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Aula de hoje:
Convocação Familiar
Libertação: Cap. 13 (resumo)
André Luiz – Chico Xavier
9° parte
Convocação familiar
Retornando do manicômio, alcançamos o
local onde o juiz residia com os
parentes na ala central do
vasto edifício em que
Gabriel e a esposa usavam pequena dependência.
– É possível, informou Gúbio – promovermos ainda nesta noite, benéfica reunião,
convocando alguns encarnados e conver-
sarmos com o juiz para analisarmos a situação da filhinha de Jorge.
Saldanha vivamente interessado concordou ao modo do aprendiz que se vê na obrigação de aderir ao mestre.
– A noite é propícia – prosseguiu o instrutor, atravessamos os primeiros minutos da
madrugada, não há tempo a perder.
Dispúnhamo-nos a visitar os aposentos
do juiz, quando um rapaz encarnado nos surge à frente, cauteloso, deslocando-se a caminho do pavimento inferior.
Saldanha tocou, de leve, o braço de Gúbio e notificou:
– Este é Alencar, irmão de Margarida e
perseguidor de minha neta.
Seguimos o jovem e observamos que se
postava à entrada de compartimento modesto, tentando forçá-la.
Em torno, o hálito viciado,
indicava que o jovem procedia de grandes libações.
– Todas as noites, comentou Saldanha, preocupado
– procura abusar de nossa pobre menina.
Reparando a resistência de Lia, estende os
processos de perseguição, com ameaças diversas, e acredito que, se ainda não atingiu
os fins que pretende, é porque intercedo,
agindo na defesa com a brutalidade que me
é característica.
– Efetivamente, Saldanha, disse Gúbio
este rapaz se revela possuído de forças degradantes e de precisa colaboração enérgica que o auxilie a buscar higiene mental.
Em minutos ministrou-lhe passes magné-
ticos nos órgãos visuais. Escoados alguns
minutos, Alencar retirou-se, algo cambaleante, em direção ao seu aposento.
Por alguns dias, disse-nos Gúbio, ele se
ressentirá de enfermidade inofensiva, que o
ajudará a meditar nos deveres do homem
de bem.
Saldanha demonstrava indisfarçável contentamento.
Logo após, passamos ao apartamento privado do juiz.
O magistrado repousava sobre leito macio, mas mantinha-se acordado. Mostrava a
mente inquieta, perturbada.
Gúbio, colocou-lhe as mãos sobre a fronte, do juiz atormentado, dirigindo-lhe a intuição para as reminiscências do processo em
que Jorge fora implicado.
Notei que os olhos do juiz exibiam modificada expressão.
Dir-se-ia contemplarem cenas distanciadas, com indizível tortura. Via Jorge, mentalmente e lembrava-lhe as palavras veementes, afirmando inocência.
Não conseguia explicar, por que fortes razões lhe recolhera a filha, introduzindo-a no
próprio lar.
Recordou que o sentenciado perdera a assistência dos melhores amigos e a própria
esposa suicidara-se em pleno desespero...
Nesse comenos, o instrutor recomendou
a Elói e a mim buscássemos Jorge, em
desdobramento do sono, enquanto prepararia a este último o desligamento parcial do
corpo através do sono.
No cubículo do manicômio, Jorge se achava ausente do vaso físico, em grande prostração. Administrei-lhe ao organismo
perispiritual recursos fluídicos reparadores
e transportamo-lo à residência indicada.
A essa altura, o dono da casa e a neta de
Saldanha, provisoriamente libertos pelo sono, já se encontravam ao lado de Gúbio,
que recebeu Jorge com desvelado carinho.
O juiz agora adormecido, vendo-se à frente do antigo réu e da filha, que identificou,
de pronto, perguntou a esmo, absorvido de
insofreável espanto:
– Onde estamos? onde estamos?
– Juiz, disse Gúbio, aureolado por luz intensa após a prece que efetuara –, congregamo-nos em teu próprio lar para uma audiência com a verdade.
O juiz, escutava perplexo e observando a
presença de Jorge, na sala, inquiriu, aflito:
– Apelam, porventura, em favor deste condenado?
– Sim – respondeu nosso instrutor, sem
hesitar. Não acreditas que esta vítima aparente de inconfessável erro judiciário já tenha esgotado o cálice do martírio oculto?
– O caso dele, porém, permanece liquidado, eu fui o juiz da causa. Consultei os códigos necessários, antes de emitir a sentença. O crime foi averiguado, os laudos periciais e as testemunhas condenaram o réu.
Não posso, em sã consciência, aceitar intromissões, mesmo tardias, sem argumentação ponderosa e cabível.
Compreendo-te a negativa, disse-lhe nosso instrutor em tom melancólico.
Os fluidos da carne tecem um véu pesado demais para ser facilmente rompido
pelos que se não afeiçoam, ainda, diariamente, ao contato da espiritualidade superior.
Invocas a tua condição de sacerdote da
lei, para esmagares o destino de um trabalhador que já perdeu tudo quanto possuía,
a fim de que resgatasse, intensivamente, os
erros do passado distante.
Admites, juiz, que o homem viverá sem
contas, ainda mesmo aquele que se supõe
capacitado para julgar o próximo, em definitivo? Acreditas haja o teu raciocínio
acertado em todos os enigmas da senda?
Terás agido imparcialmente em todas as
tuas decisões? Não creias...
O Justo Juiz foi crucificado num madeiro
de linhas retas por devotar-se no mundo à
extrema retidão.
Verificando-se pausa mais longa, o magistrado exteriorizou nos olhos indefinível terror, caiu de joelhos e rogou:
– Benfeitor ou vingador, ensina-me o caminho! Que devo fazer a benefício do condenado?
– Facilitarás a revisão do processo e lhe
restituirá a liberdade.
– Ele é, então, inocente? – indagou o magistrado.
– Ninguém sofre sem necessidade à frente da Justiça Celeste e tão grande harmonia rege o Universo que os nossos próprios
males se transubstanciam em bênçãos.
Explicaremos tudo.
E, dando-nos a perceber que precisava
gravar na mente do juiz quanto se lhe pedia
da ação providencial, continuou:
– Não te circunscreverás à mencionada
medida. Ampararás a filha (Lia), hoje internada por favor em tua casa, em estabelecimento condigno, onde possa receber a necessária educação.
– Mas, interveio o jurista, esta menina não
é minha filha.
Aprende juiz, a semear amor no chão em
que pisas para que o amor seja seu advogado, onde e quando precisares.
Na Terra, a justiça abre tribunais para examinar o crime em seus aspectos variados,
especializando-se na identificação do mal;
todavia, no Céu, a Harmonia descerra santuários, apreciando-nos a bondade e a virtude, consagrando-se à exaltação do bem,
na totalidade dos seus ângulos divinos.
Enquanto é tempo, faze de Jorge um amigo e da filha dele uma companheira de luta
que te afague um dia, os cabelos brancos e
te ofereça, mais tarde, a luz da prece, quando teu espírito for compelido a transpor o escuro portal do túmulo.
O juiz, em pranto, interrogou:
– Como agir, porém?
– Amanhã – informou Gúbio, calmo e persuasivo, te erguerás do leito e a intuição,
que é o disco milagroso da consciência funcionará livremente, retransmitindo-te as sugestões desta hora de luz e paz, qual canteiro de bênçãos ofertando-te flores perfumosas e espontâneas. Não hesite!...
Diante de Saldanha que acompanhava a
cena, demonstrando indizível alegria, Jorge
e a filha trocavam olhares de jubilo e esperança.
O magistrado, contemplou-os pensativo,
mas Gúbio, perscrutando-lhe os pensamentos, tocou-lhe a fronte, de leve, falou em voz
firme:
– Gostarias que me expressasse a respeito da culpabilidade do réu.
Em verdade, quanto ao delito de que é
presentemente acusado, Jorge tem as
mãos limpas.
Entretanto, a existência humana é como
precioso tecido de que os olhos mortais
apenas enxergam o lado avesso.
Nos sofrimentos de hoje, solvemos os débitos de ontem.
Com isto, não desejamos dizer que nossas falhas, muita vez oriundas da ociosidade ou da impenitência de agora, gerando
resultados ruinosos para nós mesmos e para outrem, sejam recursos providenciais ao
pagamento de alheias dividas, porque assim
consagraríamos a fatalidade por soberana
do mundo, quando, em todas as horas, criamos causas e consequências com os nossos atos cotidianos.
Jorge, que aqui não se encontra em reclamações e, sim, trazido por nós para benéfico entendimento, liberou certa parte do pretérito culposo.
Gúbio, a essa altura,
fez grande pausa em
suas elucidações, fixou o interlocutor e
prosseguiu, com grave entonação:
– Juiz, por agora, trazes a mente subjugada pelo choque biológico do retorno à
carne e não poderias seguir-nos na exumação do passado recente.
Já te auscultei, no entanto, os arquivos mentais e vejo os quadros
que o tempo não destrói.
Desvendando o passado
No século findo, detinhas a posse de extensa faixa de terra e te orgulhavas da posição de senhor de dezenas de escravos.
Jorge de hoje era ontem teu escravo, embora nascesse quase sob o mesmo teto que
te assinalou os primeiros vagidos, era teu
servidor, perante os códigos terrestres, e irmão consanguíneo, não obstante afagado
por outra mãe.
Nunca lhe perdoaste semelhante
aproximação, considerada em tua casa por
aviltante ultraje ao nome familiar.
Chegados ambos à tarefa da paternidade,
teu filho de ontem e de hoje (Alencar) transviou-lhe a filha do pretérito e de agora (Lia)
e, quando semelhante amargura sobreveio,
com escárnio supremo para um lar cativo e
triste, determinaste medidas condenáveis
que culminaram no insofreável desespero
de Jorge em outros tempos, o qual, desarvorado e semilouco, não somente roubou a
vida ao corpo de teu filho que lhe invadira
o santuário doméstico, mas também a própria existência, suicidando-se em dramáticas circunstâncias.
Todavia, nem a dor, nem a morte apagam
as aflições da responsabilidade que só o regresso à oportunidade de reconciliação consegue remediar.
E aqui te encontras, de novo, diante do
condenado, junto do qual sempre te inclinaste à antipatia gratuita, e ao lado da jovem a quem prometeste amparar por filha
muito querida ao coração.
Trabalha, meu amigo! Vale-te dos anos,
porque Alencar e Lia serão atraídos à bênção do matrimônio.
Age enquanto podes.
Todo bem praticado felicitará a ti mesmo,
porquanto outro caminho para Deus não
existe, fora do entendimento construtivo, da
bondade ativa, do perdão redentor.
Jorge, humilhado e desiludido, apagou o
desvario deplorável, suportando inominável
martírio moral em poucos anos de acusação indébita e prisão tormentosa, com
viuvez, enfermidades e privações de toda a
espécie.
Abalo salutar, certamente sulcava, fundo,
o espírito do magistrado, que mostrava o
semblante extremamente transformado.
Vimo-lo levantar-se, em lágrimas, cambaleante. A força magnética do nosso instrutor
alcançara-lhe as fibras mais íntimas, porquanto os olhos dele pareciam iluminados
de súbita determinação.
Abeirou-se de Jorge, estendeu-lhe a destra em sinal de fraternidade, que o filho
de Saldanha beijou igualmente em pranto,
e, em seguida, acercou-se da jovem, abriulhe os braços acolhedores e exclamou comovido:
– Serás minha filha, doravante, para sempre!...
Indescritível contentamento marcou-nos o
inolvidável minuto.
Gúbio ajudou-os a partir na direção do interior doméstico e, quando nos dispúnhamos a reconduzir Jorge ao presídio de cura
onde o corpo em repouso o esperava,
Saldanha, plenamente modificado por uma
alegria misteriosa que lhe refundia as expressões fisionômicas, avançou para o nosso instrutor e, tentando oscular-lhe as mãos,
murmurou:
– Nunca pensei encontrar noite tão gloriosa quanto esta! Ia desmanchar-se em palavras de reconhecimento, mas Gúbio, com
naturalidade, obrigou-o a reajustar-se, acrescentando:
– Saldanha, nenhum júbilo, depois do amor
de Deus, é tão grande quanto aquele
que recolhemos no amor espontâneo de
um amigo.
Semelhante alegria, neste momento, é nossa, porque te sentimos a amizade nobre e
sincera no coração.
E um abraço de carinhosa fraternidade
coroou a tocante e inesquecível cena.
Bibliografia:
Livro Libertação
Espírito: André Luiz - Médium: Chico Xavier
Capítulos - 13. Convocação familiar (resumo)
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