionadas as operações de informação e quesões econômicas , a longo
prazo e em níveis mais elevados. No nível tático se referem diretamente aos
aspectos Área, Estruturas, Capacidades, Organizações, Pessoas e Eventos
(AECOPE) dentro da área de operações.
Por meio da análise dos aspectos supracitados, os comandantes ampliam sua
compreensão do ambiente operativo em que estão inseridos. Além disso, a análise
das considerações civis passou a integrar o processo de integração conhecido como
Inteligence Preparation of Battlefield (IPB), o qual influenciou o Processo Integrado
Terreno, Condições Meteorológicas, Inimigo e Considerações Civis (PITCI-C).
A análise detalhada das considerações civis se configura como poderosa
ferramenta quando aplicado ao planejamento. A importância de cada um dos
aspectos (AECOPE) é avaliada em termos de seu impacto sobre o bem-estar da
população em comparação com seu efeito sobre as operações militares. Abaixo
seguem explicações sobre cada um dos aspectos a serem analisados nas
considerações civis.
42
Áreas são locais-chave ou características do terreno que normalmente não
se configuram como áreas militarmente significativas em conflitos de natureza
convencional. Podem incluir áreas definidas por fronteiras políticas (por exemplo,
distritos dentro de uma área urbana), localização dos centros de governo, enclaves
criminais, sociais e políticos, bem como locais para acampamento temporário de
civis deslocados.
Estruturas compreendem construções e edifícios que são elencados como
alvos de alto valor e prioridade em operaçoes militares (pontes, torres de
comunicações, barragens, etc), locais culturais protegidos por lei ou contrato
(igrejas, bibliotecas e hospitais) e aqueles com aplicação prática (prisões, armazéns,
escolas, gráficas e estações de rádio e televisão).
Capacidades são entendidas como as principais funções ou serviços
prestados à população, tais como a administração e a segurança pública, serviços
de emergência, alimentos e agricultura. Muitas vezes, referem-se aos recursos e
serviços que podem ser contratados para apoiar a missão militar como intérpretes,
serviços de lavanderia e materiais de construção e equipamentos.
Organizações são grupos não militares ou instituições que influenciam ou
interagem dentro da área de operações. Alguns podem ser nativos (grupos
religiosos, sindicatos trabalhistas, organizações criminosas, etc), enquanto outros
podem ser externos, tais como Organizações Não-Governamentais (ONG).
Pessoas: este termo geral descreve o pessoal não militar encontrado por
forças do exército em cada operação e suas várias capacidades, necessidades e
intenções.
Eventos são as atividades de rotina, cíclicas, planejadas ou espontâneas que
impactam significativamente a população civil ou as operações militares. Alguns
exemplos são os feriados nacionais e religiosos, feiras agrícolas, eleições, distúrbios
civis e desastres naturais ou provocadas pelo homem.
5.2 AS CONSIDERAÇÕES CIVIS NA ESPANHA
Para levantar informações relativas à doutrina espanhola e, em consequência
da OTAN, a pesquisa se valeu de manuais, páginas eletrônicas e, principalmente de
entrevista com oficial daquela nação amiga, cursando o CCEM no ano de 2014.
43
Importante constatação foi a de que nem a Espanha, nem a OTAN adotam as
considerações civis como fazem os norte-americanos e os brasileiros. Ao abordarem
o trato com o terreno humano, o fazem por intermédio da cooperação cívico-militar
(CIMIC). A seguir, seguem as informações doutrinárias relevantes sobre o assunto.
Como dito anteriormente, no seio da OTAN utiliza-se o termo Civil-Military
Cooperation (CIMIC), que é parecido, mas não idêntico, com o homônimo brasileiro,
para se referir ao seguinte:
A coordenação e a cooperação, em apoio à missão, entre o commando da
OTAN e os atores civis, incluindo a população e autoridades locais, bem
como as agências e organizações não governamentais nacionais e
internacionais. (OTAN, 2003).
Diferentemente do que acontece na doutrina brasileira, o termo é aplicado
indistintamente de serem as atividades CIMIC executadas por forças especializadas
ou por unidades não especializadas, em tarefas de cooperação civil-militar.
A doutrina brasileira aborda, ainda, os Assuntos Civis, termo que não existe
na doutrina da OTAN, para se referir às tarefas de governança civil ou administração
local. Nesse sentido, a doutrina brasileira é mais detalhista na análise dessa
situação, enquanto que no caso da OTAN isso não é adequadamente tratado no
momento em que assinala, apenas, a necessidade de restabelecer a ordem e
entregar o poder o mais cedo possível às autoridades locais.
Para compreender esta diversidade terminológica, é preciso fazer referência a
diferença existente entre a perspectiva brasileira e a da OTAN, uma vez que cada
uma delas nasce de realidades e necessidades com características peculiares. No
caso da OTAN, as operações realizadas nas últimas décadas legaram acúmulo de
experiências em missões com ênfase na CIMIC, sendo exemplos as desenvolvidas
em teatros como Afeganistão, Kosovo ou Bósnia-Herzegovina. No caso brasileiro,
por seu turno, em que pese existir o conceito CIMIC, a abordagem das
considerações civis se configura como ferramenta mais apropriada para gerar a
consciência situacional e cultural necessária para as operações no amplo espectro.
Além disso, cabe destacar que a DMT brasileira está influenciada pelo grande
protagonismo das missões de apoio às autoridades civis, nas quais as Forças
Armadas desenvolvem atividades de grande importância para a União que, na
maioria dos países, habitualmente estão situadas fora do âmbito militar.
Sob o paradigma da CIMIC, para a OTAN, os Estados-Maiores dos comandos
e forças da Aliança contam com uma seção que se denomina G-9, no caso das
44
Grandes Unidades e comandos no nível tático, e J-9 nas forças conjuntas. Durante o
planejamento, são considerados os fatores políticos, militares, econômicos, de
infraestrutura e de informação, que têm uma estreita relação com o ambiente civil.
No nível estratégico, na hora de apresentar as opções de resposta, são avaliadas as
possíveis contribuições de meios civis ou econômicos para o atingimento do Estado
Final Desejado (EFD).
Durante o planejamento e a conduta das operações, particularmente nas
chamadas
Operações
de
Estabilização,
são,
ainda,
abordados
aspectos
relacionados com o meio civil como a assistência humanitária, o desenvolvimento
social e as reformas em campos como a justiça ou o governo. Esses planejamentos
são acompanhados de estreita ligação com autoridades e agências civis, as quais se
iniciam nos estágios primários do planejamento, antes do desdobramento de tropas
na área de operações, a fim de facilitar o desenrolar das operações até a saída das
forças da OTAN.
De acordo com o manual da OTAN, Comprehensive Operations Planning
Directive (COPD), o resultado desse conjunto de atividades se traduz, dentre outros
documentos, no Anexo W, Cooperação Civil-Militar, ao Plano de Operações
(OPLAN), o qual detalha aspectos como a avaliação da situação civil, a estrutura
das forças CIMIC, as principais organizações civis presentes no terreno ou os locais
de importância para a CIMIC. Este último elemento se reveste de grande
importância, pois o G-9 ou o J-9 devem elaborar e manter permanentemente
atualizada a lista desses locais, cuja destruição total ou parcial poderá trazer
repercussões negativas para o cumprimento da missão.
No que se refere à preparação dos comandantes militares para atuarem em
operações no amplo espectro lidando com o terreno humano, a Espanha e demais
integrantes da Aliança recebem treinamento específico a fim de garantir o adequado
conhecimento de aspectos da área de operações onde irão ser empregados. Dentre
eles se destacam a consciência do ambiente (environment awareness) e a
consciência cultural (cultural awareness), uma vez que falhas nestas áreas, no nível
tático, poderão repercutir no nível político, inclusive.
Nesse sentido, para poderem realizar suas tarefas, antes da projeção de força
para a execução de operação no exterior, os oficiais de Estado-Maior responsáveis
pelo planejamento e condução das ações de CIMIC realizam intensa preparação
incluindo a realização de cursos específicos. De acordo com PADIN (2014), os
45
principais centros de ensino da OTAN no campo CIMIC são a NATO School
Oberammergau, na Alemanha: http://www.natoschool.nato.int/, o CIMIC Center of
Excellence, nos Países Baixos: http://www.cimic-coe.org/ e o Multinational CIMIC
Group, na Itália: http://www.cimicgroup.org/.
O treino recebido visa capacitar os oficiais ao exercício das atividades de
planejamento próprias do campo CIMIC, bem como dispor de habilidades como o
conhecimento da língua inglesa, indispensável para qualquer oficial ou sargento que
trabalhe no campo CIMIC, o treino específico para trabalho com intérpretes, a
capacitação para a organização e execução de reuniões interagências, o domínio
das técnicas de negociação e o relacionamento com a mídia.
Além do supracitado, os militares que operam no campo CIMIC devem
possuir atitude diplomática, transparente e aberta, devendo ainda serem capazes de
assessorar e apoiar os atores civis, bem como de identificar as capacidades civis
que possam apoiar a operação militar.
5.3 CONCLUSÃO PARCIAL
Por fim, em que pese os novos manuais brasileiros aprovados no início do
ano 2014 incorporarem muitos aspectos semelhantes à doutrina dos EUA e da
OTAN, fica evidenciado que a DMT brasileira tem personalidade própria, uma vez
que também se identificam diferenças significativas. Tais diferenças respondem às
particularidades e responsabilidades operacionais específicas do Exército Brasileiro.
Nesse
contexto,
não
se
considera
necessário
introduzir
alterações
significativas na doutrina vigente no Brasil, uma vez que os recentes manuais
reconhecem, de maneira clara e explícita, a importância capital da análise e da
avaliação contínua do ambiente civil no planejamento e condução das operações,
alinhado com o proposto na doutrina norte-americana, consubstanciada no FM 3-0
(Operations), e com a doutrina espanhola e da Aliança, conforme o Comprehensive
Operations Planning Directive da OTAN (COPD), emitido em 2010.
46
6 CONCLUSÃO
Neste capítulo será apresentado um parecer final sobre a capacitação dos
comandantes militares brasileiros para a condução da análise das considerações
civis em operações no amplo espectro. Além disso, serão elencadas sugestões para
o aperfeiçoamento da Doutrina Militar Terrestre, fruto das omissões e pontos
julgados indefinidos no presente trabalho. No que se refere à capacitação dos
comandantes militares brasileiros para a condução da análise das considerações
civis em operações no amplo espectro, cabem algumas observações que auxiliarão
na conclusão final desta pesquisa.
Em primeiro lugar, deve-se estabelecer uma clara separação entre as
necessidades de aprofundamento do estudo do fator de decisão considerações civis
por parte dos comandantes militares nos diferentes escalões.
Ao se considerar os comandantes militares nos níveis pelotão e subunidade,
ficou evidenciado que os mesmos não necessitam conduzir uma aprofundada
análise das considerações civis durante seus planejamentos, sendo suficiente a
interpretação das informações e dados recebidos do escalão superior. Cabe
ressaltar que este último, sabedor da limitação de tempo para planejamento de seus
subordinados, bem como da limitada capacidade de análise dos mesmos, deverá
repassar, apenas, aquilo que for pertinente para o cumprimento da missão de seus
subordinados. Sendo assim, nos escalões citados, no que concerne as
considerações civis, seus comandantes devem saber identificar onde obter as
informações em questão, assim como interpretá-las para empregá-las de forma
eficaz durante seus planejamentos e execução de missões. Outra conclusão
importante é que o Pelotão e a Subunidade irão contribuir efetivamente com o
esforço de busca de dados acerca das considerações civis, bem como serão
aqueles que irão interagir com o terreno humano durante as operações.
Subindo um degrau, ao se tratar do comandante do escalão Unidade, concluise que este está plenamente capacitado para realizar análise das considerações
civis, até porque ainda receberá os dados necessários do escalão superior. Além da
capacitação fornecida ao comandante durante o curso da EsAO, vale ressaltar que a
Unidade possui mais meios, pessoal e conta com um Estado-Maior, detendo a
capacidade de analisar as informações recebidas do escalão superior e extrair
aquilo que for útil para cumprir suas missões impostas e deduzidas. Em razão das já
47
citadas possibilidades, o comandante de Unidade possui algumas ferramentas que
lhe permitem obter dados importantes para sua operação, no que se refere às
considerações civis, contribuindo para o sucesso da missão em todos os níveis,
incluindo o político.
Tratando dos escalões Grande Unidade e Grande Comando, conclui-se que
os comandantes militares possuem plenas condições de conduzirem análise
aprofundada das considerações civis em operações no amplo espectro. O CCEM da
ECEME capacita o formando no desempenho do estudo do impacto das ações
militares no terreno humano da área de operações. Além disso, deve-se ter em
mente que a estrutura de seus Estados-Maiores, bem como a pleíade de meios,
frações e pessoal especializado disponíveis para cumprimento de missão, permitem
que nos escalões citados ocorra efetivo levantamento dos dados relevantes
relacionados as considerações civis.
Feitas as considerações finais sobre o proposto na presente pesquisa, serão
apresentadas algumas sugestões para o aperfeiçoamento da preparação dos
comandantes militares nos estabelecimentos de ensino pesquisados, uma vez que
em nenhum deles o assunto considerações civis está inserido nos respectivos
PLADIS.
Os PLADIS da AMAN e da EsAO contemplam os métodos adequados para os
respectivos escalões estudados conduzirem o processo de tomada de decisão
militar, além do que os escalões em tela se configuram como usuários das
informações e dados produzidos relativos às considerações civis.
Tanto as Normas de Comando empregadas como método para planejamento
no nível Pelotão, bem como o Estudo de Situação do Comandante aplicado nos
níveis Subunidade e Unidade se baseiam nos fatores da decisão, portanto, mediante
modificações que já estão sendo implementadas, as considerações civis, da mesma
forma, já estão sendo tratadas nas escolas. Sendo assim, acredita-se ser
desnecessário inserir tal assunto nos PLADIS da AMAN e da EsAO.
Por outro lado, na ECEME, o fato de as considerações civis não estarem
inseridas no seu Plano de Disciplinas (PLADIS) deve ser retificado o quanto antes,
sob pena de não serem estabelecidos os objetivos específicos a serem atingidos
pelo concludente do curso, acarretando em formação deficiente do comandante
militar de nível mais elevado no EB e que, efetivamente, conduzirá análise
aprofundada do fator de decisão em questão.
48
Foram analisados os PLADIS do CCEM/1º e 2º ano, na atual Unidade
Didática IV (Assuntos Civis, Atividades de Cooperação Civil-Militar e atribuições
subsidiárias gerais e particulares) e verificou-se que os assuntos Nr 1 e 2 tratam do
mesmo tema, qual seja, Assuntos Civis. Além disso, os objetivos específicos dos
assuntos Nr 1 e 2 são os mesmos. Sendo assim, visualizou-se a possibilidade de
incluir no citado plano o estudo do fator de decisão Considerações Civis.
Como sugestão, as Considerações Civis poderiam ser inseridas no PLADIS
do CCEM/1º e 2º ano, como assunto Nr 1, na atual Unidade Didática IV, a qual
pasaria a ser identificada como Considerações Civis, Assuntos Civis, Atividades de
Cooperação Civil-Militar e atribuições subsidiárias gerais e particulares, sem que
houvesse necessidade de aumento da carga horária total em vigor que é de 34
(trinta e quatro) horas.
Para tanto, os objetivos específicos para o assunto sugerido seriam:
apresentar as considerações civis como fator de decisão; estudar as considerações
civis como fator de decisão e seus desdobramentos para as operações no amplo
espectro; verificar a inserção das considerações civis no Exame de Situação do
Comandante Tático; e realizar um Exame de Situação do Comandante Tático para
operações no amplo espectro, com ênfase nas considerações civis.
Com isso, as considerações civis passariam a constar do PLADIS do EE em
tela, garantindo a padronização da habilitação dos comandantes militares na
condução da análise necessária em operações no amplo espectro.
Após as observações referentes à capacitação propriamente dita do
comandante militar para condução da análise das considerações civis em operações
no amplo espectro, serão apresentadas algumas sugestões para o aperfeiçoamento
da Doutrina Militar Terrestre.
No que se refere às considerações civis, durante a pesquisa bibliográfica
sentiu-se falta de conceitos que definissem ou contextualizassem o pesquisador
sobre os aspectos componentes do método de estudo do citado fator de decisão.
Sendo assim, abaixo segue proposta de inclusão em nossos manuais, fruto da
presente pesquisa e tomando por base publicações do Exército dos Estados Unidos
da América como, por exemplo, o FM 3-24 “Counterinsurgency”.
Os aspectos área, estrutura, capacidades, organização, população e eventos
compõem o arcabouço das considerações civis. Entretanto, nos manuais brasileiros
ainda não há uma abordagem descritiva dos citados aspectos. Sendo assim, a fim
49
de complementar os exemplos já contidos no anexo A do Manual de Campanha EB
20-MC-10.211, Processo de Planejamento e Condução de Operações Terrestres,
segue proposta para elucidação dos aspectos constantes das considerações civis.
Área: Nesse aspecto, são consideradas como mais relevantes as localidades
ou características do terreno dentro da área de operações que tenham significado
para a população local. Este aspecto suscita análise do terreno a partir de uma
perspectiva civil. Para correta análise, os comandantes devem identificar como as
áreas civis afetam as operações militares, bem como a forma como as operações
militares afetam essas áreas.
Estrutura: Analisar a estrutura consiste em determinar como a sua
localização, função e capacidade pode suportar as operações militares. Os
comandantes devem considerar as conseqüências do uso de uma estrutura para fins
militares, pois na maioria das vezes traz prejuízo às necessidades da população
civil. Comandantes devem considerar cuidadosamente os benefícios militares
esperados, bem como os custos para a comunidade local, os quais trarão
consequências inevitáveis para o esforço de guerra no futuro.
Capacidades: Se referem à habilidade das autoridades locais de prover à
população os serviços essenciais. Os comandantes analisam as capacidades dando
prioridade ao entendimento de como o governo local poderá apoiar a missão. As
capacidades mais importantes são as requeridas para salvar, manter, ou melhorar a
vida da população, nessa ordem. Nesse contexto, algumas das capacidades mais
relevantes são a administração pública (funcionamento da burocracia, tribunais e
demais setores do governo), a segurança pública (forças militares e de segurança,
polícias e órgâos de inteligência), os serviços de emergência (bombeiros e serviços
de ambulância), saúde (hospitais e clínicas), alimentação, água e saneamento
básico.
Organizações: As organizações são grupos não-militares ou instituições,
atuantes no interior da área de operações. Eles influenciam e interagem com a
população, com o inimigo, e entre elas. Geralmente possuem estrutura hierárquica,
metas definidas, operações estabelecidas, instalações fixas ou locais de reunião e
um meio de apoio financeiro ou logístico. Dentre as organizações nativas, podem ser
citadas as religiosas, políticas, patrióticas, sindicatos trabalhistas, organizações
criminosas, centros comunitários e associações de moradores. Existem, ainda,
organizações vindas do exterior. Como exemplo, estão incluídas nessa categoria as
50
corporações multinacionais, os organismos internacionais (ONU), as agências nãogovernamentais e outras instituições, como a como a Cruz Vermelha Internacional.
As operações em amplo espectro exigem comandantes capazes de
coordenar as organizações. Para tanto, faz-se necessário possuir informações sobre
as atividades desses grupos, suas capacidades e suas limitações. A consciência
situacional exigida requer entender como as atividades de diferentes organizações
podem afetar as operações militares e como as operações militares podem afetar as
atividades dessas organizações. A partir dessa análise, os comandantes podem
determinar como as organizações e as forças militares podem trabalhar juntas na
busca de objetivos comuns.
Em quase todos os casos, as forças militares possuem mais recursos do que
as organizações civis. No entanto, algumas organizações civis detêm capacidades
especializadas que podem ser compartilhadas. Comandantes militares não possuem
ascendência funcional sobre as organizações civis existentes em sua área de
operações. No entanto, algumas operações demandam que seja atingida a unidade
de esforço com essas organizações. Essas situações exigem comandantes capazes
de influenciar os líderes dessas organizações por meio da persuasão, com base na
força de seus argumentos e no exemplo de suas ações.
População: Refere-se ao pessoal não-militar. O termo inclui todos os civis
dentro de uma área de operações (a população), bem como aqueles que estão fora
dela e cujas ações, opiniões, ou influência política possa afetar o cumprimento da
missão militar. Para analisar os diferentes aspectos da população, o comandante
pode se valer de tabelas, calcos e matrizes que retratem, de forma gráfica, o apoio
da população, aspectos sobre religião, raça e etnia. A percepção da população é
outro ponto a ser considerado em operações. Para tanto, devem ser utilizadas
ferramentas capazes de identificar como determinada operação militar está sendo
percebida pela população.
Eventos: Os eventos são as atividades de rotina, cíclicas, planejadas ou
espontâneas que afetam significativamente as organizações, as pessoas e as
operações militares. Na maioria das vezes, os eventos possuem forte significado e
simbolismo. Os exemplos incluem os feriados nacionais e religiosos, ciclos
agrícolas, pecuários e comerciais, eleições, distúrbios civis, celebrações, dentre
outros.
51
Também se configuram como eventos os desastres causados pela natureza,
pelo homem ou pela tecnologia. Esses criam dificuldades e exigem respostas
imediatas. Os exemplos de eventos precipitados pelas forças militares incluem as
operações de combate, as mobilizações de efetivos militares e os dias de
pagamento. Uma vez que os eventos significativos são identificados, é necessário
que seja mapeado e que sejam analisadas suas implicações políticas, econômicas,
psicológicas, ambientais e legais.
Além das contribuições apresentadas anteriormente, fruto deste trabalho e
alicerçado, principalmente, nas entrevistas conduzidas com oficiais de Estado-Maior
de outros países que frequentaram o CCEM para Oficiais de Nações Amigas (ONA)
neste ano de 2014, em especial os da Espanha, do Chile e dos Estados Unidos da
América, surgem novas idéias para aumentar a capacitação dos militares em geral,
particularmente os oficiais formados pela ECEME, no que tange as considerações
civis.
Nesse contexto, sugere-se que sejam ministradas instruções adicionais que
aumentem a experiência do militar, bem como sua capacidade para confrontar a
grande variedade de exigências que podem surgir numa operação no amplo
espectro. Como exemplos, citam-se a seguir:
A intensificação das instruções de língua inglesa, indispensável para qualquer
oficial ou sargento em operações fora do Brasil. Atualmente, o nível de
conhecimento dos militares em língua estrangeira está aquém do desejável,
particularmente entre os sargentos. Como o idioma inglês é considerado universal,
bem como é utilizado como língua oficial em missões sob a égide da ONU e da
OTAN, acredita-se que deva ser de domínio de todo profissional das armas, em
especial dos oficiais concludentes do CCEM.
O treino específico para trabalho com intérpretes. Por meio de experiências e
relatos, verifica-se que o emprego de intérpretes em operações carece de
preparação adequada, a qual engloba, entre outros aspectos, a questão da seleção
de pessoal e o devido repasse da consciência situacional e, principalmente, cultural
do ambiente em que se desenvolvem as atividades militares.
A capacitação para organização e condução de reuniões interagências pois,
atualmente, o ambiente em que ocorrem as operações é composto por diferentes
atores, dentre eles órgãos e entidades variadas. Nesse contexto, é mister que o
combatente da atualidade possua as habilidades necessárias para coordenar os
52
variados atores e, de forma integrada, obter o sucesso militar nas situações de
emprego.
O aprendizado das técnicas de negociação para que o militar, principalmente
o oficial egresso da ECEME, disponha de ferramentas que possibilitem agir em
proveito da missão a ser cumprida. Além disso, não raro surgem situações críticas
nas quais as habilidades de negociação permitem que se encontre uma solução
para o problema ou crise apresentadas.
A intensificação de instruções focando o relacionamento com a mídia justificase pois vive-se em uma sociedade cada vez mais dependente da informação, na
qual a perspectiva que a população tem da realidade é fundamental. Vencer a
“batalha de narrativas” é não apenas se comunicar bem, mas se comunicar primeiro.
Perder o controle da narrativa poderá restringir a liberdade de ação e até mesmo
impor a derrota no “Espaço de Batalha”.
A inserção de palestras de dirigentes ou altos executivos de Organizações
Não-Governamentais
(ONG),
abordando
as
suas
visões
das
atividades
desempenhadas por suas organizações nas zonas de conflito, bem como o seu
relacionamento com as forças militares. Por exemplo, a ONG “Médicos Sem
Fronteiras”, apresentando perspectiva pouco conhecida para os militares, o que
permitirá a reflexão e a adoção de táticas, técnicas e procedimentos ajustados para
atuar de forma coordenada e integrada na busca do atingimento de determinado
objetivo.
Por fim, cabe ressaltar que a hipótese levantada inicialmente neste trabalho
foi contrariada e que foram identificadas omissões doutrinárias e outras
oportunidades de melhoria da doutrina. Dessa forma, espera-se que os resultados
apresentados neste trabalho possam se tornar referências para outras pesquisas,
bem como contribuir para o aperfeiçoamento da Doutrina Militar Terrestre brasileira.
Nesse contexto, confirmou-se a importância do tema, em especial das
considerações
empreendimento
civis
no
do
contexto
trabalho
de
dos
conflitos
conclusão
de
atuais,
curso,
o
que
além
ratifica
de
o
permitir
aprimoramentos doutrinários para que o Exército Brasileiro possa enfrentar, com
eficiência e eficácia, os desafios do século XXI.
_______________________________________
LUIS ANTONIO DE ALMEIDA JUNIOR – Maj Inf
53
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A capacitação dos comandantes militares brasileiros