UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO CRÉDITO PARA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO NO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS MARTIN MUNDO NETO DISSERTAÇÃO DE MESTRADO 2 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ENGENHARIA DE PRODUÇÃO CRÉDITO PARA AGRICULTURA FAMILIAR: UM ESTUDO NO MUNICÍPIO DE SÃO CARLOS Martin Mundo Neto. Dissertação de mestrado apresentada ao programa de Pós-Graduação em Engenharia de Produção da Universidade Federal de São Carlos, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Mestre em Engenharia de Produção. Orientador: Prof. Dr º. Hildo Meirelles de Souza Filho. SÃO CARLOS 2004 SUMÁRIO Ficha catalográfica elaborada pelo DePT da Biblioteca Comunitária da UFSCar M965ca Mundo Neto, Martin. Crédito para agricultura familiar: um estudo no município de São Carlos / Martin Mundo Neto. -- São Carlos : UFSCar, 2004. 167 p. Dissertação (Mestrado) -- Universidade Federal de São Carlos, 2004. 1. Administração financeira. 2. Agricultura familiar. 3. Crédito agrícola. I. Título. CDD: 658.15 (20a) 3 Dedico este trabalho a toda à minha família e especialmente à minha mãe Eléia e a meu pai Martin, pelo amor e pelas inúmeras oportunidades concedidas. 4 AGRADECIMENTOS Agradeço inicialmente a meu orientador Prof. Dr. Hildo Meirelles de Souza Filho pela sua paciência, atenção e leitura atenta, crítica e construtiva. A todos os membros do Projeto GIAF pelas contribuições e pelo trabalho conjunto. Agradeço os reparos e sugestões da Banca Examinadora, composta pelos professores: Prof. Dr. José Flávio Diniz Nantes, Prof. Dr. Luiz Fernando de O. Paulillo, Prof. Dr. Antônio Márcio Buainain. A todos os agricultores e entrevistados que nos atenderam com atenção, dispondo de seu tempo para fornecer as informações que foram fundamentais para a concretização do trabalho. Um agradecimento especial ao amigo e professor Júlio que me incentivou a ingressar no programa de pós-graduação e aos amigos Ferenc, Sandra, Boy e Patrícia pelas contribuições e incentivos. Agradeço especialmente a minha esposa Juceli e a meu filho Tales pela compreensão durante os períodos de ausência e dedicação à pesquisa. Agradeço a nosso pai Oxalá e a todos os Orixás pela proteção e estímulo ao desenvolvimento humano e espiritual. 5 SUMÀRIO 1 INTRODUÇÃO ...........................................................................................15 1.1 Agricultura Familiar no Brasil .............................................................................15 1.2 O problema e a questão da pesquisa ....................................................................20 1.3 Objetivos. ................................................................................................................21 1.4 Justificativa.............................................................................................................21 1.5 Hipóteses .................................................................................................................22 1.6 Metodologia. ...........................................................................................................23 2 MARCO CONCEITUAL .............................................................................29 2.1 Desenvolvimento da agricultura...........................................................................29 2.1.1 Especificidades da Agricultura .............................................................................30 2.1.2 Desenvolvimento agrícola e sistemas de produção agropecuários .......................31 2.1.3 Agricultura, Agroindústria e o Estado. .................................................................33 2.2 Agricultura Familiar – aspectos comuns a diferentes definições ......................38 2.3 Nova Economia Institucional ................................................................................47 2.3.1 Ambiente Institucional..........................................................................................47 2.3.2 Economia dos Custos de Transação......................................................................51 2.4 Nova Economia Institucional aplicada ao Crédito Rural ..................................55 2.4.1 Garantias contra os riscos inerentes aos contratos................................................57 2.4.2 Medidas para obter informações sobre os tomadores de crédito ..........................60 2.4.3 Mecanismos de incentivos ao cumprimento dos contratos...................................60 2.4.4 Medidas para fazer-cumprir os contratos..............................................................61 2.5 Problemas do crédito rural sob a perspectiva dos agricultores.........................62 2.5.1 Problemas relacionados ao Crédito específico para Agricultura Familiar............63 2.6 Crédito Rural e os Filtros Institucionais.............................................................67 3 DISPONIBILIDADE DE CRÉDITO PARA A AGRICULTURA FAMILIAR.70 3.1 Recursos Próprios ..................................................................................................71 3.2 Mercado de Crédito Rural ....................................................................................72 3.2.1 Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar...........................73 3.2.2 Crédito Rural do Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca......................82 3.2.3 Linhas de crédito rural não exclusivas para agricultura familiar..........................83 6 3.3 Mercado Informal, crédito de fornecedores e compradores..............................90 3.4 Organizações correlatas ao crédito rural ............................................................91 3.4.1 Bancos oficiais e privados ....................................................................................91 3.4.2 Cooperativas de Crédito........................................................................................95 3.4.3 Fundos de Aval .....................................................................................................99 3.4.4 Empresas Oficiais de Extensão Rural. ................................................................102 3.4.5 Organizações de representação dos agricultores familiares................................104 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS EMPÍRICOS ............................107 4.1 Disponibilidade de Crédito para Agricultura Familiar em São Carlos-SP....107 4.1.1 Bancos oficiais e Bancos privados......................................................................107 4.1.2 Cooperativa de Crédito do Vale do Mogi-Guaçu - Crediguaçu .........................113 4.1.3 Papel das instituições correlatas ao crédito rural ................................................116 4.2 Demanda de Crédito na Agricultura Familiar em São Carlos ........................121 4.2.1 Análise da amostra do Projeto GIAF ..................................................................121 4.2.2 Amostra dos agricultores familiares do Município de São Carlos-SP................128 4.2.3 Amostra de agricultores familiares produtores de leite no Município de São Carlos – SP. .........................................................................................................................130 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .....................................................................135 6 BIBLIOGRAFIA........................................................................................141 7 APÊNDICES ............................................................................................146 7 LISTA DE FIGURAS FIGURA 1 - Esquema de Três Níveis de Williamson. .................................................50 FIGURA 2– Os três níveis de filtros institucionais na “cadeia política”. .....................69 8 LISTA DE QUADROS QUADRO 1 - Características organizacionais da agricultura patronal e familiar. ...40 QUADRO 2 - Metodologia de delimitação do universo familiar...................................42 QUADRO 3 – Valor do Custo de Oportunidade (VCO) ................................................43 QUADRO 4 - “Fricções” no Fluxo de Capitais. ..............................................................57 QUADRO 5 – Principais tipos de contratos de crédito rural e termos relacionados às garantias exigidas pelos agentes financeiros............................................................59 QUADRO 6 - Grupos para enquadramento de crédito no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF).............................................76 QUADRO 7 - PRONAF modalidade de crédito custeio: valores, taxa de juro e condições especiais de financiamento.......................................................................77 QUADRO 8 - PRONAF modalidade de crédito investimento: valores, taxa de juro e condições especiais de financiamento.......................................................................77 QUADRO 9 - Linhas de crédito especiais do PRONAF.................................................81 QUADRO 10 - FEAP: Informações sobre as linhas de crédito para investimento. ....83 QUADRO 11 – FINAME Agrícola...................................................................................85 QUADRO 12 – FINAME Especial ...................................................................................86 QUADRO 13– FINAME Agrícola Modernização da Frota...........................................87 QUADRO 14 - PROGER RURAL ...................................................................................88 QUADRO 15 - Crédito rural para custeio e investimento agropecuários....................89 QUADRO 16 - Informações referentes às operações disponíveis no Banco do Povo para os Municípios do Estado de São Paulo............................................................94 QUADRO 17 - Linhas de crédito e serviços oferecidos pela Cooperativa de Crédito do Vale do Mogi-Guaçu – Crediguaçu. Valores referentes ao mês de maio-2003. .115 9 LISTA DE TABELAS TABELA 1 - PRONAF crédito: Recursos disponibilizados e aplicados - 1999/2000 a 2003/2004. ...................................................................................................................19 TABELA 2 - Principais produtos da agricultura familiar no Município de São Carlos ..........................................................................................................................27 TABELA 3 - Distribuição do crédito rural por tamanho do produtor e modalidade de crédito, em porcentagem, para o ano de 1990 e 1994. ............................................37 TABELA 4 - Agricultura Familiar - Brasil – Tipo, Estabelecimentos, área, valor bruto da produção e financiamento total (FT) dos tipos de agricultores. ............44 TABELA 5 - Agricultura Familiar - Participação percentual dos estab. e área segundo os grupos de renda total (Em Reais) .........................................................46 TABELA 6 –Número de contratos e montante do crédito rural do PRONAF, referentes ao Município de São Carlos e Municípios vizinhos, para o período de 1998-2004. .................................................................................................................108 TABELA 7 - Produtores que atenderam as exigências dos programas de crédito destinado à agricultura familiar – PRONAF e FEAP. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. .......................................................122 TABELA 8 – Produtores que não tinham qualquer conhecimento sobre os programas de crédito destinado à agricultura familiar. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. ..........................................................................123 10 TABELA 9– Principais dificuldades para ter acesso ao crédito rural indicadas pelos agricultores. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002............................................................................................................................124 TABELA 10 – Indicadores de integração dos produtores familiares com instituições relacionadas às operações de crédito dos programas especiais (PRONAF e FEAP). Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. ....................................................................................................................................125 TABELA 11– Investimento considerados prioritários pelos produtores familiares. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002...............126 TABELA 12– Fontes alternativas de recursos financeiros dos agricultores. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. ....................127 TABELA 13 – Itens que complementam a renda agropecuária dos agricultores familiares. Amostra de 72 agricultores familiares do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de abril de 2001 e março de 2002. ...................129 TABELA 14 – Indicadores de integração dos produtores familiares com organizações relacionadas às operações de crédito rural. Amostra de 27 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003..................................................................131 11 TABELA 15 – Principal fonte de crédito. Amostra de 27 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003..................................................................131 TABELA 16 – Solicitou crédito nos anos de 2001, 2002 e 2003. Amostra de 27 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003.................132 TABELA 17 – Destino dos recursos tomados em empréstimo. Amostra de 07 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003.................133 TABELA 18 – Freqüência das razões que explicam a não solicitação do crédito rural. Cada agricultor indicou três razões. Amostra de 20 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003..................................................................134 12 LISTA DE SIGLAS, SÍMBOLOS E ABREVIATURAS. BACEN Banco Central do Brasil BNDES Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social CATI Coordenadoria de Assistência Técnica Integral CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico DEP Departamento de Engenharia de Produção DESER Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais EMBRAPA Empresa Brasileira e Pesquisa Agropecuária EMBRATER Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural FAO Food and Agriculture Organization FAI Fundação de Apoio Institucional ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico FEAP Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca GIAF Gestão Integrada para Agricultura Familiar IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística IMFR Instituição de Micro-Finanças Rural INCRA Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária MDA Ministério do Desenvolvimento Agrário NEI Nova Economia Institucional PROGER Programa de Geração de Emprego e Renda PRONAF Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar OSICP Organização da Sociedade Civil de Interesse Público SAF Secretaria da Agricultura Familiar UFSCar Universidade Federal de São Carlos 13 RESUMO O modelo de desenvolvimento agrícola adotado no Brasil a partir da década de 1960 favoreceu, especialmente, os grandes produtores e aqueles que gradativamente se integraram aos complexos agroindustriais em formação. Em meados da década de 90, a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar -PRONAF – teve o propósito de atender um grande número de agricultores que, quase sempre, foram excluídos das políticas agrícolas, principalmente o crédito subsidiado. Entretanto, mesmo com a criação do PRONAF, e de programas similares no âmbito dos estados, apenas uma pequena parcela dos agricultores familiares vem sendo beneficiada. Considerando o acesso ao crédito como fundamental para o sucesso e desenvolvimento dos agricultores familiares, o objetivo desse trabalho é procurar compreender as razões que levam os agricultores familiares a terem dificuldades para acessá-lo e as alternativas adotadas pelos agricultores para o financiamento das suas atividades produtivas. O aporte teórico para o trabalho foi fornecido pelos conceitos da Nova Economia Institucional e pelos estudos sobre a agricultura familiar e crédito rural. Os dados empíricos relacionados aos agricultores familiares do município de São Carlos-SP foram analisados a partir de três amostras distintas compreendendo informações sobre um total de 132 agricultores familiares. Além disso, foram entrevistados agentes correlatos ao crédito rural, tais como extensionistas, gerentes de banco, sindicalistas, representantes de cooperativas e empresas privadas. As hipóteses testadas foram divididas em dois grupos. O primeiro está relacionado às dificuldades para acessar o crédito: exigências bancárias difíceis de serem atendidas pelos agricultores, condições de pagamento inadequadas, aversão ao risco por parte dos agricultores, assimetria de informação (agricultores desconhecem opções de crédito e agentes financeiros desconhecem o público alvo), atitude passiva dos agentes financeiros e ausência de assistência técnica. O segundo grupo de hipóteses está relacionado às alternativas adotadas pelos agricultores: utilização de fontes de rendas complementares, oriundas de atividades produtivas desenvolvidas fora da unidade de produção, e acesso ao mercado de crédito informal. Apenas a hipótese relacionada às condições de pagamento inadequadas não foi comprovada. Além de comprovar as demais hipóteses, os dados empíricos possibilitaram a identificação de novos problemas, destacando-se a visão equivocada sobre o perfil da agricultura familiar do município, que prevalece entre os representantes dos principais operadores locais das linhas de crédito subsidiado. A falta de informação sobre os programas de crédito rural tanto entre os agricultores como entre as organizações de representação e de extensão rural é um dos principais fatores responsáveis pelo baixo número de contratos de crédito rural realizados no município. A pesquisa também constatou que os fornecedores de insumos são uma importante fonte de crédito para os agricultores familiares. Palavras chaves: Crédito Rural, Agricultura Familiar, Desenvolvimento Local. 14 ABSTRACT The Brazilian green revolution, started in the 60’s, was based on a pattern that favored large producers and those who could get integrated to rising agri-industrial complexes. In the middle of the 90’s, the creation of PRONAF (National Program for the Strengthening of Family Agriculture) aimed at supporting farmers who had frequently been excluded from agricultural policies, mainly subsidized credit. In spite of the creation of PRONAF and other similar programs, only a small part of family farmers have obtained benefits. Credit access is regarded as essential to family farmers’ success. Thus, the present work intends to comprehend the obstacles for family farmers to access credit, as well as the alternatives adopted by producers to finance their activities. Theoretical foundation was provided by New Institutional Economics and by studies on family agriculture and rural credit. Empirical data on family farmers in the municipality of Sao Carlos-SP were analyzed from three samples, comprising a total of 132 farmers. Moreover, agents related to rural credit (such as extension service personnel, bank managers, rural union representatives, cooperative members and private companies) were interviewed. Tested hypothesis were separated into two groups. The first is related to obstacles in accessing credit: bank requirements which are not easy to be accomplished by farmers; inappropriate payment conditions; farmers’ aversion to risks; asymmetry of information (farmers does not know credit options and credit agents does not know the target public); passive attitude by credit agents; and lack of technical assistance. The second group of hypothesis refers to alternatives adopted by farmers: use of complementary income sources, deriving from off-farm activities; and access to informal credit market. Only the hypothesis referring to inappropriate payment conditions was not confirmed. Besides confirming the other hypothesis, empirical data allowed for new findings, such as the incorrect view of family farmers which prevails among local operators of subsidized credit lines. Lack of information is one of the main constraints to credit access. Both farmers and farmers organizations do not know several operational aspects of special credits programs. Also, it was found that farmers’ suppliers were an important source of credit to family smallholders. Key words: Rural Credit, Family Agriculture, Rural Development. 15 1 INTRODUÇÃO Estudos sobre o desenvolvimento da agricultura nos países desenvolvidos revelaram um fato que, de certa forma, contrariou as expectativas sobre as tendências da agricultura no sistema capitalista: a organização da produção na agricultura dos países centrais foi, e continua sendo, predominantemente caracterizada por unidades de produção familiares. (VEIGA, 1991; ABRAMOVAY, 1992; GUANZIROLI et al, 2001). Estudos de natureza similares vêm revelando o papel e a importância da agricultura familiar brasileira, colaborando para que ocorram mudanças no ambiente institucional nacional no sentido de favorecer esse segmento da agricultura. (ABRAMOVAY, 1997; GUANZIROLI & CARDIM, 2000; BUAINAIN & ROMEIRO, 2000). Esse capítulo inicia com a apresentação de importantes aspectos da agricultura familiar brasileira identificados nos trabalhos desenvolvidos pelo convênio FAO/Incra (GUANZIROLI et al., 2001), tanto do ponto de vista das suas potencialidades como de suas deficiências. Em seguida, é apresentado o problema central dessa pesquisa, os seus objetivos e as suas justificativas, bem como as hipóteses iniciais que orientaram esse trabalho. O capítulo termina com a apresentação da metodologia adotada. 1.1 Agricultura Familiar no Brasil Os estudos elaborados pelo Convênio FAO/Incra sobre a agricultura brasileira, a partir dos dados do Censo Agropecuário de 1995/1996, apontaram que, dentre os 4,86 milhões de estabelecimentos rurais existentes no país, 85,2 % são familiares. Esses estabelecimentos familiares ocupam apenas 30,5 % da área total dos estabelecimentos rurais do país e são responsáveis por 37,9% do valor bruto da produção agropecuária total (GUANZIROLI et al., 2001). A produção agropecuária familiar tem desempenhado um importante papel na agricultura do país, utilizando intensivamente a mão-de-obra familiar e os demais recursos disponíveis, empregando e mantendo a maioria da população do campo. Ela também é fundamental para a segurança alimentar do país, uma vez que a sua produção é, majoritariamente, destinada ao mercado interno. 16 O aumento crescente das pressões sociais por condições mínimas de vida, a escassez de recursos para a intervenção governamental, a estagnação econômica, devido à decrescente capacidade de consumir da maioria da população e à crescente dependência em relação ao consumo das elites e das exportações, induziram uma mudança na estratégia de políticas públicas visando o desenvolvimento do país. Os exemplos fornecidos pelo papel da agricultura nas economias dos países centrais e as análises dos dados fornecidos pelos Censos Agropecuários, de 1985 e 1995/1996, elaborados pelo Convênio FAO/Incra, foram fatores que influenciaram as políticas agrícolas direcionadas especificamente para a agricultura familiar. A partir de meados da década de 1980, passou a prevalecer uma tendência liberal de menor interferência governamental nos mercados agropecuários. Os recursos, cada vez mais escassos, passaram a ser alocados nos setores considerados estratégicos e prioritários. A classificação de agricultores familiares, inexpressiva até meados da década de 1990, exemplifica o processo de identificação de prioridades influenciada pela experiência dos países centrais, indício de um processo isomórfico cuja finalidade é reproduzir uma das principais estratégias de desenvolvimento desses países, sustentada no fortalecimento e desenvolvimento da agricultura familiar. O universo familiar, apesar de desempenhar papel importante na agricultura nacional, conta com a participação de apenas uma pequena parcela de agricultores que estão integrados aos mercados e apresentam desempenho econômico satisfatório, com condições de se manter em um processo contínuo de desenvolvimento. A maioria dos agricultores familiares encontra-se descapitalizada, sustentando-se precariamente nas atividades, sujeitando-se a condições de vida bastante modestas e sem condições de iniciar as melhorias necessárias nas suas unidades produtivas. Grande parte dos agricultores familiares depende de outras fontes de recursos para permanecer nas atividades agropecuárias, como por exemplo, trabalhos assalariados desempenhados fora de suas unidades produtivas, pensões e aposentadorias recebidas por algum membro da família. Porém, essas alternativas raramente permitem melhorias significativas na unidade de produção. As dificuldades e adversidades, típicas das atividades agropecuárias, somadas às mudanças nos mercados agropecuários, tanto no ambiente nacional como internacional, vêm exigindo maior competitividade e profissionalismo desses agricultores, principalmente em relação à gestão da produção. 17 A diversidade encontrada no universo de agricultores familiares, devido às diferenças econômicas, sociais, culturais ou ambientais não permite uma generalização sobre os agricultores familiares. Mas, segundo GUANZIROLI et al.(2001), foi possível identificar algumas características que contribuem para permanência desses agricultores nas atividades e, também, as suas principais dificuldades. Os autores destacam como uma potencialidade da agricultura familiar a sua capacidade de adaptação diante das mudanças no ambiente, devido à: a) agilidade para tomada de decisões entre os familiares responsáveis pela gestão das atividades; b) as suas estratégias de diversificação para diminuir os riscos, adotando combinações coerentes de atividades produtivas, integrando em seus sistemas de produção atividades intensivas e extensivas em relação aos fatores de produção disponíveis e c) a tendência de investir de maneira gradativa. Entre as principais carências dos agricultores familiares destacaram-se: a) o acesso a linhas de financiamento adequadas; b) a insuficiência de assistência técnica atenta as suas especificidades, principalmente, em relação à gestão das unidades produtivas; c) a necessidade de melhorar o nível de desenvolvimento do capital humano e d) a ausência de práticas associativas. As potencialidades da agricultura familiar merecem ser contextualizadas às particularidades desse segmento produtivo. Em primeiro lugar, a facilidade de tomar decisão esta vinculada ao número reduzido de membros das famílias que participam desse processo. Em segundo, o conceito de estratégia de diversificação aplicado à agricultura familiar tem uma abrangência distinta daquela comumente encontrada na literatura de economia industrial. A diversificação na agricultura está relacionada à economia de escopo. O agricultor adota a estratégia de produzir diversos produtos para explorar a complementaridade entre eles sob diversos aspectos: estabilizar a receita média conciliando a produção de produtos que possuem ciclo de produção de curto, médio e longo prazo; produzir subprodutos e insumos para diminuir a dependência dos fornecedores externos; implementar práticas de preservação dos recursos naturais como a rotação de culturas e o consórcio entre culturas; diminuir os riscos uma vez que a receita não estará vinculada apenas a um produto. Cabe ressaltar que mesmo a diversificação na 18 agricultura sendo diferente daquela encontrada no setor industrial, a sua adoção implicará também em um aumento da complexidade das atividades administrativas. Por último, a característica de investir de forma gradativa é fruto da própria condição de escassez de recursos em que se encontra a maioria dos agricultores familiares e dos riscos inerentes às atividades agropecuárias. Mas em relação à estratégia de diversificação entre os agricultores familiares é preciso uma analise mais detalhada. Ela está mais vinculada a uma estratégia de ampliar a produção de produtos para o auto-consumo do que para gerar um incremento na renda monetária. As tradições relacionadas a caça e a coleta silvestre estimulam entre os agricultores a criação de pequenos animais e a manutenção de quintais que fornecem alimentos e medicamentos naturais. Mesmo entre os agricultores familiares existe uma tendência a especializar-se em relação às principais atividades produtivas. Essa especialização é motivada principalmente pela inovação tecnológica. Nas amostras analisadas nesse estudo observou-se essa tendência vinculada principalmente aos investimentos em irrigação e cultivo protegido, entre os olericultores e em ordenha mecânica e tanque de expansão, entre os produtores de leite. Com o processo de desenvolvimento da agricultura, tanto nos países centrais como nos países em desenvolvimento, ocorreu uma crescente concentração de capitais tanto a montante como a jusante da produção rural, caracterizando a formação e ampliação do sistema agroindustrial. As atividades agropecuárias, posicionadas entre os fornecedores de insumos agroindustriais e a agroindústria, têm ficado com uma parcela relativa cada vez menor da renda gerada no sistema agroindustrial. Nesse contexto, a utilização das tecnologias industriais e a adequação às exigências da agroindústria tornaram-se parte de um padrão de competitividade a ser seguido pelos agricultores, dificultando a inserção das pequenas unidades produtivas no mercado do agronegócio. A agricultura familiar tem como possibilidades de inserção nos mercados, explorar os mercados tradicionais diretamente integrados ao sistema agroindustrial, explorar nichos de mercados, como a produção de produtos orgânicos, ecológicos, artesanais e também explorar um conjunto crescente de atividades não-agrícolas relacionadas a lazer, comércio e prestação de serviços próximos a sua região. Para qualquer uma dessas possibilidades é pertinente a concepção de um projeto e a avaliação de seus riscos, bem como a estratégia de operacionalização a ser adotada. Para tanto, é necessário 19 que os agricultores familiares desenvolvam uma maior capacidade de analisar e compreender o ambiente institucional no qual estão inseridos e ampliar o repertório de técnicas de gestão da produção adequado às novas exigências desse ambiente, com destaque para o desenvolvimento de novas habilidades tecnológicas, organizacionais e de marketing. A partir de meados da década de 1990, com a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF, os agricultores familiares passaram a ter um tratamento inédito, principalmente com relação à oferta de crédito rural. Se por um lado, nos últimos anos, a política agrícola vem reduzindo o volume total de recursos destinado ao crédito rural, por outro, os recursos disponibilizados estão sendo direcionados de forma a atender prioritariamente os agricultores familiares. Mas, apesar do aumento da oferta de crédito rural para os agricultores familiares, apenas parte dos recursos disponibilizados está sendo utilizada, como pode ser observado pelos dados da Tabela 1. TABELA 1 - PRONAF crédito: Recursos disponibilizados e aplicados - 1999/2000 a 2003/2004. Safra 1999/2000 2000/2001 2001/2002 2002/2003 recursos disponibilizados (em R$ mil) 3.280.000 3.976.000 4.196.000 4.200.000 2003/2004 5.400.000 recursos aplicados (em R$ mil) 2.149.479 2.168.461 2.189.275 2.376.471 3.021.991 % 65,5 54,5 52,2 56,6 56,0 FONTE: SAF/MDA e BACEN (Somente Exigibilidade Bancária), BANCOOB, BANSICREDI, BASA, BB, BN E BNDES. Dados atualizados até BACEN: Até 10/2003; BANCOOB Até 01/2004; BANSICREDI: Até 01/2004; BASA: Até 01/2004; BB: Até 12/2003; BN: Até 01/2004 e BNDES: Até 02/2004 - Últimos 03 meses sujeitos á alterações. Consulta realizada no endereço eletrônico www.pronaf.gov.br em 11/03/2004. Elaboração: SAF/MDA. Adaptado pelo autor. Este trabalho trata de aspectos relacionados à gestão dos recursos de crédito para agricultura familiar e integra o projeto Modelo de Gestão Integrada da Agricultura Familiar (GIAF)1, financiado pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), entidade governamental brasileira promotora do desenvolvimento científico e tecnológico. O projeto conta também com a colaboração da Secretaria de Agricultura do Município de São Carlos. O principal objetivo do projeto GIAF é colaborar 1 O projeto GIAF esta sendo desenvolvido no Departamento de Engenharia de Produção (DEP) da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar). 20 com o desenvolvimento da agricultura familiar apresentando instrumentos de gestão da produção que possam auxiliar os agricultores a administrar as suas unidades produtivas. A partir de um diagnóstico dos principais mecanismos de gestão utilizados pelos agricultores familiares está sendo proposto um modelo de gestão integrada para as suas unidades de produção agropecuária, considerando os seguintes temas da gestão da produção: planejamento, custos, qualidade, marketing, comercialização e recursos financeiros. 1.2 O problema e a questão da pesquisa A maioria das atividades de produção agropecuária demanda um volume relativamente grande de recursos financeiros devido a um conjunto de fatores que caracterizam essas atividades. O longo ciclo de produção, para grande parte das culturas e criações, exige o equacionamento entre os gastos incorridos no processo de produção com a obtenção de receita, proveniente da venda dos produtos obtidos. Os riscos associados aos fatores climáticos e biológicos podem levar a perda total ou parcial da produção, exigindo uma poupança ou acesso a alguma fonte de financiamento para que o agricultor permaneça na atividade. Para as unidades de produção familiares, além da demanda por recursos associada ao custeio da produção e ao investimento, existem as despesas para a manutenção da família. Para atender essa demanda o nível de capitalização dos agricultores deve ser relativamente alto. Porém, a realidade da maioria dos agricultores é bem diferente, pois, como demonstram os dados apresentados por GUANZIROLI et al (2001), são poucos os agricultores que têm a capacidade de optarem pelo auto-financiamento. A importância da agricultura e suas especificidades tornaram a formulação de políticas agrícolas uma prática comum entre os Estados preocupados com a manutenção e desenvolvimento do setor agropecuário. Entre as principais políticas, destacam-se os programas especiais de crédito rural, a assistência técnica e os investimentos em pesquisas agropecuárias. No Brasil, essas principais vertentes políticas passam por uma redefinição no sentido de atender, principalmente, à demanda dos agricultores familiares. O problema tratado nessa dissertação pode ser sintetizado da seguinte maneira: apesar de, por um lado, existir uma oferta de crédito rural subsidiado, por parte das instituições financeiras que operacionalizam os programas de incentivo à agricultura familiar e, por outro lado, haverem necessidades concretas de crédito, como por exemplo, para potenciais projetos de investimento dos agricultores familiares, por que recursos em 21 condições especiais de financiamento são pouco utilizados pelos agricultores familiares? E, se esses agricultores continuam nas atividades, quais as alternativas por eles adotadas para financiar as suas unidades de produção? 1.3 Objetivos. Considerando que a disponibilidade de recursos financeiros é um fator fundamental para o desenvolvimento da agricultura familiar, apesar de não ser suficiente, e prevalecendo o crédito rural subsidiado como um dos principais instrumentos da política agrícola, esse trabalho tem como objetivo geral identificar as razões que explicam o baixo acesso dos agricultores familiares aos recursos da política de crédito rural governamental. Como objetivos específicos pretende-se identificar as principais fontes de recursos disponíveis para os agricultores familiares, analisando os problemas e os limitantes da política de crédito no processo de desenvolvimento, bem como as alternativas de financiamento adotadas pelos agricultores familiares que não acessam as fontes de recursos financeiros relacionadas aos programas de crédito rural subsidiado. É importante frisar que a gestão dos recursos financeiros é um dos aspectos que integram a gestão da produção familiar e deve estar contextualizada ao projeto da unidade de produção agropecuária, que envolve outros aspectos da gestão como o planejamento e controle da produção, o marketing e a comercialização. 1.4 Justificativa. O papel da agricultura familiar no desenvolvimento dos países desenvolvidos tornou-se uma referência fundamental para os países em desenvolvimento. Para que os inúmeros exemplos fornecidos pelos países centrais pudessem servir de referência para o desenvolvimento da agricultura familiar no Brasil, vários setores da sociedade (agricultores, sindicatos rurais, governo, organizações não-governamentais, ambientalistas, etc) passaram a discutir e construir uma nova concepção de agricultura familiar. No lugar da agricultura familiar associada à pequena produção ou ao valor da produção, que historicamente prevaleceu, principalmente entre as elites agrárias, passa a prevalecer uma agricultura familiar definida com base nas relações sociais de produção. 22 A importância da Agricultura Familiar esta relacionada às potenciais vertentes de desenvolvimento desse setor sócio-econômico. A agricultura familiar é responsável pelo fornecimento de grande parte dos produtos destinado ao mercado interno, portanto ela cumpre um papel fundamental para a segurança alimentar do país. Ela também é responsável pela maioria dos empregos gerados no meio rural e, apesar de não ocupar a maior área destinada à produção agropecuária, ela apresenta alternativas sustentáveis de exploração e preservação dos recursos naturais, uma vez que em suas unidades produtivas o recurso mais abundante geralmente é o trabalho, enquanto que a terra e o capital são relativamente escassos. A geração de empregos no campo colabora para minimizar os problemas dos grandes centros urbanos, uma vez que, ao invés dessa população migrar para as grandes cidades, ela passa a residir na área rural ou nas localidades vizinhas. Este trabalho justifica-se pela necessidade de uma melhor compreensão do funcionamento das políticas de crédito e de seus problemas, tanto sob a perspectiva dos agentes governamentais (instituições financeiras, instituições de pesquisa e extensão agropecuária) como dos agricultores. Justifica-se também pela possibilidade de identificar quais as alternativas adotadas pelos agricultores para financiar suas atividades, já que muitos deles não acessam os programas governamentais, mas continuam desenvolvendo suas atividades produtivas. Uma maior compreensão das razões que impedem um melhor desempenho das políticas destinadas a agricultura familiar permitirá propor mudanças e ajustes às estratégias em andamento. 1.5 Hipóteses As principais hipóteses que orientaram este estudo podem ser divididas em dois grupos: 1- As razões que levam os agricultores familiares não terem acesso às linhas de crédito dos programas especiais destinados à agricultura são: a) não atendimento às exigências bancárias (garantias reais, como título da terra e/ou avalistas); b) condições de pagamento inadequadas às suas atividades (taxas de juros, prazos, carências, etc); 23 c) aversão ao risco (receio de recorrer a instituições financeiras e perder o patrimônio constituído); d) falta de informações sobre as possibilidades de financiamento existentes (assimetria de informação); e) dificuldades encontradas pelos agentes financeiros para obter informações sobre o agricultor, para avaliar a viabilidade dos seus projetos e a sua capacidade de pagamento (assimetria de informação); f) atitude passiva e despreparo dos agentes financeiros para lidar com micro-crédito rural; g) assistência técnica ausente, insuficiente ou incapaz de propor projetos viáveis. 2- As formas de financiamento alternativas adotadas pelos agricultores familiares: a) autofinanciamento por meio de rendas obtidas dentro ou fora da propriedade, em atividades agrícolas ou não-agrícolas (trabalho assalariado em tempo parcial, aposentadoria, pensão, poupança, etc); b) utilização do mercado informal (recursos tomados com parentes, vizinhos, agiotas, mecanismos de comercialização de insumos e produtos, incluindo aquisição de insumos a prazo e/ou adiantamento de recursos por compradores dos produtos); 1.6 Metodologia. Com objetivo de extrair um conjunto significativo de informações sobre o tema estudado e ao mesmo tempo preservar uma relativa flexibilidade em relação à parte empírica do trabalho optou-se por uma pesquisa do tipo qualitativa. BRYMAN (1989) indica que uma pesquisa qualitativa tem como características: ser descritiva e ter a participação ativa do pesquisador ; acesso a fontes diretas dos dados e na análise dos dados predomina o pensamento indutivo. Segundo BRYMAN (1989) um estudo de caso que aborda um conjunto significativo de questões qualitativas pode também ser considerado uma pesquisa qualitativa. Para YIN (1997), conciliar estudo de caso com estudo qualitativo possibilita enriquecer um trabalho, na medida em que as possibilidades para generalizações dos resultados alcançados aumentam. O presente trabalho pode ser classificado como uma 24 pesquisa qualitativa aplicada a um estudo de caso: estudo do crédito para agricultura familiar no município de São Carlos. A metodologia do trabalho contou com uma revisão bibliográfica sobre os seguintes temas: definição de agricultura familiar e caracterização de seus sistemas de produção; desenvolvimento agrícola e as políticas agrícolas, com ênfase para o crédito rural; conceitos da Nova Economia Institucional – NEI; questões relacionando o crédito rural e os conceitos fornecidos pela NEI. A revisão bibliográfica forneceu tanto o suporte conceitual para a pesquisa como também grande parte dos dados secundários. Seguindo a classificação de BRYMAN (1989), os dados secundários são aqueles obtidos por meio de estudos que foram previamente desenvolvidos e estão de acordo com os parâmetros conceituais considerados no trabalho em questão. As principais fontes de dados secundários utilizados foram: o conjunto de trabalhos sobre a agricultura familiar, realizado pelo Convênio FAO/Incra, que tiveram como base de dados os registros dos Censos Agropecuários coletados pelo IBGE; as informações sobre crédito rural obtidas junto ao Banco Central do Brasil (BACEN); as publicações sobre a agricultura familiar realizadas pelo Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA) e pela Secretaria da Agricultura Familiar (SAF). Complementaram as fontes de dados secundários, os dados publicados nos trabalhos acadêmicos, livros, dissertações e teses, correlatos ao tema desenvolvido, bem como as publicações institucionais dos programas de crédito rural, destinadas à divulgação das linhas de crédito rural disponíveis. Foram analisadas as principais linhas de crédito destinadas especificamente à agricultura familiar e algumas, que apesar de não serem exclusivas para a agricultura familiar, são alternativas potenciais para os agricultores familiares. Apesar das particularidades de cada região do país, a agricultura familiar está presente em todos os municípios e envolvida, principalmente, com as atividades voltadas para atender os mercados locais. As limitações desse trabalho no que se refere a abordar o universo dos agricultores familiares e seus inúmeros sistemas de produção nortearam a escolha do grupo de agricultores que fizeram parte das amostras pesquisadas2. Os critérios que orientaram a escolha das amostras estudadas seguiram a definição de 2 Para minimizar essa limitação procurou-se trabalhar com mais de uma amostra de agricultores, selecionando aqueles que tinham em seus sistemas de produção atividades produtivas que são praticadas por um grande número de agricultores familiares de todas as regiões do país. 25 agricultura familiar adotada por GUANZIROLI et al. (2001): a) a relação social de produção e b) o tamanho da área identificada em cada unidade de produção agropecuária. Foram consideradas familiares as unidades produtivas que atendiam, simultaneamente, os seguintes aspectos: o número de trabalhadores membros da família era superior ou igual ao número de trabalhadores com contrato permanente e a área máxima não excedia o limite de 15 módulos rurais3. Os dados primários foram obtidos por meio de uma pesquisa de campo e acesso direto a base de dados. Com base no referencial teórico, os dados empíricos relacionados aos agricultores familiares do Município de São Carlos foram analisados a partir de três amostras distintas. A primeira amostra, pertencente ao projeto GIAF, conteve 33 agricultores familiares olericultores. Os dados dessa amostra foram coletados entre outubro de 2002 e janeiro de 2003 por meio da aplicação de questionários4. As respostas fornecidas pelos agricultores referiram-se ao período compreendido entre outubro de 2001 e setembro de 2002. As informações sobre as unidades de produção familiares foram obtidas com os agricultores responsáveis pelas unidades produtivas e com outros membros da família, por meio de entrevistas orientadas por um questionário semi-estruturado. Os principais temas abordados no questionário foram: o perfil dos agricultores (idade; formação escolar, experiência agropecuária, etc); os recursos disponíveis na unidade de produção (mão-de-obra, recursos naturais, tecnologia), a renda proveniente das atividades agropecuárias e as outras fontes de rendas; os sistemas de produção e o destino da produção; o nível de informação sobre os programas de crédito para agricultura; as formas de financiamento utilizadas e os fatores que dificultam o acesso ao crédito; as principais práticas de planejamento e controle, com ênfase para gestão de recursos financeiros (custos de produção, capital de giro e investimentos); as fontes de informação e principais referências para as suas tomadas de decisão; a relação com a extensão rural - pública e privada - no município; a relação com as instituições de crédito, com destaque para as agências bancárias que operam linhas de crédito voltadas para agricultura familiar; as 3 Os detalhes da definição adotada por GUANZIROLI et al. (2001) estão apresentados na seção 2.2 desse trabalho. 4 O questionário utilizado na pesquisa de campo realizada com os agricultores olericultores foi elaborado para o projeto GIAF e as questões pertinentes à dissertação encontram-se disponível no Apêndice-1. Os roteiros das entrevistas realizadas com os demais agentes, que integraram à pesquisa empírica, estão disponibilizados no Apêndice-2. 26 experiências coletivas e a participação dos agricultores junto aos órgãos de representação de classe presentes no município. A segunda amostra analisada é uma sub-amostra da amostra pertencente ao Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia de políticas’” contratado pela FAO (Food and Agriculture Organization) ao Departamento de Engenharia de Produção (DEP) da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar. Ela é constituída de 27 agricultores familiares produtores de leite e os dados referem-se ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003. A terceira, e última amostra, é constituída de 72 agricultores familiares. Ela foi retirada da amostra de agricultores do Projeto: “Desenvolvimento Local e Políticas Públicas: Análise e Proposta para o Novo Rural de São Carlos - SP”, também desenvolvido por pesquisadores do DEP e financiado pela FAPESP. A amostra original, composta de 172 agricultores, foi elaborada a partir do universo de agricultores do município e estratificada em função do tamanho da área explorada. Os dados referem-se ao período de abril de 2001 a março de 2002. As três amostras analisadas, apesar de terem sido geradas em períodos distintos e estarem relacionadas a projetos diferentes, trazem informações similares sobre as formas de financiamento dos agricultores e o acesso ao crédito rural.5 Além de serem informações de uma amostra de agricultores familiares do município, os dados referem-se a agricultores que possuem em seus sistemas de produção atividades típicas da agricultura familiar e que são encontradas em praticamente todas as regiões do país: a olericultura e a pecuária de leite. A terceira amostra pode conter agricultores que também estejam em uma das outras duas amostras, pois ela engloba o universo dos agricultores do Município. Como a análise dos dados foi feita para cada amostra separadamente, a repetição da análise de um mesmo agricultor não compromete a consistência dos dados, pois ora ele foi analisado como um agricultor pertencente a um grupo de agricultores com sistemas de produção similares, ora ele foi considerado como pertencente ao universo dos agricultores familiares do Município. A análise dos dados das três amostras teve como objetivo testar as hipóteses iniciais do trabalho e procuraram dar explicações tanto para o baixo número de contratos de crédito rural entre os agricultores familiares do município como revelar quais as principais formas de financiamento adotadas por esses agricultores. 5 Com exceção da amostra dos olericultores, os questionários das outras duas amostras não foram desenhados com o objetivo de abarcar o conjunto amplo de questões relacionadas ao crédito rural. 27 Os dados obtidos junto aos agricultores foram complementados por entrevistas realizadas junto a representantes das principais instituições de fomento à agricultura familiar, tanto no âmbito estadual como nacional6. Outros agentes do ambiente institucional, relacionados ao desenvolvimento da agricultura familiar, também foram entrevistados no município: representantes da extensão rural, dos sindicatos rurais, dos bancos públicos e privados que operam crédito oficial, da cooperativa de crédito, da associação dos agricultores familiares do município (recém formada) e das principais empresas privadas, fornecedoras de insumos ou compradores da produção agropecuária familiar, compreendendo um total de 12 entrevistas. De acordo com os dados coletados pelo Censo Agropecuário 1995/1996, o número de estabelecimentos agropecuários no Município de São Carlos-SP era 580. Do total de estabelecimentos rurais no município, 200 foram considerados familiares7. Entre os agricultores familiares, 48 deles tinham como atividade comercial o cultivo de hortaliças e 109 tinham a pecuária de leite como uma das atividades que integravam seus sistemas de produção, demonstrando que essas atividades estão entre as que mais aparecem nos sistemas de produção da agricultura familiar do município. A Tabela - 2 indica os principais produtos da agricultura familiar no Município de São Carlos-SP. TABELA 2 - Principais produtos da agricultura familiar no Município de São Carlos Produto Galinhas Cana Pecuária de leite Milho Hortaliças Pecuária de corte Café Laranja Tomate Cana forrageira N° de Estabelecimentos 85 55 109 62 48 63 56 31 05 24 Valor Bruto Produção (R$) 3.987.675,00 757.712,25 665.111,00 427.037,50 383.024,00 261.884,00 221.451,25 99.076,40 85.912,40 72.349,40 Fonte: IBGE – Censo Agropecuário 1995/1996. Elaborado e adaptado pelo autor. Para obter informações sobre as linhas de crédito disponíveis para a agricultura familiar e as suas condições de operacionalização, foram realizadas entrevistas 6 Os roteiros das entrevistas realizadas com os demais agentes, que integraram à pesquisa empírica, estão disponibilizados nos Anexos. 7 Os dados sobre a agricultura familiar, com opção de consulta aos municípios, estão disponíveis no endereço www.pronaf.br. 28 com representantes das instituições relacionadas ao desenvolvimento da agricultura familiar no município: Banco do Brasil, Banco Nossa Caixa Nosso Banco, Cooperativa de Crédito Rural do Vale do Mogi-Guaçu, Casa da Agricultura e sindicatos rurais. Os dados obtidos por meio da aplicação dos questionários e das entrevistas foram analisados com o objetivo de testar as hipóteses iniciais e também apontar outras evidências relacionadas aos problemas de acesso ao crédito e alternativas de financiamento dos agricultores familiares no município de São Carlos. O trabalho está subdividido em 5 capítulos, incluindo este capítulo introdutório. O Capítulo-2 trata do marco conceitual da pesquisa e os seguintes temas: definições de agricultura familiar, características do desenvolvimento agrícola, tanto nos país desenvolvidos como no Brasil, conceitos da Nova Economia Institucional e a sua aplicação no estudo do crédito rural. O Terceiro capítulo trata da oferta de crédito rural, com destaque para os programas especiais direcionados à agricultura familiar. Também são indicadas algumas das principais linhas de crédito rural subsidiadas pelo governo, mas que apesar de serem destinadas à agricultura como um todo, constituem-se em possibilidades potenciais para a agricultura familiar. Além das linhas de crédito esse capítulo trata do mercado de crédito informal, com destaque para os fornecedores de insumos e compradores da produção familiar. Também são apresentadas algumas das principais instituições correlatas ao crédito rural e o papel de cada uma delas. As instituições analisadas foram: os órgãos de extensão rural governamental, os sindicatos rurais, os bancos públicos e privados e as cooperativas de crédito. No capítulo-4 são apresentados e discutidos os dados empíricos, procurando identificar os aspectos relacionados à falta de sintonia entre a oferta e a demanda de crédito rural no município de São Carlos, com o objetivo de testar as hipóteses iniciais do trabalho e identificar outros fatores explicativos. No capitulo-5 são feitas algumas considerações a respeito das hipóteses iniciais e de novas hipóteses que surgiram no decorrer do trabalho. O capítulo termina com algumas sugestões de políticas para que a agricultura familiar processo de desenvolvimento. possa engendrar num 29 2 MARCO CONCEITUAL O referencial teórico utilizado nesse trabalho está dividido em cinco tópicos. O primeiro trata do desenvolvimento agrícola a partir do século XVIII, destacando dois momentos distintos: a primeira e a segunda revolução agrícola. Algumas características dos sistemas de produção agropecuários predominantes em cada um desses períodos são destacadas, além do papel das políticas governamentais no desenvolvimento da agricultura e do relacionamento do setor agropecuário com a indústria produtora de insumos e de processamento da produção. O segundo tópico refere-se à classificação tradicional que predominou no país até meados da década de 1990 e os aspectos comuns entre diferentes definições para a agricultura familiar. Os estudos desenvolvidos pelo convênio FAO/INCRA, sobre a agricultura familiar brasileira, recebem atenção especial, uma vez que eles tiveram grande influência nas políticas agrícolas atuais voltadas para os agricultores familiares, inclusive o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). O terceiro tópico desse capítulo apresenta os principais conceitos da Nova Economia Institucional (NEI). São analisadas as duas principais correntes teóricas que integram a NEI: Ambiente Institucional e Economia dos Custos de Transação. A seguir, no quarto tópico, são discutidos os principais problemas relacionados ao crédito rural sob a ótica da NEI. O capítulo termina com a discussão de problemas do crédito rural sob a perspectiva dos produtores rurais. 2.1 Desenvolvimento da agricultura O desenvolvimento da agricultura nos países centrais teve como base social unidades familiares de produção agropecuária que contaram, permanentemente, com um conjunto de políticas governamentais cuja finalidade foi estimular e regular o processo de desenvolvimento (VEIGA, 1991; ABRAMOVAY, 1992; GUANZIROLI et al., 2001). O objetivo dessas políticas era promover um contínuo processo de desenvolvimento da produção agropecuária, crucial para o sistema capitalista. Abramovay destaca a importância das políticas agrícolas no desenvolvimento dos países centrais: “Na verdade, elas foram a condição para que a agricultura desempenhasse um papel fundamental no próprio desenvolvimento do mundo capitalista: o de permitir que o 30 peso da alimentação na estrutura de consumo dos assalariados fosse cada vez menor e portanto que os orçamentos domésticos pudessem consagrar-se crescentemente à aquisição de bens duráveis, uma das bases da própria expansão que conheceu o capitalismo entre o final da Segunda Guerra Mundial e o início dos anos 1970.” (ABRAMOVAY, 1992:22). Diferentemente do que se imaginava no final do século XIX, inclusive entre os críticos do capitalismo, a agricultura não sofreu um processo de desenvolvimento como aquele observado nas indústrias devido a características específicas da produção agropecuária8. 2.1.1 Especificidades da Agricultura A produção agropecuária está condicionada por forças naturais e pelo desenvolvimento de seres vivos (vegetais e animais). A dependência em relação a fatores biológicos, produção de biomassa pelo crescimento vegetal e crescimento animal, fazem com que as atividades agropecuárias sejam ditadas pelo ritmo da natureza. Essa peculiaridade da agricultura além de aumentar os riscos e às incertezas relacionadas às atividades agropecuárias, impossibilitava que a maior parte do trabalho agrícola fosse organizada como nas industriais. Considerando uma determinada área, um mesmo trabalhador daria conta de preparar o solo, semear, fornecer os tratos culturais e colher, ou seja, a divisão do trabalho poderia ocorrer para as atividades específicas, mas estas, necessariamente, estariam separadas no tempo em função do ritmo ditado pela natureza. O tamanho da área das unidades agropecuárias também se apresentava como um obstáculo à organização do trabalho aos moldes industriais. O desenvolvimento da agricultura concentrou-se principalmente na adoção de novos instrumentos de trabalho, pois a divisão do trabalho, nos moldes industriais, não podia ser implementada de forma similar à agricultura. Como observa Claude Servolin: “(...) o trabalho agrícola não produz, se falarmos com rigor, as matérias vegetais e animais, sejam elas destinadas a consumos intermediários (material forrageiro, por exemplo) ou diretamente ao consumo humano. No sentido estrito do termo, a 8 Para uma apreciação detalhada das principais interpretações sobre a trajetória de desenvolvimento da agricultura brasileira, ver PAULILLO (2001). 31 agricultura é apenas a exploração pelo homem de certos processos biológicos: a reprodução e o crescimento de vegetais e de animais domesticados. O essencial da operação, isto é, a produção da matéria nutritiva, é realizado pelos próprios organismos vivos. O papel do homem limita-se, em resumo, a fornecer a estes organismos o conjunto das condições necessárias a seu desenvolvimento e a recolher a matéria nutritiva produzida” (SERVOLIN apud ABRAMOVAY, 1992: 236). A natureza biológica da produção agropecuária adiciona riscos às atividades agropecuárias, pois na maioria das vezes, ela está condicionada por variáveis aleatórias que estão fora do controle dos agricultores, principalmente os fatores climáticos. Apesar do desenvolvimento de técnicas que procuram anular os efeitos de alguns desses fatores, como o cultivo protegido e a irrigação, na maioria das vezes, elas são soluções parciais e nem sempre, a adoção dessas técnicas de produção, são viáveis economicamente. Uma outra característica da produção agropecuária, e também relacionada à natureza, é a sazonalidade. Para maioria das atividades agrícolas a produção concentra-se em determinadas épocas do ano, gerando períodos de safra e entressafras. As decisões de investimento não podem ser tomadas em qualquer momento, mas deve-se respeitar o ciclo de produção específico de cada cultura. Os agricultores precisam arcar com os custos incorridos na produção até o momento da colheita e comercialização. No momento da venda da produção pode ocorrer excesso de oferta de um determinado produto, ocasionando uma queda significativa dos preços, comprometendo o sucesso das atividades produtivas. Esse fenômeno pode ocorrer devido à falta de coordenação e orientação dos agricultores que, muitas vezes, buscando minimizar os riscos dedicam-se a atividades de sucesso da safra anterior, gerando um movimento que pode se tornar o responsável pelo excesso de oferta futura e a queda dos preços. 2.1.2 Desenvolvimento agrícola e sistemas de produção agropecuários Segundo EHLERS (1999), a agricultura moderna teve inicio no século XVIII e foi responsável pelo aumento significativo da oferta mundial de alimentos. Esse período, além de ficar conhecido como a primeira revolução agrícola, caracterizou-se pelo aumento gradativo da prática conjunta de atividades de produção vegetal e criação animal. 32 Com a integração dessas atividades, o aumento da produção animal, além de fornecer um volume maior de produtos diretos (carnes, leite, ovos) possibilitava a produção de produtos derivados (queijos, manteiga, embutidos). Nesse período, a utilização da tração animal e de esterco, juntamente com o sistema de rotação de culturas foram fundamentais para o aumento da produção agrícola. Os sistemas de produção da primeira revolução agrícola passaram a ser denominados como tradicionais e caracterizados pela diversificação e complementaridade das atividades produtivas. Com a demanda crescente de alimentos, fruto do desenvolvimento industrial, aumento populacional e do crescimento dos centros urbanos, esses sistemas de produção agropecuários começaram a apresentar limitações: insuficiência na produção de adubos orgânicos; demanda relativamente alta de mão-de-obra para atender as necessidades da criação animal e da adubação e a concorrência por áreas destinadas à criação animal e produção vegetal. As descobertas científicas relacionadas aos fatores de nutrição vegetal possibilitaram novas formas de adubação, independente dos adubos de origem animal. O desenvolvimento da indústria química e mecânica teve entre as suas principais vertentes a sua aplicação à agricultura. A oferta de insumos químicos, primeiro os fertilizantes e posteriormente os defensivos, e as máquinas e equipamentos agrícolas industrializados cresceram rapidamente, substituindo a adubação orgânica, a tração animal e os artefatos produzidos de forma artesanal. As transformações na agricultura foram enormes e a introdução de insumos industriais nas atividades agropecuárias marcou o inicio da segunda revolução agrícola. Os sistemas de produção não necessitavam mais da integração entre as atividades de produção animal e vegetal. Passaram a prevalecer os sistemas de monoculturas especializados, supridos também com sementes selecionadas, variedades melhoradas e rações industrializadas. Esse processo se intensifica após a segunda guerra mundial e o aumento da produção e da produtividade agropecuária são crescentes. Mas as conseqüências sociais e ambientais, principalmente nos países em desenvolvimento, não tardaram a surgir. A sustentabilidade do desenvolvimento agrícola passou a ser parte da agenda de debates e pesquisas em todo o mundo. Para Ehlers, a sustentabilidade da produção agropecuária esta diretamente relacionada à integração entre as características do ambiente e da sociedade que o habita. 33 As soluções não são genéricas e devem levar em conta as especificidades de cada lugar. Ehlers aponta algumas diretrizes fundamentais para uma agricultura sustentável: “o incentivo à substituição dos sistemas produtivos simplificados ou monoculturais, por sistemas rotacionais diversificados; a reorientação da pesquisa agropecuária para um enfoque sistêmico; e o fortalecimento da agricultura familiar.” (EHLERS, 1999,p.125). Segundo CARMO (1998), nos países em desenvolvimento, como o Brasil, onde prevaleceu uma estratégia de modernização da agricultura que privilegiou as unidades patronais, a transição para formas de produção agropecuária sustentáveis terá a agricultura familiar como um agente fundamental. Para que a agricultura familiar possa utilizar as informações e inovações das pesquisas agropecuárias e aplica-las em unidades produtivas com sistemas de produção diversificados, é necessário, também, um processo permanente de capacitação tanto das gerações atuais como das futuras. 2.1.3 Agricultura, Agroindústria e o Estado. Na produção agropecuária o capital industrial ocupou-se diretamente de apenas algumas atividades produtivas, principalmente nos sistemas de produções monocultoras. O desenvolvimento industrial relacionado à agricultura posicionou-se a montante e a jusante do processo de produção rural, através dos processos descritos por GOODMAN et al. (1987) como apropriacionismo e substitucionismo9. O apropriacionismo constitui-se na substituição de elementos naturais que participavam da produção agropecuária por elementos industrializados, como por exemplo, o adubo orgânico pelo adubo químico, o trabalho humano ou animal pela mecanização. O susbstitucionismo constitui-se na substituição dos produtos agropecuários por produtos industrializados, a exemplo do leite fresco pelo leite em pó, os sucos naturais pelos 9 “Este processo descontínuo porém persistente de eliminação de elementos discretos da produção agrícola, sua transformação em atividades agrícolas e sua reincorporação na agricultura sob a forma de insumos designamos apropriacionismo. Os produtos da agricultura igualmente apresentam problemas singulares para a produção industrial. O destino deles como alimento impedia sua simples substituição por produtos industriais. Entretanto, o surgimento da indústria alimentícia, argumentamos, representa um processo igualmente descontínuo, mas permanente, de alcançar a produção industrial de alimentos, que denominamos substitucionismo.” Goodman, et al. (1990:1-2). 34 refrigerantes e sucos industrializados. Esses dois processos, iniciados de forma desintegrada, convergiram para o padrão tecnológico que se tornou amplamente difundido como a Revolução Verde na agricultura. Também para GOODMAN et al.(1990), o Estado teve um papel determinante nesse processo de desenvolvimento: “O Estado, em suma, está a cargo da tarefa de conciliar os efeitos conflitantes do crescimento continuado da produtividade, associado à apropriação industrial, sobre a produção e capacidade produtiva, as rendas rurais e as estruturas sociais rurais.” (GOODMAN et al.,1990:144-145). No Brasil, apesar da difusão generalizada do padrão tecnológico relacionado à revolução verde, ele foi adotado, em sua plenitude, apenas por uma parcela reduzida das unidades de produção agropecuárias. As políticas agrícolas, até meados da década de 1980, priorizaram o desenvolvimento da agricultura patronal como a forma de organização agropecuária tipicamente moderna e que cumpriria o papel de desenvolver o setor. Prevaleceram os sistemas de produção caracterizados por atividades monocultoras, voltadas para o mercado exportador. Essa opção de desenvolvimento colocou o país entre os maiores exportadores de gêneros agropecuários, mas não deu conta de cumprir o papel de abastecimento do mercado interno. A adoção desse modelo de desenvolvimento agrícola incentivou o aumento de alguns produtos agrícolas, principalmente as commodities agropecuárias destinadas a exportação, e proporcionou uma produtividade crescente, mas com custos ambientais elevados devido à degradação e esgotamento dos recursos naturais. Além de gerar sérios problemas ambientais, os problemas sócio-econômicos acentuaram-se devido à crescente concentração de renda no meio rural e a concentração de terras entre os agricultores patronais. Nos centros urbanos, observa-se o excesso populacional provocado, principalmente, pelo êxodo rural descontrolado e os efeitos desse processo, como o aumento tanto do desemprego como da parcela da população vivendo em condições precárias, o aumento da violência e marginalidade. Nos países centrais, as políticas para o desenvolvimento da agricultura foram permanentes e procuravam atender de forma integrada, principalmente as carências das unidades de produção familiares. Para estimular a ampliação da oferta de produtos agropecuários, a preços cada vez menores, as políticas agrícolas tinham como meta oferecer as condições necessárias para que os agricultores iniciassem um processo contínuo 35 de desenvolvimento tecnológico. De acordo com VEIGA (1991), as políticas agrícolas nos países centrais tiveram como características duas vertentes gerais e em comum: “a) investimentos públicos em pesquisa, extensão, infraestrutura e crédito estimulam um crescimento da oferta em ritmo superior ao crescimento da demanda; b) a política comercial administra uma estável queda dos preços alimentares, compatível com a manutenção de uma aceitável remuneração corrente do trabalho do agricultor e compatível, também, com a regulação do ritmo do êxodo rural exigido, tanto pelo mercado de trabalho urbano, quanto pela necessidade de aumentar paulatinamente o tamanho das unidades produtivas.” (VEIGA, 1991:196). A atomização dos agricultores familiares permitiu que a estratégia de incentivos à modernização agrícola, subsidiado pelas políticas governamentais, provocasse um aumento crescente da produtividade e da oferta de gêneros agropecuários, acarretando em estabilização ou queda dos preços médios. O aumento da produtividade, fruto da adoção de novas tecnologias, não se transformava em um constante aumento da renda agrícola. Apenas os primeiros a adotarem novas tecnologias tinham a possibilidade de ampliar suas margens de lucros, pelo menos, até o momento em que a inovação se difundisse. Os retardatários em relação à inovação, geralmente, deixavam as atividades e suas propriedades eram passadas aos inovadores. Durante o período de desenvolvimento, esse fenômeno foi um dos principais fatores que acarretaram no aumento do tamanho médio das unidades produtivas. O aumento das propriedades suscitava um novo ciclo de inovações para que novos aspectos, principalmente relacionados à escala de produção, fossem explorados. Para permanecer nas atividades agropecuárias o agricultor era praticamente obrigado a participar desse processo de desenvolvimento, adotando o padrão tecnológico predominante. Aqueles que não acompanhavam as inovações abandonavam as atividades, vendendo suas terras provocando um aumento no tamanho médio das unidades produtivas. Para aqueles que permaneciam nas atividades rurais, a perda em relação aos investimentos em inovações tecnológicas, fruto da queda dos preços dos produtos agropecuários, era compensada pela valorização da terra. (ABRAMOVAY, 1992:216-218). Segundo BUAINAIN (1999), no Brasil, durante o período de intensa intervenção estatal, compreendido entre meados da década de 1960, até meados da década 36 de 1980, a política agrícola teve sua eficácia comprometida, principalmente, pela sua subordinação em relação à política macroeconômica e aos interesses específicos, ligados às oligarquias rurais e industriais. Além de promover o desenvolvimento agropecuário, as políticas agrícolas deviam minimizar os efeitos das políticas econômicas, evitando comprometer o desempenho da produção agropecuária. Os instrumentos de incentivo ao desenvolvimento da agricultura no Brasil, apesar de diversificados (política de crédito rural, política de garantia dos preços mínimos, política de comercialização, políticas de fomento a pesquisa e extensão rural), não tiveram a continuidade que caracterizaram as políticas agrícolas nos países centrais. Diferentemente do papel desempenhado pela agricultura nos países centrais – fornecer alimentos cada vez mais baratos para o mercado interno – prevaleceu o modelo de produção agro-exportador. Historicamente o crédito rural foi o principal instrumento da política agrícola. De acordo com Buainain, “O crédito foi utilizado como instrumento de “modernização compulsória” da base técnica da agricultura, de diversificação da produção e das exportações e de estreitamento das relações intersetoriais. Foi ainda um instrumento central para a consolidação da indústria nacional produtora de máquinas, equipamentos e insumos agropecuários, assegurando mercado cativo para sua produção, independente dos preços internacionais.” (BUAINAIN, 1999:135) As políticas de crédito rural anteriores ao PRONAF não utilizava a categoria de agricultor familiar. Os agricultores eram classificados por tamanho (pequeno, médio e grande) e os critérios que determinavam essa classificação eram o nível de renda bruta anual e o tamanho da unidade produtiva, medida pela área total ou em função da extensão da lavoura especifica. Os dados da Tabela-3 ilustram a distribuição do crédito rural, referente a um período que antecedeu a criação do PRONAF. Nessa tabela, além da classificação dos produtores são apresentadas as modalidades de crédito mais utilizadas por cada categoria. 37 TABELA 3 - Distribuição do crédito rural por tamanho do produtor e modalidade de crédito, em porcentagem, para o ano de 1990 e 1994. Tamanho Pequeno Médio Grande Cooperativa Total Total 1990 1994 27,9 18,1 19,8 21,3 34,7 41,2 17,6 19,4 100,0 100,0 Custeio 1990 1994 84,2 82,4 84,6 79,7 79,8 77,1 56,8 54,2 74,9 71,0 Investimentos 1990 1994 13,3 15,8 12,5 16,8 13,9 17,0 1,2 2,0 11,0 13,5 Comercialização 1990 1994 2,5 1,8 2,9 3,5 6,3 5,9 42,0 43,8 14,1 15,5 Fonte: Anuário Estatístico do Brasil, Bacen. Apud: BUAINAIN (1999) Adaptado pelo autor. Nos países centrais a prioridade das políticas agrícolas era promover desenvolvimento tecnológico incentivando a pesquisa agropecuária e fornecendo condições para que os agricultores, continuamente, pudessem adota-las. Assim, viabilizava-se o aumento da oferta de alimentos e a queda dos preços pelo aumento da produtividade. Os empresários investiram nas indústrias, a montante e a jusante da produção rural, para poderem tirar proveito do incentivo governamental à adoção de novas tecnologias. No Brasil, o principal instrumento da política agrícola, cumpriu o papel de subsidiar a instalação da agroindústria, pois os recursos do crédito rural oficial, altamente subsidiado, eram apropriados pela indústria na medida em que ela praticava preços acima do mercado internacional: “No caso específico da agricultura, a política adotada teve como objetivos a modernização da base técnica, a diversificação das exportações e a expansão/consolidação da agroindústria processadora.” (BUAINAIN, 1999:150) A estratégia de desenvolvimento para a agricultura adotada no Brasil teve um enfoque diferente daquele dos países desenvolvidos, uma vez que a ênfase ficou concentrada nas grandes unidades de produção rural, nas empresas fornecedoras de insumos agropecuários industrializados, nas agroindústrias e na infra-estrutura que auxiliasse a consolidação do sistema agroindustrial. Segundo KAGEYAMA et al. (1990), a política agrícola foi determinante na consolidação de um perfil empresarial de cooperativas rurais, por meio de uma legislação e política de crédito específica, reforçando o viés urbano-industrial da estratégia de desenvolvimento. 38 Atualmente, os países que adotaram uma estratégia de desenvolvimento similar à brasileira vêm sofrendo críticas dos organismos internacionais que auxiliam os países em desenvolvimento. As críticas estão relacionadas principalmente ao fato da agricultura familiar nestes países não terem recebido a atenção necessária para que ela pudesse desempenhar um papel análogo ao desempenhado nos países desenvolvidos. Porém o contexto atual exige dos agricultores familiares uma maior capacidade de adaptação nesse ambiente altamente competitivo e com um padrão tecnológico ditado pelo sistema agroindustrial. Para os agricultores familiares tanto a opção de ingressar em uma das grandes cadeias de produção agroindustrial como buscar mercados alternativos, como o orgânico e de serviços não-agrícolas, é necessário atender as exigências em termos de tecnologia, padronização, qualidade, etc, além de estarem munidos de informação e suficientemente capacitados para explorar estas oportunidades, pois inevitavelmente sofrerão as influências do ambiente em que estão inseridos. 2.2 Agricultura Familiar – aspectos comuns a diferentes definições No Brasil, a partir de meados da década de 1960, e durante um período de 30 anos aproximadamente, as unidades de produção agropecuárias eram classificadas segundo os seguintes critérios: o tamanho da propriedade e o valor bruto da produção obtida na unidade produtiva. Essa classificação levou a uma histórica associação da agricultura familiar à pequena produção. Como o modelo de desenvolvimento adotado nesse período privilegiou as grandes propriedades, a maior parte das unidades de produção agropecuária do país esteve à margem das principais políticas agrícolas governamentais. Para as unidades produtivas com sistemas de produção baseados em monoculturas, a área disponível para exploração é um fator de produção fundamental na analise de viabilidade econômica, principalmente para avaliação da escala de produção potencial para uma determinada atividade produtiva. Mas, para sistemas de produção de policulturas, onde a diversificação das atividades é a estratégia adotada, outros fatores de produção passam a ser tão importantes quanto à área disponível. Fatores de produção como a quantidade e qualidade do trabalho administrativo e operacional e a tecnologia utilizada, passam a ser determinantes para o sucesso do negócio e para a garantir a permanecia dos agricultores nas atividades. 39 Com a modernização da agricultura focada na produção de gêneros para exportação as atenções estiveram direcionadas para as grandes propriedades onde predominava a monocultura. A chamada “pequena produção” era identificada como símbolo de atraso, cuja tendência era o desaparecimento. Mas o sucesso parcial dessa estratégia de desenvolvimento, principalmente por não dar conta de abastecer o mercado interno e provocar problemas relacionados à concentração fundiária, ao êxodo rural e a questões ambientais, fez com que ela passasse a ser alvo de críticas de diversos setores da sociedade, direta e indiretamente, relacionados à agricultura. O esgotamento desse modelo de desenvolvimento para a agricultura e as experiências de desenvolvimento agrícola dos países centrais redirecionaram as estratégias para o desenvolvimento da agricultura brasileira. No final da década de 1980, a sociedade brasileira passa por um intenso processo de democratização, com destaque para a discussão e elaboração da nova Constituição que contou com a participação de diversos segmentos da sociedade. Com o aumento das pressões sociais no campo, os trabalhadores rurais através de seus órgãos de representação fizeram-se ouvir. As suas reivindicações em relação aos direitos dos trabalhadores rurais, ao apoio aos agricultores menos capitalizados e à democratização do acesso a terra por meio da reforma agrária, passaram a fazer parte da pauta de discussão das políticas de desenvolvimento para a agricultura. Os estudos sobre o desenvolvimento da agricultura nos países centrais revelaram uma característica comum a esses países. Apesar das particularidades do processo de desenvolvimento de cada país, a agricultura se desenvolveu sob uma base social familiar, ou seja, as relações sociais de produção na agricultura nos países centrais foram e, continuam sendo, familiares (VEIGA, 1990 e 1998; ABRAMOVAY, 1991; GUANZIROLI et. al., 2001). No inicio da década de 1990, as reformas institucionais somadas aos estudos sobre desenvolvimento das economias dos países centrais foram fundamentais para a redefinição da estratégia para o desenvolvimento da agricultura brasileira. A natureza do trabalho (familiar ou contratado) desenvolvido nas unidades de produção agropecuárias passa a ser a principal variável de caracterização dos estabelecimentos rurais. Apesar de não existir consenso entre as definições de agricultura familiar todas convergem em relação a esse ponto. Para Lamarche, a “exploração familiar, 40 tal como a concebemos, corresponde a uma unidade de produção agrícola onde propriedade e trabalho estão intimamente ligados à família” (LAMARCHE, 1993:15). Nessa definição, apesar do tamanho da área explorada não ser considerada, a propriedade da terra é considerado um requisito necessário. Analisando as características das unidades familiares de produção agropecuárias nos países desenvolvidos, ABRAMOVAY (1992:19) chama atenção para o “caráter familiar não só da propriedade, mas da direção, da organização e da execução do trabalho nestas empresas”. Em um estudo mais recente, ABRAMOVAY (1997), define a agricultura familiar como “aquela em que a gestão, a propriedade e a maior parte do trabalho vêm de indivíduos que mantêm entre si laços de sangue ou de casamento”. Segundo VEIGA et al. (2001), a agricultura familiar “não se define em função da área disponível, mas sim pelas características organizacionais do empreendimento”. Os autores apresentam as principais características organizacionais da agricultura familiar, comparando-as com a da agricultura patronal, conforme indicado no Quadro-1. A utilização do termo agricultura familiar intensifica-se justamente nesse contexto de mudança de perspectiva sobre as estratégias de desenvolvimento para a agricultura brasileira. Estudos elaborados pelo Convênio FAO/INCRA, a partir da utilização dos micro-dados do Censo Agropecuário (1985 e 1995/1996), sobre a agricultura brasileira classificaram as unidades de produção em função da relação social de produção. Nessa nova classificação, a área deixa de ser a variável mais importante e passa a indicar, principalmente, a concentração fundiária no país. QUADRO 1 - Características organizacionais da agricultura patronal e familiar. Patronal Completa separação entre gestão e trabalho Organização centralizada. Ênfase na especialização. Ênfase nas práticas padronizáveis Predomínio do trabalho assalariado Familiar Trabalho e gestão intimamente relacionados. Direção do processo produtivo diretamente assegurada pelos proprietários ou arrendatários Ênfase na diversificação. Ênfase na durabilidade dos recursos e na qualidade de vida Trabalho assalariado complementar. Tecnologias dirigidas a eliminação de Decisões imediatas, adequadas ao decisões “de terreno” e “de momento” alto grau de imprevisibilidade do processo produtivo. Apud Veiga et al. (2001) 41 O trabalho apresentado por GUANZIROLI et al (2001) sintetiza os trabalhos do convenio FAO/INCRA fornecendo uma definição para agricultura familiar e uma segmentação do universo familiar em função do grau de capitalização dos agricultores. Esses trabalhos tornaram-se referencia para vários estudos sobre a agricultura familiar e também para a elaboração e reformulação de políticas publicas destinadas a esse segmento. Para GUANZIROLI et. al. (2001:50): “ O universo familiar foi caracterizado pelos estabelecimentos que atendiam, simultaneamente, às seguintes condições: a) a direção dos trabalhos do estabelecimento era exercida pelo produtor, b) o trabalho familiar era superior ao trabalho contratado”. Para evitar que grandes latifúndios improdutivos fossem contabilizados como estabelecimentos familiares, “considerou-se pertinente estabelecer uma área máxima regional como limite superior para a área total dos estabelecimentos familiares”. A área máxima regional foi calculada a partir da tabela do INCRA que define as áreas dos módulos fiscais municipais10. Para cada região do país foram calculadas as áreas médias regionais. Como a legislação define a média propriedade como aquela com tamanho máximo equivalente a 15 módulos fiscais, as áreas máximas regionais foram obtidas pela multiplicação das medias regionais por 15. A caracterização da agricultura familiar e sua delimitação foram feitas em função da quantidade de trabalho (familiar e contratado) utilizada na unidade de produção. Para quantificar o trabalho familiar empregado em uma unidade de produção agropecuária, os autores calcularam o número de Unidades de Trabalho Familiar (UTF), por estabelecimento/ano como “ a soma do número de pessoas ocupadas da família com 14 anos e mais e da metade do número de pessoas ocupadas da família com menos de 14 anos.” Para medir a quantidade de trabalho contratado foi definida a Unidade de Trabalho Contratado (UTC). Para calcular o numero de UTCs, primeiro foram calculadas as despesas com mão-de-obra contratada em função da soma dos seguintes itens: a) das despesas com mão-de-obra contratada (mão-de-obra permanente ou temporária); b) das 10 Para o município de São Carlos um módulo fiscal é equivalente a uma área de 12 hectares. 42 despesas com pagamentos a parceiros; c) das despesas com serviços de empreitada de mãode-obra. O número de UTCs foi obtido pela divisão da somatória de despesas pelo custo médio anual de um empregado no meio rural, calculado pela multiplicação do valor da diária media estadual (fornecido pela Fundação Getulio Vargas) pelo número de dias úteis trabalhados no ano (fixado em 260) . O Quadro-2 apresenta, sinteticamente, essa metodologia de delimitação do universo familiar. Uma outra importante contribuição do trabalho de GUANZIROLI et.al.(2001) foi a segmentação do universo familiar em função do grau de capitalização dos agricultores. Como critério de classificação dos agricultores foi utilizada uma variável: Valor do Custo de Oportunidade (VCO) definida “como o valor da diária média estadual, acrescido de 20% e multiplicado pelo numero de dias úteis do ano (calculado em 260)”. Utilizando o Valor do Custo de Oportunidade (VCO) foram definidos quatro tipos de agricultores familiares: “1) Tipo A, com renda total (RT) superior a três vezes o valor do VCO; 2) Tipo B, com renda total superior a uma vez até três vezes o VCO; 3) Tipo C, com renda total superior à metade até uma vez o VCO; 4) Tipo D, com renda total igual ou inferior a metade do VCO ” (Guanziroli et al., 2001) . QUADRO 2 - Metodologia de delimitação do universo familiar Caracterização dos agricultores familiares Direção dos trabalhos do estabelecimento é do produtor UTF > UTC Área total do estabelecimento – área máxima regional Unidade de trabalho familiar (UTF) Pessoal ocupado da família de 14 anos e mais + (Pessoal ocupado da família de menos de 14 anos)/2 Unidade de trabalho contratado (UTC) (Salários + Valor de quota-parte entregue a parceiros empregados + Serviços de empreitada de mão-de-obra) ÷ (Diária estadual x 260) Fonte: GUANZIROLI et al. (2001) Adaptado pelo autor. 43 O Quadro-3 apresenta a tipologia proposta por GUANZIROLI et.al (2001) e a forma como é calculado o Valor do Custo de Oportunidade (VCO). A partir dessa tipologia os agricultores foram classificados em relação ao grau de capitalização. Os agricultores do tipo A foram classificados como capitalizados, os do tipo B como em processo de capitalização, os do tipo C como em processo de descapitalização e os do tipo D como descapitalizados. QUADRO 3 – Valor do Custo de Oportunidade (VCO) Valor do Custo de Oportunidade (VCO) 1,2 x Diária Média Estadual x 260 Tipos de agricultores familiares Tipo A Î RT > 3 VCO Tipo B Î VCO < RT ≤ 3 VCO Tipo C Î VCO/2 < RT ≤ VCO Tipo D Î RT ≤ VCO/2 Fonte: GUANZIROLI et. al. (2001:79) Elaboração: Convênio FAO/Incra. A Tabela-4 apresenta os números da agricultura familiar no Brasil, classificada segundo a tipologia apresentada acima, considerando as seguintes variáveis: o número de estabelecimentos, a área ocupada, valor bruto da produção e financiamento total (FT). Esses dados demonstram o grau de fragilidade econômica em que se encontra a maioria dos agricultores familiares, pois do total de agricultores familiares (85,1% dos estabelecimentos do país) apenas 9,87 % dos agricultores familiares (8,4% do total de estabelecimentos do país) são classificados como do tipo A e absorvem 46,25% do total de financiamento utilizado pela agricultura familiar. 44 TABELA 4 - Agricultura Familiar - Brasil – Tipo, Estabelecimentos, área, valor bruto da produção e financiamento total (FT) dos tipos de agricultores. FAMILIAR TIPOS % % Área Área Estab. Total (ha) s/ s/ total total Estab. Total VBP (mil R$) % FT % FT VBP (mil R$) s/ total s/ total A 406.291 8,4 24.141.455 6,8 9.156.373 19,2 433.295 11,7 B 993.751 20,4 33.809.622 9,6 5.311.377 11,1 228.965 6,2 C 823.547 16,9 18.218.318 5,2 1.707.136 3,6 68.911 1,9 D 1.915.780 39,4 31.599.055 8,9 1.942.838 4,1 206.656 5,6 TOTAL 4.139.369 85,1 107.768.450 30,5 18.117.725 37,9 937.828 25,3 Fonte: Censo Agropecuário 1995/96 – IBGE Elaboração: Convênio FAO/Incra. Foi com a criação do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF que a agricultura familiar tornou-se uma instituição oficialmente reconhecida. De acordo com a apresentação do PRONAF: “A Linha de Ação Pronaf Crédito Rural foi instituída em 1995, pela Resolução CMN/BACEN n.° 2.191, de 24/08/1995, que estabeleceu as condições para a contratação do crédito destinado ao apoio financeiro das atividades agropecuárias exploradas mediante o emprego direto da força de trabalho do agricultor e de sua família. Os agricultores, para acessar os créditos disponíveis, deveriam cumprir os seguintes requisitos: a) explorar parcela de terra na condição de proprietário, posseiro, arrendatário ou parceiro; b) não manter empregado permanente, sendo admitido recorrer eventualmente à ajuda de terceiros, quando a natureza sazonal da atividade agrícola o exigir; c) não deter, a qualquer título, área superior a quatro módulos fiscais, quantificados na legislação em vigor; d) no mínimo 80% (oitenta por cento) de sua renda bruta anual deve ser proveniente da exploração agropecuária ou extrativa; 45 e) residir na propriedade ou em aglomerado urbano ou rural próximos.” 11 A definição do PRONAF, apesar de ampliar o universo familiar por não exigir a posse da terra como um requisito, têm nos demais critérios restrições que procuram delimitar o público alvo do programa. Após essa primeira definição o programa vem sofrendo alterações no sentido de adequar as suas regras à diversidade que caracteriza o universo da agricultura familiar. Entre as mudanças mais importantes, incluída no Decreto n° 1 946, de junho de 1996, está a inclusão das unidades produtivas que empregam, em caráter permanente, até dois trabalhadores contratados. Uma outra importante modificação foi a criação dos Grupos do PRONAF, pela Resolução n° 2.629 de 10 de agosto de 1999, onde os agricultores familiares são classificados em função do nível de renda obtida a partir das atividades desenvolvidas nos estabelecimentos agrícolas. A escolha dos critérios iniciais para delimitação do universo familiar utilizada pelo PRONAF e as mudanças posteriores foram orientadas, principalmente, pelos os trabalhos sobre a agricultura familiar desenvolvidos pelo Convênio FAO/Incra. Uma das restrições que foram incluídas no programa esta relacionada à renda bruta anual. Num primeiro momento a renda bruta anual foi limitada a R$ 27.500,00, passou para R$ 30.000,00 e atualmente é de R$ 40.000,00. Algumas atividades, como a pecuária leiteira, avicultura, suinocultura, que movimentam um volume de capital relativamente alto, quando compõem os sistemas de produção dos agricultores familiares que solicitam os recursos do PRONAF, tem a sua contribuição para a renda total contabilizada em apenas 50%. A Tabela-5 apresenta a agricultura familiar classificada em função da renda total (monetária e não monetária) e qual a área ocupada por cada extrato por região do país. Observa-se que a renda total de 99,2% dos estabelecimentos familiares era inferior a R$27.500,00 (critério posteriormente adotado pelo PRONAF). Como a estratégia do PRONAF é atingir os agricultores familiares menos capitalizados, essas informações forneceram os subsídios para a escolha dos critérios de delimitação do universo familiar a ser atendido pelo programa. 11 Informações disponíveis no endereço da web www.pronaf.gov.br . Acesso efetuado em 11/03/2004. 46 TABELA 5 - Agricultura Familiar - Participação percentual dos estab. e área segundo os grupos de renda total (Em Reais) GRUPO DE RT REGIÃO Nordeste C. Oeste Norte Sudeste Até 0,00 Mais de 0,00 Mais de 3.000 a Mais de 8.000 a Mais de 15.000 a 3.000 8.000 15.000 a 27.500 % % % % % Estab Área Estab Área Estab 7,0 % Área % Estab % Área % Estab % Área Mais de 27.500 % % Estab. Área 8,8 85,7 67,9 5,8 16,5 1,0 4,2 0,3 1,7 0,2 1,0 14,9 18,2 49,4 33,1 23,5 24,5 7,1 11,4 3,1 6,7 2,1 6,0 8,5 67,1 54,6 22,2 26,2 4,0 6,8 1,1 2,5 0,5 1,3 14,7 14,7 55,1 38,9 19,6 25,2 6,4 11,2 2,7 5,9 1,6 4,2 5,2 Sul 6,6 7,9 44,8 30,0 31,3 31,8 11,6 16,5 4,0 8,3 1,8 5,5 BRASIL 8,2 10,8 68,9 48,9 15,7 23,7 4,6 9,1 1,7 4,4 0,8 3,1 Fonte: Censo Agropecuário 1995/96 – IBGE Elaboração: Convênio FAO/Incra. Após a criação do PRONAF surgiram iniciativas similares no âmbito dos Estados, porém com diferentes definições para delimitar o universo familiar. No Estado de São Paulo a principal fonte de incentivo financeiro à agricultura familiar está relacionada ao Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca (FEAP). O FEAP é operacionalizado apenas pelo Banco Nossa Caixa Nosso Banco, Banco oficial do Estado. Popularmente o FEAP é divulgado como O Banco do Agronegócio Familiar – BANAGRO. Na definição de agricultor familiar do FEAP o limite de renda total anual para o estabelecimento rural é de R$100.000,00 e o tamanho máximo da área explorada não pode ser superior a 8 módulos fiscais. Não existem restrições em relação ao numero de trabalhadores contratados em regime permanente. A criação dos programas especiais destinados a agricultura familiar, ampliaram a oferta de políticas publicas destinada aos agricultores familiares. O credito rural subsidiado tornou-se a principal vertente entre essas políticas, que também apresentam iniciativas relacionadas às áreas de infra-estrutura, de capacitação dos agricultores, de comercialização da produção, de agregação de valor aos produtos, entre outras. Se por um lado não existe consenso entre as definições de agricultura familiar, por outro é notório o crescimento da importância dada a esse segmento pelos diversos setores da sociedade, direta e indiretamente relacionados à agricultura. 47 2.3 Nova Economia Institucional Entre as correntes do pensamento econômico dedicadas ao estudo do desenvolvimento das economias destaca-se a Nova Economia Institucional – NEI. A NEI tem como objetivo fornecer instrumentos que possibilitem o estudo das relações entre os agentes econômicos. Em ambientes de alta complexidade, como os das sociedades modernas, os agentes, em busca de seus objetivos (maximizar os lucros), geram conflitos de interesses entre si que são mediados pelas instituições criadas no ambiente institucional. Por meio de suas correntes complementares: Ambiente Institucional, tendo como seu principal representante Douglass C. North, e Estrutura de Governança, tendo como expoente Oliver E. Williamson, a NEI possibilita estudar a economia e, em particular, os custos de transação. Para AZEVEDO (1997:53), a “complementaridade entre ambas está no fato de cada uma tratar de um nível analítico distinto de um mesmo objeto: a economia com custos de transação, na qual o quadro institucional ocupa uma posição de destaque no resultado econômico”. 2.3.1 Ambiente Institucional Douglass C. North afirma que, “ o desempenho econômico é função das instituições e de sua evolução” (NORTH, 1994:9) e que “ ...instituições juntamente com a tecnologia empregada determinam os custos de transação” (NORTH, 1990:61). A corrente que trata do Ambiente Institucional considera a importância das normas envolvidas nas relações econômicas. Em um nível macro-analítico, são considerados os aspectos econômicos, sociais, culturais e políticos que formam o contexto em que as transações estão inseridas. O próprio processo de criação dessas normas, que podem ser formais (constituições, leis e direito de propriedade) e informais (costumes, tradições, tabus, etc), é considerado uma instituição determinante do cenário econômico. As instituições, portanto, são as regras que balizam as transações econômicas, em um determinado ambiente, e interferem diretamente no desempenho de um sistema econômico (NORTH, 1990). Para os teóricos da NEI, ao se determinar os custos de uma economia devese considerar, além dos custos de produção propriamente ditos, os custos envolvidos nas atividades de adquirir, vender, elaborar contratos, monitor a aplicação dos recursos e 48 garantir o cumprimento dos contratos. Para serem eficientes e competitivas as organizações devem procurar diminuir os custos envolvidos nas transações. Segundo NORTH (1994:1012), os custos de transação estão relacionados a quatro variáveis : a) ao custo para se obter informação, seja para avaliar os bens e serviços como para estimar o desempenho dos agentes envolvidos; b) ao tamanho do mercado; c) ao cumprimento de obrigações assumidas e d) às atitudes ideológicas e percepções dos agentes econômicos. Ele afirma ainda que “o custo de uma transação decorre dos altos custos da informação e do fato de que as partes de uma transação detêm informações de forma assimétrica” (NORTH, 1994:17-18). As instituições são fundamentais para que os custos de transacionar diminuam na medida em que elas diminuem a incerteza envolvida nas transações e incentivam a coordenação das atividades humanas. North enfatiza que “ ... a incapacidade de desenvolver mecanismos efetivos, de baixo custo, para se fazer cumprir os contratos é a mais importante fonte tanto da estagnação histórica como do subdesenvolvimento atual no Terceiro Mundo” (NORTH, 1990:54). O desenvolvimento de mecanismos de fazer cumprir contratos está relacionado a mudanças gradativas no ambiente institucional, não apenas nas regras formais, mas também nas informais ou seja nos hábitos, nos comportamentos e valores da sociedade de uma forma geral. Segundo North , “o grau de complexidade em uma economia de mercado é função do nível de contratos necessários para concretizar uma transação em economias com vários graus de especialização” (NORTH, 1990: 34). Em um ambiente competitivo, em que a especialização apresenta-se como uma alternativa para o desenvolvimento e sustentabilidade das empresas, os benefícios conquistados com a especialização podem ser absorvidos pelo aumento nos custos de transacionar no sistema econômico, dado o maior número de transações necessárias e a maior dependência entre os agentes. Em cada situação específica, para garantir o desempenho econômico, é necessário um arranjo institucional diferente. AZEVEDO (1997) ilustra a relevância e a relação entre as instituições e os custos de transação, classificando os processos de troca e analisando as características das transações em função da complexidade do ambiente em que elas estão inseridas. As transações que estão restritas à região, ou grupo de atores, com traços culturais homogêneos e se repetem com relativa freqüência, possuem baixo custo de transação, pois 49 a incerteza relacionada à transação é baixa e os custos para ações oportunistas são elevados, uma vez que a ação oportunista de um determinado indivíduo pode levá-lo a ser excluído do grupo. Nesse contexto, as instituições que governam as transações são simples, já que os custos de transação são baixos. No segundo grupo de transações, o ambiente possui relativa complexidade, já que não há, necessariamente, uniformidade cultural entre os atores e nem repetição das transações. Para resolver os possíveis problemas que possam, eventualmente, surgir nas transações e para evitar ações oportunistas entre os agentes são adotadas algumas instituições particulares como, por exemplo, o estabelecimento de reputação dos agentes e a exigência de contra-partidas para garantir o cumprimento daquilo que foi acordado nas transações. No terceiro tipo de trocas, o ambiente tem alta complexidade. Além das instituições utilizadas nas trocas dos grupos anteriores, como reputação e garantias, é necessário um arranjo institucional mais complexo, amparado, por exemplo, pelo sistema judiciário. O estudo do Ambiente Institucional tem como principais atividades analisar os impactos das mudanças institucionais sobre o sistema econômico e estudar a criação de novas instituições. Segundo North, “ ... as opções que levam à mudança institucional geralmente são determinadas por um misto de mudanças externas e aprendizado interno”. As mudanças externas são aquelas que ocorrem no ambiente e as internas estão vinculadas à “ aquisição de conhecimento ou habilidades que, dados os construtos mentais dos atores, sugerem novas oportunidades” (NORTH, 1994:14). As organizações do tipo associações e cooperativas são exemplos de instituições que procuram minimizar o efeito da complexidade do ambiente, estabelecendo uma relativa homogeneidade cultural entre seus membros, visando diminuir os custos das transações, tanto da organização com o ambiente como daquelas que envolvem seus membros individualmente. O modelo, esquematizado na Figura-1, adaptado de WILLIAMSON (apud SAES, 2000:168 in: ZYLBERSZTAJN & FAVA NEVES, 2000) visa auxiliar a compreensão das relações entre os três níveis de análise: ambiente institucional, organizações e indivíduos. 50 FIGURA 1 - Esquema de Três Níveis de Williamson. ____________________________________________________________________________________ Ambiente Institucional (a) (b) Organizações (c) (d) Indivíduo Fonte: Williamson, O. E. 1986. Adaptado pelo autor. As organizações são definidas pelas regras do ambiente (a) e pelas ações dos indivíduos (c). As organizações, por sua vez, agem tanto sobre o ambiente institucional (b) como sobre os indivíduos (d). De acordo com o modelo, uma mudança no ambiente institucional provoca reações nas organizações e nos indivíduos. Para se adaptarem às mudanças no ambiente as organizações tomam iniciativas que geram novas mudanças no sentido de estabelecer o equilíbrio. As mudanças institucionais podem derivar de alterações nas regras formais (leis, regulamentos, constituição) ou nas regras informais (convenções, normas , padrão de comportamento). Segundo North, o processo de mudança institucional é gradativo. As tentativas de mudanças rápidas por meio de alterações nas regras formais nem sempre surtem os efeitos esperados, pois elas podem ser neutralizadas pelas limitações informais que, por sua vez, mudam de forma mais lenta. Assim, “A incompatibilidade entre regras formais e informais (que podem ser resultado de uma herança cultural profundamente arraigada, uma vez que tradicionalmente sempre resolveram os problemas relacionais mais básicos) resulta em tensões tipicamente solucionadas por alguma forma de reestruturação geral das restrições – em ambas as direções – a fim de restaurar um novo equilíbrio que é muito menos revolucionário do que retórico” (NORTH, 1994:17). 51 2.3.2 Economia dos Custos de Transação Analisando as relações entre o mercado e a firma, COASE (1937:21) chama a atenção para que, além dos custos relacionados diretamente à produção, “os custos de negociação e conclusão de um contrato particular para cada transação que ocorre no mercado também devem ser considerados”. As transações implicam em custos associados à coleta de informação, a negociação entre as partes e formalização dos contratos. Posteriormente, esses custos foram denominados de custos de transação. A atividade de obter informações relacionadas à transação mostrou-se custosa, principalmente quando a informação é assimétrica. A assimetria de informação ocorre nas situações “em que uma das partes envolvidas na transação possui alguma informação privada, não adquirível sem custos pela(s) outra (demais) parte(s)” (AZEVEDO, 1997:38). AZEVEDO (1997), indica que algumas teorias econômicas, denominadas Teorias dos Contratos, surgiram como decorrência do estudo da assimetria de informação e forneceram importantes contribuições a NEI. Entre elas, destaca-se a Teoria de Agente-Principal que estuda as situações onde uma informação específica é de conhecimento de apenas uma das partes envolvidas na transação (Agente) que pode utilizala para prejudicar as demais partes envolvidas (Principal). As operações de crédito rural podem ser entendidas como uma relação de Agente-Principal, onde o tomador de crédito é o Agente e o credor, o Principal. Entre os problemas decorrentes da assimetria de informação, analisados pela Teoria do Agente-Principal, e incorporada pela NEI, destacam-se a seleção adversa e o risco moral. O fenômeno da seleção adversa ocorre antes do fechamento do contrato, quando alguma das partes omite informações com o objetivo de efetivar a transação. O risco moral ocorre quando, após o fechamento do contrato, uma informação relevante, ao resultado final da transação, é obtida e ocultada por uma das partes ou, ainda, em situações onde uma das partes pratica alguma ação que pode comprometer o resultado da transação e não pode ser monitorada pelos demais participantes. A solução dos problemas relacionados à assimetria de informação implica em custos, denominados custos de informação, na Teoria de Agente-Principal ou custos de transação, na NEI. Além dos custos de transação relacionados à informação imperfeita, existem outros problemas de adaptação a contratos incompletos que geram custos. Segundo WILLIAMSON (1996), os custos de transação podem ser divididos em custos pré- 52 contratuais, relacionados às atividades de elaborar, negociar, proteger, finalizar os contratos, e os custos pós-contratuais, relacionados às atividades de controle, monitoramento e adaptação, inclusive às situações em que ocorre a inadimplência “irremediável”, ou seja, naquelas em que ela não pode ser evitada. Grande parte das exigências do credor, em relação aos contratos, é justamente para evitar a inadimplência irremediável (avalistas, garantias reais). A corrente da NEI que estuda os custos de transação preocupa-se em identificar a Estrutura de Governança adequada a cada transação específica, estudando as transações sob uma perspectiva micro-analítica, assumindo algumas instituições, do nível macro-analítico, como pré-definidas. O foco da análise passa para elementos relacionados diretamente com os agentes econômicos e os fatores que possam contribuir para a redução dos custos de transação. Características particulares dos agentes envolvidos, como a gestão das atividades produtivas e a capacidade de adaptação para alcançar um melhor desempenho econômico, estão no centro das análises. As transações envolvem riscos relacionados ao não cumprimento dos contratos por uma das partes envolvidas. Para minimizar esses riscos e, também, para tratar das conseqüências, quando problemas acontecem, os agentes econômicos constroem mecanismos e estruturas de governança relacionados à transação. A Economia dos Custos de Transação (ECT) é a corrente da NEI que analise os custos de transação tendo como unidades de análise das transações os pressupostos comportamentais dos agentes econômicos (racionalidade limitada e oportunismo) e as dimensões das transações (especificidade de ativos, freqüência e incerteza). O custo da transação é diretamente proporcional aos riscos envolvidos. Portanto, diminuir o custo de transacionar implica em aumentar a competitividade dos agentes econômicos. 2.3.2.1 Pressupostos comportamentais dos agentes econômicos Os pressupostos comportamentais analisados pela NEI são: oportunismo e a racionalidade limitada. Com a possibilidade do estabelecimento de contratos incompletos, uma das partes, envolvida na transação, poderá agir de forma oportunista no futuro. Um dos fatores que levam a construção de contratos incompletos é a falta de informações relacionadas à transação e a assimetria de informações entre as partes envolvidas. Essa 53 última, pode acarretar comportamentos oportunistas: seleção adversa e risco moral, apresentado anteriormente. O pressuposto comportamental de racionalidade limitada foi proposto por Herbert Simon em oposição à suposta racionalidade plena assumida pela economia ortodoxa (AZEVEDO, 1997). O conceito de racionalidade limitada define que o agente econômico age de forma racional, mas limitadamente. As limitações estão associadas à impossibilidade de se prever antecipadamente todas as particularidades relacionadas a um determinado contrato, tanto em função do volume de informação que necessitam ser coletados e avaliados, em um determinado período de tempo, mas também devido à complexidade das questões envolvidas nas transações, mesmo em uma situação onde as informações estão disponíveis. Segundo Simon, diante de situações complexas e com restrições de tempo, os agentes econômicos tomam decisões racionais que acarretam em uma solução razoável que nem sempre é a ótima (SIMON, 1962). Essa é uma das razões que levam a construção de contratos incompletos. Conforme indicado por Azevedo (1997), o pressuposto de racionalidade limitada é uma das principais diferenças entre a NEI e a Teoria de Agente-Principal (e as demais teorias denominadas Teorias dos Contratos), pois essas últimas adotam o pressuposto de racionalidade ilimitada. A ação racional dos agentes econômicos, mesmo que limitada, atua no sentido de escolher instituições que permitam impedir o oportunismo, construindo estruturas de governança para transações específicas, visando garantir que uma eventual renegociação futura seja justa para as partes envolvidas. 2.3.2.2 Dimensões da transação As transações que envolvem ativos específicos, ou seja, aqueles que perdem valor fora do contexto das suas atividades produtivas, aumentam os riscos e, conseqüentemente, os custos de transação. Segundo WILLIAMSON (1996), existem pelo menos seis tipos de especificidade de ativos que explicam grande parte dos custos de transação relacionados a ativos específicos: 1- especificidade locacional – a localização próxima de firmas de uma mesma cadeia produtiva economiza os custos de transporte e 54 armazenagem significa retornos específicos a essas unidades produtivas; 2- especificidade de ativos físicos: características inerentes dos ativos que os tornam específicos a uma transação, fora daquele contexto o ativo pode perder valor; 3- especificidade de ativos humanos: capital humano especifico a uma determinada atividade, acumulado em forma de conhecimento ou experiência adquirida; 4- especificidade de ativos dedicados – estão relacionados a investimentos em ativos específicos para atender a demanda de um agente determinado, ou seja, adquiridos para a tender a cliente em particular; 5- especificidade de marca: está relacionado ao capital vinculado a marca de uma empresa, importante para os contratos de franquias; 6- especificidade temporal: esta relacionado ao instante ou período de tempo em que uma transação acontece, são particularmente importantes para as transações que envolvem produtos perecíveis. A freqüência também é uma importante dimensão da transação. Uma transação que se repete várias vezes ao longo do tempo (alta freqüência) pode possibilitar a escolha de uma estrutura de governança que permita diminuir os custos de transação, já que os custos de aquisição de informações e elaboração de contratos podem ser significativamente diminuídos. A alta freqüência de transação entre os agentes econômicos leva à construção de reputação entre as partes envolvidas. O histórico das transações fornece informações que subsidiam a decisão relacionada às transações futuras, pois facilitam a coleta de informações relevantes, diminuindo os custos de transação. Com o aumento da freqüência das transações os custos relacionados às atividades de monitoramento das cláusulas contratuais também diminuem, pois o contato mais freqüente permite um acompanhamento periódico do desempenho econômico dos agentes. A manutenção da oportunidade de negócios torna-se um forte instrumento de incentivo e aumentam os custos relacionados a atitudes oportunistas por uma das partes envolvidas. A outra dimensão da transação considerada é a incerteza. Ela está relacionada tanto com a complexidade de elaboração de um contrato, como à dificuldade 55 para a obtenção de informações que envolvem a transação e o posterior acompanhamento das partes envolvidas. Segundo Azevedo: “Tanto no tratamento da incerteza enquanto desconhecimento quanto naquele que enfatiza a assimetria informacional, o papel que a dimensão ‘incerteza’ representa é o de revelar os limites da racionalidade e, portanto, evidenciar a incompletude dos contratos” (AZEVEDO, 1997:92). Uma determinada estrutura de governança é adotada em função da incerteza, freqüência e especificidade de ativos que envolvem uma determinada transação. As estruturas de governanças estariam compreendidas entre dos pólos: de um lado o mercado spot e do outro a integração vertical. Entre esses dois extremos estariam as formas híbridas, ou seja, os contratos a termo, contratos a longo prazo, contratos com clausulas de monitoramento, entre outros12. O estudo sobre as formas de financiamento dos agricultores familiares passa, necessariamente, por uma análise das transações dos agricultores com as possíveis fontes de crédito, agentes financeiros formais (bancos, cooperativas, associações, etc) e informais (parentes, amigos, agiotas, etc). A Nova Economia Institucional – NEI fornece aportes teóricos para o estudo dessas relações, ao considerar a importância das instituições e das estruturas que regulam as transações entre os agentes econômicos em um ambiente complexo. 2.4 Nova Economia Institucional aplicada ao Crédito Rural13 A aplicação dos conceitos da Nova Economia Institucional às operações de crédito rural possibilita uma melhor compreensão dos principais problemas dessas transações. No caso especifico desse trabalho, a ênfase está nas transações envolvendo os agricultores familiares e os agentes de créditos: formais (agentes financeiros públicos e privados, cooperativa de crédito) e informais (agiotas, fornecedores, intermediários, parentes, etc.). Para HOFF & STIGLITZ (1993), os tradicionais problemas relacionados às operações de credito são: a) necessidade de garantias contras os riscos de não pagamento; 12 Para os contratos de crédito rural, as estruturas de governança que prevalecem é a forma híbrida. Esta seção esta fortemente baseada em HOFF E STIGLITZ (1993), também utilizada por LAZZARINI & CHADAD (2000) e BUAINAIN & SOUZA FILHO (2001). 13 56 b) dificuldades e custos para obtenção de informações sobre os requerentes de crédito (problema de screening); c) necessidades de criação de dispositivos de controle para forçar a liquidação dos empréstimos por parte dos tomadores (problema de enforcement) e d) a utilização de dispositivos que direcionem as decisões dos tomadores para o sucesso das atividades produtivas, ou seja, não tomem decisões que possam comprometer a sua capacidade de pagamento (problema de incentivos). Esses problemas são identificados considerando-se a relação de crédito rural como uma relação de Agente-Principal, onde o agricultor é o agente e os agentes financeiros o principal. O foco da analise está relacionada aos problemas de informação principalmente por parte do Principal. A atomização das unidades de produção agropecuárias e a sua dispersão geográfica estão entre os fatores que não motivam os agentes financeiros a operarem com o setor. Segundo os agentes financeiros, essas características tornam difíceis e custosas às atividades de monitoramento das atividades produtivas e a aplicação dos recursos de crédito. Como os custos de transação, relativo às operações de crédito, são relativamente fixos, os agentes financeiros preferem emprestar maiores volumes de recursos para um grupo restrito de agricultores, do que pequenas quantias a um número elevado de pequenos produtores. LAZZARINI & CHADAD (2000), discute diversas questões relacionadas às finanças no sistema agroindustrial, utilizando a metáfora “fricções” para explicar as imperfeições (falhas) que ocorrem no fluxo de capital no mercado financeiro e que são responsáveis pelos custos de transação nesse sistema. O Quadro–4 apresenta o resumo dessas “fricções” e alguns exemplos referentes às relações de crédito. As próximas quatro seções tratam de alguns aspectos relacionados a cada um dos principais problemas das operações de crédito indicados por HOFF & STIGLITZ (1993) e os mecanismos adotados pelos agentes financeiros para minimizá-los. 57 QUADRO 4 - “Fricções” no Fluxo de Capitais. Fricções Custos de Informação Screening Exemplos na Relação de Crédito • Busca de informações sobre o tomador de crédito • Avaliação do risco de crédito do tomador: . Histórico de crédito . Indicadores financeiros . Dados contábeis Custos de Transação Pré-contratuais Negociação • Custos para “juntar” emprestador e tomador • Custos de barganha contratual • Comissão do intermediário financeiro Salvaguardas • Colaterais da dívida (imóveis, fundos, disponibilidade atual ou futura de commodities, etc.) • Aval • Fiança Incentivos • Exigência de seguro • Gerenciamento de riscos (hedging) • “Rendas” específicas à transação (ex.: taxa de juros mais baixa) • Transferência de tecnologia • Contratos interligados Custos de Transação Pós-Contratuais Monitoramento/controle • Verificação do uso do crédito • Acompanhamento do status financeiro do tomador • Acionamento de mecanismos previstos nas cláusulas contratuais para evitar inadimplência Má adaptação • Inadimplência “irremediável” e conseqüências (custos de receber e vender colaterais, impactos sobre fluxo de caixa do emprestador, etc.) Fonte: LAZZARINI & CHADAD (2000:p.89). 2.4.1 Garantias contra os riscos inerentes aos contratos Nas atividades agropecuárias os riscos relacionados ao clima, às doenças ou pragas e de idiossincrasias de mercado estão sempre presentes. Os agentes financeiros adotam medidas procurando se proteger dos riscos inerentes às atividades rurais. Entre essas medidas as mais freqüentemente adotadas são: a exigência de garantias reais (bens de capital, imóveis, avalistas, entrega de parte da safra futura, etc.) e o estabelecimento de 58 taxas de juros e condições de pagamento em função dos riscos das atividades financiadas (BUAINAIN & SOUZA FILHO, 2001). A taxa de juros é um dos principais instrumentos para seleção dos pedidos de empréstimo e seu valor é diretamente proporcional aos riscos envolvidos na operação (HOFF & STIGLITZ,1993). Para um contrato referente a um projeto que envolve riscos elevados é adotada uma alta taxa de juro e o prazo de pagamento é diminuído. Porém, nas linhas de crédito dos programas especiais para a agricultura familiar os agentes financeiros não podem alterar as taxas de juros. Para resolver os problemas de assimetria de informação e se proteger de eventuais atitudes oportunistas dos tomadores de empréstimo, eles passaram a exigir garantias reais dos tomadores ou de seus avalistas e, muitas vezes, inviabilizam a consolidação dos empréstimos para aqueles que não têm como atender essas exigências. Obtendo garantias dos tomadores de empréstimo, os agentes financeiros reduzem seus custos com avaliação da viabilidade do projeto e com o monitoramento das atividades produtivas, pois o não cumprimento do contrato por parte dos tomadores implicará em perda das garantias fornecidas anteriormente. O Quadro-5 indica os principais tipos de contratos utilizados nas transações envolvendo agricultores familiares e explicações sobre os principais termos relacionados às garantias exigidas pelos agentes financeiros para cada tipo de contrato. O seguro de crédito agrícola vinculado ao Programa de Garantia da Atividade Agropecuária – PROAGRO – é um mecanismo de proteção do agricultor contra os riscos relacionados ao clima, mas estão restritos a algumas regiões do país e implicam em custos adicionais para os agricultores. Para as transações de crédito rural que possuem um seguro de crédito as exigências de garantias reais são minimizadas. Porém, fora do PROAGO os custos de seguros para as atividades agropecuárias são praticamente proibitivos. Na impossibilidade de contratar um seguro de crédito rural, outros instrumentos são utilizados pelos agricultores para reduzir os riscos inerentes às atividades agropecuárias. Entre eles estão as medidas para minimizar os efeitos das variações de preços, tanto dos insumos como dos produtos. A comercialização antecipada da produção, junto a cooperativas de produtores rurais, e os contratos a termo, junto a agroindústrias, são 59 exemplos desses instrumentos, mas dependem da integração com outras organizações que nem sempre estão presentes no ambiente próximos às unidades produtivas. QUADRO 5 – Principais tipos de contratos de crédito rural e termos relacionados às garantias exigidas pelos agentes financeiros Cédula Rural Pignoratícia: cédula de crédito rural cujas garantias exigidas são o penhor dos produtos que serão obtidos na produção agropecuária e aval. Cédula Rural Hipotecária: cédula de crédito rural cuja garantia exigida é a hipoteca. Cédula Rural Pignoratícia Hipotecária: cédula de crédito rural cujas garantias exigidas são o penhor dos produtos que serão obtidos na produção agropecuária e hipoteca. Nota de Crédito Rural: Titulo de crédito rural garantido por aval. Cédula de Crédito: título de crédito sob a forma de promessa de pagamento, emitida pelo devedor, em razão de financiamento dada pelo credor. Título de Crédito: documento negociável, representativo de um valor certo a receber de uma dívida, ou do direito de receber uma mercadoria. Nota Promissória: título de crédito emitido pelo devedor, sob a forma de promessa de pagamento, a determinada pessoa, de certa quantia em certa data. Hipoteca: sujeição de bens imóveis, navios ou aeronaves ao pagamento de uma dívida, sem se transferir ao credor a posse do bem gravado. Aval : garantia pessoal, plena e solidária, que se dá de qualquer obrigado ou coobrigado em título cambial. Avalista: pessoa que avaliza e obriga-se por aval em título, nota promissória, etc. Alienação Fiduciária: transferência pelo devedor ao credor do domínio de um bem, em garantia de pagamento. Penhor: direito real que vincula coisa móvel, ou mobilizável a uma dívida , como garantia do pagamento desta; Fonte: Elaborado pelo autor. 60 2.4.2 Medidas para obter informações sobre os tomadores de crédito Para reduzir os problemas de informação os agentes financeiros podem recorrer a mecanismos diretos ou indiretos (HOFF E STIGLITZ, 1993). O principal mecanismo direto, utilizado pelos agentes financeiros, para obter informações sobre os tomadores de crédito utiliza-se os sistemas de cadastro. No cadastro são consideradas informações sobre o inventário da unidade produtiva, indicadores financeiros, histórico de crédito dos agricultores, experiência acumulada na atividade, a tecnologia no processo produtivo, as relações comerciais do agricultor na região. Para elaborar um cadastro detalhado dos clientes os agentes financeiros têm custos que de alguma forma são incorporados na transação, na maioria das vezes na forma de taxas para elaboração de cadastro, compondo parte dos custos de transação. Entre os mecanismos indiretos utilizados para obter informações e minimizar os custos de elaborar os cadastros, os agentes financeiros constroem uma rede de informações composta por outros agentes financeiros e também por organizações comerciais e industriais. Além de ampliar a capacidade de obter informações, essa rede possibilita a construção de outros mecanismos de controle e incentivos ao cumprimento dos contratos, privilegiando os atores envolvidos. 2.4.3 Mecanismos de incentivos ao cumprimento dos contratos Os mecanismos de incentivos são diversos e estão relacionados ao desenho dos contratos. Eles também podem ser classificados em diretos e indiretos (HOFF & STIGLITZ,1993; LAZZARINI & CHADAD, 2000).Um exemplo de mecanismo direto é a limitação do volume de crédito a ser concedido para os agricultores. Esse limite está geralmente vinculado às atividades especificas, constituindo-se numa típica restrição das linhas de crédito. É estipulado um limite máximo de crédito que pode ser contraído por um determinado agricultor, considerando a somatória dos créditos tomados nas linhas de crédito disponíveis. Esse tipo de mecanismo tem como função controlar o volume de recursos aplicado em cada atividade e também o nível de endividamento do agricultor, além de fazer com que ele cumpra o contrato para que possa contar novamente com o volume de credito pré-determinado. 61 Ao ser definido um limite do volume de crédito, tanto para uma linha específica como para o total máximo permitido a um agricultor, pode-se inviabilizar a opção de financiamento, uma vez que as condições podem ser inadequadas às necessidades da unidade produtiva desse agricultor. A restrição de volume de credito por atividade é uma abordagem fragmentada e o limite máximo para o agricultor é uma restrição essencialmente quantitativa. Portanto, essas restrições podem ser incompatíveis com as necessidades dos diversificados sistemas de produção que prevalecem entre os agricultores familiares. Outro mecanismo indireto de controle é o contrato de crédito vinculado aos fornecedores de insumos ou às industrias de processamento (HOFF & STIGLITZ,1993). Além de reduzirem o problema de aquisição de informações, auxiliam no monitoramento da aplicação dos recursos (aquisição de insumos) e incentivam o cumprimento dos contratos (para preservar o mercado comprador). Para muitas regiões essa opção nem sempre é possível dado à escassez de organizações com as quais os agricultores possam transacionar. Para incentivar a construção de reputação entre os agricultores e os agentes de crédito, esses últimos podem sinalizar com incentivos como a possibilidade de diminuição da taxa de juros para as futuras transações ou rebates nas últimas parcelas de pagamento, referente à taxa de juros, para os contratos que tiveram suas parcelas pagas rigorosamente em dia. 2.4.4 Medidas para fazer-cumprir os contratos A natureza incompleta dos contratos gera custos de transação adicionais, pois os credores tomam medidas no sentido de fazer com que os contratos sejam cumpridos (enforcement) (HOFF & STIGLITZ,1993). Entre as salvaguardas contratuais, destaca-se a exigência de garantias reais (hipotecas, alienação fiduciária) e avalistas, além dos mecanismos indiretos apresentados anteriormente – contratos vinculados a fornecedores ou agroindústria. As garantias geralmente têm um valor muito maior do que o montante solicitado em empréstimo, justamente para forçar os agricultores a cumprir os contratos para não perder as garantias oferecidas. 62 Para a maioria dos agricultores familiares é impossível atender essas exigências, principalmente por não possuírem o título da propriedade regularizado ou não poder contar com um avalista que atenda ao perfil solicitado. A exigência de garantias, com valores relativos elevados, torna-se um dos fatores que interferem fortemente na decisão dos agricultores de não tomarem crédito rural, mesmo tendo condições de atender às exigências solicitadas. Os agricultores que conseguem atender as exigências dos agentes financeiros têm ainda que arcar com os custos de registro da cédula de credito rural em um cartório de títulos e documentos. As taxas de registro são cobradas em função dos valores dos contratos e dos bens ou imóveis apresentados como garantia. Como as garantias exigidas devem ter um valor de mercado bem acima do valor do contrato, para garantir uma maior liquidez numa situação de inadimplência irremediável, elas contribuem para elevar ainda mais os custos de transação. Para garantir o cumprimento dos contratos os agentes financeiros podem utilizar instrumentos diretos de monitoramento e controle das atividades produtivas, visitando regularmente a propriedade e verificando se o desempenho dos agricultores esta dentro do previsto no contrato. Porém, essa iniciativa é custosa, pois requer a disponibilidade de um profissional capacitado a analisar e emitir um parecer técnico sobre o desenrolar das atividades especificas de cada unidade produtiva. Por essa razão os agentes financeiros preferem uma solução mais simples (garantias reais), pois alem de resolver os problemas relacionados aos riscos não requer um envolvimento mais forte com os agricultores. 2.5 Problemas do crédito rural sob a perspectiva dos agricultores Para uma analise mais completa dos problemas relacionados ao crédito rural ofertado exclusivamente aos agricultores familiares é necessário considerar os problemas sob a perspectiva do agente (agricultores), uma vez que esses programas especiais procuram, justamente, minimizar as falhas do mercado de crédito rural. Sob a perspectiva dos tomadores de crédito (os agricultores familiares) entre os principais problemas relacionados ao crédito rural estão: a) o desconhecimento sobre as oportunidades de crédito (assimetria de informação); b) dificuldades para avaliação das possibilidades, considerando 63 os riscos e as condições de pagamento dado às contingências da unidade produtiva (racionalidade limitada); c) atender às exigências ou restrições vinculadas a cada uma das possibilidades disponíveis; d) nenhum ou pouco relacionamento com os agentes financeiros governamentais ou instituições correlatas ao crédito rural, a exemplo das organizações que fornecem serviços públicos de extensão rural; e) enorme aversão aos riscos; f) indisponibilidade ou elevados custos relacionados ao seguro agrícola; g) incompatibilidade entre as instituições de crédito rural e os agricultores; h) custos relacionados ao tempo e deslocamento para obter informações e formalizar os contratos de crédito. Tanto sob a perspectiva dos agentes de crédito como dos agricultores familiares, os problemas do crédito rural estão fundamentalmente relacionados aos custos de transação. Vincular o crédito rural ao fornecimento de insumos ou a comercialização da produção, diminui os riscos associados ao comportamento oportunista por parte dos agricultores, mas cria a possibilidade dos demais atores (fornecedores ou compradores) agirem dessa forma (HOFF & STIGLITZ,1993; STIGLITZ,1993). A vinculação das transações aos fornecedores de insumos poderá interferir no padrão tecnológico adotado por esses agricultores. Essa intervenção pode ser positiva e servir como um incentivo à melhoria do padrão tecnológico, ou negativa, quando os fornecedores, visando obter vantagens das vendas, forçam a adoção de uma tecnologia que não seja apropriada para a realidade do agricultor, ou uma adoção parcial que não permita o desempenho correspondente a aquele observado nas situações onde a adoção desses insumos é plena. Se a concorrência no mercado de insumos for baixa, os preços dos insumos podem estar acima da média de mercado, afetando diretamente os custos de produção. Vincular o crédito a entrega da produção agropecuária a uma determinada indústria processadora pode significar elevados custos de transação para os agricultores, uma vez que as indústrias podem praticar preços abaixo daqueles que prevalecem no mercado, alegando que a diferença é para cobrir os gastos relacionados à transação financeira. 2.5.1 Problemas relacionados ao Crédito específico para Agricultura Familiar Os agentes financeiros operam seguindo o princípio de obter maior lucratividade correndo o menor risco possível e exercem enorme influência nos contratos firmados com os agricultores. Eles têm sistematicamente elevado os custos dos contratos, 64 alegando o alto risco das operações de crédito rural. Como a maioria dos agricultores familiares, historicamente, esteve à margem das políticas de crédito rural e não possuem vínculo algum com os agentes financeiros, os custos de transação elevam-se ainda mais. A justificativa para os altos custos de transação é sustentada pela dificuldade para obter informações sobre os agricultores familiares e devido aos valores médios, relativamente, baixos dos contratos firmados com esses agricultores. Segundo STIGLITZ, “Os mercados de crédito são caracterizados por contratos complicados. Os credores especificam, não só a taxa de juros, mas também impõem outras condições (garantias colaterais, garantias equivalentes) que têm, efeitos, tanto de incentivo como de seleção. De fato, a presença simultânea desses efeitos, de incentivo e de seleção, é importante: na falta do primeiro, pode ser possível aumentar as garantias colaterais e aumentar as taxas de juros, assegurando assim que o tomador de crédito escolha o projeto seguro”. (STIGLITZ, 2001:30) Nos programas especiais direcionados à agricultura os agentes financeiros não podem alterar as taxas de juros de cada linha de crédito. Para compensar o elevado custo de transacionar com os agricultores e para se protegerem dos riscos relacionados às transações, os agentes financeiros cobram altas taxas para operacionalizar o crédito14 e incorporam exigências aos contratos, aumentando os custos de transação e dificultando as operações com os agricultores familiares. Com a criação do PRONAF um grande número de agricultores que estiveram excluídos das políticas agrícolas anteriores passou a ter possibilidades inéditas em termos de oferta de crédito. O baixo nível de capitalização desses agricultores, a necessidade de um capital de giro, relativamente alto, para a conclusão de um ciclo produtivo e a incerteza envolvida na produção agrícola, direcionou as prioridades dos programas especiais para a ampliação do número de agricultores familiares com acesso ao crédito. Apesar do caráter inovador desses programas, a maioria dos agricultores familiares ainda encontra dificuldades para acessar o crédito. Além da desinformação, entre os agricultores, sobre os principais programas de crédito destinados à agricultura 14 No caso de Programas governamentais, essas taxas tendem a ser pagas pelo Tesouro Nacional. Para maiores informações ver BITTENCOURT (2003). 65 familiar, um dos principais obstáculos relacionados à concessão do crédito é a ausência de agentes financeiros apropriados para a operacionalização dos contratos. Entre os agentes financeiros, responsáveis por operacionalizar os programas especiais, prevalece uma política de seleção de clientes orientada pelo mercado, com o objetivo de maximizar os lucros e minimizar os riscos das transações. Segundo ABRAMOVAY & VEIGA (1999), estabelece-se uma das principais contradições do PRONAF: apenas uma pequena parcela do público-alvo – agricultores familiares pouco capitalizados – corresponde ao perfil dos clientes das instituições financeiras operadoras das linhas de crédito oficial. Os bancos oficiais, operadores destas linhas especiais de crédito, trabalham com a lógica de mercado, determinando o perfil de sua clientela e não com um público-alvo, típico de programas assistenciais que procuram contornar as “falhas” de mercado. O desinteresse dos bancos, em operar com os agricultores familiares, aumenta os custos de transação dos programas especiais de crédito rural e dificulta o acesso do agricultor, ao exigir garantias reais para aprovação dos financiamentos. Para BUAINAIN & SOUZA FILHO (2001), seria necessário: “...considerar a institucionalidade e forma de operação do crédito, a fim de reforçar a disciplina financeira, induzir os mutuários a buscarem o máximo de eficiência na utilização dos recursos e melhorar o sistema de políticas complementares necessárias para promover o efetivo desenvolvimento do produtor familiar. Neste sentido é fundamental introduzir responsabilidades ao longo de toda a “cadeia” de um programa de crédito, fazendo com que os vários atores – órgãos governamentais, assistência técnica, comissões, bancos e produtores - sejam de fato responsáveis pelos seus atos e, portanto, compromissados com os resultados” (BUAINAIN & SOUZA FILHO, 2001: 19) Com o PRONAF, foram criadas linhas de crédito subsidiado com objetivo de atender às especificidades dos sistemas de produção encontrados entre os produtores familiares. Entretanto, apenas as mudanças no ambiente institucional não garantiram, por si só, a efetivação dessas possibilidades. As respostas dos agricultores e das organizações envolvidas com o crédito rural continuam definindo a dinâmica do processo de apropriação dessas mudanças por parte dos diversos agentes, com impactos significativos nos custos de transação das operações. 66 Para conseguirem uma melhor inserção nos mercados e acesso ao crédito subsidiado, os agricultores têm que encontrar formas de se adaptar às exigências dos agentes financeiros. As práticas coletivas, envolvendo os agricultores e outras organizações correlatas, são aquelas que mais têm conseguido fornecer alternativas a estes problemas relacionados ao crédito rural (STIGLITZ, 1993). As associações e cooperativas podem propiciar uma melhor inserção nos mercados e maior poder de negociação, tanto com os fornecedores de insumos como com compradores da produção, além de criarem um ambiente favorável no qual os agricultores possam encontrar auxílio técnico, reconhecimento social, político e cultural. Os fundos de aval e as práticas de aval cruzado, onde ocorre uma divisão de responsabilidades entre os participantes, fornecem exemplos importantes e bem sucedidos que ampliam o número de agricultores com acesso às linhas de créditos especiais e incentivam as práticas associativas. (PERACI & BIANCHINI, 2002). A concepção dos programas de apoio a agricultura familiar e as suas regras estabeleceram mudanças no ambiente institucional que desencadearam um processo dinâmico de adaptação gerando outras mudanças, tanto no ambiente como nas ações das organizações e dos indivíduos envolvidos. As organizações financeiras, que operacionalizam os programas, interpretam as regras dos programas e determinam as exigências relacionadas à aprovação das solicitações. Elas visam minimizar os riscos envolvidos nos contrato firmados com os agricultores e garantir o resgate dos recursos disponibilizados, buscando obter a maior lucratividade possível. Como as instituições financeiras orientam-se pelas práticas convencionais do mercado de crédito, exigindo garantias reais dos tomadores ou de seus avalistas, acabam por distorcer os objetivos iniciais dos programas. Os agentes que operam o crédito rural estão preocupados em selecionar os tomadores que, além de honrar os contratos, possam, como contrapartida, consumir seus produtos e serviços, ampliando as suas margens de lucro. Os valores dos empréstimos solicitados pelos agricultores familiares estão bem abaixo da média daqueles transacionados pelas organizações financeiras. Sendo assim, elas alegam alto custo para operar com este público, pois os gastos com a obtenção de informações dos agricultores, avaliação dos projetos e monitoramento da aplicação dos recursos são muito altos em relação ao montante solicitado. Para contornar esse problema os agentes financeiros exigem garantias dos 67 agricultores que raramente podem atende-las. Estabelece-se assim um conflito entre os objetivos dos programas especiais (facilitar o acesso ao crédito) e a política de operação definida pelos agentes financeiros. Os agricultores familiares não conseguem a aprovação das solicitações de crédito por não possuírem as garantias reais e não estarem em condições de consumir os produtos e serviços oferecidos pelos agentes financeiros. Individualmente, os agricultores pouco podem interferir nas políticas definidas pelas organizações financeiras, pois são restrições legitimadas pelos programas que lhes dão autonomia para criarem regras adicionais utilizadas na seleção dos agricultores. Entretanto, em regiões ou locais, onde as organizações de representação dos agricultores familiares (sindicatos e associações, a extensão rural estatal e organizações não-governamentais) atuam conjuntamente, têm surgido alternativas para os problemas normalmente enfrentados pelos agricultores familiares (SCHRÖDER, 2002). Entre estas iniciativas destacaram-se a formação dos fundos de aval e as cooperativas de crédito, formadas e geridas pelos próprios agricultores familiares. Essas formas de organização catalisaram esforços de vários agentes – extensão rural, sindicatos, prefeituras municipais, organizações não-governamentais, cooperativas agrícolas e as próprias instituições financeiras – fornecendo garantias aos agentes de crédito oficial, selecionando os solicitantes e auxiliando na elaboração e monitoramento dos projetos. Elas contribuíram para ampliar o número de agricultores beneficiados pelo crédito rural, além de oferecer um conjunto de outros elementos necessários ao processo de desenvolvimento e consolidação desses agricultores. 2.6 Crédito Rural e os Filtros Institucionais Para avaliar a eficácia das políticas públicas, como a de crédito rural, ZEZZA & LLAMBÍ (2001) utilizam o conceito de filtros institucionais. Segundo os autores os filtros institucionais operam como dispositivos que podem prejudicar ou mesmo anular as regras definidas em uma política pública. Eles são barreiras que não permitem a transmissão plena das regras e dos incentivos da política aos atores interessados, comprometendo o sucesso da política. Existem três tipos de filtros institucionais, classificados como de primeiro, segundo e terceiro níveis. Os filtros de primeiro nível, também denominado nível macro- 68 analítico, estão relacionados ao desenho e concepção da política, são filtros que aparecem no momento do lançamento de determinada política. Eles podem surgir pelo fato de aspectos estruturais da economia terem sido desconsiderados, ou por influência de alguma outra política. Os filtros de segundo nível , ou nível meso-analítico, estão vinculados ao comportamento e as regras criadas pelos agentes que participam do ambiente de operacionalização da política. Eles são denominados filtros de “transmissão do incentivo”, pois, geralmente, estão relacionados a problemas de divulgação de informação sobre a política, seus objetivos e incentivos, ao público alvo. O terceiro tipo de filtro institucional atua no nível micro-analítico, ou nível de “tomada de decisão”, e está relacionado ao comportamento dos atores que pertencem ao universo do público alvo da política. Por algum motivo específico, eles não utilizam a política criada, não respondendo às expectativas iniciais daqueles que a formularam (LLAMBÍ & ZEZZA, 2003). Os filtros do nível micro-analítico estão fortemente relacionados à formação educacional dos atores e a seus valores culturais (tradições, costumes, crenças, etc). A figura-2 apresenta os três níveis de filtros institucionais que atuam em uma determinada política. A identificação dos principais filtros institucionais relacionados à política de crédito rural auxilia a compreensão do desempenho dessa política e subsidia a tomada de decisões no sentido de torná-la mais eficaz o crédito rural. A consolidação de instituições como o crédito rural, que possibilitem o desenvolvimento dos agricultores familiares e das organizações correlatas, depende tanto da formulação de políticas que considerem as especificidades do ambiente no qual ela irá vigorar como da construção gradual e coletiva dos ajustes necessários para garantir sua maior eficiência por meio da interação dos atores sociais interessados. O desempenho diferenciado de algumas regiões do país em relação aos programas de crédito para a agricultura familiar, principalmente da Região Sul, está relacionado à atuação efetiva das organizações correlatas ao desenvolvimento da agricultura familiar (ABRAMOVAY & VEIGA,1999). O papel desempenhado pelas organizações de representação dos agricultores e pelos órgãos de extensão rural minimiza os efeitos dos filtros institucionais, principalmente os de segundo e terceiro níveis. 69 FIGURA 2– Os três níveis de filtros institucionais na “cadeia política”. Filtro de 1°nível • oferta de política Filtro de 2°nível • transmissão de incentivo Incentivos aos domicílios familiares Políticas (e fatores exógenos) • Preço relativo dos produtos • Taxa de juros • Taxa de câmbio • Estrutura de preço e inflação • Preço / remuneração dos fatores • Acesso a serviços públicos, infra-estrutura, redes de segurança, transferências governamentais Fonte: LLAMBÍ E ZEZZA, 2003. Traduzido pelo auto Filtro de 3°nível • tomada de decisão Decisões dos domicílios familiares • Produção (interna e externa à propriedade) • Consumo • Investimento • Outras estratégias de renda e emprego (incl. migração) Resultado • Renda real 70 3 DISPONIBILIDADE DE CRÉDITO PARA A AGRICULTURA FAMILIAR Para implementar uma determinada estratégia de desenvolvimento as unidades familiares necessitam de recursos financeiros. Esses recursos podem ser utilizados para o custeio de atividades produtivas, em projetos de investimentos, em atividades de comercialização da produção e no suprimento das necessidades familiares dos agricultores. As especificidades das atividades agropecuárias como a dependência em relação aos fatores climáticos, a sazonalidade da produção e o tempo, relativamente longo, de maturação dos organismos vegetais e animais, torna a gestão dos recursos financeiros um fator crucial para a sustentabilidade da unidade produtiva. Apenas para algumas poucas atividades agropecuárias é possível utilizar tecnologias que minimizem parcialmente essas variáveis. Entre os exemplos dessas tecnologias encontra-se o cultivo protegido de plantas, a implantação de sistemas de irrigação, os sistemas de criação intensiva de animais. Para os agricultores familiares, a adoção dessas soluções nem sempre é possível, pois demandam altos investimentos, principalmente para áreas ou volumes relativamente grandes. Os gastos incorridos durante o ciclo de produção e as receitas provenientes das vendas dos produtos apresentam uma defasagem que precisa ser equacionada com recursos financeiros próprios, ou captados externamente. Para poder arcar com os gastos incorridos e comprometidos com o ciclo produtivo, sem necessitar de recursos captados externamente, os agricultores familiares necessitam atingir um patamar de capitalização que lhes permitam custear as atividades produtivas, os eventuais investimentos e suprir as demandas específicas para a manutenção da família. Em uma situação de pouca capitalização, como a que ocorre entre a maioria dos agricultores familiares, o financiamento das atividades agropecuárias depende de recursos captados externamente. As fontes de recursos financeiros podem ser diretas e indiretas. Entre as principais fontes diretas estão os recursos próprios e os programas governamentais de crédito destinados à agricultura. Entre os programas governamentais, destacam-se o Programa de Apoio e Fortalecimento da Agricultura Familiar – PRONAF – a nível nacional e programas similares concebidos pelos governos estaduais e municipais. Além das alternativas de financiamento oferecidas por programas governamentais, os agricultores familiares podem recorrer ao mercado informal de crédito rural (parentes, 71 amigos e agiotas). As principais fontes indiretas de recursos são os fornecedores de insumos, tanto para o custeio da produção como para algumas atividades relacionadas a investimentos na unidade produtiva e os compradores da produção familiar (agroindústrias, intermediários), nas situações em que é possível transacioná-la antecipadamente. Grande parte dos agricultores familiares utiliza, simultaneamente, os recursos provenientes de diversas fontes. Porém nem todos têm as mesmas oportunidades de acesso e nem sempre avaliam as vantagens e desvantagens em operar com determinadas fontes, seja em relação aos riscos envolvidos nas atividades ou em relação a uma análise do custo de oportunidade para os recursos utilizados. Nesse capítulo do trabalho são analisadas as principais fontes de crédito rural para os agricultores familiares, considerando aspectos relevantes associados a cada uma delas: recursos próprios, mercado de crédito formal e mercado informal. Para o mercado formal são destacadas algumas características das linhas de crédito dos programas especiais para a agricultura familiar. No âmbito nacional são apresentadas as condições gerais das linhas de crédito do PRONAF e no âmbito do estado de São Paulo aquelas relacionadas ao FEAP. Também são apresentadas linhas de crédito rural que estão disponíveis para a agricultura em geral, mas que podem se consideradas opções potenciais para os agricultores familiares. Em relação ao mercado informal, são apresentadas as possibilidades vinculadas aos fornecedores de insumos e aos compradores da produção dos agricultores familiares. 3.1 Recursos Próprios Os agricultores familiares que atingiram um patamar de capitalização que permite o auto-financiamento, desfrutam de uma maior autonomia para tomada de decisões. Eles podem tomar as decisões necessárias para não comprometer o desempenho das atividades produtivas, independentemente da captação de recursos junto aos agentes financeiros. Mesmo assim, para esses agricultores seria prudente a avaliação do custo de oportunidade do capital próprio em relação às oportunidades oferecidas pelos programas especiais para a agricultura familiar ou pelas linhas de crédito destinadas a agricultura como um todo. 72 Entre os fatores que ampliam a capacidade de auto-financiamento dos agricultores familiares estão as rendas obtidas, por um ou mais membros da família, provenientes de aposentadoria, de pensão, da remuneração do trabalho executado fora da unidade produtiva e aquelas relacionadas ao arrendamento de parte da área disponível na unidade produtiva (GUANZIROLI ET AL, 2001; MUNDO NETO & SOUZA FILHO, 2003(a)). As duas últimas alternativas, apesar de gerarem incremento da renda monetária, implicam em redução dos recursos disponíveis na unidade produtiva - trabalho e área produtiva – e, portanto, podem não ser, sob uma perspectiva de longo prazo, a melhor alternativa para essas unidades produtivas. Segundo, Guanziroli et al., “à medida que os agricultores consolidam seus sistemas produtivos, eles abandonam progressivamente as outras atividades “rurais” não-agrícolas, que foram as que de alguma forma lhes permitiram sobreviver à adversidade e também gerar seu capital de giro”. (GUANZIROLI et al., 2001:35) Apesar da maioria dos agricultores familiares não estarem em condições de praticar o auto-financiamento total de suas atividades, eles desenvolvem estratégias cujo objetivo é diminuir a dependência em relação a terceiros. É típico nos sistemas de produção praticados pela agricultura familiar a interação entre atividades produtivas com finalidade comercial com outras que produzem gêneros agropecuários destinados ao autoconsumo. Esses últimos podem servir tanto como insumos para outras linhas de explorações (produção animal ou vegetal) como gêneros destinados ao consumo das famílias vinculadas à unidade produtiva. Essa estratégia possibilita que os agricultores familiares diminuam a sua dependência em relação aos insumos externos à unidade produtiva e pode gerar uma economia financeira e um aumento indireto da renda bruta dos agricultores. Apesar desses agricultores nem sempre atingirem níveis de produção e produtividade satisfatórios, pelos menos em parte, essa estratégia postergou o abandono das atividades agropecuárias (GUANZIROLI et al. 2001). 3.2 Mercado de Crédito Rural No Brasil, historicamente, o crédito rural tem sido a principal política agrícola para promover o desenvolvimento da agricultura. Mesmo que, teoricamente, essas 73 linhas de crédito fossem destinadas a todos os agricultores, elas foram, predominantemente, utilizadas pelas médias e grandes unidades patronais associadas à produção de gêneros de exportação. Antes da criação dos programas de crédito destinados especificamente para a agricultura familiar, apenas uma pequena parcela dos agricultores familiares utilizou o crédito rural, sendo que na maioria desses casos, a produção familiar estava integrada à agroindústria. (BUAINAIN, 1999:229). Devido às elevadas taxas de risco associadas às atividades agropecuárias, o financiamento dessas atividades não atrai o mercado de crédito na mesma proporção que o financiamento de outras atividades econômicas relacionadas à industria e ao comércio. Os governos intervêm no mercado de crédito rural para minimizar as suas imperfeições, subsidiando e garantindo a ofertada de recursos a taxas de juros compatíveis com os riscos e com a lucratividade das atividades agropecuárias. Em geral, as linhas de crédito rural estão diretamente relacionadas a uma determinada atividade produtiva. Cada linha de crédito possui um conjunto específico de restrições: finalidade, beneficiários, teto do financiamento, encargos financeiros, prazo de pagamento, incentivos para o cumprimento do contrato e garantias exigidas dos solicitantes do crédito. Cabe aos agricultores adequarem a oferta de crédito rural aos seus sistemas de produção. Essa forma de ofertar o crédito rural esta relacionada ao próprio processo de desenvolvimento das atividades agropecuárias e de sua crescente especialização. Os sistemas de produção de monoculturas se beneficiam diretamente da forma como o crédito é ofertado. Já para os agricultores com sistemas de produção diversificados é necessário ter uma capacidade de analisar as linhas de crédito disponíveis e compatibiliza-las com o projeto de sua unidade produtiva. As linhas de créditos vinculadas aos programas especiais para a agricultura familiar são as que apresentam menores encargos financeiros e trabalham com uma definição de agricultura familiar restritiva, cujo objetivo é favorecer prioritariamente os agricultores menos capitalizados. 3.2.1 Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar O Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) integra a política agrícola nacional e tem como prioridade atender os setores da agricultura que se encontram mais enfraquecidos. O programa é composto por linhas 74 complementares voltadas para financiar melhorias na infra-estrutura de municípios onde existe o predomínio da agricultura familiar, para promover a capacitação dos agricultores de seus familiares e para proporcionar o financiamento das atividades produtivas dos agricultores familiares, com os recursos sendo liberados diretamente ao agricultor ou por intermédio de suas associações ou cooperativas. O PRONAF tornou-se uma importante conquista dos movimentos sociais motivados pela obtenção de melhores condições de vida dos trabalhadores rurais e agricultores familiares, uma vez que favorece, de forma inédita, um público que, historicamente, esteve à margem das políticas agrícolas. O PRONAF é um programa de abrangência nacional com objetivos de promover o desenvolvimento dos segmentos mais enfraquecidos da agricultura, além de ser parte integrante da política de combate à pobreza rural e urbana. Por um lado, o PRONAF combate à pobreza rural potencializando uma melhoria nas condições de vida e de produção dos agricultores familiares. Por outro lado, auxilia no combate da pobreza urbana, incentivando a permanência dos agricultores no campo, minimizando o êxodo rural e seus efeitos, uma vez que a agricultura familiar emprega a maioria dos trabalhadores rurais e é responsável pela produção dos gêneros agropecuários destinados ao mercado interno. O PRONAF fornece um exemplo típico da tendência, indicada por JANVRY et al. (1997), de participação dos governos na economia dos países latino-americanos: intervir nas situações em que ocorrem falhas de mercado, privilegiando setores da população mais enfraquecidos. A linha PRONAF capacitação tem como objetivo inserir os agricultores familiares nas discussões relacionadas à gestão da produção agropecuária, envolvendo temas que tratam de tecnologias de produção agropecuária e de administração da unidade produtiva, com destaque para os aspectos ligados à qualidade, padronização, planejamento e controle da produção e estratégias de comercialização. Porém essa linha de ação do PRONAF tem apresentado resultados modestos e abrangência restrita a regiões onde a agricultura familiar tem tradição e o ambiente institucional é rico em organizações que atuam para viabilizar o desenvolvimento desse segmento da agricultura. Outra importante linha de ação do programa está focada no financiamento de infra-estrutura e serviços aos municípios e ficou conhecida como PRONAF-M. Os projetos que são objetos de financiamento dessa linha do PRONAF estão relacionados direta e indiretamente à produção agropecuária, a exemplo da construção ou melhoria de 75 estradas municipais, sistemas de fornecimento de energia elétrica para as propriedades rurais, construção de escolas.15 O PRONAF tem como sua principal vertente a linha de crédito rural, instituída em 1995, pela resolução CMN/BACEN n.º 2.191, de 24/08/1995. Para ter acesso a linha de crédito rural do PRONAF os agricultores necessitam obter o certificado de agricultor familiar. Esse documento pode ser emitido apenas pelas organizações habilitadas para esse fim: os sindicatos de trabalhadores rurais filiados à Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), os sindicatos patronais filiados à Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e as empresas governamentais de extensão rural. No certificado deve constar a assinatura de um dos sindicatos credenciados e empresa de extensão rural oficial que atua responsável pelos agricultores de um determinado município ou região. A extensão rural desempenha um importante papel na operacionalização do PRONAF, pois as solicitações de crédito devem ser acompanhadas de um estudo de viabilidade técnico-econômica. As solicitações de recursos para investimentos necessitam de um projeto técnico detalhado, constando informações sobre as metas a serem atingidas, a tecnologia a ser empregada, os prazos para implantação, as melhorias de qualidade e de produtividade. Para as solicitações que envolvem apenas recursos para o custeio das atividades agropecuárias, deve ser apresentado um plano simples para o gasto dos recursos, contendo as previsões de gastos e receitas em relação às atividades financiadas. Os Grupos PRONAF classificam os agricultores familiares em função da renda obtida nas unidades de produção agropecuária. Essa classificação, apresentada no Quadro–6, tem como objetivo estabelecer encargos financeiros e subsídios diferenciados conforme a renda dos agricultores. Os agricultores menos capitalizados ou que foram recentemente atendidos pelo programa de reforma agrária contam, por um determinado período, com as menores taxas de juros, além de bônus e rebates no saldo devedor, caso venham a respeitar as datas de pagamentos estipuladas nos contratos. 15 Para ser atendido pelo PRONAF-M o município deve seguir as orientações especificas para essa linha do PRONAF e tem que ter sido pré-selecionado pelo Conselho Nacional do PRONAF. Os critérios para seleção dos municípios são: a) a relação entre o número de estabelecimentos agropecuários com área até 200 ha e o número total de estabelecimentos do Município deve ser maior que a mesma relação no âmbito do Estado; b) a população rural em relação à população total do Município maior que a mesma relação para o Estado; c) o valor da produção agrícola por pessoa ocupada no Município ser inferior à mesma relação para o Estado como um todo. 76 QUADRO 6 - Grupos para enquadramento de crédito no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF) Pronaf Grupo A – É o primeiro crédito para os assentados da reforma agrária destinado à estruturação de suas unidades produtivas. Pronaf Grupo B – É a linha de microcrédito criada para combater a pobreza rural. Os recursos de investimento são destinados a agricultores com renda familiar anual bruta de até R$ 2 mil para financiar qualquer atividade geradora de renda. Pronaf Grupo C – Beneficia com crédito de custeio e de investimento os agricultores com renda familiar anual bruta superior a R$ 2 mil e inferior a R$ 14 mil. Pronaf Grupo A/C – É o primeiro crédito de custeio para as famílias assentadas da reforma agrária que já receberam financiamento do Grupo A. Pronaf Grupo D – Beneficia com crédito de custeio e de investimento os agricultores com renda familiar anual bruta superior a R$ 14 mil e limitada a R$ 40 mil. Grupo E (Proger Familiar Rural) – Abrange os agricultores com renda familiar anual bruta entre R$ 40 mil e R$ 60 mil, que passam a ter direito a linhas de crédito para financiamento e custeio da produção. Fonte: endereço eletrônico – www.pronaf.gov.br acessado em 12/03/2004 Adaptado pelo autor A linha PRONAF de crédito rural opera com as modalidades de crédito para custeio (Quadro–7) e crédito para investimento (Quadro–8). As condições de financiamento, para cada modalidade de crédito, são determinadas em função do enquadramento específico de cada agricultor. 77 QUADRO 7 - PRONAF modalidade de crédito custeio: valores, taxa de juro e condições especiais de financiamento. Grupo A/C: de R$ 2 mil para R$ 2,5 mil com juros de 2% ao ano, com bônus de R$ 200,00, independente do valor contratado. O prazo para pagamento é de até dois anos. Grupo C: de R$ 2 mil passou para R$ 2,5 mil, com juros de 4% ao ano e bônus de R$ 200,00, independente do valor contratado. O prazo para pagamento é de até dois anos. Grupo D: de R$ 5 mil para R$ 6 mil com juros de 4% ao ano. O prazo para pagamento é de até dois anos. Grupo E (Proger Rural Familiar): valor máximo de R$ 28 mil, com juros de 7,25% ao ano. O prazo para pagamento é de até dois anos. Fonte: endereço eletrônico – www.pronaf.gov.br acessado em 12/03/2004 Adaptado pelo autor QUADRO 8 - PRONAF modalidade de crédito investimento: valores, taxa de juro e condições especiais de financiamento. _________________________________________________________________________ Grupo A: de R$ 12 mil passou para 13,5 mil, mais R$ 1,5 mil para assistência técnica a fundo perdido, com juros de 1,15% ao ano e bônus (desconto para pagamento em dia dos financiamentos) de até 46% sobre o principal. O prazo para pagamento é de até dez anos com até cinco de carência. Grupo B: de R$ 500,00 para R$ 1 mil, com juros de 1% ao ano e bônus de 25% sobre o principal. Os agricultores terão um ano de carência e mais um ano para liquidar a operação. Grupo C: de R$ 4 mil para R$ 5 mil, com juros de 4% ao ano e bônus de 25% sobre os juros, mais bônus de R$ 700,00, independente do valor contratado. O prazo para pagamento é de até oito anos e carência de até cinco anos. Grupo D: de R$ 15 mil para R$ 18 mil, com juros de 4% ao ano e bônus de 25% sobre os juros. O prazo para pagamento é de até oito anos com carência de até cinco anos. Grupo E (Proger Rural Familiar): valor máximo de R$ 36 mil, com juros de 7,25% ao ano. O prazo para pagamento é de até oito anos com três anos de carência. Fonte: endereço eletrônico – www.pronaf.gov.br acessado em 12/03/2004 Adaptado pelo autor A criação do Grupo E ampliou significativamente os valores máximos tanto para crédito de custeio como para a modalidade investimento, mas a taxa de juros anual praticamente dobrou. Anteriormente o custeio era limitado a R$5.000,00 (ampliado atualmente para R$6.000,00) por agricultor, considerando o sistema de produção como um 78 todo e não por atividade produtiva. Para um agricultor com sistema de produção diversificado esse limite poderia ser considerado uma restrição do programa, pois teria que ser rateado para custear a somatória de atividades produtivas. Segundo ABRAMOVAY & VEIGA (1999), mesmo com esse limite relativamente pequeno, o valor médio dos contratos para crédito custeio está bem abaixo do teto máximo estabelecido pelo programa. Se por um lado não é possível identificar as razoes que levam os agricultores a solicitarem valores tão abaixo do teto estabelecido pelo programa, é possível verificar que os valores médios dos contratos não correspondem aos interesses dos agentes financeiros. Os autores argumentam que: “A escassez de recursos voltados ao crédito rural torna os maiores tomadores de empréstimo especialmente interessantes aos bancos, não tanto por sua eficiência econômica na operação desses recursos, mas, sobretudo, por sua capacidade de oferecer ao sistema bancário as garantias reais e as contrapartidas (aplicações, compra de seguros, etc.) que baixam os riscos das operações e ampliam seus ganhos colaterais”. ABRAMOVAY & VEIGA (1999:39) Devido ao baixo valor médio dos contratos efetuados com os agricultores familiares, os custos de transação tornam-se elevados quando comparado com aqueles relacionados às transações realizadas com outros segmentos da economia (agricultura patronal, comercio ou industria), servindo de justificativa para que os agentes financeiros não operem com esses agricultores. A criação da linha de crédito PRONAF rotativo, em 1997, procurou dinamizar o acesso ao crédito, principalmente para os agricultores que já tinham solicitado recursos nos anos anteriores. Essa linha de crédito segue as mesmas condições da linha de crédito custeio e pode ser renovada a cada ano. Consiste em um crédito pré-aprovado em que o agricultor só paga juros sobre o período e a quantia utilizada. O PRONAF rotativo pode ser entendido como uma estratégia para resolver parte dos problemas relacionados ao crédito rural e minimizar os custos de transação, em particular aqueles associados à coleta de informações e elaboração de contratos. Ele funciona também como uma medida de incentivo para os agricultores, pois caso o primeiro contrato seja respeitado, certamente eles terão acesso a essa forma mais simplificada de obtenção de recursos do programa. 79 Um aspecto que tem recebido atenção dos estudos sobre o PRONAF está relacionado à oferta e à demanda de recursos. De acordo com os indicadores apontando a escassez de recursos destinados ao crédito rural, observada a partir de meados da década de 1980 e o baixo grau de capitalização em que se encontrava a maioria dos agricultores familiares, esperava-se que os recursos ofertados pelo PRONAF seriam plenamente utilizados. De acordo com a Tabela–1 é possível verificar que desde o inicio do programa, em cada ano agrícola, apenas uma parte dos recursos disponibilizados pelo programa foi utilizada, contrariando essas expectativas em relação à demanda de recursos do programa. ABRAMOVAY & VEIGA (1999) identificaram alguns dos fatores que podem ajudar a compreender esse desempenho do programa: a) a maioria dos agricultores familiares nunca solicitou crédito rural e encontram dificuldades para solicitar os recursos do programa; b) o PRONAF mostrou um melhor desempenho em regiões onde a agricultura familiar está inserida em um ambiente institucional favorável, ou em que organizações correlatas têm uma postura pró-ativa em relação ao desenvolvimento desses agricultores, em regiões onde o ambiente não era propício ou onde prevalecia a agricultura patronal o programa não teve o mesmo sucesso; c) os agentes financeiros não têm interesse em transacionar com esse público, uma vez que eles não podem oferecer contrapartidas e os valores das operações estão bem abaixo da média, implicando custos de transação relativamente mais altos do que com aqueles derivados dos contratos com a agricultura patronal; Visando atender a diversidade de sistemas de produção e especificidades do universo familiar e melhorar o desempenho do PRONAF crédito rural, a cada ano agrícola, novas linhas de crédito estão sendo criadas. São linhas de crédito direcionadas a segmentos específicos da agricultora familiar, para agricultores sediados em determinadas regiões do país e para unidades de produção familiar que desenvolvem, ou pretendam desenvolver, atividades consideradas particularmente importantes tanto para a agricultura familiar como para a sociedade. As principais linhas de crédito criadas recentemente estão apresentadas no Quadro–9. KAGEYAMA (2003), em estudo recente, aplicado a uma amostra de 2.299 estabelecimentos agropecuários familiares, sendo 1.182 atendidos e 1.117 não atendidos 80 pelo crédito PRONAF, procura identificar se as unidades produtivas que receberam crédito PRONAF apresentam maiores índices de produtividade e renda do que as que não receberam. “O crédito do PRONAF mostrou-se fortemente associado com o nível tecnológico e a produtividade agrícola, sugerindo que seu papel tem sido o de substituir o antigo sistema de crédito rural subsidiado. Constatou-se, também, na amostra estudada, uma associação positiva entre a presença do PRONAF e o aumento de erosão e aumento da freqüência no uso de agrotóxicos, e não houve associação significativa entre o PRONAF e ações de recuperação de áreas degradadas”. (KAGEYAMA, 2003:12). Em relação à renda familiar não foi possível verificar se o acesso ao crédito PRONAF esta contribuindo para incrementar a renda familiar. A autora sugere que o programa deveria contribuir para que os agricultores familiares adotassem tecnologias apropriadas e fossem menos dependentes de insumos industrializados. Essas medidas seriam fundamentais para que prevaleça entre os agricultores familiares um padrão de desenvolvimento sustentável, onde não apenas os fatores econômicos de curto prazo sejam priorizados. 81 QUADRO 9 - Linhas de crédito especiais do PRONAF. _________________________________________________________________________ Pronaf Alimentos – Crédito especial para estimular a produção de cinco alimentos básicos da mesa dos brasileiros - arroz, feijão, mandioca, milho e trigo. Os agricultores terão 50% a mais de crédito, em relação à safra anterior, para a produção dessas culturas. Pronaf Semi-Árido – Crédito especial para os agricultores da região do semi-árido. Os agricultores terão recursos para a construção de pequenas obras hídricas, como cisternas, barragens para irrigação e dessalinização da água. Pronaf Mulher – As mulheres agricultoras poderão acessar crédito até 50% superior aos dos financiamentos de investimento dos grupos C e D para viabilizarem seus projetos no campo. Pronaf Jovem Rural – Os jovens que estiverem cursando o último ano em escolas técnicas agrícolas de nível médio, com idade entre 16 e 25 anos, poderão acessar crédito até 50% superior aos dos financiamentos de investimento dos grupos C e D. Pronaf Pesca – Linha de investimento para pescadores artesanais com renda familiar anual bruta até R$ 40 mil. Assim os pescadores terão recursos para modernizar e ampliar suas atividades produtivas. Pronaf Florestal – Estimula o plantio de espécies florestais, apoiando os agricultores familiares na implementação de projetos de manejo sustentável de uso múltiplo, reflorestamento e sistemas agroflorestais./ Pronaf Agroecologia – Incentivará projetos seja para a produção agroecológica ou para a transição rumo a uma agricultura sustentável. O governo estimulará o adequado manejo dos recursos naturais, agregando renda e qualidade de vida aos agricultores familiares. Pronaf Pecuária Familiar – Crédito para aquisição de animais destinados à pecuária de corte (bovinos, caprinos e ovinos), outra importante fonte de renda para a agricultura familiar. Pronaf Turismo da Agricultura Familiar - Os agricultores familiares terão mais recursos para desenvolverem projetos de turismo rural em suas propriedades, como pousadas, restaurantes e cafés coloniais, por exemplo. Pronaf Máquinas e Equipamentos – Crédito para os agricultores familiares modernizarem suas propriedades, melhorando a produção e produtividade. Fonte: endereço eletrônico – www.pronaf.gov.br acessado em 12/03/2004 Adaptado pelo autor. 82 3.2.2 Crédito Rural do Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca A criação do PRONAF, além de beneficiar diretamente os agricultores familiares por meio de suas linhas de atuação, trouxe benefícios indiretos ao consolidar, a nível nacional, um ambiente institucional favorável ao desenvolvimento da agricultura familiar. No Estado de São Paulo, e também em outros Estados do país, foram criados programas similares ao PRONAF. No estado de São Paulo, o Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca – FEAP, é popularmente divulgado como o Banco do Agronegócio Familiar – BANAGRO. Os objetivos do FEAP consistem em aplicar os recursos financeiros do fundo da seguinte forma: a) em operações de investimento rural e atividades de custeio; b) para fortalecer o setor rural no que se refere ao pequeno, médio produtor e o agronegócio familiar; c) para incentivar a introdução de métodos racionais no sistema de produção, visando ao aumento da produtividade, à melhoria do padrão de vida das populações rurais e à adequada defesa do solo e do meio ambiente. O Quadro-10 fornece as informações gerais sobre o programa de apoio a agricultura familiar exclusivo para o Estado de São Paulo e operacionalizado pelo Banco Nossa Caixa Nosso Banco. Cada linha de financiamento possui restrições específicas relacionadas: ao item a ser financiado, ao teto de financiamento, ao prazo de pagamento, ao cronograma de reembolso e à garantia exigida. Uma diferença marcante em relação ao PRONAF é que o FEAP opera apenas linhas de crédito para investimento. Para solicitar os recursos do FEAP os agricultores devem encaminhar aos agentes de crédito um projeto técnico detalhado, previamente analisado pelo órgão de extensão rural presente no município. Os extencionistas devem emitir um parecer sobre a viabilidade técnica e econômica . Como ocorre no PRONAF, a extensão rural também fica responsabilizada por atestar que o solicitante é agricultor familiar, considerando a definição de agricultor familiar estabelecida pelo FEAP. 83 QUADRO 10 - FEAP: Informações sobre as linhas de crédito para investimento. FEAP – Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca Finalidade: Presta apoio financeiro a agricultores, pecuaristas e pescadores artesanais e suas Cooperativas e Associações, em programas e projetos de interesse da economia do Estado de São Paulo, através de repasses do Tesouro Estadual, para atividades de investimento. Beneficiários: Produtores rurais, bem como as cooperativas e associações constituídas majoritariamente de pequenos produtores rurais. Teto de Financiamento: até R$ 100.000,00 Encargos financeiros: juros de 4% a.a. Prazo de pagamento: Até 4 anos, com carência de até 3 anos Exigências: comprovar pertencer a uma das categorias dos beneficiários e atender ao zoneamento agroclimático para o Estado de São Paulo relativo às linhas de financiamento disponíveis. Rebate: não tem. Garantias: Garantia hipotecária, Alienação Fiduciária do bem financiado e/ou avalista. O banco poderá solicitar um ou mais dessas garantias dependendo do valor solicitado e das características do cliente. Linhas de Financiamento: Apoio às pequenas agroindústrias; banana; café; caprinocultura; bovino de leite; bubalinocultura; irrigação/fruticultura; maricultura; máquinas e equipamentos comunitários, miniusina de leite; ovinocultura, plantio direto na palha; produção de mudas cítricas em ambiente protegido; qualidade do leite; sericicultura; produção de mudas para reflorestamento. Fonte: material de divulgação institucional do FEAP – Fundo de Expansão da Agropecuária e da Pesca.Adaptado pelo autor. 3.2.3 Linhas de crédito rural não exclusivas para agricultura familiar As linhas de crédito rural são diversificadas, inclusive para os agricultores familiares não se restringem apenas a aquelas vinculadas aos programas específicos para a agricultura familiar. Existem programas destinados à agricultura como um todo que podem atender à demanda de recursos financeiros desses agricultores. Destacam-se os programas de investimentos FINAME-Rural, o PROGER-Rural e as linhas gerais de custeio e 84 investimento para agricultura 16. As condições gerais, de cada um desses programas, estão apresentadas nos Quadros 11, 12 , 13, 14 e 15. Para explorar o potencial das linhas de crédito oferecidas pelos programas governamentais, os agricultores necessitam ter a capacidade de elaborar projetos que considerem e integrem as linhas de crédito mais genéricas com aquelas que são específicas a determinadas atividades produtivas. Ë possível elaborar um projeto que envolva varias linhas de credito simultaneamente, por exemplo, a implantação de uma nova cultura que poderia envolver recursos de uma linha de credito de custeio e recursos de linhas de credito de investimento, uma voltada para a construção de um poço artesiano, outra para o sistema de irrigação e uma outra para construção de instalações relacionadas ao armazenamento da produção ou outras atividades de apoio. A elaboração de um projeto envolvendo várias linhas de créditos pode exigir uma capacidade de analise e apresentação das justificativas e da viabilidade que o agricultor não de conta de fazer. A ausência de projetos com perspectiva de longo prazo entre os agricultores familiares e a falta de interação com as organizações que poderiam auxiliá-los nessa atividade, dificulta o processo de desenvolvimento das unidades produtivas e colabora para que não ocorra sintonia entre a oferta e a demanda de crédito rural. O crédito rural subsidiado não elimina os riscos inerentes às atividades agropecuárias. Os bancos solucionam os problemas de riscos e minimizam os custos de transação exigindo garantias dos tomadores que muitas vezes não dispõem delas para oferecer. Mesmo entre os agricultores que podem atender às exigências é comum o medo de perder os bens deixados em garantia quando se considera a parcela dos riscos associados às atividades produtivas que estão fora de seu controle. A reformulação do PROAGRO baseada no zoneamento agro-climático poderá contribuir para que os agricultores familiares tomem as suas decisões em relação às atividades produtivas, minimizando os riscos relacionados aos fatores climáticos (BUAINAIN, 1999:253). A adoção de seguro agrícola seria uma alternativa que atenderia tanto as instituições 16 Apresentação detalhada desses programas foge dos objetivos desse trabalho, além do que a cada ano agrícola, as condições gerais dos programas e as linhas específicas podem sofrer alterações. As tabelas e quadros, contendo informações dos programas e linhas de crédito rural, têm como objetivo ilustrar e oferecer informações gerais relacionadas às principais linhas de crédito, relativas ao ano agrícola 2002/2003. 85 financeiras como os agricultores, mas essa possibilidade nem sempre está disponível ou, quando está, eleva de forma significativa o custo dos contratos de crédito rural. QUADRO 11 – FINAME Agrícola ________________________________________________________________________ FINAME AGRÍCOLA Finalidade: Financiamento para aquisição de máquinas e equipamentos nacionais novos para utilização no setor agropecuário. Beneficiários: Produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas, diretamente ou por meio de suas cooperativas. Teto do financiamento: Até 80% do valor do bem a ser financiado, limitado à: • • R$ 40.000,00 para produtor rural (pessoa física); R$ 70.000,00 para produtor rural (empresa ou cooperativa). Encargos financeiros: TJLP + juros pré-fixados. Prazo de pagamento: Até 7 parcelas anuais ou 14 semestrais, vencendo-se sempre no dia 15 de cada mês. Rebates: não tem. Exigências: O valor a ser financiado, além das condições acima, não poderá exceder à: • • Garantias: 80% do faturamento líquido médio mensal dos últimos 12 meses, para empresas e cooperativas; capacidade de pagamento do produtor rural pessoa física, conforme o retorno de sua produção agropecuária. Alienação Fiduciária do bem financiado e avalista. O banco poderá solicitar outras garantias. Fonte: Banco do Brasil. Adaptado pelo autor. 86 QUADRO 12 – FINAME Especial ________________________________________________________________________ FINAME AGRÍCOLA ESPECIAL Finalidade: • • • • • • • Financiamento para aquisição, manutenção ou recuperação de: máquinas, tratores, colheitadeiras, equipamentos e implementos agrícolas; plantadeiras destinadas ao plantio direto; ordenhadeiras mecânicas, tanques de resfriamento e homogeneização de leite; sistemas de irrigação; máquinas e equipamentos para avicultura, armazéns agrícolas, suinocultura, beneficiamento ou industrialização de frutas e de produtos apícolas e para unidades de beneficiamento de sementes; implantação ou modernização de frigoríficos com atuação no âmbito municipal ou estadual; beneficiamento e conservação de pescados oriundos da aquicultura. Todos os itens acima devem ser nacionais novos cadastrados na FINAME para utilização no setor agropecuário por empresa, cooperativa ou produtor rural usuários do bem a ser financiado. Beneficiários: Produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas, diretamente ou por meio de suas cooperativas. Teto do financiamento: Até 80% do valor do bem a ser financiado, limitado à R$ 40.000,00. Encargos financeiros: Juros pré-fixados de 11,95% ao ano. Prazo de pagamento: Até 5 parcelas anuais ou 10 semestrais, vencendo-se sempre no dia 15 de cada mês. Exigências: O valor a ser financiado, além das condições acima, não poderá exceder à: • 80% do faturamento líquido médio mensal dos últimos 12 meses, para empresas e cooperativas; • capacidade de pagamento do produtor rural pessoa física, conforme o retorno de sua produção agropecuária. Garantias: Alienação Fiduciária do bem financiado e avalista. O banco poderá solicitar outras garantias. _____________________________________________________________________________________ Fonte: Banco do Brasil. Adaptado pelo autor. 87 QUADRO 13– FINAME Agrícola Modernização da Frota ________________________________________________________________________ FINAME AGRICOLA MODERNIZAÇÃO DA FROTA Finalidade: Financiamento para aquisição de: tratores agrícolas e seus implementos; • colheitadeiras; • equipamentos de preparo, secagem e beneficiamento de café para produtor rural com • renda bruta anual inferior a R$ 60.000,00. Todos os itens acima devem ser nacionais novos cadastrados na FINAME para utilização no setor agropecuário por empresa, cooperativa ou produtor rural usuários do bem a ser financiado Beneficiários: Produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas, diretamente ou por meio de suas cooperativas. Teto do financiamento : até 100% do valor do bem a ser financiado, limitado à: R$ 70.000,00 para tratores e colheitadeiras; R$ 20.000,00 para equipamentos de preparo, secagem e beneficiamento de café. O percentual financiado é limitado ao prazo da operação e à renda bruta anual do tomador. • • Para tomadores com Renda Bruta Anual inferior à R$ 150 mil: • • • Prazo até 3 anos para todos os itens: financiamento de até 100% do valor do bem; Prazo até 5 anos para todos os itens: financiamento de até 90% do valor do bem; Prazo até 6 anos para colheitadeiras: financiamento de até 80% do valor do bem. Para tomadores com Renda Bruta Anual igual ou superior à R$ 150 mil: • • • Prazo até 3 anos para todos os itens: financiamento de até 80% do valor do bem; Prazo até 5 anos para todos os itens: financiamento de até 75% do valor do bem; Prazo até 6 anos para colheitadeiras: financiamento de até 70% do valor do bem. Encargos financeiros: Juros pré-fixados de acordo com a renda bruta anual do tomador: • • 9,75% ao ano para renda inferior à R$ 150 mil; 12,75% ao ano para renda igual ou superior à R$ 150 mil. Prazo de pagamento : Parcelas anuais ou semestrais, de acordo com os prazos acima mencionados, vencendo-se sempre no dia 15 de cada mês. Exigências: O valor a ser financiado não pode exceder à: • • Garantias : 80% do faturamento líquido médio mensal dos últimos 12 meses, para empresas e cooperativas; capacidade de pagamento do produtor rural pessoa física, conforme o retorno de sua produção agropecuária. Alienação Fiduciária do bem financiado e avalista. O banco poderá solicitar outras garantias. _____________________________________________________________________________________ Fonte: Banco do Brasil. Adaptado pelo autor. 88 QUADRO 14 - PROGER RURAL _________________________________________________________________________ PROGER Rural - Programa de Geração de Emprego e Renda Rural Finalidade: Crédito fixo para custeio agrícola e pecuário. Também lhe dá suporte financeiro para investimento fixos e semifixos. Tem ainda o crédito rotativo, com renovação automática, para custeio de atividades agropecuárias Beneficiários: Produtor rural, que explora parcela de terra como proprietário, posseiro, arrendatário ou parceiro, executa o trabalho sozinho ou com sua família ou com a ajuda de terceiros.O produtor não pode ter área de terra superior a quatro ou seis módulos fiscais, mesmo sob arrendamento. Sua renda deve ser, no mínimo de 80%, oriunda da atividade agropecuária ou extrativa vegetal. Comprove que reside na terra ou em aglomerado urbano ou rural próximo, que sua renda bruta anual é de até R$ 48.000,00. Se pessoa jurídica, comprove que está adimplente com as obrigações trabalhistas, previdenciárias e fiscais, e, se pessoa física, regularidade com a previdência social, no decorrer da vigência do contrato. Teto do financiamento:Para custeio agrícola e pecuário, o teto é de R$ 42.000,00 por beneficiário/safra. Para investimento individual, até o limite de R$ 42.000,00, e investimento coletivo, até o limite de R$210.000,00, limitado a R$ 42.000,00 por participante (a somatório dos financiamentos de custeio e de investimento não pode ultrapassar R$60.000,00 por produtor). Para quem solicita crédito rotativo, o teto é de R$ 15.000,00 por beneficiário, observados os créditos concedidos ao amparo do PROGER. Encargos Financeiros: Recursos para custeio agrícola e pecuário ou investimento, os juros efetivos são de 8,75 % ao ano. Prazo de Pagamento: O prazo é de 01 ou 02, conforme o crédito solicitado. Nos investimentos, prazo de até 05 anos e carência de até 18 meses. E o pagamento é feito de acordo com o retorno financeiro da atividade beneficiada com o crédito e o ciclo da atividade assistida. Rebate: não tem Garantias Exigidas: Alienação Fiduciária do bem financiado e avalista. O banco poderá solicitar outras garantias. Fonte: Banco do Brasil. Adaptado pelo autor. 89 QUADRO 15 - Crédito rural para custeio e investimento agropecuários Linhas vinculadas aos Recursos Obrigatórios para o Crédito Rural Finalidade: Custeio Investimento Beneficiários: Produtores rurais, pessoas físicas ou jurídicas, diretamente ou por meio de suas cooperativas. Teto do financiamento: R$ 60.000,00 (até 80.00,00 se milho, soja, Citrus) safra 2002/2003 Encargos Financeiros: taxa de juros: 8,75%aa Prazo de Pagamento: 2 meses após a colheita Rebate : não tem Garantias Exigidas: R$ 40.00,00 por cliente (*) taxa de juros: 8,75%aa 3 anos (pagamento direto ao fornecedor) Hipoteca, Alienação Fiduciária do bem financiado e/ou avalista. O banco poderá solicitar outras garantias. (*) Linhas de investimento para os Recursos Obrigatórios - poços artesianos: 80% limitado R$ 20000.00,00 - cana : 100% limitado R$ 40000.00,00 - máquinas e equipamentos novos: 80% orçado limitado R$ 10.000,00 - máquinas e equipamentos usados (até 10 anos): 80% orçado limitado R$ 10.000,00 - construção, reforma ou ampliação de benfeitorias: 100% orçado limitado R$ 40000.00,00 - melhorias terreno: 100% orçado limitado R$ 40.000,00 (irrigação, drenagem, proteção e recuperação do solo) - pastagem: 100% orçado limitado R$ 40.000,00 - eletrificação e telefonia: 100% orçado limitado R$ 40.000,00 - animais de pequeno e médio portes: 100% limitado R$ 40.000,00 - animais de serviço: 100 % orçado limitado R$ 40.000,00 - proteção anti-granizo: 100% orçado limitado R$ 40.000,00 - tratores, colheitadeiras e implementos novos: 90% orçamento limitado R$ 40.000,00 - matrizes bovinas de corte: 100% orçado limitado 30.000,00 Fonte: Banco do Brasil. Adaptado pelo autor. 90 Além dessas linhas de crédito vinculadas a programas governamentais, os bancos disponibilizam um conjunto variado de opções. Porém, algumas dessas opções possuem taxa de juros elevadas e condições de pagamento inadequadas para as atividades produtivas dos agricultores familiares, a exemplo do crédito pessoal, cheque especial, leasing. Outras linhas, apesar de serem factíveis, possuem exigências adicionais. O Banco do Brasil, por exemplo, disponibiliza recursos para produtores rurais integrados a cooperativas e para produtores com certificação de produtor orgânico. 3.3 Mercado Informal, crédito de fornecedores e compradores. Alguns autores chamam atenção para relevância do mercado informal de crédito rural, em regiões onde o ambiente institucional não é favorável ao desenvolvimento do mercado formal (STIGLITZ, 1993; GENTIL & FOURRIER, 1995). O mercado informal de crédito é aquele formado principalmente por fornecedores de insumos, intermediadores comerciais da produção agropecuária e agroindústrias. Ele também conta com a participação de atores como parentes e amigos, dos tomadores de crédito, e agiotas. As relações sociais determinam as taxas de juros no mercado informal de crédito. Elas podem variar de zero, geralmente em situações envolvendo atores com fortes laços familiares, até taxas elevadíssimas, sendo, teoricamente e racionalmente, proibitiva para os tomadores, geralmente são as transações com agiotas. A relevância do mercado informal, em uma determinada região, está relacionada à inexistência do mercado formal ou às restrições encontradas pelos tomadores de crédito para operar nesse mercado. Não contar com o título de propriedade da terra ou com bens de capital para oferecer de garantia nas transações, não impede os agricultores de acessar o mercado informal. A relativa facilidade encontrada para operar com mercado informal, principalmente junto aos fornecedores de insumos, é um dos fatores que colaboram para que os agricultores menos capitalizados permaneçam nas atividades produtivas. Além do mais, problemas típicos do mercado de crédito formal como obter informação do cliente, monitorar a aplicação dos recursos e as atividades produtivas, incentivos ao cumprimento dos contratos são minimizados pela construção de uma relação de confiança que se reforça com o passar do tempo. Os riscos envolvidos nas transações, apesar de presentes com em 91 qualquer transação, estão restritos a somas relativamente pequenas e o acompanhamento das atividades produtivas de cada cliente, durante os anos sucessivos, permite uma melhor avaliação dos riscos envolvidos em cada situação. A freqüência com que as transações ocorrem diminuem o grau de incerteza. Uma outra característica do mercado informal é envolver outros serviços além do crédito, como por exemplo, a assistência técnica (fornecedores) e a garantia de comercialização da produção (intermediários e agroindústria). Os fornecedores de insumos e as agroindústrias estão permanentemente em contato com o mercado de crédito rural (formal) e, portanto, podem facilitar o acesso dos agricultores a esse mercado, principalmente nas situações onde o crédito é destinado especificamente para a aquisição de determinado insumo ou para as atividades envolvidas na comercialização da produção. O estabelecimento de confiança entre fornecedores e agricultores e o interesse dos agentes de crédito em vincular os empréstimos à aquisição de insumos explica, em grande parte, a relação entre crédito rural e a adoção de padrões tecnológicos dependente de insumos industrializados. 3.4 Organizações correlatas ao crédito rural Nessa seção do trabalho foram analisadas algumas a atuação de algumas das principais organizações relacionadas à operacionalização do crédito rural: os bancos, a extensão rural, os sindicatos rurais, os fundos de aval e as associações e cooperativas de agricultores. 3.4.1 Bancos oficiais e privados No Brasil, a partir de 1980, o Estado passa a ter uma atuação mais modesta nos mercados em que tradicionalmente sua participação era determinante, a exemplo dos setores de serviços financeiros, de saúde, de segurança, telecomunicações e energia. Para a agricultura o mercado de crédito rural foi um dos setores onde esse processo pôde ser facilmente percebido, pela significativa diminuição dos recursos disponibilizados para o financiamento das atividades do setor (BUAINAIN, 1999). Além da redução da oferta de crédito os bancos públicos, operadores oficiais dos programas governamentais, seguiram a tendência dos bancos privados em investir em tecnologia de informação para automatizar o atendimento dos clientes, com as prioridades 92 voltadas para os serviços destinados à população urbana: movimentação de conta corrente, poupança, pagamentos e recebimento de contas, fornecimento de talão de cheques, crédito pessoal, financiamento de bens de consumo. Ocorreu um crescimento da oferta de serviços financeiros, mas voltado fundamentalmente para a população urbana e seguindo as taxas de juros predominantes no mercado. Os serviços financeiros destinados à população rural, que já não eram muitos, proporcionalmente, passaram a ser menores ainda. Em relação à agricultura, os bancos continuaram a atender os clientes consolidados, que historicamente foram os médios e grandes produtores rurais, pois esse público, além de movimentarem quantias relativamente superiores às dos pequenos produtores, sempre tiveram maiores condições de oferecer garantias reais para as operações de crédito rural e de adquirir outros produtos oferecidos pelos bancos (seguros, títulos de capitalização, poupança, etc), muitas vezes oferecidos como contrapartidas para a liberação dos recursos solicitados. Com a criação dos programas especiais para a agricultura familiar, os bancos públicos foram responsabilizados pela operacionalização das vertentes relacionadas ao crédito rural. No Estado de São Paulo os recursos de crédito rural vinculado ao FEAP, são movimentados exclusivamente por intermédio do Banco Nossa Caixa Nosso Banco. Já para as linhas de crédito rural do PRONAF, apesar do Banco do Brasil ser o principal agente operador, outros bancos também podem operá-las, desde que atendam as exigências estabelecidas pelo Banco Central. Nos municípios onde a economia é diversificada e além das atividades agropecuárias, as atividades industriais e comerciais estão presentes, os bancos atendem os agricultores que já são antigos clientes e priorizam a expansão das carteiras de clientes vinculados à indústrias e ao comercio. As razões que motivam a adoção dessa política são a localização geográfica dos clientes, os montantes de recursos transacionados, os riscos inerentes as atividades produtivas e as taxas de juros praticadas para cada segmento. Para a agricultura as principais linhas de crédito possuem taxas de juros subsidiadas e prédeterminadas pelo governo. Além disso, o acompanhamento das atividades produtivas e o contato com os agricultores exigem a disponibilidade de profissionais capacitados, como também de um tempo relativamente grande para efetuar as visitas periódicas. Os agricultores localizados nesses municípios e que nunca tiveram contato com os agentes financeiros ou possuem um relacionamento eventual, passaram a enfrentar maiores 93 dificuldades para acessar o crédito rural. Já nos municípios de economia fundamentalmente agropecuária esses agricultores, geralmente, encontram maiores facilidades. Segundo BITTENCOURT (2003), tanto o Banco Mundial quanto o Banco Interamericano, com base em experiências bem sucedidas na Ásia e na América Latina, vêm, sistematicamente, sugerindo aos países em desenvolvimento que incentivem a criação de Instituições de Micro-Finanças Rurais (IMFRs) a fim de oferecer serviços adequados aos agricultores de economia familiar. As IMFRs prestariam os serviços oferecidos pelos demais agentes financeiros (bancos, cooperativas, financeiras, etc) para o público excluído do sistema financeiro tradicional. O crédito rural envolvendo pequenos agricultores e somas de recursos relativamente baixos estaria entre os principais serviços oferecidos pelas IMFRs. O sucesso das IMFRs depende da rapidez com que os serviços são oferecidos, sua localização e a simplificação das transações, principalmente com relação às exigências e garantias , e atender as principais demandas da população descapitalizada. Segundo BRUSKY & FORTUNA (2002) apud BITTENCOURT (2003), essas demandas financeiras estão associadas as seguintes necessidades: “ a) Emergenciais: doenças e gastos com médicos; b) Eventos sazonais: final de ano, impostos e material escolar; c) Eventos do ciclo da vida: morte, casamento e outras festas; d) Oportunidades: reforma da casa, educação, iniciar ou ampliar um negócio.” (BITTENCOURT, 2003:19). Um importante aspecto que deve ser considerado em relação as IMFRs é a sua sustentabilidade. Se por um lado elas podem atender as necessidades de um público particular, essa característica pode, no longo prazo, colocar em risco a sua própria sustentabilidade, uma vez que as suas atividades serão pouco diversificadas e relacionadas a riscos inerentes às atividades agropecuárias. Essa é uma das principais razões que levam essas organizações a uma certa dependência em relação a recursos a fundo perdido que são repassados por instituições que têm uma estreita relação com programas sociais, compromissados com a melhoria das condições de vida das populações mais pobres. No Brasil, as agências financeiras denominadas Banco do Povo são exemplos de Instituições de Micro-Finanças, cuja inspiração é o Grameen Bank, descrito na próxima seção. Porém, o público do Banco do Povo é predominantemente a população 94 urbana. Eles podem operar com a população rural, mas apenas recursos destinados a investimentos. No Estado de São Paulo, as agências do Banco do Povo estão vinculadas ao Banco Nossa Caixa Nosso Banco. As informações gerais sobre as operações disponibilizadas pelo Banco do Povo estão apresentadas no Quadro-16. QUADRO 16 - Informações referentes às operações disponíveis no Banco do Povo para os Municípios do Estado de São Paulo. _________________________________________________________________________ Linhas de Crédito do Banco do Povo - SP Finalidade: oferecer crédito para setores da economia formal e informal, onde o sistema financeiro tradicional está ausente. Visa atender microempreendedores, incentivando a geração de empregos e renda, principalmente entre a população de baixa renda. Beneficiários: população de baixa renda. Teto de financiamento: de R$200,00 a R$5.000,00 (pessoa física e jurídica). de R$200,00 a R$25.000,00 (para cooperativas e associações). Encargos financeiros: juros de 1% ao mês. Exigências: Pessoas físicas – trabalhar por conta própria ou ter um negócio que contribua para a renda familiar. Residir em endereço fixo há pelo menos 2 anos no município. Pessoas jurídicas – ter apresentado, no exercício anterior ao pedido de empréstimo, um faturamento bruto inferior a R$87.300,00. Cooperativas e associações – serem legalmente constituídas e associem o trabalho e a gestão do empreendimento. Destino dos recursos: os recursos são destinados para investimento (aquisição de máquinas e equipamentos) e também para capital de giro. Garantias exigidas: alienação do bem ou aval. Fonte: Banco Nossa Caixa Nosso Banco. Adaptado pelo autor. O apoio do Banco do Povo Paulista não se destina ao pagamento de dívidas, à aquisição de insumos básicos para o setor rural, à aquisição de veículos de passeio ou atividades ilegais, como a comercialização de produtos contrabandeados, fabricação e comercialização de produtos com marcas pirateadas. Para as atividades agropecuárias o Banco do Povo Paulista basicamente disponibiliza recursos para investimentos. 95 3.4.2 Cooperativas de Crédito Desde seu inicio, o capitalismo industrial provocou mudanças profundas na sociedade. Particularmente afetados foram os artesãos que com a introdução das máquinas e a organização do trabalho em fábricas, tiveram suas oportunidades de trabalho e de controle da produção extremamente reduzidas. Neste contexto é que surgiram as primeiras iniciativas cooperativistas, sustentadas pela autogestão e não por trabalho assalariado. Essas experiências estavam intimamente ligadas à formação de sindicatos e com objetivos de criar uma alternativa à organização industrial capitalista, em rápida expansão. SINGER (2002) relata a importância de Robert Owen para o surgimento do cooperativismo, indicando que já em 1821, “a primeira cooperativa owenista foi criada por George Mudie, que reuniu um grupo de jornalistas e gráficos em Londres e propôs que formassem uma comunidade para juntos viverem dos ganhos de suas atividades profissionais” (SINGER, 2002:27). Apesar das contribuições de Owen e das experiências cooperativistas do inicio do século XIX, a experiência dos Pioneiros de Rochdale, em 1844, ficou conhecida como o marco inicial do cooperativismo e consolidou os princípios cooperativistas. A partir de meados do século XIX inúmeras experiências cooperativistas aconteceram em diversos locais diferentes tanto na Europa como na América, especificamente Canadá e Estados Unidos. O cooperativismo de consumo foi responsável pela divulgação dos princípios cooperativistas, mas entre os seus principais objetivos estava a constituição de cooperativas de produção, uma vez que só assim os seus participantes assumiram o controle do ritmo e do fruto de seu trabalho. O cooperativismo de crédito surge para potencializar os mais pobres a enfrentar as adversidades como doenças, crises econômicas, guerras. Para a população rural se somam os problemas relacionados a dependência dos fatores climáticos, a sazonalidade da produção e o ciclo relativamente longo da maioria da atividades agropecuárias. As primeiras experiências ocorreram na Alemanha, em 18** tanto para as cooperativas de crédito urbanas como para as rurais. Além dos princípios cooperativistas, elas tinham uma característica particular: a responsabilidade ilimitada. Quando era necessário recorrer ao mercado para suprir as necessidades de todos os membros, todos os participantes se responsabilizavam pelos empréstimos obtidos no mercado, por meio da 96 garantia solidária. Em relação à finalidade dos empréstimos, estes tinham como prioridade financiar investimentos relacionados à produção e a principal garantia era o caráter dos participantes. “Como todos penhoravam juntos os seus bens, era de interesse de cada um admitir como sócios pessoas sóbrias, de hábitos regulares e frugais” (SINGER, 2002:62). Essas cooperativas ficaram conhecidas como “Bancos do Povo”. Segundo Paul Singer, “Em sua origem, a cooperativa de crédito não é um intermediário financeiro, como o são os bancos e as companhias de seguro, por exemplo, mas uma associação de pequenos poupadores que se unem para potencializar seu acesso a crédito mediante o financiamento mútuo” (SINGER, 2002:67). Nos países desenvolvidos as cooperativas de crédito tornaram-se grandes organizações financeiras, fundamentais no processo de democratização e acesso aos serviços oferecidos pelo sistema financeiro. Já nos países em desenvolvimento, o cooperativismo em geral e especificamente o de crédito não tem a mesma penetração que ocorre nos países desenvolvidos. No Terceiro Mundo, a maioria da população encontra-se excluída do sistema financeiro ou quando tem acesso a esses serviços os custos são elevadíssimos (altas taxas de juros, taxas de contrato, etc), pois as instituições que se propõem a transacionar com a população de baixa renda alegam alto risco, alto custo para obter informações e alto custos de transação devido os valores médios dos contratos serem baixo. Uma experiência que teve repercussão no mundo todo foi a do Grameen Bank, em Bangladesh, cujo objetivo foi combater a pobreza do país dando uma alternativa para que população pobre pudesse sair da dependência dos comerciantes agiotas. O Grameen Bank iniciou como uma experiência acadêmica e teve algumas características peculiares e diferentes das cooperativas de crédito cujos membros compartilhavam responsabilidade ilimitada. Uma delas foi conceder empréstimos apenas a mulheres, pois acreditavam que elas seriam mais prudentes na utilização dos recursos, priorizando as necessidades da família. Um outro ponto diferencial dessa experiência está relacionado à pobreza da população atendida. Como os clientes não possuíam garantias reais para oferecer, foi adotado o aval solidário. Inicialmente, os empréstimos eram concedidos a grupos de cinco mulheres que se responsabilizavam coletivamente pelos empréstimos 97 individuais. Se uma das clientes não pagasse a dívida, as demais se responsabilizavam, caso contrário, todas seriam desligadas do Banco (GRAMEEN, 1992). Uma outra importante característica do Grameen foi a estratégia utilizada para ampliar sua clientela. Consistia em ter funcionários específicos para divulgar as oportunidades oferecidas pelo Banco. Esses funcionários, além de identificar os potenciais tomadores de recursos e seleciona-los, também tinham a função de acompanhar os grupos formados e identificar potenciais lideranças que auxiliariam a garantir o sucesso do grupo. Essa característica é uma inovação em termos de organizar o atendimento ao publico excluído do sistema bancário convencional, pois as agências bancárias não existiam fisicamente, mas sim nas figuras dos seus agentes de crédito que se deslocavam até as comunidades interessadas em adquirir recursos do Grameen. A experiência do Grameen fornece um modelo para contornar um dos problemas relacionados aos programas de crédito especiais destinados a públicos alvos empobrecidos, como é o caso dos programas de crédito rural destinados a agricultura familiar. A maioria das cooperativas de crédito rural surgiu atrelada às cooperativas de produção e comercialização para viabilizar as operações financeiras entre os agricultores e o mercado de insumos agrícolas. Como essas cooperativas seguiram o modelo de desenvolvimento difundido durante a chamada “revolução verde”, somente os agricultores familiares mais capitalizados ou próximos a complexos agroindustriais participaram dessas organizações cooperativas. Conseqüentemente, a maioria dos agricultores familiares também não participou dessas organizações. No final da década de 1980, no Estado do Paraná, iniciou-se um processo de aprendizado institucional a partir de uma experiência com fundos rotativos de crédito destinados a pequenos produtores familiares excluídos do sistema oficial de crédito rural. Em 1995, esse processo resultou no surgimento de uma nova modalidade de cooperativa de crédito rural denominado: Sistema Cresol de Cooperativas de Crédito com Interação Solidária17. Estas cooperativas diferenciam-se das tradicionais por terem como cooperados agricultores familiares locais e estarem interligadas por uma central de serviços, a BASER/Cresol, responsável pela contabilidade e padronização das operações executadas pelas cooperativas que integram o sistema. Atualmente o Sistema Cresol cobre grande 17 Mais detalhes sobre a história do Sistema Cresol estão disponíveis no endereço eletrônico www.cresol.com.br 98 parte da região sul do país, atendendo a mais de 25 mil associados em 192 municípios, operando com 69 unidades cooperativas18. O sistema Cresol tem como objetivo canalizar recursos de diversas fontes (municipal, estadual, federal e internacional) facilitando e simplificando o acesso ao crédito rural para incentivar o desenvolvimento das regiões onde atuam. Para isso, procuram canalizar as energias provenientes de várias organizações presentes nas comunidades locais, como os sindicatos rurais, a pastoral rural, organizações nãogovernamentais, e daquelas instituições que defendem os interesses dos agricultores familiares nas esferas estadual e federal, como a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG e o Departamento de Estudos Sócio-Econômicos Rurais DESER. As cooperativas prestam vários serviços aos agricultores familiares, idênticos a aqueles que são oferecidos pelo sistema bancário convencional, como a poupança, empréstimos pessoais, fornecimento de talões de cheques, entre outros. Porém ao captar recursos da população local, estes recursos são reinvestidos em atividades da própria comunidade a uma taxa de juro definida pela cooperativa com ampla autonomia, visando cobrir os custos operacionais das transações e não com a intenção de ampliar as margens de lucros, como é típico do sistema bancário. O volume de recursos provenientes dos programas especiais e operacionalizados diretamente pelas cooperativas de crédito poderia ser superior, pois esse volume é proporcional ao patrimônio líquido apresentado por elas. Como as cooperativas não possuem um patrimônio do porte apresentado pelos agentes oficiais (Banco do Brasil e Bancos Estaduais) elas muitas vezes funcionam como intermediadoras entre os agricultores e os agentes oficiais, cuidando das atividades de obtenção de informações e garantias, formando grupos de agricultores que praticam o aval cruzado, ou, em algumas situações especiais, elas avalizam as transações, principalmente em operações de investimento. A atuação das cooperativas de crédito acaba por explicitar a falta de sintonia entre os agentes financeiros oficiais, responsáveis pela operacionalização dos programas de crédito destinados à agricultura familiar, e os objetivos destes programas. Mesmo as cooperativas se responsabilizando pelos riscos e pelas atividades operacionais envolvidas nestes tipos de contratos, elas recebem muito pouco do que é cobrado pelos agentes oficiais 18 Dados coletados em consulta realizada no dia 24/06/2003 ao endereço www.cresol.com.br 99 junto ao tesouro (BITENCOURTT, 2003). Sem correr risco e tendo muito pouco trabalho, os agentes oficiais se apropriam oportunamente de recursos do tesouro, alegando altos riscos para transacionar com esse público. 3.4.3 Fundos de Aval No Brasil, os fundos de aval são iniciativas bastante recentes e com origens diferenciadas. O governo federal anunciou a criação de um fundo de aval federal para dar suporte ao PRONAF, mas ainda não foi consolidado. Iniciativas por parte de vários governos estaduais também criaram fundos de aval com o objetivo de dar suporte às atividades agropecuárias e às mini e micros empresas urbanas, mas também ainda tem uma atuação inexpressiva. As iniciativas dos fundos de aval mais bem sucedidos são aquelas de âmbito municipal, como as experiências de vários municípios da região Sul e Nordeste do país. (PERACI & BIANCHINI, 2002). A principal função dos fundos é propiciar garantias às instituições financeiras que operacionalizam os financiamentos dos programas de crédito especiais para a agricultura familiar. Eles suprem a carência dos agricultores familiares que não possuem as garantias reais exigidas para a concessão do crédito, como avalistas e a titulação da terra. Os fundos são constituídos a partir de diversos arranjos institucionais, com a participação de várias organizações e agentes locais e regionais. As prefeituras municipais têm desempenhado um importante papel em experiências bem sucedidas, colaborando com o aporte inicial de capital para a constituição dos fundos e dando suporte para o seu funcionamento. A manutenção dos fundos é garantida por uma porcentagem paga, pelos agricultores ou empreendedores urbanos, sobre os valores dos contratos aprovados e avalizados pelo fundo. Segundo PERACI & BIANCHINI (2002:10), o fundo de aval criado e, inicialmente, administrado pela prefeitura municipal de Francisco Beltrão, no Estado do Paraná, serviu de referência para outras iniciativas similares. No início, essa experiência teve parecer jurídico contrário à sua concepção, pois foi alegado não ser permitido a uma instituição pública (prefeitura) avalizar e arcar com os riscos de uma parcela particular da população que participe de operações financeiras com possibilidades de gerar lucro. Para contornar esse problema, o fundo passou a ser administrado por uma Organização da 100 Sociedade Civil de Interesse Público - OSCIP, regulamentada pela Lei n. 9.760, de 23 de março de 1999. A atuação dos fundos consiste em selecionar e garantir um grupo de tomadores de crédito, que se avalizam mutuamente em operações junto às instituições de crédito oficiais. O processo de formação dos grupos e a prática do aval cruzado são mecanismos que tendem a diminuir o comportamento oportunista, pois os candidatos geralmente já se conhecem, contribuindo para a qualidade dos grupos constituídos. A coleta de informação sobre os participantes fica facilitada e a responsabilidade pelo sucesso do grupo age como um incentivo ao esforço individual e à prática coletiva. O monitoramento é feito pelos pares, estimulando um processo de cooperação que é fundamental para o sucesso das atividades produtivas. Apesar dos fundos não emprestarem os recursos para os tomadores, o seu papel é importante para viabilizar o acesso ao crédito e contribuir para o sucesso das atividades dos agricultores, pois as associações gestoras dos fundos auxiliam na elaboração dos projetos, acompanham as atividades e criam condições para que, de uma forma individual ou coletiva, ocorra capacitação dos agricultores envolvidos. As próprias instituições financeiras, principalmente o Banco do Brasil e o Banco do Nordeste, estimulam a constituição dos fundos de aval. Além de protegê-las dos eventuais riscos envolvidos nas operações com os agricultores, trazem outros benefícios e reduções de custos, como a coleta de informações e seleção dos candidatos ao crédito, monitoramento e assistência técnica dos projetos. Além disso, os fundos movimentam significativas somas de recursos, administrados pelas instituições financeiras. Os fundos contribuem no processo de operacionalização dos programas de crédito reduzindo os riscos e os custos dos contratos. Apesar disso, as instituições financeiras continuam cobrando uma taxa por contrato, paga pelo tomador, além da taxa cobrada para operar com este público, paga pelo tesouro nacional, alegando alto risco e elevado custo nas transações com os agricultores familiares. Além de ampliarem o número de agricultores atendidos pelos programas de crédito, os fundos contribuem para gerar uma transformação na comunidade que participa do processo de sua criação e operacionalização. O crédito funciona como um catalisador para diversas outras atividades que complementam as necessidades dos agricultores, como o estímulo ao trabalho em grupo, o aprendizado individual e coletivo, o contato com a 101 assistência técnica que acompanha o desenvolvimento das atividades e monitora os projetos. Este conjunto de atividades contribui para a inclusão social dos agricultores familiares na comunidade e fortalece as relações sociais entre os diversos agentes que participam desse processo. Um dos aspectos que demonstram o sucesso dos fundos de aval é a baixa taxa de inadimplência entre os agricultores que participaram dessas experiências. Ela eventualmente acontece apenas em regiões onde as condições ambientais e climáticas comprometem o desempenho das atividades agrícolas, como no sertão nordestino. Nessa situação particular percebe-se que a inadimplência não acontece por uma prática desonesta dos agricultores, pois a maioria dos agricultores da comunidade acaba ficando sem condições de saldar seus compromissos. Por um lado, esse aspecto demonstra a fragilidade econômica desses agricultores e aponta para um horizonte de longo prazo para a consolidação do processo de desenvolvimento e sustentabilidade da agricultura local. Por outro, também demonstra que a ocorrência de problemas climáticos em anos sucessivos pode comprometer as reservas dos fundos e levá-los a extinção. Apesar do sucesso dessas iniciativas, deve ser considerado que os fundos de aval acabam por elevar de forma significativa as taxas médias de juros pagas pelos agricultores. O encarecimento do crédito se dá pela necessidade do agricultor contribuir com uma porcentagem dos valores tomados em empréstimo para a manutenção fundo. Essa contribuição varia em média entre 1 % a 8 %. Considerando que a taxa de juro das linhas de crédito do PRONAF varia entre 1 % a 4 % ao ano, pode-se perceber o aumento significativo para os contratos garantidos pelos fundos de aval, mesmo para os contratos com duração de mais de um ano. Os fundos de aval preenchem um espaço que, na teoria, deveria ser ocupado pelas organizações financeiras, que cobram altas taxas para operar os programas de crédito. As demais organizações destacadas na concepção teórica desses programas, como a extensão rural, com suas unidades de assistência técnica e pesquisa, e os sindicatos rurais, não têm o poder de interferir na operacionalização dos programas como os agentes financeiros e, por isso, muitas vezes acabam participando como estimuladores das Associações gestoras dos fundos. Tanto as mudanças institucionais, fruto da política agrícola voltada à agricultura familiar, como as iniciativas de diversas comunidades buscando ampliar cada 102 vez mais o universo dos agricultores atendidos pelos programas especiais, proporcionaram avanços significativos para um segmento que quase sempre esteve à margem das políticas anteriores. Mas também é notório que esse processo ainda está concentrado em poucas regiões do país, principalmente na região Sul que, historicamente, já possuía uma agricultura familiar mais unida e articulada. Os fundos de aval mostraram-se como uma alternativa aos obstáculos encontrados pelos agricultores que tem dificuldades para oferecer as garantias exigidas pela rede bancária, apesar do encarecimento do crédito devido à cobrança da taxa de contribuição destinada ao fundo. Mas esta solução tende a ser uma fase de aprendizado coletivo para que os agentes envolvidos, principalmente os agricultores, encontrem uma solução estável tanto para o crédito como para as tantas outras questões relacionadas à gestão das atividades agropecuárias e o desenvolvimento rural da comunidade. Segundo SCHRÖDER (2002), as experiências bem sucedidas das cooperativas de crédito, como as do Sistema Cresol, podem servir de exemplos para que formuladores de políticas públicas incrementem a participação das cooperativas de crédito junto ao sistema financeiro nacional. As cooperativas do Sistema Cresol demonstraram maior facilidade para interagir e atingir o público alvo dos programas - os agricultores familiares – como também a sua maior eficácia na operacionalização do crédito rural, inclusive com a possibilidade de diminuir os custos dos contratos. A diminuição dos custos fica evidente se for considerado a atual política das instituições oficiais que apenas repassam os recursos dos programas para as cooperativas e cobram como se estivessem correndo riscos e desenvolvendo todo o trabalho de elaboração e aprovação dos contratos por ela executados. 3.4.4 Empresas Oficiais de Extensão Rural. Uma das vertentes da política de desenvolvimento da agricultura brasileira teve como preocupação a pesquisa agropecuária e os serviços de extensão e assistência técnica. No inicio da década de 1970 foram criadas a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e a Empresa Brasileira de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMBRATER), além de organizações criadas no âmbito dos Estados e dos Municípios, constituindo redes de pesquisa e extensão rural com alto grau de capilaridade. A rede de pesquisa, coordenada pela EMBRAPA, tinha como função desenvolver e adaptar 103 novas tecnologias agropecuárias para atender às necessidades brasileiras e a rede de assistência técnica e extensão rural, coordenada pela EMBRATER, por sua vez, difundiria as novas tecnologias para as diferentes regiões do país. Segundo BUAINAIN (1999), a partir da década de 1980, a diminuição da intervenção do Estado nos diversos setores da economia também se repercutiu na agricultura. Uma das políticas agrícolas mais afetadas foi à relacionada aos serviços de assistência técnica e extensão rural, servindo de exemplo a extinção da própria EMBRATER. Além disso, as organizações que compunham a rede de extensão rural tiveram seus orçamentos reduzidos e as contratações de pessoal cada vez mais raras. A prática dessa política durante anos sucessivos levou ao desmantelamento e precariedade dos serviços de extensão rural que perdura até os dias atuais. As principais atividades executadas pelas empresas de assistência técnica e extensão rural são: acompanhamento e orientação das atividades desenvolvidas nas unidades de produção agropecuária de cada município e o auxilio à elaboração dos projetos técnicos para a solicitação de crédito rural. Como indicam ABRAMOVAY & VEIGA, “ a extensão rural, desde seus primórdios em Minas Gerais, até o período dos pacotes tecnológicos dos anos 70, teve sempre papel crucial na mediação entre agricultores e bancos”. (ABRAMOVAY & VEIGA, 1999). O número de propriedades rurais e a diversidade de sistemas de produção existentes tornam praticamente impossível um trabalho dessas empresas no sentido de atender plenamente as suas demandas. O atendimento acaba sendo esporádico e os profissionais responsáveis tiveram uma formação especializada19 , contribuindo para aumentar a dificuldade para solucionar os problemas relacionados às especificidades de cada unidade produtiva. Historicamente, os agricultores beneficiados por esses serviços foram os que solicitaram o crédito rural governamental e que adotaram, pelo menos parcialmente, o padrão tecnológico difundido a partir da década de 1970. Portanto, quanto aos agricultores familiares, apenas uma pequena parcela teve acesso aos serviços da extensão rural governamental. Com a criação do PRONAF, os órgãos estaduais de extensão rural foram designados como representantes oficiais do Estado na operacionalização do programa20. 19 A partir da década de 1970 os currículos dos cursos de agronomia, veterinária, zootecnia foram direcionados a formação de profissionais aptos à difusão do padrão tecnológico da revolução verde. 20 Nos programas especiais para agricultura familiar de âmbito estadual os órgãos de extensão rural estadual têm papeis idênticos aos definidos no PRONAF. 104 Eles são responsáveis por atestar se os agricultores que solicitam recursos desses programas são de fato agricultores familiares. Mas, além de fornecer a certidão de agricultor familiar esses órgãos devem emitir um parecer técnico para as solicitações de financiamento. Para as situações que solicitam somente recursos para o custeio das atividades, eles auxiliam os agricultores a descrever onde os recursos serão utilizados. Para as situações que requerem recursos para investimento eles devem auxiliar os agricultores a elaborar um projeto técnico justificando a viabilidade do projeto. Para LACKY (1996), a extensão rural, seja ela executada por organizações governamentais, pela iniciativa privada ou por entidades de representação como, cooperativas, associações e Organizações Não-Governamentais (ONG´s), deverá contar com extensionistas que sejam capaz de: “1) solucionar os problemas dos agricultores, muito especialmente daquela grande maioria que se desempenha dentro da escassez de recursos (créditos, insumos modernos, etc.) e da adversidade físico-produtiva (terras de baixa fertilidade, de sequeiro, com relevo acidentado, etc.); 2) corrigir os erros que as famílias rurais cometem, não somente na etapa de produção, como também no acesso aos insumos, na administração de suas propriedades, no processamento e conservação das colheitas e na comercialização dos excedentes”. (LACKY, 1996:12). A limitação dos órgãos de extensão rural para atender as demandas do grande número de agricultores tem gerado iniciativas com objetivo de minimiza-las (PERACI & BIANCHINI, 2002). Destaca-se a atuação pró-ativa dos extensionistas no sentido de canalizar esforços de outros segmentos da sociedade. Eles interagem com a iniciativa privada (fornecedores de insumos, agroindústrias), instituições financeiras, órgãos de representação dos agricultores (sindicatos, associações, cooperativas), visando o desenvolvimento da agricultura de em seu município ou sua região. 3.4.5 Organizações de representação dos agricultores familiares Na representação sindical da agricultura brasileira, a nível nacional, destacam-se duas instituições: a Confederação dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG) e a Confederação Nacional da Agricultura (CNA). A CNA, historicamente, representa os interesses dos médios e grandes produtores, atualmente designados como 105 agricultores patronais. A CONTAG, desde a sua criação em 1963, defende os interesses dos trabalhadores rurais assalariados e dos pequenos agricultores, proprietário ou não, atualmente designados como familiares. Atualmente ela representa, aproximadamente 15 milhões de trabalhadores rurais, organizados em 25 Federações Estaduais e mais de 3.600 sindicatos21. A CONTAG teve uma participação fundamental na discussão e elaboração das propostas que resultaram no desenho do PRONAF. Entre as suas sugestões, que foram incorporadas no programa, está a certificação de agricultor familiar. Essa exigência do PRONAF consiste em uma carta de aptidão que deve ser assinada por um representante da extensão rural e de um representante do sindicato rural, presentes no município. Apesar de não contar com a aprovação da CONTAG, o PRONAF permite que os representantes dos sindicatos vinculados a CNA também assinem a carta de aptidão dos agricultores familiares. As Federações Estaduais disponibilizam cursos para os trabalhadores rurais e agricultores familiares com o objetivo de melhorar as suas condições de trabalho, por exemplo, abordando temas sobre manuseio e aplicação de agrotóxicos, preservação do meio ambiente e formas de organização comunitária. Para os agricultores familiares também são oferecidos cursos que abordam temas relacionados à gestão das atividades produtivas, onde a oferta de crédito governamental é divulgada. Para que os agricultores tenham oportunidade de participar desses cursos os sindicatos municipais devem solicitar e agendar junta as federações os cursos de interesse da comunidade específica. Particularmente em relação ao acesso ao crédito rural os sindicatos, além de divulgar as possibilidades existentes, podem auxiliar os agricultores familiares a elaborar um projeto de acordo com a realidade das unidades produtivas. A atuação das organizações sindicais, junto com os demais agentes correlatos à agricultura familiar, tem sido fundamental para superar os problemas dos agricultores familiares, principalmente aqueles devido a atomização dos agricultores e sua dispersão geográfica. Os sindicatos, enquanto organizações de representação, historicamente, estimulam a criação de associações, cooperativas ou qualquer outra forma de interação solidária que são particularmente importante para os agricultores familiares. Especificamente em relação ao crédito rural, os sindicatos e os órgãos de extensão rural 21 Informações obtidas no endereço eletrônico www.contag.org.br acessado em 02/06/2004. 106 governamentais exercem o papel de pressionar os agentes financeiros para que eles pratiquem uma política compatível com as diretrizes definidas nos programas de crédito, principalmente aqueles destinados exclusivamente para a agricultura familiar. 107 4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS EMPÍRICOS A análise dos dados empíricos inicia-se com a apresentação da oferta de crédito para agricultura familiar identificada no município de São Carlos. Posteriormente é analisado o papel desempenhado pelas organizações correlatas ao crédito rural e à agricultura familiar, atuantes no município: extensão rural governamental (Coordenadoria de Assistência Técnica Integral – CATI e Casa da Agricultura), os sindicatos rurais (de trabalhadores e patronal), fornecedores de insumos e compradores da produção. O capítulo termina com a analise da demanda de crédito a partir de informações coletadas junto aos agricultores familiares que participaram do estudo. 4.1 Disponibilidade de Crédito para Agricultura Familiar em São Carlos-SP. A oferta de crédito rural para a agricultura familiar está relacionada às linhas de crédito disponibilizadas pelos bancos, principalmente, pelos bancos oficiais, mas também por um agente de crédito particular, presente no município: a cooperativa de crédito do Vale do Mogi-Guaçu - Crediguaçu. 4.1.1 Bancos oficiais e Bancos privados Historicamente, as políticas de crédito rural têm sido operacionalizadas com a participação dos bancos oficiais. Em São Carlos, dois bancos governamentais, Banco do Brasil e Banco Nossa Caixa Nosso Banco, são responsáveis pela maior parte das transações de crédito rural no município. Porém, o volume de operações de crédito junto aos agricultores familiares do município, até abril de 2004, foi muito pequeno. De acordo com os dados disponíveis sobre o PRONAF22, no período compreendido entre agosto de 1998 a abril 2004, foram realizados apenas 14 contratos do PRONAF crédito rural, no município de São Carlos. A Tabela-6 apresenta os dados referentes ao número de contratos do PRONAF no Município de São Carlos e também para alguns Municípios vizinhos. Como justificativa para o baixo número de contratos operacionalizados no município, um dos gerentes de um dos bancos públicos, argumentou 22 Os dados relacionados aos contratos operacionalizados, desde a criação do PRONAF, discriminados para cada município, está disponível no endereço eletrônico www.pronaf.gov.br 108 que esse fato está associado ao predomínio da agricultura patronal na região. Mas, de acordo com os dados apresentados na Tabela-6 mesmo que o número absoluto de agricultores familiares sendo menor do que o de agricultores patronais no município de São Carlos, a relação entre o número de contratos concretizados entre os agricultores familiares dividido pelo número total de agricultores familiares no Município é muito menor do que os valores encontrados para a mesma relação nos Municípios vizinhos., demonstrando que o desempenho do programa em São Carlos é inexpressivo. As entrevistas com representantes da extensão rural municipal e com membros dos sindicatos rurais, confirmaram a percepção dos agricultores, de que o principal agente operador do PRONAF no município, o Banco do Brasil, exige garantias que dificultam a aprovação das solicitações de empréstimo. A política adotada pela agência impede o acesso de muitos agricultores, contrariando o objetivo principal do PRONAF: facilitar o acesso ao crédito. TABELA 6 –Número de contratos e montante do crédito rural do PRONAF, referentes ao Município de São Carlos e Municípios vizinhos, para o período de 1998-2004. Município Número de Contratos São Carlos Araraquara Rio Claro Descalvado Ribeirão Bonito 14 843 141 485 162 N°. de contratos N°. de A. Familiares no município 0,07 3,01 0,44 1,84 0,63 Montante (R$ mil) 67,8 3.337,6 627,2 2.213,3 752,0 Fonte: BACEN (Somente Exigibilidade Bancária), BANCOOB, BANSICREDI, BASA, BB, BN E BNDES. Dados atualizados até BACEN: Até 02/2004; BANCOOB Até 04/2004; BANSICREDI: Até 04/2004; BASA: Até 04/2004; BB: Até 04/2004; BN: Até 04/2004 e BNDES: Até 04/2004 - Ultimos 3 meses sujeitos á alterações. Disponível no endereço eletrônico: www.pronaf.gov.br acesso realizado em 07/06/2004. Adaptado pelo autor. O Banco Nossa Caixa Nosso Banco, além operar os recursos do PRONAF, opera exclusivamente os recursos do FEAP, no município. Na entrevista com o gerente responsável pela análise das solicitações de crédito rural, o principal aspecto destacado para justificar o pequeno número de contratos realizados no município também foi o predomínio da agricultura patronal e da agricultura familiar capitalizada. O entrevistado, apontou também como um problema dos programas especiais o montante de recursos disponibilizados pelas linhas de crédito, considerado, por ele, insuficiente para atender às 109 necessidades de investimentos dos agricultores. O programa FEAP só opera a modalidade de crédito para investimento. Na linha de financiamento, para olericultura, que poderia atender os agricultores que fizeram parte da amostra estudada, o valor máximo concedido para cada produtor familiar é de R$5.000,00, que seria insuficiente para a maioria das atividades de investimentos relacionadas com a instalação de estufas e irrigação. A escassez de recursos é agravada por uma outra restrição: uma vez que o agricultor tomou em empréstimo o limite máximo permitido por uma determinada linha de crédito de um programa, ele fica automaticamente impedido de tomar recursos de outras linhas disponíveis em programas similares, mesmo que elas estejam relacionadas a uma outra atividade produtiva do seu sistema de produção. Essa restrição é uma típica medida de monitoramento para limitar o endividamento dos tomadores de crédito e o eventual comprometimento da sua capacidade de pagamento. Problemas similares ocorrem em outras linhas de crédito que não são exclusivas para a agricultura familiar. O programa de financiamento de máquinas e equipamentos – FINAME Agrícola Modernização da Frota, apresentado na Quadro-13, prevê a possibilidade de aquisição de equipamentos e máquinas usados (semi-novos) que seria uma opção bastante razoável para os agricultores familiares. Porém os limites de financiamento estipulados pelo programa são incompatíveis com os preços desses produtos no mercado. Por exemplo, se um agricultor resolve adquirir um trator usado, o limite para financiamento e a idade máxima permitida para o bem a ser adquirido estipulados na linha de crédito, impossibilitam a operação, pois o agricultor não encontrará no mercado o produto desejado considerando as restrições estabelecidas. Trata-se de um problema de desenho da linha de crédito, pois as restrições no volume máximo de crédito a ser concedido são medidas de controle com o objetivo de minimizar os riscos de inadimplência, mas acabam comprometendo a consistência da própria linha de crédito. Ao serem indagados sobre quais são as exigências feitas aos agricultores familiares que solicitam o crédito rural, os gerentes dos bancos afirmaram que a política da agência está em sintonia com os programas especiais. O objetivo é atende-los minimizando a burocracia relacionada ao crédito. Exige-se a aprovação do cadastro dos agricultores, principalmente em relação à comprovação da condição de agricultor familiar e que não haja nenhuma restrição de crédito (inadimplência) junto ao comercio ou a outras instituições financeiras. As garantias solicitadas variam conforme o tipo de crédito 110 solicitado. Para as operações de crédito custeio, na maioria dos casos será solicitado a apresentação de um ou dois avalistas, dependendo do montante envolvido na operação. Foi relatado que para facilitar a operação o aval pode ser fornecido pelo cônjuge, como é típico em operações de crédito de pequenas empresas. Para as solicitações de investimento, existem situações onde o próprio bem financiado é alienado em garantia do empréstimo, utilizando-se em conjunto, ou não, o aval. Para operações onde essa alternativa não é possível é solicitado a garantia hipotecária (imóvel rural ou urbano) avaliada em pelo menos uma vez e meio a duas vezes o valor do montante solicitado. Além do baixo número de agricultores familiares no município, foram indicados como fatores que contribuem para o pequeno número de contratos: a condição de muitos agricultores em relação à titulação da terra e os elevados custos para a sua regularização. As taxas praticadas por cartórios de registros de imóveis fazem com que a maioria dos agricultores adie a transferência dos imóveis obtidos como herança, dificultando a transação com os Bancos. Uma alternativa para esse problema, apontada por um dos gerentes de crédito, seria a elaboração de contratos de arrendamento ou comodato entre os membros da família. Mas essa opção implica em um aumento nos custos de transação, uma vez que esses contratos de arrendamento ou comodato necessitam ser registrados em cartório de títulos e documentos. Com o aumento significativo das taxas de registros nesses cartórios, que passaram a vigorar no final de 2002, essa opção passou a ser pouco utilizada, pois, em algumas situações, as despesas com cartório chegavam a 10% do valor do empréstimo, principalmente para os empréstimos de valores relativamente pequenos, típicos entre os agricultores familiares. Outros custos relacionados aos contratos de crédito para a agricultura familiar que foram indicados pelos gerentes de crédito das instituições financeiras são: as taxas de cadastro que variam de acordo com a instituição (para o Banco Nossa Caixa Nosso Banco ela é de R$ 15,00), os gastos com a elaboração dos projetos técnicos, executados por profissionais autônomos ou empresas privadas, cujo preço é estipulado em função da complexidade do projeto, e as despesas com o registro da cédula rural no 111 cartório de títulos e documentos, cujos valores são determinados, principalmente, em função do montante emprestado23. Como estratégia de divulgação das linhas de crédito para a agricultura familiar, os entrevistados citaram as formas institucionais e algumas em função das especificidades da região. Entre as primeiras estão as propagandas institucionais nos veículos de comunicação em massa: TV, rádio e internet. Para uma divulgação junto ao público local foram indicadas, entre as principais formas de divulgação, a participação das instituições financeiras em eventos locais e regionais promovidos pelas prefeituras ou pela comunidade, destacando-se as feiras agropecuárias e os leilões. As instituições financeiras disponibilizam em suas agências um material impresso de divulgação dos programas de crédito rural e, para os agricultores interessados, são fornecidos esclarecimentos e maiores detalhes pelos gerentes responsáveis pela operação do crédito rural. Um outro potencial agente de crédito para a agricultura familiar, o Banco do Povo Paulista, opera no município fundamentalmente com a população urbana. De acordo com informações obtidas junto à secretaria municipal de ciência e tecnologia, o banco tem desempenhado um importante papel junto aos grupos de economia solidária presentes no município, mas de caráter essencialmente urbano. Como o Banco do Povo Paulista está vinculado ao Banco Nossa Caixa Nosso Banco, os agricultores que, eventualmente, procuram seus serviços do Banco do Povo são encaminhados para as agencias do Banco Nossa Caixa Nosso Banco. Os bancos privados seguem a lógica do mercado, procurando selecionar a sua clientela. Eles não têm interesse em operar as linhas de crédito vinculadas aos programas governamentais, mesmo quando estão habilitados, já que esses programas são destinados a públicos alvos que são, na sua grande maioria, distintos de sua clientela potencial. Eles operam com uma carteira diversificada e as operações de crédito rural restringem-se aos clientes antigos, predominantemente, médios e grandes produtores. No estado de São Paulo, entre os bancos privados que operam com crédito rural, destaca-se o 23 A Lei nº 11.331, de 26 de dezembro de 2002, em vigor a partir de 06/01/2003, estipula os valores monetários cobrados pelos cartórios para o registro ou averbação integral de contrato, título ou documento com conteúdo financeiro. Para os contratos do PRONAF essa taxa pode variar entre R$ 34,47 a R$ 425,10 por contrato. Para os contratos do FEAP a taxa pode variar entre R$ 34,47 a R$ 631,89. 112 Banespa-Santander. O Banespa, durante muito tempo, foi o principal banco governamental no estado de São Paulo, com uma grande carteira de crédito rural que foi, em parte, conservada, mesmo após a sua privatização. Entrevistando um dos diretores da Associação de Agricultores Familiares do Município identificou-se um dos aspectos fundamentais relacionados à oferta de crédito PRONAF. O entrevistado relatou ter obtido crédito PRONAF custeio por intermédio de uma das agências do Bradesco, da qual ele já era cliente de longa data. Segundo ele, o gerente lhe ofereceu os recursos e o acesso foi relativamente simples. Esse fato comprova a importância do relacionamento entre cliente e agente financeiro. Na busca de preservar a fidelidade do cliente, o banco lhe oferece um produto especial (crédito PRONAF), pois o histórico das transações com o cliente e a sua reputação indica o seu potencial para consumir outros produtos oferecidos pelo banco (poupança, talonário de cheques, títulos de capitalização, previdência privada, etc). Os bancos procuram conceder empréstimos utilizando parte dos recursos de linhas de crédito diferentes, com diferentes taxas de juros, para obter uma maior rentabilidade nas operações. Por exemplo, recursos para capital de giro (destinados para custeio da produção e outros despesas) podem ser provenientes de linhas de crédito de programas distintos, uma linha pode possuir uma taxa de juros subsidiada e outra uma taxa de juros de mercado. Como os recursos das linhas de crédito subsidiados são limitados, adotando essa política os bancos podem atender uma clientela maior, privilegiando subjetivamente os clientes que recebem recursos provenientes apenas dos programas subsidiados. Complementando essa política de atendimento aos clientes, os bancos adotam uma estratégia de marketing que busca incentivar uma relação de fidelidade do cliente para com banco. Quanto melhor for o histórico de relacionamento do cliente com o banco maior poderá ser a proporção de recursos oriundos das linhas de crédito com alto índice de subsídios. (ver Box-1) 113 Box – 1 Dificuldades encontradas por um agricultor para acessar crédito PRONAF.24 O caso aqui relatado fornece exemplos de algumas das dificuldades para acessar os recursos do crédito especial destinado à agricultura familiar. Trata-se da aprovação de um pedido de crédito PRONAF que exigiu muita insistência e paciência de um agricultor familiar que teve seu pedido de crédito PRONAF aprovado. A unidade de produção agropecuária em questão tinha uma área de aproximadamente 13 hectares e a atividade produtiva principal era a suinocultura. O proprietário responsabilizava-se tanto pelo trabalho operacional como pelo administrativo, contando com o auxilio da esposa. Eles não possuíam trabalhadores permanentes, embora, no passado, terem empregado até dois trabalhadores. O agricultor obteve informações sobre o PRONAF, por meio da divulgação institucional do programa feita na televisão e por meio do sindicato de trabalhadores rurais, do qual era membro participante. Sob orientação da extensão rural governamental, o agricultor desenvolveu um projeto técnico para ser encaminhado a uma das agências do banco oficial presentes no Município. As dificuldades iniciaram-se no dia em que ele foi até a agência entregar a proposta de financiamento. O banco não dispunha de um funcionário responsável exclusivamente pelo crédito rural. Essa deficiência ficou evidente porque ele teve que retornar várias vezes ao banco para preencher e assinar informações cadastrais. A cada retorno um funcionário diferente tratava de seu processo, implicando em uma maior perda de tempo, pois o funcionário necessitava se interar dos detalhes do processo em andamento. O agricultor relatou que o tempo perdido a cada vez que ele tinha que se deslocar ao banco para tentar resolver a situação comprometia praticamente todo o dia de serviço. Apesar dele ser, já há algum tempo, cliente do banco, ao invés dos gerentes lhe oferecerem, de imediato, recursos da linha de crédito PRONAF investimento, eles procuraram enquadrá-lo numa das linhas do PROGER, cuja taxa de juros era superior. Depois de decorrido aproximadamente 03 meses da entrada do pedido de financiamento e continuar ainda sem resposta, o agricultor resolveu fazer uma reclamação utilizando o serviço de atendimento ao cliente disponibilizado pelo banco. Após relatar o seu caso a central de atendimento ao cliente, em aproximadamente uma semana, a sua proposta foi aceita e a sua solicitação foi enquadrada na linha de crédito PRONAF investimento. 4.1.2 Cooperativa de Crédito do Vale do Mogi-Guaçu - Crediguaçu As cooperativas de crédito, além de aturem junto aos bancos para facilitar as transações de crédito dos programas governamentais, também oferecem linhas de crédito sustentadas por recursos próprios. Elas operaram a carteira de crédito vinculada a carteira de aplicações. Os cooperados poupam na cooperativa recebendo a uma taxa de juros acima daquela oferecida pelo mercado. Os recursos captados pela poupança são ofertados para os 24 Este Box está baseado no relato dado por um agricultor familiar do Município de São Carlos que teve a sua solicitação de crédito PRONAF aprovada em outubro de 2003. 114 cooperados a uma taxa de juros que remunere a poupança e cubra os gastos operacionais da cooperativa. Dessa maneira, as cooperativas oferecem aos agricultores melhores condições para seus cooperados, tanto para as aplicações na poupança como para as diversas operações crédito ofertadas no mercado. Porém, essas opções não se comparam às condições do crédito governamental subsidiado. As principais linhas de crédito e serviços oferecidos pela cooperativa de crédito Crediguaçu, vinculadas aos recursos captados das aplicações dos cooperados, estão indicadas no Quadro-14. Elas têm por finalidade atender, exclusivamente, as demandas dos cooperados. Para tornar-se um cooperado o agricultor tem que ser indicado por dois cooperados e deve preencher um cadastro detalhado, contendo informações pessoais (CIC, RG, comprovante de residência), da unidade produtiva (DECAP, escritura do imóvel) e das atividades desenvolvidas nos últimos anos. Algumas das informações cadastrais mais importantes estão relacionadas à DECAP (documento que trás informações sobre o produtor rural, a área explorada, a sua localização, o histórico da produção). Parte dos dados referentes ao cadastro são conferidos junto ao posto fiscal do município. Outra parte dos dados é conferida por meio de uma visita à propriedade. As visitas passarão a ser periódicas caso o pretendente ingresse nos quadros da cooperativa a fim de monitorar e acompanhar o desenvolvimento das atividades produtivas. O cadastro é submetido à avaliação e aprovação de um conselho de cooperados. Se for aprovado, o produtor terá que integralizar cotas partes no valor de R$600,00 (valores para o ano de 2003) que pode ser dividido em até dez vezes. Esse patrimônio será remunerado a uma taxa de juros de 12% ao ano. 115 QUADRO 17 - Linhas de crédito e serviços oferecidos pela Cooperativa de Crédito do Vale do Mogi-Guaçu – Crediguaçu. Valores referentes ao mês de maio-2003. Cooperativa de Crédito do vale do Mogi-Guaçu. Custeio rural: Para valores a partir de 25.000,00. Taxa de juros: 2,2% ao mês + tr (0,30% ao mês). garantia hipotecária (no valor de aproximadamente duas vezes o valor do Exigências: empréstimo). Cheque especial: 5% ao mês Desconto de cheques pré-datados: 2,70 a 3,5% ao mês (cheques menores, taxas menores). Desconto de duplicata rural: taxa de juros varia de 2,5% a 3,1% ao mês Credito pessoal: Mínimo de R$ 500,00.O valor máximo depende do porte do produtor. Taxa de juros: 3,5% ao mês. aval de um cooperado ou do cônjuge. Exigências: Financiamento de veículo: taxa de 2,5% com alienação do bem. Fonte: Cooperativa de Crédito do Vale do Mogi-Guaçu –Crediguaçu. Elaborado pelo autor. As operações de crédito para custeio, geralmente, estão relacionadas a áreas maiores e ao cultivo de cana-de-açúcar, de milho e a pecuária. As operações de crédito pessoal atendem as necessidades emergenciais e procuram ser facilitadas ao serem permitido o aval dado pelo cônjuge. Para qualquer contrato de crédito é cobrada uma taxa de contrato de R$ 30,00 para cobrir os custos de elaboração dos contratos. Segundo o gerente da cooperativa, ela é bem menor do que aquelas praticadas pelos bancos comerciais, que giram em torno de 150,00 a 200,00 por contrato. 116 4.1.3 Papel das instituições correlatas ao crédito rural As principais instituições relacionadas ao crédito rural no Município de São Carlos são: a extensão rural governamental, os sindicatos rurais, a associação dos agricultores familiares de São Carlos, os fornecedores de insumos e compradores da produção. A seguir serão apresentadas as principais formas de atuação de cada uma dessas instituições e suas implicações para a oferta de crédito rural para a agricultura familiar no município. 4.1.3.1 Extensão Rural O Município de São Carlos está servido pelo órgão estadual de extensão rural CATI (Coordenadoria de Assistência Técnica Integrada) e pela Casa da Agricultura, ambos sediados na secretaria de agricultura do Município. Devido ao pequeno número de funcionários de extensão rural para atender o total de estabelecimentos rurais presentes no município, é praticamente impossível o acompanhamento permanente das atividades desenvolvidas pelos agricultores. São atendidos os agricultores que procuram a sede da secretaria da agricultura. Se houver necessidade, podem ser realizadas visitas esporádicas às propriedades rurais. Um dos principais problemas indicados pelos funcionários entrevistados refere-se as dificuldades encontradas para atender as demandas específicas de cada agricultor. Para atender a diversidade de atividades produtivas desenvolvidas pelos agricultores seria necessário dispor de um quadro de profissionais especializados nas diversas áreas de produção animal e vegetal, além de conhecimentos sobre a comercialização de diversos produtos. Essa limitação faz com a atuação da extensão rural concentre-se nas principais atividades agropecuárias desenvolvidas no município (pecuária, milho, avicultura, citricultura, café), atendendo, principalmente, os médios e grandes produtores. A maior interação da extensão rural e os agricultores familiares ocorre nas atividades desenvolvidas no programa de proteção e recuperação das micro-bacias do município. Quanto ao crédito rural para a agricultura familiar, a extensão rural tem auxiliado na elaboração e formatação dos projetos que são encaminhados para os bancos. Grande parte dos projetos de investimento é elaborada com a participação de empresas 117 privadas fornecedoras de insumos. De acordo com um dos extensionistas entrevistados, muitas vezes eles apenas acrescentam algumas informações e formatam os projetos elaborados pelos agricultores, com auxílio de profissionais das empresas fornecedoras de insumos (agrônomos, veterinários). Segundo os extensionistas entrevistados, o maior problema do crédito rural esta relacionado às exigências que os bancos impõem aos agricultores (garantias reais e avalistas). Muitas solicitações são encaminhadas, mas são recusadas pelos bancos porque os agricultores não têm condições de atender essas exigências. Especificamente em relação à horticultura, a secretaria da agricultura do município mantém pelo menos duas hortas municipais, cuja produção é destinadas às escolas municipais. Atualmente elas estão em fase de conversão do modelo de produção convencional, onde predominava a utilização de insumos industrializados, para o modelo de produção orgânica. Os responsáveis pela horta municipal desenvolvem um importante papel de divulgação das técnicas de produção orgânica, incluindo a elaboração de material impresso alertando para importância da qualidade do solo e da água, da preservação e recuperação das matas ciliares, exemplificando sobre técnicas de compostagem, ricas em nutrientes que considere as demandas específicas de cada solo ou cultura e chamando atenção para o papel da rotação de culturas e do controle biológico de pragas no processo de produção orgânica. As hortas ficam abertas à população, servindo de orientação tanto para aqueles que residem na cidade e queiram desenvolver uma horta caseira como para os agricultores que tenham interesses comerciais na produção orgânica. Entretanto, nessas interações não há orientações envolvendo aspectos diretamente relacionados ao crédito rural. Um outro importante serviço prestado pela extensão rural é a análise de solo. A secretaria de agricultura municipal mantém um convênio com a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) para que as análises de solo sejam feitas no campus de Araras. Os profissionais que trabalham na horta municipal fornecem informações sobre como proceder a coleta da amostra a ser analisada. Depois da análise concluída eles também interpretam os dados e fornecem as orientações adequadas a cada situação. Atualmente é cobrada uma taxa de R$11,70 para cada analise de solo que é paga a Fundação de Apoio Institucional (FAI) vinculada à UFSCar. Esse serviço não tem relação 118 direta com o crédito rural, mas pode ser parte integrante das atividades relacionadas à elaboração dos projetos de financiamento. 4.1.3.2 Sindicatos e Associações No município de São Carlos estão presentes tanto o Sindicato dos trabalhadores rurais de São Carlos – filiado a CONATG como o Sindicato Rural de São Carlos, representando os agricultores patronais, filiado a CNA. O sindicato dos trabalhadores conta com aproximadamente 2000 associados, dois quais aproximadamente 100 são agricultores familiares e os demais são trabalhadores rurais assalariados. Por meio de entrevista junto a um dos diretores do sindicato foi possível identificar a falta de informação sobre os programas de crédito especialmente destinados aos agricultores familiares, pois o entrevistado não tinha conhecimento sobre os procedimentos necessários para solicitar o crédito, inclusive sobre certificação de agricultor familiar que deve ser assinada por representantes da extensão rural e de um dos sindicatos rurais do município. Portanto, as poucas solicitações de crédito no município, tanto do PRONAF como do FEAP, foram encaminhadas com o certificado de agricultor familiar assinado por um representante do sindicato patronal. Segundo o entrevistado, o foco das atividades desenvolvidas pelo sindicato está voltado para os trabalhadores assalariados e entre os benefícios oferecidos estão: assistência médica, odontológica e jurídica, orientações trabalhistas, farmácia e serviço de barbeiro e cabeleireira. Também são oferecidos cursos profissionalizantes de curta duração, a exemplo de, aplicação de agrotóxicos, administração rural, técnicas e formas de organização comunitária, olericultura básica em ambiente protegido. O sindicato rural patronal tem maior tradição no município e tem ocupado o espaço deixado pelo sindicato dos trabalhadores no que se refere a agricultura familiar. Um dos diretores entrevistados afirmou que o grande problema do crédito rural para os pequenos agricultores sempre foi as exigências impostas pelos bancos. Com os programas especiais para a agricultura familiar, ele afirma acontecer o mesmo, ou seja, o agricultor encaminha o pedido de crédito seguindo as orientações da extensão rural e do sindicato, mas os bancos dificultam as operações exigindo garantias e contrapartidas para que a operação seja concretizada. 119 No início de 2003, por iniciativa e apoio da secretaria municipal de agricultura, foi formada a Associação dos Agricultores Familiares de São Carlos. De acordo com um dos diretores, a associação tem como objetivos promover o desenvolvimento da agricultura familiar do município, promovendo a união dos agricultores familiares. Entre as ações prioritárias da associação está a divulgação das oportunidades de crédito para os agricultores e a atuação junto aos agentes financeiros no sentido de facilitar o acesso ao crédito rural. Apesar de ainda não ter conseguido ampliar o número de agricultores familiares com acesso ao crédito rural a associação serviu como catalisadora de pelo menos duas iniciativas que envolvem recursos de crédito, a fundo perdido, obtidos da Fundação Banco do Brasil, e que beneficiaram a agricultura familiar do município. Uma delas foi levantar verbas para abertura de um Box para venda de produtos da agricultura familiar dentro do mercado municipal. A outra esta relacionada a sua participação, junto com a prefeitura municipal e os sindicatos rurais, do projeto para criação do Centro de Tecnológico para a Agricultura Familiar. 4.1.3.3 Fornecedores de insumos e compradores da produção Os fornecedores de insumos vêm ocupando espaços no mercado agropecuário atendendo vários aspectos da demanda dos agricultores seja em relação ao crédito, como também em relação a assistência técnica e difusão de tecnologias. Quanto a crédito a sua principal contribuição está associada ao custeio das atividades, pois os agricultores adquirem os insumos necessários para a execução das atividades produtivas e recebem um prazo para pagar. Pode ocorrer, dependendo da atividade e do histórico de relacionamento do agricultor com a empresa, que o pagamento seja feito apenas após a obtenção de receita proveniente da venda da produção. O crédito dos fornecedores também pode ser para algumas atividades de investimentos que envolvam a aquisição de máquinas e equipamentos, porém as condições de pagamento podem não ser as mais apropriadas para os agricultores. O crédito junto aos fornecedores depende da relação comercial entre esses e os agricultores. Conforme vai sendo construída uma relação de confiança entre os agricultores e as empresas, ampliam-se as possibilidades e as facilidades para a obtenção de financiamento. A freqüência das transações permite aos fornecedores acompanharem as 120 atividades desenvolvidas pelos agricultores e obtenção de informações que permitam avaliar os riscos e a capacidade de pagamento de cada agricultor. Os fornecedores de insumos podem atuar, também, como divulgadores das linhas de crédito disponíveis para os agricultores, pois eles têm interesses em efetuar vendas financiadas pelos bancos, uma vez que o recebimento é garantido. Por isso é comum que as empresas disponibilizem profissionais especializados para atender as dúvidas dos agricultores e eventualmente auxiliarem na elaboração de um projeto técnico para solicitação de financiamento junto aos bancos. A relação com os fornecedores de insumos pode também gerar problemas para os agricultores. Como o objetivo das empresas é efetuar o maior número de vendas possível, os agricultores podem ser induzidos a adquirir insumos ou equipamentos que não sejam adequados a sua realidade. Mas, em um ambiente onde o acesso ao crédito e a assistência técnica governamental é precário, as empresas privadas cumprem esse papel e influenciam diretamente o desenvolvimento da agricultura. Para os horticultores do município de São Carlos, os fornecedores de insumos desempenham um papel fundamental. Além de oferecerem serviços de assistência técnica e serem responsáveis pela divulgação de novas tecnologias, eles também oferecem aos agricultores a possibilidade de adquirir insumos com condições de pagamento facilitadas. A compra a prazo é uma importante modalidade de crédito custeio, pois grande dos itens adquiridos pelos agricultores (sementes, fertilizantes, defensivos) integram as despesas do custeio da produção. Como, particularmente, para a horticultura o ciclo de produção de grande parte das culturas é relativamente curto, o período para pagamento dos insumos, oferecido pelos fornecedores, em média, 30 a 40 dias, é suficiente para atender parte importante da demanda de crédito desses agricultores. Os fornecedores de máquinas e equipamentos também oferecem condições de financiamento (crédito investimento), mas as condições de pagamento (prazo, taxa de juros) nem sempre são apropriadas, pois o retorno do investimento tem um prazo bem mais longo. Para a amostra de agricultores estudada, os compradores da produção (estabelecimentos comerciais e atravessadores) não oferecem opções de crédito. Pelo contrário, eles exploram deficiências dos agricultores (dificuldades para escoar a produção, oferta em excesso de determinado produto) e praticam preços abaixo do mercado, se apropriando de uma parcela significativa dos lucros potenciais dos agricultores. 121 4.2 Demanda de Crédito na Agricultura Familiar em São Carlos A demanda de crédito entre os agricultores familiares do município de São Carlos foi analisada com base em três estudos empíricos realizados no município. Os critérios utilizados para classificar as unidades produtivas como familiares para os três estudos foram: que o número de trabalhadores permanentes contratados para trabalhar na unidade produtiva fosse menor ou igual ao número de trabalhadores membros da família e que a área explorada fosse menor ou igual a 15 módulos fiscais25. O primeiro estudo empírico está relacionado ao projeto GIAF e conta com uma amostra de 33 agricultores familiares que tinham a horticultura como atividade principal em seus sistemas de produção. Os dados do segundo estudo empírico, vinculados ao Projeto: “Desenvolvimento Local e Políticas Públicas: Análise e Proposta para o Novo Rural de São Carlos - SP, realizada em 2002, referem-se a uma amostra de 172 agricultores do município de São Carlos (familiares e patronais) estratificada em função da área das unidades agropecuárias analisadas. Essa amostra é bastante diversificada e representa o universo dos agricultores do município. O terceiro e último estudo empírico considerado está relacionado ao Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia de políticas’” contratado pela FAO (Food and Agriculture Organization) ao Departamento de Engenharia de Produção (DEP) da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar, realizada no ano de 2003. Desse estudo foram utilizados dados referentes a uma sub-amostra formada por agricultores que tinham a pecuária leiteira entre suas principais atividades agropecuárias. 4.2.1 Análise da amostra do Projeto GIAF Para a amostra de 33 produtores familiares olericultores, do município de São Carlos, procurou-se verificar se eles atendiam às exigências estabelecidas pelos programas de apoio à agricultura familiar (PRONAF e FEAP) quanto aos limites de renda bruta anual e de área máxima da unidade produtiva. Os critérios de seleção utilizados por esses programas têm como objetivo destinar os recursos aos agricultores familiares menos 25 Para o município de São Carlos-SP o limite de área explorada para a agricultura familiar é 180 ha. 122 capitalizados26. A maioria dos produtores atenderia às exigências para ambos os programas: 79% atenderiam às exigências do PRONAF e 88% às do FEAP. O principal critério não atendido pelos demais agricultores foi com relação à renda bruta anual; 21% deles excederam o limite estipulado pelo PRONAF e 12% deles excederam o limite para o FEAP. O outro critério, tamanho da área explorada, não foi atendido por 9% da amostra apenas para o PRONAF, pois as unidades produtivas possuíam área superior a 48 ha. Ainda em relação ao grau de capitalização dos agricultores, pôde ser constatado que 45% dos agricultores enquadraram-se no Grupo-C27 do PRONAF. Nesse grupo, enquadram-se os agricultores com renda bruta média anual ainda mais baixa, revelando que quase metade da amostra encontrava-se em uma situação de fragilidade econômica. Apesar de grande parte dos entrevistados serem potenciais beneficiários dos programas especiais, como indica a Tabela-7, nenhum deles recebeu recursos desses programas. Os dados obtidos junto aos produtores da amostra indicaram o nível de informação a respeito do PRONAF e FEAP. Entre os entrevistados, 63,5% disseram nunca ter ouvido falar sobre o PRONAF e 81,8% sobre o FEAP (Tabela-8). A maioria dos agricultores, 60,6%, nunca ouviu falar sobre os programas especiais destinados à agricultura familiar, indicando um desconhecimento sobre algumas das melhores opções de crédito disponíveis no mercado e destinada exclusivamente à agricultura familiar. TABELA 7 - Produtores que atenderam as exigências dos programas de crédito destinado à agricultura familiar – PRONAF e FEAP. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. Enquadrados no PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) 79,0% Enquadrados no FEAP (Fundo de Expansão da Agricultura e da Pesca) 88,0% Fonte: pesquisas realizadas. 26 Os principais critérios de seleção dos programas, relacionados ao grau de capitalização dos agricultores, são a renda bruta anual e o tamanho da área explorada. O limite para renda bruta anual era de até R$30.000,00 para o PRONAF, sendo que as rendas provenientes da olericultura e pecuária de leite deveriam ser contabilizadas descontado-se 50%. Para o FEAP o limite da renda bruta anual era de até R$100.000,00. O tamanho da área explorada era de quatro módulos fiscais para o PRONAF (equivalente a 48 ha para o município de São Carlos) e oito módulos fiscais para o FEAP (equivalente a 96 ha). 27 Enquadra-se no grupo-C do PRONAF o agricultor com renda bruta anual entre R$1.500,00 a R$10.000,00, sendo que as rendas provenientes da olericultura e pecuária de leite eram contabilizadas descontado-se 50%. 123 TABELA 8 – Produtores que não tinham qualquer conhecimento sobre os programas de crédito destinado à agricultura familiar. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. PRONAF (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) FEAP (Fundo de Expansão da Agricultura e da Pesca) Nenhum deles (PRONAF ou FEAP) 63,5% 81,8% 60,6% Fonte: pesquisas realizadas. Quando os produtores da amostra foram questionados sobre quais são as principais dificuldades para ter acesso ao crédito rural, 39,4% dos entrevistados indicaram as exigências bancárias, 15,2% citaram as condições de pagamentos inadequadas (Tabela9). As principais dificuldades (exigências bancárias e condições de pagamento) citadas pelos agricultores refletem a forma como eles são tratados pelas instituições financeiras e qual é a estratégia do mercado para operar com este público. Como os agentes financeiros que operam os programas oficiais para a agricultura familiar orientam-se pelo mercado, as exigências por eles praticadas não devem ser muito diferentes daquelas utilizadas pelos demais agentes financeiros. Essas exigências funcionam como mecanismos de enforcement para proteger os agentes financeiros e fazem parte do conjunto de fatores que dificultam o acesso dos agricultores aos recursos desses programas. Em relação às condições de pagamento não é possível estabelecer uma relação semelhante, pois as condições oferecidas pelos programas especiais são bem mais favoráveis do que as do mercado e levam em consideração as especificidades das atividades produtivas para as quais os recursos se destinam. Entretanto, como entre os agricultores entrevistados prevalece o desconhecimento sobre os programas especiais e, conseqüentemente, das suas condições de pagamento, não existe inconsistência nas informações obtidas. Cabe ressaltar que apenas 6,1% da amostra afirmaram não ter dificuldades para acessar o crédito rural. Para essa amostra de agricultores a aversão ao risco não apareceu como um dos principais fatores que inibem o acesso ao crédito e 21,2% da amostra não indicou as dificuldades por não ter solicitado crédito. Para aqueles que não solicitaram o crédito tanto pode existir dificuldades para acessa-lo como também eles podem não necessitar do crédito rural. 124 TABELA 9– Principais dificuldades para ter acesso ao crédito rural indicadas pelos agricultores. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. Exigências bancárias 39,4% Condições de pagamento inadequadas 15,2% Aversão ao risco 9,1% Ser pequeno produtor 3,0% Assistência técnica ausente, insuficiente ou incapaz de propor projetos viáveis 3,0% Não solicitou crédito no último ano 21,2% Não tem dificuldades 6,1% Não responderam 6,1% Fonte: pesquisas realizadas. Os agricultores entrevistados revelaram ter pouca interação com as instituições responsáveis pela operacionalização dos programas de crédito: instituições financeiras, sindicatos rurais e extensão rural oficial. As duas últimas têm a incumbência de fornecer a carta de certidão de agricultor familiar que habilita os agricultores a entrarem com o pedido de solicitação de empréstimo junto às instituições financeiras. Entre os entrevistados, 93,9% disseram não ter tido acesso à assistência técnica oficial e 90,9% deles não tiveram contato algum com os sindicatos rurais do município, patronal ou dos trabalhadores. A inexpressiva interação entre os agricultores e a extensão rural oficial está relacionada ao fato de que eles recorrem ao serviço de assistência técnica oferecida pelos fornecedores de insumos. As entrevistas com os extensionistas e com um agrônomo de uma empresa fornecedora de insumos indicaram algumas particularidades relacionadas à demanda de informações técnicas dos horticultores: ela é bastante específica e as inovações relacionadas a insumos industrializados são constantes. Dessa forma apenas um profissional que está permanentemente em contato com essa atividade e com as novidades tecnológicas consegue atender as necessidades dos agricultores. Como os órgãos de extensão rural não dispõem de profissionais que possam se dedicar apenas a um tipo de atividade agropecuária, eles nem sempre podem auxiliar na resolução dos problemas enfrentados pelos horticultores. Cabe ressaltar que o padrão tecnológico predominante entre os horticultores é o que utiliza predominantemente insumos industriais. Essa característica distancia os horticultores de uma importante fonte de informações presente no município de São Carlos: a horta municipal. O sistema de produção adotado na horta municipal é a horticultura orgânica. 125 Em relação às instituições financeiras, 36,4% disseram não possuir qualquer espécie de vínculo com estas instituições: conta corrente, poupança, etc. A ausência de vínculo com as organizações financeiras é um dos filtros institucionais que dificulta a operacionalização dos programas de crédito rural. Dos 63,6% que relataram ser clientes de algum banco, 57,2% tiveram alguma quantia em poupança no último ano (Tabela-10). A pouca interação dos agricultores da amostra com as instituições relacionadas aos programas especiais para a agricultura familiar explica, em grande medida, o desconhecimento dos agricultores em relação a esses programas. TABELA 10 – Indicadores de integração dos produtores familiares com instituições relacionadas às operações de crédito dos programas especiais (PRONAF e FEAP). Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. Possui conta corrente ou poupança em instituições financeiras Não teve acesso à assistência técnica oficial Não teve qualquer nível de contato com os sindicatos rurais do município 63,6% 93,9% 90,9% Fonte: pesquisas realizadas. Apesar da pouca informação dos agricultores sobre a oferta de crédito, foi observada entre eles uma grande demanda por investimentos. As principais atividades por eles mencionadas foram: construção de estufas ou alguma forma de proteção para as culturas (estufas em forma de túnel rente ao solo ou sombrite) (48,4%), irrigação (24,2%), aquisição de veículo para transporte (21,2%) e máquinas e equipamentos para a produção (18,2%). As duas primeiras estão diretamente relacionadas a tecnologias de produção que permitem diminuir os riscos das atividades produtivas e também melhorar a qualidade dos produtos e a produtividade da área cultivada. A importância dada ao investimento em veículo de transporte pode ser explicada pela necessidade diária de escoar a produção e ter autonomia para transportar insumos. Alguns agricultores necessitam entregar os produtos mais de uma vez por dia. Aqueles que não possuem veículos de transporte dependem de um outro produtor que atua como um intermediário Ele absorve os custos de transporte e também uma parcela do lucro desses agricultores. Apenas 15,2% dos entrevistados disseram não ter interesse em investir em atividade alguma (Tabela-11). Entre os agricultores entrevistados, ficou evidente a ausência de planejamento e mecanismos de controle da produção, bem como a ausência de algum estudo sobre a viabilidade dos 126 projetos de investimento por eles considerados necessários, demonstrando o predomínio de formas empíricas de administrar as atividades produtivas. TABELA 11– Investimento considerados prioritários pelos produtores familiares. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. Construção de estufas Sistema de irrigação Veículo para transportar a produção Máquinas e equipamentos em geral Proteção das culturas com sombrite Proteção das culturas com estufas do tipo túnel Criação animal Aquisição de terra para sair da condição de arrendatário Não tem interesse 42,4% 24,2% 21,2% 18,2% 3,0% 3,0% 6,0% 3,0% 15,2% Fonte: pesquisas realizadas. Em relação às fontes alternativas de recursos financeiros e de financiamento utilizadas pelos agricultores entrevistados, algumas opções foram inexpressivas, apenas um agricultor utilizou o mercado informal de crédito (3% da amostra) e a comercialização antecipada da produção não é praticada por esse grupo de produtores. Entre os entrevistados, 30,3% disseram possuir algum membro na família que recebia aposentadoria e 33,3% disseram receber renda proveniente de aluguel de imóveis. A aposentadoria e o aluguel são importantes fontes que complementam a renda desses agricultores e aumentam a sua capacidade de auto-financiamento. O complemento da renda por meio de aposentadoria e aluguel também pode ser um dos fatores que explicam o baixo índice de contratos de crédito rural, uma vez que diminuem a dependência desses agricultores em relação aos recursos dos programas de crédito rural. Outra importante constatação é que a maioria dos agricultores, 84,8%, utiliza a opção de pagamento a prazo, oferecida pelos fornecedores de insumos. A compra a prazo demonstrou-se a principal fonte financiamento desses agricultores (Tabela-12). Os agricultores não souberam informar se existe e o valor da taxa de juros embutidas nas compras a prazo. Alguns afirmaram que não existem diferenças quando se comparam os preços dos produtos comprados a prazo com aqueles pagos a vista. Porém, as entrevistas junto aos fornecedores de insumo deixaram claro que os preços podem variar em função do prazo, do volume de produtos adquiridos e do cliente específico. Como a maioria das 127 culturas produzidas pelos agricultores é de ciclo curto, aproximadamente quarenta dias, grande parte do capital de giro dos agricultores é financiada pelos fornecedores de insumo, uma vez que a freqüência média de pagamento é mensal. Essa fonte de financiamento, apesar de importante, atende principalmente as atividades relacionadas ao custeio da produção. TABELA 12– Fontes alternativas de recursos financeiros dos agricultores. Amostra de 33 produtores familiares olericultores do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de setembro de 2001 e outubro 2002. Aposentadoria Pensão Doações Aluguel Salário de atividade não-agrícola Mercado informal (recursos tomados com parentes, vizinhos, agiotas, etc.) Comercialização antecipada da produção Financiamento da compra de insumos pelos fornecedores (compra a prazo) 30,3% 0,0% 0,0% 33,3% 9,1% 3,0% 0,0% 84,8% Outros 6,1% Fonte: pesquisas realizadas. Além do predomínio da compra de insumos a prazo verificou-se que quase a totalidade dos produtores da amostra utiliza os serviços de um mesmo fornecedor de insumos. O domínio exercido por esse fornecedor junto ao mercado local deve-se, segundo os produtores da amostra, a um conjunto de vantagens oferecidas por ele. Além do prazo para efetuar o pagamento, as condições são flexíveis, pois não fica rigorosamente determinada uma data para o pagamento, possibilitando aos produtores efetuá-lo conforme seus fluxos de recebimentos. O tempo de atividade do fornecedor no mercado contribuiu para um grande conhecimento sobre os produtores e acompanhamento histórico de suas atividades produtivas, resultando quase sempre num vínculo de amizade. Também foi destacada a especialização da atividade do fornecedor, principalmente para atender à demanda dos olericultores, oferecendo ampla variedade de produtos. Outro importante serviço oferecido é a possibilidade de se utilizar assistência técnica prestada por um engenheiro agrônomo que atende no estabelecimento. Apesar das vantagens identificadas pelos agricultores, fica evidente a influência desse agente fornecedor no padrão tecnológico adotado pelos olericultores do município. Mesmo os agricultores tendo manifestado interesse em obter informações sobre métodos alternativos para o cultivo de 128 hortaliças, como agricultura orgânica, todos os produtores da amostra utilizam o método convencional, sustentado por insumos industrializados. O quadro de falta de informação dos agricultores entrevistados está em sintonia com a ausência de atuações coletivas. Apenas um agricultor da amostra relatou ser membro da cooperativa de crédito rural existente no município. De acordo com o gerente dessa cooperativa, o número de cooperados, no município, que corresponde ao perfil da agricultura familiar, está entre 7% a 15% do total de cooperados que é de aproximadamente 170 agricultores. 4.2.2 Amostra dos agricultores familiares do Município de São Carlos-SP Essa amostra é derivada do Projeto “Desenvolvimento Local e Políticas Públicas: Análise e Proposta para o Novo Rural de São Carlos – SP” , realizado em 2002 pelo Departamento de Engenharia de Produção da Universidade Federal de São Carlos. A amostra original foi estratificada em função do tamanho da área da unidade produtiva explorada. Ela é constituída por 172 agricultores do município de São Carlos. A partir dessa amostra foi identificada uma sub-amostra de 72 agricultores familiares (41,86% da amostra original). Do total de agricultores familiares, 91,67% (66/72) atenderam as exigências do PRONAF e 95,83% (69/72) atenderam às exigências do FEAP. Entre abril de 2001 e março de 2002, 17,4% (30/172) dos agricultores solicitaram crédito rural. Apenas 9,3% (16/172) da amostra total dos agricultores do município obtiveram crédito rural e 8,1% (14/172) deles tiveram as suas solicitações de crédito recusadas. Entre os agricultores familiares da amostra 13,89% (10/72) obtiveram crédito rural, sendo que 4,2% (3/72) receberam crédito PRONAF. Do total de solicitações de crédito recusadas, 42,9% (6/14) foram de agricultores familiares. A Tabela-13 apresenta os itens que complementam a renda agropecuária dos agricultores familiares do município de São Carlos28. Destaca-se a importância da renda proveniente de aposentadorias ou pensões que foi indicada por 62,50% dos agricultores familiares. A soma do porcentual das rendas oriundas de duas fontes similares, aluguel de 28 As informações disponíveis na base de dados não permitiram avaliar a importância relativa de cada item que complementa a renda total. Foi possível apenas identificar quais itens complementares compunham a renda total desses agricultores. 129 imóveis e arrendamento, é bastante significativa, pois representam 31,94% da amostra, respectivamente 20,83% e 11,11% cada. A renda comercial também pode ser considerada uma fonte importante pois aparece na composição da renda de 26,39% dos agricultores. Com exceção da renda de aposentadoria e pensão as demais fontes de renda são difíceis de serem averiguadas pelos agentes de crédito rural, pois podem não constar na declaração de imposto de renda do agricultor ou estar no nome de um outro membro da família que não necessita constar nas informações cadastrais solicitadas pelos agentes financeiros. Nessa amostra as fontes complementares de renda também se destacaram, como já fora observado na amostra dos olericultores. Os agricultores familiares que contam com essas alternativas que complementam a renda apresentam um maior nível de capitalização e dependem menos dos programas de crédito rural para continuar nas atividades agropecuárias. TABELA 13 – Itens que complementam a renda agropecuária dos agricultores familiares. Amostra de 72 agricultores familiares do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de abril de 2001 e março de 2002. Aluguel de imóvel urbano Aluguel de máquinas e equipamentos Renda comercial Aposentadoria ou pensão Doações Arrendamento Outros 20,83% 1,39% 26,39% 62,50% 18,06% 11,11% 6,94% Fonte: Projeto “Desenvolvimento Local e Políticas Públicas: Análise e Proposta para o Novo Rural de São Carlos – SP”. Elaborado pelo autor. Entre os agricultores familiares dessa amostra apenas 26,39% (19/72) receberam algum tipo de assistência técnica entre abril de 2001 e março de 2002. No mesmo período 36,11% dos agricultores familiares participavam de alguma das organizações sociais: sindicato, associações ou cooperativas. Esses números demonstram o baixo grau de interação desses agricultores com duas das principais instituições, exceto os próprios agentes financeiros, relacionadas ao crédito rural governamental: a extensão rural oficial e os sindicatos rurais. 130 4.2.3 Amostra de agricultores familiares produtores de leite no Município de São Carlos –SP. Esta amostra está relacionada ao Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia de políticas’” contratado pela FAO (Food and Agriculture Organization) ao Departamento de Engenharia de Produção (DEP) da Universidade Federal de São Carlos – UFSCar e foi realizada no ano de 2003. Da amostra de 125 agricultores produtores de leite da região de São Carlos-SP, que inclui também agricultores dos municípios de Descalvado, Ribeirão Bonito e Dourado, 48 agricultores pertenciam ao Município de São Carlos. Desse grupo de 48 agricultores foram identificados 27 agricultores familiares (56,25%). Do total de agricultores familiares, 77,8% (21/27) atendiam as exigências do PRONAF e 100% atendiam às exigências do FEAP. Entre os agricultores que não se enquadraram no PRONAF metade extrapolou o limite de renda bruta anual e a outra metade excedeu o limite de área máxima permitida para as unidades produtivas. A Tabela-14 apresenta alguns indicadores que permitem avaliar o grau de interação entre os agricultores familiares dessa amostra e as principais organizações relacionadas ao crédito rural. Os sindicatos rurais, junto com a extensão rural oficial, têm papel fundamental tanto na divulgação dos programas de crédito para a agricultura familiar como também na formalização das solicitações de financiamento. Em relação aos serviços de assistência técnica chama a atenção a pequena porcentagem de agricultores que receberam os serviços de assistência técnica das organizações públicas (14,8%), mas é possível verificar que a maioria dos agricultores não ficou sem receber assistência técnica privada. A participação junto a sindicatos rurais, apesar de maior, também é bastante modesta. No período analisado, 14,8% dos agricultores estavam fora do sistema financeiro formal, pois não possuíam conta em banco. 131 TABELA 14 – Indicadores de integração dos produtores familiares com organizações relacionadas às operações de crédito rural. Amostra de 27 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003. Recebeu serviço de assistência técnica 29 Recebeu serviço de assistência técnica oficial Participação em sindicato rural Possuí conta em banco Compra de insumo a prazo 74,1% 14,8% 25,9% 85,2% 63,0% Fonte: Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia política’”. Elaborado pelo autor. De acordo com as informações da Tabela-15 a maioria dos agricultores familiares da amostra não considera os fornecedores de insumos uma importante fonte de crédito. Mas a maioria afirmou comprar insumos a prazo, como indicado na Tabela-14. Entre os agricultores familiares produtores de leite os compradores da produção não atuam como fornecedores de crédito, assim como fora constatado entre os olericultores. As fontes informais de crédito (familiares e amigos) aparecem com a mesma relevância dos bancos privados, demonstrando a importância dessa modalidade para esse segmento da agricultura. TABELA 15 – Principal fonte de crédito. Amostra de 27 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003. Fornecedores de insumos Associações / Cooperativas Compradores da produção Banco privado Banco oficial Organizações Não-Governamentais Familiares / Amigos Nenhuma 3,7% 7,4% 0,0% 14,8% 33,3% 0,0% 14,8% 25,9% Fonte: Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia política’”. Elaborado pelo autor. Uma das questões sobre o crédito rural presente no questionário de entrevistas perguntava especificamente se os agricultores haviam solicitado crédito nos 29 Inclui serviços veterinários privados, como vacinação de rebanho. 132 dois anos anteriores: 2001 e 2002. De acordo com as informações da Tabela-16 e apesar do pequeno número de solicitações verificado na amostra, destaca-se o fato de que os mesmos agricultores que solicitaram crédito rural no ano de 2001 solicitaram novamente nos anos subseqüentes. Uma vez superado os obstáculos para acessar o crédito rural existe uma tendência de que os agricultores continuem fazendo uso desse instrumento. Outro dado importante é que entre os agricultores que solicitaram o crédito rural, nenhum deles teve a solicitação recusada pelos agentes financeiros. No ano de 2003, o valor médio dos contratos foi de R$13.114,50, valor que pode ser considerado relativamente alto quando comparado com outros segmentos da agricultura familiar, confirmando a exigência de capital para essa atividade específica. TABELA 16 – Solicitou crédito nos anos de 2001, 2002 e 2003. Amostra de 27 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003. Solicitou crédito em 2001 Solicitou crédito em 2002 Solicitou crédito em 2003 14,8% 18,5% 25,9% Fonte: Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia política’”. Elaborado pelo autor. Em 2003, 40,7% dos agricultores da amostra contaram com um complemento de renda proveniente de aposentadoria ou pensão recebida, pelo menos, por um dos membros da família, confirmando a importância desses instrumentos para a agricultura familiar. A Tabela - 17 apresenta as informações referentes à utilização e destino dos recursos provenientes do crédito rural. As despesas com o custeio da produção e os investimentos em máquinas e equipamentos representam mais de 70% das aplicações dos recursos. 133 TABELA 17 – Destino dos recursos tomados em empréstimo. Amostra de 07 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003. Aquisição de insumos Máquinas e equipamentos Construção / Infra-estrutura Assistência técnica Manejo do rebanho Pagamento de funcionários Outros 28,6% 42,8% 0,0% 0,0% 0,0% 0,0% 28,6% Fonte: Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia política’”. Elaborado pelo autor. Para os agricultores que não solicitaram crédito rural foi perguntado sobre os motivos que impediram a solicitação do crédito rural. Cada agricultor podia indicar três razões. A Tabela-18 apresenta as opções oferecidas pelo questionário e a freqüência com que elas foram citadas pelos agricultores. O medo do risco envolvido nas operações de crédito foi o item mais citado, sendo indicado por 75% dos agricultores. Esse comportamento dos agricultores fornece um exemplo de filtro institucional de terceiro nível que está relacionado aos aspectos culturais dos agentes envolvidos. Mais de 50% deles disseram não necessitar de crédito rural, demonstrando que parte significativa da amostra possui um nível de capitalização que permite o autofinanciamento. Para esses agricultores buscar informações sobre os programas de crédito rural não está entre as atividades prioritárias. Por outro lado, mais de 50% apontou a taxa de juros elevada como o fator responsável pelo desinteresse em relação ao crédito. Esse dado pode estar indicando um possível desconhecimento desses agricultores em relação às condições de financiamento oferecidas pelos programas de crédito rural dedicados exclusivamente à agricultura familiar. 134 TABELA 18 – Freqüência das razões que explicam a não solicitação do crédito rural. Cada agricultor indicou três razões. Amostra de 20 agricultores familiares produtores de leite do município de São Carlos – SP. Dados referentes ao período de janeiro de 2003 e dezembro de 2003. Não precisou 12 Falta de garantia ou aval 05 Não quis 03 Considera arriscado 15 Dívidas anteriores 01 Não pode tomar 02 Muito caro 12 Outros 02 Fonte: Projeto “Identificando e quantificando elos críticos ao longo das cadeias de produção e da ‘cadeia política’”. Elaborado pelo autor. 135 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS A análise das três amostras confirmou os dados divulgados pelo programa PRONAF sobre o inexpressivo número de contratos de crédito rural envolvendo agricultores familiares do município de São Carlos-SP. Os resultados obtidos com o estudo empírico revelaram um alto grau de falta de informação tanto por parte dos agricultores, em relação às alternativas de financiamento oferecidas pelos programas oficiais, como pelos agentes operadores desses programas, em relação ao público potencial a ser atendido. Porém, este fato dificultou a comprovação de uma das hipóteses iniciais relacionada às condições de pagamento serem inadequadas para os agricultores (taxas de juros, prazos, carências, etc), uma vez que a maioria dos entrevistados desconhece as condições oferecidas pelas linhas de crédito subsidiado. É possível que para alguns agricultores, mesmo estas condições especiais sejam inadequadas, mas isso só poderia ser confirmado por meio de um estudo mais detalhado, pois seria necessário um estudo do fluxo de caixa dos produtores que não foi objeto de estudo do presente trabalho. As demais hipóteses iniciais foram testadas e comprovadas pelo trabalho. As entrevistas com representantes da extensão rural municipal e com membros dos sindicatos rurais, confirmaram a percepção dos agricultores, de que o principal agente operador do PRONAF no município, o Banco do Brasil, exige muitas garantias para aprovação das solicitações de empréstimo. Essa preocupação dos agentes financeiros com os mecanismos de enforcemnet dificulta o acesso de muitos agricultores ao crédito rural e contraria o objetivo principal do PRONAF: facilitar o acesso ao crédito. Segundo as informações obtidas junto a representantes da extensão rural pública, são poucos os agricultores familiares que procuram os serviços por eles oferecidos, confirmando os dados obtidos junto aos agricultores. Além disso, foi relatado que o órgão responsável pela extensão rural não tem infra-estrutura e nem pessoal suficiente para uma ação pró-ativa junto aos agricultores do município. Na ausência da assistência técnica estatal, as orientações relacionadas às atividades de projeto e sobre os problemas relacionados às atividades produtivas, em grande parte, são assistidas por instituições privadas que oferecem estes serviços, agregados ou não à venda de insumos. No Município de São Carlos-SP, de acordo com os dados coletados junto aos agricultores familiares, a falta de sintonia entre a oferta e a demanda de crédito rural pode ser explicada por um conjunto de fatores: a) a falta de conhecimento sobre as 136 possibilidades oferecidas pelo sistema de crédito rural, mesmo daquelas linhas vinculadas aos programas especialmente dedicados à agricultura familiar; b) as exigências bancárias que nem sempre podem ser atendidas pelos agricultores; c) a precária atuação da extensão rural governamental junto aos agricultores familiares, não divulgando as possibilidades de financiamento e auxiliando precariamente a elaboração de projetos técnicos para serem encaminhados junto com as solicitações de financiamento; d) a falta de interesse dos bancos em operar com os agricultores familiares e e) o receio dos agricultores em contrair dívidas e perderem as garantias oferecidas aos bancos como contra-partida aos empréstimos. Os programas de crédito para a agricultura definem as condições gerais de operação das linhas de crédito, mas deixam a critério das instituições financeiras incluírem as exigências que acharem conveniente, principalmente no que se refere a garantias. Também a avaliação da viabilidade dos projetos fica, em última instância, sob a responsabilidade dos técnicos dessas organizações, mesmo quando esses projetos são elaborados conjuntamente com a extensão rural pública. A decisão sobre a liberação dos recursos fica inteiramente sob controle das instituições financeiras e em função dos critérios particulares adotados por cada agência. A assimetria de informação também se destacou como um dos principais fatores que explicam as dificuldades de acesso aos recursos dos programas especiais. Os agentes financeiros não têm informações sobre os requerentes que, muitas vezes, não têm sequer conta corrente junto às organizações financeiras. Para obter informações cadastrais e levantar o histórico produtivo dos produtores os agentes financeiros têm que gastar recursos que implicam na elevação dos custos de transação devido à cobrança de taxas de contratos. Para resolver esse problema e minimizar os riscos envolvidos em operar com esse público, os agentes financeiros exigem garantias que não podem ser atendidas pela maioria dos agricultores ou mesmo decidem não operar o crédito para a agricultura familiar. O desconhecimento sobre os programas de crédito destinado à agricultura familiar, entre a maior parte dos agricultores da amostra de olericultores, pode ser fruto de falhas na difusão de informações sobre esses programas. Os agentes financeiros têm uma política de divulgação centrada no atendimento de “balcão”, restringindo-se às agências. Como os agricultores têm receio de contrair empréstimos em bancos e não têm o hábito de 137 buscar informações nas agências bancárias, perpetua-se uma situação de aparente falta de interesse por parte dos agricultores. Por outro lado, entre os representantes das instituições financeiras prevalece a sensação de ausência de demanda pelas opções de crédito dos programas especiais. As outras organizações, diretamente relacionadas aos programas especiais, a assistência técnica oficial e os sindicatos rurais, não dispõem de recursos e pessoal para terem uma atuação pró-ativa no sentido de divulgar os programas e aumentar o número de contratos a serem efetuados. Os programas de crédito especiais para a agricultura familiar, incluindo o PRONAF e o FEAP, vêm sofrendo modificações com o objetivo de corrigir falhas relacionadas ao desenho do programa, a exemplo da definição de agricultura familiar30 e dos limites de financiamento para cada linha de crédito. Apesar dessas iniciativas foi possível identificar outros filtros institucionais que repercutem no desempenho desses programas. Entre os filtros de primeiro nível destacam-se: a) a ampla autonomia dada às instituições financeiras para definirem outras exigências dos agricultores familiares (garantias, contra-partidas, etc); b) ausência de instituições financeiras apropriadas para operacionalizar o crédito rural; c) dependência em relação à política de assistência técnica e extensão rural. d) instrumentos de divulgação insuficientes, acarretando em alto nível de desinformação sobre os programas entre os agricultores familiares. Os filtros institucionais de segundo nível estão relacionados, principalmente, a atuação dos atores diretamente relacionados ao crédito rural, com destaque para as organizações financeiras que operacionalizam os programas, os órgãos de assistência técnica e extensão rural e as entidades de representação dos agricultores. Entre os filtros de segundo nível destacam-se: a) o conflito entre os objetivos das instituições financeiras, principalmente os bancos, (maximizar lucros) e os objetivos dos programas especiais (atender a um público alvo) levam essas instituições a não adotarem uma postura pró-ativa para a operacionalização desses programas: não se preocupam em identificar o público 30 Uma das mudanças mais importantes, incluída no Decreto n° 1946, de junho de 1996, está a inclusão das unidades produtivas que empregam, em caráter permanente, até dois trabalhadores contratados. 138 potencial em sua área de atuação; adotam estratégias de divulgação ineficientes, como o atendimento de balcão; impõem exigências, tais como garantias, avalistas, contra-partidas, que nem sempre podem ser atendidas pelos agricultores familiares, etc; b) os agricultores familiares nem sempre estão integrados ao sistema bancário; c) o despreparo das organizações de representação dos agricultores e dos profissionais de extensão rural para tratar e divulgar as possibilidades de financiamento para a agricultura familiar. d) incapacidade dos órgãos de extensão rural para auxiliar os agricultores familiares na elaboração de projetos que levem em consideração as potencialidades de cada unidade produtiva em particular; e) altas taxas cobradas pelos cartórios para registro de contratos de crédito rural e de títulos de propriedade, determinadas pela legislação vigente. f) Altas taxas cobradas por instituições financeiras junto ao Tesouro para operar as linhas de crédito especiais (BITTENCOURT, 2002). No terceiro nível, os principais filtros institucionais estão relacionados à postura e decisões dos agricultores familiares. Destacam-se: a) o receio em contrair empréstimos e eventualmente correr o risco de perder parte do patrimônio constituído; b) a falta de iniciativa em buscar informações sobre as condições de crédito oferecidas pelos programas especiais; c) a incapacidade para elaborar projetos que explorem as possibilidades oferecidas nos programas de crédito; d) o predomínio de práticas de gestão informais sem métodos de planejamento e controle das atividades produtivas. e) a falta de iniciativa e a ausência de ação coletiva entre os agricultores; No segundo conjunto de hipóteses, relacionado às alternativas de financiamento adotadas pelos agricultores, destacou-se a importância da relação entre os agricultores e os fornecedores de insumos, configurando-se uma relevante alternativa de financiamento para o grupo estudado. Porém, trata-se de uma alternativa de financiamento, 139 predominantemente, de custeio e não de investimento. Para essa última modalidade, as empresas oferecem opções para o financiamento de máquinas e equipamentos. Os investimentos realizados sem financiamento externo são limitados, pois dependem da disponibilidade de recursos próprios, escassos para a maioria dos entrevistados. Entre as fontes que complementam a renda total da família dos agricultores destacaram-se a aposentadoria e o aluguel de imóveis. A primeira indica uma tendência já verificada por estudos anteriores (ABRAMOVAY & VEIGA, 1998; GUANZIROLI et al., 2001). A segunda fonte de renda pode indicar que a família de alguns agricultores possui uma estratégia de diversificação de renda e deixa de intensificar investimentos na agricultura. Entretanto, é comum, conforme foi identificado nas entrevistas junto aos agricultores, que esses imóveis geralmente estejam registrados nos nomes dos patriarcas, quando estes ainda vivem, ou que eles ainda não tenham sido dividido entre os herdeiros. Apesar de constituírem uma importante fonte de renda, na maioria das vezes ela é dividida por vários membros da família. Os imóveis, como foi relatado, nem sempre são fáceis de serem utilizadas como garantias para os empréstimos, pois quando eles são parte de herança a ser dividida, todos os herdeiros beneficiados têm que estar de acordo com a sua alienação hipotecária, dificultando a transação. Com a análise dos dados empíricos, além de testar as hipóteses iniciais, foi possível identificar outros fatores que contribuem para compreensão da falta de sintonia entre a oferta e a demanda de crédito rural no município de São Carlos-SP: 1) os problemas relacionados à falta de informação e a pequena interação entre os agricultores familiares e as instituições correlatas estão entre os principais obstáculos a serem superados para que a agricultura familiar menos capitalizada possa acessar os recursos do crédito rural; 2) os bancos desconhecem a demanda de crédito da agricultura familiar no município, pois ao invés deles terem uma postura pró-ativa, predomina entre eles uma estratégia de atendimento de “balcão”, esperando que os agricultores procurem informações sobre os programas especiais; 3) a pouca integração entre os agricultores familiares; 4) os bancos possuem uma carteira de clientes diversificada com ênfase para as atividades comerciais, industriais e dos agricultores capitalizados; 140 5) para a formalização dos contratos de crédito existem altos custos de transação relacionados ao registro dos contratos de crédito no cartório de títulos e documentos; 6) os agricultores familiares que não possuem o título de propriedade regularizado e pretendem fazê-lo, devem arcar com elevadas taxas de registros pagas nos cartórios de imóveis; Ao mesmo tempo em que foi possível constatar a existência de um público potencial para ser atendido pelos programas de crédito especiais para a agricultura familiar também ficou evidente que parte dos agricultores familiares estão relativamente capitalizados e, portanto, não têm como prioridade acessar os recursos desses programas. O inexpressivo número de contratos de crédito rural realizado no município de São Carlos, por um lado, é reflexo da desinformação e dificuldade de acesso ao crédito rural enfrentada pelos agricultores menos capitalizados e, por outro lado, é reflexo do desinteresse dos agricultores mais capitalizados. No município de São Carlos como os agentes financeiros têm a possibilidade de trabalhar com uma carteira de clientes ampla e diversificada que lhes proporcione menores riscos e melhores contrapartidas, os agricultores familiares menos capitalizados não lhes despertam interesses. Já em municípios de economia essencialmente agropecuária, operar com esse público pode ser fundamental para garantir a sustentabilidade econômica desses agentes. A constituição da Associação dos Agricultores Familiares do município trouxe benefícios coletivos para os agricultores familiares. A atuação da associação conseguiu, por exemplo, a abertura de um ponto de comercialização de produtos oriundos da agricultura familiar, localizado no mercado municipal e a concretização do projeto de construção de um centro de desenvolvimento de tecnologias para a agricultura familiar. Para que o acesso ao crédito rural entre os agricultores familiares do município de São Carlos seja ampliado, os agricultores interessados precisam atuar conjuntamente, ampliando as parcerias entre as organizações de representação e as demais organizações correlatas ao crédito rural. Atuando coletivamente os agricultores terão maiores chances de superar as dificuldades individuais, pois os seus poderes de barganha serão significativamente ampliados. 141 6 BIBLIOGRAFIA ABRAMOVAY, R. Paradigmas do Capitalismo Agrário em Questão. São Paulo: Hucitec, 1992. ABRAMOVAY, R. Uma nova extensão para a agricultura familiar. In: SEMINÁRIO NACIONAL DE ASSSISTENCIA TÉCNICA E EXTENSAO RURAL, 1997. Brasília: Anais...Brasília:PNUD, 1997. ABRAMOVAY, R. Desenvolvimento e instituições: a importância da explicação histórica. In: ARBIX, Glauco, ZILBOVICIUS, Mauro e ABRAMOVAY, Ricardo. Razões e ficções do desenvolvimento. UNESP/EDUSP – 2001. ABRAMOVAY, R. & VEIGA, J. E. Novas Instituições para o Desenvolvimento Rural: o caso do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (PRONAF). Texto para discussão n. 641, Convênio FIPE/IPEA 07/97. Brasília, mimeo abril de 1999. ARAÚJO, P.F.C. & ALMEIDA, A. Financiamento da Agricultura: Evolução e Perspectivas. Revista Preços Agrícolas, pp. 3-8, abril de 1997. AZEVEDO, P. F. A Nova Economia Institucional, Cap. 1,2 e 3. In:Farina, E. M. M. Q., Azevedo, P. F., Saes, M. S. M.Competitividade: Mercado, Estado e Organizações. São Paulo: Editora Singular, 1997. AZEVEDO, P. F. Nova Economia Institucional: referencial geral e aplicações para a agricultura. Agricultura em São Paulo, SP, v.47,p.33-52, 2000. BITTENCOURT, G. A. Cooperativas de Crédito Solidário: Constituição e Funcionamento. NEAD: Campinas – 2001. Disponível na Internet. http://www.nead.org.br. Acessado em: 12 set. 2002. BRAVERMAN, A. & GUASH,J.L. Administrative Failures in government Credit Programs. In: Karla Hoff, Avishay Braverman, Joseph E. Stiglitz (editors), The Economics of Rural Organization. Oxford University Press, 1993 BRYMAN, A. Research methods and organization studies. New York: Routledge, 1989, 282p. BUAINAIN, A. M. Trajetória Recente da Política Agrícola Brasileira: da intervenção planejada ‘a intervenção caótica. Campinas: Instituto de Economia/UNICAMP, 1999. 325p. Tese (Doutoramento em Economia). (Mimeo.). BUAINAIN, M. & SOUZA FILHO, H. M. Procera: Impactos produtivos e capacidade de pagamento. Texto para Discussão. Convênio FAO/INCRA. Brasília, 1998. BUAINAIN, M. & SOUZA FILHO, H. M. Elementos para Análise e Desenho de Políticas de Crédito para Agricultura Familiar. São Carlos: mimeo, novembro de 2001. 142 BUAINAIN, A . M., FONSECA, R. B., SCHRODER, M., SOUZA FILHO, H. M. Crédito Rural, fundos de aval e agricultores familiares In: Limites e possibilidades de mecanismos de garantia de crédito rural: a experiência dos países do Mercosul, 2002, Campinas. BUAINAIN, A. M.; ROMEIRO, A. A agricultura familiar no Brasil: agricultura familiar e sistemas de produção. Projeto de cooperação técnica INCRA/FAO. UTF/BRA/BRA. Brasília, 2000. Disponível em: <http://www.incra.gov.br/fao/tpnp3.htm>. Acessado em: 30 abr. 2002. BUAINAIN, A. M.; ROMEIRO, A. GUANZIROLI, C. A agricultura familiar e o novo mundo rural, 2001. CARMO, M. S. do. A Produção Familiar como Locus Ideal da Agricultura Sustentável. Agricultura em São Paulo, SP, v.45, p.1-15, 1998. COASE, R.H. The nature of the firm. In: WILLIAMSON, O.; WINTER, S. (Eds.). The nature of the firm: origin, evolution and development. Oxford: Oxford University Press, 1991. EHLERS, E. Agricultura Sustentável: origens e perspectivas de um novo paradigma. Guaíba: Agropecuária, 1999. FAULIN, E. J. & AZEVEDO, P. F. Distribuição de hortaliças na agricultura familiar: uma análise das transações. Informações Econômicas, São Paulo, v.33, n.11,p. 24-37, nov, 2003. GUANZIROLI, C., ROMEIRO, A., BUAINAIN, A.M., SABBATO, A. D., BITTENCOURT, G. Agricultura Familiar e Reforma Agrária no Século XXI. Rio de Janeiro: Garamond, 2001. GUANZIROLI, C.; CARDIM, S. E. C. S. Novo retrato da agricultura familiar: o Brasil redescoberto. Projeto de cooperação técnica INCRA/FAO. Brasília, 2000. Disponível em: http://www.incra.gov.br/sade/doc/AgriFam.htm>. Acessado em: 30 abr. 2002. GOODMAN,D; SORJ, W.; WILKINSON, J. Das Lavouras à Biotecnologia: agricultura e industria no sistema internacional. Rio de Janeiro: Campus, 1990. GENTIL, D. & FOURRIR, Y. Pueden los campesinos ser banqueros? Experiencia de ahorro y crédito. Managua: ****. GRAMEEN BANK. The Grameen Reader – Training Materials for the Internacional Replication of the Grameen Bank Financial System for Reduction of Rural Poverty. Chittagong: Packages Corporation Limited, 1992. HALL, P. A.; TAYLOR, R. C. R. As Três Versões do Neo-Institucionalismo. Publicado originalmente em Political Studies, dec. 1996. Tradução de Gabriel Cohn. 143 HOFF, K. & STIGLITZ, J. E. “Imperfect Information and Rural Credit Markets: Puzzles and Policy Perspectives”. In: Karla Hoff, Avishay Braverman, Joseph E. Stiglitz (editors), The Economics of Rural Organization. Oxford University Press, 1993. HOFFMANN, R.; SERRANO, O.; NEVES, E. M.; THAME, A. C. de M.; ENGLER, J. J. de C. Administração da Empresa Agrícola. São Paulo: Pioneira, 1976. IBGE. Censo Agropecuário 1995-1996. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/economia/agropecuaria/censoagro/default.shtm> . Acessado em: 16 jun 2002. JANVRY, A.; KEY, N.; SADOULET, E. Agricultural and Rural Development Policy in Latin America: New Directions and New Challenges. Dept. of Agricultural and Resource Economics, University of California, Berkeley: 1997. KAGEYAMA, A. Produtividade e Renda na Agricultura Familiar: efeitos do PRONAF – crédito. Agricultura em São Paulo, São Paulo, SP, 50 (2): 1-13, 2003. KAGEYAMA, A. et al. O novo padrão agrícola brasileiro: do complexo rural aos complexos agroindustriais. In: DELGADO, G. C.; GASQUES,J.; VERDE, C.M.V (orgs.). Agricultura e políticas públicas. Relatório n. 127, p. 113-224. Brasília: IPEA, 1990. LACKY, P. Buscando soluções para a crise do agro: no guichê do banco ou no banco da escola? Santiago do Chile: FAO, 1996. (mimeo). LAKATOS, E. M. & MARKONI, M. A. Metodologia Científica. 2ed. São Paulo: Atlas, 1991. LAMARCHE, H (COORD.) (1993). A agricultura Familiar. Campinas: Ed. Da Unicamp, 1993. LAZZARINI, S.G. & CHADDAD, F.R. Finanças no Agribussiness. In: ZYLBERSZTAJN, D. & NEVES, M. F. Economia & gestão dos negócios agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000. LLAMBÍ, L; ZEZZA, A. Identifying and quatifying critical links along the policy and commodity chains. Project Proposal. Sub-theme: Making Markets work for the Poor. Draft for Discussion. FNPP. Roma e Caracas, 2003. MELLO, M. A.; ABRAMOVAY, R.; SILVESTRO, M. L.; DORIGON, C.; FERRARI, D. L.; TESTA, V. M. Sucessão hereditária e reprodução social da agricultura familiar. Agricultura em São Paulo, São Paulo, SP, 50 (1): 11-24, 2003. MUNDO NETO, M.; SOUZA FILHO, H. M. (a). Problemas do Acesso ao crédito para Agricultura Familiar: um estudo de caso no Município de São Carlos. In SOBER, 2003, Juiz de Fora/MG. Anais – CD-ROM. 144 MUNDO NETO, M.; SOUZA FILHO, H. M. (b) Fundos de Aval e Cooperativas de Crédito rural: Alternativas para Agricultores Familiares acessarem o crédito. Revista de Ciências Gerenciais, Vol. VII – n. 09, p. 42-49, set-2003. NORTH, D. C. Institutions, Institutional Change and Economic Performance. Cambridge University Press, 1990. NORTH, D.C. Custos de transação, Instituições e Desempenho Econômico. Rio de Janeiro: Instituto Liberal, 1994. 38p. PAULILLO, L. F. Sobre o Desenvolvimento da Agricultura Brasileira: Concepções Clássicas e Recentes. In: BATALHA, M. O. (org). Gestão Agroindustrial. (2a Edição). Ed. Atlas, 2001. V. I. PERACI, A . S. & BIANCHINI, V. Fundos Garantidores como instrumento de ampliar a cobertura do crédito rural no Brasil – Casos do Sul Brasileiro. Campinas: mimeo 2002 SACHS, I. Estratégias de transição para o século XXI: desenvolvimento e meio ambiente. São Paulo: Studio Nobel, 1993. SAES, M.S.M. Organizações e Instituições. In: ZYLBERSZTAJN, D. & NEVES, M. F. Economia & gestão dos negócios agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000. SCHRODER, M. O Cooperativismo de Crédito Rural e o Financiamento da Agricultura Familiar. In Anais do II Encontro de Pesquisadores Latino-americanos. Buenos Aires – 10 e 11 set. 2002. SCHRODER, M. Instituições Não-Convencionais de Crédito e a Agricultura Familiar. In CONGRESSO BRASILEIRO DE ECONOMIA E SOCIOLOGIA RURAL, XXX. SIMON, H. “The Architecture of Complexity”. Proceedings of the American Philosophical Society, v.106, p.467-82, Dec.1962. SINGER, P. Introdução à Economia Solidária. São Paulo: Editora Fundação Perseu Abramo, 2002. SOUZA FILHO, H. M. Desenvolvimento Agrícola Sustentável. In: BATALHA, M. O. (org). Gestão Agroindustrial. (2a Edição). Ed. Atlas, 2001. V. I. STIGLITZ, J. E. Peer Monitoring and Credit Markets. In: KARLA HOFF, AVISHAY BRAVERMAN, JOSEPH E. STIGLITZ (editors), The Economics of Rural Organization. Oxford University Press, 1993. STIGLITZ, J. E. Information and the change in the paradigm in economics. Columbia Business School, New York, 2001. 145 VEIGA, J. E. O Desenvolvimento Agrícola: uma visão histórica. São Paulo: Hucitec, 1991. VEIGA, J. E. Diretrizes para uma Nova Política Agrária. Seminário sobre reforma agrária e desenvolvimento sustentável. Fortaleza: 11/1998 (mimeo). WILLIAMSON, O. E. The Economic Institutions of Capitalism: Firms, Markets, Relational Contracting. New York: The Free Press. WILLIAMSON, O. E. The Mechanisms of Governance. New York: Oxford University Press, 1996. WCED – WORLD COMMISSION ON ENVIRONMENT AND DEVELOPMENT. Our common future. Oxford: Oxford University Press, 1987. p. 43. YIN, R. K. Case study research: design and methods. 2 ed. USA: Sage Publications, 1997. ISBN 0-0839-5662-2. ZEZZA, A.; LLAMBÍ, L. Meso-Economic Filtres along the Policy Chain: Understanding the Links between Policy Reforms and Rural Poverty in Latin America. Artigo preparado para Divisão de Agricultura e Desenvolvimento Econômico (ESA) da FAO. Roma e Caracas. 2001. Disponível em: www.fao.org/es/ESA/wp/wp04_02.pdf. Acesso em: 12/08/04. ZYLBERSZTAJN, D. Economia das Organizações. In: ZYLBERSZTAJN, D. & NEVES, M. F. Economia & gestão dos negócios agroalimentares. São Paulo: Pioneira, 2000. 146 7 APÊNDICES Apêndice – I Questionário aplicado aos produtores familiares de hortaliças, no Município de São Carlos. UNIVERSIDADE FEFERAL DE SÃO CARLOS - UFSCAR DEPARTAMENTO DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO – DEP PROJETO GESTÃO INTEGRADA DA AGRICULTURA FAMILIAR ETAPA 1: DIAGNÓSTICO IDENTIFICAÇÃO DO ENTREVISTADO ENTREVISTADOR Nome do proprietário............................................................................................. IDENTIFICAÇÃO DO Número do questionário: ....................Digitador: ................................................. Nome da propriedade............................................................................................ Entrevistadores: ................................................................................................... Endereço para correspondência............................................................................ .............................................................................................................................. Município.............................................CEP........................................................... Data entrevista: ...................................... Tel.:......................................................FAX:.......................................................... e-mail: ................................................................................................................... OBSERVAÇÃO: Em algum momento da entrevista, perguntar sobre a rotina diária de trabalho, melhor dia e horário para reuniões e visitar a horta. DADOS GERAIS DA FAMÍLIA 1. Quem é o responsável pela exploração/gestão das atividades produtivas: ( ). 1-Proprietário; 2- Administrador; 3- Arrendatário; 4-Outro: ........................................... Obs: Preencher a tabela com membros da família do responsável pela exploração/gestão que trabalham ou vivem na propriedade. Parentesco 1-Chefe 2- cônjuge 3- filho(a) 4- pai/mãe/ sogro/ sogra 5- genro/nora 6- neto (a) 7- agregado(s) 8- irmão(ã) 9- outro(s) Grau de escolaridade: 1-1º grau(fund.). 2-2º grau(médio) Sexo 1-M 2-F 3- superior Idade 4- Supletivo 1º grau 5- Supletivo 2º grau 6- alfabetização adultos; 7-pré escola/creche; 8-Analfabeto; Trabalha Escolaridade com 1-Completo hortaliças? 2.Incompleto 1-Sim 2-Não 147 Culturas Valor total gasto com salários terra parceria/Meia/socied.? em Tomou terra Matas plantadas (R$) Terras produtivas não utilizadas Terras inaproveitáveis (R$) Atividades não agropecuárias 3. (serviços não agropecuários, Quando é necessário contratar funcionários fixos ou temporários? É turismo rural, ...) vantajoso? RECURSOS NATURAIS 5. Quanto aos recursos naturais da propriedade: USO DO SOLO 4. Qual a área total explorada em hectares de outubro/2001 a setembro de a) Como é o relevo do local onde são plantadas as hortaliças (muito inclinado, inclinado, plano)? ¾ Caso seja inclinado ou muito inclinado, quais as tecnologias (processos e equipamentos) utilizadas para correção (terraço, curva de nível ...)? 2002, inclusive terras tomadas e cedidas em arrendamento ou parceria............................(ha). Arrendamento Cedeu Uso Área terra em Tomou terra arrendamento? arrendamento? ( ) 1-Sim, 2-Não ( ) 1-Sim, 2-Não em (ha) Área cedida arrendamento: em Área tomada ................................... (ha) ...............................(ha) Culturas permanentes Culturas temporárias Parceria /meia/ sociedade b) Qual o tipo de solo: leve (arenoso, claro); médio (misto); pesado (argiloso, escuro)? ¾ É feita análise do solo? Com que freqüência? ¾ Quais as técnicas usadas para a conservação/melhoria do solo (adubação, colocar calcário para corrigir a acidez ...)? c) Tem problemas com a chuva? Atrapalha ou ajuda? em arrendamento: d) ¾ ¾ ¾ ¾ em parceria/Meia/socied.? Matas e florestas naturais Empregados Temporários (inclusive N.º de empregados temporários Valor total gasto Cedeu Pastagem N.º de empregados permanentes empreita de trabalho) em descanso MÃO-DE-OBRA 2. Mão-de-obra utilizada de outubro/2001 a setembro/2002. Empregados permanentes temporárias Existe fonte na propriedade? Utiliza irrigação? Se sim que tipo (gotejamento, aspersão, por sulco – gravidade)? A água disponível é suficiente para irrigação? Qual a distância entre a fonte a os canteiros de hortaliças? Se há necessidade de puxar água de algum lugar como é feito? Há controle sobre a qualidade da água (análise)? Como é efetuado? Quais os gastos? 148 ¾ Falta água em alguma época do ano? ¾ O que faz para garantir/conservar a fonte de água ( mantém matas nas margens, represamento ...). e) Há ocorrência de geada e granizo na propriedade? Quais os problemas causados? BENFEITORIAS, MÁQUINAS E EQUIPAMENTOS 6. Quais as benfeitorias existentes na propriedade e que são utilizadas no cultivo das hortaliças? Descrição (usar chave) 7. Tamanho/ Quantidade (usar chave para tamanho) 123- Utilidade p/ hortaliças pouco utilizado médio uso muito utilizado Tamanho 1-m² 2-km 3-outros Quais as máquinas e equipamentos próprios? Descrição Valor atual (estimado) Idade Trator Carro/camioneta Triturador Bomba d’água / gerador Grade Arado Equipam. de irrigação Outros anos anos anos anos anos anos anos anos R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ OBS: óleo, filtro, peças de reposição rápida não são considerados manutenção. CULTIVO 8. 1-sede 2-cercas 3-poços 4-estufas túnel 5-estufas galpão Chaves Descrição 6-galpões 7-açudes 8-curvas de nível 9-estradas da propriedade 10-outras (quais?) Há quanto tempo trabalha com hortaliças? Tipo de manutenção 1- preventiva 2- corretiva 3- não faz Freq. de manutenção 1-semanal 2-mensal 3-anual Utilidade no cultivo de hortaliças: Gasto com manutenção 1- muito 2- médio (consertos e peças) 3- pouco 4- não utiliza 149 9. Responda o quadro abaixo com os dados do cultivo de hortaliças na sua propriedade com base no período de outubro/2001 a setembro/2002: Hortaliças Forma de cultivo/área 1- a campo 2- estufa 3- outros Época de cultivo 1-o ano todo 2-alguns meses (citar) Área de plantio Vendas Quant. (kg/mês; caixas/mês; maços/mês) Unid. (kg; caixas; maços) Valor da venda (mês) R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ OBS: Verificar com o produtor: ¾ Quantidade contida na caixa; R$ R$ R$ ¾ Ressaltar sua posição de importância das hortaliças: ......................... ¾ Quantidade contida no maço; ¾ Tamanho do canteiro; 11. O que é mais importante de ser controlado em cada etapa e como isso é feito? Folhosa 10. Quais as outras 3 principais atividades rurais realizadas na propriedade por ordem de importância (faturamento) de outubro/2001 a setembro/2002? Atividade Venda mensal Frutos Bulbo e raízes Preparo do Preparo da Fase de Colher, embalar e solo muda crescimento armazenar 150 OBS: folhosas (alface, rúcula, agrião, almeirão, acelga, salsinha...); fruto (tomate, abobrinha, pimentão, pepino ...) e bulbo e raízes (cebola, alho, batata, beterraba, cenoura...). 14. Tem algum projeto para aumentar a produtividade ou a produção? O que está sendo feito neste sentido? 12. Qual a diferença entre a quantidade plantada e a quantidade colhida? (% de perda na produção). Quais as principais causas dessas perdas? 15. Deixa de cultivar algum tipo de hortaliça por não gostar de produzir? Qual hortaliça? Qual o motivo? 13. Como identifica o aparecimento das doenças? Quais as medidas de prevenção? Que medidas são adotadas para sanar/erradicar as doenças? INSUMOS / MATÉRIAS PRIMAS 16. Quais os insumos/matérias-primas comprados para a produção das hortaliças (muda, semente, adubo, agroquímicos ...)? Insumos Quantidade (p/ tempo) Valor (mensal) R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ R$ Fornecedor Forma de pagam. 1-a vista 2- a prazo Prazo de pagam. Taxa de juros Dificuldade na aquisição de insumos 151 17. Houve produção de matérias-primas na propriedade? Qual? Insumo produzido 20. Há uma avaliação dos fornecedores de insumos? Quais os cinco principais Vendas Quant. Unid. Quant. Unid. Valor total das vendas Principal comprador: critérios para escolher o fornecedor de insumo? 1-Feira/ consumidor ( ) variedade de produtos 2-Comerciante intermediário 3-Governo 4-Associação cooperativa 5-Agroindústria/ frigorífico 6-Não houve vendas ( ) regularidade na entrega ( ) qualidade ( ) limite mínimo para compra ( ) condições de pagamento R$ ( ) tradição no mercado R$ ( ) localização R$ ( ) assistência técnica R$ ( ) preço R$ ( ) outros 18. Como escolhe os insumos a serem comprados? O que considera importante 21. Está tendo ou já teve problemas com fornecedores no último ano nesta escolha (marca, preço, indicação de terceiros, experiência passada (outubro/2001 a setembro de 2002)? Que tipo de problema? Que atitude foi ....)? tomada? 19. É feito algum tipo de inspeção nos insumos no momento em que recebe ou retira na loja? Como essa inspeção é feita (inspeção visual, comparação ...)? Depois de adquirido, o que é feito com o insumo se for detectado algum problema? No caso de haver vários fornecedores, seria possível saber de qual foi comprado e onde foi usado? TOMADA DE DECISÕES 152 22. Como decide o que produzir (recursos naturais, o que sabe plantar, o que 27. Que impostos paga (ITR, ICMS ....)? Sabe qual são os valores? tem tradição em plantar, o que gosta de plantar, o que o mercado pede, o que pagam melhor (preço), o que consegue produzir com escala de produção, estuda possibilidades de diferenciação de produtos ...)? Quais as 28. Os controles de gastos pessoais (ou da família) e da propriedade são feitos juntos? dificuldades encontradas para decidir? 29. Quais são as atividades que geram custos na produção de hortaliças em 23. Como decide como produzir (segue tradição na forma de produzir, utiliza técnicas atualizadas de produção, estuda possibilidades de agregação de valor ...)?Quais as dificuldades encontradas para decidir? 24. Como decide quanto produzir (produz o máximo que pode, de acordo com cada uma das etapas de produção? (assinale 1=pouco gasto até 5=muito gasto) Preparo do solo Preparo da muda a demanda, de acordo com o dia da semana, estação do ano ...)?Quais as Fase de crescimento Colher, embalar e armazenar dificuldades encontradas para decidir? 25. Como decide para quando produzir (de acordo com as exigências dos compradores, época ...)?Quais as dificuldades encontradas para decidir? QUALIDADE 30. Faz alguma classificação dos produtos? Como é feita? Sente a necessidade de alguma tabela ou manual com as descrições dos padrões de qualidade REGISTRO DE INFORMAÇÕES (tamanho, cor, espessura ....)? 26. Faz algum tipo de controle das atividades da propriedade? O que é controlado? (custos/despesas, vendas por produto, estoques, prazos de 31. Acha importante a padronização de produtos? Como faz a padronização dos produtos? validade, índices de perdas, inspeção de produtos para venda, controle de pragas e doenças, etc.) Onde registra? Como controla? - Caso não haja controles, qual o motivo? 32. Todas as pessoas envolvidas trabalham/produzem/aplicam as técnicas da mesma maneira? Como garante que elas estão fazendo da mesma forma? Isso é importante? LEVANTAMENTO DOS CUSTOS Outras (especificar) 153 33. Há algum tipo de treinamento para o pessoal? Como é feito o treinamento (na propriedade ou fora dela)? 34. Quais os cuidados que são tomados em termos de higiene e limpeza do ambiente produtivo? na propriedade? Acessa a Internet? Para que finalidade são utilizados o 35. Após a aplicação de algum agrotóxico, quanto tempo aguarda para colher os produtos? para resolvê-los? 37. Seria possível melhorar a qualidade de seus produtos? Como? Vale a pena trabalhar no sentido de melhorar a qualidade de seus produtos? Por quê? (que benefícios poderia receber em decorrência disso?) BUSCA DE INFORMAÇÕES local, recuperação de mananciais e do solo, reflorestamento, adubação orgânica ...? Quais os cuidados tomados para preservar o meio ambiente? 41. Participa, já participou ou tem interesse em participar de sindicatos, associação ou cooperativa? Se sim, quais as vantagens oferecidas (treinamento, informações, acesso a mercado, comercialização ...)? Se não qual o motivo? 42. Já utilizou ou utiliza o serviço de extensão rural municipal? Se sim, qual a 38. Onde busca as seguintes informações? ) Orientação técnica para produção ) Orientação para comercializar ) Capacitação gerencial ) Preços ) Necessidades dos clientes computador e a Internet (buscar informações, controle da propriedade ...)? 40. Participa de cursos sobre preservação do meio-ambiente, desenvolvimento 36. Quais são os problemas de qualidade mais freqüentes? O que tem sido feito ( ( ( ( ( Fontes de informação: 1-associações; 2-sindicatos; 3-cooperativas; 4-reunião de produtores; 5-fornecedores; 6-prefeitura (Casa da agricultura/extensão); 7-Embrapa; 8-Sebrae; 9-jornal/revista; 10-TV; 11-Internet; 12-feiras 13-profissionais autônomos; 14-amigos/vizinhos; 15-intermediário; 16-outros; 17-não busca 39. Alguém na propriedade sabe usar computador (quem)? Possui computador sua avaliação de acordo com a seguinte classificação: 1- ótimo 2- bom 3( ( ( ( ) Padrões de qualidade ) Previsão do tempo ) Crédito ) Outros regular 4- ruim 43. Conhece a Cooperativa de Crédito Rural do Vale do Mogi-Guaçu – CREDIGUAÇU e a cooperativa de insumos agropecuários - COOPERVAN ? Tem informações sobre como ingressar no quadro de cooperados? Conhece 154 amigos ou concorrentes que estejam na cooperativa? Gostaria de se tornar 48. Sabe onde seus produtos são consumidos (população local ou de fora ...)? E um cooperado? valor que é vendido no varejo? 44. Tem conhecimento sobre alguma iniciativa de apoio/incentivo do governo federal, estadual ou municipal para a agricultura familiar ou hortaliças? Quais? Qual a sua avaliação? 45. Quais seus conhecimentos sobre as leis para os produtos/produção de hortaliças (normas para embalagem, código de defesa do consumidor, teor máximo permitido de agrotóxico, período de carência depois de aplicar SEGMENTAÇÃO 49. Onde seus clientes estão localizados (São Carlos, outras cidades)? É viável comercializar em outras praças? agrotóxico ...)? Se sim, ajudam ou prejudicam? 46. Há algum tipo de fiscalização de órgão governamental ou do próprio cliente 50. Quais as principais razões para escolha dos seus clientes (melhores condições de pagamento, maior preço, garantia de preço médio, ajudam a na propriedade? O que é visto? financiar a produção, oferecem prêmio pela qualidade superior, estão dispostos a comprar os produtos disponíveis, bom relacionamento com o 47. Você percebe um crescimento ou uma queda do consumo de hortaliças na cliente, falta de outro cliente/falta de opção, não perder mercado, outros)? região? 51. Para quem vende seus produtos? Perguntar o nome do cliente (empresas) 01 02 03 O produto é: 1-consignado 2-vendido Freqüência: 1-diária 2-semanal Quem compra (dono, encarregado) Qtd. Vendida (%) Cliente é fixo? (sim/não) Forma de pagto Prazo de 1-a vista pagto 2- a prazo % Desconto por perda 155 04 05 06 07 08 09 10 * No caso de vender produtos para pessoas que vão à propriedade perguntar se compram para consumo próprio ou para revenda. COMPORTAMENTO DOS CLIENTES 52. Quais as principais exigências de cada um de seus clientes? (regularidade de entrega, qualidade, quantidade, preço, variedade, pontualidade, outros) Clientes 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 1ª exigência 2ª exigência 3ª exigência 4ª exigência 5ª exigência 53. Quais as principais características do produto que cada cliente exige? (padrão do tamanho, cor, textura, limpeza, grau de hidratação, quantidade de agrotóxico, outras) Clientes 01 02 1ª característica 2ª característica 3ª característica 4ª característica 5ª característica 156 03 04 05 06 07 08 09 10 54. O que os clientes têm pedido de diferente? Você tem mudado algo para atender esses pedidos? Quais as dificuldades enfrentadas? 56. Os clientes estão dispostos a pagar mais por produtos especiais/diferentes? 55. O seu produto está melhor que o pedido dos clientes? Quais produtos e quais características? CONCORRENTES 57. Quem são seus concorrentes? Com relação aos seus concorrentes dê nota para cada item 1-melhor; 2-igual; 3- pior Concorrentes 7.1.1.1.1.1 R e g u l a Qualidade Preço Variedade r i d a d e Pontualidade de entrega Com relação a outros produtores avalie: 1-maior; 2-igual; 3-menor Produtividade Produção Copia o que eles fazem? O que? 157 Produtores deSãoCarlos Produtores de fora Carroceiros CEASA/CEAGESP Supermercados Sacolões Feiras Outros Sempre foi assim? Qual o motivo? 158 58. Faz algo especial na produção que diferencia a qualidade dos seus produtos em relação aos outros produtores? O quê? (não utiliza agrotóxico, método de produção diferenciado, ...) PROMOÇÃO 59. Atua dentro da loja fazendo reposição ou alguma atividade de promoção? 60. Realiza alguma atividade para divulgar seus produtos? Usa marca própria nas embalagens ou rótulos? Se sim, quais as informações contidas? E código de barras? PREÇO 61. Como o preço é determinado? Possuem formação local ou regional? 62. Compete buscando oferecer preços baixos ou oferece algo especial e diferente aos seus clientes? 63. Se ocorrer algum problema climático a elevação dos preços compensa as perdas? 64. Está satisfeito com o preço e condições oferecidas pelos seus clientes? Comente. DISTRIBUIÇÃO E LOGÍSTICA 65. Como são feitos os pedidos (telefone, contato pessoal, fax, e-mail ...)? Existe um pedido mínimo e máximo para algum produto? 66. Consegue manter uma oferta constante em quantidade e qualidade? 67. No caso de não ter produto suficiente para atender um pedido o que é feito(considerar um pedido de ultima hora)? ( ) entrega a quantidade que tem ( ) pega emprestado com o vizinho ( ) atrasa a entrega ( ) compra de outro para completar ( ) não aceita o pedido ( ) outros 68. Qual a porcentagem de pedidos não atendidos? Quais os motivos (falta de produto, problemas na produção ...)? 69. Qual a porcentagem de perda durante a distribuição dos produtos (comercialização, transporte)? 70. Por quais motivos o cliente devolve o produto (chegou murcho, fora do porte, quantidade inferior ao pedido, atraso, consignação ...)? O que é feito com o mesmo? Qual o custo? Quem paga pelo prejuízo? 159 71. Como é o transporte dos insumos até a propriedade e de produtos até os clientes? Freqüência (diária/semana /mensal) Quem faz o transporte? 1 próprio 2 terceiro *passar para última coluna Veículo utilizado 1 caminhão-baú s/ refrigeração 2 Caminhão aberto 3 Utilitários 4 Caminhão-baú refrigerado Distância percorrida/ ida e volta (Km) Horas gastas N.º de envolvidos Produtos Insumos ¾ ¾ Quais os dias da semana em que os produtos são entregues com maior freqüência? Quais as vantagens e desvantagens? 72. Além de levar produtos e buscar insumos, aproveita para fazer outras coisas (levar pessoas, buscar informação, levar produtos e aproveitar para buscar insumos, levar produtos de outros produtores...)? 73. Para cada um dos clientes, em que local é feita a entrega dos produtos? (depósito, área de vendas, busca na propriedade, ...) Cliente Local de entrega dos produtos 01 02 03 04 05 06 07 08 09 10 74. Que tipo de embalagem é mais utilizado para transportar e armazenar as hortaliças? Quem fornece? ( ) madeira retornável ( ) engradado ( ) plástico retornável ( ) madeira descartável ( ) caixa de papelão ( ) saco de ráfia ( ) saco de estopa ( ) outros 160 75. Uma vez produzido, que cuidados são tomados para conservar a qualidade do produto até a sua entrega aos clientes (mantém no pé/horta e/ou estoca)? Quanto tempo depois do ponto de corte a hortaliça pode esperar no pé/horta e/ou em estoque sem que haja perda no produto e na qualidade? 76. Realiza algum tipo de processamento na propriedade (empacotamento, lavagem, cortes, refrigeração...)? 77. Para você levar seus produtos daqui para seus clientes, quais as principais dificuldades encontradas? (embalagens ruins, perda no transporte, problema com manuseio, custo do transporte, vários pontos de entrega...) CONTRATOS 78. Existe algum tipo de contrato ou acordo com seu(s) fornecedor(es)? Quais as principais vantagens que esses contratos ou acordos oferecem (fornece ou facilita compra de insumos, fornece recursos para a produção, garante transporte e a comercialização de seus produtos, garante preço ...)? 79. Existe algum tipo de contrato ou acordo com seu(s) cliente(s)? Quais as principais vantagens que esses contratos ou acordos oferecem (fornece ou facilita compra de insumos, fornece recursos para a produção, garante transporte e a comercialização de seus produtos, garante preço ...)? 80. Possui acordo com algum cliente que realize o “dia da feirinha”? Como funciona? 81. Existe acordo com outros produtores que determine a compra conjunta de insumos, a venda de produção, o transporte de mercadorias, o uso de mão-de-obra e equipamentos, empréstimo de produto ou troca de mercadoria...? Como funciona? 82. Existem diferenças na negociação com grandes e pequenos fornecedores de insumos? Quais as vantagens e desvantagens? 83. Existem diferenças na negociação com grandes e pequenos clientes? Quais as vantagens e desvantagens? 84. Como é a relação entre você e seus clientes (amistosa, inspira confiança, acreditam na palavra do outro ...)? 85. Quais foram as principais dificuldades na comercialização de seus produtos entre outubro/2001 e setembro/2002? Enumere por ordem de importância. ( ) dificuldades em encontrar compradores ( ) dificuldades para transportar a produção ( ) dificuldades em se atualizar sobre preços e prazos ( ) dificuldade para atender as exigências 161 ( ) falta de condições para armazenar a produção ( ) outros AUXÍLIOS E RENDAS 86. No período de outubro/2001 a setembro/2002, recebeu algum tipo de auxílio (ex.:bolsa escola, transporte, alimentação, saúde) ? Quais os valores? 87. Qual foi o rendimento anual total dos membros da família entre outubro/2001 e setembro/2002, para os itens: Aposentadoria (R$): ................................. Pensão (R$): ................................... Doações (de familiares, não familiares, instituições) (R$): ............................... Aluguéis (arrendamentos, ...) (R$): ................................... Salário de atividades não agrícolas (R$): ............................... Outras fontes ou atividades (R$): ............................... RECURSOS FINANCEIROS 88. Solicitou empréstimos para financiar as atividades desenvolvidas (custeio, investimento, comercialização) entre outubro/2001 a setembro/2002? a) Se sim e tenha conseguido aprovação, complete o quadro de acordo com as opções abaixo: *Fontes **Finalidade do crédito Valor total aprovado R$ Taxa de juros (anual) Prazos p/ pagamento. Carências Exigências (garantias) R$ * Fontes: 1-Bancos; 2-Intermediários, vendedor de insumos, agroindústria; 3-Terceiros – informal (vizinhos, parente, agiota ...); **Finalidade do crédito: 1-Custeio da produção 3-Investimento: irrigação, máquinas, instalações. 4-Cooperativa; 5-Outros agricultores; 6-Outros; 2-Comercialização b) Se Sim, mas não tenha conseguido aprovação, por que teve as solicitações recusadas (inadimplência, garantia insuficiente, inviabilidade técnica do projeto, pedido de valor muito elevado, ... ) ? 89. Quais as principais dificuldades para ter acesso ao crédito rural? (garantias reais-bens, projeto técnico detalhado, inadimplência em ocasiões anteriores, contrapartidas exigidas: abertura de poupança, cartão de crédito, seguros, ...) 90. No momento, quais os investimentos que considera mais importantes para as suas atividades? (estufa, irrigação, equipamentos, veículo de transporte, ...) Por que? 162 91. Possui, atualmente, alguma dívida de empréstimo? Com quem e qual o montante da dívida (banco, outros agricultores, parentes, cooperativas, vendedores de insumo...)? 92. Atualmente é cliente de algum banco? Quais os principais serviços que são utilizados (empréstimo, cheque especial, desconto de cheques pré-datados, poupança, ...)? 93. Conhece os programas de crédito destinados a agricultura familiar: PRONAF e BANAGRO (Nossa Caixa Nosso Banco)? Onde obteve informações sobre estes programas? Já solicitou crédito destes programas? Caso o pedido tenha sido recusado indique: Banco 1-PRONAF 2-BANAGRO Razões Alegadas Valor total solicitado R$ R$ Data da solicitação Finalidade do crédito 94. Emprestou dinheiro para parentes, amigos, etc, entre outubro/2001 e setembro/2002? Se sim, qual o total emprestado? 95. Possuiu algum tipo de poupança (dinheiro guardado) no período de outubro/2001 e setembro/2002? Se sim, qual o valor médio poupado? 96. Nos últimos anos, recebeu auxílio da Casa do Agricultor (da prefeitura municipal de São Carlos) e dos sindicatos rurais do município (patronal e de trabalhadores rurais) para elaboração de projetos exigidos pelas instituições de financiamento? TENDENCIAS 97. Quais as principais mudanças na política do governo que poderiam trazer melhorias diretas as suas atividades? 98. Pretende continuar na atividade de produção de hortaliças? Acredita que os filhos darão continuidade às atividades de produção de hortaliças? Para ambas as perguntas, se não qual o motivo? 99. Quais as perspectivas, tendências e desafios para o mercado de hortaliças e para a pequena propriedade rural? O que poderia melhorar? 163 Apêndice - II Roteiros para entrevista junto aos representantes das organizações correlatas ao crédito rural do Município de São Carlos. Projeto GIAF – Gestão Integrada para Agricultura Familiar Engenharia de Produção – UFSCar Módulo: Recursos Financeiros Questionário complementar: I - Instituições Financeiras. 1- Qual o perfil dos clientes que são agricultores? (tamanho da área da unidade de produção, situação em relação à terra (proprietário, arrendatário, parceiro), sistemas de produção, grau de capitalização, etc) Quais as atividades produtivas relacionadas às solicitações de financiamento? (pecuária de corte ou leiteira, avicultura, produção de grãos, cana-de-açúcar, laranja, etc). 2- Quais as formas utilizadas para divulgar os programas de crédito junto aos agricultores familiares? Existe alguma parceria (formal ou informal) firmada com outras organizações? (SEBRAE, Sindicatos, Extensão rural, etc). 3- Qual o relacionamento da instituição com o órgão governamental de extensão rural municipal e com os sindicatos rurais do município? 4- Considerando a definição oficial de agricultura familiar apresentada no PRONAF, qual o número de agricultores familiares que fazem parte da carteira de clientes da instituição? 5- A instituição, em alguma ocasião, adota uma definição alternativa para classificar os agricultores como familiar? 6- Dentre os clientes, agricultores familiares, quantos têm, em seu sistema de produção, o cultivo de hortaliças com finalidade comercial? 7- Quais as linhas de crédito e as respectivas condições gerais dos contratos disponíveis para os agricultores familiares (ou pequenos produtores)? (taxa de juros, condições de pagamento, prazos, carências, incentivos, punições, fórmula de cálculo para os juros e amortizações, custos contratuais de transação (despesas com cartório, venda casada de outros produtos (seguros, previdência privada, poupança,etc)). 8- Quais são as exigências para que um agricultor possa ter acesso ao crédito rural? (titulação da terra, tamanho da propriedade, grau de capitalização, tempo na atividade, garantias, etc) 164 9- Quais os critérios utilizados para a analisar as solicitações de financiamento quanto à viabilidade das atividades produtivas e a capacidade de pagamento dos agricultores? (detalhamento do projeto, fontes de renda alternativas e a capacidade de pagamento, capacitação e experiência do agricultor, existência de mercados, etc). 10- Quais as principais razões que impedem os agricultores familiares de terem acesso ao crédito rural? (falta de garantias reais, projeto inconsistente, histórico de inadimplência, etc). 11- Os agricultores que têm suas solicitações de crédito rural recusadas são atendidos por outras linhas de crédito? (crédito pessoal, financiamento de veículos, cheque especial, etc) 12- Nos últimos cinco anos, qual foi o número médio de solicitação de empréstimos do PRONAF (e BANAGRO para NCNB)? Qual a proporção das solicitações aprovadas? Qual a proporção entre crédito custeio e crédito investimento? Qual a taxa de inadimplência (custeio e investimento)? 13- Uma das alterações que ocorreram no PRONAF, após a sua criação, foi à criação do PRONAFINHO, com o objetivo de simplificar o acesso ao crédito. Segundo as regras desse programa, bastaria o certificado ou a carta de aptidão de agricultor familiar (concedida pela extensão rural e por um dos sindicatos rurais) para que os agricultores tivessem acesso a esta linha especial. Com a criação do PRONAFINHO aumentou o número de agricultores familiares atendidos pelo programa? Além da carta de aptidão, a instituição exige algo mais dos agricultores familiares? 14- Qual a avaliação da instituição sobre as experiências com os fundos de aval para garantir e ampliar o número de contratos firmados entre as instituições financeiras e os agricultores? Existe alguma iniciativa similar no município de São Carlos? 15- Existe algum incentivo especial para os agricultores familiares que têm em seus projetos atividades relacionadas à recuperação ou a preservação ambiental? (Reflorestamento, produção orgânica, rotação de culturas, manejo integrado de pragas, etc). Seria de grande valia para o nosso trabalho: a) Identificar contratos para os produtores de hortaliças (solicitações aprovadas e os passos para concretização dos contratos; situações onde 165 b) c) d) e) f) ocorre ou não o casamento entre crédito para custeio e para investimento.) Identificar as possibilidades de crédito existentes, especificamente, para os horticultores. Exemplos de solicitações de financiamento recusadas e as suas respectivas justificativas (se possível, também, para os horticultores). Obter cópias de documentos: modelos de contratos, lista de documentos exigidos, contratos preenchidos como exemplo, etc. Obter uma avaliação da instituição financeira sobre os custos de transação para operar com os agricultores familiares (custos relacionados à obtenção de informações, riscos, mecanismos de incentivos, monitoramento). Saber quais os instrumentos utilizados pela instituição para avaliar a viabilidade dos projetos relacionados às solicitações de financiamento (custeio e investimento: por exemplo, planilhas de custos, softwares específicos, tabelas de referência etc.). II - Sindicatos Rurais 1- Qual a atuação do sindicato junto aos agricultores familiares do município? 2- A exigência do certificado de agricultor familiar, assinada por um dos sindicatos rurais do município e pela extensão rural oficial, para solicitação de crédito junto às instituições financeiras que operam os programas de crédito especiais, refletiu em maior aproximação dos agricultores com o sindicato? 3- Quais são os procedimentos adotados na certificação dos agricultores familiares? (Documentação necessária (solicitar cópias), averiguações) Qual a possibilidade de ocorrer fraudes neste processo? (Um agricultor não-familiar obter a certidão). 4- O sindicato tem divulgado, junto aos agricultores familiares, as alternativas disponibilizadas pelos novos programas de financiamento, como o PRONAF e o BANAGRO? Quais as formas de divulgação utilizadas? 5- Qual é a atuação do sindicato junto às instituições financeiras, no sentido de ampliar o número de agricultores atendidos pelos programas de crédito especiais como o PRONAF e BANAGRO? 6- Qual a avaliação do sindicato sobre a atuação das instituições financeiras que operam com crédito rural no município? (BB, NCNB, Cooperativa de Crédito, etc). 166 7- Na visão do sindicato, quais as principais dificuldades encontradas pelos agricultores familiares para ter acesso ao crédito rural subsidiado? 8- Para o sindicato, quais as alternativas, que estão sendo (ou poderiam ser) adotadas no município, para tornar as condições de crédito mais favorável à agricultura familiar? 9- Qual o relacionamento do sindicato com a extensão rural municipal e com os órgãos de pesquisa agropecuária presentes no município (EMBRAPA)? 10- Existe alguma atuação específica do sindicato junto aos agricultores familiares produtores de hortaliças? 11- Quais as políticas do sindicato para as seguintes questões: a. Assistência técnica b. Capacitação dos agricultores c. Associações (comentar especificamente sobre Fundo de aval) e cooperativas III - Extensão Rural Oficial 1- A exigência do certificado de agricultor familiar, assinada por um dos sindicatos rurais do município e pela extensão rural oficial, para solicitação de crédito junto às instituições financeiras que operam os programas de crédito especiais, refletiu em maior aproximação dos agricultores com a extensão rural municipal? (conseqüências: maior assistência técnica ou apenas solicitação da certidão). 2- Quais são as solicitações de auxílio mais freqüentes entre os agricultores familiares? 3- Do universo de agricultores familiares, no município, qual a porcentagem que procura auxílio da extensão rural? 4- Qual a natureza dos projetos dos agricultores familiares para as solicitações de financiamento? (porcentagem das solicitações de custeio e investimento, principais atividades, valor médio solicitado, etc). 5- Quando os projetos são encaminhados para as instituições financeiras como é justificada a sua viabilidade, principalmente quanto à capacidade de pagamento dos agricultores? (solicitar os documentos padrões, procedimentos, etc.) 6- Quais as dificuldades dos agricultores familiares relacionadas à gestão da unidade de produção e à elaboração de projetos? 167 7- Quais as principais dificuldades encontradas pelos agricultores para terem as solicitações de financiamento aprovadas pelas instituições financeiras? 8- Se apenas o certificado de agricultor familiar fosse suficiente para os agricultores terem acesso ao PRONAFINHO, qual seria a possibilidade de ocorrer uma inadimplência generalizada desses agricultores? 9- Qual a avaliação da extensão rural sobre a atuação das instituições financeiras que operam com crédito rural no município? (BB, NCNB, Cooperativa de Crédito, etc (exigências, linhas de crédito, oferta e divulgação das possibilidades, etc)). 10- Qual a relação entre a extensão rural e as demais instituições relacionadas ao desenvolvimento da agricultura familiar no município? (sindicatos rurais, Embrapa, Sebrae, universidades, Ong’s, etc) Há alguma iniciativa da extensão rural municipal no sentido de estimular a criação de cooperativas de produtores e associações? (comente especificamente sobre Fundo de Aval).