Unidade Curricular: HISTÓRIA DA CULTURA PORTUGUESA
Ano: 2º / Semestre: 1º
Horas de contacto: 45
Créditos: 5
Horas de trabalho individual: 95
Total de horas: 140
Docente: José Luís Braga
Hora de atendimento:
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
1
Programa Sucinto (1)
1.
Conceito antropológico de Cultura. Fundamentos da
cultura portuguesa – a visão etnológica de Jorge Dias.
2.
A cultura e a arte portuguesa a partir de uma perspectiva
histórica:
i.
Dos primórdios da nacionalidade ao final do século
XV (instituições escolares; a língua e a escrita; o
lirismo galego-português);
ii.
A cultura no séc. XVI (o renascimento e o
humanismo em Portugal);
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Programa Sucinto (2)
iii. A época barroca (mentalidade, literatura e
ensino);
iv. A cultura das luzes;
v. O séc. XIX: o movimento romântico, a reforma
do ensino;
vi. A cultura no século XX (1ª República, Estado
Novo, o período democrático).
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Resultados da aprendizagem (1)
• Os alunos que concluam com sucesso esta unidade
curricular deverão ser capazes de:
– Conhecer e contextualizar os movimentos culturais
mais relevantes da sociedade portuguesa nas suas
diferentes expressões e vertentes, tendo
percepção dos seus ritmos de evolução e
desenvolvimento;
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Resultados da aprendizagem (2)
– Reconhecer a diversidade e pluralidade de facetas
da cultura portuguesa, com uma sensibilização
para os seus problemas e valores, a Língua e o
património em todas as suas vertentes;
– Conhecer e interpretar as principais manifestações
e vectores culturais e artísticos da
contemporaneidade portuguesa.
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Módulo 1
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA:
DIAS, Jorge – O essencial sobre os Elementos
Fundamentais da Cultura Portuguesa, Lisboa: IN-CM,
2004 [d.l.].
BURNS, Peter – Introduction to Tourism and
Anthropology, New York: Routledge, 1999.
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Módulo 1
ENDEREÇOS NA INTERNET
www: <URL: http://www.infopedia.pt>
www: <URL: http://pt.wikipedia.org>
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Conceito antropológico de Cultura (1)
• Para os antropólogos a cultura é uma preocupação
fundamental.
• Segundo Burns, a cultura inclui relacionamentos familiares,
identidades étnicas, tecnologia, condição de género,
migração e exclusão: tudo o que compõe a sociedade
humana.
• A partir de um ponto de vista simplista, podemos dizer que a
cultura é tudo, incluindo a experiência transmitida
socialmente, instituições sociais, ciência, arte, etc.
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Conceito antropológico de Cultura (2)
• O conceito de cultura assume uma panóplia de
significados de acordo com o contexto. Se nos
encontramos num museu ou numa galeria, a palavra
pode ter a acepção de arte grandiosa.
• O indivíduo que é conhecedor de arte e música é
denominado, em algumas sociedades, de culto.
Contudo, trata-se de um uso particular da palavra, que
não define o que a cultura é.
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Conceito antropológico de Cultura (3)
• A cultura pode ser definida como um todo complexo
que inclui conhecimento, crença, arte, direito moral,
costume e quaisquer outras capacidades e hábitos
adquiridos pelo homem enquanto membro de uma
sociedade. [Tylor apud Burns]
• Esta definição é importante, no entender de Burns,
porque o que a ela subjaz é que cultura é bem mais
do que cultura material.
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Conceito antropológico de Cultura (4)
• A palavra-chave na definição de Tylor é adquirido,
fazendo uma distinção muito precisa entre as
características que poderão ter sido herdadas
biologicamente e aquelas que foram adquiridas
através da aprendizagem.
• Assim, de acordo com esta definição, cultura diz
respeito à interacção entre pessoas e de como
estas aprendem umas com as outras.
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Conceito antropológico de Cultura (5)
• A mesma definição promove a ideia de que a aprendizagem
pode ser acumulada, assimilada e transmitida através de
um conjunto de tradições orais e escritas.
• A ilação que se deve tomar deste arrazoado é a de que a
cultura é observada simultaneamente através de relações
sociais e de artefactos materiais.
• A cultura consiste em padrões de comportamento,
conhecimento e valores que foram adquiridos e
transmitidos através de gerações.
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Conceito antropológico de Cultura (6)
• Geert Hofstede descreve diferentes camadas de
cultura [apud Burns]:
 Um nível nacional conforme o país de cada um;
 Uma filiação regional e/ou étnica e/ou religiosa
e/ou linguística (uma vez que as nações podem
ser compostas de diferentes regiões com
agrupamentos étnicos/linguísticos/religiosos
únicos);
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Conceito antropológico de Cultura (7)
 Um nível de género;
 Um nível geracional;
 Um nível de classe social, associado a oportunidades
educacionais, à profissão e à ocupação de uma pessoa;
 Para aqueles que estão empregados, um nível
organizacional e corporativo de acordo com a forma
como os empregados foram sociabilizados pela sua
estrutura laboral.
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Conceito antropológico de Cultura (8)
• De acordo com Burns, existe um potencial problema
com a primeira observação de Hofstede acerca da
identificação de cultura com a nação.
• Se anuirmos à ideia de que a cultura é própria de certos
agrupamentos ou de uma sociedade, também temos de
concordar que num estado-nação complexo, pluralista e
moderno (como a Indonésia, Malásia, Estados Unidos
ou Grã-Bretanha) não existe uma só cultura.
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Conceito antropológico de Cultura (9)
• Para os antropólogos, a sociedade (e portanto a
cultura) muda em resposta ao ambiente e à tecnologia.
A transmissão de conhecimento e comportamento
através de gerações implica que a cultura é dinâmica:
todas as culturas mudam com o tempo.
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Componentes da cultura
Cultura ao nível das
normas ideais
Educação e
outras estruturas
para transmitir
conhecimento e
gerar novo
conhecimento
Linguagem,
categorização,
percepção do
mundo ao redor
e comunicação
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Religião, mitos,
heróis, valores,
atitudes,
normas,
ideologias
Cultura:
Conjunto de regras e padrões
Partilhados por uma sociedade
que produz comportamento
julgado aceitável por esse grupo
Sistema político
e legal, formal e
informal para
resolução de
conflitos e controle
social
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Organização
social incluindo
relações género/
idade, padrões
laborais,
parentesco
Economia,
tecnologia e
cultura
material
Cultura ao nível das
transações observáveis
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (1)
• Fixar os elementos fundamentais de uma cultura
constitui o fim máximo a que a etnologia (estudo
dos povos quanto aos caracteres psíquicos e
culturais) se propõe.
• A amplidão e a complexidade desta missão torna
difícil formar uma visão panorâmica da cultura
portuguesa – que é o objectivo deste módulo – com a
solidez científica indispensável.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (2)
• Se definir os elementos culturais de uma sociedade tribal
requer já um longo trabalho de análise e boas qualidades de
observação, interpretação e síntese, o que não será
estabelecer as bases culturais permanentes dum povo
estratificado e com oito séculos de história?
• Acresce que não está demonstrada a perenidade de
características através do tempo, nem tampouco que a
tradição cultural apresente a estabilidade rígida que muitos
lhe atribuem.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (3)
• A herança cultural de um povo é permeável a
influências do exterior – aculturações – e a
modificações de estrutura determinadas pela sua
própria evolução.
• Acresce que é consabido quão diversas culturalmente
são as várias regiões naturais da nação portuguesa.
Esta heterogeneidade é ainda acentuada pelas
diferenças culturais próprias dos estratos sociais
que a compõem.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (4)
• A heterogeneidade cultural que se verifica-se no
espaço – sincrónica – e no tempo – diacrónica –, é
ainda complexificada pela heterogeneidade vertical
dos vários estratos sociais.
• Aqui chegados, pode parecer que o problema se
apresenta sem solução. É contudo inegável que os
vários povos denotam diferenças sensíveis entre
si, que, não obstante sejam difíceis de definir, nos
garantem não ser infrutífero tentar.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (5)
• Quando examinamos a cultura de um povo civilizado,
composto por um conjunto de áreas culturais distintas
e de classes estratificadas, não nos podemos deter
nas formas e instituições, devemos antes perscrutarlhe o conteúdo espiritual.
• «Só ele deixa compreender a evolução cultural de um
povo, porque esse conteúdo espiritual pode ter
carácter de permanência através das
transformações morfológicas e ideológicas que se vão
sucedendo no tempo.» [Dias]
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (6)
• A única constante dum povo é, nas palavras do
etnólogo Jorge Dias, o seu fundo temperamental e
não os múltiplos aspectos de que a sua cultura se
reveste, porque é ele que os selecciona e transforma
segundo a sua sensibilidade específica.
• Sem embargo, nem sempre existe uma constante
temperamental-base nas nações de composição
heterogénea.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (7)
• Por vezes, há várias mentalidades em disputa real
ou latente, que com a prossecução da história, vão
tomando alternadamente a orientação do conjunto.
• É necessário compreender o modo como se processa
tal fenómeno, já que, muitas vezes, podem tomar-se
como características de um povo aspectos culturais
de uma só região.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (8)
• Ainda pode acontecer que tomemos por cultura nacional
as características duma classe que deixou de ser a
expressão superior de todo o povo, para ser tão-só uma
autocracia que impõe a esse povo normas de conduta e cuja
cultura não corresponde à personalidade-base da nação.
• Existem povos cuja homogeneidade das partes que os
integram e a colaboração extensiva de indivíduos de
todas classes, por um elevado nível de instrução geral,
tornam particularmente simples o estudo da sua cultura. É
este o caso da Holanda e das nações escandinavas.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (9)
• Noutros casos, as diferenças regionais muito vincadas
impossibilitaram ou constituíram entraves à
unificação, que só se fez tardiamente ou por
imposição mais ou menos forçada de uma dessas
regiões sobre as outras.
• Constituem exemplos deste caso a Alemanha e a
Itália, onde ainda hoje se conservam dialectos e
formas de cultura superior que são simplesmente
regionais.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (10)
• De qualquer forma, a unificação das nações com
regiões culturais heterogéneas tem de se apoiar num
vigoroso elemento polarizador das energias
nacionais.
• A maior parte das vezes esse elemento é político e
resulta de uma imposição, mais ou menos violenta,
dos padrões de cultura duma província às outras que
com ela formam um conjunto nacional.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (11)
• Na Alemanha foi a Prússia e em Espanha Castela que
cumpriram esse papel unificador. Portugal, no entanto,
apresenta uma interessante particularidade de
unificação.
• «Embora a origem da Nação se deva também à política,
à vontade dum príncipe, que naturalmente se aproveitou
de certas aspirações de independência latentes nas
populações de Entre Douro e Minho, a unificação e a
permanência da Nação deve-se ao mar.» [Dias]
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (12)
• Foi o Atlântico um grande reclamo que aglutinou no
litoral a maior densidade de população portuguesa do
Norte, criando como que um vácuo para o interior.
• «Desde Caminha a Lisboa estabeleceram-se inúmeras
amarras que defenderam Portugal da força centrípeta
de Castela. Mas foi sobretudo o estuário do Tejo, esse
forte abraço do mar com a terra, que definitivamente
presidiu aos destinos de Portugal.» [Dias]
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (13)
• Não se verificou o domínio de uma região sobre as
outras, antes se congregaram todas num ponto
natural de convergência.
• É por isso que ao, contrário de Berlim ou de Madrid,
capitais sitas no centro de regiões dominadoras,
Lisboa, na foz do Tejo, está mais escorada no mar
do que na terra.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (14)
• Acresce ao que ficou acima dito, Lisboa ser formada por
habitantes provenientes de todas as províncias do País,
quase sem predomínio de nenhuma delas. A este facto deve
Portugal certa homogeneidade cultural permanente, para
Jorge Dias.
• Todavia, não se pode escamotear o facto de existirem ainda
hoje, a par da cultura nacional, regiões naturais muito bem
determinadas, com culturas próprias bem caracterizadas.
Resultado, não só de condições ambientais diversas, como
de ascendência cultural e possivelmente ética distinta.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (15)
• «Convém recordar que muitas características
atribuídas aos Portugueses não passam de meros
aspectos culturais duma só região.» [Dias]
• Se é certo que existe uma cultura com fundas raízes,
também é verdade que nem todos nela participam,
uma vez que, por razão de educação e instrução, boa
parte da população (sobretudo rural) apreende
sobretudo a cultura tradicional da sua região.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (16)
• A cultura nacional é uma manifestação do espírito
colectivo e resulta da combinação de múltiplos
elementos. No instante em que na combinação
ingressem elementos novos, ou faltem outros, o
composto que daí resulta já não pode ser o mesmo.
• O que resulta não é a soma de todos os elementos,
mas um corpo novo, com características próprias.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (17)
• Ou seja, se a cultura de um povo encerra em si,
transformados, todos os elementos que a constituem –
culturas locais – nem por isso esses elementos, tomados
isoladamente, permitem compreender o conjunto.
• No caso particular português, a cultura superior não é
igualmente um somatório das diferentes culturas regionais,
mas uma integração destas, de que resultou uma coisa nova
na qual elas estão contidas, embora transformadas por uma
espécie de fenómeno de sublimação espiritual.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (18)
• Enquanto a cultura local tem uma índole quase ecológica e
resulta do conflito entre a vontade do homem, o ambiente e
a tradição, a cultura superior transpõe esse conflito para o
plano espiritual, uma vez que o ambiente natural é
substituído pela história.
• «Os factores mesológicos (i.e. parte da biologia que trata
das relações entre os organismos e os meios em que eles
vivem) continuam a actuar, mas de uma maneira menos
visível e, em parte, já contidos nas culturas regionais, que
dão o seu contributo para a cultura superior.» [Dias]
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (19)
• Deve-se, assim, analisar cautelosamente as partes
sem cair no erro de as tomar pelo todo.
• É possível que os povos de outros países (Brasil,
EUA, França e Marrocos) tenham uma ideia dos
portugueses que corresponde essencialmente ao
Minhoto, ao Transmontano, ao Beirão, ao Açoriano ou
ao Algarvio, etc. e não ao Português-base.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (20)
• Ainda que a Reconquista se tivesse processado no sentido
Norte-Sul e muitos territórios tivessem sido povoados com
gente do Norte – ou esta se tivesse misturado em
proporções variáveis com populações autóctones – tal não
obstou a que se formassem regiões culturais distintas.
• Contribuiu para isso o substrato cultural anterior, bem
como a acção dos agentes naturais, distintos nas várias
regiões.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (21)
• «Se os factores mesológicos são insuficientes para
explicar os fenómenos culturais, nem por isso
podemos negar a sua acção profunda.» [Dias]
• Para Jorge Dias, a cultura portuguesa tem um
carácter essencialmente expansivo, determinado
em parte por uma localização geográfica que lhe
confere a missão de «estreitar os laços entre os
continentes e os homens.»
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (22)
• Todavia, a expansão portuguesa, ao contrário da espanhola,
é mais marítima e exploradora do que conquistadora.
• Desde muito cedo existem notícias de navegadores
portugueses e, entre as medidas de fomento comercialmarítimo, avulta a criação da bolsa de mercadores, por D.
Dinis (1293), e da Companhia das Naus, que veio a ser a
primeira companhia de seguros marítimos (séc. XIV).
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (23)
• A força de atracção exercida pelo Atlântico, «esse
grande mar povoado de tempestades e de mistérios,
foi a alma da Nação e foi com ele que se escreveu a
história de Portugal.» [Dias]
• Já seriam visíveis, na literatura portuguesa medieval,
motivos marítimos em profusão, que estariam
ausentes de qualquer outra literatura latina.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (24)
• Mas só depois de os portugueses terem realizado o
grande empreendimento dos descobrimentos é que a
arte portuguesa atingiu o seu paroxismo, enquanto
glorificação das empresas marítimas.
• Os quatro pilares do génio criador português
segundo Jorge Dias são: Os Lusíadas, os Jerónimos,
o Políptico de Nuno Gonçalves e os Tentos de Manuel
Coelho.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (25)
• Para Dias estas são quatro formas de expressão,
sumamente superiores e originais, dum povo que
por mais de um século sulcou todos os mares e se
enlevou perante as naturezas mais variadas e
exóticas.
• Se é certo que a situação geográfica portuguesa
contribuiu indubitavelmente para a índole expansiva
da cultura portuguesa, ela só por si é insuficiente para
explicar tudo.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (26)
• A este factor temos de juntar a feição psíquica
portuguesa e a maneira como esta actuou perante as
circunstâncias.
• «A personalidade psicossocial do povo português é
complexa e envolve antinomias (contradições)
profundas, que se podem talvez explicar pelas
diferentes tendências das populações que formaram o
País.» [Dias]
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (27)
• A nível geográfico, Portugal representa um ponto de
convergência natural das linhas de navegação entre
Europa, África e a América. A nível étnico, a sua
população é formada pela fusão de elementos do Norte
e do Sul.
• A despeito da relativa homogeneidade hodierna da
população, no Norte do País abundam elementos da
Europa Setentrional e Central (celtas e germanos), ao
passo que no Sul prevalecem os elementos do Sul da
Europa e do Norte de África (mediterrâneos e berberes)
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (28)
• A situação geográfica de Portugal, no extremo sudoeste da
Europa e perto de África, parecia destinar o país a servir de
charneira das mais variadas raças.
• Umas oriundas dos confins do Mediterrâneo, como os
Fenícios (atingiram o Atlântico no século XI a. C.), que lhe
disputaram os portos, outros do extremo norte, como os
Normandos, que lhe invadiram as costas (séc. IX d. C.).
• Contudo, a influência destes povos foi superficial e limitouse ao litoral.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (29)
• As invasões celtas, sobretudo a partir do séc. VI a.
C. foram mais importantes. «Estes povos, senhores
da técnica do ferro e da superioridade militar e
económica que daquela derivava, acabaram por se
fundir com a raça autóctone.» [Dias]
• Os Lusitanos, que derivaram desta fusão, eram um
povo rude, sóbrio e surpreendentemente resistente e
aguerrido. Os Romanos quando pretenderam
conquistar a Península Ibérica, viram abortar umas
atrás das outras as tentativas para os dominar.
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Conquista romana da península ibérica
Fonte: wikipédia
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (30)
• Só mais de um século após, com a vinda de Augusto
à Península, foi possível submeter, em 29 a. C., este
povo indómito que teve em Viriato (?-139 a. C.), cujas
campanhas chegaram a atingir o Norte de África, o
seu herói.
• Quando os povos bárbaros, romperam o limes
(fronteira) e começaram a invadir o império romano
em hordas sucessivas, a estrutura étnica e cultural
das populações do nosso território sofreu de novo
uma transformação.
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Invasões Bárbaras do Império Romano
Fonte: wikipédia
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (32)
• No dealbar do séc. V, os Suevos distribuem terras entre si
e fixam-se na actual província do Entre-Douro-e-Minho.
Estes povos que partiram pouco tempo antes do coração
da actual Baviera, trouxeram com as suas mulheres e filhos
os usos e costumes e as técnicas agrárias do seu país.
• Paulatinamente, fundem-se com as populações anteriores,
formando um reino que tinha Braga como capital. O reino
dos Suevos sucumbe às investidas dos Visigodos, seus
irmãos de sangue, mas mais pragmáticos nas artes da
guerra e da política.
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (33)
• Os Visigodos acabam por dominar toda a Península, durante
o século VI d. C., constituindo um grande reino cristão. Sem
embargo, logo nos inícios do século VIII, em 711, os
Árabes, impelidos por um vivo impulso religioso, lançam-se
na Península e conquistam-na a uma velocidade vertiginosa.
• Porém, à medida que ampliam o seu domínio, vão perdendo
ímpeto e, ao fim de alguns anos, o núcleo de resistência
cristã, formado nas Astúrias (norte da Península Ibérica)
começa a rechaçar o inimigo.
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História da Cultura Portuguesa
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Invasão muçulmana da Península
Ibérica (711-714)
Fonte: wikipédia
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (34)
• Desta forma, vão se formando novos reinos cristãos,
entre os quais Portugal. O nosso País nasce desta
peleja contra os Mouros. Trata-se de uma guerra
política e religiosa.
• «Enquanto se reconquista o solo da Pátria expulsase o inimigo da Fé. Atrás do conquistador vai logo o
lavrador e constrói-se o templo.» [Dias]
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Reconquista Cristã
Fonte: wikipédia
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Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (35)
• Em 1249 cessava a luta, com a conclusão da
conquista do Algarve. Nesta altura já se havia
repovoado boa parte dos territórios e, além de
inúmeras capelas românicas, já se haviam erguido as
Sés de Braga, Porto, Coimbra, Lisboa e Évora.
• Havia chegado o momento de ir mais além. Não no
espaço, que não sobejava, mas na organização
interna do país.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
55
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (36)
• «Os reis que se seguem cuidam das letras, da justiça, e
promovem medidas de fomento agrícola e de
alcance marítimo. Em 1290 fundam-se os Estudos
Gerais, o embrião da Universidade portuguesa. Nos
finais do séc. XIII Portugal já exportava cereais.» [Dias]
• Algum tempo depois, os nossos vizinhos espanhóis
começaram a ambicionar tomar Portugal. Surgem de
novo confrontos e incertezas, que cessam com a vitória
decisiva dos portugueses em 1385, no campo de
Aljubarrota.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
56
Representação medieval da
Batalha de Aljubarrota
Fonte: wikipédia
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
57
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (37)
• Esta afirmação da força nacional parece ter
despertado novas energias e toma forma a ideia de
afrontar o inimigo de tantos séculos no norte de
África.
• Nesta altura, Portugal já dispunha de embarcações
que lhe possibilitavam empreender uma expedição
militar ao Norte de África e, em 1415, conquistar
Ceuta aos Mouros.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
58
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (38)
• Era o início do período de expansão marítima. Em 141819 descobre-se a ilha da Madeira, seguindo-se os
Açores, depois prossegue-se a exploração da orla
costeira africana, com o fito de chegar à Índia pelo mar,
ao mesmo tempo que se enviam exploradores por terra.
• «Desde então, até aos nossos dias, toda a cultura
portuguesa está impregnada de influências marítimas e
ultramarinas.»
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
59
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (39)
• A história de Portugal testemunhou um período
excepcionalmente glorioso, que agora definitivamente
pertence ao passado. Uma das nações mais pequenas
da Europa governou um dos maiores impérios de
sempre e teve a maior armada da época.
• Portugal já há muito perdeu a sua preponderância à
escala global. A grandeza e a decadência das nações
tanto se devem à evolução íntima do seu povo como à
trama dos acontecimentos.
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História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
60
Descobrimentos e explorações
portuguesas
Fonte: wikipédia
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
61
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (40)
• Jorge Dias procede agora à definição das constantes
culturais do povo português, fá-lo cotejando as
características culturais actuais com aquelas que a
história nos proporciona, em função da sua
personalidade-base.
• A religiosidade do português apresenta um fundo
humano que nos é peculiar. Não tem o carácter
abstracto, místico ou trágico peculiar ao espanhol,
mas possui uma firme fé no milagre e nas soluções
milagrosas.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
62
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (41)
• O português evidencia uma extraordinária
capacidade de adaptação a todas as coisas, ideias e
seres, sem que tal envolva uma perda de carácter.
• Foi este aspecto que lhe permitiu conservar sempre a
atitude de tolerância (esta afirmação de Dias é
discutível) e que conferiu, de acordo com aquele
antropólogo, um timbre único à colonização
portuguesa: a assimilação por adaptação.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
63
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (42)
• O português carece também da exuberância e da alegria
espontânea e ruidosa dos povos mediterrâneos. É mais
inibido do que os outros meridionais pelo grande
sentimento do ridículo e receio da opinião alheia que
evidencia.
• O português comunga de um estado de alma sui generis
a que designa saudade.
• A saudade umas vezes é um sentimento poético de
fundo amoroso ou religioso que se compraz na repetição
das mesmas imagens ou sentimentos.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
64
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (43)
• Outras vezes é a avidez incessante da distância, de outros
mundos, outras vidas. «A saudade é então a força activa, a
obstinação que leva à realização das maiores empresas.»
• Em épocas de desânimo e de desaire, a saudade toma um
matiz especial, em que o espírito se nutre morbidamente das
glórias pretéritas e sucumbe ao fatalismo, que tem como
eminente expressão o fado, canção citadina, cujo nome
advém do étimo latino fatu (destino, fadário, fatalidade).
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
65
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (44)
• Na nossa história, em épocas excepcionais, quando
os acontecimentos históricos puseram à prova o valor
do povo, ou lhe franquearam perspectivas novas, que
o insuflaram de esperança, então surgiram por si,
naturalmente, as melhores obras do seu génio.
• No entanto, em épocas de estagnação, irrompe a
apatia do espírito ou sucumbe-se à saudade negativa,
espécie de intensa melancolia, como é visível em
diversas épocas da nossa história.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
66
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (45)
• Épocas em que, no entender de Jorge Dias, se
verifica o temperamento expansivo e dinâmico do
Português:
 Os Lusitanos foram um exemplo de povo
permanentemente envolvido em lutas sem
remissão;
 Na Idade Média nas lutas da Reconquista contra
os Mouros;
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História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
67
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (46)
 Nas viagens dos descobrimentos e de
colonização;
 A série de revoluções intestinas do séc. XIX e
princípios do séc. XX atestam o fundo de constante
desassossego e actividade que são sempre
guiadas por um ideal;
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História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
68
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (47)
• Assim, nas lutas de Reconquista não se pretendia só
reaver o solo que os Muçulmanos haviam tomado,
lutava-se também por um ideal religioso, expulsando
um inimigo da Fé.
• A grande empresa dos descobrimentos visa
desvendar o caminho marítimo para a Índia e os
negócios das especiarias porém, além de se
pretender expandir o Império, procura-se dilatar a Fé.
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História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
69
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (48)
• «Nunca soubemos separar o sonho da realidade,
ao contrário do inglês, que procede friamente,
orientado pelo sentido prático.» [Dias]
• O maior desaire da história pátria, a desastrosa
campanha de Alcácer Quibir (1578) em que
desapareceu D. Sebastião com o escol militar do
tempo, não passou de um grande sonho vivido com
consequências trágicas.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
70
Cenário da Batalha de Alcácer Quibir
Fonte: wikipédia
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
71
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (49)
• Acresce que «o desprezo pelo interesse mesquinho e
o gosto pela ostentação e pelo luxo nunca nos
permitiram o aproveitamento eficaz das grandes
fontes de riqueza explorada.» [Dias]
• Os tesouros não se demoravam nas nossas mãos, os
povos mais práticos e dotados de espírito capitalista
(Holandeses e Ingleses) eram mais bem sucedidos na
sua acumulação.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
72
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (50)
• Soubemos mercadejar, mas carecemos de espírito
capitalista. No século XVI, quando Lisboa era um
grande empório do mundo, sob a rutilância do luxo já
se escondia a miséria.
• O gosto pelas jóias, pela pompa, pelo luxo, é uma
constante da nossa cultura. Como exemplos
ilustrativos temos:
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
73
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (51)
 A embaixada de Tristão da Cunha ao papa –
percorreu as ruas de Roma numa extravagante
procissão onde se avistavam animais selvagens
das colónias e riquezas das Índias;
 A pompa do reinado de D. João V, que ergueu o
convento de Mafra com o ouro proveniente do
Brasil.
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História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
74
Litografia do Palácio Nacional de Mafra
(1853)
Fonte: wikipédia
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História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
75
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (52)
• Em Portugal, mesmo «as pessoas modestas, cujas casas
são despidas do mínimo conforto, andam nas ruas vestidas
com elegância ou com luxo». «O nosso luxo não é um
requinte que resulte do conforto, é-lhe quase o oposto; é
mero produto da imaginação, e não dos sentidos.» [Dias]
• Para Dias, outra idiossincrasia da cultura portuguesa é o
profundo sentimento humano, que se baseia no
temperamento afectivo, amoroso e bondoso. Para o nosso
povo o coração é a medida de todas as coisas.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
76
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (53)
• Este sentimento estaria presente em todas as classes
sociais lusas. Dias aduz o exemplo da grande paixão
de D. Pedro por D. Inês de Castro, que nem a morte
logrou desvanecer e que ainda hoje serve de motivo
poético e impressiona as sensibilidades.
• Na literatura constitui bom exemplo a poesia
medieval, tão sentida e genuína, em que amiúde se
canta o amor de uma mulher pelo homem. A lírica de
Camões é outra exaltação da emoção.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
77
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (54)
• As Cartas Portuguesas de Soror Mariana Alcoforado
frementes de incandescente paixão, os sonetos de Florbela
Espanca, as poesias de João de Deus e muitos outros,
sem esquecer a esplêndida poesia popular, também ela
fortemente infundida deste sentimento amoroso.
• A afectividade portuguesa é ainda sentida em relação
aos parentes, aos amigos e aos vizinhos: «o português não
gosta de ver sofrer e desagradam-lhe os fins demasiado
trágicos.» [Dias]
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
78
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (55)
• Para Dias, esta nossa característica poderá explicar a
pobreza do género dramático entre nós (excepção feita a
Gil Vicente).
• Este aspecto seria constatável também nas touradas
portuguesas em que o touro não morre e vem para a arena
embolado, para não ferir os cavalos e o toureiro. O
espectáculo perdeu a intensidade dramática que tem em
Espanha.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
79
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (56)
• Acresce que Portugal foi dos primeiros países a abolir
a pena de morte, possivelmente como consequência
desse modo de ser.
• Este sentimento humano tem como representantes
na literatura, por exemplo, Augusto Gil, João de
Deus, Júlio Dinis, Trindade Coelho e António Nobre.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
80
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (57)
• O português é avesso a soluções trágicas e não é
vingativo. Excepção feita ao crime passional, são raros
em Portugal os homicídios perversos que se verificam,
por exemplo, na Europa do norte.
• A própria religião tem o mesmo pendor humano,
acolhedor e pacífico. Nas aldeias portuguesas não se
erigem igrejas desmesuradas e austeras, tão próprias
da paisagem espanhola, que de tão ingentes elidem a
nota humana.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
81
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (58)
• A igreja portuguesa «é sempre um templo acolhedor,
habitado por santos bons e humanos. Não se vêm os
Cristos lívidos e torturados de Espanha. A
sensibilidade portuguesa não suporta essa visão
trágica e dolorosa.» [Dias]
• Este sentimento humano e terreno da nossa
religiosidade acha-se patente, para Dias, na grande
expansão do românico e na falta de absorção do
estilo gótico.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
82
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (59)
• O português nunca sentiu esse profundo êxtase
místico, esse anelo de ascensão que caracteriza o
gótico.
• Na generalidade dos monumentos arquitectónicos
caracteristicamente portugueses perdura uma certa
densidade de pilares, uma nítida tendência para a
profundidade e para a horizontalidade, oposta à
ânsia ascensional do gótico.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
83
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (60)
• O espírito português é contrário às grandes
abstracções, às grandes ideias que sobrelevam o
espírito humano, como se pode comprovar pela falta
de grandes filósofos e grandes místicos de que a
nossa nação enferma.
• «Foi no clima de exaltação dos descobrimentos
marítimos que os elementos psíquicos díspares da
população portuguesa se fundiram e alcançaram as
suas expressões mais elevadas.» [Dias]
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
84
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (61)
• Como vimos atrás, o Atlântico sempre exercera um
grande fascínio sobre as populações costeiras, ao
passo que as do interior se seguravam com afinco à
solidez da terra conquistada. Nas medievas cantigas
de amigo já se desprendia um aroma a maresia.
• Os portugueses empreendem a grande aventura dos
descobrimentos e desviam a civilização do
Mediterrâneo para o Atlântico, mudando o curso à
história universal.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
85
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (62)
• O velho do Restelo, personagem d’ Os Lusíadas, era
o homem da terra em face da temeridade marítima.
• Entretanto, em 1425 e 1439, a Madeira e os Açores
começam a ser colonizadas. Em 1498, Vasco da
Gama descobre o caminho marítimo para a Índia e em
1500, Pedro Alvares Cabral chega ao Brasil.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
86
Planisfério de Cantino (1502) – a mais
antiga carta portuguesa conhecida
Fonte: wikipédia
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
87
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (63)
• O profundo sentimento da natureza, já evidente na Lírica
Medieval e na Menina e Moça (séc. XVI, escrita por
Bernardim Ribeiro), prospera em contacto com os grandes
horizontes abertos, com as tempestades e com os mundos
exóticos, habitados por animais e gentes estranhas.
• Os Lusíadas, que haviam fascinado Humboldt (geógrafo,
naturalista e explorador alemão do séc. XVIII e XIX) pelo seu
desmedido deslumbramento ao descrever os fenómenos
marítimos, são o grande poema do mar.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
88
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (64)
• O mosteiro dos Jerónimos, enquanto expressão
arquitectónica superior da religiosidade portuguesa, é
sublime pela sua decoração naturalista, inspirada em
motivos marítimos e na exuberância da vegetação exótica.
• «O antigo sentimento da natureza, que só encontra até
então expressão poética, transporta-se agora para a forma
plástica. Os templos enchem-se de elementos da natureza,
impregnados de sentido religioso, de evocações de mundos
longínquos e estranhos e dos mistérios do mar.» [Dias]
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
89
Mosteiro dos Jerónimos em Belém,
Lisboa (coluna do claustro)
Fonte: wikipédia
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
90
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (65)
• A alma portuguesa possui um fundo contemplativo
que se deleita na repetição ou na imobilidade da
imagem.
• Uma das características principais da saudade é
justamente essa fixidez da imaginação que, por
intensidade, se pode estabelecer como ideia motriz e
levar à acção. A poesia medieval evidencia esse
mesmo imobilismo dos quadros que se repetem.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
91
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (66)
• Acresce que, até à actualidade, a literatura portuguesa
conservou o seu cunho lírico. A nossa vocação para o
género épico e dramático foi sempre inferior. Para Dias,
até os Lusíadas valem muito pelo seu carácter lírico.
• Nos romances actuais também escasseia a acção. Na
música repete-se o mesmo fenómeno. Em grande parte
dos compositores notamos imobilismo na adesão a
um pequeno número de desenhos musicais invariáveis,
e às sequências obstinadas.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
92
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (67)
• Duarte Lobo, foi um dos expoentes máximos do estilo
polifónico português.
• Este ostinatismo que encontramos na música erudita
portuguesa e que, de acordo com Dias, parece ter
influenciado a música europeia da época, é uma das
facetas do temperamento português, que podemos
confirmar noutras manifestações artísticas.
 Ostinato - termo italiano, mas de uso corrente na
linguagem técnica musical, para designar a repetição
frequente de um tema ou desenho característico.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
93
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (68)
• As canções corais alentejanas e minhotas, no
entender de Dias, no seu âmago representam
também a ideia do ostinato, mas a sua real origem
deve residir na alma contemplativa e obstinada dos
portugueses.
• Foi esta obstinação que tornou possível a
concretização de um sonho que parecia superior às
forças daqueles que o lograram.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
94
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (69)
• O português enferma também de um forte sentimento de
individualismo.
• «Enquanto que a personalidade anglo-saxónica ou
germânica não colide geralmente com os interesses sociais
e só preza a sua liberdade íntima, o português, da mesma
maneira que o espanhol, tem uma forte ânsia de liberdade
individual, que muitas vezes é anti-social.» [Dias]
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
95
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (70)
• A essência humana do português fá-lo ser
excepcionalmente solidário com os seus vizinhos,
daí que haja poucas regiões na Europa onde o
espírito comunitário e de auxílio mútuo esteja tão
arreigado.
• Porém qualquer organização geral que coarcte as
liberdades individuais motiva de imediato um
movimento de reacção em que todos são solidários
(e.g. normas de trânsito).
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
96
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (71)
• Portugal padece também do facto de ser um dos
estados mais burocratas da Europa. O funcionário
subalterno atém-se à letra da lei sem procurar
compreender-lhe o espírito.
• Por outro lado, o português manifesta também uma
tendência para sobrepor a simpatia humana às
normativas legais, o que faz com que a vida social e
pública rode em torno do empenho ou do pedido de
qualquer amigo.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
97
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (72)
• Pede-se para ser aprovado nos exames, para ficar
isento do serviço militar, para conseguir emprego,
para ganhar uma questão, enfim, para superar todas
as adversidades da vida.
• Para Dias, a sobreposição dos valores humanos
ao lucro e ao que é utilitário ajuda a explicar muitos
acontecimentos da nossa história e entender muitos
aspectos da sociedade moderna, constituindo esta
mentalidade uma negação do espírito capitalista.
•05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
98
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (73)
• Nas empresas e indústrias nacionais existem
inúmeros casos de absoluta ausência de
racionalização.
• O português compraz-se em projectos vagos,
«castelos no ar que não pensa realizar. Mas no seu
íntimo alberga uma certa esperança de que as coisas
aconteçam milagrosamente.» [Dias]
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
99
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (74)
• Esta inabalável fé no milagre – veja-se o sucesso entre
nós do euromilhões! – tem no sebastianismo a sua
faceta mais evidente. Todos esperavam que o rei D.
Sebastião, morto em África (†1578) aparecesse numa
manhã de nevoeiro montado no seu cavalo de guerra.
• A imaginação onírica, a má vontade em relação à
limitação que a razão impõe e a crença milagreira
conduzem frequentemente o português a situações
intrincadas, de que se livra pela sua invulgar
capacidade de improvisação.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
100
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (75)
• «O facto de se repetirem tais situações deve explicarse pela confiança que o português tem na facilidade
das soluções de última hora.» [Dias]
• Esta capacidade inata de adaptação do português é
uma das invariáveis da alma portuguesa. O português
adapta-se aos climas, a profissões, a culturas, a
idiomas e a gentes de maneira excepcional.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
101
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (76)
• O português adapta-se a outro meio cultural tão
bem que parece ter sido assimilado; mas regressa a
Portugal e num átimo já não se diferencia dos demais.
• Enquanto que o inglês permanece inglês em toda a
parte e o alemão quando deixa de o ser dificilmente
volta a tornar-se germânico, o português aderiu ao
provérbio que diz: em Roma sê romano – mas só
enquanto está em Roma.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
102
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (77)
• «A capacidade de adaptação, a simpatia humana e o
temperamento amoroso são a chave da colonização
portuguesa. O português assimilou adaptando-se.» É
a propalada propensão para a miscigenação do
português.
• Como já vimos, o português é bem menos
extrovertido, ruidoso e exuberante que os demais
povos latinos. Ademais o português é coibido por
uma forte sentimento do ridículo, receando ser vítima
de ironia ou troça.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
103
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (78)
• Aliás, a ironia está profundamente enraizada na
cultura portuguesa: desde as cantigas de escárnio e
maldizer da Idade Média até à ironia dum Eça de
Queiroz há todo um conjunto de gradações.
• «Temos a ironia benévola de Gil Vicente, a mordente
de Nicolau Tolentino e de Bocage e a ironia
pungente e sarcástica de Fialho e de Camilo.»
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
104
Fundamentos da cultura portuguesa –
a visão etnológica de Jorge Dias (79)
• Em jeito de conclusão, os portugueses são um povo
difícil de governar. Os seus defeitos podem também
ser as suas virtudes e vice-versa, de acordo com o
momento que vive.
05-11-2015
História da Cultura Portuguesa
IPCA - GAT: 2º ano
105
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