Geração Automática de Planos de Tratamento para Cirurgia Ortognática e Aprimoramento de Análise Cefalométrica em 3D: Visão Geral R. M. G. Santos, J. M. De Martino (Orientador), L. A. Passeri (Coorientador) Departamento de Engenharia de Computação e Automação Industrial (DCA) Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação (FEEC) Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) Av. Albert Einstein, 400 – Campinas, SP, Brasil – CEP: 13083-852 {mologni, martino}@dca.fee.unicamp.br, [email protected] Abstract – Nowadays the diagnosis and treatment planning in orthognathic surgery can be performed on a 3D virtual model of the patient’s head. Seeking to contribute to advance this technology, this project’s main objectives are: (1) to develop computing methods to automatically generate surgical treatment planning for adult skeletal malocclusions; and (2) to establish a true 3D cephalometric analysis based on 3D measures to effectively explore the added dimension by computed tomography compared to cephalometric radiography. The following activities are being performed on cone-beam computed tomography images: identifying cephalometric landmarks, computing 2D and 3D measures, creating virtual heads and simulating surgical correction. The expected results are: (1) extension of the McMamara’s composite normative standards to 3D; (2) development of computing methods to provide 3D automated treatment planning in orthognathic surgery; and (3) definition of a true 3D cephalometric analysis. Keywords – Computed tomography cone-beam, Three-dimensional cephalometric analysis, Orthognathic surgery, Automated treatment planning 1. Introdução A tecnologia mais recente à disposição da Cirurgia Ortognática permite que o diagnóstico e o plano de tratamento cirúrgico de traumatismos e deformidades dentofaciais, que até então eram realizados somente com o uso de telerradiografias, fotografias e modelos de gesso das arcadas dentárias do paciente, de agora em diante possam ser executados também num ambiente virtual, fazendo uso de um modelo anatômico de sua cabeça (ver Figura 1). Esse modelo, criado a partir de, no mínimo, uma tomografia computadorizada (TC) e uma fotografia, descreve a geometria das estruturas esqueléticas, dentais e tegumentares da cabeça do paciente [26]. No mercado, há uma variedade de programas de computador especializados em auxiliar o cirurgião no estudo clínico de cirurgias ortognáticas explorando a tecnologia em 3D. Dentre esses produtos, destacam-se: Dolphin 3D Surgery (Patterson Dental Supply, EUA), Invivo5 (Anatomage, EUA), Maxilim (Medicim NV, Bélgica) e SimPlant O&O (Materialise Dental, Bélgica). Estes produtos fornecem ambientes para o usuário visualizar e manipular um modelo virtual do paciente. De modo geral, essa manipulação é realizada por meio de análises cefalométricas e simulações de osteotomias e movimentação de segmentos ósseos. Eles ainda são capazes de simular, em tempo real, a interação física entre os tecidos duros e moles de revestimento da face e do pescoço e, desta forma, gerar uma representação fotorealista do efeito pós-cirúrgico desejado [17, 24]. A inovação proporcionada por essa tecnologia oferece vários benefícios potenciais ao cirurgião [1, 26], tais como: Figura 1. Exemplo de um modelo virtual da cabeça de um paciente gerado por meio do Maxilim. Fonte: [26, p. 2083]. • Aumenta de maneira significativa a confiabilidade no diagnóstico, visto que permite uma navegação em profundidade na anatomia craniana do paciente; • Favorece a avaliação da morfologia craniofacial, uma vez que a cabeça virtual é fidedigna à real, possibilitando assim a realização de medidas precisas e de análises cefalométricas acuradas; • Facilita a comunicação com o paciente, dado que uma representação estimada do resultado pós-cirúrgico pode ser apresentada a ele; • Viabiliza a confecção de guias cirúrgicos por prototipagem rápida. As perspectivas indicam que no futuro essa tecnologia, ainda em desenvolvimento, substituirá os métodos tradicionais de planejamento cirúrgico, de modo que este seja totalmente realizado por meio de um computador pessoal. Apesar dos benefícios mencionados, por se tratar de uma tecnologia ainda muito recente, ela também apresenta problemas e desafios. Hoje, as temáticas que mais se destacam são a automatização de procedimentos da Cirurgia Ortognática e a elaboração de análises cefalométricas em 3D. Este trabalho buscará contribuir em ambas. 1.1. Automatização de Procedimentos da Cirurgia Ortognática Os principais grupos de pesquisa atuantes nesta temática concentram seus esforços no estudo e desenvolvimento de métodos para localização automática dos pontos de referência cefalométricos em imagens de TC [11, 14] e na simulação em tempo real do comportamento do tecido mole facial em reflexo ao reposicionamento de segmentos de tecidos duros [13, 15, 19]. Na Ortodontia, com aplicações na Cirurgia Ortognática, podem ser destacados os estudos para segmentação automática dos elementos dentários em imagens de TC [12] e o estabelecimento virtual da oclusão dentária por movimentação de modelos geométricos das arcadas superior e inferior [6]. Buscando tratar um problema até então pouco estudado, o presente trabalho pretende automatizar a elaboração de planos de tratamento cirúrgico a indivíduos adultos portadores de maloclusões esqueléticas, realizando de modo automático a movimentação dos segmentos ósseos da cabeça virtual. 1.2. Elaboração de Análise Cefalométrica em 3D Embora não seja a única fonte de informação usada na avaliação clínica, a análise cefalométrica é um instrumento de fundamental importância para o diagnóstico e o plano de tratamento das deformidades dentofaciais. A primeira tentativa de análise cefalométrica em 3D foi proposta por Grayson et al. [8], que, por meio da combinação de telerradiografias lateral e frontal em um sistema de coordenadas integrado, conseguiu estimar as coordenadas em 3D dos pontos cefalométricos. As análises cefalométricas multiplanares [9, 10], tal como a anterior, surgiram com o propósito de tratar uma das limitações das análises cefalométricas laterais: o estudo das assimetrias faciais. O surgimento da TC por feixe cônico (TCFC) propiciou que as análises cefalométricas pudessem ser realizadas sobre informações originalmente em 3D e, consequentemente, com mensurações antes não praticáveis. Entretanto, apesar da alta precisão e reprodutibilidade das medidas cefalométricas obtidas por TCFC frente a telerradiografia [21], foram poucas as tentativas de exploração da dimensão acrescida. Um exemplo é o cálculo da curvatura dos maxilares elaborado por Bayome et al. [3]. De forma geral, as imagens de TCFC são usadas para identificação dos pontos cefalométricos em 3D, mas as medidas ainda são essencialmente planares, ou seja, realizadas sobre as vistas axial, sagital e coronal [3, 7, 18, 20, 25]. Visando investigar quais seriam os benefícios e as dificuldades da terceira dimensão na elaboração de planos de tratamento cirúrgico, fará parte do escopo deste trabalho adaptar uma análise cefalométrica em norma lateral consolidada, visando criar um padrão cefalométrico com mensurações em 3D. Para tal, serão consideradas como ponto de partida, as medidas realizadas por McNamara Jr. [16] em sua análise – a intenção com isto é reaproveitar as relações métricas identificadas por ele e mostrar quais seriam as vantagens da terceira dimensão na rotina clínica. Será necessário obter as medidas em 3D do padrão de normalidade para indivíduos adultos elaborado por McNamara, similar ao que foi realizado por Wong et al. [27] para a população chinesa; mas desta vez, para indivíduos caucasianos locais, usando outra abordagem para definição do referencial e dos cálculos em 3D, e verificando a correlação entre as medidas em 2D e 3D, a fim de garantir que as deformidades detectadas em 2D também são identificadas em 3D. Em um segundo momento, será elaborada uma análise cefalométrica em 3D verdadeira. 2. Proposta São objetivos gerais e específicos do presente trabalho: 1. Desenvolver métodos computacionais para a elaboração automatizada de planos de tratamento cirúrgico a indivíduos adultos portadores de maloclusões esqueléticas; (a) Compor uma norma cefalométrica com mensurações em 3D por meio da adaptação de uma análise cefalométrica em norma lateral consistente (de McNamara); (b) Aplicar e avaliar quais técnicas de otimização numérica propiciam melhores resultados; (c) Detectar quais medidas devem ser preferencialmente ponderadas para se produzir planos de tratamento mais confiáveis; 2. Estabelecer uma análise cefalométrica com medidas em 3D que explore a dimensão acrescida pela TC em relação à telerradiografia; (a) Comparar as principais análises cefalométricas, tanto em 2D como em 3D, a fim de se detectar suas limitações e reaproveitar suas utilidades; (b) Identificar quais mensurações obtidas via TC beneficiariam o planejamento cirúrgico. 3. Resultados Esperam-se como resultados finais: 1. O estabelecimento de um padrão cefalométrico em 3D que estenda o padrão em 2D definido por McNamara sem perder a compatibilidade com este; 2. O desenvolvimento de métodos computacionais que possibilitem a elaboração automatizada de planos de tratamento em cirurgia ortognática num ambiente virtual em 3D; 3. A elaboração de uma análise cefalométrica originalmente em 3D. Os resultados serão expressos por meio da elaboração de uma tese de doutorado e de, ao menos, três artigos científicos, um para cada resultado, sendo dois na área da Odontologia e um na área da Computação. 4. Conclusões A dificuldade no diagnóstico e na definição do plano de tratamento de pacientes portadores de maloclusão de Classe III esquelética, caracterizada basicamente pela presença de retrognatismo maxilar, prognatismo mandibular ou uma combinação de ambos, é um bom exemplo do benefício da automatização destas tarefas. Casos clínicos desta classe estão mais sujeitos à divergência de tratamentos. Isto se deve, principalmente, à complexidade na identificação do tipo de deformidade dentofacial (se é um prognatismo mandibular verdadeiro ou um pseudoprognatismo mandibular, por exemplo), às diferentes abordagens de tratamento, aos variados tipos de morfologias esqueléticas e aos fatores adicionais que devem ser considerados pelo cirurgião, como: redução das vias aéreas superiores, problemas de articulações temporomandibulares, além do próprio desejo do paciente [2, 4, 5, 22, 23]. Com uso do computador, um número maior de variáveis pode ser processado com o objetivo de facilitar a análise do problema pelo cirurgião. O desenvolvimento do método proposto abre a oportunidade para a implementação de um sistema computacional que poderia ser aplicado, por exemplo: • No ensino e treinamento de cirurgiõesdentistas residentes em Cirurgia e Traumatologia Bucomaxilofacial, permitindo que os planos de tratamento cirúrgicos elaborados por eles possam ser comparados aos gerados pelo sistema; • Na confirmação de planos de tratamentos de casos mais complexos, que exigem vasta experiência clínica. Sendo assim, especialmente útil para cirurgiões recém-formados; • Na elaboração de planos de tratamento para posterior aprovação do cirurgião, desonerando o profissional experiente de tarefas laboriosas e demoradas. Apesar da atual tecnologia em 3D fornecer ambientes propícios para o planejamento cirúrgico virtual, com ferramentas para a identificação de pontos cefalométricos, a realização de medidas e a simulação de osteotomias e de movimentação óssea, por exemplo; as análises cefalométricas empregadas ainda são estritamente em 2D, sendo realizadas sobre planos de projeção. Considerando que a TC fornece mais informações a respeito da anatomia do paciente do que a telerradiografia, então parece ser mais vantajoso realizar a análise em 3D do que em planos. A existência de uma análise com medidas em 3D certamente beneficiará o estudo de casos clínicos mais complexos, como de assimetrias, e poderá tornar a tecnologia atual definitivamente independente das análises convencionais. Referências [1] M. Accorsi and L. Velasco, editors. Diagnóstico 3D em ortodontia: A tomografia cone-beam aplicada. Napoleão, 2011. [2] R. Al-Delayme, M. Al-Khen, Z. Hamdoon, and W. Jerjes. 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