Augusto dos Anjos
(1884 – 1914)
Augusto dos Anjos
Única obra: Eu (1912)
Augusto dos Anjos
 Trata-se de um caso à parte da poesia
brasileira. Autor de grande sucesso popular,
foi ignorado por certa parcela da crítica, que
o julgava mórbido e vulgar.
Augusto dos Anjos
 A classificação de sua obra = parnasiana ou
simbolista?
 Parnasiana = domínio técnico e o gosto
pelo soneto.
 Simbolista = fascinação pela morte, a
angústia cósmica e o emprego de ousadas
metáforas.
Autor essencialmente prémodernista?
 Pré-modernista ele o é na mistura de estilos
(parnasiano na forma + simbolista no tema
+ naturalista na linguagem cientificista), na
linguagem corrosiva, no coloquialismo e na
incorporação à literatura de todas as
“sujeiras” da vida.
A visão da morte
 A tuberculose marcou-o a ferro e fogo.
Estaria assim explicado, de um ponto de
vista biográfico, sua obsessão pela morte,
em seus aspectos mais chocantes:
podridão, cadáveres fétidos, corpos
decompostos, vermes famintos e miasmas
de cemitério (emanação pútrida = aroma
podre).
A visão da morte
 Diante de tanta imundice, o artista –
dominado pelo niilismo = pessimismo –
questiona a falta de sentido da experiência
humana e expressa um nojo amargo e
desesperado pelo fim inglório a que a
natureza condena o ser humano.
A visão da morte
 A angústia diante da morte transforma-se
em uma espécie de metafísica do horror: o
homem é apenas matéria que passa, que
entra em putrefação e que depois
desaparece.
A linguagem cientificista
 Um dos aspectos mais estranhos e
perturbadores da poesia de Augusto dos
Anjos está no fato de ela vir revestida de
uma linguagem carregada de termos
científicos.
A linguagem cientificista
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“A miséria anatômica da ruga.”
“A lógica medonha/dos apodrecimentos musculares.”
“A bacteriologia inventariante.”
“O cancro (tumor) assíduo na consciência.”
“Engrenagem de vísceras vulgares.”
“A mucosa carnívora dos lobos.”
“Os sanguinolentíssimos chicotes da hemorragia.”
“Poeta, poeta malsão (doentio), criado com os sucos
de um leite mau...”
A linguagem cientificista
 A retórica delirante do poeta não se esgota,
contudo, nas referências cientificistas. Uma
quantidade inesgotável de metáforas
inesperadas percorre seus versos,
intensificando-lhes a genialidade ou o mau
gosto, conforme a opinião de cada leitor.
A linguagem cientificista
 Para o poeta e crítico Ferreira Gullar, a
poesia de Augusto dos Anjos possui um
caráter inovador “porque ela rompe com as
conveniências verbais e sociais” e leva o
poeta pré-modernista “a mesclar a beleza e
o asco”. Gullar conclui que muitas vezes o
estilo prosaico triunfa, e o escritor paraibano
adquire súbita modernidade, como em
Budismo moderno:
Budismo moderno
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Tome, Dr., esta tesoura, e... Corte
Minha singularíssima pessoa.
Que importa a mim que a bicharia roa
Todo o meu coração, depois da morte?!
 Ah! Um urubu pousou na minha sorte!
Psicologia de um vencido
 Eu, filho do carbono e do amoníaco,
Monstro de escuridão e rutilância,
Sofro, desde a epigênese da infância,
A influência má dos signos do zodíaco.
 Profundissimamente hipocondríaco,
Este ambiente me causa repugnância…
Sobe-me à boca uma ânsia análoga à ânsia
Que se escapa da boca de um cardíaco.
Psicologia de um vencido
 Já o verme — este operário das ruínas —
Que o sangue podre das carnificinas
Come, e à vida em geral declara guerra,
 Anda a espreitar meus olhos para roê-los,
E há de deixar-me apenas os cabelos,
Na frialdade inorgânica da terra!
Psicologia de um vencido
 Síntese da morbidez associada ao linguajar
cientificista e à ousadia das imagens.
 Presença de vocábulos tradicionalmente
considerados antipoéticos.
 Visão pessimista da vida e do homem, visto
que este é matéria e tudo caminha para a
destruição.
 A morte é considerada o destino final e fatal
de toda forma de vida.
Psicologia de um vencido
 Obcecado com a idéia das forças da
matéria, que pulsam em todos os seres e
conduzem ao “nada” absoluto, o poeta usa
o verme como símbolo desse processo de
decomposição.
Versos íntimos
 Vês! Ninguém assistiu ao formidável
Enterro de tua última quimera.
Somente a Ingratidão - esta pantera Foi tua companheira inseparável!
 Acostuma-te à lama que te espera!
O Homem, que, nesta terra miserável,
Mora, entre feras, sente inevitável
Necessidade de também ser fera.
Versos íntimos
 Toma um fósforo. Acende teu cigarro!
O beijo, amigo, é a véspera do escarro,
A mão que afaga é a mesma que apedreja.
 Se a alguém causa inda pena a tua chaga,
Apedreja essa mão vil que te afaga,
Escarra nessa boca que te beija!
Versos íntimos
 As divagações metafísicas e a expressão
de uma angústia existencial são as
características mais fortes da poesia de
Augusto dos Anjos.
 O sofrimento nasce da desilusão provocada
pela impossibilidade de contar com a
solidariedade humana.
Versos íntimos
 A crença na quimera – fantasia, sonho,
ilusão – resume a causa para a desilusão
humana.
 No poema, o eu lírico dirige-se aos leitores
para afirmar a impossibilidade de uma vida
feliz.
Versos íntimos
 Além da morte dos sonhos, as pessoas
estão condenadas à mais irremediável
solidão.
 Os gestos de solidariedade devem ser
vistos como sinal da desilusão futura.
 É esse o contexto que explica o terrível
conselho final: “Escarra nessa boca que te
beija.”
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Augusto dos Anjos (1884 – 1914)