PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO k ACÓRDÃO Vistos, relatados e 1 ? ! ? ^ ° E J U S T ' Ç A D E S Ã 0 pAULO ACORDAO/DECISAO MONOCRÁTICA REGISTRADO(A) SOB N« discutidos estes autos de APELAÇÃO CÍVEL SEM REVISÃO n° 414.053-4/0-00, da Comarca de MOCOCA, em que são apelantes AGOSTINHO AMATO (E OUTRA) sendo apelado O JUÍZO: ACORDAM, em Quinta Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO, V. U. " , de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O julgamento teve a participação Desembargadores OLDEMAR AZEVEDO e OSCARLINO MOELLER. São Paulo, 26 de abril de 2006. FRANCISCO CASCONI Presidente e Relator dos PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO APELAÇÃO SEM REVISÃO N° 414.053.4/0 5 a Câmara de Direito Privado COMARCA : MOCOCA APELANTES : AGOSTINHO AMATO E SUELI Cl RI EL LI DE FAZIO VOTO No 12.179 CASAMENTO - TIO E SOBRINHA - AUTORIZAÇÃO JUDICIAL - EXTINÇÃO DO FEITO SOB FUNDAMENTO DE IMPOSSIBILIDADE ARTIGO 1.521, JURÍDICA DO PEDIDO IV DO DECRETO-LEI N° 3.200/41 C.C. - DICÇÃO DO COEXISTÊNCIA DO - PROSSEGUIMENTO PARA REALIZAÇÃO DE EXAME POR MÉDICOS DE CONFIANÇA DO JUÍZO - RECURSO PROVIDO EM PARTE. Trata-se de autorização para casamento requerida por tio e sobrinha, viúvos, que pretendem afastar impedimento estampado no artigo 1.521, IV, do Código Civil, sob argumento de que entre colaterais a possibilidade de matrimônio surgiu com o Decreto-lei n° 3.200/41, pretensão que a r. sentença de fls. 23 deixou de examinar por entender juridicamente impossível (artigo 267. VI do CPC). Recorrem os interessados insistindo na prevalência do disposto no Decreto-lei n° 3.200/41, não revogado pelo novo Código Civil. Acrescentam que, embora afastada possibilidade do surgimento de prole, superada a vedação legal frente aos padrões de conduta moral e cultural da sociedade, APELAÇÃO CÍVEL N° 414.053-4/0 - VOTO N° 12.179 ^-n^. 1 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Subiram os autos, manifestando-se a Douta Procuradoria Geral de Justiça pela conversão do julgamento em diligência para juntada de certidão de nascimento recente da requerente Sueli, com parcial provimento do apelo. É o Relatório. Procedimento de jurisdição voluntária onde, tio e sobrinha viúvos, contando respectivamente com 84 e 49 anos, pretendem contrair matrimônio mediante autorização judicial, pretensão não resolvida em primeiro grau de jurisdição em razão da extinção do feito sob entendimento de impossibilidade jurídica do pedido frente ao contido no inciso IV, artigo 1.521 do Código Civil, revogada exceção contida no Decreto-lei n° 3.200/41. O casamento entre colaterais, até terceiro grau inclusive, depara e deparava no Código Civil de 1.916 com impedimento de origem moral e biológica (eugênica), evitando transtornos não desejáveis no seio familiar, como psíquicos de toda ordem. É verdade que o Decreto-lei n° 3.200/41 veio permitir a união desde que realizado exame pré-nupcial sob responsabilidade de dois médicos nomeados pelo juiz. Repetiu, como sabido, o Código de 2.002 praticamente todos os impedimentos da legislação anterior (artigo 1.521, IV), resultando a possibilidade de enfrentamento da pretensão aqui deduzida da confirmação ou não da revogação da legislação especial, não referida no novo Coaex. APELAÇÃO CÍVEL N° 414.053-4/0 - VOTO N° 12.179 2 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO O casamento, desde o conceito da época clássica do direito romano, a partir de Modestíno, que muito refletiu tendências filosóficas ou religiosas, como lembra Carlos Roberto Gonçalves, in Direito Civil Brasileiro, ed Saraiva, vol. V I , p. 21/22, pode ser tido como "a conjugação do homem e da mulher, que se unem para toda a vida, a comunhão do direito divino e do direito humano". A definição "é do século I I I e reflete as idéias predominantes no período clássico: Nuptiae sunt conjunctio maris et feminae, consortium ominis vitae, diviní et humani júris communicatio". Desde o direito Romano, "apontam-se motivos de proibição para o matrimônio. O Direito Canônico, vendo no casamento um ato de envergadura capital para o indivíduo e para a sociedade, tomou-os, desenvolveu-os, e construiu com eles a teoria dos 'impedimentos matrimoniais'". (Caio Mário da Silva Pereira, Instituições de Direito Civil, vol. V, Forense, p.79). Todavia, alguns impedimentos, mais precisamente, o que obsta casamento entre tio e sobrinha, colaterais de terceiro grau, contam tradicionalmente com seguro e legal abrandamento. Nas "Instituições", obra de Caio Mario aqui lembrada, anota o Professor: "Tem variado, no tempo e no espaço, a proibição do casamento entre colaterais, ora abrangendo graus mais remotos, ora mais chegados, em uns países e em outros. O Direito Canônico proíbe no 3 o . grau canônico (correspondente ao quarto grau civil), embora se trate de um impedimento que os Bispos são autorizados a levantar ('dispensa')... No Brasil, o impedimento tem sofrido variações: APELAÇÃO CÍVEL N<> 414.053-4/0 - VOTO N° 12.179 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO no direito pré-codificado compreendia apenas o segundo grau, sendo freqüentes as uniões conjugais entre tio e sobrinha; o Código de 1.916 levou-o ao terceiro grau, com aplausos da doutrina, mas o Decreto-lei n. 3.200, de 19 de abril de 1.941, admitiu possa levantá-lo o juiz e autorizar o casamento, à vista e laudo proferido por dois médicos por ele designados, que examinem os nubentes e atestem a inexistência de motivos que o desaconselhem" (op. cit. P. 84). O casamento entre tio e sobrinha, em antropologia CASAMENTO AVUNCULAR, bastante comum entre os povos Tupi-Guarani e Caribe da América do Sul (www.socioambiental.org), parece depender, mesmo na atual sistemática legal, de prévia autorização judicial, não revogado teor do Decreto-lei n° 3.200/41, como bem demonstra judícioso parecer subscrito pelo Ilustre Procurador de Justiça, Dr. Washington Epaminondas M. Barra, aqui adotado. Buscando as regras de direito a integração do homem, a ausência de referência expressa à situação regulamentada pelo Decreto-lei n° 3.200/41 no Código Civil não aponta para o que alguns denominam de aparente antinomia, suficiente o princípio da especialidade para se afirmar que o sistema atual também comporta exceções a tornar desnecessário até mesmo Projeto de Lei n. 6.960/02 que pretende acrescentar parágrafo ao artigo 1.521 do Código Civil para permitir autorização mediante laudo judicial. ^a^ APELAÇÃO CÍVEL N° 414.053-4/0 - VOTO N° 12.179 4 PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO Do Manual de Direito das Famílias consta expressamente: "Mesmo que seja proibido o casamento de parentes até o terceiro grau (1.521 IV), entre tio e sobrinha, por exemplo, o Decreto-lei 3.200/41 suaviza a vedação, tornando possível a sua realização mediante autorização judicial. Como dita lei não foi revogada, modo expresso, não havendo incompatibilidade entre as duas normas, persiste a possibilidade do casamento com a chancela judicial" (Desembargadora Maria Berenice Dias, ed. Livraria do Advogado, 2 a . Ed, p.154). Confira-se, ainda, Direito de Família e o Novo Código Civil, ed. Del Rey, p. 24, "Do Casamento", Euclides de Oliveira e Giselda Maria Fernandes Novaes Hironaka, com expressa menção ao Projeto de Lei n. 6.960, de 2.002. Diante do que consta dos autos, oportuno que em primeiro grau de jurisdição venha atualizada certidão de nascimento da apelante Sueli, como anotado pela Douta Procuradoria de Justiça, com realização do necessário exame após nomeação de dois médicos da confiança do juízo, mesmo diante da informação de que o varão submeteu-se a vasectomia. Meu voto, pelo exposto, dá parcial provimento ao recurso, afastada a extinção, com retorno dos autos à origem. APELAÇÃO CÍVEL N° 414.053-4/0 - VOTO N° 12.179 5