Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica da PUC-Campinas – 25 de setembro de 2012 ISSN 1982-0178 AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE REGENERADORA DE IMPLANTES INTRAOSSEO DE GUTA - PERCHA REVESTIDOS DE TINTURA DE ARNICA MONTANA Leonardo de Aguiar Oliveira Pedro Paulo Barros Faculdade de Ciências Farmacêuticas Centro de Ciências da Vida [email protected] Grupo de Pesquisa ou Programa do Orientador Centro de Ciências da Vida [email protected] Resumo: avaliou in vivo, a resposta tecidual óssea após realização de implante, em falha óssea tibial, de um tipo de material biocompatível, o guta-percha, revestido com tintura de Arnica Montana. Foram utilizados 16 ratos albinos da linhagem Wistar divididos em 4 grupos. Os corpos de prova do material, cones de guta-percha revestidos com tintura de Arnica Montana, permaneceram implantados por 24 horas, 1 semana, 2 semanas e 4 semanas em falha óssea na tíbia da pata esquerda traseira. Lâminas histológicas dos espécimes do tecido ósseo, contendo os corpos de prova do material, foram coradas em Hematoxilina-Eosina, fotografados e analisadas semiquantitativamente. A resposta tecidual foi analisada levandose em consideração a presença e intensidade de inflamação e de componentes do infiltrado celular e de células responsável pela produção de matriz extracelular conjuntiva, associadas ao processo cicatricial e de regeneração óssea. O material implantado não interferiu significativamente no processo de ossificação da falha óssea. Palavras-chave: Fitoterápicos, Arnica montana, Implantes, Ratos. Área do Conhecimento: Saúde (400.00.00-1) - Materiais Odontológicos (4.02.09.00-8). 1. INTRODUÇÃO Em fraturas de ossos compactos onde ocorre perda substancial de tecido ósseo, a reconstituição da peça óssea pode ser realizada com a utilização de materiais sintéticos biocompatíveis. Em meados do século XIX, segundo SOLER & SHOCRON (1957)[1], Bowmann, em 1867, introduziu na Endodontia a guta-percha, uma substância vegetal extraída sob a forma de látex de árvores da família das sapotáceas (Mimusops balata e Mimusops hiberi), a qual tem sido aceita como o melhor material para a obturação do sistema de canais radiculares. Este material encontra-se disponível para o uso odontológico em associação a outros componentes numa proporção aproximada de 20% de guta-percha, 60 a 75% de óxido de zinco e os demais elementos em proporções menores (1,5 a 15% aproximadamente). A guta-percha apresenta-se sob duas formas cristalinas distintas: (alfa-cristalina) e (betacristalina)[2]. A guta-percha na forma alfa-cristalina é quebradiça à temperatura ambiente, tornando-se, quando aquecida, pegajosa, aderente e com maior escoamento. Sua temperatura de fusão é de 65°C. Já a forma beta-cristalina, disponível comercialmente, na maioria dos casos, é estável e flexível à temperatura ambiente. Quando aquecida, não passa a apresentar adesividade e tem menor escoamento do que a forma alfa. Sua temperatura de fusão é de 56°C [3],[4]. As plantas medicinais correspondem, incontestavelmente, às mais antigas armas empregadas no tratamento de enfermidades humanas e de animais[5]. Atualmente, observa-se um crescimento na utilização de fitoterápicos pela população brasileira. Alguns fatores poderiam explicar o aumento deste uso como os avanços ocorridos na área científica que permitiram o desenvolvimento de fitoterápicos seguros e eficazes, como também uma forte tendência de busca, pela população, por terapias menos agressivas destinadas ao atendimento primário à saúde[6]. Dentro desse contexto, encontramos a Arnica Montana, planta conhecida principalmente por tratar contusões, inflamações, dores musculares, reumáticas e cicatrização de feridas. A Arnica Montana L. é uma espécie pertencente à família das Asteráceas, sendo originalmente nativa da Europa[7]. Entre seus principais componentes, o que mais se destaca por sua ação antiinflamatória são as lactonas sesquiterpênicas do tipo helenalina[8], cuja ação é proveniente da inibição do fator de transcrição NF kappa β[9]. Em estudos, tais lactonas demonstraram ação citotóxica contra hepatócitos humanos[10], portanto em vários países a utilização da Arnica em formulações orais é proibida[11]. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica da PUC-Campinas – 25 de setembro de 2012 ISSN 1982-0178 O maior uso da espécie está em formulações tópicas para o tratamento de doenças inflamatórias[12] e sua eficácia já foi demontrada em diversos estudos[13],[14]. Em relação à sua morfologia, apresenta inflorescências terminais grandes, eretas, ramificadas com numerosos capítulos pequenos de cor amarelada ou alaranjada. Diante destes relatos da literatura, principalmente no que tange a atividade regeneradora da Arnica e na falta de estudos do mesmo em implantes intraósseos, o objetivo deste projeto é avaliar in vivo a interferência sob forma de implantes de um tipo de material biocompativel, o guta-percha, impregnado por tintura de fitoterápico, na osteogênese das fraturas ósseas. 2. OBJETIVO Avaliar in vivo a atividade regeneradora do tecido ósseo após realização de implante, em falha óssea tibial, de um tipo de material biocompatível, o gutapercha, revestido com tintura de Arnica Montana. 3. METODOLOGIA 3.1 Processo de revestimento da tintura nos cones de guta-percha Em um vidro de relógio com 12cm de diâmetro, adicionou-se 10 mL da tintura de Arnica Montana juntamente com 10 cones de guta-percha, deixando em repouso por uma hora, em temperatura ambiente. Todos os cones receberam a mesma quantidade de tintura. Os cones foram armazenados em placas de Petri e guardados em geladeira (5 ºC) até o momento do implante. 3.2 Implantes Foram utilizados 16 ratos albinos da linhagem Wistar divididos em 4 grupos de acordo com o tempo de permanência do material implantado: 24 horas, 1, 2 e 4 semanas. Após pesagem dos animais, submeteram-nos à anestesia geral por solução de Cloridrato de Xylasina (Virbaxyl® 2%) + Ketamina (Francotar®), administrado por via intramuscular na dose de 1,5 mL/Kg de peso corporal. Posteriormente, os animais foram colocados em placa de contenção e tiveram as patas traseiras e a região dorsal tricotomizadas. Após assepsia, fez-se uma incisão na pele de aproximadamente 1,0 cm com uma tesoura de ponta fina, paralelamente ao longo do eixo da tíbia. Com o auxílio de um bisturi, seccionou-se o tecido muscular até a exposição do periósteo que em seguida foi rebatido cuidadosamente até a exposição do tecido ósseo. Com o uso de um mini motor de baixa rotação e uma broca com 2,0 mm de diâmetro, foi feito um orifício (falha óssea) no terço superior da tíbia de modo a permitir a introdução do corpo de prova. Realizou-se este procedimento nas duas tíbias das patas traseiras de cada animal. Na tíbia esquerda, implantou-se o corpo de prova, cone de Guta-percha revestido de tintura de Arnica (tratado) e a tíbia da pata traseira direita recebeu somente o implante do cone de Gutapercha que foi utilizado como controle do processo de consolidação da falha óssea. Posteriormente, o tecido muscular e a pele foram suturados e sobre os cortes aplicou-se solução aquosa PVPI (poli vinil pirrolidona iodada) anti-séptica. Durante as primeiras 48 horas pós-cirurgia, administrou-se a dose de 750 mg/Kg de peso corporal de Dipirona sódica em solução 500 mg/mL do laboratório Aventis por via intramuscular. 3.3 Obtenção de espécimes do tecido ósseo Os animais foram eutanasiados, de acordo com os tempos de permanência, por aprofundamento da anestesia de solução de Cloridrato de Xylasina (Virbaxyl® 2%) + Ketamina (Francotar®), Foram removidos espécimes do tecido ósseo das duas tíbias. Em seguida, foram fixados por imersão em solução de formol tamponado a 10% por 48 horas e após esse período promoveu-se a redução do tamanho dos espécimes para processamento histológico. 3.4 Preparação e triagem de lâminas histológicas Os espécimes do tecido ósseo foram descalcificados em solução saturada de EDTA com agitação contínua durante 30 dias. Cortes de sete micrometros de espessura foram corados com hematoxilina-eosina para a obtenção de lâminas histológicas, posteriormente fotografadas para análise morfométrica e semiquantitativa. 3.5 Análise semiquantitativa do tecido ósseo As lâminas histológicas de ambos os grupos, tratado e controle, foram submetidas a analise microscópica, sendo verificada a presença de infiltrado inflamatório, fibrócitos e fibroblastos no tecido subcutâneo e infiltrado inflamatório e osteogênese no tecido ósseo. 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO Atualmente existem quatro métodos clássicos para a avaliação de biocompatibilidade dos materiais: (a) avaliação de citotoxicidade, (b) implantes subcutâneos, (c) implantes intra-ósseos, e (d) avaliação in vivo da reação tecidual perirradicular em animais. Em cada tempo de permanência dos materiais implantados foram feitas avaliações histológicas. A resposta tecidual foi analisada levando-se em conside Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica da PUC-Campinas – 25 de setembro de 2012 ISSN 1982-0178 ração a presença e intensidade de inflamação e de componentes do infiltrado celular e de células responsável pela produção de matriz extracelular conjuntiva, associadas ao processo cicatricial e de regeneração óssea. 4.1 Implantes da tintura de Arnica Montana em falha óssea Nos animais que receberam o implante do cone de guta-percha revestido de extrato vegetal foi observado delgado envoltório conjuntivo com baixa celularidade, com exceção do grupo 24h. Observou-se na região da falha óssea proliferação osteoblástica e formação de osso primário nos mesmos padrões e proporções daqueles observados nas fraturas ósseas controle, seja em 24 horas, uma, duas ou quatro semanas pós-implante. Na região do periósteo, não se evidenciou nenhum tipo de infiltrado celular que pudesse indicar processo inflamatório em resposta ao implante. Do mesmo modo, não se observou deposição anormal de fibras colágenas ou vasos neoformados em quantidades significativas. Tanto nos grupos “tratados” como nos “controles” foi observado grande proliferação conjuntiva no tempo 24h, com decréscimo dessa quantidade nos tempos subseqüentes, até verificação de fina capsula fibrosa no grupo 4 semanas. O surgimento de tecido ósseo primário foi verificado no grupo 1 semana, sendo que no grupo 2 semanas havia sido praticamente substituído por tecido ósseo secundário,conforme pode ser observado na figura 01. A formação de tecido ósseo primário e sua eficiente conversão em tecido osso secundário indica osteogênese normal na consolidação da fratura e sua posterior reabsorção (remodelagem óssea). Figura 01: Micrografias da estrutura óssea das tíbias após implante dos cones de guta-percha revestidos com tintura de Arnica Montana. A: Cone com revestimento 24 h pós-implante. B: Controle 24 h pósimplante. C: Cone com revestimento 01 semana pósimplante. D: Controle 01 semana pós-implante. E:Cone com revestimento 02 semanas pós-implante. F: Controle 02 semanas pós-implante. G: Cone com revestimento 04 semanas pós-implante. H: Controle 04 semanas pós-implante. Hematoxilia-eosina, 300x Infiltrado Inflamatório Tratado Osteogênese Controle Tratado Controle 24h +++ +++ ++ + 1 semana ++ ++ ++ ++ 2 semanas ++ + ++ ++ 4 semanas ++ ++ ++ ++ Tabela 1: Resultados da análise semiquantitativa comparativa da celularidade óssea após implante de cones de guta-percha com e sem revestimento de tintura de Arnica Montana. Não há diferença significativa entre os grupos. Anais do XVII Encontro de Iniciação Científica da PUC-Campinas – 25 de setembro de 2012 ISSN 1982-0178 Diante destas observações é possível aferir que a tintura de Arnica Montana não interferiu no processo de consolidação da fratura óssea em tíbias de rato. 5. CONCLUSÃO O material implantado não interferiu significativamente no processo de ossificação da falha óssea. 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