Hipertireoidismo Congênito em Hospital Secundário do DF no ano de 2014: Relato de Caso e Revisão de Bibliografia Priscila Toniolo de Oliveira Morato Orientadora : Dra. Mariana Gadelha Residência em Pediatria www.paulomargotto.com.br Brasília, 18 de novembro de 2014 Brasília, novembro de 2014. ARTIGO DE MONOGRAFIA APRESENTADO AO PROGRAMA DE RESIDÊNCIA MÉDICA EM PEDIATRIA DO HOSPITAL MATERNO INFANTIL DE BRASÍLIA -HMIB/SES/DF Introdução: • É uma doença rara (1) • Passagem de autoanticorpos pela placenta em mães portadoras da Doença de Graves (1) • Caráter transitório em grande parte dos casos, com duração de até 20 semanas (3). • Gestantes com Doença de Graves = 0,2% , sendo que apenas 1% desses recém-nascidos apresentarão hipertireoidismo congênito(2). Brasília, novembro de 2014. • Importante impacto fetal e neonatal (1) Objetivos: • 3.2) Específico Revisar, analisar e discutir bibliografia atual acerca do assunto. Brasília, novembro de 2014. • 3.1) Geral Relatar caso de hipertireoidismo congênito em hospital secundário do DF. Materiais e Métodos • Os dados foram obtidos no registro eletrônico do paciente no sistema Trakcare. • Foi realizada revisão bibliográfica na base de dados PUBMED com os seguintes marcadores: hipertireoidismo congênito, hipertireoidismo neonatal e tireotoxicose neonatal. Brasília, novembro de 2014. • Relato de caso de paciente internado em hospital secundário do DF, no período de janeiro a fevereiro de 2014. Relato de Caso: • Peso ao nascer: 1.530g, E: 43cm, PC: 30 cm • Classificação do RN: RNPT PIG assimétrico , muito baixo peso ao nascer Brasília, novembro de 2014. • NBS, sexo masculino, natural de Brasília- DF, nascido de parto normal às 14:00h do dia 02/01/14, pré-termo (Idade gestacional pelo Capurro: 34 sem + 5 dias) • Bolsa rota na madrugada com presença de líquido meconial fluido. • Ao exame físico : emagrecido, abdome escavado, taquipneico, presença de gemência e retração subcostal. • Colocado em CPAP nasal e regulado para vaga em UTI neonatal. Brasília, novembro de 2014. • Não chorou ao nascer e necessitou ser reanimado com VPP por 3 minutos, APGAR: 6/6 Dados do pré-natal: • Sorologias: não reagentes para HIV, VDRL, hepatite B e toxoplasmose (2º trimestre) • APP: hipertireoidismo (sem exames confirmatórios em prontuário), DHEG grave. • Medicações utilizadas na gestação: propranolol, propatil nitrato (sustrate), inibina, cefalexina. Brasília, novembro de 2014. • 17 anos, G1P0C0A0, realizou 5 consultas de pré-natal iniciadas no quarto mês de gestação • Radiografia de tórax na admissão: padrão de doença da membrana hialina e aparente aumento da área cardíaca • Realizado HC em 04/01 - Hemoglobina: 19 hematócrito: 55.4 % leucócitos: 13.300 neutrófilos: 16% bastões: 0% segmentados: 16% eosinóflos: 0% basófilos: 3% monócitos: 1% linfócitos: 80 % plaquetas: 93.000 • Por volta do 4º dia de vida iniciou taquicardia (FC:190 bpm), que se manteve ao longo dos dias de internação Brasília, novembro de 2014. • Mantido em CPAP nasal, aventada a HD: infecção inespecífica provável e iniciado antibioticoterapia – ampicilina e gentamicina • No 8º dia de vida- piora clínica apresentando resíduo gástrico via sonda de aspecto amarronzado, perfusão capilar lentificada, pulsos finos, fígado a 4 cm do RBCD • HD: choque séptico e iniciado dobutamina, cefepime, vancomicina • Ecocardiograma: hipertensão pulmonar acentuada, presença de forame oval patente, persistência de canal arterial e baixo débito cardíaco. • Eletrocardiograma : taquicardia sinusal e sobrecarga de átrio direito. Brasília, novembro de 2014. • Suspenso ampicilina e gentamicina no 5º dia de vida -hemocultura de 02/01- negativa • Iniciado furosemida. Paciente apresentou melhora clínica e hemodinâmica neste mesmo dia e foi retirada a droga vasoativa. • Realizado IOT e colocado em VM. Durante a intubação apresentou bradicardia e necessidade de MCE por 30 segundos. • Reintroduzida dobutamina, iniciado o fentanil para sedoanalgesia. Brasília, novembro de 2014. • No dia seguinte apresentou nova descompensação clínica - piora do padrão respiratório e FC: 200 e 230 bpm. Foram administradas 3 doses de adenosina e 1 dose de amiodarona, sem resposta efetiva. • No 10º dia de vida RN apresentou hipotensão arterial sistêmica e iniciado dopamina. • Apresentou estabilidade hemodinâmica e melhora progressiva do quadro clínico nos dias subsequentes, suspenso suporte de oxigênio e drogas vasoativas no 14 dia de vida • Devido quadro clínico e antecedentes maternos foi interrogado a possibilidade de hipertireoidismo congênito e coletados TSH (hormônio estimulante da tireoide) e T4 livre (tiroxina livre). Brasília, novembro de 2014. • Houve extubação acidental no dia seguinte, não foi necessário reintubação. • Em novo ecocardiograma apresentava: • Devido persistência da taquicardia - Introduzido propranolol 1mg/kg/dia Brasília, novembro de 2014. Hipertensão pulmonar acentuada (pressão estimada de 88 mmHg), insuficiência tricúspide de grau moderado, dilatação acentuada das cavidades direitas e hipertrofia septal moderada, foi iniciado sildenafil. •Suspenso cefepime e vancomicina após 8 dias do seu início. Iniciado propiltiouracil 5mg/kg/dia de 8/8 horas via oral •Em novo ecocardiograma (28/01): não constatou-se hipertensão pulmonar, observado persistência do canal arterial com repercursão e iniciado furosemida. Optado por suspender sildenafil. Brasília, novembro de 2014. •Resultado de T4L: 3,90 e TSH: 0,1 que corroborou HD: hipertireoidismo congênito secundário por provável passagem de autoanticorpos maternos via placenta • Mantinha melhora do quadro clínico, estabilidade hemodinâmica, sem necessidade suporte ventilatório e ganho ponderal efetivo. • Recebeu alta médica com 45 dias de vida, com Idade corrigida: 7 dias, peso da alta: 2.190 gramas, em aleitamento materno misto (seio materno e fórmula infantil de partida), em uso de propiltiouracil e propranolol, seguimento agendado pela Endocrinologia Pediátrica e Neonatologia. Brasília, novembro de 2014. • Apresentava ecocardiograma (01/02) - sem alterações. Suspenso a furosemida. Discussão: • Causas: passagem transplacentária de autoanticorpos, mutação no receptor de TSH e Síndrome de McCune Albright (2) • Caráter transitório na maioria das vezes – catabolização de autoanticorpos (2,4) • 0,2% das gestantes possuem Doença de Graves 1% destes recém nascidos desenvolverão hipertireoidismo (2) Brasília, novembro de 2014. • É uma doença rara (1) Discussão: Fatores de risco para hipertireoidismo fetal e neonatal: • Níveis elevados do TRAB na circulação materna (5) • Uso de medicações antitireoidianas na gestação (5) • Ablação da glândula por iodo radioativo (5) • Sem predileção por sexo Brasília, novembro de 2014. Conforme dados da bibliografia: • 1: 25.000 ( 5,6) • 1: 50.000 (2) Discussão: • Principais causas associadas: falência cardíaca, distúrbios eletrolíticos- devido diarreia por aumento da peristalse (3,4) Dos recém - nascidos que apresentaram hipertireoidismo: • 60% - apresentam doença transitória e autolimitada (9) • 20% - óbito devido complicações (9) • 20% - apresentam sintomas persistentes (9) Brasília, novembro de 2014. • A mortalidade infantil varia entre 16 a 25% (3,4) Discussão: O tratamento materno deve ser iniciado independente do status da tireoide fetal, podendo causar: • Eutireoidismo (7) • hipotireoidismo (7) • hipertireoidismo (7) Brasília, novembro de 2014. • É um desafio terapêutico (7) Embriologia : • A glândula já migrou para a porção cervical a partir da sétima semana de gestação (2) • É composta basicamente por células foliculares que se estruturam em substância coloide (2) Fisiologia : • Iodo T3, T4 livre e tireoglobulinas (2) • O TSH atua no seu receptor que estimula a proliferação, diferenciação e função das células foliculares (2) • A partir da décima semana se inicia a síntese de hormônio tireoidiano (2) Brasília, novembro de 2014. Discussão: Discussão: • A passagem de iodo e T4 livre maternos para o feto é importante para sua maturação e desenvolvimento neurológico (2), enquanto se dá a formação da tireoide fetal. Fisiopatologia: • Passagem do TRAB ativação dos receptores de TSH estímulo da tireoide fetal (2) • O hipertireoidismo fetal se inicia a partir do segundo trimestre (2) Brasília, novembro de 2014. • A maturação da tireoide fetal independe da função tireoidiana materna (2) Discussão: Quadro clínico: • Amplo (3) • Leve, moderado e severo (3) • Baixo ganho ponderal, hiperexcitabilidade, vômitos, diarreia, febre, eritema, taquicardia neonatal persistente, taquipneia, insuficiência cardíaca, hipertensão pulmonar, plaquetopenia, colestase, hepatite, hepatoesplanomegalia (2, 4, 5) • A tireotoxicose, como no caso relatado, é rara no período neonatal (6) Brasília, novembro de 2014. • RN assintomáticos nas primeiras 2 semanas de vida (4) Brasília, novembro de 2014. Discussão: Fisiopatologia: • O aumento do hormônio tireoidiano aumenta a volemia, contratilidade e frequência cardíaca, redução da resistência periférica estado hiperdinâmico e sobrecarga cardíaca (4) • Pode haver comprometimento coronariano, vasoespasmo e aumento da demanda cardíaca (4) • Pode evoluir com hipertensão pulmonar nos casos muito graves e necessitar de ECMO, óxido nítrico e drogas inotrópicas (4) • Recomenda-se ECG e dosagem de marcadores enzimáticos (4) Brasília, novembro de 2014. • A insuficiência cardíaca quando ocorre, é uma manifestação precoce (4) Discussão: • Os casos leves podem passar despercebidos (8) • Apesar de transitório pode levar a complicações graves (8) • Filhos de mães com hipertireoidismo sem tratamento possuem 14 vezes mais chances de malformações congênitas e complicações precoces (4) Brasília, novembro de 2014. • O diagnóstico precoce é primordial para evitar prematuridade, morte fetal e atraso no desenvolvimento neuropsicomotor (2) Discussão: •Alterações em ecografia gestacional que já sugerem o hipertireoidismo: bócio fetal, alteração no Doppler, aumento da frequência cardíaca e maturação óssea fetal acelerada (2) •Padrão ouro: dosagem de hormônio tireoidiano fetal, porém somente é coletado quando não se consegue diferenciar o hipotireoidismo do hipertireoidismo através de outros sinais (2) Brasília, novembro de 2014. Diagnóstico fetal: Discussão Diagnóstico neonatal : • Se alterados TSH, T4 livre e T3 - solicitar TRAB Brasília, novembro de 2014. • Quadro clínico e alterações laboratoriais (TSH, T4 livre e T3) (2) Discussão: (8) Brasília, novembro de 2014. Coorte publicado em 2014: • 68 recém-nascidos de mães com Doença de Graves • 3 grupos: Resultados: • TRAB materno negativo : 0 Brasília, novembro de 2014. • TRAB materno positivo: Discussão: As principais conclusões do estudo: • TRAB persistentemente negativo na gestação utilizando ou não drogas antitireoidianas não está associado ao hipertireoidismo congênito (8) • TRAB coletado de cordão fetal positivo possui risco significativo de hipertireoidismo neonatal : 29% (8) Brasília, novembro de 2014. • TRAB positivo durante gestação indica risco de hipertireoidismo congênito (8) Discussão: • Já o aumento progressivo e rápido de T4 livre na circulação neonatal pode ser preditivo de hipertireoidismo. Considerar iniciar tratamento (8) • TRAB positivo em RN, sem sinais ou sintomas, devem ser acompanhados semanalmente (8) Brasília, novembro de 2014. • TSH e T4 livre dosados do cordão fetal indica função tireoidiana fetal e não o risco neonatal de apresentar a doença (8) Discussão: • 4% foram diagnosticados com hipertireoidismo congênito (5) • Todos os pacientes apresentavam T4 livre aumentado com TSH suprimido, conforme esperado (5) • Sintomatologia mais frequente era taquicardia e baixo ganho ponderal (5) Brasília, novembro de 2014. Estudo Retrospectivo publicado em 2014 analisou prontuário de 96 recém- nascidos no período de janeiro de 2007 a dezembro de 2012 Discussão: • Dosagem de TSH e T4 livre entre 48 e 72 horas de vida não diagnosticam a doença ou foi preditivo de futura alteração laboratorial/ clínica (5) • Orientou coleta entre 3 a 5 dias de vida (5) Brasília, novembro de 2014. • Sem protocolo para triagem e acompanhamento dos recémnascidos sem sintomatologia (5) Discussão: • Se T4 livre acima do valor sintomatologia associada? (5) • Orienta coleta de TRAB materno entre 20 – 24 semanas de gestação se alterados coletar TRAB do cordão umbilical do recém-nascido (5) Brasília, novembro de 2014. • TRAB é preditor de tireotoxicose fetal/ neonatal (42%) (5) Discussão: Tratamento: • Deve ser mantido até presença de autoanticorpos detectáveis (2) • Divergência entre bibliografias entre qual a primeira escolha de medicação antitireoidiana utilizar Brasília, novembro de 2014. • Drogas antitireoidianas e betabloqueador (2) Discussão: • Outras medicações: glicocorticóides(2,4) , lugol (2), imunoglobulinas (4) • Monitorização de T3 e T4 livre (2,4) • TSH é um mau marcador para seguimento (4) • Redução progressiva da medicação para não ocasionar hipotireoidismo iatrogênico (2,4) Brasília, novembro de 2014. • Propiltiouracil ( hepatotóxico porém 2 ações terapêuticas) X Metimazol / Carbimazol (menos efeitos colaterais porém apenas 1 ação terapêutica) Discussão: Considerações Finais : • Apresentou choque cardiogênico, hipertensão pulmonar e necessitou de drogas vasoativas (evolução severa) • Apresentou sintomas clássicos como: baixo peso ao nascer, baixo ganho ponderal, plaquetopenia, colestase, taquicardia persistente, taquipneia • Mãe realizou apenas 5 consultas de pré-natal Brasília, novembro de 2014. • Recém-nascido apresentou quadro de tireotoxicose neonatal • Sem relato em prontuário materno de ecografia gestacionais que buscassem hipertireoidismo no feto ou dosagem de TRAB materno. Além disso, não há relato de tratamento efetivo com droga antitireoidiana pela mãe. • Houve demora na suspeição do diagnóstico (15 dias de vida) mesmo a mãe já sendo sabidamente portadora da Doença de Graves • Não foram localizadas as sorologias do recém-nascido, bem como o peso da placenta • Não possui TSH e T4 livre de controle Brasília, novembro de 2014. Discussão Conclusão • O hipertireoidismo congênito é uma doença rara • Seguimento durante o pré-natal com ecografias seriadas • A sintomatologia é muito variada, sendo na maioria das vezes sintomas leves • Caráter transitório em 60% dos casos, porém pode ter complicações severas em uma pequena parcela. Brasília, novembro de 2014. • Suma importância o seu diagnóstico e intervenção precoces • O tratamento : drogas antitireoidianas e betabloqueador para controle da taquicardia Brasília, novembro de 2014. • O diagnóstico neonatal é feito a partir da dosagem de TSH e T4 livre. Se estiverem alterados deve ser solicitado o TRAB. Brasília, novembro de 2014. O trabalho foi realizado com o objetivo de informar os profissionais de saúde acerca da doença diagnosticada no hospital em questão, discutir as bibliografias mais recentes sobre o assunto, e aumentar o grau de suspeição para que o diagnóstico seja mais precoce e o seguimento mais acertado destes pacientes. • • 1. Kopp P, van Sande J, Parma J, Duprez L, Gerber H, Joss E, et al. Brief report: congenital hyperthyroidism caused by a mutation in the thyrotropin-receptor gene. The New England journal of medicine. 1995;332(3):150-4. Epub 1995/01/19. • 2. Polak M, Legac I, Vuillard E, Guibourdenche J, Castanet M, Luton D. Congenital hyperthyroidism: the fetus as a patient. Hormone research. 2006;65(5):235-42. Epub 2006/04/04. • 3. R S. Neonatal Hyperthroidism- discussions on three clinical cases. Revista Romana de Pediatrie. 2011;60(3):263-8. • 4. Alvarado JL, V. ZAF. Falla cardíaca como manifestacíon temprana de hipertiroidismo neonatal. Caso clínico. 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