Fonoaudiologia educacional e autismo: sem comunicação não há
inclusão!
Autores: PATRÍCIA BLASQUEZ OLMEDO, CÁTIA
CRIVELENTI DE FIGUEIREDO WALTER,
Palavras-chave: Autismo, Inclusão Educacional, Barreiras de Comunicação.
INTRODUÇÃO
Os Transtornos do Espectro Autístico estão incluídos entre os transtornos mentais
de início na infância e representam uma categoria que se enquadra nos Transtornos
Globais do Desenvolvimento, uma vez que apresentam tanto um início muito precoce
quanto uma tendência evolutiva crônica (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2013).
Os TEA agrupa um grupo de quadros caraterizados por apresentarem padrões
restritos e repetitivos de comportamento, interesses e atividades e déficits clinicamente
significativos e persistentes na comunicação social e nas interações sociais, manifestadas
por déficits expressivos na comunicação não oral e oral (APA, 2013 apud ASSUMPÇÃO,
2013).
Tais dificuldades podem trazer danos expressivos ao desenvolvimento da criança,
principalmente no que se refere às relações sociais, tornando-se uma verdadeira barreira
para o seu aprendizado, participação e inclusão escolar.
Segundo Glat e Blanco (2007), para um espaço escolar ser considerado inclusivo
precisa ser mais do que um espaço para convivência, precisa, sobretudo, ser um ambiente
onde o aluno com necessidades educacionais especiais aprenda os conteúdos socialmente
valorizados para todos os alunos da mesma faixa etária.
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Diante disto, como é possível refletir sobre o processo de ensino e aprendizagem
sem pensar em comunicação? E ainda, como estabelecer uma interação dialógica com um
sujeito não oral ou sem fala funcional?
Neste sentido, a Comunicação Alternativa (CA) configura-se como uma
possibilidade de via de comunicação para crianças com autismo e, aplicada precocemente,
deverá ser o melhor caminho para promover o desenvolvimento das competências
linguísticas, interacionais e acadêmicas destes sujeitos. No entanto, que conhecimentos
específicos são necessários aos educadores para desenvolver este trabalho? E ainda, que
profissional deve realizar a formação desses sujeitos e como deverá ser conduzida essa
formação dentro da realidade vivida no ambiente da escolar?
Estudos realizados por Netto (2012), Silva (2010), Souza e Maia (2012), dentre
outros, apontam a Consultoria Colaborativa Escolar (CCE) como um modelo promissor
para desenvolver estratégias didáticas inclusivas que podem ser usadas para melhorar a
participação e a aprendizagem da criança, e como consequência, a “efetivação de uma
inclusão responsável”.
Sendo assim, considerando os resultados promissores apontados pela literatura
referente às intervenções envolvendo a CCE , este estudo teve como objetivo elaborar,
implementar e avaliar um programa de formação de professores e mediadores da educação
infantil no uso da comunicação alternativa, especificamente o PECSAdaptado 1 , para
crianças com TEA, não orais ou sem fala funcional incluídos em uma creche.
MÉTODO
1
Sistema de comunicação apoiada, de baixa tecnologia, que foi desenvolvido para crianças com autismo
com déficit severo de comunicação oral e que consiste no intercambio de figuras como uma forma
interativa de transmitir uma mensagem a alguém. O PECS-Adaptado é uma versão do PECS – Picture
Exchange Communication System (BONDY E FROST, 1994) proposta no Brasil, por Walter (2000), com
modificações em sua forma de aplicação quanto às fases do programa e também em relação às formas de
registro.
2
Para atender os objetivos proposto a pesquisa envolveu um delineamento quase
experimental do tipo ABC (Linha de Base, Intervenção e Folow-up).
A pesquisa teve o parecer favorável pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UERJ –
Coep, sob o parecer de número 760.115/2014 e foi realizado em uma creche municipal de
uma cidade de médio porte do sul do estado do Rio de Janeiro.
Com a finalidade de melhor delimitar os estudo e tendo em vista o caráter pedagógico
que se pretendeu alcançar na intervenção, definiu-se que o estudo seria dirigido para os
professores e os mediadores que trabalhavam com crianças com idade entre dois e cinco
anos e onze meses, não orais ou sem fala funcional e que possuíam diagnóstico realizado
por médico especialista de Transtornos do Espectro Autístico (TEA) ou sugestivo para
autismo. Sendo assim, participaram inicialmente da pesquisa nove participantes, sendo
quatro crianças três professoras e duas mediadoras.
A pesquisa foi realizada em três etapas nas quais foram utilizados instrumentos
padronizados e não padronizados elaborados pela pesquisadora. O quadro a seguir
apresenta um resumo dos procedimentos realizados nas três etapas da pesquisa.
ETAPAS
Etapa 1
Avaliação e
Linha de Base
DURAÇÃO
AÇÕES DESENVOLVIDAS
2 meses
Aplicação do Questionário de caracterização das turmas
Aplicação do Formulário de caracterização do profissional da
Educação
Aplicação do questionário pré- intervenção da formação em
comunicação alternativa para autismo. - Aplicação do PROC2 junto
aos alunos
Aplicação do CARS3 junto aos alunos
Observação e análise, através de filmagem, dos profissionais
atuando com os alunos.
2
PROC – Protocolo de Observação Comportamental (ZORZI, HAGE, 2004)
3
CARS (Childhood Autism Rating Sacale) (PEREIRA, 2007)
3
Etapa 2
Intervenção
Etapa 3
Avaliação e
Follow-up
4 meses
1 mês
Reuniões semanais com os profissionais para formação
teórica e prática sobre temas relacionados à consultoria colaborativa,
autismo e comunicação alternativa.
Aplicação de Protocolos de Avaliação pelos educadores
Planejamento e aplicação das estratégias específicas
discutidas nas reuniões, baseadas no programa de formação e nas
avaliações realizadas.
Intervenção prática com os profissionais e os alunos
Observação e análise, através de filmagens , das intervenções
realizadas.
Aplicação do questionário pós-intervenção da formação em
comunicação alternativa para autismo
Reaplicação do Protocolo de Avaliação Observacional pelos
educadores
Aplicação da Ficha de Avaliação do Programa de Formação Observação e análise, através de filmagens, dos profissionais atuando
com os alunos
Os dados foram coletados ao longo de 7 meses, tendo início em abril e
encerramento em novembro de 2014. Sendo assim, ao longo da pesquisa foi possível não
só registrar e verificar a elaboração e a implementação do programa de formação, como
também, avaliar os efeitos do mesmo. Para tanto, os dados coletados foram analisados
quantitativamente e qualitativamente.
RESULTADOS
A formação foi desenvolvida em ação colaborativa junto com professores e
mediadores que atuavam com crianças com autismos incluídos na creche, sendo assim,
procurou atender as demandas dos educadores e as dificuldades comunicativas dos
educadores com as crianças verificadas pela pesquisadora. Para tanto, foram realizados
17 encontros que constituíram um Programa de Formação de 50 horas de duração,
divididas em sete módulos, sendo um de avaliação e seis de formação teórica e prática
que abordaram os seguintes temas.
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Os resultados obtidos na primeira etapa da pesquisa revelaram que os educadores
apresentam dificuldade em compreender os desejos e sentimentos das crianças, que se
expressam apenas por meio de fala não funcional, sons sem significado, gritos, choros e
birra. Contudo, apesar das dificuldades apresentadas, os educadores relatam não ter
nenhuma ou pouca formação na área de autismo e / ou comunicação alternativa e apontam
como necessária uma formação na área.
Na fase de intervenção foi possível verificar um aumento das interações
comunicativas efetivadas, tanto as iniciadas pelos educadores, como as iniciadas pela
criança e o uso de outras formas de comunicação.
Os resultados obtidos no follow-up revelaram que após a saída da pesquisadora
diminuíram as interações comunicativas, assim como as iniciativas da professora com a
criança. Contudo, através dos questionários os educadores relataram uma melhora do
comportamento e da forma de se expressar da criança, assim como da compreensão destes
em relação aos desejos e sentimentos da criança.
Em relação ao programa de formação, os educadores avaliaram a estrutura do
programa, dos encontros e o material como sendo satisfatório, assim como o formador
fonoaudiólogo e a participação deles no programa, contudo, apontaram como
insatisfatório o local e o tempo destinado à formação prática. Ainda assim, revelaram que
a formação conseguiu modificar a sua prática e contribui positivamente no trabalho,
conseguindo melhorar a interação deles com as crianças. Relataram ainda que o programa
atendeu as suas expectativas, pois aprenderam sobre diversos assuntos relacionados ao
autismo e consideram a presença do fonoaudiólogo na creche como muito importante para
orientação e intervenção prática.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A através da pesquisa foi possível verificar que apesar dos esforços dos educadores
em interagir e incluir a criança no ambiente da creche, a falta de conhecimento e
5
informação sobre autismo e comunicação alternativa acaba por transformar essa tarefa em
um enorme desafio.
O programa de formação através da consultoria colaborativa se mostrou como uma
estratégia eficaz e satisfatória para o processo de inclusão desses alunos na creche, pois
demonstrou ter melhorado não só a interação comunicativa entre os educadores e a
criança, como também a inclusão dessas crianças no ambiente da creche.
Os problemas em relação ao tempo de intervenção prática, ao local, e a diminuição
das interações comunicativas e da interação da professora com a criança nas sessões de
follow-up, se por um lado revelam resultados negativos do programa de intervenção, por
outro, nos apontam a necessidade de novas pesquisas de intervenção que melhorem os
pontos negativos do programa e a necessidade do apoio de um profissional especializado
na creche para orientar educadores que atuam com crianças com dificuldades severas de
comunicação.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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In: Nunes, L.R.O.P; Pelosi, M. Suplino, M. & Walter, C.C.F. (Orgs.). Ensaios sobre o
autismo e deficiência múltipla. Marília: ABPEE: Marquezine & Manzini 2013, p.11-18.
GLAT, R. & BLANCO, L.M.V. Educação Especial no Contexto da Educação Inclusiva.
In: GLAT, R.; (Org.) Educação Inclusiva: cultura e cotidiano escolar. Rio de Janeiro.
Sette Letras, 2007. p. 15-35.
MINISTÉRIO DA SAÚDE. Linha de cuidados para atenção integral às pessoas com
Transtorno do Espectro do Autismo e suas famílias no Sistema único de Saúde – Série A.
Normas e manuais técnicos. Brasília: SUS, 2013. Disponível em
http://www.saudedireta.com.br
NETTO, M.M.F.C. A Comunicação Alternativa favorecendo a aprendizagem de crianças
com autismo, Asperger e Angelman: formação continuada de profissionais de Educação
e Saúde. Dissertação de mestrado. Programa de Pós-graduação em Educação.
Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2012. Disponível em
http://www.lateca-uerj.net/. Acesso em 10 de julho de 2013.
NETTO, M.F.F.C. Os Desafios da Inclusão. In: NUNES, L.R.O.P.; SUPLINO, M.;
WALTER, C.C.F.; organizadores. Ensaios Sobre Autismo e Deficiência Múltipla.
Marília. ABPEE: Marquezine & Manzini, 2013. p.59-69.
SILVA, A.M. Psicologia e inclusão escolar: novas possibilidades de intervir
preventivamente sobre problemas comportamentais. Tese de Doutorado. Programa de Pós
Graduação em Educação Especial. Universidade Federal de São Carlos. São Carlos, 2010.
SOUZA, M.M.; MAIA, S.R. Formação de EquiEs Colaborativas: Um caminho para
inclusão escolar responsável. In: MENDES, E.G.; ALMEIDA, M.A. (Org). A Pesquisa
Sobre Inclusão em suas Múltiplas Dimensões. Marília. ABPEE, 2012.
7
WALTER, C.C.F. Os efeitos da adaptação do PECS ao Curriculum Funcional Natural em
Pessoas com autismo infantil. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós Graduação em
Educação Especial. Universidade Federal de São Carlos. São Carlos, 2000.
ZORZI, L. E HAGE, S. PROC – Protocolo de Observação Comportamental. São José dos
Campos: Pulso, 2004.
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