UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
DEPARTAMENTO DE LETRAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM
MESTRADO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUÍSTICA APLICADA
Eliane Cristina Alves de Souza
O GÊNERO REQUERIMENTO NA PERSPECTIVA SOCIORRETÓRICA:
análise da produção de graduandos no ambiente acadêmicoadministrativo da UFRN
Natal/RN
2013
Eliane Cristina Alves de Souza
O GÊNERO REQUERIMENTO NA PERSPECTIVA SOCIORRETÓRICA:
análise da produção de graduandos no ambiente acadêmicoadministrativo da UFRN
Dissertação
apresentada
ao
Programa de Pós-graduação em
Estudos
da
Linguagem
da
Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em
Estudos da Linguagem. Área de
concentração: Linguística Aplicada.
Orientadora: Profa. Dra. Maria do
Socorro Oliveira.
Natal/RN
2013
Catalogação da Publicação na Fonte.
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA).
Souza, Eliane Cristina Alves de.
O gênero requerimento na perspectiva sociorretórica: análise da
produção de graduandos no ambiente acadêmico-administrativo da UFRN /
Eliane Cristina Alves de Souza. – 2013.
205 f. : il.
Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Departamento de Letras.
Programa de Pós Graduação em Estudos da Linguagem, 2013.
Orientadora: Prof.ª Dr.ª Maria do Socorro Oliveira.
1. Linguística Aplicada. 2. Gênero textual. 3. Requerimento. 4. Domínio
acadêmico-administrativo. I. Oliveira, Maria do Socorro. II. Universidade
Federal do Rio Grande do Norte. III. Título.
RN/BSE-CCHLA
CDU 81’33
Eliane Cristina Alves de Souza
O GÊNERO REQUERIMENTO NA PERSPECTIVA SOCIORRETÓRICA:
análise da produção de graduandos no ambiente acadêmicoadministrativo da UFRN
Dissertação
apresentada
ao
Programa de Pós-graduação em
Estudos
da
Linguagem
da
Universidade Federal do Rio Grande
do Norte, como requisito parcial para
obtenção do título de Mestre em
Estudos da Linguagem e aprovada
pela seguinte banca examinadora:
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Maria do Socorro Oliveira (Orientadora)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
_______________________________________________________________
Prof. Dr. Benedito Gomes Bezerra (Examinador Externo)
Universidade Federal de Pernambuco
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Ana Maria de Oliveira Paz (Examinadora Interna)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
_______________________________________________________________
Profa. Dra. Maria das Graças Soares Rodrigues (Examinadora Interna)
Universidade Federal do Rio Grande do Norte
Natal/RN
22/04/2013
Lutar com palavras
é a luta mais vã.
Entanto lutamos
mal rompe a manhã.
São muitas, eu pouco.
(Carlos Drummond de Andrade - O Lutador)
AGRADECIMENTOS
Ao Espírito Santo, companheiro fiel em todos os momentos, por me iluminar e
fortalecer nos momentos difíceis e angustiantes deste percurso, concedendome a graça de realizar este trabalho.
À Profa. Dra. Maria do Socorro Oliveira, exemplo de pessoa humana,
pesquisadora e educadora, pela orientação competente, pelo incentivo em toda
minha trajetória acadêmica e pela amizade.
Ao meu esposo, Jeverson, pelo apoio à minha carreira, especialmente, pelo
exemplo de determinação e coragem na busca de seus ideais, trilhando os
caminhos com justiça, honestidade e sempre buscando a sabedoria.
Aos meus pais, José Maria e Marly, por serem exemplo de humildade e
honestidade, por sempre terem acreditado e investido na minha educação e
pelo amor incondicional.
Aos meus irmãos, Elaine e Edson, pelo amor e respeito que nos une cada dia
mais.
Aos meus sobrinhos, Vinícius, Guilherme e Danilo, que tanto amo.
À cunhada Williane e ao meu sogro João Gondim, pelo apoio e incentivo.
Às amigas Dayanne e Ana Christina, por acreditarem sempre em mim e,
principalmente, por compartilharmos os momentos mais especiais de nossas
vidas.
À amiga Márcia Cecília, por ser tão fiel e especial em todas as horas.
À amiga Elizete, pelo carinho e por toda admiração que a tenho, por sua
capacidade intelectual e sua humildade, acima de tudo.
Aos colegas da PROGRAD, por colaborarem com a realização desta
pesquisa, em especial, aos amigos Gracinha, Vanessa, Sandra, Ivone,
Francisquinho, Jocineide, Andressa, Jussara e Danúzia, pela amizade,
apoio e incentivo constantes.
À PROGRAD/UFRN, em especial, à Profª. Mirza, por entender as
contribuições deste trabalho, aprovando o projeto e possibilitando o
desenvolvimento da pesquisa.
Aos professores Benedito, Ana Paz e Graça Rodrigues, por terem aceitado o
convite para fazer parte desta Banca e, sobretudo, pelas valorosas
contribuições a este trabalho.
Às professoras Ana Paz e Graça Rodrigues, pelas valiosas observações e
sugestões fornecidas a este trabalho, no Exame de Qualificação.
Aos funcionários do PPGEL, pela disponibilidade no atendimento aos alunos
do programa, especialmente, à amiga Bete, pelo carinho, amizade e pelas
palavras de incentivo, principalmente, no momento mais difícil.
Aos colegas das letras, Louize, pelo apoio e contribuições, Rosa, Taynã,
Maria da Guia, Klébia, Henrique, Ayres, Nívia, Janima, Karla Jeane e
Janaína pelas trocas de experiências tanto acadêmicas como pessoais.
Aos colaboradores, servidores técnicos e alunos da UFRN, que se
dispuseram a participar desta pesquisa.
E a todos que, de alguma forma, contribuíram para a concretização deste
trabalho.
Gêneros não são apenas formas.
Gêneros são formas de vida, modos
de ser. São frames para a ação social.
São ambientes para a aprendizagem.
São os lugares onde o sentido é
construído.
Charles Bazerman
RESUMO
No ambiente administrativo das instituições públicas, muitas atividades são
realizadas através de práticas de escrita. Nesse domínio, a escrita está sempre
ligada a uma atividade que se deseja realizar. Dentre essas práticas, o gênero
requerimento consiste em um instrumento através do qual o requerente se
dirige a uma instituição, a fim de solicitar algo sob o amparo de uma legislação.
Considerando nossa experiência de trabalho em uma instituição pública de
ensino superior, elegemos como objeto de nossa pesquisa o gênero
requerimento produzido por graduandos no domínio administrativo da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte devido à sua importância nesse
contexto. Para tanto, os aportes teóricos adotados referem-se à concepção
sociorretórica dos estudos de gênero textual, que compreende o gênero textual
como forma de ação retoricamente tipificada (MILLER, 2009a; SWALES, 1990;
BAZERMAN, 2009). Quanto à metodologia, trata-se de uma pesquisa
associada à abordagem qualitativa (BODGAN; BIKLEN, 1994; CHIZZOTTI,
2010) cuja discussão se insere no campo da Linguística Aplicada. A geração
dos dados deu-se a partir de exemplares de requerimentos e dos dizeres dos
usuários do gênero em questionários, entrevistas e protocolos verbais de
escrita. As análises dos dados se apoiam nos métodos etnográficos de análise
de gênero postulados por Devitt, Reiff e Bawarshi (apud JOHNS et al., 2006).
Essas análises indicam que os requerimentos nem sempre se realizam
plenamente devido à falta de compreensão do gênero e de sua situação
retórica por parte dos produtores. Provavelmente, entre outras razões, isso
deve acontecer por esses alunos não terem compreendido que vários fatores
afetam a produção de textos, como o contexto, a audiência e o propósito.
Acreditamos que uma possibilidade de tornar a prática desse gênero textual
mais eficiente seja desenvolver um modo de elaboração dos requerimentos
mais prático e simples, tomando como base as necessidades impostas pela
situação retórica.
PALAVRAS-CHAVE: Gênero textual. Requerimento. Domínio acadêmicoadministrativo. Linguística Aplicada.
ABSTRACT
In administrative settings of public institutions, many activities are conducted
through writing practices. Concerning this, writing is always connected to an
activity we intend to perform. Among those practices, the genre “request”
consists of an instrument through which the requirer addresses to an institution
in order to request something under the support of legislation. Considering our
work experience in a public institution of higher education, we elected - as
object of our research - the genre “request” produced by undergraduates within
the administrative domain of the Federal University of Rio Grande do Norte
(UFRN) due to its importance in this context. For this, the theoretical framework
adopted refers to the socio-rethorical conception of genre studies, which
understands the genre as forms as rhetorically typified action (MILLER, 2009a;
SWALES, 1990; BAZERMAN, 2009). Regarding methodology, it is a research
associated to a qualitative approach (BODGAN; BIKLEN, 1994; CHIZZOTTI,
2010) whose discussion inserts into the field of Applied Linguistics. The data
were generated from samples of “requests” and their users’ replies in
questionnaires, interviews and verbal protocols of writing. The data analysis is
based on the ethnographic methods of genre analysis postulated by Devitt,
Reiff and Bawarshi (apud JOHNS et al., 2006). These analyses indicated that
the requests are not always fully accomplished due to a lack of comprehension
about the genre and its rhetorical situation on the part of the producers. It must
probably happen - among other reasons - because these students may not
have understood that several factors, such as: context, audience and purpose,
affect the text production. We believe that one possibility to make the practice of
this genre more efficient is to develop a more simple and practical way of
elaborating requests, taking the needs imposed by the rhetorical situation as a
basis.
KEY-WORDS: Text genre. Request. Academic administrative domains. Applied
Linguistics.
NORMATIZAÇÃO ADOTADA
Dissertação normalizada conforme padrão da ABNT NBR 14724:2011,
explicitada nos manuais de apresentação de trabalhos acadêmicos de Silva e
Silveira (2011) e Furasté (2011).
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Número de processos/ano encaminhados e/ou gerados na
PROGRAD ................................................................................................................ 20
Quadro 2 - Distribuição de requerimentos coletados por cursos ............................... 41
Quadro 3 - Os três gêneros do discurso de acordo Aristóteles ................................. 53
Quadro 4 - Hierarquia dos Significados ..................................................................... 84
Quadro 5- Exposição da realização dos movimentos retóricos de R21 .................. 125
Quadro 6 - Colegiados Superiores da UFRN .......................................................... 131
Quadro 7- Conjuntos de gêneros utilizados no domínio acadêmicoadministrativo .......................................................................................................... 160
Quadro 8- Relato de AG2 acerca do processo de escrita e reescrita de um
requerimento ........................................................................................................... 174
Quadro 9 - Relato de AG3 sobre o processo de escrita e reescrita de um
requerimento ........................................................................................................... 175
Quadro 10 - Sugestões dos alunos para melhorar o sistema de atividade que
envolve os requerimentos ....................................................................................... 179
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Prédio da Reitoria da UFRN ..................................................................... 33
Figura 2 - Organograma Administrativo da Pró-reitoria de Graduação da UFRN ..... 35
Figura 3 - Coordenadoria de Atendimento da PROGRAD/UFRN ............................. 36
Figura 4 - Aluno produzindo um requerimento na PROGRAD/UFRN ....................... 38
Figura 5 - Servidora atendendo às solicitações dos alunos ...................................... 38
Figura 6 - Sete fases na análise de gêneros proposta por Bhatia ............................. 79
Figura 7 - Modelo de Requerimento ........................................................................ 109
Figura 8 - Requerimento Padrão utilizado na PROGRAD/UFRN ............................ 111
Figura 9 - Requerimento nº 16 ................................................................................ 118
Figura 10 - Requerimento nº 21 .............................................................................. 124
Figura 11 - Domínio discursivo das solicitações dos alunos de graduação da
UFRN ...................................................................................................................... 138
Figura 12 - Requerimento como parte de um sistema de gêneros, no domínio
acadêmico-administrativo ........................................................................................ 163
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1- Preferência dos alunos quanto à produção de texto .............................. 113
Gráfico 2 - Modalidade de língua utilizada pelos alunos de graduação para
solicitarem algo à PROGRAD ................................................................................. 136
Gráfico 3 - Atitude dos servidores diante da não compreensão às solicitações
dos alunos ou da percepção da falta algum dado no requerimento para seu
devido atendimento. ................................................................................................ 141
Gráfico 4 - O que levou os alunos a produzirem um requerimento ......................... 144
Gráfico 5 - Frequência de uso dos requerimentos, junto à PROGRAD, por parte
dos alunos ............................................................................................................... 149
Gráfico 6 - Posicionamento dos alunos a respeito de terem sentido dificuldade
para escrever algum requerimento, junto à PROGRAD .......................................... 150
Gráfico 7 - Orientação no uso dos requerimentos ................................................... 150
Gráfico 8 - A quem os alunos pedem orientação para escrever os
requerimentos ......................................................................................................... 151
Gráfico 9 - Expressão dos servidores quanto à orientação aos alunos, na
escrita dos requerimentos ....................................................................................... 152
Gráfico 10 - Posicionamento dos servidores sobre a frequência da solicitação
de orientação, por parte dos alunos, para escrever os requerimentos .................... 152
Gráfico 11 - Posicionamento dos alunos a respeito da consulta a textos, na
escrita dos requerimentos ....................................................................................... 153
Gráfico 12 - Opinião dos servidores a respeito da necessidade dos alunos se
basearem em algum texto para escreverem os requerimentos............................... 154
Gráfico 13 - Revelação dos alunos sobre a consulta ao RGC, na escrita dos
requerimentos ......................................................................................................... 154
Gráfico 14 - Manifestação dos alunos sobre o acompanhamento da solicitação .... 155
Gráfico 15 - Posicionamento dos servidores sobre o acompanhamento da
solicitação pelos alunos .......................................................................................... 156
Gráfico 16 - Frequência de uso do computador pelos alunos ................................. 166
Gráfico 17 - Local em que os alunos usam o computador ...................................... 167
Gráfico 18 - Gêneros que os alunos escrevem na sua formação discente ............. 168
Gráfico 19 - Gêneros que os alunos escrevem, em sala de aula, a pedido do
professor ................................................................................................................. 169
Gráfico 20 - Opinião dos alunos quanto à capacidade de identificar as
características de um requerimento ........................................................................ 170
Gráfico 21 - Alunos que precisaram reescrever requerimento à PROGRAD .......... 177
Gráfico 22 - Grau de satisfação dos alunos em relação ao sistema de
solicitação junto à PROGRAD ................................................................................. 178
Gráfico 23- Nível de escolaridade dos servidores técnico-administrativos da
PROGRAD/UFRN ................................................................................................... 181
Gráfico 24 - Opinião dos servidores técnico-administrativos da
PROGRAD/UFRN sobre a leitura dos textos oficiais .............................................. 182
Gráfico 25 - Frequência com que os servidores técnico-administrativos da
PROGRAD/UFRN usam o computador ................................................................... 182
Gráfico 26 - Grau de satisfação dos servidores técnico-administrativos da
PROGRAD/UFRN em relação ao sistema de solicitação dessa pró-reitoria ........... 184
Gráfico 27 - Revelação dos servidores técnico-administrativos da
PROGRAD/UFRN a respeito de terem deixado de atender algum requerimento
por não tê-lo compreendido..................................................................................... 185
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 - Movimentos retóricos identificados nos requerimentos que compõem
o corpus .................................................................................................................. 117
Tabela 2- Movimentos retóricos encontrados nos exemplares de requerimento .... 122
Tabela 3 - Assuntos tratados nos requerimentos que compõem o corpus da
pesquisa .................................................................................................................. 127
Tabela 4 - Indicadores referentes ao número de alunos e cursos na graduação
da UFRN, no período de 1999 - 2009 ..................................................................... 132
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AC - Antes de Cristo
AG - Aluno da Graduação
CARS - Create a research space
CONCURA - Conselho de Curadores
CONSAD - Conselho de Administração
CONSEPE - Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão
CONSUNI - Conselho Universitário
CG - Câmara de Graduação
DACA - Diretoria de Administração e Controle Acadêmico
DAE - Departamento de Administração Escolar
DASP - Departamento Administrativo do Serviço Público
DDP - Diretoria de Desenvolvimento Pedagógico
LA - Linguística Aplicada
LSF - Linguística Sistêmico-Funcional
MRPR - Manual de Redação da Presidência da República
PCN - Parâmetros Curriculares Nacionais
PDI - Plano de Desenvolvimento Institucional
PROGRAD - Pró-reitoria de Graduação
PV - Protocolo Verbal
R - Requerimento
RCG - Regulamento dos Cursos de Graduação
REUNI - Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das
Universidades Federais
RN - Rio Grande do Norte
SAU-5 - Sistema de Automação Universitária
SIGAA - Sistema Integrado de Gestão de Atividades Acadêmicas
SIPAC - Sistema Integrado de Patrimônio, Administração e Contratos
ST - Servidor Técnico
UFAL - Universidade Federal de Alagoas
UFPE - Universidade Federal de Pernambuco
UFRN - Universidade Federal do Rio Grande do Norte
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 18
1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA................................................................ 28
1.1 A abordagem ..................................................................................................... 29
1.1.1 A Linguística Aplicada como norteadora .......................................................... 29
1.1.2 Sob o paradigma da pesquisa qualitativa ......................................................... 30
1.1.3 Termo de autorização de uso das informações ................................................ 31
1.2 Designação do objeto de estudo ..................................................................... 32
1.3 O cenário ............................................................................................................ 33
1.4 Os colaboradores .............................................................................................. 37
1.5 O corpus............................................................................................................. 39
1.6 Processo de geração de dados e instrumentos utilizados............................ 42
1.6.1 Os requerimentos ............................................................................................. 43
1.6.2 Os questionários .............................................................................................. 44
1.6.3 As entrevistas ................................................................................................... 45
1.6.4 Os protocolos verbais de escrita ...................................................................... 46
1.7 Procedimentos de análise dos dados ............................................................. 47
2 CONCEITO DE GÊNERO TEXTUAL/DISCURSIVO - EVOLUÇÃO ...................... 49
2.1 Entre a Retórica e a Literatura - origens do conceito de gênero textual/
discursivo ............................................................................................................... 50
2.2 Da Teoria Literária à Linguística - influências bakhtinianas na concepção de
gêneros discursivos ............................................................................................... 56
2.3 Na atualidade - gêneros textuais/discursivos ................................................. 62
3 OS GÊNEROS TEXTUAIS NA CONCEPÇÃO SOCIORRETÓRICA .................... 70
3.1 John Swales....................................................................................................... 73
3.2 Vijay Bhatia ........................................................................................................ 78
3.3 Carolyn Miller ..................................................................................................... 80
3.4 Charles Bazerman ............................................................................................. 88
4 OS GÊNEROS NO CONTEXTO DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA ...................... 99
4.1 A ‘redação oficial’ no Brasil ........................................................................... 100
4.2 O gênero requerimento ................................................................................... 106
4.2.1 O gênero requerimento nos manuais de Redação Oficial .............................. 107
5
O
GÊNERO
REQUERIMENTO
EM
ANÁLISE
PERSPECTIVA
SOCIORRETÓRICA ............................................................................................... 110
5.1 Aspectos constitutivos ................................................................................... 110
5.1.1 A constituição textual...................................................................................... 111
5.1.2 A organização retórica.................................................................................... 115
5.1.3 Os assuntos ................................................................................................... 126
5.2 O ambiente ....................................................................................................... 130
5.2.1 O ambiente físico - a Universidade Federal do Rio Grande do Norte ............ 130
5.2.2 O ambiente sociodiscursivo ............................................................................ 135
5.3 A situação de uso ............................................................................................ 143
5.3.1 Por que são usados ....................................................................................... 144
5.3.2 Como são usados .......................................................................................... 148
5.3.3 O requerimento em um sistema de gêneros .................................................. 157
5.4 Os usuários...................................................................................................... 164
5.4.1 Os escritores .................................................................................................. 165
5.4.1.1 Quem são .................................................................................................... 165
5.4.1.2 O que eles têm a dizer sobre esses requerimentos .................................... 171
5.4.2 Os leitores ...................................................................................................... 180
5.4.2.1 Quem são .................................................................................................... 180
5.4.2.2 O que eles têm a dizer sobre esses requerimentos .................................... 183
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................... 189
REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 196
ANEXOS ................................................................................................................. 204
APÊNDICES ........................................................................................................... 205
18
INTRODUÇÃO
Atualmente, muitos estudos, preocupados com as implicações sociais das
práticas discursivas, estão sendo desenvolvidos no âmbito da Linguística Aplicada
(LA) com base na análise do uso da língua em contextos autênticos. O
desenvolvimento desses estudos tem se beneficiado muito pelo avanço das
pesquisas
sobre
gêneros
textuais/discursivos,
principalmente
quanto
às
contribuições advindas da sociorretórica, vertente norte-americana.
De certa forma, podemos afirmar que os estudos dos gêneros têm
acompanhado ao longo do tempo a trajetória dos estudos da língua. Inicialmente, o
conceito de gêneros foi estabelecido na Filosofia Clássica com Aristóteles, a partir
da busca pela arte da retórica. Depois, a noção de gênero foi associada aos textos
literários e, em seguida, rediscutida pelo dialogismo bakhtiniano, quando a
compreensão de linguagem expandiu-se como atividade interativa e social. A partir
da apropriação do conceito de enunciado e da compreensão social da linguagem, os
gêneros foram reconceituados. Isso permitiu enxergá-los como fenômeno complexo,
surgindo, assim, o desenvolvimento de abordagens de estudo diferenciadas a seu
respeito.
A perspectiva que assumimos para o desenvolvimento deste trabalho baseiase na concepção sociorretórica de gênero, mais especificamente, nos estudos
aprofundados por Swales (1990), Miller (2009a) e Bazerman (2009). A partir desses
estudos, advindos da influência pós-estruturalista nas ciências sociais, na segunda
metade do século XX, os gêneros textuais são vistos como ações retóricas
tipificadas baseadas em situações recorrentes.
Tomando como base a perspectiva sociorretórica da linguagem, que aborda a
escrita por sua natureza sócio-discursiva e considera a organização social e as
relações de poder implicadas, elegemos como objeto desta pesquisa o gênero
‘requerimento’ produzido por alunos da graduação no contexto administrativo da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
A análise de gêneros que pretendemos realizar mantém o foco nas ações que
o requerimento realiza na situação em que está inserido, observando os aspectos
retóricos envolvidos nas condições de produção e uso do gênero.
19
Através desse artefato, os alunos agem no domínio administrativo da
instituição, uma vez que esse gênero é tipicamente reconhecido como o documento
que permite a esses indivíduos se dirigirem à instituição, a fim de solicitar algo que
lhe seja de direito.
Esses requerimentos são redigidos nos ambientes das coordenações dos
cursos ou, ainda, em um órgão central que atende a alunos de todos os cursos,
denominado Diretoria de Administração e Controle Acadêmico (DACA)1, situado na
Pró-reitoria de Graduação (PROGRAD). Nesses setores, os alunos podem se utilizar
da ajuda de servidores para redigir os referidos documentos.
Observando que a instituição possui uma organização administrativa rígida,
orientada por princípios da administração pública, os graduandos contam com
documentos específicos que compõem a legislação institucional para a elaboração
dos requerimentos, tais como: regimento geral da universidade, regulamento dos
cursos de graduação, calendário universitário, resoluções, decisões de colegiados,
entre outros.
Geralmente, esses requerimentos são elaborados em formulários que podem
ser de dois tipos: específicos quanto ao assunto tratado, com uma forma fechada e
estruturada; ou semi-estruturados quando não se referem a nenhum assunto
especifico. Neste caso, chamado Formulário Padrão. Deter-nos-emos a este assunto
no capítulo da metodologia.
Este possui um layout que permite uma formatação mais livre, sendo dividido
em duas partes. A primeira, denominada Dados do Aluno na qual o interessado
preenche campos específicos com seus dados pessoais e do curso ao qual está
vinculado. Na segunda parte, o formulário possui um espaço aberto, nomeado
Solicitação, onde o aluno deve expor o seu pedido de acordo com as convenções do
gênero. Assim, para que haja um claro entendimento e o objetivo seja alcançado,
este espaço exige a elaboração de um texto, corporificado em um gênero textual
para que possa realizar algum efeito nessa situação institucional (MARCUSCHI,
2010). Interessará a esta pesquisa a análise de requerimentos desenvolvidos no
formulário do tipo padrão.
1
Até pouco tempo esse órgão era conhecido como Departamento de Administração Escolar (DAE),
no entanto, em 2010, mudou de nome conforme orientação no Regimento Interno da Reitoria,
proposta pela Resolução nº 014/2011-CONSUNI/UFRN.
20
Para que haja um controle da tramitação dessas solicitações, cada
requerimento é transformado em processo administrativo por um servidor que atua
na unidade onde o requerimento foi elaborado. Além do requerimento, os processos
apresentam outros documentos anexos, observando as regras que determinam a
condução do procedimento.
Para uma melhor compreensão da demanda de requerimentos/processos
analisados na PROGRAD, apresentamos a seguir um quadro que revela a
quantidade de processos que circulou na PROGRAD nos anos de 2007 a 20112.
Quadro 1 - Número de processos/ano encaminhados e/ou gerados na PROGRAD
ANO
NÚMERO DE REQUERIMENTOS/PROCESSOS
2007
7521
2008
8514
2009
6894
2010
7741
2011
4050
Fonte: Relatório de Gestão 2007-2011 da PROGRAD
O primeiro contato que tivemos com os requerimentos se deu por ocasião em
que desempenhava funções administrativas na Coordenadoria de Atendimento 3 da
PROGRAD, primeiro setor por onde os processos destinados à pró-reitoria devem
passar, já que ele é responsável pela distribuição interna de todos os documentos a
ela destinados. Nessa época, duas coisas chamavam nossa atenção: a dificuldade
que os alunos demonstravam na elaboração dos requerimentos, principalmente na
parte do formulário referente à elaboração do texto, pois sempre perguntavam o que
deveriam escrever, e a quantidade de requerimentos que circulava nesse ambiente,
já que todos os pedidos dos alunos deveriam ser por escrito.
Com a nossa remoção para um setor interno da PROGRAD, passamos a
conviver com outro aspecto desse gênero, agora, referente à leitura desses
requerimentos. Nesse novo momento, percebíamos que era constante uma queixa
por parte dos servidores: a incompreensão das solicitações redigidas pelos alunos.
2
Os dados referentes ao ano de 2011 estão incompletos, pois foram tomados até o mês de abril.
Na época, este setor chamava-se Setor de Protocolo. Ele teve o nome modificado devido à
reestruturação na administração da Reitoria da UFRN, já citada na nota anterior.
3
21
Logo, percebemos que o gênero se realizava diante de dois obstáculos
cruciais para um desempenho eficaz, a dificuldade da escrita e a dificuldade da
leitura.
Diante desse quadro, nosso interesse em estudar esse gênero deu-se como
fruto da nossa experiência como servidora técnico-administrativa da UFRN e ele
justifica-se a partir da constatação dessas dificuldades bem como da quantidade de
requerimentos produzidos, uma vez que entendemos que a questão gira em torno
do gênero enquanto atividade social em um contexto específico.
Com base nos problemas que dificultam a concretização do atendimento às
solicitações nos requerimentos, ou seja, a plena realização do gênero, sentimo-nos
impulsionados a investigar os aspectos que envolvem produção e utilização desse
gênero. Nesse sentido, vale destacar, a importância que o domínio dos gêneros
requer para melhorar a capacidade de interação e ação social. Especificamente, o
domínio do gênero, escolhido para análise, deverá permitir a ampliação das
capacidades exigidas pela situação comunicativa no âmbito burocrático da
instituição.
Nesse sentido, o estudo de um gênero textual da comunicação administrativa
é válido, uma vez que pretende apontar conhecimentos ‘genéricos’ sobre uma área
de atuação humana, cuja análise ainda não despertou interesse notório por parte de
linguistas.
Marcuschi afirma que “há muitos gêneros produzidos de maneira sistemática
e com grande incidência na vida diária, merecedores de nossa atenção” (2010, p.
38). Nesse caso, o gênero requerimento, instrumento através do qual os sujeitos
reivindicam seus direitos nas mais diversas esferas institucionais, não seria
merecedor de um estudo? Além do mais, essa perspectiva ressignifica o estudo
interdisciplinar do gênero, ratificando a relevância da pesquisa para a área da
Linguística Aplicada (LA).
Dessa forma, interessa a compreensão do gênero e seu funcionamento
dentro das circunstâncias que o configuram, para que, dessa maneira, seja possível
a compreensão das condições de uso desse gênero.
Além disso, o fato de, praticamente, inexistirem pesquisas linguísticas
realizadas no Brasil preocupadas efetivamente com os gêneros da redação oficial já
justifica o interesse em estudar o gênero requerimento.
22
Por essa razão, foi extremamente difícil o levantamento de uma literatura, no
âmbito acadêmico, específica sobre o gênero em questão. Na verdade, foram
encontrados apenas dois trabalhos que tratam, especificamente, do gênero
requerimento. Mesmo assim, nenhum deles aborda o gênero na perspectiva que
adotamos neste estudo, no caso, a da sociorretórica.
O primeiro é um trabalho do professor doutor da UFPE, Marlos de Barros
Pessoa (2009). Trata-se de um artigo intitulado Transformação da tradição
discursiva ‘requerimento’: séculos xviii e xx. Esse trabalho apresenta uma
comparação entre requerimentos formais escritos no século dezoito e os do século
vinte, em uma perspectiva histórica mais ampla, pois procura entender como os
textos se diferenciam em razão de uma tecnologia para outra. O autor chama à
atenção para a esfera da produção desse gênero como capaz de integrar um
indivíduo a uma estrutura burocrática. Apesar de não ter uma relação direta com a
nossa abordagem, foi bem interessante conhecer a evolução histórica desse gênero
no período citado.
O outro trabalho corresponde a uma monografia apresentada ao Curso de
Bacharelado em Secretariado Executivo Bilíngue da Universidade Federal da
Paraíba, por Geziel de Brito Lima (2011), intitulada A Argumentatividade no Gênero
Requerimento: uma análise dos modalizadores discursivos. Nessa monografia, o
autor discute o funcionamento das estruturas semântico-argumentativas no gênero
textual requerimento, esclarecendo que o recurso da modalização funciona no texto
como uma estratégia de argumentação que o locutor utiliza para convencer o
interlocutor a atender a solicitação presente no documento.
Os requerimentos que constituem o corpus da pesquisa de Lima foram
coletados da rede mundial de computadores, de modo que se trata de um corpus
amplo. O autor observa que existem marcas argumentativas mesmo nos
requerimentos desenvolvidos em formulários. Ele afirma, ainda, que a contribuição
que pretender oferecer refere-se aos estudantes e profissionais da área de
secretariado.
Além desses, a obra Análise de Gênero Textual: concepção sociorretórica
(2005) da professora doutora da UFAL, Maria Inez Matoso Silveira, foi de grande
importância para o desenvolvimento de nossa pesquisa, apesar de não tratar do
gênero requerimento. Nesse trabalho, a autora analisa o gênero textual ofício com
base na perspectiva da sociorretórica.
23
A partir de modelos de análise de gêneros desenvolvidos por Swales e
Bhatia, a análise de Silveira (2005) privilegia os seguintes aspectos do ofício: o
contexto enunciativo da produção e recepção do gênero, sua organização retórica e
seus aspectos textuais e retóricos gramaticais. Sua análise não se preocupa
exatamente em catalogar as regularidades dos componentes linguístico-gramaticais,
textuais e discursivos do gênero. Em vez disso, o estudo demonstra que aspectos
como a heterogeneidade, a dispersão e a diversidade estão diretamente
relacionados aos usos da linguagem na vida social.
Essa obra estabelece aproximações com nossa pesquisa justamente na
maneira como o gênero é encarado, privilegiando o aspecto social que se
presentifica no gênero enquanto ação humana.
Nosso estudo, dessa forma, merece destaque por ele ser de natureza situada,
voltado para um contexto de problemas reais, o seu desenvolvimento deverá dar
visibilidade e encaminhamentos quanto ao domínio da prática discursiva envolvida
como forma de ação social. Nessa perspectiva, a pesquisa preocupa-se em apontar
colaborações para um problema existente na instituição.
Assim, também, o estudo da prática de escrita dos requerimentos aponta para
uma reflexão sobre uso efetivo da língua, em um contexto social que vai além dos
limites da escola, permitindo olhar à prática social existente nesse processo de
interação que possibilita ao indivíduo agir em diferentes esferas e circunstâncias,
movido por diferentes propósitos (PAZ, 2008).
A pesquisa visa contribuir para a área da LA, visto que aponta a necessidade
de se construir um conhecimento que seja responsivo à vida social, no âmbito das
atividades administrativas em empresas públicas e privadas, especificamente em
relação aos procedimentos administrativos na universidade em questão, referentes
ao gênero em estudo. Da mesma maneira, pretende oferecer subsídios para os
estudos de gêneros textuais.
Podemos
afirmar,
desse
modo,
que
ela
consiste
em
proporcionar
redimensionamentos teóricos e sociais referentes ao gênero. Em termos teóricos,
por apresentar uma nova maneira de olhar para esse tipo de texto, haja vista os
gêneros da redação oficial serem geralmente explorados, simplesmente, através de
sua estrutura composicional. A mudança de foco na análise em questão amplia a
visão em relação ao objeto, de modo que o gênero requerimento passa a ser
encarado em uma perspectiva social.
24
A relevância social diz respeito às implicações sociais possíveis, a partir deste
trabalho, no meio em que o gênero em estudo se realiza. Ao dar voz aos usuários do
gênero, tanto a quem produz quanto a quem acolhe, proporcionamos a esses
sujeitos uma reflexão sobre uma atividade de rotina, quanto aos procedimentos no
domínio administrativo da universidade, executada, muitas vezes, de forma
automática. Permitimos, assim, que tais procedimentos sejam repensados,
provocando a discussão e um provável redimensionamento no funcionamento da
instituição, no que se refere ao uso desse gênero na instância em que ele se
presentifica. Almejamos, dessa forma, oferecer um retorno efetivo à instituição.
Outra implicação deste trabalho refere-se ao ensino, pois esperamos que os
professores, ao conhecerem nossa pesquisa, percebam outros gêneros que fazem
parte do convívio social e se preocupem com uma formação mais diversificada de
seus alunos, de modo que eles sejam capazes de atuarem nas diversas instâncias
sociais, a começar pelas que fazem parte da própria instituição em que estudam,
através da ampliação do trabalho com os gêneros em sala de aula. Os professores,
de tal modo, possibilitarão um aprimoramento da competência comunicativa de seus
alunos, consequentemente, uma maior atuação social.
Constitui-se, como principal objetivo desta pesquisa, discutir o gênero
requerimento produzido pelos graduandos, enquanto prática social, desenvolvida no
domínio acadêmico-administrativo da instituição.
Com vistas a esse propósito, estabelecemos as seguintes questões de
pesquisa:
1. Quais os elementos constitutivos dos requerimentos e a sua organização
retórica?
2. Com foco no ambiente em que são produzidos, na sua situação de uso e nos
seus usuários, como se constitui a situação retórica típica dos requerimentos?
Orientados por essas questões, traçamos como objetivos específicos:
1. Identificar os elementos constitutivos dos requerimentos e a sua organização
retórica;
25
2. Analisar a situação retórica típica dos requerimentos, tendo como foco o
ambiente em que eles são produzidos, a sua situação de uso e os seus
usuários.
Para cumprir os objetivos da pesquisa, as análises partiram de dados
constituídos a partir de 50 (cinquenta) requerimentos. Procuramos formar, também,
dados concretos referentes ao uso desse gênero. Para isso, buscamos a
triangulação dos dados e ouvimos os usuários do gênero, escritores e leitores,
através de questionários, entrevistas e protocolos verbais de escrita. Essas três
ferramentas foram aplicadas com os alunos, enquanto apenas as duas primeiras,
com os servidores. Defendemos que essa triangulação torna possível uma
apreciação mais ampla e legítima do objeto.
Conforme a natureza do objeto de estudo, fundamentamo-nos em subsídios
teóricos advindos da teoria dos gêneros textuais que concebe a linguagem como
ação, constitutiva e constituída pelos aspectos sociais, históricos e culturais, ou seja,
da perspectiva sociorretórica. Essa abordagem considera que os sujeitos assumem
uma postura interativa e agem através de escolhas discursivas, a fim de realizar
propósitos sócio-comunicativos.
As concepções norteadoras deste estudo são, portanto, aquelas defendidas
pela concepção sociorretórica do estudo dos gêneros, apresentadas principalmente
por Carolyn Miller (2009a) no texto Gênero como Ação Social. Nessa obra, a autora
discute proposições gerais sobre o conceito de gênero, inserindo seu estudo nas
práticas comunicativas das comunidades discursivas, com enfoque retórico.
As contribuições de Charles Bazerman (2009) serão de grande importância
para nossa pesquisa, haja vista que, a partir de uma investigação retórica, histórica
e interativa, ele nos convida a olhar os gêneros como formas de vida, presentes nas
práticas cotidianas, estabelecidos nas relações dos indivíduos com a realidade
institucional.
Embora, não pretendamos seguir exatamente o modelo de análise de gênero
desenvolvido por Swales (1990), seus apontamentos nos serão de grande utilidade,
pois a partir de algumas adaptações ansiamos desenvolver a análise da constituição
do gênero em tela, principalmente no que diz respeito à sua organização retórica.
26
Em relação à metodologia de pesquisa, adotamos os princípios do paradigma
qualitativo4 de investigação científica (BODGAN; BIKLEN, 1994; CHIZZOTTI, 2010),
uma vez que se trata de um estudo de fatos humanos e sociais em contexto
autêntico de atuação. Tendo em vista a adoção desse paradigma, não fizemos uso
de categorias pré-estabelecidas. O caráter da flexibilidade que acompanha o
planejamento das investigações de natureza qualitativa foi constantemente
preservado.
Nesse
sentido,
utilizamos
instrumentos
da
pesquisa
etnográfica
(LAPLANTINE, 2004), por entendermos que a compreensão do gênero requerimento
na perspectiva sociorretórica só seria possível se focalizássemos nos significados
das ações dos sujeitos implícitas no gênero. Para isso, adotamos o procedimento de
imersão, no contexto social de atuação do gênero e nos permitimos ouvir seus
usuários, a fim de gerar os dados considerando o ponto de vista dos sujeitos
colaboradores da pesquisa (BODGAN; BIKLEN, 1994; CHIZZOTTI, 2010).
Para discutir a problemática proposta, a dissertação está organizada em sete
partes. Primeiramente, temos esta introdução, na qual apresentamos o objeto de
estudo, questões de pesquisa, objetivos, a motivação para a realização do trabalho,
a perspectiva teórico-metodológica, a abordagem da pesquisa, a revisão dos
estudos sobre a temática, assim como a justificativa e as contribuições da pesquisa
tanto para a Linguística Aplicada quanto para o domínio administrativo no ambiente
acadêmico.
No primeiro capítulo, a contextualização da pesquisa, apresentamos os
aspectos metodológicos referentes à pesquisa: sua relação com a Linguística
Aplicada, a abordagem da investigação, o objeto de estudo e os objetivos que
nortearam o seu desenvolvimento, o cenário em que foi desenvolvida, os
colaboradores, o corpus, os intrumentos e os procedimentos de geração dos dados
e os procedimentos de análise dos dados.
No
segundo
capítulo,
considerando
que
a
fundamentação
consiste
basicamente nos estudos sobre os gêneros textuais, traçamos a evolução histórica
do conceito de gênero nas diversas áreas de estudo, desde o seu surgimento.
Mapeamos os estudos de gênero, desde a Filosofia Clássica, fazendo a transição da
4
Vale esclarecer que o fato de a pesquisa fazer uso de gráficos não a torna quali-quantitativa, haja
vista que não empregamos nenhum tipo de técnica estatística para a sua leitura. O uso dos gráficos
é, na verdade, apenas recurso ilustrativo para dar mais visibilidade aos dados e sua compreensão é
de caráter interpretativista.
27
retórica antiga à linguística, passando pela literatura. Apresentamos também as
principais abordagens de estudo dos gêneros na atualidade. Com isso, percebemos
como, ao longo do tempo, a renovação do estudo da língua afetou o estudo dos
gêneros, e que, especificamente em relação à sociorretórica, esta corrente não
compreende uma retomada direta dos primeiros estudos dos gêneros na retórica
antiga. Trata-se de um outro modo de estudo da retórica. Por isso, também
chamada de Nova Retórica.
No terceiro capítulo, nos dedicamos mais especificamente à perspectiva
sociorretórica de estudo dos gêneros. Neste momento, apresentamos as
contribuições dos quatro estudiosos mais representativos dessa corrente: Vijay
Bhatia, John Swales, Carolyn Miller e Charles Bazerman. Destacamos o trabalho
dos três últimos, uma vez que, como teóricos, nos utilizamos dos seus construtos
para embasar a análise dos requerimentos. Merece um destaque o conceito de
gênero desenvolvido por Miller (2009a) como uma ação retoricamente tipificada.
No quarto capítulo, tratamos mais especificamente do gênero textual
requerimento, caracterizado como um gênero da redação oficial. Nesse sentido,
evidenciamos a implicação de alguns aspectos da administração pública na redação
oficial, principalmente no tocante ao Brasil, como, por exemplo, os princípios
estabelecidos pela Constituição Federal, entre outras legislações. Além disso,
discorremos sobre a definição do requerimento, o modo como ele é abordado nos
manuais de redação oficial e apresentamos um exemplar típico do gênero.
No quinto capítulo, discorremos sobre a análise dos dados referente ao
requerimento, organizado-o em quatro partes, de modo a contemplar as categorias
estabelecidas: a) os aspectos constitutivos; b) o ambiente em que se realiza; c) a
situação de uso e, por fim, d) os usuários.
Finalmente, encerramos o trabalho expondo as considerações finais. Neste
momento, retomamos as questões do estudo e discutimos suas possíveis
implicações para o uso do gênero requerimento nas condições da pesquisa e
apresentamos algumas sugestões para investigações futuras, considerando que o
assunto é tão pouco abordado em pesquisas.
28
1 CONTEXTUALIZAÇÃO DA PESQUISA
O gênero é apenas a realização visível de um
complexo
de
dinâmicas
sociais
e
psicológicas. Ao compreendermos o que
acontece com o gênero, porque o gênero é o
que é, percebemos os múltiplos fatores
sociais e psicológicos com os quais nossos
enunciados precisam dialogar para serem
mais eficazes.
Charles Bazerman
A fim de situar o trabalho no campo científico, apresentamos, agora, o
percurso metodológico adotado nesta pesquisa. Com vistas a isso, discutiremos a
abordagem de pesquisa adotada, os aspectos relativos ao objeto de estudo, o
cenário e os colaboradores da pesquisa. Trataremos, também, do corpus que
constitui a pesquisa, dos instrumentos usados para gerar os dados e dos
procedimentos de análise adotados.
Esta pesquisa se situa no campo da LA (MOITA LOPES, 2006), preocupada
com as mudanças sociais e históricas e com as rupturas com os modelos
hegemônicos. É uma área que se abre a estudos transdisciplinares,tais com a
Sociologia, a Psicologia, a Filosofia, entre outros, para pensar a linguagem como um
fenômeno situado, múltiplo e complexo.
O trabalho se situa no paradigma qualitativo (BODGAN; BIKLEN, 1994;
CHIZZOTTI, 2010; MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 1998), adotado pelas ciências
humanas, o qual considera a complexidade do fenômeno social.
De modo geral, a metodologia deste trabalho situa-se na perspectiva
sociorretórica da análise de gêneros, mais especificamente, na teoria de gênero
como ação social defendida por Miller (2009a), Swales (1990) e Bazerman (2009).
Para responder às questões que norteiam a pesquisa, esta assume uma postura
interdisciplinar,
conforme
Marcuschi
(2008), adotando
como
procedimentos
metodológicos algumas orientações apontadas por Johns et al. (2006), considerando
a complexidade existente no gênero enquanto entidade multidimensional.
29
1.1 A abordagem
1.1.1 A Linguística Aplicada como norteadora
Esta pesquisa se propõe a refletir sobre o gênero textual requerimento
produzido por graduandos no domínio administrativo de uma instituição pública de
ensino superior. Interessa discutir a utilização desse gênero no seu domínio sócio
discursivo, inserido em um sistema de atividade socialmente organizado,
observando questões referentes tanto à escritura quanto ao contexto, como as
condições de produção, circulação e recepção desse gênero.
Considerando que o contexto de análise é o de uma organização burocrática,
própria do tipo de instituição em que a sociedade é representada pelo Estado, em
uma estrutura jurídico-institucional (MOTTA, 2002), pode-se afirmar que a prática da
escrita de requerimentos é extremamente necessária, na medida em que o uso
desse gênero é o modo oficialmente reconhecido pelas organizações públicas.
Através dele, seus usuários não só estabelecem uma comunicação com essa
instância como também agem no sistema de modo a constituí-lo.
Pretendemos investigar aspectos relacionados à produção deste gênero e
seu funcionamento dentro das circunstâncias que o configuram, para que, dessa
maneira, seja possível ir além das questões de forma e substância, focando na ação
que realiza (MILLER, 2009a).
Isso aponta para uma reflexão sobre uso efetivo da língua, concebendo-a
como uma prática social que permite ao sujeito agir nas mais diversas esferas,
movidos por diferentes propósitos (PAZ, 2008). A pesquisa visa, com isso, contribuir
para os estudos atuais da LA que têm buscado a referência de uma língua real, em
suas práticas reais e específicas, em uma tentativa de estudar o objeto ainda na
tessitura de suas raízes (SIGNORINI, 1998).
Além disso, considerando que a LA constitui-se como um campo de estudo
que deve estar a serviço da sociedade, aspiramos discutir possíveis soluções e
encaminhamentos junto à comunidade usuária do gênero, através da identificação
de possíveis problemas existentes, a fim de “criar inteligibilidades sobre eles, de
modo que alternativas para tais contextos de usos de linguagem possam ser
vislumbradas” (MOITA LOPES, 2006, p. 20).
30
1.1.2 Sob o paradigma da pesquisa qualitativa
Situada na área da LA indisciplinar (MOITA LOPES, 2006), considerando,
portanto, as mudanças epistemológicas relacionadas ao cenário complexo da
contemporaneidade, esta pesquisa pretende “provocar o esclarecimento de uma
situação para uma tomada de consciência, pelos próprios pesquisados, dos seus
problemas e das condições que os geram, a fim de elaborar os meios e estratégias
de resolvê-los” (CHIZZOTTI, 2010, p. 104).
Seu enquadre está de acordo com os propósitos do paradigma qualitativo
(BODGAN; BIKLEN, 1994), visto que busca a análise descritiva e interpretativa do
sistema de atividade que envolve a produção dos requerimentos. De forma indutiva,
o processo de geração dos dados não se propõe à confirmação de hipóteses
previamente construídas, mas à apreciação sobre um determinado objeto que só é
possível após a construção dos dados e a relação direta do pesquisador com eles.
Na pesquisa qualitativa, o que se busca é o entendimento e a interpretação
dos fenômenos sociais inseridos em um contexto, o que requer uma compreensão
ativa do mundo tanto por parte do pesquisador como também dos pesquisados.
Como afirma Chizzotti (2010), essa abordagem de pesquisa fundamenta-se na
existência de uma relação dinâmica entre o mundo real e o sujeito que, por sua vez,
cria uma interdependência viva entre sujeito e objeto, um vínculo indissociável entre
o mundo objetivo e a subjetividade do sujeito. Assim, o sujeito de observador passa
à condição de integrante do próprio conhecimento através do processo de
interpretação utilizado diante dos fenômenos. Nesse caso, o objeto não é tido como
neutro, pois possui significados e estabelece relações com suas ações, como sujeito
que é.
Para atender ao paradigma selecionado, priorizamos a interpretação dos
dados (BORTONI, 2008), a fim de compreender o gênero não simplesmente como
um produto, mas as circunstâncias de sua produção e circulação, também. Para
isso, partimos da análise dos requerimentos produzidos pelos alunos e seguimos
para além dos textos, buscando as próprias perspectivas dos participantes, em um
planejamento que prevê a flexibilidade de ações, ao mesmo tempo em que visa à
possibilidade contribuir para amenizar dificuldades referentes ao objeto de estudo
(GIL, 2009).
31
Em vez de tratar o gênero simplesmente enquanto produto, buscamos a
análise do processo, desde a elaboração até o atendimento dos requerimentos, pois,
dessa forma, é possível enxergar o requerimento como um texto construído como
reflexo de normas e convenções, valores e práticas sócio-historicamente produzidos.
Em outras palavras, o gênero requerimento se constitui como reflexo da interação
projetada entre autor e leitor, produto de convenções culturais, sociais e linguísticas,
ou seja, como a materialização do discurso institucional, devendo ser necessário
para o seu estudo considerar todos os aspectos contextuais implicados no processo
de sua produção.
Isso implica olhar para as referências dos sujeitos que utilizam o gênero, para
o contexto de sua produção e para os procedimentos envolvidos nessa prática de
produção e recepção desses textos.
A natureza dos dados analisados constitui-se em uma mescla de ordem
etnográfica e documental. Neste caso, em razão de os documentos investigados, ou
seja, os requerimentos, não estarem relacionados a atividades referentes à
etnografia propriamente, como o observar e o perguntar.
Para uma melhor compreensão acerca do gênero em análise, no domínio
administrativo da universidade, e a fim de garantir maior credibilidade à pesquisa,
utilizamos mais de uma técnica de pesquisa, buscando discorrer de modo mais
abrangente sobre o fenômeno investigado, ou seja, adotamos múltiplas fontes de
informação para o desenvolvimento da pesquisa possibilitando, assim, a
triangulação dos dados (MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 1998).
1.1.3 Termo de autorização de uso das informações
Considerando que nossa pesquisa trata-se da investigação de seres
humanos, apoiada em uma abordagem qualitativa, faz-se necessária a constante
preocupação com questões éticas, decorrentes da interação do pesquisador com os
colaboradores (LÜDKE; ANDRÉ, 1986).
Conforme Bodgan e Biklen (1994, p. 75), duas questões predominam nessa
discussão: “o consentimento informado e a proteção dos sujeitos contra qualquer
especie de danos”. Faz-se necessário, dessa forma, assegurar a participação
voluntária dos colaboradores e a garantia dos anonimatos.
32
Para preservar tais questões, elaboramos um termo de autorização de uso
das informações para que os sujeitos assinassem. A elaboração desse termo deuse, conforme as recomendações de Creswell (2007), a fim de garantir aos
colaboradores alguns direitos como parte integrante da pesquisa.
A partir do acesso ao termo, os sujeitos puderam tomar consciência das
implicações da pesquisa antes mesmo de colaborarem. Nele, esclarecemos a
respeito da pesquisa, como, por exemplo, o objeto e as contribuições do estudo, e
informamos que a participação era voluntária e que o anonimato seria garantido.
Como utilizamos mais de um tipo de instrumento para gerar os dados e
fizemos abordagens diferenciadas, a autorização do colaborador para uso das
informações deu-se de modos diferentes. No caso dos questionários e dos
requerimentos, fizemos contatos por telefone e enviamos o termo e o link do
questionário por e-mail. Explicamos que a autorização seria dada através das
respostas ao questionário. No caso das entrevistas e dos protocolos verbais de
escrita, como o contato foi por telefone e pessoalmente, a autorização ocorreu por
meio da assinatura do termo.
Além dos dados de análise, também contamos com algumas fotografias no
trabalho. Vale esclarecer que a autorização dessas imagens deu-se através da
assinatura do termo. Além disso, mesmo o anonimato tendo sido garantido, os
colaboradores liberaram ao uso das fotografias sem qualquer restrição.
Em relação ao ambiente em que desenvolvemos a pesquisa, também
elaboramos um termo para autorização da realização da pesquisa. Esse termo tinha
como objetivo obter a permissão da autoridade responsável pelo setor e foi
devidamente assinado pela Pró-reitora Adjunta.
1.2 Designação do objeto de estudo
No ambiente administrativo das instituições públicas, muitas atividades são
realizadas através de práticas de escrita, como atas de reuniões, ofícios, resoluções
de órgãos superiores da administração, memorandos, relatórios, entre outras. A
escrita, nesse domínio, está sempre ligada a uma atividade que se deseja realizar
visando questões próprias da instituição.
Dentre os gêneros que fazem parte da administração pública, os gêneros
oficiais (BAKHTIN, 2010), elegemos como objeto de estudo o gênero requerimento,
33
muito utilizado na sociedade, mas sobre o qual praticamente inexiste elaboração
teórica fundamentada na perspectiva dos gêneros textuais. Segundo Brügger e
Querino (2009), requerimentos consistem em instrumentos através dos quais o
requerente se dirige à instituição, a fim de solicitar o reconhecimento de um direito
ou concessão de algo sob o amparo de uma legislação.
Nosso interesse na pesquisa diz respeito, especificamente, ao gênero
requerimento utilizado por graduandos como instrumento de participação social,
inserido em um sistema de atividade amplo, onde circulam textos do mundo real que
ocorrem dentro de circunstâncias sociais organizadas.
Entendemos que esse gênero textual merece nossa atenção devido à sua
relevância nesse contexto, pois é utilizado pelos alunos como principal instrumento
para as solicitações de documentos (declarações, certificados etc.) e de
procedimentos (retificações de notas, mudanças de modalidade, permutas de turno,
prorrogações de prazo para conclusão de curso, entre outros) referentes à sua vida
acadêmica.
1.3 O cenário
Como o objeto de estudo desta pesquisa se refere a textos produzidos no
domínio administrativo da UFRN, faz-se necessário conhecer um pouco esse
contexto.
Figura 1 - Prédio da Reitoria da UFRN
Fonte: Acervo da pesquisa
34
A UFRN é uma instituição pública de ensino que presta serviços ao seu
estado desde 1958. Na sua administração central, conforme o plano de gestão 2011
- 2015 (BRASIL, 2012), ela é composta por reitoria, 8 (oito) pró-reitorias, 2 (duas)
secretarias acadêmicas e 3 (três) superintendências. A área acadêmica possui 8
(oito) centros acadêmicos, com 70 (setenta) departamentos, 5 (cinco) unidades
acadêmicas especializadas, 3 (três) escolas de ensino técnico e 1 (uma) escola de
ensino fundamental.
Por ser uma instituição de referência no seu Estado, a UFRN se destaca em
relação ao número de cursos e de alunos que dispõe. Somente no ano de 2010, o
número de matrículas realizadas na graduação chegou a 27.204 (vinte e sete mil,
duzentos e quatro), segundo o plano de gestão atual (BRASIL, 2012).
Para administrar questões referentes ao ensino de graduação, a UFRN conta
com
a
Pró-reitoria
de
Graduação
(PROGRAD),
órgão
responsável
pelo
planejamento, supervisão, coordenação e controle das atividades de ensino de
graduação.
Além de assessorar o Reitor, com questões de política e atividades de ensino
de graduação, cabe à PROGRAD, segundo seu Relatório de Gestão 2007-2011
(BRASIL, 2010b), coordenar, supervisionar e executar os serviços de registro e
controle de registros das atividades relacionadas ao ensino de graduação;
assessorar os órgãos da administração acadêmica, em todos os níveis, sobre
legislação de ensino superior e assuntos de natureza didático-pedagógica.
A PROGRAD divide-se em duas diretorias, a Diretoria de Desenvolvimento
Pedagógico (DDP) e a Diretoria de Administração e Controle Acadêmico (DACA). A
primeira atua mais diretamente no âmbito pedagógico, desenvolvendo atividades
relacionadas à criação e atualização dos cursos, currículos e programas de
graduação. A segunda é mais atuante no que se refere às questões administrativas,
ocupando-se com o registro e acompanhamento da vida acadêmica dos alunos.
Nesse sentido, a produção e circulação dos requerimentos acadêmicos acontecem
em larga escala na DACA.
Para o desempenho de suas atribuições, a PROGRAD conta com um total de
59 pessoas, sendo: 5 (cinco) servidores técnico-administrativos em assunto
educacional, 27 (vinte e sete) servidores técnico-administrativos, 2 (dois)
funcionários de apoio técnico, 19 (dezenove) bolsistas e 6 (seis) professores, sendo
35
1 (um) o Pró-reitor e outros 2 (dois) os diretores. No momento, um destes, o diretor
da DACA, ocupa simultaneamente a função de Pró-reitor Adjunto.
Junto à PROGRAD, como órgão deliberativo, normativo e consultivo sobre
matéria acadêmica, temos a Câmara de Graduação (CG), que constitui o Conselho
de Ensino, Pesquisa e Extensão (CONSEPE). Atualmente, a CG é composta por um
corpo de 10 (dez) relatores, sendo 8 (oito) professores, 1 (um) servidor técnico e 1
(um) estudante. Esses relatores são membros do CONSEPE que, voluntariamente,
optam por participar da CG5. Quanto a essa composição, ela não é fixa, pois
depende do interesse dos membros do CONSEPE.
A CG é presidida pelo Pró-reitor e Pró-reitor Adjunto da Graduação. Ela
corresponde a um dos órgãos dos conselhos superiores da UFRN, o CONSEPE e
atua diretamente na análise de alguns processos, cujos assuntos são legalmente de
sua competência.
Apresentamos, a seguir, a estrutura administrativa da PROGRAD:
Figura 2 - Organograma Administrativo da Pró-reitoria de Graduação da UFRN
Fonte: Relatório de Gestão 2007-2011 (BRASIL, 2010b)
5
É necessário esclarecer que, na verdade, os membros do CONSEPE têm a obrigação de participar
de uma das quatro câmaras, de modo que a voluntariedade está na escolha concernente a uma das
câmaras.
36
Considerando os ambientes de maior circulação dos requerimentos
produzidos pelos alunos, envolvemos, diretamente na pesquisa, os seguintes
setores da PROGRAD: a Secretaria, o Setor de Arquivo Ativo, o Setor de admissão
e Cadastro, o Setor de Registro Acadêmico e o Setor de Expedição de Documentos.
Além dos setores da DACA, contribuíram para o desenvolvimento da pesquisa a
Coordenadoria de Atendimento e a Assessoria Técnica, colaborando com a
entrevista e com o questionário.
A DACA possui, atualmente, 19 (dezenove) servidores técnicos, sendo
distribuídos da seguinte maneira: 3 (três) na Secretaria, 4 (quatro) no setor de
arquivo ativo, 4 (quatro) no Setor de Registro Acadêmico, 4 (quatro) no Setor de
Registro e Expedição de Documentos e 4 (quatro) no Setor de Admissão e
Cadastro. Além de 9 (nove) bolsistas e 1 (um) professor, que é o diretor.
No caso da Assessoria Técnica da PROGRAD, sua contribuição deu-se com
a resposta de 1 (uma) servidora técnica ao questionário.
Figura 3 - Coordenadoria de Atendimento da PROGRAD/UFRN
Fonte: Acervo da pesquisa
A Coordenadoria de Atendimento, com 4 (quatro) servidores técnicos e 2
(dois) bolsistas, é o setor a PROGRAD que trabalha diretamente com a abertura e
recepção de processos. Ela é responsável por receber as solicitações referentes ao
ensino de graduação. Seu horário de funcionamento, diferente dos demais setores
da PROGRAD, compreende doze horas diárias e ininterruptas, que vai das 7 horas e
37
30 minutos às 19 horas e 30 minutos, permitindo o acesso aos alunos nos três
turnos em que a universidade funciona. Os demais setores da pró-reitoria funcionam
das 7 horas e 30 minutos às 17 horas e 30 minutos, ou seja, nos turnos matutino e
vespertino.
Vale esclarecer que, além de serem produzidos na PROGRAD, alguns
requerimentos são redigidos nos ambientes das coordenações dos cursos.
Atualmente, a UFRN dispõe de 70 (setenta) departamentos de cursos, distribuídos
em 8 (oito) centros administrativos.
Em sua composição administrativa, as coordenações dos cursos possuem,
geralmente, 1 (um) servidor técnico administrativo e 2 (dois) professores, um
ocupando a função coordenador de curso e o outro de vice-coordenador. As
coordenações têm a obrigação de funcionar durante oito horas diariamente.
Os requerimentos, mesmo sendo produzidos fora da PROGRAD, seguem
para lá, são recebidos pela Coordenadoria de Atendimento e encaminhados para os
setores competentes para análise e atendimento.
Optamos por gerar nossos dados apenas no âmbito dessa Pró-reitoria, uma
vez que nela são arquivados a maior parte dos requerimentos produzidos pelos
alunos da graduação.
1.4 Os colaboradores
Os sujeitos participantes desta pesquisa são alunos do ensino de graduação
e servidores técnicos da PROGRAD, ou seja, pessoas que atuam no sistema de
atividade referente aos requerimentos de modo diferenciado conforme os papéis
sociais que desempenham. A opção por trabalhar com esses dois segmentos deu-se
devido à necessidade de olhar tanto para a elaboração da escrita dos requerimentos
como para o atendimento desses documentos, a fim de visualizar o sistema
existente no uso do gênero em estudo.
38
Figura 4 - Aluno produzindo um requerimento na
PROGRAD/UFRN
Figura 5 - Servidora atendendo às solicitações dos
alunos
Fonte: Acervo da pesquisa
Fonte: Acervo da pesquisa
Em termos quantitativos, são participantes da pesquisa 50 (cinquenta)
graduandos de vários cursos, com ingresso em anos diferentes. Esses alunos se
encontram cursando períodos distintos, variando no momento em que participaram
da pesquisa entre alunos ingressantes (cursando o primeiro período letivo) e
concluintes (que tinham concluído recentemente). A participação desses alunos deuse da seguinte maneira: todos responderam ao questionário e permitiram a análise
pela pesquisadora dos requerimentos produzidos por eles no âmbito da graduação.
Além disso, 3 (três) alunos participaram das entrevistas e 2 (dois) alunos
participaram dos protocolos verbais de escrita.
Em relação aos servidores técnicos, são 8 (oito) profissionais que
desempenham suas atividades laborais na PROGRAD, sendo 4 (quatro) na DACA, 3
(três) na Coordenadoria de Atendimento e 1 (um) na Assessoria Técnica. Quanto ao
tempo de serviço na universidade, existe uma variação entre 1 ano e 26 anos. No
que se refere à formação profissional, 4 (quatro) possuem pós-graduação, 3 (três)
possuem graduação e 1 (um) está cursando a graduação. Esses oito servidores
responderam ao questionário aplicado e, dentre eles, selecionamos dois indivíduos
para participar das entrevistas. Um deles atua, mais precisamente, junto à produção
dos gêneros pelos alunos e o outro, na leitura e atendimento das solicitações feitas
por eles. Os critérios de seleção foram, portanto: a relação que mantém com o
gênero e a experiência com a atividade que desenvolvem em relação aos
requerimentos, já que trabalham há mais de quatro anos no mesmo setor.
De um total de 58 (cinquenta e oito) participantes, 23 (vinte e três) são do
sexo feminino e 35 (trinta e cinco) do sexo masculino, com faixa etária variando
entre 19 e 70 anos para os alunos, e entre 23 e 55 anos para os servidores técnicos.
39
A respeito da seleção dos colaboradores, nós não estabelecemos critérios
específicos em relação aos alunos. Nosso interesse era formar um banco de dados
que tivesse um maior alcance de modo que nenhum grupo específico fosse
privilegiado. Desse modo, tivemos discentes de cursos variados, de diferentes áreas
e em estados diferentes em relação ao curso, desde ingressantes até alunos que já
tinham concluído o curso.
Em relação aos servidores, buscamos a colaboração de servidores que atuam
em setores diferentes da PROGRAD, a fim de observamos o que as vivências
diferenciadas com o gênero poderiam revelar.
No decorrer da pesquisa, esses alunos de graduação que contribuíram com a
geração de dados serão mencionados nas análises como AG1, AG2, AG3, e assim
sucessivamente. Da mesma forma, os servidores técnicos são identificados como
ST1, ST2, ST3, e assim por diante.
1.5 O corpus
Para uma análise que permita examinar o gênero nas suas diferentes
dimensões (JOHNS et al., 2006), utilizando diferentes ferramentas etnográficas, a
definição do corpus deste trabalho constituiu-se a partir da contemplação dos
seguintes aspectos do gênero: a sua dimensão constitutiva e a sua dimensão
retórica. Os corpora são compostos por uma seleção de requerimentos,
questionários, entrevistas e protocolos verbais de escrita6.
Os requerimentos e os protocolos verbais de escrita dizem respeito,
obviamente, aos produtores dos textos; os demais instrumentos foram aplicados
tanto com os produtores como com os leitores.
No caso do corpora constituído por exemplares autênticos de requerimentos,
verificou-se que, de modo geral, os atos implicados correspondem à solicitação de
necessidades específicas por parte de graduandos junto aos representantes do
serviço público que possuem competência legalmente instituída para o devido
atendimento.
A princípio, em um estudo piloto, a pesquisa contava com 110 (cento e dez)
requerimentos coletados. A seleção desses requerimentos deu-se com base nas
6
As ilustrações usadas nesse capítulo metodológico não fazem parte do corpus de análise da
pesquisa, apesar de comporem os documentos.
40
características relevantes aos interesses da pesquisa, através de critérios da
intencionalidade, recomendável para esse tipo de pesquisa, conforme Gil (2009).
Dentre eles, foram priorizados 50 (cinquenta) requerimentos para análise dos
aspectos linguísticos do gênero. Como critério para essa segunda seleção
privilegiou-se os requerimentos cujos produtores responderam ao questionário.
Dessa forma, a pesquisa conta com 50 (cinquenta) questionários aplicados
diretamente com os produtores de requerimentos selecionados e com suas
respectivas produções.
Esses requerimentos foram produzidos nos anos de 2010 e 2011 e,
atualmente, encontram-se arquivados no Setor de Arquivo Ativo da PROGRAD.
A coleta desses requerimentos deu-se de modo indiscriminado, já que os
produtores são alunos de diferentes cursos na instituição, conforme a disposição a
seguir:
41
Quadro 2 - Distribuição de requerimentos coletados por cursos
Cursos
Ocorrências
Administração
Biomedicina
Ciências Biológicas
Ciências Contábeis
Direito
Educação Física
Engenharia Civil
Engenharia da Computação
Engenharia da Produção
Engenharia Elétrica
Engenharia Mecânica
Engenharia Química
Farmácia
Filosofia
Física
Fisioterapia
Geografia
Geologia
História
Jornalismo
Letras
Medicina
Música
Psicologia
Química
Turismo
2
1
3
1
1
1
1
1
1
1
3
1
3
3
1
2
1
5
1
1
3
2
4
1
1
5
Fonte: Acervo da pesquisa
A fim de um melhor controle do corpus desta pesquisa, os requerimentos
foram identificados por um código alfanumérico, formado pela letra R seguida de um
número que corresponde a uma sequência, de modo que são mencionados nas
análises como R1, R2, R3... até R50.
Nesse grupo de 50 (cinquenta) produtores de requerimento foram
desenvolvidas entrevistas e protocolos verbais de escrita com 2 (dois) alunos que
refizeram seus requerimentos para ter seu pedido aceito.
Para uma maior elucidação da situação retórica (MILLER, 2009a), os leitores
desses requerimentos, ou seja, os servidores da PROGRAD, também tiveram seus
42
dizeres considerados na construção dos dados para investigação a partir de
informações prestadas em 8 (oito) questionários respondidos pelos servidores e em
2 (duas) entrevistas com servidoras da PROGRAD que se dispuseram a falar sobre
suas experiências a respeito dos requerimentos.
Referentemente aos alunos, foram adotados como dados para análise 50
(cinquenta) requerimentos, 50 (cinquenta) questionários, 3 (três) entrevistas e 2
(dois) protocolos verbais de escrita. Em relação aos servidores, constituem-se como
dados 8 (oito) questionários e 2 (duas) entrevistas.
Observamos que a natureza dos dados analisados se constitui de uma
mescla de ordem documental e etnográfica. Isso permite a triangulação dos dados,
atribuindo à pesquisa maior credibilidade.
1.6 Processo de geração de dados e instrumentos utilizados
O processo de geração dos dados teve início no mês de fevereiro de 2011,
quando, submetida à apreciação da Pró-reitoria da Graduação, a pesquisa obteve
autorização oficial para sua realização.
De posse dessa autorização, começamos a fase exploratória do campo,
visitando os setores da PROGRAD. Nesse momento, empregamos técnicas como a
“observação livre”, “conversas informais” com os servidores que trabalham com o
gênero (MAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 1998, p.161). Aproveitamos para
informar à comunidade sobre a proposta de investigação, a fim de esclarecer sobre
a importância da pesquisa e, ao mesmo tempo, conseguir o apoio desses servidores
na coleta dos textos.
Uma análise preliminar dos requerimentos, amparada na perspectiva
sociorretórica de análise de gêneros, consistiu em um estudo piloto. Esse estudo
indicou que, para contemplar a situação retórica que envolve o gênero, a análise não
poderia ficar presa apenas aos textos produzidos pelos alunos. Resolvemos, então,
adotar diferentes fontes, já que compreendemos o gênero como uma entidade
complexa.
Percebemos que, para o desenvolvimento de nossa pesquisa, seria
extremamente relevante considerar a percepção dos sujeitos atuantes no
desenvolvimento da atividade ligada ao gênero a respeito das condições de uso.
43
Para atender as necessidades reveladas nesse estudo piloto, resolvemos
empregar diferentes tipos de instrumentos de pesquisa que foram aplicados junto
aos usuários do gênero requerimento, os alunos e os servidores técnicos.
Apresentaremos, a seguir, os instrumentos de pesquisa utilizados. Na medida
em que discorremos sobre os instrumentos, relatamos os procedimentos aplicados
para gerar os dados desta pesquisa.
1.6.1 Os requerimentos
Inicialmente, a coleta dos textos deu-se através do engajamento dos setores
com a indicação de requerimentos para compor o nosso banco de dados. Em
seguida, foi a vez de consultar o acervo do Setor de Arquivo Ativo da PROGRAD,
onde são arquivados os processos dos alunos de graduação ativos na instituição,
para proceder a coleta dos textos. Dessa forma, fizemos cópia dos requerimentos,
totalizando, inicialmente, 110 exemplares.
De posse desses requerimentos, criamos um banco de dados dos alunos
prováveis colaboradores da pesquisa. Esse banco continha as seguintes
informações: nome, matrícula, número do processo, assunto do processo, data da
coleta, telefones e e-mail. Esses dados permitiram o contato com os alunos para
obter autorização para análise desses documentos. O banco de dados dos
colaboradores foi sendo formado, então, à medida que os textos eram coletados.
Através de mensagens via e-mail e ligações telefônicas, procedemos ao
contato com esses alunos para informá-los sobre a pesquisa e, ao mesmo tempo,
perguntá-los sobre a disponibilidade para participarem dela.
Vale ressaltar que sempre houve a preocupação com a questão ética, uma
vez que ela deve sempre se fazer presente nas pesquisas, principalmente nas
qualitativas, em que as relações entre colaboradores e investigador ocorrem de
forma mais próxima e continuada (BODGAN; BIKLEN, 1994).
Dos 110 (cento e dez) alunos que foram contactados, 50 (cinquenta) se
dispuseram a participar da pesquisa, já autorizando a análise de seus
requerimentos.
Assim, formamos o primeiro corpora deste trabalho, composto por 50
requerimentos.
44
1.6.2 Os questionários
A segunda parte do nosso corpus é formada por 58 (cinquenta e oito)
questionários respondidos pelos usuários do gênero, sendo 8 (oito) respondidos por
servidores técnicos da PROGRAD e 50 (cinquenta) por alunos de graduação.
Para facilitar a aplicação deste instrumento, optamos por utilizar uma
ferramenta disponível pelo site do Google, chamada Google Docs. Com ela, foi
possível publicar o questionário online, facilitando o acesso e permitindo uma
interação simples, rápida e com segurança.
Para conseguir a adesão dos servidores em relação a esse instrumento,
visitamos a PROGRAD, fizemos uma exposição de nossa pesquisa, utilizando uma
apresentação no programa PowerPoint. Nesse evento, contamos, inclusive com a
presença do Pró-reitor adjunto da PROGRAD. Após a exposição, explicamos a
necessidade da participação deles na pesquisa e solicitamos os e-mails dos
voluntários para enviar o convite. Dos 10 (dez) servidores convidados por e-mail, 8
(oito) responderam ao questionário.
Em relação aos alunos, no mesmo contato que realizamos para solicitar
autorização para análise dos requerimentos, explicamos sobre a importância de
responder aos questionários. Esclarecemos, por telefone e no próprio questionário,
que a resposta a esse instrumento implicaria a autorização para o uso das
informações na análise do trabalho. Dos 110 (cento e dez) alunos contactados, 50
(cinquenta) responderam ao questionário, autorizando também a análise dos
requerimentos.
Os questionários apresentam questões fechadas e abertas. Eles tratavam,
basicamente, da identificação dos sujeitos; de suas práticas de leitura e de escrita,
em ambientes diversos e, especificamente, no ambiente acadêmico (para os alunos)
e no de trabalhos (para os servidores); e de questões referentes ao gênero em
questão.
Vale esclarecer que, devido ao fato dos usuários ocuparem lugares diferentes
em relação ao gênero, optamos por aplicar dois tipos de questionários, um para
cada categoria - escritores e leitores -, a fim de privilegiar questões específicas
quanto ao uso dos requerimentos.
45
1.6.3 As entrevistas
Após a geração dos dados, sentindo a necessidade de obter informações
mais específicas a respeito das circunstâncias que envolvem o processo de
realização dos requerimentos, resolvemos realizar entrevistas dirigidas (CHIZZOTTI,
2006) com 2 (dois) servidores e 3 (três alunos).
Buscamos depreender nessas entrevistas o contexto de realização do gênero
requerimento, os elementos que envolvem o sistema de atividade do qual esse
gênero faz parte, as dificuldades que perpassam o processo de produção e
atendimento desses documentos, a execução dessas atividades e as sugestões de
melhoria no sistema relacionado aos requerimentos.
Em relação às entrevistas com os servidores, a adesão foi negociada da
mesma forma que ocorreu com os questionários e a participação deu-se
voluntariamente. Pessoalmente, explicamos a necessidade da utilização de mais
esse instrumento e lançamos o convite. Prontamente, 2 (duas) servidoras
demonstraram a disponibilidade para colaborar com as entrevistas, quando
marcamos encontros individualmente.
Quanto aos alunos, dentre os que haviam respondido ao questionário,
escolhemos 3 (três) para realizar a entrevista. Dois desses alunos foram escolhidos
por terem refeito os requerimentos e o outro, por ele mesmo ter se oferecido para
colaborar com entrevista, caso fosse necessário. Entramos em contato, novamente,
com esses alunos por telefone e explicamos a necessidade da aplicação desse
instrumento. Após consentimento, marcamos encontros particulares.
Os encontros ocorreram igualmente tanto com os servidores como com os
graduandos. Inicialmente, colhemos as assinaturas do Termo de Autorização de Uso
das Informações e realizamos uma conversa informal a fim de ressaltar os
propósitos da pesquisa. Depois desse primeiro momento, realizamos “entrevistas
dirigidas” (CHIZZOTTI, 2006, p. 57) e fizemos uso da gravação em áudio. Durante
as entrevistas, algumas perguntas (como por exemplo, sobre o momento da escrita,
os destinatários, os propósitos, as condições de leitura) eram lançadas para que os
entrevistados falassem livremente a respeito.
Após a realização das transcrições, com base nos procedimentos da pesquisa
etnográfica, os colaboradores tinham acesso ao material, fruto do encontro anterior,
46
podendo aprovar, modificar ou reprovar as informações por eles repassadas, com
vistas a garantir maior fidedignidade aos dados coletados.
1.6.4 Os protocolos verbais de escrita
Pensando no processo de desenvolvimento da escrita dos requerimentos,
mais especificamente no momento em que essa escrita acontece e nos fatores que
interferem nesse processo, resolvemos adotar como instrumento de pesquisa
protocolos verbais (PV) (ERICSSON; SIMON,1987; 1993).
Essa técnica, utilizada em pesquisas qualitativas, consiste na coleta de dados
através da verbalização dos pensamentos dos sujeitos, durante o processamento de
uma tarefa. É um instrumento que promove uma análise pelo sujeito de seu próprio
processo de pensamento.
Inicialmente, ela foi aplicada na área de leitura, mas já existem pesquisas que
a empregam no contexto da escrita (COHEN; BROOKS-CARSON, 2001; CASTRO,
2004), como é o nosso caso. Adaptando a técnica, utilizamos relatos verbais
retrospectivos, ou seja, os PV de escrita foram desenvolvidos em momento posterior
à escrita dos textos. Neles, era solicitado que os sujeitos comentassem experiências
e opiniões sobre a escrita dos requerimentos.
Os PV foram gerados segundo algumas etapas. Primeiramente, com base
nos corpora referentes aos requerimentos, constatamos que alguns tinham sido
reelaborados. No contato por telefone com os produtores desses textos, a respeito
das entrevistas, explicamos a necessidade de uso de mais um instrumento. Após a
demonstração de interesse na colaboração de mais essa etapa, marcamos o
momento para gerar os protocolos.
A geração de dados foi realizada individualmente com os 2 (dois) alunos,
através de gravação de áudio. Antes de aplicar a ferramenta, realizamos uma
conversa informal sobre os procedimentos que envolvem a técnica de protocolos
verbais para um melhor esclarecimento da tarefa a ser utilizada.
Em
seguida,
requerimentos,
tendo
entregamos
sido
aos
apenas
sujeitos
a
as
segunda
duas
deferida.
versões
de
Solicitamos
seus
aos
colaboradores que visualizassem as mudanças e que externassem seus
pensamentos sobre a reescritura do documento, dando ênfase ao esclarecimento
dos aspectos contemplados nos processos das escritas.
47
Após, os encontros, os áudios dos relatos foram transcritos e enviados por email aos colaboradores, procedimento também realizado com as entrevistas, para
que os participantes tivessem acesso ao material, podendo fazer quaisquer
modificações nas informações apresentadas.
1.7 Procedimentos de análise dos dados
Partindo da noção de que a pesquisa qualitativa não trabalha com ideias préconcebidas, priorizamos estabelecer um diálogo entre as teorias que fundamentam
esta pesquisa (MILLER, 2009a; SWALES, 1990; BAZERMAN, 2009) e as
informações advindas dos dados gerados. Com isso, observamos como se dá a
prática social do gênero requerimento produzido por graduandos no domínio
administrativo da instituição em que estudam para eleger as categorias devidamente
apropriadas ao questionamento central deste trabalho.
Baseado na perspectiva sociorretórica dos gêneros, que compreende a
atividade de linguagem como ação social situada (MILLER, 2009a; SWALES, 1990;
BAZERMAN, 2009) e considerando a complexidade dos dados coletados e os
métodos etnográficos de análise de gênero recomendados por Devitt, Reiff e
Bawarshi, que fornecem o acesso tanto às comunidade como também aos usos dos
gêneros, (apud JOHNS et al., 2006), as categorias de análise foram exploradas de
forma mais amplas, haja vista que ao olhar o texto, olhamos também para a sua
situação retórica. Nesse sentido, adotamos as seguintes categorias para análise do
gênero requerimento: os aspectos constitutivos; o ambiente em que se realiza; a
situação de uso e os usuários.
Buscando entender como esses documentos funcionam e a interpretação que
os sujeitos dão a eles, no seu contexto de funcionamento, utilizamos vários
instrumentos de pesquisa, já citados, que permitiram examinar os requerimentos
centrando-se muito mais na ação induzida pelo discurso do que na sua substância,
como recomenda Miller (2009a).
Quanto à análise documental, a apreciação dos textos produzidos pelos
graduandos, ou seja, dos requerimentos, levou-nos a investigar, nos exemplares que
compõem
parte
do
corpus,
alguns
aspectos
constitutivos
referentes
à
macroestrutura do gênero, à organização retórica e aos assuntos tratados, que
estão relacionados aos propósitos. Neste momento, a análise teve como referência
48
os apontamentos de Swales (1990), embora tenhamos feito uma transposição de
suas ideias. Essa análise foi triangulada com informações obtidas por meio dos
questionários e das entrevistas, que foram realizados tanto com os produtores
quanto com os receptores do gênero.
A análise dos questionários e das entrevistas também possibilitou
estabelecer uma interpretação social do gênero através da observação de
características gerais da comunidade retórica (MILLER, 2009b). Com isso, foi
possível compreender o papel dos sujeitos, suas opiniões sobre esse gênero,
dificuldades e sugestões de melhorias para o sistema de atividade no qual o gênero
requerimento se insere.
Especificamente, sobre as condições de uso desses textos, depreendemos
onde e como ocorre o funcionamento desses requerimentos nesse sistema,
constatamos fragilidades, identificamos outros gêneros que participam desse
sistema e depreendemos como ocorrem as interações através desse gênero.
Finalmente, com a análise dos protocolos verbais de escrita, buscamos
identificar as etapas que constituem o momento da escrita, as mudanças
contempladas na segunda escrita dos textos, ou seja, dos requerimentos deferidos,
e, consequentemente, os critérios privilegiados pelos escritores.
189
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando que a relevância de uma pesquisa consiste no retorno que ela
apresenta à comunidade pesquisada, a fim de possibilitar a realização de ações
antes não pensadas ou vislumbradas ou, ainda, difíceis de serem viabilizadas, nossa
pretensão, neste estudo, não é a de solucionar problemas de forma definitiva, mas
de provocar um diálogo legítimo a respeito dos aspectos sociais que envolvem as
atividades relacionadas ao gênero analisado.
Com base na compreensão sociorretórica de gênero textual (MILLER, 1984;
SWALES, 1990; BHATIA, 1993; BAZERMAN, 1994), esta pesquisa buscou
investigar, como objetivo central, o gênero requerimento produzido pelos
graduandos
enquanto
prática
social
desenvolvida
no
domínio
acadêmico-
administrativo da instituição.
A partir da análise dos exemplares do gênero, dos discursos de seus
usuários e de observações sobre o ambiente em ele se presentifica, obtivemos
como evidência uma compreensão mais fidedigna das atividades realizadas no
domínio acadêmico-administrativo e, consequentemente, o entendimento de que os
requerimentos se constituem como ferramenta fundamental nesse contexto, uma
vez que são o modo legítimo utilizado pelos graduandos para se dirigirem à Próreitoria de Graduação.
Para apresentar nossas considerações a respeito do nosso objeto de
investigação, organizamos esta seção em duas partes. Na primeira, retomamos as
questões de pesquisa, a fim de atender aos objetivos propostos pela pesquisa. Na
segunda parte, compreendendo que o tema abordado não pode ser considerado
esgotado, haja vista a dificuldade de encontrar trabalhos a respeito dos gêneros que
circulam no domínio administrativo, ressaltamos a necessidade de realizar mais
pesquisas a esse respeito.
Para atender ao objetivo central, buscamos, nos dados formulados, o
entendimento que nos permitisse responder às seguintes questões: quais os
elementos constitutivos dos requerimentos e a sua organização retórica; e como se
constitui a situação retórica típica dos requerimentos, tendo como foco o ambiente
em que são produzidos, a sua situação de uso e os seus usuários.
190
Na tentativa de responder a essas questões, nossa análise partiu da
compreensão do caráter essencialmente histórico e dinâmico que há no gênero
textual e foi orientada, particularmente, pelos métodos etnográficos de análise de
gênero recomendados por Devitt, Reiff e Bawarshi (apud JOHNS et al., 2006).
Através desses métodos, tivemos acesso não só à comunidade como também aos
usos do gênero em questão. Com isso, foi possível enxergá-lo como entidade
complexa e multidimensional, resultado de uma relação funcional entre tipo de texto
e situação retórica.
Com base na noção de recorrência (MILLER, 2009a), a análise dos aspectos
que constituem esses requerimentos, revelou-nos que, por serem desenvolvidos em
formulários específicos destinados ao propósito comunicativo comum de solicitar,
são textos curtos e simples. Em geral, encontramos a realização de onze
movimentos retóricos, sendo apenas dois mais recorrentes - o de solicitar e o de
justificar. Esses dois movimentos são encarados como essenciais na identificação
do gênero e para a sua realização nesse domínio e estariam mais relacionados ao
propósito social do gênero.
Em relação aos assuntos tratados nesses documentos, percebemos que há
uma diversidade. Eles variam de acordo com períodos específicos. Relacionamos
esses assuntos ao que chamamos de propósito comunicativo individuais, pois, além
do propósito comum do gênero, que corresponde ao próprio ato de fala existente no
requerimento, que é o de solicitar, entendemos que existe um propósito comum,
que refere-se ao sujeito e o movimenta no sentido de agir através do requerimento.
Dizemos que esses propósitos comunicativos individuais são particulares, mas não
são únicos, pois se repetem, de modo que são previstos por legislações que
determinam as condições de uso.
Reconhecemos que os padrões retóricos desses requerimentos revelam que,
apesar de se tratar de um gênero da comunicação oficial, seus aspectos
constitutivos são empregados de forma pragmática e sem maiores compromissos
com
os
parâmetros
que
regulamentam
a
comunicação
oficial,
visando,
simplesmente, ao atendimento do propósito comunicativo, sem submeterem-se às
exigências dos manuais de redação oficial. Com base nessa observação,
ressaltamos a incapacidade dos manuais normativos fixarem universalmente o
gênero, como se esse não atendesse à situação comunicativa, negando-lhe a
capacidade própria de flexibilidade.
191
Como podemos observar, nos requerimentos analisados, a simplicidade do
gênero está relacionada ao padrão constitutivo do gênero, referente à solicitação e à
justificativa. No entanto, mesmo seguindo um padrão de elaboração simples, esses
requerimentos apresentam, ainda, muitos problemas de ordem tanto linguística
quanto retórica.
Essas dificuldades podem estar relacionadas a vários fatores. Um deles é o
fato de esses alunos não terem uma compreensão clara a respeito do gênero. Outro
motivo observado é o pouco ou quase inexistente trabalho com esse gênero em sala
de aula. Além disso, outra possibilidade diz respeito ao pouco contato desses alunos
com o domínio administrativo da instituição e, consequentemente, com os gêneros
que nele circulam.
Os dados evidenciam, assim, a necessidade de oferecer aos alunos a
oportunidade de conhecer melhor outros gêneros, além dos acadêmicos, que fazem
parte de sua convivência e, com isso, ampliar sua competência comunicativa e sua
atuação social nos diversos domínios que a universidade admite.
Para identificar melhor essas dificuldades existentes no sistema de atividade
referente aos requerimentos, passamos, então, a contemplar a segunda questão,
referente à situação retórica típica dos requerimentos, pois entendemos que
somente conhecendo essa situação podemos buscar encaminhamentos práticos
para tais problemas. Com base nos princípios da pesquisa etnográfica, elegemos
como elementos relevantes na situação retórica o ambiente em que os
requerimentos são produzidos, a situação de uso e os usuários do gênero.
Em relação ao ambiente em que são produzidos, apesar de esses
requerimentos serem produzidos por alunos, eles não correspondem aos gêneros
tidos como acadêmicos, pois circulam em um domínio específico dentro do espaço
da academia, o administrativo. Considerando o ambiente de instituição pública, cujas
atividades são regidas por princípios legais, os requerimentos se apresentam, de
certa forma, conforme essa padronização.
Devido à hierarquia que constitui a universidade, à sua extensão e ao número
de cursos e de alunos, a maneira permitida aos alunos para se dirigirem à
PROGRAD é através dos requerimentos, que podem ser produzidos tanto na própria
pró-reitoria como nas coordenações dos cursos. Depois da produção, todos os
procedimentos e os locais por onde os requerimentos passam seguem uma ordem.
192
Isso permite inferir que esses documentos são regidos por regras específicas e que
os alunos precisam ter conhecimento para que haja uma apropriação do gênero.
Em relação à situação de uso desse gênero, podemos afirmar que: sua
utilização dá-se devido à necessidade de solicitar algo à PROGRAD. Apesar dele
ser um gênero de uma produção na universidade considerável, é pouco ou
pouquíssimo abordado em sala de aula. Existe dificuldade por parte de alguns
alunos na escrita desse gênero e, provavelmente, devido a isso, existe também
orientação para sua produção. Os alunos, em sua maioria, não recorrem aos textos
que regulamentam a elaboração desses requerimentos, consultando o RCG poucas
vezes. Eles não costumam acompanhar o andamento do processo que envolve o
gênero.
Além disso, os requerimentos compõem um sistema de atividades que se
organiza de forma central em torno de documentos escritos próprios do sistema
acadêmico-administrativo da universidade, em que alunos, professores e servidores
técnicos agem de acordo com papéis ou funções sociais que desempenham nesse
contexto. Esses documentos acompanham os requerimentos formando processos
administrativos, de acordo com procedimentos estabelecidos no RCG, com vista ao
cumprimento de um propósito. Esses processos reúnem conjuntos de gêneros
constituindo um sistema de atividades realizadas conforme uma rotina que tem
como elemento desencadeador o requerimento.
Para abordar as representações dos usuários dos requerimentos, resolvemos
olhar não somente a situação de escrita como também a de leitura desses textos.
Essa orientação evidenciou de forma mais completa que tanto a atividade de escrita
como a de leitura dos requerimentos acontece em razão do papel social que o
indivíduo desempenha na instituição. Dessa forma, ouvimos os alunos, que
desempenham a função de escritores do gênero, e os servidores técnicos, que
atuam na PROGRAD e têm a obrigação de ler esses textos para analisar e atender
as solicitações conforme a legislação vigente.
Com base no conjunto de métodos adotados na geração dos dados
(questionários, entrevistas, protocolos verbais de escrita e consulta documental), a
análise dos usuários desse gênero deu-se na perspectiva de estabelecer um diálogo
útil no sentido de tornar visível para o outro o entendimento dos significados de suas
ações.
193
A fim de estabelecermos o diálogo e a reflexão almejada juntamente com os
usuários, retomamos os seguintes aspectos: o modo como eles se relacionam com o
gênero; as dificuldades apontadas na produção e na leitura; assim como, as críticas
e as sugestões que consideram relevantes.
Em relação aos escritores, podemos afirmar que são alunos que, no geral,
preferem ler a escrever e utilizam o computador com frequência e em vários
ambientes, principalmente, onde residem. Quanto ao requerimento, apesar de ser
um gênero textual presente vida acadêmica do aluno, ele é um dos menos
explorados em sala de aula.
Esse dado aponta para a dificuldade, exposta tanto por alunos quanto por
servidores, de o aluno não saber redigir um requerimento no momento em precisa
solicitar algo pela primeira vez à PROGRAD, sentindo-se inseguro para realizar essa
atividade.
Dentre as dificuldades apontadas pelos escritores, destacamos a falta de
conhecimento dos procedimentos que envolvem os requerimentos. Isso revela que
esses alunos não possuem uma compreensão clara dos aspectos retóricos que
envolvem esse gênero, ou seja, eles não estão aptos a lidar com as necessidades
impostas pela situação retórica. Esse desconhecimento acaba levando-os a
reescreverem seus requerimentos, o que demanda tempo, despesa e trabalho para
todos.
Em relação aos leitores, são servidores que lêem como parte das atividade
que realizam no exercício de sua função na instituição. Eles possuem um grau de
qualificação acima do exigido pelo cargo que ocupam. Apesar de gostarem de ler,
relacionam a leitura de textos oficiais à necessidade/obrigação; e usam o
computador com muita frequência.
Na atividade de leitura dos requerimentos, a dificuldade mais grave e
recorrente nos dizeres dos servidores refere-se à não compreensão dos textos, ou
seja, do objeto da solicitação. Essa dificuldade impede completamente a realização
do propósito do gênero, pois sem compreender o que o aluno está solicitando tornase impossível atender ao pedido. Isso também ratifica o não domínio do gênero por
parte dos escritores.
Apesar de se declararem satisfeitos com esse sistema de atividade, tanto os
alunos quanto os servidores apresentam sugestões para torná-lo mais eficiente.
Essas sugestões estão diretamente relacionadas às dificuldades que giram em torno
194
da ampliação do conhecimento acerca do gênero, ou melhor, de sua situação
retórica, pois os alunos pedem não somente uma maior orientação quanto à
escritura do gênero como pedem para ampliar seus conhecimentos sobre os
procedimentos empregados na atividade, sobre a legislação referente à vida
acadêmica do aluno e também sobre a PROGRAD.
Além da questão do conhecimento, outras sugestões apontadas referem-se à
melhora das condições de acompanhamento dos processos, ao emprego de mais
agilidade na condução deles e à informatização do sistema. A informatização do
processo, e, consequentemente do gênero, apresenta-se para os usuários como
uma possibilidade de melhorar das condições de produção e de leitura desses
textos, desde que, junto ao uso da ferramenta virtual, outras sugestões referentes à
situação retórica fossem observadas.
Assim como os gêneros são flexíveis e possuem a capacidade de se
modificarem de acordo com as diferentes situações (de lugar e de tempo) e com as
necessidades de seus usuários, haja vista se constituírem como ações situadas e
tipificadas, esses requerimentos são passíveis de modificações, a partir da ação de
usuários mais conscientes e mais críticos.
Considerando que os requerimentos estão a serviço de pessoas que
possuem demandas reais, acreditamos que, a partir desta pesquisa, a atualização
do gênero, em análise, que passa pela identificação dessas demandas, seja
possível, pois pensamos que os dados discutidos são suficientes para redimensionar
essa prática de escrita.
Outra contribuição da pesquisa apresentada diz respeito ao fato de termos
buscado ir além das abordagens que os livros de redação oficial fazem aos gêneros
empregados no domínio administrativo, apresentando uma proposta de trabalho com
o gênero inserido nas atividades sociais que ele realiza.
Nesse sentido, esperamos que nossas análises e reflexões sejam capazes de
oferecer contribuições substantivas ao uso desses requerimentos, possibilitando aos
usuários uma maior apropriação do gênero e promovendo, quem sabe, um
redimensionamento em suas condições de uso, a fim de uma realização mais
consciente e eficiente.
Vimos, com a nossa pesquisa, como o trabalho com os gêneros do domínio
administrativo pode se revelar fecundo e promissor para investigações linguísticas.
Acreditamos que a análise dos requerimentos, a que nos propomos, pautada na
195
perspectiva sociorretórica foi de grande relevância para as questões levantadas e
permitiu-nos olhar para o gênero de uma maneira diferente e até inovadora.
Estamos ciente, no entanto, de que há muito a ser explorado e discutido não
somente quanto ao domínio abordado como também aos gêneros do domínio
administrativo, uma área tão pouco explorada. Especificamente, em relação ao
requerimento,
ainda
restam
muitos
outros
aspectos
a
serem
investigados/aprofundados, como, por exemplo, no que diz respeito à comunidade
discursiva; aos conjuntos de gêneros; ou, ainda, ao sistema de atividade.
A nosso ver, nosso trabalho não esgota o assunto, ao contrário, a partir de
discussões aqui apresentadas, ele oferece possibilidades de pesquisas sobre os
gêneros oficiais que procurem dar respostas à vida contemporânea, seja na esfera
pública, seja na esfera privada.
Por fim, acreditamos que essa pesquisa legitima a necessidade do estudo de
outros gêneros que fazem parte da convivência social e reafirmamos nosso
compromisso em relação à Linguística Aplicada, haja vista termos cumprido nosso
objetivo de discutir questões sociais que têm a linguagem, no caso, o gênero
requerimento, como papel central.
196
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204
ANEXOS
Em razão da extensão dos documentos anexos a esta dissertação, optamos
por arquivá-los em CD-ROM, depositado junto ao documento.
Anexo A - Requerimentos elaborados por alunos da graduação.
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R27
R28
R29
R30
R31
R32
R33
R34-A
R34-B
R35
R36
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R37
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R38
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R39
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R40
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R42
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R43
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R44
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R45
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R46
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R47
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R48
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R49
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R50
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Anexo B - Protocolo Verbal de Escrita, realizado com AG2.
Sobre o primeiro requerimento:
Quando eu escrevi o primeiro requerimento, eu estava muito ansioso porque
não sabia como era que ia ficar a situação, tava até com um pouco de
desesperança, porque achava que não ia dar certo, porque, realmente, foi
um erro meu, apesar de que eu acho que houve, como eu disse antes, uma
falha na comunicação/ a universidade não explicava muito bem como era
que eu tinha que fazer a matrícula pelo SIGAA/ mas não houve um erro
técnico, foi um erro meu. Então, eu tava um pouco sem esperança. No
momento que eu escrevi, realmente, o que eu pensava era que, assim, eu
tava ansioso e queria pagar aquelas duas matérias pra não ter que atrasar o
curso/ talvez nem fosse atrasar/ mas era a grande questão que eu tinha no
momento que eu escrevi o primeiro requerimento, era um sentimento de
ansiedade e tinha um certo desespero pra pagar logo essas matérias pra
não ficar atrasado e ficar nivelado com minha turma.
Sobre o segundo requerimento:
No segundo, depois que eu tomei informação da PROGRAD, eu já estava
bem mais confiante, já tinha quase certeza que iria dar certo, que realmente
a pessoa me falou que houve um erro administrativo, alguma coisa assim,
com relação ao primeiro dia da rematrícula. Então, eu estava bem mais
seguro, bem mais confiante, pensando que era apenas um procedimento
formal pra conseguir a minha matrícula e que eu iria conseguir como
consegui.
[Perguntado sobre as mudanças entre os dois requerimentos, AG2, falou:]
As situações são diferentes, porque a primeira foi no período da rematrícula
e a segunda já foi bem depois, acho que mais ou menos uma semana
depois. Então, nesse segundo aqui, como eu já tinha a informação de que
houve um erro/ que a pessoa da PROGRAD me confirmou que houve um
erro/ eu só argumentei em cima disso, porque isso bastava pra ter a minha
matrícula deferida. Então, foi justamente em cima disso, só esse ponto e
conclui. Tentei ser bem breve no segundo, só argumentei em relação a isso
e conclui.
Anexo C - Protocolo Verbal de Escrita, realizado com AG3.
Sobre o primeiro requerimento:
No momento em que eu estava preenchendo o requerimento, a minha
preocupação era como eu iria passar o meu problema por escrito... pro
papel. Eu até cheguei a conversar com minha amiga, que também ia
preencher o mesmo requerimento, pra gente ver mais ou menos como é
que.../ a gente também não sabia como é que.../ como a gente falaria... se
era pra ser de uma forma mais formal ou de uma forma mais coloquial.
Então, assim, como a gente tava com o tempo muito curto, tinha que ser
rápido, o que eu tava pensando eu tava escrevendo. Então, o que
aconteceu foi, tipo, eu acho até que alguns termos que eu utilizei que foram
muito coloquiais, mas porque você precisa de um tempo pra você fazer, pra
você elaborar o seu pensamento pra você escrever exatamente/ até pra
você saber se a pessoa vai entender o que você tá dizendo. Então, quando
eu tava escrevendo, eu pensei muito diretamente no que eu precisava,
então... eh... eu disse de forma bem sucinta o problema que eu tive e o que
eu queria que fosse resolvido. De forma bem espontânea mesmo. No
momento da escrita, eu não me preocupei com quem iria ler o requerimento,
exatamente por esta questão de eu estar muito apressada e que eu sabia
que tinha que escrever logo e que alguém já tava esperando pra receber.
Então, foi algo muito rápido, assim, eu não tive muito tempo pra pensar em
como eu iria fazer isso.
Sobre o segundo requerimento:
No segundo requerimento, como eu tava com mais tempo, eu pensei em
detalhar um pouquinho mais, porque eu tava voltando a escrever. Então, no
momento que eu tava pensando ou no momento que eu estava escrevendo,
o que me vinha à cabeça era exatamente... como eu deveria me dirigir a
essa pessoa, tendo em vista, assim, que eu tô preenchendo algo que tem a
minha assinatura, que vai pra uma terceira pessoa e que não é uma pessoa
próxima a mim. Então, eu sabia que eu deveria preencher com um pouco
mais de cuidado com os termos que eu tava utilizando, até pra me fazer
entender por essa terceira pessoa. Então, como eu tinha um pouco mais de
tempo, eu acho que, apesar de eu ainda ter sido um pouco... bastante.../
como eu posso dizer/ Apesar de eu ter usado termos bastante coloquiais,
até eu pude ver... eu pude pensar, assim, mais calmamente no que
escrever, em detalhar mais... ‘Ah, eu vou dizer isso, porque... pra ele saber
que isso já aconteceu e que eu tô tendo que voltar aqui novamente... que
meu problema não tá sendo resolvido... que eu tô sendo prejudicada...’.
Então, eu pensei muito no que eu tinha que escrever pra que ele
entendesse o meu problema. Até por que a pessoa orientou de que, como
eu tava fazendo uma segunda solicitação e que a minha primeira já havia
sido negada, que eu deveria tá relatando todos os problemas que já tinha
passado... dizer que eu já tinha solicitado, que eu estava com pressa, de
que isso tava sendo... /a minha solicitação já havia sido lida por uma
pessoa, só que não tinha sido aprovada. Então, tinha tido algum tipo de
problema./ Então, ela orientou de que todos esses detalhes deveriam estar
nesse requerimento pra que a pessoa que fosse ler /poderia não ser a
mesma pessoa que leu o primeiro/. Então, seria interessante que eu
colocasse tudo o que foi feito desde o primeiro requerimento. (...)Aí, nesse,
eu fui deferida na disciplina que eu tava solicitando, com um pouco de
demora, ainda, mas eu acho que me fiz entender quando eu fiz a segunda
solicitação, por demonstrar que já era uma segunda vez/ quer dizer isso
pesou no momento que a pessoa foi ler o requerimento, porque ele viu que
isso era uma coisa que já deveria ser resolvida, que eu estava no meu
direito, porque eu também disse que eu tinha que ser matriculada na
disciplina porque era um direito meu. Então, eu mostrei que era um direito,
eu mostrei que eu tava me prejudicando por causa disso, mostrei que eu já
tinha entrado em contato com a pessoa responsável e que o meu problema
não tinha sido resolvido. Então, eu acho que todos esses fatores que eu
enumerei foram considerados pra que pudesse ter sido aprovado e que a
pessoa que foi ler pudesse entender o problema.
(...) Eh, eu acho que o problema do primeiro foi exatamente esse de não ter
todas as informações que poderiam ter sido relatadas pra solicitação do
processo. Como no segundo já tava uma coisa mais detalhada e que eu
mostrava que eles realmente tinham que resolver o meu problema, eu acho
que eles olharam até com mais atenção, né, porque talvez outras pessoas
solicitem isso com bastante freqüência e que nem sempre tá no direito.
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Eliane Cristina Alves de Souza O GÊNERO