1 Avaliação do Processo de Reforma Agrária na Zona da Mata de Pernambuco: sucessos e insucessos das experiências dos assentamentos Rosa Kato Cláudia Satie Hamasaki RESUMO Este trabalho teve como objetivo analisar os determinantes e implicações econômicas dos sucessos e insucessos das experiências dos assentamentos, relacionadas ou não a cooperativas e associações, estudando a criação de oportunidades e implementação de atividades econômicas nos assentamentos. A área pesquisada foi a Zona da Mata de Pernambuco (ZMPE), dividida em três micro-regiões: Mata Norte, Mata Sul e região de Vitória DE Santo Antão. Considerando-se os dados de cada município dentro das micro-regiões, avaliando-se por área, quantidade de acampamentos e assentamentos em cada região, foram selecionados os municípios: Vicência, Água Preta e Vitória. Nos municípios pesquisados, nenhum dos assentamentos apresentou sucesso nas atividades relacionadas a cooperativa e/ou associação, embora apontassem para a necessidade de organização e viabilização da cooperativa como forma de organizar a produção econômica. Com relação aos agentes econômicos, a maioria dos assentados é de ex-trabalhadores da economia sucroalcooleira. Apesar do processo de reforma agrária, ainda prevalece a cultura da cana-de-açúcar, caracterizando o cenário daquela região, mesmo nas parcelas de terra, cujo tamanho médio é de apenas 8 hectares. Embora a análise econômica desses assentamentos deva ser ainda aprofundada, os resultados apontam para necessidade de maior planejamento das atividades, o que requer maiores investimentos (apoio e ações) em infraestrutura, organização e apoio à produção econômica, viabilizando a formação de cooperativas, legitimando a reforma agrária como política pública de redução das desigualdades. Palavras-Chave: Reforma Agrária, Viabilidade Econômica, Mata Pernambucana INTRODUÇÃO Na Zona da Mata Pernambucana, a principal atividade econômica é a agricultura voltada, quase que exclusivamente, para a produção de cana-de-açúcar, com áreas reduzidas de exploração hortifrutigranjeira. A atividade tem passado por uma série de transformações, determinando outras na região sob sua influência, da produção, das relações sociais, e que alteraram as relações de trabalho ao longo da sua trajetória. O resultado dessa estrutura econômica e social é a presença de uma população pauperizada e marginalizada, comprometendo a sustentabilidade de qualquer tentativa de crescimento econômico. A base sócio-econômica sobre a qual ainda hoje se reproduz a Zona da Mata de Pernambuco restringe o acesso e o direito da sua população aos bens, serviços, atividade e recursos ofertados. É um processo excludente na medida em que lhes são negadas (no mínimo dificultadas) oportunidades de trabalho e exercício da cidadania. São pessoas que estão em situação desvantajosa, dado o baixo nível de renda, a baixa qualificação da sua mão-de-obra, e sua fragilização nas barganhas contra o capital. 2 A Zona da Mata é uma das cinco mesorregiões em que se divide Pernambuco. Está localizada na parte oriental do Estado onde viviam em 1996 cerca de 2.200 mil pessoas, representando 28,1% da população de Pernambuco, em uma área de aproximadamente 10.519km2 (10,6% da área total do Estado)1. A densidade demográfica da região da Zona da Mata de Pernambuco (ZMPE) é de 197,6 hab/km2, com um grau de urbanização de 66,3%. A área estudada apresenta crescente processo de desruralização da sua população, em que cerca de 73% estavam nas cidades e apenas 27% na área rural (CONDEPE, 1997). A área da ZMPE está dividida em três microrregiões: Mata Sul, Mata Norte e a região de Vitória de Santo Antão. Na última década, uma série de acontecimentos precipitou a região na maior crise de sua história. Entre as principais causas da atual crise, pode-se apontar a extinção do IAA – Instituto do Açúcar e do Álcool, a abertura adotada pelo modelo econômico que expôs a produção local à concorrência com outras regiões do país, a queda do preço do açúcar, a mudança na sistemática do recolhimento do INSS, a presença de secas na região. Apesar da grande heterogeneidade das situações em que estão as unidades produtivas, em que se misturam empresas produtivas e paralisadas, o setor vem amargando uma crise de perda de mercado2 e de redução de desempenho, perdendo seu dinamismo. Embora ainda hoje apareça como o segmento de maior representatividade na composição das exportações do estado3, o setor não tem conseguido mais alavancar o crescimento da região, e sua resistência e manutenção dificultam o desenvolvimento de outras atividades econômicas produtivas. Como conseqüência desta configuração de fatores, grande número de usinas e de engenhos encerrou suas atividades, o desemprego se acentuou e a miséria endêmica se ampliou ainda mais. A parcela mais afetada está sendo a daqueles que dependem do emprego no setor sucroalcoolerio. Nas estratégias de sobrevivência, cresce a importância da representação de classe e outras formas de associação, em busca de soluções para minimizar os efeitos da crise. Os efeitos da crise vieram se somar àqueles decorrentes da crescente modernização da atividade, que, ao mesmo tempo, é necessária para aumentar a produtividade e competitividade da produção do setor e ameaça postos de trabalho. A agudização do problema social contribuiu para o surgimento de uma reação, materializada sob a forma de organização de movimentos sociais que lutam pela reforma agrária. Atualmente, diversas organizações ocupam propriedades improdutivas para colocá-las dentro do programa de reforma agrária do governo federal. Desta forma, os ocupantes de terra passam a se beneficiar do uso deste meio de produção para cultivar produtos de subsistência e desenvolver outras atividades econômicas, recebendo assistência governamental e dos próprios movimentos sociais. A presença dos acampamentos e assentamentos cria uma nova realidade nos municípios onde se situam. A ZMPE é a região de maior número de conflitos pela terra em Pernambuco. De acordo com dados fornecidos pelo Movimento dos Sem-Terra, dos 141 acampamentos existentes em Pernambuco, em dezembro de 1999, 56% estavam localizados na área, reunindo um total de 1 Fonte: IBGE/SIDRA (1997). 2 Segundo Araújo (1996), existem fatores de ordem externa, relacionadas ao mercado nacional e internacional. Dois elementos têm determinado flutuações de preços: a entrada de países da Comunidade Econômica Européia (CEE) a partir dos anos 70 tem provocado mudanças na estrutura de oferta mundial de açúcar ("entre 1975 e 1985 os países desenvolvidos, com boa participação da CEE, aumentam seu peso relativo na oferta mundial de açúcar de 20% para 43% enquanto os países menos desenvolvidos vêem sua importância relativa cair de 76% para 52%"), e mudanças nos padrões de consumo de produtos adoçantes (com preferência dos artificiais e menos calóricos), enfatizando a característica de uma demanda de baixa elasticidade preço e renda. 3 Ver Hamasaki, 1997: Gráfico 1, ANEXO. 3 mais de 7.000 famílias. No que diz respeito aos assentamentos coordenados pelo movimento, dos 90, 47 se situavam na Zona da Mata, reunindo mais de 3.000 famílias4. Muito tem se discutido sobre o desenvolvimento sustentável, cuja base está na compatibilidade entre o crescimento econômico, a equidade social e o equilíbrio ambiental. Em Pernambuco, porém, há ainda um elevado contingente de pessoas que não conseguem emprego nem renda, vivendo de forma precária. Dados do IPEA, de 1990, indicavam que 32% da população do estado eram considerados indigentes, dois quais 27% estavam na região metropolitana de Recife, 29% nas demais áreas urbanas, e 44% residiam no meio rural5. Numa economia em que as preocupações com o crescimento econômico e com a sustentação do modelo de desenvolvimento (baseado na industrialização e na crescente participação brasileira na economia mundial, sem falar na “globalização”) tomam volume, que lugar se dá para a agricultura e para os seus trabalhadores? Na ausência de medidas de política econômica em busca de saídas para as questões ligadas à terra, qual a perspectiva que se dá para a população que nasceu, viveu e sobrevive da lida com os frutos que a terra dá ? A pesquisa se propõe a esclarecer as características da reforma agrária que está sendo feita na Zona da Mata de Pernambuco uma das regiões mais pobres do país, e que se encontra enfrentando possivelmente a maior crise da sua história. O estudo está dividido em dois momentos que se completam: o primeiro, o do conhecimento da origem, estrutura e estratégia dos movimentos sociais que protagonizam o processo e cujas ações se materializam na existência de dezenas de acampamentos e assentamentos. O segundo momento consiste na análise dos impactos que estas novas formas de organização do espaço provocam no (e recebem do) entorno onde se situam. REFORMA AGRÁRIA COMO POLÍTICA REDISTRIBUTIVA E FORMAS DE COOPERAÇÃO O aprofundamento das desigualdades e da exclusão sociais no meio rural brasileiro é resultante do processo de desenvolvimento excludente e desigual, que se agrava nas áreas menos desenvolvidas do país. A realização de uma ampla Reforma Agrária e a adoção de políticas agrícolas e sociais voltadas para o fortalecimento e a expansão da agricultura familiar são fatores-chave nesse processo de políticas ligadas ao desenvolvimento. Essas políticas não representariam apenas formas ou programas de combate à pobreza e à exclusão social, mas a distribuição de terras improdutivas e políticas de incentivo à produção familiar tem como contrapartida programas de redistribuição de renda. Dada esta demanda, a Reforma Agrária tem não apenas a função amplamente difundida de promover a distribuição de terras, mas também de representar um movimento de pequenos agricultores que procuram melhores condições de vida no campo, com políticas sociais e direitos trabalhistas assegurados, capazes de possibilitar a formação de um desenvolvimento sustentável no campo (Sauer,1998 ). Segundo Sauer (1998), apesar das dificuldades, são muitos os argumentos a favor da reforma agrária como instrumento de política distributiva, que não se restringem à produção e oferta de alimentos e matérias primas para o mercado interno, mas se baseiam também na importância do caráter distributivo da garantia de acesso à terra, considerada como uma democratização da atual estrutura fundiária. Além disso, devem ser considerados os aspectos 4 Fonte: www.mst.org.br.. Das 140 ocupações de terra efetuadas em todo o país para comemorar os 500 anos de descobrimento, 80 foram registrados em Pernambuco, mais de 50% na Zona da Mata. 5 SEPLAN, 1995. 4 relacionados á repercussão dos assentamentos sobre os municípios e economia local, dados os impactos gerados pela maior distribuição da riqueza e os estímulos à produção e investimentos em novas iniciativas econômicas, a exemplo da formação de cooperativas e associações de produtores. Isso é especialmente importante para regiões como a Zona da Mata Pernambucana, em que predominam as grandes propriedades canavieiras, mesmo apesar da crise que acometeu o setor sucroalcooleiro nos anos 90. Nessas áreas, a reforma agrária assume papel estratégico como base para um novo desenvolvimento, com a substituição das grandes propriedades pela agricultura familiar. Os assentamentos são uma prova concreta da melhoria nas condições materiais de existência não só das pessoas diretamente beneficiadas com a terra, havendo ainda uma geração de emprego, permitindo a inserção dos pequenos agricultores no mercado. Neste sentido, as chances para um desenvolvimento sustentável parecem maiores com a realização de uma reforma agrária e do fortalecimento da agricultura familiar, gerando as condições necessárias para a reconstituição e valorização do meio rural através da interiorização desse desenvolvimento. A criação de oportunidades e implementação de atividades econômicas relacionadas aos assentamentos através de cooperativas e /ou associações entre trabalhadores, seja como uma nova adesão no mercado, ou através de feiras livres locais, possibilidade de constituição de investimentos em educação, essencial para o sucesso dessa cooperativa, tem se mostrado mais bem sucedida do que as experiências em áreas em que não há articulação entre os produtores assentados. A cooperativa, entendida como uma associação de pessoas que trabalham em conjunto, reunindo trabalho, capital e administração, tecnologia e natureza, tem como característica essencial a organização social da produção e da administração, em especial as relações que se estabelecem entre pessoas e entre pessoas e o capital (Guareschi, 1997 ). Sendo assim, princípios essenciais em uma cooperativa devem estar presentes na forma de organização da cooperativa. Segundo Guareschi (1997) são importantes elementos a adesão livre (entra quem quer, sai quando quer); a gestão democrática (tudo decidido por eleição, sendo que cada pessoa vale um voto, independente de quanto capital ela tenha); distribuição das sobras (os lucros são repartidos conforme a quota de cada pessoa, não sendo política cooperativista a acumulação dos lucros, transformando-os em capital imobilizado, como acontece na maioria de nossas cooperativas); juros limitados ao capital (o capital sempre está em função da pessoa, e não se transforma, como no capitalismo, em produtor de riqueza e gerador de mais lucro por si mesmo); vendas à vista (não se dá aquele famoso golpe de pegar o produto e pagar no ano seguinte, como é praxe entre nós); neutralidade religiosa, política, social, sexual e racial (todos são iguais, com os mesmos direitos e deveres); educação cooperativista (um pequeno fundo é reservado para a educação dos sócios, em que a educação dos sócios é essencial para a formação de uma consciência política e social, evidente a superposição de poderes de uns sobre os outros, o que seria fatal para a sustentação da cooperativa); integração cooperativista (é a cooperação que deve existir não só internamente numa cooperativa, mas também entre as diversas cooperativas; neste sentido, a integração é importante para a luta por garantias e da defesa de interesses comuns). Da reunião dessas propriedades é que surgiria a “associação livre de pequenas forças econômicas”, baseada em dois elementos fundamentais de cooperativismo: em primeiro lugar, o princípio de auxílio mútuo, e a segunda idéia seria a expressão reflete o desejo de proteger aqueles cujo poder no mercado é relativamente fraco ao se referir a pequenas forças econômicas (Aguirre, 1986). 5 Dessa forma, no que diz respeito à sustentabilidade da produção dos assentamentos e de sua inserção no setor agropecuário, são elementos essenciais: a produção em associação com agroindústrias – sistemas integrados de produção; a produção para nichos de mercado específicos (como em mercados locais desenvolvidos, a exemplo da produção de hortifrutigranjeiros e derivado do direcionamento preferencial das compras públicas, como merenda escolar, hospitais; produtos de alto valor agregado, intensivos em mão de obra com alto nível de qualificação); sistemas de produção diversificada – conjunto de produtos com afinidades produtivas e que gerem um nível de renda significativo; pluriatividade – combinação da atividade agrícola com outras fontes de renda, como turismo, emprego na agroindústria etc.; aumento do tempo disponível para outras atividades produtivas através da introdução do progresso técnico na produção de subsistência (David et al., 1997:3). Assim caberia ao Estado apoiar com a presença de órgãos de pesquisas e de extensão rural para assistir esses trabalhadores assentados, especialmente nas questões relativas a transferência e absorção de tecnologias agrícolas. Podendo ainda, fazer financiamentos para ajudar esses trabalhadores a fazer investimentos beneficiando essa produção agropecuária, sendo desta maneira uma forma de fazer Reforma Agrária mais eficiente. DA TEORIA À PRÁTICA: AVALIAÇÃO DOS ASSENTAMENTOS NA ZONA DA MATA PERNAMBUCANA Foram selecionados os municípios em que há maior presença dos acampamentos e assentamentos em cada uma das três microrregiões da ZMPE (Mata Norte, Mata Sul e Região de Vitória de Santo Antão, segundo a classificação do IBGE), a partir de dados do IBGE, ONG’s, INCRA sobre a Reforma Agrária na região. Foram sistematizadas informações para caracterizar a região a ser estudada, analisando-se sua formação econômica e social. A partir do levantamento e seleção das áreas, foram realizadas visitas com o objetivo de entrevistar os agentes envolvidos com o processo de reforma agrária (líderes de assentamentos e assentados) e aplicar questionários. Os municípios selecionados foram Vicência (que envolveu os limites com Nazaré da Mata) na Mata Norte; Água Preta (envolvendo os limites com os municípios de Palmares e Gameleira) na Mata Sul, e Vitória de Santo Antão na microrregião de Vitória de Santo Antão. Em cada área selecionada foram visitados diferentes assentamentos, aplicando-se 25 questionários (totalizando-se 75 nas três microrregiões)6. Os questionários e roteiros de entrevistas para a aplicação em campo foram formulados para levantar o perfil da população da área, identificando os atores sociais, seu papel social e econômico, e o significado da interação entre estes atores. As análises, de estatística descritiva, foram realizadas a partir das informações obtidas com a pesquisa de campo, selecionadas as variáveis de rendimento, trabalho, família, educação, produção econômica7. Além das visitas aos municípios e áreas da Reforma Agrária selecionados, foram realizadas visitas técnicas que incluíram instituições representantes dos movimentos sociais, institutos de pesquisa, grupos representantes de classe de produtores, trabalhadores e governo, envolvidos 6 O trabalho não teve por objetivo obter uma amostra representativa quantitativamente num trabalho de inferência estatística, e sim de obter informações sobre o perfil e a realidade vivida pelos assentados, num trabalho de estatística descritiva. As visitas foram custeadas por recursos do grupo, o que limitou o número de viagens (cinco deslocamentos), cada uma com duração de 12 horas cada. 7 Ver questionário aplicado em campo anexo. 6 no processo de reforma agrária, destinadas a entrevistas e busca de informações técnicas sobre atividades produtivas. Os Representantes de Classe, os Movimentos Sociais e o Governo Foram ouvidos representantes de diferentes instituições e dos movimentos sociais ligados a Reforma Agrária, assim como dos empresários do setor sucroalcooleiro e do governo do estado de Pernambuco. O objetivo é comparar os discursos a respeito da importância, dos problemas e da necessidade de uma política pública que tenha por meta operar uma política de cunho redistributivo. Segundo o SINDAÇÚCAR – Sindicato da Indústria do Açúcar e do Álcool do Estado de Pernambuco, na Zona da Mata, depois da problemática das crises, existem trinta usinas operando em plena capacidade, pois o pior período, o da seca a cerca de três anos atrás, já é passado. Indagados sobre a importância de uma Reforma Agrária, a instituição entende que os movimentos sociais precisam de maior transparência perante a sociedade, do que eles buscam, para agir com uma maior responsabilidade social. Para a Associação dos Fornecedores de Cana do estado de Pernambuco, a crise do setor se deu devido ao processo de globalização e da seca durando cerca de três anos, trazendo uma redução de 68% na safra da Zona da Mata de Pernambuco. Considerados os problemas gerados pela desregulamentação na produção do açúcar e do álcool, depois da extinção do IAA – Instituto do Açúcar e do Álcool, e a crescente concorrência direta com São Paulo, a região teria sofrido muita dificuldade, seja em função da presença da concorrência da produção paulista, cujo custo comparado é reduzido, dado o clima mais ameno e uma tecnologia de ponta, seja em função das crises que afetam a produção local, em conseqüências climáticas desfavoráveis, trabalho essencialmente manual, com apenas 30% da produção mecanizada, e importação de produtos agrícolas como fertilizantes e inseticidas de São Paulo. Quanto à importância dada à Reforma Agrária, a visão é de conflito, considerada como movimentos de “invasão” irregular de propriedade privada, cujo proprietário tem o direito de propriedade. A concepção de reforma agrária de que dará certo é a de um movimento em que esteja garantida a assistência técnica e educação, além de preparo para a atividade de mercado e comercialização. Já em relação à cooperativa a opinião é de que não daria certo aqui em Pernambuco porque não há educação e nem toda uma preparação para o trabalhador, ao contrário das cooperativas e associações do Sul do Brasil. Na visão do INCRA – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, apesar da ZMPE ser uma região úmida, bons solos, chuvas em abundância, a economia da cana-deaçúcar não tem trazido os mesmos resultados econômicos do passado, mas sim um elevado nível de dificuldades. As opiniões se dividem, estando presentes os acham que devem ser reconstruídas e recuperadas as usinas, dado o potencial gerador de empregos, e, de outro, os que lideram a defesa de uma política com objetivos de redistribuição das terras.Quanto à implementação da reforma agrária, a maior dificuldade da tarefa está em manter os assentados na terra, por conseqüência da dificuldade de acesso ao mercado. A Reforma Agrária é entendida como um processo de desapropriação das terras improdutivas, que não cumprem sua função social, utilizando-as para o assentamento das famílias. Para o FUNTEPE – Unidade Técnica do Fundo de Terras de Pernambuco, a problemática da reforma agrária na Zona da Mata de Pernambuco decorre de uma falha da coordenação das ocupações dos trabalhadores. Ao gerar grandes pressões sobre o Estado, este tem dificuldade relacionada ao desaparelhamento financeiro e técnico para a promoção de treinamento dos trabalhadores rurais, investindo em educação e técnicas agrícolas. A instituição aponta, ainda, 7 uma grande dificuldade para incentivar esses trabalhadores para a organização de associações ou cooperativas, visando melhor acesso ao mercado. O discurso se modifica quando são considerados os movimentos sociais. Segundo o MST Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra, existem muitas dificuldades enfrentadas pelos trabalhadores na luta pela terra, considerada elemento fundamental na geração das condições essenciais de sobrevivência, em especial dada a morosidade da justiça e nas decisões de desapropriação e concessão da posse. O movimento é considerado necessário e justo, cujo objetivo é contribuir para a distribuição mais justa da riqueza, promovendo maior eficiência na alocação dos recursos produtivos. A Prática: a experiência dos acampamentos e assentamentos na Mata Pernambucana O assentamento Privilégio, no município de Água Preta, abrigava trabalhadores que foram assentados após dois anos de luta em acampamentos. O assentamento data de janeiro de 1997, congregando cinqüenta e cinco famílias, cada família com 8 a 10 hectares de terra. Os trabalhadores cultivam uma agricultura de subsistência para consumo e para venda em feira livre localizada em Palmares. Houve relato da tentativa de formação de uma associação, que, porém, não se concretizou dada a desorganização, com o reconhecimento de que é necessário um melhor preparo não só técnico como também cultural e educacional para que a mesma obtenha sucesso. A forma de apoio do MST é apenas com cursos de como produzir e explicações sobre cooperativas, na periodicidade de duas vezes por ano, insuficiente para a capacitação dos assentados. Nos municípios selecionados, a avaliação apontou para uma série de dificuldades que caracterizam os assentamentos da região. Apesar de um número não desprezível de assentamentos nas áreas pesquisadas, a pesquisa de campo revelou uma face do processo de reforma agrária que põe em dúvida a forma como esta vem se realizando na Zona da Mata de Pernambuco. A maioria das famílias assentadas vive sob condições bastante precárias no que diz respeito à infraestrutura de saneamento básico, com reduzida ou quase nenhuma produção agropecuária. Em praticamente todos aqueles visitados não há formação de cooperativas nem de associações de produtores e/ou moradores, em que a maioria ainda vive da reprodução da cultura predominante: o cultivo da cana-de-açúcar ainda que em condições adversas, ocupando áreas de cerca de 9 hectares em média. Foram poucas as ocorrências de produção de hortifrutigranjeiros e de atividade criatória, em escala comercial. Os resultados serão apresentados por cada área selecionada e visitada das três Microrregiões da Zona da Mata de Pernambuco. Zona da Mata Norte de Pernambuco A análise dos assentamentos localizados na Zona da Mata Norte Pernambuco foi feita através de visitas em dois assentamentos localizados na região, nos limites do município de Vicência, chamados Gregório Bezerra e Nova Terra. Nos dois assentamentos visitados havia a presença de uma cooperativa, embora não estivessem em atividades. A origem dos assentados é do meio rural. Antes de serem assentados, 60% estavam empregados na agricultura, com experiência por mais de três anos. Outros 40% chegaram a 8 atuar em outras atividades, entre as quais como agente de saúde, empregada doméstica ou professora. 60% dos assentados já trabalharam em usinas dentro do estado, dos quais 70% nunca trabalharam em nenhum outro tipo de atividade a não ser a agricultura. Antes de conquistarem a terra, 80% deles estavam desempregados. Com o assentamento, 70% dos trabalhadores estão ocupados na pequena agricultura familiar, plantando para consumo e comercialização do excedente de produtos da agricultura de subsistência. Os outros 30% trabalham com o comércio ou empregada doméstica. Os trabalhadores reconhecem que o assentamento não está obtendo sucesso; a maioria alegou que o assentamento estava desorganizado e sem atividades que fossem consideradas rentáveis. O assentamento Gregório Bezerra é considerado ainda um assentamento de pouco desenvolvimento, embora possa vir a se desenvolver dada a extensão da área em que se encontra a vila agrícola e a proximidade com mercados consumidores. Há uma cooperativa em formação, para a qual foi solicitado um projeto de construção de aviário e de uma central de processamento de derivados no local, além da implementação de sistema de água encanada, através de convênio com o INCRA. Houve ainda cursos de capacitação técnica oferecida pelo MST no projeto Lumiar. A formação dessa cooperativa está aparentemente ajudando ao desenvolvimento do assentamento e da sua organização. Apesar de estarem encaminhadas algumas providencias para a melhoria da qualidade de vida dos assentados, há ainda que acrescentar a importância da educação, pois 40% dos assentados são analfabetos e 44% deles fizeram o ensino fundamental incompleto. O outro assentamento, Nova Terra, apresentou-se também como um assentamento pouco desenvolvido, apesar de também apresentar uma cooperativa dentro do assentamento e do tipo de construção da agrovila. Os trabalhadores quando receberam o crédito da reforma agrária para investir na produção, adquiriam um bovino e nove caprinos para a produção de leite e queijo. Mas, a falta de estrutura dentro do assentamento e de experiência com esse tipo de criação, boa parte dos animais morreram por doenças desconhecidas pelos assentados. Os trabalhadores que perderam seu rebanho passaram a cultivar a agricultura de subsistência, mantendo ainda a cooperativa, apesar de nem todos os assentados participarem da mesma. Nas escolas dos assentamentos são oferecidos apenas os cursos da primeira a quarta série do ensino básico, e 20% dos assentados não tem acesso a essas escolas. Quando avançam para o ensino fundamental precisam se deslocar para a escola municipal. E não há programa de alfabetização para adultos dentro do assentamento, sendo prejudicial para o seu desenvolvimento. Nestes assentamentos, o acesso ao atendimento nos postos de saúde ocorre apenas ao se deslocarem para o município vizinho. A renda recebida pelos trabalhadores assentados é originada 50% da venda de produtos produzidos pelos assentados, 40% do trabalho e 10% não recebe nenhum tipo de renda, sobrevivendo do que consomem. A renda média observada através da pesquisa foi de até um salário mínimo recebida por 80% dos assentados, e apenas 20% recebiam mais de um saláriomínimo. De todos os requisitos necessários para que uma cooperativa tenha sucesso, o assentamento só atende a um o item, da neutralidade religiosa, política, social, sexual, e racial. Dessa forma, parece inviável o progresso da cooperativa, pois, além da falta de recursos, há ainda problemas como a gestão que não se caracterizaria como democrática, com a distribuição das sobras, com as vendas à vista, e principalmente com relação à educação cooperativista e à integração cooperativista. Observou-se, no entanto, que 70% dos trabalhadores nunca trabalharam em cooperativas e ou associações, 60% não conhece o significado de uma cooperativa e ou associação, mas 90% 9 dos trabalhadores alegaram achar importante a formação de uma cooperativa. Isto quer dizer, que alguns dos trabalhadores, mesmo não conhecendo o significado de uma cooperativa, acham importante a formação da mesma. Todos os trabalhadores entrevistados consideram importante a formação de uma cooperativa, apesar de não conhecerem o conceito, as dificuldades e as vantagens de uma cooperativa. Os assentados plantam não apenas para vender como também para consumo, mas ficam insatisfeitos com a baixa renda mensal. Neste sentido, consideram que o processo de Reforma Agrária não deveria se limitar a apenas distribuir a terra e dar créditos para fazê-la, mas que fosse uma reforma agrária planejada incentivando a formação de cooperativas e ou associação dentro desses assentamentos, demonstrando que é possível organizar a mesma de forma que traga progressos sociais e econômicos. O que se verificou nas visitas é que a Reforma Agrária, como está sendo aplicada, com a preocupação da distribuição das terras, não é sustentável econômica nem socialmente. Zona da Mata Sul de Pernambuco Na Mata Sul, foram visitados os assentamentos localizados no entorno do município de Água Preta. Os assentamentos escolhidos de forma aleatória foram: Serrinha, o conjunto de assentamentos de Ouvires/Barra/Palmeira, Engenho Florescente e São Gregório/AlegreI/ Alegre II. Os assentamentos visitados foram considerados pouco desenvolvidos, devido à restrição dos sistemas produtivos, com baixa produtividade e com renda de um pouco mais de um salário mínimo obtida pelos assentados e, conseqüentemente, baixa qualidade de vida. Em todos os assentamentos localizados na Zona da Mata Sul, a origem dos assentados também é do meio rural. Antes do assentamento, 68% estavam ocupados na agricultura e 32% estavam ocupados em outras atividades, essencialmente como empregadas domésticas e no comércio. Dos que trabalharam na agricultura, todos já tiveram a oportunidade de trabalhar em usinas do estado. Destes, mais de 58% deles nunca trabalharam em nenhum outro tipo de atividade a não ser a agricultura, e estes passaram mais de um ano desempregados. Atualmente, 87,5% dos assentados estão trabalhando na agricultura de subsistência para consumo e comercialização em feiras livres. Dos assentamentos visitados na região, apenas em Serrinha havia registro de formação de cooperativa, para a produção e comercialização de leite e de hortigranjeiros. No entanto, a sede da cooperativa, dentro da agrovila, havia sido desativada, com equipamentos em estado de deterioração, dada a crise na produção avícola e paralisação da produção leiteira. Segundo o presidente da cooperativa, a mesma entrou em crise devido à falta de participação da maioria dos parceleiros e de redução do mercado para produção, com dificuldades para a comercialização. Embora 45,8% já tenham trabalhado em sistema de cooperativas e ou associação, mais de 60% não tem conhecimento sobre a forma de funcionamento de cooperativas e ou associação, suas vantagens e o que é necessário para sua formação. Porém, 75% alegam achar importante a constituição de uma para obter melhores recursos para dentro do assentamento. O que pode ter acarretado esse pensamento de ser importante a formação de uma cooperativa, na opinião desses assentados, é a atuação do MST, pois 70,8% dos entrevistados disseram que o MST discute a importância e apóia a formação de cooperativas nas reuniões que promove com assentados. 10 A educação através de escolas dentro do assentamento atingia 84,6% dos assentados, mas também ofereciam cursos apenas da primeira à quarta série primária, e ao ultrapassar este nível se deslocam para escolas no município mais próximo. Na área de saúde, todo e qualquer atendimento tem que ser feito com deslocamentos para o sistema de atendimento público nas cidades mais próximas. Podem ser apontados como motivos para o baixo desenvolvimento dos assentamentos fatores como o da baixa escolaridade dos trabalhadores rurais, em que 80% têm até, no máximo, o ensino fundamental incompleto (32% são analfabetos, 48% têm o ensino fundamental incompleto) e não há programa de alfabetização para adultos. Apenas 60% dos assentamentos tinham acesso a energia elétrica, e nenhum dos assentamentos visitados tinha acesso a água encanada nem saneamento básico. Em 75% as estradas são de difícil acesso aos assentamentos. O levantamento constatou uma grande dificuldade para aumentos de produtividade em um assentamento sem recursos para isso. Como fator agravante da situação, não há cooperação, organização e união entre os assentados, o que dificulta a obtenção de maiores recursos vindo das prefeituras mais próximas, ou ainda formar uma cooperativa ou associação. Nesses assentamentos, apesar da importância concedida à formação de cooperativas, o desconhecimento da composição, formas de articulação, formação de uma cooperativa é característico da maioria dos assentados. Isso aumenta a dependência de formas precárias de geração de renda. Esta é originada, na maioria dos casos, da venda de produtos produzidos por eles. Cerca de 4% dos casos a renda é gerada da aposentadoria e 25% dos trabalhadores não recebe nenhum tipo de renda. Estes sobrevivem do que produzem. Porém, ainda é grande o vínculo com a economia sucroalcooleira, com presença da produção de cana-de-açúcar em muitas das parcelas de terra dos assentamentos. Região de Vitória de Santo Antão A análise dos assentamentos localizados na região de Vitória de Santo Antão foi feita através de visitas em quatro assentamentos: Pedreira, Galiléia, Serra e Açude Grande. Esses assentamentos visitados também foram considerados pouco desenvolvidos, devido à restrição dos sistemas produtivos e a renda baixa recebidas pelos assentados. Em apenas dois assentamentos visitados nessa região, Pedreira e Açude Grande, foi relatada a formação de cooperativas ou associação. No entanto, em Açude Grande não se observou atividade produtiva em forma de cooperativa, que pareceu desativada. Diferentemente do resultado dos assentamentos analisados nas outras duas microrregiões, em todos os assentamentos localizados em Vitória foi observado que 72% tem origem do meio rural e 28% tem origem do meio urbano. Antes de serem assentados 75% nunca trabalharam em nenhum outro tipo de atividade a não ser a agricultura, e os outros 25% tiveram ocupações que variaram de soldado, mecânico, motorista e eletricista. Dos que sempre trabalharam na agricultura, 100% tem experiência por mais de três anos, dos quais 60% já tiveram a oportunidade de trabalhar em usina dentro do estado. Antes de conseguirem a terra, 62,5% dos trabalhadores passaram mais de um ano desempregados, e atualmente 91,6% dos assentados estão trabalhando. 87,5% usam a terra para plantio para consumo, com venda do excedente. Apenas 12,5% responderam que iriam utilizá-la para criação de cardume e plantar produtos agrícolas para comercialização. 11 A maioria dos trabalhadores, 65,2%, nunca trabalhou em cooperativa ou associação. 56,5% dos assentados não conhecem o significado de uma cooperativa e não sabem o que ela é capaz de proporcionar dentro de um assentamento, apesar de 90% dos assentados acharem importante sua formação. 65,2% das pessoas disseram que o MST discutia a importância de uma cooperativa dentro do assentamento. O baixo nível de escolaridade aparece novamente como um importante obstáculo. Dos assentados entrevistados, 36% eram analfabetos e 40% tinham no máximo o ensino fundamental incompleto. Como nos demais assentamentos, dos que tem acesso à escola do assentamento, 88%, este se resume aos cursos da primeira a quarta série primária. Com relação à renda recebida por esses trabalhadores, em 54% dos casos é proveniente da venda de produtos, em 4% do trabalho, em outros 4% de pensões, em 13% de aposentadoria e em 25% dos casos não se recebia nenhum tipo de renda, os quais sobrevivem do que produzem. O assentamento de Pedreira ganha destaque, dada a presença de cooperativa formada pelos trabalhadores em condições adversas. A cooperativa foi formada antes do recebimento do crédito de reforma agrária e construíram recipientes para a criação de peixes, e cercas para criação de aves, suínos e caprinos com escala comercial. ] Os outros assentamentos apresentavam os mesmos problemas dos assentamentos visitados na região da Mata Norte e Mata Sul, com relação à falta de recursos básicos favoráveis ao desenvolvimento dos assentamentos.Os trabalhadores consomem e vendem o que produzem, mas há situações relatadas de perda da colheita por dificuldades relacionadas à comercialização. GANHOS E PERDAS: SUSTENTABILIDADE DOS ASSENTAMENTOS NA MATA PERNABUCANA De forma geral, a pergunta que mais se destaca no questionário foi sobre a qualidade de vida dos assentados, nas três áreas visitadas, foi a de se os mesmos achavam que haviam conquistado melhores condições de vida, piorado ou estavam na mesma situação que antes do assentamento. A maioria respondeu que as condições de vida melhoraram apenas pelo fato de terem conseguido uma casa própria, mas que, no entanto, percebiam uma piora, por não acessarem uma renda fixa como tinham, quando assalariados nas usinas. Apesar do processo de reforma agrária, ainda prevalece a cultura da cana-de-açúcar, caracterizando o cenário daquela região, mesmo nas parcelas de terra, cujo tamanho médio é de apenas 8 hectares. A resposta desses agricultores gera uma série de indagações, e reforça o objetivo da reforma agrária não apenas como mecanismo de distribuição de terras para os trabalhadores rurais, mas sim de acesso a condições apropriadas de vida, trabalho e sobrevivência, com uso econômico dos fatores de produção considerados improdutivos, ociosos e inutilizados. Com relação ao uso econômico e produtivo do fator terra e ocupação sustentável, as informações geradas pela análise dos dados obtidos nas visitas de campo geraram conclusões pouco animadoras. Os assentamentos visitados não continham qualquer infraestrutura produtiva, nem de saneamento, geração de energia, muitos com difícil acesso, escolas em conservação precária. Muitos dos recursos que teriam sido repassados pelas instituições responsáveis pelos assentamentos, em especial INCRA e FETAPE, acabam sendo desperdiçados devido à incapacidade técnica dos trabalhadores na criação de animais e nas 12 culturas agrícolas que se perdem devido à incidência de pragas, doenças e/ou maus tratos culturais. Some-se a isso a dificuldade na administração dos recursos. Dentro dos municípios estudados, nenhum dos assentamentos apresentou sucesso nas atividades relacionadas a cooperativa e/ou associação, embora apontassem para a necessidade de organização e viabilização da cooperativa como forma de organizar a produção econômica. Com relação aos agentes econômicos, a maioria dos assentados é de ex-trabalhadores da economia sucroalcooleira. Preocupam também os indicadores de nível de escolaridade, que são muito baixos, e a fonte geradora de renda, que em poucos casos ultrapassa uma renda familiar de mais de um salário mínimo. Isso cria importantes obstáculos à formação de cooperativas. Quase 100% dos entrevistados são analfabetos funcionais. Embora a análise econômica desses assentamentos deva ser ainda aprofundada, os resultados apontam para necessidade de maior planejamento das atividades, o que requer maiores investimentos (apoio e ações) em infraestrutura, organização e apoio à produção econômica, viabilizando a formação de cooperativas, legitimando a reforma agrária como política pública de redução das desigualdades. A formação de uma cooperativa com sucesso em um assentamento é de grande importância, dada a capacidade gerada para resolver problemas financeiros das famílias assentadas, para gerar o crescimento econômico e social do assentamento, para aumentar a tecnologia de produção do assentado adequadamente e finalmente para possibilitar a formação de uma agroindústria. Mas, para que essa implementação obtenha sucesso precisam ser resolvidos os problemas estruturais como a educação, saúde e os meios de produção e ainda atenda aos princípios, já mencionados, para a formação de uma cooperativa. Destaque deve ser dado para a necessidade de uma adesão livre (entra quem quer, sai quando quer); uma gestão democrática, onde toda decisão é tomada em eleição, sendo que cada pessoa vale um voto, independente de quanto capital ela tenha; a necessidade de educação cooperativista, onde um pequeno fundo é reservado para a educação dos sócios, pois sem a educação dos sócios, sem formação da consciência política e social, a exploração de uns sobre os outros se tornaria uma fatalidade - o grande problema da formação de uma cooperativa, e a necessidade de uma integração cooperativista, que é a cooperação que deve existir não só internamente numa cooperativa, mas também entre as diversas cooperativas. Se todas têm o mesmo ideal, somente pela união e integração conseguirão fazer seus princípios e seus interesses (Guareschi,1997). No entanto, nos assentamentos e cooperativas visitados, nenhum dos casos atendeu a esses princípios e não apresentaram estrutura e nem recursos em seus assentamentos. No que diz respeito à participação e ao trabalho de base dos movimentos sociais, trata-se de um elemento que deve ser rediscutido. O mais importante deles, o MST, segundo o levantamento, discute a importância de maior organização das estruturas produtiva e social dos assentamentos, porém parece estar falhando em não conseguir realizar e manter um trabalho de base nos assentamentos pós-posse da terra. Sendo assim, há que se repensar a forma como se tem processado a reforma agrária na Zona da Mata de Pernambuco. Embora a produção familiar seja uma unanimidade, para os estudiosos em economia agrícola, como forma de produção nos assentamentos, esta deve ser acompanhada na aplicação dos seus recursos e apoiada na comercialização dos seus produtos. Nesse sentido é preciso reforçar a estrutura produtiva local e reforçar o estímulo à produção para mercado de produtos que substituam a cultura da cana-de-açúcar, ainda encontrada em muitos dos assentamentos (ainda que cultivada em lotes de cerca de 8 hectares), tornando os assentamentos auto-sustentáveis. 13 Portanto cabe a promoção de um trabalho de base a ser promovido não só pelas instituições e programa públicos relacionados com a Reforma Agrária (como o PRONAF), com presença de agentes de desenvolvimento de instituições de governo, mas em especial de representantes dos movimentos sociais e de grupos organizados na sociedade civil que apóiam as iniciativas de programas que envolvem trabalhos na área de educação e capacitação desses assentados. São necessários trabalhos de ações integradas com o objetivo de oferecer oportunidades de inserção econômica e social dos assentados. Sem isso, a reforma agrária não terá êxito em seu objetivo de promover o desenvolvimento local sustentável, pois, da forma como esta se desenvolve, não está promovendo a efetiva participação dos seus principais atores sociais na sociedade, nem no sistema econômico, com crescente degradação do meio ambiente, uma vez que em todas as áreas visitadas não há saneamento e nem estratégias que permitam a conservação ambiental. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AGUIRRE, Basilia M. B., Mercado de Trabalho Rural, Estado e Cooperativismo, São Paulo: IPEA/FEA-USP, 1986. ANDRADE, Manuel C. d.. Área do Sistema Canavieiro. Série Estudos Regionais, nº18, Sudene, Recife, 1988. ARAÚJO, Tânia B. et al. (org.). O GTDN. Da Proposta à Realidade. Ensaios sobre a Questão Regional. Ipespe, Ed. Universitária da UFPE, Recife, 1994. 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