ILDA BASSO (Org.)
JOSÉ CARLOS RODRIGUES ROCHA (Org.)
MARILEIDE DIAS ESQUEDA (Org.)
II SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE EDUCAÇÃO
LINGUAGENS EDUCATIVAS:
PERSPECTIVAS INTERDISCIPLINARES NA ATUALIDADE
BAURU
2008
S6126 Simpósio Internacional de Educação (2. : 2008 : Bauru, SP)
Anais [recurso eletrônico] / 2. Simpósio Internacional de
Educação / Ilda Basso, José Carlos Rodrigues Rocha,
Marileide Dias Esqueda (organizadores). – Bauru, SP :
USC, 2008.
Simpósio realizado na USC, no mês de junho de 2008,
tendo como tema : Linguagens educativas – perspectivas
interdisciplinares na atualidade.
ISBN 978-85-99532-02-7.
1. Educação – simpósios. 2. Linguagens educativas. I.
Basso, Ilda. II. Rocha, José Carlos Rodrigues. III. Esqueda,
Marileide Dias. VI. Título.
CDD 370
AVALIAÇÃO NEUROPSICOLÓGICA DE CRIANÇAS COM ALTERAÇÕES NO
DESENVOLVIMENTO COGNITIVO E PSICOSSOCIAL.
NEUROPSYCHOLOGICAL EVALUATION OF CHILDREN WITH CHANGES IN DEVELOPMENT
AND COGNITIVE
PSYCHOSOCIAL.
Dra. Maria de Lourdes Merighi TABAQUIM1
Amanda Cristina FIORETTO2
Ana Vera NIQUERITO3
Resumo
A avaliação neuropsicológica investiga o comportamento nas formas complexas de atividade
mental, em condições normais e patológicas. Na busca pelo diagnóstico, procedimentos
metodológicos específicos são necessários, pois facilitam a compreensão das dificuldades e
elucidam as habilidades do examinando. A aprendizagem envolve sistemas de informação
relacionados às áreas de recepção, processamento e expressão, principalmente com relação à
linguagem, memória, afetividade e ao movimento intencional, caracterizando fatores
cognitivos do sistema nervoso. Para adotar procedimentos educacionais e comportamentais
eficazes junto à criança que apresenta dificuldades na aprendizagem escolar e no
comportamento adaptativo, é necessário o entendimento de suas competências, tanto nos
recursos cognitivos quanto no nível de resposta na tarefa. O objetivo deste estudo foi obter um
perfil neuropsicológico de crianças com alterações cognitivas e psicossociais, relacionado às
funções corticais superiores. Participaram 44 sujeitos na faixa etária de 7 a 12 anos de idade,
ambos os sexos, freqüentando escola especializada e regular, em níveis pré-escolar e
fundamental até a 4ª série. Na avaliação neuropsicológica foram empregados os seguintes
instrumentos: Raven Matrizes Progressivas Coloridas, Avaliação de Vocabulário por Imagens
Peabody e Fábulas de Düss. Os resultados permitiram evidenciar escores globais abaixo da
média para a idade e escolaridade no grupo pesquisado. Com relação aos níveis cognitivos,
atencionais, de memória, linguagem, em tarefas acadêmicas de leitura, escrita e aritmética, o
grupo manteve a classificação abaixo do esperado para a média, evidenciando dificuldades
relacionadas ao domínio espaço-temporal e generalização de informações necessárias para a
compreensão lógico-abstrata. O repertório lingüístico mostrou-se restrito para todos os
sujeitos do estudo, baseado principalmente em falas objetivas e do cotidiano da criança. Desta
forma, os recursos de linguagem mostraram-se em níveis primários, sendo a competência
receptiva superior à expressiva. Na avaliação das condutas adaptativas, foi constatado que
66% dos sujeitos demonstraram comportamentos de dependência ao meio afetivo e social;
42,07% mostraram respostas indicativas de egocentrismo e possessividade em relação a
objetos e pessoas, com dificuldades na expressão de comportamentos cooperativos, de troca e
afinidades nas relações. Foram identificados 41,65% de sujeitos com prejuízo no
autoconceito, com sentimentos de insegurança e inadequação na relação com o meio, medos
indicativos de perdas parentais e de figuras com grande valência afetiva. O estudo identificou
que 68,18% dos sujeitos apresentaram fantasias características de fases primárias do
desenvolvimento, tais como, medo do escuro, do “bicho papão”, etc. Estes dados sugerem a
imaturidade cognitiva e psicossocial dos participantes, pelas dificuldades em lidar com
estímulos novos e reais do ambiente imediato. Os desempenhos prejudicados relacionados ao
comportamento adaptativo demonstraram disfunção de áreas neuropsicológicas frontais e
1
Professora Doutora do Curso de Psicologia da Universidade do Sagrado Coração.
Aluna do Curso de Psicologia da Universidade do Sagrado Coração.
3
Aluna do Curso de Psicologia da Universidade do Sagrado Coração.
2
límbicas do córtex, responsáveis pelo processamento de informações estratégicas, de
planejamento e escolhas com julgamento moral. Os recursos cognitivos incipientes
caracterizaram condições desfavoráveis para o processamento, à retenção e generalização de
informações, conseqüenciando em perdas na produtividade dos sujeitos. O estudo concluiu a
existência de alterações cognitivas e psicossociais relacionadas aos recursos escassos
neuropsicológicos para o ajustamento afetivo e social dos sujeitos.
Palavras-chave: avaliação neuropsicológica; cognição; desenvolvimento; função cortical.
Abstract
The neuropsychological evaluation investigates the behavior in complex forms of mental
activity in normal and pathological conditions. In the search for diagnosis, specific
methodological procedures are necessary, as facilitate the understanding of the difficulties and
clarify the skills of examining. The learning involves information systems related to the areas
of receiving, processing and expression, particularly with regard to language, memory,
affection and movement intentional, characterizing cognitive factors nervous system. To
adopt procedures educational and behavioral effective with the child who presents difficulties
in school and learning in adaptive behavior, it is necessary to the understanding of its powers,
both in knowledge resources as the level of response in the task. The objective of this study
was to obtain a neuropsychological profile of children with psychosocial and cognitive
changes, related to higher cortical functions. 44 subjects participated in age from 7 to 12 years
of age, both sexes, and regularly attending school specializes in pre-school levels and key
until the 4 th series. In neuropsychological evaluation were used the following instruments:
Raven Progressive Matrices Colorful, Assessment of vocabulary by images of Peabody and
Fábulas Düss. The results revealed global scores below average for their age group in school
and searched. With respect to cognitive levels, attention, memory, language, academic tasks
of reading, writing and arithmetic, the group kept the rating below that expected for the
average, highlighting difficulties related to the domain space-time and spread of information
needed to -abstract logical understanding. The linguistic repertoire proved to be restricted to
all subjects of the study, based mainly in daily discourse and the objective of the child. Thus,
the resources of language showed up at primary levels, with the power receptive than
expressive. In the assessment of adaptive behaviors, it was found that 66% of the subjects
showed behaviour of dependence on affective and social environment; 42.07% showed
responses indicative of egocentrism and possessividade regarding objects and people with
difficulties in the expression of cooperative behavior, exchange and affinities in relations.
They were identified 41.65% of subjects with prejudice in self, with feelings of inadequacy
and insecurity in the relationship with the environment, fears indicative of loss of parental
figures and with great valencia affective. The study identified that 68.18% of the subjects had
fantasies characteristics of primary stages of development, such as fear of dark, the
"bogeyman beast", etc.These data suggest the cognitive and psychosocial immaturity of the
participants, the difficulties in dealing with new stimuli and real the immediate environment.
The performances related to impaired adaptive behavior demonstrated
areas of neuropsychological dysfunction and límbicas front of the cortex, responsible for
processing of strategic information, planning and choices with moral judgement. The
knowledge resources incipient characterized unfavourable conditions for the processing,
retention and spread of information, conseqüenciando in losses in productivity of the subject.
The study concluded that there are psychosocial and cognitive changes related to
neuropsychological scarce resources for the emotional and social adjustment of the subject.
Keywords: neuropsychological evaluation; cognition; development; cortical function.
INTRODUÇÃO
A trajetória das neurociências vem se desenvolvendo ao longo dos séculos. Embora o
avanço do aparato tecnológico e médico-científico possibilite a investigação mais complexa
da atividade cerebral e sua correlação como comportamento humano, ainda assim há muito
para se descobrir nesse campo da ciência (ANDRADE, 2004)
A neurociência é um campo interdisciplinar que abrange um conjunto de disciplinas
dentre outras: neuroanatomia, neurofisiologia, neuroquímica, neuroimagem, genética,
farmacologia, neurologia, psicologia, psiquiatria. As neurociências procuram estudar as várias
relações entre o comportamento e a atividade cerebral (ANDRADE, 2004)
Dentro das neurociências, o papel do psicólogo vem conquistando um grande
destaque, que resultou na Resolução nº 02/2004 do Conselho Federal de Psicologia, que
regulamenta a prática da neuropsicologia (diagnóstico, acompanhamento, reabilitação e
pesquisa) como especialidade do profissional psicólogo através de registro e titulação
(ANDRADE, 2004)
Todas as tarefas, que diariamente realizamos, necessitam da atividade cerebral. As
principais funções cognitivas são: percepção, atenção, memória, linguagem e funções
executivas. É a partir da relação entre todas estas funções que entendemos a grande maioria
dos comportamentos, desde o mais simples até as situações de maior complexidade, e que
exigem atividades cerebrais mais elaboradas (ANDRADE, 2004).
A atenção é uma função cognitiva bem complexa e diversos comportamentos resultam
de um nível adequado de atenção para serem bem sucedidos, também é um pré-requisito
fundamental para o processo de memorização. O conceito de atenção é definido pela seleção e
manutenção de um foco, seja de um estímulo ou informação, entre as inúmeras que obtemos
através de nossos sentidos, memórias armazenadas e outros processos cognitivos. A
habilidade de manter a própria atenção focada em um conteúdo mental fica diminuída, ou
seja, pode-se ter dificuldade de se manter uma seqüência de pensamentos simples, o que
invariavelmente compromete a habilidade de solução de problemas mais complexos
(STERNBERG, 2000).
A memória é uma das funções cognitivas mais utilizadas pelo ser humano em seu
cotidiano. Memória é a capacidade de armazenar informações, lembrar delas e utilizá-las no
presente. O bom funcionamento da memória depende inicialmente do nível de atenção. Para
que o bom armazenamento aconteça, outras atividades cognitivas como a capacidade de
percepção e associação são importantes para que as informações possam ser armazenadas
com sucesso. Quanto maior o interesse em aprender algo, melhor será o armazenamento das
informações obtidas nesse processo. Assim,quanto maior o número de emoções (sejam elas
positivas ou negativas) atribuídas a um evento,mais chances dele permanecer na memória
para uma futura recuperação (STERNBERG, 2000).
A linguagem é uma função que usamos todos os dias, durante a maior parte do tempo,
seja a linguagem oral (numa conversa) ou escrita (ao ler ou escrever um texto). O conceito de
linguagem é definido pelo uso de um meio organizado de combinar as palavras a fim de se
comunicar, embora a comunicação não se constitua unicamente num processo verbal. As
formas não-verbais, como gestos ou desenhos,também são capazes de transmitir idéias e
sentimentos (STERNBERG, 2000).
A linguagem também é caracterizada pela sua constante evolução; pois, embora as
pessoas respeitem os limites de sua estrutura (gramática, ortografia), elas podem produzir
novas elocuções a qualquer momento. Basta observar as mudanças ocorridas na escrita de
certas palavras há algumas décadas atrás, por exemplo, “pharmácia” (STERNBERG, 2000).
A percepção é uma função cognitiva que se constitui de processos pelos quais o
sujeito é capaz de reconhecer, organizar e dar significado a um estímulo vindo do ambiente
através dos órgãos sensoriais (STERNBERG, 2000).
As funções executivas compreendem um conceito neuropsicológico que se aplica às
atividades cognitivas responsáveis pelo planejamento e execução de tarefas. Elas incluem o
raciocínio, a lógica, a estratégia, a tomada de decisões e a resolução de problemas.
Independente do grau de complexidade do problema, o sujeito precisa estar apto para analisar
a situação (problema), lançar mão de estratégias, e antever as conseqüências de sua decisão
(MELLO, 2005).
Segundo Tabaquim (2002 apud LURIA, 1981), a Neuropsicologia é uma ciência
interdisciplinar do conhecimento que estuda as relações entre cérebro e comportamento,
investigando o papel desempenhado por sistemas cerebrais individuais em formas complexas
de atividade mental, em condições normais e patológicas. O conhecimento sobre fundamentos
básicos das ciências afins da Neuropsicologia, como a Neurologia, a Psicologia, a Lingüística
e a Inteligência Artificial, são essenciais para a formação do pesquisador dessa área
(TABAQUIM 2002 apud DAMASCENO, 1997).
E nos últimos vinte anos, os paradigmas da Psicologia Cognitiva e das Ciências da
Computação deram origem à “Neuropsicologia Cognitiva”.
A Neuropsicologia estuda os distúrbios das funções superiores reduzidos por
alterações cerebrais, e investiga especificamente os distúrbios dos comportamentos
adquiridos, através do qual cada homem mantém relações adaptadas com o meio
(TABAQUIM, 2002).
Segundo Tabaquim (2002 apud LURIA, 1973), a Neuropsicologia tem por objetivo a
investigação do papel de sistemas cerebrais individuais, em formas complexas de atividade
mental. Seus métodos procuram facilitar o diagnóstico tópico, precoce e mais exato, das
lesões cerebrais locais, procurando não apenas estabelecer programas de ação terapêutica e
reeducativa, como também trazer importantes contribuições para uma mais ampla
compreensão sobre a atividade mental, bem como sobre toda a psicodinâmica humana.
Segundo Tabaquim (2002), a compreensão dos processos da aprendizagem e seus
distúrbios busca considerar e conhecer aspectos neuropsicológicos, tendo em vista que as
manifestações são, na sua maioria, reflexos de funções alteradas, ou seja, disfunções em áreas
da recepção, processamento e expressão das informações, principalmente com relação à
linguagem e ao movimento intencional. O cérebro é o sistema integrador, coordenador e
regulador entre o meio ambiente e o organismo, entre cérebro e comportamentoaprendizagem.
Sabe se que, quanto mais se aprende sobre as relações cérebro-comportamento e
cérebro-aprendizagem, melhor será o nível de compreensão e de intervenção sobre a criança
com dificuldades de aprendizagem, tornando-se possível obter melhores recursos para o
diagnóstico e prognóstico do seu potencial de aprendizagem.
A avaliação neuropsicológica comumente se estrutura em uma série de testes e
subtestes, não se deve duvidar que a organização cerebral está muito mais além das
simplificações e abstrações. O valor dos resultados de uma bateria neuropsicológica deve
realizar-se como um dos conceitos de sistemas ou de redes funcionais.
Na avaliação neuropsicológica pode-se seguir diversas orientações e métodos. Em
geral, dois tipos de abordagens são diferenciados:
1-seguindo uma sistematização definida e estandartizada, aplicando a todos os
pacientes de forma sistemática;
2-utilizando uma forma mais flexível, selecionando um conjunto de provas que se
adapte aos problemas e necessidades específicas de cada caso.
O desenvolvimento cognitivo favorece o desempenho da criança na escola. O baixo
rendimento é um problema educacional e social que restringirá a participação do aluno na
vida acadêmica e particular. É preciso promover o autoconceito do/a aluno/a, respeitando
seus diferentes modos e ritmos de aprendizagem para que sintam confiança na sua capacidade
de aprender, ao se perceber aprendendo, quando estimulado a progredir, cada vez mais, a
partir da descoberta das suas potencialidades (HOWSTUFFWORKS, 2007).
Desta forma, cada vez mais são necessários estudos que busquem favorecer a
compreensão das potencialidades da criança e possibilitem estratégias para aprender. As
crianças na faixa etária de 7 a 12 anos, que estão no estágio operacional concreto, vivenciam
um período em que começam a ter a capacidade de pensar de maneira lógica e entender os
conceitos que usam ao lidar com o ambiente ao seu redor. A presente proposta visa atender a
demanda de alunos, ligados a instituições de ensino regular e especial, que apresentem
necessidades de intervenção para minimização do fracasso acadêmico.
JUSTIFICATIVA
A escolarização fundamental é uma fase sensível para o desenvolvimento acadêmico e
vital da criança, pois envolve inúmeras mudanças que ocorrem simultaneamente, requerendo
adaptações nos ambientes, físico, acadêmico, social e psicológico do aluno.
Frente ao acúmulo das demandas, novas e complexas, algumas crianças encontram
dificuldades para superar os desafios, principalmente quando existem condições prévias de
vulnerabilidade.
A avaliação neuropsicológica oferece suporte conceitual e investigativo ao estudo das
condições que contribuem para a adaptação e aprendizado escolar. A Neuropsicologia é uma
ciência voltada para a expressão do comportamento por meio das disfunções cerebrais e
ampara-se na avaliação de determinadas manifestações do indivíduo para a investigação do
funcionamento cerebral.
No estudo da criança e do adolescente deve-se levar em conta os processos de
crescimento e maturação cerebral, o desenvolvimento cognitivo, neuropsicomotor e afetivosocial, bem como as variáveis críticas que determinam e interferem nas habilidades, tais como
o ambiente acadêmico.
No processo avaliativo, a compreensão das habilidades e competências referentes aos
recursos neuropsicológicos possibilita a programação de estratégias reeducativas e a melhoria
de repertórios que favorecem o auto-conceito, o ajustamento escolar e psicossocial da criança
ou do adolescente.
Neste sentido, a literatura tem sido escassa na área do desenvolvimento atípico de
crianças e adolescentes, que freqüentam instituição educacional especializada. Estudos sobre
a aprendizagem e o comportamento adaptativo podem representar referencial acadêmico-
científico contribuinte significativo, na compreensão das dificuldades escolares, com tão alta
incidência nos últimos tempos.
OBJETIVO GERAL
O objetivo deste estudo foi investigar as habilidades cognitivas de crianças com
alterações no desenvolvimento e na conduta psicossocial.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Identificar desempenhos relacionados às áreas cognitivas, motora, perceptiva da
linguagem, memória e afetividade social;
Correlacionar
os
desempenhos
às
funções
corticais,
através
da
análise
neuropsicológica.
METODOLOGIA
Participaram 44 sujeitos na faixa etária de 7 a 12 anos de idade, ambos os sexos, da
pré-escola à 4ª série do ensino fundamental de uma instituição educacional especializada. O
critério para a escolha da população-alvo foi pelas diversas dificuldades apresentadas em
relação à aprendizagem.
Inicialmente foram realizados os procedimentos formais e éticos junto à instituição
escolar para a realização da coleta de dados.
Os instrumentos de avaliação empregados foram:
-Raven. Matrizes Progressivas Coloridas. Avalia o nível mental, independente do
conhecimento adquirido. Composto por 35 estímulos visuais, agrupados em três séries, cada
uma com um conjunto de desenhos, dentre os quais falta um que completa logicamente o
conjunto.
-Avaliação da Personalidade: Fábulas de Düss. Avalia os aspectos cognitivolinguísticos e psicossociais. Na forma verbal, avalia dois aspectos do desenvolvimento:
psicossocial, quando o discurso do examinando é comparado às temáticas e significados de
cada fábula; e o cognitivo, onde as respostas deverão ser construídas com linguagem coerente
e apresentar uma formalidade lógica na estória, adequada. O instrumento é composto por dez
pequenas histórias incompletas, envolvendo as seguintes fábulas: do passarinho, aniversário
de casamento, cordeirinho, enterro ou viagem, medo, elefante, objeto fabricado, passeio com
a mãe ou pai, da notícia e do sonho mau. O Quadro 1 caracteriza as fábulas e os significados,
cognitivo e psicossocial.
Item
F1
F2
F3
F4
F5
F6
F7
F8
F9
F10
Fábula
Um papai e uma mamãe pássaros e seu filhote estavam
dormindo no ninho, quando por causa de um vento ele cai
no chão. A mamãe voa para uma árvore, o papai voa para
outra árvore. O que vai fazer o filhote passarinho? Ele já
sabe voar um pouco.
É uma festa de aniversário do papai e da mamãe. Durante a
festa a criança se levanta e vai ficar sozinha do fundo do
quintal. Por quê?
No pasto estão a mamãe ovelha e seu carneirinho. Todos os
dias eles brincam e ela dá um bom leite quente que ele
adora, mas ele já come capim também. Um dia trouxeram
para a mamãe uma outra ovelhinha, e como ela não tinha
leite suficiente para os dois, pede ao primeiro que vá comer
capim. O que o carneirinho vai fazer?
Um enterro está passando na cidadezinha, sabem que é
alguma pessoa da família que mora naquela casa que
morreu. Quem é que morreu?
Uma criança diz bem baixinho: ‘ai que medo’. De que ela
tem medo?
Uma criança tem um elefantinho que ela gosta muito, com
sua trompa bem comprida. Um dia quando ela volta do
passeio percebe que ele está diferente. O que ele tem de
diferente? Por que está diferente?
Uma criança construiu um objeto de argila que ela acha
lindo. Sua mãe pede o objeto de presente, a criança é livre
para dar ou não dar. O que esta criança vai fazer? Por quê?
Um menino(a) faz um passeio sozinho com sua mãe(pai).
Voltando para casa o menino(a) acha que ela(e) está
estranho. Por quê?
Uma criança volta da escola e sua mãe diz que tem uma
coisa para contar. O que a mãe vai lhe contar?
Uma criança acorda e diz que está muito cansada, porque
teve um sonho mau. Com o que ela sonhou?
Psicossocial
Cognição
Independência
Adequado
Inadequado
Sentimento de inclusão
Maturidade x
Egocentrismo
Sentimentos de perda
Fantasias de perseguição
Enfrentamento do
desconhecido
Generosidade x
Possessividade
Culpa e afeto parental
Desejo x castigo
Relações antecedentes
positivas
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
Adequado
Inadequado
QUADRO 1 – Indicação das fábulas e significados, psicossocial e cognitivo.
-TVIP -Vocabulário por Imagens Peabody (DUNN et al, 1986; CAPOVILLA et al.,
1997). Avalia a linguagem receptivo-auditiva e o repertório lingüístico de crianças e
adolescentes de 6 a 18 anos. Composto por um caderno com 144 itens, com quatro figuras em
cada página, que o examinando deve indicar aquela falada pelo examinador.
A análise dos dados foi feita conforme procedimentos normativos de cada instrumento
utilizado.
RESULTADOS
Os dados foram organizados e categorizados percentualmente. A análise das respostas
de cada instrumento aplicado teve base na teoria cognitiva e neuropsicológica.
Os resultados das provas de nível mental demonstraram nível mental altamente
prejudicado em 86,4% dos sujeitos, com classificação abaixo da média, conforme Tabela 1.
Classificação
Superior
Acima da Média
Média
Abaixo da Média
Deficiente
Percentil
= ou > 95
75 e 90
25 a 75
25 a 10
= ou > 5
Quantidade Sujeitos
0
0
Acima de 50 = 2
Abaixo de 50 = 1
Acima de 25 = 3
Igual a 25 = 2
Abaixo de 25 = 6
Acima de 10 = 5
Igual a 10 = 1
Abaixo de 10 = 1
Igual a 5 = 4
Abaixo de 5 = 19
Total Percentual
0
0
13,6
34,2
52,2
Tabela 1 – Representação dos resultados obtidos na prova de nível mental (Raven).
Os dados demonstram níveis cognitivos espaço-lógico-temporal, atencional e relacionado
à memória operacional, importantes em tarefas acadêmicas de leitura, escrita e aritmética, com
classificação abaixo do esperado para a média, evidenciando dificuldades relacionadas ao domínio
espaço-temporal e generalização de informações necessárias para a compreensão lógico-abstrata.
Na avaliação das condutas adaptativas, foi constatado que 66% dos sujeitos demonstraram
comportamentos de dependência ao meio afetivo e social; 42,07% mostraram respostas
indicativas de egocentrismo e possessividade em relação a objetos e pessoas, com dificuldades na
expressão de comportamentos cooperativos, de troca e afinidades nas relações. Foram
identificados 41,65% de sujeitos com prejuízo no auto-conceito, com sentimentos de
insegurança e inadequação na relação com o meio, medos indicativos de perdas parentais e de
figuras com grande valência afetiva. O estudo identificou que 68,18% dos sujeitos
apresentaram fantasias características de fases primárias do desenvolvimento, tais como,
medo do escuro, do “bicho papão”, etc.
A média cognitiva foi de 74%, o que representa um índice satisfatório do grupo em
estratégias de adaptação às situações cotidianas, não relativas à aprendizagem formal. A
média psicossocial foi de 45%, representando escores inferiores quanto ao comportamento
afetivo relacionado à maturidade social. Desta forma, situações psicológicas, como em
conflitos familiares e pessoais, mostraram-se mais dificultosas para o grupo deste estudo.
Na Tabela 2 são apresentados os percentuais de desempenho cognitivo adequado à
faixa etária estudada e de adequação psicossocial frente à resolução de problemas adaptativos.
ITEM
F1
F2
F3
F4
F5
F6
F7
F8
F9
F10
COGNIÇÃO
84,1
79,5
79,5
68,1
79,5
50,0
86,4
59,1
79,5
75,0
PSICOSSOCIAL
34
2,3
54,5
63,6
18,2
47,7
61,3
47,7
45,4
75,0
Tabela 2 – Resultados percentuais cognitivos e psicossociais (Duss)
Desta forma, os dados sugerem a imaturidade cognitiva e psicossocial dos
participantes, pelas dificuldades em lidar com estímulos novos e reais do ambiente imediato.
Os desempenhos prejudicados relacionados ao comportamento adaptativo demonstraram
disfunção de áreas neuropsicológicas frontais e límbicas do córtex, responsáveis pelo
processamento de informações estratégicas, de planejamento e escolhas com julgamento
moral.
Recursos cognitivos-lingüísticos incipientes caracterizaram condições também
desfavoráveis
para
o
processamento,
retenção
e
generalização
de
informações,
conseqüenciando em perdas na produtividade dos sujeitos.
A Tabela 3 apresenta os valores referentes aos desempenhos dos sujeitos nas provas
lingüísticas.
Critérios
Não aplicável
Abaixo de 55
55-69
70-84
85-114
115-130
131-145
Classificação
Crítico
Extremamente baixo
Moderado
Média
Moderadamente alto
Extremamente alto
Nº Sujeitos
03
16
14
06
05
0
0
Tabela 3- Valores referentes aos desempenhos dos sujeitos nas provas linguísticas
Percentual/Sujeitos
6,9
36,2
31,9
13,7
11,3
0
0
O repertório cognitivo-lingüístico foi extremamente baixo para 31,9% dos sujeitos,
tendo o grupo um léxico básico, receptivo e expressivo, principalmente em falas objetivas e
do cotidiano da criança.
Da amostra, somente 11,3% atingiram a média lingüística compatível com a faixa
etária. Desta forma, os recursos de linguagem mostraram-se em níveis primários, sendo a
competência receptiva superior à expressiva.
DISCUSSÃO
Os sujeitos que compuseram a amostra do estudo demonstraram repertórios
relacionados ao desenvolvimento mental com prejuízos em todas as áreas corticais superiores
cerebrais, tendo em vista os valores médios obtidos nas tarefas instrumentadas no processo
avaliativo.
Indivíduos com atraso no desenvolvimento cognitivo comumente apresentam
alterações na linguagem, tanto a receptiva quanto a expressiva. Para algumas crianças, no
entanto, a habilidade de se comunicar é influenciada por fatores relacionados não somente ao
desenvolvimento, mas a fatores ambientais.
Quando a criança apresenta um grau eficiente de socialização, tende a desenvolver
mais rapidamente a linguagem do que crianças que apresentam o isolamento como forma de
comportamento padrão.
Outro fator a ser considerado é da criança que não apresenta malformação severa, pois
estão muito mais propensas a adquirir habilidades expressivas de linguagem do que outras que
não se enquadram neste critério.
O estudo constatou, confirmando os dados da literatura, que crianças com atraso
cognitivo, cujas habilidades de comunicação e socialização estão menos prejudicadas,
apresentam um melhor perfil de desenvolvimento e melhor performance em tarefas dirigidas.
O comportamento dependente de tarefas do cotidiano, relacionadas ao autocuidado ou
mesmo à mobilidade, são mais freqüentes em crianças que apresentam atraso cognitivo, pois
teriam maior dificuldade em se relacionar e socializar. Os resultados obtidos no presente
estudo mostraram que as áreas relacionadas à socialização e ao autocuidado apresentaram
escores prejudicados.
A falta de estimulação adequada, a acomodação ou desmotivação da família, atreladas
a limitação do indivíduo e às características de personalidade, podem fazer toda a diferença
quando considerada a faixa cronológica e de desenvolvimento.
Dependendo da extensão, grau e tipo de deficiências associadas ao desenvolvimento, a
criança pode acomodar-se em uma condição desfavorável de dependência, levando a família,
por extensão, a adotar os mesmos princípios, o que poderá refletir na qualidade de vida e na
baixa otimização de recursos tróficos do sujeito.
CONCLUSÃO
O repertório de habilidades e competências cognitivas, lingüisticas e psicossociais das
crianças participantes do estudo mostrou-se defasado com relação à idade e escolaridade,
sugerindo recursos neuropsicológicos limitados ao ajustamento afetivo e social.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ANDRADE, F.H.S. (org.) Neuropsicologia hoje. São Paulo: Artes Médicas, 2004.
MEYERHOFF, M (trad. HowStuffWorks). Desenvolvimento cognitivo e social de um
recém-nascido. Ed.D. ". Publicado em 13 de julho de 2006 (atualizado em 19 de março de
2007).
Acesso
em:
http://saude.hsw.uol.com.br/compreendendo-o-desenvolvimentocognitivo-e-social-deum-recem-nascido3.htm, dia 08 de Nov. 2007.
TABAQUIM, M.L. Avaliação Neuropsicológica: Estudo Comparativo de crianças com
paralisia cerebral hemiparetica e distúrbios de aprendizagem. Tese (Doutorado Ciência
Medicas) -Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP. 2002.
MELLO, C.B. (org.) Neuropsicologia do desenvolvimento. São Paulo: Memnon, 2005.
STERNBERG, R. J. Psicologia cognitiva. Porto Alegre: Artes Médicas Sul, 2000.
Download

avaliação neuropsicológica de crianças com alterações no