XXIX ENANPOLL 09 A 11 DE JUNHO DE 2014 UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA CAMPUS UNIVERSITÁRIO REITOR JOÃO DAVID FERREIRA LIMA PELO OLHAR DA HISTORIOGRAFIA DA LINGUÍSTICA: A DESCRIÇÃO DAS CONJUNÇÕES EM CELSO CUNHA E EVANILDO BECHARA Luana Silva do Nascimento Cunha [email protected] Mestranda/ UFF Orientador: Ricardo Cavaliere RESUMO: Com este trabalho, pretendemos examinar as descrições das conjunções em duas gramáticas da denominada “Geração NGB”, de tal sorte que se contribua para construir um perfil das teses empregadas pela produção linguística brasileira do período em foco no tocante ao entendimento que se aplicava às conjunções. Para o desenvolvimento da presente pesquisa, elegeram- se as seguintes obras: Moderna gramática portuguesa (1977), de Evanildo Bechara e Gramática da Língua Portuguesa (1980), de Celso Cunha. A escolha dos autores mencionados justifica-se por tratar-se de gramáticos consagrados que deixaram um legado de pesquisa em nossa língua e lograram obter grande aceitação de suas obras no âmbito do ensino básico da língua vernácula. Além disso, desses textos ainda podemos obter informações úteis à atividade docente contemporânea em Língua Portuguesa. CONJUNÇÃO: FUNCIONALIDADE PRINCIPAIS ADJUNTAS CONECTIVAS Substantivo Verbo Pronomesubstantivo Numeralsubstantivo Adjetivo Advérbio Pronomeadjetivo Numeraladjetivo Preposição Conjunção Pronome relativo MARCO DE EXPRESSÃO CLASSE E DE DE SITUAÇÃO CATEGORIA Artigo Interjeição Quadro1 - Relações entre classes gramaticais e funções sintáticas Fonte: Mattoso Câmara e o avanço dos estudos linguísticos no Brasil, de Darcilia Simões http://www.filologia.org.br/revista/38sup/06.html GERAÇÃO NGB Denomina-se Geração NGB, o grupo de gramáticos e estudiosos da língua vernácula que publicaram textos de descrição do português à época em que se edifica a Nomenclatura Gramatical Brasileira de 1959, sejam os que seguiram integralmente suas diretrizes, sejam os que o fizeram parcialmente ou a elas se opuseram. Ricardo Cavaliere TIPOS DE CONJUNÇÃO BECHARA (1977, 159) CUNHA (1980, 533) coordenativas coordenativas subordinativas subordinativas Quadro 2 Quadro 3 Fragmento da NOMENCLATURA GRAMATICAL BRASILEIRA publicada no Diário Oficial de 11 de maio de 1959. II – Do período 1 – Tipos de períodos: simples e composto 2 – Composição do período: coordenação, subordinação. 3 – Classificação das orações: a) absoluta: b) principal; c) coordenada; assindética; sindética: aditiva, adversativa, alternativa, conclusiva, explicativa; d) subordinada: - substantiva: subjetiva; objetiva (direta e indireta); completiva nominal; predicativa; apositiva; - adjetiva: restritiva; explicativa; adverbial; causal, comparativa, consecutiva, concessiva, condicional, conformativa, final, proporcional, temporal. HENRIQUES, 1999, 81. Fragmento da NOMENCLATURA GRAMATICAL BRASILEIRA publicada no Diário Oficial de 11 de maio de 1959. IX – Conjunção: 1. Classificação das conjunções: coordenativas: aditivas, adversativas, alternativas, conclusivas, explicativas; subordinativas: integrantes, causais, comparativas, concessionais, consecutivas, finais, temporais, proporcionais, conformativas. HENRIQUES, 2009, 162. BECHARA, 1988, 106. ANÁLISE DA UTILIZAÇÃO DE CRITÉRIOS NA DEFINIÇÃO DE CONJUNÇÃO GRAMÁTICO CRITÉRIO FORMAL BECHARA expressão (1977, 159) CUNHA (1980, 533) vocábulo CRITÉRIO FUNCIONAL Liga orações ou, dentro da mesma oração, palavras que tenham o mesmo valor ou função. Serve para relacionar duas orações ou dois termos semelhantes na mesma oração. Quadro 4 CONJUNÇÕES COORDENATIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) Adversativas Adversativas Alternativas Alternativas Aditivas Aditivas Explicativas Explicativas Conclusivas Conclusivas Quadro 5 FUNÇÕES DAS COORDENATIVAS ADITIVAS BECHARA (1977) - conectam orações ou palavras sem outra ideia subsidiária; CUNHA (1980) - conectam orações ou termos de idêntica função; Quadro 6 PRINCIPAIS COORDENATIVAS ADITIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) e, nem (e não) e, nem (= e não) Quadro 7 EXEMPLOS 1 A Nossa Alma é múltipla, misteriosa e estranha. FUNÇÃO Conexão de palavras (G. Aranha, OC, 773, In: CUNHA, 1980, 534) 2 Um concerto de notas graves saudava o por do sol Conexão de orações e confundia-se com o rumor da cascata. (José de Alencar, In: BECHARA, 1977, 160) 3 Não empresteis o vosso nem o alheio, não tereis cuidados nem receios. Conexão de palavras (Marquês de Maricá, In: BECHARA, 1977, 160) 4 Deram o braço e desceram a rua. Conexão de orações (M. de Assis, OC, I, 38, In: CUNHA, 1980, 534) 5 Não te ponhas a reprova-los nem a aplaudi-las. Conexão de orações (A. M. Machado, CJ, 89, In: CUNHA, 1977, 534) Quadro 8 FUNÇÕES DAS COORDENATIVAS ADVERSATIVAS BECHARA (1977) - ligam palavras ou orações que estabelecem oposição, contraste, compensação, ressalva. CUNHA (1980) - ligam dois termos ou duas orações de igual função, acrescentando-lhes, porém, uma ideia de contraste. Quadro 9 PRINCIPAIS COORDENATIVAS ADVERSATIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) mas, porém, contudo, todavia, entretanto, senão. mas, porém, todavia, contudo, no entanto, entretanto. Quadro 10 SENÃO Observação: A Nomenclatura Gramatical põe os denotadores de inclusão, exclusão, situação, retificação, designação, realce, etc. à parte, sem nome especial. (...) 2 – exclusão: só, somente, salvo, senão, apenas, etc.: Só Deus é imortal. Apenas o livro foi vendido. Bechara, 1977, 153. EXEMPLOS 1 Ela sorriu, mas foi um sorrir de incrédula. (M. de Assis, OC, I, 293, In: CUNHA, 1980, 534) 2 Tinha vontade de não mais pensar, de não mais amar; queria, contudo, viver, por prazer físico, pela sensação material pura e simples de viver. (L. Barreto, TFPQ, 272, In: CUNHA, 1980, 534) 3 Antigamente, mandava fazer as botinas de encomenda; ultimamente, porém, comprava-as feitas. (L. Barreto, REIC, 137, In: CUNHA, 1980, 534) 4 Acabou-se o tempo das ressureições, mas continua o das insurreições. (Id., In: BECHARA, 1977, 160) 5 E agora as entregais desta maneira não a pastores, senão a lobos. (VIEIRA apud A. Nascentes, Dificuldades de Análise Sintática, 7, In: BECHARA, 1977, 160) Quadro 11 FUNÇÕES DAS COORDENATIVAS ALTERNATIVAS BECHARA (1977) - ligam expressões ou orações que estabelecem uma separação ou exclusão da palavra ou oração a que se ligam. CUNHA (1980) - ligam dois termos ou orações de sentido distinto, indicando que, ao cumprir-se um fato, o outro não se cumpre. Quadro 11 PRINCIPAIS COORDENATIVAS ALTERNATIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) ou (repetida ou não) e, quando ou, ou... ou, já ... já, ora... ora. repetidas, ora, quer, seja, nem, já. Quadro 12 EXEMPLOS 1 Na guerra é preciso matar ou morrer. (M. de Assis, OC, I, 343, In: CUNHA, 1980, 535) 2 Ora se esconde, ora ressurge, ora se inclina, Aumentando o esplendor da sua cidadela. (J. de Alencar, OC, III, In: CUNHA, 1980, 535) 3 As setas dos pitiguaras já caem do céu, já voam da terra, e se embebem todas no seio do inimigo. (J. de Alencar, OC, III, 297, In: CUNHA, 1980, 534) 4 Quando a cólera ou o amor nos visita, a razão se despede. (Id., In: BECHARA, 1977, 160) Quadro 13 FUNÇÕES DAS COORDENATIVAS CONCLUSIVAS BECHARA (1977) -encerram uma conclusão. CUNHA (1980) - ligam à anterior uma oração que exprime conclusão, consequência. Quadro 14 PRINCIPAIS COORDENATIVAS CONCLUSIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) logo, pois (no meio ou no fim da oração), portanto, por isso. logo, pois, portanto, por conseguinte, por isso, assim. Quadro 15 Circunstâncias adverbiais - As principais expressas por advérbio ou locução adverbial são: (...) 12) modo: Falou assim. Anda mal. Saiu às pressas. Bechara, 1977, 153. EXEMPLOS 1 Estudou, logo será recompensado. BECHARA, 1977, 160) 2 Homem político, e, portanto, indispensável, não suportava o silêncio. (J. Ribeiro, CD, 201, In: CUNHA, 1980, 535) 3 Tinha um vocabulário quase tão minguado como o do papagaio que morrera no tempo da seca. Valia-se, pois, de exclamações e de gestos... (G. Ramos, VS, 94, In: CUNHA, 1980, 535) Quadro 16 FUNÇÕES DAS COORDENATIVAS EXPLICATIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) - explicam a razão de ser do que se diz na oração a que se ligam. - ligam duas orações, a segunda das quais justifica a ideia contida na primeira. Quadro 17 PRINCIPAIS COORDENATIVAS EXPLICATIVAS BECHARA (1977) CUNHA (1980) pois (no início da oração), que (porque), porquanto. que, porque, pois, porquanto. Quadro 18 EXEMPLOS 1 Vamos dormir, que é tarde. (M. de Assis, OC, II, 293, In: CUNHA, 1980, 535) 2 Comandou Pedro a partida, e a pé, porque era perto, o grupo dirigiuse para a casa. (A. Peixoto, RC, 134, In: CUNHA, 1980, 535) 3 Um pouquinho só lhe bastava no momento, pois estava com fome... (A. M. Machado, JT, 105, In: CUNHA, 1980, 535) 4 Venha, porque desejo conversar com você. (BECHARA, 1977, 161) 5 Fazia tudo para se agradável, pois não deixava uma pergunta sem resposta. (BECHARA, 1977, 161) Quadro 19 Sobre as Coordenativas Explicativas - BECHARA As explicativas não passam de causais coordenativas, que nem sempre se separam claramente das causais subordinativas como veremos adiante. Em certas línguas distingue-se a causal subordinativa da causal coordenativa pela diversidade de partícula. Bechara, 1977, 161. FRANCÊS INGLÊS ALEMÃO conjunção car coordenativa for denn conjunção parce que subordinativa because weil Quadro 20 BECHARA, 2001, 322. Enunciado 1: Não foram ao mesmo cinema e, portanto, não se poderiam encontrar. Enunciado 2: Não foram ao mesmo cinema; portanto não se poderiam encontrar. Enunciado 3: Não foram ao mesmo cinema e não se poderiam encontrar. BECHARA, 2001, 322 Valores particulares – CELSO CUNHA Certas conjunções coordenativas assumem varias matizes significativas de acordo com a relação que estabelecem entre os membros (palavras e orações) coordenados. CUNHA, 1980, 536. EXEMPLO VALOR Era M. C. um homem feio e extremamente inteligente. adversativo (A.F. Schmit, GB, 246, In CUNHA, 1980, 536) Fui, como ervas, e não me arrancaram. concessivo (F. Pessoa, OP, 328, In CUNHA, 1980, 536) Vocês nunca pensaram nisso, e culparam-na. consequência, conclusão (G. Rosa, PE, 128, In, CUNHA, 1980, 537) Ia decorá-la e transmiti-la ao irmão e à cachorra. finalidade (G. Ramos, VS, 98, In CUNHA, 1980, 537) Você ignora que quem os cose sou eu, e muito eu? explicação enfática (M. de Assis, OC, II, 538, In, CUNHA, 1980, 537) El-rei, preso! ... E não se levanta este Minho a livrálo!... (C. C. Branco, BO, 170, In CUNHA, 1980, 537) E a minha terra se chamará a terra de Jafé, e a tua se chamará de Sem; e iremos às tendas um do outro, e partiremos o pão de alegria e da concórdia. (M. de Assis, OC, II, 302, In CUNHA, 1980, 537) para iniciar frases com alta intensidade afetiva, com valor próximo ao de interjeições. facilitar a passagem de uma ideia a outra, mesmo que não relacionadas, quando vem repetido ritmicamente em fórmulas paralelísticas que imitam o chamado EXEMPLO VALOR Vai, se queres, disse-me este, mas temporariamente. restrição (M. de Assis, OC, I, 547, In CUNHA, 1980, 538) Aqui o major chorou, mas suspendeu de repente as lágrimas. retificação (M. de Assis, OC, I, 672, In CUNHA, 1980, 538) Vinha um pouco transformado, mas dissimulava, ofegando sossego e até alegria. atenuação ou compensação (M. de Assis, OC. I, 541, In CUNHA, 1980, 538) Lima surpreendeu-me pela sua poesia cinzenta, um pouco triste, mas poderosa. atenuação ou compensação (A. F. Schimidt, AP, 82, In CUNHA, 1980, 538) Era bela, mas principalmente rara. adição (M. de Assis, OC. I, 639, In CUNHA, 1980, 538) Quadro 22 Conclusão A partir das observações aqui apresentadas, postulamos que há nas referidas gramáticas o propósito de apresentar uma contribuição pedagógica, prezando o ensino da tradição gramatical e de uma língua padrão desejável. Cremos ainda que Evanildo Bechara e Celso Cunha descreveram as conjunções da Língua Portuguesa pautados em uma uniformidade ou harmonia teórica, uma vez que seus conceitos promovem uma formação linguística bastante similar. As contribuições aqui destacadas fazem Moderna gramática portuguesa (1977), de Evanildo Bechara e Gramática da Língua Portuguesa (1980), de Celso Cunha, obras de grande valor para as demandas atuais de pesquisadores de Língua Portuguesa, Linguística e áreas afins. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BECHARA, Evanildo. Moderna Gramática Portuguesa. São Paulo: Editora Nacional,1977. _______________ Lições de português pela análise sintática. Rio de Janeiro: Padrão, 1988. CAVALEIRE, Ricardo. Palavras denotativas e termos afins: uma visão argumentativa. Niterói: Editora da Universidade Federal Fluminense, 2009. CUNHA, Celso Ferreira da. Gramática da língua portuguesa. Rio de Janeiro: FENAME, 1980. HENRIQUES, Cláudio Cézar. Nomenclatura gramatical brasileira: 50 anos depois. São Paulo: Parábola Editorial, 2009. HENRIQUES, Cláudio Cézar. (Org.)Cadernos de Língua Portuguesa 4 – Especial – 40 anos de Nomenclatura Gramatical Brasileira, ano III, nº4, 1999. LIMA, Carlos Henrique da Rocha; Teoria da análise sintática. São Paulo: Tupy, 1956. SILVIA, Rosa Virgínia Mattos e. Tradição gramatical e gramática tradicional. São Paulo: Contexto, 2000.